UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
PEDRO ALVES CABRAL FILHO
ANÁLISE DA VIABILIDADE DE UM CENTRO DE TRANSPLANTE PULMONAR EM
SANTA CATARINA
Itajaí
2013
PEDRO ALVES CABRAL FILHO
ANÁLISE DA VIABILIDADE DE UM CENTRO DE TRANSPLANTE PULMONAR EM
SANTA CATARINA
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Gestão de Políticas
Públicas, da Universidade do Vale do
Itajaí como requisito para a qualificação
no Curso de Mestrado em Gestão de
Políticas Públicas.
Área de concentração: Gestão de
Políticas Públicas – instituições, cultura e
sustentabilidade.
Orientador:
Itajaí
2013
Prof. Dr.
Gonçalo.
Cláudio
Reis
FOLHA DE APROVAÇÃO
PEDRO ALVES CABRAL FILHO
ANÁLISE DA VIABILIDADE DE UM CENTRO DE TRANSPLANTE PULMONAR EM
SANTA CATARINA
Esta dissertação foi julgada adequada
para a obtenção do título de Mestre em
Gestão de Políticas Públicas e aprovada
pelo Programa de Pós-graduação em
Gestão de Políticas Públicas da
Universidade do Vale do Itajaí.
Área de concentração: Gestão de
Políticas Públicas – instituições, cultura e
sustentabilidade.
Itajaí, 19 de dezembro de 2012
Prof. Dr. Cláudio Reis Gonçalo.
Orientador
Prof. Dr. Flavio Ramos
Avaliador 1
UNIVALI
Prof. Dr. Claudio Reis Gonçalo
Avaliador 2
UNIVALI
AGRADECIMENTOS
Aos funcionários e aos professores do mestrado por toda ajuda e orientação.
Ao Prof. Claudio Gonçalo, pela orientação nesta jornada.
Ao meu novo amigo, Flavio Magajewski, pelo seu apoio e presteza.
Ao meu grande amigo, Joel de Andrade, por sua amizade e parceria incondicional.
Aos meus pais, irmãos e sobrinhos, por serem a minha referência de respeito à vida
e às pessoas.
Ao meu filho, por ser minha fonte inspiradora para aprender e lutar por um mundo
melhor.
À minha esposa e companheira, por ser a base e o alicerce de todas as minhas
conquistas.
Os desafios nos ajudam a descobrir coisas que não sabíamos
sobre nós mesmos.
- Cecily Tyson -
RESUMO
O transplante pulmonar tem se consolidado nos últimos 20 anos como uma opção
de tratamento de sucesso para uma variedade de doenças pulmonares em estágios
finais. Diversos estudos têm demonstrado a melhora da qualidade de vida, a função
pulmonar e a satisfação dos pacientes transplantados quando comparados com
aqueles pacientes que estão na fila de espera para um transplante. O Estado de
Santa Catarina não realiza transplante pulmonar e encaminha os pacientes que
necessitam deste procedimento para o Rio Grande do Sul. Objetivo: Avaliar a
viabilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa
Catarina. Metodologia: O estudo foi realizado em cooperação com a central de
transplantes de Santa Catarina, a diretoria de educação permanente em saúde da
Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina e o Centro de Transplante do
Hospital Santa Casa de Porto Alegre – RS. Utilizou-se a Metodologia de Multicritério
de Apoio à Decisão (MCDA), e foram identificados elementos fundamentais de
análise ou critérios utilizados para avaliar a viabilidade de implantação de um serviço
de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina, os quais foram agrupados em
elementos primários de avaliação (EPAs). Resultados: Em relação à demanda de
transplantes, em função de sua população, Santa Catarina permanece com uma
perspectiva menor que a do Rio Grande do Sul – 15 a 32 procedimentos/anos em
Santa Catarina e 82 a 137 procedimentos/ano no Rio Grande do Sul. Quanto ao
número de pulmões disponibilizados, Santa Catarina possui uma estimativa de
geração de enxertos de 10 pulmões/ano, enquanto a estimativa do Rio Grande do
Sul é de 25 pulmões/ano; o tempo em fila de espera para um transplante e a sua
mortalidade foram favoráveis à Santa Catarina, por ter fila própria e menos pacientes
em lista, porém nossa população de base para procura de órgãos seria menor; o
custo financeiro para a implantação do serviço foi desfavorável, se comparado a
manter um paciente no Rio Grande do Sul; a curva de aprendizado mostrou-se um
obstáculo grande a ser vencido, em função do tamanho da população de Santa
Catarina e dos seus reflexos na demanda de transplante, e por ser o Rio Grande do
Sul o serviço com maior experiência de enxertos com uma média de 27
procedimentos ao ano; o custo de manutenção do serviço em Santa Catarina
mostrou-se desfavorável, se comparado ao custo atual de manter o paciente no RS,
além disso, o serviço de referência do Rio Grande do Sul possui a melhor relação
custo-financiamento possível pelas normas do SUS; o número de pulmões
efetivamente transplantados e a taxa de aceitação dos órgãos disponibilizados foram
favoráveis ao serviço de transplante em Santa Catarina, com melhora do
aproveitamento dos pulmões aqui gerados e ofertados; a sobrevida dos pacientes
pós-transplantes mostrou-se desfavorável num primeiro momento para Santa
Catarina, visto que está diretamente relacionado à curva aprendizado e à
experiência da equipe para o controle pós-transplante; o custo econômico final
incorporado ao estado possui um risco potencial de deficit financeiro se não for bem
planejado. Conclusão: A implantação de um serviço próprio de transplante
pulmonar no Estado de Santa Catarina poderia incrementar o aproveitamento dos
enxertos pulmonares com potencial redução do tempo e da mortalidade em lista de
espera, porém é uma opção inquestionavelmente mais onerosa que a de manter os
pacientes em tratamento no Rio Grande do Sul.
Palavras-chave: Transplante pulmonar. Políticas públicas. Viabilidade.
ABSTRACT
In the last 20 years lung transplantation has become an established and successful
treatment option for a variety of end-stage pulmonary diseases. Several studies have
demonstrated improvement in the quality of life, lung functions and the satisfaction of
the transplant-patients compared with those patients who are on the long waiting list.
The hospitals in the state of Santa Catarina (SC) South of Brazil, do not perform lung
transplantation procedures, therefore patients who need lung transplants are referred
to the hospitals of neighboring state of Rio Grande do Sul (RS). Objective: To
evaluate the feasibility of implementing a service of lung transplantation in the state
of SC. Method: A study was conducted in cooperation with the Transplant Center of
SC, the board of the Permanent Health Education Agency/Office of SC, and, the
Transplant Center of Santa Casa de Porto Alegre Hospital in RS. The study used the
Multicriteria Decision Aid Methodology (MCDA) and it has identified key criteria to
assess the feasibility of implementing a service for lung transplantation in SC. These
criteria were grouped into primary elements of the evaluation (EPAs). Results: With
regard to the demands for lungs transplants, SC remains a smaller prospect than RS
– 15 to 32 procedures per year in SC compared to 82 to 137 procedures per year in
RS. Concerning the availability and accessibility of lung organs, SC has an estimated
generation of 10 lung grafts per year while the estimates of RS are 25 lungs grafts
per year.The study show that long waiting list and mortality favor SC for having their
own waiting list although the ratio of the number of patients and demands for lungs
organs to the base population would be lower.The study show that the financial cost
to implement the service in SC is not favorable if compared to maintaining the patient
in RS. The learning curve proved to be a major obstacle to be overcome, the ratio of
the base population of SC to the demands for lung transplantation, and, RS has more
experience with grafts and an average of 27 procedures per year. Additionally, the
study show the cost of maintaining the center in SC is unfavorable if compared to the
current cost of maintaining the current center in RS. Also the referral service in RS
has a good relationship with SUS (National Health Service) regulation
for
financing.The existing number of lungs transplanted procedures and the acceptance
rate of available organs were favorable to the implementation of the transplantation
center in SC specially if combined with improved utilization of the lungs generated
and offered. At first, patient post-transplant survival showed unfavorable for SC,
since it is directly related to staff learning curve and experience of posttransplantation procedures. The final economic cost of the center incorporated to the
state has a potential financial impact if not well planned and managed.
Conclusion:The implementation of a lung transplantation service in the state of SC
could increase the usage of lung grafts and potentially reduce waiting times and
waiting list mortality, although it is undeniably more costly option than keeping the
patients lung treatment center in RS.
Keywords: Lung transplantation. Public politics. Feasibility.
LISTA DE QUADROS E FIGURAS
Quadro 1: Profissionais e experiência mínima exigida para autorização de equipe de
transplante. ................................................. Erro! Indicador não definido.
Quadro 2: Sumário dos custos de treinamento de uma equipe de transplante
pulmonar. ................................................................................................. 76
Quadro 3: Número de transplantes pulmonares realizados no Brasil. ...................... 79
Quadro 4: Vencimentos dos profissionais da saúde. ................................................ 83
Quadro 5: Resumo do Custo Variável do Transplante em Instituição Pública de
Santa Catarina. ........................................... Erro! Indicador não definido.
Quadro 6: Classificação dos estabelecimentos de saúde e percentuais de
incremento na remuneração. ...................... Erro! Indicador não definido.
Quadro 7: Caracterização dos distintos níveis estabelecimentos de saúde. ............. 85
Quadro 8: Comparação entre centro próprio de transplante pulmonar em Santa
Catarina e manutenção do transplante pulmonar no Rio Grande do Sul,
conforme os Elementos Primários de Avaliação (EPAs). ...................... 112
Figura 1: Ciclo da Política Pública. ............................................................................ 22
Figura 2: Sobrevida geral com o transplante de pulmão. ............. Erro! Indicador não
definido.
Figura 3: Mapa cognitivo realizado para avaliação da viabilidade de um serviço de
Transplante Pulmonar. ................................. Erro! Indicador não definido.
Figura 4: Árvore de pontos de vista para análise da viabilidade de um centro de
Transplante Pulmonar. ................................. Erro! Indicador não definido.
Figura 5: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012. ............................... 70
Figura 6: Número de doadores efetivos por milhão de população no ano de 2012...72
Figura 7: Tempo de espera dos pacientes transplantados de pulmão no Estado do
Rio Grande do Sul. .................................................................................... 73
Figura 8: Capacidade instalada para transplantes no Estado de Santa Catarina. Erro!
Indicador não definido.
Figura 9: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2010. ............................... 79
Figura 10: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2011. ............................. 80
Figura 11: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012. ............................. 81
Figura 12: Transplantes realizados fora do Estado de Santa Catarina pagos por TFD
em 2011. ................................................................................................... 82
Figura 13: Sobrevida pós-transplante pulmonar........................................................ 87
Figura 14: Relação entre a necessidade estimada de transplante e o número de
procedimentos realizados em 2012. ......................................................... 91
Figura 15: Taxa de doação efetiva por milhão de população e transplantes
realizados nas regiões brasileiras no ano de 2012................................... 92
Figura 16: Número absoluto de transplantes no Brasil em 10 anos. ....................... 108
Figura 17: Ciclo de Políticas Públicas Adaptado. .................................................... 114
13
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 13
2
OBJETIVOS........................................................................................................ 20
3
2.1
Objetivo Geral .............................................................................................. 20
2.2
Objetivos Específicos ................................................................................... 20
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 21
3.1
Políticas Públicas ......................................................................................... 21
3.1.1
Formação da Agenda de Políticas Públicas .......................................... 25
3.1.2
Implementação de Políticas Públicas .................................................... 27
3.1.3
Avaliação das Políticas Públicas ........................................................... 29
3.2
Políticas Públicas de Saúde e Transplante .................................................. 30
3.3
Transplante pulmonar .................................................................................. 38
3.3.1
Complicações ........................................................................................ 41
3.3.2
Captação ............................................................................................... 43
3.3.3
Custos ................................................................................................... 45
4
CONTEXTO DA PESQUISA............................................................................... 49
5
METODOLOGIA ................................................................................................. 60
6
RESULTADOS ................................................................................................... 62
6.1
Levantamento dos elementos primários de avaliação.................................. 63
6.2
Elaboração do mapa cognitivo ..................................................................... 64
6.3
Determinação dos pontos de vista fundamentais ......................................... 66
6.4
Demanda de transplantes da população de Santa Catarina ........................ 69
6.5
Número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de
captação de órgãos. .................................................................................... 71
6.6
Tempo na fila de espera............................................................................... 72
6.7
Índice de mortalidade na fila de espera........................................................ 73
6.8
Custos de implantação do serviço ............................................................... 73
6.9
Custo para estruturação/capacitação da equipe multidisciplinar.................. 75
6.10 Concentração de modalidades de transplantes por serviço ......................... 77
6.11 Curva de aprendizado da equipe de transplante.......................................... 78
6.12 Custo de manutenção do serviço ................................................................. 81
14
6.13 Número de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de referência
para transplante de pulmão e taxa de aceitação dos órgãos
disponibilizados. .......................................................................................... 86
6.14 Sobrevida pós-transplante ........................................................................... 86
7
DISCUSSÃO....................................................................................................... 89
7.1
Demanda e Oferta ........................................................................................ 90
7.2
Implantação.................................................................................................. 96
7.2.1
Tempo e mortalidade na fila de espera ................................................. 96
7.2.2
Custo de implantação ............................................................................ 99
7.3
Manutenção ............................................................................................... 102
7.3.1
Curva de Aprendizado ......................................................................... 102
7.3.2
Custo de manutenção.......................................................................... 105
7.4
Eficiência/Eficácia (Qualidade)................................................................... 107
7.4.1
Número de pulmões efetivamente transplantados e taxa de aceitação.....
............................................................................................................. 107
7.4.2
8
Sobrevida e qualidade de vida pós-transplante ................................... 109
CONCLUSÃO ................................................................................................... 114
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 117
13
1 INTRODUÇÃO
O transplante pulmonar é, atualmente, uma modalidade de tratamento eficaz
para pacientes com doenças pulmonares graves, dentre elas a Doença Pulmonar
Obstrutiva Crônica (DPOC), que possui uma prevalência alta na população e é uma
das maiores causas de morbimortalidade, tornando-se por isso uma questão de
saúde pública. Cabe ao governo, dentro de uma política de saúde, analisar a melhor
forma de minimizar ou atenuar o impacto desta doença na população, priorizando o
melhor acesso possível ao tratamento adequado. Santa Catarina possui um dos
melhores índices nacionais em transplantes de órgãos e tecidos, porém não possui
um centro próprio de transplante pulmonar, necessitando encaminhar seus
pacientes ao centro de referência no Rio Grande do Sul. A questão é se a
implantação de um centro de transplante pulmonar próprio facilitaria e melhoraria o
acesso da população catarinense a este tipo de tratamento. O estudo da viabilidade
de um centro de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina pretende
contribuir para o debate e para a análise destes fatores dentro da formulação de
políticas públicas.
Segundo Souza (2007, p. 68), a definição mais clássica de políticas públicas é
atribuída a Lowi: “política pública é uma regra formulada por alguma autoridade
governamental que expressa uma intenção de influenciar, alterar, regular, o
comportamento individual ou coletivo através do uso de sanções positivas ou
negativas”.
[…] Políticas Públicas repercutem na economia e na sociedade, em
função disto, qualquer teoria de política pública precisa também
explicar as inter-relações entre Estado, política, economia e
sociedade. […] Pode-se, então, resumir política pública como o
campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, colocar o
governo em ação e/ou analisar essa ação e, quando necessário,
propor mudanças no rumo ou curso dessas ações. A política pública
se caracteriza por um processo dinâmico e de aprendizado formado
por vários estágios e área de atuação, e seu ciclo compreende:
definição da agenda de governo, identificação de alternativas,
avaliação e seleção das opções, implementação e avaliação.
(SOUZA, 2007,p. 69).
O processo de formação da agenda de políticas governamentais procura
investigar de que forma uma questão se torna importante em um determinado
momento, chamando a atenção do governo e passando a integrar sua agenda.
14
Agenda governamental, para Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), é definida como
o conjunto de assuntos sobre os quais o governo e as pessoas ligadas a ele
concentram sua atenção em um determinado momento. Fazem parte dela um
subgrupo denominado agenda decisional que contempla questões prontas para uma
decisão ativa dos formuladores de pesquisa, e agendas especializadas que refletem
a natureza setorial da formulação de políticas públicas (saúde, transportes e
educação). A questão dos transplantes de órgãos (em específico do transplante
pulmonar) entraria neste organograma dentro da agenda especializada.
Segundo Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), a mudança da agenda é
resultado da convergência de três fluxos: problemas, soluções ou alternativas e
política.
Problemas: Como uma determinada questão se torna um problema e passa a
ocupar a agenda governamental? Para Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), isso
ocorre quando a questão chama a atenção dos participantes de um processo
decisório, despertando a ação por meio de três mecanismos básicos:
a) indicadores (custos de um programa, taxas de mortalidade, variações na folha de
pagamento de servidores, evolução do defict público…) que apontam para a
existência de uma questão que pode se tornar um problema para os
formuladores de política. Exemplo: o custo operacional de um transplante
pulmonar no Estado é viável para se criar um serviço próprio e eliminar a
transferência de pacientes para estados vizinhos?
b) eventos, crise e símbolos: quando são em grandes magnitudes, concentram a
atenção a um determinado assunto;
c) feedback das ações governamentais: o monitoramento dos gastos, o
acompanhamento das atividades de implementação, o cumprimento ou não de
metas, as possíveis reclamações de servidores ou cidadãos… Exemplo: os
gastos
do
governos
estão
excedendo
ao
estipulado
para
pacientes
transplantados? A atividade de implementação de um setor específico dentro do
governo para transplantes pulmonares pode ser analisada?
Soluções ou alternativas: a geração de alternativas e soluções é avaliada em
comunidades e flutua em um “caldo primitivo de políticas”. As ideias são levadas a
esse “caldo” e alternativas emergem para a consideração dos participantes do
processo decisório. As comunidades geradoras de alternativas são compostas por
especialistas (pesquisadores, assessores parlamentares, acadêmicos, funcionários
15
públicos) que compartilham uma preocupação em relação a uma determinada área.
Exemplo: o médico responsável pelo setor de transplante pulmonar observa que
poderia se tentar reduzir custos com um serviço dentro do próprio Estado e
compartilha suas ideias e suas alternativas com autoridades responsáveis na área.
Desta forma, as ideias são difundidas basicamente por meio de persuasão.
Política: aqui as coalizões são construídas por meio de barganha e
negociação política. Três elementos exercem influência neste fluxo:
a) Clima ou humor nacional;
b) Forças políticas organizadas;
c) Mudanças dentro do próprio governo – o melhor período para mudanças na
agenda é o início de um novo governo.
Quando estes três fluxos (problemas, soluções e alternativas, e política) são
reunidos, gera-se uma oportunidade de mudança na agenda. A convergência destes
fluxos é denominada como policy windows (janelas políticas) e é influenciada
diretamento pelo fluxo de problemas e pelo fluxo político. Por outro lado, o fluxo de
soluções,
embora
não
exerça
influência
sobre
a
formação
da
agenda
governamental, é fundamental para que uma questão já presente nesta agenda
tenha acesso à agenda decisional (CAPELLA, 2007).
No caso dos transplantes pulmonares, se esta questão for inserida no fluxo de
problemas (por meio de indicadores que se pretende demonstrar neste trabalho)
num momento de convergência do fluxo político (mudança de governo, por exemplo)
pode passar de agenda especializada para a agenda decisional, quando já se
possuem alternativas e soluções viáveis para o problema. Isto reafirma a
importância do estudo sobre a viabilidade da implantação do serviço próprio de
transplante pulmonar no Estado.
A implantação de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina se
torna relevante a partir do momento que isto proporcione vantagens do ponto de
vista político, social e da saúde. Segundo Chaves (1998), dentro dos outros setores
da sociedade, a saúde tem como objetivo proporcionar à população de um país ou
região um nível mais alto à que se é possível alcançar num dado momento histórico
com os recursos disponíveis. Saúde é parte integrante do bem-estar social. Os
indicadores de saúde, por conseguinte, são componentes essenciais de indicadores
mais complexos de qualidade de vida. São importantes na dimensão econômica da
saúde questões ligadas à eficiência, ao custo-efetividade, à avaliação de tecnologia,
16
ao estabelecimento de prioridades, à alocação de recursos, à gestão orientada para
qualidade e resultados.
Doenças que geram um grande impacto na saúde pública, seja pela elevada
incidência, seja pela alta morbimortalidade, seja pelo alto custo, merecem especial
atenção no âmbito das políticas públicas.
A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) tem elevada prevalência em
todo o mundo. Estima-se que entre 7-10% da população adulta seja afetada.
Conforme estudo de Miravithes, em 2004, no Brasil, a bronquite crônica, usada
como exemplo de DPOC, tem uma prevalência de 12,7% na população geral adulta.
Num estudo realizado nos Países Baixos por Feenstra et al. em 2011, estimou-se
que, até 2012, o total de anos de vida perdidos por DPOC crescerá 60%, os anos de
vida acometidos por incapacidade crescerão 70% e os custos sanitários por DPOC
aumentarão 90%. Os tabagistas serão os causadores de 90% destes casos.
A Organização Mundial de Saúde (OMS), juntamente com Universidade de
Harvard, desenvolveu um indicador de saúde que permite uma visão conjunta da
mortalidade e da morbidade de determinadas doenças, a qual é expressa em
somatório de anos de vida perdido por morte prematura e anos de vida vividos com
uma doença de duração e severidade especificadas. Dentro disso, seguindo esta
lógica, foram feitas projeções com bases em dados do ano de 1990 para o ano de
2020, e as doenças pulmonares (DPOC, infecções e câncer) figuram entre as cinco
principais cargas de doença para o futuro (CHAVES, 1998).
Sendo assim, por ser uma doença de elevada prevalência, pressupõe uma
grande carga assistencial e demanda uma importante preocupação dentro da
política de saúde pública de cada governo. Ainda, conforme Miravithes (2004), um
paciente com DPOC gera um custo anual direto de U$ 1.200 a U$ 1.800. O custo
relaciona-se com a gravidade da doença: quanto maior a gravidade, maiores os
custos. Em estágios avançados da doença, a hospitalização é a responsável pelos
custos mais elevados. No âmbito brasileiro, o custo médio de uma internação para
essa doença representa equivalência ao valor anual de um tratamento ambulatorial,
cerca de R$ 2.761,00. Estes gastos estão relacionados aos custos diretos de um
paciente portador de DPOC, que pode ser entendido por custos relacionados a um
ciclo específico desta doença: detecção, tratamento, prevenção e reabilitação.
Somam-se ainda os custos indiretos referentes à morbidade e à mortalidade da
doença, e aqui se tenta medir o impacto da doença sobre o aparato produtivo
17
nacional: falecimento ou dias de ausência no trabalho.
Particularmente, nas doenças pulmonares crônicas, a qualidade de vida não é
apenas uma mera consequência da sua gravidade: múltiplos fatores que se interrelacionam estão envolvidos, e a despeito da introdução de novas modalidades de
tratamento, são responsáveis por um considerável e crescente aumento na
morbimortalidade em países ocidentais (RAMOS; CREPALDI, 2000). A possibilidade
de melhoria da qualidade de vida, por meio de intervenção clínica, tem levado à
ampliação dos objetivos do tratamento das doenças pulmonares para além da
melhora da função do órgão, procurando atuar também na recuperação dos
prejuízos funcionais (falta de ar, cansaço, fraqueza), condições essas que têm
importância indiscutível para o bem-estar dos pacientes.
O transplante pulmonar tem se consolidado nos últimos 20 anos como uma
opção de tratamento de sucesso para uma variedade de doenças pulmonares em
estágios finais, a saber DPOC, Fibrose Cística e Hipertensão Pulmonar (CAMARGO,
2006). Baseia-se na retirada cirúrgica de um ou dois pulmões doentes do paciente
receptor e colocação de um ou dos dois pulmões sadios em um paciente doador.
Para aqueles enfermos com pneumopatia terminal, o transplante é a única opção
terapêutica capaz de evitar a morte, em poucos meses, oferecendo expectativa de
uma nova vida.
Nestes últimos anos, esta atividade vem crescendo e evoluindo rapidamente,
com o refinamento das técnicas cirúrgicas e a descoberta de novas drogas
imunossupressoras (LAU; PATTERSON, 2003; TRULOCK et al., 2006). Diversos
estudos têm demonstrado a melhora da qualidade de vida, a função pulmonar e a
satisfação dos pacientes transplantados, quando comparados com aqueles
pacientes que estão na fila de espera para um transplante (LANUZA et al., 2000;
LAU; PATTERSON, 2003; LIMBOS et al., 2000; TENVERGERT et al., 1998; VAN
DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT, 2009). Apesar dos avanços, há muito ainda por
evoluir nesta área e algumas dificuldades ainda fazem deste tipo de transplante um
dos menos realizados no Brasil (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE...,
2012; CAMARGO; CARMORI, 2001; PEGO-FERNANDES; GARCIA, 2010;).
O Estado de Santa Catarina não realiza transplante pulmonar. No Brasil,
existem cinco estados que possuem centro de transplante pulmonar: São Paulo,
Minas Gerais, Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. As outras regiões do país
necessitam transportar seus pacientes a esses estados em busca desta modalidade
18
terapêutica no momento em que se consegue o órgão a ser transplantado. Santa
Catarina encaminha seus pacientes para o Rio Grande do Sul.
A situação atual dos tranplantes pulmonares encontra-se hoje dentro de um
subsistema estável, na qual os pacientes que necessitam deste procedimento são
encaminhados aos estados que possuem um centro especializado. Se a questão da
implantação de um serviço próprio conseguisse ascender o macrosistema (seja por
uma suposta mudança na percepção da questão que a transformasse em problema,
ou por uma mobilização da opinião pública), o subsistema acataria esta mudança e
promoveria reorganizações institucionais que poderiam tornar-se posteriormente
estáveis e aceitas como definitiva.
Uma série de estudos está disponível para orientar a decisão em relação a
alternativas para investimentos em políticas e intervenções na área da saúde.
