6 R a d i c a i s : uma plataforma crítica audiovisual
Bruno Massara Rocha
Introdução
A maneira como alguns espaços urbanos são formados no Brasil nos instiga a procurar
alternativas para sua análise, apresentação e visualização em função de extensas
sobreposições de situações de uso e da falta de linearidade de ocupação e aproveitamento. Na
medida em que se ampliam as escalas, num nível urbano e mesmo regional, percebemos que a
lógica de desenvolvimento destes espaços produz virtualidades muito mais complexas do que
sua correspondência física, que é na verdade sua atualização na forma de tecido urbano.
Estamos nos referindo aqui especificamente às regiões que sofrem maior interferência
industrial como por exemplo a produção siderúrgica e suas derivações. O que se chama
atenção nestas regiões é que nem sempre a complexidade de articulação inerente a processos
desta magnitude se reflete na produção do território urbano imediato às grandes plantas
industriais. São gerados assim cenários urbanos confusos resultantes desta diferença entre as
escalas do equipamento industrial e a escala do cotidiano de uma cidade.
É possível perceber situações onde a indústria se insere em meio ao tecido urbano, em alguns
casos em áreas centrais e valorizadas, fazendo divisa com bairros residenciais, comerciais,
avenidas de trânsito local, etc. Isso se deve a duas razões: inicialmente situadas em áreas
afastadas, elas acabam sendo alcançadas pelo crescimento urbano; ou ainda, a cidade cresce
ao redor da indústria como ocorre em muitas cidades no interior dos estados.
Sendo assim, ambas as escalas coabitam e dividem o mesmo espaço urbano, e diversas
situações conflitantes podem ser percebidas a partir daí, sintomas desse contato entre
espaços com intenções e relações bastante diferentes. Na maioria das vezes, o processo de
implantação das indústrias exerce influência majoritária na forma e na disposição de vários
empreendimentos, infraestruturas e equipamentos urbanos tais como: áreas de produção,
interconexão viária, logística, centros de convenções, aeroportos, etc. Já as relações locais, de
menor porte, acabam por se adaptar a este ordenamento: vilas operárias, centros de
comércio, lazer, serviço, etc. A superposição destas duas escalas produzem um terceiro
espaço, que é o somatório desigual e fragmentado das duas primeiras, ocupando um mesmo
lugar. Essa superposição de escalas dificulta a compreensão dos limites entre cada uma delas.
Lógicas opostas combinadas aleatoriamente num mesmo espaço físico, próximas, mas sem
nenhuma relação de contigüidade.
Como exemplo dessa distorção, podemos analisar questões como a constituição de
centralidades em cada um dos dois lados. Do lado industrial, as prestações de serviços, cada
vez mais especializados, nem sempre são localizáveis no espaço geográfico imediato. A medida
que se ampliam as escalas industriais, revelam-se outras formas de centralização diferentes
das que estamos habituados em nosso cotidiano. A centralidade industrial não mais é
dependente da proximidade física, mas condicionada por outras formas de aproximação que
poderíamos chamar de proximidade temporal. A articulação entre espaços produtivos
geograficamente dispersos ocorre a partir da formação de sistemas urbanos de produção
integrados e interconectados por infraestruturas de comunicação e transporte. Avaliando o
resultado local, estes núcleos industriais geram situações urbanas críticas para as cidades onde
estão implantados uma vez que estão simultaneamente próximos espacialmente mas
distantes temporalmente. Ou seja, exercem forte impacto espacial em função da presença de
suas infraestruturas operacionais, mas não permitem a apropriação das áreas ocupadas para o
desenvolvimento da cidade, muitas vezes interrompendo-a e redirecionando-a.
Já do lado da microescala local, a grande maioria das relações, sejam comerciais, de serviço,
lazer e cultura demandam proximidade física, e são potencializadas pelo contato, pelo
cotidiano, pela rua, esquina, praça, pelo encontro. Sendo assim, não há um denominador
comum entre as duas escalas, e em função da intensidade da escala industrial, esta acaba por
direcionar a escala local segundo sua necessidade própria.
A ausência de posturas de análise mais coerentes com este tipo de condição e espacialidade,
disperso em sua lógica e sobreposto em sua morfologia, é um ponto importante na produção
de novas pesquisas voltadas para definição destas formas específicas de análise e intervenção.
