VALÉRIA MARINHO OJEDA
UM PASSEIO PÚBLICO PARA VILA REAL DA PRAIA GRANDE: 1820 - 1913.
Dissertação apresentada ao Curso de Pós
Graduação em Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal Fluminense, como requisito
final para obtenção do Grau de Mestre. Área de
concentração: Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora: Drª Marlice Nazareth Soares de Azevedo
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
NITERÓI
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VALÉRIA MARINHO OJEDA
UM PASSEIO PÚBLICO PARA VILA REAL DA PRAIA GRANDE: 1820 – 1913.
Dissertação apresentada ao Curso de Pós
Graduação em Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal Fluminense, como requisito
final para obtenção do Grau de Mestre. Área de
concentração: Arquitetura e Urbanismo.
Aprovada em 28 de março de 2008.
BANCA EXAMINADORA:
_____________________________________________
Profª. Drª. Marlice Nazareth Soares de Azevedo - Orientadora
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________
Profª. Drª. Maria Laís Pereira da Silva
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________
Profª. Drª. Maria de Lourdes Pinto Machado Costa
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________
Prof. Dr. José Francisco Bernardino Freitas
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal do Espírito Santo
Niterói
2008
Aos meus familiares e amigos, pela
compreensão, colaboração e paciência,
nos momentos de ausência, durante esta
jornada.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro, lugar agradeço ao meu esposo Carlos Ojeda, que me incentivou
e me proporcionou realizar o curso de mestrado em Arquitetura e Urbanismo na
Universidade Federal Fluminense, tornando este dia possível.
Aos meus filhos Diego Andrés e Rafaela pelos períodos de ausência.
A minha orientadora, Doutora Marlice Azevedo que dividiu comigo os seus
conhecimentos e colaborou com a finalização deste trabalho de grande importância
para a minha vida profissional.
Aos queridos professores do mestrado do curso de pós-graduação de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense.
A Maurício Monteiro, coordenador do Arquivo da Câmara de Niterói que se
empenhou e colaborou com a pesquisa.
As bibliotecárias Maria José Diogenes Travessa e Glória Ventura Rodrigues,
que sempre com um belo sorriso contribuíram com o meu trabalho.
Ao Presidente e Professor do Instituto Histórico e Geográfico de Niterói,
Salvador Mata e Silva, que se empenhou em fornecer-me o material necessário para
a pesquisa e sua conclusão.
Ajuntei todas as pedras
que vieram sobre mim
Levantei uma escada muito alta
e no alto subi.
Teci um tapete floreado
E no sonho me perdi
Uma estrada,
um leito,
uma casa,
um companheiro.
Tudo de pedra.
Entre pedras cresceu a minha poesia.
Minha vida...
Quebrando pedras
e plantando flores.
Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude
Dos meus versos.
Das Pedras, Cora Coralina, 1981.
RESUMO
Este trabalho tem por finalidade, sintetizar a historiografia de um passeio
público chamado de Passeio da Memória, atual Praça do RinK, localizado nas
Bandas d’ Além (Niterói) e mostrar a presença dos espaços públicos na vida urbana
dos séculos XIX e XX. O passeio público foi parte integrante do 1º Plano de
Edificação da Vila Real da Praia Grande que deu à Vila o traçado de seu espaço
urbano e representou o fim prematuro do período colonial como aldeia de São
Lourenço dos Índios, visível nas ruas de São Domingos. O saneamento, arruamento
e as obras de infra-estrutura foram fundamentais para a melhoria da qualidade de
vida da Vila. Desenhado por Arnaud Jullien Pallière de forma bem detalhada o
projeto do passeio público representou a força e o controle absoluto do rei,
simbolizado pela monumentalidade do desenho. Para a realização deste trabalho
delimitou-se o período de 1820, ano em que se elaborou o Plano de Edificação da
Vila Real da Praia Grande e 1913 realizou-se a reforma que reconstruiu o passeio
público sob um novo projeto. Dentro do período delimitado, fez-se uma síntese das
intervenções realizadas na área que correspondeu ao Passeio da Memória, já que o
projeto inicial não fora concretizado. As principais fontes utilizadas foram as Atas da
Câmara de Niterói, o jornal “O Fluminense” e outras publicações como livros, teses e
dissertações. A relevância do trabalho está relacionada com a historiografia do
lugar, representada pela figura do rei, D. João VI. O passeio público deveria marcar
a visita do Príncipe Regente a região e registrar o dia “13 de maio de 1816”. Este
símbolo associado ao passeio público passou a ter importância para os moradores
da Vila e seus dirigentes, como fato significativo na história da Cidade de Niterói. A
reconstrução deste espaço, dentro de uma fração de tempo de quase cem anos, foi
destinada à população com área de lazer e de convivência, que representou para os
moradores a recuperação simbólica da história da cidade de Niterói.
Palavras chave: Passeio da Memória. Passeio público. Espaço urbano. Vila Real da
Praia Grande. Paisagem urbana.
ABSTRACT
This work aims to, synthesize the historiography of a public tour called the
Memory Walk, the current Rink Square, located in bands d '
Beyond (Niteroi), and
show the presence of public spaces in the XIX and XX centurie’s urban life. The
public tour was part of the 1st Vila Real da Praia Grande building plan wich gave to
theTown the route of its urban space and represented the premature end of the
colonial period as the village of St. Lawrence’s Indians, visible in the streets of St.
Domingo. The sanitation, ulica in the works of infrastructure were key to improving
the quality of life in the Town. Designed by Arnaud Jullien Pallière so well, he detailed
design of the circuit public representing the power and absolute control of the king,
symbolized by the monumentality of the design. This work delimits the period of
1820, year in which was prepared the Vila Real da Praia Grande building plan in
1913 was held on reform that rebuilt the tour public under a new project. Within the
defined period, has been a summary of the interventions made in the area that
corresponded to the Memory Walk, as the initial project was not implemented. The
main sources used were the Minutes of the Board of Niteroi, the newspaper "O
Fluminense" and other publications such as books, theses and dissertations. The
relevance of the work is related to the historiography of the place, represented by the
figure of the king, D. João VI. The tour public should mark the visit of the Prince
Regent in the region register the day "on May 13, 1816". This symbol associated with
the tour had a public importance to the residents of the Town and its leaders, as a
significant fact in the history of the city of Niteroi. The reconstruction of this area, in a
fraction of time of nearly one hundred years, was intended for people with an area of
leisure and coexistence, which represented the residents to the symbolic recovery of
Niteroi’s history.
Keywords: Walk of Memory. Walk public. Urban Space. Vila Real Praia Grande.
Urban Landscape.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Fig. 1: Passeio Los Tajamares - 1800.
26
Fig. 2: Passeio Los Tajamares – 1820-1821.
26
Fig. 3: Passeio La Cañada, século XIX.
27
Fig. 4: Uma tarde de passeio - La Cañada - Santiago de Chile.
27
Fig.5: Dom João e a Família Real na Praia Grande -1816.
39
Fig.6: Palacete de São Domingos.
40
.
Fig.7: Plano de Edificação da Vila Real da Praia Grande.
47
Fig.8: Detalhe do plano de arruamento da Vila.
51
Fig.9: Delimitação do Campo de D. Elena.
52
Fig.10: Detalhe de localização do rossio e praça do mercado.
53
Fig.11: Detalhe do Passeio da Memória – 1820.
61
Fig.12: Planta do Passeio da Memória – 1820.
64
Fig.13: Vista da fachada do Passeio da Memória.
65
Fig.14: Detalhe da praça central do Passeio da Memória.
66
Fig.15: Largo do Capim.
67
Fig.16: Os dois largos: o do Capim e o da Memória.
68
Fig.17: Coluna da Memória.
70
Fig.18: Placa de homenagem à Dom João VI.
71
Fig.19: Placa comemorativa de inauguração do monumento.
72
Fig.20: O largo da Memória e a Prefeitura.
84
Fig.21: Resposta ao pedido de empréstimo.
85
Fig.22: Medalhão de Dom. João VI-1913.
88
Fig.23: Coreto-1913.
89
Fig.24: Fonte-1913.
90
Fig.25: Aspecto do jardim em 1913.
90
Fig.26: Leão.
91
Fig.27: Estátua representativa da estação do ano.
92
Fig.28: Estátua representativa da estação do ano.
92
Fig.29: Estátua representativa da estação do ano.
93
Fig.30: Estátua representativa da estação do ano.
93
Fig.31: Pompéia e o Largo da Memória.
95
Fig.32: Localização dos elementos que constituíram o passeio público.
97
Fig.33: Escola de patinação.
99
Fig.34: Planta com a localização dos monumentos e o rink de patinação. 100
Fig.35: Carnaval na Praça General Gomes Carneiro.
101
Fig.36: Retretas.
102
Fig. 37: Praça do Rink-1957.
103
SUMÁRIO
RESUMO ________________________________________________________
06
ABSTRACT ______________________________________________________
07
LISTA DE ILUSTRAÇÕES___________________________________________
08
INTRODUÇÃO ____________________________________________________
12
CAPÍTULO 1: A PAISAGEM URBANA DO SÉCULO XIX___________________ 16
1.1–ASPECTOS DA CIDADE NO SÉCULO XIX___________________________ 16
1.2–A SALUBRIDADE OITOCENTISTA_________________________________
21
1.3–OS JARDINS NO ESPAÇO URBANO_______________________________
24
1.4–O PAISAGISMO NO BRASIL______________________________________
29
1.5–A VINDA DA FAMÍLIA REAL PARA O BRASIL________________________
31
1.6–A MISSÃO ARTÍSTICA FRANCESA________________________________
33
CAPÍTULO 2: A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO__________________
36
2.1 – A CRIAÇÃO DA VILA REAL DA PRAIA GRANDE_____________________ 36
2.2 – O PLANO DE EDIFICAÇÃO DA VILA REAL DA PRAIA GRANDE________
47
2.3 - A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO DA CIDADE________________________
56
CAPÍTULO 3: O PASSEIO PÚBLICO__________________________________
60
3.1 - O PASSEIO DA MEMÓRIA_______________________________________
60
3.2 - O LARGO DA MEMÓRIA NA GESTÃO DE PAULO ALVES-1903_________
74
3.3 – O LARGO DA MEMÓRIA NA GESTÃO DE FELICIANO SODRÉ-1913____
81
3.3.1 – O novo projeto para o Largo da Memória_______________________
87
12
CONSIDERAÇÕES FINAIS __________________________________________
104
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ___________________________________
107
ANEXOS_________________________________________________________
116
12
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por finalidade sintetizar a historiografia de um passeio
público chamado de Passeio da Memória e mostrar a relação dos espaços públicos
com a vida urbana no início dos séculos XIX e XX.
Localizado nas Bandas d’ Além, atual Niterói, o passeio público foi parte
integrante do Plano de Edificação da Vila Real da Praia Grande, elaborado em 1820,
mas por questões jurídicas foi construído somente no ano de 1913 sob um novo
projeto e passou a se chamar Praça do Rink.
O passeio público, objeto de estudo desta dissertação, foi idealizado para
reverenciar o dia “13 de maio de 1816”, dia em que D. João VI passou revista as
tropas que iam rumo a Montevidéu, evento realizado no Campo de Dona Elena
(escrita da época).
Na elaboração do projeto do passeio, Arnaud Julien Pallière trabalhou
aspectos como monumentalidade, dimensões, simetria e formas geométricas que
deram ao projeto o volume e o impacto desejado. Realizado de forma artística e bem
detalhada, como representativo da época, mereceu o reconhecimento de diversos
pesquisadores. No entanto, este projeto não foi realizado.
No ano de 1913, o passeio idealizado no plano, com um novo projeto, tornouse realidade, construído durante a gestão do Prefeito Feliciano Sodré (1910-1914).
Para esta dissertação delimitou-se o período de 1820, ano em que se
elaborou o plano e 1913, ano da reforma do Passeio Público.
A relevância deste trabalho está relacionada ao significado que o Passeio da
Memória adquiriu ao se associar ao ato do dia 13 de maio de 1816 e se pretende
reconstruir seus momentos significativos na cronologia da Cidade de Niterói.
A pesquisa não pretende fazer um simples relato dos fatos e conteúdos
encontrados, mas analisá-los no contexto das transformações urbanas da cidade. A
cada leitura tentou-se captar e traduzir o que cada momento pode representar na
história de Niterói e foi possível perceber os aspectos políticos sempre presentes.
13
Importantes fatos ocorreram no Largo da Memória e são estes que se quer deixar
registrados nesta dissertação.
Considerando a natureza do trabalho, trata-se de uma pesquisa documental e
se espera como resultado final contribuir como fonte de dados a futuros
pesquisadores sobre a Memória Fluminense.
A base de informações para o desenvolvimento da pesquisa e análise foi
extraída de periódicos como o jornal “O Fluminense”, localizados na Biblioteca
Nacional.
Os jornais retrataram as manifestações da população, suas insatisfações, a
política pública instaurada na Vila e como a população reagiu às transformações
urbanas. Registradas pelo redator e proprietário do jornal, Francisco Rodrigues de
Miranda, tem como foco a atuação dos Prefeitos e a reação da população em face
aos acontecimentos que giravam em torno do Largo da Memória.
Analisando-se as críticas, foi possível visualizar o estado do Largo da
Memória e as obras realizadas para a sua melhoria.
Foram utilizados também como fonte de dados os jornais: “Fatos e Notícias”,
“Jornal do Brasil” e o “Jornal O Globo”.
As Atas da Câmara de Niterói, localizadas nos arquivos da instituição, que
retrataram o cotidiano da cidade e as principais discussões entre os representantes
locais (1819-1890), foram utilizadas como fonte privilegiada.
Dentre os estudos que foram realizados sobre a Vila Real da Praia Grande foi
utilizado como base de informações às publicações de Mattoso Maia Forte, Antonio
Figueira de Almeida, José Antônio Soares de Souza, Emmanuel de Macedo Soares,
Paulo R. Paranhos da Silva, teses e dissertações como a de Marlice Nazareth
Soares de Azevedo e de Maristela Chicharo de Campos.
Sob o ponto de vista da abordagem para atingir os objetivos, trata-se de uma
pesquisa qualitativa que consiste na análise, comparação e interpretação das
informações disponíveis nas fontes citadas, não requerendo o uso de métodos e
técnicas estatísticas.
Elaborada a partir de material já publicado, trata-se basicamente de uma
pesquisa bibliográfica e por não existir trabalhos específicos sobre o assunto, a
pesquisa é exploratória.
A análise dos dados e informações foi realizada através de um processo
continuado, à medida que as informações foram coletadas, com o cruzamento das
14
fontes bibliográficas realizaram-se interpretações consideradas relevantes para a
conclusão da pesquisa.
A dissertação foi dividida em introdução, três capítulos e considerações finais.
Reservou-se para o primeiro capítulo uma apresentação de forma progressiva dos
fatos e informações a fim de fornecer os fundamentos básicos para a perfeita
compreensão do trabalho. Para isso, a partir da industrialização das cidades,
procurou-se focalizar a relação industrialização e cidade, tema das discussões que
deram origem a nova disciplina do Urbanismo.
Foi desenvolvida uma breve abordagem sobre a cidade industrial, que era
vista como uma cidade inchada, insalubre e enferma. As condições laborais dos
trabalhadores e as condições de vida na cidade foram os pontos básicos para as
propostas de uma vida urbana mais digna e saudável para os trabalhadores.
A insalubridade das cidades foi o meio propício para a propagação de
doenças, resultando nas epidemias, causadoras de diversos óbitos. Higienistas e
médicos se mobilizaram para erradicar estas enfermidades e numa ação conjunta foi
necessária uma grande intervenção nas cidades.
No século XVIII, Mestre Valentim marcou o início da obra paisagística no
Brasil, com o projeto do primeiro Passeio Público do Rio de Janeiro, por ordem do
Vice Rei Vasconcellos, inaugurado em 1783.
A chegada da Família Real Portuguesa, em 1808, foi um momento bastante
significativo para a Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro elevada à categoria
de sede do Império, título que a cidade deverá responder tanto na parte
administrativa quanto na melhoria do espaço urbano, que era proveniente de um
acanhado período colonial.
O início da reestruturação da cidade foi influenciado pela chegada da Missão
Artística Francesa, trazida por D. João VI que tinha também o propósito de introduzir
os ensinamentos de artes e ofícios na cidade.
Pallière, o francês responsável pelo projeto do Passeio da Memória, não veio
com a Missão Artística, chegando posteriormente. Fato que não impede de
relacioná-lo com missão, uma vez que se casou com a filha de Grandjean de
Montigny, o arquiteto do grupo.
No segundo capítulo foi descrita a criação da Vila Real da Praia Grande e sua
organização como espaço urbano, a partir das iniciativas resultantes da chegada da
Corte Real Portuguesa no Rio de Janeiro, em 1808.
15
Para o terceiro capítulo, reservou-se o caso do Passeio da Memória,
desenvolvido através de sua historiografia e das transformações ocorridas durante
os períodos de 1820 – 1847 e 1904 – 1913.
Nas considerações finais da pesquisa realizou-se uma análise dos períodos
mencionados anteriormente, relacionada às mudanças e reformas que ocorreram na
Vila que se deram a partir da elaboração do primeiro Plano de Edificação da Vila
Real da Praia Grande e do projeto do Passeio da Memória, este último objeto desta
dissertação.
16
CAPÍTULO 1
1.0 - A PAISAGEM URBANA DO SÉCULO XIX.
1.1 – ASPECTOS DA CIDADE NO SÉCULO XIX.
As condições de vida precária em que o operário vivia na cidade industrial
constituíram a base de discussões e propostas que dá início aos debates sobre a
cidade e as primeiras teorias do urbanismo.
A revolução industrial iniciado na Inglaterra no século XVIII, seguida por
Bélgica, França, Alemanha e Estados Unidos da América foi o ponto de partida para
as diversas transformações ocorridas na Europa. Transformação que fez da
Inglaterra (século XIX), “a primeira sociedade urbanizada do mundo” (entendendo-se
sociedade urbana como aquela em que a maior parte da população vive nas
cidades). (DECCA, 2001, p.27).
A cidade passou a ser comandada pelos relógios e os feitores ditavam as
regras e impunham a ordem. O novo ritmo de vida que converteu as horas de
trabalho em dinheiro para o industrial significava uma vida sacrificada e injusta,
imposta ao “operário”.
Nas fábricas, a insalubridade fazia parte do ambiente de trabalho, “fiapos” de
lã ficavam suspensos no ar, o vapor e o calor das máquinas faziam com que os
operários trabalhassem descalços com os pés na água que era utilizada para o
esfriamento das máquinas.
As intensas jornadas de trabalho realizadas por homens, mulheres e até
crianças neste ambiente repressivo no meio da umidade, escuridão, sujeira e em
alguns casos, aplicando-se castigo corporal, começaram a chamar a atenção de
observadores como Karl Marx que denuncia e compara as condições de vida destes
trabalhadores à escravidão.
17
Na obra “O Capital”, Karl Marx transcreve uma publicação do jornal, Daily
Telegraph, de Londres publicado em 17 de janeiro de 1860:
Juiz de condado de Broughton, presidindo uma reunião da prefeitura de Nottingham,
em 14 de janeiro de 1860, declarou que naquela parte da população, empregada
nas fábricas de renda da cidade, reinavam sofrimentos e privações em graus
desconhecido do resto do mundo civilizado... As 2,3 e 4, crianças de 9 e 10 anos
são arrancadas de camas imundas e obrigadas a trabalhar até as 10, 11 ou 12 horas
da noite, para ganhar o indispensável à mera subsistência. Com isso, seus membros
definham, sua estatura atrofia, suas faces se tornam lívidas, seu ser mergulha num
torpor pétreo, horripilantes de se contemplar (...). O sistema (...) constitui uma
escravidão ilimitada, escravidão em sentido social, físico, moral e intelectual (...),
mas o mercado negreiro, com os horrores do látego (chicote) e do tráfego de carne
humana é por acaso mais ignóbil do que esta lenta imolação dos seres humanos,
praticada a fim de se produzirem véus e golas para maior lucro dos capitalistas?
(MARX, 1975, p.275-276).
A indústria têxtil necessitava de grande quantidade de água para produzirem
tecidos finos como a sarja, tendo que se localizar próxima aos canais fluviais. A
indústria algodoeira também necessitava de água para mover as novas máquinas
que funcionavam com energia hidráulica. Localizadas no centro da cidade, estas
instalações tornaram as condições de vida na cidade insalubre. No ano de 1851,
Manchester era vista com chaminés e fumaças, descrita por Willian Cooke Taylor
(1800-1849), que conheceu várias cidades industriais e passou por Manchester no
ano de 1842:
Lembro-me muito bem do efeito que causou em mim minha primeira visão de
Manchester, quando olhei para a cidade pela primeira vez do final da linha férrea
que vinha de Liverpool, e vi uma floresta de chaminés expelindo vapor e fumaça,
formando uma cobertura escura que parecia abraçar e envolver todo o lugar...
Muitos anos se passaram desde aquela manhã, mas repetidas visitas a Manchester
não diminuíram os efeitos daquela primeira impressão. (DECCA, 2001, p.47).
18
As indústrias utilizavam rios como meio de transporte para escoar a produção
e receber matéria prima, além de lançar neles, os resíduos industriais, contaminando
às águas e o solo. A fumaça lançava fuligem contaminando o ar. Nas palavras de
Charles Dickens o cenário se confirma:
... Era cidade de máquinas e altas chaminés, das quais saíam intermináveis
serpentes de fumaça que se desatavam sem trégua e sem se dissolverem jamais.
Tinha um canal escuro e um rio que corria com águas purpúreas devido às tintas
fedorentas; vastos edifícios com uma infinidade de janelas que ressoavam e tremiam
o dia inteiro, enquanto os êmbolos das máquinas a vapor subiam e desciam
monotonamente, como uma cabeça de elefante loucamente melancólico. (DECCA,
2001, p.49).
A classe trabalhadora vivia no centro da cidade, próximo às fábricas devido os
transportes serem caros e a moradia era dividida com outras famílias, sem nenhum
conforto, localizada em bairros sujos e poluídos. A elite, geralmente, residia no
subúrbio, próximo a um parque particular situado na periferia.
A falta de saneamento e de água não tratada disseminaram diversas
doenças, como a cólera que matou milhares de pessoas. Neste período, fazia-se fila
para se conseguir água, às vezes dezenas de moradias dividiam uma única torneira,
localizada no pátio. (DECCA, 2001, p.51).
Estas condições subumanas de vida que a classe operária enfrentou,
despertou preocupação na sociedade a partir de 1830, aproximadamente, iniciandose vários estudos, relatórios, quadros e gravuras sobre o tema em questão.
Os pesquisadores que visitavam as habitações insalubres geralmente eram
médicos ou engenheiros responsáveis pelas reformas da cidade e pela rede de
esgoto, fazendo um relatório ao governo a fim de que se tomassem as providências
necessárias.
Para termos a idéia de um cortiço, o inspetor de saúde George R. Sims
descreveu um, visitado em Londres:
19
Os cômodos nestas casas são chiqueiros, nada além, nos quais homens, mulheres
e crianças vivem, dormem e comem. Mais que isso não posso dizer, apenas que um
estranho, entrando em um destes cômodos pela primeira vez, tem todos os seus
sentidos chocados, e acha quase impossível respirar a atmosfera pestilenta sem se
sentir imediatamente doente. E é em cômodos como estes que homens e mulheres
vivem e por vezes sem sair por dias e semanas. São encontrados algumas vezes
em um estado de nudez absoluta, tendo se desfeito de cada trapo seu para manter
“corpo e alma juntos” em períodos em que não conseguem encontrar trabalho.
(DECCA, 2001, p.55).
Outro estudo realizado foi sobre o desenvolvimento da indústria e sobre as
condições que viviam a classe trabalhadora em toda a Europa, realizada por Th.
Carlyle (Passado y Presente) e F. Engels (La situacion de la clase obrera en
Inglaterra).
As teorias sociais de Saint Simon, Fourier, Robert Owen e Willian Thomson
formariam também uma corrente ininterrupta sobre a análise da cidade industrial.
(BARDET, 1989, p.17).
A população do continente duplicou, neste período alimentado pelo
crescimento equivalente da produção agrícola. Estas mudanças incluíam o uso de
novas fontes de energia, como o carvão e o vapor; novos materiais de construção,
como o ferro e o aço, inovações técnicas e sistemas de transporte aperfeiçoados.
Estes avanços conduziram à produção em larga escala e ao crescimento do sistema
fabril.
O crescimento urbano mais marcante do século XIX ocorreu em áreas onde
emergiam indústrias de atividade fabril. Verificado primeiramente, na Grã-Bretanha
(recenseamento de 1801), ocorre também na França e Alemanha a partir de 1830.
A partir de 1850, as cidades industriais britânicas começaram a crescer mais
do que a infra-estrutura necessária às populações em expansão. As moradias dos
bairros populares eram de construção precária e superlotada.
A migração da população rural para a cidade gerou uma necessidade de se
organizar o espaço, realizar obras de infra-estrutura, inserir novos equipamentos,
solucionar as questões das habitações coletivas e instaurar novas exigências
espaciais. Surgiram diversas propostas para tentar solucionar o desafio que a nova
cidade veio impor.
20
Ebenezer Howard, o criador das cidades jardins, um estenógrafo (prático,
calculador e sonhador), estabeleceu três princípios básicos para a sua proposta: a
eliminação da especulação dos terrenos, o controle do crescimento e a limitação da
população.