Inúmeros trabalhos utilizam estimativas sobre a eficácia e o custo-efetividade de
intervenções, indicando as melhores opções para a gestão. No entanto, as análises
com origem na economia são resistentes à inclusão de outros critérios que possam
também desempenhar papéis importantes na tomada de decisão eficaz, como
preocupações éticas e sociais. Como exemplo, é possível que a preferência da
sociedade em determinado momento histórico possa incluir outros objetivos que não
só os relacionados com a eficiência, mas com a ampliação dos serviços para
pacientes graves ou hoje fora das possibilidades terapêuticas. Por conta disso,
optou-se por utilizar uma metodologia de análise do objeto de pesquisa por múltiplos
critérios de apoio à decisão (MCDA), para permitir a incorporação de outros critérios,
além da eficácia e do custo-efetividade no processo de tomada de decisão para a
implantação de serviço de transplante de pulmão em Santa Catarina.
Como ponto de partida para a construção da matriz de desempenho, as
opções de investimento elegíveis para a implementação são identificadas. No nosso
caso, as opções foram utilizar as informações do serviço de transplante de pulmão
localizado em Porto Alegre (RS) ou investir para criar um novo serviço no Estado de
Santa Catarina.
Em seguida, os critérios que compuseram a matriz de decisão foram
estabelecidos. Tendo em vista o caráter acadêmico da dissertação, os critérios
selecionados foram escolhidos a partir de reuniões técnicas com gestores
responsáveis pela coordenação do sistema de captação e doação de órgãos para
transplante em Santa Catarina. Entretanto, é cada vez mais comum identificar
19
processos participativos de seleção de critérios com reuniões e técnicas de
ponderação e priorização, nas quais participam todos os interessados – gestores,
pacientes em lista de espera, financiadores do sistema público e de planos de
saúde, profissionais de saúde, etc.
Assim, transformar a questão do transplante pulmonar no Estado de Santa
Catarina em um problema que possa ser conceituado no processo de formulação de
políticas públicas, torná-lo relevante num determinado momento, mobilizando
esforços e recursos para que se torne viável, e a maneira pela qual as alternativas
serão apresentadas e selecionadas, focalizando sua atenção para a formação da
agenda de governo, é a razão que motivou este trabalho.
A questão a ser definida é: a criação de um serviço de transplante pulmonar
próprio no Estado de Santa Catarina pode ser viável e vantajosa do ponto de vista
técnico e econômico para o estado, e do ponto de vista de satisfação e eficiência
para a população, quando comparado ao sistema que vigora atualmente?
20
2 OBJETIVOS
2.1
Objetivo Geral
Avaliar a viabilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar
em Santa Catarina.
2.2
Objetivos Específicos
a) Identificar a demanda de transplante pulmonar em Santa Catarina;
b) Reconhecer a base populacional para viabilizar um centro de transplante
pulmonar;
c) Levantar dados econômico-financeiros para a implantação e a manutenção de
um centro de transplante pulmonar.
Resultados e aplicação da pesquisa: os resultados do estudo servirão de
base para a tomada de decisão da Secretaria de Estado da Saúde do Governo de
Santa Catarina para o desenvolvimento ou não de um programa de transplante
pulmonar em nosso estado.
Observações: o estudo foi realizado em cooperação com a central de
transplantes de Santa Catarina e a diretoria de educação permanente em saúde da
Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina.
21
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1
Políticas Púlicas
A política é parte constitutiva e essencial da vida social.
O termo política, no inglês, politics, faz referência às atividades políticas: o
uso de procedimentos diversos que expressam relações de poder (ou seja, visam
influenciar o comportamento das pessoas) e se destinam a alcançar ou produzir uma
solução pacífica de conflitos relacionados a decisões públicas.
Já o termo policy é utilizado para referir-se à formulação de propostas, à
tomada de decisões e à sua implementação por organizações públicas, tendo como
foco temas que afetam a coletividade, mobilizando interesses e conflitos. Em outras
palavras, policy significa a atividade do governo de desenvolver políticas públicas a
partir do processo da política (RUA, 1998).
Avançando um pouco mais, é possível sustentar que as políticas públicas
(policy) são uma das resultantes da atividade política (politics): compreendem o
conjunto das decisões e das ações relativas à alocação imperativa de valores
envolvendo bens públicos. O conceito de políticas públicas é um conceito evolutivo,
na medida em que a realidade a que se refere existe num processo constante de
transformações históricas nas relações entre estado e sociedade, e que essa
mesma relação é permeada por mediações de natureza variada, mas que, cada vez
mais,
estão
referidas
aos
processos
de
democratização
das
sociedades
contemporâneas (SOUZA, 2007).
É importante desenvolver a compreensão de que as políticas públicas são
resultantes da atividade política e que esta consiste na resolução pacífica de
conflitos, processo essencial à preservação da vida em sociedade.
Ham e Hill (1993) apontam que a preocupação com as políticas públicas dá
origem ao surgimento da Análise de Política, classificando os estudos de Análise de
Política em duas grandes categorias:
a) a análise que tem como objetivo produzir conhecimentos sobre o processo de
elaboração política (formulação, implementação e avaliação) em si, revelando
assim
uma
orientação
predominantemente
descritiva.
Esta
categoria
corresponde, na literatura anglo-saxã, ao que se conhece como analysis of
policy, referindo-se à atividade acadêmica visando, basicamente, ao melhor
22
entendimento do processo político;
b) a análise destinada a auxiliar os formuladores de política, que agrega
conhecimento
ao
processo
de
elaboração
de
políticas,
envolvendo-se
diretamente na tomada de decisões e assumindo um caráter prescritivo ou
propositivo. Corresponde, na literatura anglo-saxã, ao que se conhece como
analysis for policy, referindo-se à atividade aplicada voltada à solução de
problemas sociais.
As políticas públicas (policies) ocorrem em um ambiente tenso e de alta
densidade política (politics), marcado por relações de poder, extremamente
problemáticas, entre atores do Estado e da sociedade, entre agências intersetoriais,
entre os poderes do Estado, entre o nível nacional e os níveis subnacionais, entre
comunidade política e burocracia.
Uma forma de lidar com essa complexidade sem descartar a dinâmica
sistêmica é associar o modelo sistêmico com o modelo do ciclo de política (policy
cycle), que aborda as políticas públicas como um ciclo deliberativo, formado por
vários estágios e constituindo um processo dinâmico e de aprendizado (SOUZA,
2007), como se pode verificar por meio da
Figura 1: Ciclo da Política Pública.
Figura 1: Ciclo da Política Pública
23
FORMAÇÃO DA AGENDA
- Definição do problema.
- Análise do problema.
FORMAÇÃO DE ALTERNATIVAS
- Avaliação das opções.
- Seleção das opções.
IMPLEMENTAÇÃO
- Monitoramento.
AVALIAÇÃO
- Ajustes.
Fonte: Souza (2007).
Na concepção do ciclo de políticas, a política pública é considerada a
resultante de uma série de atividades políticas que, agrupadas, formam o processo
político. Essa visão conduz os estudiosos a examinar como as decisões são ou
poderiam ser tomadas e permite identificar e analisar os processos políticoadministrativos, os mecanismos e as estratégias definidas para a realização da
política e o comportamento dos diferentes atores envolvidos em cada etapa do
processo de produção de políticas.
Conforme Rua (2009), o ciclo de políticas é uma abordagem para o estudo
das políticas públicas, identificando fases sequenciais e interativo-iterativo-iterativas
no processo de produção de uma política. Essas fases são:
a) formação da agenda, que ocorre quando uma situação qualquer é reconhecida
como um problema político e a sua discussão passa a integrar as atividades de
um grupo de autoridades dentro e fora do governo;
b) formação das alternativas e tomada de decisão: ocorre quando, após a inclusão
do problema na agenda e alguma análise deste, os atores começam a
apresentar propostas para sua resolução. Essas propostas expressam interesses
diversos, os quais devem ser combinados de tal maneira que se chegue a uma
solução aceitável para o maior número de partes envolvidas. Ocorre, então, a
24
tomada de decisão;
c) a tomada de decisão não significa que todas as decisões relativas a uma política
pública foram tomadas, mas, sim, que foi possível chegar a uma decisão sobre o
núcleo da política que está sendo formulada. Quando a política é pouco
conflituosa e agrega bastante consenso, esse núcleo pode ser bastante
abrangente, reunindo decisões sobre diversos aspectos. Quando, ao contrário,
são muitos os conflitos, as questões são demasiado complexas ou a decisão
requer grande profundidade de conhecimentos, a decisão tende a cobrir um
pequeno número de aspectos, já que muitos deles têm as decisões adiadas para
o momento da implementação;
d) a implementação consiste em um conjunto de decisões a respeito da operação
das rotinas executivas das diversas organizações envolvidas em uma política, de
tal maneira que as decisões inicialmente tomadas deixam de ser apenas
intenções e passam a ser intervenção na realidade. Normalmente, a
implementação se faz acompanhar do monitoramento: um conjunto de
procedimentos de apreciação dos processos adotados, dos resultados
preliminares e intermediários obtidos e do comportamento do ambiente da
política. O monitoramento é um instrumento de gestão das políticas públicas e o
seu objetivo é facilitar a consecução dos objetivos pretendidos com a política; e
e) a avaliação é um conjunto de procedimentos de julgamento dos resultados de
uma política, segundo critérios que expressam valores. Juntamente com o
monitoramento, destina-se a subsidiar as decisões dos gestores da política
quanto aos ajustes necessários para que os resultados esperados sejam obtidos.
Para Souza (2007), o ciclo de política pública enfatiza sobremodo a formação
ou a definição da agenda. À pergunta de como os governos definem suas agendas,
são dados três tipos de resposta:
a) a primeira focaliza os problemas, isto é, problemas entram na agenda quando se
assume que se deve fazer algo sobre eles. O reconhecimento e a definição dos
problemas afetam os resultados da agenda;
b) a segunda focaliza a política propriamente dita, ou seja, como se constrói a
consciência coletiva sobre a necessidade de se enfrentar um dado problema. A
construção de uma consciência coletiva sobre determinado problema é fator
poderoso e determinante na formação da agenda;
c) a terceira focaliza os participantes, que são classificados como visíveis, ou seja,
25
políticos, mídia, partidos, grupos de pressão, etc.; e invisíveis, tais como
acadêmicos ou burocratas. Segundo esta perspectiva, os participantes visíveis
formam a agenda e os invisíveis, as alternaivas.
3.1.1 Formação da Agenda de Políticas Públicas
Uma agenda de políticas consiste em uma lista de prioridades inicialmente
estabelecidas, às quais os governos devem dedicar suas energias e atenções, e
entre as quais os atores lutam arduamente para incluir as questões de seu interesse.
A agenda de políticas resulta de um processo pouco sistemático,
extremamente competitivo, pelo qual se extrai, do conjunto de temas que poderiam
ocupar as atenções do governo, aquelas questões que serão efetivamente tratadas.
O processo de evidenciação de temas varia de acordo com:
a) o reconhecimento da existência de problemas, a partir de eventos momentâneos,
da forma de manifestação das demandas, das crises e das informações sobre os
eventos (indicadores, estatísticas, pesquisas e outras fontes);
b) a proposição de políticas, que é afetada pela ação dos atores visíveis, dos atores
invisíveis
e
das
comunidades
políticas.
Ou
seja:
nas
organizações
governamentais, no meio acadêmico, nos partidos políticos ou nas organizações
da sociedade, costumam já existir propostas que viabilizam a solução de
determinados problemas; e
c) o fluxo da política, que envolve o clima ou o sentimento nacional com relação aos
governos e aos temas, às forças políticas organizadas e à disputa interpartidária
e eleitoral.
Para Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), entre os elementos considerados
no fluxo político, o clima nacional e as mudanças dentro do governo são os maiores
propulsores de transformação na agenda governamental.
Conforme Rua (2009), para que um “estado de coisas” se torne um problema
político e passe a figurar como um item da agenda governamental, é necessário que
apresente pelo menos uma das seguintes características:
a) mobilize ação política: seja ação coletiva de grandes grupos, seja ação coletiva
de pequenos grupos dotados de fortes recursos de poder, seja ação de atores
individuais estrategicamente situados;
b) constitua uma situação de crise, calamidade ou catástrofe, de maneira que o
26
ônus de não dar uma resposta ao problema seja maior que o ônus de ignorá-lo; e
c) constitua uma situação de oportunidade, ou seja, uma situação na qual algum
ator relevante perceba vantagens a serem obtidas com o tratamento daquele
problema.
Ao deixar de ser um “estado de coisas” e se transformar em um “problema
político”, uma questão qualifica-se à inclusão na agenda governamental. Não quer
dizer que vá seguramente dar origem a uma política pública, mas, apenas, que
passa a receber a atenção dos formuladores de políticas.
Embora mais atenção seja destinada à formulação de alternativas e à tomada
de decisões, a formação de agenda representa uma das mais importantes fases do
ciclo da política pública, especialmente porque mobiliza fortes recursos de poder.
Quando as alternativas para solucionar um problema começam a ser
formuladas, as aspirações dão origem às expectativas. Expectativas não significam
desejos. Expectativas são suposições que os atores formulam sobre as
consequências de cada alternativa, sobre os seus interesses. Obviamente, há atores
que têm expectativas de obter vantagens com uma decisão e outros que acreditam
que esta decisão vá lhes trazer desvantagens. A partir destas expectativas é que os
atores se mobilizam, defendendo o seu interesse, expresso em preferências. Todo
ator possui preferências. Uma preferência é a alternativa (meio) de solução para um
problema que mais beneficia um determinado ator. Assim, dependendo da sua
posição, os atores podem ter preferências muito diversas uns dos outros quanto à
melhor solução para um problema político.
As preferências dependem do cálculo de custo/benefício de cada ator. O
cálculo de custo/benefício é o cálculo das perdas e dos ganhos ou das
desvantagens e vantagens que cada ator atribui a cada meio proposto para
solucionar um problema. Este cálculo não se restringe a custos econômicos ou
financeiros. Envolve também elementos simbólicos, como prestígio; ou elementos
políticos, como ambições de poder e ganhos ou perdas eleitorais, por exemplo.
As preferências se formam em relação aos issues ou às questões. Issue é um
item ou aspecto de uma decisão, que afeta os interesses de vários atores. Por esse
motivo, os issues mobilizam as expectativas dos atores quanto aos resultados da
política e catalisam o conflito entre eles. Por exemplo, na viabilidade de um centro
de transplante pulmonar em Santa Catarina, podem-se identificar alguns issues,
como:
27
a) o conceito viabilidade de um centro de transplante, que critérios poderiam ser
usados para avaliar a viabilidade e assim proceder à sua implantação? Seria pelo
fator econômico? Seria pelo fator social?
b) qual a forma de viabilizar a realização deste centro? Seria pela demanda de
transplantes? Seria pela infraestrutura estadual? Seria pela distância territorial?
c) como proceder à mudança do padrão vigente hoje?
A fim de realizar as suas preferências quanto às soluções que poderão ser
adotadas para cada um dos issues de uma política, os atores procuram se situar
dentro da estrutura de oportunidades, ou seja, o contexto formado pelo conjunto de
recursos de poder e regras do jogo.
Para entender o processo de formulação (e também a implementação), é
essencial se definir quais são os issues de uma política e se identificar as
preferências dos atores em relação a cada um deles.
A formulação das alternativas é um dos mais importantes momentos do
processo decisório, porque é quando se evidenciam os vários issues e é quando se
colocam claramente as preferências dos atores. É o momento em que os diversos
atores entram em confronto e/ou constroem suas alianças, visando às decisões
favoráveis às suas preferências. Para isso, cada um deles procurará mobilizar seus
recursos de poder e pressionar os tomadores de decisão: influência, capacidade de
afetar o funcionamento do sistema, argumentos de persuasão, votos, organização,
etc.
O principal foco analítico da política pública está na identificação do tipo de
problema que a política visa corrigir, na chegada desse problema ao sistema político
e à sociedade, no processo percorrido nestas duas arenas e nas instituições/regras
que irão modelar a decisão e a implementação da política pública (SOUZA, 2007).
3.1.2 Implementação de Políticas Públicas
A implementação pode ser compreendida como o conjunto de decisões e
ações realizadas por grupos ou indivíduos, de natureza pública ou privada, as quais
são direcionadas para a consecução de objetivos estabelecidos mediante decisões
anteriores sobre uma determinada política pública.
Em outras palavras, a implementação consiste em fazer uma política sair do
papel e funcionar efetivamente. Envolve os mais diversos aspectos do processo
28
administrativo: desde a provisão de recursos no orçamento, na formação de equipes
e na elaboração de minutas de projeto de lei, autorizando realização de concurso
para contratação de servidores, elaboração de editais para aquisição de bens ou
contratação de serviços.
Caso seja uma política que envolva os níveis de governo estadual e/ou
municipal, será preciso realizar reuniões para decidir e pactuar as responsabilidades
de cada uma das partes, em seguida firmar protocolos de cooperação, estabelecer
os mecanismos de transferência de recursos entre instâncias governamentais, etc.
Esse processo precisa ser acompanhado, entre outras coisas, para que se
possa identificar por que muitas coisas dão certo, enquanto muitas outras dão
errado, desde a formulação da política até seu resultado concreto.
De maneira especial quando uma política envolve diferentes níveis de
governo – federal, estadual, municipal – ou diferentes regiões de um país, ou, ainda,
diferentes setores de atividade, a implementação pode se mostrar mais
problemática, já que o controle do processo se torna mais complexo.
Mesmo quando se trata apenas do nível local, para o sucesso da
implementação, é necessário considerar, ainda, a importância dos vínculos entre
diferentes organizações e agências públicas no nível local. Geralmente, quando a
ação depende de certo número de elos numa cadeia de implementação, o grau
necessário de cooperação entre as organizações para que esta cadeia funcione
pode ser muito elevado. Se isto não acontecer, pequenas deficiências acumuladas
podem levar a um grande fracasso.
Os processos administrativos e técnicos ligados à implementação de
programas são as ferramentas básicas que as organizações usam para fazer seu
trabalho, e as pessoas que nela atuam passam quase todo o seu tempo nisso.
Portanto é essencial acreditar que esses processos funcionam, produzindo os
resultados esperados. Entre eles, o de planejamento se destaca, principalmente pelo
fato de que se tornou, nos últimos tempos, símbolo de uma boa administração
(MEDINA, 1987).
Estudos indicam dez precondições necessárias para que haja uma
implementação perfeita (BAIER; MARCH; SAETREN, 1989; DAGNINO et al.,
2002);
a) as circunstâncias externas à agência implementadora não devem impor
restrições que a desvirtuem;
29
b) o programa deve dispor de tempo e recursos suficientes;
c) não apenas não deve haver restrições em termos de recursos globais, mas,
também, em cada estágio da implementação, a combinação necessária de
recursos deve estar efetivamente disponível;
d) a política a ser implementada deve ser baseada numa teoria adequada sobre a
relação entre a causa (de um problema) e o efeito (de uma solução que está
sendo proposta);
e) esta relação entre causa e efeito deve ser direta e, se houver fatores
intervenientes, estes devem ser mínimos;
f) deve haver uma só agência implementadora, que não depende de outras
agências para ter sucesso; se outras agências estiverem envolvidas, a relação
de dependência deverá ser mínima em número e em importância;
g) precisa ter completa compreensão e consenso quanto aos objetivos a serem
atingidos e esta condição deve permanecer durante todo o processo de
implementação;
h) ao avançar em direção aos objetivos acordados, deve ser possível especificar,
com detalhes completos e em sequência perfeita, as tarefas a serem realizadas
por cada participante;
i) é necessário que haja perfeita comunicação e coordenação entre os vários
elementos envolvidos no programa; e
j) os atores que exercem posições de comando devem ser capazes de obter
efetiva obediência dos seus comandados.
O acompanhamento, o monitoramento e o controle das políticas devem
incluir, também, o tipo de política e de arena política; o contexto inter e
intraorganizacional dentro do qual ocorre a implementação; e o mundo externo sobre
o qual a política deverá exercer o seu impacto.
3.1.3 Avaliação das Políticas Públicas
A avaliação de políticas públicas consiste estritamente na avaliação formal,
que é o exame sistemático de quaisquer intervenções planejadas na realidade,
baseado em critérios explícitos e mediante procedimentos reconhecidos de coleta e
análise de informação sobre seu conteúdo, estrutura, processo, resultados,
qualidade e/ou impactos.
30
Assim, pode-se afirmar que a avaliação formal é um julgamento (porque
envolve valores) sistemático (porque se baseia em procedimentos e indicadores
reconhecidos e previamente estabelecidos), que incide sobre o conteúdo (problemas
eleitos e suas soluções), as estratégias, o desenho ou concepção (estrutura), os
processos (insumos, atividades, capacidades, hierarquias de precedência e
mecanismos de coordenação), os produtos (preliminares, intermediários e finais), os
efeitos e os impactos. É uma política, programa ou projeto que tem como referência
critérios explícitos, a fim de contribuir para o seu aperfeiçoamento, a melhoria do
processo decisório e o aprendizado institucional (RUA, 2009).
Por meio desta definição, pode-se reconhecer que a avaliação contém duas
dimensões. A primeira é técnica e caracteriza-se por produzir ou coletar, conforme
procedimentos reconhecidos, informações que poderão ser utilizadas nas decisões
relativas a qualquer política, programa ou projeto. Esta dimensão diz respeito à
pesquisa avaliativa, que representa um instrumento da avaliação. A segunda
dimensão é valorativa, consistindo no exame das informações obtidas, à luz de
critérios específicos, com a finalidade de extrair conclusões acerca do valor da
política, do programa ou projeto. Porém a finalidade da avaliação não é classificar as
intervenções “boas” ou “más”, “exitosas” ou “fracassadas”. Muito mais importante e
proveitoso é apropriar-se da avaliação como um processo de apoio a um
aprendizado contínuo, de busca de melhores decisões e de amadurecimento da
gestão.
Diante do exposto, pode-se afirmar que a avaliação contribui para aperfeiçoar
a formulação de políticas e projetos – especialmente tornando mais responsável a
formulação de metas – e apontar em que medida os governos se mostram
responsivos frente às necessidades dos cidadãos.
O acompanhamento, o monitoramento, a avaliação e o controle das políticas
são processos importantes para que as políticas ganhem efetividade, resultando não
apenas em intervenção na realidade, mas sim em transformações dos problemas
em situações solucionadas.
3.2
Políticas Públicas de Saúde e Transplante
A criação do Sistema Único de Saúde (SUS) se deu por meio da Lei nº 8.080,
de 19 de setembro de 1990, que “dispõe sobre as condições para a promoção,
31
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes” (REIS; ARAÚJO; CECÍLIO, 2012).
A primeira lei orgânica do SUS detalha os objetivos e as atribuições; os
princípios e as diretrizes; a organização, a direção e a gestão, a competência e as
atribuições de cada nível (federal, estadual e municipal); a participação
complementar do sistema privado; os recursos humanos; o financiamento e a gestão
financeira e o planejamento e o orçamento.
Logo em seguida, a Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, dispõe sobre a
participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências
intergovernamentais de recursos financeiros. Institui os Conselhos de Saúde e
confere legitimidade aos organismos de representação de governos estaduais
(Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde - CONASS) e municipais
(Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde - CONASEMS). Finalmente
estava criado o arcabouço jurídico do Sistema Único de Saúde, mas novas lutas e
aprimoramentos ainda seriam necessários.
No ano de 1993, foram publicadas as Normas Operacionais Básicas (NOBSUS 93), que procura restaurar o compromisso da implantação do SUS e
estabelecer o princípio da municipalização, tal como havia sido desenhada. Institui
níveis progressivos de gestão local do SUS e estabelece um conjunto de estratégias
que consagram a descentralização político-administrativa na saúde. Também define
diferentes níveis de responsabilidade e competência para a gestão do novo sistema
de saúde (incipiente, parcial e semiplena, a depender das competências de cada
gestor) e consagra ou ratifica os organismos colegiados com grau elevado de
autonomia: as Comissões Intergestoras (Tripartite e Bipartite).
A população foi a grande beneficiada com a incorporação de itens de alta
complexidade, que antes eram restritos aos contribuintes da previdência. Com a
grande extensão de programas de saúde pública e serviços assistenciais, deu-se o
início efetivo do processo de descentralização política e administrativa, a qual pode
ser observada pela progressiva municipalização do sistema e pelo desenvolvimento
de organismos colegiados intergovernamentais. A participação popular trouxe a
incorporação dos usuários do sistema ao processo decisório, com a disseminação
dos conselhos municipais de saúde, ampliando as discussões das questões de
saúde na sociedade (LEVCOVITZ; LIMA; MACHADO, 2001).
32
Em 1996, a edição da NOB 96 representou a aproximação mais explícita com
a proposta de um novo modelo de atenção. Para isso, ela acelera a
descentralização dos recursos federais em direção aos estados e aos municípios,
consolidando a tendência à autonomia de gestão das esferas descentralizadas,
criando incentivo explícito às mudanças, na lógica assistencial, rompendo com o
produtivismo (pagamento por produção de serviços, como o INAMPS usava para
comprar serviços do setor privado) e implementando incentivos aos programas
dirigidos às populações mais carentes, como o Programa de Agentes Comunitários
de Saúde (PACS) e as práticas fundadas numa nova lógica assistencial, como
Programa de Saúde da Família (PSF).
As principais inovações da NOB 96 foram:
a) A concepção ampliada de saúde - considera a concepção determinada pela
Constituição,
englobando
promoção,
prevenção,
condições
sanitárias,
ambientais, emprego, moradia, etc.;
b) O
fortalecimento
das
instâncias
colegiadas
e
da
gestão
pactuada
e
descentralizada - consagrada na prática com as Comissões Intergestores e
Conselhos de Saúde;
c) As transferências fundo a fundo (do Fundo Nacional de Saúde direto para os
fundos municipais de saúde, regulamentados pela NOB-SUS 96) com base na
população, e com base em valores per capita previamente fixados;
d) Novos mecanismos de classificação determinam os estágios de habilitação para
a gestão, cujos municípios são classificados em duas condições: gestão plena da
atenção básica e gestão plena do sistema municipal. Na gestão plena da atenção
básica, os recursos são transferidos de acordo com os procedimentos
correspondentes ao Piso da Atenção Básica (PAB). A atenção ambulatorial
especializada e a atenção hospitalar continuam financiadas pelo Sistema de
Informações
Ambulatoriais
(SIA-SUS)
e
pelo
Sistema
de
Informações
Hospitalares (SIH-SUS). No caso dos municípios em gestão plena do sistema, a
totalidade dos recursos é transferida automaticamente.
