Memória dos Catadores de Materiais Recicláveis de Assis (2001-2007)
mas não asfalto, né? Morava na casa de uma senhora lá. Estudava pouco, mas estudava.
Aí dali da Vila Sousa minha mãe conheceu duas pessoas e elas falaram que tinham uma
casa lá em Bauru, né. E minha mãe, afobada, disse vamos para lá que vamos melhorar
nossa situação. Nós estávamos numa pindaíba, né? Trocava o dia para comer. Aí, fomos
para Bauru. Chegando em Bauru demos com a cara na porta, não tinha nada. Os caras
não tinham casa nenhuma, não tinham nem lugar de morar. Nós ficamos três dias na
rodoviária, pousando, dormindo lá, né. Aí um belo dia um senhor bem vestido, perguntou
se tínhamos casa para morar. Aí minha mãe conversou com o homem que não tinha e que
estavam sem rumo. O homem ofereceu uma casa para alugar. Daí nós fomos para a casa
do homem, né? Ele deu a casa para nós morar. Ficamos lá de 6 a 7 anos. Depois de 7 anos
em Bauru, deu na cabeça da minha mãe de novo de sair de Bauru pra ir para Ubatuba.
Mais longe ainda. Minha mãe vendeu o que tinha, arrumou um dinheirinho, pegamos o
ônibus para Ubatuba. E, novamente, ficamos na rua. Só que lá tinha um local que dá para
ficar, né. Aí eu já banquei o esperto. Conheci um homem que indicou para ir direto ao
prefeito para saber se podia arrumar um cantinho para nós ficarmos até eu arrumar uma
casa. Aí fomos lá. Bem dizer, eu fui, né. Eu tinha na época 12, 13 anos. Aí eu fui pedir para
o prefeito e ele cedeu a casa para nós de turista, com mudança e tudo. Aí nós ficamos
morando lá 3, 4 anos. Aí deu na cabeça da minha mãe, de novo, sair de lá e vir para cá.
Porque ela ficou com pensamento ruim, né? Falou que o pai dela ia morrer, e o pai dela era
doente, né tinha um buraco na perna. Aí teve que amputar a perna dele. Só que a família
não deixou amputar. Aí minha mãe quis vir pra cá. Aí vai nós vender de novo as coisas lá
em Ubatuba. Viemos para cá. Chegamos em São Paulo, ficamos três dias dormindo na
rodoviária. Até pedir esmola na rua eu tive que pedir para comer. Em Bauru também, em
Bauru antes dela arrumar a casa. Eu fiquei um ano pedindo nas casas. Mas todo mundo
me dava arroz, feijão, açúcar, óleo, às vezes até me dar dinheiro e passe, né. Fui à casa de
uma cigana, pedir arroz para ela e ela queria que eu fosse morar com ela. Foi lá até pedir
para minha mãe: “Se a senhora quiser eu dou uma caminhonete zerada mais um tanto de
dinheiro para a senhora ficar bem de vida. Só que a senhora tem que dar seu filho para
mim”. Minha mãe falou assim para ela “Você está pensando o quê? Que eu paro filho e
deixo jogado no mundo. Eu posso comer pedra o que for, mas meu filho eu não dou”. Aí
ela falou: “Você não sabe o que você está perdendo”. Aí, minha mãe deu umas porradas e
mandou ela vazar. Daí nós viemos para Assis de novo. Aí eu entrei no corte de cana, né?
Com dezesseis anos eu entrei no corte de cana.
Entrevistadoras: Antes disso, você não trabalhava?
— A.J.T.: Não, antes disso não. Eu entrei no corte de cana. O primeiro serviço meu foi
gás, trabalhei assim de entregar gás na rua, de bicicleta. Ai depois foi aumentando a
idade e foi aumentando o serviço, né. Fui jardineiro, né? Já trabalhei em funilaria. Aí,
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