UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM TEORIA E HISTÓRIA
MEU QUARTO, MEU MUNDO:
Configuração espacial e
modo de vida em casas de Brasília
Franciney Carreiro de França
MEU QUARTO, MEU MUNDO: Configuração espacial e
modo de vida em casas de Brasília
Franciney Carreiro de França
Dissertação apresentada à Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, da Universidade
de Brasília, como requisito parcial à
obtenção do grau de Mestre em Arquitetura
e Urbanismo – área de concentração em
Teoria e História.
Orientador:
Prof. Dr. Frederico Rosa Borges de Holanda
Membros da Banca:
Prof. Dr. Luiz Amorim
Profª. Dra. Sylvia Ficher
Brasília, Agosto de 2001
2
À minha família, mãe e irmãos;
ao meu pai Antônio Virgínio de França
que me viu começar este mestrado,
mas que não está mais aqui para me ver concluí-lo;
ao meu companheiro Sérgio Sauer.
3
Agradecimentos______________________________________
A pesquisa e a elaboração dessa dissertação passaram por várias transformações.
Da idéia ainda abstrata até sua materialização, ocorreu um processo crescente de
aprimoramento e superação. Nessa construção muitas pessoas e instituições foram
importantes. Embora pareça apenas mais uma formalidade, não poderia deixar de
expressar a minha gratidão, mesmo correndo o risco de cometer esquecimentos.
Gostaria de agradecer:
Ao CNPq pelo suporte financeiro e ao Programa de Pós-Graduação da FAUUnB que me recebeu e possibilitou que eu fizesse este estudo. Aos professores Gabriel
Dorfman, Jaime Gonçalves de Almeida pelo apoio e à professora Sylvia Ficher, que me
ajudou a definir a área de concentração; aos colegas e amigas do mestrado, na pessoa de
Emília Stenzel, arquiteta que sempre acreditou no potencial de uma egressa da
matemática.
Ao meu orientador, Professor Frederico de Holanda, que tem a habilidade de
poucos para juntar o rigor acadêmico - culminando num alto “controle de qualidade” com uma postura amiga e de incentivo. A quem aprendi admirar ainda mais e a
considerar como parceiro neste trabalho, meu muitíssimo obrigada.
Às minhas amigas, que silenciosamente me foram solidárias, respeitando a
minha reclusão nos últimos meses de trabalho, em especial à Marleide, Cristiane e
Wânia Mara, que só entraram em contato para oferecer ajuda ou quando pensavam que
eu havia terminado.
À minha mãe Creusa, à minha irmã Simone, ao meu irmão Ubirajara, à minha
cunhada Rosilene e às minhas sobrinhas Yara e Nayara, as quais foram sacrificadas
ficando sem as férias de julho, tão esperadas, na casa da tia. A eles, todo o meu carinho
e consideração.
Finalmente, à pessoa que esteve comigo nos momentos mais complicados que,
entre muitas qualidades, tem uma paciência imensurável. A ele, que me deu suporte em
todos os sentidos, acompanhando a elaboração, lendo várias partes da dissertação,
cuidando dos afazeres da casa e até me levando chá na bancada de trabalho. Ao Sérgio,
que não poderia me fazer maior declaração de amor.
4
Resumo_____________________________________________
Neste trabalho são estudadas as relações sociais no espaço doméstico a partir das
informações de uso, ocupação e da organização espacial de residências. Buscou-se
verificar como as práticas cotidianas, envolvendo a relação entre habitantes, visitantes e
empregados, estão relacionadas com a configuração espacial das casas.
O objeto de estudo é constituído por 27 casas no Distrito Federal, Brasil, onde
habitam estudantes dos cursos de Arquitetura da UnB, Faculdades Planalto e UniCeub.
Para obter informações de uso e ocupação foram aplicados questionários e feitas
entrevistas, e para o estudo da configuração das residências foram utilizadas técnicas da
Sintaxe Espacial.
Esse estudo buscou identificar a possível existência de um “código espacial
doméstico”, para o universo analisado,
explorando a Sintaxe Espacial como
metodologia de estudo configuracional. Procurou também, identificar um modo de vida
contemporâneo em Brasília, que se revelasse condizente ou não com sua proposta
modernista.
5
Abstract_____________________________________________
In this dissertation, the social relations are studied within the domestic space
related to informations of use, occupation and spatial organization of houses. The
intention was to verify how the daily practice, involving the relation between inhabitant,
visitors and employee are related with space configuration of houses.
The object of study is formed by twenty seven (27) houses in the Distrito
Federal, Brazil, where live students of Architecture of the Universities of Brasilia,
Faculdades Planalto and UniCeub. The informations about use and occupation were
obtained using a survey and interviews. The method of Space Syntax was used to study
the configuration of the houses.
This study tried to identify a possible existence of a “spatial domestic code” of
the studied universe, exploring the Space Syntax as a methodology of configurational
studies. It also searched for the identification of a contemporary life style in Brasilia,
which could express or not the modernist ideas and concepts.
6
Índice_______________________________________________
Introdução ......................................................................................................................... 9
Capítulo 1 – Casas: estudos e contexto ....................................................................... 12
1.1. O espaço doméstico ......................................................................................... 12
1.2. Revisão bibliográfica ....................................................................................... 15
1.2.1. Witold Rybczynski, Gérard Vincent e Antoine Prost .......................... 17
1.2.2. Gilberto Freyre ..................................................................................... 18
1.2.3. Roberto DaMatta .................................................................................. 21
1.2.4. Carlos Lemos, Francisco Veríssimo e William Bittar ......................... 23
1.2.5. Geraldo Gomes, L.L.Vauthier e Marlene Milan Acayaba ................... 25
1.2.6. Le Corbusier e o Movimento Moderno................................................ 27
1.2.7. Marcelo Tramontano ............................................................................ 30
1.2.8. Julienne Hanson e a Sintaxe Espacial .................................................. 31
1.3. Contexto social e geográfico ............................................................................ 35
Capítulo 2 - O método .................................................................................................. 39
2.1. Utilização e Ocupação dos espaços .................................................................. 40
2.2. A Sintaxe Espacial............................................................................................ 42
2.2.2. As variáveis analíticas .......................................................................... 51
2.2.2.1. Integração .......................................................................................... 51
2.2.2.2. Entropia ............................................................................................. 53
2.2.2.3. Medida de distributividade................................................................ 54
2.2.2.4. Medida de simetria ............................................................................ 55
2.2.2.5. Ordem de integração ......................................................................... 55
2.2.2.6. Grau de funcionalidade ..................................................................... 56
2.2.2.7. Grau de fechamento .......................................................................... 56
Conclusão ....................................................................................................................... 57
Capítulo 3 - Ocupação e utilização dos espaços ......................................................... 58
3.1. Espaços de maior tempo de permanência da família........................................ 58
3.1.1. A cozinha ............................................................................................. 59
3.1.2. Os quartos ............................................................................................ 63
3.2. Os espaços de menor tempo de permanência da família .................................. 67
3.2.1. Sala de estar ......................................................................................... 69
7
3.2.2. Sala de jantar ........................................................................................ 71
3.2.3. Sala de TV ............................................................................................ 72
3.2.4. Varanda ................................................................................................ 73
3.3. Espaços aos quais visitante não tem acesso ..................................................... 77
3.3.1. Escritório .............................................................................................. 78
Conclusão ....................................................................................................................... 81
Capítulo 4 - Uma análise configuracional .................................................................. 83
4.1. Características básicas do sistema espacial ...................................................... 83
4.2. Variáveis analíticas........................................................................................... 86
4.2.1. Integração média dos sistemas ............................................................. 86
4.2.2. Entropia ................................................................................................ 88
4.2.3. Distributividade.................................................................................... 90
4.2.4. Simetria ................................................................................................ 92
4.2.5. Ordem de integração ............................................................................ 94
4.2.6. Grau de funcionalidade ........................................................................ 96
4.2.7. Grau de fechamento ............................................................................. 98
Conclusão ..................................................................................................................... 104
Capítulo 5 – Espaço doméstico: morfologia e modo de vida .................................. 105
5.1 - Os espaços - seus usos e suas medidas sintáticas ......................................... 105
5.1.1. A cozinha ........................................................................................... 105
5.1.2. Quartos ............................................................................................... 107
5.1.3. Salas de estar e estar/jantar ................................................................ 109
5.1.4. Sala de Jantar ..................................................................................... 111
5.1.5. Sala de TV e Sala íntima .................................................................... 112
5.1.6. A Varanda .......................................................................................... 113
5.1.7. Escritório ............................................................................................ 114
5.1.8. Área de lazer ...................................................................................... 114
5.1.9. O Exterior........................................................................................... 115
5.2. Os sistemas e o modo de vida......................................................................... 118
Conclusão .................................................................................................................... 122
Bibliografia .................................................................................................................. 125
Anexos...........................................................................................................................129
8
Introdução __________________________________________
No final do século XX, a dimensão do espaço ganhou importância nas
discussões sobre a modernidade e a pós-modernidade. Nessas discussões a arquitetura
aparece como sendo um ótimo campo de estudo para análises filosóficas e sociológicas.
O filósofo Fredric Jameson1, por exemplo, lança mão de análises sobre a estética
arquitetônica para materializar as discussões sobre as concepções pós-modernas. Para
ele, as construções recentes tornam explícitas as mudanças nas formas e usos do espaço
na contemporaneidade.
Na arquitetura, pesquisas recentes contribuíram para ampliar o conceito de
espaço arquitetônico dando a este uma nova abordagem. Nessa concepção, ele é
entendido como uma situação relacional2, com um enfoque mais voltado para o usuário,
suas expectativas e experiências. Diferente de Jameson, o espaço não é entendido
apenas como reflexo das mudanças sociais, mas também como produtor de relações
sociais. Hillier, por exemplo, defende que o espaço possui características intrínsecas que
propiciam essas relações sociais. Segundo ele, “o espaço não é simplesmente função dos
princípios da reprodução social, mas é um aspecto intrínseco dela, uma parte necessária
da morfologia social”3.
A partir dessa concepção, surge a preocupação em entender um tipo específico
de espaço arquitetônico: o espaço doméstico. Esse trabalho propõe o estudo de
residências, considerando a configuração espacial como base da concepção e análise dos
lugares arquitetônicos. Esse estudo busca entender a estrutura doméstica a partir da
relação entre o modo de vida e a configuração espacial desses espaços
contemporâneos. O objeto é formado por uma amostra de vinte e sete (27) casas do
Distrito Federal, Brasil, localizadas no Plano Piloto de Brasília e em algumas Cidades
Satélites.
1
JAMESON, F. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. Ática, São Paulo, 1996.
HOLANDA, F. & KOHLSDORF, G. Arquitetura como situação relacional. Brasília, 1995, pág. 7.
(mimeo).
3
HILLIER, B. A lógica social do espaço hoje (mimeo), 1982. Tradução e Notas: Frederico de Holanda,
pág. 50.
9
2
Partindo das premissas da Sintaxe Espacial4, o objetivo é aprofundar o estudo do
espaço doméstico, seus significados e relações com o modo de vida das pessoas que
nele habitam. Nesse sentido, esse estudo exploratório pretende: a) contribuir para a
discussão sobre o espaço a partir de um enfoque arquitetônico; b) utilizar uma
ferramenta ou metodologia própria da arquitetura e verificar o desempenho dessa
técnica de análise configuracional de edifícios; c) caracterizar o modo de vida a partir
desse estudo.
Esse estudo do espaço doméstico procura entender a lógica da configuração
contemporânea nas casas dessa amostra.
Uma hipótese é de que transformações
recentes no modo de vida – especialmente a exacerbação da individualidade – têm
influência direta na sua organização espacial. Essa influência ou inter-relação é aqui
estudada utilizando-se a teoria e as ferramentas da Sintaxe Espacial, comparando-se
com outros estudos realizados no Brasil e em diferentes países, procurando-se saber em
que medida existem, numa realidade “vernacular”,
determinados “códigos” socio-
espaciais, e quais são suas características em um determinado conjunto de residências
em Brasília.
Este trabalho está dividido em cinco capítulos, buscando entender a relação entre
configuração espacial das residência e o modo de vida de seus habitantes.
O Capítulo 1, está dividido em três partes: a) apresentação do tema, detalhando a
linha de abordagem e o problema colocado para estudo; b) revisão bibliográfica,
discutindo algumas contribuições chaves disponíveis na literatura, relacionadas ao
presente estudo; c) caracterização do contexto social e geográfico da amostra, através de
informações como, por exemplo, composição, renda, profissão etc., dos habitantes.
O capítulo 2, apresenta a metodologia utilizada no estudo da amostra detalhando
as técnicas de pesquisa e análise. Esse capítulo está dividido em duas partes: a)
apresentação do primeiro nível de análise composto pelas linhas gerais que definiram as
categorias e ferramentas para coleta de dados (questionários e entrevistas); b)
explanação do referencial teórico, a partir da teoria da Sintaxe Espacial. A síntese da
teoria buscou explicitar os principais conceitos e definições das variáveis analíticas
utilizadas nesta análise.
4
Sintaxe Espacial é uma teoria de análise do espaço arquitetônico desenvolvida originalmente por Hillier
e colegas da Bartlett School of Graduate Studies – University College London, e posteriormente
enriquecida por pesquisadores de várias partes do mundo.
10
O capítulo 3 é dedicado à análise dos dados da amostra coletados através dos
questionários e entrevistas. À luz dos trabalhos mencionados na revisão bibliográfica é
feito um estudo do uso e ocupação dos vários cômodos das casas.
O capítulo 4 é constituído pela análise configuracional das residências, ou seja,
um estudo da organização espacial através da planta baixa de cada casa. Nesse capítulo
foi aplicada a técnica da Sintaxe Espacial para estudo de edifícios.
O capítulo 5 é constituído pela confrontação das informações dos capítulos 3 e 4.
Constitui uma busca pela identificação do modo de vida nessas casas, a partir da sua
configuração espacial e do uso dos espaços da amostra estudada. Esse capítulo está
dividido em duas partes: a) a primeira é uma análise dos espaços de per si, relacionando
características de ocupação e uso com os dados de configuração; b) a segunda é
constituída por uma leitura das casas como um sistema, em função dos vários níveis de
relações sociais entre habitantes, visitantes e empregados.
Este estudo foi realizado no contexto da Área de Concentração em Teoria e
História, do Mestrado em Arquitetura e Urbanismo, da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de Brasília, e se justifica a partir de duas paixões: uma pela
arquitetura que me fez migrar da matemática (meu curso de graduação); outra pela
própria matemática da qual herdei o prazer pelo estudo teórico. Essas paixões e
interesses criaram uma expectativa com relação à Sintaxe Espacial e suas pesquisas
relacionadas com teorias matemáticas.
11
Capítulo 1 – Casas: estudos e contexto
Existe uma paixão pelo entendimento
assim como existe uma paixão pela música
sem essa paixão não teria havido nem matemática,
nem ciências naturais.
Albert Einstein
Este capítulo está dividido em três partes e tem como objetivo apresentar o tema
a ser estudado, a revisão bibliográfica e o contexto socio-geográfico da amostra. Na
primeira parte, o tema é apresentado ressaltando a linha de abordagem e os objetivos
desse estudo. A segunda parte é composta por uma síntese de alguns estudos sobre a
casa, representando uma diversidade de trabalhos sobre diferentes aspectos e diferentes
áreas do conhecimento. Essa síntese tem como objetivo ressaltar os aspectos mais
diretamente abordados na elaboração do presente trabalho. Por último, a amostra será
apresentada quanto ao seu contexto social e geográfico. Ela será identificada,
primeiramente, por meio de informações gerais sobre as casas e suas localizações, e em
seguida será apresentado um sintético perfil socio-econômico e a constituição familiar
de seus habitantes.
1.1. O espaço doméstico
A preocupação em entender o espaço arquitetônico no contexto da relação
espaço e sociedade, tem feito parte da história da arquitetura do século XX. Isso fez
com que, em recentes pesquisas, o conceito de espaço arquitetônico fosse ampliado.
Esse, por exemplo, foi definido a partir de um conceito de arquitetura como uma
situação relacional, ou seja, como uma relação do ser humano com o espaço. Essa nova
proposta relaciona "atributos morfológicos do espaço arquitetônico e as expectativas
humanas às quais eles podem satisfazer"5.
5
HOLANDA e KOHLSDORF, 1995, pág. 7. (mimeo).
12
Se, por um lado, têm-se os atributos morfológicos do espaço, ou seja,
características de sua configuração, por outro lado, têm-se as expectativas humanas a
serem satisfeitas. Então, entender como se dá a relação entre uma instância imaterial ou
subjetiva - as expectativas humanas - e outra material - o espaço físico arquitetônico - é
o pano de fundo desse estudo. A partir desse enfoque surge a preocupação em entender
um tipo específico de espaço arquitetônico, o espaço doméstico.
Diante das transformações ocorridas na sociedade nos últimos séculos, o estudo
da casa é o estudo de um espaço, considerado pelo antropólogo Marc Augé, como o
“lugar” em contraposição ao “não-lugar”. Segundo Augé, a supermodernidade6 é uma
exacerbação dos princípios da modernidade7 e é caracterizada por mudanças
significativas no tempo e espaço. Essa supermodernidade é produtora do que Augé
denominou de "não-lugares". Os não-lugares, segundo ele, são espaços que não podem
ser definidos "como identitário, relacional e histórico”8.
Para ele, os não-lugares são a medida de nosso tempo, representados “...pelos
espaços públicos de rápida circulação, como aeroportos, rodovias, estações de metrô,
meios de transporte e grandes cadeias de hotéis e supermercados”9. O espaço doméstico
é precisamente a antítese do “não-lugar”, portanto, seu estudo é a afirmação da
importância do “lugar”. Para Augé, o “lugar” como espaço circunscrito ou o “lugar
antropológico”, é “aquela construção concreta e simbólica do espaço que é
simultaneamente princípio de sentido para aqueles que o habitam e princípio de
inteligibilidade para quem observa, como lar, a residência, o espaço personalizado”10.
A residência, esse lugar identitário e relacional, é o campo de maior produção
arquitetônica. Ela é normalmente estudada a partir de suas características estéticas,
semânticas e funcionais. Mas, além desses aspectos, esta deve ser estudada como uma
6
Outros autores utilizam diferentes termos para denominar o momento atual, ou seja, as mudanças
sociais, culturais, política e econômicas contemporâneas, como, por exemplo, pós-modernidade
(LYOTARD, J. The Post-modern condition: A report on Knowledge. Minneapolis, University of
Minnesota Press, 1984), e modernidade tardia (JAMESON, 1996).
7
Para Featherstone "a modernidade contrapõe-se à ordem tradicional, implicando a progressiva
racionalização e diferenciação econômica e administrativa do mundo social". FEATHERSTONE, M.
Cultura de Consumo e Pós-Modernismo. Studio Nobel, São Paulo, 1995, pág. 20.
8
Para Marc Augé um lugar é identitário no sentido de que um certo número de indivíduos pode se
reconhecer nele e definir-se através dele. É relacional no sentido de que esses indivíduos estabelecem
relações sociais nos mesmos. É histórico no sentido de que os ocupantes do lugar podem encontrar nele
rastros diversos de uma implantação antiga, o sinal de uma filiação. Para ele, Isso significa dizer que o
espaço é triplamente simbólico e estabelece uma relação de complementariedade entre as realidades
sociais” AUGÉ, M. Não-lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Papirus,
Campinas, 1992, pág. 73.
9
AUGÉ, 1992, pág. 74.
10
AUGÉ, 1992, pág. 51.
13
estrutura configuracionalmente definida que está relacionada ao modo como vivem nele
e interagem as pessoas. Para Hillier,
A natureza do edifício como um objeto em si tem complexidades as quais tendem naturalmente à
multifuncionalidade e diversidade da expressão cultural. É apenas pela compreensão da natureza
complexa do edifício como objeto que podemos começar a entender sua tendência natural à
multifuncionalidade.11
De acordo com Hanson, “toda casa configura um modo de vida, por meio da
construção de interfaces sociais entre homens e mulheres, mais jovens e mais velhos,
anfitriões e convidados, proprietários e empregados”12. A configuração desse espaço
constitui, então, uma concepção de relações e modos de vida. O espaço doméstico,
apesar de aparentemente simples, pode revelar muito sobre as possibilidades de
convívio. Através do estudo desse sistema - a casa - é possível saber se este facilita ou
restringe relações pessoais por meio de suas acessibilidades internas. Por outro lado,
permite entender como esse sistema de relações interage com o “exterior”.
O problema colocado é, então, entender a estrutura doméstica a partir da relação
entre o modo de vida das pessoas e os atributos morfológicos do espaço. Esse estudo é
uma tentativa de revelar um padrão que é característico das casas estudadas,
identificando um espaço doméstico contemporâneo (de início do novo milênio). Esse
espaço contemporâneo pode-se contrapor, ou não, ao espaço “moderno”, característico
das últimas décadas. Especificamente no caso de Brasília - universo geográfico da
pesquisa – esse aspecto é muito importante, uma vez que esta cidade foi concebida a
partir das premissas do modernismo arquitetônico.
Nesta linha de abordagem, serão utilizada as técnicas da Sintaxe Espacial, uma
teoria desenvolvida por Hillier e colegas da Bartlett School of Graduate Studies, de
Londres, para o estudo morfológico, ou configuracional, como ele prefere, de edifícios
e assentamentos humanos. A Sintaxe Espacial tem como proposta fundamental mostrar
11
No original: “The nature of the building as an object itself has complexities which in themselves
naturally tend to multifunctionality and diversity of cultural expression. It is only by understanding the
complex nature of the building as object that we can begin to understand its natural tendency to
multifunctionality" . HILLIER, B. e HANSON, J. The social logic of space. Cambridge University Press,
Cambridge, 1984, pág. 21. (minha tradução).
12
No original: “Every home configures a way of life by constructing social interfaces between men and
women, young and old, hosts and guests, owners and servants....” HANSON, J. Decoding Home and
House. Cambrige University Press, Cambrige, 1998, pág. 267. (minha tradução).
14
“como e porque diferentes formas de reprodução social requerem, e se materializam em,
diferentes tipos de ordem espacial”13.
1.2. Revisão bibliográfica
A casa como um lugar de identidade, espaço que revela e determina estilos de
vida, é colocada num patamar de destaque em fins de século XX e início do século XXI.
A casa, mais do que lugar de moradia e de abrigo, conforme concluiu Monteiro, é um
complexo “...imbuído de valores culturais, sociais e até psicológicos. Suas
configurações sociais juntam atividades e formam experiências, que definem a
qualidade de vida de seus habitantes”14.
Nessa perspectiva, Hanson afirmou a importância do estudo da casa como sendo
“não apenas reflexo de como indivíduos e famílias escolhem viver cotidianamente, mas
da constituição social como um todo”15. Uma das coisas mais importantes que podem
ser ditas a respeito de uma casa “não é que ela é uma lista de atividades ou cômodos,
mas que ela é um padrão do espaço, governado por intrincadas convenções sobre quais
espaços existem, como são conectados e seqüenciados, quais atividades acontecem
juntas e quais são apartadas”16.
Vários estudos sobre a casa foram feitos sob diferentes aspectos. A história do
espaço doméstico foi contada ao longo dos períodos históricos, como no trabalho de
Prost e Vincent17, e nos estudos de Rybczynski18. No Brasil, os estudos incluem análises
13
HILLIER e HANSON, 1984, pág. xi. Citado por HOLANDA, F. O espaço de exceção. Tese de
doutorado apresentada na Universidade de Londres, 1997, pág. 76. (mimeo).
14
No original: “...imbued with cultural, social and even psychological values. Their spatial configurations
link activities and form experiences which define the quality of life of their inhabitants”. MONTEIRO,
Circe G. Activity Analysis in houses of Recife, Brasil. In. Space Syntax - First Internacional Symposium,
Volume II, London, 1997, pág. 20-13. (minha tradução).
15
No original: “...not just of how individuals and families choose to live their everyday lives, but of the
constitutions of society at large...” HANSON, 1998, pág.47.
16
No original: “The important thing about a house is not that it is a list of activities or rooms but that it is
a pattern of space, governed by intricate conventions about what spaces there are, how they are connected
together and sequenced, which activities go together and which are separated”. HANSON, 1998, pág. 02.
(minha tradução).
17
VINCENT, G e PROST, A. (org). História da Vida Privada: Da Primeira Guerra a nossos dias.
Companhia das Letras, São Paulo,1992.
18
RYBCZYNSKI, W. Casa: pequena história de uma idéia. Editora Record, Rio de Janeiro, 1986.
15
antropológicas e sociológicas encontradas, por exemplo, nos escritos de Freyre19 e
DaMatta20. Incluem também trabalhos abordando vários aspectos arquitetônicos (forma,
estilo, materiais, técnicas construtivas) como fez, por exemplo, Acayaba21. Existem
análises de mudança de uso dos espaços da casa, como por exemplo, nos trabalhos de
Lemos22 e Gomes23. Há ainda, estudos especificamente referentes aos modos de vida e
novas tecnologias, como o encontrado no trabalho de Tramontano24.
Esses estudos contribuem para um perfil da constituição social, antropológica,
cultural e arquitetônica da casa brasileira. Outros estudos têm procurado reunir alguns
desses aspectos - sociais, culturais, antropológicos - sob um novo enfoque, privilegiando
a análise do espaço doméstico a partir de suas características morfológicas como, por
exemplo, aqueles de Hanson25, Trigueiro26, Monteiro27, Amorim28 e Holanda29.
O que se segue é um breve apanhado dos vários estudos envolvendo o espaço
doméstico no século XX e final de século XIX. Todos eles abordam várias questões
relacionadas ao espaço estudado, sejam elas cultural, histórica, arquitetônica ou social.
A maneira como foram agrupados não significa necessariamente que estes abordem só o
tema em evidência. Esse é um esforço de destacar os aspectos mais diretamente
pertinentes à realização do presente trabalho.
19
FREYRE, G. Casa-Grande e Senzala: Formação da família sob o regime de economia patriarcal, 1º
volume, 7º edição. Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1952.
20
DAMATTA, R. A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Editora Brasiliense, São
Paulo, 1985.
21
ACAYABA, M. Residências em São Paulo: 1947 – 1975. Projeto, São Paulo, 1986.
22
LEMOS, C. História da casa brasileira. Editora Contexto, São Paulo, 1989.
23
GOMES, G. Engenho & Arquitetura – tipologia dos edifícios dos Antigos Engenhos de açucar de
Pernambuco. Editora Fundação Gilberto Freyre, Recife, 1998.
24
TRAMONTANO, M. Novos modos de vida, novos espaços de morar – uma reflexão sobre a habitação
contemporânea. Tese de Doutoramento, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São
Paulo, 1998. (mimeo).
25
HANSON, 1998.
26
TRIGUEIRO, E, MARQUES, S. e CUNHA, V. The mystery of the social sector: Discussing old and
emerging spatial structures in Brazilian contemporary homes. In: Anais do 3º International Space Syntax
Symposium, Atlanta, 2001, pág. 40.1ss.
27
MONTEIRO, 1997.
28
AMORIM, L. The sectors’ paradigm: a study of the spatial and functional nature of modernist housing
in Northeast Brasil. Tese de doutorado apresentada na Faculty of the Built Environment The Bartlett
School of Graduate Studies, University College London, 1999.
29
HOLANDA, Frederico. Sintaxe de uma Casa-Átrio Moderna, In.: Cadernos Eletrônicos da Pós,
Brasília, 1999, página da Rede Mundial www.unb.br/fau/pos_graduacao
16
1.2.1. Witold Rybczynski, Gérard Vincent e Antoine Prost
Os motivos que levaram Rybczynski, Vincent e Prost a estudarem a casa foram
muito diferentes. Rybczynski fez um estudo sobre o conforto no espaço doméstico, que
o levou a passar por cinco séculos de história da casa incluindo diferentes culturas e
sociedades. Ele fez questão de ressaltar que seu estudo não era sobre decoração de
interiores, mas sobre o conceito de lar30, buscando entender o conceito de conforto a
partir desse espaço. Já Vincent e Prost fizeram um estudo da história da sociedade
francesa ocorrida no interior desse espaço. Segundo Vincent, o objetivo não era uma
“história da vida cotidiana, já feita e refeita” mas “a história do segredo”31. Segundo ele,
não é o segredo absoluto que todo homem leva consigo quando morre, mas o que está
na “fronteira do dito e não dito que envolve vários níveis: o indivíduo, a família, a vila
ou o bairro...”32
Em comum, entretanto, esses trabalhos resgatam, na história da casa, as
mudanças que levaram o espaço doméstico a ser considerado de domínio privado,
restrito à família. É esse aspecto que interessa para o presente trabalho, pois é assim
que, atualmente, esse espaço é considerado. Mas isso não foi sempre assim. Segundo os
estudos acima, esse é um conceito moderno, característico do século XX, resultado de
mudanças sociais que vêm ocorrendo desde a Idade Média.
