Anuário da Produção
Acadêmica Docente
AVALIAÇÃO NO ENSINO SUPERIOR:
CENÁRIOS E TENDÊNCIAS1
Vol. III, Nº. 5, Ano 2009
Adriane M. Soares Pelissoni
Faculdade Anhanguera de Campinas
unidade 2
[email protected]
RESUMO
Avaliar um conteúdo ou uma disciplina não é algo isolado, ou somente de
responsabilidade do professor. Este procedimento está conectado ao
contexto mais amplo do ensino, não pode ser visto somente na relação com a
disciplina ministrada. A prática avaliativa é de suma importância nos
diferentes níveis de ensino e está sendo modificada de acordo com os novos
paradigmas educacionais. Este artigo é resultado de levantamento
bibliográfico e tem por objetivo discutir a diferenciação entre avaliação do
ensino e avaliação da aprendizagem de acordo com os teóricos das últimas
décadas. Foi realizado também um panorama sobre a avaliação da
aprendizagem no ensino superior, para isto foram apresentados e discutidos
os conceitos de competência e habilidades relacionados as atividades deste
nível de ensino.
Palavras-Chave: avaliação; conteúdo; competência; educação.
ABSTRACT
Evaluating content or a discipline is not something separate, or only the
teacher responsibility. This procedure is connected to the broader context of
education, can not be seen only in relation to the subject taught. The
evaluation practice is very important at different levels of education and is
being modified according to the new educational paradigms. This article is
the result of literature review and aims to discuss the distinction between
evaluation of teaching and learning assessment according to the theorists of
recent decades. Was also carried out an overview assessment of learning in
higher education, for it were presented and discussed the concepts of
competence and skills related activities at this level of education.
Keywords: assessment; content; competence; education.
Anhanguera Educacional S.A.
Correspondência/Contato
Alameda Maria Tereza, 2000
Valinhos, São Paulo
CEP 13.278-181
[email protected]
Coordenação
Instituto de Pesquisas Aplicadas e
Desenvolvimento Educacional - IPADE
Informe Técnico
Recebido em: 20/07/2009
Avaliado em: 13/02/2010
Publicação: 21 de abril de 2010
1 Material da 1ª. aula da Disciplina Avaliação do ensino e da aprendizagem,
ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Didática e Metodologia do
Ensino Superior – Programa Permanente de Capacitação Docente. Valinhos, SP:
Anhanguera Educacional, 2009.
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184
Avaliação no ensino superior: cenários e tendências
1.
AVALIAÇÃO NO ENSINO SUPERIOR: CENÁRIOS E TENDÊNCIAS
A sala de aula é um local repleto de acontecimentos, no qual estão em cena dois
protagonistas: professores e alunos. Alguns dos acontecimentos que aí se desenrolam
marcam a totalidade dos discentes, como é o caso da avaliação. Quem não teve contato
com aquele aluno que “deu um branco” na hora da prova, que chorou ou até mesmo
aquele que lhe interpelou no corredor dizendo: “Quebra essa professor, é só meio ponto!”
Ao longo da história educacional e no cotidiano de nossas práticas educativas,
avaliar é quase sinônimo para prova, um procedimento único e padrão, no qual o
professor atesta a capacidade ou incapacidade do educando perante um dado
conhecimento (DEMO, 2009). No entanto, as teorias no campo pedagógico vêm
demonstrando que avaliar é algo mais amplo, envolve o processo de ensino e
aprendizagem, a mediação do professor, a relação com o saber, o desenvolvimento de
competências e habilidades.
Os currículos da Anhanguera Educacional são montados visando desenvolver
competências e habilidades, de acordo com o projeto pedagógico de cada curso. Ao
preencher o seu diário de classe você tem contato com estas competências e habilidades a
serem desenvolvidas. Assim, ao assumir o ensino por competências e habilidades não é
possível reproduzir práticas avaliativas de memorização de conteúdos e de classificação
dos alunos. É necessário ampliar a concepção de avaliação, que pode ser entendida como
processo, diagnóstico, condutor de novas práticas.
Avaliar um conteúdo ou uma disciplina não é algo isolado, ou somente de
responsabilidade do professor. Este procedimento está conectado ao contexto mais amplo
do ensino, não pode ser visto somente na relação com a disciplina ministrada. Por isso,
este artigo tem por objetivo discutir a diferenciação entre avaliação do ensino e avaliação
da aprendizagem. Pretende, além disso, fornecer um panorama sobre a avaliação da
aprendizagem, os conceitos de competência e habilidades.
