1 UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ ANDRÉA DOS SANTOS CARDOSO COMUNICAÇÃO NO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA: O AGENTE DE SAÚDE COMO ELO INTEGRADOR ENTRE A EQUIPE E A COMUNIDADE RIO DE JANEIRO 2007 2 ANDRÉA DOS SANTOS CARDOSO COMUNICAÇÃO NO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA: O AGENTE DE SAÚDE COMO ELO INTEGRADOR ENTRE A EQUIPE E A COMUNIDADE Dissertação apresentada à Universidade Estácio de Sá, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Saúde da Família. Orientadora Profª Drª Marilene Cabral do Nascimento. RIO DE JANEIRO 2007 3 Aos profissionais que atuam no Programa Saúde da Família e acreditam na proposta de se oferecer um atendimento mais humanizado em saúde. Obrigada pelas suas contribuições, sem as quais seria impossível a realização deste trabalho. Especialmente aos ACS por disponibilizarem horas de suas atividades com a pesquisa e acreditarem na contribuição da proposta de se repensar suas práticas cotidianas no PSF. 4 AGRADECIMENTOS A Deus por me dar força e coragem a cada dia que se passa. A todos os integrantes das equipes de saúde da família, que se disponibilizaram a participar deste estudo, acreditando estar contribuindo com reflexões sobre as formas de atuação em suas práticas profissionais. Ao meu esposo Erinaldo, que com todo carinho e paciência ajudou-me neste percurso. Ao meu filhote João Victor pela paciência, nos momentos em que não pudemos brincar e muitas vezes pelos momentos de tensão que eu me encontrava. À minha família pelo estímulo oferecido durante minha caminhada. Às meninas super-poderosas: Nádia Maria, Nádia Gruezo, Simone, Nina, que sempre estiveram presente oferecendo todo apoio e companheirismo, jamais esquecerei nossos momentos de desesperos e vitórias. Àquela que se foi, mas deixou fortes recordações, inclusive quanto ao meu interesse em pesquisar este assunto: In memória Genilce Souza Carvalho, companheira de trabalho, que onde estiver estará torcendo por este trabalho. À professora Drª Marilene Cabral por acreditar em nosso potencial e agir como figura materna ao permitir que o filho explore novas experiências, sem, portanto, deixar de acompanhá-lo com os olhos e corrigindo-o quando necessário. À professora Drª Inesita Araújo, pela sua valiosa contribuição na qualificação e desenvolvimento desta pesquisa. À professora Drª Valéria Romano pela sua disponibilidade e compartilhamento de saber indispensáveis a finalização deste trabalho. À Coordenação de Área Programática – CAP 3.1 pelo acolhimento que nos foi oferecido e disponibilidades de fontes de consultas. À minha companheira de pesquisa: Solange, que soube escutar a todos os momentos de extrema dificuldade, inclusive durante a pesquisa de campo. Aos agentes comunitários com quem sempre trabalhei, sem os quais seria impossível o interesse por este assunto. A todos que estiveram ao meu lado, e que direta ou indiretamente contribuíram na construção deste trabalho. 5 RESUMO Este estudo é parte do projeto “Avaliação da Estratégia da Saúde da Família em dois Municípios da Área Metropolitana do Rio de Janeiro”, da Universidade Estácio de Sá, com financiamento do CNPq. Buscou identificar e analisar a percepção dos agentes comunitários de saúde (ACS) quanto aos seus principais interlocutores, o grau de impacto destes interlocutores no desenvolvimento do seu trabalho em saúde, e as formas de comunicação estabelecidas com os demais profissionais da equipe de saúde e com a comunidade. Trata-se de um estudo descritivo, de abordagem qualitativa, com base nas categorias teóricometodológicas da educação popular em saúde, construção compartilhada do conhecimento e mercado simbólico. A coleta de dados foi desenvolvida junto a quatro equipes de saúde, de duas unidades do Programa Saúde da Família, no Município do Rio de Janeiro. Os resultados mostram os mapas de comunicação das equipes de saúde, elaborados juntamente com os ACS, que identificam o Grupo de Apoio Técnico, a equipe técnica, os próprios ACS e os moradores antigos da comunidade como seus principais interlocutores. Os ACS percebem a comunicação com os demais profissionais da equipe de forma verticalizada, com traços de autoritarismo. Ao mesmo tempo, atribuem pouca influência da comunidade no desenvolvimento de suas ações no PSF. Destacamos a importância de se ampliar o espaço de diálogo e negociação na comunicação estabelecida no interior da equipe de saúde, como exercício de efetiva participação nas decisões a serem implementadas. Sem este exercício interno, dificilmente a equipe e os ACS poderão estendê-lo à comunicação com seus interlocutores na comunidade, fragilizando desta forma a participação popular no PSF. Palavras-Chave: Agente Comunitário de Saúde. Programa Saúde da Família. Comunicação em Saúde e Participação Popular. 6 ABSTRACT This study is part of the project Evaluation of the Family Health Strategy in two municipalities in Rio de Janeiro metropolitan area, carried out at Universidade Estácio de Sá, supported by CNPq. It tried to identify and to analyze the perception of health community agents (ACS) on their main speakers, the impact degree of these speakers in the development of health work, and the communication established with other professionals from the health staff and with community. It is a descriptive study, of qualitative approach, based on theoretical-methodological categories of popular health education, a joint construction of knowledge and symbolic market. Data collection was carried out in four health staffs from two Family Health Program units, in Rio de Janeiro municipality. Results show the communication maps of the health staffs, prepared along with the ACS, who identified the Technical Support Group, the technical staff, the ACS themselves and people living in the community for a long time, as their main speakers. The ACS regarded communication with the other staff members in a verticalized manner, with hints of authoritarianism. At the same time, they pointed to the little influence of community in the development of health action. We highlight the importance of expanding dialogue and negotiation in the communication within the health staff, as an exercise of effective participation in the decisions to be implemented. Without this internal exercise, the staff and the ACS will hardly expand it to the communication with their speakers in the community, and so popular participation will be frail in the Family Health Program. Keywords: Health community agent. Family Health Program. Health communication and popular participation. 7 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Mapa do município do janeiro identificando a localização da CAP 3/1..... 72 Figura 2 - Um caminho de esperança........................................................................... 102 Figura 3 - ACS acompanhados pelas equipes do PSF.................................................. 103 Figura 4 - Esperança para a comunidade...................................................................... 104 Figura 5 - O trabalho com grandes conquistas e realizações........................................ 105 Figura 6 - Momento de alegria..................................................................................... Figura 7 - Mapa do mercado simbólico sobre o tema saúde, de duas equipes (A e B) do Programa Saúde da Família, no município do Rio de janeiro – 2006..... 110 Figura 8 - Mapa do mercado simbólico sobre o tema saúde, de duas equipes (C e D) do Programa Saúde da Família, no município do Rio de janeiro – 2006.... 116 105 8 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Total de equipes de PSF e ACS distribuídos em municípios brasileiros e a cobertura populacional............................................................................ 32 Quadro 2 - Síntese da metodologia e das fases da pesquisa........................................ 65 Quadro 3 - Distribuição das equipes do PSF na Área Programática – AP 3.1, endereços e total de agentes por equipes................................................... 73 Quadro 4 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe A 83 Quadro 5 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe B 84 Quadro 6 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe C 86 Quadro 7 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe D 87 Quadro 8 - Identificação dos agentes quanto a idade, sexo, escolaridade, religião e atividade profissional anterior ao PSF....................................................... 89 - Informações sobre o tempo de moradia na comunidade, tempo de trabalho no PACS/PSF, tempo de trabalho na equipe atual, número de famílias acompanhadas e uma palavra que representa seu trabalho.......... 91 - Principais ações desenvolvidas nas visitas domiciliares realizadas pelos ACS e pelos ACS junto com outros profissionais da equipe .................... 98 Quadro 9 Quadro 10 9 LISTA DE SIGLAS ACD – Auxiliar de Consultório Dentário ACS - Agente Comunitário de Saúde AP - Área de Planejamento CAP - Coordenação de Área Programática CEDAPS - Centro de Promoção da Saúde CEMASI - Centro Municipal de Assistência Social Integrada CIEZO - Conselho das Instituições de Ensino Superior da Zona Oeste CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas CNS – Conselho Nacional de Saúde CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COMLURB - Companhia Municipal de Limpeza Urbana DAB - Departamento da Atenção Básica DEGES - Departamento de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde EQSF – Equipe Saúde da Família FAFERJ - Federação das Favelas do Estado do Rio de Janeiro FUNASA - Fundação Nacional de Saúde FUNLAR - Fundação do Lar de São Francisco IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDH - Índice de Desenvolvimento Humano IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. MS - Ministério da Saúde MSF - Médicos Sem Fronteiras OMS - Organização Mundial de Saúde ONG’s - Organizações Não Governamentais OPAS - Organização Pan-Americana da Saúde 10 PACS - Programa de Agentes Comunitários de Saúde PAS - Programa de Agentes de Saúde PMRJ - Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro POUSO - Posto de Orientação Urbanística e Social PSF - Programa Saúde da Família SESC - Serviço Social do Comércio SGETS - Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde SIAB - Sistema de Informações da Atenção Básica SMS - Secretaria Municipal de Saúde SUS - Sistema Único de Saúde TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido THD - Técnico de Higiene Dental UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância USF - Unidade de Saúde da Família VD - Visita Domiciliar 11 SUMÁRIO 1 1.1 16 1.2 1.3 INTRODUÇÃO.................................................................................................. O Agente de Saúde como elo integrador entre a equipe do programa de Saúde da Família e a Comunidade................................................................................. A Qualificação Profissional dos Agentes Comunitários de Saúde...................... Contratação do Agente Comunitário de Saúde.................................................... 2 2.1 2.2 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO...................................................................... Objetivo Geral...................................................................................................... Objetivos Específicos.......................................................................................... 27 30 30 3 3.1 TRABALHO EM EQUIPE NO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA....... O Agente Comunitário de Saúde: entre o ser e o fazer........................................ 31 38 4 4.1 EDUCAÇÃO EM SAÚDE E CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DO CONHECIMENTO........................................................................................... Comunicação em Saúde e o Mercado Simbólico................................................ 42 47 5 5.1 5.2 5.3 5.4 METODOLOGIA.............................................................................................. Opções Teórico-metodológicas........................................................................... Percurso Metodológico........................................................................................ O Processo de Construção dos Mapas de Comunicação..................................... Entrevistas Individuais – última fase da coleta dos dados................................... 53 53 56 65 69 6 6.1 6.2 6.3 6.3.1 6.4 6.4.1 CONTEXTO LOCAL....................................................................................... A Área de Planejamento 3.1................................................................................ Características do Sistema de Saúde da Ap. 3.1.................................................. A Implantação do PSF nas Comunidades Sereno, Paz e Fé................................ Comunidade da Fé: história, características geográficas e ambientais................ A Implantação do PSF na Comunidade do Alemão............................................ História da Comunidade do Alemão.................................................................... 70 70 74 76 77 79 80 7 7.1 7.1.1 7.1.2 7.1.3 7.1.4 7.2 7.3 7.4 7.5 7.6 7.6.1 7.6.2 RESULTADOS.................................................................................................. Atividades básicas diárias das equipes do Programa Saúde da Família – PSF... Comunidade adscrita à equipe A......................................................................... Comunidade adscrita à equipe B......................................................................... Comunidade adscrita à equipe C......................................................................... Comunidade adscrita à equipe D......................................................................... Perfil sócio-demográfico dos ACS que participaram da pesquisa....................... O ACS como representante da comunidade de atuação...................................... A observação do processo de trabalho dos ACS................................................. Representação realizada através dos desenhos.................................................... Os principais interlocutores apontados nos mapas de comunicação................... Os principais núcleos das Equipes - A e B......................................................... Os interlocutores com maior impacto no trabalho em saúde dos ACS das equipes A e B...................................................................................................... Os principais núcleos das equipes C e D............................................................. 82 82 83 84 85 87 89 93 94 101 106 106 Os interlocutores com maior impacto no trabalho em saúde dos ACS das equipes C e D....................................................................................................... 114 7.6.3 7.6.4 16 20 25 111 112 12 7.7 7.8 7.8.1 7.8.1.1 7.8.1.2 7.8.2 7.8.3 7.8.4 O ACS e a divisão de trabalho entre o saber científico e o saber popular........... As vozes dos ACS na AP 3.1............................................................................... O Grupo de Apoio Técnico – GAT..................................................................... GAT Como representação de poder..................................................................... O Grupo de Apoio Técnico como intermediador de conflitos nas equipes......... Relações estabelecidas na equipe técnica............................................................ O ACS como amplificador de “vozes” da comunidade e dos serviços de saúde A participação dos vários interlocutores da comunidade no trabalho do ACS... 117 119 120 120 122 123 131 142 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 147 REFERÊNCIAS................................................................................................. 153 APÊNDICE A - Termo de Consentimento......................................................... 161 APÊNDICE B – Roteiro de encontros dos grupos focais.................................. 162 APÊNDICE C – Entrevista individual semi-estruturada................................... 163 ANEXO A – Portaria nº 1886/GM de 18 dez 1997............................................ 164 ANEXO B – Mapa do índice de desenvolvimento humano - 3.1....................... 165 ANEXO C – Mapa de divisão do subsistema de saúde – AP 3.1....................... 166 ANEXO D – Ficha de cadastramento das famílias............................................. 167 ANEXO E – Lei nº 10.507, de 10 de Julho de 2002........................................... 169 ANEXO F - Ficha de relatório SSA2 - Sistema de Informação de Atenção Básica............................................................................................. 171 ANEXO G - Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa....................................... 173 13 APRESENTAÇÃO As escolhas que me direcionaram a estudar este tema partiram de minhas experiências enquanto enfermeira supervisora do PACS e PSF, tendo o privilégio de participar do processo de implantação da Estratégia Saúde da Família em municípios do interior do Estado do Amazonas no ano de 1997. Posteriormente, vindo residir na cidade do Rio de Janeiro, fui selecionada a trabalhar novamente no PACS, que encontrava-se na época em fase de implantação no município. Assim, minhas experiências se enriqueceram com novas realidades e convivências no trabalho em equipe no PSF. Durante estes dez anos de prática, algumas questões vivenciadas no dia-a-dia de intenso trabalho no PSF me provocavam inquietações e até mesmo grandes surpresas com relação ao trabalho desempenhado pelo ACS. As oportunidades me permitiram presenciar diversas posições assumidas pelos agentes comunitários, formas de participação e integração com os demais integrantes da equipe do PSF, bem como diferentes percepções da equipe (médicos, enfermeiros, dentistas, técnico de higiene dental e auxiliar de enfermagem) frente às atividades desenvolvidas pelos ACS. Ainda recordo de algumas definições atribuídas aos agentes tais como: ele é um facilitador do serviço, elo de integração e por outros é definido como vítima, “coitadinho”, arranjador de confusões e complicador dos serviços de saúde. A responsabilidade e importância atribuídas ao papel do ACS na equipe e comunidade justificam a necessidade de avaliar as diversas formas de relações de comunicação estabelecidas internamente com as diversas categorias profissionais no PSF e suas repercussões nas vivências com a comunidade. A oportunidade de ingressar no Mestrado Profissional em Saúde da Família representou uma possibilidade de aprofundar minhas experiências, trazendo para o espaço acadêmico as ricas vivências dos ACS, procurando identificar seus principais interlocutores, 14 bem como suas percepções quanto ao processo de comunicação e relações estabelecidas entre eles e o ACS, e deste com os demais membros da equipe do PSF. Este estudo é parte integrante de um projeto realizado pela Universidade Estácio de Sá: “Avaliação da Estratégia da Saúde da Família em dois Municípios da Área Metropolitana do Rio de Janeiro” no qual contamos com a participação de vários profissionais, justificando a utilização do pronome na primeira pessoa do plural. O desenvolvimento desta pesquisa é constituído de sete capítulos: 1- Procuramos abordar o contexto histórico de surgimento do ACS, sua qualificação profissional e forma de contratação. 2- O segundo capítulo, trata-se das justificativas do estudo e os objetivos propostos. 3- Discorre sobre o trabalho em equipe no PSF e o agente comunitário frente às atividades técnicas representadas pelos serviços de saúde e as realidades expostas através da comunidade. 4- Refere-se à Educação em Saúde e Construção Compartilhada do Conhecimento, constando de um breve histórico das práticas de comunicação e sobre o conceito de Mercado Simbólico, desenvolvido por Araújo (2003) ao propor uma explicação da prática comunicativa nos processos de intervenção social. 5- Descrevemos a metodologia e sua trajetória, utilizando as estratégias teórico-metodológicas da Educação Popular em Saúde, Construção Compartilhada do Conhecimento e Mercado Simbólico. 6- Contexto local, com apresentação da AP 3.1, síntese do processo de implantação do PSF nas comunidades estudadas e a história do surgimento destas comunidades. 7- Apresentação do processo de construção dos mapas pelos ACS, pelo qual procuramos identificar os interlocutores presentes em seu cotidiano de trabalho, como também as diversas formas de comunicações estabelecidas entre eles e os ACS. Após esta fase de construção dos mapas optamos por selecionar os principais interlocutores apontados pelos próprios ACS, que possibilitaram aprofundar a discussão. Os seguintes sub-temas são contemplados: 15 - O Grupo de Apoio Técnico (GAT): Como representação de poder e como intermediador de conflitos nas equipes. - Relações estabelecidas na equipe técnica. - O ACS como amplificador de “vozes” da comunidade e dos serviços de saúde. - A participação dos vários interlocutores da comunidade no trabalho do ACS. Mencionamos algumas considerações finais sobre o estudo, procurando relacionar o processo de comunicação estabelecido com a equipe e suas repercussões na comunidade. 16 1 INTRODUÇÃO 1.1 O Agente de Saúde como elo integrador entre a equipe do programa de Saúde da Família e a Comunidade As mudanças ocorridas no campo da saúde, particularmente na segunda metade da década de oitenta, conferiram ao desenho institucional dos serviços de saúde forte caráter inovador, conformando o Sistema Único de Saúde – SUS (CORDEIRO, 2005). Em 03 de outubro de 1988, com a promulgação da nova Constituição Federal, foi instituído o Sistema Único de Saúde - SUS, tendo sua regulamentação através das leis 8080/90 e 8142/90. Segundo a Constituição Federal, em seu artigo 196 do capítulo II. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988, p. 295). Entretanto, essas mudanças mostraram-se insuficientes para alterar qualitativamente as ações de saúde, tornando-se necessário buscar novos saberes e práticas voltados a viabilizar a implementação do SUS e a contribuir para sua efetividade. Nesse sentido, a construção de novas estratégias assistenciais veio assumir cada vez maior relevância. No Brasil, o relatório da VIII Conferência Nacional de Saúde considerou que deveriam ser incluídos na política de trabalho, na área de saúde, profissionais denominados “agentes populares de saúde”, para trabalhar com cuidados primários e educação em saúde. (SILVA, VIANA e NOGUEIRA, 1986). Como uma das formas de colocar essa proposta em prática, surgiu o primeiro Programa de Agentes de Saúde (PAS), no Ceará, incluído no Plano do Governo Estadual, apresentado em março de 1987 (MINAYO; D'ELIA e SVITONE, 1990). 17 A autora relata que ocorreu naquela época uma grande seca em amplas áreas do Estado, bem como em todo o nordeste brasileiro; diante disto, viu-se a possibilidade de envolver, em um período de curto prazo, milhares de moradores daquelas áreas em atividades de promoção da saúde, com remuneração garantida pelo nível federal. Seria um trabalho temporário, mas que de alguma forma deixaria marcas, e a população de uma grande parte do interior do Estado poderia sentir efeitos positivos desta ação. O Programa era também uma estratégia frente às dificuldades em fixar profissionais da saúde em locais de difícil acesso, carentes de recursos sociais e econômicos. O agente de saúde, de acordo com Silva (1997), representou, naquele momento, além de uma forma de provimento de renda em um quadro emergencial de seca, uma via alternativa de dar respostas às demandas das famílias não providas pelo Estado. Essa alternativa baseavase na valorização da solidariedade de pessoas que possuíam um saber aprendido na sua vivência do dia-a-dia e na convivência com pessoas mais velhas. Eram as chamadas parteiras, erveiros, curandeiros, rezadores, missionários, freiras e pastores de igrejas. Como fruto desse trabalho, os Agentes de Saúde do Ceará foram reconhecidos como os principais colaboradores na queda da mortalidade infantil no período de 1991-1995 no Estado do Ceará, o que valeu ao PAS um prêmio do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF, no ano de 1993 (SILVA & RODRIGUES, 2000). Baseado nesta experiência do Estado do Ceará, o Ministério da Saúde instituiu, em 1991, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS, em vários estados brasileiros. Em março de 1994, foi implantado o Programa Saúde da Família - PSF, como forma de resguardar e oferecer maior capacidade resolutiva ao trabalho dos Agentes de Saúde. Em documento do Ministério da Saúde o PSF foi apresentado como um instrumento de reorganização do SUS e da municipalização, a ser implantado prioritariamente em áreas de riscos, selecionadas com base no mapa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (BRASIL, 1994b). 18 O Programa Saúde da Família surge assim como uma estratégia de orientar a reorganização da atenção básica, efetivando os princípios previstos no Sistema Único de Saúde – SUS, de universalidade, descentralização, integralidade, equidade e participação da comunidade. Partindo dos problemas de saúde encontrados com o conhecimento da realidade vivida pelos moradores, o PSF visa alcançar as famílias em seus territórios de residência, buscando a melhoria da qualidade da atenção básica em saúde e orientando quanto ao referenciamento dos usuários para serviços de maior complexidade. Ao reforçar a participação da comunidade e o vínculo de responsabilidade entre os serviços de saúde e a população, o PSF tem sido apontado como uma estratégia de avanço na história recente de saúde pública no Brasil (CORDEIRO, 2005). No contexto desta proposta, o Agente Comunitário de Saúde - ACS é considerado um profissional fundamental para o melhor desenvolvimento da assistência, sendo ele o principal elo de ligação entre a Unidade de Saúde da Família e a comunidade, por ser morador e estar em contato permanente com as famílias visa a facilitar o trabalho de vigilância e promoção da saúde realizada por toda a equipe. Segundo Nunes et al (2002), dentre as atribuições dos ACS preconizadas pelo Ministério da Saúde - MS, duas merecem atenção especial: a primeira afirma que os ACS devem orientar as famílias para a utilização adequada dos serviços de saúde, enquanto a segunda destaca que eles devem informar aos demais membros da equipe de saúde sobre a dinâmica social da comunidade, suas disponibilidades e necessidades. Silva & Rodrigues (2000, p. 22) também enfatizam essas atribuições: O Agente de Saúde tem um papel fundamental. É ele quem está no cotidiano dos lares, quem vivência os problemas específicos de saúde e os sociais. É ele quem presencia a miséria humana em sua face mais cruel: a do abandono na doença, da falta de acesso aos serviços, da fome que mata ou debilita lentamente as pessoas. Mas também é ele quem tem o privilégio de chegar primeiro aos dados, de ver as mudanças que ocorrem pela intervenção das ações voltadas à obtenção da saúde, diretas ou não. Silva & Dalmaso (2002) comentam que na recuperação histórica da constituição do ACS, enquanto sujeito de viabilização de uma política de saúde, cabem duas considerações de 19 ordem bem geral: a expectativa de impacto de suas ações e a sua relação com a comunidade de onde se originou. Os agentes de saúde ganham a cada dia o reconhecimento por parte de políticos, instituições de saúde e comunidade. Essa conquista se dá ao longo de aproximadamente 19 anos de intenso trabalho, merecendo de fato uma atenção mais direcionada. Apresentam grandes possibilidades de contribuir para a reorientação do sistema de saúde, facilitando o processo de humanização do atendimento e favorecendo a participação da comunidade, com maior autonomia e liberdade de expressão. Esses novos sujeitos dos serviços da atenção básica de saúde são por vezes considerados, por políticos e representantes das comunidades, “anjos de casa”,1 ficando sob sua responsabilidade algumas ações que envolvem outros setores da administração pública. Cabe aos agentes comunitários de saúde, entre outras atividades, a apresentação casa a casa da estratégia saúde da família, abrir caminhos para os demais membros da equipe e sensibilizar a comunidade para uma ação mais democrática. A posição do ACS no atual sistema de saúde, segundo o Ministério, compreende as seguintes atribuições (BRASIL, 1991): - Cadastrar as famílias de sua área de abrangência; - Diagnosticar as condições de saúde e moradia; - Atualizar mensalmente o Sistema de Informações da Atenção Básica - SIAB; - Realizar mapeamento de sua microárea; - Identificar as situações de risco em sua microárea; - Realizar visitas domiciliares pelo menos 01 (uma) vez ao mês a todas as famílias acompanhadas; - Atuar nas áreas de educação, identificando crianças fora da escola; - Estimular a mobilização da comunidade no sentido de controlar e participar dos serviços de saúde. _______________ 1. Expressão verbal proferida pelo Senador Leonel Pavan, em pronunciamento no Senado Federal em 10/02/2006, exibido pela TV Senado. 20 1.2 A Qualificação Profissional dos Agentes Comunitários de Saúde O Ministério da Saúde reconhece o PACS como uma estratégia imprescindível no processo de aprimoramento e consolidação do SUS, a partir da reorientação da assistência ambulatorial e domiciliar. Esta estratégia foi aprovada através da portaria nº 1886/GM de 18/12/1997 (BRASIL, 2006), que trata das Normas e Diretrizes do PACS (Anexo A). Entre as prerrogativas de responsabilidades do município está a de “garantir as condições necessárias para o processo de capacitação e educação permanente do ACS”, sob a responsabilidade do instrutor-supervisor com a participação e colaboração de outros profissionais do serviço local de saúde. Ainda de acordo com as diretrizes operacionais do PACS, o ACS deve ser capacitado para prestar assistência a todos os membros das famílias acompanhadas, de acordo com as suas atribuições e competências. Diante do perfil de atuação do ACS, o Ministério da Saúde enfatiza que sejam selecionadas formas mais abrangentes e organizadas de aprendizagem, propondo que os programas de capacitação direcionados a esses profissionais, se voltem para uma ação educativa crítica, de forma a assegurar o domínio de conhecimentos e habilidades específicas necessárias para o desempenho de suas funções (SILVA & DALMASO, 2002). Nunes et al (2002) comentam que o treinamento dos agentes comunitários de saúde deve muni-los de conhecimentos diversos em torno do eixo saúde-doença-cura, incorporando, além de questões biomédicas, outros saberes que os habilitem nesse processo de interação cotidiana com as famílias e no reconhecimento de suas necessidades. A qualificação que os agentes comunitários recebem para sua inserção no PSF é compatível ao nível básico da educação. De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2002), essa qualificação inicial é parte do processo de formação do ACS, sendo constituída de três unidades temáticas, com carga horária total de 80 horas. Seu propósito é situar os novos profissionais ACS nos princípios que direcionam a proposta de trabalho da estratégia de saúde 21 da família, como eixo norteador da promoção à saúde; traçar as diretrizes para o diagnóstico local de sua área de abrangência, bem como colocar questões relacionadas ao trabalho em equipe. Frente à amplitude das propostas de intervenção do PSF, torna-se imperativo a reorganização da atenção à saúde na busca de respostas mais adequadas às necessidades de saúde da população. O que requer o investimento em profissionais capazes de trabalhar com as diversidades, desenvolvendo uma relação participativa, contextualizada na família e na comunidade. A formação do ACS é um processo gradual e permanente que se desenvolve a partir das necessidades apresentadas em seu cotidiano, de acordo com sua realidade de trabalho. A responsável na equipe do PSF por essa capacitação é a enfermeira supervisora, a quem cabe acompanhar o cotidiano das atividades realizadas pelos ACS, bem como reconduzi-las quando necessário. Porém, pode também ser exercida por outro profissional de nível universitário. Com a implantação dos Pólos de Formação, Capacitação e Educação Permanente para Pessoal da Saúde da Família, através da parceria entre instituições formadoras de trabalhadores para a área da saúde e os gestores do SUS, profissionais de diversos níveis de escolaridade passaram a ter oportunidade de se capacitar, levando-se em consideração o quadro epidemiológico da realidade local de sua atuação (OLIVEIRA et al, 1999). A lei 10.507, de 10 de julho de 2002 (Anexo E), que regulamentou a criação da profissão do ACS, estabeleceu como requisito para o exercício da profissão, a conclusão do ensino fundamental e do curso de “qualificação básica”. Ao lado disto, dispôs sobre outros aspectos afins: a residência na mesma área da comunidade de atuação do ACS, o exercício profissional exclusivamente no âmbito do SUS, assim como sobre seu papel de mediador social, enquanto um trabalhador da saúde com interface na assistência social, educação e meio ambiente (BRASIL, 2004). 22 Surge assim, um profissional com uma interface intersetorial no campo da ação social e da saúde, com prestação de serviço exclusivo ao SUS, sob supervisão do gestor local em saúde (BRASIL, 2003). Os ACS são os únicos profissionais dos serviços de saúde que devem obrigatoriamente residir na comunidade de atuação há pelo menos dois anos, como forma de facilitar o diagnóstico local através do conhecimento da realidade vivenciada por cada comunidade (BRASIL, 1994a). Atualmente, alguns municípios já estão oferecendo, além da qualificação básica, um curso técnico para os agentes comunitários de saúde. Sua elaboração é pautada na metodologia de formação, onde cada módulo deve apresentar expressão concreta na dimensão do processo de trabalho do agente de saúde, contextualizando-o em sua prática cotidiana. As discussões que levaram à elaboração do curso técnico de agente comunitário de saúde envolveram consultores externos, técnicos do Ministério da Saúde (Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde - SGETS, do Departamento da Atenção Básica – DAB) e da Escola Politécnica da Fundação Oswaldo Cruz (BRASIL, 2004). O Departamento de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde - DEGES definiu que este processo deverá ser assumido de preferência pelas Escolas Técnicas do SUS, pactuando a formação nos Pólos de Educação Permanente (BRASIL, 2004). Lavor (2004) comenta que o curso técnico para agentes de saúde terá carga horária mínima de 1.200 horas. Os agentes deverão passar pela etapa formativa I, inicial, onde entrarão todos aqueles já inseridos no Sistema Único de Saúde, independente da escolarização. As etapas subseqüentes II e III serão oferecidas apenas aos que concluírem a primeira etapa e apresentem o ensino médio completo. O Ministério da Saúde orienta para a valorização da formação dos trabalhadores como um dos componentes de aprimoramento da força de trabalho, de forma a contribuir para a efetivação da política nacional de saúde, caracterizando a necessidade de elevação da 23 escolaridade e dos perfis de desempenho profissional, favorecendo a autonomia intelectual dos trabalhadores, com maior domínio de conhecimento técnico-científico (BRASIL, 2004). Diante do desafio de preparação de profissionais adequados às necessidades do SUS, impõem-se dentre outras, profundas mudanças na formação destes profissionais, a busca de alternativas que propiciem a construção de programas de ensino que favoreçam o ajustamento às novas propostas de atenção à saúde no país, considerando a incorporação do conceito de competência profissional baseada na articulação entre educação e trabalho (BRASIL, 2003). Apesar da ampliação dos mecanismos voltados a oferecer uma qualificação adequada à categoria profissional do ACS, ainda existe muito a fazer no sentido de consolidar o seu papel no atual sistema de saúde. Enquanto isso, muitos deles buscam uma outra qualificação, como o curso de auxiliar de enfermagem. De acordo com o Ministério da Saúde, as competências do ACS são apresentadas da seguinte maneira: Compete ao ACS, no exercício de sua prática, a capacidade de mobilizar e articular conhecimentos, habilidades, atitudes e valores requeridos pelas situações de trabalho, realizando ações de apoio em orientação, acompanhamento e educação popular em saúde a partir da concepção de saúde como promoção da qualidade de vida e desenvolvimento da autonomia diante da própria saúde, interagindo em equipe de trabalho e com os indivíduos, grupos e coletividades sociais (BRASIL, 2003, p. 13). Partindo desta noção de competência, o ACS deve possuir iniciativa, ter aptidão para desenvolver ações por conta própria; responsabilidade para responder pelas ações; autonomia para pensar, criticar, defender, argumentar, concluir. Desenvolver a capacidade de articular e mobilizar conhecimentos, relacionando-os ao contexto, colocando-os em ação para enfrentar situações do processo de trabalho, como também saber interagir com outros atores, estabelecendo movimentos de solidariedade, compartilhando situações e acontecimentos do trabalho. Enfim, as competências profissionais de um ACS trata da combinação de conhecimentos, habilidades, experiências e qualidades pessoais usadas de forma efetiva e apropriada em resposta às várias circunstâncias. 