CONTOS
Machado de Assis
VÁRIAS HISTÓRIAS(1896)
MACHADO DE ASSIS
OBRA ANALISADA
VÁRIA HISTÓRIAS
GÊNERO
CONTOS
ÍNDICE
16 CONTOS
AUTOR
JOAQUIM MARIA MACHADO
DE ASSIS
DADOS BIOGRÁFICOS
* 21/06/1839 - RJ
+29/09/1908- RJ
Tema: A sociedade
Professora Elis
“O homem é lobo do homem”
Thomas Hobbes
Thomas Hobbes, filósofo inglês, afirma em LEVIATÃ que é impossível ao homem viver
plenamente seu instinto, pois isso equivaleria a ação de todos contra todos e
prevaleceria a lei do mais forte.
Para sobrevivência de maior número de homens, foi criado um pacto no qual nasce o
Estado para proteger os mais fracos.
A sociedade e as obras lidas em 2008:
Contos de Machado de Assis:
1- A Cartomante ( Narra a história de Camilo, Vilela e
Rita): o desejo pela posse da “fêmea” produz a
disputa entre ‘amigos’/ elementos da mesma espécie.
O instinto( violência/ força) prevalece.
1- A Cartomante
Conto que surpreende pela excelente estrutura narrativa, dividida em
três partes. Na primeira, introdutória, fica-se sabendo que Rita, dotada
de espírito ingênuo, havia consultado uma cartomante, achando que
seu amante, Camilo, deixara de amá-la, já que não visitava mais sua
casa.
A Cartomante
Desfeito o mal-entendido, faz-se um flashback que vai explicar como se
montou tal relação. Camilo era amigo, desde longínqua data, de Vilela.
Tempos depois, este se casa com Rita. A amizade estreita a intimidade
entre Camilo e Rita, ainda mais depois da morte da mãe dele.
A Cartomante
Quando sente sua atração pela esposa do amigo, tenta evitar, mas,
enfim, cai seduzido. Até que recebe uma carta anônima, que deixava
clara a relativa notoriedade da sua união com a esposa do seu amigo.
Temeroso, resolve, pois, evitar contato com a casa de Vilela, o que
deixa Rita preocupada.
A Cartomante
Terminada essa recapitulação, vai-se para a parte crucial do conto.
Camilo recebe um bilhete de Vilela apenas com a seguinte mensagem:
“Vem já, já”. Seu raciocínio lógico já faz desconfiar que o amigo havia
descoberto tudo.
A Cartomante
Parte de imediato, mas seu tílburi (espécie de carruagem de aluguel
que equivaleria, hoje, a um táxi) fica preso no tráfego por causa de um
acidente. Nota uma estranha coincidência: está parado justamente ao
lado da casa da cartomante. Depois de um intenso conflito interior,
decide consultá-la.
A Cartomante
• Seu veredicto é dos mais animadores, prometendo felicidade no
relacionamento e um futuro maravilhoso. Aliviado, assim como o
tráfego, parte para a casa de Vilela. Assim que foi recebido, pôde ver,
pela porta que lhe é aberta, além do rosto desfigurado de raiva de
Vilela, o corpo de Rita sobre o sofá. Seria, portanto, a próxima vítima
do marido traído.
A Cartomante
Note neste conto sua estrutura em anticlímax, pois tudo nele (já a
partir da citação inicial da famosa frase de Hamlet: “há mais cousas no
céu e na terra do que sonha a nossa filosofia”) nos prepara para um
final em que o misticismo, o mistério imperaria.
A Cartomante
No entanto, seu final é o mais realista e lógico, já engendrado no
próprio bojo do conto. Reforça esse aspecto o ritmo da narrativa, que é
lento em sua maioria, contrastando com seu desfecho, por demais
abrupto. E não se esqueça da presença de um quê de ironia nesse
contraste entre corpo da narrativa e o seu final.
A Cartomante
Conteúdo: vírgulas
“Hamlet observa a Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia.
Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de Novembro
de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante. A diferença é
que o fazia por outras palavras.
