Roteiro para Elaboração do Projeto de Pesquisa
RONALDO BALTAR
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA
Importância do Projeto
A Elaboração1 do Projeto de Pesquisa, como etapa prévia de uma atividade de pesquisa
científica, é necessária na medida em que se constitui no momento em que o pesquisador irá
iniciar a reflexão sobre a construção de seu objeto de estudo e da problemática que conduzirá
a coleta e a análise dos dados, deixando claro para si e para os que se interessarem por seu
estudo os seus pressupostos e as suas hipóteses sobre a realidade a ser investigada. Assim, o
Projeto não é apenas uma formalidade acadêmica. É o primeiro passo da pesquisa científica.
Geralmente o projeto inicia-se pela escolha de um tema genérico do qual o pesquisador
possua algum interesse ou alguma afinidade intelectual ou afetiva. Uma vez definido o tema,
cujo critério de escolha será sempre pessoal, o pesquisador deverá transformá-lo em problema
de pesquisa e posteriormente (ou concomitantemente) irá definir o objeto de estudo.
O caminho mais seguro para a definição de uma problemática relevante e consistente é a
leitura de trabalhos na área em que se quer pesquisar. Portanto, após a definição do tema, o
segundo passo é a realização de uma pesquisa bibliográfica que procure ser tão abrangente
quanto o prazo que se dispõe para as leituras. Da primeira seleção bibliográfica, o pesquisador
dever escolher os títulos que são de interesse fundamental para a pesquisa, quais são os textos
secundários e se for o caso quais são os textos que serão tratados como fonte de dados
secundários. Serão os textos fundamentais, aqueles que contenham definições conceituais ou
afirmações teóricas com as quais o pesquisador pretenda dialogar diretamente em seu estudo.
Serão secundários todos aqueles textos de comentaristas sobre estes conceitos ou formulações
teóricas que o pesquisador elegeu como prioritárias. Os textos de dados secundários serão
aqueles tratados como fonte de dados para a pesquisa e não propriamente como referencial
teórico. Para o projeto, como se trata de um momento de definição de pressupostos e hipóteses
para a pesquisa futura, o pesquisador deve concentrar-se na leitura daqueles textos
fundamentais para a construção do seu objeto, deixando a leitura dos demais para o momento
seguinte da pesquisa.
A pesquisa bibliográfica deve ser feita sobre o tema e não apenas sobre o objeto de estudo
específico. Por exemplo, se um pesquisador define como objeto de estudo “a relação entre a
organização de moradores e a política municipal de saneamento nos bairros A, B e C de um
município X”, e for a uma biblioteca poderá não encontrar um só título sobre as associações
de moradores ou sobre saneamento nos bairros de seu interesse. Poderia alegar então que seu
“tema” nunca foi estudado e portanto estaria dispensado de quaisquer leituras prévias,
iludindo-se com o pioneirismo de sua proposta. Na verdade, para este caso, o tema a que se
refere o objeto seria “movimentos sociais e políticas públicas”, sobre o qual existem dúzias de
trabalhos publicados ainda que cada um possua como base empírica outros objetos de estudos
e não os bairros A, B e C do município X.
1
Ronaldo Baltar é professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina. Este roteiro foi elaborado para
auxiliar alunos do programa de pósgraduação em Ciências Sociais da UEL.
2
A pesquisa bibliográfica deve começar assim com palavras-chave de referência ao tema,
indo da mais abrangente à mais particular, como por exemplo: “movimentos sociais” e
“políticas públicas”; “associação de moradores” e “política de saneamento”; “associação de
moradores dos bairros A, B e C” e “política de saneamento no município X”.
