O SETOR (DO FOMENTO) FLORESTAL NO BRASIL: (IM)PACTOS, CONCEITOS E SUJEITOS Eduardo Álvares da Silva Barcelos – PPGEO/UFF [email protected] Resumo A reestruturação das relações produtivas a partir da década de 80 tem significado, especialmente para o setor “florestal”, um crescente processo de integração territorial articulado com diferentes escalas sociais. Neste sentido, os programas de “fomento florestal” com pequenos e médios agricultores abriram, de modo especial, uma nova política territorial capaz de organizar novos sujeitos e lugares em redes translocais de produção integrada dominada pelo complexo agroindustrial. Essa nova espacialidade empresarial tem conquistado espaço, não só na agenda política das grandes corporações, mas também nas linhas temáticas das políticas públicas florestais. Pela adoção dos contratos de integração, o fenômeno agroindustrial “florestal” ditou um estatuto de regras e procedimentos técnicos que reorganizou não só o estilo e a natureza da produção agrícola, como também as categorias do pensamento, sobretudo o conceito de floresta. Palavras Chave: escala, fomento florestal, contratos, integração territorial, agroindústria. Resumen La reestructuración de las relaciones de producción a partir de los años 80 tiene sentido, especialmente para el sector "forestal", un creciente proceso de integración regional articulado con diferentes escalas sociales. En este sentido, los programas de "fomento de los bosques", con pequeños y medianos agricultores abierto, en particular, una nueva política territorial capaz de organizar nuevos sujectos y lugares en redes translocales de producción integrada dominada por el complejo agroindustrial. Esta nueva espacialidad de los negocios ha conquistado el espacio, no sólo en la agenda política de las grandes empresas, sino también en las líneas temáticas de las políticas forestales. La aprobación de los contratos de integración, el fenómeno de los agronegocios “forestal” dictado el estado de las normas y procedimientos técnicos que reorganizó no sólo el estilo y la naturaleza de la producción agrícola, sino también las categorías de pensamiento, especialmente el concepto de bosque. Palabras clave: escala, la promoción forestal, los contratos, la integración territorial, la agroindustria. 2 1 – Introdução Este trabalho procura situar os aspectos teóricos e políticos da atual dinâmica do setor (do fomento) florestal no Brasil e aponta suas implicações para o desenvolvimento rural e agroindustrial. De início, destaca-se que as escolhas conceituais que operam no interior da atividade agroindustrial “florestal” foram resultantes das heranças coloniais do conhecimento e obedecem a um modelo epistêmico moderno-colonial que universalizou um campo de conceitos e categorias produzido pela experiência histórica européia. O uso a-histórico de conceitos e categorias ampliou o espaço de erudição das narrativas hegemônicas e incluiu as plantações arbóreas homogêneas na linha temática sobre as florestas. Além de destacar os efeitos destas escolhas no pensamento florestal do Sul1, este trabalho coloca novamente em questão os diferentes significados políticos da atual dinâmica das plantações comerciais mostrando suas estratégias e formas de organização espacial, especialmente, as novas práticas territoriais engendradas enquanto práticas políticas e de hegemonia. Neste sentido, busca-se compreender os significados políticos dos programas de “fomento florestal” (PFF) que aparecem na agenda expansionista das grandes corporações, mas também nas estratégias de ação e linhas temáticas das políticas públicas florestais. Esta opção não só confirma a forte tendência de incorporar o “fomento florestal” enquanto eixo de integração regional coadunado aos interesses empresariais, mas também para atualizar as coalizões políticas e a rede de clientela do velho regionalismo patronal (VAINER, 2007). Neste sentido, é possível observar que os PFF aparecem para atualizar a história das plantações arbóreas. Se no início do século XX as plantações industriais significaram a conquista e a consolidação das monoculturas arbóreas nos territórios do Sul, construindo redes internacionais de produção integrada, hoje as plantações homogêneas atualizam a história e reconquistam sua posição privilegiada na divisão territorial do trabalho, não só organizando os espaços transnacionais, mas também ordenando a dinâmica dos espaços locais. Por meio dos programas de “fomento florestal” uma ordem global busca impor, a todos os lugares, uma única racionalidade, uma organização técnico-operacional que separa o centro da ação da sede da ação (SANTOS, 1996). Deste modo, as escalas locais foram articuladas ao espaço global do capital e foram 1 Para efeitos analíticos, busca-se aqui, traçar uma orientação teórica para descrever o Sul, pois queremos evitar o eurocentrismo e toda sua geopolítica do conhecimento. Aqui, o Sul é entendido como metáfora do sofrimento humano causado pelo capitalismo moderno, colonial e eurocentrado (SOUZA SANTOS, 2004, p.17), mas também o lugar excepcional capaz de incorporar ao campo de visões da crítica pós-colonial, as modernidades subalternas (LANDER, 2005, p.47). O Sul é, ele próprio, no eurocentrismo, produto imperial do Norte, uma geocultura resultante das relações coloniais de dominação e, por isso, a aprendizagem com o Sul nos exige uma desconstrução das narrativas imperiais, que afirma o Sul enquanto produto imperial. Essa crítica a modernidade feita pelas margens (CORONIL, 1997, p.74 apud LANDER, 2005, p.48) descortina o Sul na medida em que afirma sua existência como lócus de resistência à dominação do Norte, movimento pelo qual emergem outras territorialidades e outras falas, comprometidas a revelar as condições para uma crítica inerentemente desestabilizadora da própria modernidade (IBIDEM). Assim, podemos retirar o Sul como mero expectador do projeto moderno e colonial e colocá-lo na posição de agente para a crítica ao sistemamundo moderno-colonial. 3 transformadas em localidades especializadas para responder as necessidades precisas do fenômeno agroindustrial2, sobretudo as mundiais. No sentido empregado por Milton Santos (1996) de uma globalização do espaço a partir de normas e formas, os PFF intensificam a corporatização do território, com a destinação prioritária de recursos para atender necessidades geográficas dos interesses transnacionais, submetendo o espaço local aos imperativos ditos globais, mas exclusivos e indiferentes aos contextos em que vem inserir-se. Assim, como localidade “mundializada”, as unidades fomentadas se encaixam ao movimento estruturado de complementaridade produtiva que aponta ser uma tendência política para integrar e redefinir formas territoriais. Sendo ao mesmo tempo um fenômeno político, econômico, técnico e territorial, os PFF organizam uma nova ancoragem territorial com redes sócio-técnicas que (des)integram regiões ao circuito de produção (regional-mundial) e consolidam as monoculturas arbóreas em outros níveis escalares. Esse é o sentido maior dos atuais programas de “fomento florestal”: ampliar os contextos regionais, criar eixos de integração transescalares, organizar novas ancoragens territoriais e fortalecer as redes de hegemonia, do local ao global. 2 – Novas dinâmicas, novos modelos: impactos da reestruturação produtiva sobre a atividade agroindustrial “florestal” No Brasil, a partir da década de 80, a dinâmica do setor “florestal” acompanhou as transformações gestadas pelo novo padrão de acumulação que, de modo especial, reestruturou o fenômeno agroindustrial. O novo regime de acumulação flexível foi apoiado na ideologia dos mercados livres e criou condições para reformular as estratégias de organização das atividades produtivas produzindo, principalmente, uma nova política de articulações entre os agentes econômicos que ganhou força pelo conceito de “organização em rede” (MAZZALI, 2000). A revisão das formas de organizar a produção foi ditada por um novo conjunto de relações e por renovadas práticas sócio-espaciais que culminaram na emergência de novas formas de articulação entre capitais e forças políticas, favorecendo uma redefinição das relações entre as escalas sub2 Essas necessidades aparecem de forma mais contundente no discurso do “apagão florestal”, uma alusão à crise de energia que atingiu o país no começo da década. Trata-se, pois, de um desequilíbrio entre a oferta e a demanda de madeira, especialmente porque a produção não acompanhou o crescimento das empresas de áreas como siderurgia, papel e celulose, móveis, painéis e chapas. Isso porque, segundo o setor, “não há”, por parte do estado, investimentos na formação de novos plantios, sobretudo pela falta de estímulos governamentais (fiscais, creditícios). É neste sentido, que o “fomento florestal” ganha destaque na geopolítica empresarial, pois aparece como um novo campo de investimentos capaz de incrementar a base plantada e a oferta de madeira sem, contudo, mobilizar ativos fundiários. Segundo Carlos Aguiar, diretor-presidente da Aracruz Celulose e ex-presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Florestas Plantadas (Abraf), que reúne grandes indústrias que utilizam a madeira cultivada, “o principal obstáculo para o plantio de florestas comerciais é a falta de financiamento de longo prazo para pequenos produtores. Quando as linhas de crédito existem, não são usufruídas por falta de informação” (“Apagão Florestal”, Revista Exame, Ano XXIX, n.2, 2 fev. 2005, p.51). Vê-se, portanto, que enquanto o “apagão florestal” abre uma nova política de necessidades, o “fomento florestal” abre uma nova política de oportunidades, ou seja, ele aparece como condição. 