No ano 2002 é editada a Norma Operacional de Assistência à Saúde/NOASSUS, cuja ênfase maior é no processo de regionalização do SUS, a partir de uma
avaliação de que a municipalização da gestão do sistema de saúde, regulamentada
e consolidada pelas normas operacionais, estava sendo insuficiente para a
configuração do sistema de saúde, por não permitir uma definição mais clara dos
33
mecanismos regionais de organização da prestação de serviços.
Nestes seus mais de 20 anos de criação, conforme balanço elaborado por
Nelson Rodrigues dos Santos (2007), militante histórico do Movimento Sanitário
brasileiro, o SUS transformou-se no maior projeto público de inclusão social em
menos de duas décadas: 110 milhões de pessoas atendidas por agentes
comunitários de saúde em 95% dos municípios e 87 milhões atendidos por 27 mil
Equipes de Saúde da Família. Em 2007: 2,7 bilhões de procedimentos
ambulatoriais; 610 milhões de consultas; 10,8 milhões de internações; 212 milhões
de atendimentos odontológicos; 403 milhões de exames laboratoriais; 2,1 milhões de
partos; 13,4 milhões de ultrassons, tomografias e ressonâncias; 55 milhões de
seções de fisioterapia; 23 milhões de ações de vigilância sanitária; 150 milhões de
vacinas; 12 mil transplantes; 3,1 milhões de cirurgias; 215 mil cirurgias cardíacas; 9
milhões de seções de radioquimioterapia; 9,7 milhões de seções de hemodiálise e
controle mais avançado da AIDS no terceiro mundo. São números impressionantes
para a população atual, em marcante contraste com aproximadamente metade da
população excluída antes dos anos oitenta, a não ser pequena fração atendida
eventualmente pela caridade das Santas Casas.
Apesar de seus avanços, como atestam os números citados, a construção do
SUS encontra vários entraves, entre os quais se destacam:
a) O subfinaciamento, isso é, os recursos destinados à operacionalização e ao
financiamento do SUS, fica muito aquém de suas necessidades.
b) As insuficiências da gestão local do SUS. A gestão municipal dos recursos do
SUS vem funcionando apenas em parte – sem desconsiderar que os recursos
para o SUS são insuficientes.
Santos (2007), falando das dificuldades do SUS, aponta ainda para outros
problemas, como:
a) A atenção básica expande-se às maiorias pobres da população, mas na média
nacional estabiliza-se na baixa qualidade e resolutividade; não consegue
constituir-se na porta de entrada preferencial do sistema, nem reunir potência
transformadora na estruturação do novo modelo de atenção preconizado pelos
princípios constitucionais;
b) Os serviços assistenciais de média e alta complexidade, cada vez mais
congestionados, reprimem as ofertas e as demandas (repressão em regra
iatrogênica e frequentemente letal);
34
c) Os gestores municipais complementam valores defasados da tabela do SUS na
tentativa de aliviar a repressão da demanda, nos serviços assistenciais de média
e alta complexidade;
d) Com o enorme crescimento das empresas de planos privados, e consequente
agressividade de captação de clientela, as camadas médias da sociedade,
incluindo os servidores públicos, justificam e reforçam sua opção pelos planos
privados de saúde;
e) As diretrizes da integralidade e da equidade pouco ou nada avançam;
f) A judicialização do acesso a procedimentos assistenciais de médio e alto custo
às camadas média-média e média-alta da população aprofundam a iniquidade e
a fragmentação do sistema;
g) O modelo público de atenção à saúde vai se estabilizando direcionada aos
pobres e está focalizado aos 80% pobres da população, e em complementar e
menos pobre aos 20% compradores de planos privados.
O SUS não tem conseguido atingir com eficácia os princípios e as diretrizes,
como a Universalidade, que vê a saúde como um direito de cidadania de todas as
pessoas, cabendo ao Estado assegurar esse direito; a Equidade, princípio de justiça
social, procura tratar desigualmente os desiguais e investir onde há mais
necessidade; e a Integralidade, que considera a pessoa como um todo, e que
pressupõe a promoção da saúde, a prevenção de doenças, o tratamento e a
reabilitação e a integração entre as demais políticas públicas.
O Sistema Único de Saúde é responsável por executar ações e serviços de
promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde dos cidadãos brasileiros.
A execução pode ser feita diretamente pelo gestor público ou por entidade
contratada/conveniada, desde que de forma regionalizada e hierarquizada em níveis
de complexidade crescente.
A atividade de transplantes de órgãos e tecidos no Brasil iniciou-se em 1964
e, desde aquela época até os dias atuais, ocorreu uma evolução considerável em
termos técnicos, resultado e número de procedimentos realizados. Mesmo com a
existência da Lei nº 5479 de 10 de agosto de 1968, revogada posteriormente pela
Lei nº 8489 de 18 de novembro de 1992, que dispunha sobre a retirada e o
transplante de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, com fins terapêuticos e
científicos, não havia, até então, uma legislação apropriada que regulamentasse a
atividade transplantadora, visto que havia apenas regulamentações regionais
35
desenvolvidas na informalidade quanto à inscrição de receptores, retirada de órgãos
e tecidos, critérios de distribuição de órgãos e tecidos captados e ordem de
transplantes. Essa lei e o decreto que a regulamentou tiveram o mérito de definir
mais claramente os critérios de distribuição dos órgãos com base num cadastro
técnico único e em princípios básicos a serem obedecidos em todo o país. Como
grande parte dos procedimentos realizados é financiada com recursos públicos,
aliada ao fato da evolução do conhecimento científico e do entendimento de que os
órgãos doados são bens públicos, cresceram, na sociedade, nos gestores do SUS e
na própria comunidade transplantadora, o propósito e a necessidade de uma
regulamentação para essa atividade.
Por meio da criação do Sistema Nacional de Transplantes conseguiu-se então
essa regulamentação e, a partir daí, a definição de critérios claros, tecnicamente
adequados, socialmente aceitáveis, justos e éticos na destinação dos órgãos
captados.
Em 1997 foi então promulgada uma nova lei dos transplantes e com isso a
criação do Sistema Nacional de Transplante (SNT) e das Centrais de Notificação,
Captação e Distribuição de Órgão (CNCDOs). Foi estabelecida a distribuição dos
órgãos e dos tecidos por meio das listas de espera regionalizadas. Com a
participação da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), foi
implementada nova política de transplante no país, simultaneamente com medidas
legais, financeiras, organizacionais e educacionais, a saber (GARCIA; IANHEZ;
PESTANA, 2006):
Medidas legais:
a) Modificação da forma de consentimento, retornando ao consentimento
informado, com decisão da família após a morte;
b) Tornado sem efeito legal a manifestação do doador ou não doador em
documento de identidade ou de habilitação;
c) Agilização da necrópsia, se possível no bloco cirúrgico, após a remoção dos
órgãos, quando for exigida.
Medidas financeiras:
a) Criação de um fundo específico para financiamento dos transplantes (FAEC);
b) Pagamento da procura de doadores: processo dividido por módulos e
pagamento por procedimento;
36
c) Pagamento do acompanhamento ambulatorial pós-transplante: não por
consulta, mas por paciente acompanhado;
d) Pagamento uniforme para hospitais universitários e não universtários.
Medidas organizacionais:
a) Modelo de organização em quatro níveis (nacional, estadual, regional e
hospitalar);
b) Definição do SNT como responsável pela política de transplantes no país,
com função principalmente normatizadora;
c) Criação da CNCDOs, atuando na alocação e no intercâmbio de órgãos e
tecidos entre estados;
d) Criação da CNCDO em todos os estados, com funções de organização e de
alocação de órgãos e tecidos (listas únicas regionais) em seu âmbito;
e) Criação do cargo de coordenador de transplante nos hospitais com UTI, os
quais devem ficar responsáveis pela procura de doadores;
f) Recredenciamento de todos os centros de transplante de órgãos e tecidos do
país;
g) Incentivo à formação de centros de transplante em regiões menos assistidas
(Norte e Nordeste).
Medidas educacionais:
a) Cursos de formação de coordenadores educacionais de transplante;
b) Encontros regionais com intensivistas;
c) Cursos sobre doação e transplante para todos profissionais que trabalham
nos hospitais;
d) Encontros periódicos com jornalistas, especialistas em comunicação e
formadores de opinião;
e) Desenvolvimento de programas educacionias específicos para estudantes de
ensino médio;
f)
Incentivo à formação de organizações não governamentais atuando na área
de doação e transplante;
g) Palestras e debates sobre doação nas escolas;
h) Semana nacional da doação (dia nacional do doador: 29 de setembro).
37
O SNT é o responsável pela política de transplante no país, com funções
normativas em âmbito nacional, e cada estado, pelas funções de normatização,
distribuição e fiscalização, enquanto a procura e a captação de órgãos são função
do hospital por meio de seu coordenador (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
TRANSPLANTE..., 2012).
O credenciamento de novos centros de transplante, a regulamentação das
várias modalidades de transplante, dos bancos de tecidos e a realização de cursos
de formação de coordenadores de transplante são também atribuições do SNT. O
grau de complexidade de cada central estadual depende da sua extensão territorial
e da sua população, do número de hospitais de detecção de referência e dos tipos
de transplantes disponíveis.
A política nacional de transplantes de órgãos e tecidos está fundamentada na
Legislação (Lei nº 9.434/1997 e Lei nº 10.211/2001), tendo como diretrizes a
gratuidade da doação, a beneficência em relação aos receptores e não maleficência
em relação aos doadores vivos. Estabelece também garantias e direitos aos
pacientes que necessitam destes procedimentos e regula toda a rede assistencial
por meio de autorizações e reautorizações de funcionamento de equipes e
instituições. Toda a política de transplante está em sintonia com as leis nº
8.080/1990 e nº 8.142/1990, que regem o funcionamento do SUS (DUTRA; SILVA,
BADALOTTI, 2003).
A proposição de uma Política Estadual de Captação e Transplante de Órgãos
e Tecidos em Santa Catarina constitui uma iniciativa para o processo de
organização de um sistema efetivo de captação e transplante de órgãos e tecidos no
território catarinense, de modo a ampliar o espectro das ações e das áreas
envolvidas, numa perspectiva de busca progressiva da integralidade e da
universalidade das ações de saúde.
Como resultado do esforço na construção do modelo assistencial de Santa
Catarina, a Secretaria de Estado da Saúde firma o compromisso de orientar e
conduzir a execução das diretrizes políticas. Os diferentes instrumentos de
ordenamento desse modelo, cujo fundamento principal reside na possibilidade de
definição de prioridades de intervenção coerentes com as necessidades de saúde
da população, garantem o acesso dos cidadãos a todos os níveis de atenção.
Assim, a Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos e Tecidos de
Santa Catarina (CNCDO/SC) foi criada pelo Decreto Estadual nº 553 de 21 de
38
setembro de1999, por força da Lei nº 9.434/97 e Decreto 2.268/97, como unidade
integrante da estrutura administrativa da Secretaria de Estado da Saúde (SC
TRANSPLANTE, 2012).
Atualmente, a CNCDO/SC está inserida na Gerência da SC Transplantes,
sendo esta um órgão da estrutura da Secretaria de Estado da Saúde, responsável
pela coordenação operacional da Política Estadual de Captação e Transplantes de
Órgãos e Tecidos no Estado de Santa Catarina. Está vinculada diretamente à
Diretoria de Serviços Especializados, da Superintendência da Rede de Serviços
Próprios, aprovada na reforma administrativa, Lei Complementar nº 284, de 28 de
fevereiro de 2005 (SC TRANSPLANTE, 2012).
O Plano Estadual de Transplantes foi elaborado, aprovado e publicado em
2006, por meio da Deliberação 081/CIB/06. O documento, pioneiro em termos de
planejamento de um sistema estadual de transplante no Brasil, não define uma
política específica para a atividade de transplante pulmonar para o Estado de Santa
Catarina.
3.3
Transplante pulmonar
A história do transplante de pulmão remonta ao início do século XX, quando o
primeiro procedimento foi realizado no John Hopkins Hospital em 1907. Em 1963,
depois de numerosos experimentos em animais, mas contando com recursos
escassos para o controle da rejeição, James Hardy, nos EUA, realizou o primeiro
transplante em humano. Já na época, o transplante pulmonar se revelou um
procedimento tecnicamente factível, mas havia um longo caminho a ser percorrido
até a sua definitiva incorporação à moderna terapia das enfermidades pulmonares
terminais (CAMARGO, 2006 ).
Os anos que se seguiram foram úteis do ponto de vista de aprendizado, mas
absolutamente desastrosos quanto aos resultados, dos 38 pacientes transplantados,
em 20 centros diferentes, apenas um teve sobrevida maior do que poucas semanas.
O pulmão era considerado o pior órgão a ser transplantado em virtude das
complicações, evidentemente mais frequentes do que em outros órgãos.
No final da década de 1980, ocorreram alguns progressos importantes no
transplante pulmonar: a demonstração, realizada por um grupo de Paris, que o
transplante unilateral podia ser utilizado em enfisema com excelentes resultados
39
(MAL; ANDREASSIN; FABRICE, 1990), e a proposição de modificações técnicas
que facilitaram sobremaneira o procedimento (CALHOON et al., 1991). Isto motivou
e impulsionou o transplante pulmonar, dada a elevada prevalência desta doença.
Outro dado relevante, neste período, foi a descoberta da ciclosporina, na década de
70, e a sua aplicação clínica inicial como medicamento imunossupressor no início
dos anos 80, levando melhores resultados no transplante (PEGO-FERNANDES;
GARCIA, 2010). O primeiro transplante pulmonar na América Latina foi realizado em
Porto Alegre em maio de 1989.
Conforme Borro (2005), até 2005, na Espanha, foi realizado uma média de
1.162 transplantes pulmonares, com um aumento progressivo nos últimos 10 anos e
mantendo uma estabilidade de 150 transplantes/ano nos últimos 4 anos.
Do ponto de vista clínico, a última década caracterizou-se pela otimização dos
cuidados pós-operatórios e pela busca contínua de melhor controle dos episódios de
infecção e rejeição. Os números cresceram vertiginosamente nos últimos anos, mas
os resultados ainda se mantêm inferiores aos obtidos com outros órgãos.
Dados brasileiros confirmam esta realidade no aumento crescente no número
de transplante pulmonar nos últimos 10 anos. De 21 procedimentos realizados em
2001, aumentou para 61 procedimentos em 2010, com um leve descrécimo em 2011
para 49 procedimentos; porém são números irrisórios quando comparados ao
transplante de outros órgãos realizados no mesmo ano de 2011: 4957 de rim, 1492
de fígado, 181 de pâncreas e 160 de coração. O Rio Grande do Sul foi o estado que
mais realizou transplante pulmonar no ano de 2011: 27 dos 41 procedimentos,
seguido por São Paulo 17, Ceará 4 e Minas Gerais 1 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DE TRANSPLANTE..., 2012).
Para Camargo e Caramori (2001), estes resultados menos satisfatórios para o
transplante pulmonar devem-se, em parte, a peculiaridades do órgão, que o tornam
menos propício à transplante:
a) É o órgão menos resistente à isquemia e o que mais facilmente desenvolve
lesão;
b) Funcionando como uma espécie de sentinela imunológica, o pulmão é mais
suscetível a episódios de rejeição;
c) O pulmão é o único órgão transplantado que permanece em contato com o
ambiente, tornando-o mais vulnerável às infecções oportunistas.
Há consenso de que o sucesso de transplante pulmonar depende
40
criticamente da rigidez nos critérios de seleção dos candidatos. Nos últimos anos,
com o avanço da experiência, novos elementos passaram a ser utilizados na
seleção do melhor procedimento para cada enfermidade (STUDER et al., 2004).
As principais indicações de transplante pulmonar são (CAMARGO; SCHIO;
SANCHEZ, 2006 ):
Transplante unilateral:
a) enfisema puro;
b) enfisema pulmonar em pacientes com mais de 50 anos de idade;
c) fibrose pulmonar idiopática;
d) hipertensão pulmonar.
Transplante Bilateral
a) fibrose cística;
b) bronquiectasias;
c) Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) infectado;
d) enfisema em pacientes jovens (<50 anos);
e) hipertensão pulmonar primária ou secundária.
Porém a indicação geral é de um paciente portador de uma pneumopatia
terminal, com severa limitação funcional, com expectativa de vida inferior a 18
meses, sem alternativas terapêuticas, sem comorbidades, com menos de 65 anos
de idade, com adequada condição psicossocial e familiar e boa motivação para viver
(GLANVILLE; ESTENNE, 2003; STUDER et al., 2004).
Diversos estudos têm demonstrado uma melhora na qualidade de vida,
função pulmonar e satisfação dos pacientes transplantados em comparação com
aqueles pacientes que estão na fila de espera (LAU; PATTERSON, 2003; LANUZA
et al., 2000; TENVERGERT et al., 1998; VAN DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT,
2009). Limbos et al. (2000) compararam 36 pacientes na fila de espera do
transplante pulmonar com 72 pacientes que receberam o pulmão e mostraram que
pacientes transplantados apresentaram uma melhora estatisticamente significativa
na saúde física, na vitalidade e na sua função social. Ainda, em relação à qualidade
de vida, Trulock et al. (2004) publicaram o registro da Sociedade Internacional de
Transplante de Coração e Pulmão, que mostrou que 83% dos pacientes que
sobrevivem ao transplante levam uma vida normal e sem limitações ao cabo de um
41
ano e que essa porcentagem se mantém ao longo de cinco anos.
3.3.1 Complicações
Yusen (2009), contudo, alerta que os médicos deveriam ajudar seus
pacientes a decidir sobre fazer ou não o transplante de pulmão, porque a despeito
da melhora da qualidade de vida em algumas das funções essenciais, ainda é um
procedimento com consideráveis riscos e alto custo. Trulock et al. (2006) afirmam
que, embora os progressos conquistados na última década e meia em relação ao
transplante de pulmão tenham melhorado substancialmente a expectativa de vida
dos pacientes transplantados, ela é ainda muito inferior à observada nos
transplantes de fígado, rim e coração. Estima-se que aproximadamente 1600
procedimentos sejam realizados ao redor do mundo, contudo a taxa de sobrevida
em 5 anos é muito variável (de 5 a 45%).
Embora a sobrevida ao longo dos anos tenha melhorado, as complicações
pulmonares continuam afligindo o seguimento do pós-transplantado e permanecem
sendo as maiores causas de morbidade e mortalidade. Para Ahmed, Shlabin e
Nathan (2001), é essencial o entendimento do impacto destas complicações, já que
muitos destes pacientes serão entregues aos cuidados do médico da sua
comunidade.
A morbidade e a mortalidade no seguimento do transplante de pulmão devem
ser consideradas no contexto do tempo pós-procedimento (STUDER et al., 2004). A
morbidade e a mortalidade encontradas no primeiro ano dizem respeito aos eventos
ocorridos durante o transplante e na fase pós-operatória (primeiros trinta dias
iniciais), que conduzem à obrigatoriedade do uso de altas doses de drogas
imunossupressoras nestes primeiros doze meses. A Síndrome da Bronquiolite
Obliterante (rejeição crônica) e as complicações do longo tempo de uso dos
imunossupressores, particularmente as infecções, são as principais causa de
morbimortalidade nos anos subsequentes.
Os primeiros trinta dias de um tranplante pulmonar são os que demonstram
um maior declínio na sobrevida. A mortalidade nestes primeiros dias do pósoperatório é de 10%, conforme Meyer (2006). Estudos mostram que as principais
complicações neste periodo são: injúria de reperfusão, disfunção primária do
enxerto, rejeição aguda e infecção (AHMED, SHLABIN, NATHAN, 2001;
42
GLANVILLE; ESTENNE, 2003; LAU; PATTERSON, 2003; STUDER et al., 2004).
Ao longo da última década, com o aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas e
da preservação dos pulmões, com o manejo mais adequado da injúria de reperfusão
e da imunossupressão, ocorreu aumento da sobrevida no primeiro ano póstransplante pulmonar de 70 a 80%, conforme
Figura 2. No entanto, a sobrevida a longo prazo continua ameaçada pelo
desenvolvimento da rejeição crônica (MORAES; CAMARGO; SCHIO, 2006).
Figura 2: Sobrevida geral com o transplante de pulmão
Fonte: Moraes, Camargo e Schio (2006).
Entre os principais responsáveis pela mortalidade tardia encontram-se a
43
Bronquiolite Obliterante (traduzido pela rejeição crônica), a sepse e as neoplasias
malignas (BORRO, 2005; MORAES; CAMARGO; SCHIO, 2006; STUDER et al.,
2004).
Dados do registro da Sociedade Internacional de Transplantes do Coração e
Pulmão, em 2009, mostram que 28% e 74% dos pacientes desenvolvem rejeição
crônica em 2,5 anos e 10 anos, respectivamente. A rejeição crônica é responsável
por menos de 5% das mortes no primeiro ano do transplante pulmonar, mas é a
responsável por cerca de um quarto das mortes após este período (CHRISTIE et al.,
2009).
As
infecções
também
representam
uma
das
maiores
causas
de
morbimortalidade deste procedimento, seja na fase inicial ou tardia (MORAES;
CAMARGO; SCHIO, 2006). Os pacientes transplantados de pulmão são mais
vulneráveis
a
infecções
imunossupressão
crônica,
oportunistas
da
e
possibildade
nosocomias
de
em
desnutrição
decorrência
e
das
da
longas
permanências em ambiente hospitalar.
Studer et al. (2004) reforçam que o sucesso de um transplante pulmonar e a
sua relação com as complicações dependem de vários fatores, como a experiência
da equipe, particularmente com as técnicas cirúrgicas e o manejo peri-operatório; a
profilaxia antimicrobiana; a seleção dos pacientes transplantados (receptores) e as
características do doador. A dificuldade em obter um órgão doador e o número
crescente de pacientes na fila de espera têm aumentado, com isso, o limite de
aceitabilidade do doador tem se extendido. Em particular, a idade do doador tem
aumentado ao longo dos anos e isto pode ter implicações na sobrevida póstransplante.
3.3.2 Captação
O processo de obtenção de órgãos para transplante é iniciado pelos médicos
intensivistas ou assistentes, que identificam potenciais doadores, diagnosticam
morte encefálica, notificam a família e fazem a comunicação à coordenação de
transplante. Segue-se com a entrevista e o consentimento da família para remoção
dos órgãos e dos tecidos, considerando as condições clínicas do potencial doador e
viabilidade dos órgãos a serem extraídos. O processo termina com a remoção e a
distribuição dos órgãos e dos tecidos doados e com a análise dos seus resultados,
44
realizada por organizações regionais de procura de órgãos.
Em virtude do complexo processo de obtenção de órgãos, o número de
doadores é insuficiente para atender à lista de espera, e a falta de órgãos para
transplante reflete não apenas a falta de potenciais doadores, mas também a falha
em convertê-los em doadores efetivos e a crescente flexibilidade de critério para
inclusão em lista de espera.
Num estudo realizado na Espanha, Del Rio et al. (2009) enfatizam que,
mesmo sendo um país com um alto grau de doação de pulmão, a necessidade do
transplante é sempre maior que o número de órgãos obtidos. Isto se deve ao fato de
que o pulmão é o órgão que mais precocemente sofre as alterações da morte
encefálica. Borro (2005), no mesmo país, afirma que a porcentagem de doadores
pulmonares é baixa em relação aos outros órgãos, mas que se deve insistir na
necessidade de pensar nos pulmões desde o princípio da geração de um doador de
múltiplos órgãos. O manejo cuidadoso e precoce do doador melhora os índices de
captação de pulmão. Rajamiyer et al. (2008) acreditam que apenas 20% dos
pacientes com morte encefálica sejam potenciais doadores de pulmão.
Westphal et al. (2011a) mostram que a morte encefálica induz a várias
alterações fisiopatológicas e isso pode levar danos aos diversos órgãos a serem
transplantados; portanto, a atuação do médico intensivista durante a manutenção do
potencial doador falecido exige cuidados específicos com estes órgãos, visando à
sua maior viabilidade para transplantes. Particularmente, os pulmões são mais
sensíveis à instabilidade hemodinâmica que ocorre com os pacientes em morte
encefálica, quando comparados aos outros órgãos, pois são mais agredidos durante
os esforços para a ressuscitação cárdio-respiratória e são mais expostos aos
agentes infecciosos durante o periodo de hospitalização (FRANKLIN et al., 2010).
Na mesma linha dos cuidados com o doador pulmonar, Westphal et al.
(2011b) ressaltam a importância da ventilação protetora na modulação da resposta
inflamatória e o consequente aumento do aproveitamento dos pulmões. Outros
estudos corroboram esta ideia e crescentes esforços têm-se dispensado no intuito
de idealizar protocolos que melhorem a manutenção e, consequentemente, o
recrutamento de pulmões viáveis para o transplante (ANGEL et al., 2006; COBO;
GALLEGOS, 2009; MASCIA et al., 2010; NOISEUX et al., 2009).
Por fim, estudos têm mostrado que, em função da melhoria das técnicas
cirúrgicas e dos cuidados peri-operatórios, existe a possibilidade de estender as
45
estratégias de inclusão de um potencial doador, aumentando o número de órgãos
doados e, consequentemente, diminuir o número de pacientes na fila de espera para
um transplante (KRUEGER; BERUTTO; AUBERT, 2011; LARDINOIS et al., 2005;
MEERS et al., 2010; PERROT et al., 2004).
Ao contrário dos candidatos a transplante renal, os candidatos a transplante
pulmonar têm uma possibilidade de vida atrelada ao transplante, que deve ser
realizado em tempo de espera inferior a 1 ou 2 anos. Raemdonck et al. (2009)
estimam que 10 a 15% dos pacientes por muito tempo na fila de espera morrem
antes de receber um transplante. Além disso, os candidatos a transplante pulmonar
dependem da adequação do tamanho do órgão a ser transplantado em relação ao
tamanho do receptor, de tempo de preservação limitado e de melhores condições
hemodinâmicas do doador. Um órgão sem receptor ideal numa comunidade pode
ser utilizado em outra região, dependendo de uma logística de transporte de equipes
cirúrgicas e de critérios estabelecidos de distribuição dos órgãos, coordenados por
organização centralizadas, estaduais e federais.
Na vigência de muitos potenciais receptores, a seleção se inicia, usualmente,
pela tipagem sanguínea, procurando a compatibilidade total com o doador. Um fator
importante na seleção do receptor diz respeito ao tamanho do órgão disponível,
aferido pelas medidas dos diâmetros torácicos e pela relação peso/altura entre
doador e receptor e a compatibilidade imunológica direta com o doador. Se com
esses elementos ainda houver disputa por dois ou mais candidatos ao mesmo
órgão, o receptor será selecionado por: ter maior chance de sucesso, ser mais
jovem, ter menor expectativa de vida sem o transplante e estar há mais tempo na
lista de espera (CAMARGO; CAMARGO 2006 ).