Normalmente as pesquisa se debruçam numa avaliação morfológica da cidade no que se
refere ao desenho urbano ou a distribuição de infraestrutura. Em alguns caso, em análises
fenomenológicas das atividades humanas como centralidades, fluxos, vetores de crescimento
e organização. Apesar disso, uma experiência imediata de fruição de espaços como os
abordados aqui não revela muito acerca de sua lógica, ou melhor não discute a origem nem as
causas do problema, apenas seu desdobramento no tecido urbano. Portanto, vemos aqui uma
defasagem no processo de análise urbana baseada em morfologia e fenomenologia.
Na dinâmica industrial, os aspectos relacionados às questões físicas dão lugar a outro tipo de
distância, a separação pelo tempo. Pode-se definir este tipo de situação como uma "unidade
de espaço sem unidade de tempo". Autores como Marc Augé e Paul Virilio já trataram desta
dimensão temporal assincrônica em espaços de grande trânsito de passageiros como nos
aeroportos e terminais de trens, ou seja, locais onde não se fixam relações próximas por se
tratarem apenas de ambientes de passagem. O que queremos mostrar aqui é que esta
condição desregulada também ocorre em escala urbana e não apenas em pontos localizados.
No caso de algumas regiões industriais brasileiras o que se vê é uma descontinuidade temporal
agindo de forma negativa na construção do espaço local. O trânsito, por exemplo, mostra
como as infraestruturas de transporte estão voltadas para a dinâmica industrial e não para o
trânsito de veículos locais, sendo comuns os acidentes, a perda de espaço de circulação de
pedestres, e o desenvolvimento de atividades especificamente voltadas para esse tipo de
atividade de circulação. Vemos também problemas decorrentes da situação fundiária de
grandes áreas urbanas, voltados exclusivamente para a indústria, constituindo-se barreiras
para o desenvolvimento urbano, e desencadeando ocupações habitacionais irregulares em
encostas, margens de rodovias e áreas periféricas.
A este tipo de espacialidade constituída por diferentes escalas tanto física quanto temporal, na
qual a lógica industrial extrapola as demandas menores de ocupação gerando uma mistura
desigual de identidades fragmentadas denominamos aqui de espaço difuso.
Aproximações para um Espaço Difuso
Um espaço difuso tem como uma das suas características possuir diferentes temporalidades
concomitantemente. Em localidades que possuem grande concentração industrial é possível se
verificar reflexos destas situações infiltradas no espaço urbano, principalmente quando esta
produção é a matriz econômica da região. A aceleração da dinâmica industrial e as novas
tecnologias de informação e comunicação têm imprimido velocidades cada vez maiores aos
processos de produção, modificando a forma como se instalam suas infraestruturas e
consequentemente interferindo no cotidiano local.
O rápido compasso da dinâmica industrial necessita de agilidade em suas etapas produtivas e
logística, além de uma especialização cada vez maior de seus serviços, sincronia dos processos
visando a ampliação dos mercados consumidores. Esta dinâmica é apontada aqui em função
de dois fatores: primeiramente porque ela é uma das que mais incorpora os efeitos de uma
mundialização e interconexão em grandes escalas tanto de seus processos quanto de suas
relações; segundo em função dela possuir grande poder sobre a organização do território,
sendo capaz de redefinir grandes áreas urbanas a partir da instalação de infraestruturas ou de
modificações estratégicas. Os impactos na paisagem podem ser percebidos na forte
heterogeneidade de usos e ocupações, além da superposição de cenários diferentes numa
porção próxima de espaço. Os espaços urbanos de circulação de pedestres, de convívio e lazer,
do comércio local se permeiam às rodovias, ferrovias, viadutos, pontes, usinas, resultando
num hibridismo que opera a partir de diferentes escalas de tempo.
O tempo da dinâmica industrial é liso, ininterrupto e acelerado e em muitas situações altera a
cadência das práticas cotidianas que, ao contrário, são muito mais variáveis. Dentro dos
espaços industriais prevalece o tempo corrido, homogêneo, incessante, característico de uma
ordem global que, segundo Milton Santos, tem como parâmetros a razão técnica operacional e
a lógica matemática. Oposta a ela, continua ele, desenvolve-se a ordem local, na escala do
cotidiano, mais informal e temporalmente lenta. Os espaços industriais são atrelados à ordem
global e corporificam espaços fechados ao uso e ocupação por parte da população como as
áreas de monoculturas, zonas de despejo de resíduos, infraestruturas de logística e
transposição de materiais, etc. Além disso, outros empreendimentos urbanos como
aeroportos, apart hotéis e shoppings centers são comuns, e direcionados à população
flutuante de empresários e trabalhadores. A ordem local vai sendo construída paralelamente
nos intervalos: bairros de periferia em locais desprivilegiados e serviços oportunistas situados
as margens das rodovias. Entender o tempo nestas situações é admiti-lo de forma ora
superposta, ora simultânea, ou assincrônica mas sempre variável. Este quadro é típico em
algumas regiões com forte vínculo industrial como as cidades localizadas no Vale do Aço, no
estado de Minas Gerais.