Na Idade Média o conceito de privado não existia, “a vida era uma questão
pública, e assim como as pessoas não tinham uma forte consciência de si, elas também
não tinham um quarto próprio”33. O espaço de moradia não era reservado somente à
família pois incluía empregados, criados, aprendizes, amigos e afilhados, famílias de
“até 25 pessoas não eram pouco freqüentes. Como todas estas pessoas viviam em um
ou, no máximo, dois compartimentos, não se conhecia a privacidade”34. Segundo
Rybczynski, as famílias numerosas faziam com que a casa medieval fosse “um lugar
público, e não privado” 35.
Com a era Moderna, surge a noção de organização da vida com dois domínios
opostos e claramente distintos: o público e o privado. Um dos fatores que contribuiu
30
RYBCZYNSKI, 1986, pág. 8.
VINCENT e PROST, 1992, pág. 8.
32
VINCENT e PROST, 1992, pág. 8.
33
RYBCZYNSKI, 1986, pág.48.
34
RYBCZYNSKI, 1986, pág.41.
35
RYBCZYNSKI, 1986, pág.41.
31
17
para essa separação foi a especialização dos espaços em locais de trabalho e de morar.
Com isso o espaço de morar ganha outras características como lugar de privacidade e
intimidade. Para Rybczynski, uma conseqüência importante dessa separação foi que a
casa se tornou um lugar mais privado, e “junto com esta privatização da casa surgiu um
maior senso de intimidade, que identificava a casa exclusivamente com a vida familiar,
dentro de casa, no entanto, a privacidade pessoal continuou relativamente irrelevante”36.
Para Prost e Vincent, essa separação vem “acompanhada por uma diferenciação
das normas: o universo doméstico se liberta de regras anteriormente ligadas ao trabalho
que ali se realizava, ao passo que o mundo do trabalho passa a ser regido, não mais por
normas de ordem privada, e sim por contratos coletivos”. Para eles, “não existe uma
vida privada de limites definidos para sempre, e sim um recorte da atividade humana
entre a esfera privada e a esfera pública. A vida privada só tem sentido em relação à
vida pública”37.
Após essa separação, o espaço doméstico passou a ser lugar de domínio privado,
lugar da família. A noção de intimidade e privacidade fizeram desse um lugar restrito,
de difícil penetração e o transformaram em objeto de estudo específico.
1.2.2. Gilberto Freyre
No Brasil, um dos primeiros estudiosos da casa foi Gilberto Freyre. Como
sociólogo e antropólogo, ele buscava o entendimento da formação da família brasileira e
das relações sociais nesse espaço. Isso o levou a se debruçar sobre o significado da casa,
fazendo surgir uma obra singular. Ele chamou seu trabalho de um “Ensaio de sociologia
genética e de História Social, pretendendo fixar e às vezes interpretar alguns dos
aspectos mais significativos da formação da família brasileira”38.
Fazem parte desse estudo textos famosos como Casa-Grande & Senzala (1933),
Sobrados e Mucambos (1936), Ordem & Progresso (1959)39, entre outros. Segundo
Bastos,
36
RYBCZYNSKI, 1986, pág.51.
VICENT e PROST, 1992, pág.21.
38
FREYRE, 1952, pág. 44.
39
BASTOS, E. Os descendentes de Prometeu. In: Caderno Mais – Folha de São Paulo, 12 de março de
2000, pág.18.
18
37
Em Casa-Grande & Senzala, Freyre afirma a importância da relação entre etnias e culturas,
resgatando o papel do escravo negro como civilizador na sociedade brasileira, operando
simultaneamente no processo de mestiçagem e no de difusão e incorporação do aparato cultural
africano, isto é, há uma absorção de seus usos e costumes pelos brancos, que reconhecem a
adaptabilidade dos mesmos à realidade tropical; em Sobrados e Mucambos, ressalta o papel do
patriarcado na ordenação da sociedade nacional, operando durante séculos como garantia de sua
organicidade.40
Nos estudos de Freyre, as relações dicotômicas estão sempre presentes e, como
num processo de equilíbrio, o branco e o negro se misturavam no interior da casagrande. Essa mistura alterava as relações sociais e culturais, criando um novo modo de
vida no século XVI. As relações de poder, a vida doméstica e sexual, os negócios e a
religiosidade forjavam, no dia-a-dia, a base da sociedade brasileira.
Freyre, no prefácio de Casa Grande & Senzala, afirma que a casa grande,
juntamente com a senzala, representava todo um sistema econômico, político e social.
Essa convicção ele estendeu para todo o Brasil, embora ela fosse mais diretamente
associada ao engenho de cana e ao patriarcalismo nortista. Segundo Freyre, “a casagrande não era exclusiva dos senhores de engenho. Podia ser encontrada na paisagem do
sul do país, nas plantações de café, como uma característica da cultura escravocrata e
latifundiária do Brasil”41.
Na casa-grande, a rotina era comandada pelo senhor de engenho, cuja estabilidade
patriarcal estava apoiada no açúcar e no escravo, onde “o suor do negro ajudava a dar
aos alicerces da casa-grande sua consistência quase de fortaleza. Ela servia de cofre e de
cemitério. Sob seu teto viviam os filhos, o capelão e as mulheres”42. Assim estabeleciase o regime patriarcal, o pai, como o chefe da casa, tinha autoridade tanto sobre a
família quanto no engenho.
Sobrados e Mucambos é a outra parte desse estudo sobre as raízes sociais e a
importância da casa brasileira. Nesse livro, as inúmeras inovações apresentadas em
1933, com Casa-Grande & Senzala, se ampliam e ganham completude. Para Bastos,
uma dessas inovações é a “decadência do patriarcado rural e desenvolvimento do
urbano”43, o que representou também mudança significativa no modo de vida e relações
domésticas nas casas brasileiras.
40
BASTOS, 2000, pág. 18.
FREYRE, Prefácio da 1ª edição, 1952, pág.34.
42
FREYRE, Prefácio da 1ª edição, 1952, pág.36.
43
BASTOS, 2000, pág. 18.
41
19
Essa decadência significava a perda do poder patriarcal, como resultado das
transformações sociais, econômicas e políticas, mas especialmente culturais. Com isso,
“alteram-se os modos de agir tradicionais e a perda dessas tradições atinge nuclearmente
a forma pela qual se organizam as relações sociais no Brasil”44, inclusive as relações
familiares e uso do espaço doméstico.
Segundo Bastos, a decadência do patriarcado rural é resultado da quebra da
continuidade entre público e privado. Isso alterou o modo de organização do poder no
país afetando a própria natureza das relações sociais e familiares. Como ele afirmou,
Influências individualista, estadista e coletivistas se apresentam como desagregadoras do sistema
patriarcal. É a família, como grande força permanente na formação nacional, influência
conservadora e disseminadora dos valores patriarcais, a grande ameaçada. (..) Mais ainda,
conferiu unidade nacional ao país, pois a forma pela qual se conseguiu a convivência pacífica
das culturas foi a existência e permanência do patriarcado.45
Para Freyre, a família patriarcal – mais do que o Estado ou a Igreja – era a
unidade decisiva da formação do sistema social brasileiro. Nessa perspectiva, a casa –
como expressão concreta desse “familismo” – era símbolo e lugar das relações e
antagonismos, bases do patriarcado. Conseqüentemente, a casa foi compreendida por
Freyre como o “fator decisivo de formação de um tipo nacional de sociedade”46.
As preocupações de Freyre, no entanto, não estavam centradas na configuração
espacial das residências. Mesmo assim, entendeu a arquitetura da casa brasileira como
expressão de estilos, de condições de convivência e funções sociais. Para ele,
A arquitetura da casa-grande brasileiramente patriarcal de engenho, da fazenda ou de estância, e
depois, da assobradada da cidade, mas ainda patriarcal, tornou-se expressão em suas formas
arquitetônicas, em correspondência com seus estilos de convivência e suas funções sociais...47
Ressaltou que a arquitetura dessas casas expressava um modo de vida. Fez então
uma associação entre a arquitetura doméstica e um estilo de convivência entre senhores
e escravos. Para ele, o estudo da casa-grande serviu “de base a uma teoria patriarcalista
44
BASTOS, 2000, pág. 18.
BASTOS, 2000, pág. 18.
46
FREYRE, G. Oh de casa!, Editora Artenova S.A . Recife, 1979, pág. 61.
47
FREYRE, 1979, pág. 56.
45
20
de interpretação da formação social brasileira”48. Mas aquela associação entre
arquitetura e estilo de convivência limitou-se, quase que apenas, à apresentação do
desenho da casa-grande do Engenho Noruega, de Cícero Dias, em Casa-grande &
Senzala.
Em sua obra Oh de casa!, respondendo às várias críticas em relação a Casagrande & Senzala – inclusive ao fato de ter apresentado uma casa sem sala, lugar
opulento de festas e requinte, e de não ter dado significativa importância a isso –, Freyre
afirmou que deixou “para outros sociólogos da História, ou historiadores tão somente, o
trato de tal assunto, de quase nenhuma importância para a análise e a interpretação do
complexo ou do conjunto histórico-sociológico...”49 feitas por ele. Dessa forma, Freyre
explicita o limite de sua abordagem.
Apesar desse limite, a contribuição de Freyre é importante para o presente
trabalho na medida em que mostra a relevância da casa como chave na definição da
estrutura social brasileira, e o seu conceito de estrutura familiar. Ao explicitar o limite
da sua abordagem,
ele aponta para a necessidade de aprofundar os estudos
arquitetônico sobre as casas. Esses devem investigar como a arquitetura doméstica
constitui um modo de vida como, por exemplo, nas casas construídas em Brasília nas
últimas três décadas.
1.2.3. Roberto DaMatta
Roberto DaMatta, como antropólogo social, faz um estudo da casa diferente da
linha adotada por Freyre. Nesse sentido, ele não considera só o interior das casas, ele as
analisa considerando a fronteira entre essas e a rua. Para ele, esses espaços são tidos
como categorias sociológicas50 fundamentais para a compreensão da sociedade
brasileira, pois elas falam da sociedade por meio de códigos sociais. Segundo DaMatta,
“a casa é uma categoria que somente se define e se deixa apanhar ideologicamente com
48
FREYRE, 1979, pág. 53.
FREYRE, 1979, pág. 54.
50
Categoria sociológica “é o conceito que pretende dar conta daquilo que uma sociedade pensa e assim
institui como seu código de valores e de idéias: sua cosmologai e seu sistema classificatório; que a
sociedade vive e faz concretamente – o seu sistema de ação que é referido e embebido nos seus valores”.
DAMATTA, 1985, pág.12.
21
49
precisão quando em contraste ou em oposição a outros espaços e domínios. (...) ela só
faz sentido quando em oposição ao mundo exterior: o universo da rua”51.
Ao estudar a casa a partir desse elo com a rua, DaMatta explicita a defesa de um
estudo da sociedade brasileira como uma sociedade relacional. Seria preciso entender
essa como um sistema, onde, mais importante que “os elementos em oposição, é a sua
conexão, a sua relação, os elos que conjugam os seus elementos”52. Por isso não é a casa
versus a rua, mais a casa e a rua como uma situação relacional. Para ele,
A casa e a rua é uma relação sobretudo complementar porque não se pode falar de casa sem
mencionar o seu espaço gêmeo, a rua. Mas é preciso notar também a oposição casa/rua tem
aspectos complexos. É uma oposição que nada tem de estática e de absoluta. Ao contrário, ela é
dinâmica e relativa porque na gramaticalidade dos espaços brasileiros, rua e casa se reproduzem
mutuamente.53
Para DaMatta, a casa e a rua “falam” da sociedade por meio de códigos sociais
complementares. Para ele o “código da casa (fundado na família, na amizade, na
lealdade, na pessoa e no compadrio) e o código da rua (baseado em leis universais,
numa burocracia antiga e profundamente ancorada entre nós, e num formalismo
jurídico-legal que chega às raias do absurdo)”54. Essa relação entre casa e rua interessa
para esse estudo, especialmente a partir da maneira como DaMatta define essa relação,
evidenciando sua importância.
Por outro lado, os códigos sociais que caracterizam essas categorias, assim como
foram definidos, podem ser diferentes de cultura para cultura e/ou sofrer mudanças ao
longo do tempo. As possíveis mudanças nessa relação é uma das características a ser
investigada nesse estudo. Não se pode estudar o modo de vida nos espaços domésticos
em Brasília, sem considerar sua relação com o exterior: a rua. A complementariedade da
casa e a rua é, tomando as reflexões de DaMatta, semelhante à relação entre o espaço
público e o privado, para Prost e Vincent. A busca do entendimento de um exige,
portanto, o estudo do outro.
51
DAMATTA, 1985, pág. 13.
DAMATTA, 1985, pág. 21.
53
DAMATTA, 1985, pág. 47.
54
DAMATTA, 1985, pág. 20.
52
22
1.2.4. Carlos Lemos, Francisco Veríssimo e William Bittar
Para Lemos, a função básica de uma casa é a de abrigo. Ela deve ser entendida
“como um invólucro seletivo e corretivo das manifestações climáticas, enquanto oferece
as mais variadas possibilidades de proteção”. Mas ele a considera também como um
“palco permanente das atividades condicionadas à cultura de seus usuários”55. Para ele,
para que essas situações domésticas, ligadas aos hábitos e práticas de uma sociedade,
possam acontecer, devem ser favorecidos pelas condições propícias da edificação. Essas
condições propícias, para ele, são elaboradas a partir de um programa de necessidades.
Com a preocupação de entender as mudanças ocorridas nesse programa de
necessidades ao longo da história, ele resgata as origens da casa brasileira fazendo o que
ele mesmo chamou de “um passeio pelo Brasil ao longo do tempo visitando as várias
ilhas culturais que sempre nos caracterizaram”. Ele segue:
Veremos como se morou e se mora no calor úmido do norte amazônico, como se viveu no
nordeste açucareiro, no sertão agreste. Na zona açucareira fluminense e nas montanhas mineiras
plenas de ouro no século XVIII. E também como se morou na São Paulo do tempo dos
bandeirantes. No litoral sul, de Cananéia para baixo. Quem sabe, iremos compreender melhor a
casa brasileira viajando pelo tempo afora, bisbilhotando o dia-a-dia de todos.56
Nesse “passeio”, Lemos revela as várias características da casa brasileira desde
as casas coloniais, passando pela casa do século XIX, chegando ao século XX. Ele
baseia sua análise nos elementos condicionantes ou determinantes do partido
arquitetônico, fixando-se em quatro deles: o programa de necessidades, a técnica
construtiva, o clima e a intenção plástica. Ele detalha o programa de necessidades da
casa da época, ressaltando o uso de cada cômodo e o seu status social dentro da casa.
Nesse “bisbilhotar”, ele faz uma descrição das divisões internas das casas
coloniais e explicita a função e uso de seus diversos espaços. Sua intenção é apontar as
mudanças no programa de necessidades do espaço residencial, através das mudanças
funcionais, até chegar às concepções e uso das casas modernistas do começo do século
XX.
55
56
LEMOS, 1989, pág. 9.
LEMOS, 1989, pág. 12.
23
Em sua obra Cozinhas e etc., por exemplo, Lemos faz um precioso trabalho
histórico-cultural no sentido de mostrar o “caminho” percorrido por algumas
dependências na estrutura da casa brasileira. Espaços como a cozinha e o banheiro - que
antes eram separados da casa por questões sanitárias e, no caso da cozinha, por questões
sociais - são hoje símbolos de riqueza e privacidade. Juntamente com a evolução do
status desses espaços na estrutura doméstica surgiram outros cômodos, como a copa e a
sala de jantar, que são também comentados por ele.
Associado a essa cronologia, Lemos sempre ressaltou as mudanças tecnológicas
que provocaram transformações nos hábitos do cotidiano como, por exemplo, a chegada
da energia elétrica, da água distribuída por redes públicas, do gás que dispensou o fogão
à lenha, até a popularização da televisão em meados do século XX. Estes são alguns
exemplos dos avanços tecnológicos que mudaram o programa de necessidades do
espaço doméstico nos últimos séculos, mudando também as concepções arquitetônicas
das residências.
Ao investigar as mudanças ocorridas no programa de necessidades, Lemos
retomou a história do uso e da ocupação da casa. Reconstituiu, assim, o modo de vida
nesse espaço, nos diferentes períodos históricos. Essa é uma perspectiva fundamental
para o presente trabalho, pois permite entender as transformações históricas da
ocupação da casa brasileira, a importância e o uso de cada cômodo e o seu papel social
na estrutura doméstica.
Na mesma linha de estudo de Lemos, estão os trabalhos desenvolvidos por
Veríssimo e Bittar57, embora não cheguem ao nível de detalhe do uso dos cômodos,
como fez Lemos. Esses autores têm o mesmo objetivo, fazer uma retrospectiva das
mudanças na utilização e status dos cômodos que compuseram o espaço doméstico em
500 anos de histórica da casa brasileira, como os próprios autores o denominam.
Tanto nos estudos de Lemos quanto nos de Veríssimo e Bittar, a ênfase é dada
na utilização dos cômodos. Não há, portanto, uma perspectiva que contemple a relação
entre os diferentes espaços da residência. Esses estudos também não estabelecem
relações entre as mudanças na organização espacial e as alterações de modos de vida.
Isso impõe limites para uma compreensão mais global da estrutura da casa, objetivo do
presente estudo. Nos capítulos seguintes, será comentado mais pontualmente suas
interpretações, à luz de novas evidências.
24
1.2.5. Geraldo Gomes, L.L.Vauthier e Marlene Milan Acayaba
O trabalho de Gilberto Freyre mitificou a casa-grande dos antigos engenhos de
açúcar como um ‘clássico da arquitetura brasileira’. Essa afirmação, proferida pelo
próprio Freyre em 198458, instigou o arquiteto Geraldo Gomes a fazer um minucioso
trabalho de levantamento histórico arquitetônico dos antigos engenhos de açúcar de
Pernambuco. Nesse estudo, ele fez um apanhado histórico envolvendo questões
econômicas, tecnológicas e sociais do período canavieiro, que definiram e consolidaram
os engenhos como marcantes na histórica da arquitetura brasileira.
Gomes fez uma análise da implantação dos edifícios, identificou os sistemas
construtivos mais freqüentes e fez uma classificação tipológica desses engenhos.
Classificou as casas-grandes dos engenhos de açúcar em Pernambuco em nove grupos,
sendo alguns deles com sub-grupos. Como o próprio Gomes afirmou, “nessa
classificação foi possível, entre outras coisas, especular sobre as prováveis origens de
seus partidos arquitetônicos”59.
Esse trabalho é importantíssimo para entender, por um lado, as origens de alguns
elementos arquitetônicos como, por exemplo, o alpendre e a varanda, e o uso e a
importância dos principais espaços na casa-grande, como salas de visitas e quartos de
hóspedes. Por outro lado, apesar de não aprofundar o uso dos espaços da casa, como fez
Lemos, Gomes ao se referir a esses espaços, evidenciou as rígidas regras impostas na
casa-grande em relação ao espaço privado dos senhores de engenho, ressaltando, por
exemplo, a formalidade existente no ato de receber visitantes e as limitações impostas a
este quanto à inserção nesse espaço.
As observações apresentadas por Gomes, quanto ao uso dos espaços desses
edifícios apoiaram-se em estudos já feitos, dentre eles, os de Vauthier60. Segundo
Freyre, “Vauthier está entre os estrangeiros que melhor têm observado os costumes da
nossa gente”61. Estudioso da arquitetura colonial brasileira, Vauthier, durante os seus
mais de cinco anos de residência no Brasil, produziu um precioso diário com anotações
57
VERÍSSIMO, F e BITTAR, W. 500 anos da casa no Brasil – as transformações da arquitetura e da
utilização do espaço de moradia. Ediouro Publicações S.A, Rio de Janeiro, 1999.
58
Gilberto Freyre, abrindo um seminário sobre Arquitetura nos trópicos, promovido e realizado no Recife
pela fundação Joaquim Nabuco em 1984. Citado por Gomes, 1998, pág.10.
59
GOMES, 1998, pág.10.
60
L.L.Vauthier - ilustre engenheiro e arquiteto francês que esteve no Brasil de 1840 a 1846.
25
sobre a casa brasileira, o qual foi publicado em revistas francesas de arquitetura, e
algumas de suas cartas sobre arquitetura doméstica podem ser encontradas em Casa de
Residência no Brasil62.
No caso de Vauthier, esse esforço de apreensão tinha como objetivo a solução de
problemas técnicos, por isso o foco eram as técnicas construtivas e os materiais usados.
Segundo estudiosos como Freyre, no entanto, ele foi além disso, fazendo um precioso
trabalho de investigação das influências históricas na tipologia das casas, e a origem dos
materiais de construção. As suas cartas revelam sua compreensão dos aspectos sociais,
históricos, ecológicos e mesmo psicológicos das construções coloniais brasileiras.
Assim como Gomes e Vauthier, a preocupação com a sistematização de dados
sobre a arquitetura doméstica, levou Acayaba a fazer um levantamento arquitetônico de
casas em São Paulo, num período mais recente. Diferente de Lemos, Acayaba não tinha
o interesse em detalhar o uso dos cômodos, mas estava incluso o interesse pelo processo
construtivo. O objetivo era registrar o projeto e toda a documentação que o envolve, no
sentido de revelar as mudanças ocorridas no espaço doméstico desde o processo
construtivo até a intenção plástica de cada obra.
Segundo ela, ao fazer tal levantamento, utilizando desenhos e fotografias de um
edifício “...o objetivo é revelar o projeto, os processos construtivos, a dimensão e a
disposição dos aposentos, o partido adotado e a intenção plástica implícita nessa obra”63.
Nesse sentido, o trabalho de Acayaba é mais próximo do que Gomes fez com os
engenhos em Pernambuco, ao revelar a tipologia das casas em São Paulo.
A idéia do trabalho, segundo ela, era “constituir, a partir do levantamento de
dados empíricos, uma coleção sistemática de casas, reduzida aos principais elementos
de representação para mostrar a evolução da arquitetura doméstica em São Paulo no
período de 1947 a 1975”64. O resultado desse trabalho foi a sistematização detalhada de
material como a planta de situação, levantamentos arquitetônicos, desenhos
arquitetônicos, fotografias, fichas técnicas e memoriais descritivos.
Embora o enfoque dado no trabalho de Acayaba seja diferente do proposto nesse
estudo, ou seja, não aprofunda o estudo da organização espacial dessas residências, o
seu levantamento está entre os valiosos estudos referentes ao espaço doméstico no
61
VAUTHIER, L.L. Casas de residência no Brasil. In: Arquitetura Civil I, FAUUSP e MEC-IPHAN, São
Paulo, 1975, introdução de Gilberto Freyre, pág 3.
62
VAUTHIER, L.L., 1975.
63
ACAYABA, 1986, pág. 19.
64
ACAYABA, 1986, pág. 19.
26
Brasil. A riqueza do levantamento de Acayaba (inclusive com fotos internas das
residências, além de fotos do exterior e as plantas baixas), daria, sem dúvida, um
excelente material para estudo morfológico dessas residências.
Tanto os trabalhos de Lemos quanto de Gomes contribuíram de maneira
fundamental para o resgate das mudanças no programa de necessidade da casa
brasileira. As mudanças sociais e culturais mudaram o uso de alguns espaços assim
como criaram outros devida às novas exigências, como, por exemplo, a recente presença
da sala de TV e o desaparecimento do quarto de hóspedes do espaço doméstico.
Juntamente com Acayaba, eles registraram as mudanças de tipos da casa brasileira em
diferentes períodos da história, contribuindo para o resgate histórico das mudanças
desse objeto.
No entanto, falou-se em mudanças no espaço doméstico (seus tipos e uso dos
espaços) sem investigar como essas mudanças estavam expressas na forma de
organização espacial das casas. Não se considerava também como essa organização
espacial estava relacionada às mudanças de comportamento das pessoas nesse espaço.
Entender melhor a relação entre a organização espacial e mudanças de uso do espaço
doméstico, é a proposta deste estudo.
1.2.6. Le Corbusier e o Movimento Moderno
O século XX é caracterizado por fortes mudanças que marcaram também a
arquitetura. Para Kopp, a Primeira Guerra Mundial, significou um “divisor de águas de
fundamental importância no que diz respeito à arquitetura, especialmente a residencial65.
No contexto econômico, social e político do pós-guerra (de 1914-1918) surge a
“ideologia ‘moderna’ na arquitetura e no urbanismo”66, essa ideologia estava imbuída da
convicção de que se podia provocar profundas transformações no jeito de viver, via
(re)organização espacial.
No período do entre guerras, numa época de reconstrução, o Movimento
Moderno propôs mudanças urbanísticas e arquitetônicas que implicaram novos
65
LEMOS, 1989, pág. 62.
KOPP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. Editora Nobel, São Paulo,
1990, pág. 16.
27
66
conceitos de estética, novos materiais, novas técnicas construtivas. Mais que isto, esse
movimento implicava num novo modo de vida. Para Kopp, é esse conceito fundamental
de “cultura do modo de vida” que esteve na base de todas as teorias arquitetônicas e
artísticas da década de vinte: “é ele que faz nascer na arquitetura formas de habitação
inteiramente novas e fundadas sobre as idéias que os revolucionários – alguns deles,
pelo menos – faziam da sociedade do futuro”67.
Nessa perspectiva, Le Corbusier destacou-se pelas pesquisas feitas sobre novas
formas de habitações. Em suas pesquisas rumo a uma proposta de um novo modo de
vida, ele projetou em 1929 a Ville Savoye. Esta residência perto de Paris passou a ser
expressão dos cinco pontos que ele considerou essenciais da nova concepção de
arquitetura: pilotis, planta livre, fachada livre, janela corrida e cobertura plana ou
cobertura jardim.
Os elementos apresentado na Ville Savoye são encontrados também na sua
proposta de unidades habitacionais para a Ville Radieuse, exemplo maior de suas
concepções arquitetônicas e urbanísticas. Após um rigoroso levantamento sobre as
necessidades básicas do ser humano para habitar, ele propôs, no projeto da Ville
Radieuse, um apartamento caracterizado pela ergonomia levada ao extremo. Essa
unidade habitacional é marcada pela otimização de cada centímetro quadrado de espaço,
tornando-se uma síntese dos conceitos racionais de Le Corbusier para habitação.
A casa é concebida então como um espaço racional, dividido em núcleos,
caracterizando o conceito de funcionalidade e praticidade da proposta de moradia. O
núcleo de serviço é composto por cozinha e banheiros, com seus espaços reduzidos ao
mínimo. Os quartos são concebidos somente para atender à função de dormitório, por
isso também com seus espaços reduzidos.
Para se ter uma idéia desse nível de racionalização, nos apartamentos, além
dessas características, outras medidas deveriam otimizar o espaço. As construções eram
pensadas com uma certa capacidade de transformação em termos de uso noturno ou
diurno, através da remoção das divisórias corrediças: “quando fechados, esses
elementos subdividiam os espaços de dormir e, abertos, ofereciam uma área de lazer
para as crianças que podia ter continuidade com a sala de estar”68.
Nesse novo modo de vida, a racionalização era a palavra chave. Não apenas a
concepção e a construção deveriam ser racionalizadas, mas também o comportamento
67
KOPP, 1990, pág. 20.
28
dos habitantes dentro das residências deveria ser racional. Para Gropius, três condições
eram essenciais para essa racionalização,
Viver de outra maneira, ou seja, que cada habitante tenha seu próprio quarto, não importa quão
pequeno; que a cozinha seja concebida de maneira a simplificar ao máximo o trabalho doméstico
e que a mobília, enfim, não imite o mobiliário burguês, mas seja, ao contrário, concebida em
função de um manutenção simples, de condições de vida higiênicas e de um preço baixo. Assim,
é toda a concepção de habitação que deve ser posta em causa69.
Com essa nova concepção de espaço de morar, a cozinha é um dos espaços com
maiores mudanças. A nova cozinha é um elemento essencial para a simplificação das
tarefas domésticas. Essa lógica fazia parte de um processo que visava otimizar,
higienizar e mecanizar as cozinhas. A cozinha do final do século 19 pareceria arcaica ao
lado das novas “cozinhas-laboratório” destas habitações. Nessas cozinhas, as funções
foram meticulosamente analisadas pelo arquiteto Gete Schütte-Lihotzky, no sentido de
reduzir sua área ao mínimo necessário, contribuindo para a diminuição do tempo gasto
com os serviços domésticos. Esse estudo resultou na famosa “cozinha de Frankfurt”.