4 nacionais (municipal, estadual, regional), nacional e global (VAINER, 2007). A abertura de fronteiras não só respondeu ao chamado da fluidez (des)integradora dos mercados, mas envolveu novas formas de interação e coordenação dos agentes políticos com o território. Esse conjugado de relações e interações tem combinado processos multiescalares de interconexão, flexibilização, relocalização, integração e simultaneidade produtiva, destacando a organização em rede como nova morfologia espacial das atividades agroindustriais. Neste sentido, o fenômeno agroindustrial “florestal” passou a interagir com outras escalas sócio-geográficas buscando, sobretudo, integrar espaços e sujeitos no campo de ações do regime de acumulação, organizando parcelas do território para (re)negociar as condições de sua reprodução e formas de exercício da hegemonia (IDEM). Isso inaugurou um legítimo campo de práticas territoriais com novas espacialidades e ampliou o rol de vantagens diferenciadas para conter os efeitos da concorrência, reduzir os custos unitários de produção, mas também para continuar a tradição regional de controle da sistemática dos processos políticos. No caso da atividade agroindustrial madeireira, sobretudo para o setor celulósico-papeleiro essas novas práticas significaram uma reorganização da hegemonia e das redes de patronagem que tecem boa parte das políticas regionais no Brasil. Significaram também a reprodução do padrão de constituição de interesses territorializados manifestado pela decomposição territorial e pela multiplicação de rupturas sócio-territoriais3. Assim, as novas relações espaciais têm convergido no sentido de produzir descontinuidades regionais que aportam um significado fragmentário dos processos políticos para reproduzir o velho regionalismo patronal engendrado pelos setores dominantes (VAINER, 2007). É neste sentido que o agronegócio com base na madeira tem buscado reproduzir sua hegemonia pela articulação de escalas e nichos territoriais fragilizados, que não escapam do padrão de poder territorial já consolidado. Aqui, a escala camponesa aparece com destaque. A ampliação das redes de patronagem e hegemonia do setor surgem com os programas de “fomento florestal”. Estes programas foram incluídos no conjunto de estratégias políticas das grandes corporações e constituem hoje um importante vetor de fragmentação do território, pois são portadores de um grande potencial de organização do espaço agrário. Por sua própria natureza, estes programas conformam um espaço regional integrado, articulado por interesses globais e gestados pelo grande capital agroindustrial. Estruturam-se por coalizões políticas, normalmente por interesses empresariais, através de convênios institucionais4 e pela incorporação de sua matriz 3 Aqui, as rupturas sócio-territoriais são resultantes de processos políticos que fragmentam as condições de reprodução do território, sobretudo reorientando estas condições para o novo arranjo territorial ali imposto. Veremos mais adiante como os programas de “fomento florestal” assumem esta condição. 4 A partir do exame das 17 edições da Revista Produtor Florestal da Aracruz Celulose, é possível ter uma idéia da magnitude da rede de patronagem ampliada pelos programas de “fomento florestal”. O Programa Produtor Florestal esteve presente em 18 projetos institucionais, articulados com entidades públicas e privadas e, organizados em 5 operacional no plano das políticas públicas5. Foram concebidos para o suprimento alternativo de madeira, principalmente para imobilizar os ativos fundiários, reduzir o custo unitário da produção, direcionar o capital para as demais atividades industriais, mas também para contornar a pressão política de setores populares e movimentos sociais. Ou seja, os PFF são, também, programas de relações públicas. E mais. Foram estruturados com a intenção de transferir aos agricultores fomentados os riscos e os custos de produção da madeira que, como sabemos, é commoditizada e, como tal, de baixo valor agregado. Isso significa que a agregação de valor não ocorre no plantio, mas sim na fábrica. Ou seja, o valor não fica pra quem planta, mas sim pra quem transforma o que se planta. Estamos, portanto, diante de um novo e poderoso mecanismo político que viabilizou a expansão territorial das plantações industriais, sobretudo pela “descoberta” de outras escalas sóciogeográficas. Neste sentido, novas territorialidades de matrizes culturais diferenciadas foram convênios, parcerias, acordos de cooperação, apoio técnico e financiamentos. Entre eles está o Plano de Desenvolvimento Florestal do Estado do Espírito Santo (2003); o Plano de Expansão Sul Capixaba, abrangendo 17 municípios (2003), a parceria com a Federação das Associações de Apicultores do Espírito Santo – FAAES (2003), o convênio de divulgação do programa com a Federação de Agricultura e Pecuária do Espírito Santo – FAES e o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – SENAR em 2004; o convênio “Unidades de Proteção de Nascentes” com a Secretária de Agricultura do Espírito Santo – SEAG e o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural – INCAPER (2004); o convênio “Reflorestamento de Imóveis Rurais” com SEAG e INCAPER (2004); o convênio “Projeto Cachoeiro 21” com a Agência de Desenvolvimento Sustentável do Sul do Estado do Espírito Santo – ADESE (2004); a parceria entre SEAG/INCAPER/SEBRAE para o “Projeto Apicultura Solidária” em 2004; o convênio com o governo do Estado do Rio Grande do Sul, BNDES e Caixa Econômica (2004); o convênio e apoio técnico com o Instituto Estadual de Florestas – IEF de Minas Gerais (2004); o treinamento e capacitação técnica junto à Associação Indígena Tupiniquim-Guarani – AITG em 2004; o contrato com a Associação de Pais e Amigos Excepcionais – APAE de Governador Valadares em MG (2005); a parceria com a Federação das Industriais do Rio de Janeiro – FIRJAN para estender o programa ao norte fluminense em 2005; o convênio e apoio técnico com o INCAPER no Programa de Extensão Florestal do Estado do Espírito Santo, desde 1985; a parceria entre Ministério Público, Arcelor Mittal, Samarco, Companhia Espírito Santense de Saneamento – CESAN, Prefeitura de Mimoso e as ONGs Instituto Terra e a Associação de Entidades Não-Governamentais Ambientalistas do Estado do Espírito Santo – ASAMBIENTAL no projeto “Pacto de Revitalização dos Remanescentes de Mata Atlântica” em 2007; o convênio SEAG/INCAPER/IDAF/IEMA no projeto de reflorestamento em imóveis rurais do Espírito Santo e a recomposição florestal de interesse ambiental em propriedades agrícolas em 2008 e; a parceria tecnológica com o Centro de Ciências Agrárias – CAA da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES em 2008, além da participação em congressos, feiras, seminários, encontros e também a parceria e o financiamento de pesquisas nas universidades federais brasileiras como a Universidade Federal de Viçosa – UFV e a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ/USP. 5 Destaca-se aqui a inclusão dos programas de “fomento florestal” nas linhas temáticas do Programa Nacional de Florestas, PNF criado em 2000 pelo decreto 3.420. Dentre os objetivos do PNF está às ações para “fomentar as atividades de reflorestamento, notadamente em pequenas propriedades rurais”, sobretudo para consolidar as metas e objetivos previstos no plano estratégico de ação e expansão da base plantada no país. Para isso, as diretrizes de ação recomendadas foram o apoio técnico e financeiro aos pequenos e médios produtores rurais, o estímulo às associações ou cooperativas de reposição florestal e a simplificação dos procedimentos legais e administrativos para o plantio, colheita, transporte, processamento e comercialização de produtos e subprodutos florestais oriundos de plantios (KENGEN, 2001, p.29; grifos nossos). Estas diretrizes foram traçadas para atender a demanda florestal nacional com o plantio de 1,2 milhão de hectares por meio de programas empresariais sustentáveis, a recuperação de 200 mil hectares degradados e o plantio de 800 mil hectares em pequenas e médias propriedades rurais até 2007 (FANZERES, 2007, p.01; grifos nossos). Por outro lado, apesar de em fase inicial de desenvolvimento, o “fomento florestal” tem conquistado também espaço na agenda de financiamentos e incentivos governamentais. A disponibilização de recursos das linhas do Pronaf Florestal e Propflora passou de R$ 10 milhões em 2003, para mais de R$ 150 milhões em 2005, correspondendo a uma participação de 7% da área plantada, de um total de 320 mil ha, para 23%, de um total de 553 mil ha plantados, em 2005. No mesmo período, o PNF disponibilizou cerca de R$ 20 milhões de reais para o estabelecimento de inúmeras parcerias, através do Fundo Nacional do Meio Ambiente, promovendo assistência técnica a mais de 10 mil produtores rurais, nos diversos biomas brasileiros (AZEVEDO e LEITE, 2006). 