1
DAIANE GOMES DE LIMA
ALÔ QUERIDA!
UMA LIGAÇÃO HOLLYWOOD – ANÁPOLIS
Anápolis - Goiás
2009
2
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIAS
UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS
CURSO DE HISTÓRIA
ALÔ QUERIDA!
UMA LIGAÇÃO HOLLYWOOD – ANÁPOLIS
Trabalho de Conclusão de Curso entregue a
Coordenação do Curso de História da Unidade
de Ciências Sócio-Econômicas e Humanas de
Anápolis, Universidade Estadual de Goiás, para
obtenção de grau de Licenciatura em História.
Orientador: Prof. Dr. Robson Pereira Mendonça
Anápolis/GO
2009
3
DEDICATÓRIA
À minha amada mãe, Sebastiana; para
as minhas queridas irmãs: Márcia,
Marisa e Lila; e à Jade, de quem sinto
muita saudade.
Amo vocês!
4
AGRADECIMENTO
Ao meu orientador Prof. Dr. Robson Mendonça por sua confiança em meu
projeto de pesquisa, por seus preciosos ensinamentos e pela compreensão nos
momentos em que tive dificuldade.
À minha família pela paciência, carinho, e amor em todos os momentos da
minha vida. Por me guiarem pelos caminhos corretos, me ensinarem a fazer as
melhores escolhas, me mostrando que a honestidade e o respeito são primordiais à
vida. È a elas que devo a pessoa que me tornei, sou extremamente feliz e tenho
muito orgulho por pertencer a está família
Aos amigos Robertson Abdalla; Luiz Flores; Marco Aurélio, Marília e Felipe
Moura; e às queridas amigas Letícia Sousa e Vera pelo apoio incondicional que
tornaram minha caminhada para a realização deste trabalho mais agradável.
Obrigada pelo amor e amizade!
À Tiziano Chiarotti e ao Museu Histórico de Anápolis pela valiosa
colaboração sem a qual este trabalho não seria possível.
À Irmã Verônica pela grande contribuição do seu depoimento.
Aos professores do curso de História da UEG e aos meus colegas de turma,
em especial à Graziano Magalhães, pelos incentivos e gestos de amizade ao longo
de todos estes anos de formação.
Especialmente ao meu grande amigo Cristiano Oliveira por me ajudar com
as traduções, e me dar uma força mesmo nos momentos em que estava ocupado;
pelo companheirismo durante as longas madrugadas de trabalho, sempre ao meu
lado mesmo estando tão longe; pelo apoio emocional, e por ser sempre a voz
sensata que me confortava nos momentos difíceis; pela infindável paciência e pelos
maravilhosos momentos em que passamos juntos! Você é inesquecível...
A Deus, meu refúgio e minha força!
5
“Eu não podia saber naquele tempo que o
caboclo tem fé num Deus misericordioso e
onipotente. Um Deus que não somente nota
a queda de um pardal, como põe na terra
tudo aquilo que o homem precisa, no lugar
e na ocasião propícia, um Deus que não se
esquece dos humildes.”
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6
RESUMO
Joan Lowell, atriz/escritora, e Leek Bowen, capitão de navio, vieram para a região de Anápolis no final
da década de 1930, por que naquela época esta cidade era a que mais se destacava em Goiás.
Estes norte-americanos se aventuraram no interior de Goiás numa época em que estímulos federais,
como a Marcha Para o Oeste, buscavam povoar e desenvolver economicamente os vazios
demográficos do interior do país. Outros norte-americanos por influencia de Joan Lowell, que lançou
em 1952 no seu país um livro sobre sua vida no interior do Brasil, adquiriram terras em Anápolis,
entre eles a atriz Janet Gaynor e seu marido Gilbert Adrian. Outra atriz, Mary Martin veio para a
cidade por causa da amiga Janet Gaynor. Ela e seu marido, Richard Halliday se encantavam com as
características naturais da localidade, bem como por sua paisagem urbana onde conviviam
harmonicamente o moderno e o arcaico.
Palavras-chave: Anápolis, Joan Lowell, Terra Prometida, Janet Gaynor e Mary Martin.
7
RESUME
Joan Lowell, actress / writer, and Leek Bowen, ships captain, came to the region of Anápolis in the
late 1930s, because in this time this city was the most important in Goiás. These North Americans if
had ventured into Goiás at a time when federal incentives, such as the Marcha Para o Oeste, had the
purpose in the populate and to develop economically the empty demographic in the interior of the
country. Others North Americans for influences of the Joan Lowell, which launched in 1952 in his
country a book about his life in the interior of Brazil, they had acquired land in Anápolis, including the
actress Janet Gaynor and her husband Gilbert Adrian. Another actress, Mary Martin came to town for
the sake of her friend Janet Gaynor. She and her husband, the Richard Halliday were enchanted with
the natural features of the site, as well as for its urban landscape where lived together and
harmonically the modern and the archaic.
Key-words: Anápolis, Joan Lowell, Promisse Land, Janet Gaynor e Mary Martin.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................09
1. FAR-WAST – O BRASIL É NOVA FRONTEIRA................................................15
1.1. A incrível Joan Lowell.....................................................................................15
1.2. EUA e America Latina....................................................................................22
1.2.1. Instrumentos de Dominação dos EUA na América Latina....................24
1.2.2. EUA e Brasil: Os Bons Vizinhos...........................................................28
2. A TERRA PROMETIDA........................................................................................35
2.1. Rumo ao Desconhecido.................................................................................38
2.2. O Casal Bowen Chega a Goiás......................................................................40
2.2.1. A Manchester do Cerrado.....................................................................42
2.3. Os Pioneiros...................................................................................................45
2.3.1. As Concepções de Fronteira.................................................................48
2.4. Como Prender um Homem Sem Ser Útil?.....................................................51
2.5. A Mais Corajosa das Mulheres.......................................................................55
2.6. Quem Conta Um Conto Aumenta um Ponto..................................................58
2.7. No Caminho de Bernardo Sayão....................................................................62
2.7.1. James Fanstone....................................................................................65
2.8. A Marcha Para o Oeste e a CANG.................................................................67
2.8.1. Joan Lowell e Léa Sayão......................................................................69
2.9. “Cobra-Sêca” Está Chegando!.......................................................................71
2.10. A Frente de Expansão e a Frente Pioneira.................................................72
2.11. Em Anápolis................................................................................................75
3. THE END?............................................................................................................78
3.1. Hollywood Vem Para o Cerrado.....................................................................81
3.2. Joan Lowell e os Conflitos de Terras.............................................................85
3.3. A Fraternidade Eclética Espiritualista Universal.............................................92
3.4. Bye-Bye Anápolis...........................................................................................97
3.5. Porque Mary Martin Amava a Selva.............................................................101
3.6. Visitas Ilustres..............................................................................................104
3.7. A Volta..........................................................................................................107
CONCLUSÃO...........................................................................................................110
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................116
9
INTRODUÇÃO
Em meados de 1930, começaram a chegar a Anápolis, uma cidade do
interior de Goiás, um grupo de imigrantes diferentes daqueles que já haviam
chegado à cidade. Anápolis já havia recebido levas de imigrantes de muitos lugares
do mundo, havia na cidade: árabes (sírio-libaneses), norte-americanos e ingleses
ligados a Igreja Presbiteriana, uma das primeiras igrejas protestantes a se instalarem
na cidade a partir de 1920 (ROCHA, 2007). Além disso, houve enorme migração de
outras localidades para a cidade de Anápolis, que nesta época se despontava por
seu desenvolvimento econômico.
Nesta mesma época chegou à cidade um casal bem diferente das pessoas
da região, eram elas, a atriz e escritora americana Joan Lowell e seu marido o
comandante naval Leek Bowen. Estes foram as primeiras de muitas outras
celebridades ligadas ao cinema e ao teatro norte-americano que viriam para Goiás a
passeio, e em alguns casos para fixar moradia.
Entre os artistas americanos que vieram para Anápolis entre o final da
década de 1930 e meados de 1950, permanecendo por aqui até o final dos anos
1980, merecem destaque figuras importantes como Janet Gaynor, primeira mulher a
receber um Oscar, o prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos
Estados Unidos da América; Mary Martin, atriz e cantora do teatro e do cinema,
famosas por peças como “Peter Pan” e “South Pacific”, e seu filho, o também ator
Larry Hagman, o J.R. da série televisiva “Dallas”; Janet Gaynor a primeira mulher a
ganhar um Oscar; Joan Lowell, escritora e atriz do cinema mudo que realizou um
10
filme com Charles Chaplin, “Em Busca do Ouro” de 1925. Estiveram em Anápolis
também vários outros atores e atrizes e pessoas ligadas ao cinema norte-americano,
para visitá-los ocasionalmente.
O objetivo deste trabalho era relatar quais foram os motivos que trouxeram
estes famosos norte-americanos para Anápolis, e quais as conseqüências da
estadia deles no município, levantando fatos que ocorreram com eles enquanto
viviam na cidade e relacionando-os com a história local. O estudo deste
acontecimento se insere na chamada história regional, e sua relevância está na
contribuição que a realização do mesmo significará também para a história geral,
pois como citou Barbosa (1998) pode-se construir uma história nacional a partir da
contribuição de trabalhos de caráter regional. A história regional é um método que é
explicado de várias maneiras, destacamos a contribuição de Neves (2002), que
afirma que esta forma de escrever a história é uma proposta de estudo da história de
algum grupo social que tem por característica uma base territorial com práticas
econômicas, manifestações culturais e organização social em comum. No presente
estudo, o aspecto em comum a todos os atores que participaram dos
acontecimentos, é a localidade em que eles residiam: Anápolis, e regiões
circunvizinhas.
No decorrer deste texto as referências que foram feitas da história de outros
lugares, nesse caso dos Estados Unidos da América e também da história do Brasil
durante o período que foi estudado, que tiveram o objetivo de comprovar ou refutar
as hipóteses levantadas contextualizando nossa discussão e análise dos fatos.
Procuramos relacionar o contexto brasileiro e mundial com a realidade goiana e
principalmente da cidade de Anápolis, pois segundo Biavaschi (2003) o historiador
11
deve ter cuidado para não tomar uma parte pelo todo, e elaborar sua pesquisa a
partir da análise de vestígios de um contexto específico que depois é aplicado
indiscriminadamente à totalidade de uma formação social. Barbosa (1998) ressalta
que existe a necessidade do historiador que trabalha com História Regional de
relacionar a dinâmica da história geral com espaço que ele se propôs a estudar,
para não criar uma história artificial descolada do contexto geral.
Assim no primeiro capítulo falamos sobre a vida de Joan Lowell antes de ela
vir para a região de Anápolis, e sobre as relações entre o país natal da atriz/escritora
e o Brasil, destacando elementos que interligavam Anápolis aos EUA. Enfatizamos
que a presença dela e de outros norte-americanos no interior de Goiás aconteceu
em uma época em que os Estados Unidos interferiam em todos os países da
América, através instrumentos como a conhecida Política da Boa Vizinhança.
E mesmo estas pessoas não estando ligadas oficialmente a nenhum
programa do governo estadunidense que fomentasse as relações entre Brasil e
EUA, e tão pouco a serviço do governo norte-americano no país, percebemos que a
chegada delas a Anápolis não deixa de relacionar-se com a vinda de tantos outros
americanos ao Brasil, bem como a ida de muitos brasileiros para os Estados Unidos.
O segundo capítulo analisa o livro “Terra Prometida” de autoria de Joan
Lowell, onde ela afirma ter vindo abrir uma estrada no interior de Goiás, numa região
onde posteriormente foi construída a colônia agrícola, antes mesmo da chegada de
Bernardo Sayão à região goiana do Vale do São Patrício. A vinda destes norte
americanos para o interior do Brasil acontece exatamente no momento em que o
governo brasileiro implementava um programa que incentivava o povoamento e
exploração dos chamados vazios demográficos, as regiões do interior do país que
12
não estavam inseridas na economia nacional. Este programa foi a Marcha para ao
Oeste do governo de Getúlio Vargas, em vigor desde 1937, e cujas medidas
propiciaram a expansão da fronteira agrícola e o aumento da produção de
mantimentos para o abastecimento do mercado interno (BORGES, 2008).
A política varguista para o povoamento do interior brasileiro previa a criação
de colônias agrícolas, que grandes extensões de terras que eram doados para os
cidadãos brasileiros (e com algumas restrições também para estrangeiros) tinham
um núcleo onde ficavam concentrados todos os serviços essenciais para os
moradores locais, como escolas, postos de saúde, comércios e a administração da
colônia (LENHARO, 1986). Dentre estas colônias a mais conhecida foi a CANG, a
Colônia Agrícola Nacional de Goiás, comandada por Bernardo Sayão. Joan Lowell
conhecera Bernardo Sayão na região da colônia e tornou-se sua grande amiga.
Além de tratar sobre a Marcha para o Oeste, o capítulo relaciona a história
de Joan Lowell com os fatos que ocorriam em Goiás, em especial Anápolis, a cidade
que era referência para boa parte do interior goiano daquela época. Desde antes de
eles virem morar no interior do Brasil, Anápolis era uma importante cidade goiana.
A cidade já no segundo decênio deste século tornou-se ponto de atração
para os comerciantes tropeiros, nela fixando-se e instalando
estabelecimentos comerciais. Asseguravam com tais iniciativas,
oportunidades de expansão dos negócios não só porque a cidade estava no
projeto do percurso da via férrea, mas também pela grande afluência de
pessoas, que já estava se processando, atraídas para o município
(FRANÇA, s/d)
O terceiro capítulo trata da vida de Joan Lowell e de seu marido, o capitão
de navio Leek Bowen, após terem saído da região do Vale São Patrício e vindo
morar em Anápolis, cidade em que o casal residiu a maior parte do tempo em que
estiveram no Brasil, apesar de quase nada se ter documentado sobre este período.
13
Devido à falta publicações sobre muitos aspectos deste período, foi necessário
recorrer a fontes como: as biografias dos norte-americanos, bem como a jornais
nacionais e internacionais que fizessem alguma referência à vinda destas pessoas a
Anápolis. Ressalta-se que a maioria dos jornais, foram consultados em ambiente
virtual (exceto os publicados no próprio município e em cidade vizinhas).
São muitas as histórias ligadas à estadia destas “estrelas” em Anápolis,
porém quando livros, revistas, jornais, biografias, páginas eletrônicas, entre outras
fontes grafadas ou iconográficas, não cobrem suficientemente todos os aspectos da
história, a falta de documentação pôde ser resolvida com a realização de entrevista.
Caprini (2007) reconhece a importância das fontes orais para a história
regional, pois quando as fontes primárias e secundárias são escassas, devido ao
fato da pesquisa ser a primeira sobre o assunto, os testemunhos são as únicas
fontes que se tem disponível. É preciso então que o pesquisador esteja
metodologicamente bem preparado para que não se cometa equívocos, ficando sua
pesquisa comprometida com os interesses dos entrevistados.
Entre os outros artistas norte americanos que vieram para Anápolis por
influência de Joan Lowell, merece destaque Janet Gaynor e Mary Martin, que
chegaram à cidade em meados da década de 1950, e adotaram a cidade como
refúgio, e recebiam em suas fazendas vários amigos, igualmente famosos. Nesta
década, a cidade não passava mais por um momento tão próspero, este foi um
período de decadência para o município, se comparado aos anos de 1930, quando a
ferrovia havia finalmente chegado. A proximidade das duas capitais, Goiânia e
Brasília, acabou por ofuscar em muito o brilho da cidade. Ao concorrer com a capital
federal Anápolis perdeu Joan Lowell e Leek Bowen, que se mudaram para lá mesmo
14
antes de sua inauguração oficial em 1960.
Mary Martin e seu marido Richard
Halliday, permaneceram em Anápolis ainda por muitos anos, pois não procuravam
um lugar de prosperidade econômica. A cidade conquistou este casal pela
possibilidade de uma vida pacata, ainda assim gozando de um relativo conforto.
15
CAPÍTULO 1. FAR-WEST: O BRASIL É A NOVA FRONTEIRA
1.1. A Incrível Joan Lowell
A atriz e escritora norte americana Joan Lowell foi a primeira a chegar a
Goiás. Seu nome verdadeiro era Hellen Joan Wagner1, quanto aos nomes de seus
pais segundo uma revista norte-americana eram Lazzarrevich e Emmaline Trask
Lowell2; mas de acordo as informações de um documento da Fraternidade Eclética
Espiritualista Universal, igreja de Anápolis que a atriz/escritora freqüentou, os nomes
de seus pais seriam Nicolas Lowell e Emmaline Trask; já para um jornal norte
americano o pai de Joan chamava-se Nicholas Wagner.3 Se os nomes de seus pais
aparecem diferentes em algumas das fontes consultadas, quanto à profissão de seu
pai são todas unânimes, ele era um capitão de navio.
A atriz/escritora nasceu em 23 de novembro de 1902 em Berkeley, uma
cidade do estado norte americano da Califórnia. Ela foi atriz do teatro e do cinema,
estrelando um de seus filmes ao lado de Charles Chaplin, o “Em Busca do Ouro”
(1925) e participou ainda, de mais seis filmes nas décadas de 1920 e de 1930.4
Joan foi ainda jornalista e escritora, escreveu livros autobiográficos, “The
Cradle of the Deep” em 1929, “Gal Report” em 1933,5 e “Promisse Land” em 1952,
ou “Terra Prometida” na versão brasileira. O primeiro de seus livros descreve sua
infância e adolescência onde ela teria vivido a bordo do navio Minnie A. Caine, o
livro narra a história emocionante de sua vida no mar, desde o convívio com os
1
Jornal The Milwaukee Journal Sentinel, Milwaukee, 7-abril-1929, p 01-02.
Revista Time, New York, 18-mar-1929
3
Idem 1.
4
Sítio eletrônico especializado em cinema, o IMDb.
5
Revista Time, New York, 24-Jul-1933.
2
16
marinheiros, passando pelas adversidades da vida em um navio, às explorações de
florestas na América Central.6
O livro foi um grande sucesso editorial, um best seller para a década de
1920. Joan Lowell se transformou em uma celebridade, a mídia a elogiou, outros
escritores também defenderam a qualidade da obra da jovem escritora.
Readers took the bait. Lowell's memoir, a Book-of-the-Month Club selection,
sold more than 100,000 copies. Lowell was profiled in newspapers,
photographed on ships and wrote a Saturday Evening Post essay about
lessons learned from a life on the sea (Los Angeles Times, 14-março7
2008).
Mas a decepção veio pouco tempo depois, quando descobriram que Joan
Lowell tinha mesmo vivido em um navio, mas apenas em algumas ocasiões e por
pouco tempo, sua infância e adolescência fora como de qualquer outra criança,
pelas ruas de Berkeley, na Califórnia. E o navio de seu pai, que segundo seu relato
havia naufragado na costa da Austrália após um incêndio, o que teria obrigado a
escritora a nadar até a praia com seus animais de estimação agarrados às suas
costas, descobriu-se posteriormente estar “repousando placidamente” no Porto de
Oakland, na Califórnia.8
A descoberta da mentira de Joan Lowell aconteceu logo após a publicação
de seu livro no ano de 1929.9 Em 18 de março do mesmo ano a Revista Time
publicava um artigo falando sobre a história de “The Cradle of The Deep” em tom
6
Idem 2.
“Os Leitores morderam a isca. As memórias de Lowell, selecionado como o livro do mês do Clube
do Livro do Mês, vendeu mais de 100.000 cópias. Lowell foi retratada em jornais, fotografou a bordo
de navios e escreveu um ensaio para a revista Saturday Evening Post sobre as lições aprendidas
com a vida no mar” (Tradução Livre).
8
Revista Time, New York, 15-abril-1929.
9
Todas as fontes consultadas afirmam que o livro foi lançado em 1929, entretanto o jornal The
Evening Independence (St. Petersburg, 08-jun-1923: p.13) em uma matéria sobre Joan Lowell falava
a respeito se seu livro. Este fato evidencia que a edição de 1929 não era a 1ª edição de “The Cradle
of the Deep”.
7
17
elogioso. No mês seguinte a farsa foi descoberta, e um jornal norte americano fez
uma análise dos diários de Bordo do Minnie A. Caine e atestou que o pai de Joan
realmente foi comandante deste navio, mas por apenas 15 meses e não 17 anos, e
nesta época a atriz/escritora já era adolescente e não um bebê, como ela havia
afirmado. A mesma matéria ainda revelou outros fatos:10
That the actually was a fire, the log of the ship shows. But this fire occurred
at an Adelaide, Australia, wharf, and instead of swimming to shore Joan
Lowell walked down the gangplank to the dock. The ship was scuttled, but
salvaged, repaired and taken back to San Francisco. The ship's log further
shows that Joan was not the only "woman thing" aboard the vessel. Her
book says that Joan's mother "hated the sea", and never sailed with her
husband, but the records show that Mrs. Wagner made the voyage to
Australia. The log also refers to "the two children”, indicating that Joan's
11
memoir was faulty when she wrote that never played with another child.
Depois do escândalo da descoberta de que sua autobiografia era composta
por várias partes fantasiosas e não verídica Joan Lowell ficou desacreditada, os
elogios deram lugar ao sarcasmo, ela foi criticada por diversos meios de
comunicação dos Estados Unidos que antes não haviam economizado glórias para
ela e para com o seu livro. Segundo o jornal The Evening Independence do dia 29
de abril de 1929 (p. 05), após a descoberta das mentiras contidas em seu relato,
Joan passou por diversos problemas, entretanto, (...) “the book, with all the yelping,
continues to sell hot cakes and to the tune of many, many thousands of dollars for
Miss Lowell”. 12
10
Idem 1..
“Que realmente havia um incêndio, o registro do navio mostra. Mas o fogo como ocorreu em
Adelaide, na Austrália, com o navio atracado, o que fez Joan Lowell em vez de nadar para a costa,
descer de prancha de desembarque para a doca. O navio foi rapidamente salvo, reparado e levado
de volta para San Francisco. O diário de bordo mostra ainda que Joan não era a única mulher , a
bordo do navio. O livro diz que a mãe de Joan "odiava o mar" e nunca viajou com o marido, mas os
registros mostram que a Sra. Wagner fez a viagem para a Austrália. O registro também se referia a
"duas crianças", indicando que a memória de Joana foi falha quando escreveu que ela nunca
brincava com outra criança (Tradução livre).”
12
“(...) o livro, com todo este alvoroço continua a vender como pão quente e ao som de muitos,
muitos milhares de dólares para Lowell (Tradução livre)”.
11
18
No ano de 1929 após a quebra da Bolsa de Nova York, a crise econômica
assolou todo o mundo capitalista. Também para Joan Lowell este ano não foi bom,
pois depois de ter tido seu livro desmentido e de ter ficado conhecida como
mentirosa, seu casamento com o jornalista e dramaturgo Thompson Buchanan
passou por uma grave crise.13 E mesmo com as tentativas de reconciliação, tempos
depois a relação terminou.
Joan posteriormente passou a viver em Nova York, onde escrevia para um
jornal de Boston, Daily Recorde, em 1933 publicou outro livro autobiográfico, “Gal
Reporter”, sobre sua experiência como repórter do jornal em uma viagem a bordo de
um navio da Guarda Costeira americana em expedição ao deserto do Mojave, no
estado da Califórnia.14 O navio partiu de Boston, cidade localizada às margens do
oceano Atlântico, e levou a tripulação até o deserto que fica no estado da Califórnia,
na costa do Pacífico.
Em 1934 Joan Lowell protagonizou e roteirizou a película “Adventure Girl”,
que foi uma tentativa de da atriz/escritora de se desculpar com seus leitores pela
farsa contida no seu primeiro livro.
Now she steps out again, this time as skipper of the black Hawk, a 48 foot
schooner on which she made an adventurous voyage to Central America.
For the sake of a graphic record, she took a movie camerman (sic) along on
this latter trip, and now the party has returned, Bring back a full-length
feature picture. It is titled Joan Lowell - "Adventure Girl", and will be shown at
15
the Princess Theatre Sunday (Kentucky New Era, 25-ago-1934: p. 03).
Este filme é uma espécie de documentário autobiográfico em que ela tentou
13
Jornal Pittsburgh Post- Gazette, Pittsburgh, 26-dez-1929, p.02.
Idem 5.
15
“Agora ela saiu novamente, desta vez como capitã do Black Hawks, uma escuna de 48 pés em que
ela fez uma viagem de aventura à América Central. Para fazer o registro gráfico, ela levou um
cinegrafista junto nesta última viagem, e agora o grupo voltou, trazendo de volta as imagens do
longa-metragem. É intitulado por Joan Lowell como “Adventure Girl”, e será apresentado no Teatro
Princess domingo “(Tradução livre).
14
19
justificar as façanhas descritas no seu primeiro livro, mostrando na película as
aventuras que dizia ter vivido em alto mar, a bordo do Minnie A. Caine. Ela filmou na
Guatemala, e de lá trouxe uma criança mestiça de 6 anos, chamado Marino Valdéz,
encontrada abandonada nas selvas durante a gravação do filme.16 Joan pretendia
adotar esta criança e educá-la, mas provavelmente não conseguiu, pois não há
registro de nenhum herdeiro seu.
É interessante notar o quando a história de vida de Joan Lowell está
intimamente ligada ao mar, e a navios. Filha do capitão de um navio chamado
Minnie A. Caine, Joan narrou no livro “Cradle of the Deep” as façanhas que ela teria
vivido no mar ao lado de seu pai, posteriormente descobriu-se que isto não teria
passado de uma estratégica literária (como justificou seu primeiro marido, o escritor
Thompson Buchanan) onde ela juntou várias experiências que ela teria vivido em
navios em um mesmo relato.17 Com o ator Basil Rathbone ela estrelou a peça teatral
“Port o’London” na qual interpretava a filha de um capitão do mar.18 A escritora ainda
participou de uma expedição a um deserto californiano a bordo de um navio com a
Guarda Costeira americana; tempos depois ela foi a bordo do navio Black Hawk
filmar “The Adventure Girl” e finalmente conheceu seu marido, com o qual se
aventurou em terras brasileiras justamente em um navio, do qual ele era capitão.