A cozinha de Frankfurt tornou-se símbolo dessa racionalização extremada, por
meio do conceito de existenzminimum. Esta redução da área ao mínimo necessário (ou
mínimo necessário à existência) foi uma preocupação que regeu toda essa concepção de
habitação. Esse conceito estava tão presente que, para Argan, “qualquer fração de
espaço que não seja efetivamente habitada, dimensionada para um ato humano preciso,
só poderá pertubar a percepção do espaço e a clareza das sensações”70.
A compreensão dos novos conceitos de modo de vida, propostos pelo
Movimento Moderno, é essencial para o presente estudo, uma vez que Brasília, universo
geográfico da amostra, é fruto das concepções modernistas de arquitetura e urbanismo.
A Investigação sobre as influências da proposta modernista de modo de vida (ou sua
negação) em casas em Brasília nas últimas três décadas é imprescindível neste trabalho.
68
FRAMPTON, K. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo, Martins Fontes, 1997, pág.216.
KOPP, 1990, pág. 53.
70
ARGAN, G. Walter Gropius e a Bauhaus, 1984. Citado por TRAMONTANO, 1998, pág.52.
69
29
1.2.7. Marcelo Tramontano
O século XX, considerado o século da ciência e dos avanços tecnológicos,
implicou o incremento de novos equipamentos no dia-a-dia
das pessoas. Alguns
pesquisadores têm estabelecido como objetivo de estudo a compreensão do alcance
dessa tecnologia e sua inserção no espaço doméstico, buscando compreender como elas
mudam o modo de vida nas residências. Tramontano, entre eles, dedica-se ao estudo
desse tema. Segundo ele, “à sociedade pós-segunda guerra restou incorporar aos seus
modos de habitar as novas e ainda incipientes mídias e todo o equipamento que lhes
davam suporte, efeito das revoluções tecnológicas que contavam com a ajuda certa dos
profissionais de marketing”71.
Em fins de século XX, as mudanças tecnológicas mudaram consideravelmente o
cotidiano das pessoas, que incluíram a presença do computador, por exemplo. Em
meados do século parecia impensável o seu uso doméstico devido ao tamanho e ao
preço elevado desse equipamento. Hoje estão presente em muitos lares, isso indica a
medida da inserção dessa tecnologia na vida cotidiana, implicando mudança de
costumes.
Tramontano e os membros do GHab72, investigam as mudanças comportamentais
no espaço doméstico pelo que eles denominam de “novas mídias”. Essas novas mídias
são novos conceitos de informação e entretenimento, que estão acessíveis, por exemplo,
pelos sistemas televisivos a cabo e via satélite, pelo sistema de telefonia celular, e pela
Internet73. A preocupação desses pesquisadores é entender quais os impactos desse novo
modo de vida no novo espaço de morar.
Eles acreditam que decorrem daí “manifestações significativas no redesenho do
espaço doméstico e na redefinição de suas funções, e toma corpo a idéia de
superequipamento, disseminado, principalmente, através da publicidade e do cinema”74.
Segundo Tramontano, as alterações parecem limitar-se aos seguintes níveis: a) relação
entre os membros do grupo familiar; b) relação entre membros do grupo familiar e as
71
TRAMONTANO, M. PRATSCHKE, A ., MARCHETTI, M. Um toque de imaterialidade: o impacto
das novas mídias no projeto do espaço doméstico, 2000, pág. 3. (mimeo)
72
GHab – Grupo de Pesquisa em Habitação, da Universidade de São Paulo.
73
TRAMONTANO, M. PRATSCHKE, A ., MARCHETTI, M, 2000, Pág.2.
74
TRAMONTANO, M. PRATSCHKE, A ., MARCHETTI, M, 2000, pág. 3.
30
novas mídias; c) relação entre membros do grupo familiar e pessoas extra-grupo; d)
alteração da função dos cômodos. Estes são os eixos de sua pesquisa.
O estudo do modo de vida sob o impacto dessas novas tecnologias é, sem
dúvida, um aspecto importantíssimo e inevitável a ser abordado no espaço doméstico,
no sentido de se entender em que medida isso muda o modo de vida nesse espaço. Este
é, inclusive, um dos aspectos levantados na presente pesquisa, embora não seja o foco
específico. No entanto, partindo dos níveis de alterações possíveis, citados por
Tramontano, é provável, como veremos, que essas mudanças estejam diretamente
ligadas à configuração desses novos espaços de morar.
As mudanças na relação entre os membros do grupo familiar e desses com
pessoas extra-grupo significam também mudanças na configuração dos espaços
domésticos, de tal forma que estes suportem bem tais mudanças nas relações pessoais.
Tramontano referiu-se a um “redesenho do espaço doméstico”, implicando
possivelmente uma redefinição configuracional das casas. Veremos como esse
redesenho não se restringe somente ao tamanho ou ao uso de cada cômodo da
residência, o que não fica claro no trabalho de Tramontano.
1.2.8. Julienne Hanson e a Sintaxe Espacial
Os primeiros estudos utilizando a Sintaxe Espacial para análise morfológica do
espaço doméstico surgiram com Hanson, na década de 1970. Ela estudou edifícios e
entre eles várias casas inglesas e francesas em diferentes períodos históricos. Suas
publicações viraram referência para o estudo morfológico de casas por sistematizar as
técnicas da Sintaxe Espacial para análise deste tipo de edifício. Entre outras análises, ela
estudou casas de arquitetos famosos do Movimento Moderno, como de Loos (Casa
Muller), Meier (Casa Giovannitti), Botta (casa em Pregassona) e Hejduk (Casa
Diamond), e casas de arquitetos em Londres.
Hanson e Hillier defenderam a importância do estudo da morfologia, sob o
enfoque dado pela Sintaxe Espacial, para o projeto em arquitetura. Segundo eles uma
“falta de compreensão da natureza precisa da relação entre organização espacial
31
[morfologia] e vida social é o obstáculo principal a um projeto melhor”75. Defenderam a
importância dessa área de estudo para a arquitetura, como forma de aliar conhecimento
teórico à competência da intuição arquitetônica.
No Brasil, alguns pesquisadores estão desenvolvendo trabalhos nessa área com
intuito de identificar as diferenças configuracionais existentes na arquitetura doméstica
brasileira. Esses estudos contribuem e complementam as pesquisas anteriores sobre
residências ao revelar a estrutura do espaço doméstico sob um outro enfoque. Estudam
as casas a partir da sua configuração, ou seja, é entendida como um sistema de relações
entre os espaços que as compõem.
Para se ter uma idéia, em recente estudo, Trigueiro investigou a afirmativa de
que os sobrados – característicos da arquitetura doméstica colonial – constituíam um
único tipo. Essa afirmativa foi primeiramente feita por Vauthier, referindo-se à tipologia
das casas coloniais, quando de suas anotações sobre a casa brasileira, no início do
século. Segundo ele, “quem viu uma casa brasileira viu todas”76.
Lemos ao estudar os sobrados paulistanos, na mesma linha de Vauthier, referiuse às divisões internas da casa colonial urbana, afirmando que “a casa popular urbana
dos tempos coloniais praticamente teve a mesma planta pelo Brasil em geral, embora as
técnicas construtivas tenham sido diversificados”77. Em relação aos sobrados coloniais
em Pernambuco, aos quais Vauthier se referiu, Trigueiro constatou que essa premissa de
semelhança generalizada estava equivocada. Segundo ela,
os resultados obtidos desautorizam a premissa de que o sobrado colonial constituiu um tipo
único demonstrando, sobretudo, que, para além de uma aparente semelhança geométrica e
estilística, a análise de configuração espacial revela modelos estruturais, plenos de significados
sócio-culturais, cujas sutilezas muitas vezes escapam às formas tradicionais de representação e
leitura.78
As conclusões de Trigueiro mostram a importância da análise da configuração
espacial do edifício. Ao concluir que, embora haja características comuns, as muitas
diferenciações na estrutura espacial dos sobrados indicam que estes não constituíram
75
No original: “...a lack of understanding of the precise nature of the relation between spatial organization
and social life is the chief obstacle to better design”. HILLIER, e HANSON,. 1984, pág. X – prefácio.
(minha tradução).
76
VAUTHIER, 1975, pág. 37.
77
LEMOS, C. Alvenaria Burguesa: breve história residencial de tijolos em São Paulo a partir do ciclo
econômico liderado pelo café. Editora Nobel, São Paulo, 2ª edição, 1989a, pág. 32.
32
um tipo único: os sobrados urbanos, por exemplo,
são mais hierarquizados, não
permitindo acessos alternativos, enquanto os sobrados semi-urbanos e a casa de sítio são
mais integrados ao exterior, modificando a hierarquia espacial antes referida.
Além desse trabalho, Trigueiro têm uma vasta pesquisa sobre espaços
domésticos com o intuito de fazer um banco de dados sobre o assunto. Essa
sistematização envolve o estudo de casas de vários períodos arquitetônicos, desde casas
do período colonial, eclético, moderno, até casas contemporâneas79.
Outro importante trabalho, também sobre casas no Recife, foi feito por
Monteiro. Nele ela fez uma análise do padrão espacial das atividades domésticas, de
diferentes grupos sociais, baseadas na análise de cada estrutura residencial. Ao mapear
as atividades no espaço doméstico, ressaltou a importância da diferença entre o rótulo
do espaço e sua ocupação. Na grande maioria das vezes a definição do cômodo da casa
não explicita as atividades que nele acontecem. No presente estudo, para o
entendimento do modo de vida se fez necessário mapeamento similar e, de fato, as
categorias de atividades para tal mapeamento foram inspiradas no trabalho de Monteiro.
Na mesma linha de pesquisa, Amorim estudou diversas casas em Pernambuco.
Em sua pesquisa de doutoramento, dedicou-se ao estudo da relação espacial entre os
“setores” das residências. Estudou como os setores íntimo, social e de serviço
configuram a estrutura dos espaços domésticos em Recife. Para esse estudo, Amorim
trabalhou com uma amostra de 14 casas coloniais, 32 casas ecléticas e 204 casas
modernas.
Em recente trabalho, Amorim discutiu outras variáveis morfológicas para o
estudo das residências e ressaltou a importância de estudar os setores como importante
aspecto da estrutura espacial doméstica. Afirmou que os setores “podem expressar
muito das intenções dos projetistas e habitantes em isolar fortemente os diferentes
setores, diferentes categorias de usuários...”80. Para esse trabalho, é de interesse o estudo
feito por ele sobre as casas de arquitetos modernista em Recife, pois serão usados como
parâmetros para análise.
78
TRIGUEIRO, E.B.F. Sobrados coloniais: um tipo só?. Pág. 7. (mimeo).
TRIGUEIRO, E.B.F. The dinner procession goes to the kitchen: a suntactic approach to nineteenth and
early twentieth century British houses. In: Anais do 1º International Space Syntax Symposium, Volume
II, Londres, 1997, pág. 19.1ss.
80
No original: “can express many of the intentions of the designers and inhabitants by strongly isolating
different sectors, differents categories of users...”. AMORIM, L. Houses of Recife – From diachrony to
Synchrony, In: Anais do 3º International Space Syntax Symposium, Atlanta, 2001, pág. 3. (mimeo)
33
79
Esse rápido panorama ilustra a diversidade de estudos sobre os diferentes
aspectos do espaço doméstico, envolvendo desde de suas características sócioantropológicas, suas formas de ocupação e uso, até sua organização espacial. Essas são
algumas características que fazem do espaço doméstico um complexo objeto de estudo.
Se, por um lado, ele se mostra carregado de significados, por outro, ele possui
características físicas (ou morfológicas), concretamente relacionadas à maneira como as
atividades acontecem.
Diante desse panorama, não é a pretensão desse estudo responder a todos os
questionamentos levantados nos diferentes trabalhos. A intenção é explicitar algumas
diferenças de abordagem, sistematizar suas contribuições para esse estudo, e sua
pertinência ao tema proposto.
Lemos, na introdução do livro Alvenaria Burguesa, chamou a atenção para os
cuidados necessários ao estudar a casa, dada a interdisciplinariedade do tema. Para ele,
“a gama de conhecimentos necessários ao pleno entendimento do tema proposto, como
se verá, está a exigir de um simples professor de história da arquitetura um saber muito
além de suas limitações”81. De fato, há razões para tanto cuidado. Entretanto, a
compreensão de alguns aspectos do espaço doméstico, sob esse enfoque arquitetônico,
exige que fronteiras interdisciplinares sejam tocadas.
Como observou Monteiro, Hillier e Hanson argumentaram que a principal
dificuldade no estudo do espaço, é o paradoxo de encontrar a relação entre o “sujeitos”
imateriais abstratos (parte subjetiva) e um mundo material de “objetos” (parte
objetiva)82. Entender essa situação relacional, que exige essa interdisciplinariedade, é o
desafio deste estudo.
81
LEMOS, C.1989a, pág.7.
No original: “Hillier and Hanson (1984) argue that the main difficulty rests in the paradox of finding a
relation between abstract immaterial “subjects” and a material world of “objects’. What is to be sought is
a relationship between the ‘social’ subject (whether individual or group) and the spatial object acting as
distinct entities: space is desocialised at the same time as society is despatialized” (Hillier and Hanson,
1984) citado por MONTEIRO, C. 1997, pág. 20-1.
34
82
1.3. Contexto social e geográfico
O universo estudado neste trabalho é composto por residências unifamiliares
localizadas no Distrito Federal, mais precisamente no Plano Piloto de Brasília e em
algumas cidades satélites. As casas, num total de 27, estão assim distribuídas: a) Plano
Piloto - 9 casas no Lago Sul, 5 casas no Lago Norte, 1 casa na W3 Sul, Asa Sul; b)
Cidades Satélites - 4 casas em Taguatinga; 2 no Guará I; 1 no Guará II; 1 em
Sobradinho; 1 em Samambaia; 1 no Parkway e 1 no Condomínio Santa Bárbara,
próximo à Escola Fazendária; c) uma entrevistada não informou a localidade. A Figura
1 mostra o mapa do Distrito Federal, onde, os pontos na cor vermelha indicam a
localidade das residências.
Figura 1
35
A escolha por residências unifamiliares, é resultado da convicção de que casas
apresentam maior possibilidade de configuração que expressa a escolha do habitante
pela forma de organização do espaço. Isto é, num apartamento, a configuração padrão
para vários moradores pode, por um lado, impor uma configuração espacial e, por
outro, inibir o que poderia ser a vontade dos moradores por uma organização mais
idiossincrática do espaço.
Em Brasília, essa imposição é ainda mais freqüente uma vez que existem poucas
variações de plantas de apartamentos, especialmente no Plano Piloto. Mesmo que estes
sejam reformados, o que geralmente acontece, as possibilidades de mudanças na
configuração espacial são limitadas. As possíveis mudanças não constituem um perfil
que expressa as particularidades encontradas nas casas, embora seja claro que esse
universo constitua, igualmente, um ótimo objeto de estudo. Quanto às casas, entretanto,
por mais que o projeto sofra interferência dos arquitetos, por sobre as aspirações das
famílias, ou sofra influência de revistas de arquitetura ou de quaisquer outras fontes, a
residência unifamiliar ainda permite uma maior escolha do habitante por uma ou por
outra configuração, quando não a busca por um projeto exclusivo. Essa busca por
(assim como a maior possibilidade de) exclusividade, torna a investigação de um
possível genótipo83 (que é uma hipótese do trabalho), mais interessante.
Nesse sentido, essa amostra revelou uma característica importante: mais de 80%
dos entrevistados classificaram como “bom” e “muito bom” morar nas casas, e mais de
33% dizem não querer mudar absolutamente nada nelas. Esses altos índices de
satisfação dos entrevistados indicam a grande aceitação das residências, inclusive de
moradores para os quais as casas não foram projetadas, que de fato constituem a
maioria, pois 55,5% delas não foram projetadas para as famílias que as ocupam.
Dentre os argumentos que justificam essa satisfação foi mencionado o fato da
casa ser “confortável”, “aconchegante” e “espaçosa”. A maioria das residências são de
casas acima de 200m2 - cerca de 59,6%, dessas, quase 20% estão acima de 500 m2 de
área construída. Essas casas foram construídas a partir da década de 1970. Cerca de
18% são da década de 1970, mais de 37% são construções da década de 1980 e cerca de
45% são da década de 1990.
36
Quanto à composição familiar da amostra, esta se apresenta, relativamente
diversificada. Encontra-se famílias monoparentais, casais com dupla renda sem filhos84,
e famílias nucleares. A predominância é ainda da família nuclear (70% dos casos),
seguida de famílias monoparentais (14%) e de casais sem filhos (3,70%)85. Nessa
composição familiar, a maior renda ainda é a do pai, em mais de 59%, seguido pela mãe
com cerca de 18%.
Para a coleta de dados foram escolhidos estudantes de cursos de arquitetura e
urbanismo. A escolha desse público é resultado, unicamente, de questões operacionais.
A perspectiva era alcançar um público que oferecesse pouca resistência à abordagem e
capaz de fornecer, com maior facilidade, dados como, por exemplo, a planta baixa das
residências.
A escolha de alunos do primeiro, segundo e terceiro semestres, deu-se devido à
preocupação em atingir um público mais “desinteressado”, ou seja, sem vícios de
interpretação do contexto ora estudado, garantindo assim uma maior idoneidade das
informações. A preocupação em diversificar a amostra, para que esta não fosse reduzida
aos alunos da UnB – Universidade de Brasília, levou à coleta de dados em outras duas
faculdades: na IESPLAN – Instituto de Estudos Superiores Planalto e UniCeub – Centro
Universitário de Brasília.
No IESPLAN e no UniCeub, os dados foram coletados em diferentes turnos
letivos. No Uniceub, os dados são dos alunos do segundo período vespertino e no
IESPLAN do segundo período noturno. Na UnB, foram coletados dados no primeiro
período e no terceiro período letivos.
A escolha do público alvo, entretanto, já se constituiu num recorte da classe
social que compõe o universo em estudo. Das famílias entrevistadas, cerca de 74% têm
renda familiar acima de 20 salários mínimos. Entre esses, o maior índice, 33,33%, são
de famílias com renda acima de 50 salários mínimos. Dados do IBGE indicam que, para
a região centro-oeste, somente 6,5% das famílias estão classificadas nesse rendimento
mensal.
Outra informação importante é o grau de instrução dos moradores. A pessoa com
maior renda na casa têm terceiro grau completo, cerca 60% dos casos. O segundo maior
83
Genótipo é um conceito, emprestado da biologia e usado pela Sintaxe Espacial, para identificar um
grupo com característica recorrentes, um código para identificar os objetos estudados.
84
DINKS - double income no kids . Cfr. TRAMONTANO, 2000, pág. 2.
37
índice é de pós-graduados, cerca de 22%, e na seqüência, de terceiro grau incompleto,
cerca de 11%. Essas informações colocam as famílias da amostra numa classificação
social bem acima da média.
Como veremos no capitulo 3, o universo estudado é tipicamente de classe
média, o que resulta num objeto propício para essa investigação, uma vez que é nessa
classe social onde estão expressas as novas concepções de uso, conforto e tecnologia,
graças aos recursos financeiros característicos dessa classe social. As possíveis
mudanças configuracionais e comportamentais podem ajudar a entender as tendências
mais recentes, particularmente se comparadas às residências modernas estudadas por
outros autores. Estaremos diante de um genótipo pós-moderno?
85
O restante, cerca de 12% não informaram.
38
Capítulo 2 - O método
O meu intento não é ensinar aqui o método
que cada qual deve seguir para bem conduzir a sua razão,
mas somente mostrar de que maneira procurei conduzir a minha.
Descartes
O estudo do espaço doméstico, sob a ótica do presente trabalho, ou seja,
considerando sua sintaxe, assim como o modo de vida que nele se desenvolve, requer
dois níveis de análise. O primeiro nível será constituído pela análise da casa a partir de
dados referentes à maneira como a família vive nesse espaço, seus costumes, seu dia-adia. O segundo será constituído pela análise da configuração desse espaço.
O primeiro nível têm como objetivo fazer uma aproximação do modo de vida;
entender como as pessoas utilizam os espaços, quando, para quê e por quem são
ocupados, e o grau de satisfação em relação ao espaço habitado. A partir daí, a
investigação é uma tentativa de mapear como se dão as interfaces sociais no complexo
estudado. Para isso, os dados foram coletados em duas etapas: a) a aplicação de
questionários; b) entrevistas com público selecionado a partir dos questionários.
No segundo nível, o espaço será analisado a partir da sua sintaxe. Essa análise
possibilitará conhecer a casa numa outra dimensão. Não a dimensão social lato senso,
como no primeiro momento, mas determinadas características físicas, ou seja, um
estudo de sua configuração em termos de barreiras e permeabilidades que conformam
tipos de acesso diferenciados – mais ou menos diretos – entre os cômodos. Essa etapa
será feita a partir da análise das plantas baixas das residências e de sua implantação.
Os dados para análise configuracional foram coletados com a aplicação dos
questionários, quando foi solicitado aos entrevistados que desenhassem as plantas de
suas casas. O estudo dessa dimensão propicia uma leitura das casas como sistemas
formados por espaços ou ambientes que se relacionam. Será possível ver como a lógica
destes sistemas está relacionada com as interações sociais descritas no primeiro
momento.
39
2.1. Utilização e Ocupação dos espaços
No espaço doméstico, são muitas as variáveis envolvidas para caracterização de
um modo de vida, conforme visto nas pesquisas envolvendo a casa. Contudo, e ciente
da complexidade do objeto, o que se pretende explorar nesse estudo é a maneira como
as pessoas vivem e utilizam esse espaço, buscando identificar um determinado estilo de
vida através das relações sociais ocorridas em seu interior.
Essas relações serão analisadas sob três aspectos: a) relação entre os habitantes;
b) relação desses habitantes com os visitantes; c) relação dos habitantes com
empregados. Segundo Hanson, “casas são sensíveis a relações sociais somente quando
constróem e contêm interfaces entre diferentes tipos de habitantes e diferentes
categorias de visitantes”86. O visitante é todo aquele que não faz parte do grupo que
mora na residência.
Para entender essas relações sociais, a aplicação de questionários e as entrevistas
procuraram identificar quais espaços são mais usados e quais são menos usados pelos
habitantes. Identificar também quais são os espaços mais usados para receber visitantes
e quais são, normalmente, os espaços inacessíveis a eles (para maiores detalhes ver o
questionário de pesquisa no Anexo 1).
Com o propósito de caracterizar melhor a utilização desses espaços, foram
elaboradas questões referentes às atividades que são realizadas. As atividades foram
agrupadas em cinco categorias87: 1) tarefas domésticas (cozinhar, lavar louça, lavar
roupa e passar); 2) lazer passivo (ver TV, ler, ouvir música, jogos de computador, fazer
ginástica)88; 3) lazer interativo (encontrar amigos, beber, namorar); 4) necessidades
comuns (tomar café, almoçar, jantar), e 5) necessidades privadas (escovar dentes, tomar
banho, dormir, repousar, fazer amor).
Outra maneira utilizada para caracterizar o uso do espaço foi mapear a
localização dos equipamentos que fazem parte do cotidiano das pessoas. Para isso foi
86
No original: “Houses are sensitive to social relations only insofar as they construct and constrain
interfaces between different kinds of inhabitant, and different categories of visitor.” HANSON, 1998,
pág. 77. (minha tradução).
87
Essas categorias foram sugeridas por MONTEIRO, 1997, pág. 20.3.
40
incluída uma questão sobre a localização de tais objetos. Apenas alguns equipamentos
foram incluídos como, por exemplo, televisão, aparelho de som, computador e aparelho
de ginástica, porque esses equipamentos podem, mais diretamente, indicar mudanças de
comportamento e de utilização dos diferentes espaços da casa. Foram incluídas ainda
outras questões procurando saber se as pessoas entrevistadas gostam ou não do bairro e
da casa onde moram, tendo por objetivo pesquisar o grau de satisfação do lugar
habitado.
Esse conjunto de questões – entre outras presentes no questionário - tem como
objetivo retratar as atividades no espaço doméstico, possibilitando assim um
mapeamento dessas atividades. Os dados coletados foram digitados e compõe um
pequeno banco de dados89, servindo de base para a análise do presente trabalho.
De posse dos resultados dos questionários, foram selecionados cerca de 20% da
amostra para entrevistas semi-estruturadas. Essas entrevistas tiveram como objetivo
aprofundar algumas informações dadas no questionário, permitindo melhorar a
aproximação quanto à maneira como vivem os habitantes das residências. Elas foram
feitas através de um roteiro que tinha por objetivo fazer com que as pessoas
descrevessem em detalhes as atividades de um dia comum e de um final de semana. Ao
descrever, elas deveriam explicitar porque os espaços foram escolhidos (em função da
resposta dada no questionário), o que os caracteriza para tal atividade, a sua decoração
etc. (para maiores detalhes ver o roteiro de entrevistas no Anexo 2).
As casas selecionadas foram: as casas 3, 16, 17, 18 e 26. Essas casas foram
selecionadas porque formam uma amostra representativa da diversidade encontrada no
conjunto estudado. Essa diversidade foi estabelecida a partir de alguns critérios: a)
configurações mais e menos permeáveis; b) configurações mais e menos setorizadas, ou
seja, plantas que apresentam os setores de serviço, social e íntimo claramente separados,
ou não; c) casas com diferentes tamanhos, em termos de área construída; d) casas em
diferentes localidades.
O alcance desse processo investigatório é limitado pelo nível de detalhamento de
algumas atividades. Esse limite é o que Tramontano, em seu estudo sobre o modo de
vida, chamou de atividades que acabam “ficando de fora”, como os diversos níveis,
88
O termo "lazer passivo" refere-se a atividades que, embora possam ser feitas coletivamente, não têm
um caráter de interação direta entre as pessoas.
89
Banco de dados feito pela autora no aplicativo ACCESS, no Windows 98.
41
formatos e natureza das relações entre os membros do grupo. Para ele, esses níveis
seriam constituídos por
uma conversa entre pai e filho, o namoro dos adolescentes, as confissões entre irmãs, a atividade
sexual de todos, das relações sexuais entre os pais aos momentos solitários dos filhos de
exploração do próprio corpo, as longas conversas entre coabitantes... A tentação de inseri-las na
esfera do entretenimento é grande, mas seria reduzir sua importância no próprio cotidiano das
pessoas90.
2.2. A Sintaxe Espacial
A Sintaxe Espacial tem suas origens no início dos anos de 1970, como visto
anteriormente. Segundo Holanda, a expressão “Sintaxe Espacial” apareceu pela
primeira vez no artigo “Space Syntax”91, publicado em 1976, embora alguns textos
anteriores de Hillier e Leaman já apresentassem as idéias básicas ali discutidas.
Entretanto, a mais completa sistematização dos conceitos, das categorias analíticas
básicas e do referencial epistemológico da teoria, foi feita no livro The Social Logic of
Space92, de Hillier e Hanson, editado em 1984.
A Sintaxe é definida por Hillier e Hanson como “uma metodologia, ou um
conjunto de técnicas para a representação, quantificação e interpretação da configuração
espacial em edifícios e assentamentos”93. Segundo Loureiro, ela procura demonstrar,
tanto empírica quanto teoricamente, a autonomia do objeto estudado para, em seguida,
argumentar que é através da compreensão desta autonomia que se pode entender a
forma material da cidade e do edifício, como um aspecto intrínseco de sua existência
social94. Isto é, ela parte do pressuposto de que uma determinada configuração espacial
tem características intrínsecas que suportam melhor determinados comportamentos e
90
TRAMONTANO, 1998, pág.231.
HILLIER, B, A LEAMAN, P. STANSALL e M. BEDFORD. “Space Sintax”, Environment &
Planning, 1976. Citado por HOLANDA, 1997, pág. 75.
92
HILLIER e HANSON. The social logic of space, Cambridge University Press, Cambridge, 1984.
93
No original: “...set of techniques for the representation, quantification and interpretation of spatial
configuration in buildings and settlements” (HILLIER, B. e HANSON, J. e GRAHAM, H. Ideas are in
things: an application of the space syntax method to discovering house genotypes, in: Enviroment and
Planning B: Planning and Design, 1987, v.14, pág. 363.) (minha tradução).
94
LOUREIRO, C. Classe, controle, encontro: o espaço escolar. Tese de Doutorado apresentada à
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. São Paulo, 1999, p. 50-51.
(mimeo).
42
91
relações humanas. Ela será utilizada, portanto, como uma metodologia capaz de
explicitar a relação entre os espaços residenciais e suas formas de uso e convívio.