3.3.3 Custos
As metodologias para transplantar pulmões estão em fase evolutiva na
medicina e pode-se afirmar que se trata de uma tecnologia recente (VAN DER BIJ;
REYNAUD-GAUBERT, 2009). Embora o primeiro transplante de pulmão tenha sido
reportado em 1963, até início dos anos 80 ele não era considerado como uma
técnica fácil e aceita como arsenal terapêutico, em função das dificuldades na
implementação e do fracasso do seguimento (índice de mortalidade muito alto). Com
o surgimento de novas técnicas cirúrgicas e de drogas imunossupresivas mais
46
eficientes, conseguiu-se uma melhora na qualidade e na sobrevida dos pacientes
transplantados e o número deste procedimento tem crescido nas duas últimas
décadas. Contudo, não há dúvidas que o transplante de pulmão é um procedimento
que requer uma tecnologia extremamente cara (ANYANWU et al., 2002).
Os cuidados intensivos, principalmente no primeiro ano pós-transplante, e o
uso de medicamentos imunossupressores por um longo tempo tornam o custo
efetivo do transplante pulmonar alto. Um estudo realizado no Canadá (VASILIADES
et al., 2005), onde foram acompanhados, por um período de 4 anos, 124 pacientes
submetidos a um transplante pulmonar, mostrou que o custo de um paciente sem
transplante (fila de espera), por mês, é de $ 1.102,00; enquanto o custo de um
paciente transplantado (incluindo o procedimento) é de $ 6.208,00 por mês.
O aumento no custo de transplante pulmonar depende de vários fatores: os
pacientes em fila de espera (quanto maior o tempo de espera, pior a condição do
paciente transplantado); o tipo de doença pulmonar preexistente (exemplo fibrose
cistica piora a sobrevida do transplantado); o tipo de transplante (um ou dois
pulmões, pulmão e coração juntos) e, por fim, o tratamento imunossupressor
instituído pós-transplante (ANYANWU et al., 2002; GROEN et al., 2004; GROSS,
1997).
Um estudo realizado no Reino Unido, onde foram acompanhados, por 5 anos
ou até a morte, 356 transplantados de pulmão, analisou os principais eventos
clínicos pós-transplante e os custos relacionados a estes eventos com o impacto do
uso de diferentes imunossupressores. Os pacientes foram acompanhados em três
tempos (0-6, 7-12 e 13-60 meses) e divididos em evolução clínica (pacientes bem,
com rejeição aguda, com infecção por Citomegalovírus, com Bronquiolite obliterante
e morte). Os custos relacionados aos pacientes com boa evolução clínica foram
contabilizados pelo uso de imunossupressão, profilaxia e visitas clínicas, e os custos
dos pacientes com complicação foram contabilizados com os gastos com
diagnóstico, tratamento e dias de internação. O custo mensal, conforme o tempo de
sobrevida, nos pacientes pós-tranplantados que evoluíram bem foram de $ 2.658,00
nos primeiros 6 meses; $ 752,00 de 7 a 12 meses e $ 523,00 até completarem 5
anos. Nos pacientes com complicação, a média mensal foi igual nos três tempos: $
2.766,00 para pacientes com rejeição (seja aguda ou crônica-bronquiolite
obliterante); $ 5.013,00 para pacientes com infecção por Citomegalovísus e $
4.171,00 para pacientes com outras infecções. Todos os pacientes foram tratados
47
com um imunossupressor estabelecido pelo protocolo do serviço (ciclosporina),
porém quando necessitaram da troca da droga, os custos mensais em cinco anos
aumentaram de 5 a 23%, conforme a droga escolhida (SHARPLES et al., 2001).
Assim, os gastos com um paciente pós-transplantado são muito maior no primeiro
ano pós-procedimento e variam enormemente conforme o tipo de droga
imunossupressora (ENCKEVORT et al., 1997).
Em função dos diferentes tipos de sistema de saúde, custos e dados
econômicos não podem ser extrapolados internacionalmemte, por isso é muito
importante estudos de performance econômica de cada país. A avaliação econômica
promove uma importante noção sobre custos e é particularmente útel para tomada
de decisões.
Ramsey et al. (1995), nos EUA, promoveram um estudo piloto sobre custoefetividade no transplante de pulmão, e mostraram que, apesar da amostra pequena
(comparação de 25 pacientes transplantados e 24 pacientes em fila de espera), o
transplante pulmonar é muito caro, embora possa melhorar substancialmente a
qualidade de vida dos pacientes; dois terços dos gastos ocorrem no primeiro ano de
vida pós-transplante; e a expectativa de vida não foi diferente nos dois grupos. Neste
estudo, o custo médio do transplante pulmonar foi de U$ 152.000 dólares (incluindo
cirurgia e cuidados pós-operatórios), o custo mensal no primeiro ano de vida póstransplante foi de U$ 11.917 dólares e nos anos seguintes U$ 4.525 dólares. O custo
mensal de um paciente na fila de espera foi de 3.395 dólares.
Tenvergert, Groen e Vermeulen (2010), avaliando quatro tipos de análise
econômica (minimização de custos, custo-eficácia, custo-utilidade e custo-benefício),
mostraram que, no transplante de pulmão, a análise do custo-efetividade mostrou
ser um procedimento efetivo (melhora a sobrevida em anos), porém caro. Como em
relação à sobrevida, não se pode falar apenas em anos vividos, mas em qualidade
de vida nestes anos. Vários estudos também mostram que os pacientes
transplantados têm uma melhora em vários domínios da qualidade de vida,
justificando assim os custos gerados pelo transplante pulmonar (GROSS; RAGHU,
1997; RAMSEY et al., 1995).
No Brasil, existem poucos estudos relativos à avaliação econômica dos
transplantes. Conforme Sanches e Dain (2008), em seu estudo sobre terapias
substitutivas renais, a utilização da avaliação econômica, particularmente a análise
de custo-efetividade, é um importante aliada para subsidiar uma alocação de
48
recursos exequível, eficiente e tendo a equidade como uma dimensão relevante a
ser considerada. Segundo ela, em nosso país, é muito difícil viabilizar uma avaliação
econômica não só pela inexistência de uma padronização metodológica para sua
operacionalização, como também pelo seu alto custo e pela disponibilidade de
dados e informações necessárias.
Um estudo realizado no Rio de Janeiro mostrou que os gastos reais (cirurgias,
procedimentos associados e medicamentos) com transplante pulmonar no Brasil,
entre 1997 a 2003, giraram em torno de R$ 30.000,00 por paciente, e que só no ano
de 2003 o gasto total com transplante pulmonar foi de R$ 1.037.986,00. O objetivo
do trabalho foi avaliar a eficiência do Sistema Nacional de Transplante (SNT), mas
mostrou também que o tempo médio na fila de espera para um transplante pulmonar
em 2003 foi de 1,77 anos. O tempo de espera prolongado, como já citado
anteriormente, é um dos fatores de aumento nos custos pré e pós-transplante. Ainda
conforme esse estudo, o Brasil é um dos países com maior programa público de
transplantes no mundo. De acordo com SNT, em 2005, foram realizados 15.527
transplantes de órgãos e tecidos no Brasil, sendo que destes 11.095 foram pagos
pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O gasto total com transplantes, incluindo
medicamentos, em 2005, foi de R$ 521,8 milhões (MARINHO; CARDOSO, 2007).
Para Chaves (1998), as questões ligadas à eficiência, ao custo-efetividade, à
avaliação tecnológica, ao estabelecimento de prioridades, à alocação de recursos e
à gestão orientada para qualidade e resultados, são fatores importantes na
dimensão econômica da saúde.
49
4 CONTEXTO DA PESQUISA
O Brasil possui hoje um dos maiores programas públicos de transplante de
órgãos e tecido do mundo. Com 548 estabelecimentos de saúde e 1.376 equipes
médicas autorizadas a realizar transplante, o Sistema Nacional de Transplante está
presente em 25 estados do país, por meio das Centrais Estaduais de Transplante
(ABTO, 2013).
No Brasil, o transplante de órgãos, por doação ao Estado, somente pode ser
feito após a morte cerebral do doador, que pode ser natural ou acidental, e com o
concomitante funcionamento dos órgãos que serão doados, sendo que a morte
cerebral deve ser devidamente diagnosticada por uma equipe médica; e o
transplante, autorizado pelo SNT e pelo SUS. O paciente deve ter manifestado, em
vida, para a família, a sua intenção de se tornar doador. Uma vez constatada por
médicos a necessidade de transplante, o paciente candidato a receptor é colocado
na fila. A fila para transplantes no SUS para cada órgão ou tecido é única, e o
atendimento é por ordem de chegada, considerados critérios técnicos, geográficos e
de urgência específicos para cada órgão, de acordo com a Portaria 91/GM/MS, de
23 de janeiro de 2003. A fila é disciplinada pela Portaria 3.407/GM/MS, de 05 de
agosto de 1998 (BRASIL, 2008).
A problemática dos transplantes de órgãos pode ser mais bem compreendida
com a observação de algumas das características econômicas dos órgãos
transplantáveis.
Entre essas características destacam-se:
a) São essenciais.
b) Não podem ser estocados por muito tempo (com exceção de ossos e medula) e
somente podem ser utilizados uma vez. Um coração dura entre 4h e 6h, um
pulmão de 4h a 6h, um pâncreas entre 12h e 24h, um fígado entre 12h e 24h e
um rim até 48h. Uma córnea pode durar até sete dias.
c) Têm pouco uso. Portanto, existe baixo custo de oportunidade, pois não há muito
a ser feito com os órgãos doados, que se deterioram rapidamente.
d) Têm poucos substitutos, com exceção de rins que, durante algum tempo e com
baixa qualidade de vida, admitem as terapias renais substitutivas.
e) Os candidatos a receptores não comandam a aquisição dos órgãos. A aquisição
é comandada pelos profissionais de saúde, o que configura um modelo do tipo
50
principal/agente.
f) Existe elevada “capacidade ociosa”, pois há um desperdício considerável de
órgãos. No Brasil, de cada 8 potenciais doadores, apenas 1 é notificado e
somente 20% destes são utilizados como doadores de múltiplos órgãos.
g) Os doadores não comandam a oferta. São os profissionais de saúde que, em
última instância, decidem se um órgão doado pode ser aproveitado e para quem
ele pode ser cedido.
A demora no atendimento exerce impactos significativos sobre o bem-estar;
as probabilidades de cura; a sobrevida dos enxertos e dos pacientes; a natureza e a
extensão das sequelas nos pacientes, nos familiares envolvidos, e na sociedade.
Pior situação ocorre quando, além de elevados, os prazos são imprevisíveis.
Com tal agravante, as incertezas decorrentes dessa imprevisibilidade impedem o
planejamento das vidas dos pacientes e dos seus familiares, da atuação do sistema
de saúde e do funcionamento do sistema produtivo em que eles, por ventura,
trabalhem. Tempo de espera elevado implica, além dos custos e sofrimentos dos
pacientes na fila, o aproveitamento de órgãos de qualidade inferior e a consequente
redução do tempo de duração dos enxertos.
Com esse sistema organizacional, a taxa de doação no país permaneceu
estável, variando de cerca de 3 por milhão de população (pmp) entre 1993-1998,
aumentando para 7,4 pmp entre 1999 e 2004, diminuindo para 5,4 pmp entre 2005 e
2007 e voltando a subir entre 2008 e setembro de 2009 para 8,6 pmp. A meta,
conforme estudos, seria de 10 pmp para o ano de 2010, 14 pmp para 2013 e 20 pmp
para 2017 (PEGO-FERNANDES; GARCIA, 2010).
O número de transplantes realizados por ano, em cada estado ou unidade
federada (UF), representa o equilíbrio possível e efetivo entre a taxa média de
serviço (a oferta) e a taxa média de chegada de pacientes (a demanda) candidatos a
transplantes no SNT. No conjunto das UFs, fica evidente um predomínio do menor
tempo de espera nas regiões Sul e Sudeste, que também concentram a maior parte
dos transplantes realizados e dos pacientes em filas (MARINHO; CARDOSO;
ALMEIDA, 2007). Conforme registro da Associação Brassileira de Transplante
(ABTO), em 2011 foram realizados 4.975 transplantes de órgãos no Brasil, sendo
São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina os
responsáveis por 73% deste total (3.628 transplantes). Já no ano de 2012, este
número aumentou para 5.385 transplantes, sendo que os estados que mais se
51
destacaram em número de transplantes por milhão de população foram RS (51,2
pmp), seguido de SP (47,2 pmp), PR (41,5 pmp) e SC (39,2 pmp) (ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013).
Santa Catarina não realiza transplante pulmonar, porém um dado interessante
em relação ao número de transplantes mostrou que, no ano de 2011, enquanto o
Brasil chegou próximo de 11 doadores por milhão de habitantes, Santa Catarina
alcançou 25 doadores efetivos por milhão de habitantes, sendo esse o melhor
resultado já alcançado por um estado brasileiro na realização de transplante de
órgãos. No ano de 2012, Santa Catarina superou expectativas e tornou-se líder no
país com melhor taxa de doação de órgãos por milhão de população (26,4 pmp),
comparando-se às melhores taxas de países desenvolvidos. Santa Catarina ocupa
hoje, no Brasil, o segundo lugar nos transplantes de fígado, quarto lugar em
transplante de rim, quinto em medula óssea e sexto em pâncreas por milhão de
população (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013).
A Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos e Tecidos de
Santa Catarina (CNCDO/SC) foi criada pelo Decreto Estadual nº 553 de 21 de
setembro de 1999, por força da Lei nº 9.434/97 e Decreto 2.268/97, como unidade
integrante da estrutura administrativa da Secretaria de Estado da Saúde (SC
TRANSPLANTE, 2012).
Atualmente, a CNCDO/SC está inserida na Gerência do SC Transplantes,
sendo este um órgão da estrutura da Secretaria de Estado da Saúde, responsável
pela coordenação operacional da Política Estadual de Captação e Transplantes de
Órgãos e Tecidos no Estado de Santa Catarina. Está vinculada diretamente à
Diretoria de Serviços Especializados, da Superintendência da Rede de Serviços
Próprios, aprovada na reforma administrativa, Lei Complementar nº 284 de 28 de
fevereiro de 2005.
A Gerência do SC Transplantes está localizada no 3° andar do Posto
Assistência Médica em Florianópolis, funciona 24 horas e possui um número de
discagem gratuita para todo o território nacional (0800 643 74 74). Sua equipe
multiprofissional e interdisciplinar é composta por 2 médicos, 6 enfermeiros, 4
técnicos em atividades administrativas, 2 assistentes sociais e 1 digitadora.
Atualmente, a manutenção operacional da Gerência do SC Transplantes é custeada
por recursos vinculados ao orçamento da GEPAM.
A principal competência da Gerência do SC Transplantes consiste em atender
52
a população catarinense no que diz respeito à doação, à captação, à distribuição e
ao transplante de órgãos e tecidos humanos. Com esse propósito, a Gerência do SC
Transplantes registra e organiza informações, por meio de cadastros de receptores,
de estabelecimentos de saúde, de equipes, de profissionais, entre outros.
São 128 profissionais cadastrados para captação e transplante, entre todas
as especialidades exigidas pelas portarias e leis, para todos os tipos de órgãos e
tecidos.
Em relação às Unidades de Saúde cadastradas para atendimento em
transplantes de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), a rede conta com 12
unidades, distribuídas em 5 macrorregiões de saúde, estando ausente nas
macrorregionais do planalto norte, serrano e meio oeste. Também estão
cadastradas, junto à Gerência da SC Transplantes, 5 unidades de natureza privada,
hospitalares e ambulatoriais para atendimento em transplantes de córnea
exclusivamente a pacientes em caráter privado. Todas as unidades vinculadas ao
SUS, cadastradas para realização de transplantes, estão também cadastradas para
captação de órgãos e tecidos. Além dessas, estão cadastradas 09 unidades que
realizam exclusivamente captação. Na rede privada, estão cadastradas 03 unidades
para captação de órgãos e tecidos.
O financiamento destinado à realização de captação e transplante, bem como
a outras atividades inerentes a elas, é de responsabilidade compartilhada entre a
União, o Estado e o Município.
O financiamento federal ocorre por meio do Fundo de Ações Estratégicas e
Compensação (FAEC), a partir das informações do SNT. São financiados os
procedimentos de notificação do potencial doador; a manutenção do potencial
doador; a captação de órgãos e/ou tecidos para transplante (cadáver e vivo); o
transplante de órgãos e/ou tecidos (cadáver e vivo); as intercorrências póstransplante; os exames e as consultas em consequência do transplante ou da
doação em vida; os medicamentos necessários em decorrência do transplante ou da
doação em vida.
O pagamento dos procedimentos é feito por meio de Autorização de
Internação Hospitalar (AIH), extrateto financeiro, para todos os níveis de gestão. Os
medicamentos são financiados por meio de Autorização de Procedimentos de Alto
Custo (APAC).
A contrapartida financeira estadual se dá por meio do custeio e da
53
manutenção da estrutura técnico-administrativa, incluindo local, equipamento,
pessoal, material, publicidade, cursos, palestras, vistoria, veículos, entre outros.
Desse modo, a Secretaria de Estado da Saúde, por meio da Gerência do SC
Transplantes, mantém em funcionamento todas as atividades específicas de
notificação, captação e distribuição de órgãos e tecidos, num período de 24 horas,
no âmbito estadual. Desenvolvem também projetos na área educacional e
esclarecimento à população em geral, referentes à doação e ao transplante de
órgãos e tecidos.
As consultas e os exames de pré-transplante se encontram inseridos no
financiamento da média e alta complexidade, acordados na Programação Pactuada
e Integrada (PPI).
A Programação Pactuada Integrada (PPI) da Assistência é coordenada pelo
gestor estadual, em estreita articulação com os gestores municipais em todas as
suas etapas em respeito ao princípio do comando único do sistema de saúde em
cada esfera do governo.
A definição do limite financeiro para todos os municípios deve ser composta
por uma parcela da população do próprio município, acrescido da parcela de
recursos correspondentes à programação de referências de outros municípios e
deduzida a previsão de necessidades de encaminhamento da população para outros
municípios, pactuada entre os gestores.
A cota financeira de cada município é determinada pela população do
município,
multiplicada
pelos
parâmetros
predefinidos
de
cada
grupo
de
procedimentos que compõem a PPI da Assistência, sendo que estes são fixos para
todos os municípios.
Os procedimentos de Alta Complexidade Ambulatorial possuem suas
referências predefinidas pelos municípios sede que realizam os procedimentos
específicos para cada grupo da Alta Complexidade. Portanto, é de responsabilidade
do gestor estadual determinar quais são as referências para os procedimentos da
Alta Complexidade Ambulatorial.
Além do deslocamento das equipes de captação e transplante de órgãos e
tecidos entre os estados brasileiros, é também garantido pelo SNT o deslocamento
do órgão ou do tecido para transplante.
Os
procedimentos
de
pré-transplante,
transplante
e
pós-transplante,
realizados em caráter privado e/ou convênio, são financiados de acordo com a
54
regulamentação específica de cada plano ou seguro saúde, do início ao final de todo
o tratamento, desde que o estabelecimento, a equipe, o profissional e o paciente
estejam cadastrados no SNT, e respeitados o Cadastro Único de Receptores.
A inscrição dos receptores se dá por meio dos profissionais médicos
credenciados que cadastram seus pacientes na Gerência da SC Transplantes
(CNCDO/SC), em formulário padrão de inscrição individual, sendo inserido no
cadastro único, respeitando a data de chegada do formulário devidamente
preenchido. A atualização das informações clínicas dos receptores cadastrados, tais
como manutenção da soroteca, intercorrências clínicas, óbito, desligamento, entre
outros, é de responsabilidade dos médicos credenciados.
A distribuição de órgãos e ou tecidos respeitará a Legislação Federal, por
meio do programa informatizado do Sistema Nacional de Transplantes, cujos dados
estão organizados respeitando os critérios previstos para cada tipo de órgão e/ou
tecido.
Quando ocorre a doação de um órgão e/ou tecido, este é submetido a
exames e os resultados são alimentados no programa, que então procede ao
cruzamento entre os dados de doador e receptor e apresenta em ordem decrescente
os receptores mais compatíveis com o órgão e/ou tecido.
O médico do receptor é contatado para disponibilização do órgão e/ou tecido,
e este deve confirmar o aceite ou não. No caso de recusa, deverá ser comunicada
por escrito em formulário próprio à gerência do SC Transplantes.
As diretrizes para organização de um sistema efetivo de captação e
transplante de órgãos e tecidos no território catarinense seguirão os seguintes
critérios na captação e na distribuição dos órgãos captados, conforme Plano
Estadual de Transplante:
a) Fluxos de referência e contrarreferência
Os fluxos de referência e contrarreferência para a captação e transplante de
órgãos e tecidos obedecerão à Política de Regionalização da Saúde, cujos critérios
estão delimitados no Plano Diretor de Regionalização, obedecendo à territorialização
municipal, microrregional, regional, macrorregional e estadual.
Em Santa Catarina, na captação de órgãos e tecidos, as unidades
hospitalares de menor complexidade deverão encaminhar o potencial doador de
órgãos e/ou tecidos, seguindo os fluxos regionalizados da assistência à saúde, às
55
unidades de referência regional credenciadas para captação e posterior distribuição,
por meio da Gerência/Central de Notificação e Captação de Órgão do Estado
(CNCDO) às unidades de referência credenciadas para transplante.
Em situações especiais de captação e transplante, como, por exemplo, para
pulmão, equipes de outras unidades da federação poderão estar diretamente
envolvidas no procedimento de retirada do órgão, mediante autorização prévia da
CNCDO. Santa Catarina, como não possui um centro de transplante pulmonar,
mantém parceria com o Rio Grande do Sul para atender à demanda estadual no
transplante deste órgão.
b) Serviços auxiliares e complementares pré-transplante
Para a realização de determinados tipos de transplantes são necessários
exames complementares, tais como angiorressonância, arteriografia e cintilografia.
Esses exames são solicitados pelo médico transplantador integrante de
equipe atuante em uma instituição credenciada para o procedimento.
Atualmente, não existem pactuações de referência e contrarreferência para os
procedimentos de pré-transplante.
c) Sistemas assistenciais de alta complexidade
Transplantes de órgãos sólidos, tanto na sua realização quanto no
acompanhamento dos pacientes, dependem de estabelecimentos de saúde
especializados no manejo das patologias, das disfunções ou das insuficiências
orgânicas relacionadas a cada modalidade específica. Esse fato reforça a
necessidade de vincular tais programas de transplante aos centros de referência de
alta complexidade nas diversas regiões do estado. A inserção de serviços de
transplante dentro das unidades da rede de assistência especializada (nefrologia,
cardiologia, ortopedia, etc.) confere resolutividade ao sistema e permite um
atendimento integral ao usuário.
d) Integralidade da assistência
Por se tratar de modalidade terapêutica que envolve alta complexidade e
considerável investimento financeiro, as ações e os procedimentos de transplante
devem atender ao princípio da integralidade da assistência, compreendida como:
- Assistência pré-transplante, que inclui inicialmente o acesso a todo serviço de
56
saúde necessário para o preparo e a inclusão do paciente na lista de espera do
respectivo programa. O SUS deverá garantir acesso a todos os procedimentos
desta etapa.
- Procedimentos de transplante, caracterizados pelo implante de órgão ou tecidos
no receptor. Tal etapa inclui o transporte ágil e eficiente desde a residência do
paciente até a unidade credenciada para transplante, com vistas a garantir
melhores resultados no processo.
- Assistência pós-transplante, realizada por meio de um conjunto de procedimentos
destinados ao acompanhamento clínico ou atenção ao paciente na possibilidade
de intercorrências.
- Assistência de urgência e emergência: em situações de complicações agudas
relacionadas direta ou indiretamente à imunossupressão; em situações de
qualquer outra natureza que possa comprometer o êxito do transplante.
Considerando o princípio da equidade, o paciente transplantado deve ter
acesso priorizado na rede de assistência do SUS especialmente nas condições que
caracterizem urgência e emergência.
A assistência farmacêutica deve ser garantida e ofertada ao paciente
transplantado na totalidade da prescrição e sob rigoroso controle, em virtude da
estreita ligação entre o uso da medicação imunossupressora e o sucesso dos
procedimentos de transplante. Antibióticos, antifúngicos e antivirais são drogas
essenciais no manejo de condições comuns a esses pacientes. Do mesmo modo,
medicações para o controle dos agravos crônicos degenerativos devem ser
garantidas aos pacientes transplantados.
e) Controle social
O controle social, realizado por meio da atuação dos Conselhos de Saúde,
confere legitimidade e visibilidade ao Sistema de Saúde. Considerando que é de
responsabilidade dos Conselhos Municipais de Saúde a formulação de estratégias e
o controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive
nos aspectos econômicos e financeiros, toda solicitação para credenciamento de
estabelecimento ou equipe de saúde para realização de captação ou transplante
deverá ser previamente aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde do município –
sede da unidade ou da equipe, cuja ata de aprovação será anexada ao processo de
credenciamento.
57
f) Gestão orçamentária e financeira
A prestação de serviços de saúde exige uma previsão orçamentária e
financeira. Santa Catarina, na condição de gestor pleno, possui seu teto financeiro
definido pelo Ministério da Saúde. Toda alteração no teto financeiro estadual, em
especial inclusão de novos serviços, deve ser previamente aprovada pelo gestor
estadual.
g) Gerência dos Transplantes de SC
O cargo de gerente dos transplantes de Santa Catarina, a partir da aprovação
deste documento pela CIB, só poderá ser ocupado por profissional de saúde não
integrante de equipe de transplante e/ou remoção de órgãos ou tecidos no momento
da posse e pelo menos nos 2 anos que a antecedam, segundo a análise do banco
de dados do SNT. O gerente do SC Transplantes deverá possuir formação na área
de saúde pública, gestão de serviços de saúde e coordenação intra-hospitalar de
doação de órgãos e tecidos para transplantes.
h) Subordinação das equipes às instituições
A partir da aprovação deste documento pela CIB, fica estabelecida uma forte
relação hierárquica entre equipes e instituições. As instituições poderão e deverão
tomar parte nas decisões que alterem composições ou comandos das suas
respectivas equipes de transplante. Quaisquer alterações nas equipes só poderão
ser processadas mediante a anuência do gestor institucional (Diretor Técnico ou
Clínico). No mesmo sentido, a atuação da equipe em outra instituição dependerá da
autorização da instituição original.
