Procuradoria Geral da Republica
3a Camara de Coordenacao e Revisao
Consumidor e Ordem Economica
E!Z E.F!:r 3!± CO E:->TA'CO DE I.J;rc'IT'. EC;fNOti000
Rel. 0860/2011/RHSC
PEAS DE INFORMACAO N.° 1.16. 000.002544/2011-51
ORIGEM : PR/DF
INTERESSADO : (Nihil)
PROCURADOR (A) OFICIANTE: Marcus Marcelus Gonzaga Goulart
RELATOR : Antonio Fonseca
EMENTA: 1. Consumidor. Ordem Economica. Materias jornalisticas.
Noticia de eventual lucro abusivo das montadoras de automoveis com
os veiculos vendidos no Brasil em comparacao aos vendidos no exterior.
2. Nao houve instrucao. 0 Procurador oficiante indeferiu abertura de
investigacao por ausencia de indicio de "negligencia ou omissao dos
orgaos federais" e, na sua opiniao, inexistencia de acao para alterar o
cenario. 3. A parte o chamado custo-Brasil, barreiras a importacao,
carga tributaria e mao-de-obra, os precos altos podem ser indicio de
falhas de mercado e de regulamentos obsoletos. Ha diversas questoes
que merecem exame, tais como concorrencia via importacao de
veiculos, exclusividade de venda de veiculos novos, acesso a
informacoes no servico pos-venda, proibicao de restricoes territoriais na
comercializacao, acesso a desenhos industriais das pecas de reposicao.
4. Voto: conversao do julgamento em diligencia para requisitar a
SERE/MF (Port. 386/2009) estudo sobre o assunto, inclusive revisao
da Lei Ferrari (L. 6.729/79) e investigacao especifica (questoes
assinaladas), alem de provocar estudos pelo IPEA no ambito do
convenio firmado pelo MPF e esse Instituto. Divulgue-se. Mantenha-se
o procedimento nesta Camara, ate cumprimento das diligencias. Oficie-
se. De-se ciencia ao procurador oficiante.
I-RELATO
1. OBJETIVO DO PROCEDIMENTO
Apurar suposto lucro abusivo das montadoras de automoveis com
os veiculos vendidos no Brasil em comparacao aos vendidos no
exterior.
Rel. 0860 /2011/ RHSC Pecas de Informasao N.° 1 . 16.000 . 002544/2011-51
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2. ORIGEM (forma de instauracao)
Procedimento administrativo instaurado a partir de copia de
noticia jornalistica enviada sigilosamente a Procuradoria da
Republica no Distrito Federal (fls. 04/07).
3. INSTRUcAO
Nao houve.
4. ARQUIVAMENTO (MOTIVACAO)
0 Procurador da Republica oficiante arquivou o procedimento
com as seguintes consideracoes (fls. 10v):
Indefiro a instauragao de inquerito civil e promovo o imediato arquivamento
dos autos ante a manifesta ausencia de ilegalidade a apurar.
As reportagens juntadas noticiam o alto prego de veiculos e outros bens no
Brasil em comparagao com outros palses, sugerindo que tal fato decorre
primordialmente do grande lucro praticado pelas montadoras brasileiras.
Nao ha noticia de negligencia ou omissao dos orgaos federais sobre o tema e
nem ha correlagao com servigos publicos federais.(...]
Esse problema so pode ser resolvido pelos proprios consumidores. Nao ha
lei, estrategia governamental ou atuagao do MPF que possa alterar esse
patamar.
5. RECURSO
Nao houve.
II - VOTO COLETIVO
O assunto nao gera interesse federal diretb, que propicie ao
Ministerio Publico Federal tomar, nesta oportunidade, alguma
medida judicial concreta. No entanto, a Instituicao, no ambito
das suas atribuicoes de zelar pela observancia dos principios
constitucionais relativos a atividade economica (LC 75/93,
art. 50, II, "c") e de defesa do consumidor, ester habilitada a
provocar orgaos federais competentes a voltar a sua atencao
para o terra.
Os precos ao consumidor de veiculos no Brasil' 4 (um dos mais
elevados do mundo. Os argumentos e explicacoes usualmente
oferecidos acabam por levantar questoes que, embora antigas',
continuam bastante atuais. Isso e facilmente verificado pelas
varias materias jornalisticas veiculadas na midia
recentemente. Basta conferir os seguintes links:
http:// quatrorodas . abril . com.br / re portage ns / carro - tao-taro - bras il - 394648.shtmI
http:// www.correiodoestado . com.br / not4cias / Iucro - e-nao-imposto faz-brasileiro - pagar-o -carro- mail - caro_ 115896/
http:// www.webmotors . com.br / wmpublicador / Mercado_ Conteudo . vxlpub?hnid=45643
A proposito, esta 3a Camara colheu impressoes de dois
economistas do seu quadro:
Bom, de uma forma geral, o prego final do carro no Brasil 6 dos mais caros
do mundo. Segundo estao informando na midia, o lucro do setor
automobilistico aqui no Brasil tambem e um dos mais elevados do mundo. Ou
1 Cf. Parecer Tecnico no 15/2006 da 3a CCR, emitido no PA n. 1.29.000.000243/2004-14 (PR/RS).
Rel. 0860/2011/RHSC Pecas de Informasao N.° 1.16.000.002544/2011-51 3
seja, o suposto "custo brasil" no parece estar atrapaihando esse setor.
