KARIN VIEIRA DA SILVA
GESTÃO SOCIAL E PARTICIPAÇÃO NAS DECISÕES: estudos
de caso em cooperativas catarinenses
Dissertação submetida ao Curso de
Pós-graduação em Administração
da Universidade Federal de Santa
Catarina como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre em
Administração.
Orientador: Prof. Dr. Luis Moretto
Neto
Florianópolis
2013.
Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de
Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.
Silva, Karin V.
GESTÃO SOCIAL E PARTICIPAÇÃO NAS DECISÕES : estudos de
caso em cooperativas catarinenses / Karin Silva ;
orientador, Luis Moretto neto - Florianópolis, SC, 2013.
200 p.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa
Catarina, Centro Sócio-Econômico. Programa de Pós-Graduação em
Administração.
Inclui referências
1. Administração. 2. Gestão Social. 3. Participação. 4.
Tomada de Decisão. 5. Cooperativismo. I. Moretto neto,
Luis . II. Universidade Federal de Santa Catarina.
Programa de Pós-Graduação em Administração. III. Título.
KARIN VIEIRA DA SILVA
GESTÃO SOCIAL E PARTICIPAÇÃO NAS DECISÕES: estudos
de caso em cooperativas catarinenses.
Esta dissertação foi julgada adequada para obtenção de Grau de Mestre
em Administração e aprovada, em sua forma final, pelo Curso de PósGraduação em Administração da Universidade Federal de Santa
Catarina.
Florianópolis, 08 de fevereiro de 2013.
Professora Eloise Helena Livramento Dellagnelo, Dra.
Coordenador do curso
Apresentada à Banca Examinadora Integrada pelos professores:
Professor Luís Moretto Neto, Dr.
Universidade Federal de Santa Catarina – Orientador
Professora Andressa Sasaki Vasques Pacheco, Dra.
Universidade Federal de Santa Catarina – Membro Interno
Prof. Paulo Otolini Garrido, Dr.
Universidade Federal de Santa Catarina – Membro Interno
Prof. Marcus Vinícius Andrade de Lima
Universidade Federal de Santa Catarina – Membro Interno
Prof.ª Carla Cristina Dutra Búrigo, Dra.
Universidade Federal de Santa Catarina – Membro Externo
Aos meus pais, pelo amor e
apoio incondicional.
AGRADECIMENTOS
A realização desta pesquisa não seria possível sem o incentivo e
apoio de importantes pessoas ao longo de minha caminhada. Por isso,
gostaria de registrar meus agradecimentos aos que foram essenciais
nesse período de minha vida.
Em especial ao Professor Luís Moretto Neto, pela dedicação
dispensada, conselhos, apoio e orientação, acadêmica e pessoal, que
fizeram com que eu trilhasse bons caminhos desde a graduação e
contribuiu, enormemente, para o meu amadurecimento. Muito, muito
obrigada Professor, pela oportunidade de caminhar ao seu lado.
Ao Professor Paulo Garrido, por sua colaboração e sempre
disposição em ajudar.
Aos colegas Samuca, Carlos e Luciane, do Grupo de Estudos em
Gestão Social, pelo companheirismo e amizade.
À Universidade Federal de Santa Catarina, ao seu Programa de
Pós-Graduação em Administração e aos Professores desta casa, por mais
esta oportunidade de aprendizado e crescimento. Aos componentes da
banca examinadora pela disposição e contribuições à dissertação.
Às batalhadoras mulheres da COLIMAR pela cordialidade com
que me receberam e disposição em compartilhar sua história.
Aos membros da COEPAD pela atenção e disposição em
contribuir. Em especial, ao Seu Aldo, que a cada encontro proporcionou
ensinamentos incríveis e aos deficientes intelectuais pelo carinho com
que me receberam.
Aos meus amigos, sempre presentes e acolhedores, em especial
ao Jefferson, o irmão que tive a oportunidade de escolher.
Ao Anderson, fundamental durante minha caminhada, pelo amor,
dedicação e paciência.
Às minhas companheirinhas, Nina e Suki, que, mesmo sem saber,
tornam meus dias mais felizes.
À minha família, meus pais Luis e Aurora, exemplos de força e
hombridade, pelo amor, compreensão e apoio incondicional, meus irmão
Juliano e Cassiano, pelo cuidado e abraço sempre carinhoso e
motivador, meu sobrinho e afilhado Bruno, a luz da minha vida.
À DEUS, com imensa gratidão, por ter colocado em meu
caminho pessoas tão especiais e ter me dado força e saúde para
concretizar este trabalho.
Um leitor vive mil vidas antes de morrer, o homem que nunca lê vive
apenas uma.
George R. R. Martin
SILVA, Karin Vieira da. Gestão social e participação nas decisões:
estudos de caso em cooperativas catarinenses. 2013. 171f. Dissertação
(Mestrado em Administração) – Programa de Pós-Graduação em
Administração, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2013.
RESUMO
A observação do cotidiano de organizações que emergiram da
sociedade civil e se desenvolveram através da construção coletiva de
diversos atores sociais evidencia que não são raras as iniciativas que
reproduzem em suas ações administrativas a lógica mercadológica,
marcada pelo utilitarismo e pela tecnoburocracia. Acredita-se, todavia,
que a lógica estratégica de mercado diverge, fundamentalmente, da
orientação pluralista e coletivista sobre as quais estas organizações estão
fundadas. Surge, nesse âmbito, a atenção para alternativas de gestão que
possam convergir com os propósitos das organizações de origem social,
com orientação dialógica e participativa. Optou-se então, neste trabalho,
pelo uso da gestão social como lente analítica para compreensão da
participação dos atores organizacionais nos processos de tomada de
decisão em duas cooperativas catarinenses de origem popular, principal
objetivo desta pesquisa. O presente trabalho teve como lócus de análise
a Cooperativa de Mulheres Maricultoras de Governador Celso Ramos
(COLIMAR) e a Cooperativa Social de Pais, Amigos e Portadores de
Deficiência (COEPAD), localizada em Florianópolis/SC. Como base
para pesquisa, utilizou-se referencial teórico que aborda os seguintes
temas: gestão social, cidadania, cidadania deliberativa e participação,
associativismo civil, cooperativismo e processo decisório. Os
procedimentos metodológicos utilizados seguiram uma abordagem
qualitativa do tipo estudo de casos múltiplos, caracterizando-se ainda
como uma pesquisa aplicada e descritiva. A coleta de dados foi realizada
através da análise documental, observação e entrevistas semi
estruturadas. Para análise dos dados foram utilizadas as técnicas de
análise de conteúdo e análise documental. Em linhas gerais, concluiu-se
que a participação dos membros da COLIMAR nos processos decisórios
aparece com maior intensidade, assim como o caráter deliberativo e
consensual das decisões é mais acentuado. A organização apresenta
fortes traços de gestão social e de cidadania deliberativa desde a sua
origem até a forma como está atualmente estruturada. Na COEPAD,
averiguou-se, de forma mais latente, a coexistência de traços de gestão
social e de gestão estratégica no que tange a participação dos atores
organizacionais no processo decisório, pois apresenta maior burocracia
em suas estruturas e processos, todavia com possibilidades de
participação e potencial para a sua ampliação.
Palavras-chave: Gestão Social. Participação. Tomada de
decisão. Cooperativismo.
SILVA, Karin Vieira da. Social management and participation in the
decisions: case studies in cooperatives located in Santa Catarina. 2013.
171f. Thesis (Master in Management) – Program of Post-Graduation in
Management, Federal University of Santa Catarina, Florianópolis, 2013.
ABSTRACT
The routine observation of the organization that emerged from society
and developed through the collective construction of social actors,
shows that is not rare, that there are management initiatives actions that
reproduce the market logical, labeled by the utilitarianism and the
technical bureaucracy. It is believed, however, that the strategic logical
diverges, fundamentally, from the pluralist and collectivist orientation
which these organization are grounded. Arises, in this scope, the
attention to the alternatives in management that could converge with the
purposes of the organizations sourced in social, with dialogical and
participation orientation. So, it was decided, in this work, to use the
social management as analytical focus to comprehend the participations
of the organization actors in the decision making process in two
cooperatives stated in Santa Catarina, sourced in popular factors, to be
the main goal of this research. The present work had as analysis locus
the Mariculturists Woman Cooperative located in Governador Celso
Ramos (COLIMAR), and the Social Cooperative of Parents, Friends and
Patients with disability (COEPAD) located in Florianópolis/SC. As the
base to this research, it was used the theoretical referential that discusses
the following themes: social management; citizenship; deliberative
citizenship and participations, citizen associativism, cooperativism, and
decision making process. The methodological procedures used, was
followed by a qualitative approach of the multiple case study type,
characterizing also as an applied and descriptive research. The data
gathering was done through the documental analysis, observations and
semi structured interviews. To the data analysis, it was used the content
analysis technique and the documental analysis. Roughly, it was
concluded that the participation of the members in COLIMAR in the
decision making process shows in a more intensive manner, as well the
deliberative nature and consensus in the decisions. The organization
shows stronger traces of social management and citzen deliberative ,
since their origin until the actual organization structure. In COEPAD, it
was observed, more latent, the coexistence of social management traces
and the strategic management in regard the participation of the
organization actors in the decision makin process, because shows more
burocracy in their structures and process, however with possibilities of
participation and potential for expanding.
Keyword: Social Management; Participation; Decision Making;
Cooperativism.
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Elementos constitutivos da gestão para cada
processo organizacional .......................................................... 26
Quadro 02: Tipos de gestão e suas características .................. 37
Quadro 03: Mapa conceitual da gestão social – Eixo temático:
societário ................................................................................. 39
Quadro 04 :Mapa conceitual da gestão social – Eixo temático:
organizacional ......................................................................... 40
Quadro 05: Mapa conceitual da gestão social – Eixo temático:
metodológico. .......................................................................... 41
Quadro 06: Diferenças societárias entre associação e
cooperativa. ............................................................................. 70
Quadro 07: Evolução dos princípios cooperativistas segundo a
Aliança Cooperativa Internacional. ......................................... 73
Quadro 08: Abordagem Racional e Abordagem Racional
Limitada. ................................................................................. 84
Quadro 09: Abordagem Racional e Abordagem Incremental . 85
Quadro 10: Síntese das Abordagens Teóricas do processo
decisório .................................................................................. 87
Quadro 11: Categoria: processo de discussão ......................... 98
Quadro 12: Categoria: inclusão ............................................... 99
Quadro 13: Categoria: igualdade participativa..................... 100
Quadro 14: Categoria: autonomia. ........................................ 101
Quadro 15: Avaliação da COEPAD segundo as Categorias da
Pesquisa ................................................................................. 145
Quadro 16: Avaliação da COLIMAR segundo as categorias da
pesquisa. ................................................................................ 173
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Proposta inicial de uma aproximação teórica para a
Gestão Social, baseado em Categorias Teóricas da Gestão
Social e suas interações. .......................................................... 46
Figura 02: Produtos COEPAD .............................................. 108
Figura 03: Espaço de comercialização da COEPAD no Centro
de Eventos da UFSC. ............................................................ 109
Figura 04: Mural COEPAD................................................... 114
Figura 05: Mural COEPAD................................................... 115
Figura 06: Mural COEPAD................................................... 115
Figura 07: Mural de produção COEPAD .............................. 116
Figura 08: Programação COEPAD. ...................................... 117
Figura 09: Sede da COLIMAR, em Governador Celso Ramos/
SC .......................................................................................... 150
Figura 10: Embalagem antiga dos produtos COLIMAR. ..... 154
Figura 11: Nova embalagem dos produtos COLIMAR. ....... 155
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
25
1.1Contextualização e apresentação do problema de pesquisa ... 25
1.2 Objetivo Geral .................................................................. 28
1.3Objetivos Específicos .......................................................... 28
1.4 Justificativa ...................................................................... 29
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
33
2.1 Gestão Social: perspectivas epistemológicas e conceituais .... 33
2.2 Cidadania, cidadania deliberativa e participação: alternativas
democráticas de gestão ........................................................... 50
2.3 Associativismo Civil .......................................................... 62
2.4 Cooperativismo ................................................................. 68
2.4.1 Cooperativas Socais .................................................................. 75
2.5 Processos decisórios........................................................... 80
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
91
3.1 Caracterização do estudo ................................................... 91
3.2 Universo do estudo ............................................................ 94
3.3 Coleta de Dados ................................................................ 94
3.4 Categorias de análise ......................................................... 97
3.5 Análise de dados.............................................................. 102
3.6 Limitações do trabalho .................................................... 104
4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
105
4.1 CASO 1: Cooperativa Social de Pais e Amigos dos Deficientes
............................................................................................ 105
4.1.1 Caracterização da Cooperativa de Pais, Amigos e Portadores de
Deficiência – COEPAD ................................................................... 105
4. 1. 2 Descrição e análise dos resultados com base nas categorias113
4.1.2.1 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 1: Processo de
discussão .......................................................................................... 113
4.1.2.1.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Canais de
difusão .............................................................................................. 113
4.1.2.1.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Qualidade da
informação ....................................................................................... 119
4.1.2.1.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Pluralidade do
grupo promotor ................................................................................ 120
4.1.2.1.4 Considerações gerais sobre a categoria “Processo de
discussão” ........................................................................................ 121
4.1.2.2 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 2: Inclusão .. 121
4.1.2.2.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Abertura dos
espaços de decisão ........................................................................... 121
4.1.2.2.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Aceitação social
......................................................................................................... 124
4.1.2.2.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Valorização
cidadã............................................................................................... 126
4.1.2.2.4 Considerações gerais sobre a categoria “Inclusão” ........ 129
4.1.2.3 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 3: Igualdade
participativa ..................................................................................... 129
4.1.2.3.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Forma de
escolha dos dirigentes ...................................................................... 129
4.1.2.3.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Discurso dos
dirigentes’ ........................................................................................ 131
4.1.2.3.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Avaliação
participativa ..................................................................................... 133
4.1.2.3.4 Considerações gerais sobre a categoria “Igualdade
participativa”................................................................................... 135
4.1.2.4 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 4: Autonomia136
4.2.2.4.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Alçada dos
atores ............................................................................................... 136
4.1.2.4.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Perfil da
liderança .......................................................................................... 138
4.1.2.4.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Possibilidade
exercer a própria vontade ................................................................ 143
4.1.2.4.4: Considerações gerais sobre a categoria “Autonomia”... 145
4.1.3 Avaliação da COEPAD segundo as Categorias da Pesquisa 145
4.2 CASO 2: Cooperativa de Mulheres Maricultoras de Governador
Celso Ramos (COLIMAR)
149
4.2.1 Caracterização da Cooperativa de Mulheres Maricultoras de
Governador Celso Ramos - COLIMAR .......................................... 149
4. 2. 2 Descrição e análise dos Resultados com base nas categorias157
4.2.2.1 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 1: Processo de
discussão .......................................................................................... 157
4.2.2.1.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Canais de
difusão .............................................................................................. 157
4.2.2.1.2 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 2: Qualidade da
informação ....................................................................................... 158
4.2.2.1.3 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 3: Pluralidade do
grupo promotor ................................................................................ 159
4.2.2.1.4 Considerações gerais sobre a categoria “Processo de
discussão” ........................................................................................ 160
4.2.2.2 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 2: Inclusão . 161
4.2.2.2.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Abertura dos
espaços decisórios ............................................................................ 161
4.2.2.2.2 Avaliação da COLIMAR segundo os Critérios 2 e 3: Aceitação
social e Valorização cidadã ............................................................. 162
4.2.2.2.3 Considerações gerais sobre a categoria “Inclusão” ........ 163
4.2.2.3 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 3: Igualdade
participativa ..................................................................................... 163
4.2.2.3.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Forma de
escolha dos dirigentes ...................................................................... 164
4.2.2.3.2 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 2: Discurso dos
dirigentes .......................................................................................... 165
4.2.2.3.3 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 3: Avaliação
participativa ..................................................................................... 166
4.1.2.3.4 Considerações gerais sobre a categoria “Igualdade
participativa” ................................................................................... 167
4.2.2.4 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 4: Autonomia168
4.2.2.4.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Alçada dos
atores ................................................................................................ 168
4.2.2.4.2 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 2: Perfil da
liderança .......................................................................................... 169
4.2.2.4.3 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 3: Possibilidade
de exercer a própria vontade ........................................................... 170
4.2.2.4.4 Considerações gerais sobre a categoria “Autonomia” .... 172
4.2.3 Avaliação da COLIMAR segundo as categorias da pesquisa172
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
177
5.1 Sugestões para pesquisas futuras...................................... 184
REFERÊNCIAS
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA
APÊNDICE B – ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO
185
198
201
25
1 INTRODUÇÃO
Neste capítulo estão dispostos a contextualização do tema e da
problemática estudada, o objetivo geral e o seu desdobramento em objetivos
específicos e, por fim, a justificativa em termos de motivação da
pesquisadora, importância, oportunidade e viabilidade do tema.
1.1
Contextualização e apresentação do problema de pesquisa
As organizações de natureza social, especificamente, as que
emergem de iniciativas da sociedade civil, comumente apresentam em
sua origem propósitos solidários, encontrando na ação coletiva subsídios
para o desenvolvimento e fortalecimento de suas iniciativas. A
institucionalização destas organizações, no seu ajustamento formal e
legal tende a criar um processo de burocratização de suas estruturas e de
seus processos em diferentes níveis e intensidades. Fato que não diminui
a importância dos trabalhos que desenvolvem, apenas suscita uma
discussão quanto à natureza das ações gerenciais desenvolvidas em
âmbito organizacional e sua convergência ou não com os valores
primários destas.
A
finalidade
social
destas
organizações
diverge
fundamentalmente da concepção instrumental das ações, que devem ter
bases coletivas e plurais, desta forma, a gestão de organizações sociais
enfrenta tensões e dualidades lógicas, marcadas pela racionalidade
predominante em suas ações em confronto com o seu propósito social.
A título de esclarecimento, destaca-se que o termo “organizações
sociais” usado no presente trabalho, refere-se de forma pontual às
organizações provenientes da sociedade civil organizada e que
apresentam como objetivo o enfrentamento de demandas e
transformação social, independente da figura jurídica que apresentam
(Associações, Cooperativas, dentre outros).
A racionalidade instrumental (RAMOS, 1981), típica do
mercado, como enclave social único e predominante, é comumente
encontrada como lógica dominante das ações dessas organizações
(BOULLOSA; SCHOMMER, 2009), inibindo a autonomia e
emancipação dos indivíduos, e conferindo caráter unidimensional e
utilitário das relações entre os autores sociais. Incorre-se então em erro
seminal a tentativa de incorporação da lógica e das práticas de mercado
26
às atividades de organismos que tenham valores inclusivos e
participativos:
A origem destas organizações foi fundada sob
uma possibilidade de coordenação de meios e fins,
isto é, de ações sociais nas quais são privilegiados
o processo, a maneira de alcançar os objetivos
desejados por meio de relações intersubjetivas no
qual o bem comum é o mote central dessas
relações” (TENÓRIO, 2008a, p.32).
Diante
desta
problemática,
torna-se
imperativo
o
desenvolvimento de abordagens gerenciais diferenciadas, que em sua
orientação considerem os sujeitos como indivíduos autônomos e
participativos, com potencialidades críticas e deliberativas, em
ambientes multidimensionais que permitam o exercício da cidadania e o
desenvolvimento social, pois segundo Tenório (2008a, p. 32) “o
desempenho esperado dessas organizações é o de gestão social ao invés
de estratégica a fim de neutralizar as consequências do mercado”.
Allebrandt e Teixeira (2005) apresentam os processos
organizacionais relacionados aos conceitos de gestão social e gestão
estratégica desenvolvida por Tenório, norteados por um modelo de
análise baseado em Serva (2007), conforme quadro a seguir:
Quadro 01: Elementos constitutivos da gestão para cada processo
organizacional
Processos
Gestão social
Gestão estratégica
organizacionais
Estrutura e
Entendimento
Fins
funcionamento Julgamento ético
Desempenho
do poder
Estratégia interpessoal
Auto-realização
Utilidade
Objetivos
Valores emancipatórios Fins
organizacionais
Julgamento ético
Rentabilidade
Julgamento ético
Desempenho
Avaliação
Valores emancipatórios Fins
reflexiva
Rentabilidade
Valores emancipatórios Fins
Inserção social
Entendimento
Êxito/resultados
Entendimento
Cálculo
Processo
Julgamento ético
Utilidade
decisório
Maximização de recursos
27
Divisão do
trabalho
Conflitos
Comunicação
Relações
interpessoais
Satisfação
individual
Auto-realização
Entendimento
Autonomia
Julgamento ético
Autenticidade
Autonomia
Entendimento
Autenticidade
Autonomia
Valores emancipatórios
Autenticidade
Entendimento
Autonomia
Valores emancipatórios
Auto-realização
Autonomia
Maximização de recursos
Desempenho
Estratégia interpessoal
Cálculo
Fins
Estratégia interpessoal
Desempenho
Êxito/resultados
Estratégia interpessoal
Estratégia interpessoal
Fins
Desempenho
Fins
Êxito/resultados
Desempenho
FONTE: Allebrandt e Teixeira (2005, p. 07).
Com base no quadro, verifica-se, em consonância com o
pensamento de Tenório (2008a, p.25-26) que a “gestão social contrapõese a gestão estratégica à medida que tenta substituir a gestão
tecnoburocrática, monológica, por um gerenciamento mais participativo,
dialógico, no qual o processo decisório é exercido por meio de
diferentes sujeitos sociais”, ou seja, a gestão social é “o conjunto de
processos sociais no qual a ação gerencial se desenvolve por meio de
uma ação negociada entre seus atores, perdendo o caráter burocrático
em função da relação direta entre o processo administrativo e a múltipla
participação social e política” (TENÓRIO, 2008b, p.40).
Uma dimensão transversal nas discussões sobre gestão social são
os elementos norteadores do processo decisório, pois segundo Oliveira,
Cançado e Pereira (2010, p. 622) a “participação efetiva no processo de
tomada de decisão traz crescimento e amadurecimento para os atores
(FREIRE, 1987; 1996; 2001), que ampliam sua visão de mundo
enquanto seres humanos dotados de razão e cidadãos participantes de
uma esfera pública”.
Para os autores, a gestão social possui como característica a
transparência, que possui interface próxima com a ação decisória, “pois,
se o processo decisório passa pelo entendimento, pela utilização da
linguagem e comunicação entre as pessoas, as informações devem estar
disponíveis a todos, o segredo e a assimetria de informações também
28
são estranhos a este processo” (OLIVEIRA, CANÇADO e PEREIRA,
2010, p. 622).
Desta forma, em um tipo ideal, o processo decisório, baseado nos
pressupostos da gestão social deveria apresentar, em primeira instância,
as seguintes características: tomada de decisão coletiva, livre de coerção
e baseada no entendimento, transparência e linguagem inteligível
(OLIVEIRA, CANÇADO e PEREIRA, 2010, p. 622).
De acordo com Monje-Reyes (2011, p.721), um tipo de
organização que possui potencialmente interface próxima com a gestão
social são as cooperativas, pois, “ambas são formas de produção social e
se sustentam na participação dos atores sociais nas decisões sobre o que
e como fazer. Por tanto, aprofundam a democracia e a modernizam os
princípios da participação ativa dos sujeitos sociopolíticos” (tradução
nossa). O autor destaca também que as características essenciais para
que a gestão de uma cooperativa seja convergente com a gestão social,
tendo que vista que “de fato, a forma de gestão de uma organização
cooperativa tem sua referência na gestão social sempre e quando é
democrática e deliberativa, como sugere a gestão social em sua matriz
de princípios”.
Diante do exposto, a seguinte pergunta surge como problema de
pesquisa: Como é caracterizada a participação no processo de tomada de
decisão em cooperativas com base nos pressupostos da gestão social?
Com a formulação do problema de pesquisa, pode-se agora
formular o objetivo geral da pesquisa e identificar os objetivos
específicos que servirão de alcance do principal objetivo desta proposta
de trabalho.
1.2 Objetivo Geral
Analisar a participação dos atores organizacionais nos processos
de tomada de decisão, à luz da gestão social, em duas cooperativas
catarinenses.
1.3
Objetivos Específicos
a) Contextualizar cada organização estudada frente ao seu
entorno;
b) Caracterizar a participação dos atores organizacionais no
processo de tomada de decisão das cooperativas estudadas;
29
c)Verificar com que intensidade as categorias estudadas se
aproximam das características de gestão social em contraponto à
gestão estratégica.
1.4 Justificativa
A motivação da construção da presente proposta de pesquisa
possui vínculo bastante estreito com a formação acadêmica da
pesquisadora. Na realização de seu trabalho de conclusão do curso em
Ciências da Administração, obteve, pela primeira vez, contato com a
temática da gestão social, que a levou a cursar uma disciplina sobre o
tema, como aluna especial no programa de mestrado em Administração
da Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Tal período culminou
em um trabalho monográfico realizado na Associação dos Amigos do
Hospital Universitário - AAHU e um projeto para seleção de mestrado
de natureza semelhante, despertando o interesse para a temática e para
as organizações sociais.
Em um segundo momento, como aluna do programa de
mestrado em Administração na UFSC, a pesquisadora participou de uma
disciplina com enfoque em gestão social, realizando como trabalho final
um estudo em uma Cooperativa Social, localizada em Florianópolis, que
desenvolve um trabalho pioneiro no Brasil.
As experiências vivenciadas nesse processo mostraram-se
bastante positivas e propiciaram enorme aprendizado à pesquisadora,
fortalecendo o seu interesse em trabalhar novamente e em maior
profundidade com a temática e o com o universo que havia tido contato
preliminar. Desta forma, surge a ideia inicial do presente trabalho de
pesquisa, em alinhar os estudos teóricos em gestão social com a
realidade organizacional de Associações e Cooperativas Sociais, tendo
em vista a aderência destas organizações de natureza social com a
perspectiva teórica proposta.
Ainda com o intuito de justificar a realização da presente
pesquisa, resgata-se o pensamento de Roesch (1999), que destaca ser
possível construir uma justificativa plausível a partir de três dimensões:
importância, oportunidade e viabilidade.
Segundo Cançado (2011) a análise de realidades sociais ou
mesmo a elaboração de metodologias para o desenvolvimento da gestão
social se configuram como imperativos na agenda de pesquisas para
desenvolver o campo de estudo.
30
Em organizações sociais, comumente, é possível verificar
conflitos entre a natureza destas organizações e a lógica de gestão
predominante em suas práticas, conforme destacado por Boullosa e
Schommer (2008, p. 9), “a observação do cotidiano da gestão nas
organizações evidencia que não são poucas as iniciativas no campo
social que reproduzem a lógica gerencial da empresa, reduzindo o
conteúdo da ação organizacional a um atributo meramente técnico”. A
gestão social em perspectiva organizacional (FRANÇA FILHO, 2008),
ou seja, como processo de gestão participativa e democrática, permite
refletir o ambiente interno dessas organizações sociais através de novas
perspectivas de gestão que procurem superar o modelo tecnocrático de
gestão:
(...) onde o imperativo categórico não é apenas o
eleitor e/ou contribuinte, mas sim o cidadão
deliberativo; não só a economia de mercado, mas
também a economia social; não é o cálculo
utilitário, mas o consenso solidário; não é só o
assalariado como mercadoria, mas o trabalhar
como sujeito; não é somente a produção como
valor de troca, mas igualmente como valor de uso;
não é tão somente a responsabilidade técnica,
mas, além disso, a responsabilidade social; não é a
res privata, mas sim a res pública; não é o
monólogo, mas ao contrário, o diálogo
(TENÓRIO, 2008b, p.53-54).
Em vista do exposto, considera-se importante analisar os
elementos através dos quais a participação é desenvolvida em
organizações sociais, tendo em vista os objetivos das mesmas, cenário
no qual o processo de tomada de decisão desponta como um dos
aspectos a serem repensados e trabalhados criteriosamente.
A pesquisa visa contribuir de forma acadêmica para o
desenvolvimento da temática e enquanto prática, para gestores e
empreendedores sociais, ao refletir experiências correntes. Ressalta-se,
por fim, a importância de organizações da sociedade civil na
transformação do quadro contemporâneo de exclusão social, na medida
em que criam e mantêm condições para o enfrentamento de questões
sociais.
O desenvolvimento de estudos dentro da temática da gestão
social converge com as preocupações levantadas por relevantes
pesquisadores do assunto, tendo em vista a construção de referenciais
31
mais consistentes, enquanto teoria e prática de gestão democrática e
participativa contribuem para evitar que o termo seja banalizado,
segundo apontamentos de França Filho (2008), ao constatar a sua
disseminação súbita, e a rápida institucionalização da Gestão Social,
conforme preocupação demonstrada por Boullosa e Schommer (2009),
onde a gestão social passaria de processo de inovação para produto
inovador.
Em vista dos desafios que se apresentam ao desenvolvimento do
campo, é oportuno desenvolver estudos em seu âmbito, com o intuito de
contribuir, de alguma forma, para a teoria e prática da gestão social.
Sendo a gestão social muito mais que uma perspectiva de análise da
realidade social e organizacional, e sim, um esforço de transformação
social e desenvolvimento da cidadania, o engrandecimento da produção
científica correlata contribui para que sejam plantadas sementes que
possam germinar sociedades mais solidárias, com mais equidade e
justiça.
A existência limitada de produções acadêmicas envolvendo a
gestão de organizações sociais analisadas através do entendimento de
gestão social aqui proposto, principalmente no que tange cooperativas
sociais enquanto objeto de estudo da Ciência da Administração,
configurou-se como uma oportunidade interessante de desenvolvimento
de pesquisas. Uma pesquisa realizada por Silva (2010), nas bases do
portal da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior), revelou que dentre os artigos disponíveis, apenas 35 (trinta e
cinco) faziam referência ao termo “gestão social”. Em pesquisa
semelhante, Neto (2011), realizou buscas no banco de dados da
biblioteca virtual da Fundação Getúlio Vargas, com 5.858 títulos desde
1947, e na base de dados SCIELO-Brasil, com 86.685 artigos, entre os
anos de 2000 a 2010, encontrando apenas 13 (treze) referências ao termo
“gestão social”, o mesmo número encontrado em pesquisa realizada na
base SciELO (Scientific Electronic Library Online). A pesquisa
aconteceu por meio da busca avançada, com as seguintes palavraschave, como os termos “Gestão Social” e “cidadania”.
Analisando a última variável, a viabilidade dadissertação,
entende-se que este trabalho é factível em função do interesse dos
dirigentes das organizações em sua realização, disponibilidade de
informações devido à disposição das organizações a serem estudadas em
contribuir para realização da pesquisa. A participação da pesquisadora
no Programa de estudos em gestão social – PEGS, coordenado pela
32
Fundação Getúlio Vargas – FVG/RJ, apresenta-se como um fator que
contribui para realização da presente pesquisa, pois permite acesso
facilitado a materiais produzidos pelos seus pesquisadores, discussões
promovidas pelos mesmos e participação em encontros fechados e
públicos.
33
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O corpo teórico desenvolvido, em razão dos objetivos do
trabalho, compõe-se de uma revisão bibliográfica sobre os seguintes
temas, apresentados sequencialmente: gestão social: perspectivas
epistemológicas e conceituais, associativismo, cooperativismo e
processo decisório.
2.1 Gestão Social: perspectivas epistemológicas e conceituais
O campo da gestão social, ainda incipiente nas discussões
acadêmicas brasileiras, ganha, progressivamente, relevância enquanto
prática, ainda que permeado de ambiguidades e carente de delimitações
paradigmáticas. (DOWBOR, 1999a, 1999b; CANÇADO, 2011;
FISCHER, 2002; MAIA, 2005). Os estudos na área apresentam
relevantes divergências epistemológicas e metodológicas em suas
construções conceituais, difusas no estado da arte.
Maia (2005) afirma que a temática da gestão social foi
introduzida no Brasil, apenas na década de 1990, em meio a dois
processos, econômicos e sociais, que marcam a conjuntura nacional: a
globalização da economia, que mercantilizou e ampliou os segmentos de
atuação no social, e a tardia regulação social, através das conquistas de
cidadania, do Estado democrático de direitos e dos desafios da
participação da sociedade civil.
Boullosa e Schommer (2008, p. 02) associam também à década
de 1990 o ganho de expressividade da gestão social, ainda que
embrionária e pouco precisa, no contexto da Constituição de 1988:
(...) que assume o município como ente federativo
autônomo (exigindo concertação com os demais
entes: União e Estados), e antenado com a crítica
internacional aos programas de ajustamento
estrutural do Banco Mundial (cujo viés era
predominantemente econômico), ao mesmo tempo
afinado com iniciativas do Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID), que incentivava o
engajamento da sociedade civil no planejamento,
execução e avaliação das políticas públicas.
34
Corroborando com apontamentos referentes às origens da
temática no país, Cançado (2011) afirma não encontrar, em seu estudo
sobre os fundamentos teóricos da gestão social, as origens da
terminologia “gestão social”, sendo as primeiras pistas encontradas nos
textos do Professor Fernando Guilherme Tenório, que desde 1990, lidera
o Programa de Estudos em Gestão Social, vinculado à Escola Brasileira
de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas.
Tenório (2008a, p,157), diz ter visitado o conceito de gestão
social quando a “quando a onda (neo)liberal econômica chegou
golpeando, literalmente, as costas do Brasil e dos brasileiros”, em 1990,
em meio ao Consenso de Washington, que trazia consigo, entre outras
coisas, o Estado-mínimo, que obrigou com que a gestão pública, em
especial, fosse repensada.
Ao encontrarmos a globalização e o neoliberalismo
circunscrevendo as origens de uma gestão voltada para e com o social,
Boaventura de Souza Santos (2001, p.40) integra os dois conceitos,
esclarecendo seus impactos nas relações de trabalho e,
consequentemente, nas políticas públicas e em todos os setores
organizacionais:
(...) no domínio da globalização social, o consenso
neoliberal é o de que o crescimento e a
estabilidade econômicos assentam na redução dos
custos salariais, para o que é necessário liberalizar
o mercado de trabalho, reduzindo os direitos
laborais, proibindo a indexação dos salários e
ganhos de produtividade e os ajustamentos em
relação ao custo de vida e eliminando a prazo a
legislação sobre o salário mínimo.
Nesse contexto, a economia é dessocializada, o “conceito de
consumidor substitui o de cidadão” e os critérios de inclusão social
deixam de ser “um direito para passar a ser solvência”. (SOUSA
SANTOS, 2001, p.40). A emergência do mercado como enclave social
único e dominante, e consequente afastamento do homem enquanto ser
social e indivíduo pensante e participativo, para um homem que se
comporta e incorpora a lógica de mercado como a lógica que orienta
suas ações e suas relações sociais e culturais, promove um deslocamento
do homem enquanto cidadão e guia maior de suas próprias ações e das
ações que envolvem sua comunidade (RAMOS, 1981).
35
Em meio ao ambiente envolto pela degradação do trabalho e
pela própria crise do capital insurge a discussão da temática relacionada
a uma “gestão social”, com diferentes enfoques e orientações, e com
pouca convergência quanto ao seu significado, conforme relata França
Filho (2008, p. 27):
A expressão gestão social tem sido usada de modo
corrente nos últimos anos servindo para identificar
as mais variadas práticas sociais de diferentes
atores não apenas governamentais, mas, sobretudo
de organizações não governamentais, associações,
fundações, assim como, mais recentemente,
algumas iniciativas partindo mesmo do setor
privado e que se exprimem nas noções de
cidadania corporativa ou de responsabilidade
social da empresa.
O autor adverte ainda que a emergência súbita do termo indica
duas tendências: a) sua banalização, ou seja, tem sido usado para as mais
variadas interpretações e carece de maior precisão conceitual; b) tudo o
que não é considerado gestão tradicional, passa a ser classificado como
gestão social (FRANÇA FILHO, 2008).
Pinho (2010, p.22) afirma que a “gestão social tem se implantado
e processado mesmo sem ter um consenso sobre esse conceito”,
contestando o que atualmente têm se entendido por gestão social e a
natureza das ações correspondentes.
Ao perpassar diferentes abordagens do conceito, o autor
questiona a própria nomenclatura utilizada, indicando que “a gestão
social não corresponde conceitualmente ao que os autores têm tratado e
entendido por ela” e que “a expressão gestão social seria muito pequena
para promover as mudanças que o conceito sugere”, sugerindo,
preliminarmente, que o termo mais adequado seria “gestão
emancipadora”, que visaria à emancipação das classes subordinadas.
(PINHO, 2010, p.49)
Sobre a crítica de Pinho, Tenório (2010, p. 57) argumenta que a
intenção de demarcar um novo marco conceitual, gestão social, “tem a
pretensão tão somente de enfatizar a necessidade de que os gestores,
qualquer que seja a configuração jurídica da organização, atuem sob
uma perspectiva na qual o determinante de suas ações deve ser a
sociedade e não mercado” e não está relacionada à pretensão de uma
36
síntese conceitual, reconhecendo as indefinições que permeiam o tema e
carência de debates mais amplos.
O uso indiscriminado do termo faz com que diferentes ações
sejam enquadradas como gestão social, sem a devida reflexão sobre sua
concepção, operacionalização e finalidade, como é notável na reflexão
de Tenório (2008b) sobre o uso do conceito de gestão social, que tem
sido objeto de estudo e de prática, muito mais relacionado à gestão de
políticas sociais, de organizações do terceiro setor, de combate à
pobreza e até ambiental, do que à discussão e possibilidades efetivas de
uma gestão democrática, participativa, quer na formulação de políticas
públicas, quer nas relações de caráter produtivo.
Em complemento, Schommer e França Filho (2008, p.61)
destacam que a utilização do termo pode estar associada “aos atores que
a empregam, ao universo organizacional em que é exercida, às
finalidades que se pretendem atingir por meio da gestão social ou, ainda,
às características do processo de gestão a que se refere”, refletindo os
tipos diferentes enfoques através dos quais a gestão social tem sido
trabalhada.
Sobre tal discussão, França Filho (2008) afirma que, antes de
tudo, a gestão social diferencia-se fundamentalmente de dois outros
tipos: a) gestão privada, que corresponde ao modo de gestão
característico de organizações que atuam em um espaço denominado
mercado ou economia de mercado e; b) a gestão pública, que se refere
ao modo de gestão praticado nas instituições públicas de Estado e suas
demais instâncias.
No primeiro caso, destaca-se que a racionalidade predominante é
a instrumental, baseada no cálculo utilitário das consequências,
conforme pensamento de Guerreiro Ramos (1981).
Nesse sentido, é válido resgatar o pensamento de Habermas
(1993, p.57) sobre o entendimento da ação instrumental, que organiza
meios, adequados ou não, “segundo critérios de um controle eficiente da
realidade, a ação estratégica depende apenas de uma valoração correta
de possíveis alternativas de comportamento, que só pode obter-se de
uma dedução feita com o auxílio de valores e máximas.”. Outrossim, as
“qualidades intrínsecas das ações administrativas (seu sentido e
significado) são pouco relevantes, sobressaindo-se sua capacidade em
contribuir para a consecução dos fins propostos, definidos em termos
meramente econômicos” (FRANÇA FILHO, 2003, p.31).
37
Sobre a gestão privada, França Filho (2008) destaca ainda, que a
mesma possui um aparato privilegiado de técnicas e metodologias, visto
que seu estudo formal data de mais de um século, mantendo,
predominantemente, seu foco voltado ao campo empresarial e a lógica
instrumental em seu âmago. Em consequência, esse modo de gestão
vem servindo de referência para os demais, sem a devida crítica quanto
à transferência de sua lógica específica, em processo que o autor
denomina “etnocentrismo gestionário privado”.
Sobre o segundo modo de gestão, a gestão pública, ela se
distingue consideravelmente do primeiro modelo apresentado - gestão
privada, em virtude dos objetivos perseguidos. É imperativo destacar
que tal diferenciação é realizada por princípios, pois teoricamente a
finalidade estatal é o bem comum, enquanto nas organizações privadas,
preza-se a satisfação pessoal, todavia na prática é comumente observado
que muitos princípios não são seguidos, haja vista, por exemplo, a
apropriação privada de bens públicos (FRANÇA FILHO, 2008).
Entretanto, esse modo de gestão se aproxima da gestão privada ao
sustentar e mesma lógica em suas ações, assentada em uma lógica de
poder norteada por uma racionalidade instrumental e técnicoburocrática, onde a dimensão do poder subordina o cidadão ao
burocrata. Todavia, Demo (1995) destaca que o fenômeno do poder não
pode ser suprimido, visto que integra as estruturas da sociedade, mas
que é possível administrá-lo de maneira democrática com base num
Estado de Direito.
Pimentel e Pimentel (2010) apresentam quadro referenciando as
principais distinções existentes entre a gestão estratégica, a gestão
pública e a gestão social:
Quadro 02: Tipos de gestão e suas características
Categorias de
Gestão
Gestão Pública
análise
Estratégica
Objetivo
Valor
Racionalidade
Protagonistas
Lucro
Interesse Público
Competição
Normativo
Instrumental
Burocrática
Mercado
Estado
Gestão Social
Interesse Coletivo
Caráter Público.
Cooperação
intra
Interorganizacional.
de
e
Substantiva/comunicativ
a.
Sociedade
Civil
Organizada.
38
Comunicação
Processo
Decisório
Operacionaliz
ação
Monológica,
vertical, com
restrição
ao
direito de fala.
Centralizado
top down.
Estratégica,
com foco em
indicadores
financeiros.
Privada
Monológica/Dialógica,
vertical com algumas
horizontalidades, em
tese sem restrições à
fala.
Centralizado
com
possibilidade
de
participação (bottom
up)
Estratégica com foco
em indicadores sociais.
Dialógica com pouca ou
nenhuma restrição ao
direito de fala.
Pública estatal.
Pública Social (França
Filho) x qualquer esfera
(Tenório, Dowbor).
Não há coerção, todos
têm iguais condições de
participação (Tenório) X
as relações de poder
restringem a capacidade
de cada um se posicionar
no debate (Fischer et al
Godim, Fischer e Melo).