2.
AVALIAÇÃO DO ENSINO X AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Para introduzir a temática da avaliação educacional é necessário diferenciar alguns
conceitos que na prática docente se misturam e, muitas vezes, chegam a ser considerados
sinônimos. O que significa avaliar? Seria medir o conhecimento? Testar?
Segundo o dicionário Aurélio, avaliar significa: ”determinar a valia ou o valor de;
apreciar ou estimar, o preço, o merecimento, calcular, estimar; fazer a apreciação; ajuizar”.
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Enquanto medir, significa “determinar ou verificar, tendo por base uma escala fixa, a
extensão, medida, ou grandeza de; comensurar; ser a medida de.” Já Luckesi (2006)
aponta que a definição mais comum e adequada para avaliação seria “um julgamento de
valor sobre manifestações relevantes da realidade, tendo em vista uma tomada de
decisão” (p.33).
Sendo a avaliação um julgamento valorativo, é necessário fazer uma distinção
entre os objetos que esta ação se destina no campo educacional. É comum encaramos
como avaliação educacional somente o procedimento pedagógico que o professor executa
frente à aprendizagem dos alunos, isto seria somente um dos aspectos da avaliação
educacional. Este processo, que envolve o julgamento valorativo da aprendizagem do
aluno é denominado por Luckesi (2006) de avaliação da aprendizagem.
Já avaliação do ensino é o processo que certifica a qualidade do ensino oferecido,
feito por órgãos oficiais. Como nos mostra Carbonari (2009), a avaliação do ensino na
Anhanguera Educacional envolve tanto a qualidade percebida quanto a qualidade certificada.
A qualidade percebida, conceito criado pela instituição, reflete a percepção dos alunos em
relação à qualidade do serviço educacional prestado. Esta avaliação é realizada por meio
do programa de avaliação institucional (PAI). Já a qualidade certificada é o resultado das
avaliações externas realizadas pelos órgãos oficiais (MEC e INEP), por meio das
autorizações e reconhecimento dos cursos, e pelos resultados do ENADE – Exame
Nacional de Desempenho dos estudantes.
A presente disciplina foi organizada a partir, justamente, deste entendimento de
que a avaliação educacional envolve tanto a avaliação da aprendizagem como a avaliação
do ensino. Nas duas primeiras aulas, focaremos atenção nas discussões teóricas sobre a
avaliação da aprendizagem, dando ênfase as possibilidades de ações dos docentes no
ensino superior. Já nas duas últimas, abordaremos as discussões sobre avaliação do
ensino, com ênfase para o Programa de Avaliação Institucional (PAI) e do SINAES
(Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior).
3.
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Avaliação da aprendizagem ganhou o centro das discussões no campo educacional há
algumas décadas. Segundo Demo (2009), as práticas educativas ainda seguem o modelo
tradicional de ensino, no qual o professor repassa grande quantidade de conteúdo e o
aluno trata de absorver, guardando na memória até o dia da provas. Luckesi (2006)
acrescenta que as práticas avaliativas são decorrentes de um processo histórico iniciado
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com a escola moderna, que podem ser exemplificadas com as práticas de provas e exames
praticadas nos colégios jesuítas no inicio do século XVI. Isto conduz à conclusão de que o
reprodutivismo escolar faz parte da história educacional brasileira, situações atuais fazem
com que estas práticas ainda sejam amplamente difundidas no ensino. Principalmente por
ser um sistema de ensino propedêutico e voltado para preparação para provas seletivas e
classificatórias como o vestibular, e não para o sucesso acadêmico do aluno
(HOFFMANN, 1996).
Segundo Luckesi (2006), a atual prática da avaliação escolar estipulou como
função do ato de avaliar a classificação e não o diagnóstico, como deveria ser
constitutivamente. Ou seja, o julgamento de valor que teria a função de possibilitar a
tomada de decisão sobre o objeto é entendido como algo estático e finalizado. Assim, é
possível classificar o objeto avaliado a partir de padrões previamente estabelecidos. Em
todo o sistema de ensino, atribuem-se menções ou notas que são distribuídas numa escala
subordinada a média. É possível identificar similaridade deste cenário com muitas
práticas que fazem parte do cotidiano acadêmico das instituições de ensino superior. O
que se propõem aqui não é uma revolução das práticas, mas sim um entendimento do seu
significado da avaliação da aprendizagem e a sua adequação ao objetivo proposto.
