A importância da floresta e do Montado ao longo da história
Florbela Melhorado ([email protected]) (Assistente Convidada da Universidade de Évora)
Departamento de Ecologia
A mancha florestal do actual território português inicia a sua progressiva diminuição a partir do
III milénio a.C., com práticas de desflorestação para a instalação da agricultura e pastoricia
(MATOSO, J., 1993).
Já em I d.C. é a viticultura romana que acentua a diminuição da mancha florestal do actual
território. Após o declínio romano, segue-se o reinado Visigótico, onde o “código visigótico”
sugere que se tenha estabelecido alguma protecção à floresta.
Ao período visigótico, seguem-se as intensas desmatações por acção dos rebanhos e
necessidades navais no tempo dos árabes, passando pelos ciclos de protecção e destruição
por razões venatórias que vêm desde o tempo da Reconquista Cristã.
Dentro da mancha florestal portuguesa, as quercíneas com o sobreiro, em particular, são das
espécies, entre todas as que constituem o antigo e o actual coberto florestal a que mais
medidas legislativas originou.
Os primeiros diplomas relativos à defesa do património florestal remontam à fundação da
nacionalidade, cuja inspiração parece surgir já do Código Visigótico (NATIVIDADE, 1950).
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No reinado de D. Sancho I (1188–1230) estabelecia-se a multa de 10 morabitinos a “totus
homo qui rancare aut taiare arborem” e previam-se penalidades draconianas, relativamente ao
pinhal: “qui pino taiare inforquen lo”.
A primeira referência ao sobreiro e azinheira remonta às Leis Agrárias Portuguesas, dos
princípios do século XIII, estabelecendo-se aqui as bases das leis de protecção à floresta de
sobro e azinho (NATIVIDADE, 1950).
Nos finais do século XIII, com o reinado de D. Dinis, aparecem as cartas de criação de
coutadas, que visavam a protecção do sobreiro e da azinheira, proíbindo e punindo práticas de
exploração, como queimadas, varejamento indiscriminado do fruto (que como se sabe,
constituía por vezes na farinha dos mais carenciados), colheita abusiva da rama verde (para a
alimentação do gado) e sobretudo cortes indevidos (normalmente para lenha ou carvão).
Nesta altura a atribuição de legislação sobre as florestas de quercíneas, visava essencialmente
a protecção de espécies cinegéticas de grande porte, pelo interesse da corte e feudatários na
caça e montaria.
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morabitino - do árabe murabiti, antiga moeda portuguesa e espanhola equivalente,
posteriormente, (1 morabitino) a 27 reis (Dicionário da Língua Portuguesa, 7ª Edição Porto
Editora); o real é também uma antiga moeda portuguesa, de cobre, mas de valor variável,
segundo as épocas. Era a unidade nomial do antigo sistema monetário em Portugal, no Brasil e
usada na antiga India Portuguesa (Lello Universal Enciclopédia, 1991)
No século XIV um pequeno período do gelo coincide também com o flagelo da peste negra,
dizimando metade da população europeia. Após esta quebra populacional, as florestas
recuperaram terreno. No século XV verifica-se novamente um aumento exponencial da
população, a pressão da procura alimentar leva ao alargamento do cultivo para terras
marginais, incluindo o avanço para as áreas de paúis (1503) dando no caso de Lagos, o nome
à vila (MATOSO, J., 1993).
A desflorestação a que se procedia, aumentava a erosão, para a combater impôs-se por via
legislativa a plantação de pinhais, e nos locais impróprios para pinhal, castanheiros, carvalhos
ou qualquer árvore que possa proliferar. Não havendo baldios, os donos das propriedades
seriam constrangidos a fazê-lo nas suas próprias terras (Leis Extravagantes, 1569).
Também para a defesa das Lezírias se determinou a proíbição do arranque de sobreiros,
desde Abrantes até Lisboa onde seria uma tentação abater árvores para fazer carvão e vendêlo em Lisboa.
Nesta altura, época dos descobrimentos, a desflorestação toma grandes proporções, não só
para a construção naval e agricultura, mas também para a industria. No século XVI instala-se a
crise da madeira, em relação às actividades industriais à volta da região de Lisboa, um alvará
proíbia qualquer empreendimento industrial numa área de 10 léguas (40 km) ao redor de
Lisboa.
Persistentes esforços se empregaram através dos tempos, para proteger a floresta, no século
XIX, criam-se os Serviços Florestais, para conduzirem o repovoamento florestal do País.
Em termos legislativos, o sobreiro é entre as espécies nacionais, a que mais disposições legais
originou, tendo regulamentadas certas práticas culturais como os desbastes, a poda e o
descortiçamento, desde o século XVIII.
Apartir do séc. XX, 1927, a legislação proíbe novamente, o arrancar ou mutilar árvores
florestais, ou empregar outros meios de onde resulte a sua morte ou depreciação. Estas
contravenções são punidas com multas desde 0.02 a 0.15 euros.
Com a campanha cerealífera, os cortes e desbastes dos montados, provocariam novamente
grandes desflorestações, sendo criados programas de reflorestação de 1945 a 1993
especialmente na zona a sul do tejo.
Contudo, apesar dos problemas de erosão e degradação do solo, a legislação é actualizada
apenas no final da década de 1970, sendo o corte de sobreiros, punível com multas de 15 a 15
000 euros (D.L. nº 172/88), e no caso da azinheira com multas de 0,50 a 1,75 euros (D.L.nº
14/77), que em 1982 são actualizadas para 3,5 euros por árvore (D.L: nº131/82). Valores
substancialmente inferiores ao benefício económico retirado pelo infractor com a venda da
lenha, que aos preços correntes do mercado, se estimava em 1996 em cerca de 20 euros por
árvore.
Actualmente, no D.L. nº 169/2001 reconhece-se que os povoamentos de sobreiro e azinheira,
incluem alguns dos biótopos mais importantes ocorrentes em Portugal, desempenhando uma
importante função na conservação do solo, na regularização do ciclo hidrológico e na qualidade
da água, representam ainda um recurso renovável de extrema importância, a nível nacional.
No quadro legislativo, o D.L nº 11/97, introduziu alterações significativas em relação à
protecção do sobreiro e da azinheira, sendo corte ou arranque, púnivel com coima de 50 a 150
000 euros no caso do sobreiro, e de 50 a 75 000 euros no caso da azinheira.
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