— Ria, ria...Os homens são assim, não acreditam em nada, pois saiba que fui, e que ela adivinhou
o motivo da consulta, antes mesmo, que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou a botar as
cartas, disse-me: "A senhora gosta de uma pessoa..." Confessei que sim e, então, ela continuou
a botar as cartas, combinou-as e, no fim, declarou-me que eu tinha medo de que você me
esquecesse, mas que não era verdade...
— Errou! Interrompeu Camilo rindo.
— Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe, já
lhe disse. Não ria de mim, não ria...
Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus
sustos pareciam de criança. Em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor
cartomante era ele mesmo. Depois, repreendeu-a. Disse-lhe que era imprudente andar por
essas casas. Vilela podia sabê-lo, e, depois, bastava-lhes o amor...”
2- Entre Santos
Trata-se de uma narrativa dentro de narrativa, que em determinado
momento dá caminho para mais outra. Um discreto narrador em
terceira pessoa abre, já no primeiro parágrafo, espaço para um
narrador em primeira pessoa, testemunha de um acontecimento
surpreendente.
Entre Santos
Enquanto era capelão na igreja de São Francisco de Paula, pôde
surpreender, numa noite, o diálogo entre santos que durante o dia
eram estátuas no templo. Discutiam o caráter humano, deslindado nas
pessoas que vinham rezar diante deles. S. João Batista e S. Francisco de
Paula eram os autores dos comentários mais ácidos em relação ao
gênero humano.
Entre Santos
Um deles faz questão de lembrar uma adúltera que vinha pedir ajuda
para se afastar de tal relacionamento, mas que, enquanto orava,
rememorava momentos ardorosos, o que diminuía a fé a ponto de
fazê-la abandonar o recinto sem nem mesmo completar seu pedido.
Tudo isso se contrapõe aos comentários de São Francisco de Sales.
Entre Santos
Para reforçar a sua teoria de que não se deve perder a
esperança no ser humano, conta a história de um avaro
que cai no desespero quando sua esposa desenvolve
erisipela (doença que se manifesta pela inflamação da
pele).
Entre Santos
Apesar de o pensamento corrente de que a sua agonia seria provocada
pelo receio de despesas funerárias, na verdade é movido por amor. E
para conseguir a graça da salvação, pede a intermediação do narrador
divino, oferecendo em troca uma perna de cera.
Entre Santos
No entanto, seu raciocínio rápido se transfere para a ideia da moeda
que iria custar tal artefato. Passa então a pensar em pagar em espécie
mesmo. Mas, sovina como era, tal contribuição seria por demais
custosa. Apesar disso, é uma opinião que não chega a formular por
completo, deixando-a no limbo de sua mente.
Entre Santos
Até que salta para um postulado um tanto cômodo: acredita, iludindose convenientemente, que o espiritual é mais importante do que o
material, por isso se propõe a, no lugar da moeda, rezar 300 padresnossos. Nesse ponto, o seu caráter materialista entranha-se com o
espiritualista, pois imagina ser muito mais lucrativo rezar 300 padresnossos e 300 ave-marias.
Entre Santos
De 300 passa para 1000, mas, em vez de expressar e, portanto, efetuar
sua promessa, perde-se, maravilhado, diante de cifra tão alta.
Entre Santos
Note nesse conto o esquema da narrativa. Um narrador lembra uma
história que foi contada por um padre e que acaba relatando a história
narrada por um santo. Essa trama dentro de trama lembra um outro
tipo de texto que também usava esse mesmo procedimento e que
também apresentava histórias mirabolantes: As Mil e Uma Noites.
Entre Santos
Repare também a postura dos santos, que se assemelha à de Machado
de Assis, na medida em que são devassadores da alma humana. Tal
atividade inspira ou o descrédito próximo da impaciência diante de
nossas fraquezas, assim como uma atitude de tolerância misturada
com esperança.
Entre Santos
Pode-se acreditar que Machado tenha, em sua carreira, assumido um
pouco das duas. Finalmente, observe como o conto consegue
apresentar o caráter dilemático da mente humana pela maneira como
o avaro lida com sua promessa.