O autor do projeto deve ter em mente sempre que quanto mais ambiciosa for a intenção de
seu estudo, no sentido de contribuir para um debate geral sobre um tema específico, mais
relevante será sua proposta de trabalho. Ao contrário, quanto mais sua pesquisa se esgotar no
próprio objeto, menos relevante será. A ambição obviamente deve ser circunscrita aos meios
para execução da pesquisa, ou seja, instrumentos analíticos propícios, formação do
pesquisador no assunto, pessoal qualificado para apoio, disponibilidade de dados, existência
de recursos financeiros e prazos adequados para a realização da pesquisa.
No caso de uma monografia de especialização, os recursos à pesquisa serão aqueles
oriundos apenas da capacidade e da formação do pesquisador para realizar uma reflexão
madura sobre um problema retirado de um objeto de seu interesse, em um prazo de seis meses
para a redação do texto final. A ambição deve ser no caso, em primeiro lugar, a formação
pessoal do pesquisador e em segundo lugar construir uma explicação que traga alguma
contribuição para um debate de interesse na área. Portanto, para a monografia, a ambição e o
objetivo da pesquisa devem ser realizar a reflexão mais profunda que for possível em seis
meses de estudo sobre um objeto específico, e não realizar em seis meses o que normalmente
seria feito em uma pesquisa de quatro anos.
Definido o problema e o objeto, ambos tendo como referência um debate temático
encontrado na bibliografia pesquisada e delimitados pelos recursos e pelo prazo de conclusão
do trabalho, resta ao pesquisador formular suas hipóteses e definir os procedimentos
metodológicos.
A apresentação do projeto não possui uma regra universal pronta. Cada instituição (CNPq,
FAPESP, PROPG-UEL, etc.) possui suas próprias normas para a apresentação de um projeto.
Para facilitar a discussão sobre a monografia nos Seminários de Projeto do curso de
Especialização, sugere-se que os estudantes sigam a estrutura geral de um projeto de pesquisa
apresentada a seguir.
BALTAR, Ronaldo. Roteiro para Elaboração do Projeto de Pesquisa.Texto de orientação para o Programa de
Pós-graduação em Ciências Sociais – UEL, Londrina, 2000.
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Estrutura Geral de Apresentação de um Projeto de Pesquisa
• Título
O Título deverá ser uma apresentação da pesquisa. Deverá informar de forma
concisa do que se trata a proposta de investigação apresentada. O ideal é que se
consiga um título ao mesmo tempo elegante e claro o suficiente para demonstrar a
intenção e o alcance do projeto de pesquisa. Contudo, entre um título elegante, mas
pouco claro, e um título esclarecedor ainda que pouco elegante, deve-se optar pelo
segundo. Tomando o exemplo anterior, um título adequado seria: “O impacto da
organização de moradores na concessão de serviço públicos de saneamento: um estudo
comparativo nos bairros A, B e C do município X”. Um título inadequado seria: “O
saneamento da política e a política de saneamento: uma sociologia dos movimentos
sociais”.
• Introdução
A introdução deverá ser um breve resumo do projeto, contendo o problema o
objeto e os objetivos se for o caso, de forma a que possa informar ao leitor, com uma
leitura rápida, o que pretende a pesquisa proposta.
• Justificativa
A justificativa será a parte em que o pesquisador irá demonstrar a relevância da
sua proposta de investigação. A relevância de um projeto nunca está nele mesmo.
Tampouco está na vontade do pesquisador, nem no ineditismo do trabalho.
Não adianta justificar um projeto com frases do tipo: “...acreditamos que a nossa
proposta por si mesmo justifique a relevância desta pesquisa, dado ser este um tema
inédito e que, pela própria situação de miséria dos trabalhadores, já se faz necessário
a muito um estudo desta natureza”.