6 introduzidas na linha de comando das redes empresariais e da dinâmica agroindustrial. Em outras palavras, essa nova política territorial que, não olvidemos, foi ditada pelos interesses empresariais, integrou novas escalas sociais ao movimento de ordenamento territorial sob a lógica do capital. Deste modo, os espaços integrados atuam muito mais do que um simples receptáculo que localiza as atividades produtivas, mas também como lugar privilegiado por onde se realiza a reprodução do capital agroindustrial. Essa nova forma de reprodutibilidade aparece como opção de baixo custo e oferece condições para atrair novos parceiros e para consolidar projetos de empreendedorismo territorial. Foi guiado por este sentido de ampliar o espaço de manobra da atividade agroindustrial que os programas de “fomento florestal” com pequenos e médios agricultores passaram a comandar as novas práticas territoriais das plantações industriais adotando o conceito de integração como parâmetro desta nova espacialidade. Não só pelas novas configurações territoriais organizadas pela a lógica agroindustrial, os PFF incluíram outras bases sócio-geográficas num contexto de dependência e subordinação e possibilitou renovar as formas de exploração do trabalho e da natureza. Em seu conjunto, oferecem uma agenda técnica de intervenção integrada composta por mudas, insumos, agrotóxicos e assistência técnica que determina em contrato6, as obrigações e procedimentos que devem ser seguidos pelos fomentados, de acordo com o estatuto de normas e regras preconizado pela atividade agroindustrial. Assim, articulando extensionismo rural com discurso competente7 (Marilena Chauí) os programas de “fomento florestal” organizam um regime de pensamento-ação que repousa no poder ilimitado de universalizar um conjunto de representações, valores, códigos e conceitos determinados por uma condição originalmente criada para que, de modo especial, possa agir e ter eficácia sobre o imaginário e o espaço social envolvente. Trata-se, portanto, se me permitem, de um sistema de regras de pensamento e comportamento dos atores sociais que se traduz na produção e uso de técnicas eficientes de produção e em formas eficazes de controle e racionalização do 6 Sobre os contratos de produção na atividade agroindustrial, Rubens Altmann (1997) destaca que os contratos de integração possibilitam a redução das imobilizações financeiras e permitem a agroindústria, não só assegurar um suprimento regular de matéria prima, a custos menores e com maior controle de qualidade, mas também um controle dos preços das matérias-primas, fator fundamental para conter os efeitos da concorrência. Para ele há uma grande estabilidade na atividade produtiva pela adoção dos contratos como mecanismo de regulação. Por outro lado, Altmann enfatiza a relação entre o tamanho da empresa e o grau de domínio tecnológico com a importância do suprimento via contratual. Observa, sobretudo na cadeia de carnes e grãos, um engajamento da agroindústria em assegurar aos produtores integrados um mercado para sua produção. No entanto, os contratos de produção na agricultura, ressalta, só se desenvolvem naquelas atividades tecnicamente bem dominadas. Altmann aponta que é “preciso, antes de tudo, que a atividade seja tecnicamente controlável na produção, que seja possível uma produção padronizada em larga escala, para que os contratos possam interessar às agroindústrias; em seguida, é preciso que a empresa seja capaz de transmitir e fazer adotar as inovações técnicas e que ela seja capaz de recuperar os ganhos de produtividade obtidos pelos produtores” (ALTMANN, 1997, p.68). 7 De forma bastante sintética, o discurso competente é aquele aceito como autorizado para decidir e recomendar, mas também aquele que transforma interesse em realidade. 7 comportamento social para alcançar certos fins. Aqui, o sentido perfeito da racionalidade instrumental (LEFF, 2007). Em geral, os programas adotam uma narrativa que “persegue não apenas a imposição de uma representação vantajosa de si, mas disputa o poder de impor como legítimos os princípios de construção da realidade social mais favoráveis ao seu ser social e à acumulação de um capital simbólico de reconhecimento (BOURDIEU, 2001 apud CARVALHO, 2006:37). Assim, trata-se de um discurso que disputa um espaço de representações, valores e esquemas de percepção que legitimam ou deslegitimam a distribuição de poder e do saber sobre o território e seus “recursos” (CARVALHO, 2006). O que devemos observar aqui, é que, estamos diante de mais uma poderosa e articulada estratégia territorial dos grandes complexos agroindustriais. Não só pela articulação transescalar conquistada, os PFF aparecem também como um regime de representação do mundo rural que atravessa diversas relações, sujeitos e instituições das mais diversas ordens possíveis. Influenciando práticas e modos de organizar o espaço agrícola, os PFF surgem para rearticular as forças do poder agro-fundiário e destacam o novo sentido dado para a expansão territorial das plantações. Para compreendermos a magnitude desta estratégia, basta observarmos a evolução dos contratos nos programas de “fomento florestal”. Segundo a Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas – ABRAF – a evolução dos contratos de fomento nos últimos anos demonstra que, entre 2005 e 2007, o número de novos contratos aumentou 95% no período, passando de 2.176 novos contratos em 2005 para 4.250 em 2007. O número total de contratos, em 2007, atingiu o acumulado de 22.155 contratos. Neste mesmo ano, a área total plantada nos programas de fomento pelas empresas associadas à ABRAF foi de 401.900 hectares, enquanto que em 2006 somava 290.000 hectares, representando um aumento de 38,6% em apenas um ano. Este cenário revela a amplitude adquirida pelo “fomento florestal” que contribuiu, em 2007, com 15% de toda a madeira industrial consumida no país. Os dados apresentados acima nos revelam o aumento progressivo dos contratos de integração na cadeia agroindustrial, sobretudo no setor celulósico-papeleiro. Isso implica, aqui, em duas possibilidades para pensarmos o significado destes programas. Por um lado, o aumento das relações contratuais no campo sinaliza uma intensificação das relações sociais e de poder por meio das tecnologias “verde” (Porto-Gonçalves), sobretudo pela incorporação de técnicas e operações verticalmente controladas. Revela também uma ampliação generalizada de novas formas jurídicas de regulação-coordenação das relações de produção que, no caso dos contratos, são de caráter privado e regidos pelo direito civil, na medida em que não há uma legislação específica para regular estas atividades. Por outro lado, o aumento dos contratos no campo nos mostra o avanço progressivo da agroindústria na organização dos serviços de assistência técnica, pesquisa e difusão 8 de tecnologias que, diga-se de passagem, era uma atribuição, agora não mais exclusiva, dos órgãos públicos de extensão rural. Esse processo tem significado aquilo que Altmann (1997) chamou de efeito arraste, ou seja, os complexos agroindustriais desenvolvem seus próprios serviços de assistência técnica a fim de garantir a difusão e a consolidação de tecnologias entre os mais diversos sujeitos e instituições do mundo rural. Assim, com a organização dos PFF, a extensão rural passa a ser compartilhada (ou privatizada?) entre a administração pública e a iniciativa privada, enfim, uma parceria público-privada. Trata-se, portanto, se me permitem o termo, de uma privatização cada vez mais acentuada da extensão rural, pois, como sabemos os contratos de produção não necessitam de mediação bancária, dispensam fiadores, são menos burocráticos e exigem apenas uma documentação (certidão de registro, RG, CPF, ITR, inscrição estadual, CCRI) para selar a parceria. Ou seja, são muito mais atraentes do que as políticas públicas rurais e as linhas de crédito (Pronaf) que exigem condições burocráticas e bancárias para a concessão dos empréstimos. Aqui, sem qualquer dúvida, uma fusão entre o público e o privado, ou melhor, uma privatização. 3 – A lógica (epistemo)lógica dos programas de “fomento florestal” O setor industrial madeireiro vem nos últimos anos ensejando, sobretudo nos países do Sul, uma multiplicidade de estratégias e práticas territoriais que ganharam uma posição cada vez mais consolidada nas políticas de integração regional, sobretudo os programas de “fomento florestal”. A expansão das grandes plantações comerciais (eucalipto, pinus, teca, acácia negra) e sua integração com pequenos e médios agricultores, não só reacende o papel geopolítico do Sul nas estratégias empresarias como também multiplica o padrão de poder mundial e sua lógica moderno-colonial em outras escalas sociais, em outros níveis do espaço, em outras ordens. É também uma atualização histórica do controle agroindustrial sobre as formas de produção da agricultura camponesa, pois implica na modernização das áreas integradas por meio das novas tecnologias florestais e de todo o seu conjunto de procedimentos, normas e conhecimentos implicados neste novo intervencionismo tecnológico no campo. Estamos sim, diante de uma nova estratégia que unifica tecnologia, capital e poder, num mesmo conjunto de ações que está organizado na base de um sistema de relações coordenado e controlado pelo regime agroindustrial. Essa (inter)dependência produtiva é, ao mesmo tempo, uma ampliação escalar da visão agrocêntrica e toda sua filiação aos adubos industrializados, aos químicos e as máquinas amplamente usados na monocultura colonial e atual, mas também uma tentativa de reorganizar o modo de produção camponês e suas relações com a história, com o espaço e com o social. 