Santa Catarina, no primeiro semestre de 2011, conforme a Associação
Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), foi um dos estados com maiores taxas
de notificação de doadores potencias (59,2 por milhão de população-pmp) e o maior
em notificação de doadores efetivos (25,6pmp) (doadores potenciais são aqueles
diagnosticados com morte encefálica e exames suplementares e se tornam um
doador elegível; doador efetivo é aquele que já iniciou a cirurgia e tem seu órgão
transplantado). No final de 2011, foi o quinto estado em número total de transplantes
no país. Ocupa, ainda, o segundo lugar nos transplantes de rim, terceiro em
58
pâncreas, quinto em medula óssea e décimo segundo em córnea por milhão de
população (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012). Neste
primeiro trimestre de 2012, ultrapassou a meta proposta para o ano de 2017, que
era de 50 notificações pmp, para 65 pmp. Está em primeiro lugar no país em taxa de
doadores efetivos (26,2 pmp), sendo que a média brasileira é de 13,1 pmp. A taxa
de efetivação de transplante no Brasil, neste primeirro trimestre, foi de 29,7% e
Santa Catarina ficou entre os quatro principais estados que ultrapassaram esta
média (acima de 40%). Conclui-se, portanto, que nosso estado representa uma
parcela importante no quadro nacional dos transplantes.
O Estado de Santa Catarina não realiza transplante pulmonar. No Brasil,
existem cinco estados que possuem centro de transplante pulmonar: São Paulo,
Minas Gerais, Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, sendo que, nos últimos
dois anos, o Estado do Rio de Janeiro não realizou nenhum procedimento
(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). As outras regiões do
país necessitam transportar seus pacientes a estes estados no momento em que se
consegue o órgão a ser transplantado. No caso de Santa Catarina os pacientes são
encaminhados para o RS.
Apesar do crescimento que houve nos últimos 10 anos no Brasil (de 0,1 para
0,4 pmp), o pulmão é ainda um dos orgãos menos transplantado do país, em 2012
ocorreram 69 transplantes, sendo o Rio Grande do Sul o estado que mais realizou
este procedimento (33), seguido de São Paulo (31), Ceará (4) e Minas Gerais (1).
Embora com um número ainda reduzido, houve um significativo aumento no
transplante de pulmão no ano de 2012, quando comparado ao ano de 2011, de 49
para 69 transplantes, atingindo o número de 0,4 pmp (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DE TRANSPLANTE..., 2013).
Sendo Santa Catarina um estado com estatísticas favoráveis em relação aos
transplantes de órgãos e com uma estrutura funcional extremamente organizada e
reconhecida nacionalmente, fica a pergunta do por que da falta de um centro de
transplante pulmonar próprio. É mais fácil encaminhar ao estado vizinho (RS) que,
por sua vez, é o maior centro deste transplante do país? Nosso Estado não possui
um número viável de pacientes para manter um serviço aqui? Não há uma equipe
técnica que possa trabalhar com esse procedimento de alta complexidade em nosso
estado? O financiamento seria muito maior se comparado ao deslocamento deste
paciente para o outro estado? Qual o custo real da manutenção de um centro de
59
transplante pulmonar? São estes os principais questionamentos que deram início à
proposta deste estudo, e que se pretende responder durante a execução desse
trabalho.
Os dados foram coletados na Secretaria de Saúde do Estado de Santa
Catarina e no Centro de Transplante do Hospital Santa Casa de Misericórdia de
Porto Alegre (RS).
60
5 METODOLOGIA
Este projeto de pesquisa é um estudo de caso no âmbito da economia da
saúde, com abordagem quali-quantitativa e aplicação da metodologia multicritério de
apoio à decisão (MCDA).
A
pesquisa
qualitativa
permite
analisar
os
aspectos
implícitos
ao
desenvolvimento das práticas organizacionais e a interação entre seus integrantes.
É a técnica mais apropriada para compreender o fenômeno no contexto em que está
inserido e do qual é parte, pois possibilita analisá-lo numa perspectiva integrada
(TRIVINOS, 1987). Quanto aos fins, pode ser considerada descritiva, pois descreve
as informações obtidas por meio da pesquisa documental e das entrevistas. A
pesquisa descritiva expõe as características de determinada população ou de
determinado fenômeno, mas não tem o compromisso de explicar os fenômenos que
descreve, embora sirva de base para tal explicação (CHURCHIL JR., 1999).
Quanto à estratégia de pesquisa, ela pode ser classificada como um estudo
de caso. Por pretender estudar um único fenômeno, associado a um problema
específico no âmbito do investimento em ampliação de serviços de saúde em uma
circunstância singular, não tem a pretensão da generalização.
Quanto aos meios de investigação, este trabalho foi dividido em duas etapas:
a pesquisa bibliográfica; e outra final, que foi a pesquisa documental e levantamento
de critérios de avaliação das alternativas para aplicação do modelo MCDA.
Assim, os elementos primários de avaliação nesta pesquisa foram
estabelecidos a partir de entrevistas e discussões com especialistas.
A avaliação e agregação desses elementos primários por afinidade e relações
de causa-efeito em uma matriz cognitiva permitiu seu agrupamento em áreas de
interesse: Exemplo: (custo, impacto na sobrevida, ampliação da oferta, curva de
aprendizado, etc.) que foi representada por uma árvore de critérios (FITZ; SOUZA,
2007).
Para cada critério foi estabelecido um descritor (ou indicador).
Para cada indicador ou descritor foi estabelecido o padrão e a escala utilizada
para a sua avaliação.
O cálculo das funções de valor definidas por cada critério será realizado com
auxílio do software MacBeth – Measuring Attractiveness by a Categorical Based
Evaluation Technique (BANA-E-COSTA; VANSNICK, 1999).
61
Em síntese, o MCDA procura sistematizar o processo de tomada de decisão
em relação a alternativas diversas, comparando-as em seu resultado segundo
múltiplos critérios ou valores percebidos pelo tomador de decisão (ENSSLIN;
MONTIBELLER NETO; NORONHA, 2001).
Os passos para a construção da metodologia são:
a) Identificação dos Elementos Primários de Avaliação;
b) Construção da matriz lógica, matriz cognitiva ou mapa cognitivo, que deve incluir
todos os valores e dimensões relevantes do problema (os EPAs);
c) Análise da matriz e da identificação dos Pontos de Vista Fundamentais, que
sustentarão a construção do modelo multicritério;
d) Definição dos descritores, que se tornarão as escalas para a medida de cada
critério (avaliarão o desempenho de cada critério) quando submetido a cada uma
das alternativas sob análise do decisor;
e) Definição das diferenças de atratividade de cada ponto da escala em relação aos
demais pontos da escala (Quanto vale a mudança do ótimo para o bom em uma
escala que qualifica um determinado critério? Essa diferença é a mesma se se
mudar do bom para o regular?).
f)
Com as diferenças de atratividade estabelecidas em relação à escala semântica,
o software Macbeth transformará cada escala em diferenças numéricas
ponderadas, permitindo a comparação das mesmas em relação a possíveis
compensações entre elas para a definição da decisão do gestor.
g) Esta fase pode ser considerada a fase da análise de viabilidade do projeto, já
que determinará os resultados de cada alternativa em relação ao desempenho
em cada critério incluído na matriz de decisão.
62
6 RESULTADOS
A proposta deste trabalho foi identificar, tendo como escopo a Metodologia de
Multicritério de Apoio à Decisão (MCDA), elementos fundamentais de análise ou
critérios utilizados para avaliar a viabilidade da implantação de um serviço de
transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina.
A operacionalização da metodologia MCDA ocorre por meio de três etapas
básicas, diferenciadas, mas correlacionadas:
a) a estruturação do contexto decisório;
b) a construção de um modelo de avaliação de alternativas/ações; e
c) a formulação de recomendações para os cursos de ações mais satisfatórias.
O presente estudo, diante das características de sua proposta e a premissa
de que o processo de decisão em relação ao tema deste trabalho tem pesquisas,
aspectos políticos e conjunturais que exigem a sua contextualização para a sua
efetiva definição, abordou apenas a primeira fase do modelo MCDA, deixando-a
como referência para outros estudos ou a continuidade da aplicação da metodologia
no contexto da gestão do Sistema Único de Saúde.
O processo de estruturação do contexto e das variáveis decisórias é de suma
importância para se ter um entendimento comum sobre o problema, orientar o
processo de criação das ações e, por fim, servir de base para o processo de
avaliação das mesmas. É nessa fase que se aplicam as ferramentas que irão apoiar
o raciocínio, gerar conhecimento sobre o problema e comunicar sobre a realidade
(ENSSLIN; MONTIBELLER NETO; NORONHA, 2001).
Como primeira etapa a ser considerada, é útil a definição, junto ao eventual
decisor, de um “rótulo para o problema”, no caso o estudo da viabilidade de
implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina. A função
principal do rótulo é delimitar o contexto decisório nesta etapa do processo, não
sendo, portanto, definitivo.
A segunda etapa, sintetizada na construção dos mapas de relações meiosfins, é centrada na definição dos elementos primários de avaliação (EPA’s). Estes
elementos constituem-se de objetivos, metas e valores dos decisores e também de
ações, opções e alternativas. Esses elementos, que podem ser registrados a partir
de técnicas de brainstorms ou análise de discurso de informantes-chave, devem ser
integrados da forma mais consistente possível em uma matriz lógica ou mapa
63
cognitivo (FITZ; SOUZA, 2007).
6.1
Levantamento dos elementos primários de avaliação
O processo de identificação de elementos primários de avaliação e a sua
organização em um mapa cognitivo talvez sejam os momentos mais demorados e
onerosos da metodologia empregada.
Os elementos primários de avaliação, peças constituintes do mapa cognitivo
construído no contexto desta pesquisa, foram coletados a partir da realização de
reuniões (brainstorms) com os agentes do processo decisório, a saber: Dr. Joel de
Andrade (coordenador estadual de transplantes de Santa Catarina, mestre em
Ciências Médicas pela Universidade Federal de Santa Catarina, especializado em
Gestão Hospitalar pela UFSC e Doação e transplante de órgãos Tecidos e células
pela Organização Nacional de Transplantes da Espanha), Dr. Flavio Magajewski
(coordenador de ensino e pesquisa da central de notificação, captação e distribuição
de órgãos de Santa Catarina - CNCDO/SC, mestre em Administração e doutor em
Engenharia de Produção, ambos pela Universidade Federal de Santa Catarina e
professor da Universidade do Sul de Santa Catarina), Dr. Sadi Marcelo Schio
(médico do serviço de transplante pulmonar da Santa Casa de Porto Alegre,
coordenador clínico do serviço de transplante pulmonar da Santa Casa de
Misericórdia de Porto Alegre - RS) e o próprio pesquisador, que atuou como
observador participativo, mimetizando aspectos da metodologia de pesquisa.
A partir das discussões, o autor da pesquisa, atuando também como
facilitador, procurou reunir as ideias apresentadas pelos especialistas participantes,
e que foram as incluídas na relação a seguir:
a) custo de implantação do serviço;
b) custo de manutenção do serviço;
c) custo
para
estruturação/capacitação
da
equipe
multidisciplinar
responsável;
d) concentração de modalidades de transplantes por serviço;
e) custo do transplante (direto - TFD , transporte, SUS e indireto);
f) curva de aprendizado da equipe de transplante;
g) número mínimo de procedimentos necessários para manter o serviço do
ponto de vista financeiro;
64
h) número mínimo de transplantes necessários para manter a equipe com
expertise aceitável;
i) sobrevida pós-transplante;
j) qualidade de vida pós-transplante;
k) tempo de espera na fila para transplante;
l) custos financeiros associados à remoção do paciente para o centro
transplantador;
m) custos emocionais dos paciente e dos acompanhantes, associados à
distância do serviço de transplante em relação ao local de residência;
n) tempo na fila de espera para o transplante;
o) índice de mortalidade na fila de espera para o transplante;
p) demanda de transplantes da população de Santa Catarina;
q) número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de
captação de órgãos;
r) número de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de
referência para transplante de pulmão;
s) taxa de aceitação dos órgãos disponibilizados.
6.2
Elaboração do mapa cognitivo
A organização lógica dos elementos primários de avaliação definiu um mapa
cognitivo que ficou estruturado conforme a
Figura 3.
65
Figura 3: Mapa cognitivo realizado para avaliação da viabilidade de um
serviço de Transplante Pulmonar
Fonte: Elaborada pelo autor (2013).
66
A matriz lógica ou mapa cognitivo é, sinteticamente, um diagrama que deve
reunir, de forma esquemática, as representações mentais de um decisor para uma
dada situação-problema.
A matriz lógica organizada neste trabalho foi se construindo de forma
assistemática como uma estrutura orientada de meios para fins em uma concepção
de linha de tempo, cujos elementos da base correspondem a causas primárias
necessárias ou condicionantes para a ocorrência de elementos colocados em níveis
sucessivamente mais altos da matriz.
A construção da matriz lógica foi um processo bastante dinâmico. A análise
dos elementos primários de avaliação (EPA’S) e a sua distribuição na matriz lógica
foram alteradas inúmeras vezes, incorporando um processo de apropriação
gradativo do pesquisador com as variáveis relevantes constituintes dessa estrutura
lógica, tendo como resultado a definição dos Pontos de Vista Fundamentais (PVF’s).
Salienta-se mais uma vez que, em se tratando do uso da metodologia de
MCDA, a estrutura do mapa cognitivo reflete o juízo de valores dos atores
participantes do processo no momento de sua confecção.
6.3
Determinação dos pontos de vista fundamentais
Os pontos de vista (PVs) ou elementos primários de avaliação (EPAs) podem
ser considerados como os aspectos que reúnem características e/ou objetivos
percebidos como importantes pelo decisor para a construção de um modelo de
avaliação de ações existentes ou construídas (SOUZA, 1999).
Certos pontos de vista são essenciais para uma possível avaliação das
futuras ações. Estes são considerados como Pontos de Vista Fundamentais (PVFs)
e constituem-se como eixos ou critérios de avaliação do problema (FITZ; SOUZA,
2007).
Seguindo este raciocínio, definiram-se como eixo para a avaliação dos
critérios a serem discutidos dentro de um serviço de transplante pulmonar quatro
etapas fundamentais, a saber: demanda e oferta, implantação, manutenção e
eficiência/eficácia (qualidade), a partir dos quais se selecionaram os pontos de vista
fundamentais (PVFs) que serviram de base para a discussão deste estudo.
A etapa da demanda e oferta incluiu os elementos que correspondem à
percepção social da necessidade de um serviço ou/as informações técnicas que
67
reinterpretam dados epidemiológicos na forma de um indicador de demanda para
um procedimento técnico, e também as condições logísticas relacionadas à oferta do
órgão a ser transplantado. Os PVFs fundamentais nesta etapa foram: a demanda de
transplante e o número de pulmões ofertados pelo sistema de captação.
A implantação corresponde aos critérios relacionados na estruturação de um
serviço de transplante, e inclui os custos econômicos relacionados à criação deste
serviço e custos sociais associados à sua ausência. Entram nesta etapa, como
PVFs, o tempo de espera e a mortalidade na fila de espera para realização do
transplante e o custo de implantação de um serviço.
A manutenção corresponde aos critérios relacionados aos processos
associados ao funcionamento de um centro de transplante e basicamente se
referem à viabilidade de um serviço sustentável e efetivo. Compreende desde a
atualização técnica da equipe até a apropriação dos custos para manter este serviço
funcionando. Os elementos fundamentais selecionados do mapa cognitivo foram: a
curva de aprendizado da equipe e os custos de manutenção de um serviço de
transplantes de pulmão.
A eficiência/eficácia (Qualidade) é a etapa que corresponde aos critérios
relacionados aos resultados alcançados com este serviço de transplante caso fosse
implantado no estado. Compreende a avaliação do serviço em termos de qualidade
e satisfação dos usuários. Foram selecionados como PVFs desta etapa: o número
de pulmões efetivamente transplantados, a taxa de sobrevida pós-transplante e a
qualidade de vida pós-transplante, e o custo financeiro final.
A organização dos PVFs nas etapas indicadas anteriormente foi inspirada nas
formulações de Donabedian, que consagrou na área da gestão da qualidade de
serviços de saúde uma visão baseada na Teoria Geral de Sistemas, na qual a
qualidade em saúde pode ser sistematizada pelo controle de elementos agregados
classicamente em uma tríade: estrutura, processo e resultado (DONABEDIAN,
1992).
A estrutura inclui recursos físicos, humanos, materiais e financeiros
necessários para a assistência médica. Inclui também o financiamento e a
disponibilidade de mão de obra qualificada.
Os processos agregam as atividades envolvendo profissionais de saúde e
pacientes, com base em padrões sociais e técnicos aceitos. A análise pode ser sob
o ponto de vista técnico e/ou administrativo.
68
Os resultados correspondem ao produto final da assistência prestada,
considerando saúde, satisfação de padrões e de expectativas.
A avaliação dos PVs incluídos na matriz lógica e a sua agregação nas etapas
apresentadas permitiram uma seleção dos PVFs, reduzindo os dezenove PVs para
nove PVFs. As etapas e os PVFs, que foram considerados elementos fundamentais
para a tomada de decisão, foram representados em uma árvore de pontos de vista,
os quais estão apresentados na
Figura 4.
Figura 4: Árvore de pontos de vista para análise da viabilidade de um centro
de Transplante Pulmonar
Transplante
Pulmonar
Demanda
Oferta
Demanda
Manutenção
Implantação
oferta
Curva de
aprendizado
Tempo e
mortalidade
custo
Eficiência
Eficácia
custo
N pulmões
ofertados
Sobrevida e
qualidade de
vida
Custo
final
Fonte: Elaborada pelo autor (2013).
Conforme Ensslin, Montibeller Neto e Noronha (2001), muitas vezes se faz
necessária a decomposição de um PVF, a fim de que se possa realizar uma melhor
avaliação do desempenho de suas ações potenciais. Como exemplo, pode-se citar a
necessidade de um maior detalhamento de algum aspecto de um problema para
uma melhor fundamentação da discussão.
A análise detalhada de cada uma das variáveis incorporadas ao modelo pode
subsidiar as decisões acerca da oferta de transplante pulmonar à população de
69
Santa Catarina em uma das duas hipóteses ou alternativas à disposição do gestor: a
criação de um serviço local de transplante pulmonar ou a manutenção do
referenciamento da população demandante de transplante de pulmão para o serviço
existente no Rio Grande do Sul. Ainda que as variáveis individualmente possam
apoiar decisões distintas, a análise global e agregada dos elementos considerados
fundamentais para representar os valores do decisor deve fornecer uma orientação
mais ampla e abrangente para apoiar o processo decisório. É importante enfatizar
que este estudo incorporou, em uma dimensão associada ao processo decisório,
algumas variáveis associadas aos benefícios que a mesma trará ao paciente, ou
seja, qual estratégia teria melhor potencial de garantir acesso a este serviço de
saúde especializado com os melhores resultados possíveis, alinhando-se à
tendência dos estudos contemporâneos de economia da saúde, comparando
alternativas (custo-benefício, custo-efetividade).
6.4
Demanda de transplantes da população de Santa Catarina
O dimensionamento da necessidade da população catarinense de transplante
pulmonar é um dado fundamental para a análise que se pretende desenvolver com
este trabalho. A demanda por um determinado procedimento determina em grande
parte a viabilidade de implantação de um novo serviço especializado em nosso
estado, além de produzir efeitos em outros aspectos do processo decisório. A
viabilidade financeira, a curva de aprendizado, a manutenção da expertise, bem
como os resultados expressos pela sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes
transplantados, são alguns dos aspectos que sofrem impacto direto desta variável.
A necessidade de transplante pulmonar, segundo Garcia, é estimada em 3-5
transplantes por milhão de população por ano (p.m.p./ano) (GARCIA, 2000).
Considerando que a população de SC é de aproximadamente 6 milhões de
habitantes, baseado nesta estimativa e considerando que toda a demanda fosse
atendida, ter-se-ia um número absoluto de 18 a 30 procedimentos por ano.
No Brasil, nos últimos 10 anos, foram realizados 552 transplantes
pulmonares, década que se caracterizou pelos maiores avanços deste procedimento
no país. Em 2012, ano com a melhor performance desta atividade no país, 69
procedimentos foram realizados nos 6 centros ativos autorizados. O Rio Grande do
70
Sul, onde foram realizados 33 desses procedimentos, obteve uma taxa de 3,1
transplantes pulmonares p.m.p./ano, conforme mostra a
Figura 5.
Figura 5: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012
71
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
Nos anos de 2011 e 2012 a Secretaria de Estado de Saúde de Santa Catarina
(SES-SC) registrou 35 pacientes com autorizações de tratamento fora do domicílio
(TFD) para transplante de pulmão. Deste grupo, 15 pacientes iniciaram sua primeira
avaliação para entrar em fila de espera, enquanto 20 estavam ou em fila de espera,
ou em acompanhamento pós-transplante, confirmando uma demanda anual próxima
do parâmetro de 3 transplantes de pulmão por milhão de população (p.m.p.).
6.5
Número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de
captação de órgãos
O sistema estadual de transplantes de Santa Catarina possui o melhor
desempenho para captação de órgãos a partir de doadores falecidos em morte
encefálica. No ano de 2012 obteve a maior taxa de doação efetiva de órgãos da
história dessa atividade no país, com 165 doadores efetivos de órgãos,
correspondendo a 26,4 doadores efetivos p.m.p./ano (Figura 6). Ainda assim, no
período referido, apenas 10 pulmões foram disponibilizados para transplante. O
resultado revela que apenas 6% dos doadores geraram pulmões possivelmente
úteis para transplante. Quando se amplia a análise para os três últimos anos,
observa-se que o padrão se mantém. Dentre as 433 doações efetivadas entre 2010,
2011 e 2012, apenas 29 pulmões foram gerados, ou seja, 6,7% do total. O que
equivale a 1,39 pulmões gerados p.m.p./ano.
72
Figura 6: Número de doadores efetivos por milhão de população no ano de 2012
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
6.6
Tempo na fila de espera
O tempo na fila de espera para os pacientes transplantados em 2012 no Rio
Grande do Sul teve uma variação grande, de 30 dias a 5 anos, porém a grande
maioria situou-se entre 3 meses a 2 anos ( 86,7%), conforme
Figura 7.
73
Figura 7: Tempo de espera dos pacientes transplantados de pulmão no Estado do
Rio Grande do Sul
36,7%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 30
dias
0,0%
30 dias
< 90
dias
3,3%
0,0%
90 dias 6 meses 1 ano < 2 anos < 3 anos < 5 anos e
<6
< 1 ano 2 anos 3 anos 5 anos
+
meses
Fonte: CNCDO RS extraído do Sistema Informatizado de Gerenciamento (SIG) do Sistema
Nacional de Transplantes (2013).
6.7
Índice de mortalidade na fila de espera
Segundo dados obtidos na CNCDO do Rio Grande do Sul, a mortalidade em
lista de transplante pulmonar no serviço da Santa Casa de Misericórdia é de 31,94%
até dezembro de 2012. Entre janeiro e abril de 2013 os números reduzem para
20,89%. Ou seja, de cada 10 pacientes listados para transplante, 2 a 3 falecem na
fila de espera.
6.8
Custos de implantação do serviço
A projeção e a análise dos custos de implantação de um serviço de
transplante pulmonar são bastante complexas e exigem um exercício direcionado
pelo menos três cenários distintos. No primeiro deles, além da adequação de uma
área física, o serviço seria implantado em uma instituição sem serviços de
transplante cardíaco ou cirurgia torácica de urgência. Ter-se-iam nessa situação,
74
além da obra física, os custos de preparo da equipe e da criação de uma estrutura
de funcionamento com cobertura 24h por dia, 365 dias por ano.
Num segundo cenário, ter-se-ia uma área física adequada na qual já
funcionaria um centro de transplantes de outros órgãos, com estrutura de centro
cirúrgico e unidade de terapia intensiva, porém se teria o custo de preparo
manutenção de uma equipe profissional para o transplante pulmonar.
E, num último cenário, haveria aquele que já disporia de estrutura física
adequada e de equipe profissional especializada e treinada.
É fundamental entender que a natureza da instituição hospitalar tem influência
direta nos custos.
O custo de implantação de um serviço de saúde, em relação à estruturação
física, está relacionado com os custos de construção, ampliação e adequação de
áreas físicas, que incluem obras civis, instalações e equipamentos.
Os custos das obras civis podem variar significativamente, conforme as
necessidades e os materiais utilizados, especialmente os revestimentos e o
acabamento da obra, que nas construções de serviços de saúde costumam exigir os
de custo mais elevado, como azulejos e materiais impermeáveis. Moura (2008),
utilizando dados da SUCAB, encontrou diferenças de mais de 465% entre o custo do
revestimento de um metro quadrado com tinta PVA em relação ao revestimento da
mesma área com azulejos, e de quase 3.000% se o revestimento for feito com
mosaico vidroso. Segundo Mascaró (1995), o custo de construção das edificações
recai nos aspectos de quantidade da área construída e qualidade da especificação
dos materiais, especialmente aqueles referentes ao item acabamento.
Em relação à dimensão da área a ser construída ou adequada para a
implantação de um novo serviço de transplante de pulmão, ela é um fator
dependente da escolha que será feita em relação à instituição que abrigará o
serviço, e será tanto menor quanto maior a infraestrutura já existente para este tipo
de procedimento. Nesse sentido, o item “concentração de modalidades de
transplante” pode oferecer mais detalhes sobre a melhor estratégia para redução de
custos de implantação de um novo serviço de transplante. Considerando que as
necessidades das obras civis podem ser modulares, que o custo unitário básico
(CUB) da construção civil para fins comerciais definido pelo SINDUSCON para maio
de 2013 foi de R$ 1.323,72 e que o custo de uma obra destinada a serviços de
saúde empiricamente pode custar até três vezes mais do que o de uma obra
75
residencial ou comercial (estabelecendo o CUB Saúde em R$ 3.971,16), pode-se
estabelecer que o custo de cada 100 metros quadrados necessários para a
implantação do serviço de transplante pulmonar terá custo estimado de R$
397.116,00.