A justificativa de um projeto está na contribuição que poderá fazer para um
melhor conhecimento sobre um tema qualquer a que refira a pesquisa. A relevância é
dada pela possibilidade de contribuição ao tema. Portanto, para redigir a justificativa o
pesquisador deverá ter lido a bibliografia que, de acordo com seus interesses de estudo,
foi classificada como principal sobre o seu tema. Deverá apresentar aqui qual é o
principal debate travado nesta área e como percebe que sua investigação poderá
contribuir para o esclarecimento das questões colocadas. Normalmente, nesta parte o
pesquisador apresenta as lacunas que existem nos estudos até então realizados e sua
contribuição será preencher uma ou mais destas lacunas. Ou então, sua contribuição
será demonstrar de forma crítica que aquilo que se entendia até então como certo em
uma dada argumentação é uma interpretação incongruente com a realidade atual.
A redação da justificativa só pode ser feita após a leitura das obras
consideradas básicas para o tema. No caso de um tema sobre o qual nunca foi escrito
nada, o pesquisador terá mais trabalho para demonstrar sua relevância, pois se em 100
BALTAR, Ronaldo. Roteiro para Elaboração do Projeto de Pesquisa.Texto de orientação para o Programa de
Pós-graduação em Ciências Sociais – UEL, Londrina, 2000.
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anos de sociologia ninguém nunca se debruçou sobre esta questão é porque talvez
pouco valor explicativo ela tenha para o entendimento da sociedade. Neste caso será
relevante o tema, caso o pesquisador demonstre tratar-se de relações sociais ou práticas
sociais novas, atuais, que surgem em decorrência de determinadas transformações e
que potencialmente podem implicar em uma nova dinâmica ou uma nova organização
social.
• Problema de Pesquisa
O problema de pesquisa é o ponto de partida da investigação científica. Por
definição, uma pesquisa só é necessária na medida em que existe uma dúvida a ser
esclarecida. Se não houver dúvida, não será necessário haver pesquisa. O problema
constitui-se por esta dúvida inicial que motiva e orienta a pesquisa. Deve ser redigido
de forma clara e argumentativa de forma a que o leitor do projeto e próprio
pesquisador entendam qual é a questão a que se busca uma resposta, pois o primeiro
passo para se atingir um conhecimento sobre algo é precisamente ter claro o que se
quer saber. Inicialmente a questão que se formula é proveniente de uma inquietação
genérica sobre uma realidade ou sobre um tema que se tem afinidade.
No exemplo citado, sobre “organização de moradores e saneamento”, suponhase que um pesquisador que more num bairro C , ao ir todos os dias para o trabalho em
seu “centro de pesquisa” passe pelo bairro A e observe que em um bairro exista
saneamento e no outro não. Uma questão que lhe poderia vir a cabeça diariamente
seria: “porque um bairro tem saneamento e outro não”? Esta questão genérica, para
torna-se um problema de pesquisa deve ser moldada dentro dos limites do campo de
investigação científica. Esta questão é genérica porque existem diferentes níveis de
resposta possíveis. “Por que não há saneamento em um local e há em outro”? Por
motivos econômicos, motivos geológicos, motivos jurídicos, motivos demográficos,
motivos educacionais, motivos de engenharia, motivos sociológicos (sociais, políticos
e culturais) entre tantos outros.
Assim, para tornar-se um problema de investigação sociológica, esta
inquietação proveniente da experiência cotidiana do pesquisador deve atender a alguns
requisitos. Em primeiro lugar deve atender ao objeto básico da sociologia. O que a
sociologia estuda, ou seja o seu objeto, é definido por “relações sociais” ou “fatos
sociais” ou “ações sociais”, dependendo da matriz teórica clássica que se queira. Logo,
a pergunta formulada tem que ser feita sobre um conjunto de “relações sociais”.