A Alemanha reservou os bairros de periferia para alojar o grande fluxo da
população industrial, subdividindo os terrenos em zona de diferentes características
regulamentando-os estritamente enquanto a iniciativa privada inglesa tomou a frente
nos movimentos em favor das melhorias das moradias populares.
Camillo Sitte (1843-1903) buscou uma estrutura orgânica, reagindo de forma
contrária à geometrização e as teorias de Haussnann.
Os Estadounienses construíram os cinturões verdes, reservas arborizadas
com parques e jardins interiores à cidade, nos vastos “Park Sistems” ou sistemas de
parques. (BARDET, 1989, p.22).
Na renovação urbana de Paris, Haussmann incluiu novos traçados, elaborou
a reestruturação fundiária foram realizadas obras de infra-estrutura, equipamentos e
espaços livres, para isso Haussman se baseou em três lemas fundamentais: a fácil
circulação, a eliminação da insalubridade e degradação dos bairros e a
revalorização e reenquadramento dos monumentos unidos através de um eixo viário.
(LAMAS, 1992, p.212).
Os congressos de higiene se multiplicaram desde o início do século XX,
realizados em Nice, Paris, Lyon, Marselha, Berlim, dentre outros. Posteriormente,
realizou-se exposições internacionais para os “Planos de Cidades” organizadas em
Berlim, Düsseldorf e Londres, ocasião que permitiu pela 1ª vez confrontar os
métodos e as realizações dos diferentes países. No congresso de Londres,
reuniram-se alguns pioneiros do urbanismo como Stübben, Patrick Geddes e neste
encontro a palavra urbanismo foi mencionada pela 1ª vez (1910). (BARDET, 1989,
p.24).
A Comissão de Higiene Urbana e Rural presidida por Georges Risler (18531941) se reuniu a partir de 1908, com a presença de especialistas como Hénard
Forestier, Prost, Jaussely, Louis Bonnier, Auburtin, de Souza, de Clermont, BenoitLevy, divulgadores das cidades jardins na França.
No ano de 1914, fundou-se a sociedade francesa de urbanistas, com D. A.
Agache, André Bérard, J.C.N. Forestier, Jaussely, Prost e Redond, sob a presidência
de Eugene Henard. Os trabalhos resultaram na 1ª Carta do Urbanismo chamada de
21
lei de Cornudet ou lei de 14 de março de 1919 modificada em julho de 1924. Esta lei
determinava “que todas as cidades com mais de 10.000 habitantes seriam obrigadas
a ter um projeto de planejamento, embelezamento e extensão”. (BARDET, 1989,
p.24).
As discussões surgidas a partir da industrialização resultaram nas
transformações do espaço urbano e no desenvolvimento das teorias urbanísticas.
No Brasil, o urbanismo passou a ser mais debatido no final do século XIX,
quando se intensificou o quadro epidêmico das cidades e foram propostos
melhoramentos para o saneamento urbano. Os responsáveis pelo projeto eram os
engenheiros que chefiavam também as comissões para a implantação da rede de
água e de esgoto. Dentre eles, podemos destacar o Engenheiro Saturnino de Brito
que atuou em mais de 20 cidades brasileiras, Theodoro Sampaio, nas cidades de
São Paulo e Bahia e Lourenço Baeta Neves, na cidade de Minas Gerais1.
1.2 – A SALUBRIDADE OITOCENTISTA.
A salubridade pode ser entendida como o estado do meio em que o homem
vive, para que se tenham as mínimas condições de higiene, ou seja, com ruas
limpas, secas, sem resíduos, odores ou animais a solta. Segundo Foucault,
salubridade:
“não é a mesma coisa que saúde, e sim o estado das coisas, do meio e
seus elementos constitutivos, que permitem a melhor saúde possível.
Salubridade é a base material e social capaz de assegurar a melhor saúde
possível dos indivíduos. E é correlativamente a ela que aparece a noção de
higiene pública, técnica de controle e de modificação dos elementos
materiais do meio, que são suscetíveis de favorecer ou, ao contrário,
prejudicar a saúde. Salubridade e insalubridade são o estado das coisas e
do meio enquanto afeiam a saúde; a higiene pública – no século 19, a
noção essencial da medicina social francesa é o controle político-científico
deste meio”. (FOUCAULT, 1986, p. 214).
1
URBANISMO no Brasil - 1895-1965. Coordenação: Maria Cristina da Silva Leme. São Paulo: Studio Nobel,
1999. p. 22.
22
As investigações médicas empreendidas na Europa, a partir do século XVIII e
de modo mais enfático, com a contínua ameaça das epidemias no século XIX foram
baseadas nos estudos de Hipócrates.
Na obra “Dos ares, das águas e dos lugares”, Hipócrates coloca a importância
existente entre o meio ambiente e a saúde da população, que se torna a base de
informações para as discussões dos higienistas do século XVIII, ao início do século
XX. Nestes estudos, Hipócrates já mencionava a importância da água tanto para os
banhos quanto para o consumo. Segundo Hipócrates, a geografia de um lugar, a
qualidade da água e com a direção dos ventos era possível que o médico pudesse
avaliar a saúde da população. A relação: alimentação - estilo de vida – saúde era
sua filosofia, dentro de uma visão puramente natural das enfermidades, rejeitando
as interpretações mágicas e religiosas que predominavam em sua época2.
A partir destes estudos, os higienistas concluíram que salubridade, saúde
pública3 e higiene estavam interligadas entre si e que tanto as condições do meio
ambiente interagiam positivamente ou negativamente na vida das pessoas,
aumentando ou diminuindo as enfermidades e o número de óbitos.
Nesse momento, o espaço das cidades e os condicionantes geográficos
passaram a ser percebidos como objetos de estudo e ao mesmo tempo, como alvos
de intervenção das autoridades públicas e sanitárias.
No combate às epidemias e aos considerados desajustes sociais, a Geografia
e a Topografia médica surgiram com um duplo papel: o de diagnóstico e tratamento.
Estes estudos constituíram um importante arquivo histórico para o estudo da
Geografia e para o Urbanismo.
No Brasil, revelaram as peculiaridades regionais de um extenso país tropical,
sendo pensadas soluções para cada localidade em concordância com suas
singularidades geográficas e sócio-culturais.
A relação com a natureza faz com que o homem tenha benefício moral e
físico, influindo de forma positiva na qualidade de vida e atue como uma fonte
renovadora e geradora de benefícios na saúde da população.
2
Enciclopédia Encarta, 2007, CD ROM.
Ferreira, Ângela Lúcia de. Disponível em: http// www.igeograf.unan.mx. Acesso em 3 jan. 2008. Saúde pública
pode ser definida como a ciência e a arte de prevenir a doença, prolongar a vida, melhorar, proteger e promover
a saúde e o bem estar mediante os esforços organizados da sociedade. Estes esforços devem abordar tanto a
política de saúde e as últimas causas da saúde e a doença, como a provisão de serviços sanitários efetivos. Ela
trabalha com a aliança que cruzam disciplinas, profissões e organizações e explora esta diversidade mediante a
colaboração, para suministrar em todas as áreas com impacto na saúde e no bem estar da população, políticas
com base na evidência e investigação.
3
23
O estímulo a criação dos parques e jardins públicos foram baseados na
prática de costumes mais saudáveis, como da educação física e na vida ao ar livre.
Temos como exemplo deste urbanismo sanitarista, as cidades jardins, que foram
construídas nas bases das teorias higienistas, com uma forte preocupação sanitária,
que se trabalhou a relação harmoniosa entre o homem e a natureza, introduzindo
nelas largas avenidas, habitações isoladas e áreas verdes.
Diversos parques como o Mont Royal, Ciutadella em Barcelona, foram criados
sob os conceitos higienistas voltados para a saúde mental e moral do homem. Para
Olmsted o parque tem que atrair o cidadão com necessidade de se exercitar para
que ele tenha uma ocupação mental e ao ar livre, com o resultado de uma vida
saudável. Para os higienistas defensores do parque a sua criação poderia solucionar
problemas sociais, como a delinqüência, o alcoolismo e a insalubridade do entorno
urbano.
No Brasil, o pensamento higienista estava presente desde o século XVIII.
Apesar de sua pouca influência, os médicos apontavam como principais causas da
insalubridade, a produção de miasmas provenientes dos pântanos, existentes nas
cidades.
A partir de 1832, a sociedade de medicina passou a fazer o controle absoluto
sobre as questões de saúde, responsabilidade assumida posteriormente para a
Academia Imperial de Medicina. Seu papel era relatar os casos de febre amarela e
dar o seu parecer. No relatório anual foi publicado pelo Ministério dos Negócios do
Império, que a febre era “uma doença passageira agravada pela irregularidade da
estação” 4, fato que agravou o quadro endêmico na cidade, intensificado depois com
o surto da varíola.
O governo interviu criando a Comissão de Saúde compostas por médicos e
engenheiros, a fim de se ampliarem as discussões e propor soluções de caráter
higienista para a cidade. Esta comissão passou a participar das discussões
enfraquecendo o papel da antiga academia. A comissão depois passou a se chamar
“Junta de Higiene” e por último “Junta Central de Higiene Pública”, que passou a ser
o único órgão controlador das questões relacionadas à saúde pública e doenças.
(REGO, 1852, anexo f).
4
FURTADO, Janaina Lacerda. Dois Lados da moeda: as relações entre a política e a higiene na Comissão de
Melhoramentos da cidade do Rio de Janeiro no final do século XIX. Publicação organizada com o apoio do
Núcleo de Estudos Estratégicos / Arqueologia, São Paulo, 5 abril 2006. Disponível em
http://www.historiaehistoria.com.br/. Acesso 9 out. 2007.
24
Resultaram destas discussões a elaboração de normas para as novas
construções e exigências para os habitantes baseados nos conceitos higienistas que
visa dar condições mínimas de vida digna e saudável.
No ano de 1860, a cólera e a febre amarela mataram milhares de pessoas,
momento de grande mobilização da Junta Central de Higiene. Para se reverter o
quadro epidêmico regularizou-se a limpeza pública, a remoção de lixo, a fiscalização
dos cortiços da cidade e os aglomerados de pessoas. (BRASIL, 1873, p.14/15).
Estes procedimentos higiênicos expressaram a relação entre a questão
médica, técnica e política que se desenvolveram no decorrer do século XIX e dá
origem, no início do século XX, a uma estreita relação entre meio ambiente,
medicina e sociedade, com o objetivo de tornar a cidade salubre, baseada nos
estudos higienistas.
1.3 – OS JARDINS NO ESPAÇO URBANO.
A Europa Medieval devastada pelas invasões e pelas guerras fez com que os
jardins fossem elaborados em menor escala e dentro dos muros de um castelo ou
monastério, como exemplo temos o horto do Monastério de Saint Gall, na Suíça, que
foi dividido em 4 áreas respectivas: uma para o cultivo de ervas aromáticas e
medicinais, hortaliças, árvores frutíferas, e flores. Os claustros na maioria dos
monastérios eram rodeados por galerias porticadas e tinha no centro um poço ou
uma fonte, com o objetivo de ajudar na meditação dos monges. Alguns castelos
tiveram um pequeno horto de ervas e hortaliças e um jardim ornamental privado para
os “senhores” reservando-se outras áreas para o resto da corte5.
Segundo Hugo Segawa, os jardins e os parques privados dos Palácios
Italianos foram construídos nas bases renascentistas a partir do século XVI.
(SEGAWA, 1996, p.38).
Na transição do século XVI para o século XVII, a França se caracterizou pela
nova tipologia chamada de “châteaux”, em que se mesclou o Castelo Medieval com
o Palácio Renascentista. (JELLICOE, 1995, p.181).
5
Enciclopédia Encarta 2007. CD ROM.
25
Hugo Segawa afirma que Paris em meados de 1600, já podia ser visto com
sinuosas avenidas arborizadas. Junto às muralhas se plantaram espécies que
resultaram num agradável corredor arborizado convidativo aos passeios, chamado
de Bulevares. (SEGAWA, 1996, p.40).
Londres, aproximadamente no mesmo período utilizou os terrenos alagadiços
extramuros, para implantar os passeios públicos com uma área destinada aos jogos
de “pallamaglio” (1630), uma prática inglesa de caça que passou a ser realizada
nesta área. No ano de 1660, este espaço foi arborizado e destinado ao público para
os passeios e o esporte. Em 1728 este passeio recebeu melhoramentos que fez do
lugar um importante ponto de encontro da sociedade inglesa, onde podiam ouvir
música, dançar, descansar e conversar.
No novo mundo a paisagem natural significou para os colonizadores descobrir
novas espécies, que resultaram no conhecimento de numerosas amostras de flora e
fauna levadas para a Europa. Para que isso fosse possível foram construídos os
jardins botânicos, local próprio para se realizar os estudos das plantas que se
iniciaram a partir do século XVI de modo informal.
De acordo com Hugo Segawa no jardim botânico do novo México (século
XVIII), construiu-se um prédio integrado aos jardins, com salas, herbário, museu,
biblioteca e moradia para o botânico. A exemplo do México, outros jardins
botânicos6, como o do Rio de Janeiro e de Havana foram inaugurados no início do
século XIX. (SEGAWA, 1996, p.58/59).
As alamedas no novo mundo, em alguns países, se converteram numa área
onde passaram a se realizar os passeios da elite. Estes locais eram favorecidos
pelas espécies vegetais de grande porte, constituindo-se corredores arborizados que
ofereciam o frescor e a sombra para suportar as altas temperaturas do verão.
No Chile, por exemplo, as Cañadas eram caminhos por onde passavam os
animais (em torno de 1800) e estes caminhos eram separados do povoado pelas
árvores que poderiam ser álamos ou sauces formando um corredor arborizado,
denominado alameda. Estas áreas tempos mais tarde se converteram em um local
de passeio público. (SEGAWA, 1996, p.59).
6
SEGAWA, Hugo. Ao amor do público: Jardins no Brasil. São Paulo, Studio Nobel Ltda, 1996. p.13. Os jardins
botânicos foram criados para se fazer o intercâmbio de espécies úteis à economia portuguesa, instalados a partir
do século XVIII, a partir da Carta Régia de 4 de novembro de 1796 dirigida ao governador do Pará que
implantasse na colônia vários estabelecimentos botânicos, inaugurado por Belém-1796, Rio de Janeiro-1808,
Pernambuco-1811, Ouro Preto-1825, e São Paulo-1799.
26
Figura 1: Passeio Los Tajamares - 1800.
Fonte: Biblioteca Nacional (Chile), disponível em: http//www.memoriachilena.cl. Acesso em: 13 set. 2006.
Figura 2: Passeio Los Tajamares - 1820-1821
Fonte: Biblioteca Nacional (Chile), disponível em: http//www.memoriachilena.cl. Acesso em: 13 set. 2006.
27
Figura 3: Passeio La Cañada - siglo XIX. 1800-1873
Fonte: Biblioteca Nacional (Chile), disponível em: http//www.memoriachilena.cl. Acesso em: 13 set. 2006.
Figura 4: Uma tarde de passeio – La Cañada, Santiago de Chile.
Fonte: Biblioteca Nacional (Chile), disponível em: http//www.memoriachilena.cl. Acesso em: 13 set. 2006.
28
Hugo Segawa afirma que as alamedas do Novo México comporam o primeiro
passeio público com fontes e árvores por ordem do 8º Vice Rei da Nova Espanha,
Dr. Luis Velasco em 1592 e desenhado em 1593 por Rodrigo Alonso, que se
converteu num dos importantes sítios urbanos ao longo do século XIX, sob a mesma
temática Européia do “ver e ser visto”. (SEGAWA, 1996, p.62).
A partir do século XVII, os passeios públicos passaram a fazer parte de todas
as importantes cidades européias e foram exportados para o Novo Mundo.
(SEGAWA, 1996, p.66).
Mas foi nos Jardins de Versalhes, projetados por André Lê Nôtre7, que Paris
tornou-se uma referência mundial através de suas criações paisagísticas.
André Lê Nôtre projetou os jardins do Palácio de Versalhes, para Luís XIV, o
Reio Sol (1661-1687). O projeto foi inspirado no Château de Vaux de Vicomte, que
distribuiu os jardins numa área de 100 hectares que se unia com a paisagem natural.
O ponto principal da perspectiva situava-se no centro da fachada posterior ao
Palácio dando uma idéia de perspectiva infinita que se materializa pela sucessão de
componentes ao longo do eixo longitudinal de simetria, com as “parterres de
broderies”, as “parterres d eau”, a Fonte de Latona, o gramado “tapis vert”, a fonte
de Apolo e o grande canal. Uma imagem espacial que expressa o poder da
monarquia real. A água foi o recurso natural mais importante desses jardins.
(KRUFT, 1990, p.17).
No final do século XVIII a França se convertia no centro europeu da paisagem
superando a Itália, graças às grandes construções propiciadas por Luis XIV.
Nos jardins paisagísticos do século XVIII, os principais elementos como as
esculturas, os templos, as torres e as grutas tornaram-se cada vez mais
extravagantes. Desprovidos de qualquer objetivo prático eram chamados de folies(loucuras), construídos por aquele de maior poder aquisitivo. (KRUFT, 1990, p.20).
A imagem do jardim perde seu aspecto tridimensional, tornando um espaço
unitário que passa a ser representado pela sucessão de planos que se superpõe
como um quadro. (KRUFT, 1990, p.26).
7
Enciclopédia Encarta, 2007. CD ROM. André Le Notre: foi um arquiteto paisagista que utilizava em seus
projetos elementos artificiais como as acéquias, fontes, estátuas, e urnas monumentais. Utilizava arbustos
recortados, maciços de flores, terraços, e os parterres geométricos. As avenidas axiais davam ao projeto maior
amplitude para as perspectivas. Além de Vaux Le Vicomte, elaborou os Jardins de Versalhes e de Chantily, criou
também Saint Cloud e Fontainebleau na França, Kensington e St James em Londres e os jardins romanos de
Quirinal e o Vaticano. Sua influência chegou até os países nórdicos, o Palácio de Tsárskoie Seló e Peterhof,
ambos juntos a San Petersburgo, assim como as colônias inglesas de Norte América, o Palácio do governador
em Williamsburg.
29
Os jardins ingleses são os exemplos mais significativos dessa solução e
podem ser representados pela obra de Lancelot Brown, que corresponde a Lê Nôtre
nos jardins franceses. A característica deste jardim é de estar integrado diretamente
com a natureza e o seu limite ser através de fossos, uma barreira invisível aos olhos,
enquanto os jardins franceses utilizavam muros, grades ou outro elemento.
O novo estilo surgido no final do século XVIII, chamado de Romantismo,
queria simplesmente resgatar as fontes estéticas da natureza agreste, as artes
populares, os restos medievais ou as influências exóticas. Um movimento que se
implantou rapidamente na Inglaterra e que influenciou de forma decisiva na evolução
posterior do paisagismo.
O século XIX foi, no entanto o século das grandes transformações refletidas
nos parques públicos, exemplos mais significativos do período.
A arquitetura e o urbanismo através do novo planejamento serão dois
elementos fundamentais para a utilização dos jardins na malha urbana, na
construção de passeios, parques, praças, na abertura de novas avenidas
arborizadas ou na incorporação da vegetação ao monumento arquitetônico das
novas cidades.
1.4 - O PAISAGISMO NO BRASIL.
O paisagismo no Brasil marcou seu início com a construção do primeiro
jardim construído na América Portuguesa, o Passeio Público do Rio de Janeiro
inaugurado em 1783, por ordem do vice Rei Luís de Vasconcelos de Souza e
elaborado por Mestre Valentim da Fonseca e Silva. (MACEDO, 2003, p.18).
A construção do passeio contribuiu para o saneamento e a higienização da
área,
ocupada
anteriormente
pela
Lagoa
do
Boqueirão,
que
já
estava
completamente poluída. Área que era utilizada para o despejo dos dejetos da
população, durante o período colonial.
O aterramento além de sanear a área possibilitou a ocupação de
aproximadamente 20 hectares, que até o momento era completamente inundada.
O projeto inspirado nos jardins franceses foi construído para a contemplação,
lazer e recreação em que tinham de fundo a bela imagem da Baía de Guanabara.
30
Para se desfrutar desta vista, se construiu um belo terraço que avançava sobre a
baía.
Elaborado para a elite, este espaço público foi destinado aos passeios da
burguesia, um hábito europeu introduzido na colônia portuguesa, como um local
próprio para a população usufruir. Neste espaço só podia circular pessoas bem
vestidas e que pertencessem à burguesia. Com o tempo este local caiu em desuso,
reformado em 1862 por Auguste Glaziou
8
que deu uma nova estruturação ao
passeio público.
Num estilo romântico, Glaziou aboliu a geometria do mestre Valentim
introduziu caminhos sinuosos e integrou ao projeto outras espécies de vegetação.
Com a chegada da Família Real, novos palacetes foram construídos,
bulevares, parques públicos, banco, correios, ministérios, faculdades, embaixadas.
Enfim, a nova elite introduz no Brasil a sua cultura e seus costumes, refletindo nas
construções e nos espaços públicos os seus conceitos, que reproduziam na cidade
os seus costumes.
Os três primeiros parques públicos da Cidade do Rio de Janeiro foram: o
Passeio Público (1789), o Jardim Botânico (1808) e o Campo de Santana (1873). Os
largos9 e os terreiros10, também foram ajardinados, transformados posteriormente
em áreas para a elite local, que foram ocupando aos poucos a área central, tirando
do centro os ambulantes, feirantes, cortiços, que se deslocaram para outras áreas
da cidade.
A elite que chegava ao Rio de Janeiro circulava pela rua principal que era a
do Ouvidor, onde estava o comércio com confeitarias, chapelaria onde desfilavam os
Barões do Império, os funcionários públicos, a pequena classe média emergente e
os europeus que chegavam ao país com interesse comercial e político.
O Campo de Santana era utilizado por esta mesma elite, como área de lazer,
projetado por Auguste Glaziou, que desenvolveu vários projetos no Brasil.
8
BITTENCOURT, Gean Maria; FERNANDES, Neusa. A Missão artística francesa de 1816. 2.ed. Rio de Janeiro:
1967. Auguste Francois Marie Glaziou reformou o antigo passeio público do Rio de janeiro, modernizou e
introduziu caminhos orgânicos, mantendo do projeto original apenas a terrazza para o mar. Criou os Jardins do
Palácio Imperial da Quinta da Boa Vista, os Jardins do Palácio Imperial de Verão. Fez o projeto da Praça Paris e
a maioria das Praças de Belém, Petrópolis, do passeio público.
9
Dicionário Novo Aurélio. CD ROM. Largo: Amplo, grande, extenso; vasto
10
Ididem. Terreiro: Local onde se realizam celebrações de cultos afro-brasileiros: macumbas, candomblés, etc
31
O significado dos parques urbanos do século XIX, para a sociedade brasileira
era uma tentativa de introduzir hábitos e costumes europeus. Os parques urbanos
construídos para grandes massas não se adequavam às necessidades do brasileiro
comum, tornando-se um espaço pouco utilizado pela população. A vasta área
territorial brasileira fazia com que o processo de ocupação das terras se desse de
forma descontinuada, com vazios urbanos, o que possibilitava vários tipos de
atividades, fazendo dos parques urbanos um equipamento temporariamente
desnecessário. O clima e as riquezas de recursos naturais faziam do país, um local
com varias opções de entretenimento natural.
O início do século XX constituiu-se um marco na consolidação do urbanismo
no qual as velhas estruturas coloniais foram alteradas, de modo que novos prédios e
ruas se adequassem aos novos padrões de produção, de vida e de cultura.
Na primeira década do período republicano, o espaço urbano se estruturou
nos conceitos da salubridade, transformando cidades inteiras como Rio, São Paulo e
Santos em espaços saudáveis investindo-se na infra-estrutura das cidades,
necessária à vida moderna das elites com a abertura de bulevares, ajardinamentos
de praças e avenidas.
1.5 – A VINDA DA FAMÍLIA REAL PARA O BRASIL.
A simples possibilidade da família real vir para a colônia, fez com que vários
estadistas e políticos portugueses elaborassem um longo plano para por em prática
e impedir o desaparecimento da história da Nação Portuguesa.
A vinda da família Real para o Brasil já era cogitada desde meados do século
XVI por D. João III que pensou na possibilidade da Corte mudar-se para a colônia,
vista pelo navegador Martim Afonso de Souza como uma “doidice um rei viver na
dependência de seus vizinhos podendo ser monarca de outro maior do mundo”, mas
foi no século XVIII, que coube ao estadista português D. Luís da Cunha, lembrar a
conveniência da mudança de D. João V para o Brasil através dos seguintes termos:
32
“Considerei talvez visionariamente que sua Majestade se achava em idade
de ver potentíssimo aquele imenso continente do Brasil, e nele tomasse o
título de Imperador do Ocidente que viesse estabelecer a sua Corte levando
consigo todas as pessoas que de ambos os sexos o quisessem
acompanhar, que não seriam poucas, com infinitos estrangeiros, e na minha
opinião o lugar mais próprio da sua residência seria a Cidade do Rio de
Janeiro”. (VIANA, 1959, p.1).
Em diversas circunstâncias foram cogitadas a possibilidade deste translado.
No início do século XIX, com a invasão Napoleônica da Península Ibérica, em 1808,
que o Rei de Portugal, D. João V, determinou o translado da Família Real para o
Brasil acompanhado de sua corte. (VIANA, 1959, p.1).
