Anais
Sistemas de Gestão em Segurança
e Saúde no Trabalho
25 a 27 de novembro de 2008
MINISTÉRIO
DO TRABALHO E EMPREGO
FUNDACENTRO
FUNDAÇÃO JORGE DUPRAT FIGUEIREDO
DE SEGURANÇA E MEDICINA DO TRABALHO
Anais da VIII Semana da Pesquisa
Presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva
Ministro do Trabalho e Emprego
Carlos Lupi
Fundacentro
Presidente
Eduardo de Azeredo Costa
Diretor Executivo Substituto
Hilbert Pfaltzgraff Ferreira
Diretor Técnico
Jófilo Moreira Lima Júnior
Diretor de Administração e Finanças
Hilbert Pfaltzgraff Ferreira
Fundacentro
Anais da VIII Semana
da Pesquisa
Sistemas de Gestão em Segurança e Saúde
no Trabalho
25 a 27 de novembro de 2008
São Paulo
MINISTÉRIO
DO TRABALHO E EMPREGO
FUNDACENTRO
FUNDAÇÃO JORGE DUPRAT FIGUEIREDO
DE SEGURANÇA E MEDICINA DO TRABALHO
2010
Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.
Disponível também em: www.fundacentro.gov.br
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Serviço de Documentação e Biblioteca – SDB / Fundacentro
São Paulo – SP
Erika Alves dos Santos CRB-8/7110
1234567Semana da Pesquisa da Fundacentro (8. : 2008 : São Paulo).
1234567890Anais da VIII semana da pesquisa : sistemas de gestão em
1234567segurança e saúde no trabalho / VIII Semana da Pesquisa da
1234567Fundacentro. – São Paulo : Fundacentro, 2010.
1234567890374 p. : il. color. ; 23 cm.
1234567890ISBN 978-85-98117-56-0
12345678901. Segurança e saúde no trabalho - Reuniões de segurança e
1234567saúde. I. Título.
CIS
A Veq (207)
CDU
613.6(81)(063)
CIS – Classificação do “Centre International d’Informations
de Sécurité et d’Hygiene du Travail”
CDU – Classificação Decimal Universal
Ficha Técnica
Coordenação Editorial: Glaucia Fernandes
R evisão de textos: Karina Penariol Sanches
Projeto gráfico e design miolo: Gisele Almeida (estagiária)
Design capa: Glaucia Fernandes • Gisele Almeida (estagiária)
Sumário
Apresentação ............................................................................................................................. 9
Comissão organizadora .......................................................................................................... 11
Programação ............................................................................................................................ 13
Tese de doutorado (resumo) ............................................................................................ 17
1. Incentivos governamentais para promoção da segurança e saúde no trabalho ....................... 19
Dissertações de mestrado (resumos) ............................................................................ 27
1. Arquivos abertos e instrumentos de gestão da qualidade como recursos para a
disseminação da informação científica em segurança e saúde no trabalho .............................. 29
2. A importância da comunicação de risco para as organizações ................................................... 37
3. A gestão da segurança e saúde no trabalho: a experiência do arranjo produtivo
local do setor metal-mecânico da região paulista do Grande ABC ........................................... 43
4. Diretrizes para um centro de triagem de materiais recicláveis quanto ao ambiente
construído em relação à segurança e saúde no trabalho: um estudo de caso no Guarituba,
município de Piraquara – região metropolitana de Curitiba ....................................................... 55
5. Programa de gestão de riscos para tubulações industriais ........................................................... 61
6. Considerações sobre o envelhecimento do trabalhador .............................................................. 69
7. Exposição ocupacional a campos eletromagntéticos em estações rádio-base: análise crítica
do programa de prevenção de riscos ambientais em uma empresa do setor
de telecomunicações...................................................................................................................................................77
8. Características da poeira resultante do processo de fabricação de materiais cerâmicos
para revestimento: estudo no pólo cerâmico de Santa Gertrudes ............................................. 85
Trabalhos apresentados na forma oral (Resumos) .................................................... 93
1. Pesquisa sobre acidentes do trabalho em micro e pequenas empresas industriais
nos ramos calçadista, moveleiro e de confecções: resultados finais .......................................... 95
2. Abordagens pragmáticas na avaliação qualitativa de riscos químicos ...................................... 103
3. Diagnóstico das condições de trabalho no beneficiamento do sisal........................................ 109
4. A previsão do Índice Wind Chill – um serviço operacional voltado aos trabalhadores
de áreas externas .............................................................................................................................. 115
5. Projeto de pesquisa e termo de ajustamento da SRTe/PR como instrumento
de modificação das condições de trabalho de fundições em pólo de metais sanitários ...... 123
6. Prevenção de explosões na fabricação de fogos de artifícios no arranjo produtivo
de Santo Antonio do Monte (MG) ............................................................................................... 131
7. Segurança e saúde dos pescadores artesanais no estado do Pará ............................................. 139
8. A produção científica sobre o trabalho e a saúde dos enfermeiros: um panorama .............. 147
9. Proteção respiratória contra agentes biológicos e a cartilha para os trabalhadores de saúde ........151
10. Boas práticas no controle da exposição ocupacional ao benzeno ......................................... 159
11. Avaliação do impacto do nexo técnico epidemiológico sobre os benefícios