Joan Lowell era de fato uma mulher muito aventureira (o que se comprova
pelo fato dela largar todo o conforto do seu apartamento em Nova York para viver
uma aventura no Brasil), a escritora é descrita por muitas pessoas como uma mulher
corajosa, Léa Sayão, filha de Bernardo Sayão e sua amiga, descreveu-a certa vez
como sonhadora (FREITAS, 2002).
16
Revista Time, New York, 19-fev-1934.
Idem 8.
18
Idem 2.
17
20
No entanto a maior aventura que Joan Lowell viveria seria muito longe de
onde ela se encontrava nesta época. Ela começa a se delinear durante um cruzeiro
pelas costa das Américas, num Transatlântico de luxo, quando a escritora conheceu
Leek Bowen, o capitão do navio e seu futuro marido. O capitão revelou a atriz seu
sonho de vir viver uma aventura desbravando o interior do Brasil, e numa história
digna de um roteiro cinematográfico, Joan e Bowen se apaixonaram e resolveram
viver na América do Sul (LOWELL, s/d).
Segundo Joan Lowell, Leek Bowen disse a ela as seguintes palavras, como
que a convidando para vir com ele: “Existem, lá, muitas terras desabitadas (...). O
Brasil ainda tem regiões inexploradas, que se oferecem aos colonizadores (...).
Sabe, desde menino, desejei descobrir um rincão, o mais longe possível da
civilização (LOWELL, s/d: p.13)”.
Joan Lowell (s/d) relata que primeiro ela veio sozinha, morando em uma
praia deserta na costa paulista, perto do porto de Santos a espera do amado,
posteriormente Leek Bowen veio, após ter conseguido se desfazer de suas posses
nos Estados Unidos e de pedir demissão do emprego. Ao chegar aqui eles ainda
não sabiam por onde começar a empreitada pelo interior do país.
Novamente a história toma um rumo inesperado, bem ao estilo “Joan
Lowell”. Mesmo morando em uma praia deserta e longe dos aglomerados urbanos
Joan (s/d) conta que algumas pessoas sabiam da existência naquelas redondezas
de um casal americano, sabiam também da vontade de ambos de desbravar o
interior do país. Então em uma manhã bateu a porta do casal dois homens que
ofereceram a eles a proposta de vir para o interior de Goiás abrir uma estrada em
terras selvagens que necessitavam de uma via de acesso, ainda que precária, para
21
que pudessem valorizar as terras para eles posteriormente vendê-las. O casal
aceitou o acordo que previa ainda que Joan viesse com o marido para que outras
esposas não temessem vir morar na localidade caso algum homem resolvesse se
mudar para lá. Assim começou a aventura de Joan Lowell e Leek Bowen pelo
Planalto central, o capitão partiu primeiro e combinou que sua esposa o esperaria
voltar para buscá-la depois de sondar o local onde deveria ser aberta a estrada.
Joan Lowell não ficou à espera de seu marido sabendo que ele estava
embrenhado no meio do mato num local desconhecido, e sem ao menos saber
comunicar-se em português. Ela juntou seus pertences e rumou com destino ao
interior do país um dia após seu marido ter saído. Foi assim, segundo seu próprio
relato, que Joan Lowell e seu marido vieram parar em Goiás para descobrir o que
eles chamavam de “terra livre aos colonizadores” (LOWELL, s/d).
Estando ela naquele momento no sertão de Goiás não haveria mais mar,
mas Joan Lowell não precisava dele para conseguir vivenciar as mais inusitadas
aventuras.
Em seu livro sobre sua vida no Brasil Joan Lowell não cita muitas datas,
sabemos que ela chegou ao Brasil no final do ano de 1935 pelo seu relato no
começo do primeiro capítulo de seu livro:
Talves (sic) a política da boa vizinhança ainda não fosse oficial entre o
Brasil e os Estados Unidos, em novembro de 1935, mas tive uma recepção
19
amistosa, cordial, quando voltei dos Estados Unidos, dali a dois meses,
desembarcando em Santos. E não trazia passagem de ida e volta
(LOWELL, s/d: p.17).
19
Joan fala que foi bem recebida quando “voltou” ao Brasil por que no cruzeiro em que ela
conheceu o marido, Leek Bowen, ela já havia passado pelo país em uma das paradas do navio e
desembarcado no Rio de Janeiro (LOWELL, s/d: p.14).
22
Joan Lowell neste trecho cita uma das formas que os norte-americanos
usaram para intervir nos países latino americanos, a conhecida Política da Boa
Vizinhança, uma postura aparentemente solidária para com o restante dos países da
América, que estavam desabando perante as conseqüências da crise de 1929 e
pela instabilidade política.
É muito difícil estabelecer quais foram os motivos para a escolha deste
casal de vir viver aqui no Brasil, alem é claro do que já está relatado no seu livro
autobiográfico, sobre a vontade de Leek Bowen de desbravar terras selvagens. Mas
a vinda deste casal para este país aconteceu em um momento da história mundial
em que os Estados Unidos impunham sua presença em quase todos os países da
América Latina, e mesmo em outras partes do mundo, de várias formas. A prática de
interferência nas questões nacionais de outros países é um traço sempre presente
na política internacional norte-americana, basta lembrarmo-nos da entrada dos EUA
na guerra do povo grego contra a dominação britânica, em 1947; no apoio ao golpe
de 1954 na Guatemala; no Japão em 1947, cujas ações americanas reverteram uma
quadro que iria levar o país a democratização; na Coréia durante a Guerra do
Vietnã,em 1959, entre tantas outras intervenções (CHOMSKY, 1999).
(...) os Estados Unidos nunca tiveram uma “política para a América Latina”,
mas sim uma só grande doutrina, uma Estratégia Global voltada para
sustentar a posição norte americana no mundo a longo prazo. Por
conseguinte, as relações para com o restante do continente americano
derivam dessa doutrina maior; são elas um ramo menor de todos – por
vezes o menos significativo deles” (SCHILLING, 2002:15).
23
1.2. EUA e a América Latina
Por volta de 1935 quando Joan Lowell saiu do seu país natal, os Estados
Unidos da América, para viver no Brasil o mundo vivia um período conturbado. Ainda
abalados pela Primeira Guerra Mundial e se recuperando dos estragos causados
pela Crise da Bolsa de 1929, o mundo caminhava para a ocorrência do segundo
grande embate entre as nações do globo. Por ter saído das duas grandes guerras
mundiais fortalecidos economicamente (embora tenha enfrentado uma recessão no
período imediato pós 1ª Guerra), principalmente logo após a 2ª Guerra mundial Os
Estados Unidos se consolidaram “como o líder militar e econômico do Mundo”
(FERNANDES et al., 2007)
No período correspondente ao recorte temporal que escolhemos, que é de
1900 á 1990, aconteceram as duas grandes guerras mundiais, além da Guerra Fria,
conflitos que foram decisivos para a consolidação do mundo tal como conhecemos
hoje.
Politicamente assistimos a ascensão de regimes fascista, que dividiram a
Europa, promoveram a guerra que afetou todo o planeta, mas principalmente o velho
continente (FERNANDES et al., 2007). No setor econômico presenciamos a
consolidação do sistema capitalista, e neste sistema nenhum país foi tão bem
adaptado e obteve tão rápido sucesso como os EUA, com seu “American Way of
Life”.
Avanços tecnológicos nos processos de produção na indústria
automobilística (linha de montagem e mecanização, de comunicações (rádio
e telefone), eletrônicos e plásticos (eletrodomésticos e outros bens de
consumo) criaram produtos inovadores e preços cada vez mais acessíveis,
Circulavam entre as massas produtos antes restritos aos ricos - carro, luz
elétrica, gramofone, rádio, cinema, aspirador de pó, geladeira e telefone -, o
“jeito de viver americano” (american way of life) tornou-se o slogan do
período (FERNADES et al., 2007; p.198).
24
O crescimento desta nova potência econômica só foi freado com uma crise
gerada em sua própria economia, o crack da Bolsa de Nova York, em 1929
(SCHILLING, 2002). Porém, após um período de grande depressão vemos o país
retomar o caminho do crescimento econômico a partir da criação do programa
econômico conhecido como New Deal, pelo presidente Franklin Roosevelt, quando o
EUA consolidou-se como uma das nações mais poderosas da América
(FERNANDES et al., 2007).
Após a 2ª Guerra os Estados Unidos saíram ainda mais fortalecidos do
embate
entre
as
potências
Européias.
O
Mundo
dividiu-se
entre
superpotências, União Soviética e Estados Unidos, sendo que
duas
primeiro
representava o capitalismo, e o outro o socialismo real, um dualismo que dividiria o
mundo através da Guerra Fria (FERNANDES et al., 2007).
Para Fernandes et al (2007) o Comunismo era visto pelas sociedades
capitalistas, principalmente os EUA, como uma ameaça a propriedade privada, a
democracia liberal e a sua soberania, e foi usado como justificativa para a
intervenção dos norte-americano nas economias da América Latina. O avanço do
Comunismo revigorou uma praticada da política internacional norte-americana, a
criação de diversos tratados, doutrinas e outros tipos de acordos visando a proteção
do território e da hegemonia dos países americanos.
1.2.1. Instrumentos de Dominação dos EUA na América Latina
Desde o Plano Hamilton, de 1820, até a ALCA (Área de Livre Comércio das
Américas) uma instituição contemporânea, muitas seriam as estratégias dos norteamericanos
para
(SCHILLING, 2002).
subordinar
a
América
aos
seus
interesses
econômicos
25
A Doutrina Monroe, ou “A América para os americanos”, de 1823, foi a
noção que guiou toda a relação entre Estados Unidos e América Latina ao longo do
século XIX e XX, e que se mantém até os dias de atuais apesar da significativa falta
de preocupação dos EUA com a situação da A. L. nos últimos anos. Esta doutrina
partia da idéia de que não poderia haver intervenção estrangeira (especificamente
européia) nos conflitos internos dos países da América, cabendo somente aos
Estados Unidos o direito de intervir no continente americano por sua condição
política e econômica relativamente estável, sendo o primeiro país independente do
continente americano, e com uma próspera economia. Porém, no fim da Guerra de
Secessão, a doutrina mudou sua natureza progressista para assumir a característica
de simples imposição da hegemonia norte-americana no restante da América. Esta
concepção também se fez presente no mito do Destino Manifesto (a crença de que a
incorporação de outras regiões vizinhas era parte dos desígnios divinos para a
nação norte-americana). O presidente estadunidense Theodore Roosevelt20 no início
do século XX implementou uma política externa mais agressiva, conhecida pelo
termo big stick e lançou o Corolário21 Roosevelt, as intenções destas medidas
diplomáticas eram proteger os interesses econômicos dos Estados Unidos na
América Latina. Posteriormente estas práticas foram reformuladas e o Corolário
Roosevelt foi substituído em 1917 pelo Corolário Wilson, do presidente Woodrow
Wilson. O Corolário Wilson além de reafirmar a posição defendida por Roosevelt
dava respaldo a qualquer governo latino americano que chegasse ao poder
mediante eleições, dando segurança aos investidores norte-americanos. Os Estados
20
O período dos mandatos do presidente Theodore “Teddy” Roosevelt (1858-1919) foi de 1901 à
1909 ,chegou a tentar um terceiro mandato em 1912, mas foi derrotado pelo democrata Woodrow
Wilson, cujo mandato se estendeu de 1913 até 1921..
21
Para Schilling os corolários “são medidas cuja função é interpretar a doutrina segundo a
conjuntura histórica, adequando-se as realidades de interesses táticos da política externa norte
americana. Trata-se da jurisprudência do intervencionismo” (2002: p.15).
26
Unidos se colocou assim, contra qualquer transformação revolucionária que pudesse
ocorrer no continente americano (SCHILLING, 2002).
Segundo Schilling (2002) ainda viriam a Política da Boa Vizinhança, em
1933; o Pacto da Não-Intervenção e Inviolabilidade de Territórios na década de
1930; o TIAR (Tratado Interamericano de Assistência Recíproca) em 1947; e a OEA
(Organização dos Estados Americanos), lançado durante a Guerra Fria; a Aliança
pra o Progresso, em 1960, e a mais recentemente a ALCA. Todas estas ações
evidenciam quase 200 anos de interferência norte-americana institucionalizada nos
países latinos americanos.
O combate ao Comunismo foi somente uma justificativa ideológica para a
manutenção das práticas intervencionistas após a 2ª Guerra Mundial. Os Estados
Unidos sempre mantiveram uma postura expansionista e para isto o governo norteamericano usou por várias vezes a intervenção direta ou indireta, como uma forma
de garantir que seus interesses econômicos com relação a um país não fossem
prejudicados por problemas internos desta nação (SCHILLING, 2002).
A Guerra Fria na América Latina começou no fim de 1940, quando os
movimentos favoráveis à mudança política e econômica surgiram em muitos
países do continente e acabaram refreados ou esmagados pelas elites
locais com a ajuda dos Estados Unidos. Manipulando a retórica do
anticomunismo, os Estados Unidos mantiveram os países latino americanos
na esfera da influência ocidental por meio de invasão, orquestração de
golpes, obstáculos à reforma social e apoio técnico e político a regimes
militares repressivos (FERNANDES et al, 2007: p. 229).
As ações de expansão da influência norte-americana para além das
fronteiras dos Estados Unidos eram justificadas pelo chamado “Destino Manifesto”, a
crença numa predestinação natural, quase divina para a liderança do continente
americano. De fato uma espécie de “recolonização” da América que há pouco tempo
havia se libertado dos europeus e passavam assim, ao julgo dos norte-americanos.
27
O destino manifesto foi a filosofia nacional dos Estados Unidos, aquela que
modelou o coração e a mente dos cidadãos, fazendo com que apoiassem,
quase que por unanimidade, o expansionismo permanente, a idéia de uma
fronteira móvel, insaciável, sem descanso, sempre em movimento
(SCHILLING, 2002: p.21-22).
O casal Joan Lowell e Leek Bowen pareciam também compartilhar esta
ideologia do povo norte-americano da procura de terras desabitadas. Ao se referir ao
Brasil, Bowen afirma que existiam aqui terras “inexploradas, que se oferecem aos
colonizadores” (LOWELL, 1984: p.13). Joan por sua vez concordava com ele, é o
que podemos perceber em sua reação após o capitão ter-lhe confessado que ainda
não havia tentado sua empreitada na América do sul por não ter uma companheira
para ir com ele. Para ela:
“Uma nova fronteira... Pensamento que me obcecava, a todos os
momentos. Também eu estava desiludida e detestava-me pelo verniz
sofisticado que voluntariamente adquirira, como defesa contra a vida
agitada da cidade (LOWELL, s/d: p.14).
Segundo Schilling (2002) uma estratégia política norte-americana para a
intervenção na América que foi amplamente divulgada e aceita pela população
daquele país era a chamada Política da Boa Vizinhança, pregada pelo presidente
Franklin Delano Roosevelt a partir de 1933. Está nova tática adotada após a crise de
1929, quando os EUA ainda estavam economicamente fragilizados, dispensava o
uso do big stick (usado largamente no início do século XX por outro presidente, seu
tio Theodor Roosevelt) cessando assim as intervenções militares, pois naquele
momento eles acreditavam que o uso da força atrapalhava a liderança de fato de
todo o continente, substituindo pó uma estratégia mais suave diante da expansão do
nazi-facismo. Esta se faria por meio da propaganda e divulgação cultural dos valores
da sociedade liberal norte-americana através do cinema, da publicidade, etc.
28
Segundo Mesquita (2002) foi criado em 1940 pelo Conselho de Segurança
Nacional uma agência responsável por fiscalizar os países da America Latina,
vinculada ao OCIAA (Office of Coordinator Inter-American Affairs), que fazia parte do
Programa de Defesa Nacional dos Estados Unidos. Em um relatório chamado “The
Founding of the CIAA” os norte-americanos afirmavam existir no Brasil vários
investimentos no ramo cultural que visavam desprestigiar os Estados Unidos na
América Latina.
Neste sentido, a criação do OCIAA se insere numa ‘estratégia’ política mais
ampla do governo norte-americano ao conectar relações culturais na defesa
e promoção dos ‘interesses nacionais’. Assim, no âmbito da formulação e
implementação da política externa, a instrumentalização das relações
culturais aos objetivos emergenciais dimensiona o poder de ‘ação’ do
Estado. A partir da cooptação de setores da elite norte-americana
estritamente ligados ao campo da difusão cultural, o Estado alcança, ao
mesmo tempo, dois objetivos: um elemento diferenciador com relação as
européias para não descortinar interesses mais amplos então em jogo e ao
mesmo tempo, viabiliza a política interna no sentido de incrementar a
indústria cultural norte-americana (MESQUITA 2002: p.38-39).
A influência alemã na América era grande após o termino da Primeira
Guerra, e se manifestava de várias formas. A grande quantidade de imigrantes
vindos da Europa depois do fim da guerra fortalecia ainda mais este vínculo, além
das relações econômicas entre Alemanha e Brasil. O OCIAA, ou Birô, recebia capital
de empresas norte-americanas com sede no Brasil, e foi durante está época que
vieram a América do Sul vários artistas e pessoas ligadas ao cinema, cientistas,
estudiosos, professores norte-americanos, a fim de fortalecer as relações entre os
povos da América (SILVA, 2006).
1.2.2. EUA e Brasil: Os Bons Vizinhos
As relações entre EUA e Brasil se intensificaram no início do século XX
quando os Estados Unidos se tornaram a maior potência das Américas. É certo que
29
esta influencia já se esboçava há mais tempo, pois desde sua independência o
Brasil tinha como modelo algumas características do sistema político estadunidense,
e a partir do século XX os norte-americanos eram os maiores compradores do café
Brasileiro, e a participação dos brasileiros na 2ª Guerra Mundial contribuiu para que
no pós-guerra o Brasil ficasse sob hegemonia norte-americana, tanto sob o ponto de
vista político, como no econômico e cultural (MASKE, 2000).
As relações entre Brasil e EUA pareciam ser vistas como desejáveis. Um
jornal de Anápolis chegou a reproduzir no início da década de 1940 uma matéria de
um jornalista americano chamado Edward O’Neil sobre as relações entre este dois
países com o seguinte título: “Os Estados Unidos estão com mania do Brasil”
22
. No
artigo ele falava sobre a grande curiosidade que o Brasil despertava nos norteamericanos, bem como da necessidade de que os países da América se
mantivessem unidos contra qualquer tipo de intervenção exterior, isto é, das
potências do Eixo, pois o governo de Getúlio Vargas manteve com a Alemanha
alguns acordos econômicos e mesmo certa afinidade político-ideológica. A virada
em favor dos Aliados se explica pela intensa pressão por parte dos norte americanos
que entraram efetivamente na guerra após o ataque a Pearl Harbor em 7 de
dezembro de 1941. Segundo a reportagem:
As coisas vindas do Brasil estão tendo tamanha aceitação nos meio
americanos que todos nós ficamos curiosos de conhecer pormenores desse
país, do qual se contam maravilhas. Os sucessos alcançados pelas
narrativas referentes à grande nação sul-americana em breve farão com
que ela seja alvo de todos os assuntos. (...) Pode se dizer que os
americanos estão com mania do Brasil e sentimos mesmo esboçar-se um
futuro de importante colaboração entre os dois países. Agora cada vez se
torna mais valiosa a colaboração entre os dois países. Agora se torna
valiosa a cooperação que a Conferência do Panamá proclamou. As três
Américas devem unir-se para fazer uma barreira contra os estranhos que
quizerem (sic) desembarcar com objetivos que não sejam pacíficos
(ANÁPOLIS, 08-jun-1941: p.01).
22
Jornal Anápolis, Anápolis, 8-Jun-1941: p. 01.
30
Nesta época os planos para a Integração das Américas eram tão audaciosos
que previam até uma rodovia que ligaria quase que todos os países americanos. A
estrada sairia do Rio de Janeiro e iria até o Alasca. O empreendimento qualificado
como “fabuloso” custaria 5 milhões de réis,
que seriam dividido entre todos as
nações beneficiadas com a construção da rodovia.23
Fatos relativamente sem importância alimentavam ainda mais os ânimos em
prol do pan-americanismo, e a América não é apresentada em sua clássica divisão
em três partes, mas como o uma só, “o Continente da Paz”:
Naturalmente todos sabem que nos Estados Unidos há numerosas cidades
com nomes romanos gregos e troianos, franceses, espanhóis, alemães, etc.
Mas decididamente será uma surpresa para os brasileiros saberem que nos
Estados Unidos no Estado de Indiana de onde estamos escrevendo esta
correspondência, existe uma cidade chamada ‘Brasil’. Sim, Brasil, com
todas as letras. E na estrada da cidade, o Rotary Clube do Brasil, isto é, da
cidadezinha americana chamada Brasil, erigiu duas pilastras entre as quais
se estende um painel com estes dísticos: ‘Seja benvindo a Brasil’. E’ curioso
assinalar segundo nos declarou um membro do Rotary Clube desta cidade,
que secções deste Clube, em duas cidades do mundo tiveram idêntica
iniciativa: uma, a de Brasil, no Estado norte-americano de Indiana; outra, a
de Uberlandia (sic) no Estado brasileiro de Minas Gerais. E assim , através
da distancia, unem-se os homens, unem-se os nomes, numa típica
demonstração da cordialidade do Continente da paz (ANÁPOLIS, 9-fev1941: p. 02)
Após o fim da guerra, em Agosto de 1947, foi realizada na cidade do Rio de
Janeiro, a Conferência Pan-Americana, na qual se aguardava a presença de
representantes de todos os países da América.24 Em 1950 na Conferência das
Nações Unidas o Brasil representado pelo embaixador Cyro de Freitas que foi o
primeiro a falar, e advogou pela criação de uma força militar permanente, bem como
de um sistema de assistência econômica e financeira para as nações membros da
Organização das Nações Unidas (ONU).25
23
24
25
Jornal Annápolis, Anápolis, 11-Maio-1941, p. 01.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 3-jun-1947, p. 01.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 15-out-1950, p. 01.
31
Esta aproximação entre Brasil e Estados Unidos foi bastante fecunda
principalmente no campo cultural, possibilitando assim a penetração dos valores
norte-americanos na cultura nacional, e facilitando a assimilação e adoção do
“American Way of Life”.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o governo norte-americano engajou
vários artistas (os cineastas Orson Welles e John Ford, por exemplo) no
esforço de angariar a adesão dos países latino-americanos à luta contra o
nazi-fascismo. Os interesses políticos (e, depois, econômicos) dos Estados
Unidos trouxeram à América Latina o produtor de desenhos animados Walt
Disney (que, na época, enfrentava uma greve em seu estúdio) e alguns
cartunistas de sua equipe. Em sua estadia, criaram diversos personagens
ligados aos países latino-americanos para o cinema de animação, entre eles
o papagaio brasileiro Zé Carioca (SANTOS, 2002 p. 02).
Neste intercâmbio cultural Carmem Miranda, atriz e cantora portuguesa
naturalizada brasileira, representava o Brasil nos EUA, ela é considerada um figura
contraditória, pois caracterizava a realidade brasileira de forma caricata para o
consumo de massa da sociedade norte-americana, ávida pelo exotismo dos países
latino-americanos. Contratada pela 20th Century Fox, a atriz com seu gingado
característico, participava de muitos filmes em Hollywood, como Serenata tropical
(1940), A Noite no Rio (1941), Aconteceu em Havana (1971) e Alegria Rapazes
(1944), entre outros.26
Goiás e Anápolis apesar de estarem localizados tão distantes dos EUA e
mesmo dos principais centros econômicos do Brasil na época, não deixavam de
estar inseridos na Política da Boa Vizinhança norte-americana. Os jornais através de
manchetes como “Goiás em evidência nos EE.UU”27; “Policiais Goianos Farão
Estágio de Tres (sic) Meses nos E.E.U.U.”28; “ Bolsa de Estudo nos Estados Unidos”
26
27
28
Jornal O Anápolis, Anápolis, 07-ago-1955, p. 01.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 21-fev-1957, p. 01.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 05-jun-1956, p. 03.
32
(destinadas a funcionários administrativos do municípios goianos)29; “Expedição
Científica ao interior de Goiás” (pesquisa biológica no norte de Goiás, organizada
pelo Museu de Los Angeles)30, dão indícios de quão estreita era a relação entre
estas duas localidades, firmadas graças as políticas de intercâmbio cultural oferecido
pelo governo norte americano durante os anos de 1950.
Anápolis com a 2ª cidade mais importante do estado de Goiás também
estava em evidência no cenário internacional e mantinha relações com os norteamericanos, como podemos confirmar pelas as matérias do jornal O Anápolis que
noticiavam o fato de um médico anapolino ter sido convidado para exercer suas
funções como “assistente estrangeiro” em hospitais de Baltimore e Nova York31,
outra matéria falava sobre a visita do embaixador americano à cidade um pouco
depois do final da guerra, deste acontecimento merece destaque o trecho:
“O embaixador dos Estados Unidos que se hospedou na casa de dª Joan
Lowell Bowen, já estava palestrando com alguns elementos locais. Assim
que perguntado a excia qual o objetivo de sua visita a Goiás nos respondeu:
(...) venho a Anápolis também para estudar os meios de melhorar os
transportes para o escoamento de um milhão de sacos de arroz, exportável
por esta cidade, conforme estou informado existir aqui”(O Anápolis, 24junho-1945: p.01, grifo nosso).
O embaixador prometeu, segundo a mesma matéria, a doação de
caminhões e combustível para dinamizar o transporte dos produtos anapolinos para
a exportação.
Assim como Joan Lowell e Leek Bowen, outros estrangeiros se encantaram
pelas qualidades do solo do mato grosso goiano, e compraram propriedades rurais
na região de Anápolis. Isto se deve ao fato de que as terras realmente eram muito
29
30
31
Jornal O Anápolis, Anápolis, 17-fev-1963, p. 01.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 13-mar-1956, p. 01.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 29-set-1956, p. 04.
33
boas para o cultivo, mas também foi graças a uma intensa política governamental
que tinha o propósito de integrar o interior do Brasil aos centros industriais,
desenvolvendo para isso uma espécie de colonização de áreas improdutivas e
devolutas nos moldes da Marcha para o Oeste norte-americana.
