Sumário
.
. Agradecimentos......................................................................... 007
. Prefácio.à.edição.em.português.................................................. 009
1. pOr Onde cOmeÇAr? lógicA.................................................... 011
Lógica........................................................................................ 013
Método....................................................................................... 024
Filosofiaeteologia....................................................................... 026
2. O que É reAl? metAfÍsicA....................................................... 029
Paracomeçodeconversa............................................................... 030
Oproblemadosuniversais........................................................... 032
Identidade.................................................................................. 041
Substâncias,essênciasenaturezas................................................. 043
Modalidade:onecessário,opossíveleoatual................................. 050
3.
cOmO cOnheÇO? epistemOlOgiA............................................ 053
Tiposdeconhecimento................................................................. 054
Oqueéconhecimento?................................................................. 056
Oproblemadoceticismo............................................................... 073
Conclusão................................................................................... 077
4. cOmO devO viver? ÉticA......................................................... 079
Metaética................................................................................... 081
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FILOSOFIA CONCISA
Ética normativa......................................................................... 089
Por que ser moral?....................................................................... 101
5. O que eu sou? Antropologia filosófica e teológica......... 105
Filosofia da mente....................................................................... 105
A consciência e o dualismo da propriedade..................................... 107
O eu e o dualismo da substância................................................... 112
Objeções ao dualismo................................................................... 116
Uma crítica das alternativas fisicalistas ao dualismo..................... 119
Liberdade e determinismo............................................................ 122
Implicações teológicas do debate acerca o livre-arbítrio................... 127
6. Como os cristãos devem pensar sobre a ciência?
Filosofia da ciência............................................................... 129
Onde encontrar socorro?.............................................................. 131
Cego pela ciência (cientificismo)................................................... 132
A ciência teísta e o naturalismo metodológico................................. 136
O debate realismo/antirrealismo................................................... 146
Modelos para a integração ciência e teologia.................................. 148
7. Para onde devo seguir daqui em diante? A batalha
pela cosmovisão e a crise intelectual................................. 153
O conflito das cosmovisões e a crise intelectual................................ 153
Salvando a alma e salvando a mente............................................ 154
Agradecimentos
Tentamos.escrever.um.livro.de.leitura.acessível.que.apresentasse.uma.discussão.
útil.de.pontos.filosóficos.básicos.e.que.são.de.grande.relevância.não.só.para.fazer.
teologia,.mas.para.construir.e.defender.a.cosmovisão.cristã..Muitos.nos.ajudaram.
nessa.empreitada..Queremos.agradecer.a.nossos.caros.colegas.do.departamento.de.
filosofia.do.Seminário.Talbot.—.William.Lane.Craig,.David.Horner.e.Scott.Rae.
—.por.sua.profunda.amizade,.por.seu.vibrante.testemunho.cristão.e.pelo.estímulo.
filosófico.que.com.frequência.nos.proporcionam..Somos.gratos.a.nossos.alunosassistentes.de.pós-graduação,.Brian.Pinkston,.Scott.Sevier.e.Gary.Osmundsen,.
por.nos.servirem.tão.animada.e.habilmente.na.preparação.deste.livro..Somos.gratos.à.Universidade.Biola,.por.nos.oferecer.bolsa.de.incentivo.ao.desenvolvimento.
docente,. com. o. intuito. de. financiar. nossa. pesquisa. e. escrita.. J.. P.. Moreland. é.
grato.ao.Eidos.Christian.Center.[Centro.Cristão.Eidos],.por.oferecer-lhe.recursos.semelhantes..Como.sempre,.Jim.Hoover.fez.excelente.trabalho.como.editor.
da.InterVarsity.Press,.e.lhe.agradecemos.por.seu.trabalho.árduo..Nossas.esposas,.