O prego em um mercado e determinado pela oferta e demanda, sendo que a
oferta e determinada, basicamente, pelo custo de produgao. Ou seja, se o
custo de produgao aqui a realmente muito elevado (o que eu nao duvido),
entao seria realmente de se esperar que os pregos dos carros nacionais
fossem mais elevados do que as importados. No entanto, claramente ha
espago para ainda assim reduzir o prego dos automoveis e manter lucros
razoaveis (se realmente os lucros atuais forem tao elevados assim). E ai que
entram os carros importados chineses e coreanos. Esses carros vinham
entrando com pregos finals mais baratos, beneficiando os consumidores com
um mercado mais competitivo e com possibilidades de comprarem carros a
pregos mais baixos, o que se imagina que estava incomodando as
montadoras nacionais. Com a elevagao do IPI, os carros importados se
tornarao mais caros e, pior, nao ha por que se imaginar que os carros
nacionais tambem nao sofrerao uma elevagao dos pregos. (Raquel Lima,
economista).
Ainda:
A carga tributaria explica somente uma parte dos pregos elevados.
Certamente a Lei Ferrari explica o resto. Desde o seculo passado o Cade ji
defendia sua revogagao. Fiz um parecer na camara abordando o assunto,
inclusive analisando o novo regime automotivo da comunidade europeia, no
qual constam as seguintes inovagoes, perfeitamente aplicaveis ao Brasil:
- fim da exclusividade na venda de veiculos novos;
-livre acesso das empresas de assistencia tecnica as informagoes
necessarias a prestagao dos servigos pos venda;
- proibigao de restrigoes territorials na comercializagao;
-acesso aos desenhos industrials das pegas de reposigao.
(...)
No parecer que mencionei tinha a sugestao de encaminha-lo para a SDE. Em
resposta a SDE encaminhou urn longo e bern elaborado parecer sugerindo ao
CADE arquivar uma representagao sobre o assunto, dada a inexistencia de
pratica anticompetitiva. Claro que a regulamentagao ajudou a descaracterizar
abuso de poder de mercado pelas montadoras.
Quanto ao assunto "restrigoes a importagao de veiculos", lembro que na
decada de 80 os japoneses invadiram o mercado norte-americano de
automoveis e o governo americano fez pior: estabeleceu quotas de
importagao de veiculos. Foram mais heterodoxos do que o Brasil. Mas a
politica adotada surtiu efeito: os japoneses transferiram suas fabricas para os
EUA.
(Roberto Alves, economista).
Como se ve ,
barreiras a
a parte o chamado custo-Brasil ,
importagao ,
carga tributaria e mao-de-obra , os pregos altos
podem ser indicio de falhas de mercado e de regulamentosobsoletos , como a chamada Lei Ferrari ( L. 6.729 /79). r^ A livre iniciativa , preceito fundamental , inibe o Estado'd
170, --^( CF, art .
aventurar - se em intervencoes indevidas
No entanto, o regime capitalista deve
paragrafo unico ).
conviver com a defesa do consumidor e a repressao dos entraves/
a concorrencia ( art. 173 § 40), a fim de assegurar que as
cidadaos possam tirar o melhor proveito dos seus recursos, em
Rel. 0860/2011/ RHSC Pecas de Informaca" o N.° 1.16.000.0025 44/2011-51
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ambiente de livre escolha.
Isso significa que no Estado de Direito economico existe
espaco para o acesso dos cidadaos as informacoes essenciais as
suas decisoes de consumo, em meio a recursos escassos. No
entanto, sem o apoio do Estado, essas garantias nao passam de
promessas vas. Por isso, e legitimo ao mesmo Estado, em
obsequio a promocao do bem comum ou a alocacao equilibrada de
riquezas, empreender todo o esforco para colocar a disposicao
dos cidadaos os meios de agregar valor aos seus recursos.
A Secretaria de Acompanhamento Economico do Ministerio da
Fazenda, que tem a atribuicao de promover a advocacia da
concorrencia, podera investigar a existencia de condicoes
adversas a competicao, em articulacao com outros orgaos
publicos (Por. MF n. 386/2009). 0 Instituto de Pesquisa
Economica Aplicada (IPEA), fundacao publica federal,
desenvolve a atividade de pesquisa para o suporte a formulacao
e reformulacao de politicas publicas. 0 Ministerio Publico
Federal recentemente firmou convenio de cooperacao com o
Instituto. No ambito desse acordo, ele podera desenvolver
estudos sobre o assunto, sobretudo para verificar se existe
conveniencia ou nao na manutencao da chamada Lei Ferrari (Lei.
n. 6.729/79).
Desse modo, e necessar.io requisitar a investigacao da SEAE/MF
e os estudos do IPEA. Diante desses trabalhos, este orgao
ministerial avaliara a possibilidade de provocar outros orgaos
governamentais, seja para aprofundar a investigacao de
eventuais falhas de mercado ou para considerar a revisao
regulatoria ou legislativa.