9 Este novo instrumento é também mais uma manifestação das heranças coloniais do pensamento que ainda se reproduzem no padrão de conceitos e categorias do pensamento florestal do Sul. Vê-se, deste modo, que ainda continuamos a nomear as plantações industriais como sinônimas de florestas, ou seja, o homogêneo e o heterogêneo se encontram no mesmo espaço de erudição e conceituação. Sublinhe-se que esta generalidade no conceito de floresta encontrada em sua polissemia conceitual, tem alterado cada vez mais a abrangência da questão florestal, quando não demonstra uma precariedade contextual permitida pelo abuso semântico do conceito. Assim, é importante destacar os limites e as possibilidades deste conceito, pois, ao que parece, sua multiplicidade de significados tem influenciado diretamente a prática política, mas também ocultado as raízes desta dependência epistemológica. De início, é importante destacar que a base conceitual da silvicultura científica tem legitimado o conceito de floresta nos programas de “fomento florestal”. Seu espaço de manobra se inscreve na tradição européia de exploração florestal e tem como apoio central a idéia de “floresta plantada”, um metaconceito incorporado no pensamento florestal do Sul que significou o principal dispositivo epistêmico adotado para nivelar a rica diversidade bio-sócio-cultural da floresta com as homogêneas e uniformes plantações industriais. O limite entre essas duas feições é que “As plantações comerciais exigem preparação do solo, seleção de plantas de rápido crescimento e com as características tecnológicas requeridas pela indústria, fertilização, eliminação de “ervas daninhas” com herbicidas, plantio com espaçamento regular e colheita em períodos curtos. Além disso, como o objetivo é produzir e colher grandes volumes de madeira ou frutos (no caso do dendezeiro) no menor tempo possível, pode-se dizer que elas possuem as mesmas características que qualquer outra lavoura agrícola. Portanto, não se trata de uma “floresta”, mas de uma cultura. Pior ainda: de uma monocultura em grande escala” (WRM, 2003, p.13). Sendo o resultado de uma transformação agressiva e profunda de uma paisagem, essas plantações são muito mais parecidas com um cultivo agrícola industrial do que com uma floresta, no sentido usual do termo, ou com lotes agrícolas manejados de maneira convencional. Tais plantações podem ser implantadas em fazendas extensas, pertencentes a uma empresa ou arrendadas por ela, ou consistem na soma de um grande número de pequenas propriedades (WRM, 1999, p.03). Confundir floresta com plantações homogêneas foi o ponto de partida que deu publicidade a uma enganosa propaganda dos programas de “fomento florestal”. Fomentamos florestas, plantamos florestas! As florestas podem ser criadas, falam em coro. No entanto, como uma cultura comercial (de árvores) que segue a risca as recomendações e os receituários técnicos de plantio, fertilização, manejo, poda, colheita, além de altas doses de insumos e agrotóxicos aplicados em espécies clonadas e selecionadas, com espaçamento regular, uniformidade e alto rendimento em madeira pode ser confundida com uma floresta? Como resposta técnica, destacamos que não é possível 10 numa plantação “plantar” a diversidade de fauna e flora existentes numa floresta, muito menos “criar” os processos ecológicos e as múltiplas interações biogeoquímicas presentes nos ecossistemas florestais. E assim não é permitido, também, a presença humana, pois diferentemente de um floresta, que oferece uma caça, um remédio, um fruto, um teto, as plantações comerciais são lugares assépticos, a-históricos, onde não se mora gente. Ainda, uma floresta contém “numerosas espécies de árvores e arbustos de todas as idades com uma quantidade ainda maior de outras espécies vegetais, tanto no solo quanto nas próprias árvores e arbustos (samambaias, trepadeiras, epífitas, parasitas, etc.) e uma enorme variedade de espécies de fauna que ali encontram refúgio, alimento e possibilidades de reprodução em mútua relação” (WRM, 2003, p.12). Mas esse uso (im)preciso do conceito de floresta nos PFF tem suas raízes na tradição européia de exploração florestal, sobretudo pelo nascimento da silvicultura na Alemanha no século XIX (DIAS, 2008; PINHEIRO, 2006). Naquela época, a exploração da madeira significou uma diminuição abrupta das reservas florestais da Europa que ficaram quase que esgotadas. Os alemães que utilizavam muita madeira e não tinham terras no mundo colonial começaram a plantar “florestas” de suas árvores e assim criaram a silvicultura, ou seja, a capacidade de criar florestas plantadas, sobretudo, para fins industriais. Surge a ciência de plantar árvores. Naquele momento, as espécies florestais eram escolhidas conforme seu uso e fim e plantadas conforme as características exigidas pela indústria: árvores da mesma espécie, selecionadas pelo seu rápido crescimento, uniformidade e alto rendimento de madeira e plantadas em blocos da mesma idade (WRM, 1999). Esta ciência, denominada silvicultura, surgiu no Norte, fundamentalmente pela conseqüência do desenvolvimento industrial, com suas enormes necessidades de madeira e matérias primas agrícolas. O desflorestamento resultante obrigou os países com desenvolvimento industrial a buscar novas formas de manejo e de restabelecimento dos bosques. (WRM, 1997:15) Esta experiência de “plantar” florestas, daí o conceito floresta plantada, foi marcante para o pensamento florestal do Sul que, como foi dito, autorizou qualificar qualquer plantação arbórea como sinônima de floresta. Vê-se, portanto, que as referências epistemológicas dos programas de “fomento florestal” são reflexo histórico do pensamento florestal europeu. Só um raciocínio logicamente colonial, definiria os plantios homogêneos como feições incluídas no espaço conceitual das florestas. E aqui, o “fomento florestal” aparece novamente, em menor escala, para atualizar a história colonial das monoculturas que, como sabemos, foi o maior instrumento político de organização da agricultura colonial, mas também a técnica que revestiu o mundo moderno-colonial ao preço da violência, escravidão, etnocídio, ecocídio (PORTO-GONÇALVES, 2006). Justifica-se, deste modo, a (im)posição das aspas no “fomento florestal” para destacar, em sua proposição semântica, o equívoco conceitual que ele mesmo desconhece ao antecipar, mesmo antes 11 de integrar seus “parceiros” ao mundo industrial, uma verdadeira violência epistêmica que atinge não só a sintaxe lingüística, mas também uma diversidade de formações sócio-geográficas desde, indígenas, camponeses, ribeirinhos, seringueiros, gerazeiros, pantaneiros, retireiros, mulheres quebradeiras de coco babaçu, enfim, um sem-número de identidades sociais da floresta e que, com a floresta, apresentam uma prática política de oposição e uma erudição conceitual sofisticada e criativa que sente na floresta o sentido preciso deste lugar: um mundo copartilhado por homens e mulheres em sua materialidade com riquezas materiais, alimento, água, remédios, animais, pigmentos, ar puro, perfumes, cipós, óleos, mas também covivido com seus mistérios, seus espíritos, sua magia, seu encanto, sua diversidade co-habitada. Habitat, habitus. Destaca-se que este sentido preciso e vivido presente no conceito de floresta nos permite afirmar, sem destoar a semântica e o significado real da palavra, que os programas de “fomento florestal” não fomentam florestas, mas sim madeira commoditizada ou simplesmente culturas arbóreas. Não fomentam florestas, pelo simples motivo de que não há nenhuma potencialidade humana que de conta de criar um ambiente tão complexo e imprevisível que tamanha diversidade não caberia num único conceito. Neste caso, dar continuidade conceitual ao “fomento florestal” é oferecer novas condições de articulação dos saberes modernos com a organização do poder, especialmente as relações coloniais/imperiais de poder constitutivas do mundo moderno (LANDER, 2005). É assinalar a seqüência de um padrão de poder conceitual que naturaliza a gramática moderno-colonial em sua totalidade e justifica sua universalização por um “piso básico de práticas sociais (e teóricas) comuns para todo o mundo e uma esfera intersubjetiva que existe e atua como esfera central de orientação valorativa do conjunto” (QUIJANO, 2005:242). Essa problemática acentuada pelas heranças coloniais é profunda ao passo que determina a natureza e o sentido preciso da prática política, o sentido do fazer político. Não é por acaso que a posição política conquistada por algumas frações do poder agro-fundiário no Brasil se