por incapacidade ............................................................................................................................ 165
Trabalhos apresentados na forma de pôster (Resumos) ........................................ 175
1. O potencial uso do Large Eddy Simulation (LES) para pesquisa no tema
saúde do trabalhador ....................................................................................................... 177
2. Relação dos afastamentos do trabalho devido às doenças do aparelho
respiratório com as condições de tempo mensal ........................................................ 185
3. Estratégias e políticas na eliminação e diminuição da exposição ocupacional
ao benzeno ........................................................................................................................ 193
4. Vigilância da exposição ao benzeno no Brasil: a importância da participação ................201
5. Relato de caso: a pior fábrica de benzeno do Brasil .................................................... 205
6. Gestão de SST na indústria da construção: resultados preliminares do
estudo piloto no Rio de Janeiro .................................................................................... 209
7. Resgate do papel histórico da Fundacentro.................................................................. 215
8. A educação em segurança e saúde no trabalho e a metodologia sociodramática............221
9. Os programas de prevenção e controle de riscos nos ambientes de trabalho
como instrumentos de gestão em SST: novas abordagens e perspectivas
no processo ensino-aprendizagem ................................................................................ 227
10. Podcast informativo Fundacentro .................................................................................. 235
11. Determinação de metais pesados em indústria cimenteira que
co-processa resíduos ...........................................................................................239
12. Exposição ocupacional a pesticidas em estufas de flores ......................................... 245
13. Determinação de Pb, Al e Ni por ICP-OES no ambiente de trabalho de uma
fundição de ligas metálicas de bronze ........................................................................ 251
14. Metodologia dosimétrica para controle da exposição ocupacional às radiações
ionizantes e ultravioleta ................................................................................................ 257
15. Developing strategies in Brazil to manage the emerging nanotechnology
and its associated risks .................................................................................................. 265
16. Identificação de substâncias químicas ......................................................................... 273
17. Barreiras às intervenções relacionadas à saúde do trabalhador do setor
saúde na América Latina .............................................................................................. 283
18. Adaptação de metodologia analítica para a determinação de HPA em amostras
ocupacionais ................................................................................................................... 287
19. Determinação de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA) em
ambiente de trabalho de indústria de cimento que co-processa resíduos ............ 291
20. Avaliação preliminar da presença de HPA no clínquer produzido em
cimenteira que co-processa resíduos industriais ...................................................... 295
21. Resíduos sólidos nas indústrias moveleiras do agreste alagoano: impactos
ocupacionais e ambientais ............................................................................................. 299
22. Tendências e variações dos acidentes do trabalho na indústria moveleira
brasileira segundo o tamanho das empresas .............................................................. 305
23. Condições de trabalho e saúde dos auxiliares de administração escolar da rede
privada de ensino do Estado de Minas Gerais: resultados de pesquisa ..........................311
24. Avaliação do impacto dos acidentes de trabalho nas micro e pequenas empresas
da indústria brasileira de calçados: gênero e parte do corpo atingida ................................ 319
25. Análise comparativa dos acidentes e doenças do trabalho na indústria
têxtil e de confecções brasileira .................................................................................... 325
26. O dialogismo presente em artigos científicos de SST ............................................... 331
27. Acidente fatal envolvendo explosão de tanques de álcool ....................................... 339
28. O processo avaliativo no ciclo de palestras técnicas sobre segurança e
saúde do trabalhador no estado do Pará ..................................................................... 343
29. Educação continuada em segurança e saúde do trabalhador na
Fundacentro no estado do Pará ................................................................................... 351
30. Segurança e saúde do trabalho no assentamento rural em Potozi do
Cabo de Santo Agostinho ............................................................................................. 359
31. Condições de trabalho no cultivo da mandioca, em Santa Maria da Serra/SP .............367
Apresentação
A Fundacentro – Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho
– instituição vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego, tem como missão a produção e a
difusão de conhecimentos que contribuam para a promoção da segurança e saúde dos trabalhadores e das trabalhadoras, visando ao desenvolvimento sustentável, com crescimento econômico, equidade social e proteção do meio ambiente.