Num jornal da cidade de Anápolis, e com o seguinte título: “Do Texas
diretamente para Anápolis” foi publicada uma matéria falando sobre a presença de
norte-americanos na cidade, cujo texto destacamos abaixo:
O Estado de Goiás, e principalmente Anápolis, vem atraindo grande numero
de norte-americanos, E todos ou quase todos inclusive artistas de
Hollywood, se localizam na zona rural. Dona Joana Lowell foi a pioneira. O
Livro Terra prometida fez sucesso nos Estados Unidos, e Goiás se tornou
muito conhecido no grande país. Disse-nos Dona Joana que,
aproximadamente, quarenta famílias norte-americanas já estão residindo
nesta região. (...) Dia 20 do corrente, viajando em avião de Real, chegaram
a esta cidade14 texanos, chefiados por Sr. Lloyd Willians, que aqui estivera
em 1955, adquirindo terras neste e no município de Pirenópolis. E ele
fazendeiro e agricultor, no Texas, pretende trazer sessenta pessoas, sendo
as que com ele vieram, o primeiro grupo. O Sr. Lloyd Willian não esconde
seu entusiasmo pelo nosso município, chegando a dizer: Os texanos
consideram o Texas a melhor região do Estados Unidos, e Anápolis ainda é
melhor do que o Texas ( O ANÁPOLIS, 20-fevereiro-1956: p.1, grifo nosso).
Nesta matéria Joan aparece com o nome de Joana Lowell, pois era assim que
ela era conhecida na cidade. O seu nome, como alguns nomes de outros norteamericanos que vieram para Anápolis passaram por uma espécie de tradução para o
português, certamente a fim de facilitar a pronuncia pelos habitantes locais.
Outro aspecto interessante destas duas reportagens e o fato de que Joan
Lowell foi citada em ambas e parece estar inserida na dinâmica da sociedade
anapolina ao ponto do jornal da cidade procurá-la para comentar o a presença de
outros norte-americanos que assim como ela estavam vindo viver no município de
Anápolis. A escritora também serviu de cicerone durante a visita do embaixador, seu
compatriota, à cidade o que evidencia que Joan já estava bem estabelecida na
34
cidade no ano de 1945. Mas antes disto Joan narrou em seu livro, A Terra
Prometida, que teria vivido em um acampamento perto da cidade de Jaraguá (perto
do local onde foi construída posteriormente a Colônia Agrícola Nacional Goiás)
assim que chegou a Goiás.
Desde o Destino Manifesto (1823), passando pela Doutrina Monroe (1835) até
o período em que se vigorava a Política da Boa Vizinhança (em meados do século
XX), foi se construindo na mentalidade dos cidadãos norte-americanos a idéia de
que eles poderiam interferir, colonizar ou levar o progresso para todos os locais do
continente americano, sendo estes atos considerados como uma predestinação
divina, e uma obrigação que cabia a eles por serem a parte mais desenvolvida da
América.
E juntando a isso a o desejo norte-americano de descobrir novas terras a
serem colonizadas (resquícios ideológicos do movimento de Marcha para o Oeste,
que rompendo as fronteiras naturais da cordilheira dos Apalaches, levaram os
cidadãos norte-americanos para o interior do seu país) tem se formada toda uma
ideologia que permeou a mentalidade da população norte-americana. Isto elucida o
fato de que enquanto o governo implementava sua política intervencionista e
imperialista, simples cidadãos norte-americanos, como o casal Bowen, realizavam
paralelamente seus pequenos projetos de colonização e exploração comercial da
América.
35
CAPÍTULO 2. A TERRA PROMETIDA
É difícil saber a data exata de quando o casal Bowen chegou a Goiás, pois
Joan Lowell em “Terra Prometida”, seu livro sobre sua vinda para este estado, é
extremamente vaga em se tratando de datas, em algumas passagens ela menciona
alguns acontecimentos históricos que ocorreram durante o período no qual morou no
Brasil, ou cita algum mês e assim podemos ter uma breve noção do tempo no qual
se desenrola os acontecimentos que está narrando.
Mesmo antes de vir morar no Brasil Joan Lowell já conhecia o país, segundo
o relato feito em “Terra Prometida”, comentou sobre a passagem por algumas
cidades do Brasil no cruzeiro em que conheceu o seu segundo marido, o capitão do
navio Leek Bowen. Durante esta viagem o navio parou no Brasil no Rio de Janeiro e
em Santos (LOWELL, s/d: 14-15). E em uma matéria de 24 de julho de 1933 a
revista norte americana Time escreveu no final de um texto sobre Joan a seguinte
frase: “With $1,000 and Count Ilya Tolstoy as a deckhand, undaunted Adventures
Lowell set off again. Said she: "Hell, yes, we're going on—rHit (sic) on around Cape
Horn".32E neste texto Joan afirma que iria contornar o Cabo Horn, o ponto mais
meridional da América localizado no território do Chile; aparentemente a América do
Sul já fazia parte dos planos da escritora, antes dela vir morar aqui.
Como já citado anteriormente Joan chega ao Brasil em janeiro de 1936. Ao
desembarcar no Porto de Santos, foi morar em uma praia deserta “na costa ao sul
mais ou menos na latitude 35”. Lá ela comprou um pedaço de terra de mil metros
32
“Com US $ 1.000 e Conde Ilya Tolstoy como um marinheiro, a destemida aventureira Lowell, partiu
novamente. Disse ela: "Claro que sim, estamos indo - atingir o entorno do Cabo Horn” (Time, 24-jul1933, tradução livre).
36
quadrados pela quantia de trinta dólares, e conheceu um pescador que ela
descreveu como sendo do tipo “viking”, chamado Roberto e sua mulher Maria, o
casal a acolheu em sua casa e depois foram eles que organizaram o mutirão que
construiu a cabana onde ela morou até sua vinda para o interior do país (LOWELL,
s/d: passim).
As mulheres ficaram na cabana, com Maria. Dali a duas horas, os
voluntários tinham já o terreno limpo. As picaretas batiam na madeira para
as futuras vigas eles cantavam enquanto trabalhavam e riam. Sentada
embaixo de uma árvore, não pude deixar de admirar-me. Aquêles (sic)
homens nada sabiam de mim, nem mesmo o meu nome e, no entanto, a um
chamado de Roberto, tinham vindo alegremente ajudar-me. Não aceitaram
dinheiro, mas eu encontraria outro meio de recompensá-los. Na minha
bagagem havia artigos de que êles (sic) precisariam e eu ia dividi-los entre
todos (LOWELL, s/d: p.29-30).
Foi neste lugar que Joan diz ter começado a conhecer os vários aspectos
cultura brasileira, as comidas típicas, os modos de falar e de se comportar, as
artimanhas para aproveitar o que a natureza oferecia, e o uso de remédios naturais
para se tratar doenças. Joan aprendeu e também ofereceu o que sabia e tinha,
doava aos habitantes locais remédios que seu marido ganhava de indústrias
farmacêuticas norte americanas, e mandava a ela por navio para que ela distribuísse
aos habitantes locais.
Desejei contribuir de algum modo para o bem da comunidade. A única coisa
que eu tinha a oferecer eram remédios. Quando disse a Josefa que
avisasse (sic) os outros que eu daria remédios aos que estivessem doentes,
longe estava de imaginar que ela iria chamar ao habitantes de uma érea de
cinqüenta milhas quadradas. Nem por sombras estava sabendo que iria ser
33
considerada uma nova Florence Nightingale . Quando fiz o oferecimento,
foi um desesperado esforço de retribuir o que êles (sic) tinham feito por mim
e contribuir com algo construtivo (LOWELL, s/d: p. 34).
33
Enfermeira britânica que ficou famosa por ter sido pioneira no tratamento de feridos de guerra.
37
Nesta praia ela conheceu sua primeira amiga em terras brasileiras, Josefa,
que segundo Joan “não sabia ler nem escrever, mas tinha conhecimento, para
sobreviver, que nunca se encontrariam em livros” (s/d: p.31). Permaneceu neste
local por muitos meses suscitando a curiosidade da colônia norte-americana e
inglesa das cidades de Santos e São Paulo, sobre o que teria levado uma ex-atriz de
Hollywood a largar seu país e todo o conforto que dispunha lá para viver sozinha no
meio da “selva” no Brasil. O capitão Bowen, havia pedido a Joan que viesse sozinha
e o esperasse por três meses até que ele conseguisse resolver todos os seus
problemas para depois vir se encontrar com ela. Este período acabou se estendendo
e Joan teve que esperar muito mais tempo até que o marido viesse, chegou até a
pensar que ele não viria quando foi informada por funcionários do porto da cidade de
Santos que Leek Bowen havia sido promovido capitão do porto de Nova York
(LOWELL, s/d).
Poucos dias depois Joan Lowell recebeu uma correspondência do marido, e
foi ao seu encontro, casaram-se em Nova York e vieram em definitivo para o Brasil,
trazendo consigo alguns animais domésticos, cachorros de caça, patos e perus.
Depois de aproximadamente um mês instalados na cabana a beira da praia
receberam a visita de três homens que propuseram a eles vir para Goiás abrir uma
estrada numa “área de duzentas milhas quadradas no centro do Estado de Goiás
em troca de cento e vinte mil acres como pagamento “(p. 50). Segundo Silva (2002)
o casal foi contratado pelo grupo paulista Monteiro de Barros para abrir a estrada
que partia de Jaraguá em direção a fazenda Lavrinhas34, de propriedade deste
mesmo grupo. O casal aceitou a proposta, mas Leek Bowen planejou vir primeiro
para depois mandar buscar Joan. De fato ele veio primeiro, mas sua esposa
34
A Fazenda Lavrinhas de São Sebastião é onde se localiza atualmente o distrito de Natinópolis,
pertencente ao município de Goianésia.
38
desobedecendo às recomendações do marido alugou um carro com motorista e
partiu em seguida para junto dele, trazendo com ela todos os pertences do casal,
inclusive os animais (LOWELL, s/d).
Sabe-se que desde 1926 os Monteiros de Barros haviam adquirido as terras
das chamadas “Lavrinhas de São Sebastião”, numa região onde foi criada, tempo
depois, a cidade de Goianésia.35 Nesta região também foi criada a cidade de Ceres,
a partir da Colônia Agrícola Nacional de Goiás (SILVA, 2002).
2.1. Rumo ao Desconhecido
Esta é a versão de Joan Lowell em seu livro “Terra Prometida” para a sua
vinda para o Brasil, porém segundo Mendes (1995) o motivo da escritora ter vindo
para o Brasil não teria sido o desejo de descobrir novas terras, pois Joan Lowell
desde a descoberta das mentiras contidas em seu primeiro livro recebia duras
críticas.
“Dizia-se que ali aportara fugida dos Estados Unidos, em virtude da
publicação de um livro Cradle of the deep, em que narrava a história de sua
mãe, deserdada ao casar com um capitão de navio-rebocador e que
morrera de parto, justamente ao dar a luz a sua filha Joana. Órfã de mãe,
teria sido criada pelo pai, no velho navio. O livro auto-biográfico fez sucesso
e chegou a ser escolhido o “Livro do Mês”, nos Estados Unidos, em março
de 1929. Descobriu-se, depois, que a obra era uma farsa e a autora passou
a ser alvo de muitas críticas decidindo então mudar para o Brasil,
instalando-se, sozinha, em Anápolis, onde ficou aguardando a vinda de seu
namorado, Lee (sic) Bowen, coincidentemente, como na história de seu livro
um capitão de navio mercante. Algum tempo depois, Bowen aposentou-se e
veio viver com a amada nas terras goianas “(MENDES, 1995: p. 414).
35
Página eletrônica oficial da Prefeitura do município de Goianésia.
39
A atriz/escritora afirmou no livro que estava cansada da vida que levava nos
Estados Unidos, então Joan Lowell teria decidido vir para o Brasil, mas segundo
Mendes (1995) ela veio esperar o marido na cidade de Anápolis, e não em uma
praia deserta no litoral de Santos como ela afirmou.
No livro Joan citou que ela voltou para Nova York para casar com o capitão
(s/d), e segundo a matéria de uma revista ela realmente esteve morando em uma
espécie de “bangalô” em uma praia da cidade de Santos, mas a própria autora
relatou na reportagem que esteve também no Rio de Janeiro.
Famed Literary Hoaxer Joan Lowell (Cradle of the Deep) started back to
Manhattan after spending 20 months in a jungle hideout 30 miles from
Santos, Brazil. When Miss Lowell sailed for Brazil she said she intended to
become a Brazilian citizen. She built herself a brick house on a beach
clearing backed by jungle, had herself appointed district nurse. One of her
accomplishments was installing, as a sanitary measure, cement floors in the
thatched-roof huts of the natives. In Rio de Janeiro, Hoaxmistress (sic)
Lowell said she ministered so well to the natives they named her "Donna
36
Joan, the Miracle Woman (Time, 06-set-1937, grifo nosso).
Cabe ressaltar que o fato de ter ido para o Rio de janeiro Joan Lowell omite
completamente no livro “Terra Prometida”.
A imprensa norte-americana mesmo após ter passado muito tempo desde a
descoberta da farsa de seu primeiro livro não foi tão compreensiva e não perdoou a
atriz/escritora, pois sempre se referiam a ela como uma farsante ou mentirosa (cf.
supra). Mas mesmo após o escândalo causado pela descoberta de que muitas
36
“Famosa fraudadora literária Joan Lowell (Cradle of the Deep) voltou para Manhattan depois de
passar 20 meses em um esconderijo na selva a 30 milhas de Santos, no Brasil. Quando a senhora
Lowell partiu para o Brasil, ela disse que pretendia se tornar-se uma cidadã brasileira. Ela construiu
uma casa de tijolos em uma clareira na praia ao lado da selva, e se designou enfermeira distrital.
Uma de suas realizações foi a instalação, como uma medida sanitária, de pisos de cimento nas
cabanas de telhado de palha dos nativos. No Rio de Janeiro, a fraudulenta Lowell disse que atendeu
tão bem os nativos que a nomearam de "Dona Joan, a Mulher Milagrosa". (Tradução livre)
40
partes do seu livro autobiográfico “The Cradle of the Deep” eram histórias
inverídicas, Joan Lowell não era uma celebridade totalmente esquecida pela mídia,
visto que se uma revista de variedade de circulação nacional como a Time publicava
freqüentemente matérias inteira ou notas sobre ela, era por que o que acontecia na
vida desta atriz/escritora ainda era do interesse de alguém. Este fato torna ainda
mais interessante a vinda deste casal para o interior de Goiás.
2.2. O Casal Bowen Chega a Goiás
Se Joan Lowell chegou ao Brasil em novembro de 1935, viveu
aproximadamente um ano, ou um pouco mais, na cabana da praia, foi e voltou para
os Estados Unidos (cuja viagem ela mesmo afirmou durar certa de 15 dias,
totalizando um mês para a ida e a volta), e o casal teria passado ainda mais um mês
na cabana a beira da praia, sem saber por onde começar seu empreendimento.
(LOWELL, s/d). Levando em consideração estas informações podemos perceber
que este primeiro período durou cerca de 15 meses, e então ela provavelmente
teria chegado
ao estado
de Goiás no início de 1937. Esta seria uma data
aproximada, pois foi baseada nos relatos de Joan, e ainda por não se saber
precisamente quanto tempo ela passou nos Estados Unidos.
Entretanto segundo a Revista Time (06-set-1937) a atriz/escritora teria
passado muito mais de um ano no Brasil antes de voltar para os Estados Unidos,
regressando para Manhattan por volta de setembro de 1937. E se considerarmos
que ela tenha passado inicialmente 20 meses aqui, como afirmou a revista,
somando mais o tempo que ela gastou na ida e na volta para os EUA, e o tempo que
ela e o marido ficaram sem saber o que fazer na cabana do litoral paulista, ela teria
41
chegado à cidade de Anápolis entre o final de 1937 e o início de 1938. Esta parece
ser a data mais coerente com os próprios relatos da atriz/escritora e com a matéria
da revista citada, pois segundo a própria Joan Lowell ela somente regressou para os
Estados Unidos, muitos anos depois de sua chegada a Goiás, e na primeira
suposição da provável data de sua chegada ao interior do Brasil, ela teria voltado ao
seu país de origem após ter vindo para este estado.
No estado de Goiás ela passou por Anápolis, que nesta época era o limite
das terras cobertas de mata, esta era a cidade mais próspera do estado. Apesar de
Goiânia naquela época já ter sido fundada, esta cidade era capital do estado do
ponto de vista jurídico, mas não do ponto de vista econômico. Depois de passar por
Anápolis Joan Lowell e Leek Bowen foram se estabelecer em Jaraguá, nas terras
onde eles iriam construir a estrada. (LOWELL, s/d).
Joan Lowell disse em seu livro que chegou “à estaçãozinha de Anápolis, que
fica exatamente no centro do Brasil, no vasto planalto da vertente oeste” (s/d: 55).
Para a atriz/escritora que vivia em “num apartamento em Nova York com todo
conforto material – telefones, lojas comidas entregue em casa, elevador e até
mesmo um porteiro, para abrir e fechar portas” (s/d: 13), Anápolis poderia ser
descrita assim mesmo no diminutivo, mas um cidadão brasileiro que viajasse pelo
Brasil na época e conhecesse bem a realidade nacional talvez descrevesse a cidade
de outra forma, um bom exemplo e o relato de Léa Sayão (1976) da sua primeira
viagem a Goiás em 1939, em companhia do pai, Bernardo Sayão. Ao visitar
Anápolis são estas as suas impressões: “Comércio forte, máquinas agrícolas,
enorme movimento de cereais exportador”. Veja que Léa ressalta os aspectos
positivos da cidade, sua prosperidade econômica, e Joan vê a estação do trem de
42
ferro, que de tão importante e aguardada pelos habitantes da cidade foi inaugurada
com festa, como uma “estaçãozinha”, ela não poderia imaginar o quando aquela
estação significou para a economia de Anápolis e para dezenas de outras cidades
goianas.
Para uma pessoa estrangeira que visitasse a cidade ela poderia até ser
considerada atrasada, mas para os padrões brasileiros a cidade era considerada
desenvolvida e no estado, como a capital goiana ainda não estava bem estabelecida
e Brasília não existia, Anápolis era considerada a cidade mais importante de Goiás.
2.2.1. A Manchester do Cerrado
Por suas possibilidades econômicas Anápolis foi um centro atrativo de
investimentos, e a acumulação de riquezas advinda das atividades agrícolas e do
comércio de foi determinante para a vinda dos trilhos da ferrovia até a cidade. A
cidade era nesta época chamada de “Ribeirão Preto goiana” ou de a “Manchester
goiana”, numa possível comparação entre o município e as cidades paulista e
inglesa, ambas famosas por seu desenvolvimento econômico.
À princípio a prosperidade econômica do município se deveu muito a suas
características geográficas:
“Devido a sua posição de entroncamento, que a coloca como um ponto de
contato entre o norte e o sul do país a cidade intensifica a sua atividade
comercial, abrindo inúmeras lojas e armazéns que vendiam, gêneros
alimentícios, armarinhos, tecidos, calçados, ferragens, agro-industriais e
outros.”(SILVA, 1997: p. 32).
A produção agrícola impulsionou a economia local, sendo que a cidade de
Anápolis chegou a ser a maior produtora de café de todo o estado de Goiás. No
43
município devido à produção destes de café e de arroz se desenvolveram várias
empresas para o beneficiamento destes itens (SILVA, 1997).
Foi a partir dos anos de 1920 que a economia Anapolina floresceu devido à
agricultura e também por causa do comércio urbano que começava a se
desenvolver. Outro fator que dinamizou a economia da cidade ainda nesta época foi
a construção da estrada de rodagem que ligava Anápolis a estação ferroviária de
Roncador (FREITAS, 2007).
A agricultura teve papel muito importante para o desenvolvimento econômico
de Anápolis, pois foi o primeiro fator de inserção da cidade nos moldes do sistema
capitalista. Posteriormente o agronegócio foi sendo paulatinamente substituído pelo
comércio, mas vemos que a agricultura desempenhou uma função primordial ao
dinamizar o comércio do município (SILVA, 1997). Outro fator que acabou por firmar
Anápolis como importante pólo de comercio varejista foi a chegada da ferrovia à
cidade no ano de 1935.
Mesmo antes da chegada dos trilhos Anápolis já era conhecida pela sua
posição estratégica, o município se localizava na rota dos comerciantes e tropeiros
goianos e mineiros. A região da antiga Freguesia de Santana começou a se
destacar como centro comercial ainda na década de 1920, posição que manteve até
meados da década de 1950 (POLONIAL, 2007).
Mas o desenvolvimento econômico (quando a compra e venda de
mercadorias passou a ser uma das atividades que mais geravam riquezas para o
município) exigiu que a ferrovia chegasse até a cidade. Nos anos anteriores à vinda
44
da estrada de ferro, Anápolis já havia passado por várias transformações
significativas que a modernizaram. Conforme afirma Polonial:
Para receber a estrada de ferro a cidade experimentou mudanças
significativas na sua fisionomia urbana, com a reforma de antigos prédios,
públicos ou privados, residenciais ou comerciais, além de novas
construções (2000: p. 67).
A estrada de ferro tinha como principal objetivo a inserção do estado de
Goiás na economia nacional, a expansão dos trilhos no território goiano desenvolveu
toda a economia do estado através das transações comerciais regionais e interregionais que a ferrovia possibilitava (BORGES, 1990).
Mas não podemos negar que a proximidade da vinda da ferrovia propiciou à
cidade grande desenvolvimento na área de infraestrutura urbana, como o
saneamento básico, reconstrução de casas velhas, melhoria nas ruas e estradas,
além da inauguração na cidade de vários estabelecimentos comerciais, como bares,
sorveterias, fábricas de gelo, cervejaria e emissoras de rádio. Surge na cidade uma
animada “vida noturna”. Nesta época vários imigrantes (como foi o caso do casal
Bowen) atraídos pelas potencialidades agrícolas e mercantis do local vieram para a
cidade. Surgem também problemas urbanos relacionados ao aumento da
criminalidade urbana. Economicamente além de facilitar o transporte de mercadorias
e assim dinamizar o comércio, a ferrovia trouxe consigo a valorização das terras do
município (POLONIAL, 2000).
A partir da chegada da ferrovia a Anápolis, a cidade se torna o maior centro
comercial do estado. Cresceu o numero de máquinas de beneficiar arroz, e em 1937
a produção deste produto já havia superado em volume de sacas da produção de
café. Em seguida a cidade tornou-se exportadora de arroz (SILVA, 1997).
45
Mesmo tendo existido vários projeto para o prolongamento da ferrovia em
Goiás, a estrada de ferro parou em Anápolis (POLONIAL, 1995). Enquanto a cidade
era o ponto final de ferrovia aconteceu aqui um fato semelhante ao ocorrido em
Roncador anteriormente, e também durante o processo de expansão ferroviária
paulista. Para o município se deslocava grande parte da produção agrícola do
estado, gerando riquezas e modernidade em todos os níveis da sociedade, por onde
a ferrovia passava deixava o seu rastro do novo. O ponto final representava a
fronteira econômica, isto é, o limite entre o moderno e o arcaico. A cidade era
também a via de acesso para a CANG (Colônia Agrícola Nacional de Goiás) e para
todo o Vale do São Patrício.
2.3. Os Pioneiros
De acordo com Joan (s/d) ela e seu marido chegam à cidade de Anápolis
pouco depois da inauguração da estação da ferrovia. Mas eles não permaneceram
na cidade, pois fixaram moradia perto de Jaraguá, distante aproximadamente 90 Km
de Anápolis, próximo a região onde foi construída posteriormente a CANG que foi
o ponto de partida para a cidade de Ceres.
Jaraguá era uma antiga cidade dos tempos da mineração, e segundo Silva
(2002) este um município que representava a zona intermediária entre a fronteira
econômica, representada por Anápolis, e a fronteira demográfica. A partir daquela
cidade se estendia uma “terra de ninguém” (p.19), o sertão goiano. E naquela época
já se pensava na expansão das fronteiras para o oeste do Brasil. A concepção do
“Eldorado” guiou muitos colonizadores que vieram para o território goiano, e está
46
presente no título do livro de Joan, “Terra Prometida”, uma “compreensão quase
mítica da colonização do Oeste” (p. 19).
Leek Bowen após uma passada rápida por Jaraguá se deslocou para as
glebas onde ele deveria abrir a estrada, e Joan, no seu encalço, também passou
pela cidade, onde causou espanto por vestir calças, hábito que ainda não existia no
interior de Goiás. Ela fez observações sobre a localidade, destacando que a cidade
estava quase abandonada, e tinha casas rústicas com janelas que na falta de vidro
estavam cobertas com “folhas de mica”. Nesta cidade ela ficou sabendo notícias do
marido, e juntamente com um grupo formado por habitantes locais ela foi ao
encontro dele. No caminho ela conheceu algumas das riquezas do sertão goiano,
como a ametista, que brotava do chão, e que para os habitantes locais não tinha
valor algum; o minério pechblenda, do qual se extrai o urânio; o gengibre do mato,
que segundo o seu guia, Filogônio, servia como “restaurador”; o níquel; e as peles
de porco do mato que eram exportadas para a Alemanha e Estados Unidos, sendo
usadas para fabricar “máscaras contra gás venenoso, num período próximo ao início
da Segunda Grande Guerra” (LOWELL, s/d: passim).
Se os moradores de Jaraguá estranharam ao ver uma mulher estrangeira e
vestindo calça circulando pela cidade, a atriz/escritora demonstrou, em algumas
partes do seu livro todo o estranhamento que ela também sentiu em relação aos
hábitos, costumes e mentalidade dos moradores locais, alguns costumes eram no
mínimo exóticos com relação ao comportamento que ela estava acostumada.
Que o viandante se acautele quando um caboclo falar em distância! Com o
tempo aprendi a entender a cheguei a catalogar as várias distâncias. Falam
em quilômetros e léguas, em vez de milhas, e a classificação é a seguinte.
Uma pequena distância é chamada de ‘ao alcance de um grito’; a distancia
média é aquela em que se pode ouvir um tiro; uma légua pequena significa
quatro milhas; a légua regular quer dizer cinco milhas ou a distancia que um
47
homem pode vencer, caminhando devagar, em uma hora; uma légua
grande, mais ou menos oito milhas; e agora, chegamos ao mais
interessante... O caboclo espicha o lábio inferior na direção desejada e diz:
‘ali’. ‘Ali’ é tão longe, que elês (sic) não sabem calcular a distância
(LOWELL, s/d: p. 63).