Barbara. DeWeese. e. Hope. Moreland,. proporcionam-nos. exatamente. aquilo. de.
que.necessitamos.para.prosseguir..É.difícil.conceber.que.este.livro.viesse.a.existir.
sem.o.amor.e.o.compromisso.que.elas.têm.pela.causa.de.Cristo..Por.fim,.somos.
gratos.um.pelo.outro..Somos.amigos.há.trinta.anos,.e.é.um.prazer.escrevermos.
um.livro.juntos..Obviamente,.quaisquer.erros.presentes.neste.livro.são.por.culpa.
de.meu.coautor.(um.círculo.vicioso,.sem.dúvida.alguma).
Prefácio à edição em português
“É.preciso.se.habituar.à.luz.do.sol.antes.de.ser.capaz.de.vê-lo”..Com.essas.palavras,.
Sócrates.tenta.convencer.o.jovem.Glauco.—.um.dos.interlocutores.de.Sócrates.na.
República,.de.Platão.—.de.que.a.filosofia.não.é.um.conhecimento.que.se.adquire.da.
noite.para.o.dia..Ela.requer.um.tempo.de.adaptação..Imagine-se.em.um.quarto.escuro.
e.alguém.de.súbito.acende.a.luz..Sua.reação.imediata.será.levar.as.mãos.ao.rosto,.para.
proteger.os.olhos.da.intensa.claridade..Mas.levará.apenas.alguns.instantes.para.você.
se.acostumar.com.a.luz.e.poder.enxergar.melhor.as.coisas.ao.seu.redor..
Guardadas.as.devidas.proporções,.o.mesmo.acontece.com.a.filosofia..De.início,.
parece.que.não.vamos.conseguir.entender.nada..Mas.o.tempo.vai.passando.e,.com.
um.pouco.de.paciência,.perseverança.e,.sobretudo,.hábito,.a.filosofia.vai.se.tornando.
cada.vez.menos.complicada,.e.também.cada.vez.mais.familiar.
Foi.justamente.pensando.naqueles.que.querem.desenvolver.o.hábito.da.reflexão. filosófica. que. os. autores. Garret. J.. DeWeese. e. J.. P.. Moreland. escreveram. este.
livro..Porém,.não.espere.encontrar.uma.sequência.de.clichês.edificantes,.de.receitas.
prontas,. de. dicas. demasiado. facilitadoras.. Lembre-se,. este. é. um. livro. de. filosofia!.
No.entanto,.é.um.livro.de.filosofia.cujas.dificuldades.foram.trabalhadas.de.forma.a.
esclarecê-las.
Fazer.filosofia.não.é.ser.confuso.e.muito.menos.falar.difícil..É.óbvio.que,.como.
qualquer. outra. disciplina. científica,. a. filosofia. possui. termos,. expressões. e. jargões.
que.fazem.parte.do.seu.vocabulário.próprio..De.fato,.é.necessário.aprender.o.“filosofês”;. porém,. como. qualquer. outra. linguagem,. isso. demanda. tempo,. um. período.
de.adaptação..O.importante.é.não.se.desesperar..Sem.dúvida.aparecerão.termos.que.
um.iniciante.nunca.ouviu.falar..Não.há.porque.se.preocupar..Os.autores.procuraram.
explicar.termos.e.conceitos.filosóficos.com.clareza.e.precisão.
Além.disso,.para.ajudar.na.compreensão.da.filosofia,.os.autores.organizaram.
o. livro. a. partir. das. disciplinas. filosóficas. (lógica,. metafísica,. epistemologia,. ética,.
antro.pologia.filosófica.e.filosofia.da.ciência),.as.quais.contemplam.as.questões.mais.
10 |
FILOSOFIA CONCISA
recorrentes no estudo da filosofia (O que é a verdade? O que é real? Como conheço? Como vivemos? O que sou? Qual o papel da ciência?). Essa estratégia
tem o objetivo de ajudar o leitor a compreender as disciplinas da filosofia a partir
das questões que têm atravessado épocas e gerações. Questões que são debatidas,
analisadas e respondidas pela própria teologia cristã ao longo da sua história.