6.9
Custo para estruturação/capacitação da equipe multidisciplinar
A composição do painel de custos relacionados à implantação de um serviço
de transplante pulmonar em Santa Catarina deve iniciar elencando os recursos
humanos mínimos exigidos pela Portaria GM/MS nº 2600 de 21 de outubro de 2009
necessários à implantação de um serviço. O Erro! Fonte de referência não encontrada.
resume esses recursos e suas competências. No entanto, é fundamental ressaltar
que as necessidades vão muito além do mínimo exigido e, sendo o transplante uma
atividade com extrema interdisciplinaridade, a contribuição de profissionais de
enfermagem, fisioterapia, psicologia, assistência social, nutrição e farmácia é
fundamental para o sucesso do projeto.
Quadro 1: Profissionais e experiência mínima exigida para autorização de
equipe de transplante
Quantidade
Especialidade
01
Médico
pneumologista
01
Cirurgião
torácico
01
Cirurgião
cardiovascular
02
Anestesistas
01
Intensivista
Fonte: Brasil (2009).
Qualificação
Residência ou título de especialista com
treinamento formal, com duração mínima de três
meses, em serviço especializado em transplante de
pulmão hospital de ensino ou de excelência.
Residência ou título de especialista com
treinamento formal, com duração mínima de doze
meses, em cirurgia brônquica e traqueal, realizado
em serviço especializado de transplante de pulmão
em hospital de ensino ou excelência.
Residência ou título de especialista.
Residência ou título de especialista com
treinamento formal, com duração mínima de três
meses, em serviço especializado em transplante de
pulmão.
Residência ou título de especialista com
treinamento de três meses em suporte inicial pósoperatório em transplante pulmonar em hospital de
ensino ou de excelência.
76
Seguindo esta lógica, o primeiro custo a ser calculado é o treinamento dos
profissionais envolvidos no projeto. Atualmente o Brasil possui bons centros de
referência vinculados ao Sistema Único de Saúde que podem receber esses
profissionais para treinamento e existe incentivo do Ministério da Saúde com essa
finalidade. Utilizando como referência os valores de diárias da Secretaria de Estado
de Saúde (SES-SC) para São Paulo (R$ 191,25) ou Porto Alegre (R$ 153,00), e as
respectivas passagens aéreas para os destinos citados, ter-se-ia um investimento
em treinamento, considerando uma equipe de 6 profissionais médicos e 2
profissionais de enfermagem pelos distintos períodos recomendados, da ordem de
R$ 377.267,50 (* os cálculos das diárias obedecem à lógica dos valores médios repassados pela
SES SC para viagens às cidades que são centros de referência em transplantes;
** os cálculos dos salários representam os valores médios brutos com profissionais de
saúde de nível superior nas suas diversas especialidades nível 14F do plano de cargos e
salários da SES/SC.
).
Quadro 2: Sumário dos custos de treinamento de uma equipe de transplante
pulmonar
Equipe
01 Pneumologista
Período de
duração
(dias)
120
Custo com
diárias*
(R$)
20.655,00
Custo com
salários**
(R$)
22.030,29
Custos com
passagens
aéreas (R$)
300,00
Total (R$)
42.985,29
02 Anestesistas
120
41.310,00
44.060,58
600,00
85.970,58
01 Cirurgião torácico
01 Cirurgião
cardiovascular
01 Intensivista
360
61.965,00
88.121,16
300,00
150.386,16
120
20.655,00
22.030,29
300,00
42.985,29
120
20.655,00
22.030,29
300,00
42.985,29
02 Enfermeiros
30
10.327,50
6.436,36
600,00
17.363,86
382.676,47
* os cálculos das diárias obedecem à lógica dos valores médios repassados pela SES SC
para viagens às cidades que são centros de referência em transplantes;
** os cálculos dos salários representam os valores médios brutos com profissionais de
saúde de nível superior nas suas diversas especialidades nível 14F do plano de cargos e
salários da SES/SC.
Fonte: SES-SC (2013).
O
custo
para
estruturação
e
qualificação
profissional
da
equipe
multiprofissional responsável pelo serviço em estudo é ainda uma decisão mais
difícil, tendo em conta as muitas possibilidades de formação prévia dos participantes
da equipe, e que serão aproveitadas, sem custo, conforme os critérios incluídos no
processo seletivo para a formação do grupo de profissionais.
77
Além disso, considerando a possibilidade de utilização de profissionais já
contratados e em atuação em outras equipes de trabalho associados a transplante
de órgãos na mesma instituição (ver concentração de modalidades de transplante
em um mesmo serviço), é impossível definir antecipadamente o custo inicial para a
formação e a qualificação da equipe.
6.10 Concentração de modalidades de transplantes por serviço
Os custos de implantação de um serviço de transplante pulmonar e sua
sustentabilidade técnica e econômica, como já colocado, são diretamente
associados à densidade tecnológica já instalada na instituição que irá abrigar o
serviço. Por conta disso, a lógica gerencial procura agregar o máximo de
modalidades de transplantes em hospitais que já possuem atividades afins. Há
especial interesse na coexistência de programas de transplante pulmonar e
cardíaco, ou, ainda, outros transplantes de órgãos sólidos, em virtude da otimização
das estruturas, dos recursos e dos insumos necessários aos diversos programas. A
existência de serviço ativo de cirurgia torácico bem estruturado e funcionante tem
especial relevância na facilidade de implantação, na redução dos custos e na
obtenção de resultados mais adequados.
A Figura 8 mostra os centros em que funcionam os diversos transplantes de
órgãos em nosso Estado.
Figura 8: Capacidade instalada para transplantes no Estado de Santa
Catarina
78
Fonte: SC Transplante (2012).
Por meio da Figura 8, pode-se verificar que as cidades de Joinvile, Blumenau
e Florianópolis são as que mais concentram centros com vários tipos de transplantes
e que Blumenau, além de concentrar cinco tipos de transplante, possuiu equipe de
transplante cardíaco, o que, como mencionado, poderia otimizar a implantação do
serviço de transplante pulmonar.
Importante assinalar que a concentração dos centros de transplante, como
mostra a Figura 8, foi projetada no ano de 2010. Atualmente não se possue o centro
de transplante de córnea em Canoinhas, e o centro de transplante cardíaco de São
José foi desativado, ficando, então, apenas as cidades de Blumenau com um centro
de transplante cardíaco no Estado.
6.11 Curva de aprendizado da equipe de transplante
Um dos critérios para análise da curva de aprendizado é o número mínimo de
transplantes necessários para manter a equipe com expertise aceitável.
Conforme registro da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos
(ABTO), a Região Sul, representada pelo serviço de transplante da Santa Casa de
Misericórdia de Porto Alegre, realizou, desde 1989, 423 transplantes pulmonares
79
nos 23 anos de atividade do serviço. Nos primeiros quatro anos, realizou 33
transplantes,
a
partir
de
então,
manteve
sua
média
em
torno
de
25
procedimentos/ano, sendo o ano de 2009 e 2012 os mais produtivos (40 e 30
procedimentos, respectivamente).
Uma divisão por períodos de 5 anos revela a evolução da equipe em termos
de procedimento, como pode ser verificado no *Projeção baseada nos resultados do
triênio.
.
Quadro 3: Número de transplantes pulmonares realizados no Brasil
Quinquênio
Período
Nº de
Procedimentos/mês
Nº de Procedimentos/5 ano
1
1989 - 1994
0,63
38
2
1995 - 1999
0,8
48
3
2000 - 2004
1,85
111
4
2005 - 2009
2,43
144
5
2010 - 2014*
2,27
*Projeção baseada nos resultados do triênio.
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
136*
O ideal, para se conseguir determinar em que momento se atingiu uma
experiência razoável, seria comparar o número de procedimentos realizados com a
taxa de mortalidade pós-cirurgia, porém não estando estes dados disponíveis, é
relevante conhecer a frequência com que estes procedimentos são realizados no
serviço de transplante pulmonar que constitui nossa referência. Destaca-se que os
dados dos dez últimos anos revelam um total de 272 transplantes realizados, ou
seja, 27,2 procedimentos ao ano, ou ainda 2,26 cirurgias a cada mês.
As
Figura 9, Erro! Fonte de referência não encontrada. e Figura 11 mostram os
números de transplantes realizados no Brasil nos últimos três anos distribuídos por
região e a evolução dos pacientes.
Figura 9: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2010
PULMÃO – TOTAL DE TRANSPLANTES: 60
2010
Nome Centro
Responsáveis
MINAS GERAIS (total de transplantes: 2)
Hospital Clínicas UFMG
Silvio Paulo Pereira
Cidade
Belo
Vivo
Fal.
Total
% Tx,
Evol.*
Total
Real.**
Pac em
Acomp.***
0
2
2
0%
16
4
80
Horizonte
RIO GRANDE DO SUL (Total de transplantes: 28)
Santa Casa de Misericórdia
José de Jesus
de Porto Alegre
Peixoto Camargo
SÃO PAULO (total de transplantes: 30)
Hospital Israelita Albert
Fabio Biscegli
Einstein
Jatene
INCOR – Instituto do
Fabio Biscegli
Coração
Jatene
Porto
Alegre
1
27
28
100%
368
São Paulo
0
2
2
100%
3
3
São Paulo
0
28
28
100%
146
75
60 transplantes realizados por 4 equipes, 3 equipes evoluíram 100% dos transplantes (58 transplantes)
Sobrevida do paciente 79% Sobrevida do exerto 79%
As taxas de sobrevida de pacientes no período contemplan apenas as equipes que informaram 100% dos seus transplantes.
Brasil
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
Figura 10: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2011
PULMÃO – TOTAL DE TRANSPLANTES: 35
2011
Nome Centro
Responsáveis
CEARÁ (total de transplantes: 2)
Hospital de Messejana
Antero
Gomes
Neto
MINAS GERAIS (Total de transplantes: 1)
Hospital Clínicas UFMG
Silvio
Paulo
Pereira
RIO GRANDE DO SUL (total de transplantes: 20)
Hospital Clínicas Porto Amarilio Vieira de
Alegre
Macedo Neto
Santa
Casa
de José de Jesus
Misericórdia de Porto Peixoto Camargo
Alegre
SÃO PAULO (Total de transplantes: 12)
Hospital Israelita Albert Fabio
Biscegli
Einstein
Jatene
INCOR – Instituto do Fabio
Biscegli
Coração
Jatene
Dados de 01/01/2010 até
30/09/2011
RBT
%
Total
Evol.
Evol.*
Geral**
Doador
Vivo
Fal.
Total
Fortaleza
0
2
2
2
100%
2
2
Belo
Horizonte
0
1
1
4
75%
17
5
Porto
Alegre
Porto
Alegre
0
1
1
1
0%
2
1
0
19
19
47
100%
387
São Paulo
0
2
2
4
100%
5
5
São Paulo
0
10
10
38
100%
156
84
Cidade
Pac em
Acomp.***
Brasil (01/10/2010 até 96 transplantes realizados por 6 equipes, 4 equipes evoluíram 100% dos transplantes (91 transplantes)
30/09/2011)
Sobrevida do paciente 72% Sobrevida do exerto 72%
As taxas de sobrevida de pacientes no período contemplan apenas as equipes que informaram 100% dos seus transplantes.
* percentual de transplantes realizados no período de 01/01/2010 até 30/09/2011.
** total de transplantes realizados pelo centro, informação obtida por meio dos dados
preenchidos pela equipe no sistema.
*** pacientes em acompanhamento pós-transplante no centro, informação enviada pela
equipe.
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
81
Figura 11: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012
PULMÃO (69 TRANSPLANTES)
Histórico Realizado
Cidade
Nome do Centro
Nº.
Realizado
Pacientes
Acomp.
RBT
Evolução
Realizado 2012
Responsável
Ceará (4)
Hospital
de
Messejana
Minas Gerais (1)
Belo
Hospital
Clínicas
Horizonte
UFMG
Rio Grande do Sul (33)
Hospital
Clínicas
Porto Alegre
Porto Alegre
Santa
Casa
de
Porto Alegre
Misericórdia
São Paulo (31)
Hospital
Israelita
São Paulo
Albert Einstein
INCOR – Instituto do
São Paulo
Coração
Fortaleza
Vivo
Falec.
Total
0
4
4
0
1
1
0
3
3
1
29
30
CE
8
6
17
5
6
3
423
Antero Gomes Neto
MG
Nilson Figueiredo
Amaral
RS
Amarilio Vieira de
Macedo Neto
José de Jesus Peixoto
Camargo
SP
11
10
Fabio Biscegli Jatene
0
4
4
185
93
Fabio Biscegli Jatene
0
27
27
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
6.12 Custo de manutenção do serviço
O tratamento dos candidatos catarinenses a transplante pulmonar nas etapas
de preparo e posterior acompanhamento, uma vez realizado o procedimento, é
ofertado na estrutura do sistema único de saúde pelo programa de Tratamento Fora
do Domicílio (TFD). O TFD interestadual tem por objetivo garantir aos pacientes
acesso a serviços de saúde não disponíveis na unidade da federação de domicílio
do usuário e possui financiamento federal.
O TFD ainda é uma necessidade e é estratégico na regionalização dos
serviços de mais alta complexidade, como transplante de medula óssea alogênico,
transplante de pulmão, pâncreas isolado e, atualmente, coração. Os transplantes
pediátricos não são feitos no Estado de Santa Catarina, assim como os transplantes
de medula óssea alogênicos, pâncreas isolado e pulmão em adultos.
Em Santa Catarina, desde 2006, todos os pacientes com processos de TFD
para transplantes sofrem análise de médicos reguladores da CNCDO/SC. Durante o
ano de 2011, realizou-se um registro sistemático de todos os processos, inclusive
com detalhamento dos custos envolvidos. Passagens rodoviárias e aéreas,
deslocamentos de ambulâncias, diárias de motoristas, pacientes e acompanhantes
foram registradas para efeito de análise. Foram avaliados 507 processos de
pacientes, autorizados 494 (97%) e negados 13 (3%) processos. Desse total apenas
16% eram processos novos, ou seja, de pacientes que tiveram seu diagnóstico e
82
tratamento em 2011 e 84% são pacientes de anos anteriores, com várias viagens
para realizar o transplante e fazer o acompanhamento ad eternum.
Quanto ao tipo de transplante realizado fora do Estado de Santa Catarina, o
Transplante de Medula Óssea (TMO) Alogênico foi o mais frequente, com 37,7%,
seguido pelo de rim, com 33, 9%; fígado, com 15,6%; e pulmão, com 3,9%. Também
foram realizados transplantes de coração, pâncreas, rim-pâncreas, rim-fígado e
córnea, conforme ilustrado na
TOTAL
191
172
79
20
10
1
15
RIMTMO RIM FÍGADO PULMÃO CORAÇÃO PÂNCREAS
PÂNCREAS
507
%
37,7
33,9
15,6
3,9
2,0
0,2
3,0
2
13
RIMFÍGADO
CÓRNEA
0,4
2,6
.
Figura 12: Transplantes realizados fora do Estado de Santa Catarina
pagos por TFD em 2011
40
37,7
33,9
35
30
25
20
15,6
15
10
3,9
5
3
2
0,2
0,4
2,6
0,6
0,4
0
TOTAL
507
%
191
172
79
20
10
1
TMO RIM FÍGADO PULMÃO CORAÇÃO PÂNCREAS
37,7
33,9
15,6
3,9
2,0
0,2
15
2
13
RIMPÂNCREAS
RIMFÍGADO
CÓRNEA
3,0
0,4
2,6
Fonte: CNCDO/SC (2013).
Os custos totais com o TFD no ano de 2011 foram de R$ 648.988,65 para
todos os pacientes incluídos no programa. Em termos percentuais, pode-se afirmar
83
que 3,9% dos pacientes de transplante pulmonar representam um custo de R$
25.959,54, ou seja, R$ 741,70 por paciente ao ano.
Uma análise preliminar dos custos com TFD em Santa Catarina, ainda que
não seja o foco do estudo, fornece uma boa informação acerca da relevância do
transplante pulmonar, comparado ao transplante alogênico de medula óssea tanto
em termos de prevalência quanto de custo.
É fundamental entender que a natureza da instituição hospitalar tem influência
direta nos custos. Uma vez mais, tomando por base o modelo de custos de um
hospital público estadual de Santa Catarina e a necessidade de recursos humanos
disponíveis para o funcionamento de um serviço de transplantes, contínuo e de
tempo integral, passa-se a ter um componente de custo fixo da manutenção da
equipe de saúde para cobertura das atividades. Ainda se se considerar que, por não
se tratarem de procedimentos eletivos, um mínimo de 3 profissionais médicos e 2
profissionais de enfermagem devem trabalhar em regime que permita uma resposta
adequada e contínua. Cabe ressaltar que nos transplantes de pulmão e coração,
distintamente de outros órgãos, a retirada do enxerto é atribuição exclusiva da
equipe transplantadora, tornando a questão da disponibilidade algo ainda mais
relevante.
Na mesma linha de um exercício de simulação de custos e tendo por bases
os valores brutos correspondentes ao vencimento dos profissionais de saúde da
SES (posição 14F para nível superior e 11F para nível médio), ter-se-ia um custo
fixo anual de R$ 313.564,81, conforme se demonstra no Erro! Fonte de referência não
encontrada..
Quadro 4: Vencimentos dos profissionais da saúde
Profissional
Médico
Enfermeiro
Técnico de
atividades
administrativas
Vencimentos
mês (R$)
7.343,43
3.218,18
Plantão/sobreaviso
mês (R$)
5.021,04
5.021,04
3.516,68
14.078,29
10.042,08
Valor
mensal (R$)
12.364,47
8.239,22
Valor anual
(R$)
160.738,11
107.109,86
3.516,68
45.716,84
24.120,37
313.564,81
Fonte: SES-SC (2013).
O custo varíável de cada procedimento foi calculado para estimativa dos
custos de centro cirúrgico e hotelaria, com base nos dados dos centros de custos do
Instituto de Cardiologia de Santa Catarina. Os demais itens da composiçao de custo
84
tem por base um detalhado estudo de 3 procedimentos realizados em 2003 no
Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (GONÇALVES;
DOEHLER, 2004), conforme se pode verificar no Erro! Fonte de referência não
encontrada..
A despeito da defasagem que possam apresentar alguns valores do referido
estudo, destaca-se que a hotelaria e a sala cirúrgica representam 65% dos custos
do procedimento. Destaca-se que os valores de honorários profissionais não estão
incluídos por se tratarem, nesta simulaçao, de custos fixos, já que se trabalha com a
hipótese de profissionais contratados do serviço público.
Quadro 5: Resumo do Custo Variável do Transplante em Instituição Pública de
Santa Catarina
Composição do Custo
Hotelaria/Total das diárias
Taxa de sala/cirurgia
SADT
Materiais
Medicamentos
Materiais cirúrgicos
Líquidos de perfusão
Custo total
Fonte: SES-SC (2013).
Valor Unitário/Quantidade
Custo
578,43 – 40 dias
R$ 30.71/min - 300 min
R$ 23.137,20
R$ 9.213,00
R$ 3.985,06
R$ 771,90
R$ 6.897,60
R$ 1.835,87
R$ 9.968,16
R$ 55.808,79
Somando-se, então, mesmo que não de forma exata, os custos anuais para
manter uma equipe de transplante pulmonar em atividade e os custos hospitalares
do procedimento – presumindo-se que seja realizada uma média ideal máxima de 27
procedimentos/ano – ter-se-ia um valor de R$ 1.830.402,14 (R$ 313.564,81+ R$
1.506.837,33) para manutenção de um serviço de transplante pulmonar em
funcionamento 24h por dia, 365 dias por ano.
A receita gerada pelo transplante pulmonar pode ser calculada a partir da
remuneração estabelecida pelo SUS para este procedimento: código 05.05.02.008-4
do Sistema Informatizado de Custos (SIGTAP) que é de R$ 44.485,10, sendo
componente de serviço hospitalar R$ 40.036,60 e o serviço profissional R$ 4.448,50
(SIGTAP, 2013). Os valores mencionados podem sofrer variação em decorrência da
aplicação da Portaria GM 845 de 02 de maio de 2012, que institui o incremento
financeiro para a realização de procedimentos de transplantes e o processo de
doação de órgãos (BRASIL, 2012). Este programa de custeio diferenciado
incrementa os valores dos procedimentos relacionados ao processo de doação e
85
transplantes de órgãos e tecidos, constantes na Tabela Unificada do Sistema Único
de Saúde nos seguintes percentuais (
e Erro! Fonte de referência não encontrada.).
Quadro 6: Classificação dos estabelecimentos de saúde e percentuais de
incremento na remuneração
Tipo
I
II
III
IV
Nível
A
B
C
D
IFTDO
60%
50%
40%
30%
Fonte: Brasil (2012).
Quadro 7: Caracterização dos distintos níveis estabelecimentos de saúde
NÍVEL
Caracterização
Estabelecimentos de saúde autorizados para 4 ou mais tipos de
transplantes de órgãos sólidos ou autorizados para pelo menos 1 tipo de
Nível A
transplante de órgão sólido e para transplante de medula óssea
alogênico não aparentado.
Estabelecimentos de saúde autorizados para 3 tipos de transplantes de
Nível B
órgãos sólidos.
Estabelecimentos de saúde autorizados para 2 ou mais tipos de
transplantes de órgãos sólidos ou para pelo menos 1 tipo de transplante
Nível C
de órgão sólido e para transplante de medula óssea alogênico
aparentado.
Estabelecimentos de saúde autorizados para 1 tipo de transplante de
Nível D
órgão sólido.
Fonte: Brasil (2012).
A portaria estabelece ainda em seu artigo terceiro que os estabelecimentos
devem apresentar à Coordenação Geral do Sistema Nacional de Transplantes, por
meio das centrais estaduais de transplantes, relatórios com os seguintes indicadores
de qualidade: número de transplantes, por órgão, no ano anterior ao do relatório;
número de transplantes por milhão de população, por órgão, no ano anterior ao do
relatório; curva de sobrevida dos pacientes, por tipo de transplante, no ano anterior
ao do relatório; e curva de enxertos funcionantes, por tipo de transplante, dos dois
últimos anos anteriores ao relatório.
A aplicação da referida portaria gera possibilidade de incremento de 30% a
60% nos valores repassados pelo SUS aos estabelecimentos de saúde, permitindo
que ocorra uma variação de R$ 57.830,63 até R$ 71.176,16. Ressalta-se ainda que
86
uma instituição que inicie seu programa de transplantes pela atividade de
transplante pulmonar deveria trabalhar um ano sem qualquer incremento, por não
possuir possibilidade de enquadrar-se na referida portaria.
6.13 Número de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de
referência para transplante de pulmão e taxa de aceitação dos órgãos
disponibilizados
Pelas regras do Sistema Nacional de Transplantes, todo o excedente de
órgãos gerados em uma unidade da federação é encaminhado aos outros estados
mediante regulação da Central Nacional de Transplantes, respeitando um critério
regional de prioridade, ou seja, todo o excedente gerado em Santa Catarina deve
atender prioritariamente à Região Sul. Por razões logísticas, em especial um tempo
de isquemia fria de no máximo 4 horas, pulmões gerados em nosso estado são
oferecidos ao Rio Grande do Sul, onde também se encontram nossos pacientes em
lista de espera. No último triênio (2010, 2011 e 2012), foram aceitos e removidos 13
dos 29 doadores disponibilizados, resultando em uma taxa de aceitação de 44,82%
das ofertas.
6.14 Sobrevida pós-transplante
A sobrevida pós-transplante é um indicador que está relacionado diretamente
com a captação do doador e com a seleção do receptor. No Brasil, os registros
informam que a taxa de sobrevida, contada a partir de 2010, foi de 53% em 1.200
dias pós-transplante, conforme se pode verificar na
87
Figura 13.
Figura 13: Sobrevida pós-transplante pulmonar
88
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2012).
89
7 DISCUSSÃO
A proposta deste estudo foi avaliar a viabilidade de um centro de transplante
pulmonar no Estado de Santa Catarina e, para isso, utilizou-se a metodologia de
Multicritério de Avaliação (MCDA).
O MCDA é uma ferramenta que auxilia o gestor a administrar seus problemas
de acordo com suas percepções de valor, levando em consideração aspectos
qualitativos e quantitativos. “Um problema pertence a uma pessoa (ou instituição),
isto é, ele é uma construção pessoal que o indivíduo faz sobre os eventos
associados ao contexto decisório”. (ENSSLIN; MONTIBELLER NETO; NORONHA,
2001, p. 75).
A metodologia MCDA construtivista permite uma evolução específica do
conhecimento no processo de apoio à decisão, ou, ainda, considera um
desenvolvimento progressivo do entendimento do processo decisório dentro de
algumas particularidades.
Tratar-se-á nesta etapa de discutir a estruturação do problema, considerada
como sendo a fase mais importante relacionada à atividade de estudo de problemas
complexos nas organizações.
A metodologia Multicritétio de Apoio à Decisão Construtivista (MCDA-C)
adotada neste trabalho segue a corrente de pensamento da escola europeia
(Multicriteria Decision Aid), segundo a vertente construtivista. Adotar a perspectiva
da MCDA-C significa acatar os seguintes entendimentos:
a) um problema é configurado como tal se for assim percebido por alguém (tem um
dono); resultante de uma situação percebida como necessitando de intervenção;
suficientemente relevante; passível de solução. Santa Catarina não realiza
transplantes pulmonares, apesar de ser um estado de relevante importância no
cenário brasileiro dos transplantes de órgãos e tecidos. Isso ocorre em função da
pouca demanda, da dificuldade técnica de implantar este serviço na região ou
pela
inviabilidade
financeira?
Que
ganhos
seriam
proporcionados
aos
catarinenses que necessitam transplante pulmonar? Teriam melhor acesso e
melhores resultados?
b) o entendimento do problema pressupõe a noção de produção de conhecimento
por meio da descoberta de como o sujeito valora o contexto no qual o objeto se
encontra; assim, levam-se em conta os sistemas de valores, as convicções e os
90
objetivos dos envolvidos, o momento atual e o grau de entendimento do decisor
sobre todo o contexto.
c) o reconhecimento do fato de que “não existe apenas um conjunto de ferramentas
adequado para esclarecer uma decisão nem existe uma única melhor maneira de
fazer uso delas”.