De acordo com Luckesi (2006):
A avaliação educacional escolar assumida como classificatória torna-se, desse modo, um
instrumento autoritário e frenador do desenvolvimento de todos os que passarem pelo
ritual escolar, possibilitando a uns o acesso e aprofundamento no saber, a outros a
estagnação ou evasão dos meios do saber. Mantém-se, assim a distribuição social. (p.37)
Neste sentido, a aula continua sendo o centro nevrálgico da educação superior. A
função básica dos professores é dar aula e dos alunos é freqüentar a aula, sendo que a
freqüência é uma das formas decisivas da avaliação. Isso coloca em cheque a grande
questão “aula não é necessariamente aprendizagem” (DEMO, 2004). O aluno pode e deve
aprender de outras formas, para além da aula expositiva. Esta discussão nos remete à
ligação entre avaliação e aprendizagem. Como já abordado por Barbosa (2009), aprender
possui um sentido polissêmico, depende, em grande parte, da teoria de aprendizagem
que se tem em mente. Então, avaliar a aprendizagem significa estar em contato com uma
visão pessoal sobre avaliar, é identificar e refletir sobre a crença pessoal sobre este ato.
Este processo reflexivo pode ser resumido através da respostas a três perguntas:
1) O que entendo por aprender?
2) O que é avaliar?
3) O quê e como os alunos deveriam aprender?
A avaliação também possui diferentes definições e objetivos que foram
apresentadas ao longo das últimas décadas. Ressalta-se que os conceitos abordados fazem
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contraposição ao modelo tradicional de ensino, isto é, dão ênfase aspectos e objetivos
diferentes para avaliação da aprendizagem puramente classificatória. Para ter-se um
panorama desta diferentes perspectivas, foi construído o Quadro 1, que sintetiza os
principais entendimento da avaliação nas últimas décadas.
Quadro 1 – Quadro teórico de abordagem da avaliação da aprendizagem nas últimas décadas.
Autor
Conceito de avaliação
Ênfase da avaliação
Ralph Tyler
(1949)
O processo de avaliação consiste essencialmente em
determinar em que medida os objetivos educacionais
estão sendo realmente alcançados pelo programa do
currículo e do ensino.
Caráter funcional
Daniel Stufflebeam
(2007)
Avaliação é o processo de delinear, obter e fornecer
informações úteis para o julgamento de decisões
alternativas.
Caráter processual
Michael Scriven
(1967)
Avaliação é uma atividade metodológica que consiste
na coleta e na combinação de dados relativos ao
desempenho.
Diferença entre avaliação
e mensuração
Bloom, Hastings e
Madaus (1983)
Avaliação é um método de coleta e de processamento
dos dados necessários à melhoria da aprendizagem e
do ensino. Avaliação é superior ao rotineiro exame
escrito. Avaliação auxilia no esclarecimento dos
objetivos.
Definição dos objetivos
A análise do Quadro 1 permite identificar que a avaliação da aprendizagem
possui diferentes funções. Destaca-se o caráter funcional, no qual a avaliação determina a
eficácia do ensino, isto é, se os objetivos educacionais que foram propostos estão sendo
alcançados; o caráter processual, no qual avaliação é um meio de obter informações e
reconduzir as práticas educativas; o papel da avaliação na aprendizagem na definição dos
objetivos do ensino, sendo a avaliação uma forma de acessar a aprendizagem e auxiliar na
recondução dos objetivos do ensino.
É possível identificar a diferença entre avaliação e mensuração. A mensuração
seria somente uma forma objetiva, quantitativa e classificação numérica da aprendizagem,
o que Luckesi (2006) denominou de caráter classificatório da avaliação da aprendizagem.
Segundo Scriven (1967), avaliação da aprendizagem não é uma forma de mensuração, é
algo ao mesmo tempo objetivo e subjetivo, pois atribui valores; é um julgamento, a partir
de dados objetivos. Isso significa dizer que avaliação da aprendizagem pode fazer uso da
mensuração, mas para que tenha o caráter emancipatório é necessário extrapolá-la. A
avaliação da aprendizagem pode ser quantitativa e qualitativa, pois é possível julgar a
aprendizagem a partir da sua quantidade e/ou da qualidade.