Qualquer pergunta que não envolva um conjunto de relações sociais não poderá ser
respondida pela sociologia. Para cada ciência em particular, o problema de pesquisa
deve estar dentro do limite explicativo do seu objeto de estudo básico, aquele que a
define como uma ciência específica em relação as demais. Assim, retomando o
exemplo, um problema de pesquisa sociológico possível seria “que relações sociais
existem nestes locais que favorecem ou bloqueiam a adoção de política públicas
básicas, no caso o saneamento”? Apesar de estar no campo sociológico, esta questão
ainda está genérica, dado que as relações sociais possíveis no caso são muito
abrangentes. Uma vez que o pesquisador possui um prazo determinado para realizar
sua pesquisa, onde não há possibilidade de esgotar todo o assunto de uma só vez, o
segundo passo a ser dado é a delimitação dos tipos de relações sociais que irão tornarse o objeto principal de estudo. No caso, após a leitura da bibliografia básica sobre o
BALTAR, Ronaldo. Roteiro para Elaboração do Projeto de Pesquisa.Texto de orientação para o Programa de
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seu tema, o pesquisador, desejando contribuir sobre o debate em torno dos conceitos
de movimentos sociais, cidadania e de poder local, poderia definir o seguinte
problema: “em que medida as organizações de moradores de bairro conseguem
influenciar a elaboração e a execução de políticas públicas locais”? Este problema
poderia ser ainda desdobrado nos seguintes: “que tipos de mecanismos de
representação política permitem esta influência por parte das associações de
moradores; e quais os obstáculos institucionais à representação destes interesses de
bairro na adoção e execução de política públicas locais, tomando-se o caso de uma
política de saneamento”? Uma vez definido e circunstanciado o problema de pesquisa,
o pesquisador deve descrever o seu objeto de estudo.
• Objeto de estudo
No texto do projeto, o item objeto de estudo é aquele reservado à descrição tão
minuciosa quanto possível do que será de fato estudado. Na verdade, o objeto em si é
construído pelo pesquisador juntamente com o problema de pesquisa.
Na exposição deve estar separado para tornar mais inteligível a proposta de
investigação. No exemplo adotado, o objeto seria descrito como as associações de
moradores nos bairros A, B e C do município X e a política de saneamento municipal
no período de tanto a tanto.
Não se deve confundir o objeto de estudo como a localização espacial do
objeto. Os bairros não são objetos. Os objetos de estudos são sempre, no caso da
sociologia, um conjunto de relações sociais que, neste caso, acontecem num
determinado local, durante um determinado tempo. É importante, nesta parte
descrever as características do objeto de estudo, quais as suas peculiaridades, e indicar
porque estes locais e este tempo foram escolhidos.
O exemplo utilizado refere-se a uma pesquisa empírica típica em sociologia.
No entanto, uma pesquisa para uma monografia pode também ter como objeto uma
reflexão teórica. A pesquisa teórica é diferente de uma pesquisa empírica baseada em
dados secundários ou em documentos (documentos históricos, dados já catalogados e
tabulados como os censos do IBGE, artigos de jornal, biografias escritas, etc.). Neste
caso, mesmo não havendo “contato” direto entre o pesquisador e as pessoas que
compõem o seu “objeto de estudo”, há uma investigação empírica sobre um dado
conjunto de relações sociais. Um estudo teórico na verdade é apenas uma parte do
pesquisa científica em si. Assim como também uma pesquisa exclusivamente voltada à
coleta de dados é uma outra parte da atividade científica. Para estar completa, a
reflexão científica deve envolver os dois momentos.
Contudo, voltando aos prazos, pode-se utilizar o momento da monografia para
uma pesquisa teórica, onde se imagina que posteriormente será utilizada como matriz
para um estudo empírico, que por sua vez irá alimentar outra revisão teórica,
completando o ciclo do pensamento científico. Trata-se de uma investigação sobre
conceitos que determinados autores utilizaram para formular um modelo explicativo
qualquer para a sociedade. Normalmente é um estudo crítico-comparativo, onde se
pretende demonstrar a insuficiência de um conceito ou de uma teoria, comparando-o
com outros conceitos de outros autores ou conceitos do próprio pesquisador. Uma
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pesquisa teórica não é portanto uma simples descrição sobre um conceito ou uma
teoria de um autor. Por exemplo, não se faz uma pesquisa sobre o conceito de
“sociedade civil” em Gramsci, cujo objetivo seja tão somente descrever este conceito.