Uma das ações da Fundacentro, visando ao cumprimento de sua missão, é a realização de um
evento bianual com o objetivo de promover o intercâmbio técnico e científico entre os servidores da Fundacentro e seus parceiros, divulgar os trabalhos por eles realizados, discutir mecanismos institucionais para o desenvolvimento de parcerias e avaliar os resultados alcançados. Esse
evento é chamado de Semana da Pesquisa.
A VIII Semana da Pesquisa da Fundacentro foi realizada no período de 25 a 27 de novembro
de 2008, no auditório do Centro Técnico Nacional, em São Paulo, e teve como tema “Sistemas
de Gestão em Segurança e Saúde no Trabalho”.
A programação incluiu apresentações orais de tese de doutorado e dissertações de mestrado defendidas por servidores da Fundacentro no período de 2006 a 2008, conferência sobre as “Diretrizes
da Organização Internacional do Trabalho para a SST”, apresentada por acadêmico da Universidade
Técnica de Lisboa, sessões de comunicações técnico-científicas de trabalhos originais apresentados
na forma oral e sessão específica de apresentação de trabalhos na forma de pôsteres.
O evento teve como público alvo os profissionais que atuam na área de Segurança e Saúde
no Trabalho.
Comissão organizadora da VIII Semana da
Pesquisa da Fundacentro
José Damásio de Aquino – Coordenador – Diretoria Técnica
Alexandra Rinaldi – Assessoria de Comunicação Social
Ana Maria Tibiriçá Bon – Serviço de Agentes Químicos
Cláudia Cecília Marchiano – Serviço de Eventos
Débora Maria Santos – Assessoria de Comunicação Social
Glaucia de Menezes Fernandes – Serviço de Publicações
Juliana Andrade Oliveira – Serviço de Ergonomia
Luiz Augusto Damasceno Brasil – Centro Regional do Distrito Federal
Maria Cristina Aguiar Campos – Serviço de Agentes Físicos
Maria Inês dos Santos – Serviço de Documentação e Biblioteca
Silvia Helena de Araújo Nicolai – Serviço de Equipamentos de Segurança
Tarsila Baptista Ponce – Serviço de Desenvolvimento de Recursos Humanos
Walter dos Reis Pedreira Filho – Serviço de Agentes Químicos
“Os resumos aqui publicados não passaram por quaisquer revisões, sejam gramaticais ou de conteúdo técnico, mantendo-se
na íntegra o texto encaminhado por seus autores.”
26
O dialogismo presente em artigos científicos de SST
Karina Penariol Sanches, Fundacentro/CTN/MTE
Palavras-chave: artigo científico; gêneros do discurso; dialogismo; saúde e segurança do trabalho.