Depois de considerar cada uma das questões filosóficas, os autores convidam seus leitores a se engajarem intelectualmente na cultura em que vivem.
Levando em conta o contexto brasileiro, esse convite deve ser mais do que bemvindo, deve ser aceito. Precisamos como nunca de cristãos comprometidos com a
Palavra de Deus, conscientes dos conflitos entre as diversas cosmovisões contem­
porâneas e, acima de tudo, aptos para dar uma resposta sobre a razão de nossa
esperança (1Pe 3.15).
Que este livro possa nos despertar para a busca da relevância da cosmovisão
cristã para a nossa cultura, pois a fé cristã não é uma fé apática, sem cérebro, mas
sim uma fé viva e inquiridora. Como disse Santo Anselmo: “Nossa fé é uma fé
que busca o entendimento”.
Jonas Madureira
Editor
capítulo 1
Por onde começar?
Lógica
Não deveriam os pastores possuir, antes de tudo, discernimento considerável,
apreensão clara, juízo sólido e capacidade de raciocinar com certa familiaridade?
JOHN WESLEY
Vivemos no que talvez seja o período mais anti-intelectual da história da civilização
ocidental [...] Devemos ter paixão, sim, corações em chamas pelas coisas de Deus.
Porém, tal paixão deve resistir com intensidade ao espírito anti-intelectual deste mundo.
R. C. SPROUL
“Simplesmente.não.o.entendo..Como.alguém.com.a.sua.formação,.que.lê.tanto.
quanto.você,.é.capaz.de.acreditar.nas.coisas.em.que.você.acredita?.Como.é.possível.que.você.acredite.em.Deus,.um.tipo.de.simpático.‘vovô.celestial’,.enquanto.
vê.no.mundo.o.sofrimento.causado.pela. Aids,.por.maremotos,.pela.fome.e.por.
guerras?.Você.conhece.muito.a.respeito.da.ciência.moderna;.como,.então,.você.é.
capaz.de.negar.a.evolução.e.crer.que.exista.algo.que.lhe.seja.mais.‘real’.do.que.seu.
corpo.e.cérebro?.Você.deve.saber.que.milagres.—.violações.das.leis.da.natureza.
—.são.impossíveis..Como.você.consegue.crer.que.coisas.‘fantasmagóricas’.como.
anjos.e.demônios.sejam.reais?.O.que.dizer.de.sua.pretensão.de.conhecer.a.verdade.
absoluta?.Nem.comece.com.isso!.Dado.tudo.que.conhecemos.sobre.as.diferentes.religiões.e.culturas.do.mundo,.como.você.consegue.ser.arrogante.a.ponto.de.
acreditar.que.alguma.religião.ou.sistema.moral.seja.verdadeiro,.e.não.mera.ficção.
vantajosa,.culturalmente.concebida?”.
Versões.desses.desafios.à.fé.cristã.são.repetidas.sem.cessar,.dia.após.dia;.sem.
dúvida,.você.já.se.deparou.com.eles.de.alguma.forma..Se.você.pensou.muito.sobre.
tais.desafios,.você.pensou.filosoficamente..Isso.porque.a.natureza.desses.desafios.
não.é.exatamente.científica,.teológica.ou.antropológica,.mas.sim.filosófica.
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FILOSOFIA CONCISA
De fato, sua reflexão filosófica provavelmente começou muito tempo atrás.
Em algum momento, você se perguntou se algo é real ou o que é real. Você perguntou o que é ou como se conhece algo. E você se questionou sobre qual era a
coisa certa a fazer em determinada situação ou como deveria viver sua vida. Essas
perguntas encontram-se no cerne da filosofia.
