XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004
Alcoolismo e as Organizações: por que investir em Programas de
Prevenção e Recuperação de Dependentes Químicos
Gláucia T. Bardi de Moraes (CEFET/PR) [email protected]
Dr. Luiz Alberto Pilatti (CEFET/PR) [email protected]
“Sempre que o homem pode desenvolver-se, e isto também na empresa, sua motivação é mais elevada, e
ele permanece saudável e produtivo. E sempre que seu desenvolvimento fica prejudicado por obstáculos e
frustrações, sua motivação cai, e as probabilidades de adoecer e fazer uso de alguma droga
aumentam”.Dr.R.Amthauer Hoechst AG,1979
Resumo
O presente artigo discute a questão do alcoolismo nas organizações e justifica a necessidade
de implantação de Programas de Prevenção e Recuperação de Dependentes Químicos
(álcool), os quais visam o diagnóstico precoce e o encaminhamento dos indivíduos para
tratamento.Neste sentido são citadas empresas brasileiras, multinacionais e pontagrossenses
que buscando a melhoria da qualidade de vida de seus funcionários tem implantado o
Programa de Prevenção e Recuperação de Dependentes Químicos, visando a construção de
relações mais justas. Ao focalizar o funcionário através destes programas, as ações destas
empresas buscam a eliminação de problemas gerados pelo uso de drogas como, a falta de
motivação, queda na produtividade, absenteísmo, gastos com doenças, perda de funcionários
especializados, custos com treinamento, acidentes, deteriorização da eficiência. Nem todas as
empresas possuem uma atitude positiva em relação aos Programas de Prevenção e
Recuperação de Dependentes Químicos, a sociedade demanda de empresas que agreguem
outros valores que não somente a maximação do retorno financeiro.
Palavras-chave: Alcoolismo – Prevenção – Recuperação.
1. Introdução
O ser humano sempre procurou fugir de sua condição natural cotidiana, empregando
substâncias que aliviassem seus males ou que propiciassem prazer. À semelhança de certos
animais, usuários intermitentes de drogas, o homem primitivo aparentemente mostrou-se
portador de uma certa sabedoria, como se uma fronteira separasse o possível do perigoso
(Calança-1991). Com o passar dos séculos, esse tipo de autoregulação e esse senso inato de
limites desapareceram. O recurso às drogas, com uso inicial de cunho religioso ou médico,
disseminou-se com o homem nas suas migrações, marginalizando-se ou tornando-se
culturalmente aceitável ou até mesmo banal. Numa perspectiva Histórica pode-se dizer que a
droga tornou-se um problema de saúde pública a partir da metade do século conforme menção
de Rehseldt -1989. O álcool é a droga mais amplamente utilizada no mundo, nas diferentes
culturas. A utilização desta substância no local de trabalho é parte integrante desse padrão de
uso global. Nos séculos XVII e XVIII, o álcool era encarado e utilizado como uma substância
psicoativa que aumentava o “rendimento” do trabalhador e permitia que esse se submetesse às
condições mais adversas de trabalho. Logo o uso do álcool era estimulado pelo empregador e
bem recebido pelo empregado, muitas vezes “pago” em parte, com quantidade de bebidas
alcoólicas. O processo da Revolução Industrial no século XIX foi marcado pelo aparecimento
de máquinas complexas para a época, pela necessidade de produção em larga escala, de mão
de obra cada vez mais especializada e do cumprimento de prazos e rotinas de trabalho com
elevada e constante produtividade. É fácil concluir que o uso de álcool nesses novos
parâmetros de organização do trabalho traria significativos prejuízos.
A partir de então, o empregador passa a interessar-se pelos hábitos sociais e estilo de vida dos
empregados, controlando-os ou procurando estratégias para isso Esse marco na mudança nas
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relações humanas de trabalho apenas iniciou um processo de valorização do bem-estar e da
motivação do trabalhador através de Programas de Prevenção e Recuperação de
Dependentes.Como uma estratégia de grande retorno financeiro para as empresas e não
apenas uma “benevolência desinteressada” aos empregados, a valorização da presença de um
Departamento de Recursos Humanos dentro das empresas, está cada vez mais sendo
observado, além de uma mudança do paradigma de um controle rígido e coercitivo aos
empregados para uma relação de parceria levando sempre em consideração o alcance da
satisfação profissional, melhorando a motivação.