Outros fatos comuns na dinâmica da vida do interior do país naquela época
também chamaram a atenção de Joan Lowell (s/d), e foi o que ela descreveu como
o “assassínio assalariado”, ou capanga, que serviam aos fazendeiros “ para liquidar
os invasores de suas terras ou para matar membros de família que não quisessem
vender, por ninharia, os direitos sobre as próprias terras” (p. 65). O uso da violência,
física ou psicológica para se apropriar das terras de pequenos produtores e
posseiros, ficou conhecida como grilagem de terras, prática da qual a própria Joan
Lowell foi vítima pouco tempo depois.
Depois de ter encontrado seu marido, o casal montou o primeiro
acampamento, a 24 milhas de Jaraguá, contratando como funcionários os homens
que serviram de guias para eles. Eles começaram a abrir a “picada”, como eram
chamados os caminhos no meio do sertão, apesar de muitos moradores da
localidade não virem com bons olhos a abertura de uma estrada nas redondezas,
pois ela iria “trazer a lei” para o local (LOWELL, s/d: p. 65).
2.3.1. As Concepções de Fronteira
O Centro Oeste foi uma região de fronteira que se consolidou como área de
moderna produção agroindustrial
após transformações nos seus meios de
produção. A região foi considerada por muito tempo um vazio demográfico cuja
vocação seria as atividades agrícolas de subsistência, extrativismo e a mineração
48
rudimentar. A partir da década de 1930 o Centro Oeste se consolidou como região
de fronteira agrícola, e o local para onde se deviam dirigir os excedentes
populacionais (BUAINAIN, VIEIRA e VIEIRA JUNIOR, s/d).
Durante o processo de expansão da fronteira no Brasil, houve a adoção da
concepção de fronteira norte americana formulada por Turner, que não se adapta
muito bem a análise da realidade brasileira, onde temos os sertões do país como
sendo o lugar do encontro do primitivo com o civilizado, e onde haveria a
possibilidade de um novo futuro naquelas terras livres (FERNANDES, s/d).
A concepção de fronteira de Turner era a concepção de uma região de
contorno sinuoso; uma área selvagem que vai sendo desbravada e organizada pelo
homem, um local onde se distingue a natureza da cultura, mas que também era
uma terra de oportunidades (MIZIARA E SAMPAIO, 2008). Segundo Turner (1921) a
fronteira era onde e civilização se encontrava com a barbárie, e este encontro era
necessário, pois o desenvolvimento norte-americano devia muito ao avanço da
fronteira
Thus American development has exhibited not merely advance along a
single line, but a return to primitive conditions on a continually advancing
frontier line, and a new development for that area. American social
development has been continually beginning over again on the frontier. This
perennial rebirth, this fluidity of American life, this expansion westward with
its new opportunities, its continuous touch with the simplicity of primitive
society, furnish the forces dominating American character (TURNER, 1921:
37
s/p).
37
Assim o desenvolvimento americano exibiu não apenas como o avançar em uma única linha, mas
um retorno às condições primitivas em uma linha de fronteira que continuamente avançava, um novo
desenvolvimento para essa área. O desenvolvimento social norte-americano tem sido continuamente
o recomeço na fronteira. Este perene renascimento, esta fluidez da vida americana, esta expansão
para o oeste com as suas novas oportunidades, seu permanente contato com a simplicidade da
sociedade primitiva, fornecem as forças dominantes do caráter americano (tradução livre).
49
Martins (1997) em uma análise mais coerente com a realidade brasileira
estudou a dinâmica de locais considerados como zona de fronteira, e segundo ele
este era o lugar do encontro e do desencontro de culturas diferentes, da indefinição
e do conflito, onde a violência da sociedade se agravava.
A fronteira se
caracterizava como o lugar da busca desenfreada por oportunidades, mas ao
mesmo tempo era o local da espoliação dos agricultores, que foram paulatinamente
expulsos das áreas rurais, quando estes locais passaram a ser incorporadas ao
processo capitalista. Longe de ser a terra de oportunidades de Turner, a fronteira é
para Martins (1997) o local onde ocorrem disputas de poder, onde precisa haver o
degradado para poder existir aquele que domina.
Para Silva e Silva (2008) a fronteira é também local da convivência de
grupos sociais com tempos históricos distintos.
Assim como Joan Lowell e seu
marido que vindos de uma grande metrópole, conviviam no interior de Goiás com
pessoas que pareciam estar estacionadas no tempo, vivendo como os norteamericanos viviam à séculos atrás.
A concepção de fronteira de Martins (1997) se parece muito com a idéia que
Amado (1995) faz sobre o sertão, que para ela seria a mais importante categoria
espacial usada desde o início da colonização por portugueses para designar uma
localização (geralmente no interior do país), e por outro lado seria também é uma
categoria que carregada de sentidos depreciativos, era usada para designar
“espaços amplos, longínquos, desconhecidos, desabitados ou pouco habitados”,
“terras sem fé, lei ou rei” (p. 6). Por outro lado para muitas pessoas significava a
esperança de uma vida melhor, e a libertação de uma vida de opressão, e foi a partir
desta dualidade que se constituiu a idéia de sertão no Brasil.
50
Vemos no relato de Joan Lowell que ela via naquela região um pouco de
cada uma destas concepções citadas (cf. supra), o sertão de Goiás era para ela um
lugar de inúmeras potencialidades, mas também era estranho e selvagem.
E para piorar ainda mais a situação do casal os contratantes, donos das
terras, não mandaram mais dinheiro além da quantia que eles deram inicialmente
para Leek Bowen. O fato do dinheiro não chegar pelo correio, preocupava cada vez
mais Bowen, pois seus homens mal alimentados trabalhavam sem ânimo algum.
Conta Joan que chegaram a quase passar fome, se não fosse pela caça de animais
selvagens e pelos alimentos que cresciam nativos pela região. Joan na falta de ter
muitas vezes até o que comer, teve que aprender a aproveitar tudo que a natureza
oferecia; tentou caçar, mas sem sucesso, conseguiu trazer somente uma arara. Por
ainda não saber cozinhar, suas funções eram pequenos serviços, como “bicho
medidor”, como a própria atriz/escritora nomeou.
“Estenda a trena e fique firme! Meça e marque. Ser ‘bicho medidor’ era, na
minha opinião, muito mais interessante do que ser relegada a cozinha do
acampamento, pois eu era a única mulher presente e sempre havia a
possibilidade de ser mandada para lá.(...) Eu fora (sic) transferida – de
Bicho-medidor, passava a Carregadora de Água. Meu serviço era levar uma
lata de água, de cinco galões, do riacho até a turma que trabalhava milha
adiante. Os nativos podem carregar pesos equilibrados na cabeça, mas até
hoje eu não consegui aprender essa arte.Tinha que levar a pesada vasilha
no ombro, e , mesmo assim apenas pela metade.(...) Quando eu achava
uma coisa pesada demais para mim, mudava de trabalho, valendo-me disso
como de um espécie de antídoto”(LOWELL, s/d: p. 75).
E quando o dinheiro tinha praticamente acabado o casal passou a viver das
doações que recebiam dos habitantes da região que estavam animados com o
desenvolvimento que a abertura da estrada possibilitaria. Contudo esta colaboração
não era suficiente para sanar todas as dívidas feitas por Leek Bowen e custear o
término da estrada, que neste momento mais por honra do que por qualquer outro
51
motivo, foi a razão pela qual o casal não abandonou o projeto. Apesar dos pesares a
estrada começou a ser conhecida. Certa manhã se aproximou do acampamento de
Joan uma comitiva formada por uma grande família, vindos em carros de boi, com
homens mulheres e crianças. A atriz/escritora ficou emocionada pela chegada de
colonizadores pela sua estrada, “estrada que era, alternadamente, um pesadelo e
um sonho” (LOWELL, s/d: p. 85).
2.4. Como Prender um Homem Sem Ser Útil?
Talvez tenha sido durante o convívio com estas pessoas que Joan Lowell
tenha sentido mais duramente o quanto o seu mundo, onde ela nasceu e fora criada,
era diferente daquele que ela vivia agora. A comitiva que chegou ao seu
acampamento era formada por uma família inteira que viera do sul do estado de
Minas Gerais, de uma região e souberam da história de um casal americano que
estavam abrindo uma estrada e que as terras á beira da estrada podiam ser
tomadas posse eu poderiam ser compradas por preços baixos (LOWELL, s/d).
O primeiro diálogo entre Joan e o grupo já evidenciou o estranhamento
mútuo. Disse o líder dos visitantes ao ver a atriz/escritora vestindo calças, como as
usadas no interior do Brasil apenas por homens: “Do lugar de onde eu venho, não
queremos saber de mulheres que usem calças”( p.85-86), Joan por sua vez achou
que aquele grupo eram muito parecido com os okies americanos38:
O grupo lembrava uma litografia americana dos tempos dos pioneiros. As
mulheres usavam uma saia comprida, em cima de várias anáguas. No
carro, sobre os utensílios domésticos, estavam teares. Havia um primitivo
38
O termo se refere ao imigrante norte-americano do início do século XX, que saia de sua terra natal
a procura de trabalho na agricultura.
52
descaroçador de algodão, feito de madeira. Duas das mulheres estavam
grávidas, outras carregavam crianças que ainda mamavam. Vi um bando de
cães de dúbio pedigree, ofegantes, à sombra dos carros. Uma vaca magra
estava tristemente de cabeça caída, o bezerrinho chupando-lhe o úbere
quase seco (LOWELL, s/d: p.86).
Pés sujos e rachados, crianças com galinhas atadas aos seus pés,
supersticiosa dieta composta somente de carne de fêmea para a mãe de recém
nascido, Joan Lowell foi apresentada à uma realidade que ela jamais havia
conhecido, e se defendia em pensamento: “Pois bem, não é assim que se pensa nos
Estados Unidos”. Quando questionada sobre o fato de não ter filhos o episódio foi
ainda mais constrangedor, pois uma delas disse: “Tenho pena do seu marido.
Quando uma vaca é estéril, o remédio é mata-lá. Todo ser vivo precisa ter utilidade”
(LOWELL, s/d: p.88).
Joan reparou que somente as calças dos homens tinham botões, as roupas
das mulheres eram presas com fitas amarradas. As mulheres eram “prendadas”
cozinheiras, e ainda teciam e coloriam o tecido para as roupas dos maridos, e Joan
foi então questionada sobre que material usava para colorir o tecido das calças de
Leek Bowen, e ela respondeu: “ Não sei tecer. Nunca teci coisa alguma, em minha
vida” (p.91). Se sentindo culpada Joan lamentou o fato de ter em um curto espaço
de tempo, caído duas vezes no conceito daquelas mulheres, ela ainda tentou
amenizar dizendo que ela tinha comprado muitas calças para ele. E que de onde ela
vinha as mulheres aprendiam coisas diferentes, “sei guiar automóvel”; “ ler e
escrever mais ou menos” (comentário muito modesto para um escritora de best
seller); “já fui artista de rádio”; “sei fazer geléia”; de onde ela vinha “ensinam a
cuidar do cabelo, da pele, das mãos“ (p. 92-93). Mas a temporada no sertão goiano
53
havia deixado-a em estado tão lastimável que nem o fato de saber cuidar de sua
aparência e estar bem cuidada ela pôde contar como vantagem.
Nunca eu compreendera a dificuldade em justificar minha existência e
utilidade, até tentar fazê-lo aquela noite, no meio de verdadeiras pioneiras
que com tanta bondade, procuravam descobrir qualidades que pudessem
fazer com que meu marido me prezasse. (...) evidente mente as mulheres
esperavam que eu citasse as minhas qualidades. – Sempre ganhei a vida.
Ninguém teve que me sustentar. (...) De muitas maneiras. Sempre tive bons
empregos e ganhei muito dinheiro. (...)... lá, onde eu nasci, as mulheres têm
orgulho de ser independente (LOWELL, s/d: p. 94).
E mesmo após todas as suas tentativas de mostrar suas qualidades, a frase
que encerrou a conversa q que foi pronunciada por uma das mulheres foi: “Que
tristeza!” (p. 94). No entanto Joan não guardou nenhuma mágoa destas pessoas, e
no seu livro mesmo ela disse que não havia nada de mesquinho, se tratava apenas
de espanto e curiosidade diante do estranho e inusitado, isto foi o que eles puderam
sentir com relação à atriz/escritora e a Leek Bowen (LOWELL, s/d). Analisando o
seu relato percebemos que ela foi extremamente generosa e modesta ao não se
gabar de tudo que já havia feito, e vivido antes de chegar à aquele lugar. Está é
uma característica que permeia todo o seu livro, a simpatia que ela mostras ter com
o Brasil e para com os habitantes deste país, independente da classe social a que
eles pertenciam. Mas talvez Joan sabiamente tenha percebido que aquelas pessoas
não valorizavam o fato dela ter sido uma escritora de sucesso, apesar dos pesares;
e atriz de cinema; certamente aquelas pessoas jamais compreenderiam Joan Lowell
por se tratar de condições de vida materialmente distintas. Era outro estilo de vida
cujas glórias efêmeras do mundo do entretenimento não valeriam mais do que a
“vaquinha” que traziam para fornecer leite para as crianças da comitiva.
54
Simmel (1983) realizou uma análise sobre a condição do estrangeiro
que parece adequar-se muito bem a condição em que se encontrava o casal Bowen
no sertão de Goiás no final da década de 1930. Para este autor o estrangeiro é:
“(...) por assim dizer, o viajante potencial: embora não tenha partido, ainda
não superou completamente a liberdade de ir e vir. Fixou-se em um grupo
espacial particular, ou em um grupo cujos limites são semelhantes aos
limites espaciais. Mas sua posição no grupo é determinada,
essencialmente, pelo fato de não ter pertencido a ele desde o começo, pelo
fato de ter introduzido qualidades que não se originaram nem poderiam se
originar no próprio grupo” (p.1).
Assim é nesta condição de “estrangeiros” que Joan Lowell e Leek Bowen se
encontram no primeiro momento em que viveram em Goiás, e foi a partir desta
condição que eles foram se adaptando a sociedade goiana. O estrangeiro é um
elemento do próprio grupo, mas está fora dele; ao mesmo tempo em que ele está
próximo, ele está distante. Nas relações do estrangeiro e nas relações com ele, os
mesmo elementos que aumentam a distância e que os separam, também fazem
com que se crie uma rede de interação (SIMELL, 1983). O casal Bowen estava
naquela região para abrir uma estrada para que se pudessem colonizar as terras
daquela região, eram, portanto uma espécie de colonizadores como tantos outros
que partilhavam da mesma situação, no entanto eles eram estrangeiros e sobre os
hábitos e modos de vida de quem vivia naquele lugar eles pouco sabiam. E então
estavam perto e longe ao mesmo tempo daquela realidade.
A comitiva dos mineiros ainda permaneceu algum tempo junto com Joan e
seu marido, esperando que Bowen abrisse uma picada na mata o suficiente para
eles passarem rumo ao oeste. Nos outros dias Joan Lowell conseguiu trocar dois
filhotes dos seus cachorros de caça que trouxera de Nova York, por uma vaca; e
aprendeu com uma destas mulheres como fazer uma argamassa composta de
55
estrume de vaca, argila e terra de cupim para a construção de sua casa. A idéia que
não agradou em nada a Bowen, mas Joan acabou construindo o que ela chamou de
Mansão Bowen. A primeira caravana partiu, mas havia chegado outra, que logo
foram contratados para ajudar na estrada apesar do casal não ter dinheiro, eles
julgavam receber uma grande parcela de terras para as quais estavam abrindo a
estrada, e com elas pagariam suas dívidas (LOWELL, s/d: passim).
2.5. A mais Corajosa das Mulheres
O capitão Bowen armou acampamento mais adiante para acelerar o feitio da
estrada, e Joan passou a ficar sem o marido, somente com a companhia de dois
outros homens, durante a semana. Dizia ela não ter medo, pois tinha os seus
cachorros e, também por que passava boa parte do seu tempo misturando os
ingredientes da tal argamassa e revestindo as paredes de sua casa. Eis que um dia
chega acompanhado de Acidino, um de seus funcionários, um garimpeiro montado
em um burro, quede tão cansado precisava de ajuda. Depois que Joan o ajudou ele
a ofereceu o resultado de seus trabalhos, grandes pedaços de quartzo de ametista
violeta, e segundo o garimpeiro, que se chamava João batista: “O cristal dá mais!
Vai haver guerra e o seu país vai comprar muito cristal” (LOWELL, s/d: p. 115).
Mas como Joan não tinha dinheiro o mineiro aceitou trocar alguns cristais
por uns “sete quilos de café”, e ela então mandou cortar alguns velhos pés de café
selvagens para colher esta quantidade deste grão. Joan tinha uma mentalidade
muito diferente da mentalidade do povo do sertão que retirava da natureza quase
tudo que precisava para sobreviver, e cuja simplicidade e não permitiria “Cortar uma
56
coisa viva, para trocá-la por uma que não tem vida, nem sangue, nem sentimento”
(LOWELL, s/d: p.116). Novamente Joan Lowell passa por uma situação em que há
um choque de mentalidades, a atriz/escritora representava a mentalidade capitalista
e João Batista traduzia a maneira de pensar tradicional do homem do sertão.
“A senhora pensa errado. Assim como quando me perguntou se eu sabia
onde havia ouro e por que não apanhara uma sacola cheia. Só procuro ouro
quando preciso de dinheiro para comprar uma picareta ou uma enxada, ou
balas. O dinheiro me serve, não sou eu que sirvo o dinheiro” (LOWELL, s/d:
p.116).
Mesmo assim João Batista manteve a sua palavra e trocou os cristais com a
atriz/escritora. Quando seu marido voltou para o acampamento ela contou-lhe sobre
os cristais que o mineiro possuía e que queria vender para eles por vinte dólares, e
que quando vendidos no armazém de Diony, um comerciante de Jaraguá, renderiam
um total de dois mil dólares, dinheiro suficiente pra sanar todas as dívidas do casal e
garantir a continuidade da estrada. Eles tentaram alcançar João Batista, mas não
conseguiram (LOWELL, s/d).
Nesta época a situação do casal e de seus funcionários estava insuportável,
e ainda se depararam com uma pedreira no caminho da estrada. Leek Bowen
estava muito desanimado e lamentava ter colocado Joan naquela situação. Para
piorar ainda mais a situação, um capanga, temendo que a estrada viesse a viabilizar
a diligências da polícia em busca de contraventores, começou a sabotar o pedaço
da estrada que já tinha sido aberto (LOWELL, s/d).
Sem dinheiro, acumulando dívidas com os funcionários e com a estrada
sendo sabotada, o casal Bowen vivia seu pior momento. O citado Diony, o dono do
armazém de Jaraguá, e outros homens ali reunidos, inclusive um grupo que queria
57
fundar a cidade de Castinópolis nas proximidades daquela região e que esperava
apenas que Leek Bowen avançasse mais a estrada para que eles pudessem chegar
ao local escolhido com um caminhão, doaram mantimentos e ferramentas para que
o casal continuasse a abrir a estrada. Pois segundo Diony “o país precisa somente
de estrada para progredir”, e muitas pessoas já depositavam confiança nas
possibilidades que a estrada que estes norte-americanos estavam abrindo, e Leek
Bowen iria ser conhecido como o “benfeitor do Estado de Goiás” (LOWELL, s/d:
passim).
A atriz/escritora mencionou sobre um grupo que planejava a fundação de
Castinópolis, mas está cidade nunca existiu, então certamente ela falava sobre
Castrinópolis, um distrito de Jaraguá que localizava-se na mesma região de Goiás
em que ela se encontrava naquela época, mas desde 10 de junho de 1980 a lei
estadual n° 8.845 a localidade pertence a cidade de Rialma.
O hábito de ajudar os sertanejos fazia com que centenas de famílias que
vieram por causa da estrada e se acampavam ao longo dela, depositassem suas
expectativas sobre o casal Bowen, segundo Joan eles acreditavam que os dois
podiam tudo por serem
norte-americanos. Com conhecimento, até considerável
para leigos, sobre primeiros socorros e sobre medicamentos, Joan e o marido
atendiam os mais variados casos, de inflamações, febre tifóide, e ferimento até
partos. Os atos de solidariedade para com o povo do sertão renderam pelo menos
uma situação bastante complicada para Leek Bowen e Joan Lowell.
2.6. Quem Conta um Conto Aumenta um Ponto
58
Certo dia o carteiro Adriano chegou ao acampamento do casal, ele não
trazia a correspondência do grupo paulista com dinheiro para a continuação da
estrada, mas trazia o recado de uma família que tinha em casa três crianças
doentes. Leek e Joan mesmo debaixo de chuva foram ao encontro delas, e as
encontraram bastante doentes, e o diagnóstico foi de que elas estavam com febre
tifóide. Eles então começaram a cuidar delas, a primeira medida foi pedir que as
pessoas que estavam na casa, não os moradores, mas vizinhos das redondezas,
fossem embora, pois se tratava de uma doença contagiosa. Com os parcos recursos
que dispunham trataram as meninas, impondo a elas uma dieta composta somente
por alimentos líquidos, o que incomodava os pais que pensavam estarem as
crianças morrendo de fome. O casal permaneceu com as crianças por três semanas,
e na véspera de natal quando acreditavam que elas já estavam melhores e que eles
poderiam ir embora, recomendaram a mãe que mantivesse a dieta líquida. Depois
de vários dias de vigília ao lado das meninas, Leek e Joan foram dormir em redes no
curral para ir embora logo de madrugada. Infelizmente durante a noite duas das
crianças morreram e os pais acusaram o casal de terem matado-as, os dois foram
então presos na casa só puderam sair quando foi explicado o motivo da morte
(LOWELL, s/d).
Esta é uma das poucas histórias contadas por Joan Lowell que encontramos
referências em outro livro que não fosse o seu. Segundo o Godinho (2005) foi um
médico franzino e recém chegado à Jaraguá, de nome Peixoto de Silveira, que
salvou a vida do casal, quando em um dia durante uma noite de chuva foi chamado
a uma fazenda a mais de 40 quilômetros da cidade, onde só poderia ir de carro até
uma parte da estrada, sendo que o resto deveria ser percorrido à cavalo, o que
certamente fez com que o médico demorasse muito tempo para chegar ao local.
59
“Quando chegou, ainda estava escuro, Peixoto de Silveira encontrou um
cenário de inferno de Dante em uma família de descendentes de alemães
em plena época da Segunda Guerra Mundial. Dois irmãos, sete e 10 anos
mortos num quarto, um deles começando a feder. Moscas no lençol. A irmã
mais nova, de quatro anos, com paratifo, para a qual não existia medicação
eficiente a mão. O médico examinou e também aos cadáveres, que tinham
todos os sinais de terem sofrido da doença. Quando pensou que havia visto
de tudo de ruim naquela noite tenebrosa foi chamado ao curral. De lá
desceu para um paiol onde encontrou presos Joan Lowell, a artista de
Hollywood que na cidade todos já tinham abrasileirado para Dona Joana, e
o marido. Amarrados, famintos, fracos e cercados por homens armados de
carabina. Proibiram Peixoto de se aproximar. Entre Grunhidos e palavrões
os homens explicaram que Dona Joana fora chamada há uma semana, ela
que sempre carregava uma malinha com remédios e cedia gratuitamente
aos fazendeiros da região. A atriz de cinema falava em uma língua
estranha, absolutamente não confiável nos rincões de Goiás e veio dos
Estados Unidos, que estava em guerra contra a Alemanha, país de onde as
crianças mortas descendiam. Peixoto explicou aos familiares irredutíveis
que as crianças morreram de paratifo e não por causa da gringa que , por
única e exclusiva culpa do destino, nascera nos Estados Unidos. Sabe-se lá
que argumentos mais usou, o fato é que salvou a vida de Dona Joana e do
marido “(GODINHO, 2005: p. 93).
A história ainda não terminaria aí, mas é Joan, no seu livro que nos relatou
como acabou este acontecimento. Após ter sido salva pelo médico, atriz/ escritora
voltou rápido para seu acampamento, mas não conseguira ser mais rápida que as
notícias.
Joan conta que quando chegou lá já havia se espalhado a notícia que o
casal havia assassinado as crianças por dois motivos: por raiva, pois o pai delas,
Henrique, era alemão e eles norte-americanos, e a Alemanha e os EUA estavam e
guerra; e também por inveja, pois o casal Bowen não tinha filhos.
Joan passou a ficar mais isolada, e temia, pois ouvira dizer que o pai das
crianças havia denunciado ela o marido, e sempre que ouvia algum barulho, que
agora devido ao trânsito de caminhões na estrada era constante, ela pensava ser as
autoridades que viriam atrás dela o do marido. Até que um dia Henrique foi
encontrá-la para se desculpar e perguntar a ela onde havia colocado as unhas de
tatu que estava na cozinha dele. Joan mal podia acreditar no que ouviu. N noite da
morte das meninas, durante a noite o pai, sob orientação de duas feiticeiras havia
60
caçado um tatu e com as garras do animal havia feito um chá e dado às crianças, e
ainda confessou que deu à elas, depois de dias de dieta líquida, o que comer. E foi
uma comida nada recomendada para pessoas convalescentes: “Carne de porco
frita, feijão e arroz” (p.130). Então Joan, no mesmo momento ficou mais convencida
ainda de ela não havia sido a causadora da morte das crianças (LOWELL, s/d).
Observem que segundo Godinho (2005) os nortes-americanos passaram
uma semana com as crianças, segundo Joan (s/d) teriam sido três semanas ao lado
das crianças, sem trocar de roupa, certamente sem Leek Bowen para orientar a
construção da estrada deveria estar parada. E da morte das meninas até o médico
chegar mais quatro dias, muitos dias para se chegar a um local que ficava a apenas
40 quilômetros de onde o médico partiu. Mas seria a melhora destas meninas mais
importante que a construção da estrada a ponto de mobilizar a atenção de Joan e do
marido, fazendo os desviar do propósito de construir a estrada? O período de chuva
talvez estivesse dificultado o trabalho, mas mesmo assim é pouco provável que eles
pudessem se ausentar por tantos dias. O relato de Joan parece exagerar no tempo
decorrido.