A vinda da Família Real para o Brasil foi de grande importância, pois a partir
deste momento se iniciou um processo de transformação não só no Rio de Janeiro,
como nas principais capitais do país.
D. João VI revogou o alvará de 1785 que impedia a instalação de indústrias
na colônia criou o Banco do Brasil, a Imprensa Régia, a Biblioteca Nacional, as
academias de Medicina, a Marinha, a Escola Militar, o Jardim Botânico e a Fábrica
de Pólvora.
A vinda da família Real foi vista por diversos historiadores como um fator
relevante para o desenvolvimento brasileiro, Handelmann destacou que o Brasil
colonial sendo então “apenas uma unidade geográfica” passou a ser “com a
transmigração Real para o Rio de Janeiro um reino autônomo”. (VIANA, 1950, p.3).
D João11, único soberano europeu transferido ao ambiente americano
conseguiu se adaptar as duras condições aqui encontradas e implantou o plano que
propiciou e presidiu a mais profunda transformação ocorrida na história do Brasil.
Segundo Hélio Viana, ele estava interessado no progresso “material” e no
crescimento cultural da antiga colônia e “não apenas em razão de sua posição como
chefe de Estado, mas por uma sólida compreensão do futuro que ao novo Império
estava reservado”. (VIANA, 1950, p.19-22).
Toda a administração que era realizada em Lisboa passou a ser feita no Rio
de Janeiro. Instalaram-se as Secretarias de Estado, os tribunais de justiça e
repartições públicas. (VIANA, 1950, p.20).
11
D. João VI permaneceu por treze anos no Brasil e retornou em 26 de abril de 1821 para Portugal.
33
Vários cientistas12 foram atraídos para conhecer e pesquisar o Brasil. Eles
vinham em busca da pesquisa científica com o interesse na flora, na fauna, nos
recursos hídricos e minerais e nos costumes locais. Com a abertura dos Portos às
Nações Amigas em 1808, Portugal deixou de ser intermediária. O Brasil passou a
negociar diretamente com seu cliente principal, a Grã Bretanha, beneficiando os
comerciantes brasileiros por estarem ligados ao monopólio português.
Para a cultura do povo brasileiro se introduziu uma intensa atividade editorial
publicado pela Imprensa Régia. O primeiro jornal brasileiro foi “A Gazeta do Rio”
(1808-1822) e a primeira revista foi “O Patriota” (1813-1814).
Um apreciador das belas artes13, D João quis de imediato transformar a
cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro numa cidade que refletisse beleza
através da arte, para ele a arte representava o reflexo de uma civilização.
Para se europeizar as terras brasileiras e oferecer à corte as condições para
que se adaptassem com maior rapidez, contratou-se um grupo de artistas franceses,
capazes de introduzir o ensino de artes e ofícios com a finalidade de formar novos
artistas e construir a identidade artística brasileira.
1.6 - A MISSÃO ARTÍSTICA FRANCESA.
A vinda da Missão Artística Francesa de 1816, para o Brasil foi um dos
benefícios que a vinda da corte proporcionou ao país. Aconselhado por Antônio de
Araujo e Azevedo, o “Conde da Barca” D. João VI contratou na Europa (1815) um
grupo de profissionais para fazer funcionar a escola de ciências, arte e ofícios.
O Conde da Barca entrou em contato com o Marquês de Marialva,
embaixador de Portugal junto à Corte de Luís XVIII para que convocasse os artistas
necessários para compor a missão. (BITTENCOURT, 1967, p.7).
12
VIANA, Hélio. A transmigração, antigo plano português. Comércio: Rio de Janeiro, 29 dez. 1959. p.22. Dentre
eles podemos destacar o príncipe Maximilian, Alexander Philip de Wied-Neuwied (1815-1817), Karl Frederic
Martins (1817-1820), o alemão Eschwege, o inglês Mawe, o francês Saint-Hilaire, os austríacos Pohl e Von
Matterer, o toscano Raddi e os bavaros Spix e Martius.
13
Ibidem, p.23-24. O ensino de belas artes foi introduzido no Brasil desde o período colonial, através das aulas
régias de desenho, mas com a chegada da corte a arte foi incrementada com a chegada de alguns artistas
portugueses que acompanharam D. João ou que vieram posteriormente, como os pintores Joaquim Cândido
Guillobel e Henrique José da Silva.
34
Marialva, através de Alexander de Humboldt, foi apresentado a Joaquim
Lebreton, que no momento estava destituído de todos os cargos que ocupava por
ser bonapartista e por ter ofendido o Duque de Wellington e a Inglaterra.
Marialva retirou-se de Paris e deixou em seu lugar Francisco José Maria de
Brito, o “Chevalier de Brito”, para que finalizasse o processo da vinda da Missão
constituída por vários artistas 14.
A Missão embarcou no veleiro norte americano Calpe que partiu de Havre em
22 de janeiro de 1816, chegou ao Rio de Janeiro no dia 26 de março de 1816. Foi
recebida oficialmente pelo Conde da Barca e pelo Marquês de Aguiar que instalaram
estes profissionais por conta do Estado.
A Escola Real de Belas Artes foi criada pelo decreto de 12 de agosto de 1816,
que contratou estes profissionais por 6 anos.
Em 12 de outubro de 1820, o substituto do Conde da Barca (já falecido), o
Visconde de São Lourenço determinou por decreto a criação da Academia Real de
Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil que não chegou a funcionar. Mais
tarde através do decreto de 23 de novembro de 1820, dava-se início as aulas de
desenho, pintura, escultura e gravura, ministrada por diversos profissionais.
O novo diretor da academia foi o português Henrique José da Silva (17721834), tendo como secretário, o Padre Luís Rafael Soyé. (BITTENCOURT, 1967,
p.10).
A abertura solene da Academia foi marcada para 19 de outubro de 1826, mas
só se realizou em 5 de novembro devido ser a data de aniversário da chegada de D.
Leopoldina ao Brasil.
Antes da missão, a arquitetura utilizada refletia a imagem dos colonizadores
que reproduzia a arte Barroca portuguesa na colônia. A missão marcou o início do
tratamento artístico no Brasil, que a partir dos grandes mestres e seus “discípulos”,
deram continuidade e puseram em prática todos os ensinamentos adquiridos,
substituindo a arte Barroca pela Neoclássica.
14
BITTENCOURT, Gean Maria; FERNANDES, Neusa. A Missão artística francesa de 1816. 2.ed. Rio de Janeiro:
1967. p. 7. O quadro superior e artístico foi composto por: 1 chefe, 7 professores e 3 auxiliares, o quadro
complementar ou de artes mecânicas, com 6 mestres de artes e ofícios.
35
Pallière15 (pintor, gravador, desenhista, litógrafo16, decorador) veio para o
Brasil na Nau de Guerra de D. João, que transportou a Princesa Austríaca, Dona
Leopoldina Josefa Carolina a futura Imperatriz, integrou-se à missão francesa
através de casamento com a filha de Grandjean de Montigny.
Graças a uma recomendação do Duque Mathieu de Montmorency, a Duquesa
de Cadaval, Pallière foi nomeado o pintor da Princesa Leopoldina e professor das
infantas. (SANTOS, 1941, p.212-240).
Por três anos sucessivos Pallière se distinguiu por excelentes produções no
Rio de Janeiro. Por incumbência de D. João VI, traçou o plano da Vila Real da Praia
Grande, pintou vistas das Províncias do Rio de Janeiro, São Paulo e de Minas
Gerais e o primeiro Panorama da Cidade de São Paulo (visto do Rio Tamanduateí),
em 1821.
Atuou como professor de desenho por decreto de junho de 1822 na Real
Academia Militar, a futura Imperial Academia Militar. Antes de ocupar este cargo
ensinava desenho e pintura em sua residência.
Segundo alguns historiadores, o artista realizou as primeiras litogravuras, na
Oficina do Arquivo Militar e acredita-se que Pallière tenha sido o pioneiro da técnica
litográfica no Brasil.
Dentre seus trabalhos realizados, o modelo para a construção da Vila Real da
Praia Grande desenhada por Pallière foi comparado pelo alemão Eduardo Teodoro
Bosche como a Fontainebleau17 brasileira.
15
Disponível em: http: www.itaucultural.org.br. Acesso em: 7 ago. 2007. Pallière nasceu em Bordéus em 1783 e
faleceu em 27 de novembro de 1862. Era filho de Jean Pallière, que foi professor de desenho, pintor e gravador.
Quando chegou ao Rio de Janeiro, exerceu o cargo de professor particular de pintura.
16
Dicionário Novo Aurélio, século XXI. CD ROM. Litografia: Processo de gravura em plano, executado sobre
pedra calcária, chamada pedra litográfica, ou sobre placa de metal (em geral, zinco ou alumínio).
17
Enciclopédia Encarta 2007. CD ROM. Fontainebleau é uma comunidade localizada na área metropolitana de
Paris à 65 km do sul de Paris. O Palácio possui elementos arquitetônicos do século XVI ao XIX. Uma das suas
principais características é que ao olhar os prédios de cima se tem a impressão que está interligada uns aos
outros nos dando a impressão de não terem sido planejado, sem uma geometria ou lógica na construção do
conjunto dos prédios, mas esta assimetria somada aos jardins tornou-se a marca registrada de Fontainebleau.
36
CAPÍTULO 2
2.0 - A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO.
2.1 - A CRIAÇÃO DA VILA REAL DA PRAIA GRANDE.
A Vila Real da Praia Grande localizava-se nas terras conhecidas por Bandas
d’ Além18, doadas ao cacique Araribóia considerado o fundador da Cidade de Niterói.
Ainda no século XVI, essas terras foram colonizadas a partir de doações de
sesmarias. Araribóia recebeu a sesmaria de São Lourenço, em forma de
agradecimento, pela sua participação na expulsão dos franceses do Rio de Janeiro,
que dominavam a baía com o apoio dos índios Tamoios. Esta ação, realizada em
conjunto com Mem de Sá e Estácio de Sá, permitiu a fundação da Cidade de São
Sebastião do Rio de Janeiro.
A sesmaria doada por Mem de Sá ao índio temininó segundo Antonio Figueira
de Almeida, “compreendia todo o terreno, desde as barreiras vermelhas (Gragoatá),
correndo ao longo da baía acima rumo ao norte até completar uma légua para o
sertão”. A posse (anexo A) se deu oficialmente em 22 de novembro de 1573,
fixando-se com sua tribo em São Lourenço, ponto inicial de ocupação da cidade.
Quando Araribóia19 se fixou na região com sua tribo, já existiam diversas
fazendas que mostravam indícios de formação de pequenos núcleos. (ALMEIDA,
1935, p.16).
Segundo o trabalho de J. Norberto em “Memória histórica e documentada da
aldeia de índios da província do Rio de Janeiro” tomo XVII, 4° da terceira serie, p.
109, diversos desbravadores antes de 1650 já haviam aberto suas fazendas e
engenhos desde Maruhy a Carahy. (ALMEIDA, 1935, p.16).
18
FORTE, José Mattoso Maia. Notas para a história de Niterói. 2. ed. Niterói: 1973. p.16. Bandas d’ Além: Termo
utilizado para denominar as terras situadas do outro lado da baía da Guanabara
19
ALMEIDA, Antonio Figueira de. História de Niteroy. 1935. p 16. Araribóia: Nasceu por volta de 1523 na Ilha do
Governador, era filho de Maracajá - guassú, principal dos temininós da ( Paranapém, Paranapuan, Maracayás,
ou dos Gatos bravos), foi batizado pelo “Senhor de São Vicente” aos 7 anos de idade na Cidade do Rio de
Janeiro, passando a se chamar de Martins Affonso de Souza.
37
Em meados do século XVIII e início do XIX, Bandas d’ Além teve um
considerável crescimento nos seus núcleos urbanos, iniciado pelos foreiros, sitiantes
e proprietários.
Algumas estradas cortavam a região, como as de São João de Carahy para
Boa Viagem, a do Cavalão, a de São Lourenço para Carahy, a nova e a velha
estrada da Conceição, a da praia e muitos caminhos de carroça. (ALMEIDA; 1935,
p.24).
As igrejas e capelas também contribuíram com o povoamento das Bandas d’
Além. A mais antiga igreja se situava no morro de São Lourenço, construída em
1576 pelo jesuíta Braz Lourenço, concluída em 1578. Temos também a Capela
Nossa Senhora da Conceição (1663), a de Santo Ignácio (1796), a de São
Domingos (1652), a da Ilha da Boa Viagem (1663), a de São João Batista (1660), a
de Guaxindiba (1645) e a de São Sebastião de Itaipu (1716). (ALMEIDA; 1935,
p.24).
Localizada às margens leste da Baía de Guanabara, Niterói foi descrito por
Antonio Figueira de Almeida como um lugar de sublime beleza.
Entremeada de colinas arredondadas e verdejantes que lhe emprestam á
fisionomia uma expressão característica–e umas ás outras se sucedem
formando vales graciosos - a cidade de Niteroy está plantada á margem
direita da Guanabara, apresentando um litoral desenvolvido e articulado em
angras e praias encantadoras. A terra e o mar interpenetram-se, ali,
caprichosamente, em braços que se alongam e pequenas penínsulas de
agradáveis perspectivas, ostentando-se ainda - a faixa de beira mar, de
terras sedimentares, numa exuberância vegetal incomparável e
maravilhosa. (ALMEIDA; 1935, p.11).
No século XIX, esta região era habitada por centenas de paroquianos e
milhares de escravos, composta por fazendas, engenhos de açúcar, lavouras de
cereais e comércio.
Com a chegada da Família Real Portuguesa em 1808, verificou-se uma
movimentação rumo as freguesias do Recôncavo Fluminense e para as Bandas d’
Além, local que passou a fazer parte dos interesses do Príncipe Regente, elegendo
São Domingos como o local preferido para o descanso de sua família.
Sua proximidade com a Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, fez com
que a região crescesse de forma mais lenta desenvolvendo-se de forma
38
espontânea, estendendo-se de São Domingos ao Ingá, Boa Viagem e Icaraí. A
expansão urbana ocorrida em meados do século XIX significou para a Praia Grande
um momento de grande transformação.
Diversos viajantes confirmaram o progresso e fizeram relatos referentes à
Praia Grande. Os primeiros a constatar estas transformações foram: Gabriel Soares
de Souza, Fernão Cardim e André Thevet. John Luccock, um viajante inglês do
século XIX faz um relato em que descreve as características do povoado, um pouco
antes de sua elevação à condição de Vila, assim como a movimentação entre a
Praia Grande e a Cidade do Rio de Janeiro.
“A enseada da Praia Grande é um dos recessos menos profundos com que
por ali se topou, mas nem por isso, o menos belo. A praia é larga e orlada
de pequeninas casas; o interior rico, embora arenoso; a região populosa; e
talvez, nenhum dos pontos vizinhos da capital passou por tão vantajosas
transformações. O porto ali afundado comunica com todas as partes
orientais da Província, bem como as estradas que vão ter ao Espírito Santo
e Porto Seguro. É ali que se embarcam todos os vários gêneros que a
região produz com abundância; motivo pelo qual se vêem barcas que de
contínuo singram rumo à cidade. A distância é de cerca de três milhas e
durante a travessia goza-se em toda sua plenitude da brisa do mar. Cerca
do meio dessa enseada, observa-se por ocasião dos disparos da manhã ou
da tarde, ou bem quando se trocam salvas de cumprimento, um desses
belos ecos abundantes na baía. Provoca-os a reverberação das montanhas
circunjacentes, e por vezes reboa e troveja com impotente grandeza. Sobre
a garganta que separa o recesso do Saco de São Xavier, acha-se situada a
encantadora e pequenina aldeia de São Domingos e na sua extremidade
oeste fica a pouco importante bateria de São João”. (LUCCOCK; JOHN,
1942, p.174).
A primeira visita do Príncipe Regente à Praia Grande se deu após a morte de
sua mãe, a Rainha D. Maria I quando decide passar um período de descanso na
região. D. João VI chegou à região acompanhado de sua família, da corte,
autoridades civis e militares, magistrado, clero e pessoas importantes da Cidade de
São Sebastião do Rio de Janeiro. No dia 13 de maio de 1816, passou revista às
tropas que iam rumo a Montevidéu e neste mesmo dia comemorava seu aniversário
concedendo o “beija mão” a toda nobreza.
Passado esta comemoração, D. João VI permanece todo o mês de maio em
São Domingos, dividindo seu tempo entre as caçadas realizadas no Morro de João
Homem e acompanhando os exercícios da Divisão dos Voluntários Reais d El Rei,
que seguem de viagem para o sul no dia 29 de maio de 1816.
39
Figura 5. Dom João e a Família Real na Praia Grande – 1816.
Fonte: José Antônio Soares de Souza, Da Vila Real da Praia Grande à Imperial Cidade de Niterói, 1993,
ilustração nº 3.
D. João VI e a corte se instalou provisoriamente no Palacete20 de São
Domingos, como era conhecido, (demolido em 1904), cujo proprietário era um
negociante de recursos e traficante de escravos, o Senhor Thomas Soares de
Andrade, conhecido por “cheira” devido ter o hábito de cheirar todo o dinheiro de
metal que lhe vinha às mãos.
Proprietário de vários edifícios, como o cedido a D. João, tinha também os da
esquina das Ruas da Praia e Imperador, cujos fundos destes prédios foram
demolidos e construídos repartições públicas. No ano de 1802, estes receberam um
novo uso, passando a ser depósito de africanos. No mesmo ano o Sr. Thomas e a
20
BACKHEUSER, Everardo. Minha terra e minha vida, nota crítica de Emmanuel de Macedo Soares, n 256,
Segundo Emmanuel de Macedo, posteriormente neste prédio funcionou o primeiro palácio de governo da
província 18341842 e a primeira Assembléia Legislativa Provincial (1835), transformado em um cortiço na
República, em 1905, em péssimo estado, foi demolido para a urbanização e ampliação da Praça Leoni Ramos.
40
sua mulher Rufina Joaquina Rosa de Andrade, doam o imóvel com todos os móveis
e adornos à D. João VI. (ALMEIDA, 1935, p.35).
Figura 6: Palacete de São Domingos.
Fonte: José Antônio Soares de Souza, Da Vila Real da Praia Grande à Imperial Cidade de Niterói, 1993,
ilustração nº 8.
Após a primeira visita de D. João VI à região, ficou confirmada uma
movimentação que fomentou o crescimento populacional não só da Praia Grande,
como das localidades vizinhas.
No ano de 1819, contava-se em todo território com a freguesia de São
Gonçalo, 13 mil habitantes e no recenseamento de 1821 a freguesia de São João
Batista 747 fogos, com 2244 habitantes livres e 2771 escravos, o que demonstra o
crescimento populacional da região. Este constituiu um fator relevante para o
reconhecimento institucional do povoado. A elevação à categoria de Vila21
significava adquirir autonomia política e administrativa.
21
Dicionário Novo Aurélio, século XXI. CD ROM. Vila é uma povoação de categoria superior a de aldeia ou
arraial e inferior a cidade
41
O desembargador, ouvidor e corregedor geral da comarca do Rio de Janeiro,
o Senhor Manoel Pedro Gomes utilizou o crescimento populacional como uma das
justificativas do seu pedido ao rei (anexo B) para a elevação das povoações da Praia
Grande e São Domingos à categoria de Vila. Nessa solicitação Manuel Pedro
ressalta que:
“ a população e a grandeza daquele sítio parece muito notável para uma
separada e particular jurisdição, e promete crescer de dia em dia, já pela
freqüência dos passageiros e transportes guiados pelas principais estradas
do norte, e nascente desta província até a Praia Grande, aonde acham a
passagem mais pronta e perto desta capital, e já pela concorrência de
muitas famílias desta cidade, que vão passar tempos ou convalescer
naquele belo lugar. Sobre a garganta que separa o recesso do Saco de São
Xavier, acha-se situada a encantadora e pequenina aldeia de São
Domingos e na sua extremidade oeste fica a pouco importante bateria de
São João (...)”. ATAS DA CÂMARA, (1819-1840), Padre Perereca,
op.cit.,p.122.
Outro motivo utilizado para o pedido de elevação à Vila foi à presença da
residência do Príncipe Regente, localizada em São Domingos, considerada um fator
de grande importância e honra para a emancipação da freguesia.
Foi no Campo de D. Elena22 (escrita original), na presença da corte e sua
tropa, que D. João VI emancipou os povoados de São Domingos e Praia Grande
que passaram à condição de Vila conforme o alvará régio, com força de lei de 10 de
maio de 1819 (anexo C), criando-se a Vila Real da Praia Grande.
A Vila era constituída pelos dois, já mencionados, povoados e quatro
freguesias vizinhas: São João de Caray, São Sebastião de Itaipu, São Lourenço dos
Índios e São Gonçalo.
Esta emancipação se deveu a diversas razões de ordem administrativa, assim
como crescimento populacional e pela proximidade com a capital do país como
consta no alvará.
22
FORTE, José Mattoso Maia. Notas para a história de Niterói. 2. ed. Niterói. 1973. P.53. Campo de Dona Elena,
as terras de Dona Elena constituíam uma antiga fazenda de mandioca, que se estendia pela zona circunscrita
pela rua direita da Conceição até a base do morro em que está à igreja, vertentes do morro do Buraco da Onça,
vertentes do morro do Hospital e a Rua Visconde do Rio Branco que correspondiam as ruas da Conceição, José
Clemente, Aurelino Leal, Quinze de Novembro, Capitão Mor, Praça General Gomes Carneiro e a antiga Praça
Santo Alexandre. Proprietária por sentença em 29 de janeiro de 1811, devido a morte de seu marido Manoel
José de Bessa, estas terras passam por um longo processo judiciário tornando se conhecido a razão da
denominação de “Campo de D. Elena”.
42
No alvará de criação da Vila, constam dois motivos determinantes para a sua
criação - a primeira foi à necessidade conceder sua autonomia política e
administrativa, evitando-se as idas e vindas ao Rio de Janeiro - a segunda foi de
ordem sentimental, pois as tropas de D. João VI ficaram aquarteladas na Praia
Grande sob o comando de Lecor, antes de partir para a Banda Oriental do Uruguai
para implantar o domínio português.
Uma vez oficialmente criada a Vila, fazia-se necessária escolher o local mais
apropriado para sua implantação, a ser decidido entre duas povoações contíguas:
São Domingos e Praia Grande.
Analisando-se os dois sítios, São Domingos, não era apropriado por estar
localizado em uma área estreita e pela existência do palácio do Príncipe Regente,
tornando o sítio inadequado para instalar o Pelourinho. Optou-se então pela Praia
Grande, por ser um sítio plano e espaçoso, com largura adequada para a
implantação da Vila.
Para instalar a Vila Real da Praia Grande vem do Rio de Janeiro o
desembargador ouvidor geral e corregedor da comarca, Joaquim José de
Queiroz. Mas não podendo fazê-lo em São Domingos, como mandava o
Alvará, retorna à Corte, consulta pessoalmente Dom João e de volta
procede à instalação no povoado da Praia Grande. (ATAS DA CAMARA,
1819 a1839).
A instalação foi oficializada no dia 11 de agosto de 1819, em audiência
realizada na casa do ouvidor geral Joaquim José de Queiroz. Estavam presentes o
escrivão, o meirinho, pessoas do clero, nobreza e o povo das quatro freguesias,
convocadas por edital.
Neste ato, segundo José Mattoso Maia Forte o Dr. Queiroz “dirigindo-se aos
moradores que a ela haviam concorrido, disse que o alvará régio determinara que se
erigisse a Vila no Sitio e Povoação de São Domingos da Praia Grande”. (FORTE,
1973, p.65).
43
Neste mesmo dia, ergue-se o Pelourinho23 símbolo do poder do rei e da
autonomia do município.
O Pelourinho possuía um formato de cruz e na sua base havia um escaninho
onde se guardavam os “pelouros”, que eram bolas de cera dentro das quais se
guardavam as listas dos nomes mais votados para vereadores e demais cargos de
eleição.
Neste local seriam construídos os meios necessários a administração desta
justiça, isto é, a cadeia, o pelourinho e as principais construções para o
funcionamento da Vila como a Câmara, a Praça do mercado e o rossio24. Localizada
próxima ao porto, constituía um fator favorável a comunicação com a Corte e os
distritos vizinhos.
Segundo o historiador Antônio Figueira de Almeida havia ainda o Pelourinho
da justiça, para a execução dos criminosos, este não possuía escaninho “era
formado por uma haste, à qual se prendia uma travessa horizontal, na extremidade
se prendia a corda de enforcamento e havia a foice da justiça”. (ALMEIDA, 1935.
p.45).
O primeiro pelourinho foi erigido no Campo de D. Elena, onde hoje está
localizado o prédio da antiga prefeitura, depois transferido para a Praça do mercado
desaparecendo com o tempo. A localização da Praça do mercado era em um
espaço situado em frente à Praça Martim Afonso onde depois se construiu um
grande chafariz. (ALMEIDA, 1935, p.45).
Os prédios administrativos a serem erguidos se fariam junto a Rua da
Conceição, principal via que ligava as estradas que levariam aos caminhos que
conduziam a Santa Rosa, São João de Carahy, a Rua de São João e permitia
chegar ao caminho de São Lourenço, costeando o mangue desta enseada.
(ALMEIDA, 1935, p.42).
