RELATÓRIO DE PESQUISA RP0802 Empresas familiares longevas: Fatores que impactam sua continuidade Elismar Álvares da Silva Campos Janete Lara de Oliveira Bertucci Thiago Duarte Pimentel 2008 Fundação Dom Cabral é um centro de desenvolvimento de executivos e empresas que há mais de 30 anos pratica o diálogo e a escuta comprometida com as organizações, construindo com elas soluções educacionais integradas. É orientada para formar equipes que vão interagir crítica e estrategicamente dentro das empresas. Depois de formar milhares de executivos, em constante integração com as empresas, a FDC tornou-se referência nacional em seu setor, participando da melhoria do nível gerencial e do desenvolvimento empresarial brasileiro. Circulam, anualmente, pelos seus programas abertos e fechados perto de 20 mil executivos de empresas de médio e grande portes. A sinergia com as empresas é resultado da conexão que faz entre a teoria e a prática de efetivas tecnologias de gestão. Essa prática é reforçada pelo trabalho interativo de sua equipe técnica, que combina formação acadêmica com experiência empresarial. Nos Núcleos de Desenvolvimento do Conhecimento (Núcleo Andrade Gutierrez de Sustentabilidade e Responsabilidade Corporativa, Núcleo CCR de Governança Corporativa, Competitividade, Núcleo de Desenvolvimento de Liderança, Núcleo de Empreendedorismo, Núcleo de Gestão Empresarial, Núcleo de Negócios Internacionais e Núcleo de Inovação) são produzidas pesquisas e outros trabalhos que dão sustentação aos programas da FDC, traduzindo seus avanços como instituição geradora de conhecimento. Suas soluções educacionais combinam: Desenvolvimento Empresarial Soluções construídas na perspectiva do cliente, aliando conteúdo a estratégia e necessidade das empresas. Atendem públicos dos diversos níveis funcionais, possibilitando o aprendizado coletivo e a formação de massa crítica na busca de resultados para a empresa. O grande diferencial dos programas é valorizar e potencializar o conhecimento existente na própria empresa. Desenvolvimento do Gestor Com foco no desenvolvimento do indivíduo e na sua atuação na empresa, muitos programas são realizados em parceria com escolas internacionais e abordam temas de gestão geral e específicos. Propiciam a aplicação prática de conceitos, desenvolvendo no indivíduo a capacidade de aprender fazendo. Pós-Graduação Fundamentam-se na perspectiva da educação continuada, centrada na realidade empresarial e voltada para o crescimento do indivíduo como pessoa e gestor. Contemplam níveis diversos de formação de Especialização a Mestrado e se complementam de forma conveniente aos participantes. Parcerias Empresariais A FDC estimula a troca de experiências entre e intra-empresas, conciliando, de forma estratégica, conceitos e práticas que possibilitam a aprendizagem coletiva e a busca compartilhada de soluções. Relatório de Pesquisa Empresas familiares longevas: Fatores que impactam sua continuidade Elismar Álvares da Silva Campos Coordenadora da Pesquisa e do Núcleo CCR de Governança Corporativa da Fundação Dom Cabral (FDC) Janete Lara de Oliveira Bertucci Colaboradora - Profa. Adjunta da UFMG Thiago Duarte Pimentel Assistente de Pesquisa do Núcleo CCR de Governança Corporativa da Fundação Dom Cabral (FDC) RP0802 Projeto gráfico Célula de Edição de Documentos Revisão Célula de Edição de Documentos Assessoria editorial Teresa Goulart Supervisão de editoração José Ricardo Ozólio Impressão Fundação Dom Cabral 2008 Reproduções integrais ou parciais deste relatório somente com a autorização expressa da FDC. É permitida a citação de dados, tabelas, gráficos e conclusões, desde que indicada a fonte. Para baixar a versão digital desta e de outras publicações de temas relacionados à Gestão Empresarial, acesse a Sala do Conhecimento da Fundação Dom Cabral através do link http:// www.fdc.org.br/pt/sala_conhecimento Copyright© 2007, Fundação Dom Cabral. Para cópias ou permissão para reprodução, contatos pelo telefone 55 31 3589-7465 ou e-mail: [email protected]. Esta publicação não poderá ser reproduzida sem a permissão da FDC. Cam pus Alo ysio FFaria aria – Centr o Alf a – Av. Princesa Diana, 760 – Alphaville Lagoa dos Campus Aloysio Centro Alfa Ingleses 34000-000 Nova Lima, MG – Brasil Tel.: 55 31 3589-7465 Fax: 55 31 3589-7402 Sumário Introdução....................................................................................................................7 Revisão da Literatura.................................................................................................11 Conceituando a Empresa Familiar ...................................................................11 O Modelo Tridimensional das Empresas Familiares ..........................................14 Metodologia ..............................................................................................................35 1ª Fase: Levantamento de informações para a construção da história da empresa.........................................................................................................37 2ª Fase: Realização das entrevistas.................................................................37 Análise ......................................................................................................................43 Governança - Estruturas e Mecanismos ..........................................................43 Sucessão..........................................................................................................45 Regras, Acordos e Critérios..............................................................................49 Família e Valores...............................................................................................52 Considerações Finais.................................................................................................59 Referências................................................................................................................................67 Anexo 1......................................................................................................................73 Anexo 2......................................................................................................................82 Anexo 3......................................................................................................................83 4 Introdução O desenvolvimento econômico e social das nações se dá principalmente com base na iniciativa privada. Dentro do conjunto de possibilidades de constituição de uma empresa privada, uma forma tradicional, talvez a mais antiga de todas, se destaca pela sua historicidade e, sobretudo, pela sua expressividade em termos numéricos: a empresa familiar. Pesquisas de diversas partes do mundo têm apontado a relevância desse tipo de empresa, não só pelos benefícios sociais advindos de sua vasta capilaridade, mas, principalmente, devido à expressividade das empresas familiares no que tange à composição do tecido empresarial mundial e a sua capacidade de gerar riqueza. Jones e Rose (1993), por exemplo, afirmam que cerca de 80% a 90% das organizações, em nível mundial, são de cunho familiar. Avelar (1998) corrobora essa estimativa, apontando algo em torno de 90% das empresas do mundo que se encontram sob o comando de famílias. No quadro seguinte, Campos (2006) sintetiza, a partir das contribuições de várias pesquisas, a proporção das empresas familiares nos principais países do mundo, a fim de ilustrar a sua relevância. Países Percentual Portugal 70% Reino Unido 75% Espanha 80% Suíça 85-90% EUA 96% Itália 99% Quadro 1: Estimativa da proporção de empresas familiares no mundo Fonte: CAMPOS, 2006. Adaptação. 5 Além de sua proporção, é importante destacar a participação e relevância das empresas familiares nas diversas economias ao redor do mundo, conforme pode ser observado no QUADRO 2, a seguir. Auto Autorr e s Países Peso Reidel (1994) Alemanha 75% dos trabalhadores são funcionários de empresas familiares; contribuem com cerca de 66% do PNB. Owens (1994) Austrália 75% dos negócios australianos são familiares e empregam 50% dos trabalhadores. Chile 75% dos negócios são familiares, sendo 65% de médias e grandes empresas. Gallo e Estapé (1992; 1996) Espanha Das empresas que possuem faturamento anual superior a 2 milhões de dólares, 71% são familiares; das 100 primeiras empresas espanholas, 17% são familiares. Gluek e Meson (1980); Ward (1987); Ibrahim e Ellis (1994); Astrachan e Kolenko (1994) Estados Unidos 90% das empresas são familiares. Elas contribuem para realizar entre 30 e 60% do PIB e pagam a metade do total dos salários. Allouche e Amann (1995) França Das 500 maiores empresas industriais de capital francês, 58,86% são familiares. Martinez (1994) Quadro 2: Participação e relevância das empresas familiares no mundo Fonte: ALLOUCHE; AMANN, 1999. Adaptação. No caso do Brasil, há uma estimativa de que 95% das empresas brasileiras são controladas por famílias. Essas organizações contribuem com mais de 50% do Produto Interno Bruto (PIB) e são responsáveis por mais de três quartos dos empregos gerados (GARCIA, 2001). Outros autores, como Vidigal (1999), apontam que, no caso brasileiro, esse número chegaria a 98% das empresas, se consideradas apenas as não estatais. A forte dependência da economia brasileira em relação às empresas familiares pode ser parcialmente explicada pela composição histórica do capitalismo brasileiro, que é marcado pelo tripé: propriedade estatal, empresas estrangeiras e empresas familiares nacionais (LETHBRIDGE, 2000). 6 Entretanto, apesar da expressividade e relevância das empresas familiares no Brasil e no mundo, foi só a partir de meados do século passado que pesquisadores tiveram a sua atenção despertada para a temática das empresas familiares. Apesar de estudos isolados e embrionários sobre o assunto - como a dissertação de Christensen (1959) sobre os problemas enfrentados pelas empresas familiares nos Estados Unidos, e o artigo seminal de Donnelley (1964), que trata especialmente do estabelecimento de parâmetros para definir o que seria uma empresa familiar -, foi somente a partir da década de 1980 que estudos sistemáticos começaram a ser produzidos por institutos de pesquisa criados para tratar especificamente dessa questão (FISCHER; SILVA; DAVEL, 2000). Embora a criação desses institutos de pesquisa tenha ajudado a diminuir a lacuna existente sobre o assunto, um grande volume dos trabalhos produzidos limita-se a mensurar as empresas familiares para estabelecer correlações estatísticas no âmbito da economia ou a explorar as vantagens e desvantagens das empresas familiares, como bem observou Rossatto Netto (2003). Dessa forma, além de recentes, os estudos sobre empresas familiares carecem ainda de abordagens que aliem tanto os aspectos teóricos quanto as questões práticas sobre as empresas familiares e abordem problemas atuais, como a manutenção do controle familiar frente à dispersão ou à pulverização das ações dessas empresas nos mercados de capitais. É justamente no sentido de contribuir para o preenchimento dessa lacuna que se insere esta pesquisa, que gira em torno das seguintes questões: Quais são os fatores mais marcantes relativos à empresa, à família e à propriedade que marcam os processos de transição do controle acionário de geração para geração em empresas familiares brasileiras? É possível identificar padrões de regularidade nos processos de transição intergeracional das empresas estudadas associando-os à longevidade da empresa familiar? Com o intuito de responder a essas questões, definiu-se o seguinte objetivo geral para a pesquisa proposta: Identificar e analisar os fatores presentes na transferência de poder e controle das empresas familiares brasileiras entre gerações, buscando identificar a existência de padrões de regularidade que contribuam para explicar a longevidade de empresas familiares de médio e grande porte no Brasil, para além da segunda geração. 7 O objetivo geral pode ser detalhado em vários objetivos específicos, mas complementares, que permitiram a execução da pesquisa e a consecução do seu objetivo final, quais sejam: • identificar os fatores tangíveis e intangíveis - relacionados à propriedade, à família e à empresa - que estão presentes durante a transferência de poder de uma geração a outra e que, de alguma forma, contribuem para a longevidade da empresa familiar; • identificar e analisar os mecanismos utilizados para transferência de controle na propriedade e na gestão das empresas familiares pesquisadas, bem como as políticas de governança que vêm sendo implementadas nessas empresas, particularmente nos momentos de transição de uma geração a outra. A definição desses objetivos aponta o estabelecimento de alguns pontos que norteiam a condução deste trabalho, como: a) a transferência de controle e poder de uma geração para a outra deve ter permitido que a família fundadora ou proprietária continuasse no comando da empresa; b) o processo sucessório é inexorável e, por conseqüência, precisa ser planejado e c) espera-se que padrões de comportamentos semelhantes entre as empresas possam ser identificados com um grau de similaridade e regularidade tal que possibilite a identificação de elementos que auxiliem na compreensão da longevidade dessas empresas. Ainda como premissa deste trabalho estabeleceu-se que a longevidade das empresas familiares está relacionada à sua capacidade de harmonizar os três círculos do modelo de empresa familiar proposto por Tagiuri e Davis (1985), Gersick et al. (1997) e Davis (2003), quais sejam: propriedade, empresa e família. Esse modelo, sobre o qual discorreremos na revisão de literatura realizada pela pesquisa, tem-se mostrado potencialmente útil para a compreensão da dinâmica das empresas familiares, pois prioriza a visão da articulação entre propriedade, empresa e família. Esta pesquisa adota uma abordagem a partir dos estudos de governança e de sucessão empresarial, considerando fatores tangíveis, como alterações na estrutura de propriedade, e intangíveis, como alterações na dinâmica de relações de poder e da esfera de influência dos membros da família empresária. Segundo Arruda et al. (2007), a identificação de fatores tangíveis e intangíveis, sobretudo na dimensão da governança, tem contribuído para a longevidade das empresas, pois permite que essas se aprimorem continuamente tendo em vista um modelo de sucesso. Essa abordagem teórica visa contribuir para o desenvolvimento e a consolidação das teorias 8 acerca da temática e para a criação e aplicação de metodologias e instrumentos fundamentados e coerentes com a realidade das empresas brasileiras e corretamente orientadas aos resultados esperados. O presente estudo está organizado em cinco partes. Nesta primeira, são introduzidas algumas questões relativas à relevância e à problemática dos estudos relacionados à gestão das empresas familiares, bem como as questões de pesquisa, os objetivos e as premissas que norteiam este trabalho. Na segunda parte, apresenta-se uma discussão realizada com base na revisão da literatura sobre empresas familiares, identificada a partir de alguns conceitos e modelos de empresa familiar, e na problemática de sucessão e planejamento desse tipo de organização, bem como questões relativas à governança e à longevidade dessas empresas. Na terceira seção, estão relatados os aspectos metodológicos da pesquisa, bem como o modelo utilizado para operacionalizar a coleta e análise dos dados. Na quarta parte deste relatório, são apresentadas as empresas pesquisadas, por meio de um breve relato da história empresarial e dos aspectos específicos relacionados ao(s) processo(s) sucessório(s) já vivenciado(s) por cada uma. Na quinta e última parte, os aspectos considerados mais relevantes em relação à sucessão dessas empresas encontramse destacados e analisados. Buscou-se aí identificar e relatar padrões de regularidade comuns às empresas pesquisadas que possam explicar, ainda que parcialmente, a longevidade dessas organizações. 9 10 Revisão da Literatura Conceituando a Empresa Familiar O bservar o desenvolvimento das empresas familiares tem constituído um esforço sistemático de vários pesquisadores e estudiosos da área. A definição tradicional bidimensional de empresa familiar, baseada nos sistemas família e empresa, tem cedido lugar a conceituações que incorporam outras variáveis de análise, como a dimensão da propriedade (GERSICK et al., 1997). O construto "empresa familiar", por sua amplitude, pode ser expresso por meio de conceitos diferentes, dependendo das variáveis, das dimensões ou dos aspectos que o autor deseja enfatizar. Para Allouche e Amann (1999), na conceituação de empresa familiar, diversas questões desafiam a amplitude e o escopo das tentativas de enquadramento que os conceitos demandam, entre as quais se destacam: • Quais são as fronteiras da família? • O conceito de empresas familiares deve se limitar à existência de uma única família controladora ou pode considerar várias? Existe um limite de famílias proprietárias para caracterizar uma empresa familiar? • A partir de que momento histórico se pode começar a falar em empresa familiar? Já na primeira geração ou somente a partir da segunda geração? • O que se entende por controle? É o controle do capital? Dentro de quais proporções? Essas questões são recorrentes nas discussões acerca das empresas familiares, o que pode ser percebido nos conceitos sobre o que é a empresa familiar, extraídos de diversos autores e sintetizados no QUATRO 3. 