Como apresenta Perrenoud (1999), a avaliação da aprendizagem deve ser,
sobretudo,
formativa.
Este
entendimento
leva
o
professor
a
observar
mais
metododicamente os alunos, a compreendê-los melhor, de modo a ajustar de maneira
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Avaliação no ensino superior: cenários e tendências
sistemática e individualizada suas intervenções pedagógicas e as situações didáticas que
propõem. Tudo isso numa expectativa de aperfeiçoar as aprendizagens dos alunos. Essa
concepção se situa abertamente na perspectiva da regulação intencional da aprendizagem,
cuja intenção é determinar o caminho já percorrido por cada um e aquele que resta a
percorrer com vistas a intervir para otimizar o processo de aprendizagem em curso. Desta
forma, a avaliação formativa trás perspectiva de ação tanto para alunos como para
professores, é um conjunto de informações que devem ser interpretadas e conduzir novos
meios de ação.
Assim, o ato de avaliar não pode ser visto como algo isolado, pronto e acabado.
Ele deve ser entendido como ato emancipatório, que supera os limites da aprendizagem
tanto dos alunos como dos professores. Dentro desta perspectiva, faz-se necessário
repensar as formas de devolução, o retorno desta avaliação (feedback). Esta situação pode
ser sintetizada a partir de questionamentos comuns aos docentes:
•
Como informar o aluno sobre o status de sua aprendizagem?
•
A nota traduz a aprendizagem?
•
Como auxiliar o aluno na construção de um caminho a aprender?
Perrenoud (1999) coloca que esta devolução ao aluno deve ser objetiva, voltada
para os objetivos do ensino e, acima de tudo, deve ser um mecanismo de auto-regulação
aos alunos. Ou seja, que possibilite uma reflexão ativa, que supere a classificação
valorativa e coloque o aluno frente a uma postura ativa de sua aprendizagem, que o faça
agir de diferentes formas para o alcance dos objetivos educacionais e pessoais.
Em síntese, a avaliação da aprendizagem deve superar o caráter puramente
classificatório que normalmente orienta as práticas educativas na atualidade. Esta deve
ser entendida como um processo contínuo e sistemático, que é funcional e orientadora dos
objetivos educacionais propostos ao ensino. Ou seja, a avaliação deve ter uma função
diagnóstica, a partir da qual se verifica a situação da aprendizagem dos alunos para
propor novos meios de mediação e de intervenção do professor. É uma leitura da
aprendizagem dos alunos e também uma forma de promover a auto-regulação da
aprendizagem entre os discentes.
Tendo em vista a importância do processo de avaliação da aprendizagem e sua
relação com a eficácia do ensino, a seguir serão abordados os conceitos de competências e
habilidades aplicados à atividade da docência no ensino superior. Esta relação se faz
necessária para identificar e evidenciar as competências e habilidades do professor para
promover uma avaliação da aprendizagem emancipatória.
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4.
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ENSINO E AVALIAÇÃO: DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS E
HABILIDADES
No senso comum, a palavra competência está associada à excelência. Percebemos esta
condição quando ouvimos ou falamos: “aquele professor é realmente competente” ou “os
alunos conseguiram aprender porque aquele professor é muito competente”. Assim,
parece claro que na linguagem do senso comum a competência está associada a um
conjunto de elementos que permitem a um sujeito abordar uma situação complexa e
resolvê-la a contento (MORETTO, 2008).
Para introduzir esta temática foi necessário recorrer a teóricos da educação que
fazem uma conceituação sobre competência e habilidades. Este assunto não é algo
consensual entre os acadêmicos da área educacional, mas sim motivo de inúmeras
discussões e diferenciação a partir da matriz teórica assumida. Desta forma, optou-se em
apresentar o conceito apresentado por Philippe Perrenoud (1999, 2000), amplamente
utilizado no cenário educacional, principalmente, no ensino superior.
Para Perrenoud (1999), competência “é a capacidade do sujeito de mobilizar
recursos (cognitivos) visando abordar uma situação complexa” (p.159). Como evidencia
Moretto (2008), o conceito de competência se relaciona a quatro aspectos importantes:
1) Competência é algo individual, está ligado ao fato de “ser capaz de”.