Esfera
Autonomia e
poder
Há diferentes
graus
de
coerção
e
submissão
entre os atores
envolvidos.
Há Coerção normativa
entre
os
atores
envolvidos.
Descentralizado,
emergente
e
participativo/surge como
construção coletiva.
Social, com foco em
indicadores qualitativos
e quantitativos.
Fonte: Pimentel e Pimentel (2010, p.08).
Para França Filho (2008) a gestão social pode ser entendida a
partir de dois níveis de análise: societário e organizacional. O primeiro
nível apresenta a gestão social enquanto problemática da sociedade,
preocupada com a gestão das demandas e necessidades do social, ou
seja, a sociedade civil organizada se mobiliza para empreender
atividades que ela mesma possa desenvolver, em prol do atendimento de
lacunas sociais, não supridas pelo estado ou mercado.
Tal fenômeno concretiza-se principalmente em organizações não
governamentais, associações, cooperativas sociais e demais entidades
preocupadas com o atendimento de necessidades comuns. Em linhas
gerais, esse entendimento de gestão social sugere que “para além do
Estado, a gestão das demandas e necessidade do social pode se dar via a
própria sociedade, através das suas mais diversas formas e mecanismos
de auto-organização, especialmente o fenômeno associativo” (FRANÇA
FILHO, 2008, p. 03).
39
Sobre o eixo societário, o quadro a seguir apresenta alguns
expoentes do assunto, que fundamentam suas ideias com base no
desenvolvimento emancipatório da sociedade, enfrentamento à questão
social e transformação societária.
Quadro 03: Mapa conceitual da gestão social – Eixo temático: societário
EIXO TEMÁTICO: SOCIETÁRIO
Categoria
analítica
Conceito
Autor
distintiva
Seria o processo onde a dimensão social se torna Dowbor (1999,
um dos componentes essenciais do conjunto da 2006)
Capacidade
reprodução social, incorporando “nas decisões
interventiva
empresariais, ministeriais, comunitárias ou
e potencial individuais, as diversas dimensões e os diversos
de
impactos que cada ação pode ter em termos de
transformaçã qualidade de vida”, onde a atividade econômica
o
da passa a ser um meio, e o bem-estar o fim, onde se
sociedade
faz necessário “repensar formas de organização
social e a redefinir a relação entre o político, o
econômico e o social” (grifo nosso)
“(...) gestão social como um conjunto de Maia (2005)
processos sociais com potencial viabilizador do
Desenvolvim desenvolvimento societário, emancipatório e
ento
transformador. É fundada nos valores, práticas e
democrático
formação da democracia e da cidadania, em vista
e
do enfrentamento às expressões das questões
emancipatóri socais, da garantia dos direitos humanos universais
o
da e da afirmação dos interesses e espaços públicos
sociedade
como padrões de uma nova civilidade. Construção
realizada em pactuação democrática, nos âmbitos
local, nacional e municipal, entre os agentes das
esferas da sociedade civil, sociedade política e da
economia, com efetiva participação dos cidadãos
historicamente excluídos dos processos de
distribuição das riquezas e do poder” (p. 78) (grifo
nosso)
Desenvolvim Gestão
centrada
“no
processo
de Carrion; Calou
ento
das desenvolvimento, na proteção da vida, na (2008)
potencialidad preservação do meio ambiente, no atendimento
es humanas
das necessidades e no desenvolvimento das
potencialidades humanas” (p. 17) (grifo nosso)
Fonte: Justen et al, (2012). No prelo.
40
Tal categoria apresenta convergência entre os seus representantes
quanto à possibilidade e importância do desenvolvimento humano e da
democracia dentro da perspectiva da gestão social.
O segundo nível de entendimento apresenta a gestão social como
uma forma específica de gestão, um modus operandi, em um nível
micro, que pode ser chamando organizacional. Ela se diferencia ao
propor um tipo diferente de racionalidade como guia de suas ideias e
ações, superando a racionalidade tradicional instrumental, a lógica de
mercado, por outras com enfoques mais sociais e emancipadores, tendo
em vista a natureza e finalidade da organização (FRANÇA FILHO,
2008).
Sobre o eixo de análise que entende a gestão social como uma
forma ou espaço de gestão, o quadro a seguir, sintetiza as principais
ideias e autores.
Quadro 04 :Mapa conceitual da gestão social – Eixo temático: organizacional
EIXO TEMÁTICO: ORGANIZACIONAL
Categoria
Conceito
Autor
analítica
Ação gerencial “(...) o conjunto de processos sociais no qual a ação Tenório
negociada
gerencial se desenvolve por meio de uma ação (2002)
negociada entre seus atores, perdendo o caráter
burocrático em função da relação direta entre o
processo administrativo e a múltipla participação
social e política” (p. 7) (grifo nosso)
Processo
“o conceito de gestão social é entendido como o Tenório
gerencial
processo gerencial dialógico onde a autoridade (2007)
dialógico
decisória é compartilhada entre os participantes da
ação” (grifo nosso) e “a gestão social deve ser
determinada pela solidariedade, portanto, é um
processo de gestão que deve primar pela
concordância, onde o outro deve ser incluído e a
cooperação o seu motivo” (grifo nosso)
Locus
de “como o espaço privilegiado de relações sociais onde Tenório
exercício
da todos têm direito à fala, sem nenhum tipo de coação” (2007)
cidadania e da (grifo nosso).
participação
coletiva
e
organizada
Processos
“(...) o processo de organização, decisão e produção Cabral
administrativos
de bens públicos de proteção social, que se (2007)
desenvolve perseguindo uma missão institucional e
41
articulando os públicos constituintes, envolvidos em
uma organização que tende a incorporar atributos do
espaço público não estatal, na abordagem que faz da
questão social. Esses atributos são os elementos que,
de forma coordenada e convergente, devem ser
observados e tomados como parâmetros no
desenvolvimento do processo de gestão” (p. 134)
(grifo nosso)
Modo de gestão
“Corresponde ao modo próprio às organizações
atuando num circuito que não é originariamente
aquele do mercado e do Estado, muito embora estas
organizações entretenham, em grande parte dos casos,
relações com instituições privadas e públicas, através
de variadas formas de parcerias para consecução de
projetos” (p. 32) (grifo nosso)
“trata de uma gestão voltada para o social. Nesse
sentido, a gestão seria definida, antes de tudo, por sua
finalidade” (p.64) (grifo nosso)
Fonte: Justen et. al (2012). No prelo.
França
Filho
(2008);
França
Filho;
Schom
mer
(2008)
Verifica-se que os autores apresentam, no eixo organizacional,
preocupação com ações gerenciais que ocorram de forma plural e
participativa, em uma tentativa de superar o modelo tradicional de
gestão, voltado para a racionalização das atividade e pessoas e
maximização do lucros.
Justen et al.(2011, p.03) apresenta ainda um terceiro eixo
temático, sobre o qual o "a ênfase recai sobre a processualidade de
construção e implementação de estratégias e ações, isto é, sobre a
instrumentação da gestão social”, trabalhando a gestão social como um
instrumento, processo ou ainda um conjunto de ações adequados para
intervenção na realidade social, de forma a desenvolvê-la e transformála, conforme quadro a seguir:
Quadro 05: Mapa conceitual da gestão social – Eixo temático: metodológico.
EIXO TEMÁTICO: METODOLÓGICO
Categoria analítica
Conceito
Instrumento para o
acesso à riqueza
social
“(...) um conjunto de estratégias voltadas à
reprodução da vida social no âmbito privilegiado
dos serviços – embora não se limite a eles – na
esfera do consumo social, não se submetendo à
lógica mercantil. A gestão social, ocupa-se,
Autor
Silva (2004)
42
Políticas públicas e
programas/projetos
sociais
Ações e estratégias
para
o
desenvolvimento
local
Instrumento
para
políticas públicas
portanto, da ampliação do acesso à riqueza
social – material e imaterial -, na forma de
fruição de bens, recursos e serviços, entendida
como direito social, sob valores democráticos,
como equidade, universalidade e justiça social”
(p. 32) (grifo nosso)
“Se trata da gestão das ações sociais públicas,
sendo que a gestão do social é a gestão das
demandas e necessidades dos cidadãos. E as
respostas a essas demandas e necessidades são as
políticas sociais, os programas e projetos
sociais. A gestão social tem um compromisso,
com a sociedade e com os cidadãos, de
assegurar por meio d,,e políticas e programas
públicos o acesso efetivo aos bens, serviços e
riquezas societárias” (p. 28) (grifo nosso)
“Entendemos gestão social como um processo
social, permeado por contradições e disputas
entre as instâncias que compõem a sociedade e
os projetos societários que representam, de
construção e implementação de ações e
estratégias, firmados por pactos sociais formais
e/ou informais, que visem o desenvolvimento
social num determinado território” (grifo
nosso)
“a ideia de gestão social diz respeito à gestão
das demandas e necessidades do social” (p. 66)
(grifo nosso)
Carvalho
(1999)
Bordin
(2009)
Schommer
França Filho
(2008)
Fonte: Justen et al. (2012). No prelo.
Os três eixos aqui tratados foram apresentados de forma separada,
para fins analíticos e didáticos, todavia relacionam-se recursivamente,
através de influência e dependência mútua. Trata-se de uma abordagem
que em sua essencial é complexa, na medida em que envolve a análise
de questões sociais, tendo em vista o entendimento de Demo (2008,
p.27) ao destacar que “a questão da intensidade dos fenômenos
complexos está na raiz do que tem se chamado de pesquisa qualitativa”,
buscando “ir além de indicadores empíricos mensuráveis diretamente”,
pois “a intensidade visa captar dimensões de maior profundidade, como
43
seria, por exemplo, a problemática da participação, para além da simples
filiação no associativismo”.
Evidenciada as distinções e aproximações entre as diferentes
formas de gestão e de gestão social especificamente, resgata-se o
entendimento do Programa de Estudos em Gestão Social da Fundação
Getulio Vargas – PEGS/FGV/RJ, especialmente de Tenório (2008b,
p.39) sobre o conceito de gestão social, já apresentado de forma sintética
no quadro 02, tipos de gestão e suas características, que perpassa
diferentes tipos de sistema social, sendo concretizado em ações em
âmbito público, privado ou não governamental através de um “processo
gerencial dialógico onde a autoridade decisória é compartilhada entre os
participantes da ação (ação que possa ocorrer em qualquer tipo de
sistema social – público, privado ou de organizações não
governamentais)” e será utilizado como viés teórico e lente analítica do
presente estudo.
Tal entendimento de gestão social tem seus alicerces
epistemológicos vinculados à Escola de Frankfurt, berço dos estudos
sobre a teoria crítica e emancipação humana, que tem em sua primeira
geração a preocupação voltada à crítica do “sistema unidimensional, da
racionalidade instrumental, do positivismo, da estética hegemônica, da
cultura de massas e do nazismo”, tendo em vista “a cultura da
modernidade que aniquila a possibilidade de uma vida autêntica e da
criatividade transformadora” (MISOCZKY e AMANTINO-DEANDRADE, 2005, p. 197). Dentre seus expoentes figuram pensadores
como Max Horkheimer e Theodor Adorno.
Ao passo que segunda fase da Escola de Frankfurt “tentará
mostrar que é tarefa racional provar a pretensão de validade de
enunciados normativos ou de decisões morais, com vistas à realização
de acordos – pois nisso consiste toda a temática da fundamentação no
contexto de atos comunicativos” (MISOCZKY e AMANTINO-DEANDRADE, 2005, p. 197). Nessa geração, destaca-se o trabalho de
Jürgen Habermas, com o desenvolvimento da teoria da ação
comunicativa.
No estudo da gestão social, aqui proposto, cabe destaque a teoria
crítica e em especial, a segunda geração da Escola Frankfurtiana, em
consonância com o pensamento dialético proposto por Habermas, no
qual a racionalidade comunicativa deve ser base para a concordância
entre os indivíduos, através do diálogo e do consenso como forma de
tomada de decisão válida, contrariando a lógica positivista,
44
predominante "no mundo dos sistemas" que carrega mecanismos
funcionalistas e alienatórios (TENÓRIO, 2002).
Nesse âmbito, fundamenta-se a diferenciação elementar entre os
significados gestão social e gestão estratégica, com base no confronto
proposto entre teoria crítica e teoria tradicional, proposta pela Escola de
Frankfurt.
Os frankfurteanos entendem por teoria tradicional todo
conhecimento positivista, técnico, que se propõe a estabelecer princípios
gerais e enfatiza o empirismo; visa o conhecimento puro, antes que a
transformação social, pois trabalha os fatos sociais como quase neutros,
de forma análoga as ciências naturais. Enquanto a teoria crítica, por ser
reflexiva e por retornar os pensamentos sobre si, investiga “as
interconexões recíprocas dos fenômenos sociais e observa-os numa
relação direta com leis históricas do momento e da sociedade estudada”,
tendo a sociedade como objeto de estudo (TENÓRIO, 2002, p. 116).
Tenório (2002, p.166) resgata o pensamento de Geuss (1988,
p.08), sobre os pontos centrais que diferem a teoria crítica da teoria
tradicional, que estão centradas em três eixos fundamentais:
1. Teorias Críticas têm posição especial como
guias para a ação humana, visto que:
a) Elas visam produzir esclarecimento entre os
agentes que as defendem, isto é,
capacitando esses agentes a estipular quais
são seus verdadeiros interesses;
b) Elas são inerentemente emancipatórias, isto
é, elas libertam os agentes de um tipo de
coerção que é, pelo menos parcialmente,
auto-imposta, a auto-frustração da ação
humana consciente.
2. Teorias críticas tem conteúdo cognitivo, isto é,
são
formas
de
conhecimento.
3. Teorias críticas diferem epistemologicamente
das teorias em ciências naturais, de maneira
essencial. As teorias em ciência natural são
“objetificantes”; as teorias críticas são
“reflexivas”.
Outra diferença fundamental entre as teorias trabalhadas
relaciona-se a atitude do pesquisador perante o seu objeto de estudo,
45
pois segundo a teoria crítica o pesquisador é sempre parte do objeto que
estuda, em especial se o objeto for social, visto que “sua percepção está
condicionada por categorias sobre as quais não pode sobrepor-se”,
contrariamente à teoria tradicional que entende o pesquisador como
neutro e distanciado do seu objeto de pesquisa. (TENÓRIO, 2002, p.
117).
Desta forma, entende-se que a teoria tradicional não é adequada
para analisar ou entender a vida social, em vista, do seu pragmatismo,
pois analisa somente o que é passível de ser visto e aceita, sem
contestação, a ordem social vigente, obstruindo possibilidades de
mudanças, tanto que tal teoria apresenta íntima relação e é fator de
sustentação da sociedade tecnocrática vigente (TENÓRIO, 2002).
Em vista destes pressupostos, a gestão estratégica caracteriza-se
como uma ação social utilitarista, baseada no cálculo utilitário das
consequências (SERVA, 1997), onde a relação social é estabelecida
através da hierarquia formal existente.
Em consequência, esse modelo de ação gerencial “é aquele no
qual o sistema-empresa determina as suas condições de funcionamento e
o Estado se impõe sobre a sociedade”, sustentados pelo comportamento
tecnocrático, pelo qual se entende “toda a ação social implementada sob
a hegemonia do poder técnico ou técnico-burocrático, que se manifesta
tanto no setor público quanto no privado, fenômeno comum às
sociedades contemporâneas” (TENÓRIO, 2008a, p. 23-24).
Nessa perspectiva, Ronconi (2011, p.02), destaca que a “gestão
social deve ser capaz de romper com os conceitos tradicionais de gestão;
deve conduzir as pessoas para a busca da emancipação e autorealização
com alcance da satisfação social e concretização das potencialidades”.
Assim sendo, gestão social apresenta contraponto fundamental a
gestão estratégica “a medida que tenta substituir a gestão
tecnoburocrática, monológica, por um gerenciamento mais participativo,
dialógico, no qual o processo decisório é exercido por meio de
diferentes sujeitos sociais”. (TENÓRIO, 2008a, p. 26). Evidencia-se
então, que a normativa da gestão social está em congruência com os
estudos críticos.
Cançado (2011, p. 189) constrói uma perspectiva teórica da
Gestão social que “caminha na contra-mão (na contradição) do sistema
hegemônico, e, ainda, que pode ter potencial latente de mudança de
percepção de mundo”, representada na figura a seguir:
46
Figura 01: Proposta inicial de uma aproximação teórica para a Gestão Social,
baseado em Categorias Teóricas da Gestão Social e suas interações.
Fonte: Cançado (2011, p. 189).
O autor afirma que tal construção “tem o contraditório como
ponto de partida, gestão estratégica versus Gestão Social, o que levou o
pesquisador a construir um conceito, para evitar que tudo que não seja
gestão estratégica seja identificado como Gestão Social” (CANÇADO,
2011, p. 190).
As categorias apresentadas na figura 01 (interesse bem
compreendido, sustentabilidade, solidariedade, esfera pública,
democracia deliberativa, ação racional substantiva, comunidades de
prática, dialogicidade, intersubjetividade, interorganizações e
emancipação), proporcionam uma delimitação preliminar da gestão
social que pode ser descrita como:
A gestão social parte do interesse público bem
compreendido, em um contexto de solidariedade e
sustentabilidade, acontecendo na esfera pública,
com uma dinâmica de comunidades de prática, em
que a tomada de decisão coletiva ocorre por meio
da democracia deliberativa sem coerção, norteada
pela ação racional substantiva permeada por
47
dialogicidade e intersubjetividade, considerando
as possibilidades das interorganizações, fundada
na dialogicidade e intersubjetividade do processo
visando à emancipação como fim último
(Cançado, 2011, p.204).
Seguindo o mesmo entendimento, os estudos sobre a gestão
social, aqui tratados, são orientados a partir do entendimento de dois
pares de palavras: estado-sociedade e capital-trabalho. Em uma nova
configuração, essa relação é apresentada de forma invertida: sociedadeestado e trabalho-capital, sugerindo que o protagonismo das relações
deve pertencer à sociedade e ao trabalho, nas relações que estabelece
com o estado e com o capital, respectivamente, conforme pensamento de
Tenório (2008a, p. 34):
Ter o indivíduo como sujeito privilegiado de
vocalização daquilo que interessa a Sociedade nas
demandas ao Estado e daquilo que interessa ao
trabalhador na interação com capital, significa
mudar a natureza destas relações, quer dizer,
passar
de
condições
monológicas,
tecnoburocráticas e autoritárias para situações
dialógicas, democráticas e intersubjetivas, do
exercício da cidadania.
O autor exemplifica a relação entre o par Sociedade-Estado com a
epistemologia da gestão social, quando o poder estatal institucionaliza
“modos de elaboração de políticas públicas que não se referiam aos
cidadãos como “alvo”, “meta”, “cliente” de suas ações ou, quando
muito, avaliadores de resultados, mas sim como participantes ativos no
processo de elaboração dessas políticas”; quanto ao par trabalhocapital, o exemplo dado refere-se a um processo de implantação de
automoção flexível em substituição a um rígido, realizado por um dado
agente econômico, “o processo será dialógico se tal decisão for
submetida a coordenação intersubjetiva de saberes (tácitos ou não), entre
os diversos sujeitos sociais envolvidos – empregados-patrões,
subordinados-superiores.” (TENÓRIO, 2008a, p. 35)
Na perspectiva, destaca-se as discussões sobre coprodução do
bem público, que em linhas gerais, significa:
48
(...) o repensar da relação entre o Estado e a
Sociedade, uma forma específica de fazer as
coisas: produzir serviços, produzir políticas,
produzir medidas que satisfaçam as necessidades
sociais de forma apropriada, utilizando o esforço
continuo daqueles que estiveram, até pouco
tempo, em campos opostos, os prestadores
(entidades públicas) e os utentes (cidadãos,
famílias, empresas, associações, comunidades)”.
(FONSECA, 2010, p. 16)
Para Salm,Menegasso e Ribeiro (2007), a coprodução do bem
público aparece como uma forma apropriada de fornecer bens e serviços
a partir da atuação do Estado e da sociedade civil, que pressupõe o
envolvimento direto e efetivo dos cidadãos na concepção e
operacionalização dos serviços públicos, pois “envolve a participação
direta e ativa do cidadão nos processos de elaboração, desenho,
implementação e avaliação das políticas públicas voltadas ao interesse
público e, em última instância, à construção do bem comum.” (SALM;
MENEGASSO e RIBEIRO, 2007, p. 232). Em complemento, Fonseca
(2010) destaca que a mobilização da sociedade civil utilizando infraestrutura dos serviços públicos permite que melhores resultados sejam
alcançados e que problemas, que não seriam passíveis de resolução de
outra forma, sejam abordados. Trazendo benefícios, principalmente,
para o fortalecimento da democracia e cidadania:
Políticas e programas que vão ao encontro das
necessidades públicas podem ser efetiva e
responsivamente alcançados por meio dos
esforços coletivos e processos colaborativos. Essa
participação de forma direta, superando ideias
restritivas, como a participação indireta através da
delegação de poderes a representantes eleitos, é
terapêutica e integrativa, educativa, protege a
liberdade e legitima as decisões. (SALM;
MENEGASSO e RIBEIRO, 2007, p. 233-234)
Desta forma, a coprodução do bem público configura-se
mediante participação do Estado, por meio do seu aparato burocrático,
pela participação ativa da sociedade civil, pelos esforços coletivos e
organizados, pelo processo colaborativo, pela responsabilidade
compartilhada entre todos os atores envolvidos, pelos resultados que
49
beneficiam a todos, pela atmosfera de confiança, pela promoção cidadã
e aprendizado coletivo (SALM; MENEGASSO e RIBEIRO, 2007).
Schommer et. al. (2011, p.40) destacam que:
A coprodução pressupõe práticas compartilhadas
e a existência de canais de expressão de diferentes
interesses e perspectivas, intermediados pelo
diálogo e pela construção de consensos e
objetivos comuns, em processos permeados por
conflitos, relações de poder e articulações
negociadas entre os diferentes atores em cena.
Nesse sentido, Fonseca (2010) aponta que a coprodução
representa uma abordagem substancialmente diferente frente a cultura
burocrática, top-down e indiferenciada, que tira poder das pessoas e
induz uma cultura de dependência. Tornando os processos mais
participativos e inclusivos, em vista da autonomia cidadã.
As manifestações dos fenômenos de protagonismo social são
encontradas em nossa sociedade, de forma bastante incipiente, em ações
de mobilização da sociedade civil em busca da participação no
direcionamento das políticas públicas e nos processos decisórios em
empresa privadas e de organização comunitária, em associações, ONG’s
e cooperativas, em prol do enfrentamento das demandas sociais e da
exclusão dos indivíduos.
Na mesma perspectiva, amplia-se a discussão com a inclusão da
categoria sociedade-capital, que está relacionada aos processos de
interação que a sociedade civil organizada (contemporaneamente
chamada terceiro setor) desenvolve com o segundo setor (capital),
sugerindo que o protagonista dessa relação, assim como no par
sociedade-Estado, deve ser a sociedade civil. Ressalta-se que não está
se diminuindo a relevância do capital em ações em que este apoie
projetos de natureza social, mas “considerando o fato do capital, uma
empresa, por ser de natureza econômica, tem o seu desempenho
quantificado pelo lucro, para, depois, vir a ser qualificado pelo que de
social implemente.” (TENÓRIO, 2008b, p. 41)
Através da premissa de que os estudos em gestão social devem
partir da ótica da sociedade e do trabalho, muda-se o enfoque sobre o
que deve ser central nas relações que estes estabelecem: a cidadania
passa a ser categoria intermediadora dos processos sociais e deve
permear todas as relações políticas e sociais, assim como a cidadania
50
deliberativa apresenta-se como alternativa articuladora e democrática de
relação entre diversos atores sociais (TENÓRIO, 2002).
Visto a centralidade da cidadania nas relações que envolvem
Estado, sociedade, trabalho e capital, tendo “a emancipação como o
próprio objetivo e resultado da gestão social enquanto processo baseado
na cidadania deliberativa” (CANÇADO, 2011, p.99) e considerando sua
interface com os processos de participação societária, na seção a seguir
serão apresentados apontamento sobre cidadania, cidadania deliberativa
e participação, aspectos essenciais para o exercício da gestão social.
2.2 Cidadania, cidadania deliberativa e participação: alternativas
democráticas de gestão
As discussões sobre o conceito de cidadania e suas expressões
na sociedade ganharam robustez na década de 1990, em paralelo com a
ascensão da temática da gestão social, vinculada fortemente a
participação social no direcionamento das políticas públicas.
No Brasil, a cidadania apresenta forte ligação com o combate à
exclusão social, a miséria e a mobilização em busca da mudança das
estruturas excludentes da sociedade (SOUZA, 1994). Para Demo (1988,
p.07), a conquista da cidadania passa essencialmente pela problemática
da pobreza política, pois “não estamos acostumados a considerar como
pobre a pessoa privada de sua cidadania, ou seja, que vive em estado de
manipulação, ou destituída da consciência de sua opressão, ou coibida
de se organizar em defesa de seus direitos.” Desnudando aspectos de
ações pela cidadania que estão vinculados mais ao assistencialismo do
que a emancipação dos indivíduos, condicionadas ao “ter” e não ao
“ser”:
Trata-se de uma competência humana essencial,
que é a de fazer-se sujeito, negando aceitar-se
como objeto. Incompetência é ser excluído sem
perceber, aceitar injustiça sem reagir, permanecer
massa de manobra como se fosse condição
histórica normal. A cidadania tem, por isso, como
primeiríssima tarefa um desafio negativo: destruir
a pobreza política (DEMO, 1995, p. 133).
Corroborando com a ideia de cidadania conquistada através do
homem enquanto sujeito participativo, Tenório (2002, p. 114) afirma
51
que cidadão “é o sujeito privilegiado de vocalização daquilo que
interessa a Sociedade nas demandas ao Estado e daquilo que interessa
ao trabalhador na interação com o capital.” Desta forma, a cidadania
não pode ser vista apenas como “a base da soberania de um Estadonação, mas também como expressão do pleno exercício de direitos
exigíveis em benefício da pessoa humana e da coletividade.” (2002, p.
114).
Nesse sentido, o sociólogo Betinho destaca que cidadão é o
sujeito que tem consciência de seus direitos e dos seus deveres e que,
além disso, participa ativamente de todas as questões da sociedade, para
o autor:
Tudo o que acontece no mundo, seja no meu país,
na minha cidade ou no meu bairro, acontece
comigo. Então eu preciso participar das decisões
que interferem na minha vida. Um cidadão com
sentimento ético forte e consciência da cidadania
não deixa passar nada, não abre mão desse poder
de participação (SOUZA, H., 1994, p. 22).
Bonin (1999) resgata o pensamento de Paulo Freire sobre os
princípios norteadores da cidadania, que envolve os valores como o
conhecimento da realidade para a libertação das opressões e reflexões
sobre o mundo circundante, destacando ainda seu pensamento sobre
“autonomia e liberdade para o exercício de uma ação política de um
verdadeiro cidadão” (1999, p. 108), visto que apresenta a educação
social e a política como essenciais para a cidadania, fundado em sua
pedagogia da libertação, que:
(...) supõe o surgimento do sujeito epistêmico,
conhecedor consciente dos processos sociais de
sua cultura a fim de superar uma consciência
ingênua. O domínio da linguagem escrita, com
seus códigos, é importante para que o sujeito
registre e expresse de forma nova seus saberes e
tenha acesso às comunicações e obras escritas por
outrem através da leitura. Portanto, a mera
alfabetização não é suficiente, pois importa que o
sujeito dominado perceba que ele mesmo como
um analfabeto também já é sujeito histórico que
produz cultura (BONIN, 1999, p.109).
52
De forma complementar, Tenório (2008b, p.44-45) fundamenta
seu pensamento sobre cidadania com base nas ideias de Habermas, que
“pretende reconciliar democracia e direitos individuais de tal forma que
nenhum dos dois se subordina ao outro”, propondo um modelo de
democracia “baseada na correlação entre direitos humanos e soberania
popular e consequente reinterpretação da autonomia nos moldes da
teoria do diálogo”, a cidadania deliberativa procedimental. Em linhas
gerais, a cidadania deliberativa habermasiana “constitui-se em uma nova
forma de articulação que questiona a prerrogativa unilateral de ação
política do poder administrativo – do Estado e/ou do dinheiro – o
capital” (TENÓRIO, 2008B, p.48).
Tenório (2002; 2008b) julga essencial para a compreensão do
conceito de cidadania deliberativa a apreensão dos conceitos de cidadão,
nas perspectivas republicana e liberal, resgatando em Habermas tais
entendimentos:
(...) o conceito de cidadão na perspectiva
liberal é definido em função dos “direitos
subjetivos que eles têm diante do Estado e dos
demais cidadãos (...) em prol de seus interesses
privados dentro dos limites estabelecidos pela
lei” (Habermas, 1995, p.40). Já sob o conceito
republicano, o cidadão, não é aquele que usa a
liberdade só para desempenho como pessoa
privada, mas na participação uma prática
comum (TENÓRIO, 2002, p. 129).
No seio dos debates entre liberais e republicanos que a cidadania
deliberativa está situada, “os primeiros priorizando os compromissos de
liberdade individual para negociar e os segundos priorizando o que é
melhor para o próprio grupo ou para a comunidade. Procurando retirar o
que existe de melhor nos dois conceitos.” (TENÓRIO, 2008b, p. 44).
A análise comparativa entre os modelos de cidadão republicanos
e liberais, Habermas acrescenta uma nova compreensão do significado
de cidadão, chamado o “modelo da deliberação”, sustentado “nas
condições de comunicação”, e no qual também está baseada a defesa de
uma “ação gerencial voltada ao entendimento, de um consenso
alcançado argumentativamente, de uma verdadeira gestão social”.
(TENÓRIO, 2002, p. 130)
53
Nesse sentido, Cançado (2011) acrescenta que a esfera pública se
configura como um espaço de intermediação entre o Estado, a sociedade
civil e o mercado, assim como a cidadania deliberativa seria o processo
participativo de deliberação, baseado, fundamentalmente, no
entendimento, ao invés de mecanismos de convencimento ou
negociação entre os atores envolvidos, pois segundo Tenório (2002, p.
126-127) “os atores, ao fazerem suas propostas, não podem impor suas
pretensões de validade sem que haja um acordo alcançado
comunicativamente no qual todos os participantes exponham suas
opiniões.”. Haja vista que a cidadania deliberativa:
(...) vai significar que a legitimidade das decisões
deve ter origem em espaços de discussão
orientados pelos princípios de inclusão, do
pluralismo, da igualdade participativa, da
autonomia e do bem comum. Espaços onde se
articulam diferentes atores que vocalizam as suas
pretensões com o propósito de planejar, executar e
avaliar políticas públicas ou decisões de produção
(TENÓRIO, 2008, p. 148).
Assim, a gestão social aproxima-se do conceito de cidadania
deliberativa enquanto entendida como uma ação política deliberativa,
onde a participação dos indivíduos é primordial em procedimento
democráticos, decidindo (em diferentes instâncias da sociedade e em
diferentes papéis) “o seu destino social como pessoa humana, quer como
eleitor, trabalhador ou consumidor”, pois a “autodeterminação não se dá
sob a lógica do mercado, mas da democracia social: igualdade política e
decisória” (TENÓRIO, 2002, p. 130).
Demo (1995, p.01) ao qualificar a cidadania como “competência
humana de fazer-se sujeito, para fazer história própria e coletivamente
organizada”, salienta que para a formação de tal competência alguns
componentes são fundamentais, sobretudo o processo emancipatório,
que “funda-se, de partida, na capacidade crítica, para, com base nesta,
intervir na realidade de modo alternativo.” (1995, p.01-02) e,
consequentemente a autonomia que, segundo Chauí (2005, p.304), “é
posição de sujeitos (sociais, éticos, políticos) pela ação efetuada pelos
próprios sujeitos enquanto criadores das leis e regras da existência social
e política”.
54
Para Cançado (2011, p. 187) “o homem se emancipa quando se
percebe enquanto indivíduo, com suas potencialidades individuais
(forces propes) como motor das forças sociais, por fim, quando se
percebe como ser político”. Sobre o sujeito político, Demo (1988, p.15)
entende como “aquele que tem consciência histórica. Sabe dos
problemas e busca soluções. Não aceita ser objeto”, ou seja, é o
individuo consciente que se organiza para preservar e conquistar seus
direitos e a cidadania.
Bordenave (1986, p. 20-21) adverte que a autonomia, ao contrário
do pensamento de muitos, não caminha para a anarquia, ao contrário, ela
“implica o aumento do grau de consciência política dos cidadãos, o
reforço do controle popular sobre a autoridade e o fortalecimento do
grau de legitimidade do poder público quando este responde às
necessidades reais da população”.
Em vista do papel essencial da autonomia e da emancipação,
enquanto imperativos de uma sociedade participativa e cidadã, a “gestão
social se propõe, enquanto processo, a viabilizar a emancipação em uma
sociedade notadamente desigual e excludente” (CANÇADO, 2011, p.
189), através da organização social e da deliberação coletiva e legítima.
Reforçando a compreensão de uma gestão social pautada na
racionalidade comunicativa, o consenso válido e a verdade só podem
existir se todos os atores envolvidos aceitarem sua validade, pois
“verdade é a promessa de consenso racional, ou a verdade não é uma
relação entre o indivíduo e sua percepção de mundo, mas sim um acordo
alcançado por meio da discussão crítica, da apreciação intersubjetiva”
(TENÓRIO, 2002, p.127).
Para Ferraz (2009, p. 130), o traço marcante das perspectivas
decisórias deliberativas relaciona-se ao fato de que:
As decisões acerca do poder estatal e de tudo que
diz respeito à coletividade devem ser
necessariamente coletivas, ou seja, devem ser
compreendidas e compartilhadas por seus
membros, aceitas em sentido profundo, pois os
seus proponentes foram capazes de uma
argumentação razoável de modo a convencer seus
interlocutores da validade e justiça de suas
proposições.
55
Ferraz (2009) resgata o pensamento de Cohen (2002), ao
apresentar princípios fundamentais a partir dos quais instituições sociais
e políticas possam funcionar dentro da lógica deliberativa, a saber: a)
princípio da inclusão deliberativa: está embasado na sustentação das
liberdades básicas (associação, expressão), visto que o exercício da
argumentação deve se manifestar sem constrangimento, sob a pena de
qualquer restrição negar a igualdade, excluindo indivíduos e grupos de
debates; b) princípio do bem comum: tem por finalidade evitar que
interesses de certos indivíduos ou grupos socias sejam privilegiados, e
consequentemente, promovendo a exclusão, e; c) princípio da
participação: os direitos necessários à participação devem ser
garantidos, assim como assegurar condições equitativas.
Para que o consenso seja alcançado, mediante o entendimento
entre as atores envolvidos em determinado processo, é essencial que a
participação seja imperativo nas relações estabelecidas, pois a dimensão
deliberativa na qual a cidadania está inserida implica necessariamente
no processo participativo dos atores sociais, elemento básico para que se
extrapolem os limites convencionais de exercício cidadão e os
indivíduos passem a adotar uma postura ativa, já que “o procedimento
da prática da cidadania deliberativa na esfera pública é a participação.”
(TENÓRIO, 2008b, p.48). Participação essa que é, “em última instância,
o desenvolvimento da aptidão para o diálogo” (GUTIERREZ, 2004,
p.58).
Nesse sentido, o incremento da discussão sobre gestão social
integrada à proposta de Habermas de cidadania deliberativa está
fortemente atrelado ao significado de participação, e a necessidade de
agregar estes dois conceitos anteriores à participação está vinculado, “a
ênfase que se faz primordial quando se deseja dizer que a gestão social
deve ser praticada como um processo intersubjetivo, dialógico, onde
todos têm direto à fala” (TENÓRIO, 2008b, p.54). O autor destaca que
tal processo deve ocorrer:
(...) em um espaço social, na esfera pública.
Esfera onde se articulam diferentes atores da
sociedade civil que ora em interação com o
Estado, ora em interação com o capital, ora os três
interagindo conjuntamente, vocalizam as suas
pretensões com o propósito de planejar, executar e
avaliar as políticas públicas ou decisões que
56
compartilham recursos em prol do bem comum.
((TENÓRIO , 2008b, p.54)
Nessa perspectiva, Jacobi e Barbi (2007, p. 243), apontam que “a
ampliação da participação está intrinsecamente vinculada à criação de
espaços públicos e plurais de articulação e participação, nos quais os
conflitos se tornam visíveis e as diferenças se confrontam”.
Tenório (2008c) defende a ideia de que a participação deve estar
sempre presente nas estratégias de gestão, sejam elas na administração
privada (relação entre trabalho e capital) ou na administração pública
(relação entre estado e sociedade), tendo em vista que a participação, de
forma consciente ou não, integra o cotidiano dos indivíduos, haja vista
sua atuação em relações sociais:
Por desejo próprio ou não, somos, ao longo da
vida, levados a participar de grupos e atividades.
Esse ato nos revela a necessidade que temos de
nos associar para buscar objetivos, que seriam de
difícil consecução ou mesmo inatingíveis se
procurássemos
alcançá-los
individualmente.
Assim, a cidadania e a participação referem-se à
apropriação pelos indivíduos do direito de
construção democrática do seu próprio destino
(TENÓRIO e ROZENBERG, 1997, p.103).
Bordenave (1986, p. 17) destaca que ela vem acompanhando a
evolução humana desde os tempos primitivos (tribos, clãs) até a
sociedade contemporânea (associações, empresas, partidos políticos) e,
desta forma, a frustração da necessidade de participar se configuraria
como uma mutilação do homem social, “o homem só desenvolverá seu
potencial pleno numa sociedade que permita e facilite a participação de
todos. O futuro ideal do homem só se dará numa sociedade
participativa”.
De acordo com Tenório (2008c, p. 152):
(...) a participação tem como pressuposto o
fortalecimento da sociedade civil. Esta perspectiva
coloca o desafio, que durante a década de 1990
esteve na contramão da história: de pensar uma
sociedade voltada para o coletivismo em lugar do
individualismo da sociedade de mercado; um
57
Estado como facilitador da participação em lugar
do Estado tecnoburocrático ou ainda “gerencial”;
um
mercado
comprometido
com
o
desenvolvimento e responsabilidade social, em
lugar de prática autocentrada, privatista e
pratrimonialista.
Nesse sentido, Demo (1999, p.13) argumenta que é através da
participação que “a promoção se torna auto-promoção, projeto próprio,
forma de co-gestão e autogestão, e possibilidade de auto-sustentação.”
Para o autor, a participação é um processo histórico infindável, o que
faz dela um processo de conquista de si mesma, pois não pode ser dada
e jamais será suficiente, trata-se de um “processo histórico de conquista
das condições de autodeterminação. Participação não pode ser dada,
outorgada ou imposta. Nunca é suficiente, nem é prévia. Participação
existe, se e enquanto conquistada. Porque é processo e não produto
acabado (DEMO, 1988, p.101).
Desta forma, “a participação não mais consiste na recepção
passiva dos benefícios da sociedade, mas na intervenção ativa na sua
construção” (BORDENAVE, 1986, p.20), que se materializa através da
tomada de decisão coletiva e deliberativa e das atividades sociais em
diferentes níveis.
Gutierrez (2004) salienta que existem diversas formas de
classificar a natureza da participação, dentre elas a que está subdividida
em participação econômica, política e social. A primeira representa, em
linhas gerais, as formas organizadas de resistência e lutas da classe
trabalhadora por direitos e contra a exploração capitalista, enquanto a
segunda, a participação política, configura-se com frequência como ao
direito o voto universal; já a participação social, é possível apontar
desde questões formais (pagamento de impostos, por exemplos) até o
comprometimento efetivo de pessoas e grupos populares organizados na
tomada de decisão sobre questões que lhe são pertinentes.
Para Bordenave (1986) os indivíduos participam em diferentes
grupos: a) primários: que incluem a família, o grupo de amizade ou de
vizinhança; b) secundários: como as associações profissionais,
sindicatos, empresas e; b) terciários: como os partidos políticos e
movimentos de classe. Assim sendo, o autor destaca que é possível falar
em processos de micro, no qual duas ou mais pessoas se unem em uma
atividade comum, sem interesse em benefícios próprios, e de
macroparticipação, que envolve a intervenção dos indivíduos em
58
processos dinâmicos que constituem ou modificam a sociedade,
justificando sua distinção mediante a premissa de que “muitas pessoas
participam somente em nível micro sem perceber que poderiam – e
talvez deveriam – participar também em nível macro, ou social”.
(BORDENAVE, 1986, p. 34).
Dallari (2004), em uma perspectiva mais critica, distingue a
participação em formal e real. Par o autor a participação formal “é a
prática de formalidades que só afetam aspectos secundários do processo
político” (2004, p. 92), materializada, por exemplos, em eleições onde a
coalizão dominante dificulta a articulação de grupos opositores de tal
forma que garantem a vitória dos candidatos governistas. Enquanto a
participação real é aquela que “influi de algum modo nas decisões
políticas fundamentais”. (DALLARI, 2004, p. 92). O autor afirma ainda
que:
Não é raro que se conceda ao povo possibilidade
de participar em atividades políticas secundárias,
que podem dar a sensação de ser fundamentais
mas que não afetam o poder de decisão do grupo
dominante, enquanto se nega o direito de
participar daquilo que realmente é decisivo
(DALLARI, 2001, p. 92).
Demo (1988, p.97) destaca que “a qualidade de uma sociedade se
retrata em seus canais de participação”, no âmbito de processos atuantes
que levam a participação autêntica e efetiva, fenômeno que em nossa
sociedade se caracteriza pela obstrução de tais canais e pelo
esvaziamento discursivo. Pois a participação da comunidade traz
consequências econômicas e sociais positivas e estimula o
desenvolvimento da cidadania e medida com que a própria comunidade
participa diretamente das ações que lhe atingem ou dizem respeito,
novos espaços éticos-políticos são criados. (FRANCO, 1999).