Introdução
A
publicação de artigos científicos (ACs), conforme aponta Barros (2006), tem apresentado elevado crescimento no Brasil e no mundo desde a década de 1990, tanto
em âmbito geral, quanto no caso específico da Saúde Coletiva em função principalmente da
valoração que se passou a dar às produções indexadas em bases internacionais e aos seus índices de impacto. Segundo Amorim (2007), em 2006, o Brasil ultrapassou países como Suécia
e Suíça, publicando mais de 16 mil ACs, um aumento de 7% em relação à produção brasileira
de 2005 e de 33% em relação a 2004. A autora aponta que, aliado ao crescimento quantitativo, está o qualitativo, tendo havido aumento no número de citações: de 14.625 entre 1981 e
1985 para 206.231 entre 2000 e 2005. Para Henz (2003) e Teixeira (2005), esse crescimento se
deve à importância que o gênero assumiu dentro da sua esfera de circulação ao longo de sua
existência, sendo considerado um dos principais meios para a disseminação da Ciência entre
pesquisadores e para se alcançar prestígio entre os pares.
Diante da relevância do gênero, pondera-se fundamental sua compreensão a partir das diversas
perspectivas possíveis. Muitos passos nessa direção já foram dados, havendo inúmeros estudos
acerca do discurso científico, todavia poucos abordam o discurso científico, mais especificamente
o AC, da perspectiva dialógica. Portanto, propõe-se um estudo do AC pautado na teoria dialógica
do discurso de Mikhail Bakhtin e seu Círculo, envolvendo os conceitos de gênero do discurso, elementos constitutivos do gênero, forma arquitetônica, interação verbal, interdiscursividade.
O objetivo da pesquisa é verificar as relações dialógicas que constituem o gênero AC, mais
especificamente as formas de diálogo estabelecidas com enunciados anteriores e com o leitor presumido em função da forma composicional dos artigos. Parte-se da hipótese de que, nesse gênero,
essas relações não se resumem apenas aos diálogos mais explícitos, que envolvem as citações sob
a forma de discurso direto, indireto, indireto livre, entre outras, ponderando-se a ocorrência de
diálogos sob formas mais profundas e complexas. Pondera-se, também, a possibilidade de flutuação, nos ACs do corpus, quanto à forma composicional, uma vez que o periódico do qual foram
extraídos é multidisciplinar em função da área do conhecimento a que se dedica (SST).
Percurso metodológico e seleção do material
Para se desenvolver um estudo da perspectiva dialógica, Bakhtin (2003) ressalta a importância de
se compreender a natureza do enunciado e a discursividade “de formas de gênero dos enunciados
nos diversos campos da atividade humana” (p. 264) a fim de se evitar erros de classificação estilística
e análises que caiam em formalismo e abstração exagerada. Desse modo, no que concerne ao AC, a
compreensão do gênero passa pela normatização, verificada em função do que preconizam manuais
de metodologia da pesquisa científica e norma da ABNT. Portanto, o corpus desta pesquisa é composto por dois grupos de materiais: artigos científicos e manuais1.
1
O termo “manuais” será adotado sempre que se fizer menção aos manuais e à norma da ABNT.
335
Selecionaram-se quinze ACs publicados na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (RBSO) no
período compreendido entre 1973 e 2006, mediante os seguintes critérios: a) fazer parte de número localizado para consulta; b) pertencer à modalidade artigo, desconsiderando-se relatórios,
notas, revisões, material noticioso, resenhas, cartas, opiniões, traduções; c) estar incluído em um
dos temas mais abordados na revista a cada biênio.
A seleção dos manuais pauta-se, primeiramente, na relevância de sua contribuição para a
normatização dos meios de transmissão do saber científico na própria comunidade científica.
Segundo, na existência ou não de discussões acerca de ACs, uma vez que há inúmeros manuais
relevantes em metodologia da pesquisa científica, mas nem todos abordam o AC. Desse modo, o
segundo de materiais é composto pela norma ABNT NBR 6022 (2003), que trata de artigos para
publicação em periódico científico, e por três manuais de metodologia da pesquisa científica: a)
Planejar e redigir trabalhos científicos (REY, 1993); b) Manual de normalização de trabalhos técnicos, científicos e
culturais (SÁ et al., 1994); e Como preparar trabalhos para cursos de pós-graduação (ANDRADE, 1995).