Após este incidente a vida continuou no ritmo normal para Joan Lowell e
Leek Bowen, com a estrada seguindo em frente e atraindo cada vez mais gente,
com as quais Joan aprendia a fazer todo tipo de coisa, de capa de chuva
impermeável, à potes de barro. A atriz/escritora estava cada vez mais adaptada a
vida no sertão goiano, e se gabava de saber fazer geléia de frutas, devido ao fato de
que isto as “pioneiras” não sabiam fazer.
A construção da estrada, graças às doações dos habitantes de Jaraguá,
estava indo bem, a casa de Joan já era uma realidade e eles também já haviam
61
plantado vários tipos de alimentos, e para completar chegou pelo correio um cheque
de São Paulo referente a uma quantia de mil e duzentos dólares. Leek Bowen pagou
suas dívidas com Diony e com seus funcionários, os demais ajudantes da estrada,
pessoa que haviam vindo por causa das terras, aceitaram receber o pagamento em
lotes de terras; Joan disse ter pagado suas dívidas com os filhotes dos seus
cachorros de caça, ela ainda alugava o pasto perto de sua casa para caravanas que
passavam com animais e que iriam pernoitar por ali. Com o conhecimento aprendido
no sertão ela desenvolvera uma espécie de farmácia homeopática em sua casa,
composta de todo tipo de ervas e raízes que possuíam valor terapêutico (LOWELL,
s/d).
O casal estava cada dia mais habituado a vida no interior de Goiás e tudo
parecia estar dando certo. O sertão goiano que outrora tinha sido um pesadelo,
onde haviam passado todo tipo de dificuldade, até fome e acusação de assassinato,
agora era um lugar bucólico, segundo a descrição da própria escritora:
Eu passava horas na clareira, admirando os milagres da natureza. No
milharal, as fôlhas (sic) balançavam-se, graciosamente. As flores do feijão
pareciam salpicos, numa peça desdobrada de organdi. As árvores perto da
clareira cantavam, à carícia da brisa, ou gemiam, ao castigo do vento. Uma
nuvem dominadora chocou-se com outra e desmanchou-se em chuva, que
veio refrescar nossas plantações. O arco-íris apareceu e retirou-se,
modestamente. Um veado começou a pular, no meio das flores de feijão,
mordiscando uma ou outra. De nossa porta, víamos aquelas maravilhas da
Natureza, tais como não existiam nem mesmo na terra da promissão
(LOWELL, s/d: p. 140-141).
Seria um final feliz para a história de Leek Bowen e Joan Lowell e a sua
saga para a construção da estrada no interior do Brasil, assim como nos filmes de
Hollywood, mas infelizmente a história toma um rumo inesperado neste momento.
Diony, o dono do armazém de Jaraguá procurou o casal para lhes dizer que o
cheque que receberam não tinha fundos. O comerciante compreendeu a situação
62
dos dois e não os acusou, Bowen tentou entregar a ele as duas notas de cem
dólares que ele levava na bota, um dinheiro que deixava reservado para a
passagem de volta aos Estados Unidos caso seus planos dessem errado e eles
tivessem que desistir. Diony não aceitou o dinheiro, pois acreditava que o Bowen
pagaria a dívida assim que pudesse. A notícia de que a estrada não iria continuar foi
dada aos outros funcionários, e Bowen decidiu que iria voltar para o mar, voltar a
trabalhar como capitão até juntar o dinheiro para pagar a conta, e enquanto isso
Joan esperaria por ele no acampamento para que os credores não pensassem que
eles haviam fugido sem pagar as contas. Joan ainda tentou animar o marido dizendo
que poderia pagar a dívida com o dinheiro da venda dos cento e vinte mil acres de
terras que o grupo que os contratou prometeram dar a eles, mas Leek Bowen sabia
que não poderiam contar com estas terras pois se mesmo o dinheiro que enviaram
para o custeio da abertura da estrada era um cheque sem fundos, certamente não
deveriam acreditar que receberiam sua parte nas terras( LOWELL, s/d).
2.7. No Caminho de Bernardo Sayão
Foi neste momento que o casal Bowen conheceu um personagem muito
importante para o historia da ocupação do interior do Brasil, Bernardo Sayão, o
homem que tornou real a Colônia Agrícola Nacional de Goiás (CANG), que
participaria da construção da capital da nação e que daria sua vida, literalmente,
para a construção da rodovia que cortaria o país de Brasília à Belém, e que já teria
muitas denominações: Transbrasiliana, Rodovia Bernardo Sayão, Rodovia BelémBrasília ou simplesmente BR 153.
63
Bernardo Sayão de Araújo nasceu em 1901 na cidade do Rio de Janeiro, era
funcionário público formado como engenheiro agrônomo. No ano de 1939 veio a
passeio para Goiás, para conhecer a nova capital, Goiânia, e se maravilhou com
tudo que viu, ele afirmou que somente faltava estradas para que a cidade se
desenvolvesse. Esta viagem é descrita como uma viagem à passeio, veio ele com a
família em seu próprio carro, e após passar por Anápolis, foi para Jaraguá onde
“sondando o terreno” ele foi encontrar com Dr. Augusto Rios, que o levou para
conhecer os campos e fazendas antigas do tempo dos escravos, e segundo Léa
Sayão (1976), e “ lá encontrou o que queria”. A autora não fala o que ele encontrou,
mas é provável que Bernardo Sayão já tivesse algum interesse com relação aquela
localidade.
Certamente o engenheiro estava na verdade em uma viagem de sondagem
ao território goiano. De volta ao Rio de Janeiro, obteve em 1941 para ter uma
audiência com o presidente Getúlio Vargas, para apresentar-lhe suas idéias já
chegou à entrevista com os “seus mapas, minuciosamente assinalados, seus
planos, fortemente traçados”. E saiu de lá como o administrador da Colônia Agrícola
Nacional de Goiás. Voltando a Anápolis se encontrou com Eduardo Cláudio, Luiz
Honório Ferreira, Oliveira Marques e Luiz Caiado de Godoy39 e juntos foram
escolher o local da futura colônia. Em Jaraguá, como se tratava de uma missão
oficial do governo federal o prefeito Antônio de Castro disponibilizou um carro
modelo Ford-29, e a bordo deste veículo eles foram com destino a Castrinópolis
(SAYÃO, 1976).
39
Luis Caiado de Godoy era um engenheiro agrônomo (ROCHA, 2007), sendo provavelmente
parente de Albatênio Caiado de Godoy que segundo a página eletrônica da Prefeitura de Goianésia
possuía registradas deste os anos de 1930 no cartório de Jaraguá, a posse as terras leiloadas da
fazenda Calção de Couro. Estas terras ficavam próximas ao local que segundo Léa Sayão (1976)
Luis Caiado de Godoy ajudou a escolher junto com Bernardo Sayão para ser fundada a CANG.
64
Esta localidade foi instalada na rota da estrada construída por Leek e Joan.
Léa Sayão (1976) comenta que essa estrada, por causa das chuvas, havia se
tornado tão precária que fazia o precário trecho Jaraguá-Anápolis, parecer uma
rodovia asfaltada. Bernardo Sayão e a comitiva tiveram que seguir a pé depois que o
carro estragou, até chegar à casa de Dr. Antônio Carlos de Araújo, onde se
hospedaram. O local designado nos planos oficiais para iniciar a colonização do
Planalto do Brasil Central seria a oeste de Jaraguá.
Joan (s/d) descreve longamente seu encontro com Bernardo Sayão. Este
teria ouvido falar de um casal norte-americano que tinha se aventurado a abrir uma
estrada no interior de Goiás, rumo às florestas do Vale do São Patrício. O
engenheiro chegou à casa dos norte-americanos e se apresentou a Joan e ao
marido, e falou sobre sua missão de abrir uma estrada e colonizar terras que seriam
dadas gratuitamente a pequenos produtores. Como o casal Bowen já estava indo
para o leste do Rio das Almas, Bernardo Sayão explicou a eles que havia percebido,
após uma análise feita do alto, a bordo de um avião, que a estrada contruída pelo
casal Bowen poderia ser usada para se chegar ao local que havia escolhido para
fundar a CANG.
Joan afirmou que nem mesmo eles poderiam prever o quão importante era
aquele encontro para o futuro daquela região:
Mal sabíamos, naquele momento, que estávamos recebendo em nossa
casa um homem que ficaria na história como o fundador do “Império do
Brasil” central. Nem podíamos imaginar que êle (sic) iria facilitar o
transporte, no interior, por estradas e pelo rio, criando aquilo que iria servir
40
ao Brasil, como St. Louis serviu aos Estados Unidos, na marcha para o
Oeste. Saião (sic) iria permitir que o misterioso Rio Tocantins, cujos
40
Cidade americana que foi adquirida da França pelos Estados Unidos como parte da compra da
Lousiana. O local se transformou mais tarde no ponto de partida dos exploradores do oeste
americano, dos garimpeiros e colonizadores e todo tipo de aventureiro que emigraram para o oeste.
65
41
afluentes nascem no famoso Rio da Dúvida, de Teddy Roosevelt , pudesse
42
ser navegado como o Mississípi . Sôbre (sic) os trechos de nossa modesta
estrada, feita com picaretas, enxada e facões, um dia passariam frotas de
máquinas americanas, tratores e raspadeiras, que fariam de Goiás o centro
o celeiro do Brasil – o que tornaria tão importante que seria aprovada uma
lei, no sentido de ser mudada a capital da República para o planalto de
Goiás (LOWELL, s/d, p.151-152).
Além de usar a estrada feita por Leek Bowen, Bernardo Sayão ainda o
convidou para ajudá-lo a estabelecer a rota que deveria tomar a estrada que ele iria
abrir. Em uma viagem de avião dias depois Leek Bowen mostrou para Bernardo
Sayão os limites das terras em que eles estavam abrindo a estrada (LOWELL, s/d).
O engenheiro começou a tomar as primeiras providências para a instalação da
Colônia, era preciso abrir uma estrada e ele “aproveitou o traçado da estrada
existente” (da estrada do casal Bowen). E numa de suas passagens por Anápolis
Bernardo Sayão conheceu o Dr. James Fanstone que se tornaria posteriormente o
médico da Colônia (SAYÃO, 1976: p.52).
2.7.1. James Fanstone
Embora tivesse nascido na cidade de Recife em 1879, o médico e
missionário evangélico James Fanstone foi criado na Inglaterra, onde realizou seus
estudos em medicina. Casou-se com Ethel Marguerite Peatfield, conhecida como
Dona Dayse, e vieram para o Brasil. Enquanto preparava uma tese para ser
apresentada na Universidade de Minas Gerais, para poder ter reconhecido seu
diploma de bacharel no Brasil, ele visitou Goiás com alguns missionários
41
Theodore Roosevelt foi convidado pelo Marechal Rondon para uma expedição que iria determinar a
rota de um curso d'água, conhecido como rio da Dúvida, o rio acabou sendo batizado de rio
Roosevelt. Porém a Joan Lowell se enganou em seu comentário, pois o rio Roosevelt é afluente do
rio Madeira e não do rio Tocantins, que tem seus afluentes no interior de Goiás.
42
O segundo maior rio dos Estados Unidos.
66
presbiterianos. Ao visitar Anápolis, por volta de 1924, resolveu fundar um
nosocômio. Construído depois de algum tempo com recursos próprios, o Hospital
Evangélico Goiano foi inaugurado em 1927. Era um prédio de seis andares,
equipado com elevador e com aparelho de Raio X. Fanstone participaria ainda em
Anápolis da fundação da terceira escola de enfermagem do país, a Florence
Nigthingale, em 1934 e do colégio Couto Magalhães, em 1932 (GODINHO, 2005).
Na década de 1920 ele se estabeleceu nesta cidade goiana “(...) because it
just couldn't go any place but forward”43, e se tornou um personagem lendário da
história de Anápolis, mas sua fama se espalhou muito além, por vários lugares do
mundo devido ao seu trabalho de atendimento dos moradores da cidade e da
região. Fanstone recebeu vários títulos e medalhas nacionais e internacionais
(GODINHO, 2005). Além disso, este médico foi uma pessoa muito importante para a
história de Leek Bowen e Joan Lowell, e principalmente para Bernardo Sayão.
2.8. A Marcha Para o Oeste e a CANG
Após a visita de Bernardo Sayão ao acampamento do casal Bowen, todos se
encheram de esperança. A abertura da estrada e a fundação da Colônia
acarretariam a valorização da das terras e com o dinheiro de sua venda, Joan e
Bowen conseguiriam sanar todas as dívidas e pagar seus funcionários (LOWELL,
s/d).
No inicio do governo de Getúlio Vargas o clima era de muitas promessas
para a solução dos problemas do campo, o governo se mostrava sensível aos
43
“(...) porque simplesmente não podia ir para qualquer lugar, mas a frente.” (TIME, 17-junho-1948,
tradução livre).
67
apelos daqueles “que trabalhavam, mas ficavam sem o fruto do seu trabalho”.
Aparentemente as medidas tomadas pelo governo Vargas democratizavam e
possibilitavam o acesso as terras pelos colonos (LENHARO, 1986).
Foi também com a chamada Marcha para o Oeste, do governo de Getúlio
Vargas, que a partir dos anos de 1930 começou “a aceleração das atividades
econômicas em direção ao marasmo que é o sertão”, buscando a “ eliminação do
fosso cultural
que ora divide sertão
e litoral”. O projeto governamental de
desenvolvimento do interior buscava a modificação da mentalidade e dos modos de
vida do sertanejo, domesticando a aspereza do território e disciplinando o sertão
pelo uso econômico da terra e pela subordinação das pessoas ao governo (SOUSA,
1997, passim).
E Joan e Leek Bowen como tantas outras pessoas também
passaram a depositar confiança nas melhorias vislumbradas a partir da instalação
da CANG em Goiás.
Para Borges (2008) durante o governo Vargas o campo representava uma
parte vital na vida econômico da nação, e a necessidades de abastecimento do setor
industrial e do mercado urbano foi um poderoso incentivo para a diversificação da
produção agrária no país. Nesta conjuntura política o governo desenvolveu a
“Marcha para o Oeste”, com o intuito de integrar, ocupar e modernizar o oeste
brasileiro, equiparando-as com as áreas mais desenvolvidas do país. As colônias
agrícolas são, portanto a tentativa oficial de ocupação do território (SILVA, 2002).
A política de interiorização do governo federal preconizava a criação de
colônias agrícolas nas regiões consideradas mais frágeis do país. No
Estado de Goiás foram fundadas a Colônia Agrícola de Goiás (CANG), em
1941 e a Fundação Brasil Central, em 1943 (LISITA, 1996: p.33).
68
Assim, Bernardo Sayão juntamente com sua esposa fixou moradia em
Anápolis, no interior de Goiás, e na região do Vale do São Patrício instalou a Colônia
Agrícola de Goiás. Os materiais e os maquinários foram mandados pelo Governo
Federal, e o administrador orientou a construção do acampamento, nas
proximidades do rio Padre de Sousa, a colônia teve como primeiro médico e amigo
de Bernardo Sayão, o Dr. James Fanstone.44 Entre Anápolis e Jaraguá Bernardo
Sayão começou a construção de uma rodovia com a colaboração da prefeitura das
duas cidades, o objetivo era seguir sempre ao norte para se vencer os 142
quilômetros que separavam Anápolis do local onde estava sendo construída a
CANG (SAYÃO, 1976).
A Colônia Agrícola em 1941 já era uma realidade, e foi lá que Bernardo
Sayão construiu sua casa onde morava com a família: sua segunda mulher, as filhas
do primeiro casamento e os seus outros filhos. A colônia contava com escolas, um
hospital provisório, oficina para reparos e almoxarifado. Cada família tinha direito a
uma casa “popular”, ou seja, modesta, e a um lote de terras de 30 hectares para
produzir, a produção era do próprio produtor. Um enorme contingente de gente veio
de vários lugares do país atraídos pela fama da CANG. Mas apesar da popularidade
e do financiamento federal na Colônia Agrícola tudo era construído com muito
esforço, pois:
A verba era curtíssima para tantos trabalhos e quase sempre chegava
atrasada. A Colônia Agrícola torna-se um pequeno povoado. Dr. Fanstone
continua dando assistência médica, e papai cada vez mais aumentando os
serviços e planos, e a verba não era suficiente. Aos poucos, aparece o
pequeno comercio: armazém, farmácia, cinema, sorveteria e armarinhos,
etc (SAYÃO, 1976, p. 66).
44
A amizade entre Bernardo Sayão e James Fanstone provavelmente influenciou esse último na
escolha do nome que daria a Faculdade de Filosofia Bernardo Sayão, instituição de ensino superior
de Anápolis “criada pelo CCM”, o Colégio Couto Magalhães (dirigido durante muitos anos pelo próprio
Fanstone) na década de 1960 em Anápolis (ABREU, 1997: p. 119).
69
Segundo Dayrell (1974) a Colônia Agrícola de Goiás tinha uma estrutura
muito frágil, a situação dos agricultores era, no geral, precária mesmo com as
benfeitorias que ali haviam sido construídas. A CANG foi um exemplo de experiência
colonizadora que não funcionou, em grande parte também por que os agricultores
não tiveram auxilio adequado, e desconhecendo o trato adequado para o solo,
utilizaram técnicas de cultivos impróprias para aquele tipo de terra causando enorme
devastação ambiental na região. O município de Ceres, criado a partir da colônia é
um dos maiores legados da antiga colônia, pois a colonização da Marcha para o
Oeste fracassou enquanto projeto que possibilitasse a democratização do acesso a
terra. Entretanto, para o governo ela criou as condições para a ocupação, e
conseqüentemente, expansão do sistema capitalista e desenvolvimento econômico
no interior do país.
2.8.1. Joan Lowell e Léa Sayão
Quando as primeiras construções foram erguidas na colônia, Bernardo
Sayão levou sua família de Jaraguá para morar lá. Vieram até suas filhas do
primeiro casamento Laís e Léa que moravam no Rio de Janeiro, esta última se
tornaria uma grande amiga de Joan Lowell. No entanto, Joan sequer chega a citar o
nome de Léa em seu livro, e esta também quando escreveu uma espécie de
biografia sobre seu pai escreveu muito pouco sobre a atriz/escritora com quem
manteve contato durante vários anos.
Outro dado curioso é que Joan apesar de estar morando com seu marido na
região onde foi construída a CANG e de afirmar em seu livro que Leek Bowen
70
ajudou Bernardo Sayão no inicio da construção da colônia, ela nada escreveu sobre
a CANG, e parte logo para outro assunto deixando a entender que não teria se
envolvido com o projeto colonizador orientado por Bernardo Sayão. No entanto no
verso da capa da biografia redigida por Léa Sayão, encontramos um texto escrito
por Joan Lowell que evidencia no mínimo duas coisas: Léa e Joan ainda tinham
algum tipo de contato mesmo depois que ambas se afastaram da região da colônia
agrícola, pois a atriz/escritora escreveu uma espécie de apresentação para a
biografia sobre Bernardo Sayão, que sua filha lançou anos depois de sua morte;
Joan manteve uma relação próxima a família Sayão, pois neste texto Joan descreve
cenas da vida cotidiana de Léa da época que ela viveu na Colônia com seu pai com
bastante intimidade, deixando entender que ela presenciou algumas destas cenas.
Os brinquedos de Léa eram animais os quais ela colecionava
freqüentemente, tais como: uma avestruz, um veado, um potro, uma malta
de cachorros viralatas(sic) e um tamanduá. A avestruz consumia a escassa
ceia, o veado debaixo da mesa escoiceava pedindo mais atenção e o potro
crescia como um garanhão acostumado a estragar latas na dispensa em
busca de rapadura; os viralatas (sic) produziam cachorrinhos sobre as
camas e Léa nunca escondia o seu amor pelos seus mimalhos, não
obstante isso enfadar sua irmã e sua simpática madrasta. Enquanto moças
da idade de Léa debutavam no Rio, ela estava nas selvas, banhando nas
frias águas dos rios das Almas, indo a alguma roça para buscar mamão e
algumas vezes uma abóbora, para a refeição da família. Eu me lembro
muito bem de Léa (grifo nosso) sentada num toco seco debaixo de uma
barraca coberta de capim, ensinando os cansados trabalhadores a ler e a
escrever, sob a luz de uma lamparina de querosene. (...) Dezoito anos atrás
Bernardo Sayão disse-me: “Se alguma coisa me acontecer, Joana, proteja
Léa, ela sentirá muito a minha falta”. Dois anos depois eu vi o brilho dos
risonhos olhos de Léa obscurecerem pela brutal morte de seu pai. (...) muitos de nós, que viveram e sofreram ao lado de Sayão (grifo nosso),
marcando para o Oeste, poderiam ter escrito este livro, mas deixamos para
Léa fazê-lo para a posteridade. Este é um livro que viverá. JOAN LOWELL
(LOWELL, 1976 apud SAYÃO, 1976: verso da capa, grifo nosso).
Isto mostra que apesar de não ter comentado em seu livro Joan
aparentemente deve ter convivido ao menos por algum tempo em companhia da
família Sayão quando eles viviam na colônia. Percebe-se também que ela mantinha
certa intimidade com a família e que era uma pessoa em que Bernardo Sayão
71
confiava a ponto de recomendar que ela cuidasse de sua filha caso algo ocorresse
com ele. No seu livro Léa afirma que Joan era a “velha amiga, ‘Joana’ como papai a
chamava” (SAYÃO, 1976: p. 300).
O casal Bowen pode também ter somente visitado a colônia: “As vistas que
recebíamos eram inúmeras, estrangeiros vinham de longe, escritores ficavam
estupefatos com esta região tão rica”. Em outra passagem do livro quando Léa
relata que seu pai trouxera do Rio de Janeiro, um comboio de maquinários para a
colônia, em uma das paradas ela afirma terem recebido “várias visitas, inclusive
amigos americanos, a família Platt, de Chicago, acompanhada do casal Capitão
Bowen” (SAYÃO, 1976: passin, grifo nosso).
2.9. “Cobra-Sêca” está chegando!
A despeito de todas estas evidencias Joan Lowell não relatou nada em
relação a colônia além daquele contato com Bernardo Sayão do qual já falamos.
Talvez por que ela e o marido tenham sido vítimas de um golpe de acabou por fazêlos perder a terra que haviam obtido a partir da abertura da estrada.
Este golpe que também foi aplicado em muitos pequenos agricultores é uma
espécie de antecedente dos conflitos no campo em Goiás, que embora datados a
partir dos governos militares de 1964, começaram a serem gerados na década de
1940 devido ao fato da CANG não ter podido absorver todos contingente migratório
que para lá se dirigiu, e que não encontrando terras disponíveis na colônia tiveram
que procurá-las em outras regiões (MIZIARA E SAMPAIO, 2008).
72
Apesar das dificuldades devido ao atraso no pagamento pelos seus serviços,
Joan e seu marido se acostumaram com a vida no acampamento. Joan havia
construído a sua casa, possuindo uma plantação destinada ao consumo próprio nos
arredores, mas esta felicidade teve curta duração. Certo um dia chega um advogado
dando-lhe a noticia de que a as terras que estavam desbravando tinham sido
vendidas para uma empresa do Rio de janeiro, que oferecia ao casal Bowen uma
quantia irrisória pelas benfeitorias que havia construído. Estes não aceitaram
negociar com o advogado, que avisou-lhes que teriam quinze dias para mudar-se
dali. Este homem era conhecido como “Cobra-sêca”, um tipo de advogado
desonesto que se especializava em grilar terras.
Segundo Miziara e Sampaio (2008) o grileiro é o personagem central no
processo de transformações das relações sociais no campo, quando houve a
passagem da frente de expansão para a frente pioneira. Ele geralmente agia e
revelia das regras legais usando todo tipo de violência e falcatruas para expropriar a
terra de pequenos proprietários que não queriam vender sua terra, ou posseiros que
apesar de trabalharem na terra não tinham a posse legal dela.
Nas regiões da chamada “fronteira agrícola”, foram muitos os conflitos,
opondo posseiros a grileiros que, com base em títulos por muitas vezes
falsificados, procuravam dar novo destino às terras, um destino que excluía
a presença dos ocupantes como produtores autônomos. Essas tensões
normalmente vieram na esteira da valorização (ou muitas vezes, na
perspectiva de valorização) das áreas e da transformação da terra em
mercadoria (MEDEIROS, 1989, p. 35).
Posseiros e grileiros são personagem muito diferentes, pois enquanto o
primeiro usava a terra para trabalhar e tirar o seu sustento dela, os grileiros usavam
a terra como reserva de valor. Ele obtinha títulos de propriedade de terras, muitas
73
vezes forjados, e exigiam a retirada do agricultor,
e se este não saíssem eles
empregavam a força necessária (MIZIARA e SAMPAIO, 2008).
O tal Cobra-Sêca usou de uma estratégia criminosa para expulsar o casal
Bowen de suas terras: envenenou os animais e posteriormente espalhou o boato de
que o acampamento estava sob “mau-olhado”. O casal acabou ficando isolado por
que as pessoas tinham medo de que qualquer contato com eles os fizesse ficar com
má sorte.
Joan Lowell conta que ficou tão atordoada com a notícia e com os
acontecimentos posteriores que entrou em um quadro depressivo e teve que ser
internada no Hospital Evangélico Goiano em Anápolis, e depois disso nunca mais
voltaram para sua casa.
2.10. A Frente de Expansão e a Frente Pioneira
Joan Lowell e Leek Bowen poderiam ser considerados um dos pioneiros na
colonização do interior do Planalto Central, pelo menos se considerarmos a região
do Vale do São Patrício. Entretanto, como demonstramos anteriormente ambos
chegam a este local num momento anterior ao desenvolvimento do programa
governamental que instituiu a CANG.
A autora faz observações sobre a grande imigração que chegava a cada dia
pela estrada por eles aberta. Essas pessoas iniciaram o povoamento da
região das Matas do São Patrício no final dos anos 30 e início dos anos 40,
anterior, inclusive à política da Marcha para o Oeste (Silva, 2002: p. 19).