Espaços Difusos no Vale do Aço
O Vale do Aço constitui-se atualmente como a segunda maior concentração urbano-industrial
de Minas Gerais, reunindo duas empresas siderúrgicas de grande porte além de uma usina de
celulose. A região foi, em meados do século XX, palco de um profundo processo de
investimento que uniu capital internacional e federal na construção de enclaves monoindustriais de base exportadora, dando origem a grandes empresas como a ACESITA (1944), a
USIMINAS (1956) e mais recentemente, a CENIBRA (Celulose Nipo-Brasileira S.A. - 1974). Esse
processo ocorreu também em outras regiões do sudeste brasileiro como na cidade de Ouro
Branco (AÇOMINAS - 1986), em João Monlevade (BELGO MINEIRA - 1937), Itabira (CVRD 1942), Espírito Santo (ARACRUZ - 1967), gerando grandes empreendimentos industriais de
base mineradora, siderúrgica e de produção de celulose. Os fenômenos urbanos que se
desenrolam em grandes centros industriais no interior do país, como os Vales do Aço são até
hoje fortemente influenciados pelas dinâmicas destas empresas multinacionais. Além disso, o
fato mais importante é que eles não estão implantados em distritos industriais longes dos
centros urbanos, mas inseridos em meio a eles, fazendo fronteira com bairros residenciais,
centros comerciais e áreas de lazer.
Os constantes desvios de comportamento espacial que se encontram ao se percorrer a região
do Vale do Aço nos remetem às heterotopias de Michel Foucault, locais que "têm o poder de
justapor em um único local real diferentes espaços e lugares que são incompatíveis um com o
outro”. Foucault apresenta argumentos que dizem respeito de conceitos como
simultaneidade, dispersão e justaposição como os alguns dos atributos principais da
heterotopia e que também são comuns e perceptíveis num circular pelo Vale do Aço. O espaço
se torna difuso em função desta falta de nitidez entre usos, funções, cenários e fluxos.
Um bom referencial para contextualizar estas definições é o entorno do principal eixo de
circulação viária do Vale do Aço, que incorpora grande parte das considerações relativas a um
espaço difuso. Ele agrega várias formas simultâneas de ocupações diferentes, incluindo a
maioria dos equipamentos e empreendimentos da região, perpassa por vários bairros com
características distintas e em nada contribui para a produção do espaço imediato a ele. Pelo
contrário, ele desarticula o tecido urbano local, fragmenta a experiência de transposição de
pedestres, constituindo assim como um equipamento urbano totalmente incompatível com a
escala da cidade. Isso se deve principalmente ao fato dele organizar a distribuição dos fluxos
de acesso às áreas industriais e não apresentar nenhum tipo de tratamento para a escala local
de acesso aos bairros. É visível a incompatibilidade quando fazemos uma análise do cenário
imediato a este eixo de circulação: viadutos e terminais de carga, galpões industriais, zonas de
monocultura, zonas de depósito de rejeitos industriais compartilham o espaço com áreas de
preservação de mata atlântica, clubes, shopping centers, hotéis, escolas e ainda ocupações
irregulares. Ou seja, a paisagem é composta por uma série de retalhos que incluem paisagens
artificiais, espaços infraestruturais, ocupações temporárias, zonas industriais, fragmentos de
bairros, áreas de serviço automotivo, empreendimentos comerciais, o que torna a nossa
experiência visual uma overdose de cenários confusos e sem a menor relação. Enfim, é uma
experiência excessivamente difusa.
Esta overdose de que envolve a experiência urbana de circular por esta região nos impede até
mesmo de definir com precisão de que forma abordá-la. As particularidades espaciais
encontradas aqui impõem um desafio sobre o modo de apreendê-la, conceituá-la e agir sobre
ela. Este artigo propõe um relato de um modelo experimental de problematização conceitual
dirigido a situações urbanas críticas e complexas tal qual ocorrem no Vale do Aço. Este
protótipo investiga a possibilidade de reconfiguração do nosso olhar a partir da apresentação
interativa desta espacialidade utilizando as tecnologias digitais como instrumento de
mediação. A interface digital denominada "6 r a d i c a i s " foi desenvolvida com o intuito de
provocar o usuário a tentar explorar estes cenários superpostos que caracterizam a região do
Vale do Aço e ao mesmo tempo apresentar a ele possíveis alternativas conceituais de definição
crítica.
