Beleza é sacrifício. É uma batalha que exige, além das privações, a boa herança genética. E, todos os dias, em frente ao espelho as mulheres fazem tudo sempre igual: conferem a linha dos culotes, o volume das pernas e avaliam a densidade dos seios. Mas será que beldades como Marilyn Monroe, Leila Diniz ou Martha Rocha, por exemplo, mesmo considerados símbolos da beleza ideais, seriam belos em qualquer época, ou os padrões do passado esconderiam alguns de seus melhores atributos de hoje? Ao longo dos séculos, os padrões de beleza mudaram muito. Quem vê uma foto de Sabine Poppaea se espanta ao saber que ela era considerada a musa do século XVI. No entanto, na virada do século, o deslumbramento pela silhueta mais fina deixa as mulheres espremidas em espartilhos. Até que, no início dos anos 20, a estilista Coco Chanel define o conceito de elegância, incentivando mulheres a ficarem magras. Afinal, gorduchas como Sabine Poppaea jamais caberiam em suas roupas. Na mesma época, a americana Cindy Jackson, ex­frentista de posto de gasolina, passou a faca 14 vezes no corpo e mais parecia uma sósia da Barbie. E, assim, no século XXI, as mulheres passam a comer biscoito de água e sal, beber água­de­coco, ou viver movidas a fatias de peixe grelhado. Se no início do século passado, 60 kg, 70 cm de cintura e 90 de quadril era considerado o padrão ideal, prepara­se: agora bastam 48 kg, 58 cm de cintura e 88 de quadril. "A beleza muda. Ela abarca as grandes dinâmicas sociais, as rupturas culturais. Há dois universos, cada um fortemente afastado do outro. No primeiro, as bocas delicadas, sempre estreitas, dos retratos do Renascimento (século XVI), lábios tão finos, como apertados, cor pálida, linhas fechadas, em que qualquer sorriso deve ser contido. No outro, as bocas abertas dos retratos de hoje, mais coloridas, lábios de formas largas", descreve o historiador Georges Vigarello, que acaba de lançar História da Beleza, pela editora Ediouro.
As corpulentas do século XVI
Ao longo da história, desde os regimes de reis, a noção do belo segue normas, que determinam os padrões estéticos definidos para a época. A feminista americana Naomi Wolf, que, em 1992, lançou O Mito da Beleza, identifica os ideais físicos desejados entre os séculos XVI e XVIII.
"A mulher antes da Revolução Industrial (1760) não experimentou o sentimento da mulher moderna com relação à beleza. Antes da invenção das tecnologias, uma mulher era exposta a poucas imagens do que seria uma mulher com beleza fora aos padrões da Igreja", nota a feminista Naomi. Naomi tem toda razão. Os retratos das esposas dos reis, no século XVI, denunciam mulheres mais corpulentas, escondidas sob os vestidos volumosos. A marquesa Sabine Poppaea com suas formas arredondadas e cor pálida é a personificação da mulher sedutora. Na época, a culinária primava por seu alto teor calórico, por isso, a disponibilidade das mulheres para a alimentação era muito maior.
O padrão 58 cm de cintura
Eis que surge uma nova musa. A atriz Leila Diniz firma­se como a representante da libertação sexual ao expor o corpo bronzeado, mesmo grávida. Com a cultura hippie, a comida vegetariana entra na moda e já, em1969, a balança começa a "irritar" a mulherada. Em 1998, Carolina Ferraz faz sucesso como exemplo de mulher magra, alta, com os músculos bem delineados: o modelo de beleza dos anos 90 e a luta pela conquista do corpo perfeito. "Lara Croft, por exemplo, cantora inspirada na primeira Lara, de quem são exibidas as rigorosas dimensões: 1,68m de altura, 48 kg de peso, curvas de 90 cm no quadril, 58 cm de cintura e 88 cm de busto. Lara exprimia o perfil de hoje: pernas esguias, bacia acentuada, silhueta adelgaçada. Cada dificuldade de sua vida parece ligada a um tormento excessivo: engordei, emagreci", descreve Georges Vigarello.
Não é à toa que a beldade Vera Fisher se submeteu às cirurgias estéticas para abandonar o estilo "recheado" que lhe rendeu o prêmio de Miss Brasil 1969. E parece que os complexos voltados para a conquista do corpo perfeito ainda vão congestionar de complexos as mulheres. Haja espelho para avaliar as linhas dos culotes. A atual Miss Brasil, Rafaela Zanella, que o diga!
Silhuetas finas em 1910 Em 1910, as preferências pelas silhuetas finas forçam mulheres a se espremer em espartilhos. Para combater o excesso de gordura, comprimidos de arsênico, usados na I Guerra passam a ser moda. E esse já é o primeiro passo para o novo modelo de beleza. Mais magras que as gerações anteriores, as mulheres estão mais liberais, pernas mais exibidas e esguias. Até que em 1950, tudo indica uma presença maior do sensual. "Caminhar envolvente de Marilyn Monroe, gestos mais desenvoltos, mais abandonados de Bardot. O sex appel é Marlene Dietrich, o glamour é Ava Gardner. O importante é a erotização. É a presença de uma beleza mais provocante", descreve o historiador Georges Vigarello, na obra História da Beleza.
Remédios alçam primeiros vôos
Durante a II Guerra Mundial (1945), se destacam os perfis mais roliços das pernas que, no Brasil, aparece nas vedetes da televisão como Carmem Verônica e Norma Tamar. No entanto, Martha Rocha leva um susto ao perder o título de miss universo em 1954, por conta das duas polegadas a mais nos quadris. Com uma indústria farmacêutica começando a alçar seus primeiros vôos, os remédios para emagrecer – como a anfetamina usada por soldados na guerra – passam a fazer parte da vida urbana. Principalmente, com a chegada de enlatados em supermercados.
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