A descrição conceitual constitui-se apenas em um estudo ou um fichamento que todo
pesquisador deve fazer para apreender o universo teórico que deseja. Seria um objeto
de estudo teórico por exemplo: uma proposta de reflexão crítica sobre “o alcance do
conceito de sociedade civil em Gramsci para a compreensão do processo de
construção do modelo de democracia operária”. Este tipo de objeto encerra em si um
problema de pesquisa: “em que medida o conceito de sociedade civil, tal como definiu
Gramsci, permite uma avaliação teórica sobre os obstáculos à construção da
democracia operária?”. Assim, na pesquisa teórica em sociologia o objeto não é
constituído diretamente por relações sociais, mas por conceitos sobre relações socais.
• Objetivos
Os objetivos de um projeto dependem fundamentalmente do tipo de pesquisa
que é realizada. Por exemplo, um projeto realizado sob encomenda do Ministério da
Saúde para uma caracterização do perfil social das comunidades onde há maior
concentração de casos de cólera, teria como objetivo “orientar a aplicação de medidas
de política pública na área de saúde, visando conter a doença”.
No caso de uma pesquisa acadêmica, como a monografia, o objetivo maior será
sempre trazer alguma contribuição explicativa a um debate qualquer sobre o tema em
que se está pesquisando.
Em alguns formulários de projeto, é solicitado que se especifique objetivos
gerais e específicos. Esta especificação não deveria ser uma obrigação dado que
dependendo da natureza do projeto objetivos gerais e específicos se confundiriam. No
entanto, sendo solicitado ou se o pesquisador sentir necessidade de explicitá-los desta
forma, pode-se seguir a seguinte regra básica: serão objetivos gerais tudo aquilo que se
referir a uma contribuição teórica que se espera alcançar com a pesquisa (por exemplo
revisão de um conceito de um determinado autor, etc.); serão objetivos específicos
tudo aquilo que se apresenta como resultado imediato do trabalho científico (por
exemplo apresentação de uma bibliografia atualizada sobre o tema, compilação de
novos dados sobre um assunto, etc.).
• Hipóteses
As hipóteses constituem-se por definição em respostas prévias, formuladas pelo
pesquisador, às perguntas feitas sobre o objeto de estudo. Ou seja, são respostas
provisórias ao problema de pesquisa.
As hipóteses são importantes por dois motivos. Primeiro permitem direcionar a
investigação, evitando a confusão de caminhos explicativos que inevitavelmente
apresentam-se ao pesquisador toda vez que começa a coletar dados. Segundo, porque
permite ao pesquisador avaliar os seus pressupostos sobre o objeto, evitando que se
tome por verdade o que não passa de uma opinião pessoal sobre um dado assunto.
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A formulação de uma hipótese consistente sobre um determinado problema de
pesquisa requer uma reflexão prévia sobre o tema abordado. Normalmente, a
elaboração de hipóteses maduras resultam de pesquisas anteriores que fornecem ao
pesquisador argumentos razoavelmente sólidos para a orientar sua investigação
científica. Hipóteses concisas e claras são, portanto, resultado da atividade contínua de
pesquisa.
Para um projeto de monografia, onde se imagina que o autor esteja dando os
primeiros passos de sua inserção em um campo de pesquisa de seu interesse, as
hipóteses formuladas apresentam via de regra um grau de superficialidade normal.
Neste sentido, um dos objetivos implícitos da monografia seria exatamente propiciar
ao pesquisador iniciante um momento oportuno para aprofundar-se numa dada área de
conhecimento, de forma a que o resultado final de seu trabalho fosse a construção de
hipóteses razoavelmente consistentes sobre o problema a que se propôs estudar. Não se
espera portanto que uma monografia ao ser finalizada apresente conclusões marcantes
sobre um tema, mas hipóteses bem fundamentadas, oriundas de uma reflexão
metodicamente elaborada.