24 O conceito de competência proposto por Zarifian (1999 apud BRASIL, 2003) está baseado na visão do trabalho como conjunto de acontecimentos, com forte dose de imprevisibilidade e pouca margem de prescrições já estabelecidas, de forma contrária ao que se propõem os estudos clássicos sobre a organização e gestão do trabalho, como o Fordismo e Taylorismo. Tal acepção requer a reconceitualização da qualificação profissional, que deixa de ser a disponibilidade de “um estoque de saberes”, para se transformar em “capacidade de ação diante de acontecimentos”. Atuando como apoio aos indivíduos e coletivos sociais, os ACS devem identificar as situações de risco em saúde, assim como participar da orientação, acompanhamento e educação popular em saúde, estendendo as responsabilidades das equipes locais de saúde, através de ações sobre a prevenção e solução de problemas de saúde, motivando práticas de promoção da vida em coletividade e de desenvolvimento das interações sociais (BRASIL, 2003). Ainda de acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2003), a competência profissional incorpora quatro dimensões do saber: saber-fazer, expressa nas habilidades; saberconhecer, manifestado nos conhecimentos; saber-ser, através das atitudes; e o saber conviver, que se apresenta no coordenar-se com os outros. A competência baseada no saber-ser para os ACS apresenta-se como tema transversal a todos as outras competências, pois incorpora o interagir com os indivíduos e seu grupo social, com a coletividade; o respeito aos valores culturais e as individualidades, ao pensar e propor suas práticas; com postura ativa, a busca de alternativas frente a situações adversas; o recurso à equipe de trabalho, para conseguir solucionar ou encaminhar problemas identificados; o levar em conta a relevância, ocasião e exatidão das ações e procedimentos que realiza; o sempre colocar-se em equipe de trabalho em prol da organização e eficiência das práticas de saúde, enfim, o pensar criticamente seus direitos e deveres como trabalhador. Deste modo, as competências se expressam pela capacidade de reflexão crítica e mudança ativa em si mesmo e nas suas práticas profissionais (BRASIL, 2003). 25 A Estratégia de Saúde da Família, focalizada na promoção da saúde, tanto em nível individual como coletivo, necessita de profissionais atuantes, que apresentem uma visão integralizada no que diz respeito às condições de saúde e de qualidade de vida. Desta maneira, entendemos que a participação destes profissionais, enquanto sujeitos do processo de trabalho educativo, cresce à medida que os mesmos são capacitados e preparados frente aos problemas apresentados no dia-a-dia e às dúvidas que surgem a partir de suas vivências pessoais. 1.3 Contratação do Agente Comunitário de Saúde O financiamento do PACS/PSF é feito parcialmente pelo Ministério da Saúde, de maneira descentralizada e com plena execução por parte do município. Cabe a este a responsabilidade no que diz respeito aos vínculos empregatícios das diversas categorias profissionais, devendo ser respeitadas as diferenças e peculiaridades de cada local (CHAGAS; LOPES; TORRES, 2002). Ainda de acordo com os autores citados acima, a contratação de médicos, enfermeiros, dentistas e auxiliares de enfermagem, cujas profissões encontram-se formalmente reconhecidas com mecanismos de regulação definidos em um arcabouço jurídico, tende a ser feita através de concurso público, em cargos efetivos (regime estatutário) ou empregos públicos (regime celetista). A contratação do ACS para o PSF segue as normas e diretrizes do PACS do Ministério da Saúde (1994b). Como forma de se manter o vínculo estabelecido com a comunidade há pelo menos 2 anos, a modalidade de sua contratação é diferente de outros profissionais, sendo diversificada entre os vários estados brasileiros. No município do Rio de Janeiro, a contratação é realizada através de processo seletivo, estabelecendo vínculo empregatício conforme a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), através de parcerias da SMS com Organizações Não Governamentais-ONG’s, 26 CEDAPS (Centro de Promoção da Saúde) e CIEZO (Conselho das Instituições de Ensino Superior da Zona Oeste). Os requisitos necessários para ser agente comunitário de saúde são: - Idade mínima de dezoito anos na data de inscrição; - Ser morador da comunidade onde irá exercer suas atividades, comprovada através de declaração da Presidência da Associação de Moradores de sua comunidade; - Ter concluído o ensino fundamental; - Disponibilidade para exercer suas atividades em 40 horas semanais, 2ª a 6ª feira, oito horas diárias, nos turnos manhã e tarde; - Apresentar conhecimentos das atribuições do agente: conforme Lei nº 10.507, de 10 de julho de 2002; - Ter concluído com aproveitamento o curso de qualificação básica para a formação de Agente Comunitário de Saúde, ministrado após contratação; - Estar em dia com as obrigações eleitorais e, se do sexo masculino, também com as obrigações militares. 27 2 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO Com o avanço do SUS, surge a proposta de mudança do modelo assistencial de saúde. Esta veio a ser reforçada com a implantação de novos programas, tais como o PACS e o PSF. Atualmente, estes programas são parte da estratégia de consolidação do SUS, no contexto da municipalização e da descentralização das ações de atenção primária à saúde no Brasil. Silva et al (2005) nos remetem à questão de que o processo de operacionalização do PSF deve se adequar às diferentes realidades locais. Ao lado disto, ser capaz de oferecer assistência humanizada, baseada no vínculo de compromisso e de co-responsabilidade entre a equipe de saúde da família e a comunidade. Desta forma, a saúde da família, traçada inicialmente como um programa, passa a ser considerada pelo Ministério da Saúde como uma estratégia, que visa reverter o modelo curativista, hospitalocêntrico e reducionista, para outro que contribua com uma nova dinâmica dos serviços e ações de saúde. Essa nova proposta de assistência à saúde considera o processo saúde-doença-cura socialmente definido. Por isto, atribui prioridade a um amplo modelo de saúde que considere o indivíduo como um todo, reconhecendo-o enquanto residente de um território vivo, mutável e que sofre influência do meio político, econômico, cultural e epidemiológico (MENDES, 1999). A partir dessa nova proposta, o agente comunitário tem como função integrar a comunidade aos serviços de saúde e vice-versa, devendo atuar como facilitador da comunicação que se estabelece nesse processo. Acredita-se que o agente comunitário representa para o sistema de saúde vigente um elemento com grande potencial de contribuição na reorganização dos serviços de saúde. O mesmo autor afirma o papel mediador desempenhado pelo ACS, através da tradução de símbolos culturais, seja de práticas e saberes populares, seja de conhecimentos 28 técnico-científicos, utilizando o conhecimento biomédico com o propósito de informar e esclarecer, partindo da escuta das famílias acompanhadas. O agente de saúde favorece a legitimidade dos serviços de saúde na comunidade e facilita a confiança e o acesso da comunidade aos profissionais de saúde ali presentes. Essa atribuição de tradução simbólica ao ACS pode abrir possíveis canais de comunicação, porém não garante necessariamente a escuta, o diálogo, o respeito pela subjetividade e a ampliação da interação entre a equipe de saúde e a comunidade. Deve-se considerar o contexto de poder em que essa comunicação se instala, que em grande parte desqualifica o saber popular do qual o agente é considerado representante. Discutir o papel do ACS enquanto elo integrador entre a equipe de saúde e a comunidade nos remete de fato a uma nova visão de trabalho, superando o que por vezes ocasiona uma ação contrária à desejada, tal como a baixa adesão dos usuários e a descrença nos serviços de saúde. O intuito de pesquisar o trabalho do ACS na realidade local das unidades do Programa de Saúde da Família reveste-se da necessidade de compreendermos melhor as relações estabelecidas em suas vivências e práticas sociais de trabalho. O agir em saúde é uma prática constitutiva da sociedade e uma ação social que extrapola os limites técnicos e reinterpreta a ciência, tornando-se visível pelo trabalho humano em saúde (SCHRAIBER, 1996). Neste contexto, são priorizadas as questões das ações humanas e das interações sociais, considerando a dimensão social que cada comunidade enfrenta de forma específica. Espera-se então que o agente de saúde seja capaz de proporcionar mudanças tanto no que se refere à reorganização do trabalho em equipe, sustentadas numa ação mais dialógica e menos hierarquizada, como também na estimulação de uma ação mais reflexiva, de transformação baseada na autonomia e liberdade de expressão. Ao lado disto, busca-se incentivar a participação da comunidade e facilitar a expressão de seus próprios anseios. Partindo desses pressupostos, entendemos que é fundamental o estudo dessa nova categoria profissional, buscando-se informações sobre sua própria percepção quanto às formas 29 de comunicação que ocorrem no cotidiano de suas atividades, envolvendo a Equipe de Saúde da Família - EqSF e a comunidade. Apesar de o ACS ser um profissional relativamente novo no campo da saúde, considera-se que desempenha um papel importante e, por isso mesmo, deve se considerar todo o esforço no sentido de potencializar sua prática. Sua incorporação à equipe, enriquecendo-a com sua linguagem, valores e preocupações tem potencial de favorecer mudanças na qualidade do trabalho educativo-participativo (FEUERWERKER, 1994 apud FAJARDO, 2001). O despertar do interesse pelo desenvolvimento deste estudo, partiu de experiências profissionais dos próprios autores, os quais desenvolvem atividades no PACS e PSF, dividindo o mesmo ambiente de trabalho com os ACS. No decorrer desses anos tivemos o privilégio de vivenciar suas práticas e as diversas formas de interação com outros profissionais de saúde e a comunidade de atuação. Com a proposta de elaboração de um projeto para avaliação no Mestrado em Saúde da Família, tivemos a oportunidade de aprofundar o estudo de algumas inquietações sobre as práticas relativamente novas de cuidados à saúde. Buscamos, assim, elaborar a presente proposta de estudo, a qual é parte integrante da pesquisa: Avaliação da Estratégia da Saúde da Família em dois Municípios da Área Metropolitana do Rio de Janeiro, em desenvolvimento na Universidade Estácio de Sá, com apoio do CNPq. A proposta deste estudo é dar voz aos agentes de saúde quanto às estratégias de comunicação presentes em sua prática na equipe de saúde da família, contribuindo para a sua reflexão, a desconstrução de modelos inadequados diante dos desafios que são lhes apresentados, assim como a identificação de formas de interação mais eficazes entre os serviços de saúde e a população assistida. 30 2.1 Objetivo Geral Identificar a percepção dos ACS quanto às condições de comunicação presentes em seu processo de trabalho no PSF. 2.2 Objetivos Específicos 1 - Conhecer a percepção dos ACS sobre as relações de comunicação que se dão no interior da equipe do PSF, identificando interlocutores e condições de interlocução; 2 - Conhecer a percepção dos ACS sobre as relações de comunicação destes com a comunidade, identificando interlocutores e condições de interlocução; 3 - Analisar, partindo da visão dos ACS, os principais desafios e possibilidades que se estabelecem no processo de comunicação entre estes, a equipe e a comunidade; 4 - Favorecer espaços de reflexão sobre comunicação e saúde junto aos ACS e à equipe do PSF. 31 3 TRABALHO EM EQUIPE NO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA A implementação do SUS tem representado um grande desafio nas atividades realizadas pelas equipes de saúde da família, apresentando experiências diversificadas e significativas nos diferentes contextos sociais, econômicos e culturais de nosso país. A descentralização do processo de decisão e a municipalização da saúde têm permitido uma maior proximidade com os problemas enfrentados pela população, assim como com seus limites e possibilidades. Dessa forma, o SUS, definido através da Constituição Federal em 1988, tem permitido o envolvimento de diferentes atores no desenvolver de seu processo, tendo como resultado o confronto entre aspectos políticos, ideológicos e tecnológicos diversos, antagonistas ou não (MENDES, 1996). Diante dessas relações, um novo modelo assistencial ganha sentido prático, visando garantir respostas mais concretas aos problemas identificados. A proposta de expansão e a qualificação da atenção básica, organizada pela estratégia saúde da família, representam parte do conjunto das prioridades políticas apresentadas pelo MS e aprovadas pelo Conselho Nacional de Saúde. Através deste, propõe-se a superação do modelo hegemônico centrado na doença, pelo desenvolvimento de práticas gerenciais e sanitárias, democráticas e participativas, sob a forma de trabalho em equipe, dirigidas às populações de territórios delimitados, pelos quais assumem compromisso (BRASIL, 2006). O Programa Saúde da Família representa uma proposta de avançar no processo de implementação do SUS, ao prever a definição e atuação em um território de abrangência, adscrição da clientela de atendimento e um processo de continuidade, integralidade e resolutividade no atendimento à saúde, possibilitando maior articulação intersetorial (MENDES, 1996). Uma equipe do Programa Saúde da Família é responsável pelo acompanhamento de 600 a 1000 famílias, não devendo ultrapassar o limite máximo de 4.500 pessoas. É composta basicamente por: 32 01 Médico; 01 Enfermeiro; 01 Auxiliar de enfermagem; 04 a 06 - Agentes Comunitários de Saúde. A partir do ano de 2000, com o ingresso da saúde bucal no PSF, a equipe passou a contar com mais 01- dentista, 01- técnico de higiene dental -THD e 01-auxiliar de consultório dentário - ACD (BRASIL, 2001). O agente comunitário de saúde é responsável pelo acompanhamento de aproximadamente 150 (cento e cinqüenta) famílias, sendo considerado elo de ligação entre a equipe de saúde da família e a comunidade (BRASIL, 2001). O fato de ser um trabalhador escolhido dentre os moradores da área de sua atuação faz do ACS um ator que facilita a relação de troca entre o saber popular e o saber médico-científico e contribui para uma abordagem mais integral e resolutiva. O Ministério da Saúde propõe a implantação de novas equipes de saúde da família (EqSF) em nível nacional, evidenciando com isso um aumento considerável dos ACS vinculados a unidades do PSF, como forma de contribuir para a reorganização do SUS. Existem atualmente, 26.650 EqSF atuando em 5087 municípios brasileiros e 218.121 ACS realizando acompanhando de 46,1% da população desses municípios. O quadro abaixo permite-nos uma avaliação desse quantitativo, relacionado ao mês de setembro de 2006. Quadro 1- Total de equipes de PSF e ACS distribuídos em municípios brasileiros e a cobertura populacional. Total de ESF. Total de ACS Total de municípios % Cobertura populacional 26.650 218.121 5.087 46,1 Fonte: Departamento de Atenção Básica (ano 2006) – MS O trabalho em equipe é considerado no conjunto das características do PSF, como um dos pressupostos mais importantes para a reorganização do processo de trabalho, com maiores 33 possibilidades de atuação congruente com uma abordagem integral e resolutiva (BRASIL, 1997). Esta nova proposta de atendimento à saúde apresenta características estratégicas para efetivar o Sistema Único de Saúde (SUS), apontando possibilidades de adesão e mobilização das forças sociais e políticas em torno de suas diretrizes, permitindo a integração e organização das ações de saúde em território definido. Tem por finalidade o enfrentamento e a resolução dos problemas identificados, através da articulação de saberes e práticas com diferenciados graus de complexidade tecnológica. Permite, desta forma, a integração dos distintos campos do conhecimento e, com isto, o desenvolvimento de habilidades e mudanças de atitudes nos profissionais comprometidos com essa proposta de trabalho (PEDROSA & TELES, 2001). Diante dessa proposta de atuação, cabe à equipe de saúde da família desenvolver ações de promoção à saúde, prevenção de doenças e prestação de cuidados específicos às famílias. Cabe também às equipes a elaboração do diagnóstico da área de atuação, articulação de ações intersetoriais; promoção da mobilização e organização dos moradores e o desenvolvimento de cidadania, aspectos estes que ainda não encontram-se suficientemente incorporados à prática cotidiana das equipes (FORTUNA et al, 2005). Ainda de acordo com as autoras acima, coloca-se para os trabalhadores de saúde o grande desafio do trabalho em equipe, com o desenvolvimento de atividades inovadoras a serem desbravadas, construídas e praticadas, o que torna mais complexas as relações entre os integrantes das equipes (Ibid., p. 263). O fato de os profissionais de diferentes categorias trazerem para as unidades de saúde seus saberes de uma forma estanque contribui para a reprodução do modelo hegemônico do fazer em saúde, isto é, conteúdos e especialidades compartimentalizados que não levam em conta as reais necessidades de saúde da população (VASCONCELOS, 1999a) O desenvolvimento do trabalho realizado pelas equipes no PSF ainda apresenta dificuldades pelo fato de envolver diversos profissionais, com suas especificidades, que 34 precisam trabalhar em conjunto em prol de objetivos comuns. A determinação de realização do trabalho em equipe através de uma construção compartilhada e coletiva, envolvendo os diversos saberes e práticas, ali atuantes, se constitui assim um importante desafio. A consolidação do trabalho em saúde da família requer a construção de um projeto comum e, para tal, as especialidades dos profissionais se complementam. Os agentes devem construir uma ação de interação entre os próprios trabalhadores e entre esses e os usuários (ALMEIDA & MISHIMA, 2001). As propostas das ações desenvolvidas pelas equipes de saúde requerem a ampliação do objeto de intervenção para além do âmbito individual e clínico, isto por sua vez demanda alterações na forma de atuação e organização do trabalho, através de uma alta complexidade de saberes. Cada profissional é solicitado a desempenhar sua profissão em um processo de trabalho coletivo, cujo resultado deve ser fruto da contribuição específica e integrada das diversas áreas profissionais ou os diversos conhecimentos (SILVA & TRAD, 2004). Pinheiro (2001) chama a atenção para a produção de um território comum que surge pela capacidade de profissionais e serviços de saúde interagirem com os usuários, possibilitando o diálogo e a interação entre esses sujeitos no cotidiano das práticas, tanto no que se refere à oferta do cuidado, como à organização da atenção à saúde, sendo considerados os aspectos objetivos e subjetivos presentes. A mesma autora destaca ainda que, por se tratar de diferentes localidades, os sujeitos se relacionam de diversas maneiras, possibilitando múltiplas formas de construção de inúmeros territórios comuns. Pensando na construção de diversos territórios comuns e considerando as especificidades de cada local, através das atividades desenvolvidas pelas equipes de saúde da família, nos remetemos a equipes multiprofissionais que trabalhem interdisciplinaridade (FALK, 1999 apud FAJARDO, 2001). O trabalho desenvolvido no campo da saúde coletiva implica na necessidade de articulação da intersetorialidade, para que se possa abranger as diversidades determinantes do processo saúde-doença-cura, visto que a organização do cuidado em saúde deve se estruturar em torno do conceito de problema e suas implicações nas 35 práticas. Neste sentido, a ação interdisciplinar é considerada de suma importância, necessitando de cooperação e complementariedade dos diversos olhares dessa realidade, de maneira que as discussões e tomadas de decisões devam ser pactuadas, favorecendo a responsabilidade mais compartilhada entre todos os sujeitos envolvidos. Espera-se com isto que os integrantes das equipes sejam capazes de conhecer e analisar o trabalho verificando suas atribuições específicas e do grupo, na unidade, no domicílio e na comunidade, permitindo o compartilhamento de conhecimentos e informações (BRASIL, 2001). Coloca-se assim um grande desafio para o trabalho em equipe, com a expectativa de práticas que os profissionais de saúde não conhecem suficientemente, mas precisam utilizar, construir e articular. A ausência de estratégias adequadas diante de tal desafio pode contribuir para a fragmentação das relações entre os integrantes da equipe e, com isto, para uma maior dificuldade de aproximação com os usuários do serviço e a comunidade. Compreendemos a expansão do PSF para além de um trabalho técnico hierarquizado, com maior horizontalidade e flexibilidade dos diversos poderes, possibilitando autonomia e criatividade de todos envolvidos, favorecendo assim, maior integração da equipe. Caso esta integração não aconteça, corremos o risco de não avançarmos no modelo de saúde que nos propomos praticar (ALMEIDA & MISHIMA, 2001). Consideramos que o trabalho de equipe possibilita uma nova forma no trabalho em saúde, a da interdisciplinaridade. A complexidade presente no trabalho em saúde implica e envolve necessariamente uma produção que não é material, não tem uma forma concreta, e interfere diretamente no modo de viver das pessoas. Esse bem não material apresenta significados diferentes para diferentes pessoas, nas diversas etapas de suas vidas, nas diversas formas de cultura e momentos da história da humanidade (FORTUNA et al, 2005). O fato de funcionar com equipes multiprofissionais favorece o deslocamento da atenção à saúde direcionada unicamente para o profissional médico, característica da medicina de família anteriormente proposta (VASCONCELOS, 1999b). A proposta de integralidade das 36 ações de saúde tenta recuperar a fragmentação entre saúde pública e medicina curativa, resultando em divergentes representações do fenômeno do adoecimento (CORDEIRO, 1997). Peduzzi (1998) comenta que a interdisciplinaridade relaciona-se à produção de conhecimentos, à integração de várias disciplinas e áreas do conhecimento. A multiprofissionalidade, por sua vez, diz respeito à atuação conjunta de várias categorias profissionais. O que se pretende alcançar é a superação desse modelo instituído, em que o usuário chega com uma queixa ao serviço de saúde, é avaliado em partes fragmentadas por diversos trabalhadores até se chegar ao médico. Assim a queixa principal é decodificada e transformada numa conduta na grande maioria das vezes medicalizante, ou seja: são prescritos remédios e atitudes individuais descontextualizadas, que nem sempre são seguidas e nem sempre causam impacto positivo na saúde daquela pessoa ou daquelas pessoas que vivem e moram na área onde a Unidade de Saúde se propõe atuar (FORTUNA et al, 2005). Ainda de acordo com as autoras acima, o fato de existir um conjunto de profissionais na equipe de saúde da família, atuando numa mesma área, com objetivos aparentemente em comum, não significa necessariamente que teremos o desenvolvimento do trabalho em equipe. Ocorre sim, o trabalho, acontecem relações que, às vezes são difíceis de se compreender, podendo deixar os trabalhadores e usuários muito distantes do que se pretende alcançar no PSF. Esse processo é ainda mais intensificado pelo próprio objeto de trabalho das equipes, que encontra seu foco principal nas famílias, representando estas, uma outra grupalidade. Cordeiro (1997) defende a idéia de que somente com a articulação das políticas sociais torna-se possível promover uma modificação mais consistente no que diz respeito às condições de saúde-doença-cura. Neste sentido, a integração entre as diversas especialidades contribui para a transformação das políticas de saúde. Peduzzi (2001, p. 103), ao estudar o trabalho multiprofissional em saúde, apresenta um conceito e uma tipologia do trabalho em equipe, fundamentada teoricamente nos estudos do processo de trabalho em saúde e na teoria do agir comunicativo. A autora afirma que “o 37 trabalho em equipe consiste numa modalidade de trabalho coletivo que se configura na relação recíproca entre as intervenções técnicas e a interação dos agentes”. Esta modalidade de trabalho possibilita duas modalidades de equipe: equipe agrupamento e equipe integração. A primeira modalidade é caracterizada pela fragmentação, em que ocorre a justaposição das ações e o agrupamento dos agentes. A equipe integração é caracterizada pela proposta de integralidade, em que ocorre maior articulação das ações e interação dos agentes. Habermas (1994 apud PEDUZZI, 2001) propõe a decomposição do conceito de trabalho em dois componentes, considerados distinguíveis e irredutíveis, ainda que interdependentes na prática: o trabalho visto como uma ação racional dirigida a fins e como interação. A interação encontra-se relacionada ao agir comunicativo, no qual se definem as expectativas recíprocas de comportamento, que devem ser compreendidas e reconhecidas minimamente por dois sujeitos. Portanto, funda-se na intersubjetividade do entendimento e do reconhecimento mútuo. “O agir comunicativo é definido como as interações nas quais as pessoas envolvidas se põem de acordo para coordenar seus planos de ação” Habermas (1989 apud PEDUZZI, 2001: p. 105). De acordo com Peduzzi (2001), entende-se que seja por meio desta prática comunicativa que os profissionais possam examinar de forma recíproca o trabalho cotidiano executado e construir um projeto comum condizente com as necessidades de saúde dos usuários. De acordo com Fortuna (1999) o trabalho de equipe em saúde é considerado uma rede de relações entre pessoas, rede de relações de poderes, saberes, afetos, interesses e desejos. A articulação em uma equipe multiprofissional refere-se ao estabelecimento de processos de trabalho distintos, com a consideração de conexões e interfaces existentes entre as intervenções técnicas peculiares de cada área profissional (CIAMPONE & PEDUZZI, 2000). 38 A construção da interdisciplinaridade parte do pressuposto de que nenhum conhecimento é total, havendo necessidade de dialogar com saberes de outra ordem, não necessariamente validado pelo saber dominante, para construir coletivamente outro conhecimento (FAZENDA, 1995). A interdisciplinaridade é, assim, antes um processo do que um produto e implica a comunicação entre os membros da equipe, distribuição de tarefas e registros das atividades (FAZENDA, 1994). Tal concepção é reforçada em Fortuna et al (2005, p. 263), que consideram: A equipe como um processo de relações a serem permanentemente olhadas, pelos próprios trabalhadores e com múltiplas possibilidades de significados. Podendo-se dizer que o trabalho em equipe vai se constituindo, gestando-se no seu fazer de todo dia, e que precisa ser analisado, pois passa por movimentos de dificuldades, de paralisação, de satisfação, é um processo de idas e vindas em diversas direções. 3.1 O agente comunitário de saúde: entre o ser e o fazer Diante da estratégia de mudança do modelo assistencial, o ACS se constitui um profissional que age para melhorar e mobilizar a capacidade da população de cuidar de sua própria saúde, favorecendo o desenvolvimento da autonomia dos sujeitos e a participação nos serviços de saúde. Torna-se um ator imprescindível para que se possa promover a integralidade nas ações de saúde. Para o Ministério da Saúde, o ACS é considerado um trabalhador que faz parte da equipe de saúde da comunidade onde mora, sendo um profissional preparado para orientar as famílias sobre os cuidados com sua própria saúde, como também com a saúde da comunidade (BRASIL, 1999). O Agente Comunitário de Saúde integra as equipes do PACS e PSF, realiza atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde, por meio de ações educativas em saúde nos domicílios e coletividade, em conformidade com as diretrizes do SUS, e estende o acesso às ações e serviços de informação e promoção social e de proteção da cidadania (BRASIL, 2003, p. 10). O reconhecimento do ACS como profissional de saúde acontece em vários países, que passam a promover sua integração às equipes básicas de saúde. Porém, em alguns casos 39 existe uma fragmentação entre o programa de ACS e outros programas de saúde, o que tende a ser atribuído à forma não estruturada de sua implantação (OMS, 1987 apud FAJARDO, 2001). Na América Latina, a inserção dos agentes nos serviços de saúde avançou significativamente nos últimos anos, quando Ministérios da Saúde da América do Sul receberam apoio financeiro de agências internacionais para que começassem a capacitar e utilizar esses profissionais. Outro fator que veio contribuir para esse avanço é o custo relativamente elevado dos serviços de profissionais da saúde com escolaridade em nível superior, bem como pela sua baixa disponibilidade para trabalhar nas periferias e zonas rurais. Diante destes e outros fatores, o ACS bem preparado torna-se importante para desenvolver cuidados básicos em saúde (CORRÊA, 1995). Os agentes comunitários de saúde (ACS) são pessoas escolhidas da própria comunidade onde irão atuar e geralmente pertencentes ao mesmo nível sócio-cultural. Devem preencher os pré-requisitos de maioridade, alfabetização e disponibilidade de tempo integral para o desenvolvimento de suas atividades. Os ACS representam uma nova categoria profissional que visa facilitar a percepção do processo saúde-doença-cura no contexto da área adscrita de sua atuação, de maneira a possibilitar um atendimento mais humano, integral e eficaz. Isso se dá, por exemplo, durante a realização de uma visita domiciliar, quando o ACS, através de um olhar diferenciado e facilitado, pela própria convivência estabelecida com a comunidade, permite uma maior proximidade com a família, podendo perceber outras situações relacionadas ao problema identificado. Com o desenvolver deste olhar diferenciado, percebe questões que estão além do indivíduo, na família e na comunidade, identificando fatores que comprometem direta ou indiretamente a condição de saúde. O fato de sentir de perto a mesma realidade enfrentada pelas famílias adscritas faz dele um conhecedor das dificuldades enfrentadas pela comunidade. Estar tão próximo das famílias que acompanha é quase sempre um fator facilitador para desenvolver seu trabalho. Contudo, por vezes observa-se a recusa ou resistência de algumas 40 famílias a comunicar suas necessidades ao ACS. Situação que requer tempo e resultados, para que alcancem mais confiança no desempenho de suas atribuições. Ao realizar atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde por meio de ações educativas, de acordo com as diretrizes do SUS, os ACS estendem o acesso às ações e serviços de informação, promoção social e proteção da cidadania (BRASIL, 2003). Define-se conceitualmente a prática educativa do ACS como sendo um conjunto de processos, técnicas, expectativas, desejos, frustrações com a presença constante de tensão entre a prática e a teoria, entre liberdade e autoridade, onde qualquer relevância costuma ser inaceitável segundo uma perspectiva que se diz democrática. (FREIRE, 2000 apud ZANCHETTA et al, 2005). Em um movimento bi-direcional, os agentes, de um lado, informam à população "modos de fazer" estabelecidos pelo sistema médico oficial e, de outro lado, munem os profissionais de saúde de elementos chaves para a compreensão dos problemas de saúde das famílias e das necessidades da população (NUNES et al, 2002). Diante da aparente incoerência manifesta em diversos posicionamentos que são assumidos em uma comunidade, podendo ser percebidos de formas conflituosas ou como sinais de desinteresse (VASCONCELOS, 1999a), os ACS passam a representar um auxilio na definição de problemas e modos de enfrentamento a serem utilizados pelos profissionais. O fato de vivenciar a realidade do território onde trabalha faz deste sujeito um facilitador da integração entre a Equipe de Saúde da Família - EqSF e a comunidade, permite um direcionamento das ações em saúde de acordo com a demanda apresentada pelos usuários e favorece a aproximação e o diálogo entre o saber técnico-científico e a cultura popular. Silva et al (2005) colocam que, pelo fato de o ACS estar próximo da comunidade e da equipe de saúde, pertencendo a esses dois territórios, pode agir como facilitador da criação de vínculos, da reorganização do trabalho em equipe, da ampliação do acesso aos serviços de saúde e atuar como facilitador da comunicação entre a comunidade e os profissionais de saúde. 