A inauguração da Vila foi entre as nove e dez da manhã em sessão solene, a
tarde comemorou-se o “Te–Deum”, cantado pelo vigário José Joaquim Ávila em
ação de graças realizado na Igreja de Nossa Senhora da Conceição e à noite
23
DICIONÁRIO Ilustrado de Arquitetura. ALBERNAZ, Maria Paula; LIMA, Cecília Modesto. São Paulo: Pro
Editores, 1998. 356 p. Il. D Pelourinho: Marco, geralmente de pedra, comumente em forma de coluna, que
simbolizava a autoridade do poder de Portugal nas antigas vilas e cidades coloniais. Tem sempre como arremate
superior as armas do rei. Situava-se na praça principal dos povoados. Junto a ele eram expostos ou açoitados
criminosos e escravos. Também eram divulgados os editais públicos. Foi extinto durante o Império. É uma das
características mais marcantes dos antigos núcleos urbanos. Em algumas das antigas cidades coloniais, até hoje
se encontra o antigo pelourinho. É o caso de Caeté e São João del Rei em Minas Gerais.
24
Dicionário Novo Aurélio, século XXI. CD ROM. Rocio: Antiga roça, que se aproveita para capinzal.
44
realizou-se uma grande festa para a população com musicatas25 e cantorias que
percorreu alegremente os caminhos parando a frente de uma casa e outra.
Segundo os costumes da época, os moradores mais ricos estenderam
colchas de seda e renda nas janelas de seus solares e iluminaram as fachadas de
suas casas. A beira dos caminhos e ao longo da praia acendeu-se fogueiras com
barricas de alcatrão. Durante as festividades, a população cantou e dançou em torno
das fogueiras. (FORTE, 1973, p.67).
No dia 5 de julho de 1819, D. João VI nomeia para o cargo de Juiz de Fora
“aquelle magistrado letrado e de maior confiança”, o advogado José Clemente
Pereira26.
Deste modo, a Câmara ficou composta por um Juiz de Fora e três
vereadores, Pedro Henrique da Cunha, João de Moura Brito e Quintiliano Ribeiro de
Magalhães e um procurador, o Francisco Faria Homem. Na posse realizada no dia
onze de agosto de 1819, Quintiliano estava ausente.
A partir deste momento, José Clemente inicia uma árdua luta para a captação
de recursos para dar início à execução das principais obras para a organização do
espaço urbano. Dentre as principais melhorias, estavam o plano de arruamento, o
abastecimento d’água, o abastecimento de gêneros de primeiras necessidades, a
construção da Igreja Matriz de São João Batista, a construção da casa da Câmara e
Cadeia, a elaboração do código de posturas e a organização do primeiro arquivo
municipal.
Seu nome teve um grande significado para a Praia Grande e como
administrador mereceu do regente Araújo Lima o reconhecimento de “Planejador da
Cidade de Niterói”, recebendo posteriormente da Câmara Municipal de Niterói o
tributo de “Criador e Edificador da Vila Real da Praia Grande”, por sua dedicação e
empenho à povoação da Vila.
25
: Dicionário Novo Aurélio, século XXI. CD ROM. Musicatas: Banda de música.
SOARES, Emmanuel de Macedo. José Clemente e a Vila Real da Praia Grande. 1980. p 112. José Clemente
Nasceu em Adem, termo da Vila de Castelo Mendo, comarca de Trancoso, Bispado de Pinhel, em Portugal, filho
de humildes lavradores, José Gonçalves e Maria Pereira. Educado por seu tio foi preparado para ingressar na
Universidade de Coimbra onde concluiu seus estudos, cursando Direito. Alistou-se em um batalhão de
voluntários acadêmicos organizado por José Bonifácio durante a invasão francesa, que ao término da guerra em
1815, volta ao Rio de Janeiro para receber sua recompensa pelos serviços prestados. No ano de 1818 foi
nomeado por D. João VI a juiz de fora da Vila de Santa Maria de Marica, mas no mesmo ano foi nomeado a juiz
de fora de Angola, ficando a primeira nomeação sem efeito. Quando em 1819 a Praia Grande passou à Vila, seu
nome foi indicado para o cargo de Juiz de fora para a Vila de Santa Maria de Maricá, tomando posse no dia que
se ergueu o pelourinho permanecendo no cargo por três anos.
26
45
Por tomar parte no movimento da Independência, o Juiz de Fora permaneceu
pouco tempo na administração da Vila.
A elevação de categoria, fez com que a Vila adquirisse a sua independência
política, com vida própria. Na nova composição administrativa o Legislativo e o
Judiciário ficaram vinculados a Vila e o Executivo à Cidade de São Sebastião do Rio
de Janeiro, mais especificamente ao Ministério do Império que comandaria as ações
provinciais até 1835. Como Vila, passou a ter uma vida autônoma para dispor de
seus bens e rendas em seu próprio benefício. (SILVA, 1995, p17).
Foi no dia 18 de agosto de 1819, que a Câmara presidida pelo Juiz de fora
José Clemente Pereira, deu início a um de seus primeiros deveres para com a Vila.
“A Câmara desta Vila Real da Praia Grande etc faz saber que sendo um dos
seus primeiros deveres, de que se não esquecerá jamais, dar providências
oportunas para que todo o povo desta vila desfrute abundância da melhor
água, da qual padece a mais considerável e penosa falta; e sendo
outrossim igual dever prover que as ruas desta vila os caminhos e estradas
públicas de todo o seu distrito ofereçam um trânsito fácil, no que interessa
quanto se não pode replicar, além do cômodo pessoal de todos, o melhor
giro do comércio, que anda sempre a par da facilidade e da importação e
exportação de seus gêneros, nascendo daqui a maior abundância dos
comestíveis de primeira necessidade, de que esta vila sofre carestia e falta
[...] não permitindo porém à mesma Câmara [... a falta de recursos...] que
tome sobre si por ora o grande peso e considerável despesa que requer o
melhoramento dos objetos sobreditos, desejando corrigir antes por alguma
forma a precisão de tanta urgência, depois de vistorias e exames pessoais a
que procedeu, e depois de ouvir os pareceres de pessoas inteligentes e
zelosas do bem público, tem acordado o seguinte: 1) Que no sítio de São
Domingos aonde chamam o Ingá se prepare uma fonte pela melhor e mais
segura e duradoura forma possível, que beneficiando o permanente e
copioso manancial da mais preciosa água que ali se encontra abandonada
e sem resguardo [forneça] a todos os habitantes do sobredito sítio de São
Domingos este alimento de primeira necessidade. 2) Fazer conduzir ao
centro da vila ou ao menos ao mais próximo dela que for possível o
admirável nascente de mais de uma telha d'
água cristalina conhecida de
saudável qualidade que brota no lado ocidental do Morro do Carimbá. E
enquanto se não pode levar a efeito este custoso mas necessário projeto,
tem a Câmara determinado facilitar ao público esta mesma água por meio
de um aqueduto provisório na testada da fazenda de Manuel Gonçalves de
Carvalho, sobre um atravessadouro que leva do Caminho de São Lourenço
para a Estrada de São João de Caraí. 3) Quanto aos caminhos e estradas
públicas que cada um dos confrontantes prepare as suas testadas, como é
obrigado e já se ordenou. 4) Sendo de custosa despesa calçar as ruas
desta Vila, tem acordado a Câmara fazê-las preparar interinamente com
aterro de saibro, que sendo feito em termos pouco dispendiosos é seguro e
permanente; e porque a Rua da Conceição exige que seja aterrada primeiro
que as demais, não só por ser uma das mais públicas e freqüentadas, mas
também porque leva à igreja matriz e à capela da Conceição, é justo que
ofereça um caminho fácil e cômodo aos fiéis que por necessidade ou
devoção têm que recorrer à mesma, será esta a primeira que mereça o
46
benefício acordado. 5) Para facilitar a execução destas obras, cuja absoluta
necessidade a todos é obvia, e cujo pronto resultado aproveita a todos,
convida a Câmara aos habitantes desta vila e seu termo para uma
subscrição de donativos voluntários, na qual o doutor juiz presidente e mais
autoridades dela abriram o exemplo. Os oferecimentos serão lançados em
um livro destinado só para isso, com expressa individuação de quem os faz;
e promete a mesma Câmara fazer constar ao público em uma maneira
demonstrada o recebimento e a destinação dos donativos que se fizerem”.
(ATAS DA CAMARA, 1819 p.5). Grifos da autora.
Observa-se que o documento acima assinala medidas relacionadas à
circulação dos moradores, o abastecimento d’ água e as responsabilidades dos
moradores na manutenção de suas testadas.
O documento ainda descreve o comprometimento inicial da Câmara para com
a população da Vila e relata os primeiros passos para que as principais
necessidades da Vila fossem atendidas.
Um dos principais problemas que a Vila tinha, era com relação ao
abastecimento d’ água, que era precário. Nele foi proposto a construção de uma
fonte no Ingá, que ofereceria água segura e duradoura. A captação para o
abastecimento do centro da Vila seria proveniente do Morro do Carimbá, obras
consideradas dispendiosas para serem iniciadas de imediato. Enquanto se
aguardava a arrecadação para a execução dessas obras, a água seria levada
através de um aqueduto provisório proveniente da fazenda do Sr. Manuel Gonçalves
de Carvalho, que vai do caminho de São Lourenço para a estrada de São João de
Caraí.
As ruas da Vila encontrando-se geralmente com poças e alagados são
citadas para pavimentação que seriam em saibro facilitando a circulação dos
transportes. A primeira rua a ser pavimentada seria a Rua da Conceição por ser a
principal via da Vila, que se ligava à várias ruas e conduzia à Igreja Matriz e à
Capela da Conceição. Quanto aos caminhos e estradas ficariam a encargo dos
proprietários.
A escassez de alimentos de primeiras necessidades foi um dos temas
importantes para a Câmara, propondo reverter este déficit com a circulação dos
produtos, estimulando deste modo à importação e exportação.
Deste modo, para dar início às primeiras propostas, a Câmara solicitou
donativos aos moradores da Vila. A Câmara não esperou a conclusão do plano que
47
estava sendo elaborado, para tomar as primeiras medidas de organização do
espaço urbano da Vila Real da Praia Grande.
2.2 O PLANO DE EDIFICAÇÃO DA VILA REAL DA PRAIA GRANDE.
A Vila, uma vez criada, tornou necessário fazer um plano para urbanização da
área da Praia Grande. Deste modo, foi encomendado à Câmara, a pedido de D.
João VI, a elaboração de um plano para regularizar a ocupação espontânea, já
ocorrida na região.
Figura 7: Plano de Edificação da Vila Real da Praia Grande.
Fonte: Imagens de Vilas e Cidades do Brasil colonial, Nestor Goulart Reis p. 187.
O plano tratava-se de um projeto urbanístico, desenhado pelo pintor Francês
Arnaud Julien Pallière, incluindo-se neste plano, o projeto de um Passeio Público27
27
Passeio público: é o primeiro parque público das Américas construído no centro do Rio no século XVIII,
destinado aos passeios, jogos e encontros.
48
para a Vila. De influência renascentista o traçado foi apresentado numa gravura de
forma artística e bem detalhada.
Este plano foi uma das primeiras medidas tomadas pela Câmara, concluído
no dia 5 de fevereiro de 1820, quando foi enviado a D. João VI para sua aprovação.
O primeiro documento enviado ao príncipe regente foi um Plano de Edificação
e o segundo tratava-se do projeto de um passeio público chamado de Passeio da
Memória, cujo objetivo era recordar o dia 13 de maio de 1816, data da cerimônia
dirigida por D. João VI, citada anteriormente.
O primeiro documento enviado ao Príncipe Regente tinha o seguinte teor.
“Senhor. A Câmara da Vila Real da Praia Grande, contemplando a utilidade
e esplendor que resultará se esta vila for edificada sobre um plano regular e
decoroso; e pesando com vistas no futuro as bem fundadas esperanças de
que a mesma cresça em numerosa população a passos rápidos, como se
deve crer, calculando sobre o aumento progressivo que este sítio recebeu
nos últimos dez anos de sua existência, que não contando àquele tempo
senão trinta a quarenta casas, hoje está enriquecido com perto de
trezentas; e desejando sobretudo abrir com solidez e grandeza os alicerces
de uma povoação que possa corresponder em tudo ao sublime e majestoso
atributo de Real que a distingue e caracteriza, e que venha a ser um dia
uma das mais formosas vilas do Império de Vossa Majestade, prostrada aos
reais pés de Vossa Majestade tem a honra de depor na mui alta e augusta
presença de Vossa Majestade o seguinte Plano de Edificação da Vila Real
da Praia Grande. A planta junta oferece uma vista aproximada do estado
atual da edificação desta vila, e do qual ela deverá vir a ser se este plano for
levado a desempenho. Os lugares que vão em branco denotam as ruas
antigas; os que vão marcados entre pontos encarnados indicam as ruas
novas. O campo número um será destinado para sobre ele se levantar um
Passeio Público, consagrado à feliz memória do faustíssimo dia treze de
maio de mil oitocentos e dezesseis. No número segundo se levantará o
Rossio que será formado por um quadrado retângulo de mil e quinhentos e
quarenta palmos, e no centro dele se colocará o pelourinho. Sobre o ponto
de número três se formará uma Praça mais pequena que o Rossio,
destinada para a venda pública de hortaliças, quitandas e peixe. E seria
muito útil que na mesma se estabelecesse um mercado diário de galinhas, a
fim de ocorrer em parte aos graves males que ao público e muito em
particular à Real Ucharia estão fazendo os atravessadores dessas aves
Entre esta Praça e aquele Rossio se edificará a Casa da Câmara, sobre o
ponto número três, com frente para o Rossio; por baixo dela se levantará a
Cadeia, com frente para o mar. A um lado da Casa da Câmara e Cadeia se
colocará o açougue; ao outro seria útil que se criasse um edifício destinado
para recolher farinhas, milhos, legumes e mais efeitos desta classe
destinados à venda pública, denominado por esta aplicação Terreiro da
Farinha Sobre o lado oposto do Rossio que fica fronteiro à Casa da Câmara
deverá reservar terreno suficiente para um templo dedicado a São João
Batista, orago da freguesia desta Vila e seu padroeiro. Defronte da capela
da Conceição se deve aperfeiçoar o Largo número quatro, que já ali está
principiado, ao encontro que faz a Rua número dez com a Rua número
dezoito No acabamento daquele lugar número cinco convém reservar
terreno suficiente para o matadouro de gado que deve entrar no açougue, e
talho de vaca da vila, ao qual quadra o nome de Campo do Curral Assim se
49
poupará à saúde pública o considerável dano que sempre vem de serem os
matadouros no interior das povoações. Pede a comodidade pública que
entre a Rua número onze e a Rua número dezesseis, com base sobre o
número dez, se coloque o chafariz que deve apresentar ao povo a água do
Morro do Calimbá, que se está conduzindo, e é por isso inevitável abrir
neste lugar um recinto cômodo e vistoso Sobre a Rua número seis se
levantarão mais quatro ruas números sete, oito, nove e dez, paralelas entre
si o mais que for possível.Estas cinco ruas serão cortadas por nove ruas
transversais, que todas devem ter seu começo na Rua seis e o seu
acabamento na número dez Todas as ruas contarão uma largura de 60
palmos e ao menos de cinqüenta aquelas que por algum obstáculo
atendível não puderem ter 60. E como esta vila goza em seu nome o
invejado atributo de Real, parece ser de direito e justiça que as suas ruas se
acomodem a nomes reais, que expressa a planta. Sendo necessário
prescrever alguma regularidade no prospecto e forma exterior das casas
para que a liberdade absoluta de edificar não venha a produzir deformidade
e defeitos notáveis, que convém prevenir e acautelar, a ninguém será
permitido levantar casas novas nem fazer consertos exteriores nas já
existentes sem licença da Câmara, que determinará o arruamento e o
prospecto. Este será regulado pela maneira seguinte: nos cantos e esquinas
das quatro ruas que quadram o Rossio e nos dois cantos da Praça sobre o
mar, a ninguém será permitido levantar senão casas de sobrado. No meio e
dos lados do Rossio e em todas as outras ruas será livre edificar casas de
sobrado ou térreas sempre que aquelas tenham trinta e cinco palmos de
altura e estas dezessete, sendo de doze a altura das portadas. Ninguém
poderá edificar fora do alinhamento das ruas; e por nenhum pretexto será
livre a qualquer deixar nas mesmas ângulos entrantes ou salientes que
dêem lugar a serem nelas surpreendidos insidiosamente os que de noite
passarem pelas ditas ruas. A Rua da Praia conservará o alinhamento que
lhe foi dado, por meio de uma singela graderia de madeira fingindo bronze,
entre pilares de tijolo e cal, levantada na frente das casas. Nas outras ruas
as casas serão edificadas sobre o alinhamento; e se alguma pessoa quiser
formar pátio ao lado de sua casa, ou conservar terreno com chácara, será
obrigado a aformosear a frente da rua com um muro da altura de doze
palmos, coberto de cal branco. Para evitar que no centro da vila se
conserve terreno devoluto e sem casas, com grave prejuízo da formosura e
comodidade da mesma vila, todos os donos de terrenos deverão ser
obrigados por termo assinado na Câmara a edificar no termo de três anos; e
não querendo ou não podendo serão constrangidos a venderem seus
terrenos àquelas pessoas que se obrigarem a edificar no sobredito terreno,
pagando aos donos dos terrenos o justo valor deles e dos materiais que
nele se acharem, a aprazimento das partes ou por meio de avaliação com
assistência da Câmara e citação dos interessados, na forma do direito e do
costume usados em casos semelhantes. E por igual razão a ninguém será
permitido aforar senão metade dos fundos que houver nos espaços de rua a
rua, conseguindo-se daqui ao mesmo tempo a vantagem de que todas as
casas fiquem patrimoniadas de quintais. Se na abertura de novas ruas,
praças e largos largos, a necessidade de sua retidão ou largura conveniente
à comodidade dos habitantes e ao serviço dos que por elas passam for
encontrar alguma pequena casa ou plantações, será o seu valor pago pela
Câmara, pelo seu justo preço, na forma que já se tem praticado com alguns.
O Largo de São Domingos deve ser aformoseado por justificados motivos e
será objeto de um plano em separado. Os suplicantes pretendem, e muito
humildemente pedem a Vossa Majestade que por efeitos da Real grandeza
e Soberana proteção se digne fazer-lhes mercê de aprovar e proteger o
sobredito plano. E receberão Mercê. José Clemente Pereira. Pedro
Henrique da Cunha. João de Moura Brito. Francisco Faria Homem”. (ATAS
DA CAMARA, 1820, 5 de fevereiro de 1820). Grifos da autora.
50
Nos grifos destacados, o documento revela questões importantes de
ocupação urbana presentes nos atuais planos diretores.
Ele descreve e indica o posicionamento dos diversos usos públicos e
institucionais que fazem parte da cidade. Nesta descrição elementos compositivos
como posicionamento de praças, traçados e larguras de ruas, gabaritos,
afastamentos, recuos e muros definem uma preocupação estética.
As ligações entre os bairros e o centro, abastecimento d’água, saneamento,
saúde e segurança pública fazem parte das propostas incluídas no documento.
Finalmente o plano tem claramente definidas as obrigações do morador para
com a Câmara, que exige prazos para a construção e reparo dos prédios sob pena
de obrigatoriedade de vender sua propriedade no justo valor.
No texto, a seguir, está indicado o local destinado ao passeio público, objeto
do segundo documento enviado ao Príncipe Regente.
“Senhor. A Câmara da Vila Real da Praia Grande, depois de levantar a
Vossa Majestade um monumento de lealdade, amor e gratidão, sobre o
assento puro de seus corações fiéis, desejando levar à eterna posteridade a
saudosa memória do faustíssimo dia treze de maio de mil oitocentos e
dezesseis, no qual Vossa Majestade se dignou honrar este sítio com a sua
Real presença, celebrando tão sagrado dia sobre o campo chamado de
Dona Elena, concorrendo ali a Corte formalmente, com os tribunais, tem a
honra de pedir a Vossa Majestade licença para levantar sobre o dito campo
chamado de Dona Elena um passeio público, segundo o plano junto, que
será denominado Passeio da Memória. E muito humildemente pede a
Vossa Majestade que por efeito da Real grandeza se digne fazer-lhe a
mercê de aprovar e proteger uma obra que é toda de Vossa Majestade.
Cristo, juiz de fora do cível, crime e órfãos nesta Vila Real da Praia Grande
e na de Santa Maria de Maricá e seus termos e nas mesmas provedor dos
bens e fazendas dos defuntos, ausentes, capelas, resíduos e cativos, tudo
por Sua Majestade Fidelíssima, que Deus guarde etc Faço saber que a fim
de prover os graves males que à tranqüilidade pública se originam de
vagarem de noite pelas ruas homens ou escravos vadios, têm as leis pátrias
decretado contra eles penas de prisão e pecuniárias; em sua observância
tenho passado ordens aos oficiais de justiça deste juízo e rogado às
autoridades militares do distrito que prendam e façam prender todo o
homem branco, preto, ou pardo; qualquer escravo que for encontrado nas
ruas desta vila sem lanterna, ou outro lume, depois das dez horas da noite,
salvo se for homem branco, de qualidade distinta, notoriamente conhecido e
acreditado; sendo escravo, [se] trouxerem escrito assinado por seu senhor,
por onde conste que vai empregado no seu serviço. Todos os que forem
presos da sobredita maneira serão multados na forma da Ordenação do
Livro V, título 79, hoje ampliada pelo alvará de 17 de setembro de 1814,
parágrafo 2º. E para que chegue a notícia de todos mandei passar o
presente etc. Vila Real da Praia Grande, 6 de fevereiro de 1820”. (Livro de
Registro de Documentos, pág. 13). (ATAS DA CAMARA, 1820, 5 de
fevereiro de 1820).
51
Constata-se que além da breve referência ao Passeio da Memória o
documento se estende a norma de condutas sendo particularmente acentuadas as
restrições estabelecidas para os escravos.
Segundo as Atas da Câmara do dia 5 de fevereiro de 1820, o autor do plano
foi o major engenheiro Antônio Rodrigues Gabriel de Castro que adotou para a Vila o
plano regular, inspirado nos ideais urbanos renascentistas. Mas como o pintor e
gravador francês Arnaud Julien Pallière foi o autor dos desenhos, atribuem a ele a
autoria dos projetos. Persiste o debate sobre a autoria do plano uma vez que o
desenho, isto é, o traço foi autenticado pela assinatura de Pallière na gravura.
Segundo as Atas da Câmara de 1820, “Todas as ruas contarão com uma
largura de 60 palmos e ao menos de cinqüenta aquelas que por algum obstáculo
atendível não puderem ter 60”. A planta a seguir indica na legenda a denominação
das ruas e localização das áreas livres a serem ocupadas por praças, passeio,
rossio, campo e terreiro.
Figura 8: Detalhe do plano de arruamento da Vila.
Fonte: José Antonio Soares de Souza, Da Vila Real da Praia Grande à Imperial Cidade de Niterói, 1993,
ilustração nº 18.
52
As praças28 dariam a Vila um aspecto de organização e salubridade pondo
um fim aos diversos alagados existentes. Num total de quatro praças, a primeira se
chamou Passeio da Memória, a ser construída nas terras de dona Elena, utilizadas
no cultivo da mandioca. Sua propriedade fazia limite com a Rua Direita da
Conceição (tortuosa como a denominação em outras cidades) até a base do morro
em que está a igreja, pelas vertentes do morro do Buraco da Onça e a vertente do
morro do hospital e pela rua da praia, atual Visconde do Rio Branco.
Figura 9: Delimitação do Campo de D. Elena.
Fonte: Imagens de Vilas e Cidades do Brasil colonial, Nestor Goulart Reis, p.187.
A segunda praça de forma retangular, com 1541 palmos, ficou reservada para
o rossio, tendo na parte central o Pelourinho. Nela seria construído o edifício da
Câmara e Cadeia, o açougue, o terreiro de farinha e a Igreja de São João Batista,
padroeiro da freguesia.
28
. Dicionário Novo Aurélio, século XXI. CD ROM. Praça: Lugar público descoberto e geralmente cercado por
edifícios.
53
A terceira praça, um pouco menor, foi denominada de Praça do mercado,
reservado para a venda de hortaliças, quitandas e peixes, chamada de Praça Martim
Afonso e a quarta e última, denominou-se de Largo29 da Conceição, conforme
detalhe apresentado a seguir:
Rossio
Largo
da Conceição
Praça
do mercado
Figura 10: Detalhe de localização do rossio e praça do mercado.
Fonte: Antonio Figueira de Almeida, História de Niteroy, 1935, p.72.
Os chafarizes e as fontes públicas instalados nos largos ou praças foram
definidos também no plano.
“...Pede a comodidade pública que entre a Rua número onze e a Rua
número dezesseis, com base sobre o número dez, se coloque o chafariz
que deve apresentar ao povo a água do Morro do Calimbá, que se está
conduzindo, e é por isso inevitável abrir neste lugar um recinto cômodo e
vistoso”... (ATAS DA CAMARA, 5 fev. 1820).
29
DICIONÁRIO Ilustrado de Arquitetura. ALBERNAZ, Maria Paula; LIMA, Cecília Modesto. São Paulo:
ProEditores, 1998. 356 p. Il. Largo: Espaço de maior largura ao longo e uma rua. Antigamente correspondia
comumente a local onde se situavam prédios de maior importância, como igrejas, conventos, ou edifícios
institucionais.