Demo (1988, p. 97-100) aponta, a título de sistematização prévia,
cinco canais, os quais acredita que a participação seja palpável:
a) organização da sociedade civil: seria a forma mais operacional
de fortalecer a cidadania, ainda que a sociedade não tenha desenvolvido
“o compromisso normal de se organizar democraticamente para a defesa
dos direitos”, pois o exercício democrático não deve se restringir a
momentos esporádicos;
59
b) planejamento participativo: trata-se das formas de
planejamento e administração sob regime de autogestão ou co-gestão,
em parceria com o Estado, “embora isto esteja – merecidamente – sob
suspeita, é possível construir dentro dos órgãos estatais e em programas
de governo áreas de possível participação popular”, desde que haja
qualidade política e interesse das partes envolvidas;
c) educação básica: é entendida como um canal de participação
pois sua finalidade precípua é política, pois aprende-se a ler, escrever,
“saber das coisas”, “para poder se menos objeto das prepotências e
ocupar um lugar mais visível de sujeito do próprio destino”; d)
identidade cultural comunitária: é o embrião da participação, visto que
planta a fé de um grupo em seu futuro, já que um passado válido foi
vivido e, fundamentalmente, para deixar a situação de objeto, o
indivíduo necessita de identidade, construída na história cultural da
comunidade, “sem isto não há comunidade, mas apenas um bando de
gente”;
e) conquista de direitos: os direitos necessitam ser conquistados,
caso contrário “não se realiza algo que é o cerne da cidadania, a saber, a
capacidade de construir com iniciativa própria seu própria seu espaço.”
Em complemento, Gutierrez (2004, p. 12-13) aponta os perigos
da participação disfarçada, ou em uso estratégico, usando termos de
Habermas, apresentando situações nas quais a participação se
desenvolve politicamente subordinada a outros interesses, como no caso
da “profissionalização da participação”, onde ela se torna um fim em si
mesmo ou ainda a influencia de um grupo específico, capaz de
condicionar o processo de tomada de decisão, já que “não existe relação
prévia e direta entre a participação e a ética, ou a eficiência.”.
Nessa perspectiva, Demo (1988, p. 101) destaca que a
participação se configura, muitas vezes, como uma máscara para o
exercício do poder pela coalizão dominante, pois “o poder não pode
chegar ao seu destino como poder; por isso, com frequência, usa a capa
da participação. Este é o seu melhor disfarce. Quando a imposição é
aceita como forma de participação, temos o poder hábil, estratégico,
capaz”. Não obstante, é fato que os processos participativos autênticos
implicam, em primeira instância, na divisão do poder entre os atores
envolvidos, contrariando a própria lógica tradicional do poder, que
perpassa a centralização e dominação.
Quando se fala em processos que envolvem deliberação é
possível que o grau de escolaridade dos participantes, condicione a
60
formação de uma hierarquia de poder em privilégio dos indivíduos com
maior conhecimento e que conseguem articulam com maior clareza suas
ideias. Segundo Brandão (2006, p.77):
Na ordem das trocas e poderes da sociedade
desigual, uma igualdade de acessos e carreiras
à/da educação compromete a necessidade política
e econômica da desigualdade estrutural de
participação na vida social, nos diferentes
domínios de poder e nas diversas alternativas de
relações entre o capital e o trabalho.
Desta forma, para que o processo deliberativo ocorra,
desvinculado de anseios de dominação e poder, os saberes devem ser
compartilhados, através do exercício da aprendizagem mútua e coletiva.
Sobre esse aspecto Tenório (1990) destaca que:
Numa relação social que se pretenda participativa,
os conhecimentos devem ser convergentes. O
saber de quem estudou deve ser usado como apoio
às discussões, mas não como orientador primeiro
na decisão. Numa relação coletiva o poder se dilui
entre os participantes, já que o conhecimento e as
informações são compartilhados, não existindo
'donos da verdade' (TENÓRIO, 1990. p. 163).
Desta forma os conhecimentos, mesmos que diferentes e
divergentes, devem ser integrados. O autor destaca ainda que se uma
pessoa é capaz de pensar sua experiência, ela é capaz de produzir
conhecimento. Para ele "participar é repensar o seu saber em confronto
com outros saberes. Participar é fazer 'com' e não 'para', [...] é uma
prática social" (TENÓRIO, 1990, p. 163).
A participação enquanto processo intersubjetivo e dialógico
possui forte ligação com o entendimento de aprendizagem, vista por
Schommer e Boullosa (2010, p.18) “como resultado de interações e
práticas compartilhadas pelas pessoas”.
Nessa perspectiva, Bordenave (1986) acredita que a participação
pode ser aprendida e aperfeiçoada, mediante a prática conjunta e a
reflexão, pois é através da ação e pensamento crítico que os indivíduos
passam a conhecer sua realidade, manejar conflitos, tolerar divergências,
aprender a organizar e mobilizar sua comunidade e por fim, aprender a
61
rejeitar e detectar tentativas de manipulação, sintomas de dirigismo e
paternalismo e a distinguir a verdadeira participação da mera consulta ao
povo. No mesmo sentido Gutierrez (2004, p. 13) destaca que a
participação é um processo eterno “já que sempre é possível estender,
aprofundar e aperfeiçoar as formas participativas”.
Assim sendo, a participação “não é um conteúdo que se possa
transmitir, mas uma mentalidade e um comportamento”, da mesma
forma que não é uma “destreza que se possa adquirir pelo mero
treinamento”, sendo em primeira instância “uma vivência coletiva e não
individual, de modo que somente se pode aprender na práxis grupal” e,
portanto, “só se aprende a participar, participando” (BORDENAVE, p.
74).
Abrangendo a educação formal e política, Demo (1995, p.147)
adverte que “a educação não favorece a cidadania automaticamente, (...)
sua tendência maior e típica é de reproduzir o espectro das
desigualdades sociais”, sendo imprescindível a superação do tecnicismo
e da mera ideologia no processo educativo, permitindo a “emergência do
sujeito histórico, capaz de ler a realidade criticamente e de nela intervir
de modo alternativo instrumentado pelo conhecimento. Trata-se de
aprender a aprender, saber pensar, para melhor intervir”.
Sobre a participação como uma ação legítima e consciente,
Tenório e Rozenberg (1997), acreditam que a mesma deve atentar para
três pressupostos fundamentais: a) consciência sobre atos: a participação
consciente envolve compreensão do processo que está sendo vivenciado
e o discernimento das ideias propostas; b) forma de assegurá-la: a
participação não deve ser algo imposto ou entendido como uma mera
concessão deve ser uma conquista cidadã; c) voluntariedade: o
envolvimento no processo participativo deve ocorrer por vontade
própria do indivíduo, sem imposição ou manipulação.
Ou seja, o sujeito enquanto cidadão deve ter a participação
voluntária, consciente e legitimada, como categoria intermediadora das
relações sociais que estabelece com diferentes setores e em diferentes
papéis, pois “é politicamente pobre o cidadão que somente reclama, mas
não se organiza para reagir, não se associa para reivindicar, não se
congrega para influir” (DEMO, 1988, p.21), já que, como destaca Frei
Betto (1993, p.02) “o mero reconhecimento de um direito inerente ao ser
humano não é suficiente para assegurar seu exercício na vida daqueles
que ocupam uma posição subalterna na estrutura social”.
62
Para Demo (1988, p.21-23) é possível admitir que “o traço mais
profundo da pobreza política de um povo seja a falta de organização da
sociedade civil, sobretudo frente ao Estado às oligarquias econômicas”
haja vista, que associar-se significa “potencializar a competência
humana democrática, realizando a regra da maioria, que deveria
prevalecer. A qualidade democrática poderia ser resumida como
qualidade associativa” (DEMO, 1995, p. 22). Para Frei Betto (2006
p.01) a cidadania inclusiva “trata-se, pois, de operar mudanças
estruturais na sociedade, tarefa a longo prazo que exige organização e
mobilização da sociedade civil, tanto para pressionar o governo e os
donos do dinheiro, quanto para ocupar instâncias de poder.”
Verifica-se que o fenômeno associativo apresenta relevante
convergência com a conquista dos direitos civis e da cidadania e se
insurge como um espaço legítimo de participação e transformação
social. Por isso, discutir-se-á, a seguir, sobre o fenômeno do
associativismo e uma expressiva forma de organização societária frente
aos ditames do mercado, o cooperativismo social.
2.3 Associativismo Civil
As experiências associativas aparecem com maior relevância no
Brasil em meados da década de 1990, em um cenário de busca pelo
resgate da participação e protagonismo da sociedade civil perante,
principalmente, o sistema repressivo de governo que marcou a década
anterior (MOREIRA, 2010). Corroborando a constatação, Horochovski
(2007) relaciona o crescimento do associativismo civil, de forma
pontual, à redemocratização do País e à crise do Estado
desenvolvimentista, constituído no período pós-guerra.
Carlos e Silva (2006, p.168) ligam o aumento do associativismo
civil à busca por maior controle social frente ao aparato estatal, “a
demanda societal dos anos 1990 por uma maior permeabilidade e
controle dos órgãos públicos pela sociedade civil pode ter gerado
impactos substantivos na adesão da população aos movimentos
populares e entidades civis organizadas”.
De forma mais ampla e temporal, Scherer-Warren (1999, p.117)
apresenta a evolução do associativismo civil brasileiro em três
momentos históricos, destacando quais as tendências temáticas que
predominaram em cada período, elucidando as transformações ocorridas
63
no processo político nacional, indicando as intensidades distintas na
capacidade de mobilização e organização da sociedade civil:
a) de 1964 a 1973: período de fechamento político
pelo regime ditatorial, aonde muitas organizações
civis
foram
reprimidas
politicamente,
desmanteladas e/ou extintas;
b) de 1974 a 1983: período de abertura e
transição. A democracia, em que há uma retomada
das mobilizações sociais e uma revitalização do
espírito associativista, com o surgimento de
organizações pela defesa da democracia e dos
novos movimentos sociais;
c) de 1984 a 1993: período de institucionalidade
da democracia, em que há o surgimento de um
novo tipo de associativismo vinculado à
ampliação dos direitos de cidadania, à
participação na esfera pública e realização de
parcerias com a esfera governamental.
Resgatando o último período citado, no qual o associativismo
ganha um enfoque menos combativo e mais cidadão, Carlos e Silva
(2006) destacam, primeiramente, que as práticas associativas brasileiras
ganharam importância diante do processo de mobilização e de
negociação dos movimentos sociais embasadas no ideário de luta por
direitos e cidadania e que, em um segundo momento, os movimentos
que fugiam aos esquemas tradicionais de clientelismo político
estabeleceram uma nova dimensão à ação associativa – a dimensão
política –, aquela que remete às práticas políticas mais complexas e
universais, tendo em vista a superação do paternalismo e
assistencialismo que, ainda hoje, permeiam as relações entre sociedade e
Estado.
Para Scherer-Warren (2001, p. 42) o associativismo civil pode
ser entendido como “formas organizadas de ações coletivas,
empiricamente localizáveis e delimitadas, criadas pelos sujeitos sociais
em torno de identificações e propostas comuns como para a melhoria da
qualidade de vida, defesa de direitos de cidadania, reconstrução ou
demandas comunitárias”.
Para Lüchmann (2011, p. 115) as associações são “organizações
voluntárias autônomas, com finalidades não lucrativas e controladas por
seus membros”, que devem cumprir funções democráticas, na medida
64
em que são autônomas, possuem uma identidade própria e participam
ativamente da vida social. Em sentido mais amplo, Demo (2001, p.22)
salienta que “associar-se significa potencializar a competência humana
democrática, realizando a regra da maioria, que deveria prevalecer. A
qualidade democrática poderia ser resumida como qualidade
associativa”.
Nessa perspectiva, Ganança (2006, p. 17) complementa ao
destacar que:
O aumento da organização autônoma de cidadãos
e cidadãs em associações, movimentos sociais,
sindicatos e partidos políticos, assim como o
aumento da participação política das pessoas,
permite que aos poucos elas possam tomar destino
de suas vidas nas próprias mãos, eliminando
progressivamente as arraigadas estruturas de
desigualdades presentes em nossa sociedade, que
gera e reproduz uma classe de sub-cidadãos/ãs,
que ocupam certos lugares sociais subalternos
correspondendo a lugares políticos invisíveis.
Sobre a importância do associativismo, Demo (2001) argumenta
que a sociedade desorganizada é a típica massa de manobra dos que
detêm maior poder, e que enquanto as pessoas não se associarem de
alguma forma, teremos uma população dispersa, frente a um Estado e
um mercado que de alguma forma estão organizados, ou seja,
“sobretudo não temos regras de jogo da convivência possível.” (DEMO,
2011 p.23). Haja vista que o “ativismo civil expresso na participação de
indivíduos em movimentos associativos, seja ele o associativismo civil,
seja o partidário ou o sindical, tem demonstrado impactos diretos sobre
propostas de políticas públicas elaboradas com a participação social.”
(CARLOS e SILVA, 2006, p. 167).
Carlos e Silva (2006) destacam que a dimensão política da ação
associativa que reivindica a redefinição da noção de direitos, a defesa da
autonomia organizacional dos movimentos em relação ao Estado e a
defesa de formas públicas de apresentação das demandas e de
negociação com o Estado apresenta interface com formas tradicionais do
associativismo presente na sociedade brasileira, fruto de formas verticais
de relações políticas, na qual a sociabilidade é definida por relações
privadas e desiguais de poder.
65
Para Lüchamnn (2011, p.118) “as associações formam a base dos
principais conceitos que sustentam perspectivas alternativas e/ou
renovadoras da democracia, seja por meio da cooperação e da
ampliação, seja por meio da contestação aos padrões de constituição da
democracia representativa tradicional”, tendo interface relevante com os
processos de ampliação e aprofundamento da democracia.
Segundo Demo (2001), o associativismo pode assumir diferentes
formas de expressão, desde os mais e menos politizados, como, por
exemplo, associação de moradores para se confrontar com o Estado, ou
associação de lazer; os localizados e os dispersos, como é o caso de
associações de vizinhos que moram juntos e associação de grupos
profissionais dispersos pelo país; os grandes e os pequenos, como os
sindicatos que possuem muitas filiações e outros apenas tópicos; assim
como expressões de associativismo clássicas como sindicatos, partidos,
cooperativas e todos os movimentos sociais (novos e tradicionais).
Lüchmann (2011, p. 116) argumenta que para a vertente de
pensamento representada principalmente por Habermas (1997), e Cohen
e Arato (2002) as organizações associativas apresentam distinção
fundamental “dos partidos políticos e outros instituições políticosinstitucionais, na medida em que não estão organizadas, tendo em vista
a conquista do poder, assim como se distanciam dos agentes e grupos
econômicos por não estarem diretamente associadas à competição no
mercado”. Desta forma, a autonomia é imperativo para organizações
dessa natureza.
Para Demo (1988, p. 45-58) os fenômenos participativos, em
especial, os que são caracterizados pela organização da sociedade civil,
como o associativismo, necessitam apresentar ao menos quatro
características, a saber: i) representatividade: as lideranças são legítimas
se escolhidas de modo democrático e, preferencialmente, com a
pluralidade de escolhas; ii) legitimidade: é legítimo o processo
participativo fundado no estado de direito, que deve regulamentar de
modo democrático e comunitário as regras da vida comum, enquanto é
ilegítimo os processos baseados em estado de impunidade, de exceção e
de privilégios; iii) participação da base: a participação autêntica deve ter
sua origem na base, com o poder de baixo para cima; iv) planejamento
participativo auto-sustentado: significa, sobretudo, a capacidade de
resolução dos próprios problemas, o que inclui a capacidade de realizar
autodiagnóstico e de formular estratégias de enfrentamento aos
66
problemas, e em consequência a organização política, essencial para
enfrentar com competência os desafios.
Independe da forma que as associações assumem, Lüchmann
(2011, p. 116) apresenta três elementos definidores da prática
associativa: a) a autonomia: diante do mercado, do Estado e das
organizações políticas dominantes, que deve garantir a expressão de
interesses sociais autênticos, embasados em valores de solidariedade e
justiça social; b) a identidade: configura-se como um “cimento
unificador”, que dá significância à saída do plano individual de ação; c)
a participação: que representa o meio da construção da identidade e do
pertencimento a uma coletividade. Tais elementos entrelaçam-se
também com concepções de democracia participativa e deliberativa.
Para Demo (2001) o associativismo refere-se a propostas de
organização da cidadania com alguma permanência no tempo, sobretudo
com capacidade de resistir a desmobilização, dentro de certa
sistematicidade. Desta forma, a simples filiação não representa a ação
efetiva de associar-se e impõe dois entraves a prática associativista: o
baixo índice de associação dos indivíduos, conferindo à sociedade, de
forma geral, “a face de bando desorganizado” e do outro lado, quando
associados, a permanência em filiações formais, usando a associação
mais com propósitos assistencialistas, com participação esporádica, “o
envolvimento realmente engajado não é regra” (DEMO, 2001, p. 24).
Outra problemática do associativismo é resgatada por Carlos e
Silva (2006, p. 164) em perspectiva histórica, que tange, em especial, a
coexistência do autoritarismo e da democracia em suas práticas:
Presentes e entrelaçadas nas práticas associativas,
as formas históricas do associativismo brasileiro,
por um lado, as baseadas em relações assimétricas
de poder e, por outro, as fincadas em condições
partilhadas de mediação política, continuam
orientando a ação movimentalista da sociedade
civil, num mix que ora tende ao tradicional e ao
autoritário, e ora tende ao inovador e ao
democrático.
Elucidando tal impasse, as autoras destacam que os movimentos
associativos dos anos 1990, ainda que tenham apresentado “desempenho
significativo no que diz respeito ao contingente de indivíduos que se
autopercebem como participantes do movimento popular, são
67
constituídos por vínculos frouxos e superficiais com a sociedade civil e
por relações instrumentais com o Estado” e que “a instrumentalização da
participação observada de modo predominante no conjunto da prática
participativa nos anos 1990 reflete um quadro de fragilização da
qualificação dos atores sociais para a participação política, para a prática
da negociação mediada pelo conflito e pelo dissenso”, traços que
influenciam ainda hoje a prática associativa e que se configuram como
desafios a serem superados (CARLOS; SILVA, 2006, p.188 e192).
Conforme complemento de Demo (1988, p. 23-24) ao salientar
que “é fato primordial que ainda não despertamos para a noção de nos
organizarmos em defesa de nossos direitos. Achamos, ao contrário, que
o Estado ou outra figura paternalista os deveriam garantir”, constatação
assentada no argumento de que “apesar de haver emergido uma forte
mobilização da sociedade a partir da abertura democrática, faz-nos falta
a trama bem urdida de associações de topo tipo, capaz de conferir
consistência e resistência às instituições da democracia”, configurando
novamente os desafios do associativismo, enquanto ator concreto e ativo
na sociedade.
Para o enfretamento das problemáticas apresentadas, resgata-se o
pensamento de Demo (1988) que destaca ser essencial a organização
competente, ancorada, principalmente, na construção de uma
organização sólida, que privilegie a participação de base e que seja
representativa e legítima e, não menos importante, o compromisso com
a autossuficiência, em vista de sua autonomia e independência. Para o
autor o caminho natural de qualquer associação é nascer pequena, porém
bem plantada; caso prospere, abre-se caminho para um horizonte de
possibilidades, que incluem o Estado, do qual se pode obter recurso,
porém como forma de conquista do grupo, “como capacidade
comprovada de negociação, como ocupação de espaço próprio, não
como dádiva que cobra subserviência” (DEMO, 1988, p. 70).
Tendo em vista formas associativas capazes de garantir sua
própria sustentabilidade, destaca-se a utilização de meios de produção
organizados, enquanto alternativas para obtenção de recursos, conforme
destacado no pensamento de Ganança, (2006, p. 62):
(...) o associativismo produtivo é uma forma de
organização social para o trabalho diferente das
tradicionais estruturas produtivas baseadas na
relação capital– trabalho. Esse segmento se
aproxima da organização cooperativa do trabalho
68
e da produção, e tem uma grande identidade com
ela. Talvez tenha uma identidade muito maior
com as cooperativas do que com a perspectiva e
formato da ação associativa, embora haja algumas
especificidades.
Nessa perspectiva, serão apresentadas considerações a respeito do
cooperativismo e, em especial, de uma de suas formas de expressão, o
cooperativismo.
2.4 Cooperativismo
A exploração do indivíduo enquanto força de trabalho, em meio
ao cenário da revolução industrial, marcou o surgimento, em âmbito
mundial, da primeira cooperativa, chamada Cooperativa dos Pobros
Pioneiros Equitativos de Rochdale, em 1844, na Inglaterra, sendo
pioneira na sistematização de seus princípios e valores em um estatuto
formal (CANÇADO, 2007; SAPOVICIS e SOUZA, 2004). No Brasil o
cooperativismo ganhou expressão com a imigração europeia, em
meados do século XX, configurando-se em cooperativas de consumo
nas
cidades
e
cooperativa
agropecuárias
no
campo
(SCHALLENBERGER, 2003; CANÇADO, 2007).
Faria (2011) destaca que, no Brasil, tais formas de organização
alternativa do trabalho surgiram por meio de iniciativas da sociedade
civil. Porém, de acordo com Culti (2002), até 1930 o cooperativismo
brasileiro se desenvolvia em ritmo lento, ganhando estímulo com crise
econômica mundial, marcada pela crise de 1929, que fez com que o
governo nacional se interessasse pelas práticas cooperativas,
principalmente como instrumento de política agrícola, culminando com
a regulamentação do cooperativismo, mediante decreto, no governo
Getúlio Vargas.
No interior dessa crise, o capitalismo conjuga, por
um lado, o avanço no assalariamento de nova
força de trabalho em escala global, dando
prosseguimento a sua tendência histórica à
desruralização e expansão das relações sociais de
produção, ao mesmo tempo em que se vivencia,
por outro lado, um processo profundo de
precarização do trabalho, de universalização da
subcontratação, de aumento da informalidade nas
69
esferas já integradas ao mercado mundial.
(FARIA, 2011, p.27)
Nesse cenário, o autor destaca que as cooperativas representam
uma alternativa de evitar o alastramento do emprego informal e
precário, mediante organização dos trabalhadores desempregados, em
virtude da falência das fábricas como reflexo da crise econômica
(FARIA, 2011).
Para Noronha (2004, p.01), a história do cooperativismo
apresenta relação estreita com a história das organizações humanas em
busca de autonomia social, entendida como “o processo em que se
relacionam os âmbitos econômico, social e cultural e através do qual,
sujeitos historicamente determinados se associam e vão construindo sua
identidade como agentes das práticas e decisões que lhes dizem respeito
na vida cotidiana” e que tem como característica primordial “a
capacidade de administrar suas vidas com independência e criticidade”.
Pois segundo Culti (2002, p.06) “o cooperativismo preocupa-se com o
aprimoramento do ser humano nas suas dimensões econômicas, sociais
e culturais”. Para a autora, a origem do cooperativismo remete as
origens do capitalismo, insurgindo paralelamente, “é reconhecido como
um sistema mais adequado, participativo, democrático e mais justo para
atender às necessidades e os interesses específicos dos trabalhadores,
além do que, propicia o desenvolvimento integral do indivíduo por meio
coletivo”, tendo em vista que tal entendimento admite o cooperativismo
como um sistema e as cooperativas como unidades econômicas e
espaços de convívio e transformações (CULTI, 2006, p. 06).
Costa (2007, p. 58) argumenta que o ato de cooperar e o
cooperativismo são elementos distintos, sendo o primeiro “qualquer ato
ou ação de colaborar com outras pessoas em qualquer formação
socioeconômica”, enquanto o segundo é entendido como “um
movimento social que procurou, através da associação, fugir de uma
opressão social resultante de um determinado período histórico e de um
determinado sistema, ou seja, o capitalismo concorrencial do século
XIX.”, destacando que “embora sejam encontradas experiências
cooperativas e associativas em períodos bastante remotos, estas não
passam de manifestações de sociabilidade característica do homem
enquanto um ser social” e que, por esse motivo, “não é possível
considerá-las partes do movimento cooperativista que é genuinamente
moderno”. Pois, para o autor, “o cooperativismo, enquanto doutrina,
teoria, sistema ou movimento associativista de trabalhadores, é um
70
fenômeno moderno oriundo da oposição operária às consequências do
liberalismo econômico”, assim como Emmendoerfer et. al. (2007, p.23)
baseados no pensamento de Pinho (2004), destacam:
O cooperativismo, enquanto sistema e doutrina,
surgiu como uma alternativa para corrigir o meio
econômico e social consequente do liberalismo
econômico. Seus princípios são baseados no ideal
de que a produção deve ser colocada em favor do
consumidor e não do produtor. Para tanto, as
pessoas associam-se e unem-se em cooperativas,
de forma que o resultado das atividades ou
prestação de serviços beneficia os próprios
associados e a comunidade em geral.
Borges et al. (2011) apresentam outra diferenciação importante
que tange a confusão existente entre associações e cooperativas,
destacando que ambas podem ser considerados empreendimentos de
economia solidária, todavia apresentam distinções societárias:
Quadro 06:- Diferenças societárias entre associação e cooperativa.
ASSOCIAÇÃO
COOPERATIVA
União de pessoas que se
organizam para fins não
econômicos.
Não tem fins lucrativos ou
econômicos.
Número
ilimitado
associados.
de
Cada pessoa tem direito a
um voto, desde que esteja
em pleno gozo dos seus
direitos sociais.
Assembleias: quórum é
baseado no número de
associados.
União de pessoas que se organizam para exercer
atividade econômica ou adquirir bens.
Caracterizada como sociedade simples, é regida
pela Lei n°5.764/71.
O objetivo principal é a prestação de serviços aos
cooperados. O lucro não é finalidade, mas pode
ser consequência da realização de uma atividade
econômica.
Número ilimitado de associados, salvo
impossibilidade técnica de prestação de serviços.
No entanto deve ser constituída pelo número
mínimo de 20 pessoas físicas.
Controle democrático: cada pessoa tem direito a
um voto, independente do capital por ela
investido, desde que esteja em pleno gozo dos
seus direito sociais.
Assembleias: quórum é baseado no número de
cooperados.
71
Não tem ações ou quotas
de capital, mas deve haver
fontes de recursos para a
sua manutenção.
Não gera excedente.
A cooperativa é estruturada por um capital social
e mantida por uma taxa de administração. Não é
permitida a transferência de quotas-partes desse
capital a terceiros, estranhos à sociedade.
Retorno dos excedentes proporcional ao volume
das operações.
Representa e defende os Presta serviço aos cooperados, para que eles
interesses dos associados.
trabalhem e produzam para sociedade ou
adquiram bens.
Os associados devem ter A cooperativa deve assegurar o direito de
direitos iguais, mas o igualdade de todos os cooperados, sejam eles
estatuto poderá instituir fundadores ou não, membros dos órgãos eletivos
categorias como vantagens ou não. Ou seja, filosófica ou legalmente,
especiais.
TODOS são donos da cooperativa.
Fonte: Borges et al. (2011, p.137-138).
Constata-se que, primordialmente, a diferença essencial entre as
duas formas organizacionais é o envolvimento econômico, em virtude
da disposição produtiva das cooperativas, e o desprovimento das
associações desse tipo de recurso.
Tendo em vista algumas características distintivas do
cooperativismo, Araújo e Souza (2010, p. 01) resgatam a definição da
Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), que apresenta as
cooperativas como sendo “empreendimentos constituídos por pessoas
ligadas a uma determinada ocupação profissional, com a finalidade de
melhorar sua remuneração e as condições de trabalho, de forma
autônoma”.
Para Andrade (2009), as cooperativas podem ser compreendidas
como sociedades autônomas, de ajuda mútua e controladas
democraticamente pelos seus cooperados, que cumpre o dever de
promover a educação e a formação de seus membros, representantes e
funcionários.
Em perspectiva semelhante, Cançado (2007, p.59) salienta que as
cooperativas “são organizações autônomas e independentes interessadas
no desenvolvimento sustentável de sua comunidade”, destacando que
“organizações com esta natureza possuem uma dimensão política de
mudança”. Contudo, o autor faz uma ressalva quanto aos tipos de
correntes de cooperativismo ao resgatar o pensamento de Oliveira
(2008), que apresenta três correntes: a) apresenta o cooperativismo
como um fim em si mesmo (liderada pela Aliança Cooperativa
Internacional - ACI, organismo mundial que tem como função básica
72
preservar e defender os princípios cooperativistas.); b) cooperativismo
como reforço as ideologias liberais (representadas pelos líderes de
muitas cooperativas agropecuárias brasileiras; c) cooperativismo
entendido como instrumento de negação da ordem liberal e alternativa
contra os efeitos negativos do capitalismo (CANÇADO 2007).
Verifica-se, entre as duas últimas definições, a convergência
quanto ao caráter autônomo das organizações cooperativas, em vista da
preservação de seus princípios e valores, e para que a lógica coletiva e
democrática possa ser mantida, ainda que tais organizações apresentem
interfaces com a esfera pública e de mercado.
De acordo com Cançado (2007, p.63), em primeira instância, o
que diferencia as cooperativas das demais organizações é fato de serem
sociedades de pessoas e não sociedades de capital, onde o protagonismo
é dado ao trabalho e não aporte financeiro e, em um segundo momento,
seus objetivos de gestão, visto que em empresas comerciais o objetivo
final é o lucro e a gestão é orientada pelo controlador dos recursos
financeiros da instituição, enquanto nas cooperativas o objetivo maior é
a prestação de serviços aos cooperados, dando-lhes a oportunidade de se
apropriarem de seu trabalho, sem a intermediação de terceiros e ainda
“as cooperativas devem ser organizações democráticas, na medida em
que cada cooperado, independente do seu investimento na organização,
tem direito a voto e pode, ainda, ser votado para cargos de direção na
cooperativa”.
Segundo Sapovicis e Souza (2004), os princípios cooperativistas
não se constituem como regras inflexíveis, todavia os seus valores
primordiais devem ser mantidos, são eles: solidariedade, liberdade,
democracia e justiça social. As autoras destacam ainda os princípios do
cooperativismo, herdados da pioneira Cooperativa de Rochdale:
a) adesão livre e voluntária: “as cooperativas são organizações
voluntárias e abertas a todos, desde que estejam aptos a assumir
responsabilidades e utilizar os seus serviços sem discriminação
de raça, classe social, sexo, opção política e religiosa,” tal
princípio tem implicações na constituição federal brasileira, que
garante a liberdade de associação de qualquer indivíduo
(ANDRADE, 2009, p.25);
b) controle democrático pelos sócios: “as cooperativas são
organizações democráticas controladas pelos seus sócios, que
participam ativamente de suas políticas e na tomada de
73
decisões”, onde todos os cooperados têm direito de voto
igualitário (ANDRADE, 2009, p.25);
c) participação econômica dos sócios: é equitativa e controlada
democraticamente, os excedentes, segundo Andrade (2009) são
destinados i) para desenvolvimento da cooperativa,
possibilitando o estabelecimento de fundos de reserva, parte dos
quais será indivisível; ii) benefício aos associados na proporção
de suas operações com a cooperativa e; iii) apoio a outras
atividades aprovadas em assembleia;
d) autonomia e independência: de acordo com Andrade (2009,
p.26) “as cooperativas são organizações autônomas de ajuda
mútua controladas por seus membros”. Segundo a autora, tal
princípio encontra subsídios na Constituição brasileira, Inciso
XVIII do art. 5° que expõe “a criação de associações e, na forma
da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo
vedada a interferência estatal em seu funcionamento”, a criação
de parceiras com instituições públicas e privadas deve ser
estabelecida tendo em vista a manutenção do controle
democrático e autonomia da cooperativa (ANDRADE, 2009,
p.26).
e) educação, treinamento e informação e cooperação entre
cooperativas: “as cooperativas proporcionam educação e
formação aos seus membros (...) de modo a contribuir
efetivamente para o seu desenvolvimento” (ANDRADE, 2009,
p.26).
Tais princípios sofreram alterações ao longo dos anos,
realizadas em reuniões da Aliança Cooperativa Internacional, conforme
destaca Cançado (2007, p.57) em um quadro explicativo:
Quadro 07: Evolução dos princípios cooperativistas segundo a Aliança
Cooperativa Internacional.
PRINCÍPIOS COOPERATIVISTAS
Estatuto de 1844
(Rochdale)
Congressos da Aliança Cooperativa Internacional
1937 (Paris)
1966 (Viena)
1995
(Manchester)
74
1. Adesão livre;
2. Gestão
democrática;
3. Retorno Pro
Rata das
operações;
a) Princípios
essenciais de
fidelidade aos
pioneiros;
1. Adesão
aberta;
4. Juro limitado
ao capital
investido;
2. Controle ou
gestão
democrática;
5. Vendas a
dinheiro;
3. Retorno Pro
Rata das
operações;
6. Educação dos
membros;
7.
Cooperativização
global.
4. Juros
limitados ao
capital;
b) Métodos
essenciais de
ação e
organização.
5. Compras e
vendas à vista;
6. Promoção da
educação;
7. Neutralidade
política e
religiosa.
1. Adesão livre
(inclusive
neutralidade
política, religiosa,
racial e social);
2. Gestão
democrática;
1. Adesão
voluntária e livre;
2. Gestão
democrática
3. Participação
econômica dos
sócios;
3. Distribuição das
sobras: a) ao
desenvolvimento
da cooperativa; b)
aos serviços
comuns; c) aos
associados prorata das operações.
4. Autonomia e
independência;
4. Taxa limitada
aos juros do
capital social;
7. Preocupação
com a
comunidade.
5. Educação,
formação e
informação.
6.
Intercooperação;
5. Constituição de
um fundo para
educação dos
associados e do
público em geral;
6. Ativa
cooperação entre
cooperativas em
âmbito local,
nacional e
internacional.
Fonte: Cançado (2007, p.57).
Dentre as mudanças, Cançado (2007) destaca a ocorrida em
Manchester, com a inclusão de princípios como a “preocupação com a
comunidade”, que segundo Andrade (2009, p. 26) significa que as
cooperativas devem trabalhar “para o bem estar e o desenvolvimento
sustentável de sua comunidade, município, região e estado através de
políticas aprovadas pelos seus membros, ou políticas realizadas em
parceria com o governo ou outras entidades”, pode apontar para uma
tendência de atualização da prática cooperativista, tendo em vista, a
importância de tais princípios, ao nortearem o cooperativismo mundial.
75
Nesse sentido, resgatam-se os tipos de cooperativas, que segundo
o Sebrae (n.d., p. 15) podem adotar qualquer tipo de atividade, tendo
destaque as cooperativas agropecuárias, que agrupam produtores rurais e
realizam atividades como “compra comum de insumos, a venda em
comum da produção dos cooperados, a prestação de assistência técnica,
armazenagem, industrialização”; as cooperativa de consumo, que “reúne
consumidores de bens de uso pessoal e doméstico (supermercado)”, com
intuito de compra comum dos bens; - a cooperativa habitacional,
integrada por indivíduos carentes de moradia, para aquisição de terrenos
e construção de casas ou prédios residenciais; as cooperativa de
trabalho, formada por trabalhadores, que intenta “conseguir clientes ou
serviço para estes cooperados, fornecer capacitação e treinamento
técnico, entre outros”; a cooperativa de produção, reúne operários de
uma organização, seus serviços consistem em coordenar seu
funcionamento; a cooperativa de crédito, que reúne as reservas
financeiras de um grupo de pessoas, “oferecendo crédito e valorizando
as aplicações financeiras dos cooperados”; a cooperativa educacional:
formada por pais de alunos, onde a cooperativa “é mantenedora de uma
escola, cujos alunos são filhos de cooperados”; a cooperativa de
serviços: formada por pessoas com necessidades comuns de serviços; a
cooperativa de saúde, que reúne profissionais ou usuários de saúde, em
cooperativas de trabalho, como no caso dos médicos, e de consumo,
como no caso dos planos de saúde; e por fim, recentemente surgem no
Brasil a cooperativa especial, que configura-se como uma “uma
alternativa de organização para índios e pessoas com alguma deficiência
física ou mental, que conservam sua capacidade produtiva”.
2.4.1 Cooperativas Socais
Em âmbito mundial, as cooperativas sociais tiveram seu inicio na
Itália, no final dos anos de 1970, impulsionadas por iniciativas de
cooperativas, de movimentos filantrópicos ligados ao voluntariado
religioso e, principalmente, do médico Franco Basaglia, promotor da
reforma psiquiátrica no país, que tinha como um de seus recursos a
criação de cooperativas para reinserção social dos pacientes através do
trabalho, todavia, apenas em 1990 foi instituída a primeira lei que
regulamenta tal tipo de cooperativa (DAMIANO, 2007; MARTINS,
2009).
76
No Brasil, de acordo com Martins (2009), algumas experiências
de mesma natureza começaram a aparecer na década de 1990,
influenciadas pela prática italiana e segundo Damiano (2007, p. 204) a
“inspiração da Lei das cooperativas sociais veio da necessidade de dar
continuidade à lei da reforma psiquiátrica, aprovada pela Câmara dos
Deputados em 1990”, a Lei Federal n. 9867/99:
Após quatro anos de tramitação no Congresso
Nacional, em 1999 é publicada a Lei brasileira de
cooperativas sociais, com seu texto original
similar a lei italiana. A Lei de autoria do deputado
Paulo Delgado, que também foi autor da reforma
psiquiátrica brasileira, foi aprovada com vetos que
acabaram impedindo sua efetiva implementação
(MARTINS, 2009, p. 18).
Tal divergência na aprovação da regulamentação das
cooperativas sociais pode estar relacionada ao entendimento de que a
mesma promoveria a segregação dos seus envolvidos. (GUGEL, 2011;
ANDRADE, 2009). Para Gugel (2011, p. 04) “trata-se, no entanto, de
equívoco produzido pelo desconhecimento dos benefícios que o sistema
cooperativado pode trazer para a sociedade quando bem implementado
e, dos próprios elementos norteadores das cooperativas sociais dirigidos
às pessoas que indicam” e segundo Andrade (2009, p. 52) “ao ser
atendido o objetivo da constituição de uma cooperativa social amplia-se
a possibilidade de que mais pessoas com deficiência obtenham a
independência econômica e pessoal”.
Carreta (2004, p. 55) resgata o pensamento de Pastore (2003) e
Siqueira (2003), sobre a discussão envolvendo a regulamentação das
cooperativas sociais:
Pastore (2003) acredita que a constituição de
cooperativas sociais é viável e recomendável,
considerando a quantidade de pessoas que estão à
margem do mercado de trabalho e que seriam
contemplados por essa legislação. Já para Siqueira
(2003),
cooperativas
sociais
confundem
empreendimento econômico (geração de trabalho
e renda) com iniciativa assistencial (atendimento à
pessoa com deficiência), o que não seria
adequado.
77
Corrobora-se, neste trabalho, ao entendimento de Damiano (2011,
p. 204) ao destacar que com as cooperativas sociais “muitas pessoas que
estariam marginalizadas poderiam passar a desenvolver uma atividade
produtiva, o que, não somente colaboraria para aumentar o seu respeito
próprio, como também sua dignidade como pessoa humana e a sua
inserção na sociedade”.
De acordo com a Lei 9867/99, em seu artigo 1° “as cooperativas
sociais, constituídas com a finalidade de inserir as pessoas em
desvantagem no mercado econômico, por meio do trabalho,
fundamentam-se no interesse geral da comunidade em promover a
pessoa humana e a integração social dos cidadãos”, ou seja, em linhas
gerais “as cooperativas sociais objetivam, portanto, a inserção de
pessoas em desvantagem econômica no mercado de trabalho”,
incluindo: i) a organização e gestão de serviços sociossanitários e
educativos; e ii) o desenvolvimento de atividades agrícolas, industriais,
comerciais e de serviços (CARRETA, 2004, p. 54).
Para os efeitos de tal Lei, artigo. 3° Gugel (2011, p.05) destaca
que são consideradas pessoas em desvantagem: “deficientes psíquicos e
mentais, as pessoas dependentes de acompanhamento psiquiátrico
permanente, e os egressos de hospitais psiquiátricos”; “os dependentes
químicos”; “os egressos de prisões”; “os condenados a penas
alternativas à detenção”e; “os adolescentes em idade adequada ao
trabalho e situação familiar difícil do ponto de vista econômico, social
ou afetivo”, devidamente atestada a condição de desvantagem, conforme
§ 3º, “por documentação proveniente de órgãos da administração
pública, ressalvando-se o direito à privacidade”. No mesmo artigo da
Lei, § 2º, salienta-se que:
As Cooperativas Sociais organizarão seu trabalho,
especialmente no que diz respeito a instalações,
horários e jornadas, de maneira a levar em conta e
minimizar as dificuldades gerais e individuais das
pessoas em desvantagem que nelas trabalharem, e
desenvolverão e executarão programas especiais
de treinamento com o objetivo de aumentar-lhes a
produtividade e a independência econômica e
social (GUGEL, 2011, p. 05).
Segundo Carreta (2004, p. 54), o estatuto das cooperativas poderá
prever ainda a “existência de sócios voluntários, sendo pessoas que não
78
estejam em desvantagem, e que possam prestar serviços gratuitamente
na cooperativa”. Nesse sentido, Gugel (2011, p.11) destaca, em especial
sobre a categoria que envolve pessoas com deficiência, que:
Sabe-se que os pais, irmãos, parentes e amigos da
pessoa com deficiência unem-se para colaborar
com a sua formação, envolvendo-se em sua vida
para integrá-la no contexto social em que vive.
Pois bem, essas pessoas que zelam pela pessoa
com deficiência são potencialmente aquelas que
poderão contribuir para a formação das
cooperativas sociais. Sim, pois a condição
estatutária que permite a inclusão de uma ou mais
categorias de sócios voluntários agregará a
participação direta de pais, parentes próximos e
amigos da pessoa com deficiência, com o objetivo
de conjugar esforços para que ela se torne
independente por meio do trabalho produtivo.
Assim sendo, tal atributo da legislação permite que
organizações dessa natureza sejam constituídas de forma mais plural,
fomentando a agregação de esforços em sua construção e
desenvolvimento.