inicia pelas escolhas conceituais. Basta observarmos a posição ocupada por alguns setores da indústria, como a de cosméticos, a siderúrgica, a farmacêutica e a de papel e celulose no quadro de conselheiros do CONAFLOR, Conselho Nacional de Florestas, um órgão de natureza consultiva no âmbito do PNF, Programa Nacional de Florestas, que propõe e avalia medidas para o cumprimento dos princípios e diretrizes das políticas públicas florestais (DECRETO 3.420, 2000). E quando se determina o sentido do fazer político, o seu exato rumo, estamos literalmente indicando as formas e modo de (re)fazer as práticas políticas, de como se conduz o processo político e, veja, simplesmente pela escolha de um conceito. Cunhar pra si o conceito de floresta, ou melhor, usar um conceito que já nasce de uma experiência histórica amplamente destrutiva (o colonialismo europeu), é renovar as forças e o padrão de conceitos e categorias de fundo colonial ainda reproduzido enquanto relação histórica e atual de dominação epistemológica. Por outro lado, ainda, é dar prosseguimento ao curso 12 histórico de total indistinção entre o público e o privado8 onde a “esfera pública nunca chega a constituir como pública, definida sempre e imediatamente pelas exigências do privado, de sorte que a vontade e o arbítrio são marcas do governo e das instituições “públicas”” (CHAUÍ, 1987:55). Neste sentido, para introduzirmos uma prática epistêmica que supere o equivoco semântico no conceito de floresta, é necessário uma desconstrução das narrativas hegemônicas que é parte do desafio posto pelo horizonte teórico pós-colonial. Busca-se, portanto, incluir um outro eixo epistêmico que organize a produção de alternativas para a construção de uma prática teórica de oposição, formando um espaço de força para a erudição e a resistência crítica (MIGNOLO, 1996). Neste sentido, o reposicionamento epistemológico (e também geográfico) do sujeito de enunciação é, também, a inversão necessária para pensarmos uma nova prática intelectual que organize um verdadeiro programa de fomento florestal. Ou seja, um fomento que comece pelos conceitos, pelo pensamento, mas um pensamento situado em outra localização epistemológica, de um outro lugar. Trate-se, pois, de recuperarmos o espaço geográfico das florestas, dos povos da floresta, das culturas várias que se materializam no habitat florestal. Essa prática teórica renovada seria, a nosso ver, um excelente dispositivo para desconstruir o imaginário das florestas e libertar, do silêncio e do anonimato, as falas da floresta, as falas de floresta, outras racionalidades. E foi assim, que todo o pensamento florestal do Sul seguiu os passos da colonialidade do saber (e do poder) em todo o seu léxico de categorias, conceitos e esquemas teóricos produzindo uma base intelectual sólida que deu continuidade as relações históricas de dominação e poder por meio da epistemologia científica. Não é por acaso, que os programas de “fomento florestal” só conseguem fomentar “floresta” com uma única espécie (plantio homogêneo), geralmente com troncos retos, poucos galhos e de crescimento rápido, grande uniformidade e rendimento e, normalmente, espécies clonadas e reproduzidas num traçado geométrico, nivelado e regular9. Além disso, fomentam um manejo desconhecido aos agricultores, com todas as regras de espaçamento, adubação, aplicação de agrotóxicos, colheita e transporte, o que justifica a assistência técnica. Via de regra, não há outras opções de espécies florestais, nem mesmo as já conhecidas pelos agricultores, nem mesmo opções alternativas de manejo, nem mesmo opções de contrato que inclua as especificidades locais e os saberes tecidos no tempo; as espécies selecionadas pelos programas O relatório de Ana Fanzeres sobre a expansão da base plantada no país destaca que “o setor empresarial de base [florestal] plantada, por seu lado, se relaciona diretamente com os centros de 8 poder político e econômico e assim assegura os benefícios necessários à sua sobrevivência. Ainda assim, vários representantes dos segmentos ligados à este setor, declaram em reuniões públicas e em seus documentos os entraves que vivenciam e prejuízos incorridos. Por outro lado, entidades da sociedade civil têm tido pouca ou nenhuma inserção junto às instâncias de poder político e, muito menos econômico, e assim recorrem à mídia, e de uma maneira geral, aos canais alternativos e à articulações com outras entidades, nacionais e internacionais, como mecanismos de divulgação de denúncias e pressão” (FANZERES, 2005, p.231-232). 9 É interessante observar que a vida das “florestas fomentadas” não nasce das práticas camponesas, não nasce pela mão dos camponeses, pelos seus cuidados; nasce em primeiro lugar de um minucioso e programado trabalho de engenharia genética, que recorta a estrutura gênica vegetal e potencializa algumas características de interesse da agroindústria. 13 são espécies de rápido crescimento, espécies “úteis”, “produtivas”, sobretudo para a indústria. Como o tempo não pode parar, dissera Cazuza, as “florestas fomentadas” normalmente são plantadas para fornecer exclusivamente madeira, fornecer um só tipo de produto, pois o regime industrial exige este afã, pois tamanha diversidade de espécies não permitiria o máximo da máquina. Aqui, o tempo é também fomentado. Por outro lado, a idéia que se tem de uma “floresta produtiva” nos plantios homogêneos acaba conformando uma prática seletiva na silvicultura, pois reduz a diversidade florestal em partes “úteis” e “não úteis”, em partes “produtivas”. E declarar uma espécie útil, produtiva e a outra como “daninha” ou de “baixo rendimento” é o primeiro passo para uma política da extinção, não só ecológica, mas também do espaço de saberes construído nesta interação, saberes com a floresta e não contra a floresta (SHIVA, 2003). “As múltiplas funções dos bosques nativos e das parcelas comunais, plenas de diversidade, foram re-conceituadas como "desprolijas", "desordenadas" e com predomínio de "mazelas". Os produtos florestais não madeireiros foram classificados como "produtos menores". Aquelas árvores “anãs”, cuja taxa de crescimento havia cessado para justificar sua existência em termos econômicos, foram descartadas como "sobremaduras". A flora e a fauna, sem valor de mercado o que reduzia a produção de madeira, foram qualificadas como "improdutivas" e se converteram em candidatos para erradicação” (WRM, 1997:15-16). É importante recuperar essa dimensão da silvicultura científica, especialmente para articular um outro campo paradigmático de oposição aos atuais programas de “fomento florestal”. Isso nos aproxima da crítica feita por Vandana Shiva (2003) a silvicultura científica. Para ela, o espaço cognitivo que relaciona a agricultura e a silvicultura foi rompido, quer diretamente, quer por elos de fertilidade. Neste paradigma, o alimento não é mais uma categoria da silvicultura; ela é exclusivamente montada para a exploração da floresta como madeira e, em alguns casos frutos (dendezeiro) e resinas. Há, aqui, uma enorme lógica fragmentária que conforma o sentido e a natureza da silvicultura científica: se por um lado há a inclusão da silvicultura como fonte exclusiva de madeira, por outro há sua exclusão como fonte de forragem, nutrientes, alimentos, abrigo, sementes, rizomas, essências, remédios, óleos, seivas, flores, controle biológico e ainda como uma importante fonte de renovação da fertilidade agrícola. Trata-se, portanto, de uma visão produtivista e uniforme, sem alimentos, diversidade, múltiplos usos e funcionalidades diversas, uma visão industrial de silvicultura, uma visão de fábrica e para a fábrica. 14 4 – O setor do “fomento (nas relações sociais e de poder) florestal” e sua natureza geográfica10 Já na fábrica, por outro lado, em depoimento a Revista Opiniões, o coordenador do programa de fomento da Aracruz Celulose, Jairo Dal’Col comenta que, “O projeto de fomento florestal brasileiro, viabilizado pelas parcerias entre as empresas do setor e os produtores rurais, além de ser um importante vetor no que se refere a ampliação da base florestal e um mecanismo eficiente de oferta de matéria-prima para os diversos segmentos do setor madeireiro, em especial, ao de celulose, energético e moveleiro, tem sido a resposta estratégica mais importante que a silvicultura está dando a questionamentos como inclusão social, distribuição de rendas, geração de emprego, utilização de espécies exóticas em mosaico, preocupações ambientais, uso múltiplo da madeira, dentre outras. Essas parcerias têm sido intensificadas nos últimos anos, de uma forma bastante variada, considerando os interesses das partes. Os modelos praticados oferecem aos produtores, desde o fornecimento de mudas de eucalipto para o plantio, até assistência técnica, insumos (adubos e isca formicida), recurso financeiro para custeio de mão-de-obra e compromisso de compra da produção. A contra partida é a disponibilidade de matéria-prima no mercado. Em 2005, o programa produtor florestal da Aracruz Celulose movimentou cerca de R$ 66 milhões, incluindo os adiantamentos operacionais, financeiros, compra e transporte de madeira e impostos. O fomento florestal perde a conotação de plantio de florestas para