As maneiras de se lidar com o abuso de álcool devera mudar de uma perspectiva punitiva para
uma perspectiva de educação e promoção de saúde, acentuando a importância do “capital
humano”.O presente artigo pretende discutir a questão do álcool nas organizações e a
premência de implantação de Programas de Prevenção e Recuperação de Dependentes
Químicos dentro das mesmas.Este trabalho foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica,
apesar das dificuldades encontradas em relação a bibliografias que tratem de programas de
prevenção e recuperação do dependente de álcool, o que se encontra são pesquisas
relacionadas à substância, o álcool propriamente dito. O que dificultou também esta pesquisa
foi o fato de dependentes químicos não aceitarem ser entrevistados por receio de
“punição”.Considerando a problemática do desemprego no Brasil é compreensível o
comportamento desses indivíduos. Conseguimos um caso para entrevista e através dele
procuramos mostrar a possibilidade de recuperação por meio de Programas de Prevenção e
Recuperação de Dependentes Químicos, no caso o álcool.
2.O Álcool
O álcool contido nas bebidas utilizadas pelo homem é o etanol (álcool etílico) com o nome
comercial e popular de álcool, substância psicoativa com capacidade de produzir alteração do
sistema nervoso central (SNC), podendo, portanto modificar o comportamento dos indivíduos
que dela fazem uso. Por ter efeito prazeroso, induz a repetição.
No corpo humano o etanol é metabolizado por oxidação. Sob condições normais, e de acordo
com o peso da pessoa e seu estado de saúde, podem ser queimados diariamente de 5 a 15g de
etanol. Aproximadamente 90% da oxidação processa-se no fígado. O próprio corpo humano
produz de forma endógena do etanol em escala extremamente reduzida.Entre os danos físicos,
destacam-se problemas circulatórios, alterações no sistema nervoso central, órgãos internos
como fígado, estômago, esôfago e pâncreas são fortemente atingidos.
Com relação a estas conseqüências, deve-se salientar que uma vez interrompido o consumo de
álcool e alcançada uma abstinência permanente, a grande maioria dos danos é reversível em
graus que podem chegar ao completo restabelecimento.
O alcoolismo também conhecido como “síndrome da dependência do álcool”, é uma doença
caracterizada por:
• Compulsão: necessidade forte ou desejo incontrolável de beber.Perda de controle:
imobilidade freqüente de parar de beber uma vez que o indivíduo já começou.
• Dependência Física: a ocorrência de sintomas de abstinência como náusea, suor, tremores,
e ansiedade, quando se para de beber após um período bebendo muito.
• Tolerância: Necessidade de aumentar as quantidades de álcool para sentir-se “alto”.
O alcoolismo tem pouco a ver com o tipo de álcool que uma pessoa ingere, há quanto tempo
ou até mesmo quanto à pessoa bebe. Porém tem muito a ver com a necessidade incontrolável
por álcool. Esta descrição do alcoolismo ajuda no entendimento do porque a maioria dos
dependentes de álcool não consegue se valer só de “força de vontade” para parar de beber
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(SENAD - 2000). Essas pessoas estão sob compulsão do álcool, uma necessidade tão forte
quanto a sede ou fome. Enquanto alguns se recuperam sem ajuda, a maioria dos dependentes
de álcool precisa de ajuda para recuperar-se da doença. Com apoio e tratamento adequados,
muitos indivíduos são capazes de parar de beber e reconstruir suas vidas (SENAD2000).Pesquisas apoiadas pelo Instituto Norte-Americano sobre álcool e o alcoolismo
demonstraram que, para muitas pessoas, a vulnerabilidade ao álcool é herdada, vale ressaltar
que aspectos do ambiente, como influências e a disponibilidade do álcool, também são
influências significativas.O abuso de álcool difere do alcoolismo porque não inclui uma
vontade incontrolável de beber, perda do controle ou dependência física e inclui menos
tolerância do que o alcoolismo. O abuso de álcool está definido como sendo o padrão de beber
acompanhado por uma ou mais das situações listados a seguir dentro de um período de 12
meses:
• Fracasso nas responsabilidades no trabalho, escola ou lar;
• Beber em situações fisicamente perigosas, como enquanto dirige ou opera máquinas;
• Ter problemas legais devido ao álcool, como ser preso ao dirigir alcoolizado ou por Ter
causado lesões em alguém enquanto alcoolizado;
• Continuar a beber apesar de Ter problemas de relacionamento causados ou piorados pelo
efeito do álcool.