0 pals tem custo de vida muito alto. A infraestrutura de
transporter urbanos e de modo geral precaria, o que torna os
cidadaos mais dependentes do veiculo proprio, nos seus
deslocamentos diarios, seja para o trabalho ou a lazer. E
funcao do governo dar a sociedade explicacoes seguras acerca
do cenario de mercado e demonstrar que tem dado o melhor de si
para o equilibrio dos interesses envolvidos e em prol dos
interesses dos cidadaos.
Parece oportuno advogar mudancas simultaneas no mercado, de
modo a liberar o sistema de precos de veiculos. A sugestao de
mudancas deve ser apoiada por estudos que indiquem com
seguranca os indices responsaveis pelos altos precos. Esta 3a
Camara deve alertar aos orgaos do Sistema Nacional de Defesa
do Consumidor (SNDC) que os precos altos de veiculos se devem
a amarras de mercado, entre outras, de natureza legal, e que e
preciso que o Sistema possa encetar campanhas contra essas
travas. A esse respeito, a experiencia do Departamento de
Defesa do Direito do Consumidor (DPDC/MJ) na abordagem do
assunto deve ser consultada.
A Lei Ferrari pode ter tido algum papel, ha 30 anos, na
reestruturacao dos mercados de veiculos no Brasil, numa epoca
Rel. 0860/2011/RHSC Pecas de Informacao N.° 1.16.000.002544/2011-51 5
em que vigia uma economia de controle de pregos. Mas hoje
existem fortes suspeitas de que essa lei e desnecessaria e ate
prejudicial. As autoridades brasileiras - se realmente prezam
pelos direitos dos cidadaos consumidores - devem ter a coragem
de promover a sua revogacao. Ou pelos menos a sua revisao, de
modo a excluir todas as possibilidades de impacto negativo nas
escolhas dos compradores de veiculos.
O mercado de autopecas deve, tambem, ganhar vigor com a
liberacao do use de desenhos industriais, facilitando a
industrializagao e comercializagao de autopegas com qualidade.
Onde direitos de propriedade industrial subsistirem, o
pagamento de royalties razoaveis pode ser a via rapida para a
liberagao da producao.
Talvez os estudos tecnicos nunca consigam computar com a
seguranca advogada por alguns setores o real efeito das
restricoes legais ou regulatorias. Mas como justificar a
necessidade dessas barreiras artificiais para tornar dinamicos
mercados que, por si, devem ser livres segundo a ideologia
constitucional?
O sistema juridico nacional ja conta com um Codigo Civil
moderno e amplo quanto as hipoteses de negocios. 0 Codigo do
Consumidor e a Lei de Defesa da Concorrencia tambem fazem
parte desse sistema juridico. Todos esses diplomas legais sao
fontes suficientes para orientar a organizacao do comercio e
da produgao. Nesse cenario, em vez de enveredar por discussoes
interminaveis ou encomendar estudos dispendiosos, parece mais
sensato livrar-se de todo o excesso que possa dificultar a
livre escolha dos consumidores.
O fundamental e a liberdade de comercio, de produgao e de
escolha dos consumidores. Essa liberdade nao precisa ser
comprovada. Mas precisa de canais livres para manifestar-se
com toda a sua pujanca.
Tudo isso justifica converter o procedimento em diligencia.
Assim,
deliberamos requisitar a SEAE/MF investigar o assunto,
em tempo razoavel - nao superior a 180 dias - especificamente
as questoes de concorrencia via importagao de veiculos,
exclusividade de venda de veiculos novos, acesso a informagoes
no servico pos-venda, proibicao de restrigoes territoriais na
comercializagao, acesso a desenhos industriais das pecas de
reposicao e tudo mais que considerar importante a compreensao
do problema. Deve ser considerado pela coordenacao desta 3a
Camara, tambem, promover estudos semelhantes no ambito do
convenio com o IPEA, com o amplo proposito de elucidar o
problema, inclusive, sendo o caso, examinar a possibilidade de
formular campanha de revogagao da Lei 6.729/79, com o apoio
dos representantes locais dos Ministerios Publicos e das
entidades estaduais de defesa do consumidor, que integim o!,
chamado SNDC, sem excluir quaisquer outros entes. j^^^,,
Enquanto nao forem executadas as diligencias, sob a iniciativa, ^'4,
- 1.16 .000.002544/2011-51
Rel. 0860 /2011/ RHSC Pe4as de informa0o N.°
da coordenacao, mantenha-se o procedimento nesta Camara.
Oficie-se. De-se ciencia ao procurador oficiante.
Brasilia - DF,3 V de setembro de 2011.
ANTONIO
ECA
r
da Republica
SubprocuradorMe Eoflr e d ©-tea 3a CCR
g g^, E^rI^QS S ANTOS
Subprocurador-Geral da Re-idb.lica
Membro titular da 3a CCR
JOSE ELAERES
Procurador Regio
Membro titul
IRA
Republica
a -3a CCR
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INTERESSADO : (Nihil) se. De-se ciencia ao procurador oficiante.