A análise do corpus divide-se em quatro etapas: i. identificação das prescrições dos manuais
acerca dos ACs, sobretudo em relação à forma composicional; ii. verificação dos pontos de tensão
entre as prescrições e o realizado nos ACs, atentando-se para características responsáveis por sua
relativa estabilidade enquanto gênero discursivo; iii. análise das relações dialógicas estabelecidas
com o leitor presumido em cada uma das articulações dos artigos do corpus; iv. verificação das relações dialógicas estabelecidas com outros enunciados em cada uma das articulações dos artigos.
Definiram-se como categorias de análise a forma composicional, o dialogismo interacional
e o dialogismo interdiscursivo.
Categorias de análise
Forma composicional
Nos ACs, a forma composicional é o primeiro dos três elementos constitutivos do gênero que
saltam aos olhos antes mesmo de se ler o texto. Por conta desse impacto que causa no primeiro
contato com o AC e pela importância que se lhe é dada nas prescrições dos manuais, a forma
composicional é tomada nesta pesquisa como uma das categorias de análise. Essa categoria de
análise possibilita verificar as possíveis relações dialógicas entre os manuais e os ACs que estejam
ou não associadas à relativa estabilidade do gênero. Embora tido como gênero estável, padronizado, há indicações, tanto nos manuais, quanto nos próprios artigos, de que o AC pode sofrer alterações em função de conteúdo temático, principalmente por conta das diferentes áreas do saber.
Dialogismo interacional
Esta categoria visa verificar, nas diferentes articulações do AC, a relação dos enunciados
com seus interlocutores presumidos.
O dialogismo interacional é constitutivo do enunciado, pois a interação é um dos pressupostos teóricos fundantes da teoria dialógica do círculo de Bakhtin. É em função da interação que
os participantes de um discurso constroem o significado, concretizando o processo de compreensão ativa e responsiva, considerado por Bakhtin tão importante. O ser humano é socialmente
336
construído e afirma sua existência social em função de sua relação com o outro. Ninguém existe
fora das relações sociais implícitas à interação.
Esse discurso direcionado a interlocutores presumidos sempre deixa marcas no enunciado,
ainda que estas não sejam facilmente apreendidas. São essas marcas que se busca identificar.
Dialogismo interdiscursivo
A terceira categoria de análise, o dialogismo interdiscursivo nas diferentes articulações composicionais do gênero, recai sobre a noção do interdiscurso (diálogo entre os diferentes discursos). Embora este termo não apareça claramente na obra do círculo, é uma noção delineada ao
longo de seus escritos e aproxima-se dos conceitos de heterogeneidade de Authier-Revuz (1990)
e de interdiscursividade de Maingueneau (1997).
Esta categoria possibilita verificar a presença de dois ou mais discursos em um único, seja por
meio de análises sintático-lexicais, pela presença de elementos retóricos utilizados pelos autores
(conscientemente ou não), ou de polêmicas/anuências ideológicas, desde que possibilite a apreensão da constituição do discurso em função do outro.
Outra contribuição importante dessa categoria é a possibilidade de se verificar que os enunciados se relacionam com a memória discursiva de modo não só a re-significá-la2, mas de proporcionar uma abertura para a produção de novos enunciados.
Resultados preliminares
A primeira das quatro etapas da análise está concluída, sendo possível ponderar algumas
importantes observações acerca dos manuais no que concerne a sua organização geral e, principalmente, quanto às prescrições acerca de artigos científicos.
Observações gerais quanto aos manuais
De modo geral, os manuais objetivam a normatização estrutural de discursos científicos,
dentre os quais o AC, a fim de orientar estudantes na elaboração de seus textos. Rey (1993)
direciona seu manual a estudantes de graduação e pós-graduação da área médica e biológica,
apresentando prescrições um pouco mais específicas, dentre as quais apenas um modelo de AC.
Andrade (1995) também direciona seu manual a estudantes, mas de áreas em geral. Ressalta ter
ciência das diferenças entre as áreas do saber e, por isso, optou por “oferecer noções genéricas,
baseadas nas normas da ABNT, ISSO, ANSI, que poderão ser adaptadas a cada caso particular”
(p. 7). Sá et al. (1994) têm objetivo um pouco mais amplo e ligeiramente diferenciado dos demais.