41 Essa forma de interação entre as duas partes de atuação do ACS é exercitada a cada dia de trabalho, na medida em que consegue consolidar seu espaço, na equipe de saúde e na comunidade. Uma prática que aproxima relações de afeto e amizade a ações técnicas e resolutivas, entretanto também inclui sensações desagradáveis e situações de conflito diante do desafio de integrar as cobranças realizadas pela equipe e as demandas apresentadas pelas famílias. Alguns profissionais apresentam uma certa dificuldade em reconhecer que existem diferentes origens culturais, étnicas e sociais na comunidade, além de vários estilos de vida (VASCONCELOS, 1998a). É o ACS quem vai advertir para atitudes inadequadas de outros profissionais em relação à realidade local. Em outras situações contrárias, o convívio com a equipe pode se dar através de preconceitos e discriminações pelo não reconhecimento de seu saber popular (VASCONCELOS, 1999a). A sensibilização para possíveis mudanças comportamentais e culturais direcionada aos indivíduos e às famílias, embora seja reconhecida de forma positiva, é insuficiente para que de fato se possa promover a saúde no sentido mais amplo. Para isto, faz-se necessária uma atuação no que diz respeito aos determinantes sócio-econômicos e culturais. A ampliação do conceito de saúde exige não apenas a mobilização de seus profissionais, mas também sua integração intersetorial, com a participação da sociedade e de outros segmentos do poder público. A implementação das ações de promoção da saúde requer um aumento na participação da comunidade, e esse movimento pode ser alcançado com mais sucesso através da inserção do ACS na equipe técnica formalmente treinada (CURIEL, 1995 apud FAJARDO, 2001). Silva & Rodrigues (2000) levantam uma crítica à atual estrutura do sistema de saúde, apontando a resistência do modelo curativo, onde a figura do médico representa um papel preponderante. Por outro lado, necessidades de racionalização dos custos tendem a sustentar o discurso de autonomia e responsabilidade individual pela saúde. Ao agente cabe orientar; ao médico, promover a cura, fechando-se aí o processo saúde-doença-cura. 42 4 EDUCAÇÃO EM SAÚDE E CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DO CONHECIMENTO Diferentes concepções e práticas têm marcado o processo de construção da educação em Saúde do Brasil. Vasconcelos (2001) comenta que, até a década de 70, havia basicamente a imposição de normas e comportamentos considerados adequados pelas elites políticas e econômicas. De acordo com Araújo (2004), pelas contingências históricas, o modelo de comunicação mais adotado no campo das políticas públicas, mais especificamente na saúde coletiva é o modelo da Comunicação & Desenvolvimento, introduzido no Brasil na década de 50, no qual a comunicação é considerada como moldagem de atitudes e comportamentos, que se efetivaria através de informação suficiente e adequada. A comunicação é entendida como repasse de mensagem de um pólo a outro, com a preocupação de eliminar os ruídos, ou seja, a polifonia social e discursiva, garantindo assim, a linearidade do processo. As práticas tradicionais de educação em saúde apresentavam um discurso biologicista, reduzindo a determinação do processo saúde-doença à dimensão individual, não considerando suficientemente as questões das condições de vida e de trabalho para a saúde. Os problemas de saúde eram atribuídos à ausência do cumprimento das normas de higiene pelos indivíduos. A busca de alguns profissionais por uma aproximação com as classes populares e movimentos sociais locais favoreceu uma compreensão ampliada do processo de adoecimento e cura no meio popular. O confronto com a complexidade dos problemas enfrentados pela população provocou nesses profissionais de saúde uma necessidade de reorientação de suas ações. Insatisfeitos com as práticas mercantilizadas e autoritárias, buscaram outras formas de atuação que fossem mais significativas para as classes populares e iniciaram suas experiências ligando-se aos trabalhos comunitários, principalmente na Igreja Católica. Posteriormente, com a multiplicação de serviços de atenção primária à saúde no Brasil, no final dos anos 70, ficou 43 facilitada a criação de condições institucionais para a transformação das práticas educativas em saúde (VASCONCELOS, 2001). Em 1977, durante a IV Reunião dos Ministros das Américas foi discutido o conceito de participação popular como capaz de ampliar os serviços de saúde. Considerando-se que a participação comunitária poderia levar ao desenvolvimento de habilidades e a transformação de pessoas em função de suas próprias necessidades. Encontra-se envolvido com este conceito a proposta de um diálogo permanente e contínuo entre o pessoal da saúde e a comunidade (OPAS, 1978 apud CANDEIAS & RICE, 1989). A Educação Popular passou então a se constituir como um instrumento de reorientação das práticas no setor saúde, representando uma ruptura com a tradição autoritária e normatizadora da educação em Saúde. Vasconcelos (2001) define que a Educação Popular é um modo de participação de agentes eruditos (professores, padres, cientistas, profissionais de saúde e outros) que buscam trabalhar pedagogicamente o homem e os grupos que se encontram envolvidos no processo de participação popular, permitindo formas coletivas de aprendizado que promovam o crescimento da capacidade de análise crítica sobre a realidade e o aperfeiçoamento das estratégias de luta e enfrentamento. Alves (2004) comenta que da convivência entre as práticas emergentes e hegemônicas é possível delinear dois modelos de educação em saúde, que podem ser referidos como modelo tradicional e modelo dialógico. A educação dialógica visa a transformação de saberes já existentes, não mais pela imposição de um saber técnico-científico tido como atributo profissional de saúde, mas sim pela busca de autonomia e responsabilidade do indivíduo, que se dá principalmente pela condição de participação de todos os sujeitos envolvidos no processo saúde-doença-cura, bem como pela compreensão da situação de saúde e a capacidade de decisão sobre si mesmo. Campos & Baduy (1998) comentam que o trabalho desenvolvido pela equipe de saúde da família, além da responsabilidade da resolução de problemas, capacidade de aceitar as diversidades culturais e de aprender continuamente nas trocas de experiências, compreende a 44 necessidade do desenvolvimento de uma comunicação interpessoal, envolvendo todos os integrantes da equipe e a comunidade onde atuam. Diante do avanço da proposta metodológica da educação popular, pautada no modelo dialógico, os sistemas de saúde passam a considerar outras dimensões envolvidas na construção do conhecimento. Em conseqüência, o discurso sobre saúde que invoca exclusivamente o saber técnico, do especialista ou do administrador (modelo tradicional de educação em saúde), perde gradativamente sua força, tendendo-se a uma maior valorização também do discurso de outros atores sociais tais como as famílias e as comunidades. O surgimento do PSF representa uma estratégia capaz de estimular novas polifonias sociais a respeito da saúde (OLIVEIRA, 2001). Assim, o conhecimento passa a ser construído e reavaliado pelos atores envolvidos – trabalhadores de saúde e a comunidade com qual trabalham - que podem com isso adquirir outros modos de pensar e viver (CAMPOS, 1999) A estratégica de saúde da família, remete a um modelo de educação em saúde que seria mais coerente com os princípios do SUS, particularmente o da integralidade. Pelo nível de compromisso e responsabilidade esperado dos profissionais que compõem as equipes, pelo nível de participação desejado da comunidade na resolução dos problemas de saúde e pela compreensão ampliada do processo saúdedoença, (...) depreende-se que o modelo dialógico de educação em saúde corresponderia ao modelo mais pertinente para o contexto de atividades do PSF (ALVES, 2004, p. 50). A criação do PSF surge como uma proposta que visa contribuir para o desenvolvimento dos sistemas locais de saúde, promovendo atenção primária com qualidade e permitindo a participação da comunidade na construção do processo de saúde; como uma estratégia de consolidação do SUS (VASCONCELOS, 1999a). Ainda de acordo com essa proposta, Dal Poz & Viana (1998) comentam que se introduziu uma outra forma de intervenção na atuação dos problemas de saúde da população, de maneira a agir preventivamente sobre as reais necessidades de saúde, com descentralização da intervenção médica. Para Chiesa & Veríssemo (2003), as intervenções nas ações de saúde também passaram a incorporar conceitos de ampliação ou fortalecimento de poder e de participação 45 comunitária. Com a inserção das propostas de participação popular em saúde, acredita-se que os indivíduos possam expandir o controle sobre suas vidas, visando alcançar as transformações das realidades sociais e políticas. A promoção da saúde e a prevenção dos agravos deixam de ser vistas de forma isolada, passando-se a considerar todo o contexto em que o indivíduo encontra-se inserido. Vasconcelos (1999a) comenta que o PSF não foi criado para atender populações rurais e pobres do país, com tecnologias simplificadas, mas que se refere a uma ampliação da atenção primária à saúde em direção à incorporação de práticas preventivas, educativas e curativas mais próximas da vida cotidiana da população, especialmente de seus grupos mais vulneráveis. Mendes (1996, p. 267), ao defender a qualidade da atenção primária à saúde afirma que: É preciso questionar a idéia de que a atenção primária é de baixa complexidade tecnológica. Ao contrário exige conhecimentos, habilidades e práticas de alta complexidade porque inscritas em distintos campos como o da antropologia, da psicologia social, da sociologia, da economia, da medicina, da comunicação social, da educação, etc. O PSF, enquanto uma estratégia de reorganização do modelo assistencial, tem por base o fortalecimento da atenção à saúde centrada no indivíduo como sujeito integrado à família, à comunidade e a uma dada realidade local. Torna-se, portanto, um espaço privilegiado para o desenvolvimento de práticas educativas com maior proximidade de enfrentamento das reais necessidades de saúde da população assistida. No PSF, de acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 1997), a educação em saúde é responsabilidade de todos que compõem a equipe de saúde da família. Permite à equipe, juntamente com a comunidade, identificar situações que coloquem em risco a saúde das famílias acompanhadas e enfrentar, de forma conjunta, os determinantes do processo saúdedoença-cura. Através de processos educativos, busca-se a autonomia, o auto-cuidado e a responsabilidade dos indivíduos envolvidos neste processo. 46 A partir de uma comunicação mais horizontalizada, em que tanto os profissionais como os usuários atuam de forma mais dialógica e participativa, é possível estabelecer um ambiente de confiança e criação de vínculos, permitindo a construção compartilhada de um saber sobre o processo saúde-doença-cura. Dessa forma, o modelo dialógico tem sido associado a compreensões mais amplas das necessidades de mobilizações, permitindo aos indivíduos reflexões mais aprofundada de seus modos de vida, possibilitando a construção de novos significados de acordo com as possibilidades individuais e coletivas. Por outro lado, observa-se o crescimento da idéia de que a integralidade da atenção precisa ser trabalhada sobre várias dimensões para que seja alcançada de forma mais completa. Para Cecílio (2001, p. 115), “a integralidade deve ser fruto do esforço e confluências dos vários saberes de uma equipe multiprofissional, no espaço concreto e singular dos serviços de saúde”, de maneira a permitir uma ampliação dos cuidados de saúde, com maiores possibilidades de envolvimento da equipe e comunidade. Dessa perspectiva, a organização da atenção deve ser no sentido de uma maior capacidade de escuta, com a intenção de atender às necessidades mais complexas do usuário, tendo o cuidado de simplesmente não procurar encaixá-lo nos serviços ofertados, tais como programas de saúde, consultas, procura por medicamentos e etc. É necessário considerarmos que essa integralidade nunca será plena em qualquer serviço de saúde singular, por melhor que seja a equipe, por melhores que sejam os trabalhadores, por melhor que seja a comunicação entre eles e a coordenação de suas práticas (CECÍLIO, 2001, p. 117). Além de formas mais participativas nas práticas não só educativas e de promoção da saúde, a proposta de integralidade depende de ações intersetoriais, devendo ser compreendida como responsabilidade de todos e não apenas fruto da equipe de saúde da família. A atuação mais participativa dos sujeitos envolvidos, tais como a família e a comunidade, implica na necessidade de considerá-los positivamente na interação com os profissionais de saúde. Porém, nem sempre suas particularidades sócio-culturais são levadas em conta adequadamente, embora lhes atribuam importância e um papel ativo na promoção e 47 formulação de políticas públicas no campo da saúde, com possibilidades de mudanças significativas na área (OLIVEIRA, 2001). Ao comentar esta questão, Oliveira aponta para uma demanda metodológica e epistemológica que ainda não aparece claramente problematizada nos documentos que formalizam o PSF. Independentemente da forma de atuação das equipes, as comunidades ou famílias apresentam ações e processos interacionais na produção de sentidos diante dos desafios encontrados em seu cotidiano, a partir de universos culturalmente estruturados, não existindo, portanto, um espaço vazio entre as equipes do PSF e a comunidade, ou entre o Estado e a população, como podem presumir diversas formas de intervenções governamentais (ibid, 2001). 4.1 Comunicação em Saúde e o Mercado Simbólico No Brasil, a associação entre comunicação e saúde existe pelo menos desde a década de 20, quando foi criado o Serviço de Propaganda e Educação Sanitária no Departamento Nacional de Saúde, com a proposta de investir na divulgação de medidas de higiene para evitar a propagação das doenças. Buscava-se, naquele momento, a fórmula de mais convencimento e menos coerção, como forma de diminuir a resistência da população aos avanços científicos (CARDOSO, 2005). As ações de comunicação e educação voltadas à prevenção eram realizadas nas escolas, locais de trabalho, com uso de material informativo, palestras e campanhas. Tinham como objetivos a mudança de comportamentos e a adoção de hábitos considerados saudáveis. A comunicação era vista como o caminho para o desenvolvimento e a superação do atraso, do analfabetismo, das superstições etc. Ao revisar a trajetória das práticas de comunicação do campo da saúde, Cardoso (2001, p. 48) concordando com Fausto Neto (1995, p. 269) identifica que: 48 Nas diferentes iniciativas do chamado campo da saúde em transferir conhecimentos e metas para seus usuários, estavam contidas noções e pressupostos de matrizes comunicacionais sustentados em paradigmas distintos. Em que num primeiro momento, priorizam a ‘campanha’ dotada de uma eficácia para dar conta de uma possível regulação entre os campos da oferta e da demanda de serviços. Após este momento, a atenção é deslocada para o processo e para a faculdade das técnicas e instrumentos, que seriam por si só, capazes de implantar no outro as chamadas expectativas do campo da oferta. E num terceiro momento, como forma de legitimar pedagogias, postulados e lógicas pertencentes ao campo da oferta, agregaram-se as tecnologias em uso, os insumos da própria experiência do usuário. Na seqüência, aposta-se na contratualidade de encontro de códigos, como uma possibilidade de superar as diferenças entre atores dos campos da oferta e da demanda. Finalmente, atribui-se aos usuários possibilidades de novos manejos e estratégias com que as políticas públicas possam efetivamente se realizar. Percebemos que esta trajetória ainda deixa marcas nos serviços de saúde que disponibilizamos hoje, como exemplificam as inúmeras campanhas, as fortes influências mantidas pela política da indústria médico-farmacêutica e de equipamentos hospitalares inovadores, e a proposta de participação dos usuários nos serviços de saúde. Durante as discussões técnicas da Organização Pan-Americana da Saúde – OPAS, em 1980, na XVII Reunião do Conselho Diretor, os Ministros das Américas reconheceram a necessidade de colocar em prática novos enfoques e propor novas estratégias para integrar a educação e a participação da comunidade nas atividades de assistência primária em saúde (RAICE & CANDEIAS, 1989). Em 1982, a Comissão Técnica de Novos Enfoques da Educação em Saúde na Assistência Primária, da Organização Mundial de Saúde (OMS), recomendou uma mudança de papéis, passando o educador a ser aluno e facilitador, e os membros da comunidade, professores e também alunos (OWH, 1982). Deveria haver uma interação entre ambas as partes, no sentido de que os profissionais pudessem compreender as diversas formas de representações dos sentidos de doença-cura para a comunidade, sustentado por meio de uma comunicação mais participativa. Fazia-se necessário pensar em estratégias de envolvimento da comunidade, capazes de promover atividades conjuntas com os profissionais de saúde. A teoria da comunicação dialógica proposta por Paulo Freire, considera a comunicação como variável primordial na construção de espaços dialógicos, em que os diferentes atores buscam a superação de um problema ou de uma situação por eles vivenciada. 49 Neste sentido, tanto os profissionais de saúde quanto as comunidades que encontram-se envolvidas devem ser considerados como sujeitos ativos da comunicação (FREIRE, 1971 apud OLIVEIRA, 2001). A 8ª Conferência Nacional de Saúde celebrou a ampliação do conceito de saúde, relacionando-a às condições de vida, e não apenas à ausência de doenças. Ao estimular a participação popular, “afirma saúde como direito de cidadania, na linha que tornou a saúde inseparável da democracia. A educação, a participação e a liberdade de expressão tornaramse requisitos do direito à saúde” (CARDOSO, 2005, p. 23). Campos (1997) comenta que o grande desafio da reforma sanitária é o avanço qualitativo que transforma a atenção médico-sanitária, percebida como instrumento de reprodução da força de trabalho, em meio para se obter o direito à saúde, defesa de vida e liberdade de expressão, propondo assim, realizar uma reforma que atenda a demanda técnica, social e política, garantindo os princípios do SUS. O espaço democrático criado após a reforma sanitária e reforçado com a municipalização da saúde abre novas propostas de se trabalhar a construção de uma sociedade mais justa e igualitária (SILVA & RODRIGUES, 2000). Com a implantação do PSF na década de 90, tornou-se mais viável a reorientação para a nova proposta de atenção à saúde, pelo fato de os profissionais estarem inseridos mais próximos da realidade vivenciada pela comunidade e terem como base de atuação uma equipe multiprofissional. Apesar da constituição do trabalho em equipe como forma de favorecer a integralidade dos serviços ofertados, alguns pesquisadores ainda se mostram preocupados com essa proposta. Guizardi; Machado e Pinheiro (2005) afirmam que a constituição das equipes multiprofissionais não superou a fragmentação das diversas especialidades, manifestada no fazer cotidiano dos serviços em saúde. A formação dos profissionais de saúde pautada no modelo biomédico, configurando uma separação entre o biológico e o psicossocial, dificulta a interação dos profissionais de 50 saúde, tanto na relação com o usuário do serviço, como também com os demais profissionais (CIAMPONE & PEDUZZI, 2000). Quanto ao trabalho em equipe, os autores comentam: Existem duas características que necessitam ser consideradas: O trabalho leva à obtenção de resultados e o trabalho em equipe exige comunicação recíproca entre os membros. Portanto, cabe à equipe de saúde a responsabilidade por atingir resultados, os quais estariam relacionados com a obtenção da saúde da clientela, facilitada pela comunicação e interação que deve existir entre os membros da equipe (CIAMPONE & PEDUZZI, 2000, p. 144). Guimarães & Xavier (2005, p. 149) colocam que o caminho mais apontado para a efetivação do controle social é o de construção de uma política de comunicação e informação em saúde capaz de articular diferentes esferas da sociedade e regiões geográficas. “Comunicação como meio – necessidade de se criarem canais de informação – e como prática, via de mão dupla, jogo entre informação e escuta: negociação”. No campo da comunicação em saúde, identificamos o modelo do mercado “simbólico”, desenvolvido pela pesquisadora Inesita Araújo por propor uma explicação da prática comunicativa nos processos de intervenção social. Araújo afirma que: Comunicação é o processo de produzir, fazer circular e consumir os sentidos sociais, que se manifestam por meio de discursos. Esse processo caracteriza um mercado simbólico, no qual o circuito produtivo é mediado por uma permanente negociação (ARAÚJO, 2004. p. 167) O modelo de comunicação coloca em relevo alguns conceitos: 1. Polifonia Todo texto é uma polifonia, um conjunto de vozes que se exprime. Cada fala, cada enunciação é palco de expressão de uma multiplicidade de vozes, algumas arregimentadas intencionalmente pelo locutor e outras das quais ele não se dá conta (ARAÚJO, 2003, p. 48). As vozes por sua vez, correspondem a interesses e posições distintas na estrutura social, que se defrontam e se confrontam na língua, numa luta pelo predomínio do discurso. 2. Sentidos Sociais - São bens simbólicos que se manifestam por meio de discursos e se transformam continuamente em seu processo de circulação. 51 Os sentidos sociais formam uma rede semiótica, dinamizada pela interdiscursividade. O processo de produção – circulação- consumo, que caracteriza o mercado simbólico é representado no modelo por uma malha de fios, cujo traçado ondulante busca caracterizar a contínua transformação dos sentidos, em seu processo de circulação (ARAÚJO, 2004, p. 170) 3. Discursos - são espaços de articulação das muitas vozes que se exprimem, correspondendo a interesses e posições distintos na estrutura social. (Idem, 2003, p. 48) 4. Interlocutores – são indivíduos ou comunidades discursivas que operam o mercado simbólico, sendo fortemente influenciados pela articulação de vários contextos tais como: história de vida, sexo, papel que representam na sociedade, lugar de fala etc. “A produção, circulação e consumo dos sentidos sociais é mediada por um processo de negociação, que é operada por pessoas e comunidades discursivas, os interlocutores” (op. cit, 2004, p. 171). 5. Comunidade discursiva - “são considerados grupos de pessoas, organizados ou não de forma institucional, que produzem e fazem circular discursos que neles se reconhecem e são por eles reconhecidos” (ibid, p. 167). 6. Lugar de Interlocução - representa a posição que o interlocutor ocupa no ato comunicativo, que pode estar mais ao centro ou na periferia. “Cada interlocutor ocupa nesse mercado uma posição, que se localiza entre o centro e a periferia discursivos, posição que corresponde ao seu lugar de interlocução e lhe confere poder de barganha no mercado simbólico” (ibid, p. 167). “Cada interlocutor desenvolve estratégias de trânsito entre as posições, visando sempre uma maior aproximação com o centro” (ibid, p. 167). 7. Contexto - é percebido como espaço dinâmico, ao mesmo tempo que molda a fala é por ela moldado. Existem vários tipos de contexto, todos considerados relevantes como condições de produção, circulação e consumo de sentidos (op.cit, 2003). A autora (ibid, p. 50) menciona os seguintes contextos: - Contexto textual - “diz respeito ao modo de relação espacial/temporal com outros textos, referencia uma relação de ordem física”. 52 - Contexto intertextual - “relaciona outros textos com aquele, através de uma rede de remissões, de associações da ordem da memória discursiva”. - Contexto existencial - “diz respeito ao modo como as pessoas se situam num espaço, numa época, a que grupos sociais pertencem, qual a sua história familiar e sua profissão, sua experiência em relação ao assunto que está sendo tratado”. - Contexto situacional - “se refere à posição social e institucional dos interlocutores (...) determina seu lugar de fala e, conseqüentemente, as expectativas a seu respeito: há regras de comunicação a serem seguidas, pelas pessoas e pelos seus interlocutores”. 8. Mercado Simbólico - O espaço da comunicação institui um mercado simbólico, onde os sentidos são produzidos, circulam e são apropriados, e onde os atores sociais negociam seu modo de perceber e classificar o mundo e a sociedade, “em busca do poder de fazer ver e fazer crer, ou seja, o poder de constituir a realidade” (ibid, 2003, p. 49). Entendemos que as concepções inerentes ao modelo do mercado simbólico, juntamente com a categoria da construção compartilhada do conhecimento e da orientação metodológica da educação popular em saúde, também pode contribuir para pensarmos as práticas discursivas no âmbito do PSF e, principalmente, as relações que estas práticas expressam no cotidiano dos serviços de saúde, seja no interior da equipe, seja entre a equipe e a comunidade. Identificar os principais interlocutores no PSF, seus discursos e suas estratégias de comunicação poderá nos auxiliar a clarear os impasses e as potencialidades no processo de integração entre os atores sociais dedicados a construir um novo modelo de assistência à saúde: o SUS que queremos. Essas propostas de mudanças encontram-se baseadas na idéia de que a população, além de ser assistida, deve se transformar em sujeito do processo de promoção da saúde. Isto implica em grandes modificações nos quadros sociais e nos padrões culturais, cognitivos e valorativos das pessoas envolvidas, as quais são representadas por diferentes profissionais da saúde e segmentos da população. 53 5 METODOLOGIA 5.1 Opções teórico-metodológicas Este estudo caracteriza-se por uma abordagem qualitativa, de caráter exploratório, e visa identificar e avaliar as práticas de comunicação entre os agentes comunitários de saúde e seus principais interlocutores no PSF. Constituindo-se em uma pesquisa exploratória e descritiva, busca-se observar, descrever e documentar certos aspectos de uma situação que naturalmente ocorre. Por se tratar de uma abordagem qualitativa, considera-se como fundamento que o conhecimento sobre os indivíduos só se torna evidente a partir da descrição da própria experiência humana, de maneira como é vivenciada e definida pelos seus atores (POLIT & HUNGLER, 1995). De acordo com Minayo (1994), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. A pesquisa qualitativa busca uma compreensão particular daquilo que estuda e produz explicações contextuais, com ênfase maior no significado, em vez da freqüência do fenômeno. O foco é centralizado no específico, no peculiar, visando a compreensão do fenômeno, geralmente ligado a atitudes, crenças, motivações, sentimentos e pensamentos da população estudada. As técnicas qualitativas podem proporcionar uma oportunidade para as pessoas revelarem seus sentimentos; o modo como falam sobre suas vidas é importante; a linguagem usada e as conexões realizadas revelam o mundo como é percebido por elas (SPENCER, 1993). Para o desenvolvimento deste estudo utilizamos estratégias teórico-metodológicas da Educação Popular em Saúde, e do Mercado Simbólico. Com base nestas abordagens, 54 consideramos a polifonia social, lugar de interlocução, construção compartilhada do conhecimento e participação popular, categorias relevantes para a nossa análise, conforme apontamos no capítulo 3 (p. 31 – 42). Os referenciais teóricos utilizados funcionaram como norteadores das etapas de planejamento e execução da coleta de dados, favorecendo maior interação com os participantes da pesquisa, bem como instrumentalizando o tratamento analítico dos dados identificados. A proposta teórico-metodológica da educação popular aos poucos começa a fazer parte das instituições de saúde, como um instrumento que permite conhecer as diversidades culturais, econômicas e sociais e suas implicações nas formas de se enfrentar os problemas de saúde. Sua ênfase na aliança entre saberes promove a participação popular e a construção de novos conhecimentos a partir das experiências dos atores envolvidos, como também possibilita a inovação na forma de organização institucional e de relacionamentos com os sujeitos presentes no processo. A participação popular encontra-se relacionada com as novas formas de enfrentamento dos problemas de saúde, em que há uma integração entre o saber técnico e o saber popular através de mútua colaboração (VASCONCELOS, 1998b). O modelo do mercado simbólico foi desenvolvido por Araújo (2003) com o objetivo de análise e planejamento estratégico da comunicação nas políticas públicas. Consideramos a metodologia proposta por Araújo, adequada aos objetivos do presente estudo, à medida que percebemos o trabalho desenvolvido pelo ACS como facilitador das relações permeadas pela diversidade dos conhecimentos, de um lado representada pelos profissionais dos serviços de saúde e, de outro, pela comunidade. O modelo do mercado simbólico apresentado por Araújo (2004) contribui para ampliar a análise da prática comunicativa, na medida em que permite focalizar sua dimensão de luta simbólica. 55 Segundo Araújo (2004, p. 167): A comunicação opera ao modo de um mercado, onde os sentidos sociais - bens simbólicos - são produzidos, circulam e são consumidos. As pessoas e comunidades discursivas que participam desse mercado negociam sua mercadoria - seu próprio modo de perceber, classificar e intervir sobre o mundo e a sociedade - em busca de poder simbólico, o poder de constituir a realidade. Como vimos no capítulo anterior, o Modelo do Mercado Simbólico descreve a comunicação como um mercado onde os diversos interlocutores fazem circular seus discursos. Ainda de acordo com a autora, é principalmente no momento de se fazer circular os sentidos sociais que se localiza fortemente a exclusão. O mapa do mercado simbólico, proposto pela autora, é um instrumento metodológico que possibilita uma representação gráfica dos múltiplos interlocutores e comunidades discursivas e seus respectivos lugares de interlocução. Este instrumento, por sua vez, facilita a análise das estratégias de comunicação presentes no PSF. A construção desse instrumento permite aos profissionais de saúde compreender a comunicação tanto como desestruturadora de suas práticas de saúde como facilitadora das relações estabelecidas com as famílias e comunidades no PSF. Neste contexto, as categorias “Construção Compartilhada do Conhecimento”, associada à Educação Popular em Saúde, “polifonia social” e “lugar de interlocução”, relacionadas ao modelo do Mercado Simbólico foram os instrumentos centrais deste estudo na consideração dos processos de trabalho do ACS em suas relações no interior da equipe e com a comunidade. Através das categorias selecionadas, buscamos contemplar a perspectiva de interação e negociação simbólica, que envolve confrontos e embates, mas também acordos e alianças. 56 5.2 Percurso Metodológico O estudo foi desenvolvido na cidade do Rio de Janeiro, em duas unidades do PSF, junto a duas equipes de cada unidade, totalizando 4 equipes de saúde. A área de atuação de duas equipes abrange as comunidades: Sereno, Paz e Fé, situadas no bairro da Penha. A área das outras duas equipes corresponde à comunidade do Alemão. De acordo com a divisão administrativa municipal, as duas unidades encontram-se na Área de Planejamento (AP). 3.1 A seleção dessas unidades de saúde resultou da negociação entre os pesquisadores do projeto de pesquisa “Avaliação da Estratégia de Saúde da Família em dois Municípios da Área Metropolitana do Rio de Janeiro”, da Universidade Estácio de Sá e os Coordenadores da Área Programática – (CAP) 3.1, com a obtenção do aval institucional, em nível central e local, para o início das atividades de coleta de dados. O projeto de pesquisa foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estácio de Sá, conforme parecer anexo (Anexo G). Após o contato inicial entre a Estácio de Sá e a CAP, iniciamos a pesquisa na unidade do Sereno, que acompanha as áreas adscritas do Sereno, Paz e Fé, e em seguida fomos para a unidade do Alemão, na qual as equipes foram indicadas pelo coordenador de área programática (CAP 3.1). Durante o desenvolvimento deste trabalho tivemos sempre presente a preocupação em manter uma relação entre os fatos vivenciados durante as fases de coleta de dados e as abordagens teóricas utilizadas. Procuramos na medida do possível, evitar que nossos sentimentos pessoais, valores e opiniões preponderassem sobre o que estava sendo evidenciado através da pesquisa. O trabalho de campo aconteceu entre os meses de maio a outubro de 2006. Antes de nossa inserção nas unidades de Saúde da Família para a realização de coleta de dados, tivemos uma etapa preparatória, a qual envolveu oficinas de treinamento para a realização das 57 atividades de sensibilização no grupo focal, utilizando-se de dinâmicas interativas e lúdicas, além de um exercício prévio para a construção do Mapa do Mercado Simbólico. As etapas de coletas de dados consistiram em: 1. Observação participante - através da observação direta do trabalho desenvolvido pelos agentes comunitários de saúde, suas relações com a equipe e a comunidade, realizando as anotações em diário de campo; 2. Entrevistas realizadas através da técnica de grupos focais - esta fase consistiu em três encontros com cada equipe, com duração de aproximadamente 60 minutos cada. Os grupos foram formados com pelo menos seis ACS; 3. Entrevista Individual: com utilização de questionários semi-estruturados. Antes de ingressarmos para o processo de coleta de dados, participamos de reuniões realizadas pelas equipes, consideradas como parte do processo de trabalho interno das unidades, onde estavam presentes todos os membros das equipes, mais um grupo de estudantes residentes, que realizam suas atividades práticas em uma das unidades. O objetivo de nossa presença neste momento foi o de nos apresentarmos às equipes como enfermeira e pesquisadoras, explicando-lhes os objetivos da pesquisa, convidando-os a participar, apresentando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A) e informando que durante o desenvolvimento do estudo todos os dados seriam tratados de maneira a garantir o sigilo de identidade dos participantes. Procuramos estabelecer um vínculo de confiança com os profissionais de forma a facilitar nossa inserção e interação no campo da pesquisa. Como colocado por Minayo (1994), a interação torna-se imprescindível porque o relacionamento entre os sujeitos, seja do entrevistador/entrevistado, observador/observado ou mesmo do pesquisador/pesquisado, é o que permitirá a construção de novo conhecimento a partir daquilo que é tido como conhecido, pois a busca de respostas a dúvidas e incertezas são razões para se realizar a pesquisa. 58 Vale ressaltar nossa preocupação em evitar ou, pelo menos, minimizar possíveis interferências de nossa presença nas atividades programadas pelas equipes. Porém, algumas vezes fomos solicitadas a participar e dar sugestões no desenvolvimento destas atividades. De maneira a facilitar a compreensão, descreveremos a seguir o processo de coleta de dados em cada uma de suas etapas: 1ª Fase da Coleta de Dados: Observação Participante Teve início em maio de 2006, perdurando em todas as outras etapas da coleta, até a conclusão das entrevistas. Começamos a observação pelo trabalho interno, na unidade do PSF, e em seguida, acompanhando a visita domiciliar na comunidade realizada pelos ACS. A observação aconteceu especificamente durante 9 encontros com cada equipe em estudo, realizados na maioria das vezes no primeiro turno de atividades, no horário de 8:00 às 12:00hs, totalizando assim 36 encontros nas quatro equipes. Estes consistiram em acompanhar a rotina de trabalho dos ACS dentro da unidade de saúde, participando de reuniões de equipe, reuniões sob supervisão do enfermeiro, trabalhos realizados com a própria equipe, como também com a comunidade, em visita domiciliar do ACS acompanhado de um membro da equipe técnica, visita exclusiva do ACS e encontros de grupos formados pelos ACS. Pelo fato do estudo acontecer em áreas de risco, houve momentos em que ficamos expostas a situações de violência na comunidade. Tivemos oportunidade de presenciar, juntamente com profissionais da equipe de saúde, um conflito armado entre o tráfico local e os policiais. Apesar da extrema tensão, esta situação permitiu não apenas a ampliação de nosso olhar de pesquisadora, mas também uma maior aproximação com a equipe. Diante destas situações nossas atividades foram diversas vezes adiadas e replanejadas, nos colocando naquele momento como disponíveis aos desabafos das experiências de violência vivenciada pelas equipes. A etapa de observação nos permitiu uma percepção mais detalhada da instituição, do ambiente e da organização do processo de trabalho das equipes. Além de favorecer um clima de confiança para a continuidade da pesquisa, facilitou o delineamento e construção do que era 59 relevante investigar, partindo de questões trazidas pelos ACS e os demais profissionais das equipes. Sobre observação participante, Becker (1993, p. 47) afirma que: O observador participante coleta dados através de sua participação na vida cotidiana do grupo ou organização que estuda. Ele observa as pessoas que está estudando para ver as situações com que se deparam normalmente e como se comportam diante dela. Entabula conversação com alguns ou com todos os participantes desta situação e descobre as interpretações que eles têm sobre os acontecimentos que observou. Patton (1990 apud MARTINS & BÓGUS, 2004) afirma que apesar de haver uma semelhança entre os métodos empregados pela observação e os processos utilizados pelas pessoas no dia-a dia, é extremamente necessário um grande preparo do pesquisador, no sentido de permitir desenvolver habilidades para inserção no ambiente de pesquisa: habilidades interpessoais, critérios para selecionar os materiais a serem registrados e condições técnicas suficientes para permitir mudanças no direcionamento da pesquisa, quando necessárias. Corroborando a afirmação da autora citada anteriormente, constatamos que essa fase inicial de observação nos permitiu identificar situações bem distintas no cotidiano das tarefas desenvolvidas pelas equipes, as quais repercutem diretamente no trabalho do ACS, de maneira que não seria possível uma uniformidade rígida no estudo das quatro equipes envolvidas. Diante desses fatores, o processo de coleta dos dados sofreu adaptações, de acordo com as circunstâncias enfrentadas em cada realidade local, entre elas: situações de violência, momentos de intenso estresse da equipe, ausência de profissionais por motivo de participação em cursos de capacitação, período de férias e outras atividades programadas pela CAP. Após esta etapa inicial, que consistiu em um período de observações das atividades realizadas pelos ACS, incluindo suas formas de relações estabelecidas tanto com a equipe como também com as famílias acompanhadas, partimos para a segunda fase de coleta dos dados, a qual consistiu na formação de grupos focais. 