54
Este chafariz ficou localizado na atual Rua Visconde de Sepetiba, ou seja,
entre as atuais ruas São Pedro e São João, posicionado nas extremidades do Plano,
ponto limítrofe com o manguezal, de acordo com os comentários de Emmanuel de
Macedo Soares transcritos a seguir:
“a Câmara encontrou grande dificuldade para realizar esse projeto,
eternizando-se o chafariz provisório, no descampado alagadiço onde em
começos deste século a Cantareira construiu sua oficina de bondes, entre
as ruas Marechal Deodoro, Marquês do Paraná e São João”. (Comentários
de Emmanuel de Macedo Soares. ATAS DA CAMARA, 5 fev. 1820).
Para auxiliar o plano na tarefa de transformar o centro da Vila, os vereadores
fizeram um relatório que descreveram e apontaram as regras para a execução do
projeto. Mais tarde, elaboraram as posturas camarárias pela mesma instância do
poder. (CHICHARO, 2004, p.145).
Basicamente tudo estava definido no plano, no qual a Câmara passa a fazer
todo o controle da Vila, determinando diretrizes com normas sanitárias para o seu
funcionamento. (grifos assinalados abaixo).
Todo e qualquer habitante desta Vila e seu Termo é obrigado a mandar
fazer diariamente o despejo das imundícies e águas impuras dentro do mar,
nos lugares próximos a ele e nos outros lugares ou valas que mais remotos
estiverem da povoação, em cuja distância não incomode os moradores das
respectivas povoações, às 11 horas nas noites de verão e às 10 nas de
inverno. (...) E o mesmo se deve entender a respeito do lixo, à exceção
daquele que não sendo impuro se pode aplicar para entulhar as cavidades
que houverem na praia. (Posturas Policiais da Câmara da Vila Real da Praia
Grande. Praia Grande: TFP. de Rodrigues e Cia, 1833.n. LXXXIX).
A Câmara controlou as construções e reformas realizadas na Vila, de modo
que somente um indivíduo com poder financeiro, poderia edificar no novo espaço,
seguindo as exigências e o padrão imposto pelas posturas camarárias.
55
“... e forma exterior das casas para que a liberdade absoluta de edificar não
venha a produzir deformidade e defeitos notáveis, que convém prevenir e
acautelar, a ninguém será permitido levantar casas novas nem fazer
consertos exteriores nas já existentes sem licença da Câmara, que
determinará o arruamento e o prospecto Este será regulado pela maneira
seguinte: nos cantos e esquinas das quatro ruas que quadram o Rossio e
nos dois cantos da Praça sobre o mar, a ninguém será permitido levantar
senão casas de sobrado. (ATAS DA CÂMARA, 5 fev. 1820). Grifos da
autora.
Pelo fato de não existir iluminação pública (implantado em 1835), foi exigido
da população a colocação de lampeões de azeite de peixe nas residências.
Todas estas medidas a serem adotadas, tinham o objetivo de transformar
este espaço em urbanizado. O resultado foi a exclusão social na qual a população
mais pobre deslocar-se-ia para áreas mais afastadas, em decorrências das novas
normas e dos melhoramentos introduzidos na Vila como água, iluminação, rede de
serviços e outros valorizando os terrenos da localidade.
Segundo o Livro de Registros e Ordens:
“Para evitar que o centro da vila se conserve terreno devoluto, e sem casas,
com grave prejuízo da formosura e comodidade da mesma Vila, todos os
donos de terrenos deverão ser obrigados por termo assinado na Câmara, a
edificar no termo de três anos: e não querendo, ou não podendo, serão
constrangidos a vender os seus terrenos a aquelas pessoas que se
obrigarem a edificar no sobredito termo, pagando aos donos dos terrenos o
justo valor deles, e dos materiais que neles se acharem, a aprazimento das
partes, ou por meio de avaliação da Câmara”. BNRJ-SM, Cód.14, 4,13.
(Registro de representação que a Câmara da Vila dirige ao Rei pedindo
armas para esta Vila. In: Livro de registros e ordens e mais papéis
pertencentes a Câmara da Vila Real da Praia Grande 1819-1828 registro
seis).
Dessa forma, é possível concluir que para se por em prática o Plano, frente
ao novo ambiente idealizado e projetado, foi necessário transformar as
características físicas da Vila, como também dar novas diretrizes para ordenar e
controlar o espaço urbano. Um controle que irá se projetar sobre o indivíduo que
fazia parte deste espaço, obrigado a seguir as novas normas e a disciplina imposta
pela nova administração.
Neste espaço inseriram-se os valores simbólicos que representavam a
fisionomia da nova elite, que foram reproduzidas no espaço da Vila. A exemplo disso
56
temos o Pelourinho, um instrumento de punição e de justiça, para mostrar e impor a
ordem na Vila. Temos também o Passeio da Memória elaborado para representar a
força e a voz de comando sobre a Vila representada pela figura do Rei, transpondo
para a nova Vila seus valores e seus costumes.
2.3 - A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO DA CIDADE.
Instaurando-se de imediato uma política urbanizadora, institucionalizada pela
Câmara, foi dado início às mudanças necessárias para a modernização e o
embelezamento da região.
O sistema de arrecadação da Vila era de baixo valor e grandes dificuldades
foram encontradas por José Clemente. Para equilibrar os negócios e realizar as
obras de infra-estrutura, que não foram muitas, criaram novos impostos.
Como o comércio requer alvarás de licença, os negociantes foram
convocados a pagar seus impostos na Praia Grande, o que antes faziam no Rio de
Janeiro. Estabeleceram-se tributos sobre a propriedade de barcos, atividade
pesqueira e outros a fim de aumentar a arrecadação e dar seguimento à
implantação do plano. Uma arrecadação que em 1819 foi de 967$025, no ano de
1820 passou para 2349$820, para uma despesa que somavam 1959$200. Um
superávit importante para a criação do novo espaço urbano. (SOARES, 1980, p.28).
Uma das maiores
preocupações da Câmara era com relação ao
abastecimento de água. Ela propõe a construção de aquedutos para amenizar este
problema e para suprir o déficit de abastecimento realiza obras complementares
para a instalação de chafarizes e fontes.
O abastecimento do centro era feito pelo chafariz de São Lourenço localizado
no final da Rua São João juntamente com o encanamento das águas do Calimbá,
mais tarde foi construído outros dois chafarizes: o do Largo da Memória e o da
Praça Martim Afonso, no ano de 1847.
O sistema de abastecimento d’água foi complementado com as fontes do Ingá
Pequeno, de São Domingos, da Armação, da Bica dos Caboclos (abastecia a aldeia
de São Lourenço), dentre outros.
57
A regularização do abastecimento de água se deu a partir de 1860, mas até
1880 o abastecimento doméstico se fazia de forma precária, utilizando-se os
chafarizes. A partir da contratação da Companhia Cantareira de Viação Fluminense,
em 1892, com a canalização das águas da serra de Nova Friburgo o abastecimento
se regularizou. (CAMPOS, 2004, p.150).
“É sabido que a fonte do Ingá Pequeno forma, talvez, mais da metade da
água, de que se abastecem os habitantes desta capital: a afluência de
carroças ali é tal que rara vez está sem mais de quatro, além de grande
número de escravos que aí vão com barris. O espaço que, atualmente, há
para acomodar toda essa gente e carroça sé apenas o da largura da rua,
que tem 60 palmos, o qual é reconhecidamente insuficiente para isso,
acrescendo por demais ser para esse lugar que transitam as muitas famílias
que, ou por gosto, ou por necessidade, vão aos banhos que oferece a praia
das Flechas, e que não poucas vezes acham obstruída a rua com os
carregadores de água”. CORREIO da Província do Rio de Janeiro. n 481,
03/03/1845 (publicou a 7ª. Sessão da Câmara, de 12/02/1845). Apud José
Antônio Soares de Souza. Op. cit., p.205. Grifos da autora.
Os comentários revelam os conflitos de uso já na primeira metade do século
XIX quando o banho de mar já era freqüentado pela população.
Até o final do século XIX e início do XX, o quadro era praticamente o mesmo.
As doenças como tuberculose, febre amarela e a cólera, fizeram parte do cotidiano
das cidades e vilas brasileiras, mas foi no início do século XX que a varíola e a peste
bubônica devastaram a cidade de Niterói.
A construção de moradias coletivas chamadas de cortiço30 foi outro fator de
insalubridade da região. Neste local, residiam os imigrantes portugueses e
alforriados, comprometendo a qualidade de vida dos moradores. Este tipo de
habitação funcionou como um agente propagador de doenças, devido à
concentração de pessoas. Foi então que a Câmara decretou a eliminação dos
cortiços da área urbanizada.
30
DICIONÁRIO Ilustrado de Arquitetura. ALBERNAZ, Maria Paula; LIMA, Cecília Modesto. São Paulo:
ProEditores, 1998. 356 p. Il. Cortiço: Habitação coletiva em geral formada por unidades habitacionais
constituídas por um único compartimento, voltadas para um pátio ou rua interna, tendo acesso comum à via
pública. Possui instalações sanitárias coletivas. Foi uma das principais alternativas de moradia para a população
pobre em São Paulo e Rio de janeiro na última metade do século XIX e início deste. A partir de fins do século
passado tornou-se alvo de críticas e perseguições pelas autoridades, acusado de propagar epidemias que
assolavam a cidade, por insalubridade. Sua construção foi proibida por legislação em fins do século XIX no Rio
de Janeiro.
58
Na seção de 12 de fevereiro de 1890, um membro da Intendência Municipal
apresentou um projeto que proibia a conversão dos prédios da cidade em cortiços
por meio de biombos. Na seção do dia 10 de abril de 1890, propôs à proibição da
construção de novos becos e estalagens e a reconstrução das que ameaçavam cair.
Estes projetos foram aprovados e enviados à Comissão de Posturas. (CAMPOS,
2004, p.158).
A Intendência de Niterói apresentou como alternativa de habitação para a
população pobre, um projeto para construção de “habitações para proletários”,
encaminhado em 26 de abril de 1890. No ano seguinte, enviou-se uma proposta
para a construção de familistérios31, uma habitação para operários que foi
encaminhada a comissão de obras32.
A manutenção da ordem ficou sob o controle do poder público e as
instituições responsáveis de fiscalizar/controlar a população, também fiscalizava
estalagens (cortiços), hotéis, hospedarias, que se tornaram alvo de controle da
polícia.
Esse ordenamento urbano já estava anunciado no conjunto de ações do
Plano de Edificação (1820) e em seus desdobramentos e, como podemos ver, a
Câmara atuou ao longo do tempo na implantação das medidas, que foram propostas
para a Vila. Essas medidas podem ser consideradas de caráter decisivo para a
construção do espaço urbano da Vila Real da Praia Grande.
O século XIX foi para a Praia Grande um momento de grande crescimento e
modernização introduzida a partir da elaboração do plano urbanístico da Vila Real
da Praia Grande. Transformações posteriores e o acompanhamento das Atas da
Câmara permitem analisar as condições de vida dos moradores, o processo lento de
organização administrava e realização de obras públicas que permitiram melhorar a
qualidade de vida de alguns extratos da população da Vila.
31
BENÉVOLO, Eduardo. História da cidade. Familistérios: Conjunto de habitações encostadas umas às outras
para acomodar diversas famílias, segundo a concepção de Fourier
32
Atas da Câmara 8 dez.1891.
59
O Poder público instaurado na Vila determinou as novas diretrizes e a
organização deste espaço para o surgimento da cidade real. A força e o poder eram
representados na figura do “Rei”, um agente controlador de todas as ações
praticadas na Vila. A construção do centro da Vila, que a partir da praça principal
(rossio), se construiria os principais prédios para a administração e da justiça local,
mesclando-se diferentes usos no mesmo espaço simbólico. (CAMPOS, 1998, p.94).
A localização do poder temporal teve como ponto de partida no plano de se
instalar o pelourinho na parte central do rossio, a construção da Casa de Câmara e
Cadeia também voltada para o rossio, complementada pela casa de farinha e o
açougue que facilitava o total controle do poder público. Com a reserva no plano da
área de construção da igreja matriz, o poder religioso mostra a sua força institucional
e simbólica ratificando as condições para erguer uma Vila Real.
60
CAPÍTULO 3
3.0 – O PASSEIO PÚBLICO.
3.1 - O PASSEIO DA MEMÓRIA.
O passeio público, denominado “Passeio da Memória”, foi projetado para
reverenciar D João VI além de contribuir com o saneamento do centro da Vila.
A área que seria construído o passeio, estava ligada diretamente ao porto,
local por onde entravam e saiam mercadorias e se limitava com a principal Rua da
Vila, a Rua direita da Conceição.
A contaminação do ar e do solo se deu por diversos fatores que contribuíram
com a insalubridade da área resultando num espaço desorganizado e sujo, fatores
determinantes para sua erradicação.
Os alagados faziam parte deste ambiente, os animais circulavam livremente
pela Vila, os resíduos eram retirados das residências e do comércio local, em barris,
transportados por escravos chamados de “tigres”, que eram levados em carroças e
lançados no morro do “Campo Sujo”, área de esgotamento sanitário da Vila, onde se
localiza, atualmente, a Praça da República.
Devido a estes fatores anteriormente citados, a preocupação com a saúde
pública aumentou, a nova administração deveria intervir de imediato no espaço físico
da Vila. Trabalhou-se para eliminação dos alagados, disciplinar a população, proibir
a circulação de animais pela Vila, fazer o aterramento do Mangue de São Lourenço,
dentre outros. Enfim ações que trariam resultados positivos promovendo a saúde e o
bem estar da população.
Como foi mencionado o passeio público estava localizado sobre as terras que
pertenciam a D. Elena Casimira, área onde se realizavam as comemorações cívicas
e festivas locais. Por ser uma área plana, foi o local mais indicado para implantar o
passeio público.
61
Uma ação judicial movida por D. Elena Casimira, proprietária do terreno, onde
seria construído o Passeio Público, não viu com bons olhos o procedimento da
Câmara que tomou posse de seu terreno sem audiência e sem o seu devido
consentimento. A Câmara se apoderou da parte que correspondia a Praça Santo
Alexandre para instalar o Pelourinho mandando retirar por conta própria as cercas
dos arrendatários e foreiros que ocupavam as terras de D. Elena. (SOARES, 1980,
p.21). Insatisfeita com tal procedimento, D. Elena dirigiu-se ao poder Judiciário e
moveu uma ação, finalizada no dia 11 de abril de 1845. Já falecida, sua filha Maria
José de Bessa, casada com Gabriel Alves Carneiro saem vitoriosos ao final da ação.
(FORTE, 1975, p.38).
Pouco tempo depois à criação da Vila, a planta correspondente ao Passeio da
Memória juntamente com as do Plano de Edificação da Vila Real da Praia Grande
não foi encontrada em seus arquivos, podendo ser encontrado um dos originais
existentes em Lisboa 33.
Figura 11: Detalhe do Passeio da Memória-1820.
Fonte: Imagens de Vilas e Cidades do Brasil colonial, Nestor Goulart Reis, p.187.
33
Atas e documentos da câmara, 23 set. 1829, v. 3, p.33.
62
O desaparecimento das plantas, gerou duas dúvidas - a primeira foi com
relação ao autor do projeto do Plano de Edificação da Vila Real da Praia Grande - a
segunda foi com relação ao primeiro nome de Pallière, se seria “Arnaud” ou
“Armand”, justificada no artigo de José Antônio Soares, publicado pelo Instituto
Geográfico Histórico Nacional.
“...Reproduziu o ilustre professor Marques dos Santos os desenhos de
Pallière em interessantíssimo artigo que publicou na Revista do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, intitulado.“ O ambiente Artístico
Fluminense a chegada da Missão Francesa em 1816”. Os desenhos
reproduzidos, que se referem a Praia Grande, são: Planta da Vila Real da
Praia Grande, e Planta e Perspectiva do Passeio Público da Vila Real da
Praia Grande, ou seja, do Passeio ou Largo da Memória.
Neste importante trabalho escreveu Marques dos Santos Armand Julien
Pallière-Nasceu em Bordéus em 1784 e la faleceu em 27 de novembro de
1862. Depois de várias informações de sobre a vida e obra de Pallière se
reportar ao n° três da citada Revista do Serviço do Patrimônio, em que já
havia tratado das atividades do mesmo artista, diz o seguinte sobre os
desenhos da Praia Grande: “A pouco e pouco temos ampliado os nossos
estudos sobre Pallière. As melhores informações acabam de nos ser
ministradas pelo infatigável pesquisador Doutor Augusto de Lima Junior, o
qual ao chegar de Portugal, nos deu a honra de sua visita e contou-nos
suas atividades, em busca de documentação brasileira, nos arquivos
lisboetas. Visitando este prezado amigo, em companhia de Wasth
Rodrigues, fomos de surpresa em surpresa, apreciando em 4 horas, coisas
que, a bem ver deveríamos examinar em dois largos meses. Estava nos
reservada nesta visita, satisfação ainda maior, quando deparamos um
desenho do projeto do Largo da Memória e seu monumento comemorativo
a D. João na Vila...(Niterói) bem como esplendido traçado urbanístico
daquela cidade, datado de 1818. Estamos certo de que a elaboração
desses projetos e sua efetivação foram devidas ao prestígio do primeiro juiz
de fora da então Vila Real da Praia Grande . A pedido de José Clemente,
vê-se que Pallière desenhou o plano da vila...”Os projetos de Pallière devem
ser de 1819 e não de 1818, nem foram feitos a pedido de José Clemente,
mas sim encomendados pela Câmara, da qual José Clemente presidente,
na qualidade de Juiz de Fora. Assim foi que se projetou o prédio da Câmara
e Cadeia da mesma vila, encomendado o risco ao Arquiteto da Casa Real
João da Silva Moniz, que o concluiu em novembro de 1820. Eu vi nos
originais, há já alguns anos, não só os desenhos de Pallière, mas ainda os
documentos que formam “Plantas e Plano da Vila Real da Praia Grande”,
quando Marques dos Santos, já então seu proprietário, teve a gentileza de
me deixar vê-los. São notáveis os desenhos. Infelizmente a reprodução, na
citada revista não esta nítida, mal da para que se leiam os nomes das ruas
projetadas e se vislumbre a perspectiva em que se acham colocados os
principais prédios já existentes. O original ele viu uma vez, ele não lembra
de ver a assinatura de Pallière nos originais. Segundo Marques dos Santos
poderia ser de procedência portuguesa pois o colorido e a projeção das
casas se assemelhavam muito aos das plantas do final do século XVIII e
começo do XIX de autoria de hábeis militares portugueses, existentes no
Arquivo Histórico e Mapoteca do Itamarati.
Gilberto Ferrez, ilustre historiador das paisagens brasileiras dissipou-me, há
bem pouco tempo, esta dúvida, ao ter a bondade de comunicar-me a
existência, em Lisboa, de outro exemplar dos desenhos da Praia Grande,
que viu assinados por Pallière. Era de hábito, em, trabalhos da natureza
63
daqueles que executou o artista Frances tirasse o próprio autor vários
exemplares, que eram numerados. Todos porém, não deixavam de ser
originais. O de Lisboa parece-me o principal”.Segundo Guilherme Auler,
historiador consciencioso e meticuloso com marcante atração para estas
minudenciam, escreveu na introdução que fez para o Registro de
Estrangeiros 1802-1822. “Arquiteto da Casa Real, João da Silva Moniz,
autor do projeto da Casa da Câmara e cadeia da Vila Real da Praia Grande,
podendo ser encontrado na seção de manuscritos da Biblioteca Nacional,
encontrando-se nestes documentos as assinaturas de Pallière”. (SOUZA,
1968, p.218-222). Grifos da autora.
As dúvidas existentes com relação aos desenhos de Pallière para a Vila Real
da Praia Grande foram discutidas e comprovadas pelos originais localizados em
Lisboa conforme o artigo do professor Marquês dos Santos reproduzido acima. O
artigo faz comentários sobre a qualidade do desenho e o fato de Gilberto Ferrez ter
visto uma das gravuras originais com a assinatura de Pallière.
Ao observar o projeto do passeio público, constata-se que trata de um projeto
monumental com bases renascentistas utilizando a simetria entre as praças com 4
sub áreas interligadas entre si com o mesmo tratamento paisagístico.
Ao observar a figura 12, a planta de forma quadrada, a partir de um eixo
central organizou o entorno em que o centro se interligava as outras quatro áreas
menores através de alamedas. No entorno do centro da praça, aparece escrito em
letras colossais às palavras “João VI R”. Este tipo de trabalho é denominado de
“Parterres” uma palavra francesa derivada de “Brodeire par Terre” que significa
bordado no solo uma técnica utilizada quando queriam introduzir cores nos jardins
através de flores.
Este projeto foi elaborado dentro de uma racionalidade, numa visão
tridimensional a partir do eixo central. Este eixo fazia com que o olhar do observador
se projetasse ao infinito, o que sugere o controle do dono, simbolizado pelo poder do
rei. A geometria perfeitamente planejada simbolizava que a natureza só seria bela
quando fosse controlada pela mão do homem.
Podemos comparar este projeto a uma obra de arte com 5 áreas de convívios
interligados entre si por caminhos, arborizados em alamedas, que ofereceriam ao
visitante o frescor para passeios, possibilitando encontros e convívio social.
Quanto à pavimentação, os caminhos poderiam ser de pedras trituradas
(cascalhos) ou pó de tijolo que circundavam o gramado delimitado por árvores
podadas em formas geométricas, técnica utilizada para realçar os espaços dos
64
jardins, dispostos normalmente em linha reta. Quanto ao gramado, ele ficaria restrito
ao retângulo, normalmente formado por bordas crespas.
Figura 12: Planta do Passeio da Memória – 1820.
Fonte: José Antônio Soares de Souza, Da Vila Real da Praia Grande à Imperial Cidade de Niterói, 1993,
op.cit., ilustração nº 19.
65
Ao observar a fachada a seguir, às árvores do eixo principal possuíam maior
altura. Estas que compunham este eixo, normalmente eram podadas até onde a
mais alta escada pudesse alcançar. A partir deste ponto as árvores cresceriam
livremente, uma técnica conhecida como “poda en rivière”, que forçava a ilusão
arquitetônica criando uma linha de cornija34 feita de folhas.
Figura 13: Vista da fachada do Passeio da Memória.
Fonte: José Antônio Soares de Souza, Da Vila Real da Praia Grande à Imperial Cidade de Niterói, 1993, op.cit.,
ilustração nº 19.
As quatro subáreas eram formadas por árvores mais baixas e de formas
arredondadas. A este tipo de arte em que os elementos que compõem o jardim são
tratados como figuras geométricas chama-se arte topiária35.
Não foi possível identificar as palavras escritas em cada praça, mas existe a
possibilidade de ter sido planejada na praça central uma fonte com monumentos em
seu entorno.
34
DICIONÁRIO Ilustrado de Arquitetura. ALBERNAZ, Maria Paula; LIMA, Cecília Modesto. São Paulo:
ProEditores, 1997/1998. p. 183. Il. v 1. Cornija: Moldura ou conjunto de molduras salientes que servem de
arremate superior a elementos arquitetônicos ou ao edifício. Quando se constitui em arremate do edifício situa-se
no alto ou no meio da fachada e tem como função principal desviar as águas pluviais que descem pelo telhado
das paredes externas. Foi muito usada, feita de pedra ou madeira, nos prédios notáveis da Arquitetura Colonial.
Foi também muito empregada em fachadas de prédios ecléticos. Principalmente quando situada no alto de
paredes externas ou de portas e janelas, é também chamada cimalha.
35
DICIONÁRIO Novo Aurélio. CD ROM. Topiária: Arte de adornar os jardins dando a uma planta ou a grupos de
plantas configurações diversas.
66
Figura 14: Detalhe da Praça central do Passeio da Memória.
Fonte: José Antônio Soares de Souza, Da Vila Real da Praia Grande à Imperial Cidade de Niterói, 1993, op.cit.,
ilustração nº 19.
O projeto do Passeio da Memória apontado como o mais notável do plano
não foi construído. Restou da área que correspondia ao antigo passeio público,
aproximadamente a quinta parte do projeto original. Na instalação da Vila, em parte
do terreno, se ergueu o Pelourinho, instrumento da justiça municipal para punir os
criminosos ou a forca para os condenados a morte.
67
A figura abaixo representa o local onde o Pelourinho foi erguido, conhecido
como Largo do Capim.
Figura 15: Largo do Capim.
Fonte: Antonio Figueira de Almeida, História de Niteroy, 1935, p.88.
Os últimos, a serem torturados na Vila Real da Praia Grande, foram três
escravos por terem matado o seu feitor nos três pelourinhos existentes no Largo do
Capim. (MIRANDA, 1904, p.1).
Na outra parte do terreno conhecido por Largo da Memória passaram a ser
realizadas as comemorações cívicas da cidade. Como já foi mencionado, o
retalhamento do terreno foi causado pelo uso indevido das terras pela Câmara. Fato
que levou a proprietária mover uma ação judicial contra a Câmara, concluída em
1845, quando ela já era falecida. Sua filha Maria Bessa casada com o Capitão Mor
Gabriel Alves Carneiro finalmente doou essas terras recebendo o agradecimento
formal do Presidente da Província Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho e da
Câmara Municipal pelo gesto em prol do Município.
O terreno original foi utilizado como servidão pública, enquanto aguardava a
finalização do processo. Durante este período, abriram-se ruas, construíram-se
casas diminuindo consideravelmente as dimensões do terreno da antiga proprietária.