recuperação de áreas degradadas ou suprimento do consumo de lenha nas propriedades e assume uma condição de estratégica para as empresas, de necessidade para o setor e de oportunidade de negócios para os produtores rurais” (OPINIÕES, 2006; grifos nossos). Nesta passagem é possível observar o sentido real dado aos PFF: um modelo eficiente de extensionismo integrado ao circuito agroindustrial (mudas, capital, insumos, assistência técnica, mercado) que articulou o mundo camponês e suas múltiplas dimensões a ciência e tecnologia, ao progresso e aos mercados, atualizando uma experiência histórica que, desde os anos 70, vem impondo uma ideologia “verde” e todos os seus riscos, incertezas e implicações socioambientais nas diferentes agriculturas praticadas e vividas. Trata-se, por outro lado, do ressurgimento do campesinato no campo de visibilidades da revolução verde, especialmente para incluí-lo nas últimas inovações tecnológicas, com destaque para as técnicas de engenharia genética. Estamos sim, diante de uma proposta política para o campo regida pela lógica do mundo empresarial, pelo interesse privado, que separa o centro da ação da sede da ação, o lugar de produção, do lugar de consumo. Em outras palavras, um verdadeiro modo empresarial de fazer agricultura com centralidade no empreendedorismo, no aumento de escala e também no elevado grau de mercantilização e especialização. Isso implica que, uma vez aumentada à intensidade pela tecnologia, o uso de substratos artificiais (adubos, agrotóxicos, sementes melhoradas) torna a produção cada vez mais divorciada das especificidades dos ecossistemas e dos conteúdos culturais 10 Peço emprestado ao geógrafo e professor Carlos Walter Porto-Gonçalves sua criativa sintaxe de dispor as palavras nas frases e, também, a idéia de conjugação das relações sociais com as relações de poder. 15 locais. Aqui, um circuito longo e desconexo, com rupturas entre passado, presente e futuro (PLOEG, 2008). No entanto, longe de exclusividade, a agricultura camponesa é, essencialmente, baseada em circuitos curtos e descentralizados que ligam a produção e o consumo de alimentos e, de forma mais geral, a agricultura e a sociedade regional fundando relações compartilhadas entre campo e cidade. Basicamente, se apóia no uso sustentado da base ecológica, na mão de obra familiar ou comunitária, nas relações de reciprocidade e nos fluxos relativamente autônomos de recursos produzidos e reproduzidos na própria unidade agrícola. Com um baixo grau de mercantilização, o modo camponês de fazer agricultura centraliza-se na perícia artesanal e nas tecnologias baseadas em habilidades multifuncionais. A autonomia é central com continuidade entre passado, presente e futuro (IDEM). Porém, longe de uma lógica binária que reduz a complexidade implicada nestas duas abordagens, é importante assinalar que estas duas lógicas, apesar de articuladas em algum sentido, apresentam características bastante diferentes, se não contraditórias. A principal delas é a autonomia. E aqui, os programas de “fomento florestal” aparecem como lócus privilegiado para discutir esta questão. Vejamos, agora, suas operações. Apesar de parcialmente integradas, na medida em que nem todas as relações de produção são controladas pelo regime agroindustrial, as unidades fomentadas são regidas pelas verticalidades. Trata-se, pois, de um espaço hierarquicamente controlado por padrões reguladores e regras técnicas, jurídicas e econômicas11 que comandam as interdependências espaciais para fundar arranjos normatizados por uma racionalidade superior com discurso pragmático, criando um cotidiano obediente e disciplinado (SANTOS, 1996). Trata-se, também, de um espaço que exige sincronicidade para otimizar as operações de modo instantâneo pois, tamanha são as condições e características exigidas (uniformidade, regularidade, homogeneidade) que somente pela prescrição de esquemas reguladores com minuciosos detalhes do processo de trabalho e de produção, daria conta de atender a linha de montagem do regime agroindustrial. Isso incide diretamente na estruturação do processo de trabalho e de produção e implica no uso de indicadores normativos externos para sincronizar a produção à temporalidade da lógica agroindustrial. Ainda no trabalho, os programas de “fomento florestal” organizam o processo produtivo de maneira que se alcance a máxima utilização dos fatores produtivos envolvidos, buscando como resultado baixos custos de produção e o incremento de bens e serviços. Enfim, um exercício concreto das economias de escala que, no caso do setor a base da madeira, é decisivo para amortecer os efeitos da concorrência. Aqui, uma clara intenção, em maior ou menor grau, de especializar o trabalho familiar e entediar seu potencial polivalente e diversificado. 11 E as regras, segundo Carlos Walter Porto-Gonçlaves (2006), implicam a presença de relações concretas de poder. 16 Sinteticamente, isso nos aproxima daquilo que Altmann (1997) chamou de destruição criativa, essência da economia de mercado. Para ele, esse processo implica numa “pressão externa que desorganiza e desestrutura. Essa pressão desintegradora se completa pela introdução de novas tecnologias, o que significa transferência das decisões quanto ao como produzir para fora da explotação agrícola e pela modificação das condições de mercado a jusante e a montante da agricultura. As interdependências estabelecidas no interior das unidades agrícolas são enfraquecidas ou destruídas” (ALTMANN, 1997, p.27). É neste sentido, que os programas de “fomento florestal” são montados para os camponeses e não pelos camponeses. O sentido quase de “obediência”, sobretudo pelas constantes intervenções da assistência técnica e pelas inalienáveis cláusulas jurídicas, é, aqui, uma pista importante para compreendermos o significado da autonomia nos PFF. Não menos, as relações contratuais e o seu sentido quase “ritualístico” de prescrever recomendações e protocolos seqüenciais é o dispositivo que introduz, ao preço da disciplina, as unidades fomentadas no campo de comando e controle da atividade agroindustrial. Um exemplo disso é o planejamento das atividades do “fomento florestal”. Nesta etapa, além de definir como plantar é a agroindústria que define quando plantar e onde plantar, ou seja, define a ação, o tempo e o espaço. “O planejamento do Fomento Florestal leva em conta a necessidade de consumo da fábrica e a participação que se deseja atribuir ao programa. A partir daí, a equipe do Fomento define as regiões com aptidão para o cultivo de eucalipto e sai em busca de contratos com produtores rurais interessados em aderir ao programa ou em renovar contratos já existentes” (ARACRUZ, 2003, p.21). Enfim, essa ampliação do espaço de manobra do complexo agroindustrial sobre a condição camponesa12, diminuindo sua autonomia e aumentando a dependência, sinaliza um processo de “enfraquecimento, erosão ou até desaparecimento de práticas camponesas e da racionalidade associada a elas”, um possível processo de descampenização nos termos de Ploeg (2008, p.52). Estamos, portanto, diante de uma nova possibilidade de aplicar, como nos lembra Carlos Walter Porto-Gonçalves, a revolução (nas relações sociais e de poder) por meio das tecnologias “verde” aos camponeses e incluí-los no novo aparato do desenvolvimento agroindustrial. Este cenário é exatamente um exemplo de como o poder agro-fundiário se articula e (re)negocia suas 12 Segundo Jan Douwe Van Der Ploeg (2008), a condição camponesa se fundamenta “(1) na luta por autonomia que se realiza em (2) um contexto caracterizado por relações de dependência, marginalização e privações. Essa condição tem como objetivo e se concretiza na (3) criação e desenvolvimento de uma base de recursos auto-controlada e auto-gestada, a qual por sua vez permite (4) formas de co-produção entre homem e natureza viva que (5) interagem com o mercado, (6) permitem a sobrevivência e perspectivas de futuro e (7) se realimentam na base de recursos e a fortalecem, melhorando o processo de co-produção e fomentando a autonomia e, desta forma, (8) reduzem a dependência. Dependendo das particularidades da conjuntura socioeconômica dominante, a sobrevivência e o desenvolvimento de uma base de recursos própria poderão ser (9) fortalecidos através de outras atividades não agrícolas. Finalmente, existem (10) padrões de cooperação que regulam e fortalecem essas inter-relações” (PLOEG, 2008:40) 17 estratégias políticas para ampliar seus contextos (Milton Santos), portanto, suas escalas. O sentido de reorganizar e modernizar a produção agrícola, ampliar as escalas econômicas, capacitar os fomentados com técnicas organizacionais, empresariais e de sustentabilidade, traçar uma rede logística e operacional e articular as unidades fomentadas aos ciclos econômicos da agricultura comercial13 é uma perfeita atualização da filosofia e da matriz operacional dos Programas de Desenvolvimento Rural Integrado – PDRI, do Banco Mundial que, por sinal, foram muito bem descritos pelo antropólogo colombiano Arturo Escobar (1996). Trata-se, portanto, de um dispositivo que atualiza a revolução verde e reproduz em outras escalas e bases sócio-geográficas um modelo ideológico que mantém as mesmas