2ª- Fase de Coleta de Dados – Encontros dos Grupos Focais Ocorreram entre os meses de julho a setembro de 2006, sendo estes encontros conduzidos por um monitor, no caso em estudo, a própria pesquisadora, tendo o 60 consentimento de todos os participantes para a gravação em MP-3, o que facilitou a análise exploratória dos dados emergentes. Cada encontro teve em média 60 minutos de duração. O grupo focal é uma técnica útil para identificar conceitos, crenças, percepções, expectativas, motivações e necessidades de um grupo específico de interesse do pesquisador. As informações obtidas através do grupo focal podem, posteriormente, serem utilizadas em um programa de intervenção ou para redirecionarem atividades de uma política ou programa que esteja sendo executado (MARTINS & BÓGUS, 2004). Para a operacionalização do grupo recomenda-se que o mesmo seja composto por no mínimo seis e no máximo quinze pessoas, número que sofre variações dependendo dos autores consultados. Tendo como tempo médio de duração 90 minutos, sendo necessário um moderador, com a função de manter o foco nas discussões relevantes para a pesquisa, bem como propor as questões aos participantes (WESTPHAL e COL. 1996, apud MARTINS & BÓGUS, 2004). O trabalho consistiu na formação de três grupos. O número de participantes foi de 6 (seis) ACS por grupo, tendo em um dos grupos apenas 3 (três) componentes. Realizamos com cada um desses grupos, três encontros, totalizando assim, nove encontros de grupos focais. Alguns dos ACS não participaram dos encontros por motivo de: férias, licença maternidade, doença, atividade de acolhimento na unidade no horário do encontro do grupo. Utilizamos nos encontros um roteiro semi-estruturado (Apêndice B) com as questões a serem abordadas, não desconsiderando as informações relevantes manifestadas pelos ACS, o que nos permitiu o aprofundamento de temas não previstos inicialmente. A escolha desta técnica se deu pelo fato de nos possibilitar um melhor direcionamento aos objetivos propostos do estudo, além de nos permitir apreender a dinâmica social através de atitudes, opiniões e motivações expressas em interações nos grupos. A seguir apresentamos um breve relato das atividades desenvolvidas em cada encontro: 61 1º Encontro - Apresentação do grupo, incluindo pesquisadores e ACS; - Realizamos novamente a leitura do TCLE, informando que poderiam retirar seus respectivos de consentimentos, caso não apresentassem mais interesse em participar da pesquisa. Para facilitar o contato com o pesquisador, disponibilizamos o número do telefone na via do TCLE que foi entregue ao participante; - Apresentamos as propostas dos nossos três encontros, expondo resumidamente as atividades programadas, e negociações quanto às próximas datas e horários a serem agendados; - Propusemos a reflexão quanto à inserção de cada ACS no PSF, rememorizando aspectos que facilitaram e dificultaram a chegada na equipe. Este momento permitiu aos ACS uma busca significativa sobre sua chegada na EqSF. - Sugerimos a expressão de percepções e sentimentos através de desenhos, que em seguida foram expostos e comentados por cada ACS. Os desenhos serviram nesse momento do estudo para facilitar a interação entre entrevistador/entrevistado, bem como de todo o grupo, além de nos permitir identificar algumas questões relevantes trazidas pelo grupo. A partir dos desenhos, o diálogo se deu com maior espontaneidade e naturalidade. O estudo destes desenhos não apresentou em nenhum momento o objetivo da análise psicológica. Tivemos a oportunidade de perceber a inquietação de alguns grupos, os quais utilizaram esse primeiro encontro como um momento de desabafo de suas tensões provocadas nas relações tanto com a equipe, como com a comunidade. Destacaram o desgaste físico e emocional relacionado ao trabalho que desenvolvem. 2º Encontro - Iniciamos com uma dinâmica que consistia em oferecer grande número de informações transmitidas por várias pessoas ao mesmo tempo a um dos participantes do grupo, para posterior reflexão sobre a multiplicidade de 62 informações que recebemos a todo instante e a seleção que realizamos das mesmas; - Propusemos uma reflexão sobre a dinâmica, comparando-a com as práticas comunicativas percebidas pelos ACS em suas atividades no campo da saúde; - Em seguida apresentamos a seguinte questão: de onde vêm as informações que vocês recebem sobre saúde? Iniciamos assim, a construção gráfica do “Mapa do Mercado Simbólico” (ARAÚJO, 2004). Através da construção do Mapa do Mercado Simbólico, fizemos um autodiagnóstico das relações estabelecidas no processo de trabalho em equipe e com a comunidade, identificando os principais interlocutores e comunidades discursivas, as formas de produçãocirculação-apropriação dos discursos e as suas repercussões nas práticas executadas pelos ACS e demais integrantes da equipe. 3º Encontro - Voltamos a refletir sobre a questão feita no encontro anterior e continuamos a construção do “Mapa do Mercado Simbólico”, aprofundando a discussão sobre as principais fontes de informações com impacto nas práticas de saúde dos ACS; - Passamos ao lugar ocupado pelos interlocutores - entre Centro e Periferia discursivas, bem como as formas de comunicação estabelecidas, se mais verticais ou dialógicas e participativas. Com isso, concluímos a construção dos Mapas de acordo com as percepções de cada grupo. Os resultados obtidos foram complementados posteriormente através das entrevistas semi-estruturadas individuais, buscando ampliar e aprofundar a compreensão das relações estabelecidas entre os ACS e seus interlocutores. Vale ressaltar que foi um processo de conquistas e estabelecimento de vínculos, em que algumas vezes os ACS expressaram seus anseios e opiniões como um desabafo, uma busca de alívio. Outros mostraram-se interessados na dinâmica proposta, como oportunidade de autoconhecimento do grupo e novas propostas para suas práticas. Outros, porém, se 63 recusaram a participar de qualquer atividade, justificando-se pelo grande número de atribuições e cobranças. Visando facilitar o entendimento sobre o processo de construção dos mapas, optamos por descrever sua metodologia no item 5.3 mais detalhadamente. 3ª Fase de coleta de dados – Entrevista Individual Esta fase ocorreu no período entre agosto e outubro de 2006, através de entrevistas individuais semi-estruturadas (Apêndice C) com um total de 12 ACS. De acordo com Trivinos (1987, p. 146), podemos entender a entrevista: Como aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante. Convém esclarecer que as perguntas que fundamentam a entrevista semi-estruturada, no enfoque qualitativo, não são definidas a priori. Elas surgem como resultados não só da teoria que alimenta a ação do investigador, mas de toda a informação recolhida sobre o fenômeno social que interessa, não sendo considerados menos importantes seus contatos, inclusive, os que são realizados na escolha das pessoas que serão entrevistadas (TRIVINOS, 1987). Segundo Berger (1978), a entrevista é definida como um recurso interativo que permite ao pesquisador reinterpretar os resultados observados a partir da inter-relação entre a pessoa que aceita ser entrevistada e o investigador, ocorridos num determinado momento e contexto. A entrevista é caracterizada pela comunicação verbal que irá reforçar a importância do significado da fala, sendo útil na coleta de dados sobre um determinado tema científico (MINAYO, 2001). Durante a entrevista se estabelece uma interação recíproca entre quem pergunta e quem responde. Trivinos (1987) comenta que antes de iniciar a entrevista, deve o entrevistador estar ciente da necessidade de desenvolver todos os elementos que permitam um clima de 64 simpatia, confiança e harmonia entre ele e o entrevistado. O que proporcionará um ambiente com a mais ampla expressão de naturalidade, fundamental a pesquisa. Cada momento permitiu uma acumulação de conhecimentos apreendidos, possibilitando uma maior proximidade com a produção das informações, um processo de construção a cada momento, colocando-se de maneira complementar e significativa para a obtenção de expressões manifestas pelos ACS. Também valorizamos a percepção através de outros sentidos, como o olhar e o observar, além das falas expressas durante as entrevistas. Assim, todas as etapas se desenvolveram com base na retroalimentação. O entrevistador deve ser cauteloso em observar os aspectos não-verbais, como gestos, expressões, entonações, sinais não-verbais, alterações de ritmo, cuja captação é significante para a compreensão e a validação do que foi efetivamente dito (MARTINS & BÓGUS, 2004). Os critérios selecionados para participar na entrevista individual foram: - Trabalhar seis meses ou mais como ACS; - Ter participado dos Grupos Focais (pelo menos 2 encontros). As entrevistas foram realizadas nas próprias unidades do PSF, sendo marcadas previamente com os ACS que concordaram em participar, através de negociação quanto à sua disponibilidade de dia e horário. Para efetuarmos sua gravação, solicitamos autorização individual dos ACS, garantindo o anonimato dos participantes. Participaram desta fase 12 ACS. A transcrição das entrevistas foi feita imediatamente após o período de coleta, com o registro de outras expressões utilizadas além da fala, tais como gestos, pausas, risadas, silêncio, diminuição da voz e outros. Esta reprodução tentou caracterizar a fala dos ACS de maneira mais próxima à obtida durante as entrevistas. Apresentaremos a seguir de maneira resumida, as etapas que constituíram as fases de coleta dos dados. 65 Quadro 2 - Síntese da metodologia e das fases da pesquisa FASE MÉTODO UTILIZADO PERÍODO LOCAL MODO 1º Qualitativo Maio/Outubro 2006 USF e Comunidades Individual e Grupo 2º Qualitativo Julho/Setembro 2006 USF Grupo 3º Qualitativo Agosto/Outubro 2006 USF Individual TÉCNICAS DE COLETA DE DADOS Observação Participante - Grupo focal (Desenhos e construção do Mapa do Mercado Simbólico) Entrevista Semiestruturada AMOSTRA 04 ESF 15 ACS 12 ACS O material resultante das transcrições das entrevistas foi submetido a várias leituras para a identificação dos temas mais freqüentes e relevantes. A categorização temática seguiu os critérios de identificação e diferenciação dos principais elementos. Certas expressões foram utilizadas como “palavras-chaves” para destacar os núcleos de sentido de cada categoria temática (MINAYO, 1994). Spink (1999) explícita que as pesquisas que procuram entender os sentidos dos fenômenos sociais, devem iniciar a análise pela imersão no conjunto das informações coletadas, deixando aflorar os sentidos, tendo o cuidado para não simplesmente encapsular os dados em categorias ou temas definidos a priori. 5.3 O processo de construção dos mapas de comunicação A construção dos mapas nos permitiu identificar as diferentes redes de produção de sentidos que encontram-se articuladas nas ações de saúde, avaliando suas formas de circulação, reprodução e silenciamento das diferentes vozes que se fazem presentes no dia-adia do trabalho do agente comunitário. 66 Ter contato com a realidade local e observar as relações que se estabelecem nas redes sociais nos facilitaram a identificação das singularidades, necessidades e as possíveis buscas de parcerias em prol dos objetivos definidos, com maior participação e autonomia dos ACS e usuários. Pudemos perceber os vários lugares de fala, as negociações e embates pela busca de poder. O mercado simbólico nos remete para a constituição de um mercado de desiguais e a negociação que nele ocorre apresenta um caráter de luta por posições de poder discursivo (ARAÚJO, 2003). Utilizamos a perspectiva da construção compartilhada do conhecimento, valorizando as diferentes expressões presentes nos grupos, com espaço para reflexão e debate. A grande vantagem deste método foi a de valorizarmos as expressões dos próprios grupos, considerando suas realidades locais. Com isto, surgiram discordâncias, que propiciaram o diálogo e o aprofundamento do tema em questão. “O investigador, ao mesmo tempo em que se ajuda, deve apoiar o informante, de maneira a propiciar a sensação deste quanto a sua utilidade, de sua importância para as metas que se procura atingir” (TRIVINOS, 1987, p. 149). Buscamos, ao longo dos encontros do grupo focal, obter as diversas expressões sobre como os agentes comunitários percebem a formação das redes locais de produção de sentidos relacionadas às questões de saúde. Esta etapa tornou-se mais clara com o seguinte questionamento ao grupo: de onde vêm as informações que vocês recebem sobre saúde? Assim iniciamos a construção gráfica do mapa. A visualização facilitava as manifestações dos participantes e a discussão com maior profundidade, até o ponto em que se produzia um acordo. Assim, ao término deste encontro tivemos como resultado o esboço de um mapa de comunicação revelando uma rede de produção dos sentidos, ou seja, os diversos indivíduos e comunidades discursivas mencionadas pelos participantes do grupo, com destaque da posição destes no espaço do mapa (centro ou periferias discursiva). 67 Pela programação do tempo destinado à coleta de dados, bem como pelas atividades previstas pelos ACS, percebemos também a necessidade de uma reflexão para aprofundarmos nosso conteúdo num próximo encontro, visto que alguns participantes ainda apresentavam uma certa dificuldade em identificar principalmente na comunidade as vozes que apresentavam maior influência sobre as questões de saúde. Alguns demonstravam um certo desconhecimento quanto ao envolvimento ou não de algumas comunidades discursivas nas questões das informações de saúde, o que proporcionava no grupo a problematização do assunto, até que chegassem a um acordo entre os participantes. No terceiro encontro, procuramos explorar as diversas relações estabelecidas entre os interlocutores identificados e os agentes comunitários, o que lhes permitiu identificarem as formas de fazer circular, reproduzir e se apropriar dos sentidos. Ao longo do trabalho, algumas informações sobre os interlocutores foram alteradas por solicitações dos próprios participantes dos grupos. Construímos dois mapas de comunicação, o primeiro com as equipes as quais denominamos “A” e “B”, pela facilidade de se trabalhar em conjunto com as mesmas, bem como por apresentarem o mesmo contexto local de trabalho. O mesmo procedimento não foi possível com as equipes “C” e “D”, por apresentarem programação diferenciada das atividades, tornando-se difícil sua junção para o desenvolvimento dos grupos. Apesar de não trabalharmos em conjunto com estas duas últimas equipes, os resultados obtidos foram bastante semelhantes, possivelmente pelo fato de trabalharem na mesma unidade e acompanharem famílias da mesma comunidade. Diante deste fato, o mapa construído com a equipe “C” foi complementado pela equipe “D”. A discussão dos dois mapas foi aprofundada durante a terceira fase da pesquisa, que consistiu em entrevistas individuais. Os mapas foram apresentados a cada um dos entrevistados, de acordo com a equipe no qual fazia parte, permitindo uma melhor visualização do produto obtido no grupo. Isto facilitou a expressão de outros interlocutores e das várias formas de relações estabelecidas, de acordo com a percepção individual de cada 68 ACS. Fomos surpreendidas pela solicitação de alguns agentes para que dispuséssemos uma cópia do mapa a cada equipe, o que se justificou como uma forma de obter melhor articulação em suas atividades. Fato que nos trouxe um momento de grande gratificação pelo trabalho. Os interlocutores e as comunidades discursivas foram representados por cores, o que indicou maior ou menor influência nas informações de saúde fornecidas aos agentes, definindo sua posição em relação aos demais no Mapa do Mercado Simbólico. Nas equipes “A” e “B” tivemos as representações pelas seguintes cores: ● Vermelho – muitíssima influência; ● Amarelo – muita influência; ● Verde – média influência; ● Laranja – pouca influência; ● Azul – influência quase nula. Enquanto as equipes “C” e “D” optaram por representar pelas seguintes cores: ● Vermelho – muitíssima influência; ● Amarelo – muita influência; ● Verde – média influência; ● Azul- claro – pouca influência; ● Azul escuro – influência quase nula. As formas de relações estabelecidas entre os interlocutores e os ACS foram representadas por setas: Apontam para uma relação de trocas, bidirecional, com negociação e escuta; Único sentido, indicam uma relação verticalizada, que direciona as ações, apresenta autoritarismo e não permite trocas; As setas mais espessas indicam maior influência dos discursos que são expressos pelos seus interlocutores. 69 5.4 Entrevistas individuais – última fase da coleta dos dados A continuação da análise dos mapas se deu através das entrevistas individuais com cada participante dos grupos. Contamos com a participação de 12 ACS com seis meses ou mais na função, o que em nosso entendimento permitiu posições mais concretas pelo tempo de trabalho e relações estabelecidas com a equipe e a comunidade. A falta de três agentes comunitários nesta última fase ocorreu pelos seguintes motivos: não ter no momento da entrevista seis meses ou mais de trabalho, outro por estar se desligando do PSF e o terceiro por motivos de doença. A média de duração das entrevistas foi de 40 minutos, constituída em sua primeira parte de informações que nos permitiram traçar a identificação de cada ACS. A segunda parte nos forneceu informações complementares das etapas anteriores da pesquisa, bem como permitiu direcionar outras questões relativas aos objetivos do estudo (Apêndice C). Percebemos nesta etapa um interesse maior dos agentes que se dispuseram a participar, demonstravam em suas expressões uma satisfação pessoal, uma valorização por estarem fazendo parte de um estudo acadêmico, serem ouvidos e assim poderem expor suas opiniões, anseios e necessidades, acreditando estar assim contribuindo com melhorias nas práticas cotidianas. A experiência como enfermeira supervisora de ACS no PACS/PSF contribuiu significativamente para uma maior aproximação com toda a equipe de saúde e aprofundamento em questões que se mostraram relevantes durante a entrevista. As falas dos participantes não serão identificadas, como forma de garantir o sigilo de identidade destes profissionais. 70 6 O CONTEXTO LOCAL O município do Rio de Janeiro possui uma população estimada em 6.094.183 (Seis milhões noventa e quatro mil cento e oitenta e três) habitantes com alta densidade demográfica (IBGE 2005). O Censo 2000 do IBGE, revela que a população do município do Rio de Janeiro é representada majoritariamente por mulheres com dez anos ou mais de idade totalizando 2.677.150 e 2.299.451 homens com dez anos ou mais de idade. Quanto ao nível de instrução e escolaridade temos 213.022 habitantes com dez anos ou mais de idade sem instrução e menos de um ano de estudo (IBGE, 2000). Em relação ao rendimento nominal mensal temos: ● Pessoas residentes com dez anos ou mais de idade e rendimento mensal até um salário mínimo, temos 425.916 habitantes. ● Pessoas residentes com dez anos ou mais de idade e rendimento mensal maior de um a dois salários mínimos, temos 650.726 habitantes. ● Pessoas sem rendimentos 1.765.132 habitantes. Os dados seguintes foram retirados do Plano Estratégico da Coordenação de Área de Planejamento 3.1/SMS – RJ (2003/2005). A atividade produtiva no Rio de Janeiro é basicamente concentrada em comércio e prestação de serviços e absorve mão de obra local e de cidades vizinhas. 6.1 A Área de Planejamento 3.1 Administrativamente, o município está dividido em cinco Regiões ou Áreas de Planejamento - AP, as quais comportam sub-divisões internas. Estas são coordenadas pelas CAP’s – Coordenação de Área Programática. A área programática – AP.3.1 abrange o Complexo do Alemão, Ramos, Penha, Ilha do Governador e Maré. Encontra-se localizada na região norte do município, sendo 71 geograficamente limítrofe com os municípios da Baixada Fluminense. Esta área dispõe atualmente de 33 equipes do PSF, conforme a tabela seguinte, e mais 8 equipes do PACS. A pouca oferta de serviços na baixada e a facilidade de acesso através das principais vias da cidade (Linha Amarela, Linha Vermelha, Rede Ferroviária, Av Brasil) aumentam a procura por atendimentos nas unidades de saúde da AP.3.1, resultando na sobrecarga do funcionamento destas. A Área Programática – AP 3.1 possui um total de 85 favelas, com 274.408 habitantes, representando 33,52% da população total. Geograficamente, essas favelas encontram-se por toda AP, não se limitando a uma determinada área específica, porém concentra-se no subsistema de saúde Leopoldina Sul quase 70 % da população em favelas. De acordo com o mapa do Índice de Desenvolvimento Humano da AP 3.1 (Anexo B) as taxas mais baixas encontram-se na comunidade da Maré e no Complexo do Alemão. Enquanto que as maiores estão no Zumbi, Ribeira, Moneró e Jardim Guanabara. A faixa entre 0,601 e 0,750 é a mais representativa da área, abrangendo o maior percentual de bairros. O Índice de Desenvolvimento Humano é constituído por três dimensões: Longevidade (esperança de vida ao nascer), Educação (taxa de analfabetismo e número de anos de estudo) e renda (renda familiar percapita). 72 Figura 1 - Localização da AP 3.1 L o c a liz a ç ã o d a A P 3 .1 n o M u n ic íp io d o R io d e J a n e ir o C a x ia s N o v a Ig u a ç u S e r o p é d ic a S .J .M e r it i N il ó p o li s Ita g u a í A P 3 .3 A P 5 .1 A P 5 .3 A P 1 A P 3 .2 A P 5 .2 A P 4 A P 2 .2 A P 2 .1 Fonte: Plano estratégico para organização da rede assistencial na Área Programática - AP 3.1 Rio de Janeiro 2003/2005. 73 Quadro 3: Distribuição das equipes do PSF equipes Nº de Tipo Equipes Equipes Parque Royal 2 PSF Parque Royal 1 PSF Mandela de Pedra 1 PSF Samora Machel 1 PSF Parque João Goulart 1 PSF CHP 2 1 PSF Parque Carlos Chagas 1 PSF Parque Oswaldo Cruz Agrícola/ S. 1 PSF Pedro/Monsenhor Brito 1 PSF Vila Turismo Marcílio Dias 1 2 PSF Marcílio Dias 2 Alemão 1 Alemão 2 5 PSF Alemão 3 Alemão 4 Alemão 5 na Área Programática – AP 3.1, endereços e total de agentes por Endereços ACS Rua Jornalista Alaíde Pires nr 35 Portuguesa – Ilha do Governador Rua Leopoldo Bulhões nr 1480 Fiocruz Manguinhos 6 6 6 6 6 6 6 6 5 Rua Alpiste nr 913 Penha Circular Avenida Itararé s/n Complexo do Alemão – Ramos Adeus 1 6 6 6 6 6 6 5 5 6 3 PSF Adeus 2 Adeus 3 Rua Reggio nr 358 – Ramos 6 7 1 PSF Esperança Rua João Rego nr 363ª Olaria 8 1 PSF Bahiana Rua Vista Alegre nr 17 Ramos 7 Nova Brasília 1 5 PSF 2 PSF Nova Brasília 2 Nova Brasília 3 Nova Brasília 4 Nova Brasília 5 Vigário Geral 1 6 6 6 6 6 Avenida Itaóca nr 1961 Sala 201 Bonsucesso Rua Antonio Mendes nr 08 Vigário Geral Vigário Geral 2 Caricó 1 2 PSF 2 Caricó 2 Caricó 3 12 6 Rua tenente Luis Dornelles Nr 480 Lj A e B Penha Circular Rua Frei Gaspar Nr 186 Penha Circular Caricó 4 33 Fonte: Secretaria Municipal de Saúde – RJ, ano 2006. 4 7 8 5 Total .................. 205 74 6.2 Características do Sistema de Saúde da Ap. 3.1 Segundo relatório disponível no site da Secretaria Municipal de Saúde (SMS/RJ, 2006) o PSF no Rio de Janeiro foi implantado no último trimestre de 1995, com um módulo na Unidade Integrada de Saúde Manoel Arthur Villaboim, pequeno hospital na Ilha de Paquetá. A SMS, através do Núcleo de Saúde da Comunidade iniciou então estudos viabilizando a implantação de outros módulos do PSF em diversos bairros do município, entre estes: Morro do Borel (2 equipes), Parque Royal (1 equipe), Canal do Anil (2 equipes), Vila Canoas (1 equipe), Vilar Carioca (3 equipes). O Índice de Desenvolvimento Humano- IDH e o risco de saúde e social foram os principais critérios para eleição das áreas de implantação destes módulos. Em 2000, foram implantadas equipes em parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz - ENSP-FIOCRUZ, entre estas: Manguinhos, Curicica e Antares. Em 2003, iniciou-se um amplo processo de expansão da ESF, com implantação de equipes nos Complexos do Caricó e Alemão e em Comunidades da Zona Oeste. A área de planejamento 3.1 foi dividida em 3 (três) blocos, chamados de Microrregiões de Saúde, ou Subsistemas de Saúde, como estratégia de hierarquização dos serviços e de busca de maior equidade (Anexo C). São eles: Subsistema Leopoldina Norte - composto por sete unidades de saúde em uma rede de serviços assim dividida: PACS Caricó, Posto de Saúde Nagib Jorge Farah, Posto de Saúde Vigário Geral, Unidade Municipal de Atendimento Médico Primário Dr. José Breves dos Santos (UMAMP JBS), Policlínica José Paranhos Fontenelle, Hospital Estadual Getúlio Vargas (e em implementação, o Posto de Saúde Marcílio Dias, da Organização Não Governamental - ONG Médicos Sem Fronteiras). Dentro deste subsistema identificam-se duas unidades centrais para onde convergem os atendimentos: a Policlínica José Paranhos Fontenelle (unidade de referência secundária) e o Hospital Getúlio Vargas. Encontra-se 75 incluído neste subsistema a unidade de saúde da família da Penha, onde desenvolvemos parte deste estudo. Subsistema Leopoldina Sul - com quinze unidades de saúde, numa rede de serviços dividida em: Posto de Assistência Médica Maria Cristina Roma Paugartten - ex PAM Ramos, com o anexo (Posto de Urgência Ramos); Centro Municipal de Saúde Américo Veloso (CMS AV); Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria (contando ainda com equipes de Saúde da Família); Instituto Evandro Chagas; Hospital Geral de Bonsucesso; Posto de Saúde 14 de Julho; Posto de Saúde Hélio Schimit; Posto de Saúde Nova Holanda (Convênio Associação de Moradores Nova Holanda); Posto de Saúde Samora Machel; Posto de Saúde Elis Regina; Posto de Saúde Operário Vicente Mariano; Posto de Saúde Gustavo Capanema; e Posto de Saúde Vila do João, Centro de Apoio Psicosocial Fernando Diniz, Posto de Saúde Davi Capistrano Filho (em implantação). Faz parte deste subsistema a unidade de saúde da família do Complexo do Alemão, também contemplada neste estudo. Assim como no Subsistema Leopoldina Norte, a unidade hospitalar (Hospital Geral de Bonsucesso) é referência para o todo o Estado do Rio de Janeiro, o que leva a uma sobrecarga no atendimento e menor disponibilidade aos moradores da AP 3.1, que segundo a distribuição territorial do município deveriam ter seu acesso mais facilitado. A unidade ambulatorial de referência secundária no Subsistema é o PAM Ramos. Esta região é a que concentra o maior grupo populacional em favelas e por isso tem uma oferta de serviços com equipes de PACS e PSF, além de postos de saúde situados dentro das comunidades, sendo estes referência para os demais programas. Subsistema Ilha - oferece uma rede de serviços com nove unidades de saúde, o Centro Municipal de Saúde Necker Pinto; Posto de Assistência Médica Newton Alves Cardozo; Posto de Saúde Madre Teresa de Calcutá; Hospital Municipal Paulino Werneck; Hospital Municipal Nossa Senhora do Loreto; Centro de Apoio Psicosocial Ernesto Nazareth e PSF Parque Royal, 76 além do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e o Instituto Puericultura e Pediatria Matargão Gesteira – IPPMG/UFRJ. A referência de atendimento emergencial da população é o Hospital Paulino Werneck, que oferece serviços de urgência/emergência 24 horas. A referência secundária é dividida entre as unidades PS Madre Tereza de Calcutá (perfil materno-infantil) e o PAM Newton Alves Cardoso (demais clínicas). Há grande demanda por atendimentos em ambulatórios especializados e serviços de apoio e diagnóstico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e do Instituto Puericultura e Pediatria Matargão Gesteira - IPPMG. Estas instituições absorvem pacientes de todo o município do Rio e região metropolitana, sendo referência em alguns casos para a população do Estado. 6.3 Implantação do PSF nas comunidades Sereno, Paz e Fé Segundo informações obtidas em entrevista com um coordenador da CAP 3.1, no bairro da Penha foram implantadas duas equipes de saúde da família no Grotão e outras duas equipes no Sereno. As primeiras abrangem as comunidades do Caracol, do Grotão e parte da Caixa d’Água. As equipes da unidade do Sereno assistem às comunidades Sereno, Paz, Fé e a outra parte da Caixa d’Água. Nesta unidade demos início a este estudo. A unidade do Sereno funciona em uma casa de alvenaria com 2 andares, distribuída da seguinte forma: no andar superior está o acolhimento (recepção), sala de imunização, sala de curativo, 2 consultórios de atendimento de enfermagem e consulta médica, uma farmácia, 2 banheiros para uso dos profissionais e dos usuários. No andar inferior localiza-se uma sala que destina-se a várias atividades, como reuniões das equipes, atualização de cadastros, avisos entre outras não relacionadas ao 77 atendimento externo da comunidade. Há um consultório onde são realizadas as consultas médicas ou atendimento de enfermagem, um banheiro de uso exclusivo dos profissionais, almoxarifado e uma pequena sala de esterilização. Na área de fundos há um quintal e uma sala onde estão montados 2 consultórios odontológicos, pia de escovação e área de serviços gerais. 6.3.1 Comunidade da Fé, características geográficas e ambientais Durante a realização do trabalho, foram registradas muitas explicações em relação à origem do nome com o qual o Morro da Fé foi batizado. Segundo os Agentes Comunitários de Saúde responsáveis pelas micro-áreas dessa Comunidade, em um primeiro momento, esta recebeu o nome de Morro do Aipim, em virtude do grande número de plantações do tubérculo. No entanto, devido à construção de uma igreja católica em meio à vegetação, um vigia da pedreira denominou a Comunidade de Fé. Além disso, muitas igrejas evangélicas foram sendo construídas na Comunidade, fortalecendo ainda mais o nome de Morro da Fé. Os moradores mais antigos têm uma outra versão para a origem do Morro da Fé. Segundo eles, algumas famílias construíram casas no morro e algum tempo depois foram ameaçadas de despejo, já que quatro pessoas se identificaram como donos do terreno e reivindicaram a posse das terras, solicitando a saída dessas famílias. Por outro lado, esses primeiros moradores, visando à sua permanência no local, buscaram orientação na FAFERJ (Federação das Favelas do Estado do Rio de Janeiro) e na Fundação Leão XIII. Orientados pelo advogado da Fundação Leão XIII, obtiveram um estatuto para regularizar sua situação de moradores e proprietários de suas habitações. Aos poucos, a opressão das pessoas que se diziam donas da propriedade foi se esvaindo e os moradores realmente se apoderaram das terras em que já viviam, fundando assim uma Associação de Moradores. Com isso, doze moradores foram nomeados como fundadores da Comunidade e, uma vez que dentre eles havia três membros da Assembléia de 78 Deus, que recorreram a orações durante todo esse processo de opressão, sugeriu-se a denominação de Fé à Comunidade. O relato de um dos moradores mais antigos da Comunidade informa a origem do nome. “Tinha três membros da Associação que eram da Igreja Assembléia de Deus e como a igreja ajudou muito eu sugeri o nome de Morro da Fé. Todo mundo aplaudiu de pé.” (Morador da comunidade da Fé há 40 anos). A ocupação do território se deu por imigração, principalmente do Ceará, Espírito Santo e Minas Gerais. No início, não havia água encanada, apenas duas únicas torneiras de onde todos os moradores abasteciam suas casas. Quando faltava água nessas torneiras, eles recorriam ao poço existente na Comunidade, que acabou dando nome a uma das ruas mais importantes da Comunidade, a Praça do Poço. O território é acidentado e úmido, provido de muitas escadas e rampas íngremes, sendo o chão de algumas ruas revestido por paralelepípedo. Apresenta duas pedreiras, que podem constituir risco para os moradores mais próximos, os quais, a despeito de o POUSO (Posto de Orientação Urbanística Social da Secretaria Municipal de Urbanismo) ser atuante e advertir negativamente com relação à construção nessas áreas, invadem as mesmas com a autorização do tráfico. O mesmo ocorre em áreas de reflorestamento, estratégia de preservação vegetativa do POUSO no sentido de evitar a aglomeração em situações de risco. As áreas de reflorestamento são bem rurais, caracterizadas pela criação de suínos. Algumas casas foram construídas pela Prefeitura no Projeto Favela Bairro, em localização bem próxima das pedreiras. Em algumas áreas, o esgoto corre pelas casas e há a proliferação de ratos, fazendo-se imprescindíveis ações de saneamento básico. Em geral, as moradias são feitas de tijolo e cimento, mas ainda existem algumas feitas de taipa e sem sanitários. 79 A coleta de lixo nas áreas mais acidentadas e altas da Comunidade acontecesemanalmente. Nas demais áreas, a freqüência é diária. O correio entrega as cartas na Associação de Moradores, a qual é responsável pela distribuição das mesmas, sendo que só recebe suas correspondências aqueles que tiverem efetuado o pagamento da taxa de R$5,00 para a associação. Não há nenhuma rádio ou jornal comunitário no Morro da Fé. No entanto, a maioria das pessoas tem telefone em suas residências e alguns têm acesso à Internet. Há também dois telefones públicos na Comunidade, sendo que um deles está localizado dentro da Associação de Moradores. Segundo os Agentes Comunitários de Saúde, praticamente todos têm acesso a uma TV por assinatura pirata, apelidada de “GatoNet”, cujo provedor se localiza no Grotão e transmite os canais da Sky para os moradores. 6.4 A Implantação do PSF na Comunidade do Alemão Segundo informações fornecidas através de entrevista por um coordenador da CAP, o morro do Alemão conta com cerca de 17 mil habitantes, é uma das 13 comunidades do Complexo do Alemão,cuja população estimada é em torno de 40 mil pessoas. O Morro do Alemão contava inicialmente com um posto de saúde, sendo posteriormente transformado em PSF. Atualmente conta com cinco equipes de saúde da família, das quais duas participaram do presente estudo. O módulo do Alemão funciona em um prédio de alvenaria de três andares. No primeiro andar funciona o acolhimento (recepção), 2 consultórios para atendimento de enfermagem e consultas médicas, uma sala de imunização, uma farmácia, sala de curativo, 2 banheiros para uso da comunidade e 3 consultórios dentários. No segundo andar encontramos 3 consultórios, uma sala de espera para onde são encaminhados os usuários para aguardar o atendimento do médico ou da enfermagem. Nesta 80 sala há várias cadeiras, ar condicionado e um aparelho de televisão que permanece ligado durante o período de permanência de usuários na sala. Uma outra sala destina-se a realização de atividades educacionais, reuniões de equipe e grupos de usuários, como por exemplo, o de escuta e a reunião do Comitê Ético. Neste mesmo andar encontramos, um almoxarifado, a sala de esterilização de alguns materiais de uso médico e enfermagem e da odontologia. Os dois banheiros presentes neste andar destinam-se ao uso exclusivo dos profissionais do módulo, e bem próximo aos banheiros encontramos os armários de aço para guardar os utensílios pessoais dos profissionais. Em uma outra sala funciona uma espécie de setor administrativo da unidade, com computadores e arquivos. O último andar é um terraço coberto onde são realizadas algumas atividades como um grupo de alongamento e também as confraternizações da equipe e da comunidade. 6.4.1 História da comunidade do Alemão Segundo o site da Secretaria Municipal de Saúde (SMS/RJ, 2006) os primeiros habitantes da região foram os índios Tamoios; a colonização portuguesa iniciou-se no século XVI e XVII com a chegada dos jesuítas e militares. A região era conhecida como subúrbio de Inhaúma (nome dado em homenagem a um pássaro muito comum na região, hoje em extinção), rica em rios o que facilitava a produção agrícola, sendo uma das regiões mais importantes do Rio de Janeiro, além de ter o mar nas proximidades facilitando o escoamento da produção e do ouro vindo das Minas Gerais. Com a chegada da família Rego, e a conseqüente compra da fazenda onde se localizava a Serra da Misericórdia (Morro do Alemão), iniciou-se a divisão das terras, o que se intensificou com a venda das mesmas, após a morte do Major Rego, para Leandro da Motta. 81 Em 1951, após a Segunda Guerra Mundial, chegou ao Brasil um polonês de nome Leonard Kaczmarkiewicz, apelidado de “Alemão” que comprou parte das terras e as dividiu em lotes, dando assim início à ocupação do conhecido Complexo do Alemão. Na década de 80, o serviço de energia elétrica chegou à comunidade por intermédio da associação de moradores e do Governo do Estado. Nesta mesma época também se iniciou a distribuição de água e a estruturação do sistema de esgoto. Hoje, o Complexo do Alemão possui uma população estimada de aproximadamente 40 mil pessoas, e abriga as comunidades do Alemão, Grota, Nova Brasília, Alvorada, Matinha, Mineiros, Itararé, Esperança, Palmeiras, Morro do Adeus, Baiana e Reservatório de Ramos (SMS –RJ, 2006). O Complexo é marcado pela pobreza, violência e exclusão social, apresentando baixo Índice de Desenvolvimento Humano -IDH (0,587) e esperança de vida de 56,72 anos, além do alto índice de desemprego e baixa escolaridade. Este cenário fez com que a SMS-Rio identificasse o Complexo do Alemão como área prioritária para a implantação da estratégia de saúde da família no município do Rio de Janeiro. 