No entanto, mesmo que o pesquisador não possua experiência de pesquisa
anterior no assunto, o seu projeto deve apresentar algumas hipóteses, ainda que não tão
consistentes, como forma de demonstrar o caminho no qual irá centralizar suas
investigações. Retomando o exemplo da pesquisa sobre política de saneamento
municipal, foram definidos os seguintes problemas de pesquisa:
1)“Em que medida as organizações de moradores de bairro conseguem influenciar a
elaboração e a execução de políticas públicas locais”?
2)“Que tipos de mecanismos de representação política permitem esta influência por
parte destas organizações?
3)Quais os obstáculos institucionais à representação destes interesses de bairro na
adoção e execução de política públicas locais, tomando-se o caso de uma política
de saneamento”?
A partir da definição destes problemas pode-se atribuir as seguintes hipóteses:
1)”A influência de moradores ocorre mais por vínculos familiares com técnicos do
poder público, do que através de pressão das associações ou representatividade
política”.
2)”A representação de interesses institucionais partidários ou associativos é frágil
perante as carreiras políticas individuais, de forma a que associações e partidos
não conseguem obter representatividade no corpo técnico que elabora, decide e
executa as políticas públicas de saneamento”.
3)”A fragilidade do sistema de representação partidária local constitui-se no
principal obstáculo à integração entre interesses de moradores e a execução da
política de saneamento no município X”.
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Embora as hipóteses soem como conclusão, na verdade são suposições. Para
que se tornem conclusivas dependem da verificação metódica dos dados obtidos
através de pesquisa. Portanto, ao longo da pesquisa, as hipóteses poderão ser refeitas
se os dados apontarem que são incongruentes com a realidade ou se não se dispuser de
informações mínimas necessárias para verificar a sua validade. Assim, objetivo de uma
pesquisa não é provar a todo custo que uma hipótese é verdadeira. O objetivo da
pesquisa é responder um problema de pesquisa para o qual se formulou uma hipótese
explicativa prévia, que pode ser verdadeira ou não. Se um pesquisador chegar ao final
de seu trabalho e concluir que suas hipóteses estavam incondizentes com a realidade,
não irá obviamente sentir-se frustrado e jogar no lixo toda pesquisa realizada. Irá
elaborar outra explicação que satisfaça o problema formulado.
Uma vez definidas as hipóteses, deve-se passar a escolha dos procedimentos de
pesquisa adequados.
• Procedimentos de Pesquisa
A descrição dos procedimentos de pesquisa deve ser adequada ao objeto, às
hipóteses e ao problema de pesquisa. Os procedimentos são a estratégia de pesquisa
que se irá montar para coletar dados suficientes o necessários para testar a hipótese
formulada. Esta descrição será tão pormenorizada quanto se fizer útil para o
entendimento dos passos da pesquisa. A escolha de métodos quantitativos,
qualitativos, entrevistas abertas, fechadas, diretivas e não diretivas, de trabalho com
dados secundários, com documentos, histórias de vida, história oral, etnografia,
pesquisa participante, surveys, e todo o conjunto de atividades técnicas que envolve
pesquisa deve ser criteriosamente avaliada de forma a que se assegure a validade, a
confiabilidade e a representatividade dos dados analisados. Sem o rigor nesta escolha,
todo trabalho de inferência sobre o material coletado poderá ser inútil do ponto de
vista científico.