Nesse sentido, a partir da análise da configuração espacial das residências, podese entender como as mesmas, ao longo da história, responderam ou não a determinadas
expectativas sociais em relação ao espaço. O conceito de configuração é de fundamental
importância na Sintaxe Espacial. Para Hanson,
relações espaciais existem onde há algum tipo de ligação entre dois espaços. Configuração existe
quando as relações existentes entre dois espaços são mudadas de acordo como relacionamos cada
um a um terceiro ou a qualquer número de espaços. Descrições configuracionais, portanto,
trabalham com a maneira pela qual um sistema de espaços está relacionado para formar um
padrão, em vez de [trabalhar] com as propriedades mais localizadas de qualquer espaço
particular95.
A teoria da Sintaxe Espacial possibilita estudar o espaço a partir do sistema de
relações espaciais – de proximidade, distâncias, circunscrição, seqüenciamento etc - que
constitui o edifício ou assentamento. Isso é possível a partir da topologia, por isso,
adota-se uma análise topológica, ao invés de geométrica, nessa abordagem do espaço
arquitetônico. Os pesquisados da Sintaxe acreditam que esta é uma das maneiras que
melhor permitem estudar as relações entre configurações espaciais e os sistemas de
encontros (e distanciamentos) que se dão entre as várias categorias de pessoas.
A Topologia é uma das mais recentes áreas de estudos na matemática. Embora
vários matemáticos tenham contribuído para o desenvolvimento dessa área, a maior
referência é sem dúvida Poincaré96. Ele dedicou-se a um dos ramos da Topologia, a
chamada topologia combinatória, também chamada de Analysis situs97. A topologia
combinatória “é o estudo de aspectos qualitativos intrínsecos das configurações
espaciais que permanecem invariantes por transformação”98. Uma transformação
topológica é, por exemplo, a deformação de um balão sem furá-lo ou rasgá-lo.
95
No original: “Spatial relations exist where there is any type of link between two spaces. Configuration
exists when the relations which exist between two spaces are changed according to how we relate each to
a third, or indeed to any number of spaces. Configurational descriptions therefore deal with the way in
which a sustem of spaces is related together to form a pattern, rather than with the more localised
properties of any particular space" HANSON, 1998, pág.23. (minha tradução).
96
Poincaré - famoso matemático, nasceu em Nancy - França, em fins de século XIX e morreu em 1912.
Ver BOYER, C. B. História da Matemática. Editoria Edgard Blücher Ltda. São Paulo, 1996.
97
Analysis situs - livro de Poincaré, publicado em 1895 que virou referência para os estudos em
topologia, por ser o primeiro a fornecer um desenvolvimento sistemático do assunto. BOYER, 1996, pág.
420.
98
BOYER, 1996, pág. 420.
43
Hillier, referindo-se à simetria - uma das propriedades da topologia que é
fundamental também para a Sintaxe Espacial - ressalta que “um objeto possui simetria
se ele mantém sua forma depois de alguma transformação”99. Por isso, a topologia é
popularmente chamada de “geometria de borracha” ou também de “geometria sem
medidas”, pois para ela “a natureza dos elementos não tem importância, só as relações
entre os elementos são importantes”100. Dessa forma, o conceito topológico é adotado na
teoria da Sintaxe Espacial porque lida com o espaço do ponto de vista das suas relações.
Para Boyer, a topologia é “um dos mais favorecidos e fecundos campos de
pesquisa no século XX. Ao lidar com aspectos matemáticos mais qualitativos do que
quantitativos, ela rompe com o estilo prevalecente na análise matemática do século
XIX”101. A utilização da topologia, portanto, dá à teoria da Sintaxe Espacial uma
característica inovadora.
99
STEWART e GOLUBITSKY, Fearful simmetry. Citados por HILLIER in: Space is the machine – a
configurational theory of architecture. Cambridge University Press. Cambridge.1996, pág. 103.
100
BOYER,1996, pág. 432-433
101
BOYER, 1996, pág. 420
44
2.2.1. Técnicas e conceitos básicos da Sintaxe Espacial
Para ser estudado como um sistema, o espaço doméstico é decomposto em
unidades elementares. No caso da Sintaxe, esta decomposição pode ser feita em
unidades de uma dimensão, chamadas de linhas axiais, em unidades de duas dimensões,
chamadas de espaços convexos e em unidades de três dimensões, chamadas campos
visuais102. A Sintaxe propõe, assim, três níveis possíveis de análise.
A técnica adotada nesse estudo, no entanto, será a da convexidade, uma vez que
o que se pretende estudar é a maneira como as pessoas usam ou ocupam o espaço, onde
elas se agrupam e o que fazem nesse local. A decomposição do espaço será feita,
portanto, em unidades bi-dimensionais, ou espaços convexos, a partir da planta baixa
das residências. Os espaços convexos são unidades de duas dimensões, circunscritas por
polígonos convexos, ou seja, polígonos que não podem ser cruzados por segmentos de
retas em mais de dois pontos. A Figura 2a ilustra essa definição, enquanto a Figura 2b,
ilustra o que seria um espaço côncavo.
Figura 2 a
Figura 2b
Figura 2 - ilustrando a definição de espaço convexo. cf. Hillier e Hanson, 1984, pág. 98.
102
Para Hanson, as pessoas movem-se ao longo de linhas axiais, formam grupos em espaço bidimensionais - elementos convexos - e vêem em três dimensões, os campos visuais ou isovistas. Segundo
ela, as organizações convexa e axial são as dimensões arquiteturais do espaço. A convexidade relata a
casa como espaço de repouso ou permanência e a organização axial expressa a estrutura da casa em
relação ao movimento. HANSON, 1998, pág. 242 e 243.
45
A figura 3 é um exemplo de uma planta baixa decomposta com a técnica da
convexidade.
Figura 3 a – Planta Baixa
37- quintal 5
25- garagem
24- lavanderia
36- quintal 4
35- quintal 3
7- copa / cozinha
21- quarto 4
22- banho 4
20- c6
6- átrio
23- escada 3
27- mezanino
26- escrit 1
19- escada 2
8- escada1
18- c5
9- c1
33- jardim int 2
29- ban 3
2- c4
10- c2
15- ban 2
12- ban 1
14- c3
11- c4
28- roupeiro
32- jardim int 3
1- vestíbulo
4- sala
38- quintal 1
5- varanda
3- lav.
13- quarto 1
30- quarto 3
17- escrit 2
16- quarto 2
34- quintal 2
31- jardim int 1
39 - Exterior
Figura 3b - Planta de convexidade, e as permeabilidades entre os espaços, cf. Holanda, 1999, pág. 3 e 5.
46
Da decomposição da planta baixa em espaços convexos, conforme figura 3, são
tiradas as relações diretas de permeabilidade e impermeabilidade entre os espaços. Para
detectar essa relação, algumas medidas sintáticas foram criadas a partir das chamadas
relações configuracionais básicas entre os espaços. Essas relações configuracionais
básicas são chamadas de simetria e assimetria, distributividade e não-distributividade.
Uma relação é simétrica, quando um espaço ‘a’ está para um espaço ‘b’ assim
como o espaço ‘b’ está para o espaço ‘a’, com respeito a ‘c’; assimétrica é quando ‘a’
não está para ‘b’ como ‘b’ está para ‘a’, no sentido que um controla a permeabilidade do
outro a partir de um terceiro espaço ‘c’. Uma relação é distributiva entre ‘a’ e ‘b’ se
existe mais que uma rota independente entre eles, incluindo uma passagem, pelo menos,
por um terceiro espaço ‘c’. É não-distributiva entre ‘a’ e ‘b’ se existe algum espaço “c”,
através do qual, necessariamente, deve passar a rota de ‘a’ para ‘b’103 (a figura 4 ilustra
essas relações).
Figura 4 - Ilustração das relações de simetria e distributividade, cf. Hillier e Hanson, 1984, pág. 148.
Para melhor compreender essas definições, a figura 4 mostra cinco situações das
diferentes relações entre os espaço a, b, c, d e suas respectivas representações. É
possível observar que: i) mostra ‘a’ e ‘b’ numa relação simétrica e distributiva com ‘c’;
ii) mostra ‘a’ e ‘b’ numa relação simétrica e não-distributiva com ‘c’; iii) mostra ‘a’ e
‘b’ numa relação não-distributiva e assimétrica com ‘c’; iv) mostra uma relação mais
complexa, onde ‘a’ e ‘b’ são simétrico cada um em relação a ‘c’, mas ‘d’ é um espaço
assimétrico em relação a ‘c’ e ambos assimétricos em relação respeito a ‘c’; v) mostra
‘d’ é não-distributivo e assimétrico com ‘a’ e ‘b’ os quais permanecem simétricos cada
um em relação a ‘d’ (ou a ‘c’)104.
103
104
HILLIER e HANSON, 1984, pág. 148.
HILLIER e HANSON, 1984, pág. 148-149.
47
Esse é o ponto de partida para a representação e análise de permeabilidade, feitas
a partir dos grafos. Um grafo é a representação de um sistema onde elementos, e
conexões entre eles, estão envolvidos (ver detalhamento adiante). As relações de
permeabilidade e impermeabilidade, representadas nos grafos, são consideradas as
dimensões básicas da configuração do espaço.
Nesse sentido, os grafos são importantes representações das relações de simetria
e distributividade entre os espaços, conforme definição anterior. Eles representam os
passos sintáticos dentro de um sistema, ou seja, explicitam as propriedades de
acessibilidade relativa entre os espaços através de uma rede de permeabilidades. Essa
representação do edifício por meio do grafo de permeabilidade é originada da Teoria
dos Grafos, aplicada aos estudos morfológicos em arquitetura105, como observou
Loureiro:
Esse tipo de representação, desde a década de 60, tem sido largamente aplicado em estudos
preliminares das solicitações funcionais a serem atendidas, a partir do programa funcional, onde
necessidade e suas inter-relações são inicialmente listadas(...). Apresenta a vantagem de facilitar
a manipulação de um número relativamente grande de restrições ao processo de geração de
formas, por permitir o uso de computadores nesta análise, partindo de uma matriz de relações
que contempla todas as necessidades (de natureza diversas) contidas no programa, permitindo
avaliar compatibilidades e incompatibilidade.106
Nessa rede de permeabilidade, os espaços convexos são representados por
círculos e a relação de permeabilidade entre dois ou mais espaços são representados por
uma linha. Um grafo pode ser construído a partir de qualquer espaço do sistema.
Quando um espaço é escolhido, o grafo é chamado “justificado”, em relação àquele
espaço. A figura 5 é exemplo de grafo justificado.
Segundo Hillier, a grande vantagem dos grafos é que eles tornam as
propriedades
sintáticas
básicas
de
simetria/assimetria,
distributividade/não-
distributividade muito óbvias e eles permitem também uma fácil mensuração dessas
propriedades sintáticas. Para ele, os grafos justificados “permitem uma forma de análise
que combina o deciframento visual de padrões com procedimentos de quantificação”107.
105
Ver STEADMAN, 1983; STEADMAN, 1976; MARCH, 1976, entre outros. Citados por LOUREIRO,
1999, pág. 183.
106
LOUREIRO, 1999, pág. 183.
107
No original: “allow a form of analysis that combines the visual decipherment of pattern with
procedures for quantification”. HILLIER e HANSON, 1984, pág. 149.
48
O estudo dos grafos justificados pode ser feito a partir de suas propriedades
configuracionais:
a) profundidade - é uma propriedade examinada de três pontos de vista:
i) a profundidade de um determinado espaço em relação a outro determinado
espaço do sistema, é dada pela mínima distância que pode ser percorrida entre os
dois. Essa distância, entretanto, não é métrica, mas sim topológica, ou seja, é
computada em termos do número de passos sintáticos (isto é, espaços
intervenientes) necessários minimamente para nos movermos de um ponto para
outro;
ii) a profundidade média de um determinado espaço em face do sistema inteiro é
dada pela média das profundidades deste espaço em relação a todos os outros,
computadas segundo procedimento descrito no item i) acima;
iii) profundidade média do sistema é dada pela média das profundidades médias
de todos os espaços do sistema, computadas segundo procedimento descrito no
item ii) acima.
Os valores de profundidade referidos nos itens ii) e iii) constituirão a base para a
medida fundamental da Sintaxe Espacial, ou seja, a integração, como veremos
posteriormente.
b) forma anelar ou árvore - outro aspecto importante dos grafos é sua forma, a
medida em que este é anelar ou em árvore. Uma estrutura é anelar quando possui rotas
alternativas formadas por espaços que se comunicam entre si. Um anel é formado
quando pode-se partir de um determinado espaço por uma direção e voltar-se a ele por
outra. Um sistema é em árvore quando não possui anéis. Isso significa que os espaços
desse sistema têm o acesso mais controlado, uma vez que há uma única rota possível
entre cada espaço e todos os outros do sistema.
A Figura 5 apresenta exemplos de sistemas com diferentes tamanhos
(quantidade de espaços convexos), mesma distância relativa ao exterior, e com
estruturas muito diferentes. O grafo 1 é tipicamente anelar e o grafo 2 é tipicamente em
árvore.
49
Grafo justificado1 – residência com 37 espaços
convexos
Grafo justificado2 – residência com 16
espaços convexos
Figura 5 – Grafos justificados. Cf.: FRANÇA, Franciney Carreiro. Análise sintática de espaços domésticos no
Distrito Federal. In: Cadernos Eletrônicos da Pós, página da Rede Mundial, Brasília, 1999, pág. 9.
c) os tipos de espaços pelos quais são formados - os grafos podem ser estudados
também pelos tipos de espaços que os compõem. Os tipos de espaços são classificados
em termos de suas relações de permeabilidade. São eles: i) tipo ‘a’ são espaços com
uma única ligação e podem ser chamados de ‘terminais’; ii) tipo ‘b’ são os espaços com,
pelo menos, duas ligações e que fazem parte de um sub-complexo ‘em árvore’, ou seja,
fazem a ligação ou o caminho para espaços terminais; iii) tipo ‘c’ são espaços que
fazem parte de um ‘anel’ simples; iv) tipo ‘d’ espaços que pertencem, pelo menos, a
dois anéis. A figura 6 ilustra estes vários tipos.
Figura 6 - Grafo ilustrando os tipos de espaços em função de suas conexões, cf. Hillier. 1996, pág. 318.
Hillier sugeriu que existe uma relação fundamental entre o tipo de espaços
convexos e o tipo genérico de comportamento humano em edifícios. Esse tipo genérico
é caracterizado por ocupação e movimento. Ocupação é mais conveniente para o espaço
50
tipo ‘a’, onde o acesso é altamente controlado. O espaço tipo ‘d’ oferece escolhas e,
portanto, está ligado a um crescente movimento.
A partir do princípio da relação de simetria e distributividade entre os espaços,
algumas medidas sintáticas foram geradas através do software New Wave108,
constituindo-se em variáveis de análise configuracional.
2.2.2. As variáveis analíticas
As variáveis analíticas a serem utilizadas neste trabalho, são medidas sintáticas
geradas a partir da decomposição das plantas baixas das casas em unidades de espaços
convexos, assim como o lote ou terreno, sendo que a área de lazer é considerado um
único espaço. Nessa decomposição, a distância topológica entre esses espaços é
considerada para gerar as medidas sintáticas. Nesse estudo, o exterior também é
considerado como uma unidade de espaço convexo, sendo o espaço fora do complexo
formado pela casa e o terreno, ou seja, a rua. As seguintes variáveis sintáticas serão
utilizadas na análise da amostra: integração, entropia, medida de distributividade e de
simetria, ordem de integração, grau de funcionalidade, grau de fechamento. Essas
variáveis serão definidas a seguir.
2.2.2.1. Integração
A integração é a principal medida da Sintaxe Espacial. Ela é obtida a partir da
profundidade dos espaços, como explicada anteriormente109. A integração de um
determinado espaço expressa matematicamente a distância sintática deste para todos os
demais espaços do sistema. Essa “distância”, entretanto, não é geométrica, mas
topológica, ou seja, é definida em termos da quantidade de espaços convexos que se
108
New Wave – software de geração das medidas de simetria dos sistemas, desenvolvidos na Bartlett
School, UCL, Londres.
109
Para a fórmula da integração, assim como para outros detalhes técnicos, ver PEPONIS, J. The spatial
culture of factories. Human Relations, 38, 1985, pp. 357-390
51
tem, minimamente, de percorrer para ir de uma dada posição a todas as outras. Quanto
maior o valor mais integrado ao sistema, como um todo, é o espaço em questão.
A integração média do sistema, por sua vez, “dá a medida em que o edifício,
como um todo, é mais ou menos acessível entre todas as suas partes”110. Consiste na
média das medidas de integração dos espaços convexos de cada sistema. Nesse trabalho,
o valor de integração dos sistemas foi calculado considerando o exterior como um
espaço convexo.
O cálculo da medida de integração resulta num atributo numérico para cada
unidade de espaço que varia aproximadamente em torno de 1,00 (para maiores detalhes
técnicos quanto a este cálculo, ver Anexo 4). Para se ter uma idéia preliminar, os valores
empíricos encontrados nessa amostra variaram de 0,603, o menor valor, a 1,247, o
maior valor de integração.
Algumas hipóteses são levantadas sobre a integração dos sistemas através de
estudos empíricos. Esses estudos têm sugerido que “um edifício bem integrado favorece
um sistema de interface intenso e informal, enquanto edifício mais segregado
corresponde a status mais fortes [diferenciados] e relações constituídas de maneira mais
hierarquizadas”111. Hillier mostrou que espaços tipo “a” e “d” contribuem para uma
maior integração do sistema como um todo, enquanto espaços tipo “b” e “c” contribuem
para uma maior segregação112.
Para melhor entender o quanto integrado é o conjunto aqui analisado, serão
utilizados outros estudos de caso como referência, entre estes, os trabalhos sobre
sobrados coloniais, feito por Trigueiro113, e sobre as casas modernistas em Recife, feito
por Amorim114. Para efeito de comparação com um universo mais amplo, foram
pesquisados outros estudos sobre casas feitos por Hanson em Londres e Paris. Entre
outras análises, ela estudou casas de arquitetos famosos do Movimento Moderno, como
de Loos (Casa Muller), Meier (Casa Giovannitti), Botta (casa em Pregassona) e Hejduk
(Casa Diamond), e casas de arquitetos em Londres. Essa comparação encontra-se no
Anexo 5.
110
HOLANDA, F. Sintaxe de uma casa-átrio moderna, Brasília, 1999, pág. 4. (mimeo). Para maiores
detalhes, ver também HANSON, 1998.
111
HOLANDA, F. 1999, pág. 5. (mimeo)
112
HILLIER, B. Space is the machine – a configurational theory of architecture. University Press,
Cambridge, Cambridge, 1996, pág. 319.
113
TRIGUEIRO, E.B.F. 1995, pág.12-13. (mimeo).
114
AMORIM, 1999, pág. 77.
52
2.2.2.2. Entropia
A medida de entropia ou “fator de diferenciação”115 é uma adaptação da medida
“H” de Shanon, desenvolvida para uma teoria matemática da comunicação116. Ela
quantifica o grau de variação entre os valores de integração dos edifícios, indicando a
diferenciação sintática entre suas diversas partes. Menor diferenciação sintática significa
sistemas mais homogêneos, enquanto maior diferenciação significa que existem, no
sistema, simultaneamente espaços muito integrados e espaços muito segregados.
Teoricamente, a medida pode variar entre 0 (sistemas maximamente
diferenciados) e 1 (sistemas absolutamente homogêneos). A hipótese sociológica que
corresponde a esta medida é: quanto mais diferenciado o sistema maiores as distâncias
entre o status das categorias de pessoas e/ou práticas envolvidas.
No universo empírico estudado até agora (ao qual tive acesso) estão, novamente,
os trabalhos de Trigueiro117, Amorim118 e Hanson119. Dentre esses a maior entropia foi
encontrada na amostra de Amorim, com 0,87 e a menor foi de 0,42 encontrada por
Hanson, as quais serão parâmetros para comparação com as casas da amostra em
estudo. Em relação à comparação com esses outros estudos, será feita um cálculo de
entropia para cada conjunto citado, esse cálculo não é comumente usado, esta aplicação
faz parte de um exercício exploratório deste estudo. O objetivo é, dessa forma,
identificar qual o conjunto de casas mais entrópico, ou menos diferenciado, até agora
encontrado.
115
Para o cálculo da Entropia é usada a RRA (Relativa Assimetria Real) máxima, média e mínima
encontradas em cada residência. O cálculo do fator de diferenciação é dado pela expressão: DF = (H ln2)/(Ln3 - ln2), Onde H = - [((a/t ln (a/t)) + (b/t ln (b/t)) + (c/t ln (c/t))], Sendo a, b e c os valores de
integração máxima, média e mínima do sistema e t a soma destes valores, para maiores detalhes, ver
HANSON, 1998, pág. 31.
116
SHANON, C. WEAVER, W. The mathematical theory of communication. University of Illinois Press,
Chicago, 1948.
117
TRIGUEIRO, 2001, pág. 40.1ss. e TRIGUEIRO, 1995, pág.12-13 (mimeo).
118
AMORIM, 1999, pág. 77.
119
HANSON, 1998, pág. 84, 227 e 267.
53
2.2.2.3. Medida de distributividade
A medida de distributividade de um sistema, assim como a de simetria adiante, é
obtida a partir da classificação dos espaços (a, b, c, d) antes comentada. Ela é a razão
entre a soma dos espaços ‘c’ e ‘d’ e a soma dos espaços ‘a’ e ‘b’ e é dada pela
expressão: (c + d)/(a + b), onde, a, b, c e d, correspondem ao número total dos tipos de
espaços daquele sistema, conforme definição anterior. Apoiada em Hillier120, Hanson
chamou os espaços tipo ‘a’ e ‘b’ de não-distributivos e os tipos ‘c’ e ‘d’ de distributivos.
Em termos das relações sociais, a hipótese é de que maior distributividade num
edifício significa que este “não constrói, como um todo, fortes barreiras entre as várias
pessoas e/ou práticas que usam os seus espaços”121. Sistemas mais distributivos criam
rotas alternativas que dão mais fluidez de movimento ao seus usuários e aumentam as
possibilidades de encontros e interação entre as pessoas.
Os sistemas pouco distributivos, ao contrário, possuem barreiras morfológicas
que dificultam o encontro entre as pessoas. Essas barreiras aumentam o controle entre
os espaços, dificultando uma maior interação. Isso resulta em práticas e utilização dos
espaços de maneira mais especializada e segregada.
Dentre os estudos sintáticos sobre espaço doméstico disponíveis na literatura
(aos quais tive acesso), apenas dois apresentam essa medida: os estudos de Hanson122 e
Holanda123. Os índices encontrados por Hanson estão entre os valores máximos e
mínimos encontrados na amostra em estudo, já o índice encontrado por Holanda supera
o maior índice do conjunto aqui estudado. Assim, a normalização124 entre 0 e 1, terá
como limite máximo a medida encontrada por Holanda, de 2,9, e como limite mínimo a
medida de 0,327, encontrada na casa 3 desta amostra.
120
HILLIER, 1996, pág. 318.
HOLANDA, 1999, pág. 9.
122
A maior medida de distributividade encontrada nos estudos das casas inglesas foi 1,2075 e a menor,
0,4943. Valores que se encontram na variação da amostra estudada. HANSON, 1998, pág 171).
123
Medida de distributividade de 2,9, a maior dentre os estudos pesquisados. HOLANDA, 1999, pág.18.
124
Para o cálculo de normalização será usada a fórmula: Vnorm = (V – Vmin)/(Vmáx – Vmin), onde
Vnorm é o valor gerado entre 0 e 1; V é o valor a ser normalizado; Vmin é o valor mínimo da faixa de
valores definida e o Vmáx é valor máximo da faixa de variação.
54
121
2.2.2.4. Medida de simetria
Outra medida, envolvendo a tipologia de espaços a, b, c e d, é a medida de
simetria. Ela é a razão entre a soma dos espaços tipo ‘a’ e ‘d’ e a soma dos espaços tipo
‘b’ e ‘c’. Essa razão é dada pela expressão: (a + d)/(b + c) , onde a, b, c e d são o total
dos tipos de espaços, conforme definido anteriormente.
A medida de simetria indica o “grau em que o edifício classifica, mais ou menos
fortemente, as pessoas e/ou práticas que organiza”125. O sistema é evidenciado quanto à
hierarquização dos seus espaços, isto é, quanto maior a medida de simetria menos
hierarquizado é o sistema.
Um sistema altamente hierarquizado possui grandes diferenciações de
importância dos seus espaços e das formas de suas utilizações. As configurações
morfológicas muito hierarquizadas acabam criando ou reforçando certos “códigos
comportamentais” nas residências. Esses códigos regem a utilização e estabelecem o
status dos espaços do sistema. Alguns lugares acabam sendo “inacessíveis” a certas
pessoas como, por exemplo, os quartos.
Para melhor visualização dos dados apresentados, essa medida será normalizada
entre os valores 0 e 1, sendo que quanto mais próximo de 1 significa que o sistema é
menos hierarquizado. Nos trabalhos de Hanson126 e Holanda127, os quais usaram essa
medida, os índices encontram-se entre o menor e o maior índice da amostra em estudo.
Portanto, os extremos considerados para a normalização serão 0,571 e 6,500,
respectivamente, as medidas de simetria mínima e máxima encontradas na amostra.
2.2.2.5. Ordem de integração
Outra maneira de caraterizar a organização espacial das residências é através da
ordem de integração dos principais espaços da casa. Baseada em Hanson, será
considerado os seguintes espaços como os “principais” da casa, para efeito deste estudo:
sala, cozinha, quarto principal e exterior. Esses espaços são chamados principais
125
HOLANDA, 1999, pág. 9.
A menor medida de simetria da amostra de Hanson é de 0,6059, e a maior é 4,6676. HANSON, 1998,
pág. 171.
127
Medida de simetria de 1,29. HOLANDA, 1999, pág.18.
55
126
porque: a) constituem os elementos mais importantes dos vários setores da casa - social,
serviço e íntimo; b) revelam, no caso do exterior, a relação que se estabelece entre o
setor privado (espaço doméstico) e o público (a rua).
A partir da ordem de integração das casas pode-se identificar em que lugares a
organização espacial da casa investe mais fortemente. Esta variável permite também
identificar a relação entre público e privado no conjunto estudado, identificando se a
estrutura espacial das residências investe forte ou fracamente na relação com a rua.
2.2.2.6. Grau de funcionalidade
O grau de funcionalidade permite verificar se os sistemas apresentam uma
orientação mais transicional ou mais funcional de seus espaços. O grau de
funcionalidade é a proporção entre o número de espaços de uso e o total de espaços
convexos. É expresso pela fórmula GF = f/c, onde f é o número de espaços de
atividades ou funcionais e 'c' é o numero total de espaços convexos. Para efeito de
comparação, serão usados os índices obtidos por Amorim, no estudo das casas
modernistas em Recife.
Baixos índices de funcionalidade indicam uma planta de orientação transicional
e altos valores indicam um layout de orientação funcional128. Um sistema com
orientação mais transicional implica, em outras palavras, na proliferação de espaços
mediadores entre lugares onde, de fato, as coisas acontecem. Isso pode ser interpretado
como uma estratégia para fortalecer a identidade das categorias de usuários (habitantes,
empregados e visitantes) pelo aumento da distância sintática entre elas.
2.2.2.7. Grau de fechamento
O grau de fechamento129 permite analisar as casas sob um outro aspecto, ou seja,
se os layouts são mais abertos ou compartimentados, se a fluidez entre espaços é maior
ou menor. Um sistema é mais compartimentado na medida em que existe um maior
128
AMORIM, 1999, pág. 68.
Amorim denomina essa variável de “grau de abertura”. Essa variável será denominada aqui de “grau
de Fechamento”, embora utilizando a mesma fórmula para cálculo, porque esse revela a proporção dos
espaços fechados em relação ao total de espaços convexos.
56
129
número de espaços definidos e separados entre si por paredes e portas.
Sociologicamente, esta medida também sugere o grau de separação de pessoas e
práticas no sistema: quanto maior o fechamento, mais forte é essa separação.
Para o cálculo do grau de fechamento, considera-se o número de espaços
fechados e o número total de espaços convexos do sistema. Esse índice é dado pela
expressão Gfe= fe/c, onde fe é o número de espaços fechados e 'c' é o número total de
espaços convexos. O índice de Gfe alto implica em sistemas mais compartimentados e
Gfe baixo implica em sistemas mais convexamente articulados130. Para efeito de
comparação serão usados os índices encontrados por Amorim nas casas modernistas do
Recife.