O casal Bowen chega à região do Vale do São Patrício antes mesmo da
chegada de Bernardo Sayão, que é tradicionalmente lembrado como o desbravador
e pioneiro na colonização daquele território, no entanto:
74
A partir dessas observações pode-se perceber que o processo de ocupação
antecede ao discurso da Marcha para o Oeste. A construção da estrada
para a fazenda Lavrinhas pelos norte-americanos, a vinda da família do Sr.
José Alves Todedo (sic) são experiências de ocupação do espaço que não
estariam inseridas na política da Marcha para o Oeste. Todavia essas
experiências se enquadram no contexto das chamadas frentes de
expansão, ainda aventureiras. A ocupação que se processava nessa região
tinha como elemento motivador a construção da ferrovia anapolina, que se
apresentava como ponto de partida para a ocupação do Mato Grosso
Goiano (SILVA, 2002: p. 21).
Para entendermos por que estes norte-americanos não são considerados os
pioneiros no desbravamento daquela região temos que recorrer a diferenciação que
Martins (1997) fez dos dois momentos da ocupação das terras brasileiras.
Estes primeiros indivíduos que vieram explorar o território de Goiás eram em
grande parte pequenos agricultores que não possuíam terras e estavam à procura
de novas áreas. Era uma frente de expansão, quando a ocupação do espaço se
dava ainda sem a mediação do capital, predominando em geral relações nãocapitalistas. Num segundo momento, temos em Goiás o desenvolvimento de
relações plenamente capitalistas, que se acentuaram com a chegada da ferrovia,
com a política varguista da Marcha para o Oeste e com a construção da Colônia
Agrícola de Goiás, e principalmente após a transferência da capital para Goiânia em
1937. Estes fatos fazem parte de um período em que muitos colonos foram expulsos
das terras, sendo substituída pela frente pioneira que modernizou a agricultura
brasileira em bases capitalistas. Na substituição da frente de expansão pela frente
pioneira tem se a passagem da produção de excedentes para a produção de
produtos para o mercado consumidor (MARTINS, 1997). A ocupação das terras
goianas foi um processo que se realizou de duas formas, pelo apossamento e pela
compra, e enquanto a frente de expansão ocorria, a frente pioneira também se
efetivava (CHAUL, 1999).
75
No caso do casal Bowen, eles representavam a frente de expansão, pois
chegaram para desbravar o território goiano e mesmo tendo vindo contratados por
uma empresa, naquela região eles desenvolveram relações não capitalistas com os
habitantes locais, mas quando Bernardo Sayão, o representante da frente pioneira,
vem para a região tem se o desenvolvimento de uma agricultura voltada para o
mercado, a colônia e os seu habitantes eram produtores que produziam não
somente para o seu sustento, mas para o mercado externo.
2.11. Em Anápolis
Quando ficou doente Joan foi trazida para o hospital dos missionários
ingleses. Não tinha terra, nem dinheiro, seus únicos bens eram nove filhotes de
cachorro de caça filhos daqueles cães que ela trouxera de Nova York, e que ela
esperava vender para conseguir algum dinheiro. E como não tinham nem onde
morar Dona Dayse Fanstone e seu marido, o médico James Fanstone, ofereceulhes uma fazenda que a família usava para passar o fim de semana. Para alimentar
os cachorros Joan conta que varria as cascas em busca de arroz que as cerealistas
da cidade beneficiavam, o casal cuidava da fazenda da família Fanstone para pagar
a conta do hospital e a estadia na propriedade deles (LOWELL, s/d).
Joan mandou uma carta oferecendo seus cachorros para um fazendeiro
milionário que se interessava por cães de caça. Esta relata que o tal fazendeiro
chegou sem se identificar, falou somente que se chamava José Martim e vestia-se
como um peão. Fez uma boa oferta pelos filhotes e pelos dois cachorros maiores, e
disse que buscaria os animais mais tarde. Quando chegou para buscar os cães ao
76
entregar o cheque o casal Bowen percebeu que o nome do comprador não era José
Martim como havia dito, pois o cheque estava assinado em nome de Quincas
Borges, um fazendeiro milionário que lidava com gado perto de Anápolis. Joan
acrescenta ainda que empresário pagou a ela mais dinheiro que o combinado pelos
cachorros e ainda ofereceu um touro Zebu puro sangue para o casal (LOWELL, s/d).
A autora falava neste trecho de um grande fazendeiro que criava gado numa
fazenda no interior de Goiás. Foram alguns membros da família Borges que em
meados do século XX viajaram para a Índia para comprar outras raças gado, e
trouxeram novas raças zebuínas para o Brasil, inclusive o gado da raça Gir.45
Apesar do casal Bowen não estar mais nas proximidades da colônia,
Bernardo Sayão nunca deixou de visitá-los, foi ele inclusive quem lhes trouxe a
notícia de que a empresa do Rio de Janeiro que havia comprado as terras onde o
casal Bowen tinham vivido queria dar uma compensação pela estrada que abriram.
Ele trouxe também um mapa para que o casal Bowen escolhesse o local da sua
gleba de terras, mas no dia em que eles foram assinar os papeis no cartório de
Jaraguá descobriram que tinham que pagar o equivalente mais de dois mil dólares
de impostos para poderem registrar as terras em seus nomes, e como não possuíam
está quantia acabaram voltando para casa sem a posse das terras. Joan resolveu
então apelar para o governador-interventor do estado de Goiás Pedro Ludovico
Teixeira46. Joan foi de carona à capital, e ao chegar na sede do governo, o Palácio
das Esmeraldas diz que não teve problema algum para ser recebida em audiência
pelo governador, que afirmou inclusive que tinha ouvido falar sobre o casal Bowen e
45
Jornal Opção On Line, Goiânia, 07 a 10-Jun-2004.
Pedro Ludovico Teixeira foi interventor federal no estado de 1930 a 1933, e governador de 1935 a
1937, novamente interventor durante o Estado Novo (1937-1945), e governador eleito de 1951 a
1955.
46
77
que possuía um dossiê sobre eles. Pedro Ludovico isentou-os do imposto de
transferência por meio de decreto, e assim o casal finalmente pode tomar posse da
fazenda que era seu grande sonho (LOWELL, s/d).
78
CAPÍTULO 3. THE END?
O final de seu livro descreve como ficou a situação da atriz/escritora e seu
marido após a posse da fazenda. Dizia ela ter uma casa confortável com piscina, e
produzir café na sua propriedade, e ainda deixou claro que Leek Bowen não se
acostumou com aquela vida pacata e planejava ir em busca de novos rincões em
outras regiões do Brasil (LOWELL, s/d) .
No entanto a história do casal Bowen em Goiás não está no fim, foi neste
momento que começou uma nova fase em suas vidas, agora em Anápolis a partir da
década de 1940. Nesta cidade onde viveram por muitos anos, Joan destacou-se na
sociedade, ela somente deixou este município quando começaram a construção de
Brasília quando foi morar na região da capital federal, onde viveu outras aventuras,
mas esta é uma outra fase da história desta pioneira.
Joan após sair da região do Vale do São Patrício afirma que nunca mais
voltou para a aquele acampamento, a fazenda que segundo ela a tornaria “a rainha
da mais bela fazenda de café, do Estado” era em Anápolis, produzia café, e foi
batizada com o nome de Ancoradouro, ou Anchorage47, sinônimos em inglês e
português para denominar lugar onde os navios ancoram (palavra que remetia a
certo passado ligado ao mar e a navios comum a Joan e ao marido). A atriz/escritora
era figura conhecida na cidade pelo nome de Dona Joana e fazia parte da sociedade
Anapolina. Em sua casa recebeu certa vez o embaixador norte-americano que
47
No seu livro o nome da fazenda aparece grafado como Ancoradouro, mas em um documento da
Fraternidade Eclética Espiritualista Universal registra a denominação em inglês Anchorage.
79
visitava a cidade48. Causava espanto entre os moradores ao dirigir seu jipe pelas
ruas da cidade, armada e vestida de calça Jeans,49 hábito nada comum para as
mulheres do interior do país. Apesar de ser considerada uma cidade moderna a
Anápolis nas décadas de 1940 e 1950 era uma localidade provinciana, imperando
um resoluto machismo patriarcal, próprio de uma região cujo código de conduta
ainda se guiava pela lógica da rusticidade e da valentia. Ainda na década de 1970,
um jornal anapolino publicou uma matéria com o seguinte título: “Igualdade dos
Sexos, Triste balela da Utopia Marxista”, na qual o autor criticava a política de
igualdade dos sexos empreendida na Rússia que segundo o mesmo “obrigava” a
mulher a trabalhar fora do lar nas mesmas atividades que os homens, o que
causava prejuízo para a saúde da própria mulher e para a educação dos filhos, e um
profundo um desequilíbrio social.50
Desde que chegou a Anápolis Joan carregava consigo uma arma de fogo
(da marca Smith and Wilson), trazida dos EUA. Quando da abertura da estrada rumo
a oeste do estado partindo da região de Jaraguá portava esta arma, mas
aparentemente a atriz/escritora nunca a usou, exceto quando saia à caça de
animais, hábito que felizmente, como a própria afirmou, não levou a adiante
(LOWELL, s/d).
Quando Joan veio morar em Anápolis, a cidade que quando ela chegou era
o município mais moderno do estado, continuava a ser uma cidade muito importante.
Tanto que uma reportagem do da revista norte-americana Time descreve assim a
cidade:
48
Jornal O Anápolis, Anápolis, 24-junho-1945: p.01.
Segundo depoimento de Armando Bulcão, cineasta que está produzindo um filme sobre as
celebridades de Hollywood que viveram no interior de Goiás, em entrevista ao jornal Contexto
(Anápolis, 22 a 28-jun-2005, p.07).
50
Jornal Folha de Anápolis, Anápolis, 13-dezembro-1971, p. 04.
49
80
It takes four days & nights by rail to reach Annapolis, gateway to the rich
backlands, and longer if the trip is made by road. But from the lush lowlands
of the north and the coffee fazendas to the south, 50,000 Brazilians a year
are passing through muddy, roughhewn Anapolis in search of new homes
and new times, just as U.S. pioneers a century ago left the Atlantic coast
and headed west. Many who come to Anapolis are on their way to the new
Government Colonia Agricola Nacional and its embryonic town of Ceres.
The Colonia, one of seven set up by Dictator Vargas in 1941, and the most
successful, is an experiment in agrarian socialism. To poor men it holds out
51
the promise of free land, home, security (Time, 07-abril-1947).
Durante o desbravamento das terras do Planalto Central, Anápolis era a
referência, a fronteira econômica. Uma cidade contrastante na década de 1940,
onde salas de cinemas, bandas de jazz, vôos internacionais diários e um vigoroso
comércio conviviam com todos os problemas urbanos e a precariedade de uma
cidade do interior do Brasil na primeira metade do século XXI. Parece muito
contrastante que estas realidades pudessem conviver tão próximas, mas era na
relação entre o moderno e o arcaico, entre o tradicional e o inovador que consistia
singularidade da essência urbana e social da cidade.
A cidade de ruas de terra era escala de vôos diários internacionais para
Chicago52 ou para Miami nos EUA; passando por Port of Spain, capital de Trinidad e
Tobago; e por Trujillo no Peru; além de vôos para cidades brasileiras como Belém,
Rio de Janeiro, Poços de Caldas, Porto Alegre e São Paulo, com viagem realizadas
em “ aviões Douglas confortáveis, rápidos e seguros”.53 Mas na década de 1950 a
situação de Anápolis devido ao aumento populacional e a expansão urbana,
51
Demora quatro dias e noites de comboio para chegar a Anápolis, porta de entrada para o rico
sertão, ou mais, se a viagem for feita por via rodoviária. Mas, desde as planícies verdejantes do norte
e das fazendas de café do sul, 50.000 brasileiros por ano, estão passando pela lamacenta e grosseira
Anápolis em busca de novas casas e novos tempos, como os pioneiros norte americanos um século
atrás deixaram a costa atlântica para ir para o oeste. Muitos que vêm para Anápolis estão a caminho
da nova Colônia Agrícola Nacional do Governo, e sua embrionária cidade de Ceres. A Colônia, um
das sete criadas pelo ditador Getúlio Vargas em 1941, é a mais bem-sucedida de um experimento de
socialismo agrário. Para os homens pobres que acreditam na promessa de terra livre, casa e
segurança (tradução livre).
52
Jornal O Anápolis, Anápolis, p.03, 14-set-1950.
53
Jornal O Anápolis, Anápolis, p.03, 6-jan-1946.
81
apresentava muitos problemas infraestruturais. Mesmo já contando com uma rede
de abastecimento de água e recolhimento de esgoto, e com rede de distribuição de
energia elétrica estes serviços funcionavam precariamente, as vias publicas serviam
de caminho para as pessoas, veículos automotores e animais, em especial o gado
rumo ao matadouro municipal. O município carecia de obras que o adequassem aos
novos tempos (FREITAS, 2007).
Mesmo com tantos problemas segundo alguns cinegrafistas que estavam
fazendo um vasto documentário das riquezas de Goiás na década da de 1950, a
cidade “é, como dizem, para onde se afluem todas as atenções do Brasil e do
estrangeiro”, e o jornal completa falando sobre o clima que “é como já afirmaram
muitos, inclusive uma ex-estrela do cinema americano, o melhor do mundo” (grifo do
nosso), e ainda vaticinaram
as perspectivas do “centro cosmopolita de
extraordinário futuro”.54
3.1. Hollywood vem para o Cerrado
Após serem expulsos das terras da fazenda Lavrinhas Joan e seu marido
não voltam para aquela região, passando a viver próximo ao município de Anápolis,
na sua fazenda Anchorage. Joan logo se adaptou aquela nova vida. Recebia
diversas personalidades importantes em sua propriedade, como a do embaixador
dos EUA, astros de Hollywood e do show business norte-americano, autoridades
brasileiras, mantendo intenso contato também com cidadãos norte-americanos
radicados em Anápolis.
54
Jornal O Anápolis, Anápolis, p. 01, 2-mar-1954.
82
Em 1952 lança simultaneamente nos Estados Unidos e no Brasil seu livro
sobre as aventuras no interior de Goiás, “Promisse Land” ou “Terra Prometida”. Na
sua volta para os Estados Unidos, Joan percebeu a boa receptividade do livro. Joan
Crawford, uma importante atriz de cinema estadunidense chegou a comprar os
direitos de filmagem do livro (projeto que não foi adiante). A despeito disto, a ao
mencionar a obra a imprensa ainda lembrava-se do passado nada recomendável da
autora: “Promisse Land, by Joan Lowell: Author of the fabulous fib “The Cradle of the
Deep” tells how she and a tired-of-it-all freighter skipper are farming 120.000 acres in
Brasil”.55
Sua história fez tanto sucesso nos Estados Unidos que atraiu a atenção de
outras personalidades norte-americanas que como elas estavam cansadas do ritmo
frenético da vida de celebridade. Por sua influência veio para Anápolis a atriz Janet
Gaynor, que por sua vez acabou por atrair a vinda de outra atriz e também cantora,
Mary Martin, que até dedicou um capítulo de sua biografia para relatar como era a
sua vida e de seu marido na cidade de Anápolis.
Janet Gaynor (Laura Augusta Gaynor) era atriz de cinema, nascida em 1906
na Filadélfia, cidade norte-americana do estado da Pensilvânia. Foi a primeira
mulher a ganhar um Oscar, categoria de melhor atriz. A cerimônia de entrega do
prêmio oferecido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood
oferecido a Janet Gaynor foi realizada em 1928, e a laureou por dois filmes
realizados no ano anterior: “Aurora (Sunrise - A Song of Two Humans)” do diretor
alemão F.W Murnau, e “Sétimo Céu (Seventh Heaven)”, de Frank Borzage. Esta
atriz talentosa transitou muito bem do cinema mudo ao falado. Porém no final da
55
“Terra Prometida” de Joan Lowell: A autora da fabulosa mentira “The Cradle of the Deep” fala como
ela e um capitão de navio cansado de tudo, estão cultivando 120.000 hectares no Brasil”. In: Jornal
Toledo Blade, Toledo, 29-jun-1952, p.5 (tradução livre).
83
década de 1930 casou-se com o estilista Gilbert Adrian, vindo alguns anos depois a
anunciar sua precoce aposentadoria (LOPEZ, 2006).
Janet Gaynor atuou no cinema norte-americano no momento em que ele se
consolidava mundialmente. Após a Primeira Guerra com a Europa enfraquecida a
indústria cinematográfica americana floresceu afirmando a supremacia dos filmes de
Hollywood no cinema mundial. A partir de 1920 sua produção baseou-se em dois
fatores, o studio system e o star-system. O studio system foi um método de
racionalizar e integrar todos os setores da indústria cinematográfica com o objetivo
de potencializar os lucros. E o star-system, também conhecido como estrelismo, era
a criação das conhecidas “estrelas do cinema”, atores que quase sempre
representavam o mesmo tipo de papel, se este tipo de personagem tivesse
agradado o público. (BETTON, 1984). Foi este sistema que criou “estrelas” como
Mary Martin e Janet Gaynor, e também possibilitou a ascensão de outras pessoas
envolvidas no processo de criação cinematográfica ao “estrelato”, como Gilbert
Adrian, o criador dos figurinos do musical “O Mágico de Oz” (1939), e de outros
filmes hollywoodianos famosos.
Gilbert Adrian, cujo nome no registro de nascimento era Adrian Adolph
Greenberg, nasceu em 3 de março de 1903 na cidade de Naugatuck, estado de
Connecticut. Estudou moda em Paris, e de volta a América trabalhou em Nova York,
na fantástica indústria teatral da Broadway, até que a esposa de Rodolfo Valentino56,
Natacha Rambova o levou para a Hollywood para desenhar as roupas de seu
marido. Em Los Angeles Adrian tornou-se um estilista consagrado considerado por
56
Um famoso ator italiano radicado nos Estados Unidos. Além de ser uma das estrelas mais
populares dos anos 20 (e do cinema mudo conseqüentemente), foi o primeiro símbolo sexual do
cinema e protótipo do "amante latino" fabricado por Hollywood de cinema estadunidense da década
de 1920.
84
muitas pessoas o mais influente estilista norte-americano dos anos de 1940, pois
vestiu atrizes como Greta Garbo, Loretta Young, Joan Crawford, Norma Shearer,
Greer Garson, Katharine Hepburn, Rosalind Russell, Claudette Colbert, e é claro sua
mulher, Janet Gaynor. Além disso ele teve seu próprio ateliê de alta costura.
Adrian reigned for 20 years during a time when Hollywood was a storybook
of fantasy, illusion and extravagance. In those days, top box office stars
were extraordinary valuable properties. No expense was spared to enhance
the magic of their images. His brilliant designs often transformed leadings
ladies into star of incomparable magnitude. In the process, he creates an
aura of fashion splendor previously unknown for an American designer (The
57
Sposkesman, 12-nov-1983: p. 14)
Depois de abandonar a carreira de atriz Janet Gaynor se dedicou a família, e
se sentia muito bem sendo somente esposa de um famoso estilista do cinema
(PARSONS, 1951)
58
. Mas toda esta felicidade foi interrompida quando Adrian foi
diagnosticado com um sério problema cardíaco de origem nervosa. Ele então
resolveu se aposentar em 1952, justamente no mesmo ano em que Joan Lowell
promovia seu novo livro, “Terra Prometida” nos Estados Unidos.
Joan Lowell não influenciou a vinda do casal Adrian para o Brasil, mas foi
por sua influência que o casal veio para Goiás, pois segundo Mary Martim (1976)
Janet e Adrian de passagem pelo país teriam gostado muito e resolveram se
estabelecer ali. Estavam na cidade de São Paulo quando alguém teria indicado que
viessem para o interior de Goiás e procurassem uma conterrânea que por causa do
seu pioneirismo na região e também por sua personalidade extravagante era uma
espécie de celebridade regional. Se até em São Paulo já se podiam dar notícias
57
Adrian reinou por 20 anos durante uma época em que Hollywood era um livro de histórias de
fantasia, ilusão e extravagância. Naqueles dias, as estrelas superiores foram extraordinárias
propriedades valiosas. Nenhuma despesa foi poupada para aumentar a magia de suas imagens.
Seus desenhos brilhantes muitas vezes transformavam mulheres em estrelas de grandeza
incomparável. Neste processo, ele criou uma aura de esplendor da forma até então desconhecida por
um designer norte americano (tradução livre).
58
Jornal The Milwaukee Sentinel, Milwaukee, p. 46, 25-mar-1951.
85
sobre Joan Lowell certamente era porque ela estava de fato se destacando na
sociedade goiana.
A versão de Mary Martin (1976) para explicar as circunstâncias da vinda de
Janet e Adrian para o Brasil estariam relacionadas à participação em um suposto
Festival de Cinema realizado no Rio de Janeiro. Mas não se tem notícia da
realização de um festival de cinema no Brasil até a realização em 1954, na cidade
de São Paulo do 1° Festival Internacional de Cinema do Brasil (BRESSERPEREIRA, 2004). Freitas (2008) confirma que o casal veio para o Brasil para um
festival de cinema em São Paulo neste mesmo ano. Outro fato que parece confirmar
esta última colocação é dada pela própria Mary Martin em uma visita feita a Janet
Gaynor em Anápolis, em 1955, quando observou que Gaynor ainda não havia
desembalado toda a sua mudança, e se o casal chegou em 1954 e tiveram que
construir sua casa, e trazer sua mudança dos Estados Unidos, é provável que num
período em torno de um ano a casa deles ainda não estivessem totalmente
organizada.
3. 2. Joan Lowell e os Conflitos de Terras
A fama de Joan Lowell havia se espalhado e muitos norte-americanos
tiveram que recorrer a ela quando se quisessem comprar terras no interior do Brasil.
Com Janet Gaynor e Gilbert Adrian e depois com Mary Martin e Richard Halliday não
foi diferente, mas outros atores também confiaram a Joan Lowell dinheiro e
procurações para a intermediação da compra de terras, no entanto atriz/escritora
não realizou as negociações. Mary Martin (1976) relatou que ao encontrar Cary
86
Grant, outro famoso ator Hollywoodiano, ela teria perguntado sobre sua propriedade
no Brasil e a resposta foi de que ele jamais tinha ouvido falar das terras desde que
havia mandado o dinheiro para comprá-las. Segundo Mary Martin (1976) Joan
Lowell ainda teria vendido terras para outras celebridades como Claudette Colbert
ganhadora do Oscar de melhor atriz por “Aconteceu Naquela noite” (1938).
Joan Lowell acabou se envolvendo em grandes confusões por causa disso;
inclusive Martin (1976) conta que Lowell teria pedido para ser presa, pois estava
com medo de retaliação por causas seus atos. Ela provavelmente não vendeu terras
somente a seus colegas norte-americanos, pois estes não viriam a Anápolis apenas
para reclamar este dinheiro, afinal não compensaria deslocar-se de tão longe para
recuperar este investimento. Em “Terra Prometida” a atriz/escritora relata apenas
que acabou se endividando ao negociar partes do lote de terra que ela acreditava
receber como pagamento pelos seus serviços.
Mas no período em que Joan afirma ter ficado nestas terras, que foi entre
1937 e 1945, ela certamente não conseguiria vender terras a nenhum norte
americano, pois segundo seu próprio relato ela estava acampada no meio do mato,
praticamente isolada, e não tinha nenhum veículo de transporte, muito menos meio
de comunicação. É pouco possível então que ela tenha conseguido negociar por
carta ou por meio de chamadas telefônicas as terras do interior do Brasil. É mais
coerente acreditar que durante sua visita aos Estados Unidos em 1952 para lançar
seu livro sobre o Brasil, ela tenha influenciado muitos dos seus compatriotas a
adquirir propriedades no interior do Brasil, e que tenha ela mesmo se
responsabilizado de comprá-las para eles.
87
Uma nota do jornal O Globo (2007) afirma que o juiz da comarca de Anápolis
havia autorizado a prisão de Joan Lowell, mas não foi por causa de irregularidades
na vendas de terras, e sim pela emissão de cheques sem fundo. A reportagem seria
a republicação de uma matéria que originalmente o próprio jornal publicara
cinqüenta anos atrás, portanto em 1957. Esta é uma data muito distante do período
em que Lowell viveu acampada nas terras da fazenda Lavrinhas, que foi durante o
final da década de 1930 e inicio de 1940, então os conflitos que teriam levado a sua
prisão dificilmente teriam origem a tantos anos atrás. Isto evidencia que mesmo
após sua saída das terras que ela e o marido estavam desbravando, teria
continuado envolvida com a venda de terras e continuou também se endividando e
emitindo cheques sem fundos, e este hábito perdurou até a década de 1950, pois é
neste período que chegam à cidade de Anápolis as outras atrizes norte-americanas
que também teriam enviado a Joan Lowell a procuração e o dinheiro pra a aquisição
das propriedades rurais.
Mary Martin e seu marido foram uma das pessoas que Joan Lowell enganou.
Esta atriz e cantora nasceu em 11 de dezembro de 1913 em Weatherford, no Texas.
Casou-se primeiramente com Benjamin Hagman, pai de seu primeiro filho, Larry
Hagman, que como a mãe também se tornou ator. Com seu segundo marido
Richard
Halliday,
um
produtor
de
cinema
que
foi
diretor
dos
estúdios
cinematográficos Paramount, uma das indústrias do cinema norte-americano e com
ele teve uma filha, Heller Halliday. Mary Martin fez cinema, mas era principalmente,
atriz de musicais e costumava passar longas temporadas apresentando espetáculos
como: “The South Pacific”, “My Heart belong to Daddy” e “Peter Pan”, este último
obteve tanto sucesso que foi produzida uma versão para ser apresentada na
televisão. No final da temporada desta peça teatral, em 1955, que ela, o marido e
88
filha partiram para uma viagem de descanso num navio rumo a Grécia (MARTIN,
1976).