Por exemplo, no caso da pesquisa sobre associações de moradores e política de
saneamento, tendo sido definidas como hipóteses a fragilidade da representação
política e a existência de laços familiares entre membros de associação e técnicos do
poder municipal como explicação para a existência ou não de obstáculos na execução
de políticas saneamento, o pesquisador deve elaborar uma estratégia de levantamento
de dados que possa convalidar ou refutar estas hipóteses. Para tanto, deve-se
questionar o seguinte para a escolha do método adequado: que tipo de dados seriam
necessários? Como obtê-los de forma fidedigna? Quantos dados seriam
representativos? Como analisá-los? As respostas a estas questões são variadas,
dependendo do alcance, do conhecimento e dos objetivos da pesquisa. Por exemplo,
poderia-se definir que, para esta pesquisa, seriam necessários dados pessoais e
informações sobre a trajetória política dos membros da associação de moradores e dos
técnicos encarregados pelo setor de saneamento básico do município. Dados que
poderiam ser obtidos através de levantamento de história de vida das lideranças mais
expressivas nos bairros e dos chefes de primeiro e segundo escalão ligados ao
saneamento no município. A possibilidade de escolha metodológica é bastante ampla,
inclusive podendo-se combinar métodos qualitativos (como a história de vida) com
métodos quantitativos (a elaboração de um índice de casas atendidas pelo do sistema
de saneamento correlacionada ao índice de membros filiados à associação de bairro a
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partir de dados retirados de uma amostra de moradores dos bairros A, B e C). O mais
importante neste caso é a clareza que o pesquisador deve ter sobre o alcance e as
possibilidades de sua escolha metodológica (Veja o quadro resumo em anexo).
• Cronograma
O cronograma deverá ser um quadro onde se descreva o tempo de duração de
cada etapa da pesquisa. Por exemplo, um cronograma para uma monografia com seis
meses de prazo para a realização, supondo-se que já se tenha feito a pesquisa
bibliográfica:
Etapas
leitura e fichamento
Lev. de dados secundários na Prefeitura
Entrevistas nas Associações A, B e C
Entrevistas na Sec. de Saneamento
Análise comparativa das entrevistas
Redação do Texto
jan fev mar abr
mai jun
Como se pode observar, as etapas podem ser coincidentes, desde que não sejam
mutuamente excludentes. Ou seja, é possível fichar um texto e levantar dados
secundários no mesmo mês. Mas não é possível fazer uma análise comparativa das
entrevistas sem tê-las terminado antes.
O cronograma deve refletir uma organização pessoal do pesquisador, portanto será um
ponto de referência para que se possa avaliar constantemente os prazos para conclusão
da pesquisa, evitando-se a demora preguiçosa e desnecessária que atrapalha o
andamento de qualquer atividade científica.
• Bibliografia
A bibliografia irá conter as referências de todos os títulos úteis à pesquisa
listados pela pesquisa bibliográfica feita antes de se iniciar o projeto. A apresentação
deve seguir as normas da ABNT.
Dicas
1.
Procure sempre ler sobre o tema de sua pesquisa. A leitura é a maior fonte de
inspiração intelectual e o caminho mais curto para o amadurecimento de um problema
de pesquisa.
2.
A leitura dos textos de interesse direto para a pesquisa deve ser feita através de
fichamento. Sem o registro das informações que se obteve através da leitura, pouca
serventia terá o texto no momento da redação.
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3.
Para o projeto da monografia as partes mais importantes são o problema, o
objeto e os procedimentos de pesquisa.
4.
Um projeto não possui limites mínimos nem máximos de páginas. Apenas
como referência, desconfie de seu trabalho se seu projeto estiver com menos de 5
páginas ou com mais de 15. Se você usou menos de 5 páginas para descrever todos os
itens relacionados acima, pode ser que seu projeto esteja superficial demais. Contudo,
se você não conseguiu expor como será sua pesquisa em até 15 páginas, pode ser que
você esteja sendo confuso ou redundante em demasia.
5.
Não enrole e não “encha lingüiça”. Quanto mais claro o projeto estiver para
você mesmo, mais facilmente será a realização da pesquisa posterior e a redação da
monografia.
6.
Use o orientador. Quando não souber como definir um problema, não conseguir
diferenciar objeto de objetivo, não tiver segurança sobre que procedimentos de
pesquisa adotar, procure conversar com o seu orientador, expondo todas as suas
dificuldades, inclusive aquelas que você tem vergonha de admitir porque acha que
deveria saber e de fato não sabe.