Enquanto o abuso do álcool é basicamente diferente do alcoolismo, é importante notar que
muitos efeitos do abuso de álcool, mas também são demonstrados por dependentes do
álcool.O alcoolismo é considerado doença quando o permanente abuso de bebidas alcoólicas
suscita dependência acompanhada de prejuízos biopsicosociais, detectáveis por métodos
usuais de diagnóstico (SENAD-2000). Esta dependência pode manifestar-se pela perda da
capacidade de controlar a quantidade de bebida ingerida. O alcoolismo é um dos problemas
que mais atinge as empresas. De 5 a 10% da população brasileira são alcoólatras
(REHFELDT 1989). É incontestável o grande número de prejuízos que o uso de bebidas
alcoólicas traz quando feito no período de trabalho, o que tem gerado uma proliferação de
políticas específicas de cada empresa endereçadas a esse problema.
Dentre os prejuízos encontram-se mais bem documentados o aumento do absenteísmo, a
diminuição de produtividade, elevação da taxa de acidentes, elevada taxa de renovação do
quadro de funcional, prejuízo nas relações interpessoais e na imagem da empresa
(GUIMARÃES e GRUBITS, 1999).
Se por um lado, as empresas têm avançado significativamente na otimização da jornada de
trabalho, de modo que, mesmo reduzindo a jornada semanal, nas últimas décadas tem-se
assistido a um aumento na produtividade, por outro lado, continuam lidando com o
absenteísmo (GUIMARÃES e GRUBITS, 1999). Os prejuízos resultam da redução da
produtividade decorrente das faltas, atraso em concluir tarefas e abandono do trabalho antes
de completar a jornada. O abuso do álcool encontra-se entre os principais fatores responsáveis
pela elevada taxa de absenteísmo (JELLENIK, 1947; THORPE e PERRY, 1959 –citado por
GUIMARÃES E GRUBITS, Série Saúde Mental -1999), sendo estimado que os “bebedoresproblemas” apresentam duas a oito vezes mais faltas que os seus controles (MORAWISKI e
COLS, 1990, BROSO e COLS, 1992, COOK e COLS, 1996 – citado por GUIMARÃES E
GRUBITS, Série Saúde Mental -1999).
Os acidentes de trabalho também engrossam as listas de prejuízos causados pelo alcoolismo
nas empresas, segundo o relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) o álcool
provocou 339 mil acidentes de trabalho no país em 2002. A legislação trabalhista considera
acidente de trabalho desde o percurso de ida ao trabalho até o seu percurso de volta. Logo,
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para as empresas, muitos acidentes de trânsito são, na verdade acidentes de trabalho. Neste
caso específico, o estabelecimento de causa-efeito é bastante óbvio, já que o álcool é um
depressor do Sistema Nervoso Central, com efeito, de sedação, redução da atenção e
concentração, lentidão do pensamento e dos reflexos e dificuldade de coordenação motora,
“síndrome” bastante propícia para predispor a acidentes. A depressão no SNC conduz a uma
redução na eficiência e acurácia das tarefas em pessoas intoxicadas.
As substâncias psicoativas provocam alterações emocionais e de comportamento, sendo o
álcool a mais difundida delas e de uso legalizado, é um importante fator que contribui para um
prejuízo nas relações interpessoais e de trabalho. Dependendo do nível de álcool no sangue,
pode desinibir, predispor à agressividade, à ansiedade ou à depressão. Um dos aspectos mais
densa e detalhadamente documentado é o das conseqüências orgânicas e comportamentais; as
principais características e manifestações das várias fases da evolução da doença, com
principal destaque para o aspecto profissional, estão relacionados a seguir abordando os riscos
provocados no trânsito com veículos conforme a porcentagem de álcool contida no sangue
(MUELLER–WICHARDS, RUHBERG, Spata – Álcool na Empresa e no Local de Trabalho).
•
0,2% - Cai à capacidade de avaliação para fontes de luz em movimento. De noite não
se consegue mais avaliar a distância de veículos que se aproximam em sentido
contrário.