11 Autores Chandler (apud CHURCH, 1996) Conceituação Critérios A firma familiar é aquela de propriedade familiar, controlada e gerenciada por uma família. Propriedade familiar. Controle familiar. Lodi (1993) A empresa familiar deve possuir valores institucionais que se identificam com um sobrenome de família ou com a figura do fundador. Tradições e valores familiares. Gersick et al. (1997) Mais que o nome da família sobre a porta ou o número de parentes na alta direção é a propriedados de uma família que define a empresa familiar. Propriedade familiar. Tagiuri e Davis (1996) São as organizações nas quais dois ou mais membros da família estendida (extended family members) influenciam a direção dos negócios através do exercício de laços de parentesco, papéis de gerenciamento ou direito de propriedade. Influência da família na direção da empresa. Propriedade familiar. Uma empresa é considerada familiar quando pelo menos duas gerações se identificam com uma mesma família e quando essa ligação influencia a política da companhia nos interesses e objetivos da família. Tal ligação é iniciada quando uma ou mais das condições a seguir existem: 1) o relacionamento familiar é um fator, entre outros, para determinar a sucessão; 2) esposas e filhos podem estar no Conselho de Administração; 3) os importantes valores institucionais da firma são identificados com a família e influenciados por ela; 4) a posição do membro da família influencia na sua posição familiar. Tradições e valores familiares. Influência da família na estratégia da empresa. Empresa de mais de duas gerações. Controle da sucessão. Apenas uma família possui a maior parte do capital, tem controle total e faz parte da administração. Controle acionário. Quando o atual executivo-proprietário tem a esperança e a intenção de transmitir o controle da empresa à geração seguinte. Sucessão familiar. Donelley (1964) Gallo & Sveen (1991) Davis (2004) 12 Continuação Autores Conceituação Critérios A propriedade é controlada por apenas uma família. Há pelo menos dois membros da família na alta gerência. Empregados não pertencem à família. Controle da propriedade. Atuação na direção. Sharma, Chrisman e Chua (1997) Negócio governado e/ou gerido em uma base potencialmente sustentável através das gerações seguintes para definir e talvez deter a visão formal ou implícita do negócio detido por membros da mesma família ou por um pequeno número de famílias. Controle da propriedade por um pequeno grupo de famílias. Sustentabilidade. Westhead, Cowling e Storey (2002) Mais de 50% das ações votantes pertencentes a membros de um único grande grupo familiar aparentados por sangue ou afinidade, e considerada como tal pelo executivo chefe, diretor gerente ou presidente do Conselho. Controle acionário de um grupo. Atuação da família na gestão ou no CAD. Alden Lank (2003) Um empreendimento ou empresa familiar é uma corporação, sociedade, propriedade ou qualquer outra forma de organização na qual uma dada família exerce o controle sobre o capital votante. Controle sobre o capital votante. Davis e Tagiuri (2003) Quadro 3: Conceitos de empresa familiar Fonte: Elaborado pelos autores, ampliando o quadro de SILVA et al., 1999. Silva, Fischer e Davel (1999) abordam a multiplicidade de conceitos associados à empresa familiar e apresentam nove desses conceitos associados a autores que defendem diferentes perspectivas, tais como Donnelley (1964), Bernhoeft (1989) e Lodi (1978), entre outros. A partir de pontos comuns e divergentes identificados entre os conceitos analisados, os autores propuseram que a caracterização de uma empresa como familiar deveria contemplar alguns aspectos essenciais, como tipo de controle familiar, sucessão na gestão, transferência de patrimônio, direção familiar, estágio geracional da empresa (empresa de mais de duas gerações), gestão influenciada pela família, propriedade familiar, tradições e valores familiares, entre outros. Essa multiplicidade de conceitos e a diversidade de critérios para caracterizar uma empresa como familiar demonstram a dificuldade de se identificar um único conceito a ser adotado por uma pesquisa sobre empresas familiares. Assim, para esta pesquisa, optou-se pela adoção de alguns critérios sugeridos por Silva, Fischer e Davel (1999) 13 como básicos para a caracterização de uma empresa como familiar: [...] 1) A família deve possuir propriedade sobre a empresa, podendo assumir propriedade total, propriedade majoritária ou controle minoritário; 2) A família deve influenciar nas diretrizes da gestão estratégica da empresa; 3) Os valores da empresa são influenciados ou identificados com a família; 4) A família determina o processo sucessório da empresa. De qualquer forma, um aspecto comum que se faz presente tanto nas definições de empresa familiar quanto nas motivações para a criação e manutenção de uma empresa no seio da família é o fato de que há uma relação entre família e empresa não apenas no âmbito da gestão, mas, sobretudo, no âmbito da propriedade e da influência dos proprietários familiares sobre a gestão da empresa. Nesse sentido é que se justifica e adota o modelo tridimensional de empresas familiares, que considera, além do binômio família-empresa, a dimensão da propriedade. O Modelo Tridimensional das Empresas Familiares Os estudos sobre empresas familiares, iniciados na década de 1960 e 1970, foram marcados pela análise bidimensional baseada nos sistemas família e empresa. Contudo, a partir da década de 1980, Tagiuri e Davis (1985) propuseram a diferenciação do sistema empresa em empresa e propriedade. Assim, a partir de então, as análises sobre empresas familiares passaram a considerar três subsistemas: a família, a gestão da empresa e a propriedade. Esse modelo foi desenvolvido com o propósito de auxiliar as empresas familiares a identificar seus pontos fortes, distinguir suas propriedades e limitações e oferecer elementos que lhe possibilitassem ampliar a compreensão acerca do comportamento de seus integrantes. Mais tarde, Gersick et. al. (1997), acrescentando a variável tempo ao modelo proposto por Tagiuri e Davis (1985), rebatizaram o modelo de três círculos de "modelo de desenvolvimento", por ele possibilitar a visualização da evolução de cada eixo - família, empresa e propriedade - ao longo do tempo. Assim, esse modelo de desenvolvimento passou a evidenciar a evolução do negócio nas etapas de lançamento, expansão e maturidade bem como os ciclos familiares e as mudanças de propriedade. De acordo com Davis (2003, p. 97), a justificativa de se incorporar a dimensão tempo ao modelo justifica-se pelo fato de que: [...] Ao longo das gerações vão ocorrendo mudanças lentas, mas constantes, na natureza da família, e o mesmo ocorre com a empresa, no princípio é uma organização simples e pequena, porém depois se torna complexa. E, em alguns 14 casos, declina ou desaparece. A estrutura da propriedade também se modifica. Geralmente, no início, as empresas têm um único fundador ou proprietário; mais tarde, a propriedade se transfere a seus filhos; e, três ou quatro gerações adiante, acaba nas mãos de primos. O modelo de três círculos de Davis (2003) foca a dinâmica das empresas familiares em três dimensões, daí a origem de sua denominação: a) O eixo do negócio, que passa da etapa de lançamento para a de expansão e depois para a maturidade. b) O eixo da família, que no início é formado por um casal seus filhos pequenos; em seguida, surgem os diversos ramos do casamento de cada filho e, num terceiro momento, os filhos dessa segunda geração. c) O eixo da estrutura da propriedade, que acompanha a evolução das fases anteriores e que tem por característica as fases do proprietário controlador, a sociedade de irmãos e o consórcio de primos. Segundo Davis (2003), a análise das dimensões propostas pelo modelo propicia a identificação das fontes de conflitos interpessoais, bem como das prioridades e limitações das empresas familiares. O autor destaca que o modelo possibilita ainda abordar a questão das inter-relações sob a ótica de diferentes racionalidades, às vezes até mesmo opostas. Assim, esta pesquisa parte da premissa de que os três círculos do modelo estão harmonizados quando analisados conjuntamente e, quando isso ocorre, maiores são as chances de sucesso da empresa familiar. 2 Propriedade 5 4 6 1 7 Família Figura 1: Modelo de três círculos, de Davis e Tagiuri Fonte: DAVIS, 2003. 15 3 Gestão/ Empresa Grande parte dos conflitos existentes no âmbito da empresa familiar é gerada em virtude dos diferentes papéis e expectativas do indivíduo como proprietário, gestor ou membro da família proprietária. GERSICK (20057) identifica sete campos gerados pela sobreposição dos sistemas nesses diferentes papéis, resumidos no Quadro 4. Posição na estrutura Interesse associado a essa posição 1. Apenas proprietário Retorno sobre investimento; liquidez 2. Apenas gestor Segurança, apreciação à cultura familiar (por exemplo: recompensa/nepotismo); objetivos de carreira; satisfação com a direção familiar da firma 3. Proprietário e gestor Retorno sobre investimento, mais segurança e alguma autonomia 4. Proprietário e familiar não funcionário Informações; regras para acesso aos postos de trabalho; regras para entrada e saída de proprietários 5. Apenas familiar Vida familiar em equilíbrio com negócios, possibilidades de trabalho, propriedade, saúde 6. Familiar não proprietário Avaliação de regras para entrada na propriedade; prospecção de e gestor carreira e sucessão; reinvestimento de lucros (não liquidez) 7. Proprietário, gestor e membro familiar Todos os acima listados; como gerir o conflito de interesses e se manter focado Quadro 4: Interesses próprios dos constituintes do sistema da empresa familiar Fonte: GERSICK et al., 1997, p. 6. O fato de os membros familiares apresentarem diferentes interesses em relação à empresa não implica que esses interesses sejam ilegítimos (DUPAS, 2003). Contudo, é necessário ampliar o que o autor chama de "zona de consenso", a fim de que os interesses dos membros da família possam ser conciliados e, com isso, também haja a coesão do grupo familiar em torno dos negócios. Essa coesão é um dos elementos fundamentais para possibilitar uma transição negociada de uma geração a outra e para perpetuar os negócios da família. As transições constituem geralmente os momentos mais difíceis por que passa a empresa familiar, 16 pois, como bem nos lembram Gersick et al. (2003, p. 105), as "transições são repletas de incertezas e as pessoas responsáveis por tomar as decisões se sentem ansiosas e vulneráveis. E isso é compreensível, porque é nessas horas que a organização faz escolhas que modelarão o seu futuro". Para se compreender a dinâmica da empresa familiar, deve-se ainda considerar que a passagem do tempo influencia fortemente os dilemas vividos por essas empresas. Considerando essa dimensão, Gersick et al. (1997) desenvolveram o modelo a seguir (FIG. 2) com o objetivo de suprir a necessidade de um modelo centrado no desenvolvimento empresarial dentro das três perspectivas de análise propostas originalmente por Tagiuri e Davis (1985), que focam a diferenciação das empresas familiares nos contextos da gestão, da propriedade e da família. Figura 2: Modelo tridimensional de desenvolvimento das empresas familiares Fonte: GERSICK et al., 2003, p. 41. Três tipos de transição são identificados e descritos pelos autores: a transição recicladora, na qual mudam as pessoas, mas se mantém a mesma estrutura de propriedade; a transição involutiva, que significa uma mudança rumo a uma estrutura de propriedade menos complexa, e a transição evolutiva, o tipo de mudança mais comum, na qual a estrutura de propriedade passa a ser mais complexa, em função da entrada das gerações posteriores no negócio. O fator comum é que a mudança (ou transição) e o crescimento (estabilidade) são essenciais para o sucesso e a continuidade do negócio familiar, embora demandem tipos de trabalho diferentes. 17 Nesse sentido, haveria uma associação entre os períodos de transição com tarefas exploratórias e estratégicas, bem como períodos de estabilidade marcados pela natureza operacional e tática das empresas. Para que haja sucesso no desenvolvimento das empresas familiares ao longo do tempo, passando de uma geração para outra, é imprescindível observar o desenvolvimento dos três eixos do sistema delineado, a fim de que a evolução ocorra proporcional e gradualmente em todas as partes e de que não haja o descompasso entre elas. Isso poderia trazer problemas de ordem tangível (por exemplo, no caso do não-desenvolvimento de mecanismos de gestão para acompanhar a realidade de expansão da empresa) ou intangível (por exemplo, conflitos, explícitos ou latentes, entre os membros familiares, que podem ocasionar um processo de eclosão de uma transição). Para o propósito desta pesquisa, buscou-se aprofundar o modelo dos três círculos, por meio da elaboração das quatro categorias específicas, constituídas de vários elementos cada uma delas, como forma de operacionalizar a observação empírica dos três eixos propostos por Gersick et al. (2003), identificados a partir da observação dos fatores apontados como determinantes da longevidade das empresas familiares. Fatores Determinantes da Longevidade da Empresa Familiar São vários os fatores determinantes para a longevidade dessas empresas. De um modo geral, ao se analisar os principais dilemas enfrentados por uma empresa familiar, o que é possível ao se observarem as etapas do ciclo de vida das empresas, podem-se identificar trade-offs comuns, tais como: • aceitar mudanças ou manter-se fiel à estratégia definida pelo proprietáriocontrolador; • empregar os familiares ou afastá-los da gestão da empresa; • expandir a empresa ou manter a sua estrutura original; • profissionalizar a gestão ou utilizar apenas a intuição; • planejar a sucessão ou deixar que ela ocorra "naturalmente". 18 A partir do posicionamento das empresas em relação a esses trade-ffs, podem-se inferir alguns fatores elementares a respeito da longevidade das empresas e das possíveis ações que elas deverão tomar para potencializar a sua longevidade. Uma pesquisa realizada pela revista Family Business sobre as principais características das organizações longevas (aqui entendidas como aquelas que já atravessaram várias gerações) constatou que muitas se mantiveram relativamente pequenas (dos 102 negócios mais antigos pesquisados, quase a metade continuava empregando até 15 pessoas); a maioria não havia aberto seu capital e grande parte dessas empresas funcionava fora das grandes cidades (das 50 mais antigas, apenas sete se situam em áreas urbanas importantes). A identificação dessas características - manter-se relativamente pequena, não abrir o capital e atuar fora das grandes cidades - remete às origens das empresas de trabalho familiar, que, em geral, são pequenas e voltadas para empregar apenas mão-de-obra da família. Elas são um meio de trabalho mais do que uma finalidade em si mesmas. Nesse sentido, é preciso considerar a diferença desse tipo de empresa familiar para as de governo familiar, que são aquelas em que a família comanda a empresa, sem necessariamente assumir sua gestão operacional. Essas empresas estão mais alinhadas às regras do mercado e sua principal diferença em relação às primeiras é o fato de o controle estar concentrado nas mãos de um determinado grupo familiar. Para esse tipo de empresa - a de controle ou governança familiar - as estratégias freqüentemente mencionadas como explicativas para sua longevidade são: restrição da participação dos membros da família, capacidade de renovar as estratégias do negócio e de criar novas lideranças, além de saber enfrentar o contexto de mudanças em que estão inseridas (WARD, 2003). Para o autor, cada uma dessas estratégias deve ser implementada por diferentes razões: 1. Redução na participação dos membros da família: Deve ocorrer com base no fato de que à medida que na empresa há uma possibilidade de participação dos membros nos cargos de gestão, em progressão aritmética, enquanto que na família o crescimento ocorre em progressão geométrica. Disputas e rivalidades dentro da família devem ser evitadas e regras claras precisam ser estabelecidas, definindo-se quem e como os membros da família podem fazer parte da gestão da empresa, preferencialmente em um número cada vez menor. 2. Regeneração da estratégia empresarial: Uma das razões pelas quais as empresas nem sempre prosperam é o fato de os gestores não seguirem um planejamento estratégico prévio da organização. A regeneração estratégica consiste em reavaliar o posicionamento, os produtos, os mercados e a postura da organização de acordo com o seu estágio no ciclo de vida. 19 3. Regeneração da liderança: De forma geral, a regeneração estratégica possibilita o surgimento e a identificação de novas idéias e de novos líderes, que, por sua vez, revelam maior disposição do que os seus antecessores para lidar com os problemas da organização. Outro fator, mencionado por Lansberg (1999) como essencial para a continuidade da empresa familiar, é a instalação de um senso de comprometimento em todas as gerações. As armadilhas que causam o fracasso de muitas empresas familiares estão relacionadas ao egocentrismo e à relutância de delegar por parte dos fundadores, às rivalidades anteriores que passam a perpassar o negócio; às crises políticas que dividem a família em ramos de visão diferenciados; aos "hobbies e brinquedos" dos familiares que utilizam o caixa da empresa para financiar seus freqüentemente elevados gastos e à resistência dos líderes mais velhos de cederem seus lugares e os redefinirem na organização. Contornar os problemas da empresa familiar demanda a implementação de processos organizacionais pautados nos conceitos de recursos, competências e capacidades (ARREGLE; VERY; RAYTCHEVA, 2005). O desenvolvimento de um "senso de fazer parte" e de um propósito comum é mencionado por Leach (1998) como fator que possibilita ganhos para a empresa, no que se refere ao empenho dos funcionários, à possibilidade de geração de conhecimentos, à criação de um pensamento de longo prazo, à estabilização da cultura e ao desenvolvimento de um senso de pertencimento, confiabilidade e orgulho. O desenvolvimento das novas lideranças parece ser a forma mais eficaz de possibilitar o surgimento e o desenvolvimento da estratégia de crescimento. Para isso, é imprescindível que a empresa esteja orientada para a mudança, rompendo com a tradicional cultura tradicionalista das empresas familiares que privilegiam a lealdade, o paternalismo e a estabilidade. O pensamento estratégico orientado para o futuro, por sua vez, é mencionado por Ward (2003) como o fator mais decisivo para que a empresa familiar cresça e sobreviva por várias gerações. O planejamento é fundamental para orientar a empresa e a família a lidarem com a crescente complexidade que as relações familiares e dos negócios vão adquirindo ao longo das gerações. Os fundadores, [...] "acostumados a se portar de maneira autônoma", devem ser levados a dividir [...] "a responsabilidade pelas decisões e compartilhar as informações financeiras confidenciais com outros integrantes da empresa". (WARD, 2003, p. 115). O modelo de planejamento proposto por Ward (2003) está baseado nas seguintes premissas: a melhor forma para lidar com as constantes mudanças de um ambiente incerto consiste no desenvolvimento de um método sistemático de identificar, isolar e 20 selecionar as melhores alternativas, dentre um conjunto de possibilidades; o planejamento deve ser contínuo e dinâmico, pois o sucesso do passado não necessariamente se repetirá no futuro; a maioria das empresas atravessa ciclos de vida evolutivos, e entendê-los facilita as atividades de selecionar e conduzir de forma racional os melhores cursos de ação. Além de desenvolver atividades sistemáticas de planejamento, a empresa familiar precisa buscar formas para se renovar, o que também pode constituir mais uma fonte de conflitos. Quando os antigos proprietários vêem no planejamento uma ameaça ao seu poder pessoal, quando o consideram uma "camisa-de-força, que restringirá sua habilidade instintiva de sobrevivência e limitará a flexibilidade que o negócio exige" (WARD, 2003, p. 115), ou quando trazem o imperativo da divisão da autoridade e das responsabilidades, há resistência e dificuldades para se aprovarem as mudanças. Para empresas familiares que enfrentam esse dilema, o autor propõe uma sistemática particular de planejamento, constituída por cinco tipos específicos de planos: 1. Plano para a participação familiar na empresa: Busca instruir a família em relação ao negócio, estimular e valorizar o interesse da família pelo futuro do negócio, desenvolver lideranças futuras e possibilitar a transição das lideranças já estabelecidas para as novas gerações. 2. Plano estratégico da empresa: Visa identificar os caminhos por onde está caminhando a empresa, identificar os valores básicos que impulsionam o negócio e avaliar como os preceitos fundamentais estão sendo colocados em prática. 3. Plano estratégico para a família: Deve expressar a intenção da família, desenvolver uma visão conjunta acerca da maneira pela qual a família e a empresa devem colaborar e propor formas de restabelecer a cooperação futura com a liderança familiar. 