2) A ação de mobilizar significa movimentar com força interior, não um ato
automático de transferência de um lado para outro.
3) No que tange a competência, os recursos são algo mais amplos que somente os
recursos cognitivos, isto é, são necessários conhecimento intelectual e recursos no
domínio emocional.
4) Competência está relacionada a uma situação complexa que envolve conteúdos
específicos, habilidades e procedimentos, linguagens, valores culturais e
administração das emoções.
Sendo assim, fica evidente que competência se relaciona intrinsecamente com
habilidades, porém são coisas distintas. Competência está no campo da amplitude, de
buscar recursos (cognitivos e emocionais) visando uma situação complexa. Enquanto a
habilidade está associada ao saber fazer, isto é, está relacionada a uma ação, física ou
mental, indicadora de uma capacidade adquirida (PERRENOUD, 1999)
A Anhanguera Educacional, ao assumir um ensino baseado em habilidades e
competências, quer oferecer ao educando algo além da formação especifica de uma
profissão (o saber fazer). Almeja oferecer um ensino que seja capaz de promover
competências entre os discentes. Ou seja, deseja desenvolver nos alunos recursos
cognitivos e emocionais para que possam abordar uma situação complexa que extrapole
os limites da situação acadêmica e educativa.
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Avaliação no ensino superior: cenários e tendências
Este fato se relaciona claramente com a avaliação da aprendizagem, pois um
ensino comprometido com o desenvolvimento de competências e habilidades não pode
avaliar de forma estática e classificatória seus alunos. Não é possível usar métodos
avaliativos que só conseguem dar informações sobre o estado e condição da
aprendizagem. Além disso, de acordo com o escopo teórico não é possível desenvolver
competências e habilidades de forma instantânea, este é um processo de formação que
acontece ao longo do tempo (PERRENOUD, 2000). Por isso, os instrumentos de avaliação
da aprendizagem devem ser construídos com a perspectiva formativa.
Esta perspectiva não quer dizer que os instrumentos clássicos de avaliação
(provas escritas e orais, trabalhos, seminários) serão extintos e substituídos. Ao contrário,
isto quer dizer que os instrumentos de avaliação devem ser entendidos de outra maneira,
consoantes a perspectiva de ensino assumida. Desta forma, a avaliação da aprendizagem
pode e deve incluir procedimentos como provas, trabalhos escritos ou orais, mas estes
devem estar relacionados ao desenvolvimento de competências e habilidades e serem
visto como um momento de diagnóstico da aprendizagem, e não como um momento de
acerto de conta entre professores e alunos.
Moretto (2008) faz uma aplicação do conceito de competência e analisa as
características de um professor competente, segundo os conceitos de Perrenoud (1999),
em duas situações complexas: ao operacionalizar uma aula e ao avaliar a aprendizagem
dos alunos. Segundo o autor, o professor competente no ensinar:
•
Conhece o conteúdo especifico de sua disciplina – identifica os assuntos
relevantes, tendo em vista o contexto dos alunos. Assim, o professor
necessita de um contínuo estudo da sua disciplina, tanto do ponto de
vista dos conteúdos conceituais como nos processos de ensino. Esta
mesma competência também foi apontada por Demo (2009), o professor
deve estar constantemente envolvido em atividades criativas, de pesquisa
e inovação.
•
Tem habilidade no ensinar – o professor sabe administrar uma aula,
escolher as estratégias adequadas ao grupo de alunos, de acordo com as
necessidades do grupo no que tange aos aspectos psicossociais e
cognitivos.
•
Identifica valores culturais ligados ao ensinar – o professor consegue
situar a sua atuação profissional com os elementos de um paradigma que
se estabeleceu ao longo do tempo. Não vê a sua atuação docente
desconectada dos fatores sociais e culturais, influenciada tanto pelos
meios de comunicação como pelos elementos socioeconômicos.
•
Utiliza a linguagem pertinente – é capaz de utilizar linguagem pertinente
para facilitar a construção de relações significativas. Sempre que utiliza
um termo desconhecido (muitas vezes utilizamos termos técnicos em sala
de aula totalmente desconhecidos pelos alunos) faz a sua contextualização
utilizando para recursos de aproximação com os alunos.