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QUADRO RESUMO DAS ETAPAS DE UMA PESQUISA
1) Definições sobre o Propósito da Pesquisa:
delimitação do tema;
estudo bibliográfico (que envolve uma pesquisa bibliográfica sobre o tema, a
leitura e o fichamento dos textos selecionados);
delimitação dos objetivos da pesquisa;
2) Definições Metodológicas:
definição do problema de pesquisa;
definição das hipóteses;
definição do quadro de referencial teórico;
delimitação do objeto de estudos;
3) Definições sobre Técnicas e Procedimentos de Pesquisa:
escolha das fontes de dados;
se pesquisa documental, seleção das fontes de documentos;
se pesquisa de campo, definição da amostra (tipo, critérios e quaSe sim, siga em frente. Você já deve ter um
esboço do seu objeto de estudos
4)
5)
6)
7)
tativa, definição do roteiro de observação e/ou de entrevistas;
se pesquisa de campo quantitativa, definição das variáveis e categorias
e em seguida elaboração do questionários;
aplicação teste dos instrumentos de coleta de dados e, se necessário,
reelaboração;
escolha das técnicas de análise de dados (devem ser relacionadas às
técnicas de coletas de dados)
Coleta dos dados
Análise dos dados
Elaboração do Relatório de Pesquisa
Disseminação dos Resultados de Pesquisa, através de artigos, livros,
conferências, etc.
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DA IDÉIA À PESQUISA,
PASSO A PASSO
idéia vaga sobre o
que
se
quer
pesquisar...
Pesquisa
Bibliográfica,
seleção de textos, leitura e
fichamento.
aprofundar-se sobre o
assunto
observação
“despretenciosa”
fenômeno.
do
A
delimitação
do
referencial teórico está
intimamente relacionada
com
a
escolha
metodológica que você irá
fazer. Defina aqui os
conceitos que você irá
utilizar ou retire esta
definição de autores que já
trataram sobre o tema. A
leitura sistemática e o
fichamento
são
fundamentais nesta fase.
“brain storm”
jogo de idéias.
ou
levantamento
de
informações
secundárias disponíveis
Se não, volte a obter mais
informações,
sobretudo
através
da
leitura
especializada
consegue definir o
que vai pesquisar?
Se sim, siga em frente. Você já
deve ter um esboço do seu
objeto de estudos.
Delimite o seu referencial teórico
Se não, volte para leitura. Preste
atenção
à
discussão
metodológica dos trabalhos
relacionados ao seu tema.
Verifique se o tema não é muito
difícil de ser abordado. Há fontes
de informação disponíveis? Esta
pesquisa é factível?
conversa com pessoas
que já estudaram o
tema
Defina o problema de pesquisa e
formule algumas hipóteses iniciais
consegue definir
como vai pesquisar?
Se sim,
comece a pesquisar
coleta de dados
análise dos dados
A esta altura, é bom
começar a redigir um
projeto de pesquisa.
Faça uma justificativa
mostrando a relevância
acadêmica
do
tema.
Elabore
objetivos
compatíveis com o tempo e
os recursos que você terá
disponíveis.
Comece a pensar no
método e nas técnicas de
pesquisa que você irá
utilizar.
Faça
um
cronograma e relacione a
bibliografia usada.
Esta é fase de “ir a campo”.
Primeiro deve-se definir os
instrumentos
(questionários,
etc.) e uma estratégia de coleta
de informações. Deve-se definir
que tipo, onde, como e qual o
volume de informações se
pretende coletar. Faz-se uma préaplicação ou pré-campo. Estando
tudo certo, começa-se a coleta
efetivamente.
reflexão tendo como base o
quadro teórico, as hipóteses e o
problema
idéias para novas
pesquisas
Redação do
Relatório
Disseminação, artigos,
congressos livros...
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