4. Plano de divisão patrimonial: Visa definir questões fundamentais para a família, como estabelecer renda vitalícia após a aposentadoria para o proprietário fundador e seu cônjuge, definir quem e em que condições os membros da família participarão de fundos de capitalização e como serão financiadas novas oportunidades de negócio para os membros da família. 5. Plano para o desenvolvimento de liderança na sucessão: Tem por objetivo desenvolver e preparar o(s) sucessor(es) para assumir a liderança do negócio, bem como definir estratégias e parâmetros para capacitação dos novos líderes e avaliar o desempenho dos sucessores (WARD, 2003). 21 Além desses, o autor cita como importante a elaboração do planejamento patrimonial e da sucessão. O planejamento patrimonial deve contemplar questões como: análise das forças que modelam a empresa e a família; alternativas e caminhos alternativos relacionados ao futuro; identificação e alternativas para minimizar os pontos fracos e realçar os pontos fortes da família. Já em relação ao plano de sucessão, Ward (2003) relaciona alguns aspectos que devem ser contemplados, como definição da política que regerá a participação da família nos negócios; entendimento da família relativamente à continuidade da empresa nos negócios; estabelecimento de um plano de desenvolvimento para os líderes; estabelecimento do Conselho de Administração ativo; estratégias de financiamento dos membros mais antigos da família; definição das regras que guiem o processo de sucessão; estabelecimento de critérios para transferência do controle sobre a propriedade. Em abordagem mais recente, Ward (2004) considera que a continuidade da empresa depende das diretrizes estabelecidas em quatro tipos de planejamento, todos eles estabelecidos no nível estratégico da inter-relação entre empresa e família, como detalhado na FIG. 3. Plano Patrimônio e de Finanças Pessoais Plano de Continuidade da Familia Plano de Sucessão da Liderança e da Propriedade Plano Estratégico do Negócio Figura 3: Triângulo do planejamento da continuidade Fonte: WARD, 2004. Adequando a proposta de Ward (2004) sobre o processo de planejamento de continuidade da empresa familiar ao modelo dos três círculos de Davis (2003), percebese que o Plano de Continuidade da Família e o Plano de Sucessão da Liderança e da Propriedade se encaixam na área sobreposta pelos três círculos, pois estão relacionados às questões da propriedade e do negócio. O Plano de Patrimônio e de Finanças Pessoais 22 se encaixa na área sobreposta de família e propriedade, enquanto o Plano Estratégico do Negócio se identifica com a área sobreposta de família e negócio. A identificação de elementos comuns entre esses modelos nos permite inferir que todos eles podem ser reunidos na dimensão da governança da empresa familiar, que busca estruturar os mecanismos e processos de gestão fundamentais para que se mantenha o equilíbrio dos três eixos: propriedade, gestão e família. A questão crucial que a empresa familiar enfrenta consiste em estabelecer mecanismos que permitam sua sobrevivência ao longo das sucessivas transições que ocorrem entre as várias gerações. Gersick et al. (2003) identificam seis componentes genéricos da transição, que seriam comuns a todas as empresas, dependendo de seu ciclo de vida, e tenderiam a seguir um padrão bastante comum. Eles são sinteticamente descritos a seguir: 1. Acúmulo de pressões pró-desenvolvimento: Os autores usam a metáfora da geleira para descrever como são acumuladas as forças que culminam na pressão pela transição. Essa é descrita como um sistema funcional em expansão contínua, até que se atinja, por meio da interação com o ambiente, o equilíbrio ou a ruptura. No momento em que a expansão atinge o seu limite, gera-se a "explosão" das pressões e o início de uma nova fase. Uma vez desencadeada a transição, toda a pressão acumulada é ativada e o sistema tem a oportunidade de realizar as mudanças que possam promover o melhor aproveitamento dos recursos e o alinhamento de suas metas. 2. Detonador: Nesse caso, um evento ou uma situação específica desencadeia o início do processo de transição. Pode ser um alarme temporal, como a proximidade da idade compulsória para aposentadoria ou mesmo o afastamento definitivo do gestor. O detonador é o elemento visível que dá início à materialização de um amplo conjunto de pressões que vinham sendo adiadas ao longo do tempo. 3. Desprendimento: A mudança iniciada em virtude desse elemento consiste em reconhecer que uma determinada fase já passou e que é hora de assumir compromissos com uma nova fase. Geralmente é simbolizado por um compromisso público, como a definição de uma data de aposentadoria, a transferência de ações ou o lançamento de um programa de promoção dos candidatos a liderar a geração seguinte. 4. Avaliação de alternativas: Aqui, o desafio consiste em identificar diferentes formatos para a nova estrutura de propriedade e analisar sua viabilidade no que diz respeito aos sonhos, talentos e capacidades dos participantes. É um processo de teste, aprendizado e revisão. 23 5. Escolha: Em determinado momento, a empresa tem que escolher uma dentre as várias alternativas disponíveis. Essa fase geralmente é um passo do processo que já deve ter sido planejado e vem sendo trilhado há algum tempo. Processos de transição bem-sucedidos culminam com a realização de escolhas difíceis e com o encaminhamento do processo para os passos finais. 6. Compromisso com a nova estrutura: Nesse ponto, a empresa familiar declara formalmente que está pronta a funcionar de maneira diferente. Transições são fontes de renovação organizacional, mas também de crise, e a crise da sucessão é a maior que uma empresa geralmente enfrenta (ETZIONI, 1985). A maneira mais segura de enfrentar esse momento é encarar a transição como uma oportunidade de mudança e conduzir um processo de mudança planejada, visando minimizar os efeitos nocivos e inesperados das transições (GERSICK et al., 2003). Ward (2003), por sua vez, sugere que a formulação de respostas para as perguntas que seguem pode fornecer um check-list útil para nortear o planejamento dessa etapa: • Que forças modelam a empresa e a família? • Como essas forças influem no atual funcionamento do negócio? • O que tornou empresa e família bem-sucedidas até agora? • Quais os segredos para o sucesso futuro? • Que caminhos alternativos podem ser levados em conta? • O que se pode aprender da experiência de outras famílias e empresas em situações similares? • Como deve ser modelado o sucesso futuro? Deve-se confiar nas próprias forças? Superar os pontos fracos? Aproveitar recursos e oportunidades? Explorar valores e objetivos? • Como deve ser preparada a futura liderança? Todas essas questões remetem a quatro temas essenciais na discussão da sucessão em empresas familiares: a governança; o processo sucessório; a definição de regras, mecanismos e acordos; a família. Para operacionalizar e atender ao propósito desta pesquisa, buscou-se aprofundar o modelo dos três círculos, por meio da elaboração de quatro categorias específicas, constituídas de vários elementos cada uma delas, que 24 constituem o modelo empírico da pesquisa. Supõe-se que, a partir da revisão da literatura, essas quatro categorias abrangeriam os principais elementos subjacentes aos fatores determinantes da longevidade das empresas, já que estão relacionadas à dimensão da propriedade e da governança da empresa, à dimensão da sucessão (na gestão, na governança e no patrimônio) e à dimensão da família, nos aspectos relacionados a sua influência no encaminhamento dos negócios. Governança: estruturas e mecanismos Lank (2003) conceitua governança como o modo pelo qual as sociedades são governadas, dirigidas e controladas. Uma conceituação mais detalhada é oferecida pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, que considera a governança um "[...] sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas, envolvendo os relacionamentos entre acionistas, Conselho de Administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal. O objetivo das práticas de governança corporativa é a criação e operacionalização de um conjunto de mecanismos que visam fazer com que as decisões sejam tomadas de forma a se otimizar o desempenho de longo prazo das empresas. Assim, independentemente de sua forma de controle (familiar ou não familiar), a questão básica de governança de qualquer empresa privada se mantém inalterada" (IBGC, 2006). Além das questões tradicionais de governança, as empresas de controle familiar apresentam outras peculiaridades: a necessidade de equacionar o relacionamento entre parentes, os sentimentos envolvidos, o estabelecimento de novas lideranças, a transição de gerações, a pulverização da estrutura de propriedade ao longo do tempo e a necessidade de recurso das famílias, que não pode nem deve ser suprida pelo fluxo de caixa da empresa. A governança da empresa familiar, portanto, precisa equacionar desafios como a conciliação do crescimento familiar com o crescimento da rentabilidade, a harmonização dos interesses da empresa com as expectativas individuais, a educação dos herdeiros para o papel de acionistas, a profissionalização da família e propriedade e a criação de mecanismos eqüitativos transparentes para seus stakeholders. Para Lambretch (2005), a governança corporativa na empresa familiar é o elo que une o indivíduo, a família e a empresa. Assim, é necessário compreender que o indivíduo pertence à família, assim como esta pertence à empresa, sendo o ajustamento entre esses três níveis mediadso pela noção de governança. Cabe ressaltar aqui que o pertencer, como bem destaca Davis (2004), não significa abrir mão de suas convicções ou restringir a sua individualidade por causa da família ou da empresa, mas apenas evidenciar que é necessário que o indivíduo se comprometa com o grupo social do qual faz parte, aceitando as suas normas e colaborando com elas. 25 Em pesquisa recente realizada pelo IBGC (2006) com quinze grandes empresas familiares de sucesso no Brasil, diversos aspectos merecem atenção, como destacado no Quadro 5. Fator Resultados apresentados Idade das empresas familiares pesquisadas Variação de 5 a 107 anos. Estrutura do Conselho de Administração O tamanho médio dos conselhos das empresas é de nove membros (variando de 5 a 15 pessoas). Um terço das empresas apresentou Conselho de Administração com mais de nove membros, o que é considerado excessivo pelo IBGC. Apenas duas empresas declararam ter maioria de conselheiros independentes. Em média, as empresas possuem cerca de um terço de conselheiros independentes. Caráter uni ou multifamiliar Oito das empresas pesquisadas são multifamiliares e sete são do controle acionário unifamiliares. Participação das famílias na gestão da empresa Em seis empresas, as famílias controladoras optaram por permanecer exclusivamente como acionistas, deixando de atuar na condução dos negócios; a família se relaciona com a empresa como membros do Conselho de Administração. Conselhos de família Apenas cinco empresas possuem Conselho de Família formalizado. Quadro 5 - Síntese dos resultados da pesquisa realizada pelo IBGC em grandes empresas familiares brasileiras Fonte: Pesquisa IBGC, 2006. "Boas" práticas de governança, listadas para as empresas de forma geral, também podem ser utilizadas pelas empresas familiares para nortear a etapa de transição de uma geração para a outra, naturalmente considerando as especificidades da estrutura de propriedade da empresa e seu ciclo de vida. Dentre essas práticas, podem ser destacadas: • existência do Conselho de Administração e de conselheiros independentes; • definição de critérios para escolha do CEO; 26 • separação entre o CEO e o presidente do CAD; • mecanismos de sucessão nos órgãos de governança da empresa; • conselhos de família e de herdeiros; • reformulação estratégica em relação aos objetivos de longo prazo da empresa; • abertura e divulgação de informações para acionistas e mercado; • existência de auditoria independente. O processo sucessório A questão da sucessão merece um destaque, pelo significado e pelas estratégias que são estabelecidas no momento da passagem do negócio de uma geração para outra. O cuidadoso planejamento dessa etapa pode tornar a transição entre gerações um momento potencialmente efetivo para a organização, quando se conseguem conciliar os interesses da família e da empresa, em busca do desenvolvimento da empresa, da propriedade e da própria família (GERSICK et al., 2003). A sucessão nas empresas familiares é comumente vista e tratada como um evento transitório e esporádico, o que tem contribuído para explicar falhas identificadas no processo de transferência das empresas familiares entre as várias gerações. (LAMBRECHT, 2005). Para esse autor, a transferência multigeracional deve ser pensada como um processo de longa duração, cuja questão central consiste em se tentar compreender por que determinadas famílias têm sucesso na passagem do negócio para as gerações futuras enquanto outras falham. Ao processo de transferência do poder e controle para gerações futuras Lansberg (1999) dá o nome de transição multigeracional1. Nesse sentido, a sucessão é uma jornada, cujas escolhas são determinadas pelo sonho compartilhado da família; os desafios são pautados por mudanças fundamentais na estrutura de liderança e de propriedade. Para um bem-sucedido processo de sucessão, a empresa deve ser capaz de redefinir seus objetivos e recursos, no contexto das aspirações da família e das potencialidades da empresa face ao futuro. Entre os inúmeros estudos de casos sobre o tema sucessão, o autor apresenta um modelo sobre a 1 transferência das empresas familiares entre várias gerações. Em pesquisa realizada pelos autores deste relatório junto ao periódico internacional Family Business Review, do Family Business Institute, compreendendo o período de 1997 a 2007, o autor parece ser o único a desenvolver um modelo que contempla os vários períodos de transição intergeracionais. 27 Nesse contexto, o entendimento do fluxo do poder na empresa deve ser estabelecido a partir da definição da estrutura de propriedade. É a concentração ou a divisão das ações de propriedade que determina o tipo de estrutura na qual irá transitar a futura geração, estabelecendo o tipo de poder, de controle e o comportamento prevalente na empresa familiar. Para o autor, a sucessão deve ser dirigida por um relógio biológico, definido em função da idade dos líderes seniores e de seus sucessores. O processo sucessório significa que a redefinição das lideranças pode representar a oportunidade de reformular a direção da companhia e renovar suas energias (LANSBERG, 1999). O planejamento da sucessão deve considerar ou estabelecer políticas relativas à participação da família; à entrada de novos membros na empresa; às estratégias que viabilizem a continuidade da empresa ao longo do tempo, mediante declaração da missão familiar; à elaboração do plano de desenvolvimento para líderes; à definição de parâmetros para a participação de membros da família no Conselho de Administração; à especificação do plano estratégico; às políticas de financiamento da segurança econômica dos membros mais antigos; ao processo de seleção do(s) sucessor(es) e à outorga de poderes à equipe encarregada da transição e da transferência de controle sobre a propriedade, entre outros elementos. O modelo multigeracional de transferência do poder e controle nas empresas familiares de Lambrecht (2005) identifica cinco elementos fundamentais que devem ser considerados nos períodos de transição dessas organizações, quais sejam: 1. O modo como a família define a sucessão numa transição multigeracional O autor identifica cinco situações que podem ser encontradas em processos de transição: a) o sucessor assume naturalmente a liderança; b) há uma requisição explícita do sucedido para que o sucessor assuma o negócio; c) os sucessores assumem em virtude de circunstâncias alheias a sua vontade (ex.: doença ou morte do sucedido); d) vão surgindo lideranças espontâneas na família, como que seguindo formas predestinadas; e) o sucessor é preparado e formado para assumir, sob diversos aspectos, a liderança do negócio. 2. Motivação centrada na manutenção do negócio em família - Geralmente está associada a três razões: herança familiar, preservação do nome da família e exploração dos benefícios financeiros advindos de um produto ou nicho de mercado. 3. O modo de preparação da transição multigeracional - De maneira geral, os passos sistematizados que guiam uma transição programada incluem a identificação do espírito empreendedor, a realização de estudos, a educação formal interna, a experiência externa em outras empresas, a entrada oficial nos negócios e a habilitação para realizar planejamento e acordos formais. 28 4. O modo de transferência da propriedade, da gestão e a regulação da governança - Aqui, a governança assume o papel principal, para definir as regras que permitirão o funcionamento equilibrado dos outros dois elementos. 5. O papel dos "transferidores" da empresa familiar - Tanto os sucessores quanto os sucedidos, bem como os outros membros familiares, têm um papel importante nesse processo, no sentido de criar oportunidades para que a cultura e os valores da família sejam preservados e transferidos às novas gerações. Delineamento de Responsabilidade Comunicação honesta Planos Formais Símbolo Nome da Família Saúde dos Negócios Educação Formal Interna Sucessor Sucedido Valores individuais Mãe como Experiência externa liderança Começar de baixo simboólica Envolvimento desde cedo Pai como Sem coerção “Buddy” ou “Big Manitu” Liberdade Co-shareholder com Entusiasmo ascensão por entrada oficial INDIVíDUO Valores Familiares Somente Shareholdders Vantagens Ativos Competitivas F AMíLIA TEMPO EMPRESA Figura 4: Modelo multigeracional de Lambrecht Fonte: LAMBRECHT, 2005, p. 280. 