Sobre os tipos de cooperativas sociais, Martins (2009, p. 54)
recorre a Lei italiana n° 381/1999, que discorre sobre as cooperativas
sociais e apresenta as seguintes tipologias: tipo A: “tem como
característica principal promover serviços educativos e de assistência
social à população em desvantagem”; tipo B: “tem por objetivo investir
na inserção laboral e na reinserção social por meio do trabalho” e; tipo
A e B: “são cooperativas sociais que mesclam A e B, prestando
assistência à comunidade e incluindo em entre seus membros pessoas
consideradas em desvantagem social”.
Segundo a autora, as cooperativas do tipo A manifestam suas
atividades de forma direta na comunidade através de espaços de
reabilitação e creches, por exemplo, aproximando da área,
tradicionalmente, de responsabilidade do poder público; enquanto as
cooperativas do tipo B configuram-se em atividades de produção e
prestação de serviços, por exemplo, tendo em vista, a inserção laboral de
pessoas em desvantagem, favorecendo a integração social dos mesmos
(MARTINS, 2009).
79
A título de exemplo, é possível identificar no mercado nacional a
materialização de cooperativas sociais através das seguintes iniciativas:
Cooperativa Social de Produção dos Jovens artesãos de São Paulo –
COOPERARTE; A Cooperativa Social de Produção e Prestação de
Serviços de Porto Alegre – COOPERSOCIAL; Cooperativa Social das
Pessoas com Deficiência de Santa Catarina – COOPERDEF e; a
Cooperativa Social de Pais Amigos e Portadores de Deficiência –
COEPAD, localizada em Florianópolis, Santa Catarina.
Os objetivos das cooperativas sociais contemplam a constituição
de um novo cenário para as chamadas “pessoas em desvantagem”,
mediante a construção coletiva, envolvendo diversos atores sociais, de
uma alternativa democrática para inclusão social e desenvolvimento da
cidadania, através de atividades que podem ser desenvolvidas pela
sociedade civil.
Verifica-se no cotidiano que muitas cooperativas apresentam
divergências quanto à observância dos princípios de cooperativismo,
sendo estes substituídos pelos valores de mercado, que sucumbem à
cooperação em vista do lucro e, consequentemente, trazem a tona
novamente a exploração do trabalhador. Segundo Monteiro et. al. (2010,
p.01):
Por
serem organizações
diferentes
das
organizacionais tradicionais mercantis, as
cooperativas apresentam a necessidade de uma
forma de gestão também distinta baseada em
princípios cooperativistas. Porém, o contexto
hegemônico da sociedade ocidental ainda é o
capitalismo. Dessa forma, organizações sociais
como as cooperativas que se propõem a atuar de
forma diferente têm encontrado, geralmente,
dificuldades em se constituir e se desenvolver.
Em vista de tal entendimento, esta pesquisa buscou analisar a
gestão de duas cooperativas de origem popular, pontualmente, a
participação dos atores organizacionais no processo decisório, para
tanto, os procedimentos metodológicos utilizados será descritos a seguir.
80
2.5 Processos decisórios
O processo decisório é uma temática estudada por diferentes
áreas do conhecimento, que abrange desde estudos filosóficos até
campos que envolvem as ciências exatas, como o da matemática,
conforme destacado por Iizuka (2008, p. 42):
A ciência política privilegia uma análise dos
conflitos entre diferentes segmentos, os interesses
e a influência de atores, os efeitos do poder etc.; a
psicologia, por sua vez, tende a observar o
comportamento dos indivíduos e o papel
desempenhado segundo os diversos perfis; a
economia procura sistematizar suas contribuições
a partir das distintas concepções humanas: o homo
economicus (racional e maximizador das suas
utilidades), o homem administrativo que toma
decisões otimizadoras e limitadas no âmbito
organizacional; a sociologia enfoca os aspectos
relacionados aos pequenos grupos, ao tipo de
profissão etc.; a filosofia questiona a decisão a
partir da ética e da razão humana; a matemática
contribui com os modelos probabilísticos e a
ciência da computação com o avanço no
conhecimento sobre a inteligência artificial.
O autor destaca que, no Brasil, a introdução da temática do
processo decisório ocorreu na década de 1960, em meio ao processo de
legitimação do campo administrativo no País, sendo a Escola Brasileira
de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas (EBAPE) uma
das pioneiras na introdução da temática em sua estrutura curricular, com
o intuito de “buscar modelos explicativos, mais objetivos e práticos, de
tal forma a subsidiar os futuros administradores a exercerem suas
funções de maneira que pudessem concretizar ações mais eficientes e
eficazes nas organizações públicas e privadas” (IIZUKA, 2008, p. 42).
O primeiro modelo de processo decisório, chamado modelo da
escolha racional, foi construído pelos economistas neoclássicos, que
tinham como pressuposto a concepção do homo economicus, ou seja,
“um ser racional que busca maximizar a sua utilidade por meio de
escolhas ótimas a partir de cálculos ponderados entre as variáveis
contidas nas “cestas” de alternativas que ele conhecesse previamente”
81
(IIZUKA,2008, p. 44). Segundo Franganito (2010) neste modelo, o
processo decisório aparece como sendo uma questão de maximização de
utilidades, numa situação onde as alternativas e suas consequências
podem ser antecipadas.
As decisões baseadas no modelo racional apresentam limitações
que comprometem sua efetividade no alcance dos objetivos
organizacionais, apresentando restrições quanto as variáveis, dentre as
quais se destacam as variáveis humanas, que envolvem aspectos como a
motivação, conflito e personalidade dos atores organizacionais,
variáveis políticas, que envolvem relações de poder e interessantes
distintos e variáveis sociais, dentre as quais se destacam os grupos de
referência (MOTTA, 1988).
Cantisano (1998) aponta duas críticas principais sobre o modelo
da escolha racional. A primeira relaciona-se a não consideração das
preferências individuais dos indivíduos, como, por exemplo, a influência
das emoções e uma segunda crítica diz respeito às limitações da
racionalidade. Iizuka (2008, p. 48) apresenta outros limites do modelo:
(...) acesso à informação nunca é perfeito; as
pessoas têm capacidade limitada para reconhecer
e lidar com as informações; a racionalidade
econômica, maximizadora da utilidade, é uma
dentre as diversas racionalidades e, finalmente, as
condições em que ocorre a decisão não podem ser
ignoradas, na medida em que influenciam o
processo decisório e podem ser determinantes nos
rumos tomados.
O modelo racional, segundo Stoner e Freeman (1999, p. 190),
“cria uma imagem do tomador de decisões como uma supermáquina
calculadora, mas sabemos que os seres humanos reais não tomam as
suas decisões dessa forma”, segundo os autores, os decisores “tendem a
usar o que Herbert Simon chama de “racionalidade limitada” e regras
empíricas chamadas de heurísticas, e deixam que as tendências
influenciem suas decisões”.
Em vistas as limitações encontradas nesse modelo e a
necessidade de alternativas mais condizentes com a realidade emerge a
Teoria da Racionalidade Limitada, de Herbert Simon. Segundo Iizuka
(2008, p.49), Simon foi o principal teórico da perspectiva
comportamental, descrevendo o “homem administrativo”, um ser
82
humano real, que apresenta limitações cognitivas e que age em situações
imperfeitas em meio a um ambiente organizacional caótico e
contestando os economistas neoclássicos ao apresentar “uma abordagem
em que as pessoas tomavam decisões satisfatórias, ou seja, racionais,
mas “imperfeitas”, em que se buscava otimizar as alternativas
percebidas e disponíveis no momento da tomada de decisão”. A teoria
de Simon funda-se, então, no entendimento da racionalidade limitada,
na ideia de fragmentação do conhecimento entre os indivíduos e não
impossibilidade do processo ilimitado de dados e informações que
possam interferir na dinâmica organizacional.
Para Simon (1965, p. 10) o próprio processo administrativo é um
processo decisório, que consiste “no isolamento de certos elementos nas
decisões dos membros da organização, no estabelecimento de métodos
de rotina para selecionar e determinar esses elementos, e na sua
comunicação aos outros processos por ele afetados” e é caracterizado
“pela especialização vertical, a partir da qual se pode obter uma
pirâmide ou hierarquia de autoridade, com maior ou menor formalismo,
e por uma especialização das funções decisórias entre membros dessa
hierarquia”.
Segundo Freitas e Kladis (1995), o modelo de decisão de Simon é
dividido em três grandes fases e com uma revisão e acompanhamento
constantes (feedback). Na primeira fase, denominada “inteligência ou
investigação”, ocorre a exploração do ambiente, etapa na qual os dados
são processados em busca de indícios que possam levar a identificação
de oportunidades e ameaças. Posteriormente, parte-se para o “desenho
ou concepção”, etapa em que acontece a criação, desenvolvimento e
análise dos cursos de ações possíveis, período no qual o tomador de
decisão formula o problema e analisa as alternativas disponíveis, tendo
em vista seu potencial de sucesso. A terceira etapa envolve a “escolha”,
pois define qual alternativa será escolhida dentre aquelas possíveis, que
ocorre após a fase “desenho”, onde o decisor deve coletar informações
que garantam a escolha da melhor opção possível. Por fim, tem-se o
feedback, que envolve todas as etapas anteriores e pode ocorrer entre a
fase de escolha e concepção ou inteligência ou entre a fase de concepção
e inteligência.
Desta forma, para Simon (1970), a tomada de decisão é
essencialmente uma ação humana e comportamental, que envolve a
seleção consciente ou inconsciente de determinadas ações, que sejam
fisicamente possíveis para o agente e para os demais atores sobre os
83
quais ele exerce influência e autoridade. De acordo com Rosa (2006),
Simon apresenta a tomada de decisão através de duas abordagens:
processo lógico e processo não lógico:
O autor define o processo racional, lógico, como
aquele de pensamento consciencioso, passível de
expressão por palavras ou outros símbolos, isso é,
pela razão. Por processo não lógico, Simon chama
aquele que não é capaz de ser expresso em
palavras ou pela razão, que é conhecido pelo
julgamento, decisão e ação. A fonte do processo
não lógico são os fatores e condições psicológicas
ou, do ponto de vista psíquico e social, é
representado pela ausência de esforços
conscientes por parte do indivíduo (ROSA, 2006,
p.31).
Segundo Sasur et. al.(1998, p. 04) Simon defende que “que os
indivíduos, na verdade, não decidem por um processo racional de
consideração de todas as alternativas, mas efetuando simplificações que
sejam acessíveis à própria capacidade mental” e desta forma, o autor
estabelece “a diferença entre decisões programadas e não programadas
como, respectivamente, aquelas mais rotineiras e as mais imprevisíveis e
complexas”. Lacombe e Heilborn (2006, p. 441) alertam que ao
classificar as decisões em programadas e não programadas “elas não
devem ser consideradas dois tipos totalmente distintos e sim dois polos
entre as quais existe um continuun, algumas decisões aproximando-se
mais de um polo”.
Iizuka (2008, p. 53) apresenta algumas limitações do modelo de
Simon, destacando que o “o processo decisório para Simon seria algo
razoavelmente linear”, e que os “fatores que eventualmente pudessem
afetar a trajetória de uma decisão seriam indesejáveis e, portanto,
eliminados ou mesmo diminuídos, o que nem sempre é possível”,
destacando ainda que a teoria da racionalidade limitada “aproxima-se
dos objetivos da teoria da escolha racional ao não abandonar os
princípios centrais de uma visão geral acerca dos seres humanos e do
seu comportamento num processo de tomada de decisão”. Ainda assim,
é possível reconhecer diferenças entre abordagem racional e a
racionalidade limitada, conforme quadro de Piovesan (2002)
apresentado por Iizuka (2008, p. 53):
84
Quadro 08: Abordagem Racional e Abordagem Racional Limitada.
Abordagem racional-compreensiva
Abordagem racional limitada
Os problemas são bem definidos.
Os problemas são ambíguos e pouco
determinados.
Uma lista completa de alternativas A informação para a identificação de
para consideração dos analistas.
alternativas é precária e muitas
alternativas são desconhecidas.
Existe uma base completa de
informação sobre o contexto e o
ambiente.
A visão sobre os impactos de cada
alternativa é adequada.
Os analistas têm a informação
completa sobre os valores e interesses
dos cidadãos e dos grupos de
interesse.
Os recursos, competências e tempo
são suficientes.
Fonte: Iizuka (2008, p. 53)
A informação sobre o contexto ou
ambiente é problemática e incompleta.
Os impactos das possíveis alternativas
são desconhecidos.
Os valores, interesses e preferências
não são bem estabelecidos.
O tempo, os recursos e competências
são limitados.
Segundo Iizuka (2008, p. 53) o quadro permite apontar distinções
fundamentais entre as abordagens, em especial que a “preocupação dos
teóricos das abordagens neoclássicas está mais no resultado e enquanto
que a linha teórica de Simon está no processo”.
Visando uma abordagem mais sintonizada com o cotidiano
organizacional, a abordagem incremental da tomada de decisão surge
para questionar os pressupostos da visão racional da decisão, buscando
um método de maior praticidade, capaz de reduzir a complexidade da
realidade que o permeia (GONTIJO; MAIA, 2004). Segundo Rosa
(2006, p. 48):
Os incrementalistas assumem que a seleção de
valores e a análise empírica não se realizam
distintamente no tempo e sem influência mútua.
Esse modelo tem como características principais a
tentativa de descentralização e democratização de
decisões
e
a
elevada
capacidade
de
aprimoramento e adaptação e, no caso, as políticas
seriam mais sensíveis aos diversos grupos de
interesse envolvidos, o que pode representar mais
85
vezes os interesses dos grupos mais poderosos e
articulados.
Iizuka (2008, p. 55) com base em Lindblom (1959, p. 81),
expõe um quadro comparativo entre a abordagem racional (denominada,
usualmente, como método racional compreensivo) e a abordagem
incremental (também conhecida como o método das comparações
limitadas e sucessivas):
Quadro 09: Abordagem Racional e Abordagem Incremental
Método racional compreensivo
Método das comparações limitadas e
sucessivas
1) A distinção clara entre valores e
objetivos é um pré-requisito para uma
análise empírica das alternativas
políticas.
1) A seleção dos objetivos avaliados e
a análise empírica para a ação
necessária não são distintas entre si,
mas são intimamente entrelaçadas.
2) Na formulação da política pública,
segundo a análise da abordagem dos
meios e os fins: primeiro os fins são
isolados e então os meios para
alcançá-los são procurados.
3) O teste da “boa” política pública é
o que podem demonstrar os meios
que são mais adequados para os fins
desejados.
4) Análise é compreensiva; todos os
fatores relevantes são considerados.
2) Desde que os meios e os fins não
são distintos, a análise de meios e fins
é frequentemente inapropriada ou
limitada.
5) Conta-se de forma intensa e
frequente com a teoria.
3) O teste da “boa” política pública é
feito tipicamente por diversos analistas
que diretamente concordam com ela.
4) A análise é drasticamente limitada:
i) Importantes consequências
possíveis são negligenciadas
ii) Importantes alternativas de
políticas públicas são negligenciadas
iii)
Importantes
valores
afetados são negligenciados.
5) Uma sucessiva comparação reduz
consideravelmente ou elimina a
necessidade de um embasamento
teórico.
Iizuka (2008) destaca que o aspecto central do incrementalismo
foi apresentar a prática de gestores públicos e privados, evidenciando
86
um processo contínuo de negociações a partir de pequenos passos, nem
sempre linear, no processo de decisão.
Ainda dentre os principais modelos para tomada de decisão,
destaca-se o modelo político, que, segundo Façanha e Yu (2011), é
relevante para a tomada de decisões não-programadas, quando as
condições são incertas, a informação é limitada, e não há acordo entre os
gestores sobre as metas a serem perseguidas ou qual curso de ação
tomar. A premissa do modelo é de que os envolvidos têm interesses
distintos e, por vezes, conflitantes, o que acarretaria na forte
possibilidade de um alinhamento estratégico entre os participantes e a
construção de redes de influência. Sendo que, as preferências dos
sujeitos mais influentes exercem grandes possibilidade de conduzir e
dominar as decisões (FAÇANHA; YU, 2011).
Destaca-se ainda o modelo da “lata do lixo” (Garbage Can
Model), criado por Cohen, March e Olsen, “num contexto de operação
das universidades e os seus muitos problemas de comunicação
interdepartamental” (Iizuka, 2008, p. 64). Segundo Façanha e Yu
(2011), tal modelo é formado por 4 (quatro) elementos: 1) mecanismos
de decisão (estrutura ou instância para tomar decisão); 2) participantes
(pessoas que fazem parte do mecanismo da decisão); 3) problemas
(propostas apresentadas ao mecanismo de decisão) e; 4) soluções do
problema (uma ou mais alternativas de decisão escolhidas para cada
problema).
De acordo com Iizuca (2008, p. 64-65), a principal característica
do modelo da lata de lixo é:
A desconexão parcial entre problemas e escolhas,
partindo-se do pressuposto que há muitas
organizações em que as soluções são apresentadas
antes dos problemas serem identificados,
principalmente quando uma organização se depara
com uma situação de grande ambiguidade,
incertezas, conflitos e variações ambientais.
Em tal modelo, a problemática existente pode receber quatro
tipos de soluções, a saber: a) solução satisfatória (solução final); b)
decisão de abandono (devido à dificuldade de se alcançar uma solução
final; c) decisão com exame superficial, e; d) decisão sem qualquer
discussão.
87
Salienta-se a existência de diversas outras abordagens
envolvendo os processos decisórios, algumas delas destacas no quadro a
seguir, elaborado por Iizuka (2008, p. 75-76), que contempla além dos
modelos aqui apresentados, os modelos chamados Sensemaking e
Groping Along.
Contribuições-chave
Conceitos
Quadro 10: Síntese das Abordagens Teóricas do processo decisório
Escolh
a
Racio
nal
Teorias e Modelos de Processo Decisório
Racionali
Increment Política –
Garbage
dade
alismo
Agenda de Can
Limitada
Disjunto
Políticas
Públicas
Homo
Econo
micus
Conce
pção
clara,
concis
ae
simple
s da
nature
za
human
a
- Uso
do
métod
o
científi
co
- Homem
Administra
tivo
Abordage
m
Comporta
mental
Limitações
cognitivas
Limitações
quanto ao
acesso e
uso das
informaçõe
s
- Quebra
da
racionalida
de perfeita
- Cotidiano
da gestão,
caráter
prático.
Negociaçõ
es e ações
por meio
de
pequenos
passos e
sucessivas
aproximaç
ões
- Quebra
da
racionalida
de perfeita
- Atores
políticos
Com
diferentes
papéis e
influência
- Conflitos
competitiv
os abertos,
fechados e
latentes.
Influência
da
dinâmica
política
na agenda
de
Políticas
Públicas
- Quebra
da
racionalida
de
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cia
temporal
e
contextu
al
Descone
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parcial
entre
problem
as e
escolhas
Soluções
Procuran
do
problem
as
Sensema
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Groping
Along
- Criação
contínua
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Interpret
ação e
compree
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a da
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repertóri
o
Plausibil
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mais do
que
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Extração
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como
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atenção
Cotidian
o da
gestão,
caráter
prático
– Foco
na ação,
mais do
que no
planejam
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Aprendiz
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ativos e
interativ
os
- Gestão
baseada
na
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as
pessoas
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números
e
relatório
s
Maxim
izar os
resulta
dos
Otimizar
os
resultados
Resolver
problemas
Resolver
conflitos
Homo
gênea
e
dirigid
a pelo
topo
Homogêne
a e dirigida
por
técnicos e
especialist
as
Heterogên
ea, mas
com uma
direção
comum
Restrit
a ao
topo
Limitada
aos
técnicos e
especialist
as
Relacionad
a ao
problema
em questão
Heterogên
ea e
permeada
por
conflitos
competitiv
os
Relacionad
a aos
interesses
e poder
Alcanç
ar a
melhor
soluçã
o
Encontrar
uma
solução
ótima
Encontrar
uma
solução
Compr
eensív
el,
racion
al
Intencional
mente
racional,
com
limitações
cognitivas
Intencional
mente
racional,
admitindose a
intuição e
a
experiênci
a
Inexist
em
Existem e
são
indesejávei
s
Existem e
podem ser
positivos
nos
pequenos
passos
Conflitos
Processo de escolha
Busca
Participaçã
o
Organização
Ênfase
88
Justificar
um ponto,
vencer
uma
posição
divergente
Conflitos
de
interesse
dominado
pelo poder
das
coalizões
Existem
em alto
grau,
estimulado
pelo jogo
político
Combina
r
problem
as e
soluções
randômi
cos
Anarquia
s
Organiza
das
Fazer
sentido,
ser
plausível
Tatear
possibili
dades
Heterogê
nea,
plural
Heterogê
nea,
aberta e
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Fluida e
não
sistemáti
ca
Fluida e
relaciona
da aos
repertóri
os
Fluida e
relaciona
da aos
repertóri
os
Não
aplicável
Buscar
algo
plausível
Coalizõe
s
randômi
cas de
problem
as,
soluções,
participa
ntes e
oportuni
dades
Não se
aplica
Guiado
pelos
sentidos
criados e
pela
plausibili
dade
Alcançar
os
objetivos
tateando
possibili
dades
Intuitivo,
baseado
nos
repertóri
os,
contexto
se
aprendiz
ados
Existem
e são
passíveis
de
combina
ções
Existem,
mas são
“neutrali
zados”
pela
ação
89
Linear,
Normativa
Não linear,
Prescritiva
Alisso
ne
Zeliko
w
(1996)
e
Etizion
i
(1992)
Simon
(1959,
1965,
1978)
Lindblom
(1959,
1979),
Wildavsky
(1966) e
Quinn
(1980).
Referências-chave
Abordagem
Linear,
Norma
tiva
Linear
quanto aos
Atores e
Agenda e
não linear
quanto à
dinâmica
política,
Descritiva
Alisson e
Zelikow
(1996),
Bachrach e
Baratz
(1962),
Dahl
(1958),
Lukes
(1980),
Mills
(1959),
Kingdon
(1984)
Não
linear,
Descritiv
a
Não
linear e
Construti
va
Não
linear e
Construti
va
Cohen,
March
e Olsen
(1972)
Weick
(1995)
Behn
(1988)
Fonte: Iizuka (2008, p. 75-76)
Sobre o processo decisório vale destacar ainda a classificação das
decisões através níveis, utilizada por diversos autores, que será
apresentada a seguir.
De acordo com Mélo, Vieira e Porto (2011) as decisões podem
ser estratégicas, táticas ou operacionais. As decisões estratégicas são
aquelas que determinam os objetivos da organização de forma ampla,
realizada pela alta cúpula diretiva, e envolve aspectos como o
planejamento estratégico e o relacionamento externo da organização. As
decisões táticas ou administrativas são realizadas em um nível abaixo
das decisões estratégicas, geralmente tomadas pela gerência
intermediária e objetivam o cumprimento das metas definidas nas
decisões estratégicas. As decisões operacionais são tomadas no nível
mais baixo da estrutura organicional e se referem ao curso das operações
rotineiras (MÉLO, VIEIRA e PORTO, 2011).
Tal nivelamento do âmbito e complexidade das decisões é
amplamente utilizado na literatura administrativa, expondo de forma
bastante burocrática e unidimensional o processo decisório. Alternativas
mais transversais de pensar o processo decisório são apresentadas
através do entendimento de processos decisórios participativos, que
90
convergem com o entendimento de gestão social, que pressupõe a
autoridade decisória compartilhada entre os participantes da ação
(TENÓRIO, 2008).
Apresentados os principais alicerces da base teórica, serão
dispostos a seguir os procedimentos metodológicos utilizados na
pesquisa.
91
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
De acordo com Roesch (1994), o intuito da metodologia é
descrever como o projeto será realizado, tendo como base os objetivos
da pesquisa, através do delineamento e detalhamento de um conjunto de
ações que permitam o alcance dos objetivos formulados de forma
efetiva.
Nesse âmbito, Richardson (2007, p. 22) alerta para a confusão
entre método e metodologia, pois para o autor “método é o caminho ou
maneira para chegar a determinado fim ou objetivo” enquanto a
metodologia “são os procedimentos e normas e regras utilizadas por
determinado método”, ou seja, “o método científico é o caminho da
ciência para se chegar a um objetivo. A metodologia são as regras
estabelecidas para o método científico, por exemplo: a necessidade de
observar, a necessidade de formular hipóteses, a elaboração de
instrumentos, etc”.
Demo (2011, p.26) salienta que “para que um discurso possa ser
reconhecido como científico precisa ser lógico, sistemático, coerente,
sobretudo bem argumentado” e destaca, a título de demarcação
científica, são critérios essenciais para garantia de cientificidade de um
trabalho acadêmicos: a coerência, ou seja, a “ausência de contradição no
texto”; a sistematicidade, “o esforço de dar conta do tema amplamente”;
a consistência, que refere-se a capacidade do texto de resistir à contraargumentação”; originalidade, em vista que a pesquisa apresenta alguma
inovação, ainda que em sentido reconstrutivo; a objetivação, que
diferentemente da objetividade, trata-se do “compromisso metodológico
de dar conta da realidade de maneira mais próxima possível” e; a
discutibilidade, que significa “a propriedade da coerência no
questionamento” (DEMO, 2011, p. 27-28).
Desnudado o entendimento sobre metodologia e critérios de
cientificidade de uma produção acadêmica, parte-se para o delineamento
dos procedimentos metodológicos que nortearão a presente proposta de
pesquisa.
3.1 Caracterização do estudo
Em vista da natureza da presente pesquisa, pode-se afirmar que a
abordagem mais adequada é a pesquisa aplicada, que segundo Vergara
(2007) é motivada pela necessidade de resolver problemas concretos,
92
tendo uma finalidade prática e ao contrário da pesquisa pura é originada
pela curiosidade prática do pesquisador. Em
perspectiva
socioeconômica, Godoy (1995a) comenta que nesse tipo de análise estão
envolvidas indagações na formulação de política, planejamento, ou
sentidos do mesmo teor. Na pesquisa em questão, as indagações
circundam o a participação dos sujeitos nos processo de tomada de
decisão nas organizações estudadas, com intuito de analisar tal processo
a luz da teoria da gestão social, através de categorias analíticas que serão
apresentadas na seção “categorias de análise”.
Quanto à abordagem do problema a ser trabalhado, pode-se
afirmar que a abordagem qualitativa apresenta-se como a mais
adequada, pois considera que há uma relação dinâmica entre o mundo
real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo
e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido em números
(SILVIA; MENEZES, 2001).
Minayo e Sanches (2003, p. 239-240) trabalham a abordagem
qualitativa “procurando enfocar, principalmente, o social como um
mundo de significados passível de investigação e a linguagem comum
ou a “fala” como a matéria-prima desta abordagem, a ser contrastada
com a prática dos sujeitos sociais”, pois tal abordagem trabalha com
valores, crenças, representações, hábitos, atitudes e opiniões. Por
abordar de forma intensa as relações sociais, “a abordagem qualitativa
só pode ser empregada para a compreensão de fenômenos específicos e
delimitáveis mais pelo seu grau de complexidade interna do que pela sua
expressão quantitativa”, adequando-se a estudo como de “um grupo de
pessoas afetadas por uma doença, ao estudo do desempenho de uma
instituição, ao estudo da configuração de um fenômeno ou processo”
(MINAYO; SANCHES, 1993, p. 245).
De maneira complementar, resgata-se o pensamento de Godoy
(1995a) sobre características básicas de uma pesquisa qualitativa, a
saber: a) ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador
como instrumento natural; b) caráter descritivo; c) o significado que as
pessoas dão aos elementos e à sua vida são a preocupação essencial do
investigador e; d) enfoque indutivo na análise de seus dados.
Gil (2007, p. 41-43) apresenta a classificação de uma pesquisa
quanto aos seus objetivos gerais, por meio de três grandes grupos: i)
exploratórias: “têm como objetivo principal o aprimoramento de ideias
ou a descoberta de intuições”; ii) explicativas: “têm como preocupação
central identificar fatores que determinam ou contribuem para a
93
ocorrência dos fenômenos” e; iii) descritivas: “têm como objetivo
primordial a descrição das características de determinada população ou
fenômeno ou, então, o estabelecimento de relação entre as variáveis”.
Mediante tal classificação, entende-se que a presente pesquisa como
predominantemente descritiva, que objetiva observar, registrar, analisar
e correlacionar fenômenos sem que ocorra a manipulação dos dados,
com o intuito de vislumbrar com maior precisão a natureza de
determinados fatos e sua relação com outros acontecimentos (CERVO,
BERVIAN e SILVA, 2007).
Segundo Roesch (1999), os estudos qualitativos podem ser
conduzidos através de, no mínimo, três tipos, bastante difundidos, são
eles: a pesquisa documental, o estudo de caso e etnografia. Neste
trabalho, será utilizada a perspectiva do estudo de caso, que segundo
Godoy (1995b), tem o intuito de analisar detalhadamente um
determinado ambiente, um sujeito ou uma situação específica.
De acordo com Yin (2010, p. 22) a escolha pelo estudo de caso,
normalmente acontece, quando: “a) as questões “como” e “porque” são
propostas; b) o investigador tem pouco controle sobre os eventos e; c) o
enfoque está sobre um fenômeno contemporâneo no contexto da vida
real”.
Vergara (2007, p.49) comenta que “estudo de caso é circunscrito
a uma ou poucas unidades, entendidas essas como pessoas, família,
produto, empresa, órgão publico, comunidade ou mesmo país. Tem
caráter de profundidade e detalhamento”. Segundo Yin (2010, p. 24) o
“estudo de caso permite que os investigadores retenham as
características holísticas e significativas de eventos da vida real”, dentro
os quais, o autor destaca o comportamento de pequenos grupos e
processos organizacionais e administrativos, que convergem com os
objetivos propostos nesta pesquisa.
Segundo Alves-Mazzotti (2006) os estudos de casos mais comuns
focalizam apenas uma unidade de análise (um indivíduo, um grupo, uma
instituição, um programa), porém, podem-se ter os estudos de casos
múltiplos, que focalizam mais de um objeto, nos quais dois ou mais
estudos são conduzidos simultaneamente (vários indivíduos, várias
instituições). O estudo de casos múltiplos converge com a proposta de
pesquisa, visto que serão analisadas duas organizações, originárias da
sociedade civil, em Florianópolis/SC, que desenvolvem atividades
voltadas à comunidade, descritas na seção a seguir.
94
3.2 Universo do estudo
De acordo com Richardson (2007, p. 157) o universo ou
população a ser estudada significa “um conjunto de elementos que
possuem determinadas características”.
Assim sendo, a escolha das organizações deu-se a partir dos
seguintes critérios: i) surgimento vinculado a iniciativas da sociedade
civil, através da mobilização social, tendo em vista os pressupostos da
perspectiva da gestão social aqui adotada como viés teórico, que
privilegia o protagonismo da sociedade civil perante o Estado e o
mercado; ii) apresentarem em sua origem traços inovadores quanto ao
enfrentamento de demandas sociais e; iii) organização dentro do mesmo
espaço territorial, tendo em vista a acessibilidade facilitada aos dados
dentro de um espaço de tempo delimitado e aproximações quanto ao
contexto socioeconômico do ambiente em que estão inseridas; iv)
apresentar certa permanência no tempo, tendo no mínimo cinco anos de
constituição formal.
Assim as organizações selecionadas foram: a Cooperativa Social
de Pais, Amigos e Portadores de Deficiência – COEPAD e
a Cooperativa de Mulheres Produtoras de Alimentos da Maricultura COLIMAR, sendo o universo do estudo, especificamente, os atores
sociais que compõem tais organizações.
3.3 Coleta de Dados
A maneira como um estudo é conduzido, em pesquisas
científicas, é delineado através da identificação dos procedimentos
metodológicos, sendo a coleta de dados a etapa que destaca a maneira
como os dados serão obtidos. Segundo Gil (1999, p.65) o “elemento
mais importante para a identificação de um delineamento é o
procedimento adotado para a coleta de dados”. Nesse sentido, a presente
pesquisa utilizará as seguintes técnicas: entrevistas semi-estruturadas,
pesquisa documental, pesquisa bibliográfica e observação não
participante.
Roesch (1999, p. 165) destaca que “uma das fontes mais
utilizadas em trabalhos de pesquisa em Administração, tanto de natureza
qualitativa quanto quantitativa, é constituída por documentos” e
apresenta alguns exemplos “como relatórios anuais da organização,
95
materiais utilizados em relações públicas, políticas de marketing e
recursos humanos, documentos legais, etc”.
Godoy (1995) configura a pesquisa documental como o resgate e
análise a escritos (jornais, revistas, diários), estatística (que produzem
registros ordenados) e, os elementos iconográficos (grafismo, filmes,
imagens, entre outros), sendo que tais documentos podem ser de ordem
primária, quando produzidos diretamente por pessoas presentes na
ocorrência do evento analisado ou secundária por pessoas que não
estavam presentes na ocasião da sua ocorrência.
De maneira complementar Richardson (2007, p.228) destaca a
observação documental “pode ser definida como a observação que têm
como objeto não os fenômenos sociais, quando e como se produzem,
mas as manifestações que registram estes fenômenos e as ideias
elaboradas a partir deles”.
Desta forma, documentos institucionais foram consultados, tais
como estatutos, manuais de procedimentos, atas de reuniões e
assembleias, código de direitos e deveres, entre outros, tendo em vista
apontamentos sobre a condução de reuniões, deliberações, formulação
de políticas, e melhor compreensão dos valores e crenças
organizacionais. Como fontes também foram utilizadas os portais
eletrônicos das organizações estudadas e produções audiovisuais
relacionadas às mesmas.
O segundo instrumento de coleta de dados se constitui em uma
pesquisa bibliográfica, que segundo Gil (2007, p. 45) é semelhante à
pesquisa documental, apresentando distinção fundamental quanto à
natureza das fontes de dados, pois “enquanto a pesquisa bibliográfica se
utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores sobre
determinados assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que
não recebem ainda um tratamento analítico”.
Vergara (2007) comenta que a pesquisa bibliográfica, é o estudo
sistematizado desenvolvido com base em materiais publicados como
livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, ou seja, material acessível a
todos. Segundo Gil (2007, p. 45) a vantagem principal da técnica “reside
no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de
fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar
diretamente”. Na presente pesquisa foram utilizados artigos e livros
recentes envolvendo a temática, em especial as pesquisas do Programa
de Estudos em Gestão Social (PEGS) e da Rede de Pesquisadores em
Gestão Social.
96
Sobre a entrevista, como instrumento de coleta de dados, Martins
(2006, p. 27) destaca que “seu objetivo básico é entender e compreender
o significado que os entrevistados atribuem a questões e situações, em
contexto que não foram estruturados anteriormente, com base nas
suposições e conjecturas do pesquisador”.
Nessa perspectiva, Richardson (2007, p. 207) afirma que em
situação que envolva indivíduos, é essencial a compreensão do que
acontece com o outro, desta forma, “a melhor situação para participar na
mente de outro ser humano é a interação face a face, pois tem caráter,
inquestionável, de proximidade entre as pessoas, que proporciona as
melhores possibilidades de penetrar na mente, vida e definição dos
indivíduos”, sendo tal interação essencial na pesquisa em Ciências
Sociais e a entrevista uma técnica importante no desenvolvimento da
relação interpessoal.
Segundo Boni e Quaresma (2005), as formas de entrevistas mais
utilizada nas Ciências Sociais são a entrevista estruturada, semiestruturada, aberta, entrevistas com grupos focais, história de vida e
também a entrevista projetiva. Na presente pesquisa, será feito uso da
entrevista semi-estruturada, na qual “o pesquisador deve seguir um
conjunto de questões previamente definidas, mas ele o faz em um
contexto muito semelhante ao de uma conversa informal” (BONI;
QUARESMA, p.75). Tendo em vista, a flexibilidade do instrumento ao
permitir que novos elementos possam surgir ao longo de seu
desenvolvimento, trazendo novas perspectivas à pesquisa.
O roteiro de perguntas foi elaborado a partir das categorias
analíticas, que estão dispostas na seção “categorias de análise” da
presente proposta de pesquisa.
Nas duas organizações foco do estudo, foram entrevistados
membros fundadores das organizações que ainda estavam em atividade,
integrantes do corpo administrativo, cooperados, funcionários e
voluntários que por indicação ou por observação da pesquisadora
apresentaram forte representação e até que novos elementos
diferenciados significativos deixaram de aparecer tendo em vista os
objetivos dos estudos e as categorias de análise, que serão apresentadas
a seguir. Desta forma, foram entrevistados todos os membros da
COLIMAR em atuação, que totalizam 6 (seis), incluindo a presidente e
demais cooperadas, e no caso da COEPAD foram realizadas 9 (nove)
entrevistas, abrangendo membros da diretoria (entrevistados 1, 4 e 5)
funcionários (entrevistados 2, 3 e 8), cooperados deficientes
97
(entrevistados 6 e 7) e seus pais (entrevistado 9). Destaca-se que
algumas entrevistas não seguiram o roteiro, disposto no apêndice A
como no caso dos deficientes intelectuais, pois julgou-se mais adequado
conduzir o diálogo de forma mais informal e adaptada ao entrevistado.
Por fim, foi utilizada a observação, como instrumento de coleta
de dados. Para Marconi e Lakatos (1999) a observação é uma técnica de
coleta de dados que objetiva a busca de informações e aproximação com
a realidade estudada, que pode ser caracterizada como uma observação
não participante, participante, individual, em equipe. Nessa pesquisa
optou-se pela realização de uma observação não participante. Segundo
Richardson (2007, p.260), “nesse tipo de observação o investigador não
toma parte nos conhecimentos objeto de estudo como se fosse membro
do grupo observado, mas atua como um espectador atento”, destacando
que “baseado nos objetivos da pesquisa, e por meio de seu roteiro de
observação, ele procura ver e registrar o máximo de ocorrências que
interessa ao seu trabalho”.
De acordo com Martins (2006, p.25) “o papel do observador pode
ser tanto formal como informal, encoberto ou revelado, pode ser parte
integrante do grupo social ou simplesmente periférico em relação a ele”.
Nessa pesquisa a observação foi revelada com o acompanhamento da
pesquisadora no grupo social, atuando dentro das organizações em dias
e horários intercalados, durante dois meses (novembro e dezembro), nos
diferentes grupos e divisões das organizações. O roteiro de observação,
disposto no apêndice B, foi norteado pelas categorias analíticas, que
estão dispostas na seção “categorias de análise” da presente proposta de
pesquisa.
3.4 Categorias de análise
No entendimento de gestão social utilizado como viés teórico
desta pesquisa, a cidadania deliberativa se configura como uma
alternativa democrática, transversal nas relações que a sociedade
estabelece com os demais atores socais, assim como orientadora maior
dos processos de gestão. Nesse sentido, Tenório et al. (2008) destacam a
necessidade do desenvolvimento de critérios de avaliação para processos
decisórios deliberativos como vinculada ao Programa de Estudos em
Gestão Social, no qual os autores estão vinculados, assim como a autora
deste projeto de pesquisa.
98
Perante tal desafio, Tenório et al. (2008) desenvolveram com
base nos princípios fundamentais da cidadania deliberativa, que tangem
a inclusão, pluralismo, igualdade participativa, autonomia e o bem
comum, critérios para avaliação de processos decisórios deliberativos.
Tais categorias foram utilizadas em trabalhos anteriores para a análise
de processos decisórios participativos de políticas públicas, programas
de governo, em especial na análise do Programa Territórios da
Cidadania, e para análise de arranjos produtivos locais (APL’s),
apresentando resultados distintos em cada situação estudada. Acredita-se
ser esta a primeira utilização dos critérios em âmbito de organizações
construídas coletivamente pela sociedade civil.
Com base nesta construção categórica serão resgatadas e
adaptadas três categorias de análise que servirão de base para a
compreensão dos processos decisórios nas organizações a serem
estudadas, a saber: processos de discussão, inclusão, igualdade
participativa e autonomia, que serão detalhadas individualmente a
seguir, conforme descrição de Tenório et al. (2008).
A categoria “processo de discussão” será analisada a partir dos
seguintes critérios: canais de difusão, qualidade da informação e
pluralidade do grupo promotor, conforme quadro a seguir.
Quadro 11: Categoria: processo de discussão
CATEGORIA
CRITÉRIOS
Canais de difusão
Processo de discussão
Qualidade da informação
Pluralidade do grupo promotor
Fonte: Adaptado Tenório et. al (2008).
Nesta categoria, a preocupação está voltada para igualdade de
direitos, caracterizada por um espaço intersubjetivo e comunicativo o
qual possibilite o entendimento dos atores envolvidos.
Tal categoria desdobra-se em critérios que abrangem,
primeiramente os “canais de difusão”, que pressupõe a existência e
utilização de canais adequados e que garantam o acesso à informação
para a mobilização dos potenciais participantes, pois para “o
desenvolvimento da participação faz-se necessária a fluência das
99
informações nos diferentes âmbitos participativos” (TENÓRIO et al.,
2008, p.10).
A “qualidade da informação” é o segundo critério, tendo em vista
a clareza, utilidade e pluralidade das informações, explicitando os
objetivos do processo para que os participantes potenciais se envolvam
nos processos de discussão (TENÓRIO et al., 2008).
A “pluralidade do grupo promotor” envolve o compartilhamento
da liderança, ou seja, a capacidade do grupo promotor em compartilhar
os processos de discussão e de responsabilidades facilita o envolvimento
dos diversos atores envolvidos na discussão e a pluralidade dos atores
que promovem as discussões e atividades nas organizações (TENÓRIO
et al., 2008, p.10).
A categoria “inclusão” será analisada a partir dos seguintes
critérios: abertura dos espaços de decisão, aceitação social, política e
técnica e valorização cidadã, conforme quadro a seguir.
Quadro 12: Categoria: inclusão
CATEGORIA
CRITÉRIOS
Abertura dos espaços de decisão
Inclusão
Aceitação social
Valorização cidadã
Fonte: Adaptado Tenório et. al (2008).