68
A figura, a seguir, mostra os dois largos resultantes do retalhamento das
terras de D. Elena. A maior área ficou conhecida por Largo da Memória e a menor
por Largo do Capim, originalmente denominado Praça do Pelourinho.
Largo do Capim
Figura 16: Os dois largos: o do Capim e o da Memória.
Fonte: Antonio Figueira de Almeida, História de Niteroy, 1935, p.72.
Largo da Memória
69
Aproximadamente em 1840, o Capitão mor Gabriel Alves Carneiro autorizou a
construção de um trecho de casas entre esses dois largos, denominada de travessa
do Pelourinho atual Travessa Alberto Victor e antigo Beco da Tapioca. (MIRANDA,
1904, p.1).
Quando se finalizou o processo, com a carta de sesmaria do índio Araribóia, a
Câmara deixou claro que a praça em questão, por ocupar a área da sesmaria
indígena, não pagaria nenhum tipo de indenização por não existirem benfeitorias,
conforme os grifos no texto abaixo:
... “em vista da carta de sesmaria do índio Martim Affonso, em remuneração
dos seus serviços feitos por occasião da expulsão dos Francezes...
reconheço este que a praca em questão está em terras da dita sesmaria na
qual foram estabelecidas condições de prestar logradouros públicos etc...
não há lugar indemnizacão alguma, por não existirem ali benfeitorias. E
achando se em iguaes circunstancias a praça do pelourinho (Capim) tem
deliberado dasapropriá-la também na forma estabelecida para a da
Memória”. (MIRANDA, Francisco Rodrigues de. Memória a D. João VI. O
Fluminense, Niterói, 07 setembro 1904. n.5667). Grifos da autora.
Nesta ocasião foi lançada à pedra fundamental, em 19 de novembro de 1845,
para a construção de um monumento que recordasse o dia em que o Rei de
Portugal chegou à Vila, planejado pelo engenheiro militar Egídio José de Lorena e
inaugurado em 30 de abril de 1847.
O monumento consistia de uma coluna de granito ranhurado que se apoiava
em uma base octogonal de onde saiam 4 torneiras de bronze, conjunto inserido em
uma grande bacia de pedra.
No dia 30 de abril de 1847 o Imperador Pedro II inaugurou o chafariz
monumento na presença da Imperatriz, Príncipes, e outras autoridades. As quatro
bicas de bronze que faziam parte do monumento foram colocadas depois. Apenas
inaugurou-se a coluna de granito36 com duas inscrições, lavradas em “Cartelas de
Mármore”. (FORTE, 1975, p.44).
36
Secretaria de Educação e Cultura, O Fluminense, Niterói em três tempos 19 jan. 1974.
70
Figura 17: Coluna da Memória.
Fonte: Foto da autora, 23/3/2005.
71
A primeira cartela se referia a homenagem a D. João VI.
El Rey Dom João 6º
De Saudosa Memória
Deu neste lugar beija-mão
Quando honrou esta cidade
Então simples arraial
No dia 13 de Maio
De
1816
Figura 18: Placa de homenagem à Dom João VI.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006.
72
A segunda cartela tinha a inscrição comemorativa de inauguração do
monumento.
Em utilidade pública
E para eternizar o fato que deu nome a esta praça
Mandou o Imperador
O Senhor Dom Pedro II
Construir este chafariz
Sendo Presidente da Província
O Senador
Aureliano de S e O. Coutinho
1847
Figura 19: Placa comemorativa de inauguração do monumento.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006.
73
Apesar das boas intenções, o Largo da Memória nunca foi ajardinado, a
construção do monumento-chafariz além de memorial para D. João VI foi uma forma
encontrada pelo presidente da província Aureliano de Souza e Oliveira de construir
chafarizes nas principais praças para amenizar a falta d’água da cidade. (SOARES,
1992, p.64).
Devido a falta d’água, o chafariz do Largo da Memória atraiu diversas
lavadeiras, que fizeram do local uma área para lavar e secar roupas. Este uso atraiu
diversas aves domésticas e cabruns da vizinhança, além de ser utilizado para matar
a sede de animais que por ali circulavam. No ano de 1872 a fonte secou, voltando a
funcionar 20 anos mais tarde, com o sistema de abastecimento regularizado. A partir
de 1912, o chafariz passou a não servir para nada restando apenas o monumento.
Quando se dividiu a área do passeio público em dois largos: o da “Memória” e
o do “Capim”, para a Câmara o nome “Largo da Memória” deveria estar relacionado
com a sua fundação. O vereador José Carlos da Costa Velho propôs a Câmara
Municipal no dia 5 de novembro de 1889, que o Largo da Memória, como era
conhecido, passasse a se chamar de “Praça Tenente Coronel José Alves Carneiro”,
para homenagear o neto de D. Elena Casimira, filho do capitão mor “Gabriel”, uma
denominação que não pegou, continuando ser chamado Largo da Memória.
Uma segunda proposta, para ser denominada Praça General Gomes
Carneiro, foi feita em 14 de maio de 1897, pelo vereador Julio Timbau e aprovada
pela Câmara. O nome homenageava o herói do cerco da Lapa, durante a Revolta
Federalista. Para o povo esta mudança de nome não teve nenhum significado,
permanecendo Largo da Memória. (SOARES, 1986, p.1).
O Largo do Capim, conhecida também como Praça do Pelourinho, depois
passou a se chamar de Praça Santo Alexandre, área onde se construiu o primeiro
prédio da Prefeitura da Cidade de Niterói (1910) chamado de Palácio Araribóia
(1973).
74
3.2 - O LARGO DA MEMÓRIA NA GESTÃO DE PAULO ALVES – 1903.
Com a Revolta da Armada37 em 1893, período que antecedeu a gestão do
prefeito Paulo Alves, Niterói sofreu um processo de deterioração do seu espaço
público. Completamente destruída, tornou se necessário, na nova República, que a
sede do Governo passasse de Niterói, para a cidade de Petrópolis. Em 30 de janeiro
de 1894, em caráter provisório, a transferência tornou-se definitiva em 1º de outubro
do mesmo ano para que se preservasse a integridade da população, numa cidade
totalmente destruída.
Para o historiador fluminense Luiz Palmier, a revolta de 1893 foi muito
desastrosa para a cidade. Monumentos foram destruídos, milhares de mortos e
feridos que provocaram o deslocamento de diversas famílias para cidades próximas
ou zonas rurais em conseqüência da guerra civil. (SILVA, 1995, p.19).
Quando se criou as prefeituras municipais pela lei n.624 de 1903 tornou-se
possível realizar uma administração mais direcionada para os principais problemas
das cidades. Nilo Peçanha, eleito Presidente do Estado em 1903, transfere a capital
novamente para Niterói, em assembléia de 04 de agosto de 1902 escolhendo como
primeiro Prefeito de Niterói, o Dr. Paulo Alves, que tomou posse em 5 de janeiro
1904.
O critério adotado por Nilo Peçanha na escolha do prefeito foi eminentemente
técnico, buscou um engenheiro e empresário que estivesse ligado aos setores
financeiros do país.
A intenção do prefeito Paulo Alves e seu sucessor Pereira Ferraz (assumiu
em 31 de 1906 e ficou até 1910) era dar continuidade, ampliar o plano de
urbanização iniciado por José Clemente Pereira, construir novas e amplas avenidas,
reformar parques e investir no embelezamento das praias.
37
ENCICLOPÉDIA, Brasileira. Disponível em: http // br.geocities.com/vinicrashbr. Acesso em 2 fev. 2008.
Revolta da armada. Rebelião provida por algumas unidades da Marinha Brasileira contra o governo de Floriano
Peixoto. Começa no Rio de Janeiro em setembro de 1893, estende-se à Região Sul e prolonga-se até março de
1894. Com a renúncia de Deodoro da Fonseca à Presidência da República em 23 de novembro de 1891,
passados nove meses de governo, o vice presidente Floriano Peixoto assume o cargo. A Constituição, no
entanto, prevê nova eleição caso a Presidência ou vice presidência ficassem vagas antes de decorridos dois
anos de mandato. A oposição acusa Floriano de manter-se ilegalmente à frente da Nação. Em 6 de setembro de
1893, um grupo de altos oficiais da Marinha exige a imediata convocação dos eleitores para a escolha dos
governantes.
75
Frente a uma grande massa popular, a solenidade de posse do Presidente do
Estado Nilo Peçanha se deu na Praça General Gomes Carneiro, frente ao edifício do
Tribunal da Relação. (MIRANDA, 1904, p.2).
Paulo Alves, nomeado em 04 de janeiro de 1904, tomou posse no Salão
Nobre da Câmara Municipal, local onde a prefeitura funcionou em caráter provisório
durante 06 anos. (SOARES, 1992, p.25).
O novo prefeito determina como principal prioridade a construção de esgoto
sanitário, calçamento e arborização de ruas. Seu planejamento para a cidade foi
muito audacioso, indo contra aos interesses das elites da cidade. Estes projetos
gerariam um endividamento irreversível para o município, já que para executá-los
era necessário recorrer a empréstimos estrangeiros.
A urbanização da cidade e o embelezamento eram os principais objetivos a
serem executados em sua gestão devido a poucas transformações ocorridas na
cidade durante o período Imperial, apesar de ter recebido o título de Cidade Imperial
pelo decreto n.93 de 22 de agosto de 1841.
A cidade até 1904 conservava seu aspecto colonial e não se via nenhum tipo
de melhorias no espaço urbano. A rede de esgotos não estava concluída, a água
potável não era suficiente para abastecer a cidade, as ruas necessitavam de
calçamentos modernos, ou seja, não se via nenhum sinal de progresso na cidade.
No seu discurso, o prefeito tentou sensibilizar os municípios a atribuírem
importância ao turismo e à ecologia. Quanto às obras públicas idealizou uma larga
avenida ao longo da Praia de Icaraí, que na época tinha estes terrenos como fundos
de quintal dos palacetes das chácaras da Moreira César. Esta avenida prosseguia
até São Francisco; e daí alcançava as praias oceânicas, através do prolongamento
da Estrada da Cachoeira. Foram planejadas para esta avenida a construção de
hotéis, praças, quadras de esporte, cassinos, dentre outras obras.
A novidade de Paulo Alves desagradou a alguns contribuintes da cidade,
quando cometeu a imprudência de tocar em assuntos delicados e comprometeu seu
trabalho na prefeitura.
Para executar as propostas de melhoramentos, o prefeito teria que contrair
um empréstimo, criar novos impostos, além de pedir a colaboração dos proprietários
das fábricas na construção de vilas residenciais que poriam fim aos cortiços da
cidade, fato que desagradou aos industriais e aos proprietários urbanos que
76
exploravam e obtinham altos lucros com estas habitações coletivas, que viviam em
condições insalubres.
Em 8 de janeiro de 1904, O jornal O Fluminense, criticou as preocupações do
prefeito com o seguinte comentário...
“...verdadeiras arapucas armadas constantemente ao sossego de milhares
de habitantes. Além do perigo iminente em que se vê toda essa pobre gente
que neles mora, faz nos eles uma impressão de miséria e desasseio que
contrista”.
“Alguns desses casebres, sem a menor condição de higiene, de arquitetura
e de segurança para os seus moradores, existem entre nós desde que os
índios de São Lourenço deliberaram fazer construções em seu aldeamento,
que era toda esta cidade”. (MIRANDA, 1904. p.1). Grifos da autora.
As possibilidades do prefeito por em prática suas propostas foram poucas.
Por ter caído no desagrado dos empresários e dos moradores, somado a falta de
verbas, teve o seu trabalho dificultado na prefeitura.
A intenção do prefeito Paulo Alves era tornar os melhoramentos propostos
como base para as gestões seguintes. (FORTE, 1973, p.196).
As boas intenções do prefeito não foram suficientes para que ele tivesse êxito
no cargo que ocupava. Sua administração era questionada constantemente pelo
jornal “O Fluminense“, órgão vinculado ao comércio, cujo fundador, proprietário e
diretor foi o Sr. Francisco Rodrigues de Miranda, o maior crítico de Paulo Alves.
Em uma das críticas, sob o título de Leviandade Administrativa, o artigo
refere-se ao prefeito como uma marionete, dizendo que Nilo Peçanha governava por
intermédio de Paulo Alves. Num de seus textos comentava: “A que fica reduzida
então a figura do Prefeito. A um mero autômato ou joguete de que se serve o
presidente, sempre que quer para servir ou vexar o povo”. (MIRANDA, 1904, p.1).
Em Leviandade Administrativa II, a demissão de um advogado da prefeitura
para ser substituído por um amigo de Nilo Peçanha, foi à causa da indignação do
redator do jornal, reproduzida nestas palavras, “...não nos é dado comprhender que
o Dr. Nilo Peçanha tenha exigido, em forma de ultimatum, a demissão do advogado
da prefeitura para substituí-lo por amigo seu...”
77
Através das críticas foi possível ter idéia de como se encontrava a cidade de
Niterói em 1904. A erradicação da insalubridade e as obras de infra - estrutura eram
fundamentais para a organização do espaço urbano.
Vemos a cidade cheia de casas sujas, passeios sem calçamento, terrenos
não murados, sarjetas imundas, muros fora do alinhamento, animais
vagando pelas vias públicas, enfim tudo quase no mesmo pé em que
estava, e nem uma multa, nem uma palavra, nem mais nada por parte da
prefeitura. (MIRANDA 1904, p. 2).
Em meio a tantas denúncias o Largo da Memória também foi o alvo das
atenções do mesmo redator publicando em 10 de julho de 1904, sob o título “A
Memória” uma crítica quanto ao estado de abandono e sujeira em que se encontrava
o Largo.
“A Memória”
"Passando ha dias pelo largo da memória que afinal mereceu o favor de
uma capina, observei que o monumento que recorda o beija mão de D.
João VI e seus súbditos da Praia Grande estava transformada em latrina
pública e dele haviam arrancado a placa de bronze comemorativa daquela
real visita. Que mão criminosa arrancaria essa prova histórica, essa
explicação do monumento, esse sinal evidente de que muito temos
avançado na cultura do espírito pela avenida larga da liberdade...
...Quando, inflamado no amor pátrio Tomas Ribeiro fundiu em bronze os
versos de Dom Jayme contra a Ibérica, exclamou em sublime peroração:
Que mais querem de nós, após tamanha galhardia de algoz Ébrios da
Glória. Apagarão acaso a luz da história. Não lêem seus efeitos. Que nos
quer a Hespanha”. (MIRANDA, 1904, p.1).
Este artigo nos mostra a relação que o Largo de Memória tinha com a
chegada de D. João VI à Praia Grande, adquirida a partir de sua 1ª visita à região. O
beija-mão, a revista às tropas e o aniversário do príncipe se tornaram parte
integrante do dia 13 de maio, data memorável para os que testemunharam este dia.
A nova aparência do Largo e o mau cheiro causaram uma indignação incompatível
com a memória do lugar. Uma história que jamais poderia ser esquecida.
No Largo da Memória também se comemorou o dia 07 de setembro de
1904...
78
“às cinco horas da manhã foi tocada a alvorada junto ao monumento
chafariz a memória de Dom João VI. Descoberto o monumento “às duas
horas da tarde e quinze minutos da tarde” pelos senhores Doutor Nilo
Peçanha Presidente do Estado e o Comendador Camello Lampreia não
foram cantados os hinos da Independência e o da República devido uma
forte chuva cair na cidade por toda a manhã, dando continuidade a
comemoração no teatro João Caetano”. (MIRANDA 1904, p.1).
Para este largo, Paulo Alves reservou a restauração do monumento à
Memória de D. João VI. Esta foi uma das obras que o prefeito conseguiu concluir na
sua gestão. O responsável pela restauração foi o arquiteto e escultor Ludovico
Berna convidado para remodelar a praça, nivelar e limpá-la.
A reinauguração foi programada para o dia 7 de setembro deste mesmo ano,
pelo governador Nilo Peçanha que realizou a sessão cívica no teatro Municipal, se
prestando as homenagens à D. João VI.
Acrescentou-se a coluna, “um medalhão de bronze com o busto perfil de D.
João VI, em uma das faces e em outra em baixo relevo, um tacape, um arco, uma
flecha, e colares de dentes símbolo do Brasil – Colônia”. (FORTE, 1973, p.82). Nas
outras faces apareciam as datas de 1500, 1822 e 15 de novembro de 1889 que
indicavam o período Colonial, Império e República. Na base retangular foi colocada
uma placa de bronze, contendo a seguinte inscrição, que desapareceu.
“Interpretando a justiça soberana da República, a Prefeitura Municipal mandou
restaurar este monumento, sendo presidente do Estado o Dr. Nilo Peçanha, em 7 de
setembro. 1904.” (MIRANDA, 1904, p.1).
Após estas comemorações, o medalhão de D. João VI foi danificado pela
oposição, recolhido e guardado pela Prefeitura para que não houvesse maiores
danos. Desta reforma só restaram 8 lampiões a gás que cercaram o monumento.
Segundo o jornal “O Fluminense” a população estava contra o prefeito Paulo Alves,
fazendo com que o largo caísse novamente no abandono.
“A festa do Largo da Memória idealizada pelo prefeito para
deslumbrar os povos foi, como é geralmente sabido, um verdadeiro fiasco.
A própria natureza vexou-se diante de tanta cousa ridícula e protestou,
fazendo cahir abundante chuva nos 2 domingos marcados para a ridícula
funeconata. O fogo de artifício ante hontem queimado foi mais uma prova
da enfermidade de que se acha accommetido o homem das avenidas. Viam
se pecas allegoricas com os dísticos-Viva o Dr. Paulo Alves e cousas
semelhantes, isto é, engrossamento ao prefeito, feito pela própria prefeitura!
79
Como nota digna de registro o Sr. Paulo Alves arranjou um ensaio de
cordão carnavalesco em volta do monumento! Monumental a nossa
Prefeitura”. (MIRANDA, 1904, p.1).
A possibilidade da prefeitura adquirir um empréstimo para a execução das
obras foi divulgada a população na publicação de 18 de setembro. Segundo a
Câmara, o empréstimo só seria possível caso as verbas fossem utilizadas em
melhoramentos materiais da cidade. Quanto à criação de impostos deveria ser
decretado por meio de posturas, o que não era aceito pela Câmara.
“A deliberação n.9 autorizando o prefeito a contrahir um empréstimo até a
quantia de 5.000:000$000, cujo producto líquido será exclusivamente
applicado aos melhoramentos materiaes da cidade e na ordem indicada, é
opposta ao art. 42, parágrafo único da lei estadual de 18 de novembro de
1903. De facto, não sendo o empréstimo destinado a obras de saneamento,
abastecimento de água, construção de esgotos e de estradas e iluminação
pública – únicas taxativamente mencionadas na lei, como capazes de
legitimar a autorização concedida, no limite marcado – é claro que é
manifestamente illegal, por ser a sua importância muito superior á metade
das rendas municipais, calculada pela lei, do orçamento vigente, em
335:000$000. As obras a que tem de ser apllicado o producto do
empréstimo, não sendo das comprehendidas na excepção da lei, cabem na
sua regra e esta só permite o empréstimo não excedente à metade das
rendas municipaes. A deliberação n.10, contendo diversas autorizações ao
prefeito, é nulla, por contraria a Constituição da União, a reforma
Constitucional do Estado e as suas leis. Essa nullidade afecta a
mencionada deliberação na sua forma e no seu fundo. É, assim, que por
elle são creados diversos impostos, quando, pela lei n.624. A, art. 51, a
creação de impostos só pode ser decretada por meio de posturas e não de
deliberações, consoante á destinação estabelecida, pelo art.27 dessa lei
quanto a forma porque as câmaras exercerão as suas atribuições
legislativas ou deliberativas”.(MIRANDA, 1904, p.1).
Impossibilitado de executar suas propostas, dificultado pela Câmara, sua
gestão durou 10 meses. No dia 22 de outubro de 1904, o jornal “O Fluminense”
publicou o abandono do cargo do prefeito Paulo Alves. Neste mesmo dia, no artigo
“Festas e porcarias”, o redator critica o estado de abandono do Largo da Memória e
das ruas da cidade.
80
“...hoje um bem conservado capinzal capaz de provocar as ambições de
qualquer lavadeira, desejosa de commodo coradouro de roupas branca. As
ruas da cidade, ladeadas quase todas de mal cheirosas sarjetas não
consentem que o transeunte abandone o lenço, a menos que deseje
envenenar os pulmões com as emanações que dali se desprendem”.
(MIRANDA, 1904, p.1).
Mediante os acontecimentos, o prefeito Paulo Alves, ao deixar a Prefeitura,
apresentou ao seu sucessor um memorial, em que se referiu a D. João VI quando
chegou à Praia Grande.
“Só D. João VI... distinguiu e criou esta Cidade, fazendo dela sua estância
de verão, o seu retiro e a sua estação de banhos. Fez paradas e revistas
deu festas, levantou a terra e animou o povo em cujo seio passava os dias
destinados ao repouso e recreio. Foi um amigo e um protetor deste então
modesto arraial da Praia Grande. Fez construir aqui duas vivendas, uma
das quais ainda existe em ruínas, no bairro de São Domingos. Por tudo
isso, a gratidão popular levantou em 1847, no largo que, por tal motivo,
passou a denominar-se de Memória, uma modesta coluna de granito,
montada por utilidade pública, como reza a lápide, sobre bebedouro do
costume de então. O deplorável abandono em que encontrei esse
monumento cujos arredores eram um vasto vazadouro de imundícies e cujo
antigo bebedouro servia (permita-se-me o termo) de cloaca, era o mais
esmagador libelo do desamor criminoso da Cidade a memória dos seus
maiores.Pois bem, o monumento agora está limpo, ajardinado e iluminado.
Quatro novas placas de mármore com dizeres em bronze foram colocadas.
A inspiração de Benevenuto Berna devem-se os belos medalhões contendo
o busto do saudoso amigo da Cidade e a alegoria ao período selvagem do
Brasil, que ornamentam hoje as duas faces da coluna, até então
desguarnecidas; tudo simples e modesto é certo, mas digno e sincero. Não
estará, ainda sim, justificada a comemoração ou a festa, como dizem por
aí”? (FORTE, 1973, p.83).
Este memorial nos mostra a importância que o Largo da Memória adquiriu por
conta de sua história. Esta benfeitoria foi à única iniciada e concluída na Gestão de
Paulo Alves.
No final do governo de Nilo Peçanha (1903-1906), Niterói permanecia com a
aparência do período do Império, segundo o periodista. O Prefeito não conseguiu
por em prática a proposta de urbanização da cidade, que continuou sem calçamento
e com pouca água. O bonde era puxado a burro, não existia rede de esgotos,
somente fossas e o bairro de Icaraí se localiza no meio de um alagado.
O que se pode tirar de todas estas críticas realizadas por F. R. de Miranda, é
que a cidade todavia se apresentava sem as benfeitorias prometidas. Devido aos
81
fatos relatados, o Dr. Nilo Peçanha concluiu que o apoio do governo seria
fundamental para a remodelação da cidade.
A cidade de Niterói estava “amarrada impiedosamente a uma rotina de anos e
anos, afogada na lama e no lixo, pasto público de galinhas e porcos, na deprimente
decoração de coradouros e tinas de barrelas38 nas suas praças e ruas”! As idéias e
propostas de Paulo Alves serviram apenas de base para as administrações futuras.
(FORTE, 1973, p.137).
Depois disso, no ano de 1907, na gestão do prefeito João Pereira Ferraz,
reservou-se para o Largo da Memória o cercamento e calçamento com meio fio de
cimento.
3.3 - O LARGO DA MEMÓRIA NA GESTÃO DE FELICIANO SODRÉ – 1913.
Quando o presidente Alfredo Backer assumiu em 1906, as mudanças
começaram chegar à cidade. Eleito com o apoio de Nilo Peçanha, de
representatividade nacional, Backer se colocava numa condição especial, capaz de
elevar a cidade como um dos municípios importantes do país. A capital procurando
seguir os passos da modernidade que a cidade do Rio de Janeiro começou a
adquirir com a reforma do Prefeito Pereira Passos (1906), iniciou grandes obras de
remodelação e embelezamento que se realizaram na administração do Prefeito João
Pereira Ferraz (1906 - 1910), com o apoio do governo do estado.
Os planos reiteravam projetos para a antiga Praia Grande, com a abertura de
largas avenidas, amplas e belas praças, cais às margens das praias, luz elétrica nas
ruas e casas, ampliação dos serviços de água para os moradores, esgoto tratado,
edifícios mais imponentes, uma estação balneária (sonho do ex-prefeito Paulo
Alves), sistema de telefonia para facilitar a comunicação com os vizinhos,
estabelecendo prioridade para as obras de saneamento da cidade.
38
Dicionário Novo Aurélio, século XXI-CD ROM. Barrelas: Água onde se ferve cinza e que é usada para
branquear roupa.
82
Pouco a pouco, a cidade de Niterói foi transformando seu espaço urbano em
um ambiente mais organizado e moderno. As praças urbanizadas deram um novo
aspecto à cidade.
Dentre os melhoramentos introduzidos, podemos destacar a urbanização do
Campo de São Bento, área alagadiça que se transformou num parque de pequena
dimensão, inaugurado em 1910, com o nome do Prefeito Pereira Ferraz. Urbanizouse a Praia de Icaraí, criou-se o jardim de Gragoatá, o Largo do Capim, onde foi
construída a primeira sede da Prefeitura e a Alameda São Boaventura, com a
abertura do canal central.