Entretanto, o que é filosofia? Filosofia é pensar de forma crítica sobre questões
importantes. Desse ponto de vista, a filosofia é algo que todos fazem. Todos possuem crenças sobre o que é real, o que é valioso e como passamos a conhecer essas
coisas. Para a maioria das pessoas, essas crenças fundamentais em grande parte
não são examinadas e, talvez, sejam mutuamente inconsistentes, mas, ao formálas e agir a partir delas, todos estão fazendo filosofia.
Em nível mais aprimorado, “filosofia” refere-se ao conjunto de conheci­
mento, frequentemente assunto de cursos universitários, que organiza e apresenta
o pensamento dos principais pensadores ao longo das eras no que concerne a
questões como realidade, valores e conhecimento.
Em nível ainda mais refinado, pode-se dizer que “filosofia” é a atividade
espe­cializada em que se envolvem alguns “pensadores profissionais” que se apoiam
no pensamento de seus predecessores, fazendo uso de certas ferramentas e métodos, com o objetivo de desenvolver, apresentar e defender conclusões cuidadosamente examinadas acerca da realidade, valores e conhecimento. Uma vez que
a filosofia preocupa-se, antes de mais nada, em discernir a verdade sobre essas
coisas, é natural que ela influencie cada aspecto da vida — dentro e fora da academia — e que seus termos, suas ferramentas, seus argumentos e suas conclusões
estejam presentes em quase todo livro tirado da estante da biblioteca.
Infelizmente, os termos e ferramentas são por vezes mal empregados, e os
argumentos e conclusão, frequentemente mal representados. Como em qualquer
disciplina, o profissional pode rapidamente apontar os erros, mas aos olhos não
treinados tudo permanece igual.
Temos profundo interesse e preocupação pelo impacto da filosofia sobre a
teologia. Os teólogos medievais acreditavam que a teologia era a rainha das ciên­
cias (isto é, dos domínios do conhecimento) e a filosofia era sua criada. O desenvolvimento da teologia tanto nas igrejas orientais quanto nas ocidentais tem sido
profundamente afetado pela filosofia, e a teologia, por sua vez, tem afetado a filosofia ocidental. Contudo, grosso modo, desde o Iluminismo, o fluxo tem sido de
mão única, da filosofia para a teologia, e na maior parte das vezes tem tido efeito
corrosivo para a teologia ortodoxa.
Em nossos dias, a teologia foi em grande medida banida da universidade
(até mesmo diversas faculdades cristãs reduziram a quantidade de cursos sobre
Bíblia e teologia), e a filosofia é em grande medida ignorada (os currículos da
área de humanidades foram em geral enfraquecidos, a fim de dar lugar a cursos
Por onde começar?
| 13
mais “práticos”). Some a isso o anti-intelectualismo, em moda em muitas igrejas
evangélicas, e o resultado é que a maioria dos jovens que desejam entrar no seminário ou participar de alguma organização paraeclesiástica está despreparada para
compreender ou comprometer-se com os aspectos filosóficos dos estudos bíblicos,
em particular, e da cultura em que servem, em geral. E a maioria dos pastores não
tem nem tempo nem preparo para ficar atualizado com as tendências da filosofia
contemporânea, mesmo nos pontos que incidem diretamente na teologia e no
ministério.1
Nosso objetivo neste “kit de ferramentas filosóficas” é reparar o problema,
proporcionando-lhe breve, não técnico e prático guia de termos e conceitos filo­
sóficos seletos, bem como ilustrar a importância e utilidade de cada um deles no
ensino bíblico e no fazer teológico, à luz de questões contemporâneas.2 Nosso alvo
não é que você se torne filósofo profissional. Desejamos, porém, que você seja
capaz de reconhecer e entender a filosofia com que você se depara diariamente,
de tal maneira que consiga ser mais seletivo, filosoficamente falando, não importa
qual seja sua jornada específica de serviço ao nosso Senhor.