29 Visando orientar o processo de transição multigeracional, Lambrecht (2005) aponta elementos que devem estar presentes nesse processo, quais sejam: • definição de políticas e diretrizes para orientar o processo sucessório na gestão; • realização de ações concretas relativas à transferência do controle acionário concomitantemente à sucessão na gestão; • implementação de ações efetivas relativamente à sucessão na gestão; • definição de políticas para definir critérios relativos a oportunidades de entrada e remuneração para cargos executivos entre familiares x não familiares; • definição de critérios de competência e mérito para entrada, promoção e desligamento de familiares na gestão; • orientação e formação profissional dentro e fora da empresa para os potenciais sucessores; • implantação de programas para formação dos herdeiros como futuros acionistas; • definição de políticas de aposentadoria; • desenvolvimento de mecanismos de proteção patrimonial. Com base nos critérios propostos por Lambrecht (2005), torna-se possível avaliar empiricamente como se dá o processo sucessório de uma geração, como proposto por esta pesquisa, bem como analisar a existência de padrões comuns nos processos sucessórios das empresas pesquisadas. As regras, acordos e critérios A categoria de regras, critérios e acordos estipulada por esta pesquisa incorpora vários mecanismos formais utilizados pelas empresas familiares, não necessariamente associados à governança ou à família. Trata-se de mecanismos e processos relativos à gestão da empresa, como a questão da profissionalização, que afeta tanto as empresas de controle familiar quanto aquelas de controle não familiar. A profissionalização da gestão é um imperativo às exigências de um mercado cada vez mais competitivo e, no caso da empresa de controle familiar, essa decisão implica a preparação dos herdeiros e dos grupos familiares envolvidos, a fim de possibilitar que esses indivíduos 30 desenvolvam a visão e as ferramentas indispensáveis para nortear sua compreensão acerca de questões complexas, nas esferas da família, da propriedade e da empresa. Para Aires (2003), a questão da profissionalização não pode ser abordada de maneira superficial. Não se trata apenas de retirar da Diretoria os herdeiros, ou representantes das diversas famílias, e contratar no mercado de trabalho executivos para assumirem suas posições. Nada disso vai adiantar se os "donos" não souberem conduzir a sociedade a uma visão comum, ou se não conseguirem se afastar do dia-a-dia da empresa sem "abandoná-la" (AIRES, 2003, p. 149). No caso das empresas de controle familiar, nas quais geralmente há a sobreposição de papéis e funções, torna-se importante o estabelecimento formal de regras e acordos para que se evite a transferência de conflitos da família para a empresa e desta para a família. Esses acordos têm justamente a finalidade de dar mais transparência às ações dos membros familiares, de reduzir a parcialidade e minimizar a subjetividade nas relações societais. Questões delicadas nas relações familiares, mas importantes para as reorganizações societárias e patrimoniais, precisam ser tratadas no processo de planejamento da sucessão, como o estabelecimento de regras de sucessão, as formas de utilização de bens da empresa, o parâmetro para o usufruto e a doação de cotas, os critérios que norteiam o processo de profissionalização da empresa, as regras de comercialização das cotas (ações) no mercado interno e externo, as condições para saída da empresa, etc. São algumas questões fundamentais que devem ser abordadas com precisão e com antecedência possível, para deixar claro aos membros familiares quais são as "regras do jogo" e o campo de mobilidade de cada um nesse cenário, evitando-se com isso uma série de conflitos. O processo de compra e venda de ações, tanto entre os próprios acionistas familiares quanto entre a família e pessoas de fora da sociedade, por exemplo, é um procedimento que deve ser objeto de bastante cuidado nesse processo (DAVIS, 2004). Um processo de reconcentração ou diluição de ações pode ser levado a termo e alterar todo o equilíbrio da composição acionária - inclusive ocasionando perda de controle pela família - com a saída não programada de um membro da família. Rearranjos de poder ocorrem nos momentos de transição e significam a instauração de novas alianças dentro da empresa, mas podem também ocorrer agrupamentos de membros insatisfeitos com o encaminhamento da sucessão. Esses indivíduos podem começar a trabalhar independentemente em torno de outras lideranças, criando enorme fonte de conflito. Assim é que reconcentração acionária torna-se uma alternativa para negociação com os minoritários, mas de forma clara e formal. Outra questão importante levantada por Davis (2004) refere-se à política de dividendos, que deve ser claramente definida em função das expectativas e necessidades dos acionistas familiares, a fim de fornecer incentivo para que os membros da família mantenham sua participação na empresa. 31 Todos esses elementos têm como base a formalização de processos dentro do âmbito da gestão da empresa, com vistas a se estabelecer o regramento das relações entre os membros familiares e não familiares. Para esta pesquisa, foram definidos os seguintes critérios: " acordo societário e/ou código de conduta; " reconcentração acionária; " mecanismos para o tratamento de conflitos na sociedade; " políticas de dividendos; " separação entre remuneração do capital e do trabalho; " estratégias de financiamento e investimento da empresa. Com base nesses elementos, buscou-se verificar sua existência e utilização nas empresas estudadas não os considerando diferenciadores dessas empresas, mas partindo da concepção de que seriam pré-requisitos necessários para uma administração eficiente e efetiva, no sentido de contribuir para a longevidade das mesmas. Família e valores Para que qualquer negócio familiar seja bem-sucedido e se perpetue ao longo das gerações, é necessário que incorpore os valores familiares, a história da família e suas raízes, pois esses são os elementos que permitem a coesão dos membros em torno de um objetivo comum, e que, muitas vezes, servem como mola propulsora tanto para a família quanto para a empresa (DAVIS, 2004). A dimensão afetiva e simbólica da família, contudo, precisa ser racional e formalmente organizada e estruturada para que possa ser utilizada em benefício da família e da empresa. Somente essa organização consegue transformar em mecanismos tangíveis as influências simbólicas ou intangíveis, geralmente esparsas e dispersas. Um dos mecanismos sugeridos por Davis (2004) para operacionalizar essa idéia é a criação do Conselho de Família, que criará regras, acordos e critérios (códigos de conduta ou acordo societário, por exemplo) alinhados às expectativas, às necessidades e aos valores da família. Essa instância poderá ainda declarar os valores e a visão da família sobre si e sobre o negócio, as formas de transmissão de valores para as futuras gerações, as formas a serem adotadas para identificação de lideranças e os mecanismos escolhidos para o encaminhamento e a resolução de conflitos na família. O Conselho de Família tem sua tradição nas empresas familiares européias de várias gerações e tem servido como um importante anteparo para preservar a harmonia 32 familiar e evitar que problemas associados à família possam intervir nos negócios. Esse mecanismo permite que determinados membros da família representem os interesses do conjunto de forma racional e ordenada, estabelecendo também uma interface com a empresa no que tange à transmissão de informações desta para a família e das necessidades e expectativas da família para a empresa. O Conselho também se encarrega de criar políticas para preservar os interesses da família em longo prazo (DAVIS, 2003) e, geralmente, estabelece a interface do clã com a esfera da governança. A constituição de um plano familiar, composto idealmente por três partes - a história da família, a visão de futuro e o plano de ação -, é sugerida pelo autor, que o considera um documento que objetiva organizar e formalizar as idéias e intenções da família para a sua preservação no longo prazo. A história da família deve registrar as passagens relevantes da vida de seus integrantes e trazer contribuição no sentido de evidenciar as raízes da família e o seu legado em termos da identidade e do senso de pertencimento. Serve para resgatar o passado, educar e integrar os jovens e estabelecer parâmetros que permitam construir uma visão de futuro para a família e a empresa. Dessa forma, pode-se explorar de forma positiva um dos fatores diferenciadores da empresa familiar em relação aos demais tipos de empresa, o qual geralmente proporciona vantagem competitiva, que é o conjunto dos elementos simbólicos, traduzidos pela cultura familiar, capaz de construir o amálgama que mantém a coesão da família em torno de um objetivo central. Nesta pesquisa, a dimensão família e valores foi operacionalizada por meio da abordagem aos seguintes aspectos: • valores e visão da família sobre o seu papel; • visão da família sobre o seu papel no negócio; • mecanismos da família para formação e transmissão de valores; • formação de lideranças e sucessores na família; • conflitos e mecanismos de solução na família; • família e autofinanciamento; • participação dos acionistas e seus herdeiros na gestão; • participação de parentes afins na gestão ou na governança; • reputação da família como fator relevante para o sucesso do negócio. 33 A partir da revisão conceitual, foram estabelecidas as dimensões da pesquisa, agrupadas em quatro conjuntos temáticos (categorias de análise), mencionados pela literatura como condicionantes fundamentais para se analisar a longevidade das empresas familiares. Buscou-se, então, avaliar nas empresas pesquisadas como essas dimensões vêm sendo vivenciadas para cada uma delas - no contexto de sua história e de seu momento particular de transição. A comparação entre as empresas deverá possibilitar a identificação de ciclos de eventos que possam contribuir para ampliar nossa compreensão acerca da longevidade das empresas familiares de médio e grande porte no Brasil. 34 Metodologia P ara identificar os fatores relacionados à longevidade das empresas familiares e a sua relação com a história empresarial de cada uma, abordada neste estudo, optou-se pela pesquisa de natureza qualitativa devido ao enfoque centrado no processo de identificação de padrões comportamentais dessas empresas. Como método de trabalho utilizou-se o estudo multicasos, uma vez que o objetivo era evidenciar padrões de relações entre um conjunto de empresas que compunham o universo da pesquisa. Os estudos multicasos oferecem ao pesquisador a possibilidade de aprofundar verticalmente na compreensão dos fenômenos, além de permitir a comparação entre os vários casos estudados e, conseqüentemente, a compreensão ampla do fenômeno estudado e a formulação de hipóteses para pesquisas futuras (YIN, 2005). Para o problema focado por esta pesquisa, a opção pela utilização de multicasos justificase na medida em que não foram identificadas, no Brasil, pesquisas relativas aos fatores que influenciam a longevidade das empresas familiares e que a teoria sobre a temática envolvida não é suficientemente consolidada. Assim, esta pesquisa busca explorar questões ainda parcialmente tratadas pela teoria, aprofundando a questão da longevidade, e avaliar sistematicamente um conjunto de empresas, para que então possam ser identificados padrões de regularidade, similaridades e diferenças entre os casos estudados. O universo da pesquisa é composto por empresas familiares brasileiras de médio e grande porte, ou seja, com receita líquida anual superior a 100 milhões de reais e com idade superior a 50 anos, a partir de sua fundação. Priorizaram-se empresas que já estejam com a segunda geração no comando e a terceira geração pelo menos em fase de preparação para atuar na empresa (considerando-se aí as diversas possibilidades em que essa atuação pode ocorrer), cujos sucessores tenham pelo menos 25 anos de idade. Algumas exceções, entretanto, foram consideradas pelos pesquisadores. Em duas empresas, a segunda geração já assumiu a gestão da empresa, mas o fundador ainda não se afastou totalmente dos negócios; portanto, não se pode caracterizar totalmente a conclusão do primeiro processo sucessório. Como essas empresas apresentavam vários outros requisitos interessantes em relação ao encaminhamento do processo sucessório e mostraram-se abertas a colaborar com o trabalho, optou-se por sua inclusão no universo da pesquisa. Essa decisão revelou-se acertada posteriormente, pois interessantes aspectos do processo de sucessão puderam ser apreendidos nessas organizações. 35 O critério relativo à idade das empresas é justificável na medida em que, em geral, elas necessitam de, no mínimo, cerca de 60 anos para atingirem a terceira geração de controladores, ou seja, com familiares interessados no negócio com idade superior a 25 anos. O corte relativo ao faturamento da empresa visou contemplar fatores relacionados ao seu tamanho, pois interessava a esta pesquisa trabalhar com empresas de médio para grande porte. Ao final, foram nove as empresas pesquisadas: • ABC Algar (Grupo) • Asamar (Grupo) • Cerâmicas Eliane S/A • Cia. Industrial Cataguazes • Embaré Indústrias Alimentícias S/A • Randon S/A • Renner Hermann S/A • RBS (Grupo) • Sabó Indústria e Comércio de Autopeças A unidade de análise escolhida é a de cada organização, individualmente. Os dados para a pesquisa foram obtidos por meio de fontes primárias e secundárias. As fontes primárias foram representadas pelas entrevistas e por informações cedidas pelas empresas pesquisadas, como estatutos, relatórios internos, códigos de ética e conduta, manuais e outros documentos. Informações do tipo secundárias foram obtidas por meio de consulta aos sítios disponíveis na internet, uma fonte extremamente útil para coleta de informações que subsidiaram a construção da história empresarial e da identificação de determinadas práticas da empresa em relação aos seus diversos stakeholders. Também foram encontrados livros, publicados em edições comemorativas de momentos marcantes da empresa (50 anos, por exemplo), que foram muito úteis para o levantamento de toda a história e dos fatos considerados relevantes na vida da empresa, sob sua própria perspectiva. A parte empírica da pesquisa foi desenvolvida em três grandes fases, interligadas entre si, e descritas a seguir. 36 1ª Fase: Levantamento de informações para a construção da história da empresa Por meio de consulta às fontes secundárias, essa fase buscou subsidiar os pesquisadores com informações relevantes para preparar a fase de visita à empresa e realizar as entrevistas. Um breve histórico da empresa foi elaborado, complementado posteriormente com informações coletadas durante a visita e as entrevistas. 2ª Fase: Realização das entrevistas Foi elaborado um roteiro semi-estruturado, com o objetivo de pautar a condução das entrevistas realizadas com proprietários familiares das empresas em estudo. Tal roteiro encontra-se integralmente apresentado no Anexo 1 e contém 44 questões, inclusive com a listagem de alguns elementos que deveriam ser lembrados pelo pesquisador no momento da entrevista. Concomitantemente, ao longo da fala do entrevistado, o pesquisador deveria identificar o momento específico em que determinadas decisões haviam sido implementadas. Deveriam ser identificados os momentos relevantes para caracterizar mudanças efetivas na história empresarial daquela empresa que pudessem ser associados ao processo de sucessão de uma geração a outra, e então deveria ser assinalado no roteiro quando isso havia ocorrido. Contudo, essa não se revelou uma questão simples sob o aspecto empírico. As transições de geração para geração nem sempre são marcadas pelos mesmos episódios. Numa determinada empresa, o entendimento de que ocorreu um processo de transição pode estar associado ao momento de mudança de CEO, por exemplo, enquanto noutra a transição está associada ao momento de mudança do presidente do Conselho. Esses dois exemplos ilustram situações que não são contempladas na teoria administrativa acerca do que constituiu, exatamente, o processo de transição não necessariamente de uma geração a outra, mas de estratégias que efetivamente representam momentos marcantes e definitivos na forma de gestão e de governança daquela empresa. Para auxiliar na identificação desses momentos, tentou-se inicialmente associar, durante a entrevista, cada uma das questões do roteiro ao momento histórico em que tinham ocorrido. Essa estratégia de pesquisa não foi bem-sucedida, pois nem sempre os entrevistados respondiam adequadamente a tal solicitação. Optou-se, então, por tentar acumular o maior volume possível de informações, para que os próprios pesquisadores efetuassem, a posteriori, a identificação e categorização desses momentos. Transcritas as entrevistas, o conteúdo das falas foi associado às quatro dimensões pesquisadas, agrupadas em diversas categorias cada uma, como se segue (ver também Anexo 2). 37 Categoria 1: Governança: Estruturas e Mecanismos Nesse item, são avaliadas questões relativas ao Conselho de Administração, ao CEO, à separação entre o CEO e o presidente do CAD, aos mecanismos de sucessão nos órgãos de governança, à existência de conselhos de família e de herdeiros, às definições estratégicas de longo prazo da empresa, aos mecanismos de produção e à divulgação de informações aos acionistas. Categoria 2: Sucessão A parte 2 do roteiro semi-estruturado contém questões relativas à existência de políticas e diretrizes para orientar o processo sucessório, ao nível de desenvolvimento de um plano sucessório, à transferência de controle acionário concomitantemente à sucessão na gestão, ao histórico da(s) sucessões já ocorridas, ao tipo de oportunidades oferecidas para os postulantes de cargos executivos entre familiares e não-familiares, à existência de processos mais formais de formação de sucessores dentro e fora da empresa, aos processos de formação de herdeiros enquanto acionistas, a políticas de afastamento de proprietários e de proteção patrimonial. Categoria 3: Regras, Acordos e Critérios A parte 3 do roteiro tratou de questões relativas ao acordo societário ou a código de conduta existente nas empresas, dos mecanismos de tratamento de conflito adotados, da política de dividendos, da separação entre remuneração do capital e do trabalho e das estratégias de financiamento e investimento adotadas pela família em relação aos negócios. Categoria 4: Família e Valores A última parte do roteiro apresentou aos entrevistados questões relativas aos valores e à visão da família acerca de seu papel na empresa, na família e nos negócios, aos mecanismos desenvolvidos para formação e transmissão de valores e formação de lideranças e sucessores, às formas existentes para encaminhamento e solução de conflitos, formas existentes para autofinanciar necessidades da família, participação de acionistas e de seus herdeiros na gestão, participação de parentes afins na gestão e na governança, visão acerca da importância da reputação da família como um fator relevante para o sucesso dos negócios. Nas empresas pesquisadas, foram identificados diversos momentos que caracterizaram as etapas de transição, relatados na parte 4 desta pesquisa, quando são apresentados os históricos de cada uma das empresas. Como será possível constatar, diferentes formas de identificar o processo de transição foram admitidas, optando os 38 pesquisadores por ater-se mais ao processo em si do que ao rigor de definir parâmetros muito estritos, que poderiam eliminar interessantes situações identificadas. Buscouse, assim, identificar os eventos mais importantes associados às fases de transição de uma geração, como visualizado na FIG. 5: Transição 1 1a geração Transição 2 Transição 3 3a geração 2a geração Fundadores 4a geração Sucessores na propriedade e na gestão Figura 5: Processo de transição empresarial Fonte: Elaborado pelos autores. Ainda como parte das estratégias de pesquisa, foi proposto pelos pesquisadores aos entrevistados que hierarquizassem, ao final da entrevista, um conjunto de itens identificados na literatura como especialmente relevantes para possibilitar a realização de processos sucessórios considerados bem-sucedidos. Foi-lhes solicitado que classificassem esses elementos em ordem de importância: do menor (1 como sendo o mais importante) para o maior (9 como sendo o menos importante). Os respondentes são membros das gerações atuais e anteriores, pertencentes às famílias de controladores das empresas pesquisadas. Buscou-se apreender as percepções dos protagonistas dos processos de sucessão acerca das questões apresentadas, relativas à empresa e à família. As entrevistas foram realizadas entre novembro de 2006 e agosto de 2007, dando origem a um volume considerável de informações, tratadas e analisadas ao longo da pesquisa. O relatório final foi preparado no período de novembro de 2007 a março de 2008. 