Direcionado a alunos de graduação e pós-graduação, mas principalmente a instituições de ensino
superior e especialistas da área de normatização, seu manual visa consolidar um padrão aceito
por toda a comunidade envolvida e possibilitar “maior qualidade no registro das observações
científicas, técnicas e culturais” (p. 15). A ABNT (2003), por sua vez, define como objetivo somente o estabelecimento de um “sistema para apresentação dos elementos que constituem o artigo em publicação periódica científica impressa” (p. 1), sem definir o público a que se destina.
2
Termo emprestado de Maingueneau (1997).
337
Conforme verificado, Sá et al. (1994) e a ABNT (2003) indicam um modelo de AC, mas reconhecem a existência de outros e ressaltam a necessidade de adequação da forma em função da
área do saber. Andrade (1995) não só reconhece a existência de diferentes modelos de AC, como
apresenta cinco deles em suas prescrições, “baseados em três autores de diferentes áreas” (p. 65).
Rey (1993) diferencia-se dos demais nesse aspecto, pois seu manual é claramente direcionado a
um público muito específico, não havendo motivos para ressaltar outros modelos de AC.
Diante dessas observações, pondera-se que, em função dos seus objetivos, os manuais não pretendem compreender nem discutir questões relativas à formação/concepção do gênero AC, mas o
tomam como uma ferramenta para transmissão do saber científico que necessita uma “regulamentação”, para que seja utilizada corretamente no alcance dos objetivos daqueles que se utilizam dela.
Forte incidência de normatização sobre a forma composicional
Os objetivos dos manuais não só regem sua concepção, como perpassam todas as prescrições, fazendo-se visíveis a todo momento. É conseqüência desses objetivos que as prescrições
incidem fortemente sobre a forma composicional dos ACs, colocando em segundo plano os
demais elementos que constituem o gênero, a saber, estilo e conteúdo temático. Levanta-se como
hipótese para este distanciamento o fato desses dois elementos necessitarem de uma abordagem
complexa e profunda, o que talvez pudesse distanciar os manuais de seus objetivos didáticos, que
se relacionam principalmente à descrição das partes do AC.
Segundo Bakhtin (2003), as formas composicionais são modos específicos de estruturar a
obra externa, dando conta somente da realização do objeto material, parte integrante da obra estética na sua totalidade, e são determinadas pela forma arquitetônica. A relação entre as duas formas é muito complexa, todavia, podemos compreender a forma arquitetônica como o processo
que envolve a concepção da obra como um todo, integrando tempo, espaço, material, conteúdo,
forma e organização/articulação de valores éticos/morais atribuídos pelos sujeitos aos signos.
É em função desses elementos que a forma arquitetônica “escolhe” a forma composicional. No
caso dos ACs, sua forma concisa, enxuta e clara submete-se a um dos valores éticos científicos,
que é transparecer a objetividade que perpassa todo o processo científico.
Forma composicional do AC prescrita nos manuais
Conforme ressaltado, a forma composicional é priorizada nos manuais, sendo que três deles
apresentam basicamente um modelo de AC, embora reconheçam a existência de outros. Andrade (1995) não só reconhece essa múltipla existência, como apresenta cinco modelos de AC: dois
deles são similares entre si e em relação ao que os outros manuais apresentam; outros três são
apresentados de forma muito abstrata e confusa, sendo desconsiderados nesta pesquisa.
A ABNT (2003) divide o AC em elementos pré-textuais (título, autoria, resumo, palavras-chave), textuais (introdução, desenvolvimento e conclusão) e pós-textuais (título em língua estrangeira, palavras-chave em língua estrangeira, notas explicativas, referências, glossário, apêndice e
anexos). Essa divisão é adotada por Sá et al. (1994) e Andrade (1995), que, embora não utilizem
a nomenclatura “Desenvolvimento”, apresentam três articulações que lhe equivalem: “Material e
338
método”, “Resultados” e “Discussão”. Esse modelo é muito similar ao proposto por Rey (1993),
que não inclui a articulação “Conclusões”, aproximando-se mais ao modelo IMRD (Introdução,
Metodologia, Resultado, Discussão) proposto por Coracini (1991).