Conclusão
As informações fornecidas pelos questionários e entrevistas, juntamente com a
análise sintática das residências permitirão uma leitura do modo de vida nas casas da
amostra. As variáveis sintáticas permitirão entender os sistemas, tanto global como
localmente e, a partir do dados levantados, será possível confrontar a estrutura espacial
com as informações de uso e ocupação dos espaços. Os dois níveis de análise, propostos
neste capítulo, serão executados em dois momentos, no capítulos 3 e 4, respectivamente,
e analisados conjuntamente no capítulo 5.
Esse estudo permitirá também testar a teoria da Sintaxe Espacial para análise de
residências, abrindo a possibilidade de aprofundar o uso dessa teoria. A sua aplicação
permitirá analisar possíveis redundâncias e inconsistências, contribuindo assim para
aprimorar essa técnica de análise morfológica na arquitetura.
130
AMORIM, 1999, pág.68.
57
Capítulo 3 - Ocupação e utilização dos espaços
A casa não é apenas reflexo de como indivíduos e famílias
escolhem viver cotidianamente,
mas da constituição social como um todo.
Julienne Hanson
Neste capítulo, as casas serão analisadas a partir dos dados fornecidos pelos
entrevistados com o objetivo de identificar a maneira como vivem as famílias nesse
edifício, seus costumes, seu dia-a-dia. Esses dados serão confrontados com outros
obtidos através de um resgate histórico da utilização e ocupação dos principais cômodos
das residências, identificando as mudanças de uso ocorridas ao longo da história da casa
brasileira.
Isso será feito através de informações quanto à utilização e a função de cada
cômodo e as preferências dos habitantes. Mais especificamente, a partir da análise dos
seguintes elementos: a) espaços mais utilizados pela família; b) espaços menos
utilizados por ela; c) espaços mais utilizados para receber visitantes; d) espaços aos
quais o visitante geralmente não têm acesso; e) espaços utilizados pelos empregados.
Esses eixos dão um perfil da ocupação e utilização dos espaços: quando, para quê, e por
quem são ocupados.
3.1. Espaços de maior tempo de permanência da família
Mesmo desconsiderando o tempo de repouso, o quarto é o espaço de maior
tempo de permanência da família. Segundo os dados, este aparece como o primeiro
espaço mais citado, com 29,63% das indicações. Seguido pela cozinha como segundo
espaço de maior tempo de permanência, com 18,52%.
O quarto e a cozinha aparecem como sendo, respectivamente, os espaços de
individualidade e coletividade eleitos pela família. Em um dos depoimentos o
58
entrevistado expressa bem essa constatação. Quando perguntado sobre o espaço que
mais gosta na casa, ele respondeu: “Do meu quarto e da cozinha. No primeiro tenho
privacidade... e na cozinha temos integração”.
A Tabela 1 mostra os espaços mais utilizados pelas famílias da amostra
pesquisada. É possível observar que o itens “quartos” e “cozinha” apresentam os
maiores índices. À exceção da sala de TV e da sala de estar, todos os demais itens
receberam poucas citações.
Tabela 1- Espaço de MAIOR tempo de permanência da família131
Cômodos
Quartos
Cozinha
Sala de estar
Sala de TV
Escritório/biblioteca
Copa
Sala de estar/TV
Sala de jantar
Varanda
Mezanino
Quintal
Sala de estar/Jantar
Total
% de respostas
Primeiro
Nº
8
5
4
4
2
1
1
1
1
27
100
Segundo
%
Nº
29,63
5
18,52
12
14,81
1
14,81
5
7,41
2
3,70
3,70
3,70
1
3,70
1
100
27
100
Terceiro
%
Nº
18,52
10
44,44
1
3,70
1
18,52
4
7,41
3,70
3,70
100
5
3
1
1
1
27
100
%
37,04
3,70
3,70
14,81
18,52
11,11
3,70
3,70
3,70
100
3.1.1. A cozinha
A cozinha, sua localização e status, passou por várias mudanças ao longo da
história da casa brasileira, recebendo influência das transformações sociais durante o
ciclo canavieiro, passando pelo ciclo do café, até as novas perspectivas em nossos dias.
Apesar de não ter como objetivo descreve esse processo em detalhes, é importante
observar que a cozinha já foi cômodo separado da casa, considerado lugar ‘sujo’ até ser
lugar ‘asseptizado’ e adquirir um caráter estritamente funcional, como veremos a seguir.
131
As Tabelas 1, 2, 3 e 4, com dados de uso/ocupação, apresentam, além dos dados em relação ao
“PRIMEIRO” espaço mais citado, as colunas com dados dos segundo e terceiro espaços. Foram usados
para esta análise somente os dados da primeira coluna, mas, a título de informação foram expostos os
dados referentes às demais citações.
59
Até início do século XIX, segundo Lemos, a cozinha era espaço separado da
casa, o que ele denominou da “extroversão da cozinha”. Para Lemos, esta era a primeira
constante arquitetônica nos partidos da habitação brasileira a “Cozinha separada, no
quintal. Cozinha no alpendre. (...) Sempre a cozinha menosprezada, lugar dos negros”132.
Essa separação entre a cozinha e os demais cômodos tinha, portanto, uma conotação
social muito forte pois “na casa do branco, ou do pardo metido a branco, a cozinha está
sempre isolada da habitação, sendo o traço de união entre ambos o elemento servil”133.
Durante todo o século XIX e meados de século XX, vários acontecimentos
fizeram com que a cozinha viesse definitivamente para dentro da casa. Ela deixou de ser
um “puxado” nos fundos ou um anexo da casa para ser um cômodo que compõe o corpo
da residência. Entre esses acontecimentos são muito significativos: a) abolição da
escravatura; b) a revolução industrial; c) as Primeira e Segunda Guerras Mundiais.
A abolição da escravatura provocou uma diminuição da mão-de-obra escrava
para os serviços na cozinha. Isso fez com que crescesse a utilização de mão-de-obra
branca e, com o tempo, até as próprias donas das casas passaram a trabalhar na cozinha.
Ela deixou de ser, portanto, associada aos negros e ao trabalho escravo. A distinção
social que se refletia na distância física dos lugares começa a enfraquecer e a cozinha
aglutina-se à casa.
Com a revolução industrial, e a conseqüente evolução de alguns utensílios
domésticos, mudou-se o jeito de trabalhar na cozinha. Um bom exemplo dessa
mudança, é o grande fogão a lenha que começa a perder a importância diante dos fogões
a gás. A significativa diferença de tamanho, por exemplo, entre esses dois utensílios
domésticos contribuíram para a diminuição do tamanho das cozinhas em relação às
cozinhas das casas de engenho.
Segundo Tramontano, o que vai alterar as atribuições da cozinha, no entanto, é a
mudança do status da mulher rica dentro da sociedade. Isso gerou mudanças também
dentro de casa, já a partir da década que precede a Guerra de 1914. Para ele, a mulher
foi “empurrada à força para o papel de ‘Rainha do lar’ pela crescente falta de pessoal
doméstico qualificado - em número cada vez menor mesmo nas residência das família
mais abastadas”134.
132
LEMOS, 1978, pág. 67.
LEMOS, 1978, pág. 67.
134
TRAMONTANO, 1998, pág. 81.
133
60
Já no primeiro pós guerra, a crescente utilização da mão-de-obra feminina em
indústrias e trabalhos fora de casa, associados aos novos avanços tecnológicos,
contribuíram para mais uma mudança na cozinha brasileira. Isso exigiu a concepção de
um lugar com pouco espaço para a desordem e mais equipamentos para agilizar as
tarefas domésticas. Para Tramontano, “uma cozinha prática e funcional era a exigência
dos novos tempos, otimizar os gestos e os passos necessários às atividades de cozinhar
(...), devido à escassez de pessoal doméstico e ao desenvolvimento de novos
equipamentos”135.
Com essa preocupação, surgiu o conceito do existenzminimum, conforme
definido no capítulo 1, proposto pelo movimento moderno arquitetônico, na primeira
metade do século XX. Nessa proposta, esse espaço era pensado unicamente com a
função de preparo dos alimentos e não era prevista área para refeições, ou deveria ser
apenas para refeições rápidas, ou seja, espaços pequenos e de pouca permanência.
Figura 7 - Schüte-Lihotzky, Frankfurter Küche, 1926 - FRAMPTON,1997 pág. 166.
Essas transformações paulatinas fizeram surgir desde a cozinha das casas
coloniais, com dimensões menores do que as das casas de engenho, até a cozinha de
dimensões mínimas da proposta modernista. No conjunto estudado, cerca de 33% dos
entrevistados forneceram as medidas das cozinha, o tamanho dessas, em média, é de
18,5 m2, tendo cozinha com até 36m2. Isto é, são mais próximo das cozinhas das casas
coloniais, típicas no Centro-Oeste, do que da cozinha de dimensões mínimas. De fato,
isso é interessante, porque constitui uma volta a padrões pré-modernistas, ou
simplesmente a não-aceitação dessa proposta.
135
TRAMONTANO, 1998, pág. 79.
61
No conjunto analisado, além dessa característica física, a mais importante
constatação em relação à cozinha é o fato dela ser eleita como o espaço de convívio da
família. Ela é o lugar das conversas informais, das refeições em conjunto, de momentos
de lazer. Essa característica difere, e muito, do que antes era pensado da cozinha da
classe média no século XIX. Isso contraria frontalmente a afirmação de Lemos de que
“na casa proletária, tolera-se a superposição estar-serviço, ou melhor, nela a família
pode usufruir de momentos de lazer dentro da cozinha, o que jamais ocorrerá numa casa
de classe média.”136.
A preferência pela cozinha como espaço de convívio muda também sua função,
em relação às concepções das últimas décadas. Além de espaço para preparo das
refeições, passou também a ter a função de espaço coletivo da família. Ela incorporou,
então, a função de um outro espaço, surgido em meados do século XX, o espaço da
copa. A copa - que já teve o nome de office, devido à influência francesa no início do
século, foi concebida para ser um espaço de convivência, especialmente através das
refeições em família.
Segundo Tramontanto, “o office vai tomar o nome de copa, recebendo os
mesmos azulejos da cozinha e os móveis da sala de jantar [e tinha a] função de espaço
de sociabilidade - transição entre a instância ‘de rejeição’ e a ‘de prestígio’”137,
referindo-se à cozinha e à sala de jantar, respectivamente. A copa já foi, segundo
Lemos, “o local de estar preferido da família de classe média.(...) Na copa, as crianças
faziam as lições, o dono da casa lia jornais enquanto a ‘patroa’ lavava o trem da
cozinha”138.
Esse espaço, anexo à cozinha para servir as refeições, está agora perdendo lugar
para a cozinha. As cozinhas aumentaram de tamanho, como já mencionado, e passaram
a ter a função da copa, fazendo com que essa praticamente desaparecesse. É
significativo que das 27 casas estudadas, apenas 7 (25,9%) tenham especificamente
copas. As demais têm as chamadas copa-cozinhas, ou seja, cozinha com espaço para
mesa, às vezes com espaço demarcado por um balcão.
Outra importante característica das cozinhas da amostra é a presença de vários
equipamentos. Além dos eletro-eletrônicos mais comuns das últimas décadas, como
microondas, lava-louça, geladeira, outro equipamento muito presente é a televisão. A
136
LEMOS, 1989, pág. 11.
TRAMONTANO. 1998, pág. 108.
138
LEMOS, 1978, pág. 150.
137
62
cozinha aparece como o terceiro espaço que apresenta maior ocorrência de televisores
nas casas, superando inclusive os índices da sala de estar. Fica atrás somente do quarto e
da sala de TV, respectivamente, o primeiro e o segundo espaço com maior ocorrência
desse aparelho.
Na década de 1930, a copa “ganhou mais um habitante, o rádio (...) o que falava
alto dentro de artísticas caixas de madeira”139. O rádio, a grande novidade que invadia os
lares na época, é hoje substituído pela televisão. A TV é o eletro-doméstico mais
utilizado nas casas, que têm, em média, 4,15 aparelhos por residência140. Diferente do
rádio que é só ouvido, a TV precisa ser assistida, o que exige permanência no espaço.
Sua presença na cozinha é um dos fatores que ilustram o fato desse espaço ser de
permanência da família, o que novamente, contesta a visão de Lemos para as casas de
classe média, quando observa que “é na casa modesta que a televisão e o fogão
coabitam o mesmo compartimento”141.
3.1.2. Os quartos
O quarto é talvez o espaço que mais tenha sofrido alterações nas últimas
décadas. Sofreu alterações em termos de tamanho, função, conforto, sendo considerado
inclusive como símbolo de status social. Mais do que isso, o quarto pode ser um dos
principais símbolos das mudanças no modo de vida das pessoas, como reflexo das
alterações ocorridas nos últimos tempos, com o advento da modernidade.
Segundo Lemos, no final do século XIX, “as famílias receberam os benefícios
da água potável distribuída por redes públicas, do gás, do combustível para luminárias e
fogões e da energia elétrica”142. Com esse benefício o banheiro passou a ser uma das
novidades incorporadas nas casas brasileiras.
Sinônimo de conforto e motivo de ostentação, esses espaços com latrina,
banheira, ou chuveiro, e pia passaram a ser incorporados ao interior. Os banheiros,
139
LEMOS, 1978, pág. 150..
Para se ter uma idéia do que representa esse índice de televisores, a média de pessoas por residência
(da amostra) é de 4,74, ou seja, é quase uma TV (0.87) por habitante.
141
LEMOS, 1978, pág. 201.
142
LEMOS, 1978, Pág. 56.
63
140
assim como as cozinhas, deixaram de ser associados ao “sujo” para serem vistos, além
das questões sanitárias, como símbolos de status e sinal de prosperidade dos habitantes.
Primeiramente, o banheiro vincula-se à casa pelos fundos, junto à cozinha.
Depois, já na década de 1960, passou a ser localizado próximos aos quartos e também
próximo à sala de estar, dando origem aos chamados “banheiros sociais”. Para
Veríssimo e Bittar, “a localização do banheiro em relação ao organograma básico da
habitação é típica nas novas construções: apenas um na zona íntima próxima à
circulação, junto aos quartos”143.
Segundo, Bittar e Veríssimo, surge, nos anos 1970, a “febre” das suítes,
compostas do quarto conjugado a banheiro privativo e com espaço destinado a trocar
roupa e, excepcionalmente, uma pequena saleta. Segundo eles, “as casas abastadas,
projetadas
por
arquitetos
e
publicadas
nas
revistas
especializadas,
adotam
imediatamente essa solução, acoplando um banheiro ao quarto do casal, conferindo-lhes
a privacidade”144.
Figura 8 – Planta baixa da casa 4
O banheiro privativo de um quarto se transformou em um dos diferenciais das
casas nesse período. Isso aconteceu em dois níveis, primeiro, porque nem todas as casas
tinham suíte, dando aos donos dessas casas um status social diferente; segundo, nem
todos da casa tinham suíte. Ela era privilégio dos donos, geralmente pai e mãe,
estabelecendo assim uma diferenciação social em relação aos demais habitantes.
Tornou-se comum nas casas de classe média ter uma suíte para os donos da casas e ter
um banheiro social para os demais moradores.
143
144
VERÍSSIMO e BITTAR, 1999, pág. 104.
VERÍSSIMO e BITTAR, 1999, pág. 94.
64
Esse quadro mudou nas décadas de 1980 e 1990, quando as suítes deixaram de
ser privilégio do casal e passaram a integrar os demais quartos da casa. Do universo
estudado, 22 casas foram construídas nas décadas de 1980 e 1990, sendo que 12 dessas,
mais de 50% da amostra, apresentam mais de uma suíte na casa. Algumas têm suítes
para todos os habitantes (ver casa 22 e 27). O gráfico 1 ilustra o crescimento do número
de suítes por década.
G r á fi c o 1 - N ú m e r o d e c a s a s c o m s u íte s p o r d é c a d a
5
Nº de casas
4
3
1 s u íte
2 s u íte s
2
3 s u íte s
q u a tr o
1
0
D é ca d a d e
1970
D é ca d a d e
1980
D é ca d a d e
1990
O crescimento do número de suítes nas últimas décadas contribuiu para
acrescentar aos quartos características de espaços mais confortáveis e mais privativos.
Nesse complexo chamado quarto, outras funções foram agregadas. Lemos já sinalizava
para a invasão da televisão no setor íntimo das casas, quando ela se popularizou na
década de 50. Ele dizia que “a televisão também foi invadindo as zonas de repouso,
instalando-se nos dormitórios, aos pés da cama”145.
De fato a TV invadiu os quartos, mas, em fins de década de 90, não foi só ela. O
elevado número de equipamentos encontrados nesses espaços, com TVs, aparelhos de
som, computadores e aparelhos de ginástica, confirmam essa tendência. O quarto é
citado como um dos espaço com maior ocorrência de televisores, 24,10% dos casos, e
de aparelhos de som, 22,54% da amostra. Esses índices superam, respectivamente, a
presença desses equipamentos nas salas de TV e nas salas de estar.
O quarto é ainda o segundo lugar citado com maior ocorrência de computadores
e o terceiro em equipamentos de ginástica. No gráfico 2, é possível ver a grande
145
LEMOS, 1989, pág. 73.
65
inserção desses equipamentos no espaço doméstico, e seu alto índice de inserção,
especificamente, nos quartos. Nele pode-se visualizar que o quarto está entre os espaços
com os maiores índices de ocorrência desses equipamentos na casa. Eles aparecem
como os espaços mais usados para comportar todos esses equipamentos.
A presença de tantos equipamentos revela que o quarto passa a ser um espaço de
múltiplas atividades. É lugar para descanso, sala de estudo, local de trabalho, diversão e
lazer. Essa sobreposição de atividades era esperada no final da década de 1990.
Veríssimo e Bittar já afirmavam que “para várias camadas da população, o quarto é sala
de visitas, escritório, sala de estudos, local de trabalho e, ocasionalmente, lugar de
descanso e do amor”146. Curiosamente, essa multifuncionalidade lembra a idade média
onde existia esse tipo de ocupação.
Gráfico 2 - Localização dos equipamentos
25
Ocorrência
20
15
10
5
0
Lazer
Co pa
Co zinha
Qt o emp .
Es c./ B ib lio .
M ezanino
Quart o s
Sala d e
es t ar
Sala d e
jant ar
Sala d e TV
Sala í nt ima
Varand a
Tipo de espaço funcional
Aparelhos de som
Computadores
Equip. de ginástica
TV
A diferença é que, na Idade Média, as pessoas dormiam no mesmo lugar que
comiam. Para Rybczynski, “a vida era uma questão pública, e assim como as pessoas
não tinham uma forte consciência de si, elas também não tinham um quarto próprio”147,
o que permitia uma concepção diferente para a utilização dos cômodos das casas.
O que se tem hoje é que as pessoas comem no mesmo lugar que dormem, ou
seja, ocorreu uma inversão: não é a sala que serve de dormitório, mas é o dormitório
que serve de sala, entre outras coisas. Essa multifuncionalidade dos quartos só reforça a
noção de privacidade tão característica do espaço doméstico contemporâneo.
146
VERÍSSIMO e BITTAR, 1999, pág. 95.
66
Pressupunha-se que a multifuncionalidade dos cômodos com a sobreposição de
atividades, dar-se-ia por questões de espaço físico. Em outras palavras, apenas a falta de
recurso iria justificar o uso de cômodos para várias atividades como, por exemplo, lazer
e descanso. Essa era a perspectiva de Lemos quando escreveu que
a moradia do homem rico de haveres e de poder não apresenta em seus cômodos a hipótese de
superposição de funções ou de atividades da habitação. Ali sempre houve uma dependência para
cada mister. A casa do rico sempre foi muito grande e a do pobre muito pequena, de reduzido
número de cômodos, muitas vezes resumida a uma só dependência148.
Talvez a observação se justificasse para determinada época, pois na amostra
estudada, que é um universo de casas de classe média, onde os edifícios são espaçosos
(em média com 350 m2) nesses, os quartos são, na maioria, esses complexos
multifuncionais. Possuem banheiro privativo, televisores, som, computadores e
aparelhos de ginástica, oferecendo motivos e atrativos suficientes para justificar a sua
indicação como espaço de maior tempo de permanência da família. Se isto antes
resultava de restrições impostas por pequena área construída, transformou-se numa
opção que constitui o modo de vida dos habitantes dessas residências.
3.2.
Os espaços de menor tempo de permanência da família
e os mais usados para receber visitantes
De maneira geral, os espaços menos utilizados pelas famílias estudadas são a
sala de estar, a varanda, a sala de jantar e o escritório. A sala de estar é disparado o
espaço de menor tempo de permanência da família, indicado como o primeiro espaço
menos utilizado, com 26,92% de respostas, seguido pela varanda com 19,23% das
indicações, e a sala de jantar com 15,38% (Tabela 2). Por outro lado, todos esses
espaços são os mais utilizados para receber visitantes. A sala de estar é indicada com
59,26% das respostas, seguida pela varanda, com 14,81%, e pela sala de jantar, com
11,11% (Tabela 3).
147
148
RYBCZYNSKI, 1999, pág. 48.
LEMOS, 1989, pág. 70.
67
Essa inversão indica claramente a separação dos espaços das casas em espaços
mais destinados à família, e espaços mais destinados aos visitantes. Existem, no entanto,
alguns espaços que, tanto estão entre os eleitos como de permanência da família, como
entre os espaços escolhidos para receber visitantes. Estes são os espaços de transição
dentro desse sistema de relações humanas, como será visto mais adiante.
Tabela 2- Espaço de menor tempo de permanência da família
Cômodos
Sala de estar
Varanda
Sala de jantar
Escritório/biblioteca
Cozinha
Sala de TV
Mezanino
Sala de estar/jantar
Sala íntima
Garagem
Quartos
Subsolo
Área de lazer
Copa
Total
% de respostas
Primeiro
No
7
5
4
3
2
2
1
1
1
26
96,30
Segundo
%
No
26,92
2
19,23
9
15,38
4
11,54
3
7,69
3
7,69
2
3,85
1
3,85
3,85
0,00
0,00
1
0,00
0,00
0,00
100
25
92,59
%
8,00
36,00
16,00
12,00
12,00
8,00
4,00
0,00
0,00
0,00
4,00
0,00
0,00
0,00
100
Terceiro
No
%
6
2
3
4
3
1
1
1
3
1
25
92,59
24,00
8,00
12,00
16,00
12,00
4,00
4,00
0,00
0,00
4,00
12,00
4,00
0,00
0,00
100
Tabela 3- Espaços mais usados para receber visitantes
Cômodos
Sala de estar
Varanda
Sala de jantar
Área de lazer
Cozinha
Sala de TV
Copa
Escritório/biblioteca
Mezanino
Quartos
Total
% de respostas
Primeiro
Nº
16
4
3
2
1
1
0
0
0
0
27
100,00
%
59,26
14,81
11,11
7,41
3,70
3,70
0,00
0,00
0,00
0,00
100
Segundo
Nº
6
5
8
1
5
1
0
1
0
0
27
100,00
%
22,22
18,52
29,63
3,70
18,52
3,70
0,00
3,70
0,00
0,00
100
Terceiro
Nº
%
2
0
2
5
4
6
1
1
1
3
25
92,59
8,00
0,00
8,00
20,00
16,00
24,00
4,00
4,00
4,00
12,00
100
68
3.2.1. Sala de estar
Ao longo da história da casa brasileira, a sala sempre esteve presente exercendo
a sua função principal: a de receber. Ao longo dos séculos, contudo, ela sofreu algumas
transformações, passando da atribuição exclusiva de receber as pessoas, na casa grande,
a um uso que incluía a permanência da família, em nossos dias. Como observaram
Veríssimo e Bittar,
do conjunto de salas de receber da casa-grande patriarcal, observamos a pequena sala social da
morada urbana colonial, ou mesmo o grande salão do sobrado nobre setecentista, com seu
mobiliário mais faustoso, tetos estucados, além de alfaias importadas. (...) Prenuncia-se aí a
implantação deste setor social que irá marcar o século XIX.149
Durante todo o século XIX, a sala era o principal espaço do setor social, sendo
chamada de sala de visitas e, até meados do século XX, esse era o espaço destinado a
receber visitantes. Segundo Lemos, era espaço sempre fechado, “aguardando os
raríssimos comparecimentos previamente combinados, geralmente nos aniversários de
gente da casa, onde não havia a hipótese de qualquer tipo de superposição de
atividades”150. Gomes chamou atenção de que Vauthier já havia comentado a
hospitalidade de que havia sido testemunha “ilustrando a privacidade da parte íntima e
de serviços da casa quando explica que o salão de visitas se comunica diretamente com
a escada externa”151.
No século XX, para alguns autores, começaram a desaparecer as várias salas
para receber, como eram na casa-grande patriarcal. Segundo Veríssicmo e Bittar, na
segunda metade do séc. XX “com a influência americana e a racionalização do espaço,
surge a sala única, mantendo parte do ‘ritual ancestral de receber’”152. Mas essa parece
ser parte da proposta modernista, já na primeira metade do século. Nas casas
modernistas estudadas por Amorim, a maioria possuem somente uma sala de estar,
geralmente aberta para sala de jantar. A sala passou assim a ser, simultaneamente, de
estar para a família, e o lugar para receber os visitantes.
149
VERÍSSIMO e BITTAR, 1999, pág. 61.
LEMOS, 1989, pág 70.
151
VAUTHIER, 1975, pág.81, citado por GOMES, 1998, pág. 92.
152
VERÍSSIMO e BITTAR, 1999, pág.58.
150
69
Para Lemos, na década de 50, com a popularização da televisão, a sala de visitas
desapareceu como unidade da habitação, “a televisão uniu a sala de jantar à sala de estar
e, nisso, outra modernidade na arquitetura domiciliar. Foi o fim definitivo da sala de
visitas”153. De fato, como já foi mencionado, da década de 50 para cá a televisão invadiu
a casa brasileira. Se, num primeiro momento, ela acabou com a sala de visitas, em
seguida fez surgir outro cômodo na estrutura doméstica, ou seja, a sala de TV. A TV
entrou pela sala de estar mas, com o tempo, exigiu uma sala própria, e acabou chegando
nos quartos e até na cozinha.
Os dados levantados neste trabalho indicam uma redução drástica da presença da
TV no espaço destinado à sala de estar. Essa aparece como o quinto espaço com maior
índice de ocorrência de televisores, perdendo para a cozinha, que é o terceiro, e até para
a dependência de empregada, que é o quarto lugar com maior índice. Apenas 9 casas,
cerca de 30%, possuem TV's na sala de estar. Destas casas, apenas uma tem sala de TV.
Isso indica uma tendência de que os televisores somente ocupam a sala de estar, na falta
de um espaço próprio.
Essa crescente saída da TV, e o aumento do número de aparelhos de som na sala
de estar, conforme gráfico 2, dão a esse espaço outra característica. A sala de estar não é
o espaço coletivo da família. Alguns dos entrevistados deixaram isso bastante claro,
afirmando que a sala de estar é reservada para receber visitantes porque “foi decorada
com este intuito, possui espaços para acomodar os visitantes”. Segundo outro
entrevistado, a sala de estar é o espaço destinado para receber visitantes porque é “o
ambiente mais apropriado, pois é mais arrumado, menos bagunçado”. Outro ainda
afirmou que existe “um piano, o qual atrai os visitantes”.
A sala passa a ser um espaço mais requintado, lugar para ouvir música, para
manter conversas, para receber pessoas externas. Ela funciona assim como um filtro,
permitindo a recepção de visitantes que não são tão íntimos da família. Os mais íntimos
vão para sala de TV, ou mesmo chegam à cozinha, que é o espaço informal da casa.
Apenas as pessoas muito íntimas tem acesso aos quartos.
Os dados indicam claramente a sala de estar como um espaço formal. Essa
característica formal remete esse espaço ao status dado à chamada sala de visitas do séc.
XIX, ou seja, um lugar reservado, preparado apenas para receber visitantes, indicando
que a proposta de sala única (lugar para receber e também de convívio da família) de
153
LEMOS, 1989, pág 72.
70
fato não se consolidou. O que se tem hoje, é a permanência dessas salas, sob um outro
rótulo. A sala de estar, na maioria das casas, é de “estar” mesmo só na presença de
visitantes, que não têm acesso a outros cômodos da casa.
3.2.2. Sala de jantar
A sala de jantar é, para alguns autores, a evolução da varanda do século XIX.