características e valores encontrados em seu espaço original, um lugar capitalisticamente construído para mercantilizar as relações em todos os âmbitos possíveis. Essa ampliação do espaço original incluiu um conjunto de ações impregnadas de intencionalidade (SANTOS, 1996) e, deste modo, os valores de quem as produziu. Assim, todo o conteúdo dos programas de “fomento florestal” aparece impregnado de intenções, de ações, de formas, de ideologia e, também, de interesses. Aqui, um claro jogo de reprodutibilidade do original pela penetração progressiva nas novas escalas, e com novos sujeitos. “De certa maneira, pelo jogo da circulação há uma projeção do ponto inicial no ponto terminal. Trata-se, pois, de uma reprodução do espaço original. Não uma reprodução idêntica, mas uma reprodução do equivalente, que leva em consideração as particularidades espaço-temporais do espaço terminal. Não é um decalque territorial, mas uma reprodução territorial que só se deu pelo estabelecimento de um sistema de circulação (RAFFESTIN, 1993, p.215; grifos nossos).” O que devemos ver aqui é o espaço original como referência total do tempo, do espaço, do fazer, do saber e da consciência. Afinal, os PFF são portadores de uma territorialidade particularmente criada e experienciada que surge para reorganizar outras territorialidades, outros tempos. Essa necessidade de reproduzir o original pelo artifício do equivalente, aproxima perfeitamente daquilo que Claude Raffestin (1993) chamou de estratégias em pequena escala. “As estratégias em pequena escala são aquelas que tentam realizar uma integração territorial e uma continuidade na distribuição das distâncias: controle dos espaços “moleculares” por oposição aos espaços “atômicos”. Nestas estratégias, dá-se mais importância, mais significados, aos pontos terminais do que aos pontos intercalares. A concepção territorial dessas estratégias é, muitas vezes, por demais abstrata: postula a homogeneidade, a isotropia e a transferência do espaço, ou seja, propriedades que só existem no nível de uma representação e de forma alguma na realidade 13 No nosso caso o agronegócio com base na madeira. 18 territorial vivida” (RAFFESTIN, 2003, p.208). Seria preciso descrever que essa estratégia inspira códigos hierárquicos e centralizadores? Assim, o espaço original na condição de equivalente surge para afetar, controlar e influenciar pessoas, fenômenos e relações que, para Robert Sack (1986), é o sentido real da territorialidade. Busca-se, desta forma, apenas circular e comunicar conteúdos que apresentem o mesmo estilo e configuração que os modos de organização espacial originalmente ordenados. Isso demonstra, de modo espacial, que a força de reprodutibilidade dos programas de “fomento florestal” é organizada para relocalizar a ideologia da revolução verde nas diferentes escalas sociais, inclusive aquelas que historicamente r-existiram (Porto-Gonçalves) a entrada do fenômeno da agricultura capitalista no seu sentido mais profundo. Neste sentido, podemos até arriscar que os PFF são verdadeiros centros de reprodução ideológica e conceitual (ex. floresta plantada, empreendedorismo) que só se justificam para continuar o domínio colonial pelos conceitos e o domínio colonial pela técnica; enfim, um fomento de conceitos, de conhecimento e de técnicas. Nosso objetivo é que o produtor rural encontre na empresa um parceiro e que o Fomento Florestal não represente uma mera relação de troca de volume de madeira, mas também uma troca de experiência, de apoio, de informações e de conhecimento técnico. Enfim, ações que possam tornar as atividades nas propriedades rurais ainda melhores: maior rentabilidade, mais empregos e por que não, mais justiça social (NUNES, 2003; grifos nossos). Pelo argumento do diretor de operações da Aracruz Celulose, Walter Lídio Nunes, o “fomento florestal” só terá um sentido “democrático” e, com muito esforço, pelas suas próprias palavras, a justiça social, se houver uma relação de troca de experiências, de apoio, de informações e de conhecimento técnico. No entanto, longe de exclusividade, que tipo de conhecimento técnico inscrito na lógica camponesa poderá servir ao complexo agroindustrial da celulose e a todo o seu regime industrial de produção? Que tipo de conhecimento poderá ser compartilhado sem, contudo diminuir a intelectualidade camponesa e suas sofisticadas técnicas, saberes e fazeres? O modo como se planta uma árvore? O modo como se faz um berço, contraditoriamente chamado de “cova”? O modo como se produz alimentos? Enfim, entendemos que se trata de um falso argumento, pois ao que parece não há conhecimento camponês que possa ser realmente incorporado numa lógica que sequer compreende o sentido real da palavra floresta. Não há experiência camponesa que possa realmente ampliar a estatura do tronco ou mesmo diminuir o teor de lignina da madeira fomentada. E também não há possibilidades de construir um contrato para além das cláusulas já ditadas pela agroindústria, um contrato a partir da lógica camponesa, do seu espaço vivido, de sua cultura. Isso se confirma, a começar, quando o camponês separa conceitual e politicamente os limites entre uma plantação de madeira e uma floresta. Já bem dissera um camponês do Movimento dos Pequenos Agricultores do Espírito Santo, 19 “a questão é que o eucalipto [madeira] é agressivo, eu digo o seguinte: o eucalipto ele é capitalista, entendeu, uma floresta é socialista, pois ela permite por si só, não precisa de ninguém interferir, nasce tudo, cipó, outras árvores, variedades de árvores, entendeu. Então, mas no meio do eucalipto não tem, nem se o fomentado quisesse plantar milho no meio do eucalipto não ia colher, não precisa de cláusula proibindo isso. A próprio monocultivo de eucalipto em si já tira dele essa opção, não tem, não precisa de cláusula, ele não precisa; mesmo que ele queira ele não vai conseguir nada, nada” (entrevista realizada por Eduardo Álvares da Silva Barcelos em 23/06/2009). Por outro lado, a inclusão do campesinato no aparato do desenvolvimento rural já nos revela a dimensão contraditória deste mecanismo. A partir da metade do século XX, a formação das grandes plantações comerciais no Sul significou não só a expansão das terras cultivadas pelo uso de técnicas ocidentais, invisibilizando saberes e fazeres diversos, mas também a expulsão do campesinato, o êxodo rural e os processos de desruralização que marginalizou uma grande parte da população rural. E entre expansão e expulsão, e veja ex-pulsão, um pulso externo, uma força que agride uma ordem interna já consolidada, abriu-se um grave processo de esvaziamento demográfico que, de forma brutal, conformou uma agricultura cada vez mais sem homens e mulheres, sem agricultores, porém cada vez mais dependente de aparatos tecnológicos e de técnicas científicas. No entanto, pois, uma parcela do campesinato r-existiu a todas essas transformações nas relações sociais e de poder por meio das tecnologias verdes (PORTO-GONÇALVES, 2006) e a toda essa onda de expropriação e proletarização do trabalho que, se acreditou, inclusive, ser capaz de eliminar o campesinato pelo domínio da agricultura industrial. Essa fração r-existida, que ainda hoje luta para r-existir às ultimas inovações da revolução verde, sobretudo em sua versão transgênica, é a mesma parcela do campesinato contraditoriamente convocada a “cooperar”, a “participar” e, sobretudo a se tornar um empreendedor14, um “produtor florestal”. Afinal, ser “produtor florestal” é ter o segredo do sucesso, é ter oportunidade de trabalho, é ter lucro garantido, é ter mudança de vida, é ter um futuro15. Trata-se, então, de reconhecer nos PFF uma experiência inovadora, uma nova identidade, um novo modo de ser, o “produtor florestal”16. 14 Enquanto que na artesanalidade os indicadores e parâmetros de trabalho e produção são internamente decididos incorporando conhecimentos locais, habilidades, padrões de comunicação e de troca e principalmente as referências culturais situadas no tempo e no espaço, no empreendedorismo, característica inerente aos programas de “fomento florestal”, a produção reflete um alto grau de dependência com os mercados e centraliza o regime de trabalho nas economias de escala e na maximização dos lucros, sobretudo pela produção repetitiva e regular de um mesmo produto, geralmente commoditizado (PLOEG, 2008). 15 Essas afirmações foram retiradas das várias edições da Revista Produtor Florestal da Aracruz Celulose. 