39 Empresa Entrevistados ABC Algar (Grupo) Acionista e presidente do CAD Asamar (Grupo) Acionistas membros do CAD, representantes de três gerações Cerâmicas Eliane S/A Acionistas membros do CAD, da segunda e terceira gerações Cia. Industrial Cataguazes Acionista e ex-presidente CEO Embaré Indústrias Alimentícias S/A Acionista e diretor da empresa Randon S/A Presidente do CAD CEO da empresa Acionista Renner Hermann S/A Vice-presidente Herdeiros RBS (Grupo) Acionista e presidente do CAD CEO da empresa Sabó Ind. Com. Autopeças CEO da empresa Quadro 6: Detalhamento das entrevistas realizadas Fonte: Dados da pesquisa. O tratamento dos dados foi realizado por meio da análise temática do conteúdo das falas dos entrevistados (BARDIN, 1988), que foram transcritas e criteriosamente analisadas. Buscou-se identificar como ocorreu o processo de transição geracional, bem como a existência de padrões comuns, identificados nas nove empresas pesquisadas e que fossem associados aos processos de transição. O mapa analítico de interpretação das entrevistas e que serviu de base para a análise das repostas e construção dos padrões identificados pela pesquisa é apresentado na FIG. 6. Ao final da pesquisa, buscar-se-á discutir os momentos marcantes no processo de transição de cada uma das empresas para, ao final, identificar os elementos comuns a esses diversos momentos de transição. Como já mencionado, nem sempre as mudanças estratégicas em termos de sucessão e governança da empresa familiar 40 podem ser direta e objetivamente associadas à passagem de uma geração a outra, mas, como teremos a oportunidade de discutir, de alguma forma elas estão relacionadas, foram preparadas e direcionadas tendo em vista esse momento crucial na vida da empresa familiar. Transição 1 1a geração Transição 2 4a geração 3a geração 2a geração Fatores presentes Transição 3 Fatores presentes Fatores presentes Padrões Encontrados Figura 6: Mapa analítico de interpretação das entrevistas Fonte: Elaborado pelos autores. Na parte seguinte deste relatório, são apresentados os dados agrupados das nove empresas pesquisadas e, no Anexo 3, um quadro sintético que contém as informações consideradas mais importantes em relação a cada dimensão pesquisada. Na seqüência, são apresentadas as conclusões da pesquisa. 41 42 Análise N este tópico, descrevem-se os aspectos considerados especialmente relevantes para o processo de transição experimentado pelas empresas pesquisadas. O grande volume de informações coletadas, embora naturalmente enriqueça a análise, apresenta também o grande desafio de realizar a síntese sem perda de conteúdo. Inicialmente, a análise tomará como eixo norteador cada uma das categorias utilizadas pela pesquisa (Governança, Sucessão, Regras, Acordos e Critérios, além de Família e Valores). Posteriormente, serão discutidos os fatores recorrentes nos processos de transição, para, finalmente, se concluir com algumas recomendações de caráter mais geral. Governança - Estruturas e Mecanismos Das nove empresas pesquisadas, oito possuem Conselhos de Administração, cuja composição varia entre cinco e onze membros. Embora a criação do CAD nessas empresas esteja associada ao atendimento de exigências legais já bastante antigas, em todas elas, as alterações mais recentes na estrutura de propriedade e de poder na empresa implicaram alterações na estrutura, no tamanho e no funcionamento do Conselho. Na maioria das empresas, a presidência do Conselho ou a participação nele constitui o elemento de ligação entre a(s) família(s) e a empresa. A maior parte dos componentes do CAD são acionistas; uma das empresas possui conselheiros indicados pelos minoritários e por investidores institucionais, mas o número de conselheiros independentes ainda é significativamente inferior. Uma das empresas pesquisadas, a Cia. Industrial Cataguazes, optou por uma composição bastante inovadora do CAD, no qual três conselheiros são independentes e os outros dois, representantes das famílias proprietárias. O Conselho aparece em praticamente todas as empresas como uma instância que vem gradativamente assumindo um papel mais efetivo na condução estratégica dos negócios. Alguns conselhos já apresentam, entre seus membros, conselheiros independentes com elevado nível de formação e experiência. Contudo, observa-se que ainda não foram implantados mecanismos formais para avaliação do desempenho do Conselho. Em sete das nove empresas pesquisadas, há separação entre o presidente do Conselho de Administração e o CEO da empresa. Nas empresas onde não há essa separação, ambos os cargos são exercidos por membros da família controladora. Todas as empresas 43 demonstraram grande preocupação com a definição de critérios claros para a escolha do CEO e algumas já apresentam avanços significativos nesse processo. Podem ser identificadas aí duas linhas distintas: algumas empresas optam por profissionalizar a gestão da empresa por meio da contratação de profissionais de mercado; outras preferem identificar, formar e selecionar membros da própria família, os quais, geralmente, após um longo processo de preparação, são alçados ao cargo de CEO da empresa. Competência, mérito e talento para os negócios são mencionados como critérios fundamentais a serem apresentados pelos candidatos ao cargo. Independentemente da forma de encaminhamento, percebe-se uma grande preocupação de todas as empresas no sentido de se definirem critérios que impeçam o exercício do cargo por pessoas que não apresentem elevada competência para tal. Observa-se ainda que a definição desses critérios geralmente começa a ocorrer após o ingresso da segunda geração na empresa da família. Em todas as empresas, a questão da sucessão é discutida de forma direta ou por meio do desenvolvimento e da implementação de mecanismos relacionados à estrutura societária, ao reforço ao papel do Conselho, à criação de critérios para orientar o ingresso e a ascensão de membros da família na empresa, à redefinição das cláusulas que regem os acordos de acionistas e à definição de critérios para afastamento dos membros da geração anterior. Dificuldades para discussão direta da questão da sucessão, quando esta ocorre, estão relacionadas à permanência de importantes membros da geração anterior na estrutura de propriedade da empresa. Nesses casos, buscam-se formas graduais de se proceder à sucessão, quando as novas gerações vão assumindo, de fato, a gestão e a condução dos negócios, alçando os membros mais antigos da família a posições de comando geralmente dos órgãos de governança da empresa. O afastamento de membros das gerações antecessoras não representa uma situação fácil para as empresas, que geralmente aguardam que o membro mais antigo anuncie sua decisão acerca de quando e como deseja afastar-se do negócio. Até que isso ocorra, o assunto é evitado ou tratado com constrangimento pelos sucessores. Conselhos de família vêm sendo constituídos, em quase todas as empresas pesquisadas, de maneira formal ou informal. Em uma das empresas, o Conselho, já em funcionamento, encontra-se solidamente estruturado, guiado por regimento próprio, que define a natureza, os propósitos, a composição e as atribuições desse órgão. A experiência de criação do Conselho foi mencionada pela empresa como muito importante no processo de planejamento do processo de sucessão. Não se identificou em nenhuma das empresas pesquisadas a existência de conselhos de herdeiros. De maneira geral, não se podem associar mudanças nas estratégias empresariais aos processos de transição na sucessão já ocorrida ou em curso nas empresas. Nos casos em que houve mudanças estratégicas - e foram várias - elas estão mais associadas a imperativos macroeconômicas, à abertura da economia iniciada na década de 90, à 44 internacionalização da empresa ou ao acirramento da concorrência. Contudo, pode-se afirmar que mudanças na estrutura patrimonial, de propriedade e de poder das empresas implicaram alterações na forma como as questões estratégicas são discutidas e decididas. A maior estruturação dos conselhos de administração, a profissionalização da gestão e uma mais clara delimitação da esfera de atuação da família implicaram a condução de processos estratégicos tecnicamente mais elaborados, com ampliação da visão de longo prazo, e mais formalizados, inclusive com o uso das ferramentas de planejamento estratégico. Como a maioria das empresas da pesquisa é constituída por sociedades anônimas, todas elas produzem e divulgam as informações requeridas desse tipo de sociedade para o mercado. Não foi possível, contudo, associar políticas específicas de disclosure concomitantes aos processos de transição ou uma preocupação mais dirigida no sentido de produzir e disseminar informações para segmentos específicos da família. Como geralmente essas empresas possuem um significativo volume de informações, é sempre mencionado que acionistas e membros do Conselho de Administração dispõem de acesso irrestrito a todas elas. Não se observa, contudo, a adequação das informações aos diferentes perfis representados por esses segmentos. Todas as empresas têm seu sítio na internet, com diferentes níveis de detalhamento. Alguns deles contêm informações mais mercadológicas, enquanto outros apresentam maior grau de sofisticação, especialmente num dos casos, em que a empresa já integra níveis diferenciados de governança da Bovespa. Assim, pode-se inferir que as estratégias de produção e disseminação de informações nas empresas pesquisadas parecem estar mais associadas ao cumprimento de determinações legais e à dependência da empresa em relação a acionistas e investidores externos do que propriamente a variáveis relacionadas ao processo de transição. Sucessão A definição de políticas e diretrizes para orientar o processo sucessório encontra-se em discussão, de forma mais ou menos intensa, em todas as empresas pesquisadas, e diferentes estratégias vêm sendo discutidas e implementadas. Puderam ser identificados basicamente três diferentes estágios por que passam as empresas pesquisadas, que tentaremos sintetizar aqui. a) Processos sucessórios incipientes: Nessa categoria se encontram basicamente as empresas que estão iniciando a discussão do processo sucessório; os mecanismos de governança que auxiliam no suporte ao processo de profissionalização da empresa começam a ser estruturados, embora o CAD aí não tenha ainda assumido um papel mais estratégico e 45 independente. Nem sempre há separação entre o presidente do CAD e o CEO da empresa; a fragilidade de critérios norteadores para guiar o processo sucessório geralmente traz como conseqüência a permanência de membros mais antigos, que tendem a permanecer indefinidamente na empresa, dificultando a transição intergeracional. Essas empresas geralmente estão encaminhando seus primeiros processos sucessórios e o número de envolvidos encontra-se ainda sob controle. Observa-se, contudo, que a temática da sucessão constitui uma grande preocupação nessas empresas, pois os atuais gestores sabem que as estratégias utilizadas em processos anteriores não servirão para nortear as sucessões futuras. Pode-se perceber também uma às vezes significativa diferença em termos da evolução da empresa, no que se refere à sua modernização tecnológica e ao gerenciamento de seus processos operacionais e à forma de conduzir seu processo de profissionalização. Há que se observar aqui que imperativos de mercado, tais como aumento da concorrência, processos de internacionalização e oportunidades de crescimento forçam as empresas a modernizarem seus processos e suas tecnologias, mas igual pressão necessariamente não atua no mesmo ritmo sobre seus processos de gestão. Quando se fala sobre os critérios a serem utilizados para nortear a escolha dos futuros sucessores, todos os atributos aparecem vinculados à competência profissional e à meritocracia. Contudo, são ainda incipientes as ações efetivas no sentido de se estabelecerem formalmente esses critérios e, especialmente, de se criarem instâncias formais, como conselhos de família ou de herdeiros, holdings patrimoniais e familiares, práticas efetivas de governança corporativa e, sob o aspecto da cultura e dos valores, mecanismos que trabalhem a família, no que tange ao aspecto cognitivo, para perceber e vivenciar seu papel de forma mais adequada a uma nova realidade. Tais empresas provavelmente optarão pela continuidade da família tanto na condução operacional dos negócios quanto nos órgãos de governança já existentes ou que vierem a ser criados. Duas das nove empresas pesquisadas apresentam prioritariamente essas características. b) Processos sucessório em implantação: Quatro das nove empresas pesquisadas encontram-se em fase de discussão, estruturação e implementação de mecanismos para guiar seus próximos processos sucessórios, algumas em etapa já bastante avançada. Nessas empresas, o Conselho de Administração se encontra bastante estruturado, alguns até com a participação efetiva de conselheiros independentes; há separação entre os presidentes do Conselho e os CEOs das empresas e critérios já estabelecidos para escolha do CEO, que necessariamente não tem de ser um membro da família, visto que a maioria dessas empresas considera a possibilidade de contratação de executivos de mercado para o cargo; para a escolha de sucessores, critérios de competência e mérito já se encontram 46 definidos e membros postulantes a cargos de gestão conhecem as regras e estão sendo preparados, de maneira mais ou menos formal, para a sucessão. Em pelo menos uma das empresas pesquisadas, existe uma forte determinação no sentido de que os sucessores não participem efetivamente da gestão e tornem-se, prioritariamente, acionistas da empresa, com presença exclusiva em órgãos estratégicos, como o Conselho de Administração. Há, aí, um explícito incentivo para que as novas gerações construam carreiras independentes da empresa. Em todas essas empresas, já foram criadas holdings patrimoniais e, em alguns casos, holdings familiares, nas quais efetivamente ocorre a transferência de propriedade das ações da família. Acordos de Acionistas constituem uma prática corrente. Todas as empresas que estão nesse grupo se utilizam de técnicas estruturadas de planejamento e gestão, bem como apresentam modernas tecnologias de produção, fato que pode ser atribuído mais ao porte, ao amadurecimento das empresas e ao mercado competitivo no qual estão inseridas do que ao avanço na estruturação de seus processos sucessórios. Uma das empresas desse grupo já compõe o nível 1 de governança corporativa da Bovespa, o que naturalmente impacta o ritmo em que devem ser criadas e implementados as chamadas "boas práticas de governança corporativa". Quando a empresa mantém ativa negociação no mercado acionário, uma série de exigências em relação a transparência, accountability e eqüidade no tratamento de acionistas precisam ser cumpridas, o que evidentemente tem profundos impactos na definição de mecanismos que tragam tranqüilidade ao mercado. Adicionalmente, novos shareholders são incorporados aos acionistas já existentes - como fundos de previdência, por exemplo, que passam a demandar maior profissionalização da empresa em todas as dimensões. O aspecto mais vulnerável desse grupo de empresas talvez possa ser encontrado no frágil e informal papel atribuído aos conselhos de família e/ou de herdeiros, bem como na utilização de mecanismos mais estruturados para preparar a família para uma relação nova e diferente com os negócios - de proprietários para acionistas. Embora seja recorrente a idéia da centralidade da família e a importância de sua coesão para a longevidade da empresa, na prática ainda são tênues os mecanismos que facilitem o encontro, a convivência e, principalmente, o enfrentamento dos inevitáveis conflitos de interesses. Em todas as empresas, aparece um forte apreço pelos valores e crenças dos fundadores, mas os atuais membros da família que estão à frente dos negócios temem que a parte da história da empresa que se entrelaça com a da família fundadora se perca com o tempo. c) Processos sucessórios implantados: Em três das nove empresas pesquisadas, puderam ser identificados processos de sucessão mais consolidados. Todas elas já passaram por diversos processos sucessórios, alguns inesperados e traumáticos, e se encontram (ou se encaminham) 47 para a terceira ou quarta geração de sucessores. Conselhos de Administração ativos, bem estruturados e altamente profissionalizados são órgãos existentes em todas elas, bem como uma gestão também profissionalizada, seja por meio da contratação de executivos de mercado, seja por meio da participação de membros da família selecionados por critérios de mérito e competência. As regras para participação nos conselhos estão definidas e algumas já formalizadas em acordos societários ou de acionistas; há separação entre os cargos de presidente do Conselho e de CEO e regras para se definir a aposentadoria de executivos e membros do Conselho já foram definidas. Há que se observar que essas empresas cresceram intensamente nas últimas décadas, atuam em mercados altamente competitivos, utilizam tecnologia de ponta e algumas já participam de mercados externos. O imperativo da profissionalização para essas organizações foi trazido, em grande medida, pela complexidade do ambiente, pela acirrada concorrência enfrentada e pelo aumento no tamanho da empresa. Nesse contexto, a empresa tem de considerar formas de profissionalização que interferem na dinâmica da concentração do poder unicamente nas mãos da família e podem torná-la vulnerável a problemas de capacitação para o exercício de determinadas posições acerca das quais não se pode correr risco. Outro aspecto a ser observado nessas empresas é a presença de mecanismos bastante avançados no sentido de se aproximar a família e a empresa. Conselhos de Família, de Sucessores e de Herdeiros estão estruturados, com atribuições e papéis bem definidos; já aparecem também programas para orientação dos futuros herdeiros e identificação e treinamento de lideranças dentro das famílias, bem como programas bastante estruturados para preparar as futuras gerações para o papel de acionistas. Em síntese, o avanço nos mecanismos de sucessão nas empresas pesquisadas devese a fatores bastante diferenciados. Em algumas, esse avanço pode ser atribuído ao crescimento da empresa, que passou a demandar estruturas e processos de gestão mais profissionalizados; em outras, à maturidade da empresa, que já se deparou com vários processos sucessórios e amadureceu seus mecanismos para enfrentar o problema; contudo, há também empresas com significativos avanços em seus mecanismos de sucessão e governança e que estão apenas na segunda geração. Em algumas, a evolução nos mecanismos existentes deve-se a práticas de fundadores ou de seus primeiros sucessores, que, à frente de seu tempo, perceberam a necessidade de prepararem seus próprios sucessores e de se afastarem da empresa no momento que consideraram adequado. Assim, uma das conclusões relevantes desta pesquisa pode ser a de que o momento adequado para que cada empresa familiar comece a preparar a sucessão deve ser o mais prematuro possível, de preferência ainda pelo