Segundo Tramontano, esse é um espaço com dimensões bem maiores do que os demais
espaços representativos das casas, e “parece resultar de um compromisso entre a antiga
varanda e suas ascendentes européias”154. Já para Lemos, esse espaço é a transformação
da varanda porque “a família, onde come, permanece”. Segundo ele, foi assim que
“surgiu mais uma zona de estar na casa (...) enquanto a velha varanda foi
desaparecendo, inclusive o uso da palavra, firmando-se a expressão ‘sala de jantar’”155.
Se Lemos está certo quando diz que “onde a família come, permanece”, então é
possível entender porque a sala de jantar é hoje um espaço pouco utilizado por ela.
Primeiro, esse espaço perdeu o status de lugar de refeições da família para a copa;
depois a copa perdeu lugar para a cozinha, como visto anteriormente. Com isso, a
família distanciou-se da sala de jantar em prol do uso da cozinha.
A sala de jantar aparece, na amostra estudada, entre os espaços pouco utilizados
pelos moradores. É um espaço bastante reservado. Até mesmo quando ela é utilizada
para trabalho e estudo, o que acontece em algumas casas que não possuem escritório,
esta apenas aparece como o terceiro espaço mais utilizado. O mesmo acontece nas
demais residências, onde a sala de jantar é muito pouco utilizada para as refeições em
família. Ver Tabela 3.
Contudo, a sala de jantar não desapareceu do programa de necessidades da casa
da classe média. Na lista dos espaços mais utilizados para receber visitantes, ela aparece
como o terceiro mais utilizado, como vimos, com 11,11% das respostas. É o espaço
destinado a recepções que exigem formalidades. Em entrevista, alguns dizem não
freqüentar mais a sala de estar e de jantar porque “os móveis que os compõe são
antigos, ‘pesados’, que impõe um certo ar de respeito...”.
154
155
TRAMONTANO, 1998, pág. 107.
LEMOS, 1978, pág. 150.
71
É interessante notar, a propósito, que a sala de jantar atual resgata a tipologia da
casa de engenho. Gomes, ao estudar os vários tipos de casas de engenho em
Pernambuco, ressalta que em algumas casas “a sala de jantar não é separada do salão ou
parlatório e esta peça é a única franqueada aos estranhos”156. Essa especialização da sala
de jantar reforça ainda mais a distinção entre espaços da família e de visitantes.
3.2.3. Sala de TV
Conforme vimos anteriormente, quando a TV apareceu na década de 50, ela
ocupou a sala de estar. Com a sua popularização ela saiu da sala de estar e passou a ter
um espaço próprio, a sala de TV. Lemos ressalta essa mudança afirmando que “em
todos os programas, surge o novo elemento, a sala de televisão, uma nova sala de
especialização total”157.
Com o aumento do número de aparelhos de televisão nos quartos - espaço com
maior ocorrência - a sala de TV passa a ser o segundo espaço com maior ocorrência.
Embora continue sendo o espaço coletivo para assistir televisão, a crescente perda de
função específica faz com que ela agregue diferentes atividades. Deixa de ser espaço
com ‘especialização total’, como era no final da década de 50, para ser espaço com
múltiplas funções.
Na sala de TV é possível encontrar também outros equipamentos que
caracterizam essas novas atividades, como os aparelhos de som e de ginástica. Ela
aparece como o quarto espaço mais citado com aparelhos de som e como o terceiro,
juntamente com a varanda, com equipamentos de ginástica (ver Tabela 5). Pela Tabela
6, pode-se constatar que essa sala aparece como o espaço mais citado para as atividades
como ver TV, ler, ouvir música, fazer ginástica. Além disso, ela aparece como o quarto
espaço mais citado para necessidades privadas como, por exemplo, dormir ou repousar.
É o quinto espaço para lazer interativo, isto é, encontrar amigos, beber, namorar.
Algumas vezes, no entanto, é a sala íntima que exerce a função da sala de TV.
Geralmente junto aos quartos, essa sala abriga um aparelho de TV utilizado de uma
forma mais privativa pelos membros da família. Dentre as muitas atividades
156
157
GOMES, 1998, pág. 92.
LEMOS, 1989, pág 72.
72
encontradas na sala de TV, uma chama a atenção: esse espaço, juntamente com a
chamada sala íntima, faz o papel de quarto de hóspede. Esse espaço é utilizado,
portanto, também para acomodar pessoas, em substituição aos antigos quartos de
hóspedes.
O quarto de hóspedes estava presente no programa de necessidades das
residências até fins do século XIX, bem ao lado do vestíbulo. Geralmente esse quarto
estava em posição simétrica à do escritório e, como observou Tramontano, “este
cômodo mantém com o restante da casa uma relação muito parecida com a que
mantinham as alcovas de visitantes do passado”158. Gomes ressaltou que, nas casas
grandes, os quartos de hóspedes, embora compondo o corpo da casa, eram isolados e
algumas vezes “ocupam nesse caso um local inteiramente diverso ou são situados na
outra extremidade do corredor das senzalas”159.
Somente uma casa da amostra, a casa 25, possui especificamente o quarto de
hóspede, localizado no pavimento térreo, próximo à porta de entrada principal, e fora do
setor íntimo. As residências, estudadas demonstram claramente, portanto, a tendência de
eliminar esse espaço na organização e estrutura doméstica em nossos dias. Com o seu
desaparecimento do programa de necessidades, outros espaços assumem essa função,
como é o caso da sala íntima e de TV, na amostra em estudo. É nessas salas que iremos
encontrar o sofá-cama, peça essencial para transformar esse espaço em local de repouso.
Essas múltiplas atividades fazem com que a sala de TV, por um lado, apareça
como o terceiro espaço mais utilizado pela família (ver Tabela 1) e, por outro lado,
apareça como o quinto espaço mais utilizado para receber visitantes. Segundo alguns
entrevistados, dependendo do grau de intimidade, o visitante é recebido na sala de TV.
3.2.4. Varanda
A varanda é tão presente na casa brasileira que chega a ser considerada como
uma de suas características marcantes. Mas existem várias possibilidades para explicar a
origem desse elemento arquitetônico. Apesar da grande utilização, não há uma certeza
sobre as suas origens.
158
159
TRAMONTANO, 1998, pág. 107.
GOMES, 1998, pág. 92.
73
A palavra “varanda”, segundo Lemos, "tem origem oriental e foi incorporada no
linguajar europeu pioneiramente pelos portugueses e espanhóis. Já em 1498, no roteiro
de viagem de Vasco da Gama, há menção à palavra ‘varanda’, como sendo um local
alpendrado de permanência aprazível”160.
Segundo Gomes, as varandas ou alpendres, existem nas casas portuguesas bem
antes de serem construídas no Brasil: “sua origem provável é o sequeiro mas podem ter
evoluído para um espaço de circulação, proteção e até ter encontrado sua vocação de
lazer contemplativo tão associada à modorra tropical”161. Ele enfatiza ainda que a
varanda foi encontrada em outros lugares como nas grandes casas rurais nos Estados
Unidos. As “...varandas periféricas já existiam desde o séc. XVIII, no sul dos Estados
Unidos, como a casa Parlange, na Luisiana francesa, construída em 1750, um clássico
do estilo colonial francês”162.
Na casa brasileira, a varanda aparece, primeiramente, como o alpendre, o
“telhado que se prolonga para fora da parede mestra da casa e que é apoiado em sua
extremidade por colunas”163. O alpendre aparece na frente, na parte posterior e, às vezes,
circundava toda a casa, desde o ciclo da cana - nos grandes casarões de engenho .
Gomes encontrou o alpendre ao longo da fachada principal das casas de engenho
(as quais ele chamou de nortenhas164), ao longo de uma ou duas fachadas (denominada
de solares165) e alpendres em forma de “U” em “L” (no caso do Bungalows166). Ele
concluiu que
o avarandado periférico sistematicamente construído ao longo de, pelo menos, três lados do
núcleo retangular da casa, tem sido freqüentemente considerado como uma criação brasileira. Na
realidade, esse tipo só existiu, comprovadamente, em Pernambuco, a partir do século XIX,
quando já se faziam sentir no país outras influências que não a portuguesa.167
Esse espaço tinha, pelos menos, quatro funções: a) climática, a proteção dos
raios solares e conseqüente refrescamento da casa; b) na frente da casa ele era espaço
160
LEMOS, 1989, pág 30.
GOMES, 1998, pág. 95.
162
MORRISON, 1953, pág. 263-264, citado por GOMES, 1989, pág.103.
163
LEMOS, 1989, pág. 27.
164
Casas nortenhas - devido à semelhança com as casas rurais do norte de Portugal. GOMES, 1998,
pág.49.
165
Solares - por sua semelhança com as casas rurais e urbanas de Portugal. GOMES, 1998, pág.53.
166
Bungalows - por sua semelhança com os bungalows anglo-indianos, um tipo de casa desenvolvido no
século XIX pelos colonizadores ingleses a partir de um padrão da região de Bengala, Índia. GOMES,
1998, pág.97.
74
161
para receber visitantes, uma espécie de ante-sala; c) o alpendre da frente era também
um lugar estratégico para o dono do engenho controlar os escravos em seus afazeres,
lugar aprazível de onde ele dava as ordens; d) o alpendre posterior da casa era espaço
anexo à cozinha que servia para alguns trabalhos domésticos e lugar para refeições.
Segundo Lemos, “o ciclo canavieiro transformou o alpendre posterior da casa
bandeirista na varanda, local de estar, de comer, de trabalhar”168. Essa mudança de
função fez com que o alpendre posterior deixasse de ser um puxado e integrasse o corpo
da casa, embora de forma tímida, uma vez que não era um cômodo fechado como os
demais. Por isso Lemos distingue “alpendre” de “varanda”, afirmando que varanda é
espaço “entalado entre dois compartimentos, totalmente aberta para o exterior,
possuindo, no máximo, um peitoril ou guarda-corpo”169.
Apesar dessas definições buscarem estabelecer uma clara diferença entre esses
dois espaços, o que se tem hoje sob a denominação de varanda são as duas coisas. É
possível visualizar nos exemplos abaixo a presença tanto da varanda como do alpendre.
Na casa 9 encontra-se a varanda e na casa 12 encontra-se o alpendre, tais como nas
definições acima, mas ambos sob o mesmo rótulo, ou seja, varandas.
Figura 9 - Planta baixa da casa 9
De maneira geral, a varanda corresponde à denominação do alpendre do século
XIX. O que existe de novo é a varanda, tal como Lemos a definiu, sob o rótulo de
sacada. Sacada é o nome dado à varanda localizada no segundo pavimento das casas. A
167
GOMES, 1998, pág. 132.
LEMOS, 1978, pág. 197.
169
LEMOS, 1989, pág. 28.
168
75
casa 17 exemplifica bem essa variação, pois no segundo pavimento encontram-se as
duas, varanda e sacada (segundo a denominação do entrevistado), ambas com as
mesmas características.
Figura 10 - Planta baixa da casa 17
Figura 11 - Planta baixa da casa 12
Na amostra analisada, a presença da varanda é marcante em quase todas as
residências, das menores às maiores casas, confirmando esta como unidade
característica dessas casas. A varanda hoje, alpendrada ou não, encontra-se tanto na
frente, como na parte posterior das casas, ou em volta delas. No entanto, a sua função
mudou. Não está mais ao lado da cozinha para servir de sala de jantar, e não está mais
na frente da casas como ponto estratégico de controle do dono da casa. Mas ainda
continua sendo espaço para receber visitantes, seja localizada na frente, na lateral ou na
parte posterior das casas, geralmente próximas da área de lazer.
76
De fato, ela aparece em 2º lugar como espaço mais utilizado para receber
visitantes. Sua proximidade da área de lazer, além de confirmar esse espaço como
propício para receber visitantes, dá à varanda outra característica típica do modo de vida
contemporâneo. Nela pode-se encontrar aparelhos de ginástica, TV e aparelhos de som.
Juntamente com a sala de TV, ela é o terceiro lugar mais usado para atividades físicas.
Lemos observa que a varanda foi considerada, até início do séc. XX, como o
“centro das atenções, seria realmente o local de estar da família”170. Entretanto, ela é, na
grande maioria, um dos espaços menos utilizados pela família, aparecendo em 2º lugar
na Tabela 2. Só em algumas das casas analisadas, a ambientação requintada tenta
resgatar o velho hábito do espaço de estar da família com sofás aconchegantes, redes,
almofadas, como, por exemplo, a casa 26. A proprietária dessa casa, em entrevista, fez
questão de ressaltar que “na minha casa, o lugar mais aconchegante é a varanda, estou
fazendo de tudo pra isso. Nela vai ter rede, sofás...uma decoração atrativa”.
Ainda assim, seria diferente do espaço anexo à cozinha, lugar de grande
permanência da família, que deu origem à sala de jantar. A varanda é, nas casas
analisadas, como uma sala de estar aberta com característica mais informal.
3.3. Espaços aos quais visitante não tem acesso
Confirmando a tendência em estabelecer espaços diferentes para visitantes e
habitantes, os quartos - que já foram citados como espaços de maior tempo de
permanência da família - são considerados pelos entrevistados como primeiro espaço
onde visitante não tem acesso. Cerca de 72% das respostas afirmaram isso. Além dos
quartos, outros espaços que o visitante não tem acesso são, em segundo lugar o
escritório e, em terceiro, a cozinha.
Isso confirma, por um lado, o escritório como o segundo espaço mais restrito e,
por outro lado, a cozinha como o espaço reservado aos moradores. Só as pessoas mais
íntimas chegam na cozinha, estabelecendo uma clara distinção nas relações sociais. Dos
entrevistados que responderam qual é o segundo espaço onde o visitante não tem
acesso, 12,% citaram o escritório.
77
Tabela 4- Espaço onde visitante não tem acesso
Cômodos
Quartos
Varanda
Escritório/biblioteca
Mezanino
Sala de TV
Sala de estar
Quintal
Quarto da mãe
Cozinha
Total
% de respostas
Primeiro
No
18
3
3
1
0
0
0
0
0
25
92,59
%
72
12
12
4
0
0
0
0
0
100
Segundo
No
3
1
12
0
1
0
0
1
5
23
85,19
%
13,04
4,35
52,17
0,00
4,35
0,00
0,00
4,35
21,74
100
Terceiro
No
%
2
2
5
2
1
1
1
0
5
19
70,37
10,53
10,53
26,32
10,53
5,26
5,26
5,26
0,00
26,32
100
3.3.1. Escritório
O escritório aparece na casa brasileira no séc. XIX com o nome de ‘gabinete’.
Lemos considerou o gabinete como a “novidade no programa da época, dependência
destinada aos livros e ao trabalho intelectual. (...) Esse espaço é a nova dependência que
viria dar às residências uma aura de intelectualidade”171. Sua presença na amostra em
mais de 63% das casas, confirma sua permanência no programa de necessidades das
residências. Na amostra, ele pode ser encontrado tanto em casas com cerca de 100m2,
até em casas acima de 500m2 e, com uma incidência maior, nas construções da décadas
de 80 e 90.
A crescente popularização de novas tecnologias, como o computador,
modernizou esse espaço. O escritório é disparado o lugar mais citado com ocorrência de
computadores na casa, cerca de 52,78% (Tabela 5). Consequentemente, é o espaço
definido para as atividades de trabalho e estudo, com mais de 40% das indicações
(Tabela 6). Embora, em alguns escritórios possa se encontrar televisores e aparelhos de
som, ele é um dos espaços com clara definição de atividade.
Essa definição das atividades pode justificar o fato dele não estar entre os
espaços mais utilizados para receber visitantes. Ao contrário, do total de respostas sobre
qual é o segundo espaço onde o visitante não tem acesso, 12% citaram o escritório. Em
170
171
LEMOS, 1989, pág 134.
LEMOS, 1978, pág. 134.
78
alguns casos, os visitantes são recebidos a negócios pelos proprietários, que são
trabalhadores autônomos. É o caso da residência 17, por exemplo, um dos poucos casos
onde o entrevistado diz ser o escritório um dos lugares de maior permanência. Isso
confirma sua função específica, o trabalho. Por outro lado, o escritório é pouquíssimo
usado pelos habitantes, como se pode perceber pela Tabela 1.
Com a popularização dos computadores, autores especulam sobre o aumento do
número de pessoas trabalhando em casa. Isso seria como uma volta a essa prática, já que
o trabalho em casa é um hábito antigo, que remonta aos tempos medievais172, para dizer
o mínimo. Em recente estudo sobre o modo de vida, Tramontano afirmou que “o local
de trabalho tende a ocupar novamente o espaço da habitação, que deverá alojar um
número mínimo de pessoas, talvez - e com, aparentemente, crescente probabilidade uma única, criando o cenário que abrigará um novo tipo de força de trabalho,
completamente fragmentada”173.
Essa tendência pode se confirmar em outros centros, mas essa perspectiva ainda
não se verifica no modo de vida das pessoas e famílias da amostra estudada, embora a
média de computadores seja alta, 1,7 por casa. Vale a pena ressaltar que, como são
casas de estudantes de arquitetura, muitos fazem trabalhos esporádicos (desenhos de
projetos) em casa com auxílio do computador. No entanto, essa não é a principal renda
da família, não caracterizando ainda o tipo de trabalho ao qual Tramontano se referiu.
De fato, cerca de 68% das pessoas com as duas maiores rendas na família são
empregados: a) de empresa do setor privado, público ou de economia mista; b)
empregador titular ou proprietários de empresas; c) servidores públicos; d) mais de 25%
são aposentados; e) apenas 6% são profissionais liberais.
A pequena quantidade de profissionais autônomos, pode explicar o alto índice,
mais de 80%, de pessoas que trabalham fora de casa (incluindo pessoas além daquelas
com as duas maiores rendas), e isso pode explicar, ainda, a pouca utilização do
escritório para atividades diárias dos membros das famílias. Outro fator importante que
pode provocar mudanças na função dos escritórios é o crescente número de
computadores nos quartos. É o segundo espaço com maior índice de presença dessas
máquinas possibilitando que os serviços esporádicos sejam feitos nos quartos e não no
escritório.
172
173
TRAMONTANO, 1998, pág. 216.
TRAMONTANO, 1998, pág. 216.
79
A combinação desses fatores faz com que o escritório, na maioria das casas, seja
um espaço subutilizado. Em um dos questionários, a entrevistada identifica o escritório
como um “espaço abandonado”. Talvez a presença dele nos programas de necessidades
das residências continue sendo uma relíquia do status que o “gabinete” tinha no século
XIX. Em vez de se constituírem em espaços necessários de trabalho e estudo, têm
apenas uma função marginal e “decorativa” de baixa utilização.
Tabela 5 – Localização dos equipamentos
Cômodos
Aparelhos de som
Nº
Computadores
%
Nº
Equip. de ginástica
%
Nº
TV
%
Nº
%
Área de lazer
4
5,63
1
2,78
7
36,84
2
2,41
Copa
0
0,00
0
0,00
0
0,00
1
1,20
Cozinha
4
5,63
1
2,78
0
0,00
11
13,25
Dependência de empregada
5
7,04
0
0,00
0
0,00
9
10,84
Escritório/biblioteca
9
12,68
19
52,78
0
0,00
5
6,02
Mezanino
2
2,82
0
0,00
1
5,26
3
3,61
Quartos
17
23,94
11
30,56
4
21,05
20
24,10
Sala de estar
16
22,54
3
8,33
0
0,00
8
9,64
Sala de jantar
1
1,41
0
0,00
0
0,00
2
2,41
Sala de TV
7
9,86
0
0,00
3
15,79
16
19,28
Sala íntima
4
5,63
0
0,00
1
5,26
5
6,02
Varanda
2
2,82
1
2,78
3
15,79
1
1,20
71
100
36
100
19
100
83
100
Total
Tabela 6 – Atividades
Cômodos
Área de lazer
Interativo
Lazer passivo
Neces. comuns
Neces. privadas
Tar. domésticas
Trab./Estudar
14 15,56
10
11,24
0
0,00
1
2,38
1
3,45
1
copa
0 0,00
0
0,00
1
2,13
0
0,00
0
0,00
0
0,00
Cozinha
2 2,22
3
3,37
16
34,04
0
0,00
19
65,52
0
0,00
Qto de emp.
1 1,11
3
3,37
1
2,13
6
14,29
5
17,24
1
2,86
Esc./Biblio.
4 4,44
7
7,87
1
2,13
2
4,76
0
0,00
14
40,00
Mezanino
3 3,33
2
2,25
0
0,00
1
2,38
0
0,00
0
0,00
Quartos
5 5,56
14
15,73
2
4,26
21
50,00
0
0,00
6
17,14
Sala de estar
20 22,22
13
14,61
3
6,38
1
2,38
0
0,00
4
11,43
Sala de jantar
10 11,11
3
3,37
16
34,04
1
2,38
2
6,90
4
11,43
Sala de TV
9 10,00
18
20,22
3
6,38
3
7,14
1
3,45
3
8,57
Sala íntima
3 3,33
6
6,74
1
2,13
4
9,52
1
3,45
0
0,00
19 21,11
90 100
10
89
11,24
100
3
47
6,38
100
2
42
4,76
100
0
29
0,00
100
2
35
5,71
100
Varanda
Total
2,86
80
Conclusão
Diante desse quadro sobre a ocupação e utilização dos espaços, fica evidente a
forte divisão do espaço doméstico em áreas mais destinadas à família e área mais
destinadas a visitantes, revelando características muito interessantes da ocupação de
alguns espaços, como se segue.
a) O fato da cozinha ser o espaço de convívio da família (lugar para refeições,
conversas e até para assistir televisão), estabelece grande diferença em relação às
casas da primeira metade do século XX, quando a copa era espaço de convívio da
família. Estabelece, também, diferença em relação às casas coloniais que tinham a
varanda dos fundos como lugar de refeição e de permanência. E, definitivamente, é
diferente da cozinha laboratório da proposta modernista. Ou seja, as cozinhas dessas
casas contemporâneas apresentam-se com características próprias, fruto da
aglutinação de atividades desses outros espaços.
b) A materialização do aumento da noção de privacidade, expressas pela comodidade e
conforto encontrados nos quartos, fazem desses os espaços de maior permanência.
A generalização desse conforto aos demais membros do grupo familiar, não se
restringindo aos donos da casa (em grande parte da amostra), pode ser sinal de
alguma mudança na estrutura patriarcal característica da família nuclear.
c) O fato da sala de estar e da sala de jantar serem espaços para receber visitantes, e o
pouco uso deles por parte dos habitantes, remete esses às características encontradas
nas casas coloniais e na casa-grande de engenho. As salas de visitas eram usadas
especificamente para esse fim, e as salas de jantar eram o espaço para refeições
apenas em ocasiões especiais.
d) Outra caracterização da ocupação e uso desses espaços contemporâneos é a presença
da sala de TV como o segundo espaço coletivo da família (o primeiro é a cozinha).
Esse espaço reforça, por um lado, a sala de estar como espaço formal, a
permanência da sala de visitas e, por outro lado, a privacidade da família pelo fato
deste não ser acessível diretamente aos visitantes.
e) Mais uma característica dessas residências é o desaparecimento ou o pouco uso de
alguns cômodos como, por exemplo, o quarto de hóspedes e o escritório. O
desaparecimento do quarto de hóspedes é claramente a confirmação do espaço
doméstico como de domínio privado, restrito à família. A pouca utilização do
81
escritório, está relacionada com um uso multifuncional dos quartos, onde
encontramos aparelhos de som e computadores.
As constatações desse primeiro nível de análise dão um mapeamento das
atividade desenvolvidas nessas residências. Essas informações serão melhor entendidas,
segundo as premissas desse trabalho, quando confrontadas com os dados da análise
configuracional das casas.
82
Capítulo 4 - Uma análise configuracional
Teorias são abstrações através das quais entendemos o mundo.
Uma teoria arquitetônica, deve aprofundar nossa compreensão
do fenômeno arquitetônico
Hillier
Esse capítulo tem como objetivo descrever a Sintaxe Espacial das residências,
ou seja, fazer essencialmente uma caracterização dos sistemas estudados em termos das
suas permeabilidades e impermeabilidades ao movimento das pessoas no interior destes
edifícios, e em relação aos seu exterior. Esse estudo será feito com o auxílio da técnica
de convexidade e de suas variáveis analíticas, conforme descritas no capítulo 2.
Neste capítulo, serão lançadas ainda hipóteses interpretativas das implicações
sociais destes padrões espaciais, com base nos recentes estudos envolvendo o espaço
doméstico sob esse enfoque. Essas hipóteses serão posteriormente verificadas, na
medida do possível, no capítulo 5.
4.1. Características básicas do sistema espacial
Os dados geométricos, como tamanho do lote e a área construída das
residências explicitam um tipo de variação da amostra em estudo. No conjunto, as casas
variam de 100m2 até mais de 500 m2, e os lotes entre 350 m2 – como, por exemplo, em
Samambaia - até mais de 1000 m2 – no Lago Sul. Essa diversidade também se manifesta
quanto aos dados sintáticos básicos: o número de espaços convexos nas residências
varia de 11 a 69 (casa 21 e a casa 3, respectivamente). A média de espaços convexos
para a amostra é de 30,30.
O tamanho sintático dos sistemas é medido pelo número de espaços convexos e
é visualizado pelos grafos justificados. Os grafos foram construídos tendo como espaçoraíz o exterior, conforme exposto no capítulo 2. Como a amostra é composta por
83
sistemas com grandes variações de espaços convexos, se analisada quanto à sua
profundidade em relação ao exterior, é fácil identificar algumas características comuns
(daqui para frente, ‘profundidade’ deverá sempre ser entendida como em relação ao
exterior).
A profundidade dos grafos varia de 5 a 13 níveis. A Tabela 7 apresenta as
casas agrupadas em função desses níveis de profundidade (9 grupos) e seus respectivos
números de espaços convexos.
Tabela 7 – Níveis de profundidade dos sistemas
Nº de
Níveis
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Níveis de
Profundidade
5
6
7
8
9
10
11
12
13
Imóvel
Número de
Espaços convexos
15, 11, 12
25, 24, 17, 17, 16,
35, 22, 24, 37, 35
32, 36, 45, 19, 27,34
33
36
47, 43
34, 69
44, 40
19, 21, 23
7, 12, 13, 15, 20,
9, 16, 26, 27, 22
1, 4, 5, 14, 18, 29
25
10
6, 28
2, 3
8, 17
% de casas
por níveis
11,11
18,51
18,51
22,22
3,7
3,7
7,4
7,4
7,4
Nesta tabela é possível verificar que os maiores sistemas - com 47 e 69
espaços convexos – apresentam diferentes níveis de profundidade, sendo que o primeiro
sistema com profundidade total de 11 níveis e o segundo com 12, mostra que os maiores
sistemas não são, necessariamente, os mais profundos, como se poderia pensar a priori.
Os sistemas mais profundos – com 13 níveis - são os que possuem 44 e 40 espaços
convexos, ou seja, não são os maiores do conjunto.
A primeira constatação em relação a esse aspecto, é que a maioria das casas,
cerca de 63%, está entre os níveis 6 e 8 de profundidade. Nesses níveis estão também as
casas com as maiores médias de integração da amostra, com exceção da casa 19 – com
5 níveis, dando uma característica do conjunto.
A principal constatação, no entanto, é a grande variação dos tamanhos dos
sistemas nos níveis onde estão as casas mais integradas. Isso mostra que maior
integração independe do tamanho do sistema. Numa correlação direta entre essas duas
categorias
(integração
e
tamanho),
o
valor
de
–0,6865
confirma,
até
surpreendentemente, uma forte correlação inversa entre elas. A Figura 12 ilustra isso
mostrando sistemas com praticamente mesmo tamanho como, por exemplo, a casa 5
(com 45 espaços convexos), que está entre as mais integradas, enquanto a casa 8 (com
44) está entre as mais segregadas da amostra.
84
Figura 12.a – Grafo da casa 5, com 45 espaços convexos
Figura 12.b – Grafo da casa 8, com 44 espaços convexos
85
4.2. Variáveis analíticas
Como vimos na Capítulo 2, as variáveis escolhidas para essa análise sintática
são: integração média dos sistemas, entropia, distributividade, simetria, ordem de
integração, grau de fechamento e grau de funcionalidade. A Tabela 8 mostra os valores
encontrados para essas medidas.
4.2.1. Integração média dos sistemas
A média de integração dos sistemas da amostra apresenta uma considerável
variação, sendo que a menor é 0,603 e a maior é 1,147. Apesar dessa variação, o
conjunto apresenta-se com uma certa uniformidade, ou seja, com exceção das casas 19 e
23 que apresentam as maiores médias – 1,147 e 1,011, respectivamente – as demais
casas estão com índices abaixo de 1.