Com a nomeação de Feliciano Sodré (1910-1914) as transformações
urbanísticas da cidade de Niterói se intensificaram. Nomeado para prefeito a convite
do Presidente de Estado Oliveira Botelho, sucessor do Presidente Alfredo Backer,
sua gestão foi baseada em duas vertentes: a primeira na urbanização geral da
cidade e a segunda nas obras de saneamento, dando continuidade as
transformações urbanística que a cidade de Niterói iniciou com o estatuto de capital.
Feliciano Sodré investiu na arborização das praças de menor porte, como a
Leoni Ramos, Nilo Peçanha, Pereira Nunes, Jardim do Ingá e Martim Afonso de
Souza. As ruas foram intensamente arborizadas, fizeram os gramados da Alameda
São Boaventura e da Praia de Icaraí.
Aterrou-se a Enseada de São Lourenço, construiu-se o Porto de Niterói e
foram abertas amplas avenidas nesta nova área urbanizada, o Teatro Municipal foi
reformado e nesta administração o Largo da Memória sofreu a primeira intervenção
significativa desde o seu primeiro projeto no século XIX. Para o prefeito, a
reconstrução do Passeio da Memória foi inevitável. O projeto, que não saiu do papel
em 1820, representava um marco importante para a memória da cidade.
Através de um novo projeto e em menor escala, os moradores recuperariam
um espaço para o convívio. Este projeto resgataria a qualidade do ar, eliminaria as
áreas alagadiças e seria um local para passeios, lazer, descanso, comemorações
cívicas, carnaval e recebeu também um Rink de patinação, que deu um novo uso à
praça.
Sua intenção era resgatar a Praça General Gomes Carneiro e transformá-la
em um passeio público, planejado no Primeiro Plano de Edificação da Vila Real da
Praia Grande.
83
Para dar início as obras de remodelação projetadas, foram necessários
recursos que exigiram um pedido de empréstimo. No dia 29 de setembro de 1912, o
jornal “O fluminense” publicou uma nota dando por concretizado o pedido feito a
Londres, no valor de 75 mil contos, destinado aos planos de melhoramentos da
prefeitura.
As verbas seriam destinadas ao aterramento do mangue de São Lourenço
que o transformaria numa nova cidade jardim, com a construção de prédios
administrativos e obras de saneamento. Ruas alargadas e recuperadas e novos
parques que dariam continuidade ao plano iniciado em 1820 pelo juiz de fora, José
Clemente Pereira.
Neste mesmo dia, antes de receber a resposta, sobre a concessão ou não do
empréstimo, a prefeitura anunciou a população que em poucos dias as obras de
saneamento seriam iniciadas. (MIRANDA, 1912, p.1).
Uma quantia tão elevada seria difícil de conseguir, além de que altos juros
seriam pagos para dar a população às condições mínimas necessárias para uma
vida digna e saudável.
84
Figura 20: O Largo da Memória e a Prefeitura.
Fonte: O Fluminense, 30. dez. 1913.
85
Em 04 de outubro de 1912, no artigo “O Empréstimo Periga” O Fluminense
publica os telegramas recebidos de Londres.
Figura 21: Resposta ao pedido de empréstimo.
Fonte: Jornal “O Fluminense”, 4 out. 1912.
86
Londres 2
“Os jornaes desta capital occupam-se largamente do empréstimo para o
Estado do Rio que acaba de ser lançado na City. A “Westminster Gazette”
diz que as informações officiaes relativas ao resultado da operação ainda
não são conhecidas do público nem talvez o sejam tão depressa. Observa,
porém, a Gazette, que é muito provável que os subscriptores sejam
obrigados a tomar três quartos do empréstimo e concluindo, attribue a falta
de apoio ao público a varias causas, especialmente a inquietação que se
nota nos centros financeiros por causa da crise balkanica. O Evening
Santard julga que o total do empréstimo é muito elevado e que obrigará os
subscriptores a tomar oitenta e cinco por cento e o Financial Time diz que a
rapidez com que foram encerradas as listas para o empréstimo implica num
revés para os emissores, o que ninguém deve extranhar visto as atenções
estarem neste momento todas voltadas para os lados dos “Balkans”.
Concluindo as suas apreciações o “Evening Santard” , diz que a opinião nos
centros da bolsa era inteiramente favorável ao empréstimo e assegura que
com algum cuidado não será diffícil attrahir de novo o interesse do público
para a operação”. (MIRANDA,1912, p.1).
Londres 1
“As listas da subscripção do empréstimo do estado do Rio de Janeiro foram
muito bem recebidos na “City”, mas a actual situação política européia
desorientou os mercados financeiros, de modo que se deu uma depressaão
na bolsa e os subscriptores públicos do empréstimo não foram muito
numerosos. Os títulos do empréstimo estão sendo cotados com um
pequeno desconto. É provável que os banqueiros garantidores fiquem com
cinqüenta por cento do empréstimo”. (MIRANDA,1912, p.1).
O empréstimo seria destinado à construção dos Edifícios da Assembléia,
Palácio do Governo, Tribunal de Justiça, Chefatura de Polícia, Teatro Municipal e a
Escola Normal no Largo da Memória. Em meados de 1913, se desistiu destas
construções no Largo, devido a possibilidade de aquisição de terrenos do Campo
Sujo permitindo dar seguimento ao projeto de reurbanização e embelezamento do
passeio público.
Com a liberação do empréstimo foi possível realizar a reforma da Praça
General Gomes Carneiro (antigo Largo da Memória), a única iniciada e concluída
durante a gestão de Feliciano Sodré. Como Governador, 10 anos depois, Sodré
concretiza a urbanização do aterrado São Lourenço e os prédios administrativos que
ocupariam o entorno da praça foram construído no Campo Sujo 39. Este era um local
39
Campo Sujo: área insalubre da Cidade de Niterói, onde se despejavam o lixo da cidade, neste local construiuse o centro do poder, atual Praça da República.
87
de despejo de dejetos das residências, que eram recolhidos e transportados por
escravos em barris, constituindo uma área pantanosa e insalubre da cidade. Este
local foi desapropriado para que fosse erguido o centro do poder, denominado de
Praça da República.
3.3.1 - O Novo Projeto para o Largo da Memória.
A reforma do Largo da Memória foi vital para a carreira política do prefeito
Feliciano Sodré. O novo projeto transformou a então denominada Praça General
Gomes Carneiro, em um parque ajardinado e construiu-se o passeio público,
idealizado no Plano de Edificação da Vila Real da Praia Grande.
Para dar início a transformação deste espaço se contratou o escultor
Modestino Kanto para restaurar o monumento da Memória. Nesta reforma, se
retornaram as cartelas de 1847, o medalhão de D. João VI e foi acrescentado mais
um de D. Pedro II, fixando-se duas placas novas na base da coluna fazendo o
registro da reforma da praça.
“Este jardim foi construído pela prefeitura e inaugurado em 31 de dezembro
de 1913, sendo presidente do Estado o Dr. Francisco Chaves de Oliveira
Botelho e Prefeito Municipal o primeiro Tenente Engenheiro Militar Feliciano
Pires de Abreu Sodré Junior”... A segunda referia-se à remodelação do
monumento: “Este monumento foi inaugurado pela prefeitura no ano de
1913, sendo presidente do Estado o Doutor Francisco Chaves de Oliveira
Botelho e Prefeito Municipal o primeiro tenente engenheiro militar Feliciano
Pires de Abreu Sodré Junior. No centenário da criação da Vila, em 1919,
cobriu-se a última face do pedestal com mais uma placa: 1819-1919. O
povo de Niterói, comemorando o primeiro centenário da Vila Real da Praia
Grande, mandou colocar esta placa, sendo presidente do Estado o Dr. Raul
de Morais Veiga e Prefeito Municipal o Dr. Enéas de Castro”. (SOARES,
1992, p.66).
88
Figura 22: Medalhão de Dom João VI-1913.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006.
89
Nesta reforma, a praça, foi cercada e calçada, construíram-se uma fonte
artística, uma pista de patinação, um ginásio próprio para os bailes públicos e foram
recolocadas as placas de mármore que tinham sido guardadas em 1847.
Para as festas populares e as comemorações cívicas, que eram realizadas no
local, se construíram os coretos, que foram num total de quatro, posicionados em
cada vértice da praça.
Figura 23: Coreto – 1913.
Fonte: Centenário da Independência do Brasil – 1922.
90
Figura 24: Fonte-1913.
Fonte: Centenário da Independência do Brasil-1922.
Para dar um ar clássico, foram colocadas esculturas simbolizando deusas,
grandes vasos de flores e leões.
Figura 25: Aspecto do jardim em 1913.
Fonte: Centenário da Independência do Brasil-1922.
91
Figura 26: Leão.
Fonte: Foto da autora, 26/7/2006.
Foi inserido no passeio, um grupo de quatro estátuas e em frente a cada uma
delas havia um banco, ambos feito de mármore, criado pelo escultor Modestino
Kanto40. Os bancos já não existem mais, apenas as alegorias, que representam as
quatro estações do ano: primavera, verão, outono e inverno, localizadas nos jardins
da Praça General Gomes Carneiro.
40
Disponível em: http://www.alerj.rj.gov.br/memoria/cd/bios/mkanto.html. Acesso em: 15 jan. 2008. Modestino
Kanto (1889-1967): Nasceu em Campos de Goitacazes, na Estado do Rio de Janeiro. Ingressou na Escola de
Belas Artes no ano de 1908. Estudou escultura com Rodolfo Bernadelli e no ateliê de Paul Landowsky (esculpiu
o Cristo Redentor), na França, graças a uma bolsa de estudos adquirida em 1908. Suas principais obras são: o
Monumento de Marechal Deodoro da Fonseca (Praça Paris), e as alegorias da Independência e da República no
Palácio Tiradentes, que trabalhou em parceria com Magalhães.
92
Figura 27: Estátua representativa da estação do ano.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006
Figura 28: Estátua representativa da estação do ano.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006.
93
Em frente a cada estátua havia um banco de mármore.
Figura 29: Estátua representativa da estação do ano.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006.
Figura 30: Estátua representativa da estação do ano.
Fonte: Foto da autora, 29/4/2006.
94
O jornal “O Fluminense” publicou em 28 de dezembro de 1913, uma crítica
relacionada ao gasto de grandes somas em dinheiro, nas obras do “parque do Largo
da Memória”. Segundo o que suas palavras diziam, “esse parque que em
extravagância ultrapassa a tudo o que se possa conceber de mais extravagante”.
Visto como uma obra dispendiosa, para o jornalista, as obras da Praça eram
meramente política, já que Feliciano Sodré pretendia se candidatar a Presidência do
Estado. A obra foi inaugurada no dia de São Silvestre com um concerto da Banda de
Música do 58º batalhão de caçadores, Força Militar do Estado e Corpo de
Bombeiros da Cidade de Niterói, sob a regência do maestro Francisco Braga.
Durante os três anos de mandato, a obra do passeio público foi considerada a
mais importante de sua gestão, compreendida nos planos de melhoramentos
materiais da cidade.
O novo passeio público foi comparado pelo “estilista” do Prefeito Feliciano
Sodré a Pompéia, como a cidade que nasceu das cinzas, o que provocou de
imediato as críticas de F. R. de Miranda ao governo, descrevendo como um
desperdício os investimentos utilizados nas obras da Praça.
“O Senhor Sodré entrega, amanhã ao público de Nictherói, a sua mais
importante obra compreendida nos planos de melhoramentos dos materiais
da cidade, como uma espécie de cadean du Rui, o fã célebre Rink da antiga
praça da Memória. Em outra qualquer circunstância, isso seria para nós
todos motivo de justo regosijo, attentos os fins em vista: proporcionar
diversões ao público”....
“O Largo da Memória evocando Pompéia é o que pode haver de mais justo
como simple. Pompéia e o Largo da Memória! Ambas lembram ruínas uma
a de uma cidade que em meio do luxo e da riqueza de seus naturaes ....
soterrada, e o outro a de um município que, sem recursos próprios valendose dos alheios, esbanjou-os em utilidade e loucos desperdícios! Como fui
feliz na comparação, o estilista da prefeitura! Pompéia e o Largo da
Memória. Ambos ruínas, ambos restos de cidade que se viram soterradas
pelas convulções da natureza uma pelos desvairios de seu governo e a
outra!”. (MIRANDA, 1913, p.1).
95
Figura 31: Pompéia e o Largo da Memória.
Fonte: O Fluminense, 30 dez. 1913.
96
A associação do novo passeio público, a Pompéia, não foi pela destruição
nem pelo seu sepultamento. O fato do passeio original não ter sido construído, não
impediu que se construísse um novo projeto.
Durante a realização desta pesquisa, tentou-se localizar as plantas do
passeio público inaugurado em 1913, mas nada foi encontrado. Maurício Monteiro, o
coordenador do Arquivo da Câmara de Niterói que se empenhou e colaborou com a
pesquisa, afirmou não existir nenhum tipo de planta ou documentos referentes a
esta época. Apesar dessas palavras, numa intensa procura nos arquivos não foi
possível localizar o projeto.
Com o material levantado durante a pesquisa, foi possível localizar numa
planta da Praça do Rink, a posição dos elementos que fizeram parte do passeio
público. Este posicionamento foi baseado em imagens conseguidas no Livro
“Centenário da Independência” combinadas com as publicações do jornal “O
Fluminense”.
A delimitação do passeio se dava entre as ruas Almirante Teffé, XV de
Novembro, Aureliano Leal e Dr. Borman. Nesta reforma, o passeio recebeu
calçamento, foi cercada, ornamentada e iluminada com luz elétrica.
97
Rua Dr. Borman
Coreto
Coreto
Alegoria
Chafariz
Alegoria
Coluna da Memória
Leões
Alegoria
Fonte
Leões
Alegoria
Rink de Patinação
Coreto
Rua Almirante Teffé
Figura 32: Localização dos elementos que constituíram o passeio público.
Fonte: Prefeitura Municipal de Niterói, Cadastro Técnico, 7 dez. 2005.
Coreto
98
O ar clássico foi possibilitado pelos monumentos inseridos no parque, como
os “Leões” feitos de pedra, colocados na entrada da Praça pela Rua Aureliano Leal
e XV de Novembro.
Outro elemento que contribuiu com o ar clássico, foi a escultura das quatro
alegorias feitas em mármore, distribuídas duas a duas na praça em cada lateral que
representavam as quatro estações do ano, primavera, verão outono e inverno.
Para a entrada principal, a Rua Almirante Teffé, reservou-se o “Rink de
Patinação”, última moda da Europa, área voltada para o laser dos moradores.
No centro da praça estava a Coluna da Memória-chafariz, simbolizando a
fundação da Vila e a fonte com a escultura de uma deusa. Fonte meramente
decorativa devido ao novo uso da praça.
Os pavilhões de música foram construídos por fora da balaustrada, um em
cada esquina do passeio. Neste local, as bandas de música animavam as festas da
cidade e foi o ponto de encontro de diversos carnavalescos.
Através desta reforma pode–se dizer que o novo espaço público ganhou uma
nova fisionomia, mostrando beleza, organização e elegância dentro do estilo
clássico. Este resultado agradou ao Prefeito Feliciano Sodré, que atingiu o seu
objetivo, concluindo a construção do passeio público idealizado em 1820, em uma
escala menor.
Neste espaço dedicado a memória da Cidade de Niterói, cada detalhe
executado, como o jardim, as árvores, o Rink, o passeio, a fonte, e as estátuas
permitiram que a praça se tornasse um local de permanência, de passeios e de
lazer.
O Rink de patinação atraiu a população jovem que passou a se reunir
diariamente na praça e deu um novo uso ao espaço. Um espaço que, por tradição,
foi o local onde se realizavam as comemorações cívicas e festivas manteve estas
características, podendo ser considerado um marco histórico importante para a
Memória Fluminense. Os longos períodos de abandono e a deterioração do largo,
não foram capazes de apagá-lo da história.
99
Figura 33: Escola de patinação.
Fonte: O Fluminense, 30 dez. 1913.
100
Rink de Patinação
Figura 34: Planta com a localização dos monumentos e do rink de patinação.
Fonte: Prefeitura Municipal de Niterói, Cadastro Técnico, 7 dez. 2005.
101
A praça no carnaval de 1914 reuniu diversos carnavalescos.
Figura 35: Carnaval na Praça General Gomes Carneiro.
Fonte: O Fluminense 22 fev.1914.
102
41
Figura 36: Retretas .
Fonte: O Fluminense, 8 set. 2006.
O passeio se descaracterizou a partir de 1931, devido a retirada das estátuas
de mármore reconduzidas posteriormente. No ano seguinte, os vasos canteiros
devido mal estado de conservação, foram demolidos a pedido do Prefeito Gastão
Braga, mas foi no ano de 1958, que o prefeito Alberto Fortes mandou demolir o Rink
de patinação para construir um terminal rodoviário.
41
Dicionário Novo Aurélio- século XXI. CD ROM. Retreta: Concerto popular de uma banda em praça pública.
103
Figura 37: Praça do Rink-1957.
Fonte: Disponível em: http://www.worldisround.com/articles/60960/photo31.html. Acesso em: 15 jun.2007.
104
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
A visita de D. João VI a povoação de São Domingos foi fundamental para a
transformação da região e deu lugar a reurbanização desse povoado e o da Praia
Grande, objeto do Plano realizado em 1820, por determinação do príncipe regente.
A elevação dos povoados à categoria de Vila concedeu autonomia
administrativa e jurídica, e o plano deu diretrizes para urbanização e indicou a
abertura paulatina de novas ruas, complementadas posteriormente por insipientes
obras de infra-estrutura e saneamento que contribuíram para minimizar a
insalubridade local.
A Vila Real da Praia Grande como foi chamada, foi uma das Vilas brasileiras
contemplada com um Plano Urbanístico de traçado em xadrez, adaptado à
topografia do sítio, recuperando de forma simplificada os princípios renascentistas.
Constava no Plano, o arruamento da Vila, o posicionamento das principais
praças e a construção do Passeio da Memória, tema desta dissertação.
O passeio público foi projetado no local da cerimônia da visita D. João VI à
Praia Grande, evocando esse momento através de sua dimensão monumental para
a época e para a escala do projeto, numa referência simbólica ao poder real.
O projeto do passeio estava referenciado ao paisagismo da escola francesa e
a prática européia de inserir na cidade um local para os passeios e convívio social,
introduzida pela nova elite que passa a adotar novos hábitos.
O Passeio da Memória foi projetado por Arnaud Julien Pallière para ocupar
uma extensa área subdividida em quatro áreas com o mesmo tratamento
paisagístico. A partir do centro, a praça se interligava às outras quatro através de
alamedas, com grande volume de massa vegetal que daria frescor e sombreamento
e ofereceria aos visitantes um agradável local de convívio.
105
A sua dimensão e uso como área pública gerou uma longa demanda jurídica
da parte dos proprietários que impediu sua construção e retardou o saneamento da
área central. O terreno se tornou servidão pública, em que era comum ver animais
circularem livremente, águas estagnadas e lançamento de dejetos residenciais,
fatores que contribuíram para a insalubridade do lugar.
Após a finalização da ação judicial, com a superfície bastante reduzida, no
Largo da Memória foi construído um monumento com chafariz (1847) para amenizar
a falta d’água existente na Vila, referenciando-se a visita de D João VI à Praia
Grande.
Chama a atenção que a partir daí, o Largo da Memória passou a ser criticado
pela Câmara, mais por sua denominação do que por suas características físicas,
recebeu então, diversos nomes, evocando políticos e personalidades locais, o que
não significava novos projetos de intervenção.
Apesar da Vila passar a ter o estatuto de Capital da Província em 1835,
apenas com a consolidação da cidade como capital da República, o antigo Largo da
Memória passa a ser objeto de intervenções mais significativas, obedecendo a um
aproveitamento paisagístico do início do século XX.
Durante a gestão de Paulo Alves (1904), primeiro prefeito da cidade, a praça
foi nivelada, limpa e restaurou-se o monumento da Memória.
No seu entorno, abriram-se ruas que permaneceram inacabadas, uma
questão que preocupava o redator do jornal, “O Fluminense”, Francisco Rodrigues
de Miranda, dentre uma série de críticas relacionadas ao estado de abandono da
cidade.
A partir de 1907, as obras de remodelação da cidade se incrementaram com
o saneamento e ajardinamento de novas praças como o Campo de São Bento,
transformando-o num belo parque, várias ruas foram pavimentadas, construiu-se o
cais de Gragoatá e de Icaraí, dando a cidade um novo patamar de qualidade urbana
com novos espaços para o laser.
Mas foi na gestão de Feliciano Sodré (1913), que o antigo Largo passa a ter
um tratamento urbanístico como passeio público, recuperado sob a diretriz de um
novo
projeto
paisagístico
dentro
de
parâmetros
higienistas,
com
novos
equipamentos de laser (coretos, rink de patinação) e alegorias escultóricas numa
evocação ao período neoclássico do ecletismo.
106
O passeio, mais conhecido atualmente como Praça do Rink, representou nas
primeiras décadas do século XX, um local de referência para as atividades de lazer
da cidade, inclusive como ponto de encontro dos carnavalescos. Perdeu aos poucos
os usos tradicionais, com a retirada da pista de patinação, dos coretos e a sua
utilização temporária como terminal de ônibus. Atualmente, a Praça apresenta
outros usos, resultado de sua apropriação por usuários como os freqüentadores do
clube de sueca e da feira semanal de artesanato, resultado também das
transformações do centro da cidade que perdeu significativamente seu papel de
moradia.
107
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
Documentos reproduzidos.
ARQUIVO DA CÂMARA DE NITERÓI.
Atas e Documentos da Câmara Municipal de Niterói (1819-1865). Transcrição e
comentários de Emmanuel de Macedo Soares. Levantamento realizado na Gestão
do presidente Wolney Trindade. Niterói, em 3 volumes. 1995.
Livros, revistas, textos e recortes de jornais:
BIBLIOTECA ESTADUAL DE NITERÓI.
LUCCOCK, John. Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil. São
Paulo: Empresa gráfica da revista dos tribunais, 1942. 435 p.
Remodelação Rink e Jardim São João têm obra da PMN. O Fluminense, 20 out.
1981. Pasta 4 O (34) 4.
Praça do Rink não terá ônibus de volta e ganhou novas obras. O Fluminense, 23 set.
1981. Pasta 4 O (34) 5.
A Praça do Rink. A tribuna, 7/8 jun. 1981. Pasta 4 O (34) 6.
Rink é história da frustração do administrador. Opção, 7/13 out. 1984. Pasta 4 O (34)
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Rink, uma tradição da cidade, está com brinquedos destruídos. Jornal do Brasil, 3
jun. 1973. Pasta 4 O (34) 9.
República é de estudantes. O Globo, 30 ago. 1992. 4 O (34) 13.
Rei de Portugal esteve lá. Praça do Rink traz história da cidade. O Fluminense, 26
jun. 1993. 4 O (34) 10.
Melhorias para toda a cidade. O Globo, 30 set. 1992. Pasta 4 O (34) 12.
Moradores redescobrem velhos encantos. O Globo, 30 ago. 1992. 4 O (34) 14.
Uma homenagem a D. João VI e água de sobra. O Globo, 13 out. 1996. Pasta 4 O
(34) 15.
108
Niterói em três tempos (XLVII). O Fluminense, 19 jan. 1974. Pasta 4 O (34) 16.
Ambientalistas vão resistir à garagem na Praça do Rink. O Fluminense, 20 set. 1999.
Pasta 4 O (34) 17.
Para o povo, Praça do Rink. O Fluminense, 10/11 out. 2004. Pasta 4 O (34) 19.
BIBLIOTECA NACIONAL (Brasil).
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p 2.
____.Treze de maio. O Fluminense, Niterói, 13 maio 1904. p 1.
____.Leviandade administrativa II. O Fluminense, Niterói, 15 maio 1904. p 1.
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____.A prefeitura quer divertir-se. O Fluminense, Niterói, 8 jun. 1904. p 1.
____.Vacinação antivariólica. O Fluminense, Niterói, 11 jun. 1904. p 2.
____.Planta da cidade. O Fluminense, Niterói, 9 de jul. 1904. p 1.
____.Cousas do prefeito. O Fluminense, Niterói, 10 jul. 1904. p 1.
____.Os festejos de ontem. O Fluminense, Niterói, 8 set. 1904. p 1.
____.Memória a D. João VI. O Fluminense, Niterói, 9 set. 1904. p 1.
____.Carnavalesco. O Fluminense, 13 set.1904. p 1.
____.Hygiene pública e a prefeitura. O Fluminense, 24 set. 1904. p 1.
____.Festas e porcarias. O Fluminense, 22 out. 1904. p 2.
____.A Prefeitura e as boas Intenções. O Fluminense, Niterói, 29 set. 1912. p 1.
____.O empréstimo periga. O Fluminense, Niterói, 4 out. 1912. p 1.
____.Fracasso do empréstimo. O Fluminense, Niterói, 6 out. 1912. p 1.
____.A fundação de Niterói. O Fluminense, Niterói, 22 nov. 1912. p 1.
109
____.Falta d’água em Nictheroy. O Fluminense, Niterói, 2 jan. 1913. p 1.
____.Estudos, planos, farsas e fumaças. O Fluminense, Niterói, 13 jan. 1913. p 1.
____.A Prefeitura e o empréstimo. O Fluminense, Niterói, 25 fev. 1913. p 1.
____.A falta d’água em São Domingos. O Fluminense, Niterói, 2 mar. 1913. p 1.
____.O Largo da Memória e a Prefeitura. O Fluminense, Niterói, 8 jun. 1913. p 1.
____.Os palácios. O Fluminense, Niterói, 25 jun. 1913. p 1.
____.A Prefeitura e os seus planos. O Fluminense, Niterói, 2 jul. 1913. p 1.
____.Perseguição aos pobres. O Fluminense, Niterói, 14 jul. 1913. p 1.
____.A saúde pública em perigo. O Fluminense, Niterói, 15 jul. 1913. p 1.
____.O Sr. Sodré: O homem, o tenente, o político . O Fluminense, Niterói, 16 jul.
1913. p 1.