Dentro do estudo da viabilidade de um centro de transplante pulmonar em
Santa Catarina, procedeu-se à seleção de alguns critérios que se entende serem
relevantes e que foram agrupados de forma acadêmica em: demanda/oferta,
implantação, manutenção e eficiência, cada um contendo seus Pontos de Vista
Fundamentais, com intuito de facilitar a compreensão da nossa visão do problema e
que serão discorridos a seguir.
7.1
Demanda e Oferta
A escassez de órgãos para transplante constitui um fator limitante
fundamental para esta terapêutica. A demanda cresce de maneira exponencial à
medida que melhoram os resultados de sobrevida, porém a taxa de doação não
acompanha o mesmo ritmo.
É fundamental reconhecer a limitação que a questão da doação impõe à
realização dos transplantes. Mesmos nas regiões com melhores taxas mundiais de
doação, existe uma consistente insuficiência de oferta de órgãos torácicos para
transplante, sendo as dificuldades para obter pulmões ainda maiores que para a
obtenção do coração. Na
91
Figura 14, pode-se observar a disparidade entre demanda estimada e oferta de
transplantes para os diversos programas existentes no Brasil. Observa-se que o
pulmão possui o pior desempenho nessa análise.
Figura 14: Relação entre a necessidade estimada de transplante
e o número de procedimentos realizados em 2012
Necessidade estimada (■) e nº de
20.000
transplantes realizados (■) no Brasil
em 2012
15.000
10.000
Necessidade
Transplantes realizados
5.000
0
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
O Brasil realizou 522 transplantes pulmonares em 23 anos desta atividade no
país, sendo 69 no ano de 2012. Comparando com a Espanha, nossa taxa ainda é
baixa. Conforme dados da Organização Nacional de Transplantes (ONT) da
Espanha, foram realizados, de 1990 a 2007, 1.827 transplantes pulmonares e esses
números vêm crescendo anualmente (DEL RIO et al., 2009). A Espanha é um país
de referência em doação e transplante de órgão no mundo todo, e isso
particularmente ocorreu pela adoção de estratégias na melhora da doação de
órgãos (MATESANZ, 2008). O Brasil possui o maior sistema público de transplante
do mundo, o Sistema Nacional de Transplante, sustentado pelo SUS, e que
92
aperfeiçoou e regulamentou os transplantes de órgãos e tecidos em todo o país e
estabeleceu unidades de coordenação em todos os estados da federação, porém
ainda apresenta um cenário de acesso aos transplantes bastante desigual entre a
população residente nos diversos estados, com vantagens para os estados mais
desenvolvidos do Sul e do Sudeste. Na
Figura 15, pode-se analisar a taxa de doação efetiva p.m.p e os órgãos
transplantados em cada região do país. Destaca-se a disparidade entre as cinco
regiões geográficas. O maior número de transplantes está concentrado nas regiões
Sul e Sudeste, que detêm mais da metade da população brasileira.
Figura 15: Taxa de doação efetiva por milhão de população e transplantes
realizados nas regiões brasileiras no ano de 2012
93
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
A necessidade de transplante pulmonar, segundo Garcia (2000), é estimada
em 3 - 5 transplantes por milhão de população por ano (p.m.p./ano). O Rio Grande
do Sul, para onde são encaminhados os pacientes catarinenses, obteve uma taxa de
3,1 transplantes pulmonares p.m.p./ano no ano de 2012, portanto dentro de média
aceitável para este tipo de transplante.
Como a distribuição dos órgãos doados ocorre prioritariamente na unidade da
federação onde órgão é gerado, nossa base populacional para geração de doadores
é de 6,2 milhões de habitantes. Aqui é fundamental ressaltar que a maior limitação à
implantação de um serviço de transplantes é a escassez de órgãos. Na hipótese de
implantar um serviço em Santa Catarina, perder-se-iam na base de procura por
94
doadores os 10 milhões da população gaúcha, tendo em vista a distribuição
prioritariamente regional dos órgãos.
Considerando a média calculada de 3-5 transplante por milhão de população
por ano, haveria, para a população de Santa Catarina, uma média ideal de 18-30
procedimentos/ano, porém se se contar ainda que a mortalidade mínima em fila de
espera gira em torno de 10%, este número cairia para 16-27 procedimentos/ano.
Pelos dados do Rio Grande do Sul, existem 10 pacientes catarinenses em controle
pós-transplante e mais 10 em fila de espera, mostrando que nosso número ainda se
mantém baixo para os padrões de necessidade. Conforme Matesanz (2012), na
Espanha, em comunidades pequenas que não dispõem de todos os programas de
transplante, sobretudo o pulmonar, é necessário que se estabeleça o fluxo de
receptores a um centro de referência, que deve zelar pela igualdade de acesso ao
transplante para todos os cidadãos. Essas referências são estabelecidas com pactos
entre as comunidades autônomas, e a oferta dos órgãos das regiões de origem dos
pacientes segue a mesma lógica do encaminhamento dos pacientes. Esta
organização otimiza o funcionamento de centros de transplante mesmo em
comunidades uniprovinciais sem grandes populações. Na Espanha, país com 47
milhões de habitantes, existem 6 centros de transplante pulmonar que, juntos,
realizaram 235 transplantes (5.0 p.m.p./ano) em 2010, ano em que a atividade
brasileira foi de 60 procedimentos ao ano (0.4 p.m.p./ano) (MATESANZ, 2012;
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012).
Muito importante assinalar que o número de pacientes candidatos a
transplante pulmonar não deve, necessariamente, se ampliar com a abertura de um
novo centro transplantador em Santa Catarina. Admite-se que o gargalo desse
serviço de alta complexidade não seja somente a oferta em si do procedimento,
mas, talvez, da rede especializada no atendimento, no reconhecimento ou, ainda,
encaminhamento dos pacientes candidatos ao transplante pulmonar. É fundamental
destacar que esse número de transplante necessário, ou seja, a demanda tem
impacto direto na viabilidade econômica e técnica da implantação de um serviço em
nosso Estado.
Por outro lado, segundo a Lei de Roemer (1961, p. 38) “um serviço de saúde
tem a capacidade de gerar a sua própria demanda, mesmo em mercados
saturados”. Isto significa que o âmbito das relações de mercado na área da saúde
está sujeito a um mecanismo invertido que determina a oferta de algum serviço de
95
saúde, uma capacidade extraordinária de induzir a criação da demanda para o seu
consumo. Nesse sentido, prevê-se uma tendência de utilização plena da capacidade
instalada de serviços de saúde em geral e do serviço de transplante de pulmão em
particular (ROEMER, 1961).
Além disso, estudos de avaliação da evolução das demandas futuras,
associadas à carga de doença no mundo, indicam que as doenças obstrutivas
pulmonares crônicas, que ocupavam a décima primeira posição em 1990, passarão
à quinta posição entre as doenças responsáveis pela maior parte dos anos perdidos
por incapacidade no mundo em 2020, sugerindo que a tendência da demanda por
transplante de pulmão aumentará nos próximos anos (MURRAY; LOPEZ, 1996).
Com tais indicações, é possível imaginar que a demanda atual por transplante
de pulmão, que se encontra em torno de três transplantes pmp/ano, poderá
aumentar, dentro do parâmetro indicado por Garcia (2000), para até cinco
transplantes por milhão de população/ano. Nesse caso, a demanda por transplante
em Santa Catarina pode ser estimada, para fins de avaliação de viabilidade de um
novo serviço de transplante de pulmão, como sendo de até 32 transplantes/ano.
Os dados de 2011 apontam que 50% da demanda máxima estimada, 15 dos
35 potencias pacientes, tiveram sua avaliação inicial. Levando em conta que todos
os processos de TFD novos para transplante pulmonar foram autorizados, impõe-se
uma análise mais detalhada das razões pelas quais os pacientes não são
encaminhados para o procedimento. A falta de acesso a consultas especializadas
em pneumologia e o escasso conhecimento acerca dos reais benefícios do
transplante pulmonar pelos especialistas podem fazer parte do universo deste
problema. Embora exista divulgação para as gerências regionais de saúde acerca
do acesso aos serviços de transplantes que não se dispõem em Santa Catarina, é
fundamental admitir este aspecto como outro possível ponto crítico.
A análise dessa variável sugere que, para além da implantação de um novo
centro de transplante pulmonar, é fundamental refletir sobre possíveis falhas
assistenciais em todas as etapas do processo de atendimento do paciente com
indicação do procedimento.
Em relação ao número de pulmões disponibilizados, viu-se que, apesar do
nosso estado ocupar o primeiro lugar do país na taxa de doador efetivo pmp/ano
(26,4), apenas 6% dos doadores geraram pulmões possivelmente úteis para
transplante. Em um estudo realizado na Espanha, um dos maiores centros de
96
transplantes do mundo, a taxa de aproveitamento dos pulmões em doadores de
múltiplos órgãos entre os anos de 1997 e 2004 foi em torno de 11% (DEL RIO et al.,
2009).
Isso ocorre porque em torno de 70 a 80% dos doadores de múltiplos órgãos
apresentam algum tipo de lesão pulmonar (edema, contusão ou aspiração), o que
inviabiliza a utilização dos pulmões. Além disso, os órgãos não podem ser estocados
por muito tempo, no caso do pulmão, em torno de 4 a 6 horas. Assim, no Brasil, de
cada oito potenciais doadores, apenas um é notificado e somente 20% desses são
utilizados como doadores de múltiplos órgãos (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA,
2011). Conforme a experiência brasileira, sabe-se que não mais do que 15% dos
doadores de rins se mostram aptos ao aproveitamento simultâneo de um dos
pulmões e apenas cerca de 30% deles têm ambos os pulmões normais. Por outro
lado, é dramática a constatação da má qualidade média das UTIs de trauma,
principal fonte potencial de doadores, nas quais com grande frequência se observa a
perda da condição pulmonar em período de poucas horas por descasos técnicos,
como hiperhidratação, aspiração de vômitos, manejo contaminado de vias aéreas,
etc. (CAMARGO; CAMARGO, 2006). É importante que haja padronização nas
medidas a serem adotadas no potencial doador e que ele seja visto sempre como
um doador de múltiplos órgãos. Pode-se concluir, então, que o aproveitamento do
pulmão para o transplante depende das peculiaridades do próprio órgão e das
condições técnicas do centro transplantador. Sendo Santa Catarina o estado com
maior taxa de doador efetivo pmp no ano de 2012, pode-se inferir que não foi esse
último critério que resultou no baixo aproveitamento do pulmão, mas sim, e
provavelmente, as dificuldades e as características inerentes ao próprio órgão.
7.2
Implantação
A implantação de um serviço de transplante pulmonar pressupõe a
necessidade, a viabilidade e as vantagens deste serviço no Estado. Elencam-se
como Pontos de Vista Fundamentais os itens descritos em 7.2.1 e 7.2.2.
7.2.1 Tempo e mortalidade na fila de espera
97
O fenômeno de disparidade geográfica em transplantes de órgãos é
amplamente relatado na literatura (MORRIS; MONACO, 2003). Existem relatos do
problema em países desenvolvidos como Austrália, Espanha, Estados Unidos,
França e Reino Unido. No Brasil, as eventuais consequências desse fenômeno
podem ser agravadas pelas dimensões continentais do país, como já se viu
anteriormente. Entretanto, não existem indicadores oficiais gerais do tempo de
espera nas filas e de outras variáveis relevantes relacionadas aos transplantes de
órgãos no Brasil.
O transplante de órgãos, em nosso país, por doação ao Estado, somente
pode ser feito após a morte encefálica do doador, que pode ser natural ou acidental,
e com o concomitante funcionamento dos órgãos que serão doados, após
obrigatório consentimento familiar. A morte encefálica deve ser devidamente
diagnosticada por uma equipe médica e o transplante autorizado pelo SNT. Uma vez
constatada por médicos a necessidade de transplante, o paciente candidato a
receptor é colocado na fila. A fila para transplantes no SUS para cada órgão ou
tecido é única e o atendimento é por ordem de chegada, considerando critérios
técnicos, geográficos, de compatibilidade e de urgência específicos para cada órgão,
de acordo com a Portaria nº. 91/GM/MS 10, de 23 de janeiro de 2001 (MARINHO;
CARDOSO; ALMEIDA, 2010).
Barr et al. (2005) relataram que o número de pacientes na lista de espera
para transplante pulmonar nos EUA têm progressivamente aumentado devido a
fatores que tornaram o transplante pulmonar uma técnica bem aceita para o
tratamento de doenças pulmonares em fase avançada, como, por exemplo,
melhoras no manuseio dos doadores, na técnica operatória, na imunossupressão e
nos cuidados pós-operatórios. Segundo esses autores, havia 3888 pacientes na lista
de espera nos EUA ao final de 2003, número que representava um aumento de
147% em relação há dez anos. Esses mesmos autores relatam que, no mesmo
período, houve um aumento de apenas 51% no número de órgãos disponíveis,
mostrando que há uma desproporção entre os doadores e os receptores (2005).
Um estudo mais recente, realizado nos EUA, mostrou que, no ano de 2005,
após a implantação de um sistema efetivo de aproveitamento do pulmão do doador
(LAS - lung allocation score system), que basicamente aumentou as notificações e
as taxas de consentimento, melhorou o manejo do potencial doador e os critérios de
expansão do doador e houve uma diminuição no número de pacientes ativos em
98
lista de espera, no tempo de espera e na taxa de mortalidade. Em 1999, o tempo
médio de espera em fila era de 2.897 dias e em 2005 a 2008 foi de 200 dias em
média/ano. A morte em fila de espera, que em 1999 era de 190,5 por 1000 pacientes
/ano, baixou em 2006 para 103,5 por 1.000 pacientes/ano (YUSEN et al., 2010).
A Espanha, país que também possui um sistema nacional de transplantes
eficiente e que realiza uma média de 150 transplantes pulmonares por ano, possui
um tempo médio em fila de espera de 187,2 dias (BORRO, 2005).
No Brasil, um estudo onde foram avaliados alguns aspectos dos transplantes
de órgãos nas Unidades da Federação, nos anos de 2004, 2005 e 2006, mostrou
resultados que indicaram redução no tempo de fila de espera por alguns órgãos
(córnea e pâncreas); elevação em outros (fígado, coração, rim/pâncreas) e ligeiras
flutuações, sem tendência muito definida, nos transplantes de rim e nos transplantes
de pulmão ao longo do período estudado. Os estados das regiões Sul, Sudeste (com
a exceção do Rio de Janeiro) e Centro-Oeste, tiveram os menores tempos de
espera, as maiores produtividades e a maior capacidade de realização de
transplantes do país (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2007).
Atualmente, no Brasil, segundo o Registro Brasileiro de Transplantes (RBT),
existem 165 pacientes ativos em lista de espera para transplante pulmonar até
dezembro de 2012, assim divididos: 3 no Ceará, 14 em Minas Gerais, 54 no Rio
Grande
do
Sul
e
97
em
São
Paulo
(ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA
DE
TRANSPLANTE..., 2013). Os dados obtidos no serviço da Santa Casa de Porto
Alegre mostram 30 pacientes em lista de espera.
Marinho, Cardoso e Almeida, em estudo realizado em 2010, comparando o
tempo em fila de espera dos diversos órgãos e tecidos no Brasil, mostraram que,
para o transplante pulmonar, o limite inferior de tempo de espera foi de 1,14 anos
em 2004; 1,35 anos em 2005; e 1,03 em 2006. Os limites superiores seriam iguais
ao dobro desses valores. No serviço da Santa Casa de Porto Alegre, local para onde
são encaminhados nossos pacientes catarinenses, o tempo em lista de espera teve
uma variação muito grande de 30 dias a 5 anos, porém mais da metade dos
pacientes (66,7%) permaneceu entre 6 meses a 2 anos em fila de espera. Apesar de
o nosso país ter um grande destaque no cenário mundial de transplantes,
principalmente no transplante renal, ainda possui, para o transplante pulmonar, um
tempo em fila de espera muito além dos padrões internacionais (ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013).
99
A demora no atendimento exerce impactos significativos sobre o bem-estar;
as probabilidades de cura; a sobrevida dos enxertos e dos pacientes; a natureza e a
extensão das sequelas nos pacientes, nos familiares envolvidos e na sociedade.
Pior situação ocorre quando, além de elevados, os prazos são imprevisíveis. Com tal
agravante, as incertezas decorrentes da imprevisibilidade impedem o planejamento
das vidas dos pacientes e dos seus familiares, da atuação do sistema de saúde e do
funcionamento do sistema produtivo em que eles por ventura trabalhem. Tempo de
espera elevado implica, além dos custos e dos sofrimentos dos pacientes na fila, o
aproveitamento de órgãos de qualidade inferior e a consequente redução do tempo
de duração dos enxertos (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2010).
Um estudo brasileiro, realizado num serviço de transplante pulmonar de São
Paulo, revelou que havia, de 2001 a 2008, 164 pacientes em lista de espera para
transplante pulmonar. Desses, 31 pacientes do total de 164 (18,9%) faleceram
enquanto aguardavam em lista e o restante (133/164, 81,1%) se enquadrava em
uma das seguintes categorias: aguardando em lista (62/164, 37,8%), vivo após ter
sido transplantado (45/164, 27,4%) ou falecido após ter sido transplantado (26/164,
15,9%) (SILVA JR. et al., 2009).
Com relação à taxa de mortalidade em fila de espera, o Rio Grande do Sul
apresentou um índice de 31,94% até dezembro de 2012 e 20,89% no primeiro
trimestre de 2013, índice também considerado alto para padrões internacionais, que
giram em torno de 10% (YUSEN et al., 2010). Sendo esse índice relativamente alto,
sabendo-se que o tempo de espera está diretamente relacionado à mortalidade e o
prejuízo que esta demora acarreta a vida do paciente, será que a implantação de
outro serviço de transplante na Região Sul, particularmente em Santa Catarina, não
ajudaria a diminuir essas taxas? Pode-se analisar esta questão de duas maneiras:
considerando que um centro de transplantes em SC supriria as necessidades
apenas do nosso estado, ter-se-ia tecnicamente um tempo de espera menor, porém,
se se considera que o transplante pulmonar é um tratamento muito específico para
uma população pequena, haveria uma demanda pequena e uma captação menor
ainda, aumentando com isso o tempo em fila de espera para o transplante.
7.2.2 Custo de implantação
100
A economia da saúde seria o ramo do conhecimento que tem por objetivo a
otimização das ações de saúde, ou seja, o estudo das condições ótimas de
distribuição dos recursos disponíveis para assegurar à população a melhor
assistência à saúde e o melhor estado de saúde possível, tendo em conta meios e
recursos limitados (DEL NERO, 1995).
A responsabilidade governamental é enorme quando se trata do uso racional
dos recursos públicos investidos em saúde. Isto quer dizer destinar recursos de
forma a se obter resultados positivos nos indicadores de saúde selecionados para
medir o impacto das políticas e dos programas públicos. Dentro desta visão, é
importante a discussão sobre o papel dos serviços de saúde:
a) Os serviços de saúde têm conseguido promover saúde?
b) Quais os princípios que regem a organização e o financiamento desses serviços?
c) É possível manter certo número de serviços disponíveis sempre que necessários
e em todas as localidades?
d) É possível diminuir o custo dos serviços sem alterar sua qualidade?
A função do gestor público está diretamente relacionada a esses
questionamentos. O transplante pulmonar é um procedimento muito específico para
uma população pequena. Assim, qual sua melhor opção: fornecer um centro de
qualidade e eficiência para a população em nosso estado, ou fornecer o acesso a
um dos melhores centros de referência do país?
Dentro dessa visão, a análise de custos, tanto para implantação como para
manutenção de um centro de transplante em nosso estado, se torna irrelevante a
partir do momento que esse serviço próprio proporcione um aumento na demanda e
na oferta do órgão, um menor tempo e mortalidade em fila de espera e uma melhora
na sobrevida e na qualidade de vida desses pacientes.
Os custos para implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa
Catarina foram divididos em três cenários, com o único objetivo de se estimar um
cálculo, que, longe de ser exato, proporcione uma pequena demonstração dos
gastos efetivos nesse processo: instalação de área física e investimento em
recursos humanos; utilização de área física preexistente e investimentos em
recursos humanos e utilização tanto de área física como de recursos humanos
preexistentes.
101
Conforme registro da ABTO, atualmente, Santa Catarina possui 6.248.436
habitantes, numa extensão territorial de 95.346,18 km², tendo 225 hospitais, sendo
22 na capital e 203 no interior do estado. Tem 901 leitos de UTI e 66 hospitais
possuem mais de 80 leitos. Registra 28 hospitais com serviço de neurocirurgia e 28
com Comissão Intra-Hospitalar de Doador de Órgãos e Tecidos para Transplante
(CIHDOTTs). Dentro desse contexto, há de se supor que a implantação de um
serviço de transplante no Estado de Santa Catarina se enquadra no segundo
cenário, no qual haveria alguns centros de unidade de terapia intensiva com
qualidade suficiente para manter o serviço de transplante em funcionamento
(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013).
Na Espanha, um dos modelos de maior sucesso em transplantes do mundo, e
que serve de exemplo para diversos países, inclusive o Brasil, recomenda-se que,
em grandes hospitais que possuem centros ativos de transplantes, a equipe seja
formada por um médico e por um número de enfermeiros igual ao número de
programas de transplantes (rim, fígado, pulmão, coração e outros) que permaneçam
por tempo integral. Em hospitais pequenos e médios, sem programa de transplante,
porém com unidades de terapia intensiva, que a equipe seja composta por um
médico em tempo parcial; ajudado por uma enfermeira, dependendo da capacidade
potencial de geração de órgãos (MATESANZ, 2008).
Além do serviço de unidade de terapia intensiva, os hospitais que têm serviço
de neurocirurgia possuem maior capacidade de gerar potenciais doadores de órgãos
dada a gravidade e a complexidade dos pacientes que internam com patologias
neurológicas e neurocirúrgicas agudas que podem evoluir para morte encefálica.
Santa Catarina possui 28 hospitais com serviços de neurocirurgia já instalados e
funcionando.
As vantagens de se ter uma comissão intra-hospitalar de doação de órgão e
tecido para transplante num determinado serviço seriam: manter uma logística de
atuação intra-hospitalar frente a um potencial doador; valorização mais adequada
dos potenciais doadores subótimos e idosos e uma maior participação; implicação e
conscientização hospitalar no processo de doação e transplante de órgãos. Santa
Catarina possui 28 CIHDOTTS distribuídos nos hospitais do estado.
Dentro do exposto, haveria um cenário considerado satisfatório em termos de
estrutura hospitalar para a implantação de um centro de transplante pulmonar em
Santa Catarina. Pode-se, ainda, sugerir que, na avaliação da capacidade instalada
102
para transplante no Estado, conforme se vê na Figura 8, Blumenau, por concentrar
um número considerável de transplantes de outros órgãos e por possuir serviço de
transplante cardíaco (órgão estreitamente ligado ao pulmão), seria, na possibilidade
de implantação de um serviço de transplante pulmonar, a região mais favorável do
estado.
7.3
Manutenção
A manutenção de um serviço de transplante pulmonar depende e está
diretamente relacionada à primeira etapa. A partir do momento que exista uma
demanda de transplantes adequada, consegue-se manter a atividade e os custos de
um centro de transplante. Nessa fase, a qualidade do serviço depende muito
intimamente da quantidade dos procedimentos realizados. Destaca-se alguns
Pontos de Vista Fundamentais:
7.3.1 Curva de Aprendizado
Na fundamentação do conhecimento médico, na medicina como tal,
encontram-se todas as práticas que se desenvolvem a partir do momento em que
esse conhecimento é aplicado a doentes e contextos concretos. O conhecimento
médico “puro” é transformado no decorrer da sua aplicação e se concretiza por meio
das suas utilizações. A curva de aprendizado nada mais é do que o tempo
empregado para que a prática clínica permita estabelecer uma experiência passível
de segurança e eficácia. Está diretamente relacionada com o número de
procedimentos realizados e quanto maior for, mais habilidade e mais confiança.
A base da teoria da curva de aprendizado é simples: um trabalhador aprende
com o seu trabalho e quanto mais frequente ele repete a operação, mais eficiente se
torna e melhores resultados se obtêm. O conceito de curva de aprendizado foi
introduzido na medicina nos anos 1980, principalmente depois do advento da
cirurgia minimamente invasiva (SUBRAMONIAN; MUIR, 2004).
Os métodos para definir uma curva de aprendizado na cirurgia (surgical
learning curve) são basicamente dois:
a) o tempo que se leva, e/ou
103
b) o número de procedimentos que um cirurgião médio necessita para ser capaz de
desempenhar um procedimento com um resultado razoável. Isto pressupõe a
capacidade de identificar um cirurgião médio.
As learning curves (ou curvas de aprendizagem) referem-se às vantagens de
custo que são obtidas por meio do acúmulo de experiência no processo de
produção. No caso em questão, tem-se que o que é medido é o tempo das cirurgias
e/ou o número de procedimentos realizados. Os benefícios da aprendizagem se
manifestam, eles próprios, em menores custos, na melhoria da qualidade e nos
menores preços.
Fatores que afetam a curva de aprendizagem:
a) Eficiência da mão de obra: os cirurgiões tornam-se fisicamente mais hábeis e
tornam-se mais habilidosos. Eles se tornam mentalmente confiantes e gastam
menos tempo hesitando, aprendendo, experimentando ou cometendo erros.
b) Padronização, especialização e melhoria nos métodos de produção: à medida
que o processo de produção ocorre e criam-se protocolos incorporando o
aprendizado obtido, a eficiência tende a aumentar.
Quando os cirurgiões se especializam num limitado conjunto de tarefas e
cirurgias, eles ganham mais experiência com aquelas tarefas e operam a uma taxa
mais rápida, com isso aprendem a programar o processo produtivo com maior
eficácia, conforme o tempo que exercem esse procedimento.
As curvas de aprendizado dependem também da frequência com que os
procedimentos são realizados num período específico. Estudos sugerem que as
taxas de complicação são inversamente proporcionais ao volume de cirurgias
realizadas (HU; CLARK; MA, 2003). Um estudo realizado nos EUA, para determinar
a relação entre a experiência com transplante cardíaco e a mortalidade após
procedimento, revelou uma taxa de mortalidade mais alta nos pacientes que
receberam os primeiros 5 transplantes quando comparados aos que receberam o
transplantes subsequentes: 20% versus 12% (LAFFEL et al., 1992). De um modo
geral, com relação à cirurgia, quanto maior a prática cirúrgica, menor o tempo de
procedimento, menores as complicações e maior o sucesso da intervenção.