•
0,3% - Fica prejudicada a avaliação de profundidade de espaços. Isto provoca
ultrapassagens arriscadas e reduzidas em relação a veículos na frente. A possibilidade
de acidentes dobra.
•
0,6% - Objetos localizados parecem ao observador mais distante do que na realidade
estão. Assim enxerga uma curva mais distante do que sua posição real. Entra
possivelmente com velocidade excessiva na curva, erra o vértice e se perde. A
sensibilidade da vista para a luz vermelha diminui a percepção de semáforos, locais de
obra ou luminárias traseiras e de freios fica alterada. Torna-se difícil a rápida
adaptação de luz alta para baixa.
•
1,0% - A capacidade de adaptação a repentinas diferenças de luminosidade é
sensivelmente prejudicada. Reconhece-se tarde demais pedestres, ciclistas, veículos
estacionados ou objetos na pista – o campo de visão fica consideravelmente estreito.
Não se percebendo o que vem da direita ou da esquerda. A percepção e avaliação de
profundidade do espaço, bem como a atenção fica reduzida, escolhe-se tarde demais
ou nunca. O tempo de reação fica mais prolongado, o percurso de frenagem mais
longo.
•
1,3% - Neste ponto instala-se uma completa incapacidade para dirigir. O estado de
desinibição alcança o auge.
•
1,7% - Ciclistas não são capazes de dirigir uma bicicleta.
•
2,5% a 3,0% - Instalam-se sinais de intoxicação. Estas alterações revelam-se na
capacidade de percepção e reação, avaliação de si próprio e da realidade, a capacidade
de resistência e confiabilidade, a indiferença e a passividade, prontidão de assumir
riscos e agressividade no trabalho. O empregado embriagado é incapaz de efetuar um
serviço ordenado e qualitativamente correto, cria situação de risco para si e para os
outros. Sob condições normais, o corpo queima em media 0,1% de concentração de
álcool no sangue por hora. Conseguir atingir estes índices é muito mais fácil do que
queima-los depois. (REHFELD, 1989).
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Tabela 1 -A tabela a seguir mostra o aumento e a diminuição da concentração do álcool no sangue
durante as primeiras 5 horas após o consumo.
Bebida
Cerveja
Vinho
Champanhe
Licor
Conhaque
Cachaça
Rum Wisque
Quantidade
1/2 l.
1/2 l.
1/2 l.
1 dose simples
1 dose simples
1 dose simples
1 dose simples
Concentração de álcool no sangue depois
de 5 horas
½h
1h
2h
3h
4h
5h
0,3
0,4
0,35 0,2
0,1
0,0
0,6
0,8
0,7
0,6
0,5
0,4
0,7
1,1
1,0
0,9
0,8
0,7
0,2
0,35 0,25 0,1
0,0
0,0
0,2
0,35 0,25 0,1
0,0
0,0
0,3
0,45 0,35 0,2
0,1
0,0
0,4
0,55 0,45 0,3
0,2
0,1
Fonte: ZIEGLER, H. Betriebliche Helfen Fuer Alkoholkranke (Ajudas da Empresa para Doentes de
Alcoolismo)
3.Prevenção
O consumo de bebidas alcoólicas não somente tem raízes culturais, como também está
presente em muitas manifestações religiosas, a bebida alcoólica participa da vida cotidiana
como ingrediente normal, tem significativa expressão no contexto econômico e é legalmente
aceita pela sociedade. Enfim, o álcool tem profundas raízes no comportamento da sociedade.
Quem se importa na realidade com as diferentes nocividades provocadas pelas ações do álcool
ou do fumo, do açúcar ou do sal? Todos com consumo normalmente praticado, uns pela
grande maioria, outros por expressivos segmentos da sociedade. “Prevenir quem contra o
quê?” A resposta quanto ao objetivo da prevenção torna-se difícil, quando temos o
conhecimento que em todas as épocas tiveram e têm suas drogas legais, e com toda a
conveniência tributária para o Estado.Partindo da posição de que aproximadamente 10%
(SENAD-2000) diretamente, tem algum grau de dependência alcoólica, portanto, qualquer
ação preventiva não deve interessar a 90% da população.