No que tange a inclusão considera-se que “o poder ilegítimo, que
não representa o processo democrático, pode tomar espaços e assim
favorecer a tendências endógenas do poder administrativo existente” e
representa como categoria, a capacidade dos atores de estarem inseridos
nos espaços decisórios (TENÓRIO et al., 2008, p.12).
Por “abertura dos espaços de decisão” entende-se a existência de
processos e espaços que permitam a maior articulação de interesses dos
indivíduos ou grupos que compõem a organização e que favoreçam a
negociação de conflitos, capazes de possibilitar “uma chance igual a
todos, e consequentemente uma melhora progressiva, contínua e durável
das condições de participação nas tomadas de decisões” (TENÓRIO et
al., 2008, p. 10).
100
O critério “aceitação social”, representa o “reconhecimento pelos
atores da necessidade de uma metodologia participativa” nos processos
de tomada de decisão, em diferentes âmbitos (TENÓRIO et al., 2008,
p.10).
Tendo em vista que as formas de inclusão e de participação
devem, primordialmente, valorizar a cidadania, tem-se o critério
“valorização cidadã”, que considera o quanto a necessidade de
participação e suas implicações são valorizadas pelos próprios cidadãos.
Considera-se que quanto maior for esta consciência, maior tende a ser a
efetiva participação (TENÓRIO et al., 2008).
O critério “igualdade participativa” sugere o “nivelamento das
oportunidades de atuação efetiva nos processos de tomada de decisão”,
pois “dotados de informação e com acesso livre aos canais de
deliberação, qualquer indivíduo (cidadão) ou organização é passível de
influenciar as decisões tomadas via processo deliberativo”. Desta forma,
discute-se a forma de escolha dos dirigentes e seus respectivos
discursos, assim como a avaliação participativa dos atores nos processos
de tomada de decisão, conforme quadro a seguir (TENÓRIO et al.,
2008, p.13).
Quadro 13: Categoria: igualdade participativa
CATEGORIA
CRITÉRIOS
Forma de escolha dos dirigentes
Igualdade participativa
Discursos dos dirigentes
Avaliação participativa
Fonte: Adaptado Tenório et. al (2008).
Sobre a “forma de escolha dos dirigentes”, procura-se analisar os
métodos utilizados na escolha dos representantes da organização e sobre
a legitimidade dos mesmos perante os membros das organizações
(TENÓRIO et al., 2008).
No critério “discurso dos dirigentes” procurou-se identificar a
valorização da participação pelos representantes em seus discursos,
sendo necessário “considerar em que medida se percebe que a
participação é evidenciada como importante no discurso dos
representantes”, com foco na estruturação, disseminação e impacto dos
101
discursos exercidos por representantes de diversos grupos durante o
processo de deliberação (TENÓRIO et al., 2008, p.10).
Busca-se identificar através do critério “avaliação participativa”,
as intervenções dos participantes no acompanhamento e avaliação nos
processos de tomada de decisão, “dando a oportunidade aos
participantes de exercer a autocrítica, qualificar as implicações dentro do
processo” (TENÓRIO et al., 2008, p.13).
A quarta e última categoria, “autonomia”, significa, em linhas
gerais, a “apropriação indistinta do poder decisório pelos diferentes
atores”, implicando no direito de escolha e aceitação ou não das
condições vigentes (TENÓRIO et al., 2008, p.11). Tal categoria
desdobra-se nos critérios de alçada dos atores, perfil da liderança e
possibilidade de exercer a própria vontade, conforme descrito no quadro
a seguir.
Quadro 14: Categoria: autonomia.
CATEGORIA
CRITÉRIOS
Alçada dos atores
Perfil da liderança
Autonomia
Possibilidade de exercer a própria vontade
Fonte: Adaptado Tenório et. al (2008).
O critério que tange a “alçada dos atores” visa verifica com que
intensidade os atores organizacionais podem intervir nas problemáticas
discutidas dentro das organizações (TENÓRIO et al., 2008).
O “perfil de liderança” foi analisado tendo em vista as
“características da liderança em relação à condução descentralizadora do
processo de deliberação e de execução” (TENÓRIO et al., 2008, p.11),
tendo em vista que a “liderança deve ser capaz de mobilizar os poderes e
atores, porém, não de forma autoritária, pois os objetivos do grupo são
anteriormente discutidos” (TENÓRIO et al., 2008, p.14).
O último critério desta categoria destaca a “possibilidade de
exercer a própria vontade”, analisar a configuração do exercício das
vontades individuais e a existência de instituições, normas e
procedimentos que permitam o exercício da vontade individual ou
102
coletiva dos diferentes atores sociais dentro da organização (TENÓRIO
et al., 2008).
3.5 Análise de dados
O tratamento destinado material coletado foi feito, inicialmente,
mediante transcrição literal das entrevistas, que foram registradas
através de um gravador de voz, de maneira a garantir a fidelidade das
informações. Os dados coletados por meio de observação não
participante foram contextualizados e registrados em arquivo digital
logo após sua ocorrência, visando garantir maior integridade das
informações e a temporalidade das ocorrências. Os materiais
bibliográficos e documentais coletados foram organizados em programa
de gerenciador de arquivos digitais, caso estejam em formato pertinente
ou quando impressos, analisados e registrados aspectos relevantes dos
mesmos em arquivos digitais.
Análise do material se deu mediante a técnica de análise de
conteúdo e análise de documental. Bardin (2004) apresenta
diferenciações fundamentais entre as suas perspectivas, visto que a
análise de documental trabalha com documentos e objetiva a
representação condensada da informação para consulta e armazenagem
em vista da determinação fiel dos fenômenos sociais (RICHARDSON,
2007), enquanto a análise de conteúdo trabalha com mensagens
(comunicações) e a manipulação de mensagens (conteúdo e expressão
desse conteúdo) e verifica indicadores que permitam inferir sobre uma
realidade diferente daquela evidenciada na mensagem.
Segundo Martins (2006), a análise de conteúdo é adequada para
analisar a comunicação de maneira objetiva, através da busca de
inferências confiáveis de dados com respeito a determinado contexto, a
partir de discursos orais de seus atores e materiais textuais.
Sobre tal técnica, Bardin (2004) destaca três etapas fundamentais,
a saber: a pré-análise, a descrição analítica e o tratamento dos
resultados. Sobre a primeira etapa Richarson (2007, p. 231) salienta que
ela “visa operacionalizar e sistematizar as ideias, elaborando um bom
esquema preciso de desenvolvimento do trabalho”, e em perspectiva
qualitativa, Dellagnelo e Silva (2005) destacam a flexibilidade, desta
etapa, em atividades como a escolha dos documentos, a formulação dos
objetivos, a referenciação de índices, a elaboração de indicadores e a
preparação do material.
103
A etapa seguinte corresponde à descrição analítica, que “consiste
basicamente na codificação, categorização e quantificação da
informação” (RICHARDSON, 2007, p. 233). A codificação refere-se a
uma unidade de registro (palavra, tema, objeto, entre outros) e de
contexto (utilizada para codificar uma unidade de registro, trata-se de
uma unidade de compreensão), regras de quantificação ou de
enumeração, em estudos quantitativos o cálculo da frequência é bastante
utilizado, já em perspectivas qualitativas, pode-se usar atributos como
intensidade e direção e, a categorização deve atentar para características
com: exaustividade, exclusividade, concretude, homogeneidade,
objetividade e fidelidade, sendo a análise temática a mais utilizada
(DELLAGNELO e SILVA, 2005).
Desta forma, na presente pesquisa, a análise dos dados foi
realizada mediante categorias de análise pré-estabelecidas, a saber:
processos de discussão, inclusão, igualdade participativa e autonomia e,
através do confronto entre o entendimento de gestão social e as práticas
observadas nas organizações focadas na pesquisa. E como sugerem
Dellagnelo e Silva (2005) para enfoques qualitativos, foi utilizada um
escala de intensidade, para aproximação de cada critério e suas
respectivas categorias de análise, aos pressupostos de gestão social em
contraponto com a gestão estratégica, tendo o em vista o seguinte
entendimento de Tenório (2008a, p.25-26) ao destacar que “gestão
social contrapõe-se a gestão estratégica à medida que tenta substituir a
gestão tecnoburocrática, monológica, por um gerenciamento mais
participativo, dialógico, no qual o processo decisório é exercido por
meio de diferentes sujeitos sociais”.
A escala utilizada para mensuração das intensidades está disposta
na tabela a seguir:
104
Tabela 1: Escala de intensidades para avaliação de categorias de análise da
pesquisa
Escala
Correspondência
5
Aproximação alta com os pressupostos da gestão social.
4
Aproximação média com os pressupostos da gestão social.
3
Aproximação da gestão social e gestão estratégica em mesma
intensidade.
2
Aproximação média com os pressupostos da gestão estratégica.
1
Aproximação alta com os pressupostos da gestão estratégica.
Fonte: Elaboração própria
Destaca-se que a palavra “média”, aqui utilizada, não tem
conotação estatística, e sim, refere-se a um “meio termo”, ou seja, uma
aposição entre uma aproximação “alta” e uma aproximação “alta” dos
pressupostos trabalhados.
A última etapa relaciona-se ao tratamento dos resultados, onde
são realizadas inferências e a interpretação dos dados (GIL, 2007), é o
momento no qual reflexões são propostas, contradições constatadas e a
compreensão dos fenômenos é desenvolvida (DELLAGNELO e
SILVA, 2005).
3.6 Limitações do trabalho
A pesquisa encontrou limitações proporcionadas pelas
demarcações realizadas a fim de tornar o estudo viável, que limitaram o
estudo das categorias de análise aos critérios pré-estabelecidos, ainda
que outras variáveis apresentassem potencial de contribuir para
compreensão mais ampla e aprofundada dos fenômenos estudados.
105
4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
Neste capítulo os dados coletados serão descritos e analisados de
forma sequencial, apresentando, primeiramente, a caracterização da
organização e, em seguida, as categorias de análise subdivididas em
tópicos, assim como os critérios que a compõem, obedecendo a seguinte
ordem: 1) processo de discussão; 2) inclusão; 3) igualdade participativa
e; 4) autonomia.
O primeiro caso exposto é o da Cooperativa Social de Pais e
Amigos dos Portadores de Deficiência (COEPAD) e, posteriormente,
será apresentado o caso da Cooperativa de Mulheres Maricultoras de
Governador Celso Ramos (COLIMAR).
4.1 CASO 1: Cooperativa Social de Pais e Amigos dos Deficientes
4.1.1 Caracterização da Cooperativa de Pais, Amigos e Portadores de
Deficiência – COEPAD
A Cooperativa de Pais, Amigos e Portadores de Deficiência –
COEPAD é uma entidade social, que objetiva proporcionar capacitação
e trabalho as pessoas com deficiência intelectual, contribuindo para o
resgate de sua autoestima e o exercício de sua cidadania, com a
colaboração dos associados, instrutores, monitores de trabalho e demais
colaboradores (COEPAD, 2012).
A iniciativa surgiu no ano de 1998, após a dissolução de classes
especiais em um colégio da região, conforme relato do entrevistado 1:
Quando chegou a época braba (sic) da inclusão,
o governo queria incluir de qualquer jeito, não
dava recurso, mas interferia, aí o colégio chamou
os pais dos alunos daquele grupo, e falou o
seguinte: esse é o último ano que nós vamos
trabalhar com esse grupo, nós vamos continuar
com a inclusão, mas vamos incluir lá no início do
colégio, os novos. Vocês tem um ano pra tomar
uma decisão, tomar um caminho para seus filhos.
De acordo com o entrevistado 1, várias alternativas foram
cogitadas, porém, como tratava-se de deficientes intelectuais adultos, o
trabalho surgiu como melhor alternativa de inclusão:
106
Começamos a discutir: vamos fazer outra escola?
Não tem sentido. Voltar para a APAE? Ela não se
encaixava mais para elas. Ir pra Fundação
Catarinense? Também não. Já estavam todos
adultos, com 18, 20 anos, quem se alfabetizou,
alfabetizou, quem não alfabetizou até essa época,
agora depois de tantos anos não ia se alfabetizar
mais, podia melhorar alguma coisa, mas não
alfabetizar. Então vamos fazer alguma coisa
pensando no trabalho. Vamos tentar incluí-los no
trabalho. Para poder se tornar cidadão. Cidadão
com seus diretos e suas obrigações. Tentar ver
como eles podiam trabalhar.
A partir de então, reuniões frequentes passaram a ser realizadas,
com a participação de cerca de 30 pais, com caráter bastante
deliberativo, “nós fizemos tudo em coletividade, conversando,
discutindo, nós tivemos um ano todo de preparação, nós fizemos o
seguinte, no próprio colégio a gente fez muitas reuniões de pais, a gente
começou a discutir o que fazer até que se chegou à conclusão que seria
uma cooperativa” (ENTREVISTADO 2).
Segundo um dos fundadores da cooperativa a falta de recursos e
conhecimento no segmento foi o desafio inicial “nós não tínhamos
nada, não tinha dinheiro, não tinha vivência nenhuma, nem experiência
nesse sentido de cooperativa” (ENTREVISTADO 1). Para superar essa
dificuldade, cerca de trinta pais dividiram-se em três grupos em busca e
soluções, “um grupo foi estudar como fazer o estatuto, outro grupo foi
procurar local onde poderia instalar e um terceiro grupo foi levantar o
que poderia ser feito como produto da cooperativa, já que tínhamos
definido que seria cooperativa de produção” (ENTREVISTADO 2).
Após o levantamento das possibilidades decidiu-se por produtos
que tivessem como base o papel reciclado, como relata o entrevistado “a
gente trabalhou muito, fazia reunião de 15 em 15 dias, quando chegou
no final nos listamos 50 produtos que poderíamos fazer, e depois foi por
eliminação, a gente discutiu e ficaram em 5, que é o papel reciclado e
que hoje é nossa matéria prima para quase todos os nossos produtos
(ENTREVISTADO 1).
Após um ano de reuniões e busca de recursos a Fundação Vidal
Ramos, entidade filantrópica sediada em Florianópolis/SC, cedeu cerca
de 150m² de área física para instalação do projeto. No local foi instalada
107
a primeira oficina, para fabricação de papel artesanal, reciclando papel
doado pela comunidade e em seguida a confecção de produtos com o
material reciclado, “papel, vamos fazer papel. Vamos arrecadar com a
comunidade. A gente movimentou muito a comunidade ali em torno
da gente. A gente tomou como hábito, como definição, o seguinte: nós
vamos trabalhar na área ecológica, tentar fazer o máximo possível
dentro da área ecológica” (ENTREVISTADO 2).
Além da preocupação ecológica, a qualidade dos produtos e
superação do caráter assistencialista na comercialização sempre foi
preocupação:
Nós não queríamos produzir alguma coisa e que
as pessoas comprassem, adquirissem por pena,
“ah, é feito por deficiente, eu compro e depois na
primeira lata de lixo jogo fora”. Esse lado das
pessoas terem pena é difícil de tirar, mas que
comprem um produto que possam usar, que seja
útil. Foi uma das coisas que a gente primou
(ENTREVISTADO 1).
Em 1999, o grupo buscou auxílio na Organização das
Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC), que orientou a
formação da Cooperativa Social de Pais, Amigos e Portadores de
Deficiência - COEPAD, fundada no dia 16 de novembro de 1999, sendo
a primeira cooperativa para portadores de deficiência do Brasil.
A entidade tem como princípio a importância do direito de ser e
estar feliz, aprender, produzir e fazer parte da sociedade. A sociedade
Vida e Movimento, uma entidade sem fins-lucrativos e filantrópica
incorporou legalmente a Cooperativa, sendo a proprietária do imóvel e
do projeto da cooperativa, “foi feito um convênio de parceria com a
cooperativa por 20 anos, renovável mais 20, mas a diretoria somos nós
mesmos, quer dizer, é tudo nosso” (ENTREVISTADO 1).
A associação iniciou suas atividades com vinte trabalhadores com
deficiência intelectual e atualmente atuam quarenta. Os cooperados são
divididos em duas categorias: 1) portadores de deficiência intelectual,
participantes das oficinas de trabalho e das demais atividades da
Cooperativa; 2) os pais e amigos dos portadores de deficiência
intelectual; 3) voluntários, que em dias alternados, auxiliam nas
atividades rotineiras e funcionários contratados da área administrativa e
coordenadores de oficinas (ESTATUTO SOCIAL).
108
Os pertencentes à primeira categoria, que considerados
incapazes perante a legislação são representados por pais, tutor ou
responsável.
A produção da cooperativa é dividida em três oficinas,
a de produção de papel, a oficina de cartonagem e a oficina de
serigrafia, todas formadas por deficientes e voluntários e coordenadas
por um funcionário da cooperativa. Quase todo o trabalho produtivo é
realizado pelos cooperados, apenas alguns processos de cortes, que
oferecem riscos são terceirizados e a parte de costura dos produtos, que
vem sendo realizada através de uma parceria com uma associação de
mulheres de pescadores em Biguaçu/SC, porém para atender o aumento
da demanda uma oficina de costura está sendo desenvolvida.
Eles desenvolvem trabalhos de reciclagem de papel, confecção
de brindes e materiais institucionais (agendas, blocos, envelopes) e
personalização de produtos através da serigrafia, bolsas retornáveis,
tendo como premissa a preservação do meio-ambiente e o uso de
materiais não poluentes, como por exemplo, a produção do “papel
semente”, que depois de usado, pode ser jogado na terra, como forma de
plantar a semente. Anualmente é realizado um concurso na cooperativa
que seleciona alguns desenhos feitos pelos deficientes para estampar os
cartões de natal produzidos.
Figura 02: Produtos COEPAD
Fonte: COEPAD (2012)
Os produtos que inicialmente eram vendidos apenas mediante
contato direto com empresas, atualmente são comercializados em uma
loja no Centro de Eventos da Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC) e através de uma vendedora da Cooperativa. Um estudo recente
109
realizado com os docentes da UFSC demonstrou que 86% dos
professores desconhecem a existência da COEPAD dentro da
Universidade e 95% não sabem que os canudos nos quais os diplomas
de formatura são colocados e oferecidos aos alunos na solenidade de
colação de grau são confeccionados pela COEPAD, demonstrando a
pouca visibilidade da cooperativa e de sua parceria com a UFSC em
âmbito institucional (BARBOSA, 2012).
Figura 03: Espaço de comercialização da COEPAD no Centro de Eventos da
UFSC.
Fonte: COEPAD (2012)
A entidade se mantém com o retorno obtido na venda de seus
produtos, “nós vivemos do que fazemos, não temos ajuda de ninguém, o
governo não põe dinheiro aqui, e a gente nem quer muito, porque o
governo para pôr dinheiro ele quer mandar, e a gente perde o controle”
(ENTREVISTADO 1). O entrevistado destaca ainda que o apoio maior
vem de empresas “para o governo pedimos uma coisa ou outra, mas a
maioria são para empresas”. Os equipamentos adquiridos pela
Cooperativa foram viabilizados mediante realização de projetos junto às
110
empresas, “todos os equipamentos que temos aqui foram adquiridos
através de projetos” (ENTREVISTADO 1).
O lucro obtido é destinado parcialmente à melhoria da
Cooperativa e parte para dividendos dos cooperados deficientes.
Segundo o entrevistado 3 a renda é simbólica “eles ganham, por mês,
150 reais. Nós não podemos pagar mais do que isso. Cada um ganha
esse dinheiro como forma de ajuda”, porém bastante significativa “eles
ganham esses 150 reais e ficam felizes da vida, se sentem mais gente”.
Alguns deficientes são contratados de empresas privadas e cedidos para
a cooperativa, pois, segundo relatos, muitas empresas não tem alocação
para pessoas com deficiência em suas atividades ou ainda preferem não
tê-las em suas atividades, porém precisam cumprir as disposições legais,
que exigem que determinado percentual do quadro de trabalhadores seja
composto por deficientes.
Relatou-se que mais importante que o dinheiro recebido pelos
cooperados, a busca pela independência dos mesmos é um trabalho
especial realizados na cooperativa, “nós fizemos nesses anos todos, um
trabalho especial que é o seguinte: nós falamos para as famílias “vocês
querem um filho independente? “Então vamos torná-los
independentes’” (ENTREVISTADO 1). Para tanto, a cooperativa
incentiva que eles aprendam a ir trabalhar sozinhos, peguem ônibus,
levem o próprio lanche, “não somos paternalistas mesmo, a gente não
quer dar isso, dar aquilo, aquele assistencialismo, a gente quer que eles
aprendam, que tenham mais autonomia” (ENTREVISTADO 1).
O presidente ressalta a dificuldade em ter o entendimento dos
pais quanto à proposta, “foi mais difícil convencer os pais do que a
gurizada. Porque os pais, a tendência natural é proteger, o filho é
deficiente então vou proteger. Esse novo trabalho visa, primeiro,
incluir, colocar o deficiente no trabalho, aqui é um local de trabalho;
segundo, gerar independência em cada um, e; terceiro, desenvolver o
trabalho na linha ecológica” (ENTREVISTADO 1).
Outro desafio foi superar a ideia assistencialista que, comumente,
se tem das atividades desenvolvidas por deficientes “nós começamos a
colocar na cabeça das pessoas, dos pais principalmente, que isso aqui
não é uma escola, não é coisa de assistência social, é uma empresa. A
cooperativa como empresa, tem direitos e obrigações. Tem que chegar
no horário certo, assinar o ponto e tem que vir trabalhar”
(ENTREVISTADO 2), destacando-se que apenas as pessoas que
apresentam condições de trabalho podem se integrar a cooperativa, “só
111
vem pra cá aquele que trabalha, tem muitos pais que vem aqui “ah
quero botar meu filho”, aqui não é depósito, nem escola, se ele não tem
condições de trabalho ou não quer, vai para a APAE, que tem
programas para isso, nós não temos, nosso programa é trabalho”
(ENTREVISTADO 1).
A experiência na realização das atividades de produção e a
educação formal não são exigências para ser cooperado, desde que tenha
condições de trabalho, conforme relata o entrevistado 2 “ele (deficiente
intelectual) pode não saber muita coisa, não precisa saber ler, nada
disso, se tiver condições de trabalho a gente trabalha com eles,
promove, ensina (...) se ele só rasga papel, e tem condições de fazer,
então ele pode ficar”.
O aceite de voluntários é realizado mediante algumas exigências,
que tangem principalmente o comprometimento com a organização e
com o trabalho a ser realizado. Para isso, os voluntários precisam
preencher uma ficha informando a disponibilidade de horários e fixando
ao menos um dia da semana, o período (manhã ou tarde) em que vão
trabalhar e a oficina que desejam atuar. Segundo o entrevistado 1, as
exigências visam garantir que o voluntariado não seja encarado de forma
descompromissada e atendendo a interesses pessoais “a gente abre, mas
nós somos exigentes, porque se não vira um lugar de madame vir, e
aqui não é lugar de madame vir passear ou se expor, para dizer que
trabalha aqui e aparecer no jornal” .
Ressaltou-se nas entrevistas a dificuldade de inserção dos
deficientes ao mercado de trabalho, devido à falta de adaptação de
estruturas, pessoas e processos as necessidades dos mesmos. Segundo
relatos, as exigências legais estão à frente da realidade das empresas,
criaram-se leis sem que houvesse mudanças nas estruturas e relações de
trabalho, conforme pode-se observar nas falas do entrevistado 4,
“fizeram uma lei, mas não adianta empurrar eles para o mercado, eles
acabam ficando isolados, não se socializam, e isso é importante para
eles”, e do entrevistado 2:
Aqui tem uma estrutura que se adapta a eles, no
mercado lá fora as pessoas não estão
preocupadas e não estão preparadas, por isso que
eu digo, isso de colocar eles no mercado tudo
bem, mas precisa de uma estrutura, uma
preparação, conscientização, a não ser que em
cada local tivesse uma pessoa preparada para
112
trabalhar com eles, porque precisa ter paciência,
eles tem limites.
O entrevistado 3, salienta a importância da criação de ambientes
de trabalhos para os deficientes “o governo deveria ir além das leis,
deveria criar alternativas de trabalho para eles, de preparação e não só
essas Apaes, tem pessoas que nem precisariam ir para lá”.
O diálogo com os deficientes intelectuais, que já atuaram em
outras organizações, corroborou as informações sobre as dificuldades
enfrentadas, conforme relatou o entrevistado 6, “eu já trabalhei no
mercado X (rede de supermercados da grande Florianópolis), mas eu
não gostei e voltei pra cá (COEPAD) (...), lá eles não tratavam a gente
igual aqui”, os entrevistados 7 e 8, respectivamente, relataram suas
experiências, “aqui a gente tem amigo, todo mundo conversa, e lá não
tem nada disso”, “eu tinha carteira assinada, mas aqui eu gosto mais,
porque tem amigos”.
Um aspecto marcante na cooperativa é a importância que os
deficientes dão ao coral formado por eles, em diversos momentos
durante a observação, o assunto do coral foi tratado com grande
entusiasmo e extrema alegria, sendo a pesquisadora convidada para
assistir aos ensaios e a apresentação realizada em um evento da
cooperativa, “você vai ver o nosso ensaio, né? Vai ver como é lindo
(ENTREVISTADO 7)”. De acordo com a organizadora do coral ele
apresenta resultados bastante positivos:
Para eles é uma realização incrível, saber que
eles podem cantar, serem aplaudidos, ajuda na
autoestima, no bem estar deles e tem outra coisa,
na responsabilidade, de ter que ensaiar em casa
as músicas, de ter que combinar com o amigo de
ensaiar para a apresentação em dupla, é uma
forma de aprendizado e crescimento também
(ENTREVISTADO 3).
O lazer também é valorizado na organização, todas as sextasfeiras não há expediente para os deficientes, que realizam atividades
esportivas, através de uma parceria firmada com o institudo Guga
Kuerten, que promove as atividades e disponibilizam espaço físico para
a sua realização. A atividade também é vista com grande apreço pelos
deficientes.
113
A entidade possui também parcerias com empresas privadas,
fundações e instituições públicas, como a Fundação Banco do Brasil, a
rede Angeloni, a Universidade do Vale do Itajaí, Petrobrás, dentre
outras. Além da parceria com a UFSC (com a cessão do espaço para a
loja da COEPAD), que pretende ser ampliada através da integração
entre os alunos e a cooperativa,“nós fizemos um projeto e mandamos
pra UFSC para fazer parcerias com os cursos, psicologia, educação
física, com os cursos relacionados com as nossas necessidades aqui,
poderíamos fazer projetos, estágios com a gente, essas coisas, mas
ainda não saiu”. O projeto foi enviado a mais de um ano, sem avanços
em sua concretização (ENTREVISTADO 1). A seguir será apresentada
a descrição e análise dos dados com base nas categorias: processo de
discussão, inclusão, igualdade participativa e autonomia.
4. 1. 2 Descrição e análise dos resultados com base nas categorias
4.1.2.1 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 1: Processo de
discussão
Para análise desta
características deliberativas
primeiramente, os critérios
difusão; 2) qualidade da
promotor.
categoria, que visão compreender as
dos processos decisórios, serão analisados,
a ela relacionados, a saber: 1) canais de
informação e; 3) pluralidade do grupo
4.1.2.1.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Canais de
difusão
Os canais de difusão da informação visualizados na cooperativa
estão voltados mais à comunicação oral. Durante as observações
realizadas verificou-se que as informações são disseminadas,
predominantemente, através do diálogo informal entre seus membros e
através de reuniões programadas (ver figura 08) e as solicitadas pelos
cooperados, principalmente os membros da administração e os
coordenadores de oficinas. Para os pais, representantes legais dos
cooperados deficientes, que não participam da cooperativa e não
comparecem às reuniões, o informes são enviados de forma escrita,
através de comunicados. O uso de correspondências eletrônicas não é
realizado, pois segundo o entrevistado 1 “não fizemos por e-mail porque
114
a grande maioria do nosso pessoal não tem e-mail, não adianta, as
pessoas são pessoas simples, a metade pelo menos são simples, a gente
faz por correspondência mesmo, faz comunicado e cada um leva seu
comunicado para casa, funciona melhor”.
São utilizados murais dispostos nos corredores da cooperativa,
um deles destinado a informes de sobre a programação das reuniões e a
organização da produção (informações sobre os pedidos, sequência da
produção, prazos), outro apresenta reportagens realizadas com a
cooperativa e um terceiro, chamado de “nossas reflexões”, apresenta
como a cooperativa é constituída, alguns de seus valores, dentre outras
coisas, conforme é possível verificar nas imagens a seguir:
Figura 04: Mural COEPAD
Fonte: Foto tirada pela autora.
115
Figura 05: Mural COEPAD
Fonte: Foto tirada pela autora.
Figura 06: Mural COEPAD
Fonte: Foto tirada pela autora.
116
Figura 07: Mural de produção COEPAD
Fonte: Foto tirada pela autora.
Nesta última figura apresentada, fez-se uma reprodução da
programação da cooperativa para conhecimento de como as informações
são dispostas, conforme figura 08.
117

PROGRAMAÇÃO COEPAD/VIDA E MOVIMENTO – 2011
 REUNIÃO DE PRODUÇÃO: em todo o pedido de confecção de
produtos, Guilherme e Carlos devem se reunir com os Coordenadores de
Oficina s para distribuição dos serviços.
 REUNIÃO DA DIRETORIA: quinzenal, duas
preferencialmente às quartas, com início às 19:30.
reuniões
mensais,
 REUNIÃO COM OS PAIS: trimestral, as quartas à noite.
 REUNIÃO COM OS VOLUNTÁRIOS: trimestral, as quintas à tarde.
 REUNIÃO COM OS COORDENADORES DAS OFICINAS: bimestral,
às sextas à tarde.
 PEDIDO DE MATERIAL/EQUIPAMENTO: a ser feito pelos
Coordenadores das Oficinas, duas vezes por mês, sempre nas 1° e 3°
segunda-feira de cada mês.
 AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO: semestral.
 TARDE DE INTEGRAÇÃO (IGK): toda sexta.
 COMEMORAÇÃO DE ANIVERSÁRIOS DOS COOPERADOS:
última sexta do mês (pela manhã)
última quinta do mês (à tarde)
MARÇO
04 (sexta, à tarde) - Reunião da diretoria com os Coordenadores das
Oficinas.
30 (quarta, à noite) – Assembleia Geral da COEPAD.
31 (quinta, à tarde) – Reunião de diretoria com os Voluntários.
Figura 08: Programação COEPAD.
Fonte: Reprodução de foto tirada pela autora.
Um aspecto interessante remete-se a figura do presidente da
cooperativa, que é considerado como um “veículo de comunicação”,
pois diariamente, ao chegar à cooperativa percorre, inicialmente, a área
administrativa, onde é informado sobre as atividades e alguns
informativos que precisam ser repassados, sobre os mais diversos
assuntos, e a seguir percorre todas as oficinas de trabalho, nas quais
conversa com os grupos de trabalho, coordenadores, e demais
funcionários e voluntários que encontra no caminho, fazendo com que a
informação flua em diferentes âmbitos, como é possível verificar na fala
com o entrevistado 3:
118
Ele sempre ao chegar, conversa com todo mundo,
passa em cada oficina, dá bom dia, pergunta se
está tudo bem, conversa, então ele acaba se
tornando um porta-voz entre a gente, o que
aconteceu na reunião, o que a gente está
planejando fazer, se tem algo para organizar,
enfim, e ele é uma pessoa muito transparente,
muito clara.
A transparência é apontada por Castellà e Parés (2012) como
essencial para que os participantes do processo decisório possam saber o
que está acontecendo e como as decisões são tomadas, e para que isso
ocorra, os autores destacam a necessidade de informações claras,úteis e
plurais.
Segundo o entrevistado 1, os meios de comunicação utilizados
são capazes de mobilizar os atores em âmbito interno, porém o
relacionamento da cooperativa com o ambiente externo é considerado
bastante frágil:
Internamente a nossa comunicação é boa,
consegue mobilizar, convergir os propósitos, mas
até hoje não divulgamos a nossa história para
fora, muita gente não sabe nem o que é a
COEPAD e nos já estamos há 13 anos, então é
uma falha muito grande, a gente tem site, mas as
pessoas não abrem, ele também não é dos
melhores, nós não divulgamos esse lado, do que é
a cooperativa, o que faz, o lado social, por
exemplo, um produto que é o papel semente,
ecológico, para conscientizar as pessoas, depois
de usar, planta e nasce flores, plantas, enfim, é
uma coisa nova e nos não divulgamos, as pessoas
não sabem, só nos sabemos,então nos temos essa
falha muito grande.
A cooperativa chegou a confeccionar um jornalzinho eletrônico,
que era distribuído entre seus membros e pessoas que o solicitassem,
porém foi extinto há alguns anos.
Visto os canais de difusão apresentados e sem julgar, neste
momento, o mérito das informações contidas neles e a pluralidade na
promoção destes canais, verifica-se certa pluralidade dos canais de
difusão e que tais canais, se utilizados de forma indiscriminada, são
capazes de proporcionar acesso à informação para a participação de
119
diferentes atores nos processos decisórios em âmbito institucional.
Resgatando o pensamento de Castellà e Parés (2012, p.228), destaca-se
que a “facilidade do acesso a informação favorece situações de atuação
de maior igualdade entre os participantes durante o processo e uma
maior transparência”, sendo essencial para a qualidade do processo
participativo (CASTELLÀ; PARÉS, 2012, p.228).
Dispostos os canais de disseminação da informação, parte-se
agora para a análise das informações difundidas.
4.1.2.1.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Qualidade da
informação
Quanto à clareza e a utilidade das informações é possível
afirmar que a informações são repassadas de forma entendível e
possuem importância para que os membros da cooperativa possam estar
integrados das atividades, conforme relato do entrevistado 4, “a gente
sempre tenta fazer com as informações cheguem de uma forma clara
para todos, que estejam sempre por dentro dos assuntos gerais da
cooperativa (...) e a gente direciona também, o que é relevante para a
cartonagem, o que é para a papel”. E do entrevistado 2:
O que passam para a gente é fácil de entender,
não tem nada muito técnico que a gente não
consiga entender, e se tiver, alguém explica (...) e
assim, da utilidade, são úteis sim (as
informações), para o que a gente precisa, dá
subsídios para estarmos interados do que
acontece na cooperativa, e a gente precisa saber
das atividades para encaminhar o nosso trabalho
de uma forma melhor também.
Os relatos do entrevistado 3 permitem esclarecimentos sobre
diversidade das informações, segundo ele, nem todas as informações são
compartilhadas, ainda que haja liberdade para indagações. Ao ser
perguntado se todas as informações eram compartilhadas na
cooperativa, o entrevistado respondeu “algumas coisas, nem tudo né, o
que pertence ao escritório, na direção, fica com eles, mas temos a
liberdade para chegar e conversar, perguntar”.
De acordo com Castellà e Parés (2012) é essencial que o processo
participativo conte com suficientes recursos humanos, materiais, de
120
tempo e também de informação. Com relação a este último, destacam
que é necessário que o processo participativo “permita aos cidadãos
conhecerem com maior intensidade a temática que lhe é proposta,com
informação suficiente ( e que seja clara e plural) que lhe possibilite
pronunciar-se de maneira coerente e rigorosa sobre as principais
alternativas existentes” (CASTELLÀ; PARÉS, 2012, p.228).
Desta forma, verifica-se que a qualidade da informação apresenta
aspectos positivos quanto à clareza e utilidade da informação, porém a
diversidade limitada das informações fragiliza a socialização e
democratização das mesmas.
4.1.2.1.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Pluralidade do
grupo promotor
Verificou-se na cooperativa que a promoção de espaços de
deliberação e as conduções das atividades e discussões são feitas,
predominantemente, pela presidência da cooperativa e pelos seus
gerentes, tendo em vista que é o corpo administrativo que determina o
cronograma das reuniões e sua periodicidade. O cronograma que
determina as reuniões permanece fixado nos murais da organização,
onde pode-se observar que as reuniões determinadas aparecem com as
seguintes terminologias “reunião da diretoria com os coordenadores das
oficinas”, “reunião da diretoria com os pais”.
Durante as observações foi possível verificar certa centralidade
dos processos em dois membros da cooperativa, a atual diretora geral e
o presidente da cooperativa, que desempenha um papel importante, visto
que os membros conferem ao mesmo grande estima e confiança.
Observou-se por vezes os membros da cooperativa, inclusive
pertencentes à diretoria, ao iniciarem um discussão informal sobre o
assunto, falarem “vamos esperar o seu XX (presidente da cooperativa)
chegar e a gente conversa sobre isso com ele”. Acontecimentos de
mesma natureza foram observados, fazendo referencia à diretora em
questão.
A centralidade da promoção dos processos deliberativos é
encontrada também em estatuto, que dispõe sobre a assembleia geral dos
cooperados, órgão supremo da cooperativa, e salienta que as
assembleias são habitualmente convocadas e dirigidas pelo Presidente
da Cooperativa, após deliberação do Conselho de Administração.
121
4.1.2.1.4 Considerações gerais sobre a categoria “Processo de
discussão”
Com base na análise dos critérios que compõem a categoria aqui
discutida é possível afirmar que os canais de difusão da informação são
plurais e acessíveis, perpassando diferentes âmbitos da organização com
clareza, características que aproximam com o entendimento de
cidadania deliberativa e de gestão social.
Todavia, a pouca diversidade nas informações disponíveis, aliada
a centralidade na promoção das discussões, fragiliza o caráter
democrático e confere certa unidimensionalidade ao processo de
discussão, características comuns à gestão estratégica, justificada talvez
pela necessidade de fortalecer a gestão da cooperativa de trabalho e não
de como uma organização assistencialista.
4.1.2.2 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 2: Inclusão
A categoria “inclusão” tem a pretensão de discutir as
possibilidades de inclusão dos atores nos espaços decisórios e será
analisada a partir dos seguintes critérios: 1) abertura dos espaços de
decisão; 2) aceitação social, e; 3) valorização cidadã.
4.1.2.2.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Abertura dos
espaços de decisão
O estatuto social da COEPAD dispõe sobre a realização da
assembleia geral dos associados (ordinária ou extraordinária), que deve
ser formada por todos os deficientes e todos os pais, é o órgão supremo
da Cooperativa, responsável pela tomada de decisão de interesse da
sociedade, e suas deliberações vinculam a todos.
Segundo o estatuto ela é tradicionalmente convocada e dirigida
pelo presidente da cooperativa, após deliberação do Conselho de
Administração, mas poderá ser convocada pelo Conselho fiscal ou por
1/5 (um quinto) dos associados, após solicitação não atendida. Os
trabalhos devem ser conduzidos pelos convocantes e a mesa composta
pelos principais interessados na discussão e as decisões serão tomadas
por maioria simples de votos dos associados presentes, tendo peso
igualitário. A assembleia geral ordinária deve ser realizada
obrigatoriamente uma vez por ano e delibera sobre a prestação de
contas, eleições (quando necessário), dentre outros tópicos e assuntos de
122
interesse social. A assembleia geral extraordinária é realizada sempre
que necessário sobre qualquer assunto de interesse da Cooperativa
(ESTATUTO SOCIAL, capítulo V, artigos 31, 32).
Segundo o entrevistado 5, as três categorias de cooperados,
citadas na caracterização da organização, participam das assembleias,
“tem as três categorias que participam, e tem os funcionários, junto
com a direção”. O entrevistado 4 relata que as assembleias são
compostas, majoritariamente, pelos pais dos cooperados “são mais os
pais, eles vem com os cooperados, mas numa assembleia dessas são
representados pelos pais, para discutir as dificuldades, problemas”.
O entrevistado 1 relata que os assuntos tratados em assembleia
são bastante deliberados “nossas assembleias são bem concorridas e
são bem debatidas, quem tiver dificuldades pode colocar, argumentar
sobre um assunto em pauta, a gente busca criar as condições para o
pessoal debater”.
O estatuto prevê os direitos e deveres dos cooperados disposições
sobre os espaços de deliberação. Dentre os direitos dos associados
destacam-se: tomar parte nas assembleias gerais e discutir e votar os
assuntos que nela se tratarem; propor ao conselho administração ou às
assembleias gerais medidas de interesse da cooperativa; solicitar, por
escrito, quaisquer informações sobre negócios da cooperativa, bem
como consultar livros e peças do balanço geral, e outros documentos
que julgar necessário; convocar, juntamente com outros associados, a
assembleia geral; propor critérios na distribuição das sobras líquidas
anuais e candidatar-se a cargo no Conselho de Administração e no
Conselho Fiscal (Estatuto social, capítulo II, artigo 7).
Com relação aos deveres dos cooperados destaca-se o
cumprimento do estatuto e das decisões tomadas deliberadamente, a
satisfação dos compromissos firmados com a cooperativa e o dever de
acusar seu impedimento nas deliberações sobre qualquer operação que
tenha interesse conflitante com a da Cooperativa. (ESTATUTO
SOCIAL, capítulo II, artigo 8)
Destaca-se que os assuntos a serem discutidos em assembleia são,
predominante, selecionados pelos dirigentes da cooperativa. Os espaços
decisórios, que abrangem as discussões não levadas a assembleia,
aparecem relacionados à diretoria da organização e ao conselho de
administração, que é o órgão superior na hierarquia dentre os órgãos de
administração, sendo de sua responsabilidade decidir sobre assuntos de
ordem econômica ou social de interesse da Cooperativa e seus
123
associados. É composto de seis membros associados eleitos pela
assembleia geral para um mandato de três anos, sendo obrigatória, após
o término do mandato, a renovação de ao menos 1/3 dos membros.
(ESTATUTO SOCIAL, capítulo VI, artigos 40, 41).
O relato do entrevistado 4 corrobora a informação de que as
decisões são centralizadas no corpo administrativo, “as decisões são
tomadas em diretoria, nós resolvemos em diretoria, membros do
conselho,quando a coisa é maior a gente leva para assembleia”. O
entrevistado 1, relata a mesma situação:
As pequenas coisas, rotineiras, a gente resolve em
diretoria, por isso temos reuniões todo o mês, até
mais de uma vez por mês, porque tem o presidente
e vice presidente que são os que vivem o dia
inteiro aqui, porque os outras são da diretoria
mas trabalham, não podem estar aqui todo o dia,
tudo o que é definido é em diretoria, quando a
coisa precisa de assembleia a gente faz, nós temos
um cronograma para reunir todos.