Lógica
Com frequência (até demais!), ouvimos alguém dizer: “Por que a lógica é tão
impor­tante na teologia? Você dá a entender que a lógica está até acima de Deus!”.
Cremos que tal questionamento reflete uma má compreensão bastante comum a
respeito da lógica.
Se Deus não existisse, a lógica não existiria (e, nesse sentido, nada mais existiria). Porém, se Deus existe, muitas outras coisas também existem, incluindo as
leis da lógica.3 Por exemplo, considere a lei da identidade: Deus é quem ele é, e
não outro Deus. Considere, também, a lei da não contradição: Deus não pode ser
e, ao mesmo tempo, não ser bom. Tais leis (e outras coisas que existem atemporalmente) não existiriam se Deus não existisse; portanto, a existência delas depende
1
Para saber mais sobre os perigos e as soluções ao anti-intelectualismo na igreja, ver J. P. Moreland,
Love Your God with All Your Mind: The Role of Reason in the Life of the Soul. Downers Grove, Illinois:
InterVarsity Press, 1997.
2
Para bem mais detalhada e minuciosa introdução à filosofia, ver J. P. Moreland e William Lane
Craig, Philosophical Foundations for a Christian Worldview. Downers Grove, Illinois: InterVarsity Press,
2003 [publicado no Brasil com o título Filosofia e cosmovisão cristã. São Paulo: Vida Nova, 2005].
3
Indiscutivelmente, números, conjuntos, universais, proposições, relações, entre outros, também
existem. Outra maneira de dizer isso é assim: se algo existe, tudo que é logicamente necessário deve
existir. Mas nada pode existir, a menos que algo que é metafisicamente necessário exista. E Deus
necessariamente existe, nesse último sentido; logo, todas as necessidades lógicas dependem da existência dele.
14 |
FILOSOFIA CONCISA
de Deus. Contudo, elas não foram criadas como se ele pudesse tê-las criado diferentes. Assim, dizer que as leis da lógica aplicam-se a Deus não significa que
a lógica tem controle sobre Deus. É a simples admissão de que, por algo existir,
muitas outras coisas também existem e não poderiam ser de outra forma.
Outra objeção que ouvimos muitas vezes é a seguinte: “Pois bem, existem
muitas diferentes lógicas. Como podemos dizer qual delas está certa? Não é algo
muito arbitrário?”. Novamente, cremos que se trata de uma má compreensão.
A resposta rápida é “sim”, existem muitas diferentes lógicas. No entanto, devemos ter duas questões em mente. Em primeiro lugar, existem também muitas
diferentes álgebras e muitas diferentes geometrias (os matemáticos e os lógicos são
muito criativos!). Alguns desses sistemas foram desenvolvidos para lidar com problemas específicos e não arrogam para si validade universal (p. ex., lógica difusa,
versões de lógica multivalente e diversos sistemas de álgebra abstrata). Em segundo
lugar, nenhum desses sistemas poderia ser “construído” sem determinadas “leis do
pensamento” fundamentais (se a lei da não contradição não fosse sustentada universalmente, não poderíamos sequer afirmar que existem diferentes sistemas!).
A última objeção é a seguinte: “Sua lógica é vestígio do ocidente dominado
pelos homens, ignorando a lógica oriental e a lógica feminista, por exemplo”.
Mais uma vez, cremos que isso reflete uma péssima compreensão da lógica.
Quanto à “lógica oriental”, na realidade, ela não existe. É verdade que certas
vertentes do hinduísmo e do budismo ensinam que a contradição está na essência
da realidade, de modo que, no caminho para a iluminação, deve-se aprender a
aceitar a contradição. Porém, conforme mostrou Mortimer Adler, contanto que
os hinduístas e budistas aceitem os resultados da ciência e tecnologia modernas,
estão tacitamente afirmando a lei da não contradição, que subjaz ao fundamento
da ciência. 4
Em relação à “lógica feminista”, com quase toda certeza é uma questão de
ênfase e valores, e não de diferentes lógicas. Pode-se admitir, por consideração ao
argumento, que as mulheres são, em geral, mais relacionais e mais emotivas, e os
homens são mais objetivos e lineares em seu pensamento. Mas, obviamente, as
mulheres podem lançar mão da lógica objetiva, quando necessário, e os homens
podem aprender a valorizar os relacionamentos e os vínculos emocionais. Diferença em ênfase não é diferença em espécie.