16 Muito mais do que uma invenção, no sentido preciso da palavra, o “produtor florestal” foi o dispositivo discursivo e textual que deu identidade aos programas de “fomento florestal”. Sua racionalidade atomizada com dependência técnica, contratual, financeira e epistemológica é portadora de um conjunto de ações, valores e esquemas de percepção que, de modo especial, constitui o pensamento-base e a visão agrocêntrica da ideologia do agronegócio com base na madeira. Trata-se de uma identidade territorial inventada, não pela sua natureza puramente funcional e disciplinar, mas por não representar uma continuidade histórico-cultural com relações internas e externas coerentes a um lugar (SAQUET, 2007). Isso demonstra, num sentido mais histórico, que o “produtor florestal” não mantém uma filiação vivida com o passado, sobretudo as relações de pertencimento e proximidade, como ainda, não se vincula à memória, à 20 Trata-se, aqui, de uma estratégica mudança nas categorias do discurso que surge para apresentar, sobretudo no imaginário, um novo regime de representação do campesinato no sistema de relações sociais e de poder, mas também para abrir um novo campo visual (A. Escobar) da atividade agroindustrial. Isto é, sem dúvida, uma renovação da política de visibilidades do aparato agroindustrial que, de modo especial, mas não exclusivo, funciona para produzir novos grupos de clientes e ampliar as redes de hegemonia. Uma outra questão é a “ausência” de uma suposta “consciência florestal17” na lógica dos camponeses que, no caso dos programas de “fomento florestal”, aparece como condição necessária para legitimar sua existência enquanto política (privada) de desenvolvimento rural. No entanto, é importante assinalar que essa ausência ou precária consciência florestal é uma condição inventada, sobretudo para organizar práticas e métodos de intervenção integrada naqueles que supostamente não atingiram este “estado de consciência”. Em geral, se comete um grave equívoco ao se confundir disposição para plantar madeira commoditizada com “consciência florestal”. Assim, só uma medida logicamente colonial teria a ousadia de retirar da condição camponesa a compreensão da dimensão florestal e suas múltiplas relações simbiônticas com a agricultura. Ao falar da importância dos camponeses na preservação ambiental da região serrana no Espírito Santo, especialmente em Domingos Martins, uma das lideranças do MPA-ES nos brinda com um belíssimo exemplo de consciência florestal, consciência da floresta, de floresta. Ele diz, “Olha eu acho o grande desafio pra nós é reflorestar. Esse é um desafio muito grande pra nós, reflorestar. Nós temos como bandeira a produção de alimentos saudáveis, mas as estatísticas mostram pra nois que a produção de alimentos hoje ela está acima do consumo; então já que nós, a nossa bandeira é a produção de alimentos, nós temos que dar uma olhada nisso ai, não é parar de produzir ne, não é parar de produzir. Mas, digamos assim, é ver que além da produção de alimentos, nós temos que reflorestar o planeta e Domingos Martins não está fora do contexto, então eu acho que um grande desafio é reflorestar. Agora, a outra coisa é colocar na cabeça desses técnicos ne e engenheiros que eucalipto não é floresta, então isso é um desafio nosso agora. É um desafio pra nós enquanto movimento reflorestar, agora reflorestar com árvore nativa, não com árvores exóticas; então reflorestar com árvore nativa da região, recuperar a mata atlântica porque ela vai proporcionar a produção de alimentos, ela não vai interferir: ela vai aumentar a produção de alimentos ne e ela vai aumentar a produção de água, ela vai reduzir o número de pragas e doenças não só na fauna e na flora mas tamem no ser humano de um modo geral. Então eu acho que esse é o nosso grande tradição e ao espaço vivido. Sua existência atomizada, sem dimensão simbólica, sem um código genético local, material e cognitivo que é produto social da territorialização de línguas, mitos, signos, ritos, religião, enfim, dos atos territorializantes dos atores sociais e históricos (IDEM), aparece como invenção identitária para produzir um campo visual capaz de incorporar, novamente, o campesinato na dinâmica do regime agroindustrial. Aqui, o “produtor florestal” nasce por gênese pura, ou seja, sem história, é a-histórico. 17 É interessante observar que dentre os objetivos do Programa de Extensão Florestal do Estado do Espírito Santo, uma iniciativa do governo com apoio da Aracruz Celulose S.A., se afirma explicitamente à suposta “ausência” da “consciência florestal” na lógica dos agricultores. Dentre outros, o programa tem por objetivo “gerar novas fontes de recursos para os pequenos e médios proprietários rurais, através da ocupação de terras marginais, degradadas; gerar matéria prima florestal excedente para atrair novos empreendedores; contribuir para o controle da erosão e degradação do solo; gerar a oferta de madeira através de espécies de rápido crescimento e desenvolver a consciência da necessidade do plantio de florestas nos pequenos e médios produtores rurais” (NOVO PEDEAG, 2007, p.10; grifos nossos). 21 desafio, nosso maior desafio no momento ne, não é abandonar a nossa bandeira de produção de alimentos, essa é a espinha dorsal nossa, mas o desafio agora é reflorestar nossas áreas degradadas, nossas áreas onde não tem, as encostas, as áreas de APP, as áreas de reserva legal” (Entrevista realizada por Eduardo Álvares da Silva Barcelos em 23/06/2009). Vejamos, pois, que este depoimento dispensa maiores comentários sobre o significado das florestas na consciência camponesa. Talvez, ao que parece, precisamos com urgência incorporar uma outra racionalidade nos programas de “fomento florestal”, uma consciência camponesa. Fica, aqui, a nossa dica. Por fim, não podemos deixar de fora a questão da segurança alimentar. É sabido, pelas mais variadas fontes, que mais de 75% da comida que chega a mesa do brasileiro é produzida pelos camponeses. É sabido também que os PFF foram montados para articular ao regime agroindustrial, os mesmos camponeses que produzem os alimentos do nosso dia-a-dia. Deste modo, temos aqui implicados, uma convergência de dois processos distintos, porém interligados: por um lado à produção de alimentos e sua lógica e, por outro, a produção de madeira industrial. Neste sentido, é possível compatibilizar os dois processos? Se tomarmos empiricamente a evolução da área plantada no Brasil no período de 1990 a 2007 para algumas culturas agrícolas, seria pouco o nosso sentido de alerta, ou melhor, um sentido de crise (Tabela 1). Tabela 1: Evolução da área plantada no Brasil (1990-2007) Fonte: SIDRA/IBGE Área Plantada (ha) Cultura Arroz Feijão Mandioca Café Batata inglesa Laranja Abacate Batata doce Milho Soja Cana Madeira em tora (m3) % 1990 2007 4.158.547 5.304.267 1.975.643 2.937.804 159.089 913.867 17.671 64.323 12.023.771 11.584.734 4.322.299 47.024.280 2.915.316 3.975.900 1.941.104 2.280.241 147.800 821.575 9.892 44.045 14.010.838 20.571.393 7.086.851 105.131.741 -29,9 -25,0 -1,7 -22,4 -7,1 -10,1 -44,0 -31,5 16,5 77,6 64,0 123,6 No período destacado, é interessante observar o salto de quase 124% na produção de madeira em tora e a queda acentuada da área plantada dos principais alimentos que compõe a mesa do brasileiro. Embora seja desconhecida à área plantada com madeira pelo IBGE(?), segundo a 22 ABRAF, a silvicultura já ocupa uma área de 5.560.203 hectares no país, enquanto que a área plantada de arroz e feijão, base da alimentação brasileira, caiu em média 27,5% no período. Somados ao boom dos contratos como visto anteriormente18, os dados nos autorizam a falar de uma contradição inscrita no espaço agrário brasileiro. O modelo agrícola que vem se impondo nas últimas décadas no país, implica a redução da área plantada dos produtos alimentícios da cesta básica dos brasileiros, no entanto amplia a área plantada das principais commodities de exportação, soja, carne (associado ao milho), polpa de madeira, papel, celulose e ferro gusa19. Trata-se, portanto, de uma commoditização do espaço agrário brasileiro, não só conformada no velho, colonial e atual latifúndio, base da monocultura, do racismo, da violência e da escravidão, mas também um processo implicado na agricultura camponesa por meio dos programas de “fomento florestal” que, como sabemos, oferecem condições especiais para continuar a revolução verde e a política expansionista, moderno-colonial, das plantações arbóreas comerciais. Não sabemos ao certo a intensidade deste processo, no entanto podemos dizer, em maior ou menor grau, que os programas de “fomento florestal” são práticas que estruturam a crise dos alimentos, ou seja, estão inseridos no bojo destas contradições. 5 – Referências Bibliográficas ABRAF. Anuário Estatístico da ABRAF: ano base 2007. Associação Brasileira dos Produtores de Florestas Plantadas. 2008. ALTMANN, Rubens. 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São Paulo: Brasiliense, 1987. 179p. 18 O “fomento florestal” contribuiu, em 2007, com mais de 400.000 hectares plantados por pequenos e médios agricultores totalizando 22.155 contratos (ABRAF, 2008). 19 Para maiores informações sobre a Geografia Agrária da Crise dos Alimentos, ver PORTO-GONÇALVES e ALENTEJANO (2009). 23 CARVALHO, Márcia Maria Andrade. A “ambientalização” do discurso empresarial no extremo Sul da Bahia. Tese de doutorado em Planejamento Urbano e Regional. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006. 204p. DAL’COL, Jairo. Fomento Florestal: uma oportunidade de negócio. Opiniões, Ribeirão Preto, jun/ago, 2006. DECRETO 3.420. Programa Nacional de Florestas. Brasília, 2000. DIAS, Célia Regina da Silva. Geografia Histórica Ambiental: uma geografia das matas brasileiras. Tese de Doutorado em Geografia. Universidade Federal Fluminense, 2008. 181p. ESCOBAR, Arturo. La invención del Tercer Mundo: construcción y desconstrucción del desarrollo. 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