Este raciocínio desestimularia qualquer iniciativa neste sentido, se não soubesse que o real
campo de interesse é bem mais amplo, já que os 10% de pessoas efetivas, se distribuem entre
aproximadamente 25% das famílias e num sentido mais amplo, de uma sociedade. Isto aponta
que um substancial segmento da população esta sendo atingido indiretamente pela doença.
Seria utópico e até mesmo ingênuo, almejar uma sociedade livre de álcool, pois esta não
somente teria que vencer obstáculos como uma milenar tradição ao lado de agradável paladar
da maioria das bebidas, mas também a extrema facilidade com que qualquer pessoa poderia, a
partir de produção própria, suprir suas necessidades (há muitos livros com títulos tais como
“Faça sua cerveja em casa”, “Licores caseiros” “Vinhos” etc. (REHFELDT, 1989)).
Os reflexos causados pelo abuso do álcool no trabalho têm motivado as empresas brasileiras
a implantar “Programas de Prevenção e Recuperação”. A prevenção distingue-se entre:
prevenção primária e secundaria/terciária, uma vez que a problemática, embora possa ser mais
limitada em alguns aspectos, é a mesma. Apenas está localizada num universo mais limitado
que, conseqüentemente, admite medidas mais, seletivas, mas, por isto mesmo, mais eficazes e
promissoras. A prevenção primária corresponde a introdução de medidas estruturais na
empresa, com o objetivo da humanização do trabalho no sentido mais amplo. Algumas
profilaxias utilizadas têm sido as da intimidação, da informação e do treinamento
comportamental e estratégias de controle, estas ações antecipatórias visam diminuir a
probabilidade do início ou do desenvolvimento de uma condição (REHFELDT-1989).
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Inclui-se aqui a educação para a promoção e medidas sociais e legais. Em alguns países
europeus, as ações preventivas primárias se concentram em disciplinar a oferta e o consumo
do álcool nas próprias empresas, o que, no Brasil, não é necessário, devidos à inexistência
formal desse hábito, salvo em casos muito isolados ou de forma escondida, como por
exemplo, a cachaça misturada ao café, e assim mesmo figurando como contravenção a
dispositivos reguladores da relação trabalhista. Existem, porém medidas que procuram fazer
frente ao abuso de bebidas alcoólicas com a utilização de estruturas empresariais:
• Treinamento de grupos de auxilio e a constituição de grupos de ajuda.
• Treinamento de pessoas difusoras de idéias (lideres, supervisores e outros).
• Instituição de equipes de trabalho e de planos de ação com especifica tarefa prevencionista.
(REHFELDT, 1989).
Um dos objetivos da Prevenção secundária é o estabelecimento de normas e procedimentos no
tratamento individual do problema com os envolvidos. A preparação destas normas deve tanto
obedecer aos princípios básicos da prevenção de dependência na empresa, garantindo uma
melhor identificação com o programa. A meta global de todo o programa de prevenção e
recuperação de alcoolismo é a interrupção definitiva do abuso do álcool e a obtenção da
abstinência, a fim de preservar a saúde das pessoas envolvidas e garantir condições para um
desempenho profissional normal.
A prevenção terciária consiste no complexo de ação que visam eliminar, ou pelo menos
reduzir, as possíveis causas que possam redundar num retorno ao alcoolismo, ou o retorno a
um aparentemente inofensivo beber “social”. A recuperação de um alcoolista jamais deve ser
considerada como efetiva e completa no dia em que termina seu programa terapêutico
ambulatorial. A reintegração do alcoolista na sociedade, principalmente no ambiente de
trabalho, constitui um dos principais pressupostos para uma recuperação definitiva. Sua
reabilitação social significa que reassumirá seus anteriores direitos e suas obrigações na
sociedade, sem restrição, participando ativamente da vida social e se desenvolvendo
levemente, de acordo com suas possibilidades.
As portas da virada do segundo milênio é cada vez maior o numero de empresas brasileiras e
multinacionais que se sensibilizam com a gravidade e qualidade de vida dos funcionários, o
estabelecimento de uma cultura capaz de enfrentar esta doença que é o alcoolismo.