82 7 RESULTADOS 7.1 Atividades básicas diárias das equipes do Programa Saúde da Família - PSF As atividades desenvolvidas pelas equipes estudadas seguem, de uma maneira geral, as normas e orientações preconizadas pelo Guia Prático do Programa Saúde da Família Brasil (2001). Apresentam delimitação de território, adscrição de clientela e diagnóstico local de saúde. Estas características, porém, definem particularidades de um território vivo, marcado pela estrutura física das divisões das ruas e suas limitações, como também pelos próprios estilos de vida, aspectos culturais, dispositivos sociais, movimentos locais e organizações comunitárias ali atuantes. Apresentamos a seguir, de maneira sintética, algumas características de cada comunidade acompanhada pelas equipes, tendo por base os dados fornecidos pelo Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB), atualizados nos meses de agosto e outubro de 2006. Esses dados foram construídos durante a fase de cadastramento das famílias por meio de informações declaradas pelas mesmas, através da ficha A - Ficha de Cadastro - (Anexo D), atualizada ao longo do acompanhamento das famílias. Ao final dos quadros-síntese das quatro comunidades, faremos algumas considerações sobre o conjunto apresentado. O SIAB (Anexo F) é alimentado mensalmente pelos dados obtidos através do cadastramento e acompanhamento das famílias, é um instrumento elaborado pelo Ministério da Saúde com o propósito de agregar dados sobre a população de área de abrangência das equipes do PSF. É considerado um instrumento importante de avaliação dos indicadores e serviços de saúde a serem programados de acordo com os resultados em cada área. Constituise assim, em uma forma de planejamento, acompanhamento e avaliação das ações de saúde. As equipes que participaram do presente estudo são identificadas aleatoriamente em “A”, “B”, “C”, “D”, de maneira a preservar melhor o anonimato dos informantes. Cada uma 83 das quatro equipes estudadas apresenta a mesma constituição: 1 médico, 1 enfermeiro, 1 dentista (para cada duas equipes), 1 auxiliar de enfermagem, 1 técnico de higiene dental e 5 ou 6 ACS. 7.1.1 Comunidade adscrita à Equipe A - População Cadastrada: 2944 (Dois mil novecentos e quarenta e quatro) moradores distribuídos em 850 famílias. Quadro 4 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe A Sexo/Faixa < 1 >1a 4 > 4 a 6 > 6 a 9 > 9 a 14 > 14 a 19 > 19 a 39 > 39 a 49 > 49 a 60 etária Feminino 20 85 66 109 157 139 512 193 165 Masculino 10 87 66 81 147 128 456 164 123 Total 30 172 132 190 304 267 968 357 288 Fonte: SIAB (Agosto/2006) > 60 Total 142 94 236 1588 1356 2944 - Escolaridade: 1619 pessoas (54,99%) com ensino fundamental incompleto, 417 (14%) não sabem ler e escrever, 252 (8,56%) com o ensino médio completo, 219 (7,44%) com ensino médio incompleto. - Situação profissional: 689 (20,01%) com emprego formal, 549 (18,65%) estavam desempregados, 363 (12,33%) com emprego informal. - Cor: 1136 (38,59%) pardos, 1032 (35,05%) brancos e 663 (22,62%) pretos. - Moradias: 776 (91,29%) de tijolo, 29 (3,41%) de taipa não revestida e 25 (2,94%) de madeira. - Abastecimento e tratamento da água: 822 moradias (96,71%) ligadas à rede pública. Em 572 moradias (67,29%), os habitantes fazem uso de água filtrada; em 249 (29,29%), não realizam qualquer tratamento, e em 11 (1,29%), fervem a água. - Esgotamento sanitário: 836 (98,35%) moradias com algum sistema de esgoto e 11 (1,29%) com lançamento a céu aberto. 84 - Renda familiar: 425 famílias (50%) com renda familiar maior de 1 até 2 salários mínimos; 165 (19,53%), mais de ½ até 1 salário mínimo; 143 (16,82%), mais de 2 até 5 salários mínimos. - Plano de Saúde: 2728 moradores (92,66%) não possuem. Em caso de doença, 730 (75,26%) procuram o hospital público; 195 (20,10%), outra unidade pública de saúde, e 19 (1,96%), unidades de saúde da rede privada. - Plantas Medicinais: 608 (71,53%) não fazem uso, enquanto 231 (27,18%) as utilizam. - Participação em grupos na comunidade: 122 moradores (4,14%) participam, sendo 100 (81,96%) em grupos religiosos, 13 (10,65%) em associações e 9 (7,37%) em cooperativas. - Meios de comunicação: televisão 746 (48,41%), rádio 634 (41,14%), 117 (7,59%) jornal, e 31 (2,01%) revistas. Vale ressaltar que uma mesma família poderia optar por dois ou mais meios de comunicação. 7.1.2 Comunidade adscrita à Equipe B - População: 3018 moradores distribuídos em 856 famílias. Quadro 5 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe B Sexo/Faixa < 1 >1a 4 > 4 a 6 > 6 a 9 > 9 a 14 > 14 a 19 > 19 a 39 > 39 a 49 > 49 a 60 Etária Feminino 21 115 47 103 155 142 540 197 137 Masculino 26 113 70 79 133 131 523 167 121 Total 47 228 117 182 288 273 1063 364 258 Fonte: SIAB (Agosto/2006) > 60 Total 127 71 198 1584 1434 3018 - Escolaridade: 1632 pessoas (54,08%) com ensino fundamental incompleto, 442 (14,65%) não sabem ler e escrever, 280 (9,28%) alfabetizadas, 217 (7,19%) com ensino médio incompleto. - Situação profissional: 700 (23,19%) desempregados, 532 (17,63%) com emprego formal, 377 (12,49%) com emprego informal. - Cor: 1519 (50,33%) brancos, 916 (30,35%) pardos e 572 (18,95%) pretos. 85 - Moradias: 829 (96,85%) de tijolo, 14 (1,64%) de madeira e 04 (0,47%) de taipa não revestida. - Abastecimento e tratamento da água: 850 moradias (99,30%) ligadas à rede pública. Em 658 moradias (76,87%), os habitantes fazem uso de água filtrada; em 157 delas (18,34%), não realizam qualquer tratamento, e em 23 (2,69%), fervem a água. - Esgotamento sanitário: 851 (99,42%) moradias com algum sistema de esgoto e 5 (0,58%) com lançamento a céu aberto. - Renda familiar: 408 famílias (47,66%) com renda familiar maior de 1 até 2 salários mínimos; 182 (21,26%), com mais de 2 até 5 salários mínimos; 107 (12,50%), com mais de ½ até 1 salário mínimo e 24 (2,80%), com até ½ salário mínimo. - Plano de Saúde: 2807 moradores (93,01%) não possuem. Em caso de doença, 720 (65,69%) procuram o hospital público; 288 (26,28%), outra unidade pública de saúde, e 61 (5,57%), unidades de saúde da rede privada. - Plantas Medicinais: 608 (71,03%) não fazem uso, enquanto 214 (25,00%) as utilizam. - Participação em grupos na comunidade: 228 moradores (7.55%) participam, sendo 143 (62,71%) em grupos religiosos, 38(16,66%) em outros grupos, 35(15,35%) em associações e 12 (5,26%) em cooperativas. - Meios de comunicação: televisão 727 (49,76%), rádio 611 (41,82%), 79 (5,41%) jornal, e 21 (1,44%) revistas. 7.1.3 Comunidade adscrita à Equipe C A equipe “C” é responsável pelo acompanhamento de 925 famílias cadastradas e 3279 pessoas. Estas estão distribuídas nas seguintes faixas etárias: 86 Quadro 6 – Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe C Sexo < 1 >1ª 4 > 4 a 6 > 6 a 9 > 9 a 14 > 14 a 19 > 19 a 39 > 39 a 49 > 49 a 60 Feminino 14 71 59 Masculino 10 76 65 Total 24 147 124 Fonte: SIAB (Outubro/2006) 105 105 210 157 168 325 148 157 305 567 525 1092 233 198 431 184 133 317 > 60 Total 168 136 304 1706 1573 3279 - Escolaridade: 1637 pessoas (49,92%) com ensino fundamental incompleto, 444 (13,54%) não sabem ler e escrever, 268 (8,17%) ensino fundamental completo, 261 (7,96%) com ensino médio incompleto. - Situação profissional: 774 (23,79%) com emprego formal, 696 (21,40%) desempregado, 448 (13,77%) com emprego informal. - Cor: 1434 (44,08%) não informaram, 840 (25,82%) brancos, 749 (23,02%) pardos e 226 (6,95%) pretos. - Moradias: 819 (99,35%) de tijolo, 04 (0,43%) de adobe e 01 (0,11%) de taipa revestida. - Abastecimento e tratamento da água: 919 moradias (99,35%) ligadas à rede pública. Em 730 moradias (78,92%), os habitantes fazem uso de água filtrada; em 156 delas (16,86%), não realizam qualquer tratamento, e em 33 (3,57%), fervem a água. - Esgotamento sanitário: 867 (93,73%) moradias com algum sistema de esgoto e 45 (4,86%) com lançamento a céu aberto. - Renda familiar: 386 famílias (41,73%) com renda familiar maior de 1 até 2 salários mínimos; 353 (38,16%), mais de 2 até 5 salários mínimos; 83 (8,97%), mais de 1/2 até 1 salário mínimo e 29 (3,14%) vivem de doações;. - Plano de Saúde: 3077 moradores (93,84%) não possuem. Em caso de doença, 825 (66,32%) procuram o hospital público; 318 (25,56%), outra unidade pública de saúde, e 82 (6,59%), unidades de saúde da rede privada. - Plantas Medicinais: 433 (46,81%) não informaram, 314 (33,95%) não utilizam e 178 (19,24%) utilizam. - Participação em grupos na comunidade: 302 moradores (9,21%) participam, sendo 269(89,07%) em grupos religiosos, 17 (5,63%) outros, 10 (3,31%) em associações e 06 (1,99%) em cooperativas. 87 - Meios de comunicação: televisão 862 (45,18%), rádio 615 (32,23%), 222 (11,64%) jornal, e 104 (5,45%) revistas. Vale mencionar que uma mesma família poderia optar por dois ou mais meios de comunicação. 7.1.4 Comunidade adscrita à Equipe D - População: 2989 moradores distribuídos em 834 famílias. Quadro 7 - Distribuição da população cadastrada por gênero e faixa etária equipe D Sexo < 1 >1a 4 > 4 a 6 > 6 a 9 > 9 a 14 > 14 a 19 > 19 a 39 > 39 a 49 > 49 a 60 Feminino Masculino 10 17 82 78 52 57 Total 27 160 109 Fonte: SIAB (Outubro/2006). > 60 Total 105 124 158 168 128 136 509 462 201 166 128 133 165 110 1538 1456 229 326 264 971 367 261 275 2989 - Escolaridade: 1482 pessoas (49,58%) com ensino fundamental incompleto, 316 (10,57%) com fundamental completo, 268 (8,97%) não informaram, 261 (8,73%) não sabem ler e escrever e 224 (7,49%) ensino médio completo. - Situação profissional: 579 (19,14%) com emprego formal, 503 (16,63%) com emprego informal, 488 (16,13%) desempregado. - Cor: 1354 (44,76%) pardos, 743 (24,56%) brancos, 572 (18,91%) pretos e 340 (11,24%) não informaram. - Moradias: 795 (95,32%) de tijolo, 21 (2,52%) de taipa não revestida, 10 (1,20%) taipa revestida. - Abastecimento e tratamento da água: 830 moradias (99,52%) ligadas à rede pública. Em 543 moradias (65,11%), os habitantes fazem uso de água filtrada; em 220 delas (26,38%), não realizam qualquer tratamento, e em 52 (6,24%), usavam cloro. - Esgotamento sanitário: 819 (98,20%) moradias com algum sistema de esgoto e 14 (1,68%) com lançamento a céu aberto. 88 - Renda familiar: 303 famílias (36,33%) com renda familiar maior de 1 até 2 salários mínimos; 250 (29,98%), mais de 2 até 5 salários mínimos; 125 (14,99%), mais de 1/2 até 1 salário mínimo, 64 (7,67%) ignorada e 37 (4,44%) vivem de doações. - Plano de Saúde: 2778 moradores (92,94%) não possuem. Em caso de doença, 566 (45,68%) procuram unidade pública de saúde; 544 (43,91%) hospital público, 89 (7,18%), unidades de saúde da rede privada. - Plantas Medicinais: 384 (46,04%) não utilizam, 315 (37,77%) utilizam e 135 (16,19%) não informado. - Participação em grupos na comunidade: 261 moradores (8,73%) participam, sendo 231(88,50%) em grupos religiosos, 15 (5,74%) outros, 08 (3,06%) em cooperativas e 07 (2,68%) em associações. - Meios de comunicação: televisão 771 (42,93%), rádio 680 (37,86%), 150 (8,35%) outros, 127 (7,07%) jornal e 66 (3,67%) revistas. Vale mencionar a opção por dois ou mais meios de comunicação. A partir da consolidação dos dados obtidos apresentados acima, evidenciamos uma maior representatividade do gênero feminino, com 6416 (52,43%) mulheres e 5819 (47,57%) homens. Referindo-se à faixa etária, evidenciamos que prevalece o grupo de até 19 anos, seguindo-se a faixa de 19 a 39 anos, dados semelhantes nas quatro equipes em estudo. Quanto ao nível de escolaridade os resultados mais elevados foram para o ensino fundamental incompleto, com 6370 (62,2%) seguindo-se de analfabetismo com 1564 (15,2%) pessoas. Não há registro de moradores com ensino superior. Em relação à situação profissional, tivemos nas quatro equipes um maior número de emprego formal, com 2574 (38,4%) pessoas, seguido de 2433 (36,3%) desempregados. A maioria das famílias acompanhadas, aproximadamente 3421 (98%) estão ligadas a rede de abastecimento público de água. Os meios de comunicação mais mencionados foram a televisão e o rádio. 89 Os dados relacionados a cor foram obtidos através de informações declaradas pelos próprios moradores no momento do cadastro das famílias, havendo predominância da cor parda, seguindo-se da branca. Temos uma predominância das casas de alvenaria, com água potável e sistema de esgoto. Um dado relevante é quanto à participação dos moradores em grupos: dos que participam, tivemos um maior resultado para grupos religiosos, com um total de 793 (86,8%) pessoas nas quatro equipes, apresentando principalmente uma grande influência das igrejas evangélicas nas comunidades. Não foi possível identificarmos as principais cooperativas presentes nas comunidades. 7.2 Perfil sócio-demográfico dos ACS que participaram da pesquisa Apresentaremos a seguir um quadro com os dados dos ACS quanto a: sexo, idade, escolaridade, religião e atividade profissional anterior ao PSF. Quadro 8 - Identificação dos agentes quanto: ao sexo, idade, escolaridade, religião e atividade profissional anterior ao PSF. Atividade Identificação Sexo Idade Escolaridade Religião profissional anterior Equipe “A” F 33 Fundamental Católica Do lar ACS - 1 Equipe “B” F 41 Médio Evangélica Recreadora de Creche ACS – 2 Equipe “B” Fundamental Corretora de seguro F 30 Evangélica ACS – 3 Incompleto de saúde Equipe “A” F 48 Médio Católica Costureira ACS – 4 Equipe “B” Médio F 25 Evangélica Cabeleireira ACS – 5 incompleto Equipe “C” Médio M 39 Católica Promotor de vendas ACS - 6 incompleto Equipe “C” F 25 Médio Católica Costureira ACS – 7 Equipe “C” M 37 Médio Evangélica Vigilante ACS – 8 Equipe “C” Fundamental F 39 Católica Vendedora ACS – 9 Incompleto Equipe “D” F 44 Médio Católica Guarda ACS – 10 Equipe “D” F 42 Médio Católica Recreadora de Creche ACS – 11 Equipe “D” Médio F 34 Espirita Vendedora ACS - 12 incompleto 90 A identificação destas informações nos possibilitou traçar um perfil dos ACS, permitindo uma aproximação com suas realidades, as quais estão relacionadas com o desempenho de suas atividades. Estas informações representam dados significantes para programações futuras de contratação de novos profissionais. Contamos com a participação de dez mulheres e dois homens, sendo assim nossa amostra é representada em sua maioria por mulheres. Resultados semelhantes foram encontrados nos trabalhos de Silva & Dalmaso (2002) e Martins et al (1996). Se considerarmos a história de constituição do PACS, percebemos que a prioridade de contratação era dada às mulheres, baseando-se na idéia de que estas seriam capazes de estimular uma posição mais ativa de outras mulheres da comunidade onde moram, o que seria facilitado por apresentarem semelhanças nas condições de vida. De acordo com Minayo; D'elia e Svitone (1990), uma outra contribuição para esta condição era a possibilidade de promover medidas educativas principalmente direcionadas ao grupo materno-infantil, com o intuito de se reduzir a mortalidade, através do incentivo ao aleitamento materno e uso de soro caseiro. Em nossa amostra as idades variaram entre 25 e 48 anos, prevalecendo dez mulheres na faixa etária acima de 30 anos e apenas duas com 25 anos. O que está de acordo com os prérequisitos do MS, que exige idade acima de 18 anos. Ferraz & Aerts (2005) comentam que os agentes de saúde com mais idade tendem a conhecer melhor a comunidade, apresentam maiores laços de amizades, podendo ter também maiores inimizades ou conflitos com alguns moradores da comunidade, apresentam seus conceitos sobre o processo saúde-doença mais arraigados, apresentando assim, uma maior tendência a resistências a novos conhecimentos. Em relação à escolaridade dos agentes, sete apresentavam o ensino médio concluído, dois o ensino médio incompleto e três o ensino fundamental. Estes dados mostraram que o nível de escolaridade encontra-se acima do que o exigido pelo MS. 91 A religião pode ser considerada uma informação importante no desempenho das atividades dos agentes, principalmente quando nos referimos às comunidades carentes, onde a religião apresenta forte influência no comportamento das pessoas, influenciando muitas vezes nas condições de saúde-doença-cura. Como forma de facilitar a visualização de outras características relevantes dos ACS, optamos por colocá-las em um outro quadro, contendo as seguintes informações: tempo de moradia na comunidade, tempo de trabalho no PACS/PSF, tempo de trabalho na equipe atual, número de famílias acompanhadas e uma palavra que representa seu trabalho. Quadro 9 - Informações sobre o tempo de moradia na comunidade, tempo de trabalho no PACS/PSF e na equipe atual, número de famílias acompanhadas e uma palavra que representa seu trabalho. Tempo de Tempo de Tempo de Palavra que Nº de famílias Identificação trabalho na trabalho no moradia na representa seu acompanhadas equipe atual PACS/PSF Comunidade trabalho Equipe “A” Ajudar a 3 Anos 5 Anos 33 Anos 165 ACS - 1 comunidade Equipe “B” 3 Anos 5 Anos 41 Anos 178 Sinceridade ACS – 2 Equipe “B” 3 Anos 5 Anos 30 Anos 173 Ser verdadeiro ACS – 3 Equipe “A” 3 Anos 5 Anos 48 Anos 200 Gratificação ACS – 4 Equipe “B” 3 Anos 4 Anos 15 Anos 180 Liberdade ACS – 5 Equipe “C” 3 Anos 3 Anos 6 Anos 161 Perseverança ACS - 6 Equipe “C” 3 Anos 3 Anos 25 Anos 170 Acolher ACS – 7 Equipe “C” 2,8 Anos 2,8 Anos 37 Anos 175 Esperança ACS – 8 Equipe “C” 1,6 Anos 3 Anos 7 Anos 185 Esperança ACS – 9 Equipe “D” Respeito a 3 Anos 3 Anos 44 Anos 160 ACS – 10 comunidade Equipe “D” Reconhecimento 3 Anos 3 Anos 40 Anos 157 ACS - 11 da comunidade Equipe “D” 3 Anos 3 Anos 34 Anos 160 Esperança ACS - 12 Um outro dado bastante interessante é quanto ao tempo de moradia na comunidade, no qual obtivemos como resultado que dez agentes residiam na comunidade desde a infância, o que facilita sua transição em toda a comunidade e a confiança por parte das famílias. 92 Para Carvalho (2002), o ACS, por ser morador da área, tem laços de amizades e conhece de perto as condições da sua comunidade, favorece a horizontalidade das relações e constroe gradativamente a credibilidade do trabalho. Além das atribuições propostas pelo PSF, os agentes sentem-se envolvidos com os problemas encontrados na comunidade, buscando soluções externas à unidade de saúde. No horário extra ao trabalho, as mulheres denominaram-se como donas de casa, responsáveis pelo cuidado dos filhos, educação, alimentação, atividades domésticas, outras atividades e ainda o atendimento no seu próprio domicílio a moradores que buscam informações sobre os serviços de saúde, e até mesmo o acompanhamento de alguns indivíduos para serviço de emergência. Alguns agentes relataram desenvolver suas atividades fora de seu horário de trabalho, na sua própria casa, no supermercado, na igreja. Neste período, suas atividades não são quantificadas nos registros do SIAB, como veremos na seguinte fala: “Como eu moro na parte de cima da comunidade, eu conheço de cima para baixo, tanto é que à noite vão bater na minha porta, pessoas de outras áreas, de outras equipes. Às vezes eu de férias eles (moradores) foram atrás daquele exame de ressonância magnética, coisa que nem oferece aqui (USF). A gente não pode ir na feira, ir no supermercado, todo mundo te pára p’ra pedir informação, e você tem que dá, até de outras equipes e você tem que dá conta”. De acordo com o tempo de trabalho na equipe, podemos perceber que a maioria dos agentes encontram-se desde a implantação do PSF na comunidade, e outros acompanharam a proposta de transição do PACS para PSF (Equipes “A” e “B”). Estes dados indicam a pouca rotatividade destes profissionais, principalmente quando comparados com os demais membros da equipe técnica. Como já mencionado anteriormente, os ACS são responsáveis pelo acompanhamento de 150 à 180 famílias (BRASIL, 2001). De acordo com os resultados obtidos, dois agentes apresentaram um número acima do que foi estabelecido pelo MS. 93 7.3 O ACS como representante da comunidade de atuação Dos doze agentes que participaram do estudo, dez responderam que sua inserção no PACS/PSF se deu pela situação de desemprego no momento do processo seletivo para agente comunitário de saúde. Após iniciarem o trabalho, passaram a demonstrar maior interesse em ajudar sua comunidade, apresentando planos e expectativas futuras em prol de melhores condições dos moradores. “No momento eu estava desempregado né, e como tinha acontecido essa oportunidade de haver esse concurso para a comunidade, e eu já estava morando aqui, então achei interessante fazer” “Foi através da divulgação, vamos tentá né, e vê o que a gente pode consegui dentro dessa comunidade. Ai eu fiz, mas pensava que não ia dá em nada, eu fiz passei, legal vou fazer alguma coisa pela comunidade né, têm muita gente carente, eu acho que nem é doença não, eu acho que é mais o lado espiritual. Eu tava desempregada, e tenho dois filhos pequenos, então é muito complicado trabalhar fora, e dentro da comunidade eu poderia estar de olho neles né”. “O que me motivou a trabalhar como agente de saúde em primeiro lugar foi o salário, no primeiro mês, o salário foi mais importante, depois foi uma coisa assim, que eu gostava de trabalhar no posto de saúde, ai eu fui ficando, fui gostando de trabalhar com a comunidade”. “Foi a necessidade de emprego, que eu não tinha, e eu gosto de trabalhar com público”. “O que me levou a trabalhar, pra falar a verdade foi a precisão, no início né. (...). Eu precisava, meu esposo tava desempregado né, e eu era só do lar, aí teve na associação um cartaz dizendo que iam selecionar agente de saúde para trabalhar pelo PACS, aí eu fiquei, como estava precisando, tinha uma filha pequena (...) daí fizemos um treinamento, daí comecei a trabalhar no PACS aí eu fui pegando apego com as famílias, gostando do trabalho que fazia, aí eu fiquei até hoje no PACS, depois PSF”. Souza (2000) menciona que a convivência com a sua própria comunidade estimula em interesse por melhores condições de vida no local, passando a representá-la mais ativamente junto aos demais membros da equipe de saúde. Silva & Dalmaso (2002) encontraram como resultado no Projeto Qualis em São Paulo que ser agente comunitário de saúde aparece como uma oportunidade de reingresso no mercado de trabalho, para um menor número representou uma etapa de profissionalização e remuneração do trabalho já desenvolvido com a comunidade e maior possibilidade da ajudar as famílias. 94 Ao serem questionadas sobre a participação em atividades voluntárias direcionadas às comunidades, nove agentes responderam já haver realizado este tipo de atividade antes de sua inserção no PACS/PSF, como podemos observar nas seguintes falas: “Eu sempre trabalhei na igreja, desde os quatorze anos, eu sou evangélica e sempre trabalhei na parte social da igreja, visita de criança no berçário, era feito com a equipe da igreja, a gente visitava a criança e levava um presentinho. Essas visitas eram mais aos recém-nascidos e os afastados da igreja”. “Trabalhava só na associação, porque eu sempre adorei trabalhar com criança, então na minha própria casa nós fazíamos sessões de cinemas, tentava ver passeios que eu consegui juntamente com a escola de meus filhos, eu sempre fiz isso”. “Eu tinha atividade na igreja, eu fazia parte do departamento infantil e juvenil, trabalhava com crianças e adolescentes”. “Eu já fui presidente de escola de samba, presidente de velha-guarda, eu já lidei muito com o público na comunidade mesmo”. 7.4 A observação do processo de trabalho dos ACS Com base nas anotações realizadas no diário de campo durante o acompanhamento dos ACS e de outros membros das equipes, apresentamos a seguir as principais ações e orientações observadas, como também algumas considerações sobre as relações dos ACS estabelecidas com as famílias e a comunidade. A maioria das atividades dos ACS é realizada fora da unidade de saúde, constituindose principalmente por visitas domiciliares (VD) e ações educativas. Porém, realizam também atividades internas na unidade de saúde, entre as quais: acolhimento, atender ao telefone, atualização de cadastros das famílias, identificação de outros ACS responsáveis pelo acompanhamento de famílias ainda não cadastradas, participação em grupos educativos com os usuários e capacitações profissionais. O acolhimento faz parte da atividade realizada na porta de entrada da unidade de saúde, com participação de todos os profissionais. As equipes apresentam uma escala, 95 contando com a participação de todos, no dia em que cabe a responsabilidade da equipe por esta atividade. Assim, a equipe fica na entrada da unidade (recepção) recebendo os usuários que buscam atendimento ou informações. Os agentes comunitários ao desenvolverem esta atividade facilitam a entrada dos usuários ao serviço, identificando suas demandas e encaminhando-as de acordo com as necessidades. Ouvem as queixas dos usuários e fornecem uma explicação sobre os possíveis encaminhamentos existentes. Demonstraram estar bem integrados ao funcionamento da unidade, procurando muitas vezes a solução em outras equipes, o que demonstrava uma articulação entre todos os profissionais que atuam na mesma unidade. Observamos que é bastante comum a busca por informações sobre como agendar atendimento na unidade. Nestas ocasiões, procura-se identificar o agente responsável pelo acompanhamento da família. Isso se dá pela alta rotatividade dos moradores na comunidade, bem como pela não realização do cadastramento, o que acontece freqüentemente porque o ACS não encontra a família no seu horário de trabalho. O serviço de acolhimento facilita identificar as necessidades dos usuários, com a valorização de suas expressões culturais e demandas. Deslandes (2004, p. 13) afirma que: “a ampliação da noção do cuidado em saúde demanda uma valorização das expectativas e demandas dos próprios usuários, reconhecendo sua autonomia e legitimidade simbólicas, cujas manifestações, a princípio, não são delegáveis a tradutores- intérpretes”. A visita domiciliar é uma das principais atividades do agente comunitário (BRASIL, 2001b). Esta permite ao agente conhecer mais profundamente o contexto em que se dão as condições de vida dos usuários, tanto no âmbito individual como familiar, considerando suas especificidades, o que a partir daí, orientará suas ações. A rotina de trabalho do agente tem início às 8:00 horas, quando acontece uma reunião com o enfermeiro supervisor de cada equipe. Nela, os ACS expõem as situações-problema identificadas durante as VD’s realizadas no dia anterior, dão sugestões e fazem comentários sobre os casos, na busca de soluções. A reunião é vista pelos ACS como um espaço de 96 compartilhamento, aproximação, discussão e planejamento das atividades. Alguns agentes comentaram que estas reuniões às vezes não acontecem, e no caso de algum problema identificado, que necessite ser comunicado, o agente procura diretamente o médico ou enfermeiro para buscar uma orientação. Além das reuniões diárias que acontecem no início da manhã, os ACS também participam das reuniões semanais da equipe de saúde, realizadas geralmente às 6as. feiras. Acompanhamos cinco reuniões semanais das equipes, as quais muitas vezes contam com a participação de supervisores do Grupo de Apoio Técnico (GAT), vinculado à SMS – Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro. Observamos que as temáticas que receberam maior ênfase nas reuniões semanais foram as relacionadas à programação do trabalho em equipe, principalmente as atividades vindas sob orientação do Grupo de Apóio Técnico (GAT). Entre estas, destacamos: - Atualização das fichas A - (cadastro das famílias); - Programação semanal para visita domiciliar com outros membros da equipe; - Planejamento de outras atividades a serem realizadas na semana seguinte à reunião; - Escala do agente no acolhimento da unidade; - Atualização do esquema de vacinação dos próprios agentes de saúde; - Utilização do espaço da unidade para a realização de um evento em prol da comunidade; - Programação de atividades educativas junto à comunidade; - Busca dos faltosos de grupos de acompanhamento: hipertensão, diabetes, gestantes e outros; - Levantamento de casos de transtorno mental na comunidade; - Comunicação quanto à entrega de exames para alguns moradores; - Falhas nos serviços de referência e contra-referência; - Protocolo para facilitar alguns procedimentos da unidade com outros serviços de referência. 97 A busca de parcerias intersetoriais e o meio ambiente também foram temas freqüentes: - Parcerias com creches e escolas para ajudar em programação a ser realizada na unidade; - Relato de casos e solicitação de providências com outros serviços, tais como serviço social, nutrição, psicologia e outros; - Reflorestamento, gari comunitário e agente jovem; - Exposição de situações de risco nas microáreas, tais como: rato, escabiose, lixo, etc; Durante estas reuniões, observamos que duas equipes apresentaram maior espaço de diálogo e negociação entre os integrantes, dividindo as responsabilidades e os compromissos das atividades; nas duas outras equipes, porém, ainda prevaleceu uma posição mais diretiva quanto ao direcionamento das ações, com maior cobrança e imposição na programação das atividades. Dando continuidade ao relato sobre a rotina de trabalho dos agentes, estes permanecem na unidade até aproximadamente 9:30h, quando então, sobem à comunidade para a realização das VD’s. Segundo os ACS, a realização do trabalho antes deste horário é prejudicada pelo fato de as famílias acordarem mais tarde. Conforme mencionamos no capítulo sobre o percurso metodológico, durante o período de observação no interior da unidade de saúde fomos percebendo uma gradual abertura da equipe para que pudéssemos acompanhar as atividades realizadas na comunidade. Este processo contribuiu para que os agentes se colocassem mais à vontade durante a realização de suas atividades. Ainda assim, nas primeiras visitas, sentimos ainda algum desconforto por parte destes, mas com o decorrer do trabalho foram se colocando com mais naturalidade, e sempre procuravam comentar o caso conosco. A seguir, descrevemos as principais ações desenvolvidas pelos ACS nas 40 visitas domiciliares observadas, algumas destas acompanhadas de outros membros da equipe técnica. 98 Quadro 10 - Principais ações desenvolvidas durante o acompanhamento das visitas domiciliares realizadas pelos ACS e ACS junto com outros profissionais da equipe. Ações Desenvolvidas Higiene oral Acompanhamento de HA/Diabetes Marcação de consulta Orientação sobre alimentação Entrega de exames Atualização das fichas de cadastro Orientação do exame ginecológico Puericultura Ações comunitárias Cartão de vacina Acompanhamento de idoso Total Visita Domiciliar Visita do ACS junto com outros Profissionais 04 02 03 02 01 0 01 02 01 02 0 18 Visita somente do ACS 0 03 07 03 0 03 03 01 0 01 01 22 Total Visitas 04 05 10 05 01 03 04 03 01 03 01 40 Nos seis períodos (de 8:00 às 12:00h) em que acompanhamos visitas domiciliares com ACS e outros profissionais da equipe, constatamos que as ações predominantes estiveram relacionadas com à marcação de consultas para atendimento na unidade de saúde, representando um total de dez visitas, no qual três foram realizadas juntamente pelos agentes com outros profissionais da equipe e sete com presença única do ACS. Seguindo-se de acompanhamento de grupos de risco (hipertensão, diabetes, gestantes, e outros) com a realização de cinco visitas, sendo duas realizadas com o acompanhamento de outros profissionais da equipe e três somente com o ACS. Observamos que a ênfase nas VD’s, nas equipes estudadas, é ainda o enfrentamento de doenças, no moldes do modelo curativista, com um discurso predominante medicalizador e de controle sobre a vida dos indivíduos. Os agentes afirmaram que algumas VD’s são previamente programadas, enquanto outras acontecem aproveitando-se oportunidades em que os moradores se encontram no domicílio. É freqüente a dificuldade de encontrar o morador durante o horário de trabalho, o que muitas vezes leva o ACS a extrapolar sua carga horária para conseguir obter informações sobre as famílias. Lembramos que o agente é responsável por 750 pessoas de sua comunidade, sendo esse número flexível de acordo com as necessidades locais, e deve realizar no mínimo uma visita mensal de acompanhamento por família (BRASIL, 2001b). 99 Através das VD’s, os agentes chegam mais próximos dos problemas enfrentados pelas famílias e trocam informações sobre o controle de doenças, medidas preventivas etc. Não existe para sua execução uma receita pronta, pois irá depender de cada caso e das necessidades individuais de cada família. As famílias consideradas com maior vínculo pelos agentes, permitem um clima de confiança e abrangência dos assuntos tratados. Nestas, muitas vezes os agentes são convidados a participar de horários de refeições, comentários íntimos da família, acompanhamento a serviços de referência e ajuda na solução de problemas familiares. Percebemos em alguns momentos o recurso à religião, na grande maioria a evangélica, utilizada como instrumento de trabalho pelo agente e aceita pela família acompanhada. Em situações que o agente se vê desprovido de recurso técnico adequado, utiliza seus próprios meios para oferecer apoio à família, entre os quais a oração é sempre bem-vinda. A exemplo desta situação, presenciamos um caso de uma senhora que seria submetida a um exame específico e por isso encontrava-se bastante apreensiva e angustiada. A agente tomou a decisão de convidar-nos a fazer uma oração, pela melhora das condições de saúde da senhora e ainda prontificou-se a acompanhá-la durante seus percursos aos hospitais, devido as dificuldades dos familiares pelas suas atividades de rotina do trabalho. Em um estudo sobre o ACS, no Projeto Qualis/PSF no município de São Paulo, foi identificado que o mesmo não dispõe de suficientes instrumentos, tecnologias e saberes para as diversas dimensões de seu trabalho. Diante desta situação, este profissional muitas vezes acaba trabalhando também com o senso comum e a religião (SILVA & DALMASO, 2002). Em algumas visitas, os profissionais não foram convidados a entrar na residência e as atividades se realizaram então, no espaço externo ao domicílio. Nestes casos, as orientações foram dadas ali mesmo, na porta de entrada, dificultando uma maior abrangência da observação e dos assuntos abordados. Alguns profissionais comentaram que nem sempre as VD’s são valorizadas pelos moradores, justificando dessa maneira o não recebimento da 100 equipe no interior de suas casas. O tempo chuvoso e frio no mês de junho dificultaram ainda mais estas atividades. Oliveira (2001), ao comentar a visita domiciliar, afirma que esta tem sido pouco problematizada como uma forma de interação ou como um desafio para os profissionais da saúde, os quais muitas vezes não conseguem aprofundar as razões pelas quais esse procedimento é recusado por algumas famílias. Quando isso acontece, costuma ser justificado pela maior ou menor empatia entre os profissionais e os membros da casa ou pelo fato de que os moradores não entenderem esta proposta de assistência. Ainda seguindo o pensamento do autor citado anteriormente, a reflexão sobre a visita domiciliar provoca duas linhas de raciocínio: uma direcionada ao valor cultural da casa, nas fronteiras entre o público e o privado, e outra ao significado da visita, representada pelo que vem do meio externo. O que está em jogo é uma espécie de invasão simbólica do espaço privado cuja função, entre outras, é a de resguardar-se do que vem de fora. Assim, a facilidade ou dificuldade da realização desta atividade pelos que vêm de fora, no caso os profissionais de saúde, deve ser avaliada pela atribuição de significados, valores e formas de interações que são estabelecidas neste espaço pelos seus moradores. As atividades de educação em saúde são realizadas pelos agentes com maior freqüência durante a visita domiciliar, quando procuram abordar questões como a alimentação, ventilação da casa, higiene, cuidados com o recém-nascido e outros. Os grupos ainda são pouco freqüentes nas atividades das equipes. Dentre os grupos regulares, alguns encontravam-se mais consolidados em suas práticas, como o Grupo de encontro do Comitê Centro de Promoção da Saúde (CEDAPS). Este grupo se propõe a discutir em encontros mensais as prioridades locais, programação e avaliação das atividades previstas, com a participação de usuários e profissionais de saúde. Porém, tivemos também a experiência de aguardar a realização de um grupo de hipertensos, quando poucos usuários compareceram. O grupo não chegou a acontecer e os usuários receberam atendimento individualizado. 