Comparando as médias de integração das casas da amostra com as casas
estudadas por Amorim, em Recife, as casas 3, 8 e 17 são menos integradas que a casa de
Pontual, a menos integrada da amostra dele. A casa mais integrada da mesma amostra é
a de Svenson, com média de integração de 1,229, a qual supera as maiores integrações
do conjunto estudado aqui, ou seja, a casa 19 com 1,147 e a casa 23 com 1,011. Mas,
cerca de 63% dessa amostra (17 casas) superam a segunda maior medida de integração
da amostra de Amorim, ou seja, a casa de Reynaldo com 0,832.
Se comparada aos sobrados coloniais estudados por Trigueiro, cerca de 70%
da amostra (19 casas) superam o sobrado menos integrado daquele estudo, com 0,693 e
a maior integração do conjunto estudado aqui, também supera a maior integração
encontrada por ela, o sobrado 2 com 1,137.
Pode-se concluir então, diante dos estudos apresentados, que as casas dessa
amostra são bem integradas. Isso é confirmado pela média do conjunto estudado (0,85)
que está entre as médias dos conjuntos de Amorim e Trigueiro, respectivamente, com
0,81 e 0,90. Isso significa que as casas estudadas em Brasília são exemplos de sistemas
que – a partir das hipóteses encontradas na literatura – deveriam favorecer um uso mais
intenso e informal de seus espaços.
86
Tabela 8 - Dados gerais das varáveis sintáticas
Tipos
Imóvel
a
b
Nível de
c
d
Total Conv.
RRA
Máxima
Profund.
Média
Simetria
Menor
Sim.
Distribu-
Dist.
(norm.)
tividade
(norm)
Integração
Entropia
Grau de
Grau de
Funcion.
Fecham.
casa19
4
2
9
15
5
1,359
0,952
0,510
6,500
1,000
2,750
0,942
1,147
0,825
0,80
0,27
casa23
4
6
2
12
5
1,596
1,064
0,702
1,000
0,072
2,000
0,650
1,011
0,867
0,86
0,42
casa12
6
2
10
6
24
6
1,777
1,091
0,676
1,000
0,072
2,000
0,650
0,964
0,818
0,78
0,38
casa5
15
10
10
10
45
8
1,664
1,101
0,661
1,250
0,114
0,800
0,184
0,960
0,838
0,85
0,58
casa15
5
3
4
5
17
6
1,640
1,145
0,581
1,429
0,145
1,125
0,310
0,949
0,807
0,75
0,35
casa20
7
1
8
16
6
1,859
1,148
0,569
0,778
0,035
1,000
0,262
0,945
0,750
0,92
0,56
casa13
8
1
8
17
6
2,016
1,141
0,615
0,889
0,054
0,889
0,218
0,937
0,738
0,92
0,41
casa16
11
3
6
2
22
7
1,867
1,180
0,711
1,444
0,147
0,571
0,095
0,915
0,822
0,83
0,50
casa1
10
10
8
4
32
8
2,171
1,209
0,641
0,778
0,035
0,600
0,106
0,904
0,724
0,78
0,41
casa26
9
3
5
7
24
7
1,912
1,204
0,637
2,000
0,241
1,000
0,262
0,891
0,780
0,88
0,33
casa7
12
4
9
0
25
6
1,158
1,221
0,742
0,923
0,059
0,563
0,092
0,876
0,946
0,86
0,36
casa27
13
8
9
7
37
7
2,150
1,226
0,684
1,176
0,102
0,762
0,169
0,867
0,753
0,93
0,43
casa9
17
8
7
3
35
7
2,068
1,266
0,657
1,333
0,129
0,400
0,028
0,851
0,761
0,78
0,34
casa22
16
8
9
2
35
7
1,723
1,231
0,765
1,059
0,082
0,458
0,051
0,848
0,874
0,75
0,43
casa25
13
4
10
6
33
9
2,130
1,263
0,789
1,357
0,133
0,941
0,239
0,845
0,806
0,81
0,39
casa4
13
9
9
5
36
8
2,031
1,276
0,694
1,000
0,072
0,636
0,120
0,836
0,788
0,84
0,44
casa21
4
3
4
11
5
2,035
1,356
0,754
0,571
0,000
0,571
0,095
0,815
0,818
0,83
0,27
casa14
8
6
5
19
8
2,320
1,343
0,707
0,727
0,026
0,357
0,012
0,814
0,741
0,77
0,47
casa6
13
6
10
8
37
11
2,210
1,310
0,783
1,313
0,125
0,947
0,241
0,811
0,792
0,71
0,35
casa29
14
7
10
3
34
8
1,924
1,339
0,754
1,000
0,072
0,619
0,114
0,786
0,838
0,81
0,41
casa18
12
8
7
27
8
2,004
1,384
0,738
0,800
0,039
0,350
0,009
0,780
0,818
0,83
0,41
casa28
14
8
16
5
43
11
2,119
1,382
0,786
0,792
0,037
0,955
0,244
0,758
0,817
0,81
0,47
casa10
15
8
6
6
35
10
2,023
1,386
0,805
1,500
0,157
0,522
0,076
0,755
0,841
0,80
0,34
casa2
9
8
8
9
34
12
2,587
1,442
0,956
1,125
0,093
1,000
0,262
0,726
0,796
0,67
0,35
casa8
16
16
6
6
44
13
2,586
1,588
0,990
1,000
0,072
0,375
0,019
0,662
0,820
0,79
0,48
casa17
13
16
5
6
40
13
2,445
1,612
0,980
0,905
0,056
0,379
0,020
0,654
0,841
0,71
0,33
12
2,751
1,751
1,101
0,865
0,049
0,327
0,000
0,603
0,837
0,74
0,38
1,278
0,119
0,848
0,203
0,849
0,809
0,81
0,40
casa3
28
24
13
4
69
Total
309
184
210
115
818
Média
Entropia do conjunto
30,30
1,282
0,925
4.2.2. Entropia
A medida de entropia ou “fator de diferenciação”, conforme definida no
capítulo 2, quantifica o grau de diferenciação entre os valores de integração dos
sistemas. Essa medida é importante porque indica se um sistema estabelece ou não
grandes diferenciações sintáticas entre os seus lugares, isto é, se existem
simultaneamente espaços extremamente integrados e espaços extremamente segregados
no sistema.
A amostra é composta por residências que apresentaram uma pequena variação
nas medidas de entropia, ou seja, cerca de 24,2% de variação entre a maior e a menor
medida, sendo elas 0,95 e 0,72, respectivamente. Entre os estudos de Hanson, Amorim e
Trigueiro, a menor medida de entropia foi de 0,42 e a maior de 0,87, respectivamente,
encontradas por Hanson (entre as casas vernaculares da França) e Amorim. Isso
significa que, em face da literatura existente, o maior índice de entropia até hoje
identificado encontra-se nesta amostra.
Todas as casas dessa amostra superam o menor índice encontrado por Hanson.
Apenas 3 casas da amostra estudada têm índices maiores do que a casa mais entrópica
dos arquitetos modernistas do Recife, estudadas por Amorim. Mas, cerca de 89% (24
casas) têm índices de entropia maiores do que o segundo índice encontrado por ele, de
0,85. Com relação aos sobrados coloniais, cerca de 63% superam a menor entropia do
conjunto de Trigueiro.
Diante dessas evidências, pode-se concluir que essas medidas são altas,
indicando esses sistemas como muito entrópicos, ou pouco diferenciados. De maneira
geral, as casas estudadas não apresentam espaços extremamente integrados e outros
extremamente segregados. Isso significa, diante das hipóteses sociológicas, que não
existe grandes distâncias das categorias de pessoas e/ou práticas envolvidas nessas
casas.
As casas que apresentaram os maiores e menores índices de entropia, são bons
exemplos do que são diferenciações no sistema. A casa 1, por exemplo, tem a menor
medida de entropia 0,72. A variação entre o seu espaço mais integrado – sala de jantar,
com 1,559 – e o menos integrado – o banheiro da suíte4, com 0,461 – é muito grande se
comparada à casa 7. Esta última, com 0,95 de entropia, tem como espaço mais integrado
o quintal (com 1,348) e o exterior, menos integrado, com 0,863. Essa variação entre os
espaços mais integrados e os menos integrados é que dá a diferenciação sintática do
sistema, a qual não se revelou muito elevada na amostra.
Para visualizar o quanto o conjunto estudado é entrópico em relação aos demais
estudos mencionados, foi calculada a entropia de cada um desses conjuntos, conforme
Tabela 9. A comparação a seguir será feita com base nos dados de cada um deles. Se
comparado aos dados levantados por Amorim e por Trigueiro, o conjunto mostra-se
apenas levemente mais diferenciado. As casas modernistas do Recife, com 0,936 de
entropia, são mais homogêneas que o conjunto estudado, que tem 0,925, e os sobrados
coloniais em Recife constituem um conjunto mais homogêneo que os outros dois, com
0,954.
Tabela 9 – Entropia dos conjuntos
Autores
Hanson
Amorim
Trigueiro
Franciney
Amostras
Entropia do conjunto
Casas vernaculares na Normandia – França
0.841
Casas de arquitetos em Londres
0,865
Casas das “estrelas” (Loos, Meier, Hejduk e Botta)
0,975
Casas de arquitetos modernista em Recife
0,936
Sobrados coloniais
0,954
Casas modernista em Natal (refor., não reformadas e novas 0,930
construções)
Casas em Brasília
0,925
Em relação aos demais estudos empíricos disponíveis na literatura, existe uma
diferença entre as casas estudadas no Brasil e as estudadas por Hanson em Londres e em
Paris. Os conjuntos analisados por ela apresentam-se bem mais diferenciados do que os
de Amorim, de Trigueiro e do conjunto em estudo. No caso das casas dos arquitetos de
Londres, a diferenciação é significativa, pois a entropia do conjunto é de 0,86, bem
abaixo da amostra desse estudo (0,925), e o mais diferenciado é o conjunto de casas
vernaculares na França com 0,84. Entre a média das casas das “estrelas”, a entropia foi
bem alta, 0,98, sendo este o conjunto mais homogêneo de todos.
Essas diferenciações sintáticas entre os conjuntos, especialmente com relação
àqueles que dizem respeito a casas de arquitetos, chamam a atenção pois acredita-se que
as casas de arquitetos são mais idiossincráticas que as demais. Amorim considerou essa
hipótese quando do seu estudo em Recife, mencionando vários críticos que abordam
essa discussão. O pressuposto é de que as casas de arquitetos são diferentes das casas
convencionais, entre outras coisas, por não serem modelos reproduzidos em grande
número e por que revelam a personalidade do próprio arquiteto. Segundo Amorim,
89
“casas de arquitetos são individuais e únicas, talvez posa vir a ser um tipo, mas nunca
como um modelo para ser reproduzido”174.
A comparação entre os dados do estudo das casas modernistas do Recife e os
dados das casas em Brasília - mais especificamente em relação à integração dessas casas
– permite verificar que essa diferenciação nem sempre acontece. A diferença é muito
pequena, o que não confirma a hipótese levantada, de que as residências de arquitetos
são muito diferenciadas entre si. É importante ficar claro que isso acontece apenas em
relação a integração dos sistemas e não quanto a outros aspectos dessas residências, que
não são objetos desse estudo. Mesmo assim, é curioso notar como uma faceta
fundamental na configuração destes edifícios (exatamente aquela mais relacionada aos
modos comportamentais que neles se desenvolvem, a saber, sua sintaxe), nega a suposta
idiossincrasia destes projetos.
4.2.3. Distributividade
No conjunto estudado, as medidas de distributividade (Tabela 8) chamam a
atenção pela sua heterogeneidade: a discrepância entre a maior, com 2,750, e a menor,
com 0,346, mostra sistemas muito distributivos e outros pouquíssimos distributivos. A
casa 19, com maior distributividade, é o exemplo de configuração que não constrói,
como um todo, fortes barreiras entre as várias pessoas e/ou as práticas que
usam/ocupam os espaços, e a casa 9, no outro extremo, é um exemplo de configuração
que estabelece essas barreiras.
Para entender melhor esses dados, basta verificar a composição da
configuração das casas 19 e 9. A casa 19 tem a presença absoluta de espaços tipo “c” e
“d” , ou seja, cerca de 80% dos espaços da casa. A grande presença desses tipos
significa que a maioria dos espaços estão ligados aos outros de forma a criar anéis,
propiciando diferentes rotas na casa, para os mesmos destinos. O inverso acontece na
casa 9, onde os espaço tipo “a” e “b” superam os tipos “c” e “d” em mais de 70% dos
casos. A presença desses tipos de espaços sinaliza para uma estrutura mais em árvore,
174
No original: “Architect’s house are individual and unique, perhaps aimed to become a type, but never
as a model to be reproduced”. AMORIM, 1999, pág. 65. (minha tradução).
90
onde os espaços são mais segregados. Para melhor visualização dessas estruturas, ver os
grafos das casas 19 e 9 na Figura 13.
Dada a heterogeneidade das medidas de distributividade do conjunto, conforme
mencionado, elas serão comparadas com outras encontradas na literatura. Para que seja
mais facilmente visualizado, os dados foram normalizados entre 0 e 1 (mais próximo de
zero implica em sistemas menos distributivos), tendo como parâmetro a medida de
distributividade do estudo de Holanda, a maior entre os estudos a que tive acesso.
Figrua 13 a – Grafo casas
Figrua 13b – Grafo casa 19
Após essa normalização, a média do conjunto ficou em 0,220, ou seja, um
índice muito baixo. Isso significa que os sistemas da amostra apresentam-se pouco
distributivos. Embora o parâmetro usado para comparação tenha sido muito alto (2,9)
fazendo com que a média de distributividade do conjunto seja tão baixa, o valor
normalizado evidenciou uma das características desse conjunto. Isto é, a amostra é
composta, na grande maioria, por sistemas que são: a) muito anelares quando envolvem
os espaços dos setores social, serviço e de lazer; b) extremamente em árvore, quando
envolvem os espaços do setor íntimo.
Embora algumas casas sejam muito distributivos, em parte de seus sistemas, a
grande quantidade de espaços não-distributivos (geralmente encontrados no setor íntimo
e de serviço), fazem com que o índice de distributividade seja baixo. Os sistemas das
casas 5 e 2, são bons exemplos dessa estrutura, um misto de parte muito distributiva e
outra extremamente em árvore.
91
Figura 14 a – Grafo casa 2
Figura 14b – Grafo casa 5
Teoricamente, isso significa que, de maneira geral, os sistemas têm uma
estrutura que controla mais o acesso aos diversos cômodos da residência. Internamente
ao conjunto, a diferença entre os sistemas indica que existem estruturas que investem
mais fortemente no controle do acesso a certas dependências em particular,
nomeadamente o setor íntimo. Isso resulta em práticas e utilização dos espaços de
maneira mais especializada e segregada.
4.2.4. Simetria
Outra medida envolvendo os espaços tipos a, b, c e d, como vimos, é a medida
de simetria. Segundo a literatura, ela dá um perfil do edifício quanto ao grau de
classificação das pessoas e/ou das práticas cotidianas. É uma outra maneira de
caracterizar o grau de diferenciação interna do sistema, só que de maneira mais local, ao
contrário da integração e da entropia que tratam o sistema globalmente.
Na casa 19 – onde o índice de simetria de 6,500, é o maior da amostra - a
ausência de espaços tipo “b” evidenciou o número de espaços “a” e “d”, dando a esta
casa um maior número de espaços que favorecem à integração. Na casa 21 - com o
menor índice de simetria, ou seja, 0,571 - a ausência de espaços tipo “d”, evidenciou os
espaços “b” e “c”, que contribuem para uma maior segregação desse sistema (ver
Tabela 8).
92
Se comparado ao conjunto estudado por Hanson, das 27 casas da amostra,
apenas o índice da casa 19 supera o maior índice encontrado por ela. Cerca de 92% dos
sistemas da amostra estão abaixo das casas consideradas por ela como sendo pouco
simétricas.
Dada a grande variação das medidas de simetria da amostra, foi feita uma
normalização desses valores, onde os parâmetros foram o máximo e o mínimo da
própria amostra. Estes foram normalizados variando de 0 a 1, sendo que, quanto mais
próximo de zero, menor a simetria. A média do conjunto, depois de normalizado, ficou
em 0,119 (Tabela 8) - esse baixo valor confirma a tendência do conjunto de ser pouco
simétrico, em comparação com os dados de Hanson. A hipótese é que baixos índices
indicam que os sistemas classificam fortemente os vários papéis e status nessas
residências.
Esse atributo caracteriza esses sistemas sob um outro aspecto, ou seja, são pouco
simétricos apesar de não serem muito diferenciados sintaticamente, conforme a medida
de entropia vista anteriormente, e de serem muito integrados. Por um lado, a correlação
entre simetria e entropia é baixíssima, praticamente nula: 0,064. Por outro lado, a
correlação entre simetria e integração é positiva, mas não é muito forte: 0,53. As baixas
medidas de simetria, em contraste com as altas medidas de entropia, e as altas medidas
de integração, colocam dificuldades na caracterização dessa amostra, uma vez que a
simetria (uma medida local) não reflete nem a entropia, nem a integração do sistema
como um todo (medidas globais).
Esse descompasso pode ser resultado de problemas como: a) uma possível
inconsistência teórica, a qual exigiria um estudo mais aprofundado, ultrapassando o
alcance do presente trabalho, e/ou b) a falta de outros estudos para comparação,
inclusive da própria região estudada, pelos quais se possa revelar uma recorrência desta
contradição entre medidas locais e globais, denotando até mesmo uma determinada
família configuracional.
No primeiro caso, o aprofundamento, do ponto de vista teórico, seria no sentido
de verificar se demonstrações formais foram feitas ou se apenas testes quantitativos175.
Estes testes não são mais do que uma verificação da hipótese levantada, diferentemente
de uma demonstração mais formal. A diferença é que um teste numérico pode-se revelar
satisfatório para um certo valor, mas, para algum valor diferente daquele testado, ele
175
Como parece sugerir em HILLIER, 1996, pág. 321.
93
pode não ser válido. Já uma demonstração matemática mais formal comprova a validade
da hipótese para qualquer valor dado.
No segundo caso, é possível que a contradição seja indicativa de configurações
que, consistentemente, investem em baixa simetria, mas em alta integração e alta
entropia. Pela literatura, isto significaria que haveria uma forte classificação em nível
local, ao mesmo tempo em que haveria uma fraca classificação em nível global176. A
evidência aqui tratada parece confirmar a hipótese da literatura em termos de categorias
excludentes, típicas de uma classificação forte. Entretanto, uma pesquisa mais
aprofundada será necessária para a verificação desta hipótese.
4.2.5. Ordem de integração
A partir da tabela de integração das residências, visualiza-se a ordem com que
os seus espaços são apresentados. A Tabela 10 mostra os espaços de atividades (citados
pelos entrevistados), a circulação mais integrada e o exterior, ordenados pelas suas
medidas de integração. É fácil verificar, nesta tabela que os espaços de atividades do
setor social (sala de jantar e de estar) são os mais integrados das casas. A varanda e a
área de lazer, também estão entre os mais integrados. Por outro lado, o exterior e quarto
de empregada são os mais segregados dos sistemas (para maiores detalhes sobre a
ordem de integração de todos os espaços convexos das casas, ver anexo 4).
A partir da Tabela 10 é possível verificar a incidência em que aparecem os
espaços “principais”: sala, cozinha, quarto principal e exterior (conforme definidos no
capítulo 2). Vale ressaltar que foi considerada como sala tanto de estar como de jantar,
tomando uma ou outra, no caso de maior integração. A Tabela 11 mostra a ordenação
predominante do conjunto.
176
Ver, por exemplo, a discussão de Hanson sobre distributividade e simetria (HANSON 1998, pág. 188),
assim como sua citação dos conceitos de classification e frame, de Bernstein (idem, pág. 118).
94
Tabela 10 – Ordem de integração
Imóvel Ordem de integração
Casa1
Casa2
Casa3
Casa4
Casa5
Casa6
Casa7
Casa8
Casa9
Casa10
Casa12
Casa13
Casa14
Casa15
Casa16
Casa17
Casa18
Casa19
Casa20
Casa21
Casa22
Casa23
Casa25
Casa26
Casa27
Casa28
Casa29
S.jantar > Circ. > estar > copa > área de lazer > varanda > qto1 = escritório = exterior > qto2 > qto empregada > cozinha
1,559 1,267 1,053 1,014
0,954
0,932
0,881 0,881
0,881
0,863 0,780
0,737
Estar > circ. > varanda > área de lazer > s. jantar = cozinha > s. TV/int. > escritório > qto. emp. > exterior = qto 1 > qto 2
1,046 1,010 0,936
0,871
0,766
0,766
0,753
0,747
0,668
0,601 0,601 0,529
Circ. > estar > área de lazer > s.jantar > escrit. > cozinha > qto1 > varanda > exterior > copa > qto2 > TV/Int. > qto. emp.
0,908 0,816 0,772
0,765
0,730 0,687
0,678 0,671
0,666
0,580 0,562 0,504 0,436
Estar/Jantar > TV/Int. > varanda > cozinha > circ. > área de lazer > escritório > qto1 = qto2 >exterior > qto. emp.
1,442
1,328
1,173
1,097 1,040
0,970
0,814
0,737 0737 0,696
0,677
Área de lazer > Varanda > TV/Int. > qto1 > circ. > estar/jantar > qto2 > cozinha > copa = qto. emp.> escritório > exterior
1,513
1,496
1,333 1,202 1,161 1,077
0,997 0,983 0,863 0,863
0,847
0,761
Estar > varanda > s.jantar > área de lazer > circ. > TV/Int. > cozinha > qto1 > qto2 > escritório = exterior > qto. emp
1,277 1,187
1,160
1,121
1,097 0,943 0,917
0,651 0,635 0,601
0,601 0,580
Estar > circ. > cozinha > qto1 > s.jantar > exterior > qto2
1,417 1,256 1,083 1,005 0,891
0,863
0,825
Estar > circ, > TV/Int, > s,jantar > varanda > área de lazer > qto1 > cozinha > qto2 > qto empregada > exterior
1,010 0,995 0,924 0,911
0,880
0,771
0,728 0,704 0,675
0,626
0,511
Circ,> estar/jantar > varanda > cozinha > área de lazer > exterior > qto1 = qto2 > escritório > qto empregada
1,522 1,327
1,161
0,919
0,884
0,868 0,837 0,837 0,868
0,709
Jantar > circ, > cozinha > estar = TV/Int > varanda > área de lazer > escritório = qto1> qto2 = exterior > qto, empregada >
1,242 1,101 1,064 0,969 0,969 0,889
0,821
0,745
0,745 0,598 0,598
0,563
Circ,> cozinha = varanda > estar/jantar > qto1 > área de lazer > exterior > escritório> qto empregada > qto2
1,479 1,151
1,151
1,102
1,057 0,977
0,878
0,750
0,740
0,709
Circ, > s,jantar > cozinha > s,estar > qto1 > qto2 > exterior
1,626 1,273 1,171
1,045 0,887 0,887 0,496
Circ, > s, estar > cozinha > qto1 > qto2 > escritório > exterior
1,414 1,359
0,955 0,841 0,768 0,654
0,589
Estar/jantar > circ,> qto1 > cozinha > exterior > qto2
1,722
1,464 0,887 0,791
0,650
0,636
Jantar = circ, > cozinha > estar = qto1 > varanda > qto2 > exterior
1,250 1,250 1,184 0,938 0,938 0,833 0,804 0,643
Circ, > s,jantar = TV/Int > cozinha > estar > varanda > qto1 = qto2 > área de lazer > escritório > qto empregada > exterior
1,021 0,968
0,968 0,846
0,798 0,695 0,663 0,663 0,629
0,619
0,499
0,457
Circ, > cozinha > estar > qto1 = qto2 > s,jantar > varanda > qto, empregada > exterior
1,356 1,006 0,931 0,866 0,866 0,678 0,671
0,600
0,547
Varanda > estar > circ, > cozinha/copa > exterior > qto1 = qto2
1,962
1,681 1,239 1,177
0,759
0,736 0,736
Circ, > estar > copa > qto1 > qto2 > cozinha > exterior
1,757 1,387 1,146 0,976 0,909 0,850
0,538
Estar/jantar > circ, > cozinha > qto1 = exterior > qto2
1,327
1,206 0,737
0,664 0,664 0,492
Circ, > s,jantar > qto1 > TV/Int, > cozinha/copa > varanda > estar > área de lazer > qto emp, > escritório = exterior > qto2
1,308 1,206 1,080 1,020 0,919
0,860
0,844
0,761
0,749
0,737
0,737
0,698
Estar > circ, > cozinha > qto1 > qto2 > exterior
1,424 1,306 1,119 0,746 0,712 0,627
Circ, = s,jantar > estar > cozinha > area de lazer > TV/Int, > escritório > qto1 > exterior > qto2 > varanda > qto,
empregada
1,268 1,268 1,197 1,118
1,103
0,894
0,867
0,833 0,759 0,702 0,691
0,629
S, jantar > circ, > varanda > cozinha > estar > qto1 = qto2 > exterior > qto empregada
1,569
1,263 1,233
1,177
0,941 0,822 0,822 0,664
0,595
s, jantar > circ, > estar > copa > área de lazer > varanda = TV/Int, > cozinha > qto1 = qto2 > escritório > qto, emp,>
exterior
1,463
1,346 1,173 1,147 1,019
0,989
0,989 0,961
0,934 0,934 0,917
0,677
0,651
Circ, > s,jantar > cozinha > área de lazer > estar > qto1 > qto2 = escritório > copa = TV/Int, > qto, emp, > exterior >
varanda
1,273 1,096 0,913
0,906
0,869 0,863 0,720 0,720
0,646 0,646
0,621 0,600
0,558
Estar > circ, > copa > TV/Int,> cozinha > s,jantar > qto1 > escritório > área de lazer = exterior > qto2 > qto,empregada
1,327 1,185 1,071 1,046 0,916
0,898 0,787
0,735
0,705
0,705
0,640 0,630
Tabela 11 – Ordem de integração dos “principais” espaços
Ordem de integração
Sala > cozinha > quarto principal >exterior
Sala > cozinha > exterior > quarto principal
Sala > exterior > cozinha > quarto principal
Sala > Quarto principal > cozinha > exterior
Cozinha > sala > quarto principal> exterior
Imóveis
2, 4, 6, 7, 8, 10, 13,
14, 17, 23, 27, 28, 29
9,19, 21, 22, 25, 26, 3
1
5, 15, 20
12, 16, 18
Ocorrência
13
7
1
3
3
%
48,15
25,93
3,70
11,44
11,11
95
A seqüência “sala > cozinha > quarto principal > exterior” aparece em quase
50% dos casos, seguida pela seqüência “sala >cozinha > exterior > quarto principal”,
com quase 26% dos casos.
Essas duas seqüências mostram uma clara definição de
estrutura doméstica da amostra com as seguintes características: a) o forte investimento
nos espaços do setor social (sala de estar e jantar); b) a distância na relação com o
exterior, sinalizando uma fraca relação público/privado; c) o isolamento dos quartos
confirmando o seu status sempre diferenciado dentro da casa.
Em recente estudo sobre espaços domésticos no Distrito Federal, verificou-se
que essa seqüência também foi a predominante. Esse enfraquecimento da relação com
exterior pode “evidenciar a pouca importância da interface público/privado e a
tendência à interiorização das residências”177, sinalizando esta como uma das
características das casas em Brasília.
4.2.6. Grau de funcionalidade
No conjunto, as casas têm entre 1 e 17 espaços de transição ou circulação,
apresentando uma média de 5,5 para o conjunto da amostra. Já o número de espaços de
atividade variam entre 5 e 48, com uma média de 20. Os valores extremos são
encontrados nas casas 3 e 21. Essas casas exemplificam a diversidade da amostra, pois a
primeira tem 6 espaços convexos e a segunda 65 espaços. À primeira vista, é difícil
afirmar o que significam esses valores absolutos. Por isso, são melhores avaliados
quando relativizados para o número total de espaços convexos da casa, gerando o grau
de funcionalidade.
O grau de funcionalidade permite identificar se um sistema apresenta uma
orientação mais transicional ou uma orientação mais funcional. Um sistema com
orientação mais transicional indica uma configuração que investe forte nos espaços de
circulação, significando maior classificação dos espaços e de seus usos.
Os valores encontrados na amostra, conforme Tabela 8, indicam a casa 2 (com
0,67) e a casa 27 (com 0,93), respectivamente, com o menor e o maior grau de
funcionalidade. Se comparada à amostra de Amorim, a casa 27 supera a medida da casa
de Svenson (com 0,75), a mais funcional da amostra. A grande maioria, cerca de 70,4%
96
das casas dessa amostra, superam o maior índice de funcionalidade encontrado por ele.