Mas sua bagagem por engano não foi embarcada no mesmo navio, e para
recuperá-la a atriz e sua família tiveram que mudar um pouco a rota de seu passeio
passando por vários portos. Quando chegou ao Porto de Santos, ela recebeu uma
carta do casal Janet Gaynor e Gilbert Adrian que já estavam residindo no Brasil. A
mãe de Janet tinha visto em uma coluna social que Mary Martin e sua família
passariam pelo Brasil, e enviou para a filha a notícia. Janet então escreveu uma
carta e confiou a uma americana chamada Janet Homer missão de entregá-la. Por
vários dias esta se dirigiu ao porto para esperar pelo casal Hagman, até que um dia
conseguiu entregar a correspondência que os convidava para irem conhecer sua
casa no interior do Brasil. Mary Martin e Richard Halliday aceitaram o convite e
vieram para Anápolis. Quando chegaram aqui eles se encantaram com a
maravilhosa casa que Janet e Adrian haviam construído e com as belezas naturais
do lugar. Richard Halliday manifestou o desejo de comprar uma gleba de terra que
ficava próxima a casa de Janet Gaynor, e avisou que se soubessem que ela estaria
a venda era para avisá-lo (MARTIN, 2006)
Joan Lowell foi a intermediadora da negociação, e após Mary Martin e
Richard Halliday mandarem o dinheiro e a procuração, receberam de volta os
documentos das compras das terras, todos devidamente carimbados e aparentando
serem legais. O casal foi então conhecer seu pedaço de terra no Brasil. O local
escolhido por Richard era alto e de lá podia se ter uma vista muito bonita. Certo dia
o casal foi para suas terras para planejar as futuras construções, estavam
passeando quando escutaram rajadas de balas. Os tiros foram dados pelo
89
verdadeiro dono das terras que deu somente o aviso para que não adentrassem
mais em sua propriedade. Joan inventou para Mary Martin e Richard Halliday
diversas histórias, a cada dia ela aparecia com uma história diferente. Até que o
casal Halliday percebeu que haviam sido enganados, à eles não pertenciam terra
alguma no Brasil. Mary Martin afirmou que foi neste momento que reconheceu
naquela senhora conhecida como Dona Joanna, a Joan Lowell do escândalo literário
do final da década de 1920 (MARTIN, 1976).
Joan Lowell ofereceu ao casal Halliday um cheque de um banco de Anápolis
como pagamente pelo dinheiro enviado para a compra das terras, mas quando
tentou descontá-lo souberam que o mesmo não tinha fundo. Todos ficaram muito
chateados, Gilbert Adrian que já tinha a saúde abalada, contraiu leve febre, os
habitantes da cidade também se solidarizaram com a situação do casal, segundo
Mary Martin eles ficaram envergonhados. O sonho tropical de Richard Halliday e
Mary Martin quase acabou neste momento, pois apesar de Joan possuir bens na
cidade levariam-se anos para que eles pudessem recuperar seu dinheiro. Eis que
entra em cena Gibran El-Hadj, um comerciante descendente de uma das inúmeras
famílias árabes que se fixaram em Anápolis. Ele ajudou o casal Halliday a comprar
sua fazenda na região de Anápolis emprestando o dinheiro, e assim tornou-se
grande amigo e, posteriormente, representante do casal no Brasil (MARTIN, 1976).
Apesar de ter colocado-a nesta situação constrangedora, Mary Martin disse
em seu livro que não guardou rancor de Joan Lowell. E assim começou a historia de
amor verdadeiro entre o casal Halliday e Anápolis. A atriz descreve o lugar com
tanto carinho que fica evidente o quanto ela e o marido gostavam daqui, e mesmo
após Janet Gaynor e Gilbert Adrian voltarem para os estados Unidos em 1957,
90
permaneceu aqui até que seu Richard Halliday veio a falecer, então como não tinha
família na cidade ficou inviável para a ela viver sozinha em um local que evocava
tantas lembranças (MENDES, 1995).
Toda história que envolve o casal Halliday e a suposta compra da fazenda e
os acontecimento que se desenrolaram após a descoberta da fraude cometida por
Joan Lowell aconteceram em pouco tempo, pois se em 1955 ela veio a passeio para
o interior de Goiás, em 1956 ela já possuía casa na cidade como afirmou uma
reportagem de um jornal local que dissertava sobre as qualidades do município.
Celebridades do mundo artístico internacional como, Gilbert Adrian, Janet
Gaynor, Richard Halliday e Mary Martin fixam residência em Anápolis. (...)
estrangeiros de todas as partes aportam quase que diariamente nesta
cidade. Nas ruas de Anápolis, texanos são vistos freqüentemente em suas
vestimentas características: Botas de salto alto, calças “far west”, camisas
espalhafatosas, e chapéus típicos daquele Estado do Tio Sam (O
ANÁPOLIS, 07-dez-1956: p 01).
Em 1956 viviam na cidade as três atrizes e seus maridos, Mary Martin tinha
sua filha, Heller Halliday com 15 anos de idade, e Robbin Gaynor, era o filho do
casal Gaynor e Adrian e tinha 16 anos, mas os filhos continuaram estudando nos
Estados Unidos. O filho mais velho de Mary Martin, de seu primeiro casamento,
Larry Hagman, em sua biografia afirmou que visitava ocasionalmente a mãe em sua
fazenda brasileira, mas que preferia ficar morando em sua casa nos Estados Unidos
(HAGMAN, 2001).
Janet e Adrian que haviam se aposentado moravam quase todo tempo59 na
cidade, mas Mary Martin e Richard Halliday conciliavam os períodos na cidade com
as temporadas de trabalho nos EUA. Mendes (1995) afirma que certa vez encontrou
59
Quase todo o tempo, pois algumas notas do jornal o Globo (2007) falam sobre a passagem do
casal na cidade quando estavam vindo dos Estados Unidos rumo a Anápolis.
91
Mary Martin no aeroporto de Brasília e observou que andando mancando, fato que a
própria atriz atribuía a longa temporada na fazenda, onde ela usava botas ao invés
de sandálias, algo que deixou-a desacostumada ao uso de sapato de salto alto.
A vida simples do interior o clima e as belezas naturais do Brasil encantavam
estas pessoas acostumadas com temperaturas não tão amenas. Janet Gaynor numa
vida pacata se dedicava a jardinagem, e sua casa possuía uma aparência tão
rebuscada (diziam ter a arquitetura mourisca, estilo relacionado aos mulçumanos do
norte da África e da Península Ibérica), que ficou conhecida na cidade como Palácio
da Branca de Neve, a princesa do desenho animado dos estúdios Disney. Richard
Halliday por sua vez plantou 300 pés de rosas para Mary Martin, e presenteou a
esposa com uma ponte em estilo japonês que foi colocada em um lago da
propriedade do casal (MARTIN, 1976). Estes norte-americanos tentavam transferir
um pouco do conforto e do glamour dos locais onde viviam nos EUA, para as suas
fazendas em Anápolis, criando nas suas propriedades ambientes extravagantes
para os padrões locais.
Segundo Martin (1976) no ano de 1957, Janet Gaynor e Gilbert Adrian
voltaram definitivamente embora para o seu país natal, e retomaram suas carreiras,
mas em setembro 1959 o estilista sofreu um derrame vindo a falecer nos Estados
Unidos.60 As duas outras atriz, Joan e Mary, e seus companheiros continuaram
morando em Anápolis.
3.3. A Fraternidade Eclética Espiritualista Universal
60
Revista Time, Nova York, 21-setembro1959.
92
Mesmo tendo sido considerada na década de 1930 e início de 1940 uma
cidade moderna, Anápolis nos anos 1950 ainda carecia de muitas reformas
estruturais. Um depoimento desta época evidencia alguns dos problemas da cidade,
onde o velho e o novo pareciam conviver pelas ruas:
No dia seguinte rumamos para Anápolis. Uma estrada mais ou menos
regular, porém com uma poeira vermelha de sufocar pelo trânsito
permanente de carga e passageiros... Anápolis parece bem uma cidade de
fronteira. No ano que vem vai comemorar o seu cinqüentenário. É uma
cidade cosmopolita; dá-nos impressão de uma cidade americana, onde os
homens andam de revólver na cinta, e uma “lambedeira” do lado! Pouca
água, a maioria das casas com cisterna (na minha terra chama-se poço ou
cacimba); luz deficiente, todas as casas tem transformador e quando
funciona sem interrupções é dia de alegria, pois a mesma vive agora a fazer
jogo de esconder em fase de melhorias. O cinema só funciona porque tem
luz própria. Predomina entre a população a colônia Síria, que dizem ter
muito dinheiro; é um centro de cereais, de compra e venda. A vida não é
cara nem barata, mas as casas são de preços assustadores e a grande
61
maioria não possui instalações sanitárias completas.
Este é o relato sobre Anápolis feito por um dos membros fundadores da
Fraternidade Eclética Espiritualista Universal que visitou a Anápolis durante os
preparativos para a fundação da primeira sucursal desta instituição que foi instalada
nesta cidade em 1956, e este é um dos fatos que também fazem parte da odisséia
de Joan Lowell pelo Planalto Central.
Segundo Mello (2008) a Fraternidade Eclética foi fundada por Mestre
Yokaanam, cujo nome em registro de nascimento era Oceano Araújo de Sá, no Rio
de Janeiro, em 1956. Este movimento religioso tinha caráter missionário e
messiânico o que causou muita oposição contra os fraternários, como eram
chamados os seguidores de Mestre Yokaanam.
Conforme Yokaanam já esperava, árdua foi a sua tarefa, sobretudo nos
primeiros tempos de fundação da fraternidade e da Cidade Eclética (do final
61
Página eletrônica da sucursal de Anápolis da Igreja Fraternidade Eclética Espiritualista Universal.
93
da década de quarenta ao início da década de setenta), quando ele e sua
obra foram alvo de difamações, escândalos e graves denúncias, divulgadas
publicamente. A imprensa sensacionalista foi-lhes implacável, cedendo
espaço considerável às acusações de insanidade mental, charlatanismo e
exercício ilegal da medicina, abandono da família e não-pagamento de
pensão, desvio de verbas da fraternidade para outros fins e ocupação
indevida de terras (MELLO, 2008: p. 35).
Em 1956 mestre Yokaanam veio para Goiás em viagem secreta a fim de
encontrar as terras onde deveria ser fundada a Cidade Eclética, uma cidade que foi
criada “para ser o embrião e exemplo da prática do cristianismo primitivo restaurado,
sempre em acordo com orientações espirituais e princípios cristãos ancorados na
prática da humildade e da caridade fraterna, contando sempre com cooperação”
(MELLO, 2008: p.28).
Mas antes de chegar ao local em que deveria ser construída a tal cidade
Mestre Yokaanam passou por Anápolis, onde devido ao seu carisma conquistou
vários adeptos que aqui fundaram uma primeira sucursal da Fraternidade Eclética.
Segundo fontes oficiais, a Regional da Fraternidade Eclética Espiritualista
Universal sediada em Anápolis-GO, foi fundada em 13 de outubro de 1956,
portanto pouco antes da chegada da caravana dos Peregrinos da caridade
que se instalaram no Planalto Central do Brasil. Anápolis já podia ser
considerada, àquela época, talvez por sua proximidade com Goiânia, como
a segunda Cidade mais importante do estado de Goiás. Essa importância
cresceria pelo seu natural desenvolvimento e também pela futura
62
construção e consolidação de Brasília como capital do País.
Para a abertura da primeira sucursal, a transferência da matriz e sua
fundação no Planalto central, e ainda para a manutenção dos trabalhos filantrópicos
a instituição dependia da doação de seus sócios-contribuintes, como eram
chamados os seus membros. Difíceis foram os primeiros tempos de instalação da
62
Este relato foi publicado no Clarim da Juventude (Jornal de circulação interna para a Juventude
Eclética Universal), e pertence a irmão Elpídio, atualmente ele está disponível na página eletrônica da
Fraternidade Eclética Espiritualista Universal.
94
igreja no Planalto Central por causa da falta de verbas, e também pela oposição da
Igreja. Contudo,
Uma freqüência de mais de uma centena de pessoas atesta o prestígio de
que a Instituição já goza naquele Estado, apesar da campanha difamatória
desencadeada pelo solerte Padre Pitaluga. Mestre Yokaanam:.(sic) tem que
se virar de manhã à noite para atender a milhares de solicitações,
consultas, conselhos, etc., a todos atendendo de modo já bastante
conhecido dos Fraternários. Irmão Aristóteles:. (sic) está residindo já em
Anápolis com sua família. Só no dia 07 de setembro partimos rumo a
Campo Limpo, local escolhido para a construção da Cidade Eclética
63
Fraternidade Universal.
Joan Lowell foi uma destas pessoas que simpatizaram com as doutrina
pregada por mestre Yokaanam, tendo participado ativamente da fundação da
Fraternidade Eclética em Anápolis desde o princípio, em 1956. Neste mesmo ano
foi empossada na primeira Diretoria Social da Sucursal da Anápolis, que assim foi
constituída:
Agenor Santos – Presidente;
Joana Lowell Bowen – Vice-Presidente;
Dr. Mário Evaristo de Oliveira – Procurador Geral;
Isaac Abrão José – 1º Secretário;
José Bosco Isaac – 2º Secretário;
Edwirges Soares – 1º Tesoureiro;
Antônio Afonso de Almeida – 2º Tesoureiro;
64
Dr. Mário Evaristo de Oliveira – Orador.
A atriz/escritora por causa da sua intensa participação nos preparativos para
a fundação da filial de Anápolis desta instituição recebeu no dia 26 de setembro do
ano de 1956 um cargo muito importante, o de vice presidente. Posteriormente após
terem alugado um prédio onde funcionaria a Fraternidade Eclética ouve uma
reformulação desta primeira diretoria, em janeiro de 1957, e Joan Lowell continuou
como a vice-presidente. Em 21 de fevereiro do mesmo ano os trabalhos para a
estruturação desta sucursal continuavam, foi realizada então uma cerimônia que
63
64
Idem 62.
Idem 62.
95
preparou os primeiros obreiros que integrariam o primeiro quadro de adeptos da
Fraternidade Eclética em Anápolis.65
Nesta ocasião os obreiros receberam o Santo Balandrau, que é uma “veste
comprida, à maneira daquelas que usavam Jesus Cristo e seus apóstolos” (MELLO,
2008: p.28), e que para os adeptos da Fraternidade Eclética tem um valor simbólico,
pois somente os membros que participam ativamente de todas as atividades desta
instituição podem usá-lo. Entre os pioneiros, os primeiros adeptos, que no total
foram apenas 15 pessoas, que receberam o Balandrau estava “5. Joan Lowell
Bowen”.66 No mesmo mês, finalizados todos os preparativos, tinha chegado o
grande dia da inauguração solene da sucursal, que ficou assim registrado na edição
do jornal interno da instituição.
O Povo recebe de braços abertos a Fraternidade Eclética Espiritualista
Universal. – Inaugurada, solenemente, a Sucursal nº 1 em Anápolis, Estado
de Goiás. – Cerimônia tocante. – Sócia benfeitora da Fraternidade, a Sra.
Joan Lowell Bowen, esposa do Capitão Bowen– Os oradores. – Autoridades
presentes. (...) Em seguida, o Irmão Polycarpo:. Fez uso da palavra,
conferindo à Irmão (sic) Joan Lowell Bowen, de nacionalidade americana, o
diploma de Sócia Benfeitora da Fraternidade, conforme a Constituição
Estatutária da Casa, a qual recebeu o referido Diploma com grande
emoção, recebendo cumprimentos dos Irmãos presentes, pelo merecimento
tão oportuno. Logo após a entrega do Diploma a Irmã Joan Lowell, ocupou
o microfone o Mestre Yokaanam:.(sic), que fez magnífica oração, que foi
gravada e guardada carinhosamente na Divisão de Imprensa para os anais
67
da Casa e como mensagem ao porvir (grifo nosso).
A cerimônia foi um ato público em que estiveram presentes muitas pessoas
importantes da cidade, como o prefeito da Cidade de Anápolis, Carlos de Pina;
Jarbas de Oliveira repórter da Rádio Imprensa; Francisco Garcês, repórter da Rádio
65
66
67
Idem 62.
Idem 62.
Jornal O Nosso, maio-1957, apud página eletrônica da Fraternidade Eclética.
96
Carajá, todas de Anápolis. O marido de Joan Lowell, Leek Bowen, também esteve
presente assistindo a solenidade.68
Pelos cargos que Joan ocupou, mas principalmente por ter recebido o
Balandrau vemos que ela gozava de um grande prestígio dentro da Fraternidade
Eclética. Mas segundo seu registro na instituição em novembro, do mesmo ano em
que havia solenemente se tornado membro da Fraternidade Eclética, ela foi
“desligada” da sucursal de Anápolis. Nesta época atriz/escritora havia se mudado
para a região onde estava se construindo a futura capital do Brasil, mesmo local em
que se encontrava também o velho amigo, Bernardo Sayão, então diretor da
NOVACAP (Companhia Urbanizadora da Nova Capital), empresa federal criada para
realizar as obras para a fundação de Brasília e presidida por Israel Pinheiro. Nesta
época também estava sendo construída na região de Brasília, no entorno, a Cidade
Eclética por mestre Yokaanam, que contou evidentemente com a ajuda de Joan
Lowell.
Aparentemente podemos pensar que o vinculo entre Joan Lowell e a
Fraternidade Eclética não foi muito forte, nem duradouro, mas quando indagamos
irmã Verônica69, filha de um dos fundadores da instituição de Anápolis e que chegou
a conhecer a atriz/escritora, sobre a importância e sobre se seu vínculo com a
sucursal anapolina esta deu o seguinte depoimento:
(...) não é que não foi forte. Foi um vinculo muito forte e muito importante
naquela... naquela ocasião, anos atrás. Muitos anos atrás. Porque a
Fraternidade estava recém chegada aqui à Goiás, vinda do Rio de Janeiro.
Então no primeiro momento, aquele entusiasmo, aquela coisa... mas a Dona
Joana, ela era um pessoa envolvida com muitas coisas. Ela não era uma
pessoa que cuidava só de uma coisa, ela tinha várias coisas que ela
cuidava. Tinha inclusive uma fazenda, uma coisa assim, mas ela sempre foi
muito e ligada a Fraternidade, e foi enquanto...enquanto existiu uma
68
69
Idem 62.
Irmã verônica é o pseudônimo de Maria Helena dos Santos.
97
colaboradora muito importante, ajudou muito, muito mesmo a Fraternidade,
tanto aqui em Anápolis, quanto lá no Planalto central, que é onde fica a
matriz da nossa instituição, a Cidade Eclética, né (sic)? Ela ajudou muito,
muito mesmo naquela época (...) no começo ainda de querer construir, de
fazer a fundação de Brasília, ela foi um membro muito importante dentro da
instituição como colaboradora, e por isso que ela recebeu este título de
Benfeitora. Porque uma pessoa pra ser considerada Benfeitora na
Fraternidade ela não necessariamente tem que ser obreiro de Balandrau.
Qualquer um pode ser considerado benfeitor na obra, desde que, de acordo
com aquilo que ele faça, com aquilo que ele doe, com aquilo que ele faça
espontaneamente sem que a casa tenha que ficar pedindo. Ele tem que
abraçar o movimento criado pela Fraternidade e... e aceitar os nossos
princípios, e ela foi uma pessoa que deu muito bem com muita gente lá na
70
cidade Eclética, ela ajudou muito, muito mesmo (16- out-2009, Anápolis)
3.4. Bye-bye Anápolis!
No final da década de 1950 todas as atenções se voltavam para o Planalto
Central por causa da construção da nova capital no interior de Goiás, e muitas
pessoas se dirigiram para lá. Entre estas pessoas que foram as pioneiras na
formação de Brasília estava o casal Bowen, como citado acima, Joan Lowell mudouse para a região de Brasília no final de 1957.
Num primeiro momento podemos pensar que Joan e seu marido tenham
deixado Anápolis para morar em Brasília por influência de Bernardo Sayão, que era
o chefe da NOVACAP (o órgão federal criado exclusivamente para cuidar da
construção da nova capital), e segundo Sayão (1976) muito amigo de Joan Lowell.
Seria compreensível que eles mudassem para a região de Brasília seguindo o
grande amigo. Outros acontecimentos também podem ter influenciado o casal a
mudar para aquela região, como o fato de Joan ter sido presa em 1957 devido as
confusões que ela havia criado por causa da venda fraudulenta de terras e pelos
cheques sem fundos que emitia, como também devido a construção da Cidade
Eclética, criada por Mestre Yokaanam fundador Fraternidade Eclética Espiritualista
70
Depoimento de Irmã Verônica.
98
Universal, igreja da qual Joan fez parte e contribuiu ativamente enquanto vivia em
Anápolis.
Joan
Lowell
tornou-se
amiga
de
mestre
Yokaanam
e
contribuiu
substancialmente para a fundação da Cidade Eclética,71 que se localiza nas
proximidades da cidade de Santo Antônio do Descoberto, em Goiás, na região do
entorno da capital, distante apenas 60 quilômetros de Brasília. Foi a partir de 1956
que um grupo de fraternários liderados por Mestre Yokaanam se dirigiu ao planalto
goiano e criaram uma comunidade fraterna, onde prevalecem os princípios morais
cristão e um estilo de vida que pode ser definido como um socialismo religioso. Lá
construíram casas e plantações que poderiam ser utilizadas por todos e onde não
aceitam as relações capitalistas entre os habitantes (MELLO, 2008). Como
colaboradora da sucursal de Anápolis da Fraternidade Eclética, e da Cidade Eclética
no entorno de Brasília, Joan Lowell tornou-se muito amiga de Mestre Yokaanam,
eles costumavam ficar por muitas horas conversando, entretanto ela não residia na
nesta comunidade.72
Segundo Mendes (1995) o casal Bowen saiu de Anápolis e foi morar em
uma chácara em Planaltina no Distrito Federal, e lá deste os primórdios da capital
Joan se destacava por sua espontaneidade, extravagância e carisma.
(...) ostentando seu passado de ex-estrela do Hollywood, em pouco tempo
Joana tornou-se figura conhecida e presença constante em qualquer festa
ou comemoração da nova capital. Seu marido quase nunca aparecia, Joana
tomava conta da cena, como se a vida fosse um filme, e ela atriz principal.
Vivia com poucos recursos e muitas vezes se metia em confusões por
dificuldades financeiras e emissão de cheques sem cobertura, mas não
perdia uma festa, onde aparecia sempre alegre, e procurando ser o centro
das atenções (MENDES, 1995: p. 415).
71
72
Idem 70.
Idem 70.
99
Na missa que inaugurou o inicio das obras de construção de Brasília Joan
Lowell, no meio da cerimônia, saiu de seu lugar e foi ajoelhar-se ao lado do
presidente Juscelino Kubistchek e de seu vice. Nas festas da jovem capital Joan
Lowell era figura de destaque, no primeiro Baile de Carnaval de cidade lá estava a
atriz/escritora ao lado de Rita Hayworth, uma famosa atriz norte-americana que
havia sido convidada para o baile; na festa do ano seguinte ela encontrou outro
compatriota, o ator Kirk Douglas. Nestas festas Joan ganhou alguns concursos de
fantasias de carnaval, certa vez ela fantasiou-se de Congresso Nacional com a
cabeça entre as duas torres a as cúpulas sobre os ombros, em outra foi de noiva e
chegando à cavalo. Ostentando seu passado de ex-estrela do Hollywood Joan,
agora passava a destacar-se na restrita e elitista sociedade brasiliense. Sua vida
nem por isso passou ser fácil, pois continuava a passar por dificuldades financeiras
(MENDES, 1995). Atuou nesta época como jornalista escrevendo crônicas para o
jornal Diário Carioca, que tinha uma edição diária destinada a Brasília (FREITAS,
2002).
Aventureira Joan propôs, em 1962, a Léa Sayão que percorressem
juntamente com duas outras mulheres o trajeto da Belém-Brasília, estrada que
Bernardo Sayão havia construído e que em poucos anos estava em um estado
lastimável devido ao abandono e a falta de manutenção e melhorias. Viajaram pela
precária rodovia em uma Kombi, um carro da montadora de automóveis
Wolkswagen, e voltaram em um avião da Força Aérea Brasileira, a FAB (MENDES,
1995 e SAYÃO, 1976). Nesta aventura estas corajosas mulheres atravessaram o
país por uma estrada sem asfalto, cheia de lama e que estava sendo engolida pela
selva antes mesmo de ser concluída, registrando todos os detalhes para revista O
100
Cruzeiro, que publicou a matéria narrando a aventura em 9 de junho daquele mesmo
ano (FREITAS, 2002).
Segundo Mendes (1995) Joan já havia realizado sozinha à alguns anos
antes, quando a rodovia ainda estava sendo construída, todo o percurso em um
carro da Wolkswagen. Logo após a morte de Bernardo Sayão, em acidente ocorrido
durante a construção da mesma estrada em janeiro de 1959, Léa conta que a
atriz/escritora esteve presente na primeira viagem inaugural de uma linha de ônibus
do Expresso Braga que percorria a Belém-Brasília (SAYÃO, 1976).
Na ocasião da viagem pela BR-153 com Léa Sayão, Joan já tinha se tornado
viúva, pois Leek Bowen falecera após ter sido atropelado na Estação Rodoviária de
Brasília. Porém não perdeu sua alegria de viver, continuando a frequentar os bailes
de carnaval realizados na cidade e continuou incrivelmente ativa. Em novembro de
1967 Joan Lowell faleceu vitimada por uma hemorragia pulmonar73 em sua chácara
em Planaltina, no Distrito Federal, e foi sepultada no cemitério da Boa Esperança,
onde já estava enterrado seu marido (MENDES, 1995).
3.5. Porque Mary Martin Amava a “Selva”
Mesmo após a volta de Janet Gaynor para os Estados Unidos, e da ida de
Joan Lowell para Brasília, Mary Martin e Richard Halliday continuaram a viver em
Anápolis. Mesmo tendo se adaptado a cidade, sua presença não chegou a alterar a
dinâmica da cidade se comparada a Joan. Mesmo assim Mary Martin diziam ser
73
Revista Time, New York, 24-nov-1967.
101
uma espécie de embaixatriz de Anápolis nos EUA,74 embora na prática pouco ou
nada tivesse feito de efetivo pela cidade, apesar de amar o lugar.