As reuniões rotineiras são divididas de acordo com os grupos que
compõe a organização, como, por exemplo, reunião de diretoria, reunião
de produção (gerente de produção e coordenadores), reunião de
coordenadores (com a participação ou não da diretoria), reunião com os
pais (direção e pais dos deficientes cooperados), reunião com os
voluntários (direção e voluntários) e ficam, normalmente, restritas aos
grupos que a compõe, como é possível verificar no relato do
entrevistado 3 “as reuniões de diretoria eu não participo, tem a reunião
dos coordenadoras com a produção, por exemplo, dos funcionários, que
eu participo sim”. A entrevista 2 afirma também participar
prioritariamente das reuniões de seu grupo, ainda que sempre que,
quando necessário, é convidada a participar da reunião de diretoria, “as
(reuniões) que pertencem aos coordenadores sim, aos funcionários, as
que eles tem na diretoria quando é um caso mais especial eles chamam,
aquele que for preciso ir até lá”.
O planejamento da organização é realizado por sua diretoria e não
conta com a participação dos demais membros, “quem faz o
planejamento é a diretoria, se reúne, planeja, tudo isso, todo ano a
gente faz sempre um planejamento para o ano seguinte, vê o que
aconteceu no ano, como foi, cada ano pega o planejamento que foi e
nos mudamos ou alteramos para o ano seguinte” (ENTREVISTADO
124
4). Após a definição do planejamento estratégico, ele é repassado aos
demais membros, “a gente publica, informa para todo mundo, reúne os
coordenadores, faz várias reuniões, é passado todo o planejamento”.
Recentemente, uma consultora foi contratada para auxiliar na
elaboração do planejamento da cooperativa “essa moca está contratada
para fazer exatamente uma avaliação, como está a qualidade do nosso
produto, como vai estar a condições de produção, até quanto podemos
produzir, onde está o erro, para fazer um planejamento estratégico bem
feito para 2013” (ENTREVISTADO 4).
Quanto à inclusão dos portadores de deficiência intelectual nos
espaços de discussão, verificou-se ser bastante incipiente a participação
dos mesmos, ainda que as reuniões de pais e assembleias sejam abertas
aos mesmos. Em um grupo de cerca de seis cooperados com deficiência
foi perguntado sobre a participação individual ou de seus pais na última
reunião realizada. A maioria relatou não saber se os pais tinham vindo
ou afirmaram a não participação dos mesmos. Apenas um disse estar
presente, “eu vim, mas fiquei esperando meu pai aqui do lado de fora
(da sala de reuniões) mesmo” (ENTREVISTADO 7).
Verificou-se na organização uma forte vinculação do processo
decisório com a hierarquia formal instaurada, possuindo uma
característica top-down, na qual o processo ocorre, primeiramente, nas
instâncias mais altas de poder.
Um dos relatos coletados pode indicar traços que expliquem tal
característica da organização, “a gente precisa de pessoas que
soubessem de administração de cooperativas, mas nós não temos verba
para contratar (...) eu mesmo, e muitas das pessoas que estão aqui
conosco são ou eram funcionários públicos, trabalhavam em empresas,
não entendem muito dessa coisa de gestão, como que funciona do
cooperativismo” (ENTREVISTADO 1). Desta forma, percebe-se o
desconhecimento dos membros da cooperativa sobre formas de gestão
mais democráticas e participativas, tendo a suas experiências voltadas as
formas tradicionais e burocráticas de gestão.
4.1.2.2.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Aceitação social
Ao analisar o reconhecimento dos atores organizacionais da
necessidade de uma metodologia participativa foi possível identificar
traços que demonstram a existência da preocupação com o assunto na
cooperativa. Tal característica se materializa de forma evidente no
125
esforço da direção para criar um ambiente que fomente a participação de
pais e dos deficientes intelectuais nas reuniões que são realizadas com
eles, pois, como será discutido no critério seguinte, existe pouca
participação dos pais nas atividades da cooperativa, principalmente nas
reuniões.
Para tanto, houve adaptações no formato como as reuniões eram
tradicionalmente organizadas, com a utilização de dinâmicas, desenhos,
pequenas palestras, dentre outras técnicas, que além de atrair mais pais,
permitiu a participação dos deficientes, conforme o relato de um deles
“foi bem legal, a gente participou, fez desenho com o pai da gente,
tinha dinâmica com a gente, com o pai e com os outros que estavam lá”
(ENTREVISTADO 6).
Para um dos coordenadores foi “uma um forma de tentar adaptar
para a participação deles também”, e que trouxe resultados, “o pessoal
elogiou muito a forma da reunião, a gente pediu um feedback e os pais
gostaram bastante desse jeito da reunião, foi uma coisa menos formal,
entendeu? A psicóloga falou um pouquinho, teve uma palestrazinha,
parece que foi bem legal, já são mudanças, e isso é muito bom”
(ENTREVISTADO 3).
O relato de um dos pais corrobora a informação sobre sucesso da
reunião, “foi muito legal, diferente do que era sempre, mais informal,
teve mais integração, eu acho, entre nós, os filhos, os condutores da
reunião”.
Um dos dirigentes da organização reconhece a importância da
mudança e disse encontrar dificuldades na criação de metodologias
participativas, ainda que ache relevante:
Nesse lado assim de metodologias para
participação a gente é muito fraco, eu confesso
para você que eu não sou profissional, tenho
muito o lado social, do coração, mas não sou um
gestor mesmo. Agora, graças a Deus, a gente está
conseguindo profissionais, com formação
diferente e com a cabeça diferente também, como
as psicólogas, que tem ajudado muito a gente
nesse lado, de reunião, de relacionamento,
integração, então eu acho que a gente está
caminhando (ENTREVISTADO 1).
Castellà e Parés (2012) salientam que em espaços deliberativos é
comum que surjam desigualdades deliberativas e de comunicação entre
os participantes e para reduzir tais desigualdades é recomendável a
126
utilização de técnicas e mecanismos específicos que ajudem a minimizálas, configurando um desafio prático à gestão social.
4.1.2.2.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Valorização
cidadã
Em princípio, ressalta-se que o critério “valorização cidadã”,
considera o quanto a necessidade de participação e suas implicações são
valorizadas pelos próprios cooperados, e não o quanto os atores
organizacionais se sentem cidadãos, pois isso necessitaria uma análise
diferenciada e mais ampla que os processos decisórios.
Desta forma, verificou-se que entre os coordenadores e dirigentes
a participação é bastante valorizada, “eu acho importante participar
sim, nós fizemos parte de uma cooperativa, não é? Ter que ser
cooperativo então, por isso eu sempre dou a minha opinião quando
pedem e também quando não pedem também” (ENTREVISTADO 3). O
entrevistado 2 relata a relevância de participar e a liberdade de
expressão na organização:
A cooperativa enfrenta muitas dificuldades e ela é
muito importante para nós, para todos que
trabalham aqui, então eu acho, que somente
participando, dando a nossa contribuição é que
ela consegue se manter (...) por isso eu procuro
estar sempre nas reuniões que tem da gente, nas
confraternizações, dar minha opinião quando
sobre as coisas (...) e a gente tem liberdade para
fazer isso aqui na cooperativa.
O entrevistado 5, corrobora a informação:
Eu acho que nós temos um ambiente legal aqui,
ninguém pensa em fazer somente o seu trabalho e
ir embora, existe algo maior, de tentar contribuir
de verdade, fazer com a cooperativa melhore, e
ninguém consegue fazer isso sozinho (...) nós
temos as nossas reuniões de diretoria, por
exemplo, mas fora isso a gente conversa bastante,
um dá opinião para o outro, para tentar
melhorar.
Com os deficientes intelectuais o assunto foi trabalhado de forma
abrangente, sendo destacado por eles a participação na produção, no
127
coral e nas festividades da cooperativa, como se observa nos relatos dos
entrevistados 6 e 7, respectivamente, “o trabalho é tudo a gente que faz,
é cooperativa dos deficientes intelectuais, é a gente que participa do
trabalho”, “a gente participa do coral, faz a festa junina, fizemos a
árvore de natal do Guga (da Fundação Gustavo Kuerten, parceira da
COEPAD) ano passado”.
A participação dos pais dos deficientes nas atividades e reuniões
da cooperativa foi relatada como bastante difícil. De acordo com o
entrevistado 1, as próprias normas da cooperativa visam incentivar a
participação:
A gente tem uma norma aqui, quando o deficiente
vem para trabalhar a gente coloca que pelo
menos um membros da família, o pai, a mãe, tem
quer vir participar, fazer voluntariado de um
período, pelo menos, para conhecer a
cooperativa, os valores que nós cultivamos, o
nosso trabalho, o trabalho dos filhos (...) porque a
pessoa só valoriza quando participa.
Porém, o entrevistado 3 relata a dificuldade de promover a
participação dos pais:
Por ser uma cooperativa, é o que a gente fala, tem
que ser todo mundo participando, ainda mais eles
(os pais) que são representantes dos deficientes, a
cooperativa é deles e para eles (deficientes), mas
a maioria não participa e a gente pede nem que
seja uma vez por semana para participar, mas
tem alguns que não vem aqui nunca (...) e eu
sempre falo para eles estimularem os pais a vir
“convida o pai e a mãe para vir aqui, fala que é
importante”, porque tem que vir participar, ver o
trabalho deles, e parece que na reunião foi falado
para os pais que não podem vir, tentar contribuir
de outra maneira”.
O entrevistado 4 ressalta a importância da mudança de
comportamento dos pais, “isso é uma coisa que a gente tenta mudar e
precisa mudar, para eles participarem mais, poucos participam, mesmo
nas campanhas que a gente ta precisando de voluntários, a gente liga,
mas maioria não vem”, pois segundo o entrevistado 1, a participação é
importante para que os pais possam tomar parte nas reuniões, “é
importante participar, até porque não adianta só vir nas reuniões, nas
128
assembleias, sem saber o que acontece na cooperativa, para pode
debater, discutir com a gente, porque também não adiante ficar só
ouvindo, só um lado falando”.
De acordo com relato do entrevistado 1, a participação dos pais
nas próprias assembleias realizadas é bastante difícil:
Não adianta muito convidar que o pessoal não
vem, então para trazer os pais para participar das
assembleias a gente convoca, a gente da um
ultimato sempre, “ou vem ou então a cooperativa
vai fechar”, claro que não chega a esse ponto,
mas a gente faz isso para eles virem participar,
porque é difícil, tem que criar um ambiente para o
pessoal vir, mesmo assim sempre tem falha, não
vêm 100 %, mas tem a participação dos pais.
Segundo relatos, o principal argumento dos pais para a não
participação é a escassez de tempo e a dificuldade em conciliar as
atividades profissionais com as atividades da cooperativa.
A dificuldade da participação dos atores nas cooperativas é algo
apresentado por Cançado et.al. (2012, p. 417), ao destacar que “no
Brasil existe uma ampla literatura que relata que as assembleias estão
quase sempre vazias e apenas um pequeno grupo se perpetua no poder”,
e a falta de interesse dos sujeitos em participarem realmente das
cooperativas e de agir coletivamente, o que dificulta o processo de
participação e integração. Os autores destacam ainda que a baixa
participação compromete o cumprimento do principio cooperativista que
tange a gestão democrática, “se o principal instrumento de participação
do cooperado é a assembleia e ele não comparece, a prática do princípio
fica comprometida” (CANÇADO et.al., 2012, p.405).
Ainda que os mecanismos participativos na cooperativa não
sejam amplamente abrangentes, verifica-se que para os membros que
atuam efetivamente na cooperativa a participação nas atividades e a
exposição das opiniões é bastante valorizada, reconhecendo como
fragilidade a não participação integral dos pais dos deficientes
cooperados, que, aparentemente, não vislumbram como de extrema
importância a própria participação.
129
4.1.2.2.4 Considerações gerais sobre a categoria “Inclusão”
A inclusão dos atores organizacionais nos espaços de decisão está
fortemente vinculada à hierarquia organizacional e aos traços de gestão
estratégica que permeiam tais ambientes.
Todavia, avanços foram percebidos quanto aos principais atores
excluídos do processo decisório, os deficientes intelectuais, através da
promoção de reuniões que fogem ao rigor tradicional e proporcionam
atividades integrativas adaptadas às necessidades dos deficientes,
demonstrando que, mesmo de forma incipiente, a preocupação com
metodologias participativas se faz presente.
A valorização da participação encontra-se segmentada entre os
grupos componentes da cooperativa, sendo relevante para os membros
que participam ativamente da organização (coordenadores, demais
funcionários, dirigentes, deficientes intelectuais), porém com certo
descaso por uma parcela generosa de pais, representantes dos
cooperados com deficiência.
Faz-se importante uma ressalva quanto ao direcionamento do
termo “inclusão” nesta análise, pois não faz referência à inclusão social,
realizada grandiosamente pela COEPAD através do trabalho, mas está
relacionada à inclusão dos diferentes atores organizacionais no processo
decisório da cooperativa.
4.1.2.3 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 3: Igualdade
participativa
Para a análise de tal categoria, serão utilizados os seguintes
critérios: 1) forma de escolha dos dirigentes; 2) discursos dos dirigentes
e; 3) avaliação participativa.
4.1.2.3.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Forma de
escolha dos dirigentes
Para a realização das eleições é criado um comitê especial que
coordena e fiscaliza o processo, composto por associados não
candidatos. Todos os cooperados em atividade podem se candidatar e
tem direito a voto igualitário.
130
Segundo o entrevistado 1, desde sua criação não houve
concorrência nas eleições, contudo ele acredita que, com o crescimento
da organização, isso seja possível em breve:
Nós temos a assembleia e então a gente abre a
inscrição e registra uma chapa ou duas chapas,
nós nunca tivemos mais que uma, então a gente
convida aqueles voluntários que estão há algum
tempo e quem gostam mais, que vestem a camisa,
para fazer parte da diretoria, faz uma chapa e vai
para assembleia fazer a votação (...) mas eu
espero que com o crescimento da cooperativa
possa ter mais disputa, fica mais democrático, eu
acho” (ENTREVISTADO 1).
Através de tal relato é possível verificar que a meritocracia
aparece como uma forma de escolha dos componentes da diretoria da
cooperativa, visto que a votação em assembleia representa apenas uma
forma de validação da escolha feita pelas lideranças da organização.
O entrevistado 5 relata que, apesar de não haver disputas nas
eleições, há mudanças “não tem, disputa, sempre uma chapa, mas de
três em três anos a gente muda, o conselho fiscal, e a diretoria em dois
anos”. O entrevistado 4 relata como a diretoria é formada, “ela é
composta pelos pais e voluntários,a diretoria tem no mínimo 2/3 de pais
e 1/3 de pessoas voluntárias”.
Porém, o presidente da cooperativa permanece o mesmo desde o
início, mas salienta ser seu último mandato:
Eu sou o presidente desde que começou e nunca
renovou. Em marco do ano que vem (2013) tem
nova eleição, eu não vou ser mais candidato a
presidente, porque a cooperativa está com 12
anos e eu já todo esse tempo todo. Acho que as
coisas tem que mudar, as coisas evoluíram,
quando nos começamos era pequeno e se tornou
grande, e eu já to cansando também, estou com
oitenta nos e algumas pontes de safena. E eu acho
o seguinte também, tudo na vida tem que
modernizado, e hoje nos temos cabeças mais
jovens, pensar diferente.
A meritocracia é presente também na forma de escolha dos
coordenadores de oficinas, exceto no caso em que são necessárias
131
habilidades técnicas, como no caso da serigrafia, tendo em vista que tais
cargos são, predominantemente, ocupados por “ex-voluntários que se
destacaram” nas atividades da cooperativa.
Verifica-se que o processo de escolha dos representantes, que
segue um procedimento presente em estatuto, garante a integridade das
eleições, sendo o voto igualitário a forma de escolha. Todavia, uma
análise mais ampla, desnuda aspectos que podem comprometer o caráter
democrático da escolha, como a existência de uma única chapa, a
permanência prolongada de membros em cargos diretivos e a escolha
meritocrática dos coordenadores.
Ressalta-se o esforço do presidente da cooperativa para que tal
situação se modifique e a organização possa ter maior pluralidade em
sua direção.
4.1.2.3.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Discurso dos
dirigentes’
Os dirigentes da cooperativa demonstram em seus discursos
preocupação com a integração e a participação coletiva, como é possível
observar na fala do entrevistado 1:
Não tenha dúvidas quanto a isso, nós valorizamos
a participação de todo mundo, seja o voluntário,
que é fundamental, a família, e a gente bate muito
em cima da família, no bom sentido, para
incentivar, tem que participar, tanto que cada
camarada que entra como cooperado, a família
assina o compromisso, de uma vez por semana,
uma tarde ou uma manha, ser voluntário, se não
puder, tem que vier na cooperativa conhecer,
acompanhar.
Para o entrevistado 5, a própria separação das reuniões em grupos
é uma forma aproximativa “a gente faz questão de ter contato com
todos, e as vezes em um grupo grande fica mais difícil, ou não pode vir
ou vem pouco, por isso nós temos muitas reuniões com grupos, fica
mais fácil, as pessoas se posicionam mais, acabam conversando melhor
”.
A fala do entrevistado 4, reforça a integração entre os membros,
“a gente procura sempre a integração, sempre com a ideia de que se
tem aqui, de que nós somos uma família, um família de fibra (lema da
132
COEPAD), que trabalha em conjunto, que todos são importantes, e
cada um tem seu papel, precisa participar, e que somos uma empresa
também”. O relato é corroborado pelo depoimento do entrevistado 1:
A ideia geral nossa é que somos uma família, isso
colocado, embora seja uma atividade, é trabalho,
é uma empresa, mas apesar de tudo, a gente
coloca como uma família, há um entendimento, há
uma relacionamento bom, não temos muita
participação dos pais, quando a gente pede, um
outro vem, mas em geral há um ambiente bom.
O entrevistado relatou o seu entendimento sobre o papel dos
deficientes intelectuais na cooperativa “eu sempre digo, aqui o
deficiente “é o cara”, como se diz, a cooperativa é deles, então tudo
que se faz aqui, tem que ser feito por eles, não se faz nada que eles não
tenham participação, não digo que ele faça 100%, mas ele tem que ter
participação, seja rasgando papel, ele tem que participar”.
O entendimento da organização como uma empresa foi verificado
por vezes nas falas dos entrevistados, o que pode justificar,
parcialmente, a intensidade da atuação da “diretoria”, e sua
característica centralizadora, ainda que com possibilidade de
participação e expressão dos demais membros, pois parecer haver certo
mimetismo de características predominantes em empresas tradicionais,
que adotam o modelo estratégico de gestão, como se observa na fala a
seguir, do entrevistado 4: “é uma trabalho, é uma empresa, como
qualquer outra”. E está presente na fala do entrevistado 5:
Precisava de um administrador profissional, para
trazer as coisas de empresa mesmo para a gente,
porque a administração acaba ficando na mão do
presidente, que não seria o ideal, o presidente,
diretoria, teria que estar aqui para decidir
algumas coisas, que não estejam bem, ou que
estejam errado, mas não para decidir o dia a dia
(...) a gente já adotou algumas práticas de
empresas, porque todo mundo aqui tem ou teve
um trabalho fora, serviço público ou em empresa
mesmo, então tem alguma experiência de lá, mas
a gente precisava de conhecimento profissional,
como para controlar melhor as coisas, ter um
administrador para decidir, ficar mais empresa.
133
O entrevistado 1, é mais cauteloso e destaca a importância do
lado social na cooperativa: “a gente é uma empresa, não dá para ser no
amadorismo, tem que ser profissional, mas não deixando o lado social,
isso não pode, no momento que você deixa o lado social perde muita
coisa, mas pode ter o lado profissional e um lado social”.
O entrevistado 1destacou ainda a importância da mudança na
direção da cooperativa, como se verifica em sua fala:
Pode ser que esteja errado, mas é a maneira que
a gente esta fazendo, por isso que acho que esta
na hora de mudar a diretoria, ou pelo menos a
presidência, lógico que eu tenho o lado
profissional, mas eu sou o lado do coração, eu
sou mais ligado no lado do coração, e ai, o
pessoal diz assim, mas você passa muito a mão na
cabeça das pessoas, mas é meu estilo, minha vida,
eu não vou mudar agora, depois de 80 anos não
vou mudar minha maneira de ser e é por isso que
precisa mudar (...) esse é meu último ano, na
eleição que vem alguém tem que pegar, porque se
não a gente fica muito dono, pensa que isso aqui é
da gente, embora a gente faça uma
autoavaliação, fica a mesma cabeça, o mesmo
pensamento.
Os discursos apresentados demonstraram que os dirigentes
parecem valorizar a participação dos diferentes atores e a pluralidade do
grupo dirigente, considerando essencial para o desenvolvimento da
organização. A associação feita entre empresa tradicional e a
organização cooperativa indicou traços de mimetismo organizacional,
em especial, quanto aos traços instrumentais que caracterizam alguns
aspectos da cooperativa.
4.1.2.3.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3: Avaliação
participativa
A intervenção dos membros no acompanhamento e avaliação das
decisões aparece disposta no estatuto da cooperativa, como no caso da
especificação dos direitos dos cooperados, que garantem, como já
citado, o acesso a quaisquer informações sobre negócios da cooperativa,
bem como consultar livros e peças do balanço geral e outros
documentos que julgar necessário. Durante as entrevistas e observação,
134
não pareceu ser uma prática comum entre os cooperados e funcionários
que não fazem parte da administração, buscarem por tais informações e
documentos.
O conselho fiscal também cumpre função de acompanhamento,
pois objetiva fiscalizar assídua e minuciosamente as ações da
administração da cooperativa, sendo formado por três membros efetivos
e três suplentes e permitido a reeleição de apenas 1/3 de seus membros
(ESTATUTO SOCIAL, capítulo VII, artigos 52, 53).
De acordo com o entrevistado 5, o diálogo é o principal
instrumento de acompanhamento e avaliação das decisões, “muita coisa
é na base da conversa (...) um pergunta para o outro como está o
andamento de tal mudança que foi decidido fazer, se deu certo ou não, o
que correu como planejado, o que precisa revisto, o que ele pensa sobre
o andamento das coisas”.
Durante as observações, presenciou-se dois momentos que
corroboram a informação: em um dos momentos o gerente de produção
foi até uma das oficinas e, em tom informal, perguntou sobre a opinião
da coordenadora a respeito de uma decisão recente, que alterou o
processo de produção e afirmou ter conversado com os demais
coordenadores; em um segundo momento, a atual gerente geral, se
dirigiu a uma das oficinas e pediu que os presentes opinassem e
avaliassem alguns encaminhamentos dados pela cooperativa em
determinado evento.
Anualmente são realizadas reuniões que abrangem todos os
membros da cooperativa para avaliação das atividades planejadas e
realizadas, conforme relato a seguir, “no final do ano sempre tem
avaliação, a gente reúne todo mundo, para avaliar, reavaliar, a
diretoria, o planejamento, a produção, ver como foi o ano, o que
planejou, os resultados” (ENTREVISTADO 8).
Os relatórios de atividades, financeiros, dentre outros, precisam
passar por aprovação em assembleia, são pauta obrigatória, dando a
oportunidade para que os participantes interfiram na avaliação dos
documentos.
Assim sendo, verifica-se a existência de normas que facilitam o
processo de intervenção e da possibilidade da intervenção e
acompanhamento das atividades e problemáticas discutidas, todavia não
foi possível verificar, em profundidade, a frequência e a complexidade
de tais intervenções.
135
Verifica-se a importância do acompanhamento dos processos
decisórios nas palavras de Castellà e Parés (2012, p. 243) ao destacarem
que a avaliação e acompanhamento dos processos desde seu principio e
de forma contínua é mais que um critério de qualidade, “já que apenas
por meio de avaliação podemos analisar a qualidade democrática do
processo, e só assim podemos melhorar”.
4.1.2.3.4 Considerações gerais sobre a categoria “Igualdade
participativa”
A forma de escolha dos representantes na cooperativa obedece ao
processo disposto em estatuto, que determina a escolha mediante
votação isonômica em assembleia. Todavia os processos realizados até o
momento foram compostos por apenas uma chapa, compostas por
membros já pertencentes à diretoria e membros escolhidos por
meritocracia pelas lideranças da cooperativa, tornando a assembleia uma
etapa de validação das escolhas da cúpula, o que compromete a
isonomia da participação entre os membros e restringe as possibilidades
de escolhas.
Tal fato foi apresentado com preocupação nos discursos dos
dirigentes, que salientaram a importância da mudança na diretoria e da
participação dos membros nas atividades da cooperativa. A palavra
“empresa” foi utilizada com frequência no discurso dos dirigentes,
relacionada à necessidade da cooperativa em adotar características
gerencialistas em suas atividades, possíveis limitadores da igualdade
participativa, tendo em vista a burocratização de suas estruturas.
A intervenção dos atores na validação e acompanhamento das
problemáticas da cooperativa se mostrou possível e foi verificada
durante as observações, ainda que de forma incipiente.
Desta forma, foi possível verificar a existência de normas e
estruturas capazes de proporcionar isonomia entre os participantes,
assim como a valorização dos dirigentes quanto a este aspecto e o
potencial interventivo dos atores, todavia algumas contradições nos
processos fragilizam a igualdade participativa.
136
4.1.2.4 Avaliação da COEPAD segundo a Categoria 4: Autonomia
A categoria “autonomia” tem em vista o entendimento das
possibilidades de participação indistinta nos processos decisórios e será
analisada através dos seguintes critérios: 1) alçada dos atores; 2) perfil
da liderança e; 3) possibilidade de exercer a própria vontade.
4.2.2.4.1 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 1: Alçada dos
atores
A intensidade com que os atores organizacionais podem intervir
nas problemáticas da organização apresentou-se bastante relacionada à
liberdade de expressão relatada pelos entrevistados. O entrevistado 2
evidencia tal fato, “alguma coisa que a gente não gosta que está sendo
feita, que acha que não está muito certo, a gente vai conversar, a
diretoria diz que a gente tem que dar sugestões, que isso é bem vindo,
então a gente está sempre contribuindo”. O entrevistado 3 também
relata a liberdade de opinião, “a gente tem uma abertura bem grande
para dar e pedir opinião, as meninas dos escritório, a gerente, se elas
tem dúvidas procuram a gente, a gente também, se precisa falar algo é
só chegar e conversar”, assim como o entrevistado 8, “a gente
participa sempre, é porque assim nas decisões, nos colocamos as coisas
que a gente não gosta, alguma coisa que te chateou, nos temos
liberdade para falar”.
O entrevistado 8, relata que algumas propostas “assustam” os
dirigentes, porém não deixam de ouvi-lás, “algumas ideias que a gente
tem, muito diferentes, inovadoras, eles se assustam um pouco, mas se tu
souber levar, conversar, é tranquilo, eles te ouvem”.
O relato do entrevistado 3, apresenta indícios sobre a alçada dos
atores e destaca, novamente, o relevante papel do atual presidente:
O que eu posso lutar para mudar eu mudo, o que
eles podem fazer eles aceitam, eu sempre vou
direto no Seu X (presidente), porque minha
relação com ele é super, hiper aberta, então o que
eu preciso eu peço a ele, o que ele pode fazer, ele
faz, de mudanças assim. A diretoria também aqui
é assim, a diretora que está aí agora, é super
aberta, falei para ela que seria importante alguns
materiais aqui (na oficina) e ela fez uma
campanha no trabalho dela e conseguiu todo o
137
material para mim. Então, é bem, assim,
colaborativo, sabe?.
Os entrevistados relataram, entretanto, não interferirem
diretamente em assunto administrativos, como se observa no relato do
entrevistado 3 “a parte do escritório, a parte administrativa eu não me
meto, coisas de dinheiro, mas assim, a produção que eu posso ajudar o
nosso gerente eu ajudo, nosso relacionamento é bem aberto” e do
entrevistado 2, “as coisas mais burocráticas, de escritório, eu não
costumo dar muita opinião, mas nas coisas que dizem respeito ao meu
trabalho sim”.
Alçada dos deficientes intelectuais é bastante restrita a
representatividade dos pais, ainda que tenha se verificado na
organização abertura de canais para os deficientes exporem seus
pensamentos, como na fala de um dos coordenadores, “a gente tem que
respeitar a opinião deles também, não porque tem algumas limitações
que eles não tem opiniões, que eles não tem vontades, eles têm, eles
sentem, eles sabem o que querem também, mas tem que família que não
tem muito interesse as vezes, e eles que deveriam ser os representantes”
(ENTREVISTADO 2).
O entrevistado 1, retrata as possibilidades e limitações dos
deficientes na cooperativa:
Tudo que é feito, tem que ser feito por eles, isso
sim, mas que eles decidam, vamos produzir isso
hoje ou aquilo, isso não. Em cada oficinas tem
uma liderança, tem um coordenador, para poder
fazer a coisa, porque por mais desenvolvidos que
eles estejam, eles não tem assim a capacidade de
chegar e “vou fazer esse gravador”, e como fazer
não sabe, tem que ser orientado, mas tudo é feito
por eles.
O mesmo entrevistado salienta ainda que a autonomia maior dos
deficientes é nas atividades de lazer:
A participação maior é na parte de lazer, quando
tem festa, são eles que fazem, que cantam, que se
organizam. No esporte, eles sempre participam
muito. No produto, eles fazem, mas não decidem,
porque é a gente que faz pesquisa, qual o melhor
produto para fazer, o que está precisando, o que
precisa mudar, mas tem que ser atividade
138
integrada, não se faz
(ENTREVISTADO 1).
nada
sem
eles
Quanto aos pais que não atuam diretamente na cooperativa, o
entrevistado 9, afirmou não interferir nas problemáticas discutidas,
exceto em reunião, “quando tem reunião a gente vem, participa, mas de
outras coisas não, até porque é eles que estão mais aqui, sabem melhor
o que acontece, o que precisa”. Tal fato diminui a alçada dos
cooperados deficientes, pois sua representatividade se expressa na
participação de seus pais, o que não acontece com frequência.
Conclui-se que a alçada dos atores apresenta aspectos positivos
quanto à liberdade de expressão de opiniões em diferentes âmbitos e a
receptividade da diretoria quanto a mudanças no ambiente operacional,
pois como já foi dito, o que tange a parte estratégica é conduzido,
predominantemente, pela direção da cooperativa, que, entretanto, é
receptiva a sugestões. Todavia a baixa participação dos representantes
dos deficientes limita as possibilidades de expressão e intervenção dos
mesmos.
4.1.2.4.2 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 2: Perfil da
liderança
A estrutura administrativa apresenta forma tradicional
burocrática, através de uma hierarquia formada em primeira instância
pelo conselho administrativo, seguida pelos gerentes e, posteriormente,
pelos coordenadores.
O padrão de autoridade presente na organização vincula-se
fortemente à hierarquia, com a existência de níveis distintos em relação
à complexidade da decisão. O trabalho manufaturado é dirigido por um
coordenador, que orienta as atividades a serem realizadas. O
entrevistado 3, relatou a existência de certa autonomia em suas
atividades “assim, com relação ao nosso trabalho a gente autonomia
sim, como a gente vai organizar o pessoal, como que vai fazer isso,
aquilo, como vai arrumar a oficina”. O entrevistado 8 corroborou a
informação, salientando, porém, que decisões de maior complexidade
são levados a diretoria, “a gente autonomia no nosso trabalho, até
porque a gente sempre comenta, a gente está sempre com a nossa
oficina, então conhece melhor, mas quando tem um problema mais sério
vai para a diretoria”.
139
O entrevistado 2 relata a relação de confiança entre os
coordenadores e a direção, “eu acho assim, que essa questão de
autonomia é muito da confiança que eles tem na gente, a diretoria
confia muito na gente, dá essa liberdade, procura a gente para saber”.
O entrevistado 3 relata uma situação semelhante “esses dias eu falei
para o Seu X (presidente da cooperativa), que eu queria fazer umas
mudanças aqui (oficina de trabalho) e ele falou “minha filha, eu confio
em você, pode fazer o que você quiser””.
No que tange o relacionamento entre os coordenadores e os
deficientes intelectuais, que possuem contato direto e constante, os
deficientes relataram ter grande abertura, “quando precisa, fala para ela
(coordenadora) “posso conversar com você?”E daí vai para o
sofazinho para conversar” (ENTREVISTADO 6). No acompanhamento
das oficinas, durante as observações, verificou que o relacionamento é
bastante informal e baseado no diálogo entre os participantes, que
trabalham de forma integrada.
O entrevistado 2 ilustra o padrão de autoridade:
Por exemplo, essa semana precisava fazer papéis
diferentes, então eu que decidi como organizar o
trabalho, o nosso coordenador veio aqui e passou
os pedidos e eu que decidi como fazer, mas tem
coisas que a gente leva para a diretoria, como
essa semana que teve uma menina que se
apaixonou por um rapaizinho aqui, mas como ele
não quis nada, ela jogou tinta e sujou todo ele
(sic).
Para a resolução de tal impasse foi marcada uma reunião, com um
representante da diretoria, a coordenadora da oficina, a cooperada
envolvida no incidente e seus pais, e a psicóloga da cooperativa.
As decisões que ultrapassam os limites de organização do
trabalho manufaturado ficam a cargo da diretoria da cooperativa, que foi
considerada pelos coordenadores bastante aberta e receptiva:
A nossa diretora agora é uma pessoa especial,
qualquer coisa é só dizer que precisa conversar
que e a gente tem todo o tempo para conversar,
sobre qualquer assunto da cooperativa. E o Seu X
(presidente da cooperativa), para mim é um pai,
nem tem o que falar. E o restante da direção
todos são muito abertos, não existem barreiras
entre a gente para conversar, qualquer coisa a
140
gente pode chegar e conversar com eles, é que
tem uma liberdade que a gente tem que é muito
boa aqui dentro” (ENTREVISTADO 2).
O aspecto foi também destacado pelo entrevistado 8, “a relação
com a direção é muito boa, não tenho do que reclamar, eles são muito
legais, abertos para conversar”, e pelo entrevistado 6, deficiente
intelectual, “ah, a gente conversa com eles sim, na hora do trabalho, do
lanche, faz brincadeira, as vezes no corredor (...) eu gosto bastante de
todos eles”.
O perfil da atual diretora também é visto pelos membros da
cooperativa “a nossa diretora aqui trabalha muito bem, ela sempre
elogia, reconhece o esforço que a gente faz, seja quem for, ela
reconhece, na hora de dar bronca ela dá, mas na hora de reconhecer
reconhece, aquela critica que é construtiva mesmo”, assim como o
coordenador de produção, “ele é muito aberto, está sempre pedindo a
nossa opinião, é muito bom trabalhar com gente assim”
(ENTREVISTADO 3).
O presidente da cooperativa é visto como o líder da cooperativa e
possui uma relação bastante afetuosa os demais membros, conforme os
relatos a seguir:
“Ele é o nosso
(ENTREVISTADO 5);
cartaz,
é
a
cara
da
cooperativa”
“Ele é um pai não só para mim, mas para todos aqui”
(ENTREVISTADO 2);
Eu digo para ele que ele foi um anjinho que apareceu na minha
vida, aprendi muito com ele, não só de trabalho, mas principalmente de
vida, eu era tímida, meio orgulhosa, ele não tem orgulho, se tiver que se
humilhar ele vai se humilhar mesmo para conseguir algo para a
cooperativa” (emociona-se ao falar) (ENTREVISTADO 3);
“Ele
é
um
(ENTREVISTADO 4);
líder,
batalhador,
humilde,
íntegro”
“Quando eu falo que trabalho na COEPAD as pessoas falam “ah
é a do Seu X (presidente da cooperativa)”, ele não gosta, mas foi
141
acontecendo, ele que
(ENTREVISTADO 8).
sempre
batalhou
por
isso
aqui”
Durante as observações verificou certa dependência dos membros
para com o presidente, ouvindo por vezes em discussões informais sobre
determinado assunto a frase: “vamos esperar o Seu X (presidente)
chegar e a gente conversa novamente sobre isso”. Mesmo na resolução
de conflitos o presidente aparece como principal figura tanto no que
tange os deficientes intelectuais, quanto aos demais membros, como ele
mesmo relata, no caso dos deficientes, “quando eles tem algum
problema, então eles falam “quero falar com o Seu X (presidente da
cooperativa)” e vem falar comigo “ah, eu não quero ficar mais lá,
porque o fulano brigou comigo”, ai o Seu X tem que interferir, tem que
conversar, conciliar as coisas” (ENTREVISTADO 1).
A intervenção do presidente também foi presenciada claramente
durante as observações. Em determinada situação um dos funcionários
teve uma desavença com outro membro da cooperativa e havia
abandonado o trabalho, em época de maior demanda produtiva, a
interferência de demais colegas e da diretoria não solucionou o caso, que
foi resolvido apenas após um telefone do presidente para o funcionário.
O entrevistado 3, comentou a situação, “é normal em todo lugar,
sempre tem um desentendimento ou outro, e todo mundo fica um pouco
nervoso nessa época, tem muito pedido para entregar, mas o Seu X
(presidente), telefonou para ele e ele vai voltar. O Seu X, sabe
conversar, ouvir e todos tem muito respeito e confiança nele”.
Para o entrevistado 1 não se trata de liderança, para ele é a
forma de condução de sua vida:
Eu não acho que o que eu faço é liderança (...) eu
botei minha vida aqui, corpo e alma, faço porque
gosto, então eu me dedico muito e o pessoal fica
achando que isso é liderança, mas não é, é uma
maneira de viver, de ser, de encarar as coisas, eu
gosto deles (deficientes intelectuais), eu brinco
com eles, eu chego todo dia eu vou cumprimentar
todo mundo. Eu faço isso porque, eu sei o que é
ser pai de deficiente, isso também marca muito, e
a gente sabe como eles são, as dificuldades que
eles tem, então por isso que eu fico ai o tempo
todo, mas agora eu já disse, não tem mais,
ninguém quer, mas eu vou sair da presidência, vai
ter que mudar.
142
O entrevistado 1 justifica sua saída pela necessidade de mudança:
Eu já estou há muito tempo, as pessoas falam “a
cooperativa do X” (referindo-se ao nome do
presidente) já colocaram até em uma placa na
feira da esperança (evento realizado anualmente
na Associação de Pais e Amigos dos Deficientes
(APAE) de Florianópolis), e isso é um absurdo, a
cooperativa não é minha, entendeu o que eu
quero dizer? Precisa mudar a lógica,
pensamentos diferentes na condução da
cooperativa”.
O anúncio da saída do presidente preocupa os membros da
cooperativa e é vista com desconforto, conforme se observa no relato do
entrevistado 8 “eu acho que ele não deveria sair da presidência, como
cargo não, ele que representa nossa cooperativa, ele deve ficar, ele tem
que continuar, por mim ele não sairia não”.
O entrevistado 3 diz não vislumbrar um substituto para o cargo:
Eu me preocupo sim, porque o nosso presidente é
a cara da cooperativa, ele que corre atrás, ele é a
credibilidade da cooperativa, eu não sei quem
faria esse papel, não sei se tem alguém aqui
dentro, porque precisa ter o lado humano, e esse
lado algumas pessoas esquecem e é muito
importante, é empresa, é empresa, é empresa, mas
trabalhamos com pessoas diferentes, mas não só
uma empresa é uma cooperativa, e eles
(deficientes) tem limitações, então, ele
(presidente) é coração puro, compreende os dois
lados”.
Para o entrevistado 3, o lado humano é o diferencial da
cooperativa perante outras empresa, “essa parte do coração mesmo,
essa parte humana é o diferencial, é uma empresa, mas é diferente,
embora nosso trabalho, as vezes, a gente pareça um robozinho, todos
fazendo a mesma coisa, não é, é diferente, é assim como uma família”.
O entrevistado 3, demonstra a mesma preocupação quanto a
preservação dos valores sociais cultivados pelo então presidente:
Ele tem muito essa coisas dos valores sociais, do
humano na cooperativa, então eu tenho
143
preocupação, por causa dessa coisa de ser
eficiente, às vezes a diretoria não tem muito essa
parte do humano, do social, foca muito na parte
do gerenciamento, e na minha opinião, para ser
presidente precisa conciliar os dois lados, ter em
mente que é uma empresa, mas voltada para o
social”.
A capacidade de mobilização dos atores organizacional por parte
do presidente também é apresentado como uma preocupação “o Seu X
(presidente) corre muito atrás e no final sempre acaba reunindo o
interesse das pessoas, acho que porque todas elas acreditam na causa,
no final sempre acaba dando certo, e isso é muito difícil de fazer”
(ENTREVISTADO 8). O entrevistado 2 também salienta a capacidade
de mobilização do presidente, “ele tem, digamos assim, essa habilidade
reunir as pessoas para alcançar um objetivo, sabe? A COEPAD está
aqui hoje muito por causa a essa força, dedicação, que ele tem, se ele
fala “pessoal nós precisamos disso, disso e disso, vamos fazer um
equipe e trabalhar”, todo mundo pega junto e corre atrás”.
Desta forma, verificou-se, de um lado uma estrutura verticalizada
de autoridade, porém que atua com a possibilidade de participação e
grande abertura para o diálogo, por outro. A liderança exercida pelo
presidente possui grande legitimação entre os membros da cooperativa e
apresenta grande capacidade de mobilização, sendo o perfil social do
líder bastante valorizado.
O perfil da liderança, de forma conceitual, pode ser classificado
entre o autoritário e o liberal, sendo, desta forma, considerado como
democrático, pois valoriza a participação, não obstante o predomínio,
por vezes, da voz do líder.
4.1.2.4.3 Avaliação da COEPAD segundo o Critério 3:
Possibilidade exercer a própria vontade
Verificou-se na cooperativa a existência de normas, dispostas em
estatuto, que favorecem o exercício da vontade própria, como os direitos
concernentes ao processo eleitoral e a intervenção em assuntos gerais da
cooperativa e assembleias.