fundador. Os problemas experimentados por empresas que têm de levar a termo processos de sucessão abruptos e conflitantes já são muito difundidos pela literatura 48 e pela observação. Contudo, mesmo empresas familiares maduras e de porte nem sempre revelam o mesmo talento para lidar com a sucessão como o que apresentam para lidar com os assuntos do negócio. Regras, Acordos e Critérios Acordos acionários constituem a base fundamental para expressar os acordos familiares e os compromissos assumidos e podem ser expressos tanto por meio de documentos formais quanto por acordos "de gaveta". Todas as empresas pesquisadas possuem Acordo de Familiares. Em algumas empresas, o Acordo constitui um mecanismo que já vem sendo utilizado há alguns anos e, além de expressar compromissos assumidos pelos acionistas, detalha também aspectos relativos à participação da família na empresa, as regras de governança, de sucessão, de comportamento e de conduta. Alguns tipos de documentos, pouco comuns há alguns anos, começam a aparecer nessas empresas. Foram mencionados, por exemplo, a existência de Códigos de Ética, para nortear o comportamento tanto da família quanto de empregados da empresa, Código de Conduta para famílias proprietárias, Regimento Interno de Conselhos de Administração e de Conselhos de Família. Todos esses documentos são vistos como importantes elementos para definir políticas, criar e comunicar regras que possibilitem antecipar, mediar e, se possível, prevenir as possibilidades de conflitos entre herdeiros, entre a família e a empresa e dentro da empresa. Observa-se, contudo, que a existência de fóruns estruturados para discussão da problemática da sucessão, bem como o processo de elaboração de regras escritas sobre o funcionamento desses fóruns constituem ainda mecanismos incipientes nas empresas. Em várias delas, está em discussão a possibilidade de se criarem alguns desses fóruns (por exemplo, Conselho de Família ou de Herdeiros); em outras, incentivase a discussão da temática da sucessão em momentos específicos, especialmente quando a empresa está vivendo algum problema relativo a esse aspecto, mas de maneira informal e não estruturada. A existência de um Conselho de Família, inclusive com regimento próprio, apareceu em diversas empresas pesquisadas. A discussão franca e objetiva dos problemas de sucessão aparecem como políticas que devem guiar o comportamento dos indivíduos, mas não necessariamente suportadas por fóruns ou regulamentos específicos. A prática encontrada nas empresas pesquisadas possibilita concluir que existem importantes avanços nos mecanismos de encaminhamento da problemática da sucessão. Na passagem da primeira para a segunda geração, geralmente a sucessão é encaminhada pelo fundador da empresa, que permanece nos negócios até alcançar uma idade avançada e, muito freqüentemente, indica o filho mais velho para sucedê- 49 lo. Da segunda para a terceira geração, geralmente são discutidos critérios para nortear o processo sucessório, mas eles permanecem como acordos tácitos entre os herdeiros. Parece ocorrer na terceira geração importantes avanços em relação à consolidação do processo, com a formalização de critérios para nortear a sucessão e que são baseados no mérito e na competência profissional dos interessados. A maioria das empresas pesquisadas encontra-se na terceira geração e os entrevistados demonstraram grande preocupação com as próximas transições, uma vez que o número de pessoas envolvidas em cada processo sucessório cresce em progressão quase geométrica e a cada geração tende a tornar-se mais complexo. Todos foram unânimes em reconhecer que aquilo que funcionou no passado necessariamente não funcionará da mesma forma no futuro e que a constituição de fóruns de discussão mais sistematizados e estruturados provavelmente tornar-se-á uma necessidade imperiosa para a empresa familiar que deseja sobreviver aos momentos de transição intergeracional. Outros elementos avaliados dentro da categoria "Regras, Acordos e Critérios" foram as políticas de dividendos praticadas pelas empresas, as formas de remuneração do capital e do trabalho e as estratégias de financiamento e investimento utilizadas pelas empresas. Se a escolha dos dois primeiros elementos pode ser justificada com facilidade (afinal, a definição de regras que norteiam o jogo empresarial é fundamental para orientar a decisão de investir, atuar, permanecer ou buscar alternativas ao negócio), a relação do último critério (estratégias de financiamento e investimento) com a questão da sucessão precisa ser justificada como estratégia metodológica. Tentou-se, aqui, analisar se a existência de políticas bem definidas de investimento e de estratégias para financiar o crescimento da empresa influencia as perspectivas das novas gerações no sentido de permanecer ou não na gestão da empresa. De fato, essa parece ser uma razão consistente, pois não há sentido econômico para as novas gerações demonstrarem interesse em construir suas carreiras em empresas com poucas perspectivas futuras. Por outro lado, muitas vezes as novas gerações são demandadas porque representam a esperança de salvar empresas em dificuldades. Há ainda situações em que a necessidade de se realizar uma sucessão inesperada é colocada pelo imponderável e os herdeiros se vêem na necessidade de assumir a empresa até pela inexistência de alternativas de curto prazo. Nas empresas pesquisadas, a relação entre a existência de políticas e práticas de sucessão claramente definidas e de estratégias de financiamento e investimento não pode ser estabelecida com clareza. De maneira geral, todas as empresas pesquisadas relatam a existência de estratégias de investimento a médio e longo prazo, financiadas preferencialmente com o reinvestimento dos lucros gerados pelo próprio negócio - prática amplamente referenciada pela literatura como uma opção minimizadora de risco e demonstrada por grande parte das empresas brasileiras. Outras opções também aparecem, como financiamento por meio de captação de recursos de longo prazo em bancos de fomento, lançamento de novas ações (embora essa opção seja vista com 50 reservas, pela diluição do capital ordinário que efetivamente pode representar) e acesso a crédito via mercado de capitais externo (ADRs, por exemplo). Mais recentemente, associações com empresas estrangeiras, por meio de joint ventures, têm representado importantes alternativas estratégicas para viabilizar o processo de crescimento e, principalmente, de acesso a mercados onde a empresa parceira já atua. Algumas das empresas pesquisadas relatam já terem vivido graves crises financeiras no passado, mas nenhuma delas menciona dificuldades severas em relação a esse aspecto no momento atual. Portanto, nessas empresas, a questão da sucessão se coloca aparentemente independente da existência de perspectivas financeiras futuras, não necessariamente porque esses elementos sejam de fato separados, mas porque nas empresas pesquisadas as perspectivas futuras representam possibilidades bem equacionadas no presente. Discutir a problemática da sucessão em empresas longevas apresenta, provavelmente, maior racionalidade econômica e maior atratividade do que em empresas onde a decisão de tocar o negócio é mais uma obrigação da qual não se pode fugir. A relação entre a existência de políticas de distribuição de dividendos e de formas distintas de remuneração do capital e do trabalho e a questão da sucessão na empresa familiar podem não parecer óbvias, mas sua existência é postulada por esta pesquisa. Uma das questões mais importantes na definição de políticas para nortear o processo sucessório parece ser a separação entre a propriedade e a gestão da empresa. A remuneração do acionista ocorre naturalmente via recebimento de dividendos; portanto, pressupõe-se que herdeiros tenderão a ocupar seu lugar de acionistas quando a possibilidade de serem remunerados via dividendos for atrativa. Por outro lado, a prática de se associar remuneração relativa ao trabalho prestado pelos acionistas na empresa majorando-a pelo fato de ele (ou ela) ostentar a condição de sócio ou reduzindo-a em momentos de crise também não se mostra uma prática que facilite a profissionalização na relação da empresa com seus proprietários e gestores, nesses diferentes papéis. Em todas as empresas pesquisadas, há clara separação entre remuneração do capital e do trabalho, o que poderia ser esperado, tendo em vista o porte e o nível de profissionalização dessas empresas. Todas as empresas participantes desta pesquisa são sociedades anônimas (de capital aberto ou fechado) e, portanto, têm de atender à Lei das S/A, que estabelece o pagamento de, no mínimo, 25% do lucro líquido sob a forma de dividendos. Empresas em fase de crescimento geralmente destinam grande parte de seus lucros para o reinvestimento no próprio negócio, destinando apenas o percentual mínimo para distribuição entre os acionistas. Se, por um lado, essa política constitui a fonte de financiamento mais utilizada pelas empresas pesquisadas, ela pode também inibir a atratividade dos dividendos para todos os grupos de acionistas. Praticamente todas as empresas pesquisadas mencionaram políticas mais conservadoras de distribuição de dividendos, com percentuais próximos aos estabelecidos pela legislação, bem como a opção pela alternativa estratégica de utilização de lucros para financiar o processo de 51 crescimento da empresa. Não se pôde constatar, contudo, relação de causalidade entre a existência de política de dividendos e de sucessão, uma vez que todas as empresas pesquisadas apresentam as políticas básicas estabelecidas para atender à legislação. Por outro lado, uma das empresas pesquisadas, que apresenta avanço em relação ao desenvolvimento de regras para nortear o processo sucessório, demonstrou clara preocupação em assegurar para os herdeiros dividendos atrativos, que deverão competir com a possibilidade de venda das ações da empresa e conseqüente desestabilização da situação de controle acionário por parte da família. Essa preocupação se acentua na medida em que, a cada geração, o número de herdeiros aumenta significativamente, reduzindo o percentual relativo de cada acionista. Pode-se argüir, por outro lado, que essa preocupação relaciona-se mais à lucratividade do negócio como um todo do que propriamente à política de distribuição de dividendos praticada pela empresa, embora possa também ser afetada por ela. A existência de regras, acordos e critérios revelou-se, nesta pesquisa, uma dimensão de avaliação complexa. Se, por um lado, o aparato formal, legal e institucional é essencial para fornecer as bases para se pensar e planejar o futuro, por outro, o porte das empresas e a profissionalização dos instrumentos de gestão utilizados por elas tornam a avaliação dessa dimensão problemática. Como todas as empresas pesquisadas são bastante similares em relação à existência prévia de um aparato formal, tal dimensão deixou de constituir um fator discricionário para avaliar a existência ou mesmo os avanços na implementação de políticas para guiar o processo sucessório. A pesquisas futuras pode-se recomendar cuidadosa avaliação acerca da pertinência de utilização dessa dimensão, ao menos com os mesmos indicadores aqui utilizados, dada a dificuldade para se estabelecerem relações mais estritas entre essa dimensão e a questão da sucessão nas empresas familiares. Família e Valores Empresas familiares longevas provavelmente sobreviveram ao desafio da sucessão ao longo das diversas gerações porque conseguiram um nível de diálogo e maturidade intergeracional diferenciado. Essa constatação constitui talvez a conclusão mais relevante desta pesquisa, ainda que descrever operacionalmente esse processo não seja tarefa simples. Todos os entrevistados expressam fortes crenças acerca do papel da família, tanto internamente quanto em relação ao negócio. Essa crença é manifestada quando se 52 diz, por exemplo, que a família aprendeu que o negócio é maior do que as diferenças individuais que efetivamente existem entre os membros de cada ramo familiar. Princípios éticos, respeito às diferenças e uma série de valores comuns são mencionados pelos entrevistados, mas sempre se pode argumentar pela existência de um discurso articulado, mais do que pela real existência de princípios diferenciados em relação a valores praticados por diversos grupos sociais e familiares. O aprofundamento dessa questão, contudo, mostrou mais do que um discurso apenas ufanista em nome dos valores da família: a existência de conflitos, de diferenças e até mesmo de crises não foi negada pelos entrevistados. Esses momentos, contudo, parecem ter sido enfrentados pelas famílias como obstáculos a serem superados, e não impedimento para discussão das questões de sucessão ou de outros problemas que eventualmente ocorram no contexto da família e da empresa. Um grande número de situações já foi experimentado pelas empresas pesquisadas, dentre as quais identificamos pelo menos as seguintes: 1) processos de sucessão deflagrados de forma inesperada, em virtude da morte prematura do membro da família que detinha o controle da empresa; 2) disputas entre membros da mesma família ou entre membros das famílias proprietárias; 3) necessidade de acomodar grande número de herdeirosproprietários; 4) elevada dependência de acionistas em relação à empresa; 5) resistência de acionistas controladores no sentido de se afastar das atividades de gestão da empresa; 6) dissidência entre famílias controladoras. Os problemas com os quais se depararam (ou ainda se deparam) essas empresas não parecem menores do que aqueles que, em diversas empresas, dificultam ou mesmo inviabilizam o encaminhamento do processo sucessório. O que parece ter sido diferente aqui é a forma como essas questões têm sido encaminhadas, no sentido de se buscarem, de forma perseverante, alternativas consensuais para o encaminhamento dos problemas. São manifestadas, contudo, claras dúvidas acerca da possibilidade de se confiar unicamente no modelo de diálogo, compreensão e coesão familiar como norteador das discussões futuras, pois o crescimento exponencial de atores na cena da sucessão praticamente inviabiliza essa alternativa. Assim, as gerações atualmente no poder tratam de criar ou consolidar regras mais bem definidas para nortear as relações entre as muitas famílias que já existem hoje ou que existirão num futuro próximo e a empresa. Quando o controle das empresas é multifamiliar, o problema torna-se ainda mais complexo, pois as regras de sucessão têm de acomodar diferentes perspectivas em relação à empresa. Mecanismos para transmissão dos valores da família às novas gerações são encontrados notadamente no âmbito das famílias, como encontros de gerações e eventos comemorativos de datas importantes. Contudo, várias famílias já começaram a organizar encontros mais estruturados, com vistas a aproximar parentes que às vezes nem se conhecem, transmitir valores particularmente importantes para o clã e o legado 53 afetivo e histórico das velhas gerações aos mais novos, além de construir e reconstruir as histórias, os mitos e os ritos tanto da família quanto da empresa. Grande preocupação foi revelada no sentido de tornar esses encontros mais freqüentes e permanentes na agenda da família, transformando o que no passado constituiu iniciativas isoladas em eventos organizados e agendados com grande antecedência para possibilitar a presença do maior número possível de pessoas. Em uma das empresas pesquisadas, um conselho de herdeiros que representou diferentes troncos familiares na discussão e encaminhamento do processo sucessório foi escolhido num encontro de família que reuniu mais de cem membros. Todos os entrevistados relataram a existência desses eventos, variando mais o caráter de que são revestidos: desde eventos tipicamente sociais até fóruns de discussão e de encaminhamento de questões relativas aos negócios. Apenas uma das empresas entrevistadas mencionou a existência de um Conselho de Família formalmente instituído, inclusive com Regimento próprio, cujos objetivos incluem: a) elaborar programas de desenvolvimento de acionistas e gestores; b) elaborar código de ética para sócios e familiares; c) elaborar políticas e tomar decisões relativas a questões de patrimônio, imóveis, partilha e heranças; d) promover encontros no âmbito da família; e) servir de fórum para discussão de pendências familiares; f) promover iniciativas de contribuição da família à comunidade; g) tomar decisões sobre a sucessão e a continuidade da empresa com a família e h) acompanhar os resultados da empresa, no papel de acionistas. Diversas outras empresas mencionaram a importância de se institucionalizarem alguns fóruns de discussão, sob a forma de Conselho de Herdeiros, Conselho de Família e outras denominações. Independentemente do momento específico por que passa cada empresa nesse processo, foi grandemente destacada a importância desses fóruns como o local privilegiado para discussão e encaminhamento das decisões mais essenciais relativas à relação família-empresa. O processo de formação de lideranças e de sucessores na empresa ocorre de formas distintas. As lideranças são inicialmente identificadas no âmbito das famílias e estão associadas à existência de características como a vocação demonstrada para os negócios, capacidades intelectuais e de relacionamento, determinação e desejo de atuar nos negócios da família. Identificadas as lideranças "naturais", as famílias encaminham seus jovens de formas diferentes: algumas incentivam o ingresso mais breve possível na empresa, para que ele (ou ela) possa experimentar desde os trabalhos mais simples até chegar aos cargos executivos, inclusive como uma forma de testar a real vocação do indivíduo; outras já orientam o desenvolvimento de carreiras fora da empresa e o retorno apenas quando esse profissional já tiver conquistado respeitabilidade externa; outras famílias adotaram ainda como prática desestimular completamente os jovens a atuar na gestão das empresas da família, levando-os a desenvolver carreiras independentes e preparando-os para o papel de acionistas. Essas escolhas constituem questões internas das famílias e não cabe discutir sua pertinência; contudo, uma clara sinalização às novas gerações é fundamental para guiar escolhas e 54 nortear carreiras de potenciais sucessores. Há casos em que o problema da sucessão não é o excesso de candidatos, mas exatamente a falta de opções no contexto da família, cujos jovens, por opção ou contingência, construíram carreiras independentes e não desejam mais retornar. Já a identificação de sucessores para a gestão vem ocorrendo de maneira mais institucional no contexto das empresas. Algumas empresas já desenvolveram regras específicas para guiar o processo de escolha do sucessor, cujos atributos mencionados como mais importantes são a competência, a formação acadêmica e profissional, a experiência e o interesse em atuar na empresa. Quanto mais ligada à geração do fundador estiver a sucessão, mais provavelmente a escolha será realizada pelo patriarca e tenderá a recair sobre o filho mais velho; muito dificilmente essa escolha privilegia as filhas, mesmo quando elas são as primogênitas. Cada processo de sucessão parece constituir um aprendizado para a empresa, embora a cada geração ele possa se apresentar em circunstâncias e com características significativamente diferentes. Teoricamente, pode-se levantar a hipótese de que, à medida que as sucessões vão ocorrendo ao longo das gerações e quanto maior o número de famílias proprietárias, provavelmente maiores também tenderiam a ser as pressões para que fossem desenvolvidos critérios para nortear o processo. Essa possibilidade foi verificada nas empresas pesquisadas, ainda que de forma preliminar, mas são necessárias observações de um número maior de empresas, ao longo de períodos mais extensos de tempo, para possibilitar uma avaliação mais criteriosa desse aspecto. O amadurecimento de critérios para nortear o processo sucessório, por sua vez, parece estar mais associado à complexidade do ambiente de negócios, à multiplicidade de famílias envolvidas e ao aumento no número de herdeiros do que propriamente ao número de vezes em que a sucessão já foi desencadeada. Em algumas empresas pesquisadas, foram identificados critérios bastante avançados de escolha de sucessores já na segunda geração. Programas de formação de sucessores não são ainda usuais nas empresas pesquisadas, embora praticamente todos os entrevistados reconheçam que eles seriam relevantes. Herdeiros que assumem a direção das empresas familiares são formados on the job, tanto na(s) empresa(s) onde irão atuar como no mercado. Oferecer ao filho uma primorosa formação acadêmica, até mesmo com oportunidade de realizar cursos nos melhores MBAs internacionais, é visto como uma preparação para a entrada e a assunção de posições de comando na empresa. Quase todas as empresas pesquisadas desenvolvem ou facilitam a inserção de seus funcionários em programas de treinamento e desenvolvimento avançados, até por meio da universidade corporativa, e, se não há programas mais específicos para formação de sucessores, esses podem utilizar os programas convencionais de formação de gestores. Tais programas, oferecidos por algumas instituições de ensino no Brasil, também são mencionados como importantes possibilidades por essas empresas. 