____.Prefeitura de escândalos. O Fluminense, Niterói, 12 ago. 1913. p 1.
____.O estado sanitário é mau. O Fluminense, Niterói, 13 ago. 1913, p 1.
____.Os projectos do prefeito. O Fluminense, Niterói, 28 set. 1913. p 1.
____.Industria, comércio, lavoura?. O Fluminense, Niterói, 20 out. 1913, p 1.
____.Os ilusionismos do Sr. Sodré. O Fluminense, Niterói, 25 out. 1913. p 1.
____.A propaganda honesta. O Fluminense, Niterói, 27 out. 1913. p 1.
____.Carta aberta a Tenente Sodré. O Fluminense, Niterói, 4 dez. 1913. p 1.
____.Perdulários e mentirosos. O Fluminense, Niterói, 27 dez. 1913. p 1.
____.A fita das inaugurações “O enterro do fim do ano”. O Fluminense, Niterói, 28
dez. 1913. p 1.
____.O melhor pedaço “Rhetorica de Gamella”. O Fluminense, Niterói, 29 dez. 1913.
p 1.
____.Pompéia e o Largo da Memória. O Fluminense, Niterói, 30 dez. 1913. p 1.
____.Três anos perdidos. O Fluminense, Niterói, 2 jan. 1914. p 1.
____.Escola de patinação ou instituto de deformação. O Fluminense, Niterói, 23 jan.
1914. p 1.
____.Melhoramentos que não existem. O Fluminense, Niterói, 24 jan. 1914. p 1.
110
____.A Prefeitura e a água. O Fluminense, Niterói, 26 jan. 1914. p 1.
____.O estado da cidade, não há idéia de tamanho desleixo entre nós - pobre
Nictheroy. O Fluminense, Niterói, 1 fev. 1914. p 1.
____.O aspecto miserável da cidade. O Fluminense, Niterói, 14 fev. 1914. p 1.
____.Carnaval. O Fluminense, Niterói, 22 fev. 1914. p 1.
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116
ANEXO A
Auto da posse da sesmaria de Martim Affonso de Souza
"Saibam quantos este público instrumento de posse de sesmaria dada por
mandado e autoridade da justiça virem, que no anno de nascimento de nosso
Senhor Jesus Christo de 1573 annos, aos vinte e dois dias d'
este prezente mez de
novembro d'
esta presente éra da banda de além d'
esta cidade de São Sebastião
d'
esta capitania e governação e bahia d'
este Rio de Janeiro, terras do Brazil, no
termo d'
ellas, nas terras que dizem ser escriptura e carta dada atraz, que o
governador general Mem de Sá a Martim Affonso de Souza, cavalheiro da ordem de
Christo, e logo aho, por este Martim Affonso, foi dito a mim público tabelião e ao
porteiro mestre Vasco, e perante as testimunhas, que ao todo foram presentes, que
o dito governador lhe deu de sesmaria para elle e para seis ascendentes e
descendentes, ahi onde estava uma légua de terras e duas para o sertão, a qual
logo começaria das barreiras vermelhas, que estão defronte d'
esta dita cidade indo
pelo rio e bahia correndo em comprimento da dita légua e dias para sertão a dentro
conforme adoação e demarcação em elle conteúdo; pelo dito porteiro mestre Vasco,
e ante mim, deu posse da dita légua de terras de comprimento, e para sertão duas
léguas, conforme a dita carta, e que esta dita terra depois se demarcará com quem
de direito deve fazer, porquanto o Sr. governador capitão Christovam, que de
prezente está, manda metter de posse da dita terra, conteúda em a dita carta. E logo
o dito porteiro mestre Vasco, perante mim tabelião e governador e testimunhas ao
diante nomeadas, metteu em mão do dito Martim Affonso de Souza terra, pedras,
arêa e ramos, e lhe deu posse pessoal, actual e realmente da dita légua de terras
em cumprido ao longo do dito rio e bahia, e duas para o sertão conforme a dita carta
atrás, dentro do limites d'
ella para elle e seus herdeiros ascendentes e descendentes
sem contradicção de pessoa alguma que até ahi contradisse conforme a dita carta
actualmente, e o dito Martim Affonso aceitou a dita posse, e se ha por investido
n'
ella, tomando sobre suas mãos a terra, pedra, arêa e ramos que lhe
117
o dito porteiro deu, e depois de os ter andou passeando pela dita terra e com as
suas próprias mãos tomou por si terra, pedras, arêas e ramos, se houve por metido
de posse da dita terra conteúda na dita carta, e lhe foi dada a dita posse
pacificamente, do que o dito Martim Affonso de Souza requereu a mim tabelião lhe
mandasse passar instrumento de posse nas costas da dita carta e dada dita terra
para elle saber assim lhe fora dada a dita posse, o qual instrumento d'
ella lhe passei
para sua conservação e verdade da dita carta atraz de instrumento de dada atraz
por verdade de despacho em ella atraz pelo dito Sr. governador, porque manda que
seja o dito Martim Affonso de Souza, metido na posse da dita terra. Testimunhas que
ao dito foram presentes Miguel Barros Seabra, o dito governador e o reverendo
padre Gonçalo de Oliveira, procurador do collégio d'
esta cidade, aonde todos
assignaram com o dito porteiro em esta dita cidade, aonde este instrumento passei
aos 27 dias do mez de outubro da sobredita éra por mandado do digo governador
sem causa que divida faça, e a aqui assignei de meu público signal que tal é, etc."
(MEMÓRIA HISTÓRICA E DOCUMENTADA DAS ALDEIAS DE ÍNDIOS DA
PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO, ps. 275/281 - Joaquim Norberto de Souza Silva.
Rev. Ins. Hist. Geográfico v. 17, série 3, nº 14, 2º trimestre - Ano 1854, apud COSTA
ABREU, Antonio Izaias, MUNICÍPIOS E TOPÔNIMOS FLUMINENSES, Imprensa
Oficial do Rio de Janeiro, 1994 - transcrição literal, mantendo a grafia da época)
Quanto á divergência nas datas constantes no Auto da Posse - 22 de
novembro de 1573, no preâmbulo, e 27 de outubro daquele mesmo ano, no término,
Izaias da Costa Abreu explica: a primeira data refere-se ao traslado e, a segunda, à
de investidura do sesmeiro na posse da aludida gleba.
118
ANEXO B
Pedido de elevação da freguesia à Vila
Senhor A criação de uma vila no Sítio de São Domingos da Praia Grande da
Freguesia de São João de Icaraí da banda d’além do vasto e vistoso Porto desta
Cidade, e do termo dela, é proposta nesta representação à Real Atenção e Grande
Sabedoria de V. Mag. não só porque a população e grandeza daquele sítio parece
muito notável para uma separada e particular jurisdição e promete crescer de dia em
dia já pela freqüência dos passageiros e transportes guiados pelas principais
estradas do Norte e Nascente desta Província até a Praia Grande, aonde acham a
passagem mais pronta e perto desta Capital, e já pela concorrência de muitas
famílias da Cidade, que vão passar tempos em convalescer naquele dito lugar; mas
também porque se lhe proporciona um apropriado Termo composto dos Territórios
das quatro Freguesias vizinhas, de São João de Icaraí, de São Sebastião de Itaipu,
de São Lourenço dos Índios e de São Gonçalo, cuja total população sobe a mil
trezentos e quatro habitantes, segundo consta da oficial correspondência, que se
ajunta inclusa. É ainda de maior momento, para que o Expectável e Faustíssimo dia
13 de maio do ano próximo passado, em que o mesmo senhor honrou o sítio
mencionado com a sua Real Presença, e com a Sua Real Família, havendo ali
concorrido a Corte, Tribunais, e Autoridades dela, já memorável nas Graças feitas às
suas leais, Valorosas Tropas de Portugal, e que foi a brilhante reunião motivo
poderoso desta diligência ordenada pelo eminente e preclarissimo Desembargador
do Paço Procurador da Real Coroa da Fazenda, fique também perpetuamente
memorável assim pela elevação do dito Sítio a Vila conforme expectação de muitos
de seus moradores; como pela criação de um lugar de Juiz de Fora, que exerça
jurisdição nela, e na outra confiante de Santa Maria de Marica para mais pronta
expedição das coisas do Real Serviço e da Real Fazenda, e dos negócios
particulares. Porém V. Majestade mandará o que for mais conveniente. Rio de
Janeiro, 26 de janeiro de 1817- O Ouvidor da Comarca, Manoel Pedro Gomes,
Mattoso Maia Forte.
119
ANEXO C
Carta de lei nº2 de 26 de março de 1835, que erigiu a Vila Real de Praia
Grande a Capital da Província do Rio de Janeiro.
Joaquim José Rodrigues Torres, Presidente da Província do Rio de Janeiro.
Faço saber a todos os seus habitantes, que a Assembléia Legislativa Provincial
decretou e eu sancionei a Lei seguinte:
Artigo Primeiro: A Vila da Praia Grande é a Capital da Província do Rio de
Janeiro.
Artigo Segundo: Na mesma Vila terá lugar a reunião da Assembléia
Legislativa Provincial em o primeiro dia do mês de outubro do ano de mil oitocentos
e trinta e seis e seguintes.
Mando portanto a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução
da referida Lei pertencer que a cumpram e façam cumprir tão inteiramente como
nela se contém. O Secretário desta Província a faça imprimir, publicar e correr.
Dada no Palácio do Governo da Província do Rio de Janeiro aos vinte e seis dias do
mês de março de mil oitocentos e trinta e cinco, décimo quarto da Independência e
do Império.
Joaquim José Rodrigues Torres
120
ANEXO D
Alvará com força da lei pelo qual se erige em Vila o sítio e povoação de São
Domingos da Praia Grande; na forma que abaixo se declara:
"Eu El-Rei Faço saber aos que este Alvará com força de Lei virem: Que
Sendo-me presente em Consulta da Mesa do meu Desembargo do Paço a
necessidade que há de se criar uma Vila no Sítio e Povoação de São Domingos da
Praia Grande do Trº desta Cidade, pa. melhor e mais pronta administração da
Justiça assim dos moradores da dita povoação, como das quatro Freguesias
vizinhas da São João de Icaraí, de São Sebastião de Itaipu, de São Lourenço dos
Índios, e de São Gonçalo, avista dos grandes embaraços, que todos eles
experimentam no largo trajeto do mar entre aquela Praia, e esta Cidade, que são
obrigados a passar freqüentemente para promoverem nela os seus recursos, litígios
e dependências; tendo aliás crescido muito a sua população, que excede já a mais
de treze mil habitantes na sua total extensão, e que diariamente vai crescendo cada
vez mais pelas vantagens, que oferece a sua situação próxima a esta Capital e ao
seu Porto: Ponderando-se mais na consulta a circunstância de ter sido
especialmente honrado o dito Sítio e Povoação com a Minha Augusta Presença, e
da Minha Real Família no fausto Dia 13 de maio de 1816, concorrendo ali a Corte
formalmente e os Tribunais, e estando também ali acampada a Divisão das Minhas
Tropas ora denominadas "dos Voluntários Reais d'
El-Rei" a quem Fui então servido
agraciar com especiais demonstrações da Minha Soberania elevar o sobredito Sítio
e Povoação à classe e dignidade de Vila: Propondo-se finalmente na referida
consulta que por todos estes motivos houvesse Eu por bem criar não só a dita Vila
mas um lugar de Juiz de Fora do Cível, Crime e Órfãos para ela, o qual exercitasse
também a sua jurisdição na Vila da Santa Maria de marica e seu Termo, que é
confinante, e fica na distância de seis e sete léguas, segundo as diversas estradas,
que para ela se dirigem, tudo ao fim de se facilitarem aos povos de uma e outra Vila
121
os meios de mais pronta e segura administração da Justiça por um Magistrado
Letrado, e de maior confiança.
E tendo consideração ao referido e ao mais que se expendeu na mencionada
consulta, em que foi ouvido o Procurador da Minha Coroa e Fazenda, com o Parecer
do qual houve por bem conformar-me Souvido erigir em Vila o sobre dito Sítio e
Povoação de São Domingos da Praia Grande com a denominação de "Vila Real da
Praia Grande a qual terá por Termo as quatro freguesias vizinhas de São João de
Icaraí, de São Sebastião de Itaipu, de São Lourenço dos Índios, e de São Gonçalo,
que ficaram desde logo desmembradas do Termo desta Cidade a que pertenciam; e
gozará de todas as Prerrogativas e Privilégios de que gozam as demais Vilas de
Meus Reinos; e os moradores dela e do seu Termo serão obrigados a aprontar à sua
custa o Pelourinho, Casa da Câmara, Cadeia e mais oficinas debaixo das Ordens da
Mesa do Meu Desembargo do Paço. A Câmara da dita nova Vila se comporá na
forma da lei do Reino de três Vereadores, e um Procurador do Conselho, que hei por
bem criar para ela, assim como dos Almotacéis, dos Tabeliães do Público, Judicial e
Notas, um Alcaide, e o Escrivão do seu Cargo; ficando anexas ao Oficio de primeiro
Tabelião os d'
Escrivão da Câmara, Almotaçaria e Sisas, e ao segundo tabelião o
d'
Escrivão dos Órfãos: E as pessoas que forem providas nos ditos empregos os
servirão na forma das Leis e Regimentos que lhe são respectivos. À mesma Câmara
ficarão pertencendo todos os rendimentos estabelecidos no mencionado Sítio e
Povoação, e nas quatro Freguesias acima declaradas, que até agora percebia o
Senado da Câmara desta Cidade; além duma Sesmaria duma légua de terra em
quadro conjunta ou separadamente, aonde a houver desembaraçada, a qual lhe
será concedida pela Mesa do meu Desembargo do Paço para se aforar em
pequenas porções com foros razoáveis e o Laudêmio da Ordenação do Reino;
procedendo-se a respeito de tais aforamentos na conformidade da Lei de 23 de julho
de 1766. Sou outrossim Servido criar para a dita nova Vila um lugar de Juiz de Fora
do Cível, Crime e Órfãos, e anexar a referida Vila de Santa Maria de Marica e seu
Termo á Jurisdição do mesmo Juiz de Fora; o qual vencerá o ordenado, prós e
percalços, que diretamente lhe competirem, e servirá com os mesmos Escrivães e
Oficiais, com que atualmente servem os Juízes Ordinários; e dos Órfãos da dita V.ª
de Santa Maria de Marica, cujos lugares ficarão suprimidos desde o dia da posse
daquele Ministro; subsistindo unicamente os Vereadores e Procuradores do
conselho, na forma que se observa nas outras Vilas aonde há Juízes de Fora. Pelo
122
que mando à Mesa do meu Desembargo do Paço e da consciência e Ordens,
Presidente do meu Real Erário, Conselho da minha Real Fazenda, Regedor da Casa
da Suplicação, e a todos os Tribunais, Ministros da Justiça, e quaisquer outras
pessoas a quem o conhecimento, e execução do presente Alvará haja de pertencer
o cumpram e guardem, e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nele se
contém, não obstante quaisquer Leis, Alvarás, Regimentos, Decretos, ou Ordens
que o contrário determinem; porque todas e todos hei por derrogados como delas e
deles fizesse expressa e individual menção para o referido efeito somente; ficando
aliás sempre em seu vigor e observância. E valerá como Carta passada pela
Chancelaria, posto que por ela não há de passar e o seu efeito haja de durar mais
dum ano, sem bem.º da Ordem. em contrário. Dado no Rio de Janeiro, a dez de
maio de 1818 - El Rei com Guarda.
Alvará com força de Lei, pelo qual Vossa Majestade há por bem erigir em Vila
o Sítio e Povoação de São Domingos da Praia Grande do Termo desta Cidade com
a denominação de Vila Real da Praia Grande - Designando o Termo, Rendimentos,
e patrimônio que lhe hão de pertencer.E há outrossim por bem para a mesma Vila
um lugar de Juiz de Fora do Cível, Crime e Órfãos; anexando à sua jurisdição a Vila
de Santa Maria de Marica, e seu Termo, que lhe é confinante, tudo na forma que
acima se expressa e declara. Para S. Majestade ver. Por imediata Resolução de Sua
Majestade de 12 de fevereiro de 1819 tomada em Consulta da Mesa do
Desembargo do Paço de 8 do mesmo mês e ano - Monsenhor Almeida, José
d'
Oliveira Pinto Botelho e Mosquêra - Bernaro José de Souza Lobato o fez escreve.
Joaquim José da Silveira o fez. (Conforme MAIA FORTE, José Mattoso. Notas para
a História de Niterói, 2ª edição, Niterói, Instituto Niteroiense de Desenvolvimento
Cultural, 1973).
123
ANEXO E
Representação do ouvidor da Comarca, Manoel Pedro Gomes, dirigida a D.
João VI.
Senhor, A criação de uma Vila no Sítio de São Domingos da Praia Grande da
Freguesia de São João de Icaraí da banda d'além do vasto e vistoso Porto desta
Cidade, e do termo dela, é proposta nesta representação à Real Atenção e Grande
Sabedoria de V. Mag. Não só porque a população e grandeza daquele sítio parece
muito notável para uma separada e particular jurisdição e promete crescer de dia em
dia já pela freqüência dos passageiros e transportes guiados pelas principais
estradas do Norte e Nascente desta Província até a Praia Grande, aonde acham a
passagem mais pronta e perto desta Capital, e já pela concorrência de muitas
famílias da Cidade, que vão passar tempos em convalescer naquele dito lugar; mas
também porque se lhe proporciona um apropriado Termo composto dos Territórios
das quatro Freguesias vizinhas, de São João de Icaraí, de São Sebastião de Itaipu,
de São Lourenço dos Índios e de São Gonçalo, cuja população total sobe a mil
trezentos e quatro habitantes, segundo consta da oficial correspondência, que se
ajunta inclusa. É ainda de maior momento, para que o Espectável e Faustíssimo dia
13 de maio do ano próximo passado, em que o mesmo senhor honrou o sítio
mencionado com a sua Real Presença, e com a da Sua Real Família, havendo ali
concorrido a Corte, Tribunais, e Autoridades dela, já memorável nas Graças feitas às
Suas leais, Valorosas Tropas de Portugal, e que foi brilhante reunião motivo
poderoso desta diligência ordenada pelo eminente e preclaríssimo Desembargador
do Paço Procurador da Real Coroa da Fazenda, fique também perpetuamente
memorável assim pela elevação do dito sítio a Vila conforme expectação de muitos
de seus moradores; como pela criação de um lugar de Juiz de Fora, que exerça
jurisdição nela, e na outra confinante de Santa Maria de Marica para mais pronta
expedição das coisas do Real Serviço e da Real Fazenda, e dos negócios
particulares. Porém V. Majestade mandará o que for mais conveniente.
Rio de Janeiro, 26 de janeiro de 1817. - O Ouvidor da Comarca.
124
ANEXO F
Registro do Plano que a Câmara da Vila Real da Praia Grande mandou a sua
“Majestade El Rei Nosso Senhor, para regular a edificação desta Vila”.
Senhor – A Câmara da Vila Real da Praia Grande, contemplando a utilidade e
esplendor que resultará se esta Vila for edificada sobre um plano regular e decoroso
e pegando com vistas ao futuro as bem fundadas esperanças de que a mesma
cresça em numerosa população fundada esperanças de que a mesma cresça em
numerosa população a passos rápidos; como se deve crer, calculando sobre o
aumento progressivo que este setro recebeu nos últimos dez anos da sua existência,
que não contando aquele tempo senão, trinta a quarenta casas, hoje está
enriquecido com perto de trezentas, e desejando sobre tudo abrir com solidez e
grandeza os alicerces de uma povoação que prove corresponder em tudo ao
sublime e majestoso atributo de Real que a distingue e caracteriza, e que venha a
ser um dia uma das mais formosas vilas do Império de Vossa Majestade – Prostado
aos Reais pés de Vossa Majestade, tem a honra de pôr á mui Alta e Augusta
Presença de Vossa Majestade a seguinte:
Planta de Edificação da Vila Real da Praia Grande.
A Planta junto oferece uma vista aproximada do estado atual da edificação
desta vila e de qual ela deverá vir a ser se este plano for levado ao desempenho. Os
logares que vão em branco denotam as ruas antigas, os que vão marcados entre
pontos encarnados indicam as ruas novas. O campo número um será destinado para
sobre ele se levantar um passeio público, consagrado á feliz memória, do
faustosíssimo dia treze de maio de mil oitocentos e dezesseis, que será denominado
– Passeio da Memória. No logar numero segundo se levantará um Rocio que será
formado por um quadrado retângulo de mil quinhentos e quarenta palmos, no centro
dele se colocará o Pelourinho. Sobre o ponto numero três se formará uma praça
mais pequena que o Rocio, destinada para a venda publica de hortaliças, quitandas
125
e peixe. E seria muito útil que na mesma se estabelecesse um mercado diário de
galinhas, afim de socorrer em parte aos graves males, que ao público e muito em
particular á Real Ucharia então fazendo os atravessadores destas aves.Entre esta
praça e o Rocio se edificará a Casa da Câmara sobre o ponto numero três com
frente para o rocio; por baixo dela se levantará a cadeia com frente para o mar. A um
lado da casa da Câmara e cadeia se colocará o Açougue, ao outro seria útil que se
criasse um edifício destinado para recolher farinhas, milhos, legumes e mais efeitos
desta classe destinados á venda publica, denominado por esta aplicação – Terreiro
da farinha. Sobre o lado oposto do Rocio e que fica fronteiro á casa da Câmara, se
deverá reservar terreno suficiente para um templo, dedicado a São João Batista,
orago da freguezia desta Vila e seu padroeiro. Defronte da Capela da Conceição se
deve aperfeiçoar o largo número quatro que ali já está principiado, no encontro que
faz a rua numero dez com a rua numero dezoito.
No acabamento daquela e logar numero cinco convém reservar terreno
suficiente para matadouro do gado, que deve entrar no açougue, e talho de vaca da
Vila, ao qual quadra o nome de – Campo do Curral. Assim se poupará á saúde
pública o considerável plano que sempre vem de serem os matadouros no interior
das povoações. Pede a comodidade pública que entre a rua numero onze e a rua
numero dezesseis com base sobre o número dez se coloque o chafariz, que deve
apresentar ao povo a água do morro do Carymba (Calimbá) – atual Marquês do
Paraná que se está conduzindo e é por isso inevitável abrir neste logar um recinto
cômodo e vistoso. Sobre a rua numero seis se levantarão mais quatro ruas, numero
sete, oito, nove, e dez, paralelas entre si o mais que for possível. Estas cinco ruas
serão cortadas por nove ruas transversaes, que todas devem ter o seu começo na
rua seis e seu acabamento no número dez. Todas as ruas conterão uma largura de
sessenta palmos; e ao menos de cincoenta aquelas que por algum obstáculo
atendível não poderem ter sessenta. E como esta Vila gosa em seu nome o invejado
atributo de Real, parece ser de direito e justiça que as suas ruas se acomodem a
nomes reais que expressa a planta.
126
ANEXO G
Carta de Lei Nº6, DE 28 de março de 1835, que elevou a Capital da Província
do Rio de Janeiro à Categoria de Cidade, com o nome de Niterói.
Joaquim José Rodrigues Torres, Presidente da Província do Rio de Janeiro.
Faço saber a todos os seus habitantes que a Assembléia Legislativa Provincial
decretou e eu sancionei a Lei seguinte:
Artigo Primeiro: A Vila Real da Praia grande, Capital da Província do rio de
Janeiro, é elevada à categoria de Cidade com a denominação de Niterói.
Artigo Segundo: Ficam igualmente elevadas à mesma categoria, a Vila de
São Salvador dos Campos, com a denominação de Cidade de Campos dos
Goitacazes, e a Vila da Ilha grande, com o nome de Cidade de Angra dos Reis.
Mando, portanto, a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução
da referida Lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir, tão inteiramente como
nela se contém. O Secretário desta Província a faça imprimir, publicar e correr. Dado
no Palácio do Governo da Província do Rio de Janeiro, aos vinte e oito dias de
março de mil oitocentos e trinta e cinco, décimo quarto da Independência e do
Império.
Joaquim José Rodrigues Torres.
127
ANEXO H
Decreto Nº 93, de 22 de agosto de 1841 – Concede à Cidade de Niterói O
Título de Imperial.
Querendo honrar a Cidade de Niterói, capital da Província do Rio de Janeiro,
hei por bem conceder-lhe o título de Imperial.
Cândido José de Araújo Vianna, do meu Conselho, Ministro e Secretário de
Estado dos Negócios do Império assim o tenham entendido, e faça executar com os
despachos necessários.
Palácio do Rio de Janeiro, em vinte e dois de agosto de mil oitocentos e
quarenta e um, 20º da Independência e do Império.
P. Cândido de Araújo Vianna.
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VALÉRIA MARINHO OJEDA UM PASSEIO PÚBLICO PARA VILA