6 r a d i c a i s - apreensão áudiovisual crítica
A apreensão crítica é um processo que busca incentivar o cruzamento de temporalidades
distintas a partir de uma decomposição da paisagem local em referências digitais. Os
elementos constituintes deste cenário difuso são registrados no formato audiovisual, divididos
em camadas distintas e depois recombinados numa interface dinâmica. Estas imagens são
dispostas ao usuário de forma que ele tenha possibilidades distintas de não somente visualizálas, mas de compor uma imagem-síntese de proporções conceituais maiores a partir de sua
experiência e intenção. Denominamos esta imagem-síntese de paisagem-relativa, uma vez que
ela não representa a paisagem existente, mas problematiza-a segundo os critérios de quem a
criou. Ao usuário é permitido decompor e recompor a paisagem relativa a todo instante,
procurando possíveis entendimentos da relação entre os elementos, instigando um
procedimento de pesquisa intuitiva visual, sonora, que analisa as possibilidades de
combinação de cenários e sons diferentes para uma mesma localização.
O aspecto temporal é considerado como um estado de sincronia ou assincronia entre as
diferentes atividades, formas de uso e ocupação e a adequação delas aos equipamentos
existentes. O tempo é sinergia, adequação, e independe de proximidade física. A experiência
do tempo é dada ao usuário a partir da navegabilidade das imagens que compõem a paisagemrelativa. A sucessão de imagens revela diversos aspectos locais como: os tipos de serviços
prestados, a forma e a disposição dos edifícios, as relações entre espaços de trânsito e de
pedestres, as formas de ocupação urbana, as relações sociais construídas, etc. Ao usuário é
oferecida a possibilidade de combinar estes itens visualmente e sonoramente, numa tentativa
de propor a construção de relações entre elas. Imagina-se que a experiência prática de
combinação de imagens quase nunca está dissociada de uma pré-análise ou um préjulgamento das suas potencialidades de associação, podendo resgatar uma capacidade crítica
por parte de quem as manipula. Além disso, mais do que despertar a capacidade de
organização espacial que é inerente ao profissional de arquitetura, espera-se despertar ou
estimular a capacidade de associações temporais que reside nas possibilidades de se
estabelecer relações entre diferentes eventos.
Para Marc Augé, o espaço hoje não tem as dimensões exatas que nós imaginamos, e que
devemos reaprender a observá-lo. Para isso é necessário nos recolocar diante dele,
reposicionar o nosso olhar e investigá-lo sob outros parâmetros. O observador deve assumir
uma postura de explorador para decompor este cenário nas suas partes menores e a partir daí
reconstruí-lo para compreendê-lo. Diante da impossibilidade de reconfiguração física do
cenário real de forma imediata, podemos explorar a capacidade de reposicionamento do
observador. Através das ferramentas de autoria multimídia, a tecnologia digital nos permite
multiplicar este observador, reposicioná-lo, fragmentá-lo, ampliando as ocasiões de apreensão
visual mediada. O observador não precisa ser um andante ou um flanêur, mas uma entidade
multiplicada que pode explorar o espaço de forma dinâmica e a partir de diferentes
posicionamentos simultâneos.
O desafio da apreensão de determinadas espacialidades difusas atuais se instaura na tentativa
de tornar visíveis diferentes tipos de fenômeno que nos impedem de fazer uma leitura
imediata. Manual Gausa sugere que alguns dos atributos mais importantes para uma
mediação digital de compreensão espacial é que eles sejam mais abertos, no sentido de
permitir cruzamentos de informações de diversas fontes, que possam admitir leituras menos
lineares, mais sobrepostas, mais visuais, proporcionando olhares comparativos que ofereçam
um maior grau de envolvimento com as novas situações urbanas difusas.
Rem Koolhaas aponta para a necessidade em se especular quais as novas categorias espaciais
estamos hoje submetidos. Segundo ele, essas novas articulações espaciais redefinem a nossa
percepção e compreensão do mundo, perpassando por várias esferas da sociedade: espaços
domésticos, de trabalho, de lazer, espaços de encontro, espaços comerciais, industriais sobre
os quais a ausência de parâmetros e limites precisos os tornam carentes de definição e de
estratégias de apreensão.
