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Economia no DF
22 • Cidades • Brasília, domingo, 13 de janeiro de 2013 • CORREIO BRAZILIENSE
AGRONEGÓCIO / Impulsionado pelo dinheiro da agropecuária, mercado local cresce em ritmo chinês. Frota de veículos aumentou
68% em quatro anos, e valor do m² se equipara ao de Águas Claras. Cristalinenses investem para tirar proveito da expansão econômica
Fotos: Edilson Rodrigues/CB/D.A Press
Consumo de vento em popa
» DIEGO AMORIM
ristalina parece a mesma de sempre: um aglomerado de casas às
margens da BR-040 rodeado de
extensas áreas verdes. Quem não
a conhece poderia descrevê-la como
uma típica cidade do interior, com direito a praça, igrejinha, intrigas políticas e
festejos. De perto, no entanto, a realidade é bem diferente. A força do agronegócio faz circular no município goiano
mais dinheiro do que poderia imaginar o
mais otimista dos garimpeiros nos tempos áureos dos cristais na região.
No campo e na área urbana da cidadezinha que agora sustenta o maior
Produto Interno Bruto (PIB) agropecuário do Brasil, mansões foram erguidas,
com refinados projetos de arquitetura.
C
Nas ruas, a frota de veículos aumentou
68% nos últimos quatro anos — são
32,1 mil carros para 48 mil moradores,
média de dois veículos para cada três
habitantes. É difícil encontrar um modelo popular, mas é muito fácil avistar
caminhonetes e picapes roncando motores e cheirando a novas.
Até o início de 2015, o único prédio de
Cristalina terá companhia de pelo menos mais seis. Não faltam compradores
para os novos apartamentos, cujo metro
quadrado vale R$ 3,5 mil, mesmo preço
cobrado em lançamentos de Águas Claras, na capital do país. Coberturas de 300
metros quadrados compõem a planta de
edifícios luxuosos, com área de lazer
completa e até instalações para automação residencial dos imóveis.
Concessionárias e mais lojas de
equipamentos agrícolas se preparam
para chegar à cidade. Empresários de
Caldas Novas prometem a construção
de dois resorts nos próximos anos, um
deles a 12 km do centro, em um local
com cachoeiras ainda pouco exploradas turisticamente. “Ninguém segura
Cristalina”, diz o prefeito Luiz Attié
(PSD), que pegou carona nas boas notícias vindas do campo e foi o primeiro
a se reeleger no município.
A agricultura bilionária atraiu gente
de todo o país, mudou a base produtiva
da região e mexeu com a autoestima dos
cristalinenses. Quem nasceu na cidade e
saiu dela em busca de uma vida melhor
agora está retornando para investir. “As
pessoas têm dinheiro, mas não têm onde
gastar”, percebe Dejaime Francisco Xavier, 34 anos, que largou o serviço público
para se dedicar a uma pizzaria reinaugurada no fim do ano passado, após investimento de R$ 500 mil.
O sucesso do estabelecimento de Dejaime ilustra o potencial econômico de
Cristalina. O salão tem capacidade para
200 pessoas. Todo dia, em média, ele recebe entre 350 e 400 clientes. “É garantia
de casa cheia”, diz o empresário, nascido
e criado na cidade, mas que buscou consultoria em Brasília. “Só não atendo mais
gente porque falta mão de obra”, completa ele, que tem 20 funcionários. O
próprio Dejaime ajuda a servir as pizzas.
Boom imobiliário
Assim como o conterrâneo, Fábio Rodrigues, 43, vislumbrou a chance de se
dar bem na terra natal. Abriu uma cons-
trutora e cuida da obra de um prédio de
10 andares no bairro onde nasceu. Dos
40 apartamentos, todos com varandas
gourmet, 16 estão vendidos, incluindo
uma cobertura de R$ 900 mil. “Faltava
ousadia para investir”, comenta ele, que
hoje mora em Luziânia, mas tenta convencer a família a se mudar para o edifício que está construindo.