55 A maioria das empresas pesquisadas ainda não definiu idade limite para aposentadoria dos membros da família que atuam na empresa, seja nos cargos executivos, seja no Conselho de Administração. Algumas já incluíram essa definição quando do estabelecimento de regras para nortear os processos futuros, mas o afastamento da geração que hoje está no controle das empresas constituiu ainda uma decisão privada. Nesses casos, parece haver certo constrangimento na definição de idade limite para a aposentadoria, e isso é tão mais forte quanto mais inicial for a geração a que pertence o indivíduo. Nos casos das duas empresas que ainda não completaram o processo de transferência do controle da primeira para a segunda geração, esse tema parece constituir quase um tabu, e a saída dos fundadores não é tratada abertamente. Outro caso - oposto ao prolongamento do momento de saída do fundador - foi relatado a esta pesquisa pelos entrevistados da empresa Renner Herman: em 1986, ao completar 65 anos, o então presidente da empresa (e pai dos atuais gestores) decidiu se afastar compulsoriamente dos negócios, embora os filhos não estivessem prontos para assumir a empresa. Um CEO contratado no mercado dirigiu a empresa por cinco anos, até que o filho mais velho completasse sua formação e assumisse a gestão da empresa. Definir uma idade limite para aposentadoria constitui um passo fundamental na definição de regras para o processo sucessório. A aproximação desse momento passa a representar de forma natural a hora de deflagrar o processo, além de constituir uma referência temporal para a empresa e os sucessores. Para o membro próximo a se aposentar, representa um limite ao qual deverá se ajustar e também uma forma honrosa de deixar a empresa. Contudo, a definição dessa regra deverá necessariamente ter sido acompanhada da criação de mecanismos que suportem financeiramente a saída do acionista, considerando-se aí os impactos sobre seus dependentes. Pode-se argumentar que a empresa não deve arcar com o ônus de suportar gerações de acionistas que não criaram, no passado, condições de financiamento próprias e independentes, o que parece de fato um argumento relevante. Contudo, deve-se considerar a existência de situações em que a empresa precisa manter um fluxo de rendimentos para acionistas de gerações passadas que ajudaram a construir a empresa e que não têm como se manter (e às suas famílias) após a aposentadoria. A definição de regras para nortear a aposentadoria deverá possibilitar às futuras gerações estabelecer diferentes relações com a empresa, mas, até que se complete a transição, o suporte financeiro dos membros das gerações prévias parece digno e ético. A necessidade de se criarem mecanismos para financiar as necessidades das gerações futuras é manifestada por diversos entrevistados, embora ainda não sejam relatadas muitas experiências concretas para se operacionalizar a idéia. De maneira geral, observase que os membros da primeira e da segunda gerações são altamente dependentes da empresa (como gestores e acionistas), exceto aqueles que desenvolvem carreiras fora da empresa da família; alguns já apresentam preocupação em diversificar seus investimentos pessoais em outras empresas ou no mercado. 56 Apenas uma idéia já mais avançada e atualmente em fase de estruturação, sobre a possibilidade de criação de um investimento conjunto visando suportar futuras necessidades da família, foi relatada pelos entrevistados da empresa Randon. Tratase da criação de um fundo de investimentos, com recursos oriundos de dividendos da holding familiar, para financiar três tipos de necessidades dos membros da família no futuro: a) educação; b) atividades empreendedoras; c) necessidades pessoais. A idéia aqui é a de suportar eventuais necessidades dos herdeiros ou mesmo auxiliá-los na criação de novos negócios, uma vez que a política da empresa é a de preparar os herdeiros para o papel de acionistas e para o desenvolvimento de carreiras completamente independentes da empresa da família. Em todas as empresas pesquisadas, há membros da família na gestão das empresas, embora em algumas a participação ocorra na gestão das holdings de controle, não necessariamente nas empresas que compõem o grupo. Apenas uma das empresas pesquisadas expressou a existência de uma clara política de afastamento dos herdeiros dos cargos de gestão da empresa, embora essa possibilidade somente vá ser implementada para a próxima geração de herdeiros (terceira geração). Nas outras empresas, a participação de membros da família na gestão foi claramente associada à demonstração de critérios de mérito, concorrendo os interessados da família em "igualdade" de condições com profissionais de mercado. Essa condição de eqüidade dificilmente pode ser avaliada de forma genérica, merecendo cada caso de sucessão onde foram consideradas as possibilidades de se colocar um herdeiro ou um profissional uma análise específica, o que não foi objetivo desta pesquisa. Mesmo considerando que a condição de competição entre um herdeiro e um externo não é, por princípio, equânime, a política de selecionar os ocupantes de cargos estratégicos pelo critério de mérito já expressa, por si só, um avanço significativo por parte dessas empresas. O que se depreende aqui é a preocupação com a profissionalização dos órgãos de gestão e de governança da empresa, seja por meio da contratação de profissionais de mercado, seja com herdeiros que demonstram talento, competência, mérito e experiência reconhecida. Finalmente, todos os entrevistados foram unânimes em reafirmar a importância da reputação da família para o sucesso dos negócios. Orgulho de pertencer, reafirmação dos valores familiares no contexto da empresa, manutenção do nome dos antepassados (inclusive com a preocupação de conservá-lo para as futuras gerações, já que geralmente apenas o sobrenome paterno é transferido aos filhos), apego às tradições e outras expressões que associam o nome da família a atributos como confiança, estabilidade e honradez são mencionados pelos entrevistados como elementos muito importantes para o reforço da imagem da empresa no mercado. 57 58 Considerações Finais A s informações obtidas por esta pesquisa foram consideráveis e possibilitaram uma extensa análise dos diversos elementos que precisam ser considerados, direta ou indiretamente, na análise do processo de transferência do poder e do controle de empresas familiares. Em primeiro lugar, há que se considerar que a estrutura de propriedade da empresa familiar brasileira ainda é altamente concentrada nas mãos de relativamente pequeno número de famílias proprietárias. Tais empresas, embora, em virtude de seu tamanho, já se constituam como sociedades anônimas, geralmente mantêm seu capital fechado, seja por receio de perda do controle, seja porque o mercado brasileiro não privilegiou (o cenário macroeconômico e o aparato econômico e institucional brasileiro não era tão "incentivador", o mercado era pouco atraente, além de a instabilidade econômica ser fator corrente), ao menos até os anos 1990, a entrada de empresas no mercado de capitais. A despeito dessas questões, o processo de crescimento das empresas pesquisadas foi considerável. Todas elas apresentam histórias empresariais bastante comuns: foram criadas há aproximadamente meio século por empreendedores visionários; cresceram e diversificaram seus investimentos para outros negócios; ao longo desse tempo, a família fundadora manteve o controle acionário do negócio e deseja manter essa posição para as gerações seguintes. Empresas familiares longevas provavelmente sobreviveram ao desafio da sucessão ao longo das diversas gerações porque conseguiram um nível de diálogo e maturidade intergeracional diferenciado. Essa constatação constitui talvez a conclusão mais relevante desta pesquisa, ainda que descrever operacionalmente esse processo não seja tarefa simples. Nesta etapa das considerações finais, entende-se que a primeira questão à qual esta pesquisa se propôs responder pode ser retomada, qual seja: Quais são os fatores mais marcantes relativos à empresa, à família e à propriedade que marcam os processos de transição do controle acionário de geração para geração em empresas familiares brasileiras? A prática encontrada nas empresas pesquisadas possibilita concluir que existem importantes avanços nos mecanismos de encaminhamento da problemática da sucessão. Na passagem da primeira para a segunda geração, geralmente a sucessão é encaminhada pelo fundador da empresa, que permanece nos negócios até alcançar uma idade avançada e, muito freqüentemente, indica o filho mais velho para sucedêlo. Da segunda para a terceira geração, geralmente são discutidos critérios para nortear o processo sucessório, mas eles permanecem como acordos tácitos entre os herdeiros. 59 Parece ocorrer na transição da terceira para a quarta geração importantes avanços em relação à consolidação do processo, com a formalização de critérios para nortear a sucessão, baseados no mérito e na competência profissional dos interessados. As empresas familiares pesquisadas foram predominantemente empresas de grande porte, longevas, maduras e bem-sucedidas em seus ramos de atuação. Portanto, as características aqui destacadas devem levar em consideração que essas empresas representam, em primeiro lugar, uma alternativa viável e atrativa, sob o aspecto econômico, para que sucessivas gerações sejam capazes de relativizar os interesses e os conflitos nascidos no contexto da família em prol da empresa. Processos de sucessão bem estruturados parecem, assim, guardar uma estreita relação com a solidez financeira da empresa, com seu ritmo de crescimento e com suas perspectivas futuras. Ao crescer e se consolidar, a empresa geralmente precisa buscar fontes externas de financiamento, via mercado de capitais, via entrada de novos sócios ou via parcerias tecnológicas em acordos de joint venture, por exemplo. A entrada de novos players força a empresa a se profissionalizar, criar estruturas de governança e exigir padrões de desempenho de gestão que são incompatíveis com estruturas familiares, fechadas, pouco transparentes e vulneráveis a conflitos familiares. Levantase, aqui, a hipótese de que a definição de regras de sucessão não ocorre apenas por meio de um processo visionário dos gestores membros da(s) família(s) controladora(s). O processo que dá sustentação a uma sucessão bem planejada é o processo de profissionalização da empresa, que pode ocorrer tanto via escolha de membros das famílias controladoras como por meio de profissionais de mercado, ou ainda um misto dessas duas alternativas. A FIG. 7 sintetiza alguns dos fatores mais marcantes nas fases de transição intergeracional: 60 1a geração • Fundador vê a empresa • • • • • • • • como propriedade privada. Empresa não consolidada ou em fase de consolidação. Fase de investimentos e reduzida atratividade financeira. Filhos do fundador vêm para a empresa por senso de dever. Transição não planejada. Pouca habilidade para lidar com os conflitos. Dificuldades para separar as questões da família e da empresa. Sucessor(es) necessariamente não apresentam talento para o mundo dos negócios. Sucessor(es) nem sempre desenvolveu(ram) a inteligência executiva que o negócio requer (profissionalização da gestão). • Empresa consolidada. • Sociedade de irmãos. • Sucessor(es) começa(m) a • • • • • • 4a geração 3a geração 2a geração definir critérios para a próxima sucessão. Regras e acordos de acionistas tornam-se mais formais. Se a preparação da família e dos prováveis sucessores não ocorrer no mesmo ritmo de crescimento e amadurecimento da empresa, provavelmente haverá problemas com o processo de profissionalização da empresa. Criação de fóruns de interlocução família e empresa. A empresa se depara com o dilema da profissionalização via família ou via profissionais de mercado. Necessidade de introduzir elementos de governança para oferecer transparência, confiabilidade e eqüidade aos acionistas. Preparação da família para assumir seu papel de liderança e capacidade de superação de conflitos. • Empresa madura e • • • • • • • • • • bem-sucedida. Patrimônio diluído. Sociedade de primos. Mudança de papel de herdeiro ou proprietário para acionista. Regras de sucessão se consolidam. Sucessão definida por mérito e competência, e pode ser feita com membros da família ou profissionais de mercado. Mecanismos de governança se consolidam. Risco de que potenciais sucessores não demonstrem interesse pela empresa. Conflitos dispersos. Desafio de manter o interesse da família pela empresa. Diluição do controle patrimonial pode levar à perda do controle pela família. Figura 7: Síntese de alguns dos fatores mais marcantes nas fases de transição intergeracional 61 Constatou-se, assim, a necessidade de articulação entre os processos de sucessão, a profissionalização da empresa e sua estrutura de governança. Com o crescimento da empresa, há a necessidade crescente de adoção de práticas de profissionalização, instrumentalizadas por meio de regras, acordos e critérios, que geralmente passam a ser adotados a partir da segunda geração e são consolidados na terceira geração da família na empresa. Esses acordos definem as regras do jogo e são fundamentais para conferir segurança aos acionistas, herdeiros e sucessores. Nesse momento, a família nuclear geralmente já se multiplicou por vários núcleos familiares e grande parte dos jovens tende a se direcionar para outras carreiras. Tão crítico quanto ter herdeiros se digladiando pelo controle da empresa é não ter candidatos à sucessão na liderança das empresas de natureza familiar, seja na liderança da gestão executiva, seja na governança da empresa. Assim, o maior desafio a ser enfrentado nessa fase é a preparação da(s) família(s) para as diferentes relações que se estabelecem entre ela(s) e a empresa, enfatizando-se a necessidade do surgimento de uma liderança familiar que oriente a condução dos negócios. Assim, o papel da liderança familiar nos órgãos de governança da empresa converge com a conceituação de uma empresa de controle e governança familiar, ao passo que o papel da liderança familiar na gestão executiva da empresa está associado à empresa de direção familiar (GALLO; TOMASELLI, 2006). Geralmente, inicia-se com a terceira ou quarta geração a mudança no papel de proprietários para o papel de acionistas. Fora das posições de gestão e de controle da empresa, a maioria dos membros das famílias provavelmente passará a atuar como acionistas, com uma perspectiva completamente diferente daquela que foi adotada pela geração anterior. Com a diluição das ações em mãos de um significativo número de herdeiros, passa a haver um risco real de perda do controle da empresa. Essa é uma das razões pelas quais a maior parte das famílias constitui holdings familiares, que são as personalidades jurídicas que detêm o controle acionário das empresas. As holdings familiares concentram as ações dos membros da família e passam a constituir o locus onde se definem as regras que visam proteger as ações dentro da própria família e também onde ocorrem as transferências de uma geração a outra. Conselhos de Família geralmente exercem um papel fundamental na definição das políticas que norteiam as ações familiares nesse sentido. A preparação da família para essas mudanças constitui um aspecto fundamental para possibilitar sucessões bem-sucedidas. A profissionalização da família e da empresa deveria caminhar como um processo simultâneo, embora com estratégias totalmente particulares, o que na prática não constitui tarefa simples nem freqüente. Com o aumento no número de membros das famílias, o inevitável distanciamento entre os parentes dificulta a transmissão dos valores que possibilitam a identificação das novas gerações com a empresa da família. Mesmo no papel de acionistas, parece importante que as novas gerações valorizem a história, cultivem os valores, desenvolvam o senso de pertencimento e preservem a memória da empresa. Essa reaproximação não ocorre 62 de maneira "natural" - precisa ser buscada, preparada, incentivada e praticada. Cabe aos membros mais velhos e aos líderes das famílias o papel de promover eventos que estimulem e promovam a convivência entre as gerações. Esta pesquisa permite afirmar que a longevidade das empresas familiares deve-se a uma série de fatores. Entre eles, encontra-se, certamente, uma capacidade diferenciada de conduzir os processos sucessórios. Nesse sentido, todas as empresas pesquisadas apresentaram em comum uma preocupação expressiva com esse aspecto. Pode-se perceber que o processo de crescimento e amadurecimento dessas empresas trouxe para elas a necessidade de profissionalização da gestão. Ao se confrontarem as questões da profissionalização, o aspecto da sucessão inevitavelmente emerge como uma das questões mais relevantes a serem equacionadas, dando então origem à implementação de diversas estratégias que refletem as escolhas particulares de cada empresa, mas que, em conjunto, definem as regras do jogo para as próximas gerações. Assim, encontraram-se empresas que, no primeiro processo de transição intergeracional, já mostram avanços em relação à implementação de regras que definem o processo e a implementação de estruturas de governança mais complexas. Em outras empresas, o amadurecimento desse processo só aparece na segunda ou terceira transição intergeracional, mostrando que o amadurecimento do processo de transição guarda significativa relação com as demandas de profissionalização da empresa, introduzidas mais por variáveis externas. Podemos então retomar a segunda questão à qual esta pesquisa se propôs a responder: É possível identificar padrões de regularidade nos processos de transição intergeracional das empresas estudadas associando-os à longevidade da empresa familiar? De certa forma, é possível identificar alguns eventos que têm impactos significativos na empresa, mas a ordem e o momento histórico em que esses eventos ocorrem variam conforme o processo de crescimento e profissionalização da empresa. A FIG. 8 ilustra alguns desses eventos. 