A despeito de tais similaridades entre os manuais, algumas diferenças podem ser notadas.
Nos elementos pré-textuais, Andrade (1995) e Rey (1993) não mencionam a existência das palavras-chave. No que tange ao resumo, cada manual sugere uma determinada quantidade de
palavras considerada ideal para um bom resumo. Apenas a ABNT (2003) coloca o resumo em
língua estrangeira como elemento pós-textual.
Nos elementos textuais, Andrade (1995) é a única é indicar a presença dos agradecimentos na
Introdução. Para os demais, esta é uma articulação pós-textual. Em “Resultados”, Sá et al. (1994)
ponderam fundamental a existência de tabelas, quadros e gráficos, ao passo que Rey (1993) sugere sua utilização eventual nesta articulação, privilegiando sua utilização em “Discussão”. A maior
diferença nos elementos textuais é o fato de Rey (1993) não considerar a articulação “Conclusão”. Segundo o autor, a discussão está inter-relacionada às conclusões, sendo a existência desta
última redundante e desnecessária.
Breves conclusões
A priori, o AC poderia ser considerado um gênero estável, sendo incluído dentre os diversos
gêneros com grande estabilidade. Todavia, analisando a fundo as prescrições, verifica-se que esse
gênero está sujeito a algumas quebras em sua forma composicional, revelando que as prescrições
não devem ser vistas como uma “camisa de força”, mas como diretrizes básicas não rígidas para
a construção de um AC. Os próprios manuais, ao reconhecerem a existência de outros modelos
de AC, corroboram tal ponderação.
O AC é uma forma de organizar o saber científico, desse modo, está sujeito a alterações
em função de modificações que ocorram no processo científico. Assim, embora os manuais
pudessem constituir-se em grandes colaboradores na perpetuação do gênero AC, favorecendo a
manutenção da estabilidade do gênero, reconhece-se a flexibilidade do AC, deixando a pergunta
sobre até que ponto eles influem nessa manutenção do gênero AC.
Referências
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– artigo em publicação periódica científica – Apresentação. Rio de Janeiro, 2003.
AMORIM, C. Produção científica do país cresce e melhora. 2007. Disponível em: < www.
jornalismo.ufms.br/index.php?alt=noticia&id_not=275>. Acesso em: 06 out. 2008.
ANDRADE, M. M. de. Como preparar trabalhos para cursos de pós-graduação. São Paulo: Atlas, 1995.
AUTHIER-REVUZ, J. Heterogeneidade(s) enunciativa(s). Caderno de Estudos Lingüísticos, Campinas, n. 19, p. 25-42, jul./dez. 1990.
339
BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 2.ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
BARROS, A. J. D. Produção científica em Saúde Coletiva: perfil dos periódicos e avaliação pela
Capes. Rev. Saúde Pública, v. 40, n. especial, p. 43-49, 2006.
CORACINI, M. J. Um fazer persuasivo: o discurso subjetivo da Ciência. São Paulo: Educ/
Pontes, 1991.
HENZ, G. P. Como aprimorar o formato de um artigo científico. Horticultura Brasileira, Brasília,
v. 21, n. 2, p. 145-148, 2003.
MAINGUENEAU, D. Novas tendências em análise do discurso. Campinas: Pontes/Editora da Unicamp, 1997
REY, L. Planejar e redigir trabalhos científicos. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Edgard Blücher, 1993.
SÁ, E. S. de et al. Manual de normalização de trabalhos técnicos, científicos e culturais. Rio de Janeiro:
Vozes, 1994. p. 55-62.
TEIXEIRA, G. J. H. Artigo científico: orientações para sua elaboração. Disponível em:
<http://www.serprofessoruniversitario.pro.br/ler.php?modulo=21&texto=1334>. Acesso
em: 05 nov. 2005.
340
Sobre o livro
Composto em Garamond 16/12/10 (título, subtítulo, intertítulo e textos)
e Franklin Gothic Book 8 (legendas)
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