O casal vinha para Anápolis sempre que podia, tentavam conciliar o trabalho
nos Estados Unidos com as temporadas restauradoras que passavam no interior de
Goiás. No período em que morou em Anápolis Mary Martin protagonizou musicais
como, “Peter Pan”, durante a década de1950 (este espetáculo fez tanto sucesso que
chegou a ter uma versão televisiva e fez com que a atriz ganhasse a maior
premiação do teatro norte-americano, o premio Tony; “The Sound Of The Music”,
entre 1959 e 1951; “Hello Dolly”, musical que ela estrelou nos anos de 1965 e 1966
e “I Do! I Do!” que ficou em cartaz durante os anos de 1968 e 1969. Mas na década
de 1970 o casal Halliday se dedicou mais ao seu rancho no interior de Goiás
(MARTIN, 1976).
Sua fazenda tinha o nome de Nossa Fazenda Halliday, existindo até hoje na
entrada do caminho que conduz à sua fazenda uma coluna de concreto com o nome
da propriedade já quase apagado escrito em azulejos. Localizada nas proximidades
da BR153, logo após o povoado de Interlândia, “Nossa Fazenda”75 tinha sede em
uma colina de onde é possível avistar o horizonte.
Nesta propriedade Mary Martin e Richard Halliday criavam galinhas para a
produção de ovos, plantavam café e cultivavam um pomar, Construíram uma grande
casa com o apoio de inúmeros operários (cerca de trinta pessoas contando com as
mulheres de alguns deles). Num primeiro momento a casa tinha apenas um quarto,
74
75
Jornal Correio do Planalto, Anápolis, 18 a 24-ago-1975: p. 01 e 03.
A casa da atriz ainda existe, a antiga proprietária a mantinha conservada, inclusive a decoração
feita pelo casal Halliday, mas quem comprou a propriedade não teve tanto zelo e atualmente a casa
está em péssimo estado de conservação.
102
mas em compensação a atriz tinha um estúdio enorme no segundo andar e seu
marido tinha um escritório, a casa não possuía energia elétrica, pois apesar de
Anápolis possuir abastecimento de energia este benefício não havia se estendido a
zona rural da cidade. Depois foram construindo os outros cômodos, e cada um tinha
uma decoração diferente. Havia também as casas dos agricultores, que também se
multiplicaram. Martin afirma que ao final da construção sua casa parecia uma
pequena vila. Com o passar do tempo eles se adaptaram a vida no campo, e a
fazenda produzia tudo que eles precisavam, exceto eletricidade, sal e
linha
telefônica, objeto que atriz não sentia falta, pois Richard acreditava que poderia
quebrar o encanto do local que eles denominavam como “ selva” (MARTIN, 1976).
Causa estranhamento ver Mary Martin se referir a região rural do entorno de
Anápolis como sendo uma “selva”, mesmo isto tendo ocorrido há quase quarenta
anos atrás. Pois para os brasileiros quando se fala em selva pensa-se no mínino em
um lugar selvagem, de mata fechada e natureza bravia assim como é a selva
Amazônica, mas para aqueles estrangeiros que estavam acostumados às grandes
metrópoles as terras da Anápolis, que já estavam até mesmo parcialmente
povoadas eram consideradas como “selva”. Como já foi discutido Anápolis era uma
cidade onde o novo convivia com o velho, onde veículos automotores e de tração
animal dividiam as ruas, para alguns lembrava a paisagem do velho oeste
americano.76
E assim o casal se ocupava com a administração da fazenda, e segundo
Mary Martin (1976) todos os dias havia algo diferente para se fazer, não era apenas
76
Rever depoimento na p.92.
103
um local de descanso, ou um lugar para se “(...) getting away from it all”.77 A fazenda
tinha a sua dinâmica e era o suficiente para ocupar Richard e Mary.
Mary Martin, no entanto arrumou algo para ela cuidar e passar o seu tempo.
Em 1970 ela inaugurou “uma das mais luxuosas boutiques do Brasil Central”
78
que
tinha em anexo um salão de beleza sob responsabilidade das Cáritas, uma
instituição da Igreja Católica de atuação social. A loja de produtos importados
realmente era muito sofisticada, até mesmo a filha do general Emílio Garrastazu
Médici, presidente do Brasil de 1969 a 1974, vinha à Anápolis exclusivamente para
comprar na Nossa Loja Mary Martin’s. Muitos turistas também se deslocavam para
a cidade com o único objetivo de fazer comprar na loja da atriz de Hollywood.79
A loja era bastante conhecida e prestigiada, entretanto os jornais da cidade
não davam muita importância para ela. Naquela época era comum as boutiques da
cidade realizarem desfiles para mostrar a coleção de roupas para a sociedade
anapolina, haviam vários desfiles e outros eventos, mas somente em um evento
Nossa Loja esteve presente, isto foi durante a Convenção do Rotary Club, distrito
453 em 1971.80 Também não foram encontradas muitas referencias nas colunas
sociais sobres Mary Martin, Joan Lowell, e Janet Gaynor, seus respectivos maridos
e qualquer outra pessoa que tenham vindo visitá-los. Isto pode nos levar a crer que
elas não se integraram ao círculo social anapolino. O interessante é que Joan Lowell
não é citada em nenhuma coluna social, somente em outras matérias do jornal.
Mendes (1995), porém, afirma que após ir morar em Brasília a atriz/escritora
freqüentava praticamente todas as festas da nova capital e era sempre encontrada
77
78
79
80
(...) ficar longe de tudo (Tradução livre).
Idem 50.
Jornal O Anápolis, Anápolis, 30-out-1970: p. 04.
Jornal Folha de Anápolis, Anápolis, 03-maio-1971, p. 04.
104
na seção da colunista social Katucha. Janet só foi citada em um jornal81, apenas
para dizer que ela morava em Anápolis, e mais nada, sua passagem por Anápolis foi
muito discreta.
3.6. Visitas Ilustres
O amor de Mary Martin por Anápolis fica nítido em sua biografia, pois
dedicou um capítulo para falar sobre seu rancho no Brasil, e exaltar as belezas
naturais da região. Este sentimento acabou convencendo muitos de seus amigos e
parentes a vir visitá-la.
A partir da década de 1950, principalmente, Anápolis entrou em um período
de estagnação, a cidade que num passado recente desfrutava do título de capital
econômica do estado, que se destacava pela oferta dos mais variados serviços, e
até pelo fato de ter um aeroporto com vôos diários e nacionais e internacionais,
“escala importante no sentido Rio-Miami, e última no sentido inverso” (ROCHA,
2007: p.153), passou por uma fase muito complicada.
A partir dos anos 1940 enfrentou uma grande crise, devido ao intenso
progresso econômico que não adequadamente acompanhado de uma evolução
estrutural; a localização do município, apesar de estratégica, causou grande
estagnação principalmente após a consolidação das duas capitais, primeiramente de
Goiânia, e depois de Brasília (a partir de 1960). Para Rocha (2007), contudo esta
opinião é tema de muitos debates, e não há um consenso sobre o fato de Goiânia
realmente ter inibido o desenvolvimento de Anápolis. Acredita-se inclusive que
81
Jornal O Anápolis, Anápolis, 02-dez- 1956, p. 01.
105
Brasília pode ter ampliado os horizontes da cidade, porque foi a partir da criação da
capital federal que se construiu a BR153, rodovia que interliga o norte e o sul do país
e que é conhecida como Belém-Brasíla, sugerindo, esta denominação, que seu
percurso se estenda de Belém a Brasília, quando na verdade esta começa em
Anápolis indo até a capital paraense
A despeito desta crise para Mary Martin e seus hospedes Anápolis era um
refúgio. Como já foi mencionado a presença das atrizes americanas em Anápolis em
pouco ou nada alterou a dinâmica da cidade, exceto pela atuação de Joan Lowell
que se integrou muito bem a sociedade anapolina a ponto de não retornar mais ao
seu país para morar, visitando-o somente uma vez após sua vinda para o Brasil. Os
jornais locais comprovam a pouca expressividade referente a presença destas
mulheres aqui, pois com duas grandes atrizes residindo na cidade pouco se
escreveram sobre elas, apenas notas, trechos ou citações.
Na década de 1970 Mary Martin, foi notícia em algumas reportagens: uma
sobre um almoço para autoridades que ela ofereceu em sua casa (cf. infra), e outra
falava sobre sua biografia que havia sido lançada nos Estados Unidos em 1975.82
Elas estavam na cidade apenas para descansar, para elas não havia badalação,
festas, nem colunas sociais apesar da cidade ter eventos e colunistas sociais que
escreviam sobre os acontecimentos da sociedade anapolina.
A
vida
das
atrizes
era
aparentemente uma
vida
pacata, exceto
ocasionalmente quando elas recebiam alguma visita importante em sua casa, como
quando Mary Martin recebeu em sua casa o embaixador americano no Brasil, John
Crimmins; o prefeito de Anápolis, Jamel Cecílio; o governador do estado, Irapuãn
82
Jornal Correio do Planalto, Anápolis, 31-jul-1975.
106
Costa Jr.; Geraldo Rosa, diretor do CERNE (Consórcio de Empresas de
Radiodifusão e Notícias do Estado); o empresário Mounir Naoun, o empresário e
amigo da atriz, Gibran El-Hadj; o deputado Habbib Issa; o médico Josiah Wilding; e
os seus amigos norte-americanos, o arquiteto e decorador John Astin Perkins; o
assessor da atriz , Bem Washer; e Ruth Zukerman.83
Sem
contar
os
inúmeros
artistas
e
pessoas
ligadas
à
indústria
cinematográfica norte-americana que vieram para Anápolis para visitar a casa da
atriz. Na sua biografia Mary Martin cita que apenas sua família e de seu marido, e
amigos do trabalho vinham para sua fazenda, mas alguns jornais atuais afirmam que
por causa destas atrizes viverem aqui muitos atores estiveram em Anapolis para
visitá-los, são eles: John Wayne, ícone dos filmes de faroeste; Ronald Regan, que
antes de se tornar presidente dos Estados Unidos era ator e veio conhecer a casa
de seus amigos;84 Janeth Leight, atriz do filme “Psicose” (1960); Clark Gable, o galã
do filme “E o vento levou” (1939);85 e provavelmente atriz indicada ao Oscar por
“Falam os Sinos” (1949), Loreta Young, que era muito amiga de Mary Martin86. Além
de Robert Cumminngs, estrela do filme “Disque M para Matar” (1954), de Alfred
Hitchcock; e Robert Mitchum, de “Herança de Carne” (1960), filme de Vincente
Minneli.87
A respeito dos filhos de Mary Martin e de Janet Gaynor falou-se muito,
pouco, pois sobre estes não há nada documentado, exceto pela biografia do filho de
Mary Martin. Sobre Robin Gaynor, filho de Janet e Adrian, não existe nada escrito, e
83
Idem 75.
Jornal Tribuna de Anápolis, Goiânia, 03 a 09-jul-2005.
85
Jornal Contexto, Anápolis, 22 a 28-jun-2005.
86
Gibram Ell-Hadj, que era o representante do casal Halliday no Brasil acabou ficando com muitos
documentos deles, incluindo correspondências tocadas entre Loretta Young e Mary Martin (MENDES,
1995).
87
Página eletrônica de Expat American Living in Brasil.
84
107
sobre Heller Halliday sabe-se que veio com os seus pais na primeira vista ao Brasil e
depois veio vê-los em Anápolis. Larry Hagmam, filho mais velho de Mary Martin veio
visitar a casa de sua mãe, mas ele nunca residiu na cidade, pois preferia morar nos
Estados Unidos. O Ator que interpretou o personagem J. R. do seriado de televisão
“Dallas” e o Major Nelson em, “Jeannie É um Gênio”, era visto andando pelas ruas
da cidade, certa vez acompanhado de um amigo “famoso” chamado Burt Lancaster,
o protagonista do filme “A Um Passo da Eternidade”, de 1953.
Além dos americanos que vieram visitar a Nossa fazenda, outros
americanos viviam em Anápolis, como George Homer que viveu em Anápolis no
mesmo período em que as atrizes moraram por aqui, sendo casado com Janet
Homer (a mesma que entregou a carta de Janet Gaynor para Mary Martin no porto
de Santos), e se tornou amigo delas, e também era amigo de Bernardo Sayão. Após
a fundação de Brasília mudou-se para aquela cidade com sua família.
3.7. A Volta
Richard Halliday e Mary Martin ao contrário de Joan, passavam na cidade
apenas para tomar o vôo que partia da capital direto para Nova York, nunca
freqüentaram a vida social de Brasília. O casal passava as temporadas na fazenda
em Anápolis, mas não deixaram de trabalhar durante o período em que viveram no
Brasil. De acordo com Cunha (Apud Mendes, 1995):
Não estranhe se eu informar para todos que um dos grandes shows da
Broadway está sendo bolado em Anápolis, pertinho de Brasília. Lá estão
Mary Martin, seu esposo Richard Halliday e o compositor Smitz. É que Mary
Martin está sendo, hoje, o grande sucesso dos Estados Unidos, e sempre
que pode se recolhe a sua fazenda em Goiás, para novas criações
(MENDES, 1995: p. 416).
108
O amor da atriz pela cidade era tanto que ela planejava aposentar-se e
mudar-se definitivamente para o interior do brasil. Porém, seus planos se desfizeram
em 1973, quando Richard Halliday faleceu em Brasília, vítima de pneumonia, e teve
então seu corpo transportado para os Estados Unidos onde foi cremado (MARTIN,
1976). O sonho de mudar-se definitivamente para Anápolis foi interrompido. De
acordo com algumas matérias88 de jornais da cidade a atriz ainda veio e
permaneceu na cidade por alguns anos. Entretanto com a morte do companheiro foi
impossível que ela continuasse na cidade vivendo longe de seus filhos e netos.
No inicio a vida na fazenda era alegre, conta Mary Martin (...). Havia a
presença de sua amiga Janet Gaynor e de seu marido Adrian, assim como
outra Janet, a esposa de George Hommer. Havia, também, a presença de
Joana Lowell e de seu marido, o capitão Bowen. Aos poucos, todos foram
deixando Anápolis, permanecendo lá apenas Mary Martin, o marido e uma
filha. Mais tarde, a filha casou e passou a residir nos Estados Unidos. O
casal ficou sozinho. Com a morte do marido, tornou-se difícil para sra.
Martin continuar ali, sozinha, cheia de recordações apesar de ser a terra
que amava(...), (MENDES, 1995: p: 417).
A atriz voltou para os EUA ainda no final da década de 1970 e em 1984 ela
passou para o nome de seu caseiro, José Rodrigues Sobrinho a propriedade de sua
fazenda89. Em 1978 a atriz foi homenageada na cerimônia de entrega do Oscar, e
em 1989 ela ganhou uma honraria do Centro Kennedy de Artes, de Washington,
pelo conjunto de sua obra, permaneceu trabalhando até por volta de 1986.
Em 1982 Mary Martin e Janet Gaynor sofreram um grave acidente num táxi,
quando veio a óbito seu assessor, Ben Washer. Janet também saiu muito
machucada do acidente, não conseguindo recuperar-se totalmente das fraturas, e
com o organismo fragilizado ela não resistiu a uma pneumonia que a levou em 14 de
88
Ver notas 83 e 75, que relatam fatos sobre Mary Martin em Anápolis que ocorreram após a morte
de Richard Halliday, em1973.
89
Página eletrônica do Memorial da Fama.
109
setembro de 1984. Mary Martin ficou muito abalada pelo acidente e depois pela
morte da melhor amiga, e em 11 de novembro, apenas um mês antes de completar
77 anos, ela faleceu em seu rancho na Califórnia, vítima de um câncer de cólon
(ROCHA, 2007).
Armando Bulcão, professor da Universidade de Brasília (UNB) produziu
recentemente um documentário ainda não lançado90, sobre a vida destes atores em
Anápolis e em Brasília e das outras personalidades que vieram visitá-los, buscando
resgatar aspectos da história destes locais que ainda não foram documentados.
90
Jornal O Popular, Goiânia, 25-ago-2005: p. 1.
110
CONCLUSÃO
O casal Joan Lowell e Leek Bowen vieram para Anápolis no final da década
de 1930, por que naquela época a cidade se destacava em Goiás, ainda mais
depois dos estímulos federais para a colonização do interior do país. Janet Gaynor e
Gilbert Adrian vieram para Anápolis por influência de Joan Lowell, eles procuravam
um lugar mais calmo para viver por causa dos problemas de saúde do Adrian. Mary
Martin por sua vez, veio por causa de Janet Gaynor, que era sua amiga e já residia
na cidade. Ao chegar em Anápolis, ela e Richard Halliday se encantavam com as
características do naturais do
local, bem como por sua paisagem urbana onde
conviviam o moderno e o arcaico, mas que para eles tudo era muito exóticos.
As histórias do livro de Joan Lowell são romanceadas bem ao estilo de um
filme hollywoodiano, com direito a um início insosso, quando inicia-se o romance
entre Joan e Leek; o desenrolar da história é de muita luta: existem vilões, como o
advogado grileiro (Cobra-Sêca); situações embaraçosas como o incidente com
família alemã; lições de vida, como quando Joan trocou o café pelos cristais do
garimpeiro João Batista; e quando o casal pensa em sucumbir
e desistir da
construção da estrada eis o final triunfante, que tem eles morando em sua própria
fazenda produtora de café, com uma casa com piscina, sem esquecer que ela
deixa subentendido que estão a procura de novas terras e novas aventuras em
outros lugares do Brasil.
Exatamente como num enredo de um filme a história de Joan se desenvolve
destacando pessoas importantes no contexto regional, que segundo ela teriam
111
participado dos acontecimentos: Quicas Borges teria comprado seus cachorros de
caça, o governador Pedro Ludovico que a isentou do pagamento dos impostos da
fazenda que haviam ganhado e finalmente Bernardo Sayão que ela conheceu na
região da CANG, e que tornou-se seu amigo.
A inconsistência de seu relato e seu passado, quando teve a primeira
biografia desmascarada, nos faz crer que Joan Lowell não veio para o interior de
Goiás abrir uma estrada, e os motivos são os seguintes: seu relato, como já foi
citado, é muito fantasioso, as dificuldades descritas são tamanhas que dificilmente
ela e o marido se aventurariam em uma região tão desabitada e selvagem, que
segundo Castilho (2009) mesmo a viagem para chegar até ela “não era nada fácil,
ao mesmo tempo que significava a possibilidade da “terra prometida”, o percurso
levava muito tempo e as doenças poderiam levar à morte”; o casal não possuía os
conhecimentos necessários para abrir uma estrada não era somente
abrir uma
“picada” na mata, eles precisavam saber para onde deveriam ir; o casal não
dominava o língua portuguesa para poder lidar com os trabalhadores da estrada e
para resolver os problemas que certamente surgiriam durante a construção da
estrada, e mesmo para viver no interior de Goiás.
Segundo Lowell (s/d: p. 151) Bernardo Sayão teria usado trechos da estrada
aberta pelos norte-americanos para construir uma rodovia que foi origem da
Transbrasiliana. No entanto, Léa Sayão (1976) afirma que seu pai construiu a esta
estrada “aproveitando o traçado que já havia de Anápolis à Jaraguá, e que tinha
consumido grandes somas de ambas as Prefeituras”. Não fala em estrada que tenha
sido financiada por um grupo paulista. Aliás, Joan não cita o nome do grupo que os
contratou, reforçando a tese de que o casal Bowen não teria aberto estrada alguma
112
em Goiás, pois se isso fosse verdade, não teria motivo para proteger o nome de um
grupo, no caso os Monteiro de Barros, que teria agido com tamanha má-fé
contratando os serviços de Joan e de seu marido e depois não os pagando.
Sayão (1976) afirma ainda que a colônia recebia muitos visitantes entre eles
estrangeiros e escritores que ficavam maravilhados com as possibilidades da região.
Comenta inclusive que certa vez quando seu pai trazia um comboio de máquinas
para a colônia em um dos acampamentos na estrada recebeu “amigos americanos,
a família Platt, de Chicago, acompanhada do casal capitão Bowen’ (p. 85). Como
podemos perceber, Joan Lowell de fato teve contato com Bernardo Sayão, e por
causa desta amizade ela visitou a CANG diversas vezes, e como era amiga da
família pode presenciar cenas
as intimas de Léa Sayão ainda criança que ela
descreveu na apresentação da biografia de Bernardo Sayão,escrita por Léa. Mas
isso não significa que a atriz/escritora tenha vivido acampada naquela região.
Sua história nos faz lembrar a trajetória de Bernardo Sayão: o casal Bowen
vieram abrir uma estrada e ficaram acampados, a beira da via que estavam abrindo,
com o tempo chegaram mais pessoas e o lugar foi se tranformando um aglomerado
de gente, algo semelhante aos primeiros tempos da Colônia Agrícola de Goiás.
Some a isto o fato de Bernardo Sayão ter ficado famoso pela abertura de estradas, e
uma das primeiras construções ter sido justamente a melhoria e ampliação da
estrada que ligava Anápolis a Jaraguá, mesmo antes de começar a Colônia. Joan
então poderia ter se inspirado na história do próprio Bernardo Sayão para escrever
suas memórias.
O fato de ela afirmar ter, juntamente com o marido, aberto uma estrada que
teria sido usada para a construção da Transbrasiliana, poderia desagradar Léa
113
Sayão, caso não fosse verdade, pois ela era a filha do verdadeiro construtor desta
estrada. O livro de Joan foi publicado em 1952, naquela época Bernardo Sayão era
apenas o ex administrador da CANG, que havia sido dispensado do cargo devido a
indícios de má administração, na ocasião do lançamento do livro ninguém poderia
imaginar ainda que aquela rodovia seria umas das mais importantes do país, e que
seu construtor seria considerado um herói nacional .
Mendes (1995), um jornalista que conheceu pessoalmente Joan Lowell
afirmou que ela “dizia” (a conjugação do verbo evidencia que era a própria autora
que falava) que veio dos Estados Unidos por causa da descoberta das mentiras do
seu livro, e ainda segundo este ao contrário do que a atriz/escritora escreveu no
livro, veio esperar o marido em Anápolis e não em uma praia deserta de Santos. Em
Anápolis teria conhecido Bernardo Sayão e freqüentado a CANG. O fato de não ter
vivido em um acampamento a beira da estrada não a impediu de ter passeado pelo
interior de Goiás, em uma destas aventuras pelo sertão goiano ela e Leek Bowen
foram
acusados de assassinato de duas crianças que haviam medicado. Esta
história reforça ainda mais a idéia que o casal Bowen não abriu estrada, pois é
improvável que na situação que ela dizia estar vivendo, o casal pudesse passar
vários dias cuidando das crianças enquanto as obras da estrada ficavam paradas.
Existem poucas referências sobre as histórias de Joan Lowell em outras
publicações, o que nos pode levar a crer que nem tudo no seu livro é verdade, isto
não seria novidade, pois quando ainda estava morando nos Estados Unidos ela
inventou boa parte de sua primeira autobiografia, sendo desmascarada algum tempo
depois. Outras pesquisas que citam o fato de Joan Lowell ter ido abrir uma estrada
que partia de Jaraguá rumo às terras da fazenda Lavrinhas, como o trabalho de
114
Silva (2002), baseiam-se no próprio livro da atriz/escritora, então não podem ser
considerados evidência concreta de que ela realmente tenha vivido naquela região,
pois não se fez uma análise da possibilidade deste fato ter ocorrido como é narrado
em “Terra Prometida”.
Estes são os indícios de que Joan Lowell e Leek Bowen não foram abrir uma
estrada em direção a fazenda Lavrinhas, mas moravam em Anápolis, onde tinham
uma fazenda; Joan participou ativamente da fundação da igreja Fraternidade
Eclética Espiritualista Universal, e ficou muito amiga de seu fundador, Mestre
Yokaanam. A atriz/escritora também emitia cheques sem fundos, e se envolveu em
vendas fraudulentas de terras, quando recebeu dinheiro de muitos atores norteamericanos, deixando-os no prejuízo.
As atrizes Janet Gaynor e Mary Martin também foram vítimas de Joan
Lowell. Mas ambas conseguiram comprar as tão sonhadas propriedades em
Anápolis, cidade que era destaque na região. Janet Gaynor foi embora ainda na
década de 1950, pois seu marido continuava doente, e mesmo a calmaria da vida no
interior não o havia curado, Mary Martin deixa Anápolis mais de vinte anos de pois
de chegar, e após a morte de seu marido, quando decidiu ir para perto de sua
família nos Estados Unidos.
A presença destes atores na cidade em pouco, ou nada, alterou a dinâmica
do município. Chegamos a esta conclusão após a análise dos periódicos regionais,
quando verificamos a ausência de publicações sobre os atores nos jornais locais da
época, uma evidência de que a presença destes norte-americamos em Anápolis
teria sido bastante discreta. Atualmente poucos sabem deste fato, porém pessoas
115
mais velhas, que viveram naquela época, conhecem esta importante passagem da
história de Anápolis.
Mas com a consolidação de Goiânia como capital estadual, e posteriormente
com o inicio da construção de Brasília, Anápolis perde um pouco do seu prestígio.
Juntam-se a isto os fatos de: a Fraternidade Eclética estava construindo sua
comunidade conhecida como Cidade Eclética nos arredores da futura capital; Joan
Lowell se sentia-se ameaçada por causa de dívidas; e seu grande amigo, Bernardo
Sayão tinha se mudado para o Planalto Central, para tomar frente das obras de
construção de Brasília. Não havia mais nada que prendesse Joan Lowell em
Anápolis, todas as atenções agora se voltavam para a construção de nova capital.
Depois de inaugurada a capital ofereceu muito mais oportunidades para Joan
Lowell, eram festas e outros eventos sociais onde ela quase sempre atraia a atenção
por sua extravagância e desinibição ostentando sua condição de ex-estrelas de
Hollywood. Em Brasília ela teve também a oportunidade de voltar a escrever para
um jornal.
Sobre os maridos destas três mulheres pouco se tem documentado, suas
esposas se destacam por que elas eram as “estrelas de cinema”, além de serem
mulheres corajosas e atuantes. Estes homens que trabalhavam nos bastidores da
indústria cultural norte-americana, ou mesmo nem tivera contato com ela como no
caso do capitão Leek Bowen, não tiveram muito espaço na mídia, não sendo citados
nem mesmo em páginas eletrônicas puderam ser encontradas informações sobre
eles; Adrian neste caso possuía a vantagem de ter sido um dos mais importantes
estilistas de sua época, existindo maiores informações acerca de sua pessoa.
116
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