Entre Santos
• Mostra extremo materialismo ao entregar-se ao fervor espiritualista,
conseguindo, talvez cínica, talvez inconscientemente, conciliar esses
opostos.
3- Uns Braços
Conto tocante que narra a descoberta do amor e de toda a
sensualidade que cerca o descortinar desse mundo novo. É a história
de Inácio, jovem de 15 anos que vai trabalhar como ajudante do ríspido
solicitador (funcionário do Judiciário, algo entre procurador e
advogado) Borges, morando na casa deste.
Uns Braços
É lá que acaba se encantando com os braços de D. Severina,
companheira do seu patrão. Deve-se lembrar que na época em que se
passa a história, 1870, não era comum uma mulher exibir tal parte do
corpo.
Uns Braços
Mas, antes que se pense que ela era despudorada, deve-se lembrar
que só o fazia por passar por certas dificuldades que tornava o seu
vestuário falto de peças mais adequadas. Ainda assim, os breves
momentos em que via a mulher e principalmente os braços dela eram,
para Inácio, o grande alívio diante de um cotidiano tão massacrante.
Uns Braços
Até que um dia D. Severina percebe o interesse que desperta no moço.
Demora a aceitar, pois considera-o apenas uma criança. Mas, quando
vê o homem já na forma do menino, entra num sentimento conflitante,
misto de vaidade e pudor. Por isso oscila entre tratar mal o rapaz e
mostrar preocupação com o seu bem-estar.
Uns Braços
Até que num domingo ocorre a cena mais importante da história. D.
Severina encontra Inácio dormindo na rede. Dá-lhe um leve beijo na
boca. A senhora não sabe que naquele exato instante o garoto sonhava
com o beijo dela e ele não sabe que era beijado realmente enquanto
estava mergulhado na fantasia do seu sono.
Uns Braços
Pouco tempo depois, Borges dispensa o garoto de forma
admiravelmente amistosa. O menino não vê mais D. Severina,
guardando a sensação daquela tarde como algo que não ia ser
superado em nenhum relacionamento de sua existência.
Uns Braços
Note que nesse conto Machado mostra o dom que possui para
narrativas memorialistas. Veja também o seu início abrupto, sendo o
leitor jogado de chofre no meio da história (técnica chamada de in
media res). Repare, por fim, que a temática da descoberta do amor só
vai perder em delicadeza e brilho para outro conto do autor, “Missa do
Galo”, que infelizmente não faz parte dessa coletânea.
4- Um Homem Célebre
A temática básica desse conto é a oposição entre vocação e ambição.
Sua personagem principal, Pestana, é um famoso compositor de polcas,
um estilo bastante popular de música. No entanto, seu grande sonho
era produzir música erudita no nível dos grandes mestres, como
Chopin, Mozart, Haydn.
Um Homem Célebre
Por mais que se esforçasse, só conseguia compor o gênero popular.
Chega até a se casar com uma cantora lírica tísica, Maria, crendo que,
convivendo com ela, finalmente teria a fatídica inspiração. Esforço
inútil.
Um Homem Célebre
Por fim, ela morre e pensa em compor para ela, já que estava imbuído
da dor da perda, um réquiem. Outro fracasso. Espera conseguir
inspiração para a missa de aniversário do falecimento, mas mais uma
vez frustra-se. É quando desiste e dedica-se às polcas.
Um Homem Célebre
Por fim adoece, não demorando muito para morrer em consequência
de uma febre. De acordo com o próprio narrador, teve tempo para uma
última piada. Seu editor vinha pedir uma polca em deferência à subida
dos conservadores ao poder. O compositor disse que a faria e ainda
deixaria outra pronta, para quando subissem os liberais.
Um Homem Célebre
Há uma crítica que ainda é atual: o mercado está mais interessado em
obras de qualidade fácil, que satisfazem de forma imediata e rasteira o
gosto do público. Sintomático disso é o fato de o editor já ter títulos
prontos para obras que ainda nem existem, aproveitando-se de fatos
do momento, da moda.
Um Homem Célebre
Além disso, há um conflito interessante entre o efêmero (polca) e o
eterno (música erudita), que pode ser também visto como entre o
baixo e o sublime.