63 Crescimento Processo sucessório • Preparação da família Expansão e consolidação da empresa • Formação de sucessores • Criação de órgãos Fundação pelo PAI de ligação famíliaempresa Profissionalização da gestão • Fortalecimento vínculos familiares Estruturas de governança Figura 8: Alguns eventos que têm impactos significativos na empresa Algumas sugestões relativas ao encaminhamento do processo sucessório para empresas familiares podem ser levantadas por esta pesquisa, a despeito da complexidade do tema e do cuidado sempre recomendável de que cada empresa deve buscar o momento e a forma mais adequados às suas especificidades: • O planejamento do processo sucessório deve começar a ser realizado o mais cedo possível: de preferência ainda pelo fundador da empresa. 64 • Normas orientadoras para guiar as futuras sucessões devem ser estabelecidas no contexto de Acordo de Acionistas ou outros documentos que imprimam à questão a relevância e o formalismo que ela efetivamente apresenta. • A discussão da sucessão no âmbito da família deve ser igualmente preparada e encaminhada, preferencialmente por lideranças que consigam conduzir a questão de forma racional. • Conselhos de Família, de Herdeiros, de Sucessores ou outros representam um avanço no encaminhamento da questão da sucessão, pois institucionalizam fóruns de discussão, encaminhamento e decisão. • A profissionalização da empresa e dos membros da família que possam vir a assumir cargos de direção na empresa precisa ocorrer de forma simultânea; do contrário, será necessário esperar a próxima sucessão para corrigir os erros da anterior. • A preparação da família para vivenciar seus diferentes papéis ao longo da trajetória da empresa deve ser cuidadosamente conduzida. Mudanças de atitudes e papéis não são "automáticas" nos indivíduos; ao contrário, elas precisam ser estimuladas e trabalhadas. • Fóruns específicos para formação de herdeiros como gestores e/ou futuros acionistas têm uma importância crucial no processo de sucessão. • O ritmo do processo de crescimento da empresa, sua expansão em mercados nacionais e internacionais, o ingresso de novos sócios, a entrada da empresa no mercado de capitais ou em níveis diferenciados de governança corporativa são alguns fatores que provocam mudanças profundas na empresa. No caso das empresas familiares, esses aspectos forçosamente trarão para a agenda a rediscussão da problemática da sucessão. • O processo de profissionalização da empresa pode ocorrer via contratação de profissionais de mercado para os cargos de gestão ou via seleção de membros da família que atendam aos critérios estabelecidos (normalmente competência e mérito). Não parece haver uma sistemática melhor que outra; trata-se de uma opção da família. • A implementação de mecanismos de governança corporativa pode contribuir significativamente para aprimorar o processo de sucessão: a) sob o aspecto formal, pela criação de órgãos que delimitam as questões de propriedade e gestão; b) sob o aspecto da transparência e da visibilidade com que a questão da sucessão passa a ser discutida; c) sob o aspecto da estabilidade de regras que os acionistas esperam de uma empresa profissionalizada. 65 • A criação de estruturas patrimoniais mais complexas aparece como um imperativo para separar e acomodar em holdings patrimoniais e familiares questões de natureza bastante distintas, como a propriedade da empresa e a propriedade das ações dos membros da família. Adicionalmente, essas holdings funcionam como estruturas de suporte para "armazenar" o conflito, separando-o das questões operacionais da empresa. 66 Referências AIRES, A. Planejamento da sucessão a partir de reorganizações societárias e patrimoniais. In: ÁLVARES, E. Governando a empresa familiar. Belo Horizonte: Qualitymark/FDC, 2003. ALLOUCHE, J.; AMANN, B. L'entreprise familiale: un état de l'art. Revue Finance, Contrôle, Stratégie, v. 3, n. 1, p. 33-79. Paris: Editions Economica, 2000. McCRAW, T. K. In: CHANDLER, A. Ensaios para uma teoria geral da grande empresa. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998. AMARAL, A. C. R.; MONTGOMERY, N. Atribuições do Conselho de Administração: novas formas de gestão corporativa. In: MARTINS, I. G. S.; MENEZES, P. L.; BERNHOEFT, R. (Orgs.). Empresas familiares brasileiras: perfil e perspectivas. São Paulo: Negócio, 1999. ARREGLE, J. L.; DURANT, R.; VERY, P. Origenes du capital social et avantages concurrentiels des firmes familiales. Management, Paris: Bernard Forgues, 2004, v. 7, n. 2. ARRUDA, C.; BRASIL, H. S.; SANTANA, J. L.; CAMPANA, R.; FONTES, R. C.; NOGUEIRA, D. Empresas duradouras. Relatório de Pesquisa RP0701, ano 7, n. 1. Fundação Dom Cabral, Belo Horizonte, jul. 2007. BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1988. BERNHOEFT, R. Desafios e oportunidades das sociedades familiares. In: MARTINS, I. G. da S.; MENEZES, P. L.; BERNHOEFT, R. (Orgs.). Empresas familiares brasileiras: perfil e perspectivas. São Paulo: Negócio, 1999. p. 53-74. BERNHOEFT, R. Empresa familiar: sucessão profissionalizada ou sobrevivência comprometida. São Paulo: Nobel, 1991. BORNHOLDT, R. Governança na empresa familiar: implementação e prática. Porto Alegre: Bookman, 2005. CAPELÃO, L. G. F. Relações de poder no processo de sucessão em empresa familiar: o caso das Indústrias Filizola S.A. Organizações & Sociedade, v. 8, n. 17, maio-jun. 2000. CAVEDON, N. R. Os diferentes modelos de família e de empresas familiares e seus respectivos valores: um olhar sobre empresas comerciais em Porto Alegre. Organizações & Sociedade, v. 10, n. 27, maio-ago. 2003. CHANDLER, A. D. Scale and scope. Cambridge: [s.n.], 1990. 67 DAVIS, J. A. A constituição familiar: um guia de exemplos de declarações e políticas para a empresa familiar. Tradução da equipe técnica da Fundação Dom Cabral. Cambridge, Massachusetts, EUA: Harvard Business School e Owner Managed Business Institute, 2004. DAVEL E.; VASCONCELOS, J. G. Gerência e autoridade nas empresas brasileiras: uma reflexão histórica e empírica sobre a dimensão paterna nas relações de trabalho. In: MOTTA, F. C. P.; CALDAS, M. P. Cultura organizacional e cultura brasileira. São Paulo: Atlas, 1997. DAVEL, E.; COLBARI, A. Organizações familiares: por uma introdução a sua tradição, contemporaneidade e multidisciplinaridade. Organizações & Sociedade, v. 8, n. 17, maio-jun., 2000. DAVIS, John. Entrevista à HSM Management: uma radiografia da relação empresa + família + propriedade. HSM Management, v. 41, p. 96-103, nov.-dez. 2003. Disponível em: <http://www.hsmmanagement.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2007. DE VRIES, M. K. Family business: human dilemmas in the family firm. London: International Thompson Business Press, 1996. DONELLEY, R. The family business. Harvard Business Review, v. 42, n. 4, 1964. DYER, W. G. Jr. Cultural changes in family firms: anticipating and managing business and family transitions. San Francisco: Jossey-Bass Publishers, 1986. ETZIONI, A. Organizações modernas. São Paulo: Pioneira, 1989. FATTOUM, S.; FAYOLLE, A. L'impact de la relation prédécesseur/sucesseur sur le déroulement du processus de succession dans les enterprises familiales. Lyon: G r e n o b l e . D i s p o n í v e l e m : < h t t p : / / w w w. e n t r e p r e n e u r i a t . c o m / F a t t o u m % 20et%20Fayolle. pdf#search=%22fattoum%20pr %C3%A9d% C3%A9cesseur%22>. Acesso em: 22 ago. 2006. FISCHER, T.; SILVA, J. C. S.; DAVEL, E. Desenvolvimento tridimensional das organizações familiares: avanços e desafios teóricos a partir de um estudo de caso. Organizações & Sociedade, v. 7, n. 17, maio-jun. 2000. GALBRAITH, J. K. O novo estado industrial. Lisboa: Difel, 1967. GALLO, M. A.; SVEEN, J. Internationalizing the family business: facilitating and restraining forces. Family Business Review, verano de 1991. GARCIA, V. P. Desenvolvimento das famílias empresárias. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001. 68 GERSICK, K. E.; DAVIS, J. A.; HAMPTON, M. M. C.; LANSBERG, I. Generation to generation: life cycles of the family business. Boston: Harvard Business School Press, 1997. GERSICK, K. E.; LANSBERG, I.; DESJARDINS, M.; DUNN, B. Como gerenciar as transições. HSM Management, v. 6, n. 40, nov.-dez. 2003. GONÇALVES, S. C. Patrimônio, família e empresa: um estudo sobre as transformações no mundo da economia empresarial. São Paulo: Negócio, 2000. HSM MANAGEMENT. Dossiê: Empresas familiares: o desafio da continuidade. HSM Management, v. 41, p. 83-91, nov.-dez. 2003. Disponível em: <http:// www.hsmmanagement.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2007. IBGC. Governança corporativa em empresas de controle familiar: casos de destaque no Brasil. São Paulo: Saint Paul, 2006. JONES, G.; ROSE, M. (Orgs.). Family capitalism. London: Frank Cass, 1993. LANSBERG, I. Succeeding generations. Boston: Harvard Business School Press, 1999. LANZANA, A. As empresas familiares brasileiras diante do atual panorama econômico mundial. In: MARTINS, I. G. S.; MENEZES, P. L.; BERNHOEFT, R. (Orgs.). Empresas familiares brasileiras: perfil e perspectivas. São Paulo: Negócio, 1999. LEACH, P. Guia da empresa familiar. Rio de Janeiro: Xenon, 1998. LEHBRIDGE, E. Tendências da empresa familiar no mundo. Disponível em: <http:// www.bndes.gov.br/conhecimento/revista/rev707.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2005. OLIVEIRA, M. A. G. Prefácio. In: BERNHOEFT, R. Empresa familiar: sucessão profissionalizada ou sobrevivência comprometida. São Paulo: Nobel, 1991. ROSSATO, F. J. N. Ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais: o processo sucessório nas bancas do mercado público de Porto Alegre. Dissertação (Mestrado) em Administração. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Escola de Administração, 2003. ROSSETO, C. R. Postura estratégia nas empresas familiares: uma aplicação da teoria de Miles e Snow. In: GRZYBOVSKI, D.; TEDESCO, J. C. Empresa familiar: tendências e racionalidades em conflito. Passo Fundo: Ediupf, 2002. SHARMA, P.; CHRISMAN, J. J.; CHUA, J. H. Strategic management of the family business: past research and future challenges. Family Business Review, v. 10, n. 1, 1997. TAGIURI, R.; DAVIS, J. A. Bivalent attributes of the family firm. Family Business Review, v. 9, n. 2, 1985. 69 TRIVINOS, Augusto N. Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987. VIDIGAL, A. C. As origens da empresa familiar no Brasil. In: MARTINS, I. G. S.; MENEZES, P. L.; BERNHOEFT, R. (Orgs.). Empresas familiares brasileiras: perfil e perspectivas. São Paulo: Negócio, 1999. WARD, John L. Perpetuating the family business: fifty lessons learned from long-lasting, successful families in business. Houndmills: Palgrave MacMillan, 2004. WARD, John. Planejar para prosseguir. HSM Management, v. 6, n. 40, nov.-dez. 2003. WARD, J. Planejar para prosseguir. HSM Management, v. 41, p. 114-121, nov.-dez. 2003. Disponível em: <http://www.hsmmanagement.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2007. WESTHEAD, P.; COWLING, M.; STOREY, D.; HOWORTH, C. The scale and nature of family business. In: Denise E. Fletcher. Understanding the small family business. Routledge Studies in Small Business, 2002. YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2005. Referências Utilizadas para Elaboração dos Casos ABC Algar ABC Indústria e Comércio S.A. ABC INCO. Homepage institucional. Disponível em: <http:/ /www.abcinco.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. ABC TÁXI AÉREO. Homepage institucional. www.abctaxiaereo.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. Disponível em: <http:// Algar Call Center Service S.A. ACS. Homepage institucional. Disponível em: <http:// www.acs.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. Companhia de Telefones do Brasil Central - CTBC. Homepage institucional. Disponível em: <http://www.ctbc.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. Asamar ALESAT. Homepage da empresa. Disponível em: <http://www.ale.com.br>. Acesso em: 31 out. 2007. 70 DIÁRIO DO COMÉRCIO/MG, 27 set. 2007. Construções "alavancam" empresa. Disponível em: <http://www.diariodocomercio.com.br>. Acesso em: 18 mar. 2008. LUZ, Aline. Grupo Asamar fatura R$3,5 bi por ano. Diário do Comércio, 27 set. 2007. Disponível em: <http://www.diariodocomercio.com.br>. Acesso em: 18 mar. 2008. INVERTIA. Biodiesel: Ale prevê ter 350 postos até dezembro. Invertia, 20 abr. 2006. Disponível em: <http://www.biodieselbr.com/noticias/biodiesel/biodiesel-ale-preve-ter350-postos-ate-dezembro-20-04-06.htm>. Acesso em: 30 out. 2007. MINISTÉRIO DA FAZENDA. Secretaria de Acompanhamento da Econômico. Ato de contratação entre ALE e SAT, n. 08012,002634/2006-73, 14 ago. 2006. Disponível em: <http://www.cade.gov.br/plenario/Sessao_385/Pareceres/ParecerSeae-AC2006-08012.002634-2006-73_Satelite_Distribuidora_de_Petroleo.PDF>. Acesso em: 30 out. 2007. Cataguases COMPANHIA INDUSTRIAL CATAGUASES - CIC. Breve história da Companhia Industrial Cataguases. Disponível em: <http://www.cataguases.com.br/por/index.htm>. Acesso em: 30 out. 2007. Dados da Pesquisa ENGENHARIA E SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES S.A. ENGESET. Homepage institucional. Disponível em: <http://www.engeset.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. GUIMARÃRES, T. B. C. Empreendedorismo como estratégia corporativa: um estudo do caso Grupo ALGAR. Dissertação de Mestrado em Administração. Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração. Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, 2005. INSTITUTO ALGAR. Homepage institucional. Disponível em: <http:// www.institutoalgar.org.br/conteudo.asp?ContentID=13>. Acesso em: 7 fev. 2008. RELATÓRIO ALGAR. Relatório de Sustentabilidade. ABC ALGAR, Uberlândia, 2006. Disponível em: <http://www.algar.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. RIO QUENTE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES S.A. RQ Empar - RIO QUENTE RESORTS. Homepage institucional. Disponível em: <http:// www.rioquenteresorts.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. 71 SILVA, Antônio Pereira. Com o suor do teu rosto: biografia do Comendador Alexandrino Garcia. Uberlândia: Sabe, 1993. 152 p. SOCIEDADE ANÔNIMA BRASILEIRA DE EMPREENDIMENTOS - SABE. Homepage institucional. Disponível em: <http://www.netsabe.com.br>. Acesso em: 7 fev. 2008. Renner HOMEPAGE do grupo Renner, 2008. <http://www.renner.com.br>. PORTAL EXAME. Grupo Renner vende divisão de tintas à americana PPG. Disponível em:<http://portalexame.abril.com.br/degustacao/secure/ degustacao.do?COD_SITE=35&COD_RECURSO=211&URL_RETORNO=http:// portalexame.abril.com.br/negocios/m0121105.html>. Acesso em: 2 fev. 2008. http://www.dzestudio.com.br/site/trabalhos.php?id=8; http://www.renner.com.br; http://www.rennermm.com.br; http://www.metalgrafica.com.br; http:// www.flosul.com.br; http://www.continuousprocess.com.br; http:// www.dzestudio.com.br/site/trabalhos.php?id=8. Acesso em: 27 fev. 2008. 72 73 Roteiro de Entrevista Semi-estruturado Anexo 1 74 75 76 77 78 79 80 81 82 Questões Anexo 2 83 Quadro-Síntese das Empresas por Dimensões Pesquisadas Anexo 3 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 Sobre os Autores Elismar Álvares da Silva Campos Coordenadora da Pesquisa e do Núcleo CCR de Governança Corporativa da FDC. Formação acadêmica: Psicóloga, pela UFMG, em 1974. Especialista em Administração de Recursos Humanos, pelo IPEAD, e em Planejamento de Carreira nas Organizações. Cursos de Estudos de Psicanálise Freudiana - GREP; Formação em Dinâmica de Grupo, pela Escola Ruy Flores; Liderança na Empresa Familiar, pelo IMD - Lausane, Suíça. Atualmente, é professora full time e pesquisadora da Fundação Dom Cabral (FDC), coordenadora do Núcleo de Governança Corporativa da FDC, atuando principalmente nas áreas de Governança Corporativa, em geral, e em temas relacionados à Governança Corporativa das Empresas Familiares. Atua também como mediadora de conflitos na empresa familiar. Desenvolveu e liderou na FDC o Programa de Desenvolvimento de Acionistas, voltado às famílias proprietárias de negócios. Recentemente, desenvolveu e liderou na FDC o Programa de Desenvolvimento de Conselheiros, destinado ao desenvolvimento de competências por parte desses profissionais para atuarem com maior efetividade nos conselhos de administração. É autora de vários artigos e estudos de caso de empresas e organizadora e co-autora dos livros Governando a Empresa Familiar (Editora Qualitymark, 2003) e Governança Corporativa: um Modelo Brasileiro (Editora Elsevier, 2008). Janete Lara de Oliveira Bertucci Formação acadêmica: Doutora, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); mestra, também pela UFMG, e graduada em Administração, pela Fumec. Atualmente, é professora adjunta da Universidade Federal de Minas Gerais. Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração, atuando principalmente nos seguintes temas: Estratégias Gerenciais, Estratégia e Competitividade, Estratégias Corporativas, Governança Corporativa, Gestão de Instituições de Ensino Superior e Efetividade Organizacional. É bolsista de produtividade do CNPq e desenvolve projeto de pesquisa financiado pela Fapemig. 94 Thiago Duarte Pimentel Formação acadêmica: Mestre em Administração, pelo Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração (CEPEAD) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 2008; bacharel em Planejamento Integrado do Turismo, pela UFMG, em 2005. Atualmente, é professor contratado do Departamento de Ciências Administrativas da UFMG. Membro do Núcleo de Estudos Organizacionais e Simbolismos (NEOS). Atua nas áreas de Turismo e Administração, com ênfase em Teoria das Organizações, tendo interesse, especialmente, nos seguintes temas: Turismo - Planejamento e Gestão do Espaço Turístico; Teoria das Organizações - Estudos Organizacionais e Simbolismos; Empresas Familiares - Governança, Sucessão e Transferência Intergeracional. 95 96 Relatório de Pesquisa FDC RP0801 Sumário executivo – estratégia proativa de mercado – resultados da pesquisa qualitativa. Leonardo Araújo, Rogério Gava. CAMPUS ALOYSIO FARIA Centro Alfa – Av. Princesa Diana, 760 Alphaville Lagoa dos Ingleses 34000-000 – Nova Lima (MG) – Brasil Tel.: 55 (31) 3589-7200 UNIDADE BELO HORIZONTE Rua Bernardo Guimarães, 3071 Santo Agostinho 30140-083 – Belo Horizonte (MG) – Brasil Tel.: 55 (31) 3299-9700 ESCRITÓRIO SÃO PAULO Av. Dr. Cardoso de Melo, 1184 Ed. Olímpia Trade, 15º andar – Vila Olímpia 04548-004 – São Paulo (SP) – Brasil Tel.: 55 (11) 3513-4700 www.fdc.org.br 4005 9200 (Capitais) 0800 941 9200 (Demais Localidades) INFORMAÇÕES Teresa Goulart Fone.: 55 31 3589-7465 – Fax: 55 31 3589-7402 [email protected] Faça uma visita virtual à FDC. Acesse www.fdc.org.br e conheça nossas instalações e programação..