Nos últimos anos, o preço dos terrenos disparou, junto com a produtividade
das grandes fazendas. Um terreno vendido a R$ 150 mil, cinco anos atrás, custa
hoje cerca de R$ 1 milhão. Não à toa a
renda mensal do corretor Marcelo Silveira, 37, aumentou 10 vezes desde que ele
começou a atuar no mercado imobiliário
da cidade, há 13 anos. “O agronegócio
alavancou Cristalina. Os investimentos
são certeiros”, afirma.
Histórias de um novo eldorado
“BOA PARA
GANHAR DINHEIRO”
TERRITÓRIO
DAS PICAPES
Roupa surrada, chapéu na cabeça, andar arrastado, jeito tímido
e um sorriso largo. O paranaense
Henrique Gonzatti, 43 anos, pertence a uma das famílias mais ricas de Cristalina. Chegou à cidade
acompanhado dos pais, nos anos
1980, ainda rapaz. Trabalhou na
roça esse tempo todo. A propriedade de 500 hectares cresceu 12
vezes de lá para cá. As safras ficaram cada ano melhores. Com o dinheiro que foi sobrando, os quatro
irmãos resolveram investir na cidade. Abriram um armazém, uma
empresa de transportes e, por último, uma construtora. “O município cresceu e a gente quis pegar o
embalo”, explica ele, tímido e de
poucas palavras. Os dois filhos, de
13 e 14 anos, querem estudar medicina e engenharia fora da cidade.
“Eles vão, mas voltam. Esta cidade
é boa para ganhar dinheiro”.
A loja de Ildomar Alves Cabral,
45 anos, fica na primeira esquina
após a entrada principal de Cristalina, próximo ao balão onde há
uma minirréplica do Cristo Redentor. Aos céus e ao campo, o
empresário nascido em Luziânia
só tem a agradecer. Desde a inauguração, em 2008, o faturamento
com automóveis novos e usados
cresce 15% ao ano. Em 2012, Cabral vendeu 250 veículos, total 78%
superior aos 140 comercializados
no primeiro ano do negócio. Perto
do Natal, oito caminhonetes deixaram o pátio: todas pagas à vista.
Pelo menos 85% dos clientes são
ligados ao agronegócio. Quase
sempre levam picapes de no mínimo de R$ 130 mil. “São esses pivôs
de irrigação que têm provocado isso na cidade. Os agricultores plantam, colhem e têm dinheiro no
bolso o ano inteiro”, diz Cabral.
NEGÓCIO À
PROVA DE CRISE
CRISTAIS
BUSCAM ESPAÇO
Foi em Cristalina, de onde nem
sonham sair, que um goiano de
Catalão e um paulista de Franca se
encontraram para uma parceria
de sucesso. Quando Herivelton
Barbosa, 38 anos, chegou à terra
da irrigação, em 1995, só havia
uma revendedora de máquinas
agrícolas. Hoje, são seis. Helder
Sampaio, 47, há mais tempo na cidade, também havia percebido o
nicho de mercado. Nove anos
atrás, os dois criaram coragem e
inauguraram a loja que agora é líder em venda de equipamentos e
máquinas para pulverização. Nos
últimos dois anos, o faturamento
cresceu 60%, chegando, em 2012,
a R$ 20 milhões. O salto impulsionou a dupla a investir também em
uma transportadora de máquinas. “Com irrigação e o plantio o
ano inteiro, aqui é muito difícil ter
uma crise no campo”, diz Barbosa.
Em vez de ofuscarem, os
grãos tendem a dar sobrevida
aos famosos cristais de Cristalina. A visibilidade que o município passou a ter após o avanço
do agronegócio é encarada pelos artesãos como oportunidade
de ressuscitar o próprio trabalho. “A cidade surgiu por causa
dos cristais, não há como nos
esquecermos dessa origem”, diz
o presidente da Associação dos
Artesãos de Cristalina, Willian
Francisco Souto, 38 anos. Até a
década de 1970, 80% da população cristalinense vivia da extração e comercialização dos
cristais. Hoje, calcula Souto,
não passa de mil o número de
envolvidos. Ainda neste semestre, deve ser inaugurado o
Mercado do Cristal, obra de R$
600 mil erguida em terreno
doado pela prefeitura.
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