Alguns relatos permitiram vislumbrar possibilidades de exercício
da vontade própria frente às problemáticas encaminhadas pela diretoria,
como no caso relatado pelo entrevistado 3:
144
Eles (diretoria) me pediram para ir para a loja
(localizada do centro de eventos da UFSC),
cheguei na UFSC, de férias, não tinha ninguém e
eu dentro daquela lojinha, a noite eu já liguei
para o Seu X (presidente) e disse “eu não quero
ficar aqui, por favor, eu não consigo ficar longe
deles, eu não gostei de ficar, se quiser pode me
demitir que eu volto a ser voluntária”, e ele me
falou “calma, minha filha, você não está mais na
loja, pode ficar tranquila, você vai voltar para
onde gosta de trabalhar””.
Outro relato semelhante foi descrito:
Ontem queriam colocar essa mesa aqui eu falei
“eu não quero essa mesa aqui, ela parece um
caixão, eu não quero” (risos), até porque não tem
nada a ver que a sala, quando chegaram para
montar, eu falei “desculpa, eu sei que vocês
fizeram com a maior boa vontade, mas eu prefiro
a minha emendada mesmo, que é clarinha”, e o
pessoal
levou
para
outra
oficina”
(ENTREVISTADO 3).
Ao comentar o ocorrido, o entrevistado declarou:
A gente esse tipo de possibilidade, as nossas
vontades são ouvidas, eu acho, nem sempre são
acatadas, mas poder falar já é um avanço, né (...)
no caso do coral, por exemplo, o pessoal tinha
medo que não tivesse tempo de ensaiar, essas
coisas, mas eu conversei direitinho com eles,
ouviram a minha ideia e acabaram concordando”
(ENTREVISTADO 3).
Quanto aos deficientes intelectuais o exercício da vontade própria
foi apenas verificado nas atividades de lazer, “a parte de lazer é eles
que fazem, por exemplo, nós temos o nosso encerramento do ano,
sempre fazemos uma festa de natal e a festa junina, então essas
decisões, eles que organizam, quem casa, quem não casa, quem vai ser
padrinho, vai ter coral, vai ter apresentação, essa parte eles se
organizarem” (ENTREVISTADO 1).
Tais relatos e a discussão das demais categorias de análise
permitiram verificar que em âmbito operacional o exercício das
145
vontades individuais se faz mais presente, todavia em âmbito estratégico
a possibilidade de atuação é mais restrita, pois como as decisões são em
diretoria, podem não convergir com a vontade dos demais atores
organizacionais, ainda que tal convergência seja buscada pelos
dirigentes.
Quanto à cooperativa, enquanto instituição, o maior impedimento
apresentado para o exercício da vontade própria são as limitações
financeiras, que condicionam as decisões da cooperativa à sua
disponibilidade de capital e capacidade de produção.
4.1.2.4.4: Considerações gerais sobre a categoria “Autonomia”
A autonomia dos atores organizacionais encontra alicerces na
valorização do diálogo em todos os âmbitos da cooperativa e na
possibilidade de promover mudanças, ainda que, predominantemente,
restrita ao nível operacional e de lazer dos cooperados. Considera-se
possível que mudanças na esfera gerencial talvez não ocorram devido à
baixa participação dos pais, representantes dos cooperados deficientes.
4.1.3 Avaliação da COEPAD segundo as Categorias da Pesquisa
A intensidade com que as categorias estudadas se aproximam do
entendimento de gestão social em contraponto com a gestão estratégica
será apresentada a seguir, com base nos dados coletados as categorias e
seus respectivos critérios serão analisados e classificados em uma escala
de 1 (um) a 5 (cinco), conforme quadro a seguir:
Quadro 15: Avaliação da COEPAD segundo as Categorias da Pesquisa
Critérios
Intensidade
Categorias
Intensid
ade
Canais de difusão: verifica- 5Processo
de 3se certa pluralidade dos Aproximação
discussão:
é Aproximaç
canais
de
difusão
e alta com os fortalecido
ão
da
capacidade para proporcionar pressupostos da quanto aos canais gestão
acesso à informação para a gestão social.
de difusão da social
e
participação de diferentes
informação
gestão
atores
nos
processos
disponíveis
na estratégica
decisórios
em
âmbito
organização e a em mesma
institucional.
sua clareza e intensidade.
utilidade.
Qualidade da informação: 3-
146
apresenta aspectos positivos
quanto à clareza e utilidade
da informação, porém a
diversidade limitada das
informações
fragiliza
a
socialização democratização
das mesmas.
Pluralidade
do
grupo
promotor: a promoção de
espaços de deliberação e as
conduções das atividades e
discussões
são
feitas,
predominantemente,
pela
presidência da cooperativa e
pelos seus gerentes.
Abertura dos espaços de
decisão:
verificou-se
a
existência de normas que
privilegiam a abertura dos
espaços de decisão. Na
prática administrativa, os
espaços decisórios nos quais
decisões,
principalmente,
estratégicas são tomadas são
formados,
predominante,
pelos dirigentes.
Aceitação
social:
identificam-se traços que
demonstram a existência
preocupação com a criação de
metodologias participativas e
iniciativas,
ainda
que
incipientes, nesse sentido.
Valorização cidadã: para os
membros
que
atuam
efetivamente na cooperativa a
participação nas atividades e
a exposição das opiniões é
bastante
valorizada,
reconhecendo
como
fragilidade a não participação
integral
dos
pais
dos
deficientes cooperados, que,
Aproximação
da
gestão
social e gestão
estratégica em
mesma
intensidade.
1Aproximação
alta com os
pressupostos da
gestão
estratégica.
2
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão
estratégica.
4
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão social.
4
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão social.
Todavia, a falta
de
diversidade
nas informações
disponíveis,
aliada
a
centralidade na
promoção
das
discussões
e
atividades
gerenciais,
fragiliza o caráter
democrático
e
unidimensionaliz
a o processo de
discussão.
Inclusão:
A
inclusão
dos
atores
nos
espaços
de
decisão
está
fortemente
vinculada
à
hierarquia
organizacional.
A valorização da
participação se
faz presente na
organização,
porém de forma
segmentada, não
atingindo todos
os
ambitos
organizacionais.
O
desenvolvimento
de metodologias
participativas
aparece como um
grande avanço no
fortalecimento da
participação.
3
Aproximaç
ão
da
gestão
social
e
gestão
estratégica
em mesma
intensidade.
147
aparentemente,
não
vislumbram como de extrema
importância
a
própria
participação.
Forma de escolha dos
dirigentes:
O processo de escolha de
representantes, presente em
estatuto, apresenta caráter
democrático. Todavia, a
existência de uma única
chapa e a forma meritocrática
com que é formada e que
permeia também a forma de
escolha dos coordenadores,
pode comprometer o caráter
democrático do processo de
escolha dos representantes.
Discursos dos dirigentes:
demonstrou que os dirigentes
parecem
valorizar
a
participação dos diferentes
atores e a pluralidade do
grupo
dirigente.
Diagnosticaram-se traços de
mimetismo organizacional,
em especial, quanto ao
instrumentalismo
que
caracteriza alguns aspectos da
cooperativa.
Avaliação
participativa:
existência de normas que
facilitam o processo de
intervenção e da possibilidade
da
intervenção
e
acompanhamento
das
atividades e problemáticas
discutidas, todavia não foi
possível
verificar,
em
profundidade, a frequência e
a complexidade de tais
intervenções.
Alçada dos atores: apresenta
2
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão
estratégica.
4
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão social.
Igualdade
Participativa:
Foi
possível
verificar
a
existência
de
normas
e
estruturas
capazes
de
proporcionar
isonomia entre os
participantes,
assim como a
valorização dos
dirigentes quanto
a este aspecto,
todavia algumas
contradições nos
processos
fragilizam
a
igualdade
participativa.
4
Aproximaç
ão média
com
os
pressuposto
s da gestão
social.
Autonomia:
4
4
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão social.
4
-
A
-
148
aspectos positivos quanto à
liberdade de expressão de
opiniões
em
diferentes
âmbitos e a receptividade da
diretoria quanto a mudanças
no ambiente operacional. O
que tange a parte estratégica é
conduzido,
predominantemente,
pela
direção da cooperativa, que,
entretanto, é receptiva a
sugestões. Todavia a baixa
participação
dos
representantes dos deficientes
limita as possibilidades de
expressão e intervenção dos
mesmos.
Perfil
da
liderança:
verificou-se, de um lado uma
estrutura verticalizada de
autoridade, porém que atua
com a possibilidade de
participação e grande abertura
para o diálogo, por outro. A
liderança
exercida
pelo
presidente possui grande
legitimação entre os membros
da cooperativa e apresenta
grande
capacidade
de
mobilização, sendo o perfil
social do líder bastante
valorizado.
Todavia,
a
intensidade e o alcance da
liderança
a
tornam
unidimensional e inibem a
sua pluralização.
Possibilidade de exercer a
própria vontade: em âmbito
operacional o exercício das
vontades individuais se faz
mais presente, todavia em
âmbito
estratégico
a
possibilidade de atuação é
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão social.
3
Aproximação
da
gestão
social e gestão
estratégica em
mesma
intensidade.
3
Aproximação
da
gestão
social e gestão
estratégica em
mesma
intensidade.
autonomia dos
atores
organizacionais
encontra
alicerces
na
valorização do
diálogo em todos
os âmbitos da
cooperativa e na
possibilidade de
promover
mudanças, ainda
que,
predominanteme
nte, restrita ao
nível operacional
e de lazer dos
cooperados.
Aproximaç
ão média
com
os
pressuposto
s da gestão
social.
149
mais restrita, pois como as
decisões são em diretoria,
podem não convergir com a
vontade dos demais atores
organizacionais, ainda que tal
convergência seja buscada
pelos dirigentes.
Quanto
à
cooperativa,
enquanto instituição, o maior
impedimento
apresentado
para o exercício da vontade
própria são as limitações
financeiras, que condicionam
as decisões da cooperativa à
sua disponibilidade de capital
e capacidade de produção.
Fonte: elaboração da autora.
O quadro apresenta aproximação dos critérios tanto com
características da gestão social quanto da gestão estratégica. Os critérios
que apresentaram maior convergência com esta última estão
relacionados com a pluralidade do grupo promotor, a abertura dos
espaços de decisão e a forma de escolha dos dirigentes. Com relação à
gestão social, os critérios que apresentam maior convergência vinculamse aos canais de difusão, a aceitação social, a valorização cidadã,
discurso dos dirigentes, a alçada dos atores e a avaliação participativa.
Os critérios que envolvem a qualidade da informação, o perfil da
liderança e a possibilidade de exercer a própria vontade, apresentam em
mesma intensidade aproximações com gestão social e gestão estratégica.
De maneira semelhante, as categorias apresentam, predominantemente,
o mesmo equilíbrio.
4.2 CASO 2: Cooperativa de Mulheres Maricultoras de Governador
Celso Ramos (COLIMAR)
4.2.1 Caracterização da Cooperativa de Mulheres Maricultoras de
Governador Celso Ramos - COLIMAR
A atividade pesqueira faz parte da tradição do município de
Governador Celso Ramos e ainda hoje tem grande importância na
economia local, sendo a maior geradora de renda e ocupação para as
150
famílias, pois cerca de 70% da população, formada por cerca de 13 mil
pessoas, vive direta ou indiretamente da pesca, constituindo-se em um
dos maiores polos produtores de marisco de cultivo do Estado. A
captura do peixe, do camarão, do siri e o cultivo do mexilhão são
exercidos predominantemente pelos homens da região, enquanto as
mulheres, tradicionalmente, se ocupam do processamento do pescado
(COLIMAR, 2012).
Nesse contexto, nasceu a Cooperativa de Mulheres Maricultoras
de Governador Celso Ramos – COLIMAR, fundada em 27 de junho de
2003, com o propósito de agregar valor ao pescado e gerar trabalho e
renda para as famílias dos pescadores.
Figura 09: Sede da COLIMAR, em Governador Celso Ramos/ SC
Fonte: COLIMAR (2012)
A iniciativa de constituir uma cooperativa surgiu do Presidente
da colônia de Pescadores da comunidade na época, Senhor Nei
Custódio, e segundo a entrevistada 3, e também uma das primeiras
cooperadas “ele comunicou as comunidades, os grupos, para juntar as
mulheres e fazer uma cooperativa. Aí, eu entrei nessa, e comecei a
participar das reuniões”. Segundo a entrevistada 3, “ele também
ajudaria a ir à procura do mercado, tendo como objetivo valorizar o
nosso produto, e ter o nosso próprio trabalho, para ajudar a melhorar a
nossa renda familiar e gerar mais empregos para nós mulheres, e para
o nosso município, que oferece pouca oportunidade de trabalho, a não
ser “descascar camarão””.
151
A entrevistada 1 relata as dificuldades enfrentadas no início da
cooperativa “foi bem difícil, bem complicado, a gente não sabia o que a
gente ia fazer, como ia montar uma cooperativa, mas não sabia o que ia
fazer, se era salgadinho, se outro tipo de cooperativa, ai gente teve que
fazer votação, um queria uma coisa outro queria outra, e foi
complicado, porque tinha muita mulher na época, tinha mais de 20
mulher, e foi aprovado como salgadinho” (sic), produto que é feito até
hoje através do beneficiamento de peixe, ostra, marisco e camarão
(casquinhas de siri, bolinhos de peixe, camarão empanado no palito,
mini quiches de ostras, risoles de peixe, croquetes e empadas de
camarão).
Após a decisão dos produtos a serem fabricados, as cooperadas
foram à procura de apoio para iniciar as atividades, que exigia
qualificação técnica “fomos à procura de apoio, fazendo cursos através
da EPAGRI (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural),
SEBRAE (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e
Prefeitura, para conseguir nos qualificar para atender os clientes, que
exigem bastante qualificação nessa linha de produtos”
(ENTREVISTADA 5). Conseguindo inicialmente o certificado da
Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina
(CIDASC), o SIE (Inspeção de Produtos de Origem Animal), e
posteriormente os produtos se enquadram na legislação da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que permite a
comercialização dos produtos a nível nacional (DOCUMENTO
INSTITUCIONAL - COLIMAR, 2011).
A cooperativa iniciou suas atividades com a participação de cerca
de 23 mulheres, porém as dificuldades enfrentadas fizeram com que a
maioria delas desistissem, “foi saindo, foi entrando, foi saindo e daí só
ficou no finalzinho, só tinha ficado 3, foi bem difícil, assim a gente, todo
mundo pensou em fechar, foi bem complicado, foi começo assim, foi
bem difícil, ainda ta difícil, mas foi bem complicado”.
Segundo a entrevistada 3, na época, até mesmo o fechamento da
cooperativa enfrentaria dificuldades “a gente tinha muita dívida, ainda
tem, e ia fechar como? Quem que ia pagar as dívidas da cooperativa?”.
As cooperadas que decidiram dar permanecer, apenas três, foram em
busca do apoio da comunidade para dar continuidade à cooperativa “a
gente foi aqui na comunidade, nos parentes da gente, pra ajudar, se não
a cooperativa ia fechar, até porque ia ficar sem as 20 pessoas que
precisa ter” (sic).
152
Outra grande dificuldade encontrada foi o poder local, pois a sede
da cooperativa é patrimônio da União. Segundo a entrevistada 1, o local
foi cedido pela prefeitura da época, porém sem a formalização da
concessão, o que posteriormente causou problemas, “quando mudou o
prefeito, queriam tirar nós daqui, queriam colocar uma secretaria aqui,
mas a gente foi atrás e conseguiu ficar”. A entrevistada 5, apresenta um
relato mais surpreendente sobre o caso “quando ele viu que não ia
conseguir tirar a gente daqui, nós fomos conversar com ele e sabe o que
ele falou? “não quero saber daquilo, quero mais é que pegue fogo””.
Atualmente as cooperadas possuem um termo de comodato de utilização
do prédio, o que garante temporariamente o seu uso, porém a
insegurança permanece:
Eu acho muito difícil tirarem a gente daqui, o
ministério da pesca doou essas coisa tudo pra
nós, a não ser que mandem a gente pra outro
lado, fazem algo e passem nós pra lá (...) a gente
já tinha conversado com o prefeito que se elegeu
agora, ele prometeu que a gente ia ficar, mas
nunca se sabe, né (sic) (ENTREVISTADA 1).
A falta de incentivo do poder local aparece como uma das
maiores reclamações das cooperadas:
O município não apoia a gente em nada, porque se
o município apoiasse a gente não tava assim
(referindo-se as dívidas), e uma cooperativa que é
assim um exemplo, porque é uma cooperativa só
de mulher, lá em Brasília querem fazer um
trabalho com nós, quer que mande foto da
cooperativa, porque em Santa Catarina é uma
cooperativa de exemplo, é assim, a gente espera
que um dia a gente tenha reconhecimento daqui
(ENTREVISTADA 6).
A entrevistada 4, relata dificuldades, inclusive, nas doações de
produtos para a prefeitura local “não tem apoio, é bem complicado, não
tem um interesse deles, nem os nossos bolinhos a gente entrega aqui, os
de doações, eles não quiseram, a gente entrega em Biguaçu. A gente
entregou uns 200 quilos e ficou uns dois meses ali, o pessoal ia buscar e
eles não entregavam”.
As cooperadas relatam não ter reconhecimento da comunidade
local, conforme narrado pela entrevistada 3:
153
Esses dias eu fui na feira com a camiseta da
COLIMAR e uma vizinha disse: “o que! Essa
cooperativa ainda existe?”Eu disse: “existe!
Porque?” Ela disse: “pensei que nem existia
mais”. Se você perguntar aqui em governador
Celso Ramos onde fica a COLIMAR, eles vão
dizer que não existe mais, aqueles que conhecem
até vão dizer que não conhecem. As pessoas de
longe conhecem mais a COLIMAR que o pessoal
daqui. La em Brasília eles falam da COLIMAR,
aqui ninguém conhece.
A dificuldade levou com que as cooperadas tivessem que buscar
fornecedores de pescado fora da comunidade “o marisco tem que ter o
SIF (certificação do Serviço de Inspeção Federal), a gente podia
comprar do município, mas não tem, e a gente tem que comprar na
Penha (cidade localizada a cerca de 100km de Governador Celso
Ramos), onde a gente achou marisco com fiscalização”
(ENTREVISTADA 6). Perguntadas sobre terem procurados os
pescadores para dialogar sobre o assunto, a entrevistada 4 relata “a
gente tentou conversar com os pescadores, mas eles não querem nem
saber de fiscalização, e não pode, traz problema para a gente, tem que
informar onde a gente vai comprar, tem que ter nota do produtor, os
daqui não querem nem dar a nota. Fica complicado.” A entrevistada 5
afirma que a maioria dos pescadores tem medo da fiscalização “a
maioria dos pescadores é mais velhos, tem a cabeça fechada e os filhos
pensam igual, se você falar em nota fiscal pra eles, não querem nem
saber, não deixam nem falar, tem medo, teve um que saiu quase
correndo daqui quando eu pedi”.
Para resolver o impasse de fornecimento a COLIMAR firmou
parceria com a Cooperativa de Maricultores de Penha - COPERMAPE,
solucionando também o problema de quantidade mínima de cooperados
e permitindo que um projeto com a Companhia Nacional de
Abastecimento (CONAB) fosse realizado, pois o mesmo necessitava da
existência de pescadores cooperados. Segundo a entrevistada 3 os
pescadores da região foram procurados para juntarem-se a cooperativa:
A gente precisava de pescador né, e fomos atrás
deles para ver se eles entravam como cooperado,
mas daí eles começam assim “o que a gente vai
ganhar com isso? Acho que não vale a pena essa
coisa de cooperativa” Aí é difícil né, nós tivemos
154
que ir para a Penha, porque lá tem uma
cooperativa de maricultor, ai tem 9 ou 10
cooperados de lá, que é como se fosse daqui
também, para poder fazer o projeto da CONAB.
A COLIMAR tem parceria também com Cooperativa de
Produção e Abastecimento Vale do Itajaí – COOPER, que adquiri os
seus produtos para comercialização em sua rede de supermercados.
Outra parceria relevante na organização é realizada com o Núcleo
de Abordagem Sistêmica do Design (NASDesign) da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC), e data de cerca de 2 anos, que, dentro
de outros projetos, revitalizou a marca da cooperativa, construindo uma
nova identidade visual e novas embalagens para o produto, como podese observar nas figuras abaixo:
Figura 10: Embalagem antiga dos produtos COLIMAR.
Fonte: COLIMAR (2012)
155
Figura 11: Nova embalagem dos produtos COLIMAR.
Fonte: COLIMAR (2012)
Segundo a entrevistada 1 a parceria com a UFSC foi bastante
positiva “ajudou muito, nossos produtos ficaram mais bonitos, chama
mais atenção, o pessoal gosta bem mais quando olha uma embalagem
bonita”, o que facilitou a colocação dos produtos no mercado.
Atualmente a cooperativa não trabalha com a venda direta para
supermercados, exceto para o ligado a COOPER, pois segundo as
cooperadas existem muitas dificuldades e exigências nesse segmento.
Além disso, uma experiência negativa com uma grande rede europeia,
que possui grande atuação no Brasil, inibiu a inclusão da cooperativa no
mercado de varejo, conforme relata a entrevistada 4, “foram milhares de
exigências, tinha que ser com a marca deles, tudo do jeito deles, cada
coisinha que a gente fazia tinha que mandar por sedex para eles
provarem, tivemos que pagar até uma mulher que trabalha com eles pra
fazer uma inspeção, 3000 mil reais”. A entrevista 2 relata a ocorrência
de muitas mudanças em virtude das exigências do comprador “teve
muitas mudanças, mandamos fazer embalagem diferente, caixa pra
embalar e tudo com o nome deles, fizemos até empréstimo para
conseguir fazer como eles queriam, agora tá aí, tudo guardado, esse
monte de coisas que não o que fazer, porque tem o nome deles”.
De acordo com a entrevistada 5, a demora no recebimento do
produto foi uma das causas dos problemas:
A gente trabalhou dia e noite para dar conta da
encomenda, quando a gente terminou eles
demoraram mais de três meses para aceitarem
156
receber o produto, quando chegou na prateleira
do supermercado já tava quase vencido, e
ninguém compra coisa de peixe quase vencendo,
daí não vendeu e eles simplesmente pararam de
pegar coisas da gente”.
Após a experiência, a cooperativa esteve prestes a fechar as
portas, em virtude das altas dívidas contraídas não apenas em nome da
cooperativa, mas das cooperadas e de seus familiares. A solução foi a
parceria com a CONAB, conforme relato da entrevista 1 “resultado a
gente não temo, porque a gente ta pagando as dívidas, a gente fica
preocupado pra pagar, agora que a gente entrou para o CONAB, a
gente ta pagando tudo direitinho, tá com aos bancos tudo em dia, então
tamos mais tranquila” (sic).
Ainda sobre as dificuldades encontradas, as cooperadas destacam
a mudança constante na legislação, que não favorece as cooperativas, e
os impostos cobrados:
Cooperativa é muito complicado, é muito mais
complicado do que se fosse uma empresa, porque
o imposto é o mesmo que a gente paga, INSS dos
funcionários é mais caro do que uma empresa, a
empresa paga 8% a cooperativa paga 11% se for
para funcionário, eles não fazem uma coisa pra
ajudar as cooperativas, um apoio, não, do jeito
que eles fazem parece que querem que acabe com
tudo, eles não tem uma coisa para ajudar mesmo
(ENTREVISTADA 4).
A entrevistada 2 diz acreditar que a legislação tem feito com as
cooperativas se parecem cada vez mais com empresas tradicionais “tá
ficando tipo uma empresa mesmo, cada vez mais burocracia pra gente,
eles não criam as coisas pras cooperativas, parece que eles copiam das
empresas e colocam pra gente” (sic).
Embora as dificuldades sejam muitas e recorrentes a COLIMAR
completa em 2013, 10 anos de funcionamento, contando com 6
mulheres atuando em suas atividades, sendo que três delas estão desde
sua fundação. As cooperadas almejam que a cooperativa alcance bons
resultados e possa contribuir para o desenvolvimento da região, “a gente
espera assim que possa ter um salário digno e que a cooperativa cresça,
dê emprego mais gente aqui, que tenha reconhecimento, porque foi
157
muito esforço, mas a gente acredita muito, já tamo há 10 anos aí, se
Deus quiser e muito trabalho a gente vai longe”(sic).
4. 2. 2 Descrição e análise dos Resultados com base nas categorias
4.2.2.1 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 1: Processo de
discussão
O “processo de discussão” tem como princípio a deliberação de
problemas mediante a autoridade negociada entre os atores. Para a
análise de tal processo entende-se necessário a atenção a três critérios,
que serão expostos a seguir.
4.2.2.1.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Canais de
difusão
Verificou-se na COLIMAR a existência de poucos canais de
difusão das informações, não havendo o uso de mídias impressas ou
eletrônicas de forma recorrente. O principal meio de difusão das
informações ocorre através da comunicação oral, utilizada desde o
surgimento da cooperativa e que se mantém até hoje. Segundo a
entrevistada 2 “a informação é no boca a boca mesmo, aconteceu
alguma coisa eu vou falar para elas, do mesmo jeito que se acontece
algo com elas, elas vem e me falam”.
O uso de outras mídias é feito apenas para atendimento de
implicações legais, como relatado pela cooperada 2:
Só quando tem a reunião anual daí a gente faz o
edital e publica trinta dias antes, tem que
protocolar o edital e mandar para a junta da
OCESC (Organização das Cooperativas do
Estado de Santa Catarina) e tem que colar em
órgãos públicos, posto de saúde, prefeitura, esse
ano a gente esqueceu de colocar no jornal do
município e tivemos que pagar trezentos reais,
para colocar nos informes, um editalzinho
pequenino. É muita burocracia assim e incentivo
quase nada.
O registro das reuniões realizadas formalmente é feito em livros
que ficam arquivados na sede da cooperativa “toda reunião de coisa
158
importante que a gente faz aqui, a gente coloca no livro pra (sic) saber
o que aconteceu” (ENTREVISTADA 4). Indagadas sobre o acesso as
atas das reuniões que obrigatoriamente precisam ser registradas, a
entrevistada 3 comenta que o acesso é livre a todos :
Os livro fica tudo ali, todo mundo pode olhar a
hora que quiser, tão ali naquelas gavetas (aponta
para as gavetas), se eu não vim na reunião e
quiser saber o que aconteceu é só olhar no livro
que tá escrito lá, só não pode tirar as coisas do
lugar, né, bagunçar. Mas eu nunca faço porque é
mais fácil conversar com a mulherada (sic).
De acordo com as cooperadas, a comunicação oral é suficiente
para atender as necessidades da cooperativa, atribuindo a eficácia
parcialmente ao pouco número de cooperadas, a entrevistada 3 comenta
que “funciona porque a gente tá sempre perto, as que ficaram, quando
era mais gente era mais complicado né, e a gente tá sempre sabendo
como as coisas estão acontecendo e como não está, a gente tá sempre
querendo saber das coisas né” (sic). Para a entrevistada 4, esse tipo de
comunicação é a mais eficiente na cooperativa “eu acho que é
suficiente, é melhor eu falar direto com elas, do que colocar algo na
parede que ninguém vê, nem vão ler um mural, acho que é mais fácil ir
falar com elas diretamente, que já tenho certeza que elas ficaram
sabendo, que tão(sic) informadas do que acontece”.
4.2.2.1.2 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 2: Qualidade da
informação
Os relatos supracitados na categoria anterior salientam aspectos
referentes ao critério “qualidade da informação”, pois as cooperadas
consideram obter todas as informações que necessitam sobre a
organização, “a gente sempre sabe de tudo que tá acontecendo, porque
a gente conversa, né? E aqui não tem aquela coisa de esconder o que tá
acontecendo, acho que por isso que deu certo” (sic).
Para a entrevistada 5, a transparência das ações é primordial para
o andamento da cooperativa “desde que a gente começou aqui com a
cooperativa é assim, sempre com essa ideia de ser transparente, né, de
falar com clareza das coisas, de fazer com que todo mundo fique
sabendo do que acontece, até pras (sic) coisas ficarem em ordem aqui
159
dentro, pra (sic) ninguém ficar sabendo das coisas pela metade, né, não
dar confusão”.
A transparência aparece como um dos principais norteadores da
gestão social, pois, segundo Oliveira, Cançado e Pereira, (2010, p. 622),
“se o processo decisório passa pelo entendimento, pela utilização da
linguagem e comunicação entre as pessoas, as informações devem estar
disponíveis a todos, o segredo e a assimetria de informações também
são estranhos a este processo”, denotando traços de gestão social
presentes na organização.
4.2.2.1.3 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 3: Pluralidade do
grupo promotor
O último critério analisado nessa categoria refere-se a
“pluralidade do grupo promotor”, que envolve o compartilhamento da
liderança nos processos de discussão, sendo eles não conduzidos
unilateralmente. Verificou-se na COLIMAR a proeminência de uma das
cooperadas e atual presidente na condução dos temas a serem discutidos,
“normalmente ela vai falando, explicando as coisas direitinho pra (sic)
gente, tem umas coisas que a gente não entende direito né, e ela vai
explicando” (ENTREVISTADA 6).
Porém, as cooperadas relatam a busca da liderança na
participação de todos, conforme entrevistada 3, “mais é a presidente né,
sempre ela quer participar com a gente, quer nosso apoio, sempre ela
na frente, a gente nunca decide sozinha, quando ela tem uma ideia ela
passa pra gente e quando a gente tem passa para ela também”.
A cooperada 1, atribui a liderança da atual presidente a sua
melhor articulação ao falar e entendimento dos fatos:
Quem toma mais a frente assim é a nossa
presidente né, que ela que entende melhor que nós
assim, né. Agora tem a minha filha que também tá
aqui, que já tem um estudo melhor, nos estudemos
menos e ela já estou mais né, se formou na escola,
a presidente não, mas é que assim, ela é mais
inteligente, assim em termo mais de comunicação,
de entender mais as coisas, ela é melhor do que
nós nessas coisas, tanto que é a presidente (sic).
A educação formal e a habilidade comunicacional apresentaramse como propulsores da liderança na promoção das atividades na
160
organização, pois as cooperadas que possuem menor escolaridade
acreditam que o fato da presidente se comunicar com maior facilidade
ajuda no desenvolvimento das atividades e no relacionamento externo
da cooperativa:
Ela fala melhor que a gente, né, então quando tem
um projeto, alguma coisa assim que precisa
conversar com o pessoal de fora, é sempre ela e
agora com a cooperada mais nova, que tem mais
estudo, né, fica mais fácil de dizer o que a gente
quer, entender o que tem que fazer, consegue mais
fácil as coisas, sabe” (ENTREVISTADA 3).
Segundo a entrevistada 5, foi por iniciativa das cooperadas que a
presidente ocupa essa posição “eu aprendi a falar aqui na cooperativa,
porque eu era muito tímida (...) teve uma vez que veio o governador
aqui na comunidade e elas empurraram a presidente lá para frente para
falar, diziam “você tem que ir lá pra falar melhor da cooperativa””.
Perguntada sobre tal situação, a entrevistada 5 comentou acreditar na
igualdade entre os cooperados “aqui não tem uma que é melhor que a
outra, a gente é tudo igual, mas se elas acham que isso ajuda a
cooperativa, eu vou ajudar né”.
4.2.2.1.4 Considerações gerais sobre a categoria “Processo de
discussão”
Castellà e Parés (2012) destacam que a “situação de maior
qualidade democrática é aquela em que os participantes recebem toda a
informação necessária, podem deliberar sobre ela em condições de
igualdade e podem tomar uma decisão a respeito de forma democrática”.
Ma COLIMAR, o processo de discussão na apresenta traços positivos
quanto à forma como as informações são socializadas na cooperativa, de
forma ampla e transparente, de forma mais relevante em âmbito interno.
Em âmbito externo, as discussões, com parcerias com órgãos públicos,
empresas, discussão de projetos, por exemplo, são conduzidas,
geralmente, pelos mesmos representantes e sem a participação coletiva,
havendo intermediários no processo, ainda que os mesmos sejam
posteriormente discutidos pelas cooperadas.
De modo geral, verificou-se que, mesmo com a existência
limitada de canais de difusão de informação na COLIMAR, as
cooperadas conseguem através do diálogo se manter informadas sobre
161
as atividades da cooperativa, garantido o compartilhamento das
informações de maneira suficiente para que possam ter participação
ativa nas decisões.
Evidências corroboradas pela observação realizada, onde foi
possível acompanhar o fluxo das informações, caracterizado
predominantemente pela informalidade e transmissão imediata e
transparente das informações, o que segundo Tenório et al. (2008, p.10)
pode contribuir para o exercício da participação, pois “para o
desenvolvimento da participação faz-se necessária a fluência das
informações nos diferentes âmbitos participativos”. Observou-se, que o
ambiente colaborativo e a informalidade nas relações fortalecem os
laços criados entre as cooperadas e inibem os entraves que poderiam
dificultar a socialização das informações.
4.2.2.2 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 2: Inclusão
A segundo categoria a ser trabalhada está relacionada à
“inclusão” dos atores nos espaços decisórios e será estudada a partir de
três critérios, a saber: a) abertura dos espaços de decisão; b) aceitação
social, e; c) valorização cidadã.
4.2.2.2.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Abertura dos
espaços decisórios
O primeiro critério a ser trabalhado nessa categoria refere-se a
“abertura dos espaços decisórios”, visando analisar a possibilidade de
articulação de interesses dos indivíduos na cooperativa, que favoreçam a
negociação de conflitos e que proporcionem chances igualitárias de
participação nas tomadas de decisões.
Verificou-se na cooperativa que os espaços de tomada de decisão
são permeados por um caráter deliberativo, sendo o diálogo a base do
consenso, conforme descrição da entrevista 3 “eu acho que a gente é
ouvida sim, o que a gente pensa das coisas a gente pode falar, as vezes
acolhe as vezes não, mas sempre ouve o que a gente fala”. A
entrevistada 5 ressalta o caráter coletivista da decisão “ninguém toma
decisão sozinho, quando tem uma decisão eu procuro elas pra
conversar, ver como fazer, desde coisas mais pequenas até decisões
maiores” (sic). Segundo a entrevistada 6, todas cooperadas tem a
possibilidade de participar das decisões “não participa só se não quiser,
162
porque elas sempre falam que precisa conversar sobre isso ou sobre
aquilo, porque precisa decidir e tem que falar pra achar o melhor pra
fazer, né” (sic).
Com base nos depoimentos das cooperadas e das observações
realizadas, verificou-se a existência de grande abertura para participação
nas tomadas de decisão. A informalidade e o nível de descentralização
são outros aspectos relevantes na organização, sendo observado por
inúmeras vezes durante a pesquisa a paralisação temporária do trabalho
para que uma reunião coletiva fosse realizada, muitas vezes no próprio
local de produção, para que a decisão a respeito de determinado
problema fosse tomada, com a participação de todas as cooperadas.
Segundo a entrevistada 1 a prática é comum na organização “é assim
mesmo, quando a gente precisa fazer a reunião, a gente para um pouco
o serviço e conversa, “ah, tem isso pra decidir” e a gente conversa e
decide”.
4.2.2.2.2 Avaliação da COLIMAR segundo os Critérios 2 e 3: Aceitação
social e Valorização cidadã
Os critérios seguintes possuem relação bastante próxima, pois o
critério “aceitação social” refere-se ao reconhecimento das cooperadas
da necessidade de uma metodologia participativa, enquanto o critério
“valorização cidadã”, considera o quanto a necessidade de participação e
suas implicações são valorizadas pelas cooperadas.
A proximidade dos critérios e a dificuldade no tratamento dos
mesmos em campo, tendo em vista a dificuldade de esclarecimento de
questões como “metodologias participativas”, fez com que fossem
tratados tangencialmente e de forma ampla, buscando compreender a
importância que as cooperadas dão a sua participação e a participação
coletiva.
Verificou-se nas entrevistas que o entendimento de participação é
frequentemente relacionado na cooperativa com o entendimento de
responsabilidade compartilhada e o próprio entendimento de
cooperativismo, que segundo uma das cooperadas contribuiu para a
manutenção e desenvolvimento da organização, conforme a entrevistada
1:
Eu acho assim, que essa coisa de participar
cooperativa de verdade era mais difícil
começo, a gente não entendia nada
cooperativismo, nem sabia o que era, a gente
na
no
de
foi
163
entender mais agora pra frente, que a gente tem
as palestras, as reuniões, tem o seu Elvio, que
ajuda bastante quando a gente precisa, ele é da
OCESC, que trabalha cooperativismo lá (...),
porque tem essa coisa de todo mundo é dono, tem
as responsabilidade, então não pode deixar que
um faça as coisas sozinho, né, é de todo mundo”
(sic).
Segundo a entrevista 6 a necessidade de participação relacionase a responsabilidade “eu acho que é importante participar, porque
quando entra aqui tem que saber que a responsabilidade das coisa que
acontece também é da gente, se der errado não vai ser da presidente só,
e se não ajudar as coisa não vão pra frente depois, né” (sic).
Segundo a entrevistada 3 a participação nas atividades da
cooperativa tornou-se imperativo “a gente fica mais aqui do que na
própria casa, já virou a casa da gente, então não tem como não
participar, nem estaria aqui se não tivesse vontade de participar, a
gente pega amor né, (...) e se não pudesse participar das coisas também
não ficaria né”.
Percebe-se nas cooperadas o sentimento de pertencimento a
organização e de responsabilidade com o seu andamento, vislumbrando
na participação a oportunidade de contribuir para o seu
desenvolvimento.
4.2.2.2.3 Considerações gerais sobre a categoria “Inclusão”
Verifica-se na COLIMAR que a inclusão das cooperadas nos
espaços de decisão ocorre de forma bastante abrangente, capaz de
integrar todas as cooperadas no processo de decisão. Destacou-se
também a valorização da participação demonstrada pelas entrevistadas,
que retratam a participação como uma forma de atuação ativa na
cooperativa.
4.2.2.3 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 3: Igualdade
participativa
Para a análise categoria “igualdade participativa”, foram
utilizados os seguintes critérios: 1) forma de escolha dos dirigentes; 2)
discursos dos dirigentes e; 3) avaliação participativa.
164
4.2.2.3.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Forma de
escolha dos dirigentes
No estatuto social da COLIMAR dispõe-se a escolha dos
dirigentes mediante o voto direito de todos os cooperados, em eleições
realizadas nas assembleias ordinárias, durante as quais o conselho
administrativo precisa ser trocado a cada dois anos e o conselho fiscal
anualmente. Segundo a entrevistada 2 “é obrigatório realizar uma
reunião mensal de administração e do conselho fiscal, e todo ano tem
que ter uma assembleia ordinária, mudar a diretoria, conselho fiscal,
administrativo, todo ano tem que ter”.
Cumprindo as obrigatoriedades as reuniões são realizadas
regularmente, todavia o processo de escolha dos dirigentes é realizado
de maneira diferente, conforme relatado pela entrevistada 3 “quando
chega o tempo a gente combina, não chega a fazer eleição, a gente
combina, conversa e resolve”. A entrevistada 1 conta com mais detalhes
a forma de escolha “a gente se reúne, conversa, uma diz o que acha, a
outra diz o que acha, uma concorda a outra a vezes não, daí a gente
vai, assim, discutindo, né, e diz assim ó (sic) “você vai ser a
presidente”, se aceitou fica, se não aceitou a gente procura outra”.
Questionada sobre o motivo da escolha da atual presidente, a
entrevistada 1 relatou que:
Ela é a terceira presidente nossa, né (...) fizemos
uma reunião e achamos melhor botar aquela,
depois fizemos reunião e achamos melhor colocar
a outra e colocamos, depois ela saiu, ai a gente
pensou assim “a única que tinha mais inteligência
aqui era ela” (atual presidente), que entendia
mais das coisas, ai botemo (sic) ela de presidente
e tá (sic) ai até hoje.
A forma de escolha dos dirigentes apresenta caráter deliberativo,
no qual as cooperadas discutem suas ideias e chegam a um consenso,
como forma de decisão válida, processo bastante próximo ao
entendimento de cidadania deliberativa.
Os fatores que influenciam na escolha como “a mais inteligente”
e “a que sabe falar melhor”, podem influenciar negativamente, caso
sejam usados como instrumentos de convencimento e persuasão, todavia
na COLIMAR não forma identificados traços que demonstrem o uso do
conhecimento de forma negativa, pois, segundo relatos, o conhecimento
165
tem sido usado como apoio aos processos de discussão, conforme
observou-se no relato da entrevistada 6, já exposto anteiormente:
“normalmente ela vai falando, explicando as coisas direitinho pra (sic)
gente, tem umas coisas que a gente não entende direito né, e ela vai
explicando”.
Tal processo converge com o que destaca Tenório (1990. p. 163),
sobre relações participativas, ao destacar que “o saber de quem estudou
deve ser usado como apoio às discussões, mas não como orientador
primeiro na decisão. Numa relação coletiva o poder se dilui entre os
participantes, já que o conhecimento e as informações são
compartilhados, não existindo 'donos da verdade'”.
4.2.2.3.2 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 2: Discurso dos
dirigentes
O “discurso dos dirigentes” apresenta-se como segunda categoria
a ser analisada, buscando verificar a importância atribuída à participação
das cooperadas pelos dirigentes. Neste caso, buscou-se resgatar aspectos
da fala da presidente da cooperativa, assim como identificar aspectos
que possam esclarecer o seu posicionamento através da observação,
tendo em vista o reconhecimento dos membros da organização quanto a
sua liderança.
Verificou-se durante a observação que a presidente busca
compartilhar suas decisões com as cooperadas, buscando-as sempre que
um problema aparece. Segundo a entrevistada 5 todas as ações são
realizadas em conjunto e não seria correto que apenas a decisões fossem
tomadas sozinhas “aqui todo mundo faz tudo, e faz todo mundo, quando
é para limpar o chão são todas que limpam, quando é para cozinhar
são todas que cozinham, e quando é para tomar uma decisão também,
nem todo mundo pensa igual, mas a gente conversa, temos uma amizade
muito grande”. A entrevistada 2 corrobora a informação de que as
atividades são realizadas em conjunto “acho que ninguém pensa, assim
“ vou fazer sozinho”, “vou decidir isso sozinho”, todo mundo tenta
ajudar o outro aqui, pensa no conjunto”.