As Empresas ESSO, SHELL, rejeitam fazer negócios com companhias que não tenham um
plano de reabilitação e controle de drogas, seguidas pela American Airlines condicionou a
negociação de compra de aviões com a EMBRAR ao ajuste de seu programa de controle de
substâncias proibidas aos padrões americanos. A EMBRATEL trabalha com Programa de
Prevenção e Reabilitação e ostenta orgulhosa a marca de 82% de reabilitação de funcionários
dependentes. Os empresários descobriram que cada dólar investido na empresa em programas
de reabilitação provoca o retorno de sete dólares sob forma de aumento de produtividade,
redução de absenteísmo, queda na procura pelo departamento médico e o incomensurável
benefício de preservação da imagem da empresa. As indústrias deixam de ver a dependência
às drogas sob o prisma da legislação do trabalho, para encará-los como doença social e
oferecer este benefício de forma espontânea.(REVISTA VEJA-p. 32 – 2002)
4.Empresa Pontagrossense não se limita a benefícios legais
Em Ponta Grossa desde 2002, a Empresa no ramo do transporte coletivo urbano V.C.G.
(Viação Campos Gerais) desenvolve junto a seus funcionários Programa de Atendimento a
Alcoolistas ou Dependentes Químicos – coordenado pela Assistente Social. Para a
coordenadora do Programa as empresas exercem grande influência sobre seus funcionários e
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quando oferecem serviços efetivos de educação, prevenção e tratamento garantem uma força
de trabalho mais saudável e produtiva. O Programa desenvolvido nesta empresa é um dos
pioneiros em Ponta Grossa, implantado em 2002 e que já atendeu 132 funcionários em sua
maioria dependentes de álcool. O Programa de Atendimento a Alcoolistas ou Dependentes
Químicos da V.C.G., tem por objetivo, o alcance e manutenção da sobriedade, identificação
precoce do problema e, conseqüentemente, melhores oportunidades de recuperação,
diminuição de riscos de acidentes em geral, aprimoramento do desempenho no trabalho,
restauração familiar, oportunidade de exercer seu papel social e educativo, servir de incentivo
e modelo para que outras empresas ofereçam esse beneficio a seus empregados e também
melhorar a produtividade, diminuição de acidentes que são geradores de prejuízo. Esta
iniciativa conta com o apoio além da diretoria da empresa, da Prefeitura Municipal de Ponta
Grossa através da Secretaria Municipal de Saúde, Alcoólicos Anônimos, Hospital Psiquiátrico
Franco da Rocha e COMEN Conselho Municipal de Entorpecentes, estes colaboradores
através de palestras, teatros e depoimentos auxiliam na recuperação dos funcionários
dependentes.
Partindo do entendimento que os vícios são uma doença em tratamento e que o sucesso
depende de uma serie de fatores, como o temperamento da pessoa e a vontade de mudar, o
período e a freqüência do uso de drogas, seja ela o álcool (droga lícita) ou outras drogas (não
lícitas) o Serviço Social da empresa atua no sentido de encaminhar para tratamento os
funcionários que desejem se tratar, bem como dá acompanhamento a sua família. O principal
entendimento da empresa, é que o fato de trabalharem com transporte de pessoas, estas vidas
não devem ser colocadas em risco. O funcionário dependente é acompanhado pela
coordenadora do programa a instituições como Alcoólicos Anônimos COMEN – mantendo
acompanhamento ao funcionário e sua família através do grupo Gera-Sol que é um programa
voltado para as esposas de funcionários que tem como pano de fundo a Responsabilidade
Social por parte da empresa em despertar nas pessoas, nos casos esposas, a postura de sentirse um cidadão, com a capacidade de ser um agente de transformação na sua família, na
vizinhança e para a comunidade como um todo. A coordenadora do Programa de
Atendimento a Alcoolistas ou Dependentes Químicos afirma que “os melhores funcionários
são aqueles em recuperação, eles não faltam ao trabalho e são exemplos para os colegas, o
programa é uma iniciativa que esta dando certo e que outras empresas deveriam investir em
seus funcionários através de Programas como este”.
As dificuldades existem, a recaída, devem ser incluída como evento previsível nas projeções
de qualquer programa de recuperação de alcoolismo pela empresa, a coordenadora do
programa da referida empresa lida este fato, mas encara realmente como previsível e não
desestimula o alcoolista em momento algum. Outra dificuldade a ser superada quando da
implantação desse programa é a resistência do alcoólatra que muitas vezes não procura o
Serviço de Assistência Social por não se considerar um dependente, por medo, o que pode
agravar o quadro.