As leis do pensamento. Três leis lógicas são tão fundamentais que, às vezes,
são chamadas de leis do pensamento. Já mencionamos duas delas: a lei da identi­
dade e a lei da não contradição. A terceira é a lei do terceiro excluído.
Mortimer Adler, Truth in Religion: The Plurality of Religions and the Unity of Truth. Nova Iorque:
Macmillan, 1990, p. 69-76.
4
Por onde começar?
| 15
Tais leis são às vezes chamadas de axiomas ou princípios fundamentais. Não
podem ser provados, mas a verdade deles é inevitável, pois, tão logo se tente refutar qualquer um deles, descobre-se que é necessário pressupô-los. Suponha, por
exemplo, que você tente refutar a lei da
identidade. Então, você pressupõe que
As três leis do pensamento
está tentando refutar a lei da identidade,
e não a lei da gravidade; a lei da identiLei da identidade Algo é o
dade é o que é, e não é a lei da gravidade.
que é, e nada além disso.
Ou suponha que você tente refutar a lei
Lei da não contradição
da não contradição. Quer dizer que você
Para qualquer propriedade F,
tentará provar que é falsa a afirmação de
nada pode ser tanto F quanto
que algo não pode ser verdadeiro e falso,
não-F, ao mesmo tempo
ao mesmo tempo e no mesmo sentido.
e no mesmo sentido.
Porém, isso pressupõe a própria lei que
você está tentando refutar. (Existe uma
Lei do terceiro excluído
famosa história sobre Saul Kripke, granQualquer proposição é verdadeira
de lógico de Princeton. Em determinado
ou falsa, e não algo entre
encontro com docentes de outros deparas duas possibilidades.
tamentos, muitos tentavam argumentar
que a lei da não contradição deveria ser
extinta, por ser vestígio do pensamento ocidental polarizador dominado por homens. Kripke respondeu: “Está bem. Vamos nos livrar dessa lei. Então, podemos
também ficar com ela.”).
Será que essas leis têm alguma relação com a teologia? Sem dúvida alguma!
Em Isaías 45.5, por exemplo, Deus faz esta forte afirmação: “Eu sou o Senhor, e
não há outro; além de mim não há Deus”. Ora, de acordo com a lei da identidade,
é Javé (o Senhor) quem fala, e Javé não é Krishna ou Brahmin ou Baal. Segundo
a lei da não contradição, o Senhor não pode ser o único Deus e, ao mesmo tempo,
apenas um de vários deuses existentes. E, conforme a lei do terceiro excluído, ou
é verdadeiro que o Senhor é o único Deus, ou isso é falso; não é possível que “o
Senhor é o único Deus” seja verdadeiro para os cristãos, mas falso para os budistas.
(Para saber mais sobre a lei da identidade, ver o capítulo 2).
Argumentos. O argumento filosófico não é discussão acalorada, nem disputa
retórica. Os argumentos filosóficos não são escolhidos com base no voto da maioria ou na sensação que causam. Na filosofia, os argumentos consistem em conjunto de premissas que levam a uma conclusão. Existe uma diferença fundamental
entre argumentos dedutivos e indutivos. Adiante, examinaremos argumentos indu­
tivos, mas no momento trataremos de argumentos dedutivos, especificamente. No
argumento dedutivo, a relação entre as premissas e a conclusão é uma questão
lógica. A verdade das premissas garante a verdade da conclusão; ou, dito de outro
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