Isso caracteriza o conjunto aqui estudado como tendo um layout de orientação mais
funcional que de transição, conforme a alta média do conjunto, de 0,79, em vista da
média das casas dos arquitetos em Recife, que é de 0,699. A Figura 15 ilustra um
sistema muito funcional, onde existe só uma circulação entre os quartos.
Segundo a hipótese, o alto índice de funcionalidade significa pouca
classificação/separação entre rótulos, ou seja, não existe a proliferação de espaços
mediadores entre os vários lugares da casa o que aumentaria a distância sintática entre
as categorias de usuários (habitantes, empregados e visitantes). Amorim chamou de
mediadores os espaços de circulação. Para ele, esses espaços são “uma típica
característica de casas modernas que é penetrantemente presente, controlando o acesso
de setor para setor, prevenindo encontros indesejáveis”178.
Figura 15 – casa 27
Portanto, o alto grau de funcionalidade da amostra indica, por um lado, que o
fato de não investir muito em espaços de transição como espaços mediadores, sugere
um investimento em espaços de atividades que façam esse papel de transição, por outro
lado, as casas da amostra apresentam uma características tipicamente não modernistas,
conforme Amorim. A Figura 16, exibe um dos sistemas mais transicionais da amostra.
177
FRANÇA, 1999, pág. 4.
97
Figura 16 – Casa6
4.2.7. Grau de fechamento
O grau de fechamento permite analisar a casa sob um outro aspecto, o da
acessibilidade relativa entre cômodos, isto é, a medida em que a casa se constitui como
sistema de espaços convexos que podem ou não ser isolados entre si por meio de portas
e paredes. Em outras palavras, se o layout é mais aberto ou compartimentado. As casas
16 e 19 são, respectivamente, as casas com configuração mais compartimentada e
menos compartimentada da amostra estudada.
Na casa 16, todos os cômodos são isolados por portas. A sala de estar, por
exemplo, é completamente isolada do restante da casa. Até o pequeno corredor, onde
encontra-se o banheiro social, possui porta. A cozinha é um espaço fechado que não se
abre nem para a sala de jantar. Até a área de serviço é fechada para o corredor lateral
externo, caracterizando este como um sistema altamente compartimentado.
178
No original: “Mediation, however, is a typical characteristic of modern houses that is pervasively
present, controlling access from sector to sector, and preventing, undesirable enconunters.”AMORIM,
2001, pág. 19.12.
98
Figura 17 a - casa 16
Já a casa 19, com o menor grau de fechamento, apresenta mais franco acesso
entre os cômodos: a abertura da cozinha para a sala de jantar, e dessa para a circulação
que leva diretamente à sala de estar, sem portas, fazem com que os espaços fechados se
reduza à área intima, os quartos. À primeira vista, poder-se-ia dizer que esse franco
acesso é devido à pequena escala da casa 19, com cerca de 100m2., mas verificando-se a
casa 9, com mais de 400m2 e a segunda com menor índice de fechamento, fica evidente
que a questão não é simplesmente em função de característica geométricas (no caso,
tamanho global da área construída), e sim de características topológicas.
Figura17b – casa 19
Na casa 9, o espaço da churrasqueira, por exemplo, é formado por dois espaços
convexos. A sala de estar/jantar forma um único espaço convexo e é aberta para o hall
de entrada, formando com este, dois espaços convexos abertos. Esse franco acesso entre
99
espaços do setor social reduz os espaços fechados à área íntima e à de serviço. Isto, em
proporção ao número total de espaços convexos, gera um baixo índice de fechamento.
As casas 19 e 9 - juntamente com as casas 2, 3, 6, 7, 10, 12, 15, 17, 21, 25, 26,
ou seja, quase 50% da amostra - são menos compartimentadas que a casa de Holanda,
com 0,40. Nenhuma casa da amostra é mais compartimentada que as casas do mercado
imobiliário inglês – 0,77, citadas por Hanson. Quase 40% da amostra são tanto ou mais
compartimentadas que as casas dos arquitetos londrinos – 0,42 em média, também
citadas por ela179.
Para Hanson, o baixo índice de fechamento das casas dos arquitetos de Londres
é resultado da complexidade de seus espaços. Segundo ela, “a maioria dos cômodos é
constituída por domínios espaciais mais complexos, feitos de uma mistura de espaços
funcionais e transições, e é isto que confere às casas dos arquitetos um grau de
peculiaridade que tanto contrasta com a configuração estereotipada e ‘em caixas’ de
muitas casas modernas da especulação imobiliária”180.
Entretanto, isto não é sempre assim. Para Holanda, o baixo índice de
fechamento de sua casa, por exemplo, não é devido à proliferação de espaços convexos
em cada cômodo, como sugeriu Hanson. Ao contrário, ele resulta da “minimização do
fechamento dos espaços [onde] a economia de elementos de circulação é grande, sendo
muitas delas incorporadas aos diversos cômodos”181.
Considerando que tanto Hanson quanto Holanda concluíram que os índices
encontrados por eles são baixos, o conjunto da amostra, apresenta-se pouco
compartimentado, já que a média é de 0,43. Por outro lado, como os argumentos de
ambos para esses baixos índices são diferentes, o que justifica esse valor para a amostra
em estudo?
No conjunto analisado, pode-se encontrar tanto exemplos próximos do que
Hanson sugeriu, quanto próximos às características citadas por Holanda. A casa 17, com
a complexidade de espaços convexos, se aproxima dos exemplos do primeiro caso. A
casa 26, por sua vez, apesar de não ter um pátio interno (como na casa átrio de
Holanda), tem a cozinha aberta para sala de jantar, que também é aberta para sala de
estar. Essa configuração minimiza o fechamento e dá uma característica próxima do
exemplo estudado por Holanda.
179
HANSON, 1998, pág. 230.
HANSON, 1998, pág. 230, citada por HOLANDA, 2000, pág.12.
181
HOLANDA, 2000, pág. 12.
180
100
Figura 18 – casa 17 - Planta de convexidade
A casa 3, é um misto das características apresentadas por Hanson e por
Holanda. Ela possui cômodos como, por exemplo, a sala1 (composta por quatro espaços
convexos) e vários espaços de circulação compostos por mais de um espaço convexo.
Isso dá uma maior complexidade ao espaço, como sugeriu Hanson. Essa residência tem
também o mezanino e o estar superior que são espaços de atividades e fazem papel de
circulação, aproximando-se do exemplo de Holanda.
Figura 19a – Planta baixa casa 3
101
Na casa 3, ao mesmo tempo em que existem espaços de atividades que servem
de passagem (economizando elementos de circulação), existem espaços de atividades,
compostos por vários espaços convexos (dando complexidade aos espaços). Ela tem,
portanto, espaços abertos por motivos diferentes, ora pela complexidade dos espaços
convexos, ora pelo franco acesso a outro ambiente.
Figura 19b – Planta de convexidade casa 3
Na amostra estudada, com baixo índice de fechamento, chama a atenção o
fechamento da cozinha. De maneira geral, as cozinhas são espaços isolados
sintaticamente do sistema por meio de portas e paredes. De fato, em 24 casos, cerca de
88,89% dos casos, a cozinha não tem abertura nem para a sala de jantar. Somente em
um caso, a casa 26, encontra-se a chamada cozinha americana, como já foi mencionado.
Nas demais casas, só são abertas para a copa e, na grande maioria, são fechadas para os
outros cômodos da casa.
De maneira geral, as residências têm baixo grau de fechamento pela
predominância da abertura do setor social, especialmente, sala de estar e jantar, cerca de
55% da amostra. A existência de várias varandas, como espaços convexos abertos,
também auxiliam numa configuração pouco fechada. Embora sejam abertas na grande
maioria, as salas de estar em alguns casos, formam espaços convexos distintos das sala
102
de jantar, como no caso das salas em “L”. Isto é, são espaços “recortados”
configuracionalmente de maneira a definir melhor os ambientes entre si. A casa 10 é um
bom exemplo desse tipo de configuração espacial (ver casas 18 e 22 – Anexo 3).
Em síntese, esta amostra parece sugerir que a distinção feita por Holanda não é
muito importante, pois as duas estratégias para se conseguir maior fluidez espacial
encontram-se indistintamente utilizadas. Curioso mesmo é notar que um dos atributos
tidos como típicos de uma arquitetura moderna mais erudita – aquela fluidez – foi
aparentemente incorporado numa amostra mais “vernacular” como esta, ainda que num
recorte de classe social específico.
Figura 20 – casa 10 – Planta baixa e Planta de convexidade
103
Conclusão
As informações relativas à configuração espacial das residências, segundo as
variáveis analíticas, indicaram algumas características do conjunto:
a) Esses sistemas são bem integrados e muito entrópicos, significando que
são
configuracionalmente propícios a um intenso convívio entre as pessoas, uma vez
que não existem espaços muito segregados e outros muito integrados.
b) Os sistemas mostram-se pouco distributivos e pouco simétricos. A baixa
distributividade indica que, de maneira geral, esses sistemas criam mecanismo de
controle do acesso aos diversos cômodos das residências. Por outro lado, os baixos
índices de simetria caracterizam essas estruturas domésticas com forte indício de
formalidade, classificando os vários papéis e atividades no espaço. Juntas,
significam aumento da privacidade local, ainda que mantendo, pela alta integração,
facilidade de contato global.
c) As características anteriores, aliadas ao fato desses sistemas serem funcionais (alto
índice de funcionalidade), sinalizam para a possibilidade de existirem espaços de
atividades que são mediadores do acesso de um espaço para outro, como estratégia
de controle.
d) Os sistemas, pela ordem de integração das casas, isolam-se de maneira explícita em
relação ao espaço público, sinalizando pouca relação entre esses dois “mundos”. A
segregação do exterior nos sistemas é tão grande quanto a segregação dos espaços
destinados aos empregados. Esse isolamento indica uma tendência à formalidade
dessas casas, pois pode, por um lado, dificultar o acesso de visitantes e, por outro,
estabelecer grandes distinções na relação com os empregados. A ordem de
integração mostrou também o forte investimento desses sistemas nos espaços dos
setores social e de lazer, que estão entre os espaços mais integrados.
Como essa configuração suporta o cotidiano das diversas categorias de usuários
nesse espaço, segundo informações do capítulo 3, será melhor compreendido no
próximo capítulo, quando será feito o cruzamento das informações configuracionais,
com o uso e ocupação dessas residências.
104
Capítulo 5 – Espaço doméstico: morfologia e modo de vida
O estudo da ocupação e utilização dos espaços, feito no capítulo 3, permitiu
identificá-los em relação às preferências de seus habitantes. Essas preferências
revelaram o conjunto de espaços destinados à cada função: receber visitas, fazer
refeições, descanso e lazer. O estudo da configuração das residências, feito no capítulo
4, permitiu entendê-lo como um sistema de relações espaciais.
Este capítulo destina-se a caracterizar espacialmente o modo de vida através do
cruzamento dos dados dos capítulos anteriores. Em primeiro lugar, isto será feito
considerando os espaços de forma individual, conforme foi apresentado no capítulo 3.
Essa caracterização sintática específica dos principais cômodos permitirá evidenciar a
sua importância na configuração, aliada às informações de utilização e função. Em
segundo lugar, será feita uma leitura do complexo como um todo.
5.1 - Os espaços - seus usos e suas medidas sintáticas
5.1.1. A cozinha
De acordo com os dados dos questionários e entrevistas, um dos espaços
preferidos das famílias é a cozinha. É o espaço coletivo de maior tempo de permanência
dos moradores da amostra. Em termos sintáticos, no sistema como um todo, a cozinha é
um dos espaços mais bem integrados, estando em mais de 78% dos casos acima da
média de integração das casas. Essa é uma das características morfológicas que bem
suportam a ampla utilização desse espaço pelas pessoas da amostra.
Outra característica constatada desse espaço foi a sua bi-permeabilidade. Esse
aspecto é melhor entendido quando se verifica que a cozinha está presente, na grande
maioria dos casos, em um dos anéis de permeabilidade das casas. Geralmente, está no
anel formado pelos espaços do setor social (sala de jantar e estar) e os espaços do setor
105
de serviço (área de serviço, quintal). Isso é mostrado pelos grafos de permeabilidade,
por exemplo, das casa 7 e 17. Esse dado é confirmado pelo fato da cozinha ser do tipo
“c”, em
cerca de 62% dos casos. É um espaço que têm características mais
distributivas, conforme visto anteriormente.
O fato da cozinha ser espaço mais integrado revela uma mudança na
configuração das casas contemporâneas em relação às casas típicas da arquitetura
doméstica colonial, onde as cozinhas eram segregadas espacialmente182. Nos grafos de
permeabilidade é possível visualizar também que sua profundidade sintática em relação
ao exterior é, em mais de 59% entre os níveis 3 e 4. Esses níveis são pouco profundos se
comparados aos espaços do setor social como sala de jantar e sala de estar, também
localizados nesses níveis. No restante, em mais de 40%, estão a 5 ou 6 passos sintáticos
do exterior. Nesse sentido, os extremos são as cozinhas das casas 13 e 20, onde elas
estão no nível 6, máximo de profundidade dessas casas, junto com os quartos e
banheiros, os espaços mais profundos desses sistemas.
Outra característica sintática das cozinhas é o seu fechamento, conforme visto no
capítulo 4. Esse fechamento é um indicativo da estratégia usada para isolar, tanto em
termos de acessibilidade como de visibilidade, este espaço do restante do sistema. Uma
vez que ela é pouca profunda em relação ao exterior (estando em alguns casos no
mesmo nível das salas de estar), o artifício é utilizado para isolar a cozinha dos espaços
mais usados para receber visitantes, dando assim uma relativa privacidade ao espaço de
convívio da família. Isso revela uma dicotomia entre o formal e o informal nas casas,
pois assim, espacialmente separados, esses espaços evidenciam a classificação das
atividades e não permitem a superposição delas, mesmo em momentos diversos.
Na única casa em que se encontra a cozinha aberta para a sala de jantar (casa
26), a proprietária, ao ser questionada sobre o que mais gosta na casa respondeu: “da
cozinha americana, gosto de receber as pessoas na cozinha...”. Nessa casa a cozinha é
tida como sinônimo de status, uma vez que existe uma segunda cozinha, montada
juntamente com a área de serviço, que é mais usada no dia-a-dia pela empregada,
conforme declarou a proprietária, enquanto a cozinha americana é usada mais
freqüentemente por ela.
182
Trigueiro concluiu, que as cozinhas eram tão segregadas quanto o alojamento dos escravos, por serem
espaços reservados aos serviçais. Para ela, “a rua é extremamente segregada como também o são todos os
espaços reservados a atividades que pressupõem a presença de estranhos ou serviçais – loja, quarto de
hóspedes homens, cozinha, alojamento de escravos. TRIGUEIRO, 1995, pág. 6.
106
Essa característica peculiar da cozinha encontrada na casa 26 remonta às
cozinhas da casa colonial paulistana do início do século XIX, descritas por Lemos.
Segundo ele, a “extroversão” da cozinha ainda permanecia, fazendo surgir a chamada
cozinha “de fora” ou cozinha “suja”, o lugar onde o serviço grosso era feito183. Neste
caso específico, dois aspectos chamam a atenção: primeiro, o caráter simbólico dado à
cozinha (“de dentro”), um lugar de representação para os visitantes; segundo, revela
uma maior distância social entre patrões e empregados. Ambos os aspectos reforçam o
status social dado à cozinha nessa casa.
Tantos os aspectos peculiares da casa 26, quanto as demais características desta
amostra, indicam as mudanças configuracionais nos sistemas estudados, em face das
residências coloniais ou modernas estudadas por outros autores. As características da
cozinha nessas casas, como sua alta integração e sua pouca profundidade em relação ao
exterior, mostram a importância e o status desse espaço dentro da estrutura doméstica
contemporânea, diferentemente das casas coloniais.
Por outro lado, essas mudanças indicam ainda que a cozinha não assumiu as
funções concebidas na proposta modernista. Ao se manterem como o lugar de convívio
e interação entre os membros da família, as cozinhas da amostra deixam de ser espaço
estritamente funcional, como proposto pelo Movimento Moderno.
5.1.2. Quartos
Diferente das cozinhas, os quartos são, em cerca de 89% dos casos espaços tipo
"a" (49%) ou "b” (40%). Esses espaços têm, portanto, características não-distributivas,
formando estruturas em árvore. Essa estrutura ramificada evidencia o controle do acesso
a esses espaços, favorecendo assim a sua segregação e dificultando, ou mesmo
impedindo, o acesso por parte de pessoas externas ao grupo familiar.
Essa segregação abrange todos os quartos da casa, desde os quartos usados pelos
habitantes até os quartos de empregada. No sistema como um todo, os quartos estão
183
“Enquanto não houver prova em contrário, podemos perfeitamente dizer, com base nos fatos sabidos e
análise dos aspectos sociais da época, que a cozinha “de fora” da casa paulista sempre foi a verdadeira
cozinha, a que sempre existiu e que as novas condições econômicas, principalmente, sugeriram ou
toleraram a segunda cozinha, a “de dentro”, aquela freqüentada inclusive pelo patrão, pelo chefe...”.
LEMOS, 1978, pág. 102.
107
entre os espaços menos integrados da casa (ver Tabela 12). Na grande maioria, cerca de
76%, estão abaixo da média de integração das residências e com poucas exceções,
aparecem acima da média, revelando bem a estratégia morfológica de isolamento desses
espaços. Os quartos só estão acima do índice de integração dos banheiros, dos
roupeiros, do exterior e do quarto de empregada, que são os espaços mais profundos e
segregados das casas analisadas.
A segregação espacial desses cômodos corresponde ao seu isolamento social.
Essa segregação espacial junto com as informações de uso como, por exemplo, o
superequipamento desses espaços (televisores, computadores, som, aparelhos de
ginásticas) e sua multifuncionalidade, como vimos no capítulo 3, confirma o seu status
nas estruturas domésticas das casas da amostra. Mais do que isso, esse isolamento
espacial confirma a busca, cada vez maior, por privacidade. Em entrevista com a
moradora da casa3, a casa mais segregada de toda amostra, ela disse: “até pra comer nós
usamos o quarto, no quarto nós temos tudo...”.
A grande quantidade de espaços tipo ‘b’, quanto aos quartos, é explicada pela
forte presença das suítes que caracterizam o conjunto. Nesses casos, o quarto faz o papel
de distribuidor, ou seja, dele se pode ir para o banheiro ou para o roupeiro e, em
algumas casas, também para a varanda. Desta maneira, esses espaços formam o
complexo mais segregado das residências, e também os mais profundos, considerandoos a partir do exterior, o que é coerente com estratégia de isolamento desses espaços.
O elevado número de suítes na amostra, dando conforto e individualidade aos
moradores, como vimos no capítulo 3, e a sua segregação espacial, indicam possível
mudanças das relações no núcleo familiar. Por um lado, a generalização desse conforto
aos demais membros do grupo familiar, não se restringindo aos donos da casa (em
grande parte da amostra), indica que não há mais essa grande diferença de status
interno.
Por outro lado, o fato dessas suítes (independente de serem dos donos) estarem
no mesmo nível de profundidade em relação ao exterior (em alguns casos o quarto do
casal é menos profundos que o dos filhos – casas 12) e igualmente segregadas (abaixo
da média de integração) na maioria absoluta, sinalizam o processo de enfraquecimento
do domínio patriarcal, característico da família nuclear brasileira do passado184.
184
TRIGUEIRO, 1995, pág. 6 e 7.
108
Os quartos de empregada, por sua vez, encontram-se abaixo da média de
integração, em todas as casas, sem exceção. Essa baixa integração reproduz a
segregação da área destinada aos serviçais, como observou Trigueiro185. Embora
segregados, como nos sobrados coloniais, eles podem ser divididas em dois grupos; a)
segregados e profundos em relação ao exterior – sendo na maioria tão profundos quanto
os quartos dos habitantes ou salas de TV e Íntima - (mais de 55% dos casos); b)
segregados mas não tão distantes relativamente ao exterior, como o eram nos sobrados
coloniais, referidos por Trigueiro - (cerca de 44,5%).
Essas duas situações indicam, por um lado, que algumas casas carregam ainda
características encontradas nos antigos sobrados coloniais. Por outro, denota uma nova
relação entre empregados e patrões, sugerindo maior autonomia dos primeiros em
relação aos últimos, na medida em que empregados são menos controlados pelos
patrões, em face do âmbito público (isto é, do espaço ‘exterior’, ou da ‘rua’, conforme
DaMatta). De qualquer maneira, ambas situações indicam também, a pouca inserção dos
serviçais no contexto social das residências.
5.1.3. Salas de estar e estar/jantar
Os dois principais espaços do setor social: as salas de estar e jantar, embora na
maioria dos casos sejam espaços abertos um para outro, podem ser encontrados em
espaços convexos distintos - só sala de estar e só de jantar - ou no mesmo espaço
convexo, no casos das salas de estar/jantar. Por isso, embora tenham as mesmas
características sintáticas, para efeito estatístico elas foram divididas em três categorias:
a) estar/jantar; b) estar; c) jantar.
As salas de estar/jantar aparecem na amostra em cerca 37% dos casos, e estão
acima da média de integração das casas em todos os casos. Juntamente com a sala de
estar são os lugares mais usado para receber visitantes, conforme dados dos
questionários. Por outro lado, são os lugares de menor tempo de permanência da
família, como vimos.
A sala de estar, aparece em 17 casas, sintaticamente ela é espaço muito
integrado, estando em cerca 94% dos casos acima da média dessas residências. Na
amostra, como um todo, é o espaço de atividade mais integrado em mais de 59% dos
185
TRIGUEIRO, 1995, pág. 6.
109
casos. Essa alta integração da sala de estar confirma, sintaticamente, esse espaço como o
mais importante espaço do setor social.
A sala de estar juntamente com estar/jantar, são, em 87% dos casos, espaços do
tipo ‘c’ ou ‘d’, isto é, são espaços distributivos, pertencentes a anéis de permeabilidade,
ora em anéis que se formam unindo-os aos espaços do setor de serviço, ora compondo
anéis com os espaços do setor social e de lazer. Em alguns casos, ocorre em ambos.
Essa bi-permeabilidade da sala e sua alta integração, a caracteriza como espaço de fácil
acessibilidade, tanto local como globalmente.
As salas de estar e estar/jantar são também os espaços menos profundos em
relação ao exterior. São mais profundos somente em relação às garagens, varandas,
jardins e os halls de entrada. Encontram-se na grande maioria – (cerca de 77%) nos
níveis 3 e 4 de profundidade em relação ao exterior, conforme pode-se ver, por
exemplo, no grafo justificado da casa 12.
Figura 21 - Casa 12 – Plantas e grafo justificado
Entretanto, se comparada às casas coloniais, onde as salas eram, normalmente,
no nível 2 ou 3, essa profundidade em relação ao exterior aumentou. Para se ter uma
idéia do distanciamento em relação ao exterior, para chegar à sala de estar, uma pessoa
irá encontrar, normalmente, o jardim, um hall externo, e o hall de entrada ou vestíbulo,
como espaços mediadores e, portanto, como artifícios de distanciamento da casa do
exterior.
110
Esses espaços também têm a característica de ser lugar aberto, ou seja, não são
isolados dos demais cômodos por portas e paredes. Na grande maioria, cerca de 85%
dos casos, a sala de estar é aberto para a sala de jantar ou para a sala de TV, como nas
casas 8 e 1. Em outros casos são abertas para as circulações. O caso extremo acontece
na casa 16, um bom exemplo de espaço fechado, onde a sala de estar é fechada até para
a circulação por meio de uma porta.
O fato desse espaço ser pouco usado pelos habitantes não é devido à segregação
desse em relação aos demais espaços da casa. Pelo contrário, na maioria absoluta dos
casos, é espaço altamente integrado, sendo aberto, distributivo e raso em relação ao
exterior. Seu pouco uso, portanto, não está relacionado à configuração, mas a regras e
convenções que se superpõem aos padrões espaciais, negando sua potencialidade copresencial. Voltarei a comentar este aparente paradoxo.
5.1.4. Sala de Jantar
Sintaticamente, a sala de jantar é o segundo espaço mais integrado do setor
social. Das 17 casas em que aparece, está acima da média de integração das casas em
cerca de 88%. Juntamente com a sala de estar e estar/jantar, é o espaço de atividades
com maior integração e os menos profundos dos sistemas, estando localizados nos
níveis 3 e 4 de profundidade em relação ao exterior.
Esse espaço tem a característica de ser bi-permeável, sendo na maioria dos
casos, tipo ‘d’. É o espaço que está em dois anéis, geralmente em - a) um anel que o liga
aos demais espaços que compõe o setor social (sala de estar, varandas), as quais em
muitos casos são ligadas também à área de lazer); e b) um outro anel que se liga à
cozinha e aos demais espaços do setor de serviço.
Ou seja, essa alta integração e pouca profundidade das salas de jantar, assim com
as salas de estar, as coloca como espaço muito acessível, tanto para visitantes, como
para atividades coletivas da família. No entanto, seu pouquíssimo uso, por parte dos
habitantes, e para receber visitantes só em ocasiões especiais, caracteriza-a como espaço
estritamente formal.
111
5.1.5. Sala de TV e Sala íntima
A sala de TV e a sala íntima têm, como visto anteriormente, praticamente a
mesma função. De acordo com dados do questionário, em ambas pode-se encontrar
televisores, aparelhos de ginásticas e aparelhos de som. Juntas elas estão presentes em
mais de 51% da amostra sendo que algumas casas possuem os dois espaços (o caso das
casas 3, 5, 8, 6 e 22). Sintaticamente, elas apresentam algumas características muito
parecidas e algumas diferenças, como se segue.
Em comum, o fato de serem espaços bem integrados e mais profundos em
relação ao exterior. A sala de TV, está presente na amostra em cerca de 10 casas, ou seja
aproximadamente 37% do conjunto. Dessas, oito estão acima de média de integração,
ou seja, cerca de 80% dos casos. Quanto à sala íntima, das nove ocorrências, 77% estão
acima da média de integração das casas. Tanto a sala de TV quanto a sala íntima são
espaços muito integrados nos sistemas estudados. Outra característica sintática dessas
salas é sua profundidade, pois cerca de 80% delas estão acima do nível 4. A maioria está
entre os níveis 4 e 7, mas há casos de salas íntimas encontradas até no nível 11 de
profundidade sendo, portanto, mais profundos que outros espaços do setor social.
Entre as diferenças sintáticas, estão o fato das salas íntimas serem
mais
caracterizadas como espaços tipo ‘c’, enquanto as salas de TV’s são mais do tipo ‘b’.
Ou seja, uma encontra-se em anel, enquanto a outra favorece mais estruturas em árvores
e segregadas. Isso acontece porque as salas de TVs, em grande parte, fazem o papel de
ligação entre o setor social e o íntimo, e as salas íntimas - embora também possam ser
encontradas no mesmo nível de profundidade das salas de TVs e também fazer a função
de ligação entre esses dois setores – têm a característica de formar um anel com quartos
e varandas. Ambas, no entanto, são os espaços coletivos reservados à família.
Nos grafos de permeabilidade fica claro que essas salas marcam a divisão, na
maioria dos casos, da estrutura doméstica das casas em dois blocos: a) um bloco
formado pelos espaços do setor íntimo; b) um bloco formado pelos espaços do setor
social e de serviço. Isso é visível nos grafos justificados das casas 2, 3, 4, 5, 8, 10, 17,
22, 25 e 29, onde o primeiro bloco tem a formação em árvore e o segundo é anelar
(Anexo 3). Isso contribui para o alto grau de funcionalidade encontrado para o conjunto
(ver capítulo 4), pelo que espaços de atividades são também usados como
mediadores/circulações.
112
As salas de TV e íntima são indicadas como o terceiro espaço de maior tempo de
permanência da família, e como os espaços reservados para atividades coletivas dos
habitantes das residências da amostra. Por outro lado, foram indicados como o terceiro
espaço usado para receber visitantes. Isto significa que esta superposição categórica
habitante/visitante é coerente com sua característica sintática de transição entre o setor
social e o setor íntimo.
5.1.6. A Varanda
As varandas estão presentes em mais de 70% das casas da amostra, num total de
41 varandas. Isso representa uma média de 1,5 varanda por casa, número significativo
que confirma a forte presença desse elemento na composição das residências do
conjunto analisado. Elas podem ser encontradas tanto junto aos quartos, como também,
próximas às salas de estar e jantar e ainda junto à área de lazer.
Quando encontradas junto aos quartos, esses espaços são profundos em relação
ao exterior, geralmente os mais profundos espaços do complexo, juntamente com os
banheiros e os roupeiros. Para