4.1 Entrevista
Em entrevista com C.A.S. 45 anos, funcionário da empresa V.C.G., constatou-se que ele
atribui a dependência inicialmente ao fato de passar por dificuldades financeiras, problemas
de doença na família. Admite que não encarava o alcoolismo como doença, buscava refugio
na bebida, como uma forma de aliviar as tensões. “O alcoólatra é difícil, ele não é bobo, ele é
esperto, a gente sempre arruma uma desculpa uma coisa ou outra para não comparecer à
solicitação da Assistente Social para uma conversa” completa C.A.S. Há um ano e meio está
freqüentando as reuniões do AA e sendo assistido pela Assistente Social da empresa, está em
recuperação, aceitou a ajuda.
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“Enquanto a pessoa não admite que tem a doença, porque o alcoolismo é uma doença, fica
difícil de aceitar ajuda, eu achava que só era alcoólatra aquele que fica caindo pelas ruas, hoje
eu sei que o alcoólatra é aquele que como eu bebia, para ficar mais tranqüilo, relaxado, isso
tudo é ilusão, depois o sofrimento vem em dobro, participar de grupos onde as pessoas têm o
mesmo problema, falam a mesma língua, o depoimento de um vai dando forças para o outro”,
comenta C.A.S. a respeito da participação no grupo AA. diz que está feliz, está adquirindo
autocontrole, respeito e readquirindo sua auto-estima.
“Tenho que continuar me recuperando ainda não estou 100%,mais já me sinto outra pessoa,
estou mais feliz, o Programa de Prevenção e Recuperação é de muita importância, motiva o
funcionário a recuperar-se, pois sente a confiança que a empresa deposita nele, antigamente o
funcionário era demitido, hoje não, a empresa dá apoio, força se preocupa, e assim o
funcionário produz mais e ambos ganham”. C.A.S. conclui dizendo que sua família agradece
à Assistente Social por estarem colaborando com sua recuperação; tem consciência que estará
sempre se recuperando e diz que quem precisar de ajuda deve procurar o programa em sua
empresa, sem esta ajuda, seria praticamente impossível a recuperação. “Hoje sou outra pessoa
preparada para falar, para dar depoimentos, para ajudar outras pessoas que assim como eu são
portadoras desta doença chamada alcoolismo”.
5.Conclusão
Este artigo teve por objetivo discutir a questão do alcoolismo nas organizações e justificar a
necessidade de implantação de Programas de Prevenção e Recuperação de Dependentes
Químicos. Considerando a relação de interdependência entre empregador e empregado, é fácil
perceber a importância do que aqui foi apresentado. No século em que estamos as empresas
estão sendo julgadas por seus compromissos éticos, pela ampliação do leque de benefícios
espontâneos. Desta forma é preciso descaracterizar a imagem de que a empresa que implanta
o programa de prevenção e recuperação tem caráter simplesmente assistencialista e
paternalista de benefícios, a finalidade última da empresa é produzir, prestar serviços em
busca de resultados mediante o emprego mais racional possível de fatores de produção que
incluem acima de tudo o homem.
Na empresa decidida a enfrentar o problema do alcoolismo, é preciso implantar, organizar e
acompanhar todas as estratégias e políticas no sentido de encarar a situação e querer
solucioná-la com todos os envolvimentos necessários e utilização de todos os recursos que
possam influir e atuar num trabalho racional e em conjunto, buscando soluções e não apenas
paliativos frutos da emotividade de quem tem pena, quando deve ter coragem de decidir a
favor de medidas mesmo momentaneamente dolorosas, mas posteriormente gratificantes com
retornos positivos para o funcionário e conseqüentemente para a empresa.
6.Referências
Alcoolismo. http://veja.abril.com.br (14/03/04)
Álcool: o que você precisa saber. Manual SENAD –Secretária Nacional Antidrogas.
GUIMARÃES, Dra. Eliana A. M.; GRUBITS, Profª Dra. Sonia. Série saúde mental e trabalho. São Paulo: Casa
do Psicólogo, Vol. 1, 1999.
KOSOVSKI, Éster. Plantão Médico: drogas, alcoolismo e tabagismo. Rio de Janeiro: Biologia e Saúde, 1998.
REHSELDT, Klaus H. G. Álcool e trabalho: prevenção e administração do alcoolismo na empresa. São Paulo:
EPU, 1989.
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