A entrevistada 5 destaca a importância da união dentro da
cooperativa “se a gente não fosse unida, se todas não pegassem junto, a
gente não tava (sic) mais aqui, com todas essas dificuldades (...) a gente
virou uma família, todas se ajudam e fazem as coisas juntas, por isso dá
166
certo, eu acho”. Na fala da entrevistada 5 verificou-se novamente o
sentimento de coletivismo presente na cooperativa:
Tu imagina se todas não participassem, se a gente
não ajudasse umas as outras, agora faz uns três
meses que eu não venho mais direto pra cá
(cooperativa), porque meu pai tá (sic) doente e eu
tenho que levar ele pro (sic) hospital, essas
coisas, e elas estão tocando direto, tomam as
decisões que precisa, não fica dependendo de
mim, sabe, mas elas sempre me deixam
acompanhando as coisas e, se elas chamarem que
precisa conversar eu venho também”.
Destaca ainda ser esse o motor da sustentação da cooperativa,
“dá certo porque é assim, porque a gente é unida, não tem diferença
entre a gente, porque a gente consegue ouvir, respeitar a opinião do
outro, mesmo que às vezes a gente pense diferente (...) se fosse só pra
(sic) fazer o serviço da gente e ir embora trabalhava numa empresa né,
ganhava mais do que aqui”.
O discurso da presidente converge com as características
observadas nas ações cotidianas da organização, no qual a participação
coletiva é vista como uma forma de gerenciar e dar continuidade à
cooperativa, uma forma de “fazer com que dê certo”, pois a
responsabilidade quanto aos rumos da organização é compartilhada.
4.2.2.3.3 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 3: Avaliação
participativa
O critério “avaliação participativa” busca compreender as
intervenções dos participantes no acompanhamento e avaliação nos
processos de tomada de decisão.
A COLIMAR não dispõe de nenhuma ferramenta ou metodologia
formal para a avaliação e acompanhamento das decisões. Ao ser
indagada sobre o acompanhamento das decisões a cooperada 6 declarou
que “a gente tá (sic) sempre aqui, então a gente vê se deu certo ou não
deu”. Segundo a entrevistada 4 “quando a gente percebe que a coisa
não tá (sic) indo bem, a gente faz uma reunião e conversa “ah, porque
não deu certo”, “onde que a gente errou”, “o que a gente tem que
mudar””.
167
Abordando a igualdade participativa de forma ampla, ao serem
indagadas sobre a participação das cooperadas e a sua própria, a
entrevistada 1 respondeu“tudo a gente faz, a gente sempre combina uma
com a outra, sempre trocando a ideia, as vezes uma tá nervosa e a outra
tá mais calma, mas no final das contas a gente sempre se entendeu bem,
graças a Deus (sic)”.
Sobre a reflexão a respeito da participação a entrevistada 1
respondeu que “eu nunca fiquei pensando “ah, será que eu participo
bastante”, eu chego aqui e tem as coisas pra (sic) fazer, tem os assunto
pra (sic) discutir, e eu to (sic) sempre lá, fazendo as coisas, falando”.
Segundo a entrevistada 4, o próprio processo autoexcluí “acho que
quem não queria participar de verdade não ficou na cooperativa, já
saiu, não se adaptou”.
Desta forma, verifica-se a ocorrência da avaliação participativa
através da ampla e ativa participação das cooperadas em todos os
âmbitos organizacionais.
O fomento ao processo de aprendizado coletivo apresenta-se
como uma oportunidade a ser explorada pela organização, para além de
processos produtivos e princípios cooperativistas, tendo em vista, por
exemplo, o desenvolvimento de metodologias que permitam a maior
intervenção no acompanhamento e avaliação nos processos de tomada
de decisão.
4.1.2.3.4 Considerações gerais sobre a categoria “Igualdade
participativa”
De acordo com Castellà e Parés (2012, p. 242) um processo
participativo de qualidade “deve possibilitar que seus participantes
deliberem em condições de igualdade, tenham capacidade de fazer
propostas e, finalmente, tomem uma decisão de forma democrática”. Na
COLIMAR a participação apresenta-se bastante igualitária, propiciando
a todas as cooperadas a oportunidade de deliberação. O
desenvolvimento de metodologias que permitam maior e melhor
acompanhamento das atividades aparece como uma oportunidade a ser
explorada.
168
4.2.2.4 Avaliação da COLIMAR segundo a Categoria 4: Autonomia
A “autonomia” dos cooperados será a próxima a ser discutida,
tendo em vista o entendimento quanto à possibilidade de participação
indistinta nos processos decisórios, e será analisada através dos
seguintes critérios: 1) alçada dos atores; 2) perfil da liderança e; 3)
possibilidade de exercer a própria vontade.
4.2.2.4.1 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 1: Alçada dos
atores
Nesse âmbito, discute-se primeiramente a “alçada dos atores”
visando verificar com que intensidade os atores organizacionais podem
intervir nas problemáticas discutidas.
Segundo a entrevistada 2, as cooperadas tem a liberdade de
expressar as opiniões e discuti-las, “pode pelo menos opinar, não é
assim que sempre vai ser aceito o que eu penso, na verdade nem tem
como acontecer isso, até porque eu penso de uma forma, tenho uma
opinião e ela tem a dela, mas todas são ouvidas, a gente conversa e
coloca a que melhor se encaixa na situação”.
A entrevistada 4, ressalta a existência de abertura para a
participação “não tem isso de não pode falar, não pode dar a opinião, a
gente gosta de fazer escutando a vontade das pessoas, é assim mesmo, e
todo mundo quer que seja assim, todo mundo conversando”.
A forma como as problemáticas que são discutidas em âmbito
organizacional permite às cooperadas interferir e participar de forma de
maneira bastante igualitária. Quando as discussões ultrapassam os
limites da organização a representação das cooperadas é feita,
normalmente, pela presidente da cooperativa, conforme a fala da
entrevista 1:
Os problemas assim de fora, de ir lá falar com o
pessoal do governo, por exemplo, eu não sei
resolver, eu sei cozinhar (...) aqui na cooperativa
a gente é tudo amiga, então a gente fala do jeito
que sabe, né, (...) coisa de presidente,
comunicação, não funciona para mim, não sei
falar muito, me comunicar muito, porque mesmo
não tive muito estudo.
169
Os assuntos discutidos fora da cooperativa são trazidos às demais
cooperadas, que tem a possibilidade de discuti-los coletivamente, como
foi verificado durante as observações realizadas.
4.2.2.4.2 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 2: Perfil da
liderança
O critério seguinte busca investigar o perfil da liderança, sua
forma de condução das atividades e sua capacidade de mobilização dos
atores envolvidos. Baseando-se nas observações e entrevistas é possível
afirmar que a liderança apresenta características descentralizadoras e
perfil democrático, permitindo que o poder decisório seja diluído entre
as cooperadas, evidenciado, por exemplo, na condução das atividades
pelas cooperadas na ausência da presidente e na ampla possibilidade de
participação, como é possível observar no relato da cooperada 3 “ela
sempre pede a opinião da gente, as vezes até tem a opinião dela, mas
ela sempre fala com a gente, para ver se a gente aceita”. Traços da
característica da liderança podem ser extraídos da fala da entrevistada 4,
que destaca a participação de todas as cooperadas, inclusive a
presidente, em diferentes atividades:
Nós construímos isso aqui junto, a gente não
briga, uma cooperativa tem que ter união,
bastante união, porque aqui todo mundo faz
tudo, a gente limpa, a gente lava, faz
salgadinho, não tem nada daquilo que porque
aquela é presidente, aquela é não sei o que, que
muda o serviço, não tem nada disso, aqui pega
tudo junto, na hora de decidir e não hora de
trabalhar (...)não tem diferença se é presidente
ou não, não tem nada que se eu sou cozinheira
não vou fazer aquilo, ou a que é presidente não
vai para cozinha...nada, ela tá sempre lá na
cozinha ajudando (sic).
O compartilhamento da liderança é algo relevante, apresentado
por Castellà e Parés (2012, p. 230) como essencial para o processo
participativo, pois “a existência de uma liderança compartilhada pode
dar maior grau de eficiência e coerência ao processo participativo”.
A figura da presidente não representa a instituição autocrática da
liderança e ocupa um papel de “porta-voz” da cooperativa. O
170
acompanhamento de algumas reuniões permitiu a constatação de que a
presidente costuma tratar os assuntos de forma bastante plural, sem a
imposição de sua vontade, usando o seu conhecimento de forma a dar
suporte para as cooperadas que apresentam mais dificuldade, conforme
foi declarado por uma das cooperadas “nas reunião ela (a presidente)
vai explicando as coisa) pra gente, porque tem muita coisa que eu não
entendo direito (sic)” (ENTREVISTADA 3). Neste caso, a presidente
atua como uma facilitadora do processo de discussão, tendo em vista
que sua legitimidade depende da compreensão dos envolvidos sobre os
assuntos em questão, conforme salienta Tenório (1990), ao dizer que o
saber deve ser usado como apoiador dos processos de discussão e não
como seu orientador maior.
Quanto à capacidade de mobilização dos atores envolvidos por
parte da liderança, não foi possível verificar com clareza a intensidade
com que isso ocorre e de que forma é feita em situações mais
complexas.
O que foi possível verificar quanto à mobilização das cooperadas
relaciona-se ao processo produtivo e ao envolvimento das famílias das
mesmas, em especial em momento de grande demanda e na manutenção
das instalações, conforme relatos da entrevistada 3, “quando tem pedido
muito grande, a gente trabalha até tarde da noite, a família ajuda
também, meu marido as vezes vem aqui, pinta uma coisa aqui, arruma
lá, se precisar entregar ele entrega, pega, a família das outras ajuda
bastante, sempre que precisa eles vem também”.
4.2.2.4.3 Avaliação da COLIMAR segundo o Critério 3: Possibilidade
de exercer a própria vontade
Discute-se ainda nesta categoria, a “possibilidade de exercer a
própria vontade”, visando identificar normas, procedimentos e outros
processos que permitam o exercício da vontade individual e coletiva.
Sobre tal aspecto, verificou a existência de normas dispostas em
estatuto, que privilegiam a exposição das vontades individuais e especial
coletivas, principalmente no que tange as estâncias deliberativas.
As cooperadas ao serem questionadas sobre o assunto deram os
seguintes depoimentos:
Assim, não é que pode fazer o que quer né, tem
que ter compromisso com a cooperativa, mas a
gente assim, como é que diz? É flexível, né, a
gente tenta entender o que tá acontecendo, por
171
exemplo, eu fiquei doente e fiquei um mês sem vir
em julho, agora a que é nossa presidente tá com
problema na família e não pode vim sempre (...) a
gente tenta se ajudar (sic) (ENTREVISTADA 1)
Entrevistada 3: “a vontade da gente as vezes não dá, né, porque a
gente é um grupo, então a gente tem que pensar que não é só a gente
sozinho, que tem mais gente, as vezes um pensa diferente do outro,
então tem que achar um jeito”. Desta forma, percebe-se que os
objetivos coletivos são colocados à frente dos individuais na condução
da cooperativa.
As entrevistas demonstraram que muitos anseios das cooperadas
são colocados em segundo plano, pois a situação financeira impõe
limitações à consecução de muitos objetivos pessoais. A entrevistada 1
declarou que:
A gente pensa mais na cooperativa do que na
gente mesmo (...) a gente planeja e pede pra Deus
que dê certo, que a gente pague as dividas, que
um dia a gente tenha um salário digno, que até
hoje nos não tivemos, é isso que a gente espera, a
gente tá lutando para isso, mesmo se a gente não
alcançar, mas tem o filho da gente que alcança
(sic).
Segundo a entrevistada 4, as limitações financeiras ainda são
empecilhos para o exercício da vontade individual e coletiva “a gente
ainda tem muita dívida, fez até empréstimo no nosso nome, do marido,
então às vezes a gente precisa se preocupar mais com isso, tem muita
coisa que a gente queria, mas ainda não dá pra fazer, mas todas nós
temos o sonho de ver a cooperativa diferente”.
Todavia, para as entrevistas a cooperativa trouxe benefícios
quando a cidadania, a possibilidade de maior autonomia, conforme
podemos observar na fala da entrevistada 2 “faz se valorizar mais,
porque não tá dependendo só do marido, vai ter o próprio dinheiro,
para as coisas que quiser, “ah, hoje eu quero ir no salão fazer isso”,
não precisa pedir pro marido pra fazer isso, ela vai lá e faz, quer
comprar uma roupa, comprar um presente, quer sair de casa um
pouco”. A entrevistada 5 relata a importância da cooperativa para a
cidadania:
Eu acho que ajuda na cidadania porque eu
aprendi que a gente tem direitos e que tem que
172
lutar por eles, ninguém vai bate na tua porta pra
te dar eles, e que unida a gente consegue fazer as
coisas também, ter um emprego melhor, às vezes
nem por causa do dinheiro, talvez empresa ganha
mais, mas ser o próprio patrão, aprender a
entender o outro, trabalhar em equipe mesmo, é
difícil ter isso”.
Para entrevistada 3, a cooperativa aparece como uma
oportunidade de socialização “foi importante, eu comecei a sair mais, a
aprender mais, hoje eu to aqui por isso, pela amizade, pelo
aprendizado, é um lugar que eu me sinto bem”.
Acredita-se que o entendimento do que seja participação supera o
formalismo e a obrigatoriedade na cooperativa, sendo mais um
sentimento de pertencimento social, conquistado por mulheres de
origem humilde e pouca escolaridade, que conseguiram através do
trabalho e da cooperação um lugar na sociedade e a superação da
dependência familiar e, certamente, deram um importante passo na
busca por sua cidadania e o desenvolvimento de sua região.
A cidadania aqui discutida converge também com as palavras de
Tenório (2012, p.31), que a relaciona com um “agir deliberativo sob o
qual são promovidas, intersubjetivamente, considerações e/ou
argumentos com o objetivo de decidir sobre algo que beneficie o
conjunto daqueles envolvidos”.
4.2.2.4.4 Considerações gerais sobre a categoria “Autonomia”
A autonomia das cooperadas é identificada na grande liberdade
de expressão e deliberação na organização, assim como as
características descentralizadoras na gestão. Todavia, quando a
cooperativa enquanto instituição a intensidade da autonomia esbarra nas
preocupações financeiras e nas imposições vindas do mercado.
4.2.3 Avaliação da COLIMAR segundo as categorias da pesquisa
A intensidade com que as categorias estudadas se aproximam do
entendimento de gestão social em contraponto com a gestão estratégica
será apresentada a seguir, com base nos dados coletados as categorias e
173
seus respectivos critérios serão analisados e classificados em uma escala
de 1 (um) a 5 (cinco), conforme quadro a seguir:
Quadro 16: Avaliação da COLIMAR segundo as categorias da pesquisa.
Critérios
Intensidade
Categorias
Intensidade
Canais de difusão:
existência de poucos
canais de difusão da
informação, porém
eficientes.
4 - Aproximação
média
com
os
pressupostos
da
gestão social.
Qualidade
da
informação:
a
transparência
e
fluidez
das
informações
são
comuns
à
organização
e
valorizadas
pelos
cooperados.
Pluralidade
do
grupo promotor: a
iniciativa
das
deliberações
costuma ter origem
na liderança da
cooperativa e são
conduzidas por ela,
porém
com
possibilidade
e
valorização
da
intervenção
das
cooperadas.
Abertura
dos
espaços de decisão:
o
caráter
deliberativo
e
participativo
permeia os espaços
decisórios.
5 - Aproximação alta
com os pressupostos
da gestão social
Processo
de
discussão:
a
transparência
apresenta-se como
principal
aspecto
positivo, enquanto a
origem
das
proposições carece
de maior pluralidade.
4
Aproximação
média com os
pressupostos da
gestão social.
Inclusão: a inclusão
das cooperadas nos
processos decisórios
vincula-se
fortemente a um
sentimento
de
pertencimento
a
5
Aproximação
alta com os
pressupostos da
gestão social .
3 - Aproximação da
gestão
social
e
gestão estratégica em
mesma intensidade.
5 - Aproximação alta
com os pressupostos
da gestão social
174
Aceitação social e
Valorização
cidadã:
a
participação
é
tratada
como
essencial para o
andamento
da
cooperativa
(produção,
administração, etc.)
e
considerada
inerente ao próprio
cooperativismo.
5 - Aproximação alta
com os pressupostos
da gestão social
organização e de
responsabilidade
com
o
seu
andamento,
vislumbrando
na
participação
a
oportunidade
de
contribuir para o seu
desenvolvimento.
Forma de escolha
dos dirigentes: os
dirigentes
são
escolhidos
em
deliberações
realizadas
pelas
cooperadas.
Discursos
dos
dirigentes:
a
liderança
da
cooperativa mostrase interessada na
participação
de
todas e as procura
sempre que uma
decisão precisa ser
tomada.
Avaliação
participativa:
inexistência
de
ferramenta
ou
metodologia formal
para a avaliação e
acompanhamento
das
decisões
Acompanhamento
das decisões através
da percepção no dia
a
dia
dos
5 - Aproximação alta
com os pressupostos
da gestão social
Igualdade
Participativa:
a
participação
na
cooperativa
apresenta-se bastante
igualitária,
propiciando a todos
a oportunidade de
deliberação.
O
desenvolvimento de
metodologias
que
permitam maior e
melhor
acompanhamento
das
atividades
aparecem como uma
oportunidade a ser
explorada.
5- Aproximação alta
com os pressupostos
da gestão social
4Aproximação
média
com
os
pressupostos
da
gestão social
5
Aproximação
alta com os
pressupostos da
gestão social
175
encaminhamentos e
resultados.
Oportunidade para o
desenvolvimento de
metodologias
que
permitam
maior
acompanhamento
das atividades.
Alçada dos atores: 5 - Aproximação alta
as cooperadas tem a com os pressupostos
possibilidade
de da gestão social
expor suas opiniões
e discuti-las em
todos os âmbitos da
organização.
Perfil da liderança: 5 - Aproximação alta
apresenta
com os pressupostos
características
da gestão social
descentralizadoras.
Possibilidade
de 4 - Aproximação
com
os
exercer a própria média
vontade:
o pressupostos
da
coletivismo é mais gestão social
valorizado que as
vontades pessoais na
organização.
A
preocupação com o
saldo das dívidas da
cooperativa, muitas
vezes, acaba por
sobrepor
as
vontades individuais
e
coletivas
aos
imperativos
financeiros.
Fonte: elaboração da autora.
Autonomia:
a
autonomia
das
cooperadas
é
identificada
na
grande liberdade de
expressão
e
deliberação
na
organização, assim
como
as
características
descentralizadoras
na gestão. Todavia,
quando a cooperativa
enquanto instituição
a intensidade da
autonomia esbarra
nas
preocupações
financeiras e nas
imposições vindas
do mercado.
5
Aproximação
alta com os
pressupostos da
gestão social .
Com base no quadro apresentado verifica-se que a maioria dos
critérios apresentou proximidade com os pressupostos de gestão social,
apenas o critério “possibilidade de exercer a própria vontade”
apresentou características equilibradas, tanto de gestão estratégica como
de gestão social. Em consequência, as categorias também se mostram
próximas da gestão social.
176
177
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As teorias organizacionais, apesar de seu constante
desenvolvimento, carregam, predominantemente, em seu âmago, a
busca pela produtividade e máxima eficiência, traços advindos dos
primórdios dos estudos organizacionais e característicos das Escolas
Clássica e Científica da Administração. O gerencialismo e o
instrumentalismo que norteiam a racionalidade administrativa
tradicional perpassam épocas e se fazem presentes nas organizações
atuais, mesmo que com novas roupagens e revestidos de nomenclaturas
mais suaves.
Por muito tempo, acreditou-se haver uma única melhor maneira
de administrar, orientada por uma única racionalidade, baseada no
cálculo e no utilitarismo. E desse entendimento desenvolveram-se
teorias, técnicas, estruturas, seguindo a mesma orientação e
incorporando a lógica competitiva de mercado, não apenas em empresas
tradicionais de produção e serviços, mas em âmbito público e na esfera
pública não estatal, um espaço próprio da sociedade civil, na qual,
muitas iniciativas de base social emergem, como é o caso das
cooperativas estudadas nesta dissertação. Todavia a incorporação de
uma lógica mercadológica na condução de organizações que não
possuem como objetivo único o lucro e se estruturam de maneira
cooperativa ao invés de competitiva, surge como uma problemática a ser
discutida.
Diante desta problemática, a preocupação primeira desta pesquisa
está na compreensão da gestão destas organizações e para tanto, julgouse pertinente estudar a participação dos atores organizacionais no
processo de decisão, tendo como base o entendimento de gestão social,
orientada por uma racionalidade comunicativa/substantiva, que entende
a deliberação e o consenso como forma de decisão válida e que se
contrapõe à gestão estratégica, aquela guiada pela racionalidade
instrumental, na qual o cálculo utilitário das consequência é o orientador
maior do processo decisório.
Para o alcance do objetivo geral desta pesquisa entendeu-se
importante, primeiramente, contextualizar as cooperativas estudadas.
Em atendimento ao primeiro objetivo específico apurou-se que as
cooperativas apresentam convergência quanto às suas origens, ambas
foram fundadas através da mobilização da sociedade civil em busca de
um objetivo comum e de alternativas para o enfrentamento de uma
178
problemática social, que não encontra solução nem na esfera estatal,
nem na mercadológica. A problemática enfrentada pode parecer
divergente, em um primeiro momento, todavia, carrega em sua essência
os mesmos anseios, que podem ser resumidos no excerto retirado de um
documento institucional da COEPAD (2012), “as discussões daquele
grupo giraram em torno da dependência dos portadores de deficiência
em relação aos seus familiares, dificuldades de adaptação à sociedade
competitiva e outros aspectos relativos à constante subordinação”
(grifo nosso). Assim como no caso dos deficientes intelectuais, o grupo
de mulheres fundadoras da COLIMAR, buscavam além da geração de
renda, a conquista de independência frente à família. Nas palavras de
Pedro Demo (1995) a autonomia cidadã depende também da superação
da subordinação financeira. As dificuldades de adaptação à sociedade
competitiva também é comum a COLIMAR, pois a pouca escolaridade
aliada às escassas oportunidades de qualificação e à carência de
emprego na região, dificultam as inserção dessas mulheres no mercado
de trabalho.
O processo de formação das cooperativas também apresentam
traços comuns. Ambas foram constituídas após um longo período
preparatório e sucessivas deliberações, nas quais as decisões eram
tomadas por consenso negociado e tinham caráter deliberativo e
coletivista. Todavia, o desenvolvimento das cooperativas foi distinto, a
COEPAD aumentou consideravelmente o seu número de membros,
passou de cerca de 20 (vinte), em sua fundação, para mais de 50
(cinquenta), em 2012, já a COLIMAR, iniciou suas atividades com
cerca de 30 membros e hoje conta com a atuação efetiva de apenas 6
(seis). A COEPAD, por ser uma cooperativa social, tem em seu grupo
categorias diferenciadas de associados, que incluem deficientes
intelectuais, seus pais e voluntários, além de possuir funcionários em
cargos gerenciais (gerente de produção e coordenadores de oficinais, por
exemplo), o que não ocorre na COLIMAR, e pode influenciar no
distanciamento entre o número de associados.
As estruturas organizacionais adquiriram formas diferenciadas,
ainda que as duas cooperativas sigam as exigências legais e tenham a
formação comum a todas as cooperativas (assembleias, conselho
administrativo e conselho fiscal), pois, no caso da COEPAD, tais
estruturas são mais representativas, assim como a formalidade dos
cargos, enquanto na COLIMAR representam mais o cumprimento de
formalidades do que efetivamente instâncias administrativas, já que a
179
atuação de seus membros se aproxima das características de um grupo
de trabalho.
Em linhas gerais, verificou-se que a COEPAD atravessou um
maior processo de burocratização em suas estruturas, agregando maior
formalismo em seus processos e rigidez em sua hierarquia, enquanto a
COLIMAR, manteve um caráter bastante informal em sua estruturação,
preservando com maior proximidade a sua forma inicial.
O conhecimento processo de construção e consolidação das
cooperativas permite melhor compreensão das características que
permeiam os seus processos gerenciais e, especificamente, a forma de
condução dos processos decisórios, servindo como suporte para a
caracterização da participação dos atores organizacionais no
processo de tomada de decisão das cooperativas estudadas, tendo
como base as seguintes categorias, orientadas pela gestão social:
processos de discussão, inclusão, igualdade participativa e
autonomia, que se materializa como segundo objetivo específico desta
pesquisa. Antes de iniciar as discussões sobre o segundo objetivo da
pesquisa, ressalta-se que as categorias analíticas serão abordadas de
forma transversal, pois, durante a análise dos dados, percebeu-se a
interface muito próxima entre alguns critérios e categorias e, que, por
delimitação da pesquisa e escolha metodológica, não foram trabalhadas
de forma amplamente integrativa.
O estudo dos processos de discussão permitiu verificar que a
COEPAD possui maior diversidade em seus canais de difusão da
informação frente à COLIMAR, todavia a qualidade das informações
aparece com maior intensidade nesta última, possivelmente, devido a
fluidez da informação, que no caso da COEPAD, assume uma dimensão
mais verticalizada, disseminando-se, por vezes, através de uma
“cascata” hierárquica.
A transparência apareceu como um aspecto positivo em ambas
cooperativas, pois o pleno conhecimento das informações, planejamento
e resultados é essencial para o fortalecimento da capacidade interventiva
e de exposição de opinião dos atores organizacionais, e para que possam
avaliar e propor conscientemente as alternativas a serem discutidas,
sendo, então, de extrema importância a criação de canais eficazes de
informação.
A pluralidade do grupo promotor se expressa de forma não muito
intensa em ambos os casos, pois a promoção e condução das
180
problemáticas e atividades são, predominantemente, realizadas pelas
lideranças organizacionais.
Com base nos critérios estudados, conclui-se que o processo de
discussão na COLIMAR se aproxima em maior intensidade do
entendimento de gestão social em comparação à COEPAD, pois
apresenta uma forma menos burocrática e mais dialógica, enquanto na
COEPAD, a fluidez dos processos participativos nas decisões esbarra,
muitas vezes, em sua estrutura formal.
Em seguida, analisou-se a inclusão dos atores organizacionais nos
processos decisórios, iniciando as discussões pela abertura dos espaços
decisórios. A análise deste critério apresentou associação com as
características do desenvolvimento organizacional das cooperativas,
apresentado no início destas considerações, pois, no caso da COLIMAR,
os espaços deliberativos de discussão, característicos de sua formação,
foram mantidos e contam com a participação de todos os membros. No
caso da COEPAD, o ajustamento formal de suas estruturas aos padrões
burocráticos, possivelmente relacionados ao grande crescimento da
organização, restringiu a participação coletiva em determinados espaços
decisórios, como, por exemplo, no que tange as decisões administrativas
restritas a diretoria.
Sobre os critérios que tangiam a valorização da participação e de
metodologias participativas por parte dos membros das cooperativas,
verificou-se que na COLIMAR, apesar da inexistência de metodologias
formais efetivadas de participação, averiguou-se que seus membros
valorizam a participação e a consideram essencial para o
desenvolvimento coletivo. A COEPAD apresenta situação semelhante
quanto aos membros que atuam efetivamente na cooperativa, entretanto,
conforme relatado, os pais, representantes formais dos deficientes
intelectuais, oferecem relutância em participar.
Desta forma, conclui-se que a inclusão dos atores nos espaços de
decisão na COEPAD está fortemente vinculada à hierarquia
organizacional, traço da gestão estratégica, e na resistência de
determinados atores organizacionais em serem incluídos nestes espaços.
Na COLIMAR, a inclusão vincula-se fortemente a um sentimento de
pertencimento à organização e de responsabilidade compartilhada com o
seu andamento. A valorização da participação se faz presente em ambas
as cooperativas, porém, na COEPAD, de forma segmentada, não
atingindo todos os âmbitos organizacionais, novamente relacionada a
resistência em participar de determinados atores. Sendo a autonomia um
181
dos pressupostos do processo decisório baseado na cidadania
deliberativa (TENÓRIO, 2008), a COLIMAR apresenta maior
convergência com tal concepção.
Quanto ao estudo da igualdade participativa nas organizações,
analisou-se, primeiramente, a forma como os dirigentes são escolhidos,
critério que despertou interessantes percepções, a começar pelo processo
de escolha da COLIMAR, que apresenta caráter deliberativo e
coletivista, acordado após consenso negociado entre as cooperadas. O
relato do critério predominante na escolha da atual presidente,
relacionado à maior escolaridade e melhor comunicação, é ressaltado
por Tenório (1999) com cautela, pois de acordo com o autor, o
conhecimento deve ser usado como apoio às discussões e não como
orientador maior dos processos decisórios, fato observado na
COLIMAR.
Na COEPAD, o processo em si de escolha de dirigentes, obedece
às disposições em estatuto, sobre a possibilidade de candidatura
extensiva a todos os membros e o voto igualitário, conferindo caráter
democrático ao processo. Contudo, o histórico eleitoral da cooperativa
demonstrou a ocorrência apenas de eleições com uma única chapa,
definida pelas lideranças, mediante julgamento meritocrático, além de
certa dependência para com o presidente, que está no cargo desde o
início da cooperativa. Fatos que fragilizam as qualidades democráticas
do processo e são vistos como preocupação pelo presidente da
cooperativa.
O sentimento de confiança e apego entre os membros da
cooperativa e as lideranças é, certamente, um fator de coesão
organizacional, todavia, pode acarretar na concentração de poder de
determinados dirigentes, reduzindo a alçada dos demais atores
organizacionais e conduzindo a práticas paternalistas, traços estranhos à
prática da gestão social.
A tomada de decisão mediante consenso e deliberação na escolha
dos representantes aproxima a COLIMAR em maior grau das
propriedades da gestão social quando comparada as características
predominantes no processo de escolha da COEPAD. Pois, com base em
Tenório (2002), a gestão social pressupõe a concordância entre os
indivíduos, através do diálogo e do consenso como forma de tomada de
decisão válida, contrariando a lógica positivista, predominante "no
mundo dos sistemas" que carrega mecanismos funcionalistas.
182
O discurso dos dirigentes das duas cooperativas convergiu
fortemente quanto à valorização da participação dos atores e ao esforço
para integrar diversos atores organizacionais.
Verificou-se, na COEPAD, um discurso relacionado à
“empresarização” da cooperativa, com a adoção de práticas comuns a
gestão tradicional, fato que pode tornar as ações gerenciais
progressivamente instrumentalizadas, divergindo do caráter participativo
das organizações cooperativas em essência.
Acredita-se ser possível que o desconhecimento de alternativas
gerenciais conduza as lideranças a incorporarem na cooperativa,
experiências provenientes das organizações onde atuam ou atuaram,
predominantemente, privadas e públicas. Configura-se, então, um dos
desafios à gestão social, em vistas ao desenvolvimento de metodologias
convergentes com organizações de cunho social e coletivo, e sua
consolidação teórica e prática, como alternativa de gestão participativa,
deliberativa e democrática.
No que tange a avaliação participativa, que visou analisar
disposições sobre a avaliação e acompanhamento das decisões tomadas
nas cooperativas, verificou-se traços de gestão social em ambas as
organizações, ainda que com configurações diferenciadas. Na COEPAD,
contatou-se a existência de normas, dispostas em estatuto, e órgãos,
direcionados ao acompanhamento e avaliação das atividades, assim
como reuniões avaliativas, entretanto, não foi possível averiguar a
intensidade e complexidade dessas intervenções. No caso da
COLIMAR, constatou-se a não existência efetiva de normas ou órgãos
destinados a promover o acompanhamento e avaliação por parte de seus
membros, entretanto, as cooperadas relatam acompanhar as atividades e
debater conjuntamente o andamento das decisões.
Tendo como base os critérios da forma de escolha dos dirigentes,
discurso dos dirigentes e avaliação participativa, conclui-se que, ambas
as cooperativas, apresentam traços convergentes com a gestão social no
que tange a igualdade participativa, pois, ainda que não em totalidade, a
isonomia entre os membros é valorizada e encontra mecanismos para se
expressar.
Algumas barreiras à igualdade participativa estão refletidas em
critérios da última categoria analisada, a autonomia, como, por exemplo,
nos critério alçada dos atores e possibilidade de exerce a própria
vontade. Na COEPAD, verificou-se que tais critérios possuem vínculo
com a hierarquia da organização, pois a alçada e o exercício das
183
vontades individuas aparecem com relevância no âmbito operacional,
enquanto o nível estratégico é condicionado, predominantemente, pelos
dirigentes. O perfil das lideranças apresenta uma estrutura verticalizada
de autoridade, porém que atua com a possibilidade de participação e
grande abertura para o diálogo. Acredita-se ser possível que mudanças
na esfera administrativa não ocorram devido à baixa participação dos
pais.
O estudo dos mesmos critérios na COLIMAR apresentou maior
convergência com a gestão social, tenho em vista uma gestão mais
descentralizada e com ampla possibilidade de participação em todos os
âmbitos, onde o coletivismo predomina no exercício das vontades.
Ressalta-se, que em ambas as organizações, as dificuldades financeiras
aparecem como um forte entrave para o exercício da autonomia das
mesmas frente seu ambiente externo, visto que, algumas decisões
acabam por esbarrar nas preocupações financeiras.
A discussão feita até o momento destacou de forma ampla a
intensidade com que as categorias estudadas se aproximam das
características de gestão social em contraponto à gestão estratégica,
terceiro objetivo deste trabalho, que foi alcançado, e se apresenta
detalhadamente nos quadros 16 e 17.
O alcance dos três objetivos supracitados permitiu a consecução
do objetivo geral: analisar a participação dos atores organizacionais
nos processos de tomada de decisão, à luz da gestão social, em duas
cooperativas catarinenses.
Em linhas gerais, concluiu-se que a participação dos membros da
COLIMAR nos processos decisórios aparece com maior intensidade,
assim como o caráter deliberativo e consensual das decisões é mais
acentuado. De forma semelhante, apresenta fortes traços de gestão
social, desde sua origem até a forma como está atualmente estruturada, e
de cidadania deliberativa, que significa “que a legitimidade das decisões
deve ter origem em espaços de discussão orientados pelos princípios de
inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do
bem comum” (TENÓRIO, 2008, p. 148), traços encontrados na
cooperativa de forma abrangente. Na COEPAD, averiguou-se, de forma
mais latente, a coexistência de traços de gestão social e de gestão
estratégica no que tange a participação dos atores organizacionais no
processo decisório, pois apresenta maior burocracia em suas estruturas e
processos, todavia com possibilidades de participação e potencial para a
sua ampliação.
184
Considera-se possível que o desenvolvimento histórico das
organizações, que faz da COEPAD, atualmente, maior que a COLIMAR
em número de membros e com uma estrutura mais complexa (com
diversas oficinas de trabalho e diferentes categorias de associados),
tenha influência na configuração dos processos decisórios e,
consequentemente, na forma como a participação dos seus membros se
efetiva. Assim como, o interesse coletivo em participar, presente na
COLIMAR, e que encontra dificuldades na COEPAD, aparecem como
influenciadores do formato atual dos processos decisórios nas
organizações estudadas.
Por fim, destaca-se que a gestão social, vista como utópica por
muitos, encontra formas de expressão na prática organizacional e se
apresenta potencial para emergir como alternativa de gestão para
organizações cooperativas e, que, independente das práticas de gestão
utilizadas, as cooperativas apresentadas se configuram como exemplos
de organização popular e de enfretamento às problemáticas sociais,
desempenhando um importante papel social e na conquista da cidadania
de seus membros, construindo oportunidades efetivas de inclusão social
e desenvolvimento coletivo.
5.1 Sugestões para pesquisas futuras
A partir da realização desta pesquisa sugere-se que estudos
semelhantes sejam realizados visando abarcar outras realidades
organizacionais, como, por exemplo, em instituições privadas e
públicas.
Propõe-se também a ampliação da pesquisa, com a utilização de
todas as 6 (seis) categorias de análise e seus respectivos 21 (vinte e um
critérios) critérios, propostos por Tenório et al. (2008), para a análise de
processos decisórios participativos. Uma vez que, nesta pesquisa, o
recorte feito limitou as categorias e critérios analisados.
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198
APÊNDICES
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA
Atividade
que
desempenha
___________________________________
na
organização:
1. Há quanto tempo você trabalha na cooperativa?
2. Como e porque você se integrou a cooperativa?
3. Como se obtém informações sobre as atividades da cooperativa?
4. Você considera que as informações que chegam ate você são claras? Os
objetivos são transparentes?
5. A informação que você recebe na cooperativa é clara, útil e suficiente
para atender seus interesses como cooperado?
6. Os canais de comunicação empregados são capazes de mobilizar os
cooperados para os propósitos da cooperativa?
7. Você considera que a cooperativa consegue reunir diferentes interesses
em torno de um objetivo comum?
8. Na cooperativa, quem mais promove ou busca promover atividades
conjuntas?
9. Como você enxerga a participação dos cooperados nos processos de
tomada de decisão?
10. Há abertura de espaços para a participação com iguais chances para
todos os cooperados no processo de tomada de decisão?
11. Você considera que os cooperados participam acompanhando e
avaliando os processos decisórios da cooperativa?
12. Você considera que sua opinião e ouvida e respeitada pelo grupo?
199
13. A cooperativa possui relação/parceria com outras cooperativas, órgãos
de governos, empresas privadas?
14. Você acha que elas interferem nas atividades, decisões e na liberdade da
cooperativa?
15. E os órgãos regulamentadores? Qual sua percepção sobre eles?
16. Os poderes locais aceitam as medidas propostas pela cooperativa? Já
houve a ocorrência de algum embate dessa natureza?
17. Você considera que a cooperativa exerce sua autonomia e independência
na sua relação com as demais instituições da sociedade?
18. Os representantes da cooperativa são escolhidos por eleições? Você
participa ou já participou de alguma delas?
19. Você participa das assembleias anuais? E das reuniões de grupo
recorrentes?
20. A participação na cooperativa permite o exercício da sua vontade e da
vontade coletiva dos demais cooperados?
21. Os dirigentes da cooperativa compartilham a liderança com os demais
cooperados?
22. Você considera que os dirigentes da cooperativa valorizam no discurso e
na prática a participação dos cooperados?
23. Os lideres da cooperativa conduzem a deliberação e execução dos
processos da cooperativa de forma descentralizada?
24. Como você avalia a necessidade da metodologia participativa da
cooperativa?
25. Você considera importante e necessária a sua participação na
cooperativa para a valorização de sua condição de cidadão?
200
26. Como você avalia o perfil e comportamento dos cooperados nos
processos de democráticos de participação na cooperativa?
27. Você considera que, na maior parte dos casos, o processo decisório da
cooperativa é realizado com base no diálogo, no entendimento ou
realizado com base no cálculo, utilidade e maximização dos recursos?
28. Você acredita que a cooperativa tem alcançado bons resultados?
29. O rumo da cooperativa é condizente com a sua vontade ou você acredita
que ela deveria estar em outro caminho?
201
APÊNDICE B – ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
Data: ___________ Local: ___________________
Evento
observado:
________________________________________________
As categorias de observação foram adaptadas dos critérios de
avaliação de processos decisórios de Tenório et al (2008) descritas na
metodologia do presente trabalho, sendo assim elas estão dispostas da
seguinte forma:

Processo de discussão:
 Como as informações são difundidas na organização? Há murais,
informativos, utilização de correios eletrônicos, dentre outros meios de
comunicação?
 Como a comunicação oral ocorre? Quais os assuntos são tratados?
 As informações são transmitidas de forma clara e transparente? Há
dificuldade de compreensão das mensagens?
 Quais atores organizacionais promovem as discussões? Há o destaque
de algum ator neste processo?
 Quais os atores organizacionais são mais participante nos processos de
discussão?
 Quais as limitações dos processos de discussão?






Inclusão:
Os espaços decisórios apresentam qual configuração?
Quais atores organizacionais aparecem com relevância nestes espaços?
Há predominância de algum grupo ou indivíduo?
Quais grupos ou indivíduos não participam do processo?
Os atores organizacionais demonstram preocupação ou interesse pela
própria participação e pela participação coletiva?
 Os atores organizacionais demonstram preocupação ou interesse pelo
desenvolvimento de metodologias participativas?
202

Igualdade participativa:
 Há discussão ou opiniões sobre a forma com que os representantes são
escolhidos?
 Os dirigentes demonstram interesse na participação dos diversos atores
organizacionais?
 Os dirigentes buscam a participação ou opinião dos atores
organizacionais?
 Os atores organizacionais expressam suas opiniões com liberdade?
 Os atores organizacionais intervêm no acompanhamento e avaliação nos
processos de tomada de decisão? Como isso ocorre? Com que
frequência? Em quais âmbitos?
 Há metodologias ou normas que permitam e/ou fomentem a intervenção
dos atores organizacionais?
 Há metodologias ou normas que fomentem a igualdade participativa?
 Quais são entraves à igualdade na participação?

Autonomia:
 Os atores organizacionais podem intervir nas problemáticas da
organização? Como isso ocorre? Com que abrangência?
 Quais problemáticas os atores organizacionais costumam intervir?
 Os atores organizacionais tem liberdade de organizar e/ou decidir sobre
as atividades que desenvolvem?
 Existe a possibilidade do exercício da vontade individual? E da
coletiva? Como isso ocorre? Qual a abrangência?
 Como se expressam as vontades individuais?
 A liderança da organização apresenta características autoritárias,
democráticas ou liberais?
 A liderança é centralizada ou descentralizada?
 Há compartilhamento da liderança? Qual a abrangência?
Demais impressões da pesquisadora:
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203
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KARIN VIEIRA DA SILVA GESTÃO SOCIAL E