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•
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Administra as emoções – é capaz de administrar o mundo amplo de
emoções existente dentro de uma sala de aula (raiva, ira, medo, alegria,
insegurança), sem precisar apelar para punição ou autoritarismo, é um
dos recursos que o professor precisa ter para enfrentar a situação
complexa de ensinar.
As competências elencadas acima são claras e mostram que ser professor é algo
complexo, que exige o desenvolvimento de competências e habilidades distintas de outras
profissões. Esta temática foi abordada por Perrenoud (2000), em seu livro “As dez novas
competências para ensinar”. Nele, o autor ressalta que não basta a intenção de ensinar,
mas é necessário mobilizar recursos cognitivos e emocionais para esta ação. Ser professor
do ensino superior não é uma profissão de final de semana, ou um bico, é algo que exige
profissionalismo e um intenso processo de aprendizagem.
A partir desta discussão, também é possível elencar as competências necessárias
do professor no que tange a avaliação da aprendizagem, a partir do paradigma formativo.
Segundo Moretto (2008), o professor competente no avaliar a aprendizagem:
•
Sabe que a prova é um momento privilegiado de estudo, e não um
acerto de contas – O professor entende a avaliação na perspectiva
formativa e não como um momento de punição ou acerto de contas entre
professor e aluno. Além disso, conhece e utiliza diferentes técnicas e
instrumentos para avaliar de forma processual e contínua os alunos.
•
Elabora bem as questões das provas – O professor que sabe
contextualizar os procedimentos avaliativos de acordo com os objetivos
estabelecidos, pergunta de forma clara e precisa, seleciona os conteúdos
relevantes e não coloca situações de “pegadinhas” para os alunos.
•
Administra valores culturais ligados à avaliação – O professor que
entende que a avaliação por muito tempo foi utilizada como instrumento
de controle e punição, e tenta quebrar este paradigma, entende que
avaliação da aprendizagem é um momento privilegiado de ensino. É
aquele que desenvolve a competência na situação complexa de avaliar e
relaciona as questões da avaliação aos valores culturais dos alunos e
mobiliza os recursos necessários para isso.
•
Utiliza linguagem clara e precisa para o comando as questões –
Seleciona o tipo de linguagem mais adequada, que seja mais clara o
possível nos momento de avaliação. Assim, se elaborar a seguinte questão
“quais as características de um aluno?”, percebe que esta formulação pode
causar confusão entre os discentes, pois não estabeleceu claramente que
tipos de características que estão envolvidas. Faz uma reformulação e
estabelece critérios para correção da questão.
•
Cria ambiente favorável ao controle das emoções – aquele professor que
entende as emoções presentes em situações de avaliação (angústia, medo,
alegria, tensão e estresse) e faz uso de recursos capazes de criar condições
para que o aluno se sinta tranqüilo e sem estresse no momento de
avaliação, seja ela através de qualquer instrumento.
Em suma, a partir das discussões apresentadas é possível perceber que os
instrumentos de avaliação da aprendizagem (provas, trabalhos, seminários) que são
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Avaliação no ensino superior: cenários e tendências
amplamente utilizados nas atividades educacionais podem e devem continuar a fazer
parte da práxis do ensino superior. A mudança reside na forma de entendimento da
avaliação, que supera o paradigma classificatório e adentra no campo da formação.
Espera-se que este artigo possa ter atingido o objetivo proposto, que foi sintetizar
as principais linhas teóricas que norteiam as práticas de avaliação no ensino superior.
Além disso, espera-se que este texto seja um convite à reflexão sobre o tipo e a qualidade
das práticas avaliativas realizadas e uma forma de iniciar e mobilizar novos cursos de
ação por parte dos professores.
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Adriane Martins Soares Pelissoni
Mestre em Educação pela Universidade
Estadual de Campinas. Possui graduação
em
Pedagogia
pela
Universidade
Estadual de Campinas. Atualmente é
professora do curso de especialização em
Psicopedagogia do Centro Universitário
Nossa Senhora do Patrocínio, professora
de didática da Faculdade Anhanguera de Campinas e
coordenadora do Serviço de Atendimento ao Estudante
(SAE). Tem experiência na área de Educação, com ênfase
em Educação, atuando principalmente nos seguintes
temas:
ensino
superior,
atividade
docente,
pesquisadores- formação, ensino de psicologia e
produção bibliográfica.
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