Congresso “Escutismo, educar para a vida no século XXI”
Corpo Nacional de Escutas | Escutismo Católico Português
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Igreja
Corpo Nacional de Escutas | Escutismo Católico Português
Ecologia humana: um contributo do escutismo católico para uma sociedade
mais humana no séc. XXI
Pe. Pedro Carlos Lopes de Miranda
Agrupamento 1316, Figueira de Lorvão, Região de Coimbra,
[email protected]
Como pode a razão reencontrar a sua grandeza sem escorregar no irracional? Como pode a natureza
aparecer novamente na sua verdadeira profundidade, nas suas exigências e com as suas indicações? Chamo à
memória um processo da história política recente, esperando não ser mal entendido nem suscitar demasiadas
polémicas unilaterais. Diria que o aparecimento do movimento ecológico na política alemã a partir dos Anos
Setenta, apesar de não ter talvez aberto janelas, todavia foi, e continua a ser, um grito que anela por ar fresco, um
grito que não se pode ignorar nem acantonar, porque se vislumbra nele muita irracionalidade. Pessoas jovens
deram-se conta de que, nas nossas relações com a natureza, há algo que não está bem; que a matéria não é apenas
um material para nossa feitura, mas a própria terra traz em si a sua dignidade e devemos seguir as suas indicações.
É claro que aqui não faço propaganda por um determinado partido político; nada me seria mais alheio do que isso.
Quando na nossa relação com a realidade há qualquer coisa que não funciona, então devemos todos refletir
seriamente sobre o conjunto e todos somos reenviados à questão acerca dos fundamentos da nossa própria cultura.
Seja-me permitido deter-me um momento mais neste ponto. A importância da ecologia é agora indiscutível.
Devemos ouvir a linguagem da natureza e responder-lhe coerentemente. Mas quero insistir num ponto que - a meu
ver –, hoje como ontem, é descurado: existe também uma ecologia do homem. Também o homem possui uma
natureza, que deve respeitar e não pode manipular como lhe apetece. O homem não é apenas uma liberdade que se
cria por si própria. O homem não se cria a si mesmo. Ele é espírito e vontade, mas é também natureza, e a sua
vontade é justa quando respeita a natureza e a escuta e quando se aceita a si mesmo por aquilo que é e que não se
criou por si mesmo. Assim mesmo, e só assim, é que se realiza a verdadeira liberdade humana.
(Discurso de Bento XVI ao bundestag, o parlamento alemão, em 22 de Setembro de 2011)
A ecologia e a sã relação com a natureza é algo que está incrustado bem no centro do ideal e do
método escutista.
O contexto em que vivemos não pode deixar de fazer realçar a íntima relação que deverá haver,
na vivência escutista, entre as duas ecologias a que se refere Bento XVI. De nada valerá a promoção de
uma ecologia que não seja integral, isto é, que não seja simultaneamente um verdadeiro humanismo, no
sentido em que esteja ao serviço da promoção do humano defendendo o ambiente e o ecossistema natural
e espiritual próprios para que o humano se desenvolva. É que, como profundamente vê o papa, o
verdadeiro desenvolvimento humano não pode ignorar a natureza humana, que lhe é dada, que não é
simplesmente fruto da vontade e do arbítrio. É da identificação e até mesmo da reconciliação do ser
humano com a natureza corporal e espiritual que lhe é dada que depende a sua realização e bem estar
integral.
Parece-me, por isso, a todos os títulos atual e desejável que o Escutismo, e particularmente o
Escutismo Católico – já que:
As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de
todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos
discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu
coração. (GS 1)
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– faça sua esta causa da ecologia integral, isto é, duma ecologia que seja também ecologia do homem em
todas as suas dimensões, um humanismo integral, portanto. O Escutismo Católico tem para oferecer o
contributo do Evangelho de Jesus Cristo para esse humanismo.
O homem verdadeiro que encontramos em Jesus Cristo, entendamo-nos, não é outro senão o
homem criado por Deus à sua imagem e semelhança, no qual todos nos sentimos irmãos, iguais em
dignidade apesar de todas as diferenças sociais, étnico-culturais ou religiosas; não se trata aqui, portanto,
de um mero combate político, por mais nobre que seja o sentido em que o tomemos. Para os cristãos,
Jesus veio apenas dar-nos a medida pela qual havemos de medir o nosso compromisso com essa
dignidade. É neste sentido, então, universal e universalista de compromisso com a humanidade, que o
cristão e o escutismo confessional encontrarão na promoção e defesa dos mais ameaçados valores do
respeito pela vida humana desde a conceção até à morte natural e do respeito pela família um campo
muito privilegiado para a sua ação e para a sua identificação com os ideais fundacionais do Escutismo. E
quando tomamos estes valores como de primeira importância, isso não significa de modo nenhum a
ignorância dos outros conexos, como sejam, evidentemente, os valores de uma economia ao serviço da
pessoa humana, e não o inverso, afim de que a pobreza e a injustiça social sejam sempre um adversário
bem presente. É que nem a luta por aqueles primeiros tem autoridade moral sem o compromisso
concomitante com estes segundos, nem o inverso. Aliás, bem se pode dizer que uma das grandes
fragilidades atuais da luta contra a pobreza e a injustiça social , bandeira tão agitada pelas democracias
ocidentais— bem denunciada pelo Beato João Paulo II na Evangelium vitae – é precisamente a flagrante
contradição em que não poucas de entre elas caiem ao desproteger terrivelmente os fracos mais
radicalmente sem voz como são os seres humanos não nascidos.
Por todas estas razões, penso ser muito dignificador do Escutismo Católico e daqueles que
forem entregues aos seus cuidados educativos, e proponho, que estes temas façam parte do seu itinerário
educativo com o realce que merecem.
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