6 r a d i c a i s – uma máquina conceitual
O processo de elaboração de uma plataforma digital visa criar condições instrumentais para
uma aproximação crítica com relação aos espaços difusos. Como todo tipo de pesquisa, iniciase a partir da constituição de um banco de dados e de um levantamento de informações
prévias acerca do objeto em questão. Em seguida, definem-se parâmetros de análise, realizamse cruzamentos e segue-se a interpretação por parte do pesquisador. A plataforma digital
insere-se neste estágio, no momento em que a informação é “tratada”, adquire significado e
pertinência conceitual. Foram inseridas nesta plataforma diversas informações levantadas, que
incluem referências audiovisuais e conceitos iniciais ainda carentes de tratamento crítico, e
sobre elas aplicadas diferentes estratégias de combinação.
Alguns conceitos iniciais foram elencados e faziam relação com o aspecto inicial que a imagem
do local sugeria. No entanto, tais conceitos ainda não haviam sido testados nem relativizados,
portanto poderiam se comportar ora como fenômenos, ora processos, ora definições, ora
constatações. Portanto, foram dispostos na plataforma apenas a partir de seus radicais:
. ester...(radical de estéril)
. moviment...(movimento)
. acab....(inacabado)
. arid....(árido)
. desert...(desértico)
A estes radicais foram atribuídos diferentes possibilidades de combinação de prefixos (trans,
hiper, des, in, sub) e sufixos (mento, ez, ado, ismo, ação, il). Dessa forma, seria possível testar
as relações entre radicais, prefixos e sufixos cruzando: definições, atributos e condições. Por
exemplo:
hiper + moviment + ação = hipermovimentação
sub + moviment + ado = submovimentado
trans + desert + ismo = transdesertismo
des + acab + mento = desacabamento
in + estéril + ismo = inesterilismo
Além das possíveis atribuições de valor aos radicais (dando origem até mesmo a termos
novos), tais palavras são projetadas sobre referências visuais que se alternam na medida em
que os conceitos são criados. O processo é intuitivo, exploratório e sugere caminhos e
combinações sem determinações. Toda a especulação se debruça na necessidade de oferecer
caminhos possíveis, virtuais, para aproximação crítica de conteúdo no sentido de
problematizar as abordagens e provocar reflexões.
A relação interativa do usuário-
pesquisador com a plataforma busca oferecer possibilidades de construção de um percurso de
visualizações e reflexão que se ordena a partir das interpretações particulares e da intenção de
cada usuário. A problematização do conteúdo virtualizado pela interface é potencializada no
momento em que usuário-pesquisador se esbarra com terminologias incertas e sem
significação imediata. Surgem então aberturas conceituais para que ele deposite uma
bagagem crítica pessoal, numa tentativa de criar condições novas de leitura e definição ou de
um novo e inesperado encadeamento de idéias. Vemos a seguir algumas imagens da
composição da plataforma em operação:
A apreensão das imagens e dos possíveis conceitos é proporcional ao grau de envolvimento do
usuário, o quanto ele se coloca a disposição das construções de sentido. A plataforma sugere
caminhos não-definidos a serem percorridos, deixando a cargo do usuário seu percurso
pessoal.
Análises conclusivas
Além de modificar a nossa percepção de tempo, a elaboração de plataformas conceituais
interativas nos apresenta também novas possibilidades de modelar a percepção do tempo, de
analisá-lo e permitir trabalhar com situações onde o tempo não se apresenta de forma
contínua e homogênea. A plataforma experimental investiga estratégias de mediação do olhar
e do pensar os espaços a partir das possibilidades de construção de relações, cruzamentos de
dados, novas formas de registro e apreensão da espacialidade urbana que não seja a sua
reprodução física num modelo tridimensional.
Tal estratégia é necessária para que possamos aprofundar as análises e produzir novos
encadeamentos críticos para situações urbanas como a dos espaços-difusos, muito comuns em
diversas cidades de grande atividade industrial no Brasil e no mundo. Espaços difusos
demandam olhares mais operacionalizados, análises mais aprofundados de suas escalas e um
conhecimento das causas iniciais de sua produção. Plataformas interativas devem ser
construídas como dispositivos críticos operacionais, dando suporte às análises de dados e ao
mesmo tempo fomentando novas abordagens teóricas. É importante também que ela dê
margem à intuição do pesquisador, que ofereça caminhos inesperados e potencialize novas
relações críticas e novas definições para os problemas atuais. Acredita-se que com o uso e o
desenvolvimento de novas plataformas operativas, possamos ampliar o leque de análise e nos
aparelhar técnica e conceitualmente para propostas de intervenção e agenciamento da
complexidade dos espaços contemporâneos.
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6 R a d i c a i s : uma plataforma crítica audiovisual