101 Uma das equipes comentou desenvolver uma atividade em grupo para “escuta” dos participantes e realização de trabalhos manuais, tendo como líder do grupo um ACS. Porém, alguns profissionais relataram falta de segurança do agente para realizar este tipo de atividade, ficando a responsabilidade principalmente com a equipe técnica. 7.5 Representação realizada através dos desenhos A realização dos desenhos no primeiro encontro favoreceu a interação do grupo, como também facilitou a exposição de algumas situações causadoras de tensão naquele momento. Os agentes foram solicitados a relembrar sua inserção no PSF e expressar através dos desenhos, as seguintes questões: como foi para você a chegada no PSF? Quais fatores facilitaram e quais dificultaram este momento? A auto-representação como ACS e suas facilidades e dificuldades na inserção no PSF estruturou um discurso gráfico de valor subjetivo, constituído de aspectos racionais e afetivos. Cada desenho foi apresentado aos demais integrantes do grupo. As falas dos ACS foram gravadas com o propósito de facilitar maior apreensão das questões trazidas e seu possível desdobramento em contatos posteriores, seja no grupo focal ou durante as entrevistas. Como já comentado anteriormente sobre as dificuldades apresentadas na realização do estudo, a desconfiança, receio e uma certa resistência pareciam comuns às quatro equipes, sendo manifestado claramente nos primeiros encontros com os grupos. Procuravam manifestar suas insatisfações quanto as várias mudanças e falta de cumprimento de algumas atividades voltadas para a comunidade, expressas pela grande rotatividade dos profissionais ficando com isso algumas atividades prejudicadas, projetos que não avançam e promessas que não chegam a ser cumpridas. Deixando assim, os diversos profissionais desacreditados e temerosos a tudo de novo que ali se apresenta, justificando a falta de interesse por novas atividades e 102 envolvimento com as mesmas. Além deste fator, percebiam o estudo como uma atividade a mais a ser desenvolvida, sobrecarregando suas responsabilidades. O que exigia das pesquisadoras conquistas para a execução das atividades e participação dos agentes. Com as expressões manifestas através dos desenhos, pudemos identificar situações comuns entre os agentes, referindo-se às facilidades de sua chegada. As dificuldades não foram mencionadas, havendo nesse momento da chegada ao PSF uma grande esperança em prol de ajudar a comunidade, como também quanto à remuneração pelo trabalho com carteira assinada e maior segurança no desenvolvimento das atividades. A seguir apresentamos alguns desenhos que representam mais claramente as expressões dos ACS neste encontro. Figura – 2 Um caminho de esperança “Eu consegui através da associação de moradores entrar no PACS, e fiquei muito feliz, depois fui para o PSF. Uma Nova Vida! Com mais esperança” Nas equipes em que o trabalho foi iniciado com o PACS, este foi considerado pelos agentes de saúde um facilitador para sua chegada no PSF. A associação de moradores da 103 comunidade foi mencionada como parceira na divulgação do processo seletivo para ACS. O fato de ser morador da comunidade foi também considerado um facilitador para o desenvolvimento de seu trabalho. O momento de inserção na equipe do PSF, comentado na apresentação da figura (2) representou maior segurança para o desenvolvimento do trabalho do agente de saúde, quando comparado ao trabalho anterior no PACS. O PSF trouxe mais recursos e apoio ao desenvolvimento do trabalho, pois a partir de então o agente de saúde passou a contar com uma unidade de saúde bem próxima à comunidade, dispondo de atendimento ambulatorial, sala de vacinação, sala para pequenos procedimentos, farmácia, serviço odontológico e outros. Os ACS declararam-se felizes pelo módulo como também por contarem com uma equipe multiprofissional. O início do trabalho na equipe do PSF representou para os agentes de saúde um motivo de esperança e melhora a todos da comunidade. Alguns agentes colocaram que o fato de serem acompanhados pelas equipes do PSF facilitou sua inserção no trabalho, pois já tinham um conhecimento prévio de suas atividades e conheciam o médico, enfermeiro e o agente que realizou o cadastro de sua família. Figura – 3 ACS acompanhados pelas equipes do PSF. “O que facilitou a minha chegada na equipe foi que antes de eu me tornar agente eu era uma paciente dessa mesma equipe que eu atuo”. “Eu conhecia o médico, alguns agentes e vez em quando eu me consultava”. 104 Figura – 4 Esperança para a comunidade “Esperança de ajudar a comunidade” “Feliz” “Não tivemos dificuldade para entrar no PSF”. O trabalho representava naquele momento uma oportunidade de ajudar a melhorar a comunidade, alguns comentaram que não conheciam sua comunidade tão profundamente, como após tornar-se agente comunitário. Observamos que quando passam a exercer o trabalho como ACS, percebem mais claramente as condições sociais da sua comunidade. A própria convivência com a comunidade estimulava-os a iniciar os trabalhos cheios de disposição e esperanças em prol de melhoria das condições na comunidade onde residem “No meu caso eu não sabia nem o que queria dizer social e fui fiz o teste, (...) e no último teste que foi o teste oral, eu me peguei falando do meu avô, que foi um dos primeiros moradores daqui (....). Então, foi quando eu comecei a me virar um pouco prá esse social, foi quando a gente foi conhecer o morro e tinha muitos lugares que a gente não conhecia, eu não conhecia a miséria do morro, a pobreza, a doença que ta ali tão perto, e a gente só descobriu enquanto agente comunitário”. Embora muitos agentes já desenvolvessem atividades comunitárias antes, o ingresso no PSF representou um estímulo para maior envolvimento na resolução de problemas vivenciados pela comunidade. 105 Figura -5 O trabalho com grandes conquistas e realizações. “Eu percebi que estava entrando num campo de trabalho, que era árduo, difícil, mas era de grande produtividade, com grandes conquistas e grandes realizações”. “O PACS já foi um facilitador de preparação de trabalho, porque já vim de um trabalho concreto e acrescentamos o que não tínhamos hoje no PSF”. Figura – 6 Momento de alegria. Foi contente muito feliz, e insegura, nervosa sem saber o que me esperava, sem saber como seria meu trabalho com a comunidade”. “Eu soube através do presidente da associação. O PACS facilitou a minha chegada no PSF”. 106 7.6 Os principais interlocutores apontados nos mapas de comunicação 7.6.1 Os principais núcleos das Equipes - A e B Reproduzimos a seguir o mapa de comunicação elaborado juntamente com os ACS das equipes A e B. Para facilitar a apresentação do mapa, agrupamos os interlocutores mencionados em alguns núcleos básicos, considerando identidades e aproximações institucionais, territoriais e/ou profissionais. a) Instituições públicas de Saúde: - Ministério da Saúde (MS), com destaque à Fundação Nacional de Saúde – FUNASA e seus agentes de endemias, ao curso técnico oferecido aos ACS e aos próprios ACS, que reconhecem seu trabalho como uma proposta do MS. - Secretaria Municipal de Saúde, com destaque ao Grupo de Apoio Técnico (GAT), à equipe técnica do PSF e ao Conselho Distrital. O termo “equipe técnica”, refere-se aos demais profissionais da equipe de saúde (médico, dentista, enfermeiro, auxiliar de enfermagem). O GAT destina-se a oferecer apoio técnico e operacional, consultoria e supervisão aos módulos de PSF. Na AP 3.1, compõe-se de 12 profissionais: clínico, pediatra, ginecologista, enfermeiro, sanitarista, assistente social, representante de saúde mental (psicólogo ou psiquiatra), odontólogo, terapeuta ocupacional, nutricionista e fonoaudiólogo. Segundo um de seus representantes, na prática estes profissionais assumem menos uma função técnica em suas especialidades, e mais a função de gerenciamento dos recursos humanos e insumos para o PSF. O Grupo de Apoio Técnico – GAT, tem a função de facilitar o acompanhamento das equipes, oferecer capacitações aos profissionais, realizar o treinamento inicial (introdutório) na 107 chegada dos profissionais, acolher os profissionais, discutir juntamente com as equipes o processo de trabalho e avaliação, o monitoramento através do sistema de informação, permitindo uma avaliação dos indicadores de saúde. O GAT é responsável ainda por discutir a intersetorialidade e favorecer o desenvolvimento local, sustentável através das parcerias, como o CEDAPS, que trabalha a formação dos conselhos locais gestores, o SESC, FIOCRUZ , o Ministério da Saúde com o Programa Brasil Alfabetizando onde os próprios módulos do PSF servem de espaço para sua realização e também com a gerência do bolsa família. O Conselho Distrital é um órgão colegiado, consultivo e deliberativo, com a finalidade de auxiliar a administração pública e o conselho municipal de saúde, através da análise, planejamento, formulação e supervisão das políticas, na fiscalização de ações governamentais e nas decisões de matéria de sua competência conforme o art. 1º da Lei nº 2011(Câmara Municipal do Rio de Janeiro, 2006). b) Outras instituições públicas: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro (PMRJ), com destaque à Secretaria de Assistência Social, Secretaria Municipal de Obras, Secretaria de Educação e à Companhia Municipal de Limpeza Urbana (COMLURB). Na Assistência Social, são mencionados a Fundação Municipal Lar Escola Francisco de Paula (FUNLAR) e o Centro Municipal de Assistência Social Integrada (CEMASI). O Posto de Orientação Urbanística e Social (POUSO) é vinculado à Secretaria de Urbanismo. Na Secretaria de Educação, foram mencionadas as escolas e creches municipais. Na COMLURB, os garis comunitários, moradores da comunidade. A Fundação Municipal Lar Escola Francisco de Paula - FUNLAR, é considerada uma instituição voltada para a pessoa portadora de deficiência da cidade do Rio de Janeiro. Cabendo a esta a formulação da política pública de atendimento ao portador de deficiência da cidade e execução de ações neste sentido (PMRJ, 2007). 108 O CEMASI (Centro Municipal de Assistência Social Integrada) é a porta de entrada para os programa sociais da Prefeitura. Atua como núcleo de articulação da rede social, sendo sua principal função atualmente atender a política de Vigilância da Exclusão Social (PMRJ, 2007). Os Postos de Orientação Urbanística e Social – POUSO – são instalados dentro das favelas beneficiadas pelo programa municipal “Favela Bairro”. Têm como objetivo a consolidação de novos bairros e sua real integração à cidade, sendo estes locais regularizados urbanisticamente através da elaboração de legislação de uso e ocupação do solo específica para a área e entrega de "habite-se" às unidades habitacionais (PMRJ, 2007). Os moradores são estimulados a construir dentro das normas previstas, pois têm a possibilidade de ter projetos para as novas construções e acréscimos. O POUSO disponibiliza o atendimento de um arquiteto ou engenheiro para prestar orientação nas novas obras, além de ter a atribuição da fiscalização do novo bairro. No momento, dispõem de 30 POUSO’s atendendo a 59 comunidades na cidade, cerca de 250.000 habitantes, distribuídos em 58.000 domicílios (PMRJ, 2007). c) Comunidade: Neste núcleo, são mencionados os moradores antigos, os grupos violentos, os garis comunitários, a associação de moradores, a igreja católica, além de grupos ligados ao serviço de saúde que funcionam na comunidade, tais como: de hipertensos, gestantes e higiene oral. A expressão “grupos violentos” foi indicada pelos participantes do estudo, em referência aos que se dedicam às atividades do tráfico de entorpecentes. Os garis comunitários são responsáveis pela limpeza da comunidade, representando o serviço da COMLURB no local. Apresentam vínculo empregatício com a associação de moradores da comunidade. Vale mencionar as diferenças apresentadas nas cores e nas setas dos interlocutores ligados a um mesmo grupo discursivo. Como exemplo, temos na comunidade representações variadas tanto no que se refere a cor, indicando comunidades com maior ou menor influência 109 nas informações de saúde, quanto na posição das setas, indicando as várias maneiras de comunicação estabelecidas. Comentaremos mais detalhadamente estes aspectos nos capítulos seguintes. d) Meios de comunicação de massa: TVs e jornais de grande circulação. Vale ressaltar que não foi mencionada pelas equipes a presença de rádio comunitária. e) ONGS: As ONG’s presentes na comunidade foram representadas pelos grupos “Jovens pela Paz”, “Ponto Zero” e “Médico sem Fronteira”. Jovens pela Paz é um projeto vinculado ao Governo do Estado e direcionado a jovens de 16 a 25 anos, buscando formar uma juventude mais atuante na luta pela igualdade social. Os integrantes do projeto atuam em atividades que buscam promover o desenvolvimento da sociedade fluminense, realizando trabalhos nas áreas da educação, da saúde, da conscientização juvenil, da política pública de juventude, na área social e na educação para o trânsito (Governo do Rio de Janeiro, 2006). Médicos Sem Fronteiras (MSF) é uma organização internacional não-governamental sem fins lucrativos que oferece assistência médica de urgência em casos como conflitos armados, catástrofes naturais, epidemias e fome. A organização foi criada com a idéia de que todas as pessoas têm o direito a tratamento médico, e que essa necessidade é mais importante que as fronteiras nacionais (MSF, 2007). Podemos identificar ainda um sexto núcleo, reunindo os grupos profissionais mencionados: equipe técnica, ACS, garis comunitários e agentes de endemias, já apresentados nos núcleos anteriormente citados. 110 111 A seguir, apresentamos os interlocutores identificados pelos ACS, em ordem crescente de importância, de acordo com a escala de cores e as setas definidas no mapa. 7.6.2 Os interlocutores com maior impacto no trabalho em saúde dos ACS das equipes A e B 1. Grupo de Apoio Técnico As reuniões entre os profissionais do GAT e os ACS receberam o maior destaque no mapa das equipes A e B, o que pode ser observado tanto na cor (vermelha) como na largura da seta. Isto indica que os profissionais do GAT representam os interlocutores com maior impacto sobre os ACS daquelas equipes, o qual é exercido principalmente no espaço destas reuniões. Observe-se que além de larga, a seta é bidirecional, o que indica uma relação de negociação e troca. As oficinas e os cursos de treinamento oferecidos pelo GAT também foram mencionados, porém em cor azul, que indica influência quase nula sobre os ACS. 2. ACS A comunidade discursiva formada pelos próprios agentes comunitários de saúde, está representada na cor amarela (muita influência) e com seta bidirecional, indicando espaço de trocas e negociações. Interessante mencionar que os ACS declararam-se um grupo forte e questionador quanto aos seus direitos. 3. Equipe técnica e estudantes residentes Este conjunto de profissionais foi apontado como sendo o terceiro grupo de maior impacto sobre os ACS, representados no mapa pela cor verde com média influência nas informações de saúde. Apresentando seta unidirecional, expressa maior verticalização na comunicação no interior das equipes de saúde. 112 A equipe técnica desenvolve trabalho com grupos na comunidade, entre os quais os grupos de gestantes, de hipertensos e de higiene oral. Estes foram representados na cor azul, ou seja, com influência quase nula na atuação dos ACS. 4. Moradores antigos, grupos violentos e garis comunitários, todos vinculados à comunidade. São vozes da comunidade com expressão juntos aos ACS. Dentre elas, a de maior influência é a comunidade discursiva dos moradores antigos, representados na cor laranja (pouca influência). Estes participam nas atividades de equipe, trocam informações e permitem uma comunicação mais horizontal com os agentes. O grupo violento foi representado na cor laranja (pouca influência). Porém, podemos perceber a seta unidirecional, que indica a ausência de trocas com a comunidade, colocandose em uma posição autoritária em relação aos demais. Os garis comunitários foram representados na cor laranja (pouca influência) nas atividades dos ACS. 5. Conselho Distrital (SMS), Agentes de Endemias (FUNASA/MS), Pouso (SMU/RJ) e Funlar (SMAS/RJ). Vinculados às instituições públicas, de saúde e de áreas correlatas. Estas comunidades foram representadas em cor laranja e com a maioria das setas bidirecional, com exceção do Conselho Distrital, que apresenta seta unidirecional. È interessante destacar que apesar de o Pouso, Funlar, moradores antigos e os agentes de endemias serem considerados com pouca influência, estes aparecem com a seta bidirecional, indicando maiores possibilidade de trocas e negociações, com uma comunicação mais dialógica com os ACS. 7.6.3 Os principais núcleos das Equipes - C e D Agora reproduzimos o Mapa de Comunicação das equipes C e D. Em seguida, identificamos os interlocutores mencionados. 113 a) Instituições públicas de saúde - Ministério da Saúde (MS), com menção aos seus impressos (distribuídos através da equipe técnica), como também à Fundação Nacional da Saúde (FUNASA/MS) e seus Agentes de Endemias. - Secretaria Municipal de Saúde (SMS/RJ), com destaque aos profissionais do PSF (equipe técnica e ACS) e ao Grupo de Apoio Técnico (GAT/SMS) b) Outras instituições públicas - Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro (PMRJ), com menção à Companhia de Limpeza Pública (Comlurb) e seus garis comunitários. c) Comunidade - Moradores antigos, grupos violentos, associação de moradores e garis comunitários. d) Meios de Comunicação de massa - Rádios, jornais e TV. Note-se a ausência de menção a veículos de comunicação locais ou comunitários. e) Igrejas - Católica e evangélica. Observamos que neste mapa, as igrejas não estão na chave da comunidade. f) ONGs - Centro de Promoção da Saúde - CEDAPS - Médicos Sem Fronteiras g) Serviço Social do Comércio –SESC - Vinculado à Confederação Nacional do Comércio. Também aqui podemos identificar um núcleo reunindo os grupos profissionais mencionados que atuam na comunidade: ACS, equipe técnica, agentes de endemias, garis comunitários. A seguir, apresentamos os principais interlocutores identificados pelos ACS das equipes C e D, em ordem crescente de importância, de acordo com a escala de cores e as setas definidas no mapa. 114 7.6.4 Os interlocutores com maior impacto no trabalho em saúde dos ACS das equipes C e D 1. Equipe técnica Considerada com a maior influência nas informações de saúde dos ACS, o que se dá principalmente através das capacitações destacadas na cor vermelho e na largura da seta. Este espaço foi identificado com uma permissão de trocas, flexibilidade e negociações, representados através da seta que além de larga, é bidirecional. As reuniões também foram consideradas com grande influência, porém com menores possibilidades de trocas. Os livros de saúde, manual do ACS e folhetos, utilizados como material educativo para treinamentos em serviço, foram mencionados na cor azul e com seta unidirecional, que indica influência quase nula sobre os ACS e uma comunicação pouco dialógica e participativa. 2. ACS Semelhante ao que foi comentado nas equipes “A” e “B”. Os ACS ocuparam em ambos os mapas a 2ª comunidade discursiva com a mesma representação em cor amarela e seta bidirecional. 3. GAT Foi apontado em terceira colocação pelos ACS destas equipes. Representado em cor verde (média influência), este grupo mantém uma relação mais próxima com a equipe técnica. É representado com seta unidirecional, tanto na comunicação com os ACS quanto com os demais membros da equipe. As oficinas apareceram em cor verde (média influência) e com seta unidirecional. O treinamento introdutório e o curso técnico proposto pelo MS para ACS representados em cor azul escuro (influência quase nula) e seta unidirecional. Nem todos os agentes haviam passado pelo curso técnico por ser uma proposta nova no município, mas optaram por mencioná-lo como uma repetição dos assuntos discutidos na própria equipe 115 durante as capacitações e com um certo distanciamento das realidades vivenciadas no dia-adia. Vale destacar que a influência exercida pelo GAT foi mencionada de maneira distinta pelas equipes. As equipes “A” e “B” por encontrar-se com um certo clima de tensão entre seus membros, buscava apoio no GAT, reconhecendo neste um espaço de escuta e maiores possibilidades de comunicação. Enquanto que as equipes “C” e “D” por encontrarem um espaço entre seus integrantes com maiores possibilidades de trocas e negociações, buscando entre os mesmos da equipe o apoio e a escuta, não reconheciam o GAT com a possibilidade de uma maior aproximação, mas sim, com certo autoritarismo sobre as atividades a serem desenvolvidas pela equipe. 4. Moradores antigos, grupos violentos e associações de moradores. Os moradores antigos também foram considerados com grande participação no trabalho do agente, com maior destaque no grupo relacionado à comunidade. Estes dados foram semelhantes aos resultados encontrados nas equipes “A” e “B”, representados em cor azul claro (pouca influência) e seta bidirecional. Tanto os grupos violentos como a associação de moradores estão representados na cor azul escuro (influência quase nula) e com seta unidirecional. Os agentes de endemias e os garis comunitários não foram considerados vozes da própria comunidade, porém realizam nela suas atividades, considerados outros grupos de profissionais ali atuantes. Foram representados na cor azul claro (pouca influência) e seta unidirecional. O mapa das equipes “C” e “D” apresentou em sua constituição um menor número de interlocutores, quando comparado ao mapa das outras duas equipes. Quando comparamos os mapas, percebemos uma diferença em sua constituição, significando assim, as diversas realidades e as especificidades das comunidades onde realizamos a pesquisa. 116 117 7.7 O ACS e a divisão de trabalho entre o saber científico e o saber popular A comunicação representa um importante instrumento de trabalho do ACS, e envolve a aproximação com as famílias e a comunidade, bem como maiores possibilidades de mobilização e mudanças. Além de permitir uma participação mais ativa dos usuários no serviço de saúde local. Como podemos perceber na constituição dos mapas, as maiores influências sobre as informações em saúde do ACS estão representadas pelas instituições de saúde (MS e SMS), enquanto que as informações expressas pela comunidade ainda são identificadas com pouca ou quase nula influência. Cabe aqui uma reflexão quanto às posições atribuídas a essas comunidades discursivas. De acordo com nossos entrevistados, a comunicação destas instituições com os ACS ainda encontra-se predominantemente verticalizada, com pouco espaço para diálogo e participação. O nível hierárquico superior é representado pelo MS, através de materiais educativos e atividades programadas e repassadas à SMS, a qual encontra-se representada nas USF pelas equipes do GAT. Uma possível compreensão da baixa relevância atribuída às vozes da comunidade no trabalho dos ACS passa pela maior valorização do saber científico. A forma hierarquizada dos serviços de saúde traz conseqüências diretas no desenvolvimento das atividades do agente comunitário, o qual tenderá a agir muitas vezes descontextualizando a realidade local e direcionando suas práticas de forma mais técnica e menos humanizada, limitando suas ações de acordo com o que é estabelecido internamente na unidade de saúde. Diante do processo de construção dos mapas, tivemos duas realidades distintas. As equipes C e D mostraram maior flexibilidade e espaço de negociação, principalmente durante as capacitações realizadas pela equipe técnica, representadas no mapa em cor vermelha/muitíssima influência e com seta de maior espessura. As reuniões de equipe também foram representadas em cor vermelha e seta bidirecional, porém com menor 118 influência quando comparadas com as capacitações. Já nas outras duas equipes (A e B), este espaço de escuta e diálogo foi visto no GAT, através das reuniões representadas no mapa em cor vermelha/muitíssima influência e seta bidirecional. Vale comentar que a diferença de posição percebida nas equipes A e B em relação ao GAT, representado como grupo mais forte em cor vermelha/muitíssima influência foi justificada pelo fato de o mesmo ser percebido com maior poder de decisões quando comparado à equipe técnica. Já as equipes C e D apontaram a equipe técnica em cor vermelha/muitíssima influência, justificada pela sua maior proximidade com as atividades relacionadas ao trabalho do ACS, bem como pelas suas possibilidades de discussões. Estas situações serão abordadas mais detalhadamente através das falas dos ACS, como veremos adiante. Os materiais educativos (livros, revistas, manual do ACS e folhetos) repassados através da equipe técnica, bem como o treinamento introdutório e as oficinas, foram representados pelas equipes C e D em cor azul/influência quase nula e seta unidirecional. Enquanto que as equipe A e B mencionaram as oficinas e treinamentos representados em cor azul/influência quase nula ligados ao GAT. Diante destes resultados iniciais como pensar a prática do ACS como um novo profissional capaz de integrar o serviço de saúde à comunidade? Quais as possibilidades de um atendimento mais humanizado, com maior capacidade de autonomia nas decisões e respeito às diversidade culturais? As limitações e as contradições presentes no trabalho desenvolvido pelos ACS interferem na qualidade de suas relações com os moradores, levando muitas vezes a situações de desconfiança e conflito, que exigem destes profissionais habilidades de comunicação bastante complexas. A aliança com os moradores depende em grande parte destas habilidades, de forma a garantir o vínculo necessário ao desenvolvimento de suas atividades. O vínculo com a comunidade, por sua vez, os fortalece na relação com os demais profissionais da equipe de saúde. 119 O PSF prevê profissionais atuantes, com visão integral do indivíduo, família e comunidade. Ao lado disto, questiona a predominância de práticas direcionadas apenas pelo domínio de conhecimento técnico concentrado nas mãos de poucos, que não expressam subjetivamente a realidade local da comunidade. Campos (1997) defende a idéia de que o grande desafio da reforma sanitária é o avanço qualitativo que transforma a atenção percebida como instrumento de reprodução da força de trabalho em meio do direito à saúde, defesa de vida e liberdade de expressão. Propondo assim, realizar uma reforma que atenda uma demanda técnica, social e política, garantindo os princípios do SUS. De maneira a aprofundarmos a análise, trazemos os dados obtidos nas entrevistas individuais, destacando os principais interlocutores e comunidades discursivas mencionadas pelos ACS das quatro equipes estudadas. 7.8 As vozes dos ACS na AP 3.1 Com base nos dois mapas, identificamos os principais interlocutores, de acordo com a percepção dos ACS das equipes A, B, C e D, expressa durante a construção dos mapas e as entrevistas. São eles: o GAT, os profissionais das equipes do PSF (equipes técnicas e ACS), os grupos presentes nas comunidades locais (moradores antigos, grupos violentos, garis comunitários e agentes de endemias). A análise contemplará o lugar de interlocução (centro e periferia) de cada um e o grau de troca/negociação presente na comunicação estabelecida com os ACS. 120 7.8.1 O Grupo de Apoio Técnico – GAT O Grupo de Apoio Técnico é percebido pelos agentes em duas principais posições distintas: como representação de poder e como mediador de conflitos nas equipes. 7.8.1.1 O Grupo de Apoio Técnico como representação de poder Apesar deste grupo assumir posições diferentes nos dois mapas, analisamos após a categorização das falas que o mesmo aparece como autoridade central no trabalho das EqSF, estabelecendo as metas e prazos para as atividades, colocando-se no nível hierárquico acima da equipe técnica. A seguir, descreveremos algumas falas dos agentes das equipes C e D que consideram o GAT com menor influência quando comparado à equipe técnica, porém como podemos perceber, colocam nitidamente a relação hierárquica e freqüentemente verticalizada com o GAT. “É tem troca sim, entendeu (com a equipe técnica) mas é o que eu falei existe a troca, mas quando a gente tá fazendo algo que a gente acha que tá fazendo o bem, o certo, vem aquelas coisas do GAT, que não permite troca”. “O GAT é mais p’ra marcar alguma coisa, tem que fazer isso, tem que ser p’ra ontem e a gente até reclama muito disso, tudo é p’ra ontem”. Alguns comentaram sobre muitas cobranças além de suas atribuições, feitas pelo GAT e equipe técnica, entre as quais: levantamento de pessoas que recebem auxílio do governo e verificação de existência de tampas de caixas d’água. Mencionaram também que outras instituições públicas aproveitam o serviço dos agentes para levantamento de dados, os quais acabam sendo solicitados pelo GAT. “A gente aqui tá com atribuição que não é da gente, e o GAT frente a tudo isso, não é chegar aqui e impor, então o que teria que ser feito não é feito, mas eu não tô criticando o GAT, porque eu não sei o que vêm atrás do GAT”. 121 Informaram que além destas cobranças, vivem intensas frustrações quando não podem contar com o apoio do GAT e de outros setores da área programática para solucionar um determinado problema. “Não me sinto frustrada com o trabalho, eu me sinto frustrada com as situações, quando a gente não consegue alcançar o objetivo que a gente tá esperando. Além de tudo isso, tem o GAT que impõe, que quer, o GAT não pode ajudar, é complicado. E é o que eu sempre vou falar, a gente que tá lá na pontinha, que lida todo dia com os pacientes, a gente é que sabe as mazelas, a gente é que sabe as queixas, a gente é que escuta, a gente é ofendido, um dia é abraçado no outro dia é xingado, porque a gente é que tá ali na ponta, é muito complicado, entendeu”. O ACS deve contribuir para o processo de transformação social. No entanto, é necessário considerar que é um processo lento, que requer esforços conjuntos e permanentes e é papel de todos os cidadãos, deve envolver todos os profissionais de saúde incluindo os técnicos e gestores, bem como outros setores da sociedade. A dimensão técnica é necessária, porém não se pode perder a articulação com a dimensão social e política, o que vale para todos os profissionais (TOMAZ, 2002). A saúde coletiva implica na intersetorialidade para se alcançar os diversos determinantes do processo saúde-doença. De maneira a articular as ações que se fazem necessárias, também a interdisciplinaridade se faz essencial, pois os diversos olhares complementam a visão sobre a realidade e propõem ações interrelacionadas (FAJARDO, 2001). Os ACS entendem que o autoritarismo manifestado muitas vezes pelo GAT decorre de outros níveis do sistema, reconhecendo assim, uma questão hierárquica nos serviços de saúde. O que vem justificar as cobranças do GAT à equipe técnica, e desta aos ACS. Como mencionado nas seguintes falas: “A equipe técnica ela cobra mais um pouco, mas também p’ra ela cobrar é porque tem alguém que cobra dela também, como o GAT. Para eles (equipe técnica) passarem a ordem p’ra gente, eles também recebem ordem , e se nós não concluirmos com perfeição ou o máximo que a gente conseguir fazer, a cobrança vai em cima deles também, como o GAT, têm pessoas que cobram deles também”. “É, eles (GAT) escutam a nossa fala, mas muitas vezes não dão solução, deixa vago, não sei se eles não têm como resolver também, se dependem de outros, tipo assim, uma pessoa acima deles”. 122 7.8.1.2 O Grupo de Apoio Técnico como intermediador de conflitos nas equipes Em casos de conflitos que extrapolam o gerenciamento da equipe, o GAT atua intervindo através de reuniões realizadas com os integrantes. Este espaço foi mencionado como um momento de troca, escuta, em que todos participam e dão suas opiniões. A reunião como apontada no mapa, foi considerada uma estratégia utilizada pelo GAT com muitíssima influência sobre as informações em saúde dos ACS e, especialmente, em algumas equipes que enfrentavam durante a pesquisa um clima de tensão interpessoal, buscando apoio no GAT. Quando então, este se apresentava para as equipes como um mediador de conflitos. Como foi colocado nas seguintes falas: “A única coisa que a gente tem de bom é isso (reunião), que a gente tem liberdade para falar com eles (GAT), eles entendem nosso caso, por mais até que eles não queira se indispor com o outro lado (equipe técnica), mas pelo menos ouve a gente e tenta resolver”. “Eu acho que eles (GAT) deixam a gente bem liberados para a gente dizer nossa opinião, o que está acontecendo, o que não está acontecendo, nunca teve nenhuma proibição, são abertos para ouvir e a gente falar”. “Na reunião de sexta-feira são discutidos todos os problemas, o que aconteceu na semana que não deu bons resultados e traçar metas para próxima semana, as informações trazidas pelo GAT”. Os treinamentos e oficinas disponibilizados pelo GAT seguem uma programação previamente definida; alguns, entretanto, são considerados pelos agentes distantes das realidades locais. No mapa, aparecem com quase nula influência nos seus serviços de saúde. Alguns agentes comentaram que muitas vezes estes treinamentos não condizem com a realidade da comunidade, o que dificulta de aplicar tais conhecimentos em suas práticas diárias. Considera-se necessário a implantação de formas mais abrangentes nas capacitações dos profissionais de saúde, incluindo os agentes, baseando-se em experiências existentes, utilizando métodos de ensino-aprendizagem inovadores, reflexivos e críticos (TOMAZ, 2002). 123 Este autor, ao comentar o processo de qualificação do ACS, considera-o ainda desestruturado, fragmentado e insuficiente para o desenvolvimento de suas competências, afirmando que: Os programas educacionais devem ter como base o desenvolvimento das competências, usando para isso métodos de ensino-aprendizagem inovadores, reflexivos e críticos, centrados no estudante, e, quando possível, incluindo novas tecnologias, como a educação à distância. Além disso, dentro desse contexto, o desenvolvimento de algumas competências transversais, como a capacidade em trabalhar em equipe e a comunicação, devem fazer parte de qualquer programa educacional do ACS e dos outros profissionais de saúde. (Ibid, 2002,. p. 87) Por não ser objeto de estudo a questão de formação profissional, não nos deteremos ao assunto. Porém, acreditamos na necessidade de estudos quanto ao processo de formação e educação continuada dos profissionais, contribuindo para melhor consolidação da nova proposta de atenção à saúde. O GAT assumiu posições diferentes em ambos os mapas como já comentado anteriormente, porém é percebido pelas equipes como principal responsável pelas cobranças, as quais reconhecem sendo derivadas de outros níveis hierárquicos. 