A
curva
de
aprendizado
também
está
diretamente
relacionada
à
complexidade do procedimento. Em um artigo de revisão que comparava técnicas
cirúrgicas de ressecção hepática, viu-se que a intervenção por laparoscopia exige
um tempo maior na curva de aprendizado quando relacionada à cirurgia
104
convencional (HERMAN et al., 2009). A cirurgia de transplante pulmonar é
considerada um procedimento de alta complexidade, que requer aperfeiçoamento
específico. Envolve uma equipe multidisciplinar e seus resultados interferem na
sobrevida dos pacientes transplantados (REYNARD et al., 2003). Da mesma forma,
Laffel et al. (1992), em seu estudo, encontraram relação entre o treinamento
específico da equipe de transplante e a taxa de mortalidade dos pacientes
transplantados e concluíram que quanto maior a experiência em transplante, melhor
o seguimento dos pacientes transplantados. Sendo assim, quantas cirurgias são
necessárias para que o médico alcance experiência suficiente para manter sua
expertise e, ainda, quantas cirurgias são necessárias para que ele mantenha essa
sua competência?
Na avaliação de um centro de transplante pulmonar no Estado, precisa-se
lembrar de que, atualmente, nossos pacientes são encaminhados a um serviço
referendado como um dos melhores do país, senão o melhor, com uma liderança
nacional na quantidade de cirurgias de transplantes pulmonar. Qual seria, então,
para o Estado de Santa Catarina, o número viável de cirurgias para manter a mesma
qualidade do serviço atual? Viu-se que, conforme dados do CNDCD/RS, existem,
hoje, 10 pacientes catarinenses em acompanhamento pós-transplante no serviço do
RS, levando-se em conta que a estimativa ideal é de 3-5 pmp/ano de transplante
pulmonar, considerando a população catarinense em torno de 6,2 milhões, ter-se-ia
18 a 30 transplantes por ano. Descontando a mortalidade em lista no último ano no
RS em torno de 30%, haveria um número ideal máximo de 21 transplantes pm/ano.
Com esse cenário, haveria uma média de 1,75 transplantes/mês.
Um estudo interessante realizado por Serra (2007) analisa a construção e a
reprodução do conhecimento técnico médico numa unidade de transplante hepático.
Por ser um estudo observacional e de entrevistas, em várias ocasiões, foi possível
constatar que alguns doentes, imediatamente antes de tomarem contacto com a
unidade transplantadora, tinham como referência um dos elementos da equipe. Ela
mostra que a importância da experiência clínica é, de fato, fundamental também do
ponto de vista da opinião pública “de uma forma geral, os médicos, e os serviços a
que estão associados, são reconhecidos pelo número de casos tratados, pelos
resultados que apresentam e pelos anos de experiência em áreas específicas de
intervenção”. Ela ainda conclui que, “seja qual for o motivo, a experiência tem
primazia na formação médica”. Assim, a experiência acumulada também permite ao
105
serviço conquistar um lugar de referência no panorama nacional ou mundial. Na
análise da implantação de um serviço de transplante pulmonar em nosso estado,
precisa-se avaliar se é possível manter a qualidade e referência do estado vizinho,
onde são encaminhados nossos pacientes atualmente e que possui essa referência
no panorama nacional (SERRA, 2007).
7.3.2 Custo de manutenção
Antes de se avaliar o custo para manter um centro de transplante pulmonar
em nosso estado, é importante lembrar que a doença pulmonar obstrutiva crônica
(DPOC), uma das principais indicações para o transplante pulmonar, é também uma
das principais causas de doença e de morte em todo o mundo, representando um
custo econômico e social representativo. Ela cobra seu preço de maneira perversa e
democrática, enviando a fatura para seus doentes e sua família, para governo e
sociedade. No núcleo familiar provoca preocupação, limita a vida social e o lazer,
compromete o orçamento e abrevia a vida. No campo profissional, reduz a
produtividade, antecipa a aposentadoria e é causa de pagamento de pensões e de
benefícios. Na área do Sistema de Saúde, motiva atendimentos repetidos em
pronto-socorros e em ambulatórios e é causa frequente de hospitalizações, o que
provoca despesas elevadas para governo e sociedade.
Para avaliação econômica do impacto que ela determina, duas parcelas
devem ser consideradas: os custos diretos, que incluem as depesas médicas e não
médicas associadas à doença; e os custos indiretos, que refletem as perdas
causadas pela cessação ou pela redução da produtividade causadas por
adoecimento e morte (CAMPOS, 2004).
O transplante pulmonar é uma alternativa viável para esses pacientes. Apesar
de ser um procedimento que requer uma tecnologia extremamente cara, promove
uma melhora na sobrevida e em vários domínios da qualidade de vida, justificando
assim os custos gerados pelo procedimento (GROSS; RAGHU, 1997; RAMSEY et
al., 1995).
Um estudo realizado no Canadá, onde foram acompanhados, por um período
de 4 anos, 124 pacientes submetidos a um transplante pulmonar, mostrou que o
custo de um paciente sem transplante (fila de espera) por mês é de U$ 1.102,00,
enquanto o custo de um paciente transplantado (incluindo o procedimento) é de U$
106
6.208,00 por mês (VASILIADES et al., 2005).
Em 2005, conforme registro da SNT, foram realizados 15.527 transplantes de
órgãos e tecidos no Brasil, sendo que desses, 11.095 foram pagos pelo Sistema
Único de Saúde (SUS). O gasto total com transplantes, incluindo medicamentos, em
2005 foi de R$ 521,8 milhões (MARINHO; CARDOSO, 2007).
Um estudo realizado no Rio de Janeiro mostrou que os gastos reais (cirurgias,
procedimentos associados e medicamentos) com transplante pulmonar no Brasil,
entre 1997 a 2003, foi de aproximadamente R$ 30.000,00 por paciente e que só no
ano de 2003 o gasto total com transplante pulmonar foi de R$ 1.037.986,00. Se se
comparar com os cálculos previstos para o Estado de Santa Catarina, com base em
valores atuais, ter-se-ia um dispêndio só para este estado de R$ 1.830.402,14 ou R$
67.792,67 por paciente.
Aqui, duas observações são fundamentais: Como o componente dos serviços
profissionais é fixo nesta simulação, o incremento no número de procedimentos
reduziria o custo individual para cada procedimento. Aqui, é importante destacar a
limitação imposta por nossa capacidade de gerar enxertos pulmonares que
permitiriam ampliar o número de procedimentos.
Outro ponto fundamental é o que trata dos custos variáveis dos
procedimentos. Tomando por bases nosso cálculo e somando os custos de
honorários profissionais (com base em 30 procedimentos ano, capacidade máxima,
sem contar taxa de mortalidade), tem-se que cada procedimento geraria um custo
de R$ 10.452,16 que, somados aos R$ 55.808,79 do custo variável, totalizaria R$
66.260,95. Quando se compara aos valores repassados pelo SUS para o
procedimento, variando de R$ 44.485,10 (hospital com programa de transplante
pulmonar em implantação) até R$ 71.176,16 (hospital nível A da classificação
IFTDO), tem-se uma clara sinalização de que tipo de estabelecimento pode
desenvolver este tipo de programa de transplante sem maiores riscos financeiros.
Dentro desta variação, cada procedimento pode gerar um deficit de R$ 21.775,85 ou
um superávit de R$ 4.915,21 no melhor de todos os cenários.
Atualmente os pacientes catarinenses que necessitam de transplante
pulmonar são referidos, por meio de Tratamento Fora de Domicílio (TFD), para o
serviço de Porto Alegre e isto, como citado anteriormente, gera um custo anual em
torno de R$ 25.959,54. Este custo torna-se irrisório se comparado ao custo de
manutenção de um serviço próprio, principalmente porque, a partir do momento que
107
o paciente chega ao serviço de referência, todas as suas necessidades: exames de
imagem, laboratório, pareceres das mais diversas especialidades e outros, são
executados no complexo hospitalar da referência. Este fato é muito positivo para o
paciente, pois facilita muito sua investigação, porém é mais oneroso ao centro
transplantador e deve ser levado em conta no projeto de instalação de um futuro
centro de transplante pulmonar em Santa Catarina.
7.4
Eficiência/Eficácia (Qualidade)
7.4.1 Número de pulmões efetivamente transplantados e taxa de aceitação
O uso de órgãos no Brasil é extremamente variável, excedendo 70% para rins
e fígado, 15% para coração e apenas 5% para pulmões (PEGO-FERNANDES;
GARCIA, 2010). Esses resultados menos satisfatórios para o transplante pulmonar
devem-se às peculiaridades do órgão, que o torna menos propício ao transplante
quando comparado aos outros órgãos (CAMARGO; CARAMORI, 2001).
De uma maneira geral, no Brasil, os transplantes de órgãos vêm crescendo
na última década. Apesar do transplante de rim e do fígado apresentar um
crescimento mais acentuado; o transplante de pulmão, disponível em seus seis
centros de transplante no país, também mostrou um ligeiro acréscimo, conforme
demonstrado na
Figura 16.
108
Figura 16: Número absoluto de transplantes no Brasil em 10 anos
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013).
Santa Catarina, apesar de não realizar transplante de pulmão, apresenta um
cenário favorável no país em relação à efetivação de transplantes de outros órgãos,
com uma taxa de 26,4 doadores efetivos pmp/ano.
109
Estratégias ao redor do mundo têm sido realizadas para melhorar as técnicas
de preservação do pulmão: prevenir o barotrauma do pulmão do doador, modificar
as soluções de preservação do órgão e diminuir o tempo de isquemia (ANGEL et al.,
2006; AHMED; SHLABIN; NATHAN, 2011; COBO; GALLEGOS, 2009). Apesar da
evolução dos sistemas de alocação de pulmão, tanto na Europa como nos EUA, a
taxa de aceitação de pulmão não chega a 50% (KRUEGER; BERUTTO; AUBERT,
2011). Um estudo realizado no Canadá mostrou que, mesmo com a implantação de
um protocolo para aumentar o recrutamento de pulmão, a taxa de utilização do
pulmão para transplante chegou a 33% em 2006 e 24% em 2007 e 2008 (NOISEUX
et al., 2009).
No Brasil, um estudo retrospectivo realizado no Estado de São Paulo mostrou
que, no ano de 2006, houve uma taxa de utilização dos pulmões doados muito baixa
(4%) em relação às taxas médias mundiais. Conforme Pego-Fernanades et al.
(2008), os motivos para a baixa taxa de aproveitamento dos pulmões doados foram:
gasometria (30,1%), infecção (23,7%), distância (10,9%) e idade (8,8%).
Se se analisar Estado de Santa Catarina, no último triênio, foram aceitos e
removidos 13 pulmões dos 29 doadores disponibilizados, resultando em uma taxa
de aceitação do órgão de 44,82% das ofertas. É um índice considerado muito alto
até para padrões internacionais. Sabe-se que o aproveitamento do órgão doado está
diretamente relacionado com o cuidado e o manejo do potencial doador e isso reflete
o preparo da equipe transplantadora e a qualidade das unidades de terapia
intensiva. Santa Catarina foi avaliada pela ABTO no ano de 2012 como:
(...) o Estado que lidera o número de doadores efetivos pmp no
Brasil. Tem 28 CIHDOTTs ativas, além de programas líderes em
transplante renal e hepático. Possui equipe específica para retirada
de órgãos com cirurgiões dedicados a esse processo. Possui grande
suporte do governo estadual. (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
TRANSPLANTE..., 2012).
Talvez esses motivos expliquem o sucesso na aceitação dos pulmões doados
e favoreça a avaliação da implantação de um centro de transplantes pulmonar no
estado.
7.4.2 Sobrevida e qualidade de vida pós-transplante
110
Apesar dos avanços conquistados na área do transplante pulmonar na última
década, a sobrevida em curto e em longo prazo dos pacientes transplantados ainda
é menor, quando comparada a de outros órgãos sólidos. Estima-se uma sobrevida
de 94%, 88% e 80% em um, três e cinco anos, respectivamente, para transplante
renal; 86%, 78% e 73% para transplante hepático; 87%, 80% e 74% para transplante
cardíaco e 84%, 68% e 52% para transplante pulmonar (YUSEN, 2009).
Na Espanha, um registro publicado sobre 15.267 pacientes transplantados no
período de 1990 a 2002 mostrou uma sobrevida de 74% em 1 ano, 58% em 3 anos
e 47% em 5 anos. A enfermidade de base (enfisema e fibrose cística têm melhores
resultados) e a situação clínica do paciente no momento do transplante são os
principais fatores que influenciam na sobrevida (BORRO, 2005).
Um estudo realizado nos EUA mostrou resultados semelhantes apenas na
sobrevida de 3 anos (83% em 1 ano, 54% em 3 anos e 29% em 5 anos). Eles
acreditam que a idade (pacientes maiores de 65 anos), tipo de transplante
(unilateral), severidade do quadro clínico no momento de transplante (pacientes
internados em unidade de terapia intensiva) e tipo de doença de base podem piorar
os resultados da sobrevida (YUSEN et al., 2010).
Neste mesmo estudo, Yusen et al. (2010) afirmam que, mesmo tendo uma
taxa de sobrevida menor em relação aos outros transplantes de órgãos sólidos, de
uma maneira geral, sem contar a patologia de base, ela ainda é maior quando
comparada aos pacientes em fila de espera para o transplante. Um estudo realizado
em Zurique em pacientes com fibrose cística pulmonar mostrou uma taxa de
sobrevida de 72,7% em pacientes transplantados e 33% em pacientes sem
transplante (HOFER et al., 2009).
No Brasil, conforme registro da ABTO, tem-se uma sobrevida em 3 anos de
53%, contados a partir de 2010. Estes dados são semelhantes aos resultados dos
melhores centros mundiais de transplante e isso se torna importante porque a
sobrevida tem sido um dos principais critérios para avaliar o sucesso deste
procedimento. O Guideline Internacional para seleção de candidatos a transplante
pulmonar de 2006 baseia-se muito nas suas recomendações no tempo de espera
por transplante e no tempo estimado de sobrevida pós-transplante (ORENS et al.,
2006) e o Lung Allocation Score System (LAS), utilizado nos EUA, solidificou-se
como um excelente método de captação de órgão baseado no seguimento da
sobrevida antes e após o transplante pulmonar (YUSEN et al., 2010).
111
A Região Sul, particulamente o Rio Grande do Sul, foi a responsável pela
maioria dos transplantes pulmonares do país em 2012 (33 de 69 procedimentos),
com a melhor taxa de transplante pulmonar por milhão de população (3,1). Estando
o Brasil inserido numa taxa de sobrevida similar às taxas mundiais e tendo o Estado
do Rio Grande do Sul como centro de referência, fica o questionamento se a
implantação de outro serviço na mesma região ajudaria a incrementar ainda mais
esta taxa de sobrevida.
A taxa de sobrevida nos pacientes transplantados é um importante marcador
do sucesso do procedimento, que é, sem dúvida, a opção terapêutica mais favorável
ao doente terminal quando comparado ao paciente em fila de espera. Porém, além
do número de pacientes que sobrevivem, precisa-se analisar a qualidade de vida
que proporciona o transplante pulmonar a estes sobreviventes, principalmente por
se tratar de um procedimento que não está isento de riscos. De acordo com Gross e
Raghu (1997), “na clínica médica, qualidade de vida representa o efeito da doença e
sua consequente terapia sobre o paciente, na percepção do própio paciente”. De
uma maneira geral, critérios como saúde física, mental e social, como bem-estar,
ajudam a definir qualidade de vida (GROSS; RAGHU, 1997).
Vários estudos têm demonstrado uma melhora na qualidade de vida, função
pulmonar, e satisfação dos pacientes transplantados em comparação com aqueles
que estão em fila de espera (LAU; PATTERSON, 2003; LANUZA et al., 2000; VAN
DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT, 2009). Um estudo comparando 36 pacientes na fila
de espera com 72 pacientes que receberam transplante pulmonar mostrou que os
pacientes transplantados apresentaram uma melhora estatisticamente significativa
na sua saúde física, na vitalidade e na sua função social (LIMBOS et al., 2000).
Ainda em relação à qualidade de vida, Trulock et al. (2004) publicaram o registro da
Sociedade Internacional de Transplante de Coração e Pulmão, que mostrou que
83% dos pacientes que sobrevivem ao transplante levam uma vida normal e sem
limitações ao cabo de um ano, e que essa porcentagem se mantém ao longo de
cinco anos.
Na análise da viabilidade de se implantar um centro de transplante pulmonar
em nosso estado, a qualidade de vida teria um papel importante para nossos
pacientes. É difícil inferir qual o custo emocional para pacientes e seus familiares
que são deslocados para outro estado para realizar este procedimento, e que
permanecem por um longo período fora do seu convívio familiar, porém isto, com
112
certeza, interfere na sua qualidade de vida. Pacientes fora do Rio Grande do Sul
precisam permanecer naquele estado um tempo médio de 6 meses após a
realização de transplante. Isto demanda hospedagem, alimentação, saudades da
sua casa e outros. Um estudo realizado por Ramsey et al. (1995) mostrou que a
qualidade de vida é tempo dependente, e que os primeiros quatro meses póstransplante apresentam um escore mais baixo de qualidade de vida. Sendo assim,
para nossos pacientes catarinenses que permanecem o período pós-operatório em
outro estado, a distância não seria um fator adicional para sua piora na qualidade de
vida?
De uma maneira sintética, agrupou-se os elementos primários de avaliação
(EPAs) e comparou-se a análise de um centro próprio de transplante em Santa
Catarina com a manutenção do transplante pulmonar no serviço de referência do Rio
Grande do Sul, conforme
Quadro 8.
Quadro 8: Comparação entre centro próprio de transplante pulmonar em Santa
Catarina e manutenção do transplante pulmonar no Rio Grande do Sul,
conforme os Elementos Primários de Avaliação (EPAs)
EPAs
Serviço Próprio em SC
1. Demanda de
transplantes da
população de
Santa Catarina
População de 6,3 milhões de
habitantes e demanda de 3 – 5
Tx pulmonares p.m.p. limita as
perspectivas a 15 a 32
procedimentos ano.
2. Número de
pulmões
disponibilizados
para transplante
pelo sistema de
captação de
órgãos
Com 26,4 doadores p.m.p. e
6,7% de aproveitamento para
órgãos torácicos, a estimativa
de geração de enxertos é de
10 pulmões/ano.
3. Tempo na fila
de espera
4. Índice de
mortalidade na fila
de espera
Possibilidade de redução por
se ter fila própria e menos
pacientes em lista.
A perda de 10,7 milhões da
base da população doadora
pode comprometer a melhora.
Na mesma linha do item 3,
acrescenta-se a possibilidade
que um serviço em SC eleva o
aproveitamento dos pulmões
ofertados, reduzindo ambos
tempo em fila e mortalidade.
Manter referência no RS
População de 10,7 milhões de
habitantes. Demanda estimada
de 32 a 53 Tx ano. Como única
referência na Região Sul
potencial de 82 a 137
procedimentos ano.
Com 18 doadores p.m.p. e
13% de aproveitamento para
órgãos
torácicos,
geração
estimada de enxertos de 25
pulmões/ano.
Número maior de pacientes em
lista, incluindo candidatos de
todo o Brasil. População de
base para procura de órgãos
4,3 X maior que a de SC.
Possibilidade de criação de
uma equipe de captação de
pulmões em SC para aprimorar
a logística e o aproveitamento
dos pulmões.
113
EPAs
5. Custo de
implantação do
serviço
6. Curva de
aprendizado da
equipe de
transplante
7. Custo de
manutenção do
serviço
8. Nº de pulmões
efetivamente
transplantados
pelo serviço de
referência para
transplante de
pulmão e taxa
aceitação dos
órgãos
disponibilizados
Serviço Próprio em SC
Desfavorece a hipótese se
comparado ao custo atual de
manter os pacientes no RS.
Maior obstáculo a ser vencido
pelo tamanho da população de
SC e seus reflexos em
demanda
de
transplante
pulmonar
e
geração
de
enxertos.
Desfavorece a hipótese se
comparado ao custo atual de
manter os pacientes no RS.
Precisa ser confrontado com a
receita gerada a partir da
realização dos transplantes em
SC. A escolha do perfil da
instituição pode neutralizar a
dificuldade.
É real a possibilidade que um
serviço em SC elevasse o
aproveitamento dos pulmões
aqui gerados e ofertados, com
impacto no tempo de espera e
mortalidade em lista.
Pesa novamente a questão da
curva de aprendizado e ampliase pelo expertise de toda a
equipe de saúde no cuidado
9. Sobrevida pós- pós Transplante pulmonar e
acompanhamento.
transplante
O eventual melhor acesso ao
serviço
hospitalar
especializado
poderia
ter
algum impacto.
Potencial benefício por tratar10. Custos
se de equipe local sem
emocionais do
deslocamento de pacientes e
paciente e
familiares para o RS. Deve-se
acompanhantes
relativizar, pois um único centro
associados à
em SC implica que a maior
distância do local
parte dos pacientes será
de residência
tratada longe do domicílio.
Manter referência no RS
Menos oneroso ainda que se
leve em conta o custo do
tratamento fora do domicílio.
Experiência de 423 enxertos
com
média
de
27
procedimentos ao ano na
última década.
O serviço de referência no RS
tem a melhor relação custofinanciamento possível pelas
normas do SUS.
Possibilidade de criação de
uma equipe de captação de
pulmões em SC para aprimorar
a logística e o aproveitamento
dos pulmões.
Possibilidade de criação de
uma
equipe
de
acompanhamento
de
transplantados
pulmonares
integrada ao serviço do RS.
Estrutura
de
complexo
hospitalar
com
acesso
facilitado a todos os recursos
necessários ao paciente sem
precisar
deslocamento
e
esforços adicionais. Instituição
vinculada sem restrições ao
SUS.
11. Custo
Há risco potencial de deficit
econômico final
Risco de perda de receita para
financeiro se o projeto não for
incorporado ao
o serviço do RS.
bem planejado.
estado
Fonte: Elaborado pelo autor (2013).
114
8 CONCLUSÃO
No ciclo das políticas públicas, a formação da agenda política representa uma
das mais importantes fases, porque mobiliza fortes recursos de poder. A formação
da agenda é fortemente afetada pelos atores políticos e pelos processos de
evidenciação do tema que poderiam ocupar a atenção do governo. Neste sentido,
este estudo procurou apresentar informações sobre a viabilidade ou não da
implantação de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina, dando
instrumentos que possam ser úteis para a atenção dos formuladores de política no
processo de formação da agenda e formação de alternativas, conforme pode ser
verificado na
Figura 17.
Figura 17: Ciclo de Políticas Públicas Adaptado
FORMAÇÃO DA AGENDA
- Definição do problema: Transplante Pulmonar em Santa Catarina.
- Análise do problema: viabilidade de um centro próprio.
FORMAÇÃO DE ALTERNATIVAS
- Avaliação das opções: criar um centro em nosso estado ou manter
o sitema vigente.
- Seleção das opções: análise dos pontos de vistas fundamentais.
IMPLEMENTAÇÃO
- Monitoramento.
AVALIAÇÃO
- Ajustes.
Fonte: Elaborada pelo autor (2013).
Sendo assim, a análise dos dados obtidos para avaliação da viabilidade de
implantação de um serviço de transplantes de pulmão em Santa Catarina permite
inferir:
115
a) A demanda anual para este procedimento deve variar entre 18 a 30
procedimentos.
b) A pequena oferta de pulmões para transplante consiste em uma ameaça real ao
desenvolvimento de um programa de transplantes em Santa Catarina.
c) O desenvolvimento de um programa de transplante pulmonar em nosso estado
poderia incrementar o aproveitamento dos enxertos pulmonares com potencial
redução do tempo e da mortalidade em lista de espera.
d) A redução da base populacional de procura de doadores pode neutralizar o
suposto benefício da redução do tempo de espera.
e) A opção pela implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa
Catarina é inquestionavelmente mais onerosa que a de manter os pacientes em
tratamento no Rio Grande do Sul.
f) O maior desafio à implementação desta proposta consiste em expor os pacientes
a uma curva de aprendizado da nova equipe e seu estabelecimento, bem como a
garantia de uma demanda que permita a esta manter a expertise.
g) O desenvolvimento da nova equipe e do estabelecimento pode comprometer o
resultado dos transplantes de pulmão em Santa Catarina nos seus primeiros
anos de atividade.
h) O desenvolvimento de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina
pode trazer mais conforto e facilidade de acesso aos catarinenses.
i) O perfil de um estabelecimento de saúde catarinense para o desenvolvimento de
deste projeto deve contemplar a existência do maior número possível de
programas de transplante de órgãos sólidos, incluindo coração e um serviço ativo
e qualificado de cirurgia torácica.
j) Há um considerável risco de deficit financeiro para este programa de transplantes
se o estabelecimento não atender às características dos níveis A ou B do
programa de incremento financeiro para a realização de procedimentos de
transplantes e o processo de doação de órgãos da Portaria GM 845 de 02 de
maio de 2012.
Este estudo procurou analisar diversos fatores relevantes na avaliação de
políticas públicas referentes ao transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina.
Sua contribuição teórica promoveu a discussão de aspectos que precisarão ser
desenvolvidos, em momento oportuno, pelos formuladores da política de saúde na
tomada de decisões pertinentes à mudança ou não da configuração atual da rede de
116
serviços de saúde de alta complexidade, não sendo, portanto, definitivo. O autor
reconhece como limites desta pesquisa alguns aspectos importantes: por ter
assumido o contexto específico de processo de tomada de decisão que interessa
apenas dois gestores e duas instituições prestadoras de serviço (as Secretarias de
Estado da Saúde de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, o Hospital da Santa
Casa de Misericórdia de Porto Alegre e outro hospital de grande porte de Santa
Catarina não definido), assumiu o caráter de estudo de caso, não sendo suas
conclusões generalizáveis. Por outro lado, apesar de ter sido elaborado a partir de
informações e opiniões colhidas em reuniões com importantes agentes do processo
decisório, restringiu-se a um grupo limitado de participantes e a um momento
histórico e político específico e limitado.
Dentro da metodologia adotada, o presente estudo abordou a primeira fase do
modelo MCDA – estruturação do contexto decisório. A continuidade da aplicação da
metodologia no contexto da gestão do Sistema Único de Saúde é uma opção dos
formuladores das políticas de saúde, e o presente trabalho pode ser uma
contribuição relevante para a elaboração de estudos futuros.
117
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