7.8.2 Relações estabelecidas com a equipe técnica Tivemos oportunidade de acompanhar as relações entre os profissionais da equipe e suas repercussões no trabalho com a comunidade, o que se deu de maneira diversificada, enriquecendo o estudo com a observação de situações mais amplas e divergentes. Entendemos que as condições vivenciadas pela equipe interferem na qualidade do serviço executado. Trabalhar em equipe é considerado por alguns profissionais um dos maiores desafios para se alcançar as propostas do PSF (ALMEIDA & MISHIMA, 2001). O processo de interação e a comunicação entre os membros de uma equipe não acontecem de forma tão simplificada. Há necessidade de desenvolver estratégias para a superação de resistências, que o trabalho de cada um seja conhecido por todos e que a comunicação seja exercitada de 124 maneira mais horizontalizada. Tais fatores são considerados centrais para se alcançar os objetivos propostos no novo modelo. Ao questionarmos como seria o trabalho em equipe, percebemos que a conceituação deste trabalho para a maioria dos ACS é vista como um conjunto de profissionais, tendo como base de atuação a solidariedade de todos para a execução das atividades. “P’ra mim da minha equipe, é muito bom, é melhor em equipe porque é um ajudando os outros, é assim, se não fosse a equipe não ia ter aquele elo de trabalho, a gente dá resultado, é através da nossa equipe nós todo junta que a gente forma e chega ao objetivo que a gente quer, e a gente consegue, entendeu”. “Trabalhar em equipe é trabalhar com harmonia, com compreensão que ajuda muito”. “P’ra mim trabalhar em equipe é bom, eu não tenho dificuldade nenhuma, p’ra mim é a união, toda vez que eu precisei, o que foi possível fazer, foi feito”. Outros agentes, entretanto, expressaram a questão da divisão de tarefas e do cumprimento das mesmas colocadas com autoritarismo pela equipe técnica, não respeitando as opiniões dos demais. A fragmentação das tarefas ainda é muito comum no trabalho em equipe, havendo uma divisão de responsabilidades específicas a cada profissional, sem que haja o conhecimento e participação de todos os envolvidos. Desta forma, tendemos a não considerar suficientemente o trabalho em sua totalidade, mas a valorizar as especialidades e a hierarquia de conhecimentos. “Eu acho que trabalhar em equipe é assim, todo mundo de acordo com aquela situação, todo mundo sabendo daquilo, coisa que aqui quase nem acontece, aqui quando a gente vê as decisões tão tomadas”. “O trabalho em equipe é o seguinte, tipo assim, você praticamente não dá as coordenadas, você é coordenado, nem tudo você pode tomar a frente, tem que pedir p’ra quem tá acima de você, p’ra você tomar certo tipo de atitude”. “Trabalhar em equipe (...) [sorriu] Assim, parece que a gente fica meio perdida, é assim, cada um completa seu trabalho, te ajuda. Cada dificuldade que você tem na sua microárea, tem um profissional p’ra te responder, né. Dependendo do problema você vai procurar, se é uma criança desnutrida você vai procurar o nutricionista, na área da assistente social é documento, certidão e outra coisa assim, o auxiliar faz o curativo, o enfermeiro supervisiona. Outro problema você vai procurar outro”. “Tem situação que a gente sabe que só o médico pode diagnosticar. Às vezes é uma conversa, ai pode ser o enfermeiro, auxiliar, também, depende muito do caso” 125 A situação de fragmentação e justaposição das atividades, expressa o modelo hegemônico de saúde, com centralização das atividades sobre o médico, o que dificulta sua participação de forma mais integrada na equipe, desenvolvendo a maioria de suas atividades no consultório médico, como verificamos nas seguintes falas: “Eu converso mais com a enfermeira, porque o médico tá sempre ocupado, tá sempre consultando”. “Em caso de alguma dificuldade na minha microárea eu chego p’ra ele (médico), que ele nunca tem tempo p’ra conversar a sós, ai eu falo com ele logo, tento passar o caso p’ra ele”. “Eu sempre procuro a enfermeira da equipe, a gente passa o caso p’ra ela e ela p’ro médico”. O trabalho principalmente do médico ainda encontra-se mais direcionado para atendimentos individualizados e curativos, sofrendo influências das repercussões históricas do nosso modelo de saúde, com predomínio do saber médico sobre as demais categorias profissionais, estabelecendo assim, uma hierarquização no trabalho com desvalorização dos conhecimentos de outros profissionais. A formação dos profissionais de saúde, ainda pautada no modelo biomédico, com separação entre o biológico e o psicossocial, pouco facilita a interação dos profissionais tanto com a própria equipe como com os usuários (CIAMPONE & PEDUZZI, 2000). A prática médica foi identificada com a prática científica e os médicos passaram a ser considerados os detentores de um saber que pode ser verificado “cientificamente”. Tiveram assim, seu poder fortalecido na sociedade, com desqualificação dos outros saberes e práticas curadoras mais tradicionais, entre as quais a medicina chinesa, a homeopatia, o saber popular, entre outros, identificados como “não-científicos” e, por isso pouco aceitáveis (LUZ, 1988). A supremacia médica nas equipes de saúde acaba por resultar em hierarquia e desigualdades da valoração social de outros profissionais, gerando um modelo de atenção 126 reducionista, centrado na recuperação biológica, atendimento individualizado e com rígida divisão do trabalho (ALMEIDA & MISHIMA, 2001). Ao comentarem sobre o trabalho em equipe no PSF, as autoras citadas anteriormente defendem que este pode se abrir para além de um trabalho técnico hierarquizado, baseando-se em um trabalho de interação social entre os trabalhadores, com maior horizontalidade e flexibilidade dos diferentes poderes ali presentes, favorecendo a autonomia, criatividade dos agentes e integração de todos os envolvidos no trabalho. Apesar de este trabalho representar para alguns ACS um desafio, trabalhar em equipe e comunidade requer, na visão destes profissionais, algumas características: autoconhecimento, segurança, respeito, paciência, persistência e confiança, o que ao longo dos anos como agente comunitário favorece o seu crescimento tanto à nível pessoal, quanto profissional. “O agente tem que ter muita paciência, porque a paciência também contribui p’ra ele (ACS), ele tem de saber levar, tem que ter persistência, tem de saber ouvir, e ouvir e muito”. “Olha eu tinha até medo no começo, porque eu achava que cada cabeça tinha uma opinião sabe, então de repente quando você começa a trabalhar numa equipe (...) E a minha equipe é excelente, cada um ajuda o outro, cada um batalha pelo outro, cada um batalha por objetivos, quando um discorda, é de uma maneira saudável, então eu aprendi que trabalho em equipe não é aquele bicho de sete cabeças que eu pensava no começo, e hoje em dia eu vejo que por mais que você discorde, você trabalhando com certas pessoas, a pessoa tem como dá sua opinião sem ter briga, aprendi a conviver com o outro”. “Era uma oportunidade nova, porque eu tava cinco anos na mesma coisa, e era um trabalho diferente do que eu fazia, este aqui a gente trabalha na rua, com as pessoas. E eu sempre fui uma pessoa assim, muito fechada, ai isso me ajudou muito a conversar, chegar e conversar, perguntar eu não tinha essa abertura de chegar e conversar, trabalhar com público. Foi um desafio no início, sempre tinha aquelas capacitações, e eu sempre tive aquela dificuldade de falar”. Consideramos que as reuniões fazem parte do processo de trabalho das equipes, com o propósito de facilitar a interação entre os profissionais, favorecendo assim, um espaço de trocas das informações e dos diversos saberes, com participação do todos os integrantes. Porém, percebemos com a construção dos mapas de duas das equipes estudadas, que este momento ainda é fortemente marcado pelas posições hierárquicas que cada um ocupa no 127 serviço de saúde, assumindo uma posição mais próxima ao centro ou mais periférica, a representação de sua imagem que é veiculada aos demais, mantendo um certo domínio do conhecimento científico e desvalorização do outros saberes. Este modelo nos remete ao mercado simbólico, espaço da concorrência, onde as competências de cada um concorrem entre si e definem o valor que será atribuído a cada fala, em que a fala representada pelo médico, enfermeiro e dentista são consideradas com maior preponderância em relação às demais. As estratégias discursivas dependem das relações de força entre os campos e os trunfos que a pertença a estes campos atribuem ao interlocutor. Trata-se de uma negociação desigual, uma vez que o mercado simbólico não é um mercado de iguais, seus membros não possuem as mesmas condições de produção, circulação e consumo de bens. Não possuem o mesmo capital social, cultural, econômico; não possuem o mesmo capital simbólico. A maior desigualdade se apresenta na circulação, onde há um desequilíbrio flagrante entre as condições desfrutadas pelos núcleos discursivos centrais da sociedade e as que são propiciadas aos núcleos periféricos (ARAÚJO, 2003, p. 49). Os ACS das equipes A e B relataram que participam de uma reunião semanal com os demais integrantes da equipe e o representante do GAT, responsável pela supervisão destas equipes, nestas reuniões são repassados os informes sobre as atividades da próxima semana e discutidas questões da convivência em equipe. Ao serem questionados sobre sua participação nas reuniões, temos as seguintes falas: “Agora eu não estou me expondo mas, só ouço, se tiver que concordar eu concordo, fico na minha, participo de corpo,alma e espírito, mas não dou palpite nenhum, só quando me perguntam, eu até falo, mas também só respondo. A equipe acha que nós ACS somos submissos, você tem que aceitar o que eles falam, tipo assim, você não têm opinião própria, falou e você (ACS) tem que obedecer”. “Eu costumo ficar neutra, eu prefiro ouvir e pronto, eu prefiro ouvir e ficar calada, porque a minha opinião ninguém vai acatar, podem até ouvir, mas vão chegar a um ponto que [silenciou]. Então, eu prefiro ficar calada”. “A minha participação na reunião é quase nada né, a gente nunca pode falar nada, se a gente falar mesmo a gente falando certo, a gente tá sempre errado, a gente acaba calando, a gente não discute. Assim, a gente fica só escutando, a gente calado já tá errado, só eles [equipe técnica] falam, você não vê ninguém falando”. Silva & Trad (2004) ao comentaram sobre o espaço da reunião, afirmam que este se restringe à socialização do que foi programado individualmente pelos profissionais de nível 128 superior. Assim, os ACS não ficam à vontade para opinar com relação ao que é apresentado, neste sentido as decisões não são partilhadas no momento de concepção do trabalho, acabando por comprometer a construção do plano comum, uma vez que este necessita da participação de todos os profissionais nos diversos momentos do processo de trabalho . A comunicação é entendida como uma forma de ação social em que a realidade é compreendida pelos demais atores sociais como um mundo intersubjetivamente compartilhado. O que nos leva a indicar que quanto maiores os contextos verticais de comunicação, maiores serão os conflitos e os desentendimentos entre as pessoas, levando ao comprometimento da ação e integração dos envolvidos no processo, facilitado pela separação rígida entre quem pode falar e mandar e quem deve se calar e obedecer, gerando diferentes formas de integração e sensibilidade, enfatizando a desigualdade ou hierarquização que contribuem com as relações verticais de poder (OLIVEIRA, 2001). Consideramos o momento da reunião importante para um maior entrosamento entre os integrantes da equipe, quando são discutidos os problemas relacionados ao trabalho e às relações estabelecidas na equipe. Nesse contexto, avaliamos que a comunicação pode avançar para além de sua dimensão instrumental, que a reduz ao processo de produção de mensagens tecnicamente bem formuladas e postas em circulação por um emissor para um receptor. Ao se articular a mecanismos interacionais e de compartilhamento dos grupos envolvidos, favorece a emergência de novos padrões comportamentais e cognitivos no campo das práticas do PSF (OLIVEIRA, 2001). Com os resultados obtidos através dos mapas e das entrevistas, podemos questionar sobre possíveis dificuldades observadas nas práticas comunicativas nas equipes de saúde. O espaço das reuniões ainda não favorece suficientemente a participação de todos, havendo pouca interação e restritas possibilidades de negociação. Os assuntos mais valorizados nas reuniões com a equipe são a programação e execução das atividades, o que justifica a menor 129 participação dos integrantes, pois a definição das atividades deriva de outros níveis e devem ser cumpridas pelas equipes. “Os assuntos mais colocados na reunião é a respeito das coisas que vai acontecer na semana, a programação da semana. Se tiver um problema, eles [equipe] procuram ajudar”. “São mais os informes que trazem para as equipes, eventos, coisas que a equipe possa estar trabalhando, agora vai ter a campanha de vacinação, são essas coisas assim”. “É discutido o que aconteceu na semana que não deu bons resultados e traçar metas da próxima semana, novas informações que vêm do GAT p’ra cá”. Observamos nas equipes C e D uma maior participação dos agentes nas reuniões de equipe, sendo estas realizadas duas vezes por semana, uma para a programação das atividades e outra para capacitações. Estes encontros funcionam como facilitadores da interação do grupo, em que a responsabilidade é assumida por todos os integrantes, levando os agentes a sentirem-se mais valorizados pelo seu trabalho. Campos & Baduy (1998) comentam que o trabalho desenvolvido pela EqSF, além da responsabilidade da resolução de problemas, capacidade de aceitar as diversidades culturais e de aprender continuamente na troca de experiências, compreende a necessidade do desenvolvimento de uma comunicação interpessoal, envolvendo todos os integrantes da equipe, bem como a comunidade onde atuam. “Na reunião de segunda-feira é quando nós colocamos o problema da comunidade p’ra nossa enfermeira, e ela avalia os casos, e na sexta-feira um momento p’ra explicar alguma coisa, por exemplo: se você não sabe o que é um cartão de vacina, ela (enfermeira) tira aquele dia para explicar, se você tem dúvida sobre hipertensão ela explica, a reunião tem sido feita duas vezes na semana, uma p’ra você avaliar todos os problemas da semana, marcar consulta, preventivo e passar os informes e a de sexta-feira é mais para você aprender, uma capacitação para você aprender o que você tem de fazer no dia-a-dia, nesta eu participo mais, porque eu faço o curso de enfermagem, então eu pergunto mesmo, para eu me especializar mais”. “Uma reunião é p’ra marcar consulta, entrega dos exames e trazer o que a gente viu lá fora, e outra é p’ra capacitação, ela (enfermeira) diz vamos vê o que vocês querem falar. Agora tá meio tumultuado, porque ela (enfermeira) vai sair ai a gente fica (...) e a gente já se adaptou com ela, tem que começar tudo de novo e vem outra e muda tudo”. “Na reunião da nossa equipe são discutidos os problemas da área, também problema de trabalho, um pouco de cada, mas mais focado para problema da área, os problemas que acontecem durante a semana. Assim, alguma novidade, algum caso novo, ás vezes o GAT participa, nem sempre, mas participa, um pouco aqui, um pouco ali, vai passando de equipe em equipe”. 130 “Tem duas reuniões uma na segunda e outra na sexta-feira, eu participo, dou sugestões, sinto meu trabalho reconhecido tanto pela equipe, como pela comunidade, claro que tem uma família ou outra que nunca tá satisfeita né”. A programação das atividades fica freqüentemente sob a responsabilidade da equipe técnica, cabendo aos agentes a possibilidade de identificar determinadas situações de risco na comunidade que necessitem de intervenções. Como expressado nas seguintes falas: “Quando preciso ajudar eu ajudo, me dou bem com os (...), eu gosto de ajudar. Algumas coisas são tiradas em reunião, às vezes a gente dá sugestões, mas ás vezes já vêm com a programação montada e só te encaixa, você vai p’ra isso, você p’ra aquilo, entendeu”. “A equipe resolve, senta com a gente e informa: Ó, a diretora da creche ligou pedindo que se faça um trabalho de pesagem, então o enfermeiro pergunta quais os agentes que vão ser responsáveis direto, então divide o horário quem vai de manhã e quem vai fazer à tarde”. “Geralmente é assim, faz uma programação e ela [enfermeira] passa p’ra gente fazer na rua. É igual tá tendo agora pra vê onde têm galinha, criação, aviário, ai montaram um questionário e entregaram p’ra gente perguntar e entregar a eles [equipe técnica]. A idéia acho que partiu do GAT, porque tá sendo todas as equipes”. A equipe técnica assumiu posições discursivas e formas de comunicação diferenciadas nos dois mapas. Foi representada pelos ACS das equipes A e B em cor verde/média influência e seta unidirecional, indicando pouca participação e diálogo entre os seus integrantes. Porém, os ACS utilizam suas próprias estratégias de enfrentamento, como o silenciamento, abdicando de suas vozes, demonstrando pouco envolvimento com os trabalhos da equipe e deixando para a equipe técnica todas as iniciativas inerentes ao serviço. Neste caso, buscam espaço de expressão e apoio no GAT e entre eles. Já as equipes C e D foram apontadas em cor vermelha/muitíssima influência e seta bidirecional, principalmente nas ações de capacitações oferecidas aos agentes. Nestas equipes os ACS conseguem expor suas opiniões e participar mais ativamente, compartilhando as atividades da equipe. 131 7.8.3 O ACS como amplificador de “vozes” da comunidade e dos serviços de saúde Na construção do mapa de comunicação, os agentes identificaram-se como uma categoria que apresenta auto-influência sobre as informações de saúde entre si mesmos e nas suas relações de trabalho. “A gente aqui sempre tá trocando informações, até mesmo p’ra fazer uma queixa, a gente funciona muito bem”. “Quando a gente está em dúvida, a gente vai pedir ajuda a qualquer um deles [ACS], um ajuda o outro, temos muita influência nessa troca, e é até mais fácil, porque um explicando para o outro fica mais fácil entender do que quando a equipe explica, a gente entende até melhor”. “Às vezes a família não consegue falar comigo sobre o problema, mas fala p’ra outro ACS de outra micro-área, ai o ACS vai e me fala”. Solicitados no momento final das entrevistas a expressarem uma palavra que representasse seu trabalho, a maioria se referiu à valorização da comunidade através do: acolher, respeito, liberdade, perseverança, ajuda, sinceridade e outros. Residentes na comunidade, consideram-se interlocutores com destaque da população local. Percebem-se como representantes das reivindicações dos moradores juntamente aos serviços de saúde e na buscas por ações intersetoriais, e em outro momento reforçam as informações do serviço para os moradores. O contato mantido ora como moradores e representantes da comunidade, ora como ACS e representantes dos serviços de saúde, favorece o reconhecimento de seu papel social na área, tornando-os diferenciados dos outros moradores. O estudo realizado com ACS por Zanchetta et al (2005) mostrou que apesar de serem moradores da comunidade, eles se sentem diferentes pelo poder de ajudar os outros. Mas, eles se sentem também diferentes dentro do Centro Municipal de Saúde, quando esbarram nas barreiras burocráticas que dificultam e por vezes tornam impossível a possibilidade de atender às demandas das famílias. 132 Nunes et al (2002), em seu estudo com agentes de saúde, destacam um aspecto que também surgiu nas falas de nossos entrevistados, quanto à nova responsabilidade que assumem ao fazer parte da equipe do PSF, de dominar certas informações e práticas referentes à biomedicina. A formação que recebem permite um sentimento de orgulho, por diferenciarem o seu conhecimento atual do conhecimento popular de que dispunham, atribuindo-lhes um maior prestígio social, uma vez que o saber biomédico situa-se numa escala superior na hierarquia de saber da sociedade. O agente de saúde acredita que com seu trabalho poderá contribuir para o desenvolvimento local, sendo capaz de representar com legitimidade as necessidades manifestadas pela comunidade. O fato de ser morador da mesma comunidade funciona como facilitador da compreensão das prioridades locais e das formas de significados culturais ali presentes. “A comunidade reclama da falta de remédios (...). Eu acho que quando entrou isso [unidade de saúde] aqui [comunidade] a prefeitura imaginava que a gente conseguia fazer isso em um mês, dois meses, um ano, mas não é não gente, é um trabalho de formiga mesmo, que demora muito, aqui é uma unidade, um módulo e as pessoas chamam de postinho e pensam até que é uma emergência, eles chamam de postinho [sorriu], e muita gente tá aprendendo, no primeiro dia que a gente abriu a porta, isso aqui lotou, e hoje em dia você vê que não tem fila, a pessoa pede, a gente vai lá, marca a consulta, conseguimos dá uma organizada”. “As pessoas te passam um problema achando que você vai dá a solução e vêm aqui e não têm o remédio, a gente desanima. Aqui todo mundo é pobre, não tem dinheiro, como a pessoa vai se tratar se não tem dinheiro? No caso da dentista, eu digo logo é loteria, não tem material, é complicado”. “Eu sei que é uma assistência básica, mas eu acho que deveria ser um pouco mais completa, tê os remédios, aqui ficou muito tempo sem o aparelho de pressão, que é uma coisa simples, mas que a pessoa se sente acolhida, em chegar, sentar ali e aguardar, ai mede a pressão, às vezes até desabafa, chora com a pessoa que tá ali. Às vezes também tá marcada (consulta) e a gente tem de ir lá e remarcar, tá sem água ou sem (...) É muito chato”. Por outro lado, passam a representar o poder público para as famílias acompanhadas, acreditando em possíveis chances de negociações e melhores condições de assistência aos moradores. Os agentes comunitários representam a reconstituição do diálogo, a partir das questões trazidas por eles da esfera privada (famílias) para a esfera pública (serviços de saúde). 133 Mas na prática, nem sempre as questões manifestadas pela comunidade e pelas famílias se transformam em possíveis ações do Estado, mas de maneira contrária o que ainda predomina são as atividades de controle de doenças, com protocolos definidos. De acordo com Zanchetta et al (2005), o ACS que a princípio teria a função de servir como canal de transmissão de mensagens de saúde à população, tornou-se um emissor espontâneo de reivindicações para a melhoria de suas condições ocupacionais, assegurando maior eficácia de suas ações educativas e a resolutividade das ações assistenciais. Os agentes comunitários têm por finalidade, entre outras, o aumento da eficácia das ações de educação para a saúde. O que tende a ser facilitado pelo fato dessas pessoas compartilharem um mesmo contexto social e cultural e um mesmo universo lingüístico (NUNES et al, 2002). O autor ainda enfatiza que o agente comunitário pode melhor intermediar os serviços de saúde a tais populações por apresentar habilidades políticas, autonomia, livre e fácil acesso às comunidades. De fato esse acesso é facilitado, principalmente quando relacionado ao atendimento na própria equipe de saúde da família, essa facilitação deve-se ao fato do ACS apresentar uma inscrição oficial na rede de assistência, o que lhes possibilita um nível razoável de resolutividade em relação a algumas ações de saúde. O agente de saúde assume vários lugares de fala, de acordo com o contexto situacional apresentado, ora como morador da comunidade, reivindicando direitos sociais; ora como agente de saúde, que considera ter adquirido maiores conhecimentos sobre as condições de saúde-doença-cura; ora como parente, vizinho, fiscalizador, representante diante de outros órgãos públicos; ora ainda como trabalhador, defendendo interesses de sua categoria profissional. Estes lugares de fala algumas vezes não encontram bem definidas suas fronteiras, como mencionado pelos entrevistados a realização de seu trabalho no próprio domicilio, na igreja, supermercado e mesmo a cobrança feita pela comunidade ao agente, quanto à situação do lixo, desemprego, ratos, maus tratos à criança, ao idoso e outros. Assim, 134 assumem diferentes posições de acordo com o contexto apresentado, sendo que suas falas apresentam uma conexão com as várias identidades que compartilham no desempenho de suas funções. As pessoas localizam-se numa topografia social que determina a legitimidade da sua fala e as expectativas a seu respeito. Dependendo do lugar que ocupa cada interlocutor, existem regras de comunicação a serem seguidas no ato comunicativo, podendo ocupar vários lugares de interlocução de acordo com o contexto situacional que lhe é apresentado. (ARAÚJO et al, 2003) Esta situação mencionada pela autora acima aparece nitidamente nas diferentes posições ocupadas pelos ACS, com maior prestígio diante da comunidade, e com menor posição hierárquica quando nas relações com a equipe técnica. As falas seguintes expressam as várias posições ocupadas pelos agentes: “Houve caso de eu ser chamada pra acompanhar um morador até o hospital e fiquei lá até a noite”. “Teve uma microárea que nós chamamos os garis comunitários pra ajudar na limpeza de uma casa, tinha muito lixo na casa, eu fui ajudar a conversar com a mulher que tinha transtorno mental e fiquei pé firme até a retirada do lixo pelo pessoal da limpeza, pelos garis, foi um bom trabalho”. “Às vezes você vai passando p’ra ir em algum lugar, eles te chamam e perguntam do médico, do remédio, entendeu”. “Tá certo que eu tenho que saber ouvir, mas tudo é saber falar, saber pedir, sei que é um emprego, preciso, tenho carteira assinada, mas agente [equipe] tem que saber pedir, tem que saber falar com respeito, assim como eu respeito eles [equipe] também quero ser respeitada, não só como ACS, mas como moradora da comunidade”. “A gente passa as informações p’ra eles [agentes de endemias], como a gente tá todo dia na comunidade, a gente quando encontra com eles, passa onde tem foco de alguma coisa que esteja acontecendo”. Em um estudo realizado com agentes comunitários, Lunardelo (2004) comenta sobre o caráter fiscalizador que estes profissionais tendem a apresentar em suas orientações, ou seja, fiscalizando o cuidado que a própria clientela tem em relação a sua saúde. A entonação de voz 135 e a postura corporal foram importantes para a percepção da cobrança em relação ao indivíduo ou à família. Os ACS têm como base de atuação para educação em saúde as situações mais valorizadas pelos serviços de saúde onde estão inseridos, entre as quais: hábitos de higiene, alimentação, prevenção de doenças e outras. Participam até mesmo no acompanhamento de grupos de risco, padronizados pelo SIAB, apresentando forte influência a valorizar mais o saber técnico e científico, o que os leva a buscar outras qualificações profissionais, como forma de sentir maior segurança e oferecer maior qualidade em seu trabalho, e muitas vezes não se dão conta suficientemente de suas potencialidades pela maior proximidade com o conhecimento popular. Ao realizar um estudo com agentes comunitários, Nunes et al (2002) apontam a reprodução de recomendações médicas pelos ACS sem a contextualização local, no contato com as famílias assistidas. As práticas dos agentes têm como base, freqüentemente, a reprodução do saber científico, reduzindo a complexidade dos casos e a possibilidade de uma abordagem mais integral do indivíduo. Isto nos leva a concordar com Araújo et al (2003) ao comentarem que ainda predominam as avaliações quantitativas de compreensão e retenção na memória das informações fornecidas, o que dificulta a apreensão dos sentidos sociais que são reproduzidos. “Eu como ACS, eu tô lá para buscar e eu venho trazer informações, eu lá na comunidade tô vendo o problema cara-a-cara, depois a gente repassa para os técnicos”. “Agora eles [moradores] já entenderam que têm que vim aqui, participar dos grupos de hipertensão, vim nas consultas, eles já entenderam como é o trabalho, porque o tempo todo a gente passa p’ra eles como é que funciona o módulo, o trabalho, a base do trabalho, o horário que é de segunda à sexta, até meio dia, que eles fazem a reunião deles [equipe] à tarde, a gente informa isso p’ra eles [moradores] ”. “Você [ACS] vai todo mês falar, perguntar se tá tudo bem, se tá fazendo as coisas que a gente ensina, se tá tomando os remédios, muitas coisas que a gente aprendeu que acaba colocando p’ra vida da gente, e a gente passa, mas e ai, não há uma troca, eu vou lá e cobro e o que tô levando p’ra eles [moradores]”. 136 “É um trabalho difícil, porque é assim nós temos que tá sempre visitando as famílias e sempre passando as mesmas coisas, e às vezes coisas novas, mas mesmo a gente passando é difícil entrar na cabeça da comunidade, é um trabalho que tem que tê muita paciência, tá ali sempre, falando sempre as mesmas coisas pra ir mudando aos poucos”. A situação descrita acima pode estar ilustrando situações de desconhecimento de condições ou cuidados de saúde pelos moradores, nas quais atua um modelo de comunicação cuja proposta é a transmissão de informações, sem considerar suficientemente as experiências de vida e seus significados para os usuários do PSF. Ou seja, o fato de o ACS ser morador e integrante da comunidade onde trabalha, embora possa ser um facilitador, não garante necessariamente uma comunicação dialógica e participativa com os demais moradores. Não devemos esquecer, sobretudo, que a família representa um sujeito ativo no processo de cuidado em saúde, apresentando suas próprias estratégias, que não devem ser desconsideradas pelos profissionais de saúde (TRAD, 1999). “A gente vai tentar conscientizar a comunidade que a gente não tá ali p’ra tá tratando o doente, mas para previnir, é um trabalho de prevenção, é muito difícil colocar isso na cabeça das pessoas”. Os ACS são considerados nas equipes do PSF os principais responsáveis pela busca de informações na comunidade, principalmente através de suas atividades de cadastramento das famílias e mapeamento da comunidade, identificando possíveis parcerias com escolas, igrejas, associações de moradores, cooperativas, comércios e outras organizações presentes na comunidade. Os agentes entrevistados mencionaram a preocupação quanto às exigências para o preenchimento das fichas de acompanhamento (fichas B) e de outros dados quantitativos, o que requer parte importante do seu tempo de trabalho, sem que se alcance, na maioria das vezes, o retorno esperado com os dados obtidos. Assim, o propósito de se prestar um cuidado ampliado de saúde, ouvir, compartilhar as situações presentes, acaba sendo em parte substituído pela busca de informações dos moradores para o preenchimento de suas fichas de 137 acompanhamento, focando dados mais quantitativos e, muitas vezes, para responder a exigências de outros níveis hierárquicos. Entretanto, nem sempre os moradores se mostram disponíveis e colaboradores diante da proposta de trabalho dos ACS. A recusa de algumas famílias em fazer o cadastramento ou mesmo em receber o atendimento pelo agente e na unidade de saúde tende a ser explicada pela falta de credibilidade no PSF e outros serviços públicos. Segundo os ACS, isto requer tempo e confiança conquistados a cada dia de trabalho, através de estratégias para a conquista, algumas tendo como suporte a própria unidade de saúde, oferecendo os atendimentos médicos, vacinação, serviço de odontologia etc.; mas também a criação de vínculos de confiança, amizade e solidariedade facilitada pela convivência e conhecimento dos moradores. “Eu tenho recusa do primeiro cadastro que eu fiz, e mais três recusas de moradores que vieram depois, moradores que não quiseram participar do programa, eles disseram que isso não serve p’ra nada, porque vieram na época que tava com falta d’água, ai a gente não pode chegar e ficar batendo de frente, tem de esperar o dia que tiver com a cabeça mais fresca e poder tá esperando um pouco, p’ra poder trazer essa pessoa p’ra gente”. “Têm uns que já falam tudo, que tá faltando as coisas dentro de casa, que não têm dinheiro, que tá desempregado, que não têm comida, entendeu, tem tudo isso.Quando ocorreu assim algumas coisas, comida, eu consegui pegar uma cesta básica, ajudar em alguma coisa fora do trabalho né”. “Com o tempo as pessoas passam a gostar do trabalho, vê o trabalho indo direito, passam a confiar , porque no começo eles não confiam, não adianta, ai você vai indo lá tem grupo disso, tem isso, tem grupo daquilo, faz isso, faz aquilo, aí você acaba pegando aquela amizade, aí eles (moradores) acabam confiando no seu trabalho, mas logo no início é difícil”. “O tempo que a gente fica acompanhando as famílias ajuda, quando as pessoas são mais resistentes, porque é muito difícil você conhecer as cento e setenta e cinco famílias, (...) Agora têm pessoas que não querem receber ninguém, eu jogava papelzinho em baixo da porta, dizendo: eu estou aqui, que Deus tê abençoe, até que ela me recebeu e ela tinha um problema que a família tinha abandonado ela, ai ela se sentia abandonada, ai ela ficava fechada em casa, problema emocional, e eu jogava o papelzinho em baixo da porta e ela acabou me recebendo”. “Eu acho que o importante é a gente tá sempre aparecendo lá, tá sempre vendo a gente, p’ra cada dia tê mais confiança, eu consegui muitas entradas em casas assim, de a gente tá sempre passando, sempre conversando, umas falam muito, outras falam um pouco, mas eu acho que é o agente tá sempre ali, batendo, batendo, batendo até quebrar essa barreira, eu acho que é assim que a gente vai conseguindo”. “Você chega brinca, conversa com a pessoa, tenta ser amiga da pessoa, mas de um modo educado, falando direito e a pessoa vê que você é uma pessoa respeitada”. 138 Alguns dos entrevistados chegaram a comentar sobre o grande número de informações que buscam junto às famílias, e até mesmo defendendo-as sobre a recusa do fornecimento por algumas. Como pode ser observado nas seguintes falas: “Tem gente que é muito fechada, eu acho que isso é dá pessoa mesmo, eu também ficaria assim se alguém chegasse na minha casa perguntando um monte de coisas, eu não ia responder tudo, não ia mesmo, eu acho que eles (famílias) dão (informações) até demais p’ra gente. É uma conquista”. “O fato como você chega nessa pessoa ajuda muito, porque eu não posso chegar e perguntar, tem uma lista quando você preenche a ficha do cadastro, você tem isso, tem aquilo, a pessoa não vai dizer nunca, entendeu”. Estes exemplos ilustram situações em que a criação de vínculo se apresenta como uma condição necessária para o desenvolvimento das atividades dos ACS junto às famílias, que conseguem dessa forma afirmar um espaço de interlocução mais ativo, seja nas relações com os ACS, seja no contato com os demais profissionais nos módulos do PSF. O desenvolvimento do trabalho dos ACS se depara com inúmeros limites, os quais, ao serem reconhecidos em suas práticas, são enfrentados através da intersetorialidade. A atuação do PSF implica em articulação dos serviços de saúde a outras instâncias governamentais e não governamentais, configurando uma rede de serviços e de relações que devem estar direcionados para objetivos comuns, para o desenvolvimento de mecanismos de intervenção nos problemas concebidos num conceito ampliado de saúde, como uma questão de natureza social (SUCUPIRA, 1998). Constatamos nas diversas falas que o fato de os ACS representarem os serviços de saúde nas comunidades com a quais convivem, coloca-os muitas vezes em situações desagradáveis. Diante da falta de resolutividade dos problemas e de práticas que não chegam a ser concretizadas, sentem-se pressionados pela comunidade e abandonados pelos órgãos públicos, o que causa uma sensação de desânimo. Ao indagarmos sobre sua rotina de trabalho, percebemos a intensa responsabilidade que assumem ao fazer parte do PSF, como também as esperanças que lhes são depositadas pela comunidade, ficando algumas vezes desacreditados e desvalorizados diante das famílias. 139 A falta de apoio de outros setores públicos ao trabalho dos agentes provoca uma grande frustração, que chega a interferir até mesmo em sua própria família. “A gente tem que ter fé e acreditar no trabalho que tá fazendo, melhorou muito do PACS para o PSF, temos mais um suporte, melhorias, mas precisamos melhorar mais, às vezes a comunidade cobra que quer e a gente não pode dá. E o agente comunitário vai p’ra comunidade acreditando e tentando contornar isso, a gente não é a solução”. “No começo a gente teve que viver dentro de uma realidade e saber muito bem colocar na cabeça da gente nossas limitações, que a gente vai ver aquelas coisas todas e a gente não tem o direito de levar aquilo p’ra casa da gente. Eu já tava entrando num processo com meu marido, que eu já tava culpando ele de tudo, tudo, de alguma coisa, a gente se envolve com a situação, quando chega na hora que a gente quer andar com a situação a gente tem que se conter (...) Ai é um trabalho todo que se perde, e com isso nós é que estamos lá dentro, inserido na área é que perdemos a credibilidade”. “Quando é aquele problema que é fácil, que nós mesmo da equipe consegue resolver é tranqüilo, agora quando é aqueles casos, que nem a equipe pode resolver e nem às vezes o pessoal de fora, o GAT pode resolver, e ter aquele negócio enrolando é complicado. E a gente quer resolver, mas não tem como, então a gente fica ali em cima do muro, né. È bem complicado”. “Eu acredito que é um trabalho que gaste sua energia mental, te deixa muito mais cansado, que a gente nem coloca mais o físico, que é a subida do morro”. As situações expressas pelos agentes nos remetem a uma cobrança, representada de um lado pelas famílias, que reconhecem neles um aliado e porta voz de suas necessidades, e de outro pelos serviços de saúde, que estabelecem suas prioridades e exigências a serem cumpridas. “Às vezes você (ACS) tem que levar a resposta que a equipe decidiu e muitas vezes é a resposta que o morador não quer receber, ai chega lá em cima com uma resposta que a pessoa não quer ouvir, ai fica a desejar”. Reconhecem a importância de seu trabalho para a equipe, percebendo como um facilitador o fato de fazer parte da comunidade, conhecendo-a mais profundamente. Alguns agentes percebem o reconhecimento de seu trabalho pelos moradores da comunidade e pela equipe técnica. “Nós conhecemos bem mais a comunidade, além de morar na comunidade, a gente trabalha nela. E eles (equipe) estão fora, eles realmente não vêem o que acontece lá”. 140 “Eu acho que o fato de o agente ser morador da comunidade ajuda, pois comigo eles (moradores) ficam bem mais à vontade porque me conhecem, do que quando vai uma outra que eles (moradores) não conhecem, ou quando eu vou com o enfermeiro”. “Eu sinto o reconhecimento de meu trabalho dos dois lados (equipe técnica e comunidade) ainda mais quando a gente consegue resolver, quando consegue resolver a gente vê que a gente tem valor, que a gente é reconhecido mesmo, a gente escuta muito elogio também”. “No início eu achava mais dificuldade em relação (deu uma pausa) aos meninos ai de cima (violência), porque a minha área é a pior (...) E eu tinha que ter uma estratégia de falar com eles, para eles virem até a unidade, tinha que ter calma e paciência para falar com eles, olha o médico vai te atender, vocês vão me acompanhando, eu vou na frente e vocês vão me acompanhando. Agora eu já tenho prática e sempre o enfermeiro vai comigo fazer as visitas”. Com a intenção de contribuirmos com propostas de melhores condições de trabalho, questionamos os agentes de saúde sobre suas principais dificuldades na realização das atividades. Obtivemos como resultados: Falta de organização dos serviços de saúde no município e descontinuidade das ações; Maior credibilidade ao trabalho do agente; Distância entre a unidade de saúde e a comunidade de atuação do ACS, e Falta de segurança em algumas microáreas. Mencionaram com maior intensidade a falta de continuidade dos serviços oferecidos, sentindo-se os mais prejudicados com a situação, pela sua proximidade com a comunidade assistida e a confiança que lhes é depositada pelos moradores. “Eu acharia que deveria ter mais estrutura no nosso trabalho, a insatisfação é só quando não realizamos o que nós queremos, deveria ter mais suporte”. “Eu acho que ainda falta mais reconhecimento do agente comunitário, ser mais respeitado por parte da comunidade e dos profissionais. Às vezes a gente não se sente muito valorizado não, você tem aquele receio sabe (...) Nas nossas reuniões a gente está buscando isso, os direitos da fala do ACS, brigar por seus direitos. O que cabe ao ACS fazer e o que não cabe, a gente é igual bombril multi-uso, trabalho interno e externo a comunidade, os cursos, somos convocados para as reuniões e a gente tem de ir e a gente acha que com tudo isso que fazemos, ainda não somos reconhecidos pela comunidade e pela equipe. Precisam acreditar mais no ACS, se estão vendo que trabalha acredite nele, dê o apoio”. “Deve ter mais estrutura para trabalhar, outra queixa que eu tenho é o local que eu faço, eu acho que em alguns casos os agentes poderiam fazer sua área acompanhada de um outro agente, nunca sozinho entendeu, dependendo do local, eu não vou jamais numa família que eu sei que ali só mora um homem, eu tenho medo”. 141 “Eu acho que o número de famílias é muito elevado, tem horas que eles [equipe técnica] acham que nosso trabalho não tem muito valor, muita precisão, a comunidade já acha que é válido, eles agradecem, eles adoram o nosso serviço, a gente sente neles que eles gostam. Só não é melhor pela demora do atendimento, devido ao sistema de saúde, eles chegam lá e demoram a ser atendidos”. Entre os fatores facilitadores para o desempenho de suas funções, indicaram os ganhos obtidos com o contrato de trabalho, com carteira assinada, décimo terceiro salário e férias, afirmando segurança quanto a esta questão. Afirmaram também que a implantação do PSF trouxe melhores recursos e ganhos para toda a comunidade. “A questão do contrato a gente não têm o que reclamar”. “A gente não têm nenhum problema quanto a questão do vínculo empregatício”. “Tá bem melhor hoje, melhorou 100%, pois nos anos anteriores a gente não tinha nada. Desde o PACS tinha orientação e prevenção à saúde, tudo bem que isso continua até hoje, mas em compensação eles(moradores) precisavam de certos recursos e não tinha, agora com o módulo ai tem mais recursos, faz grupos de hipertensão com nutricionista, faz grupos de gestantes, preventivos, tem várias coisas que no anterior não tinha”. “O atendimento no PSF é diferenciado, o médico acolhe, conversa, olha olho no olho, vai na casa, conhece a família. Eu sei que às vezes a gente precisa ir na emergência de um hospital, e a gente é tratado como um (silenciou) ”. “O PSF foi a melhor coisa que aconteceu na nossa comunidade, ajuda muito, isso aqui ajuda muito. É uma esperança p’ra muita gente que precisa, tanto de um passeio, de um médico, de conversar, de uma oportunidade, tem gente que nem sabia o que era um preventivo, tem uma senhora que tem cincoenta e poucos anos e nunca tinha feito um preventivo e foi fazer aqui a primeira vez”. As falas dos ACS demonstraram uma concordância com a construção dos mapas. Se observarmos as relações estabelecidas com os moradores, estas parecem ter como apoio os serviços de saúde, com possibilidades de troca entre o contato com a família e os serviços oferecidos, tais como: a marcação de consulta, acompanhamento da medicação, exames médicos e outros. Reproduzindo assim, o que predomina em sua relação com a equipe, representada nas equipes A e B de maneira verticalizada e pouco dialógica. Já nas equipes C e D, apesar de permitir maior participação e compartilhamento de todos da equipe, encontra 142 ainda algumas atividades e limites, justificada pelo autoritarismo manifestado pelo GAT, o que também depende de outros níveis do sistema, como o MS. 7.8.4 A participação dos vários interlocutores da comunidade no trabalho do ACS Com a construção do mapa de comunicação, identificamos os principais interlocutores da comunidade de atuação dos agentes comunitários. Destacando-se entre eles, os moradores antigos, os agentes de endemias da Funasa e os garis comunitários. - Os moradores antigos: foram considerados participativos no trabalho do ACS e na unidade de saúde, permitindo o diálogo e a troca de informações. Estão representados no mapa com uma seta bidirecional na cor amarela, o que indica um lugar de pouca influência em comparação aos que representam mais diretamente as instituições de saúde. Apesar do impacto limitado das informações de saúde provenientes dos moradores antigos junto aos ACS, estes reconhecem sua importância na troca de informações, na participação nos serviços de saúde, como também na influência que exercem sobre outros moradores. “Teve um trabalho aqui na unidade uma vez, que eles [moradores antigos] participaram, falando da história da comunidade, eles sempre contribuem”. “Os moradores antigos participam sim, vêm na reunião, às vezes eles tão aqui na reunião participando, existe troca de informações, tem morador que participa da associação que às vezes eles tão aqui, eles conhecem os problemas da comunidade”. “Os moradores mais antigos conhecem tudo, conhecem quem está entrando, quem está saindo, na minha área tem uma casa de, como é mesmo que fala, é uma casa de oração (falou em voz baixa), mas não é igreja, é eu acho que é coisa de mesa, essa daí passa muita informação para gente, ela é bem antiga na comunidade, ela conhece tudo, até quando inaugurou a unidade ela deu umas fotos p’ra gente, umas fotos muito boas do morro”. “Às vezes não dá tempo de você visitar todas as famílias, então, pelo menos na minha microárea, um dia desses aconteceu isso, eu estava fazendo uma visita domiciliar em uma outra rua e um morador passou e falou: Olha o Sr.(...) faleceu, a comunidade é bem participativa, inclusive quando eles ouvem que estão falando mal, eles defendem a gente”. 143 Duas equipes (C e D) dispõem de uma reunião mensal na qual contam com a participação regular dos moradores, de maneira a expressar suas necessidades e opiniões quanto aos serviços de saúde, formular novas estratégias de enfrentamento dos problemas locais. Em algumas situações, a comunidade utiliza suas próprias estratégias, como o fato de omitir certas informações aos ACS e a outros profissionais ali atuantes, recusa ao atendimento e visita domiciliar, procura de outros meios para chegar à unidade de saúde e atingir seus objetivos, colocando os agentes em situações desconfortáveis com a equipe, ao atribuírem sua procura diretamente na unidade pela ausência do ACS na microárea. “Mas tem também famílias que são assim, você marca a consulta e eles não vêm, e quer vim o dia que acha que deve vir. Então, essa é uma família problema, ao invés de ela falar a verdade, ela diz que o agente não marca a consulta, não faz a visita”. “Às vezes a família não fala comigo, mas vem aqui e fala que eu não passo p’ra fazer visita, então o que vale pra eles (equipe técnica) é a palavra da pessoa, aqui tem esse problema também”. “Existem algumas família que realmente não falam o que está acontecendo ali, eles não falam, muitas vezes você fica sabendo por vizinhos, às vezes você está ali na hora fazendo as perguntas, mas eles não falam. Eu tive um caso de três gestantes ao mesmo tempo, uma veio até mim e me pediu para marcar a consulta, as outras duas não falaram nada, e eu vim saber depois, como já estava passando o tempo, e elas não vieram até mim eu fui e perguntei, você está gestante? Pra você ir fazer pré-natal, tal dia e tal hora. Muitas vezes eles [moradores] não falam nem com o agente nem com a equipe, ai você tem de ser cara-de-pau mesmo e perguntar”. “A gente tem de ir lá na comunidade e identificar as pessoas que recebem bolsa família de casa em casa, e detalhe, tem gente que não fala, tem casa com televisão ligada com DVD, com ar-condicionado, que recebem cheque cidadão, e eles não falam que recebem, às vezes a gente sabe que recebem, e eles não falam. Ai depois a cobrança vem em cima do agente”. Em um estudo realizado por Nunes et al (2002) foi evidenciado as várias formas de resistências manifestadas pelas famílias, desde simplesmente não adotar as medidas repassadas pela equipe, até a recusa em recebê-los em seu domicílio. Esses casos de resistência podem ser entendidos muitas vezes pela falta de interação entre ambas as partes, em que uma faz uso de seu poder para o estabelecimento de comportamentos e outra, como forma de defender-se, procura ignorá-los. 144 Apesar de ser considerado que, pelo fato de o ACS ser morador da comunidade poderá atuar como facilitador de vínculo, por outro lado a comunidade procura nele comportamentos que assegurem questões éticas, ao comparar seus comportamentos enquanto morador da comunidade. Questões que devem merecer atenção no processo de seleção dos agentes. “Eu tenho o caso de uma menina que tem AIDS, e ela tinha 19 anos na época e não contava isso p’ra ninguém, e veio contá p’ra mim, e eu tive de pegar o pessoal da minha equipe e tentando conversar com ela que a gente estaria ali p’ra ajudar, que não ia ser um fofoqueiro da vida que ia espalhar p’ra comunidade toda. Eu acho que eles [moradores] associam muito a imagem de um morador que eles confiam também, eles associam muito isso a imagem não só como profissional, mas a imagem do agente como pessoa que eles já conhecem há bastante tempo”. “O fato de eu morar 33 anos nesta comunidade facilita muito, pois eles me conhecem desde pequena”. “Eu sempre trabalhei na igreja, então eles já me conhecem há muito tempo”. Com base nestas falas, podemos perceber que a participação dos moradores é percebida pelos agentes tantos de maneira positiva, quando contribui com o trabalho da equipe, como de maneira negativa, quando atrapalha a dinâmica de atividades e, especialmente, quando coloca em questão a função do ACS na equipe. Apesar do vínculo com os moradores ser considerado um elemento central nas atividades dos agentes comunitários, a participação ativa dos usuários é considerada pouco relevante no conjunto de interlocutores identificados. - Os agentes de endemias da FUNASA: apresentam uma participação no trabalho dos agentes, permitindo troca e diálogo, apesar de alguns agentes comentarem sua baixa freqüência na comunidade. Entre as instituições que representavam na comunidade a Secretaria de Assistência Social e Urbanística do município do Rio de Janeiro, estavam presentes somente nas equipes A e B a FUNLAR, o POUSO e o CEMASI, apresentando diferenças na forma de atuação. O CEMASI com uma influência quase nula e considerado apenas como emissor de 145 informações, enquanto o POUSO e a FUNLAR foram identificados pelos participantes com uma ação mais dialógica. “Quando a gente precisa dos agentes de endemias, eles vêm e ensinam a gente como trabalhar, a última vez foi lá eles trazem bastante informação p’ra gente”. - O gari comunitário: representa os serviços da COMLURB, é um morador da comunidade de fácil acesso, sendo responsável pela coleta de lixo e a limpeza do local. Oferece apoio ao trabalho do agente de saúde, porém a relação entre eles se dá através do repasse de informações para as equipes A e B e com uma participação mais horizontal nas equipes C e D. A comunidade conta com profissionais que atuam no local em prol de melhorias, como os agentes de endemias, garis comunitários, a equipe técnica do PSF e os próprios ACS. Juntos representam um avanço nos serviços de saúde pública pela sua maior proximidade com a realidade local. Porém, parece não haver uma atuação conjunta suficientemente integrada, representando as instituições de saúde, maior poder frente aos demais. Isto foi representado de maneira semelhante nos dois mapas ao mencionarem nas equipes (A e B) Grupo de Apoio Técnico (GAT)/ muítissima influência, ACS/ muita influência, equipe técnica/ média influência e os agentes de endemias e os garis comunitários/ pouca influência. Já as equipes (C e D) apontaram a equipe técnica/muítissima influência, ACS/ muita influência, GAT/ média influência e os gari e agente de endemias/ pouca influência. - A associação de moradores: foi considerada com pouca influência por todas as equipes estudadas. Quanto às igrejas, tivemos a presença da católica nas equipes A e B com influência quase nula, e nas equipes C e D tivemos a presença da igreja católica e da evangélica, com maior participação nas atividades de saúde. Porém, esta participação ainda se limita principalmente à cessão de espaço físico para a realização de atividades na comunidade, como campanhas de vacinação, atividades educativas e outras. “As igrejas ajudam nas campanhas, cedem espaço e ajudam na divulgação, ela contribui demais, ficam o dia inteiro quando têm campanha”. 146 O PSF concebido como uma forma de intervenção no plano cultural e social, envolve as diversas vozes que se fazem presentes na comunidade, considerando de que maneira se articulam e interferem nas formas de representação das condições de saúde. Como exemplo temos as igrejas, ONG’s, associações e outros. Assim estaremos com maiores possibilidades de atingirmos os objetivos traçados, com participação de todos os envolvidos e divisão de responsabilidade. 147 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Não devemos desconsiderar os avanços obtidos com a reforma sanitária, garantindo legalmente o espaço de participação da população, favorecendo assim condições mais igualitárias, justas e democráticas. O PSF veio para facilitar esta proposta, pela proximidade de seus profissionais com a comunidade e as famílias acompanhadas, prestando um atendimento mais humanizado, comprometido com a população local e a transformação social. Esta proposta de atendimento representa novos desafios para os profissionais de saúde, usuários e gestores, na perspectiva de favorecer o desenvolvimento de construção da cidadania e participação popular. O agente comunitário é visto com um grande potencial de permitir a união entre os serviços de saúde e a comunidade, considerando as singularidades do local. Porém, na prática de sua atuação podemos perceber freqüentemente uma outra direção, na qual ainda predomina o modelo centrado na doença, fiscalizador, avaliado por medidas prescritivas. Estas atitudes encontram-se reforçadas pelas situações hierárquicas do sistema de saúde. A cultura institucional e a forte resistência da tradição centralizadora, na sociedade e nos serviços de saúde em particular, tendem a valorizar as concepções médico-científicas hegemônicas, com medidas padronizadas pelas autoridades sanitárias a serem seguidas pela população, desqualificando outras experiências e saberes populares, com o fortalecimento do poder de fala e do autoritarismo de um pequeno grupo e a conseqüente falta de comprometimento, justificada pela ausência de informações ou capacidade de entendimento de uma maioria. As atividades de diversos profissionais da equipe de saúde tendem a não favorecer o diálogo e a desconsiderar as singularidades, histórias de vida, questões culturais, valores e desejos, baseando-se predominantemente em uma prática normativa e no cumprimento de 148 metas, com poucas possibilidades de mudanças nas relações que as pessoas estabelecem com seus problemas de saúde, e com isso trazendo a falta de autonomia e responsabilidade pelos seus próprios cuidados relacionados à saúde. Sentindo-se os profissionais frustrados com suas atividades e os poucos resultados obtidos. As atividades das equipes de saúde encontram-se, fortemente baseadas nas relações hierárquicas estabelecidas com os próprios coordenadores. Apesar dos avanços teóricos com novos modelos de atuação nos serviços de saúde, na prática sua execução ainda sofre uma influência abrangente do modelo hegemônico, com valorização de campanhas e medidas diretivas de controle. Observamos que as visitas domiciliares encontram-se mais direcionadas ao controle da vida do indivíduo - uso correto de medicação, acompanhamento de consulta médica, cartão de vacina, passando desapercebidas pelo agente de saúde muitas vezes outras situações que continuam reforçando as atitudes das famílias. A comunicação presente nos serviços de saúde tende a desconsiderar um contexto mais ampliado e ainda valoriza pouco alguns aspectos que consideramos essenciais, entre os quais os significados subjetivos que envolvem as práticas de cuidado e saúde, como também as condições concretas disponíveis para sua viabilização. Ao reforçar medidas técnicas e padronizadas, as propostas do PSF colaboram com a continuidade do modelo tradicional, sem a suficiente valorização de relações horizontalizadas entre o saber científico e o popular, como também de ações participativas e dialógicas. As relações dos ACS estabelecidas tanto na equipe técnica, como com a comunidade revelam a ausência de uma maior interação entre as diferentes categorias profissionais e os segmentos sociais envolvidos, o que nos leva a considerar fundamental uma reavaliação do processo de trabalho e de formação (acadêmica e continuada) dos profissionais, enfocando a centralidade do diálogo, das trocas e das negociações no processo da transformação social. 149 Ainda que haja avanços importante, como expressa a inclusão dos ACS na equipe de saúde, a prática da comunicação se repete, com as vozes dominantes procurando manter seu lugar de fala, com a valorização de discursos verticalizados e uma escuta ainda reduzida de outros segmentos sociais, sendo esta uma das grandes dificuldades para avançarmos no processo de compreensão e de mudança dos diferentes significados sociais. Diante das situações comentadas, cabe uma reflexão sobre como permitir a expansão do PSF para além de um trabalho técnico hierarquizado, sem tentarmos avaliar o processo de comunicação na equipe e com a comunidade. A relação mais dialógica e participativa tende a permitir o desenvolvimento de competências do trabalho ACS com maior autonomia, iniciativa e compromisso, refletindo em suas relações com os moradores com maiores possibilidades de participação e compreensão de suas necessidades. É interessante comentar que nas equipes onde havia maior predomínio e formas de comunicação verticais e autoritárias, o ACS fazia uso de suas próprias estratégias de enfrentamento, reconhecidas pelos demais da equipe como alienação ou descompromisso, justificadas pela pouca participação dos ACS. Reconhecemos os inúmeros desafios e responsabilidades sobre a equipe técnica, ficando ainda mais sobrecarregada pelas dificuldades de divisões de responsabilidades e compromissos, envolvendo tanto a comunidade, quanto outros setores da sociedade. Isto leva os integrantes das equipes sentirem-se frustrados com os resultados insuficientes de suas atividades e os únicos responsáveis pelas soluções dos problemas apresentados. Constatamos com a pesquisa que duas equipes apresentavam maior envolvimento tanto internamente, como com a comunidade, apresentando como resultados maior responsabilidade de todos os envolvidos. O espaço das capacitações e reuniões permitiam maior envolvimento de todos os integrantes da equipe, em que todos sentiam-se envolvidos com os processos de trabalho, demonstrando maior autonomia em suas ações. Enquanto que as duas outras equipes apresentavam, de acordo com a maioria das falas, um clima de tensão e 150 disputas internas, com maior concentração de atividades para profissionais específicos e uma relação mais verticalizada com a comunidade. Apesar dos avanços observados nas duas equipes, pudemos constatar traços de autoritarismo, restando ao agente muitas vezes apenas retransmiti-lo aos moradores das comunidades assistidas. Como propor aos ACS a atividade de facilitadores de vínculos, favorecendo o acesso aos serviços de saúde e a participação da população, quando estes estão sendo estimulados a transmitir informações e ditar mudanças de comportamentos? Como esperar dos ACS uma relação dialógica e participativa com a comunidade, quando não conseguem vivenciar este modelo no interior das equipes em que trabalham e nas capacitações profissionais que recebem? Ao representar para a comunidade predominantemente o lugar instituído dos serviços de saúde, os ACS tendem a ter como resposta dos moradores estratégias de enfrentamento e resistência. Captar as necessidades de cada um dos envolvidos, requer dos profissionais abertura, escuta, estabelecimento de vínculo, laços de confiança, oferecendo possibilidade para a fala e para o diálogo, com compreensão empática das necessidades. Convém desde às CAP’s estimular a participação da população, permitindo novas formas de compreensão das práticas comunicativas no PSF, constituindo uma relação mais próxima, horizontal e dialógica entre o Estado, as instituições de saúde e a comunidade. O mapeamento das redes locais de sentido permitiu identificar algumas estratégias de comunicação que ocorrem nas práticas do PSF e na comunidade, facilitando assim, a compreensão entre as diversas articulações, estratégias e negociações que ocorrem no campo da prática. Percebemos que os interlocutores são considerados de maneiras distintas entre as comunidades. A construção do mapa do mercado simbólico tornou mais claro as diversas redes de produção de sentido de cada comunidade e os principais fluxos de comunicação sobre as informações de saúde, permitindo avançar na apreensão qualitativa dos processos de 151 construção e disputa de sentidos que atravessam as práticas humanas e sociais que estão presentes, de maneira singular na estratégia da saúde da família. Através dos resultados obtidos com este estudo, consideramos que a mobilização social, envolvendo profissionais e população atendida no PSF, é essencial para se atingir resultados mais condizentes com os princípios do SUS, em especial o de participação da população e o de integralidade da assistência. O que requer um modelo de comunicação mais avançado, capaz de sustentar práticas mais coerentes com o conceito ampliado de saúde. Entendemos que o trabalho em equipe no PSF deve ser reavaliado por todos os envolvidos.O encontro nas reuniões de equipe pode ser um espaço propício a esta mobilização, permitindo avanços no sentido de colaborar para uma maior aproximação de todos, favorecendo trocas e crescimentos e facilitando as relações com a comunidade. Incluir o agente comunitário desde o planejamento das atividades, até sua execução e avaliação, poderá contribuir no seu envolvimento nas diferentes atividades, as quais concentram-se na grande maioria das vezes sob a responsabilidade do médico ou do enfermeiro. Entretanto, notamos uma predominância nos espaços das reuniões de transmissão das informações, como estratégia de comunicação, freqüentemente já elaboradas por outros níveis hierárquicos, ficando a equipe responsável apenas por executá-las. Um outro ponto a ser destacado, mencionado pelos ACS, diz respeito à percepção quanto à extensão de suas responsabilidades, até mesmo por questões que ultrapassam sua capacidade resolutiva, colocando-os em uma situação desconfortável na comunidade. Isso ocorre, por exemplo, quando não conseguem oferecer soluções para alguns casos, tais como um atendimento mais especializado, atendimentos a portadores de deficiências especiais, saneamento básico, etc. Entendemos que o processo de implantação do PSF deva ser articulado com vários setores da sociedade, de maneira a possibilitar que todos se sintam responsáveis pelos objetivos almejados, trabalhando a interdisciplinaridade em busca da integralidade da 152 assistência. Caso contrário, ao se desconsiderar a complexidade de sua atuação, corremos o risco de ver o PSF oferecer uma medicina pobre direcionada para pobres, confirmando a crítica que lhe é, dirigida. Neste caso, a responsabilidade de oferecer respostas adequadas à população fica nas mãos dos que se encontram mais próximos dessas necessidades. 153 REFERÊNCIAS 1. ALVES, V.S. Um modelo de educação em saúde para o Programa Saúde da Família: pela integralidade da atenção e reorientação do modelo assistencial. Revista Interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, SP, v. 9, n. 16, p. 39-52, set. 2004/fev 2005. 2. ALMEIDA, M.C.P; MISHIMA, S. M. O desafio do trabalho em equipe na atenção a saúde da família: construindo “novas autonomias” no trabalho. Revista Interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, SP, v. 5, n. 9, p. 150-153, ago. 2001. 3. ARAÚJO, I.S. (Org.). Promoção da saúde e prevenção do HIV/AIDS no município do Rio de janeiro: uma metodologia de avaliação para políticas públicas e estratégias de comunicação. Relatório de Pesquisa. Rio de janeiro, jul. 2003. 4. ______. Razão Polifônica: a negociação de sentidos na intervenção social. Revista Perspect. Cienc. 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O trabalho em equipe no PSF: Investigando a articulação técnica e a interação entre os profissionais. Revista Interface - Comunicação, Saúde, Educação, São Paulo, v. 9, n. 16, p. 25-38, Set. 2004. 80. SPENCER, J.C. The usefulness of qualitative methods in rehabilitation issues of meaning, of context and of change. Archives of Physical Medicine and Rehabilitation, v. 74, p. 119-126, 1993. 81. SPINK, M.J.P. (Org.). Práticas discursivas e produção de sentidos no cotidiano: Aproximações teóricas e metodológicas. São Paulo: Cortez, 1999. 82. SOUZA, H.M. Programa saúde da família: entrevista. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 53, n. especial, p. 7-16 , 2000. 83. SUCUPIRA, A.C.S.L. Repensando a atenção à saúde da criança e do adolescente na perspectiva intersetorial. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 32, n. 2, p. 61-78, 1998. 84. TOMAZ, J.B.C, O Agente comunitário de saúde não deve ser um “Super-Herói”, Revista Interface -Comunicação, Saúde, Educação. 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Perfil de Competências Profissionais do Agente Comunitário de Saúde (ACS) – Versão Preliminar- Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2003. 161 APÊNDICE - A Universidade Estácio de Sá Mestrado Profissional em Saúde da Família Comitê de Ética em Pesquisa Rua Riachuelo, 27, 6° andar, Lapa, Rio de Janeiro-RJ. Tel.:(021)3231-6135 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Você está sendo convidado (a) a participar da pesquisa "Comunicação no Programa Saúde da Família: O Agente de Saúde Como Elo Integrador Entre a Equipe e a Comunidade", porque é um dos profissionais que integra uma equipe de saúde do Programa de Saúde da Família - PSF. Sua participação não é obrigatória, mas é muito importante. O objetivo desta pesquisa é contribuir para melhorar a comunicação nas equipes do PSF e entre estas e os usuários dos serviços de saúde. Sua participação consistirá em fornecer alguns dados relacionados a sua inserção na equipe do PSF. Os dados obtidos através de sua participação serão agregados aos obtidos junto a outros profissionais, inclusive de outras equipes de saúde, e serão divulgados através de artigos e eventos científicos, garantindo o anonimato dos entrevistados. Sua participação não será remunerada, mas estará contribuindo para o aprimoramento dos serviços de saúde oferecidos através do PSF, como também para a formação acadêmica de estudantes e pesquisadores. A qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento, sem que isto represente qualquer prejuízo em sua relação com os pesquisadores, com o Serviço de Saúde Municipal, ou ainda com a Universidade Estácio de Sá. Em caso de dúvida, você poderá esclarecêlas através de contato telefónico com a pesquisadora responsável ou no endereço acima. Pesquisadora Responsável: Andréa dos Santos Cardoso - RG 1550122-1SSP-AM Rio de Janeiro,____de______________________de 2006. Declaro que entendi os objetivos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em participar. Entrevistado__________________________________________________ Documento de Identificação_____________________________________ 162 APÊNDICE - B Roteiro de encontros dos grupos focais. 1º Encontro - Apresentação de todos os integrantes do grupo; - Conhecer a chegada do ACS no PSF (desenhos e exposições); - Identificar os aspectos que facilitaram e dificultaram sua chegada na equipe. 2º Encontro - Utilização de dinâmica – que consisti em oferecer grande número de informações ao mesmo tempo a um dos integrantes do grupo, para posterior reflexão sobre as diversas fontes de informações que recebemos a todo instante, e a seleção que realizamos das mesmas; - Início da construção do mapa do mercado simbólico com o seguinte questionamento: De onde vêm as informações que vocês recebem sobre saúde? 3º Encontro - Identificar os principais interlocutores que aparecem no trabalho do ACS, a partir das informações obtidas no 2º encontro; - Identificar o lugar de interlocução e as formas de relações estabelecidas com os ACS. 163 APÊNDICE - C Roteiro para Entrevista Individual Semi-Estruturada 1. Dados de identificação Sexo___________ Idade___________ Escolaridade_______________ Tempo de trabalho no PSF__________ Nesta equipe:__________ Atividade profissional anterior__________________________________ 2. Por que escolheu trabalhar como ACS? 3.Como você percebe a comunicação no trabalho em equipe? (explorar relações entre os segmentos profissionais / meios de comunicação utilizados / fatores que facilitam ou dificultam) 4. Como a equipe recebe suas opiniões e sugestões? 5. E a comunicação com as famílias acompanhadas? (explorar facilidades e dificuldades) 6. Você notou alguma mudança na sua relação com as famílias depois que entrou no PSF? (quais/o que contribuiu ou dificultou) 7. Sua relação com as famílias interfere no seu trabalho junto à equipe? (fatores que facilitam ou dificultam) 8. Você se sente seguro para executar suas atividades? (apoio da equipe e capacitação profissional) 9. Tem alguma sugestão para melhorar sua comunicação com a equipe? E com as famílias? 164 ANEXO – A Portaria nº 1886/GM Em, 18 de dezembro de 1997 Aprova as Normas e Diretrizes do Programa de Agentes Comunitários de Saúde e do Programa de Saúde da Família O Ministro de Estado da Saúde, no uso de suas atribuições e, considerando que o Ministério da Saúde estabeleceu no seu Plano de Ações e Metas priorizar os Programas de Agentes Comunitários de Saúde e de Saúde da Família, estimulando a sua expansão; O Ministério da Saúde reconhece no Programa de Agentes Comunitários de Saúde e no Programa de Saúde da Família importante estratégia para contribuir no aprimoramento e na consolidação do Sistema Único de Saúde, a partir da reorientação da assistência ambulatorial e domiciliar, RESOLVE: Art. 1º Aprovar as Normas e Diretrizes do Programa de Agentes Comunitários de Saúde e do Programa de Saúde da Família, nos termos dos Anexos I e II desta Portaria, com vistas a regulamentar a implantação e operacionalização dos referidos Programas. Art. 2º Esta portaria entrará em vigor na data de sua publicação. 165 ANEXO - B AP 3.1 – Índice de Desenvolvimento Humano A P 3 . 1 – Ín d ic e d e D e s e n v o lv im e n to H u m a n o R io d e J a n e ir o = 0 ,7 6 6 J a r d im V ig á r io A m é r ic a G e r a l ( 0 ,7 0 9 ) ( 0 ,6 5 0 ) P a rada de Lu ca s (0,6 46 ) A P 3 .1 = 0 ,7 2 2 C o r d o v il (0,67 6 ) G a le ã o (0,69 7 ) P o r tu g u e s a (0,7 95 ) M o n e ró (0,8 41 ) Tauá (0,6 91 ) B a n c á r io s ( 0 ,7 2 4 ) F re gue s ia ( 0 ,7 4 0 ) C o co tá (?) J a r d im C a rio c a ( 0 ,7 2 9 ) P r a ia d a B a n d e ir a ( 0 ,7 9 9 ) P ita n g u e ir a (0 ,7 0 1 ) J a r d im G u a n a b a ra C a c u ia (0,8 50 ) ( 0 ,7 4 0 ) B rá s D e P in a ( 0 ,7 1 1 ) P e n h a C ir c u la r ( 0 ,7 3 9 ) P en h a (0,70 6 ) Z u m b i (0 ,8 0 1 ) R ib e ir a ( 0 ,8 0 1 ) C .U n iv e r s it á r ia (? ) O la ri a ( 0 ,7 4 5 ) ID H : A g r e g a ç ã o C . A le m ã o q u a lita tiv a d e 3 ( 0 ,5 8 7 ) d im e n s õ e s s o c ia is b á s ic a s : lo n g e v id a d e , e d uc aç ão e ren da R a m os (0,7 37 ) B on su ce ss o (0,7 44 ) M aré (0 , 5 9 7 ) M a n g u in h o s (0,6 06 ) * F o n te :C e n s o s D e m o g rá f ic o s d e IB G E (1 9 9 1 ) C o m E la b o ra ç ã o d a F u n d a ç ã o J o ã o P in h e ir a e d o IP E A 166 ANEXO - C Divisão da Área Programática 3.1 por Subsistema e População 167 168 169 ANEXO - E Senado Federal Subsecretaria de Informações LEI Nº 10.507, DE 10 DE JULHO DE 2002 Cria a Profissão de Agente Comunitário de Saúde e dá outras providências. O Presidente da República Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º Fica criada a profissão de Agente Comunitário de Saúde, nos termos desta Lei. Parágrafo único. O Exercício da profissão de Agente Comunitário de Saúde darse-á exclusividade no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. Art. 2º A profissão de Agente Comunitário de Saúde caracteriza-se pelo exercício de atividade de prevenção de doenças e promoção da saúde, mediante ações domiciliares ou comunitárias, individuais ou coletivas, desenvolvidas em conformidade com as diretrizes do SUS e sob supervisão do gestor local deste. Art. 3º O Agente Comunitário de Saúde deverá preencher os seguintes requisitos para o exercício da profissão: I - residir na área da comunidade em que atuar; II - haver concluído com aproveitamento curso de qualificação básica para a formação de Agente Comunitário de Saúde; III - haver concluído o ensino fundamental. § 1º Os que na data de publicação desta Lei exerçam atividades próprias de Agente Comunitária de Saúde, na forma do art. 2º, ficam dispensados do requisito a que se refere o inciso III deste artigo, sem prejuízo do disposto no § 2º. 170 § 2º Caberá ao Ministério da Saúde estabelecer o conteúdo programático do curso de que trata o inciso II deste artigo, bem como dos módulos necessários à adaptação da formação curricular dos Agentes mencionados no § 1º. Art. 4º O Agente Comunitário de Saúde prestará os seus serviços ao gestor local do SUS, mediante vínculo direto ou indireto. Parágrafo único. Caberá ao Ministério da Saúde a regulamentação dos serviços de que trata o caput. Art. 5º O disposto nesta Lei não se aplica ao trabalho voluntário. Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 10 de julho de 2002; 181º da Independência e 114º da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Barjas Negri Paulo Jobim Filho Guilherme Gomes Dias 171 ANEXO F Ficha Relatório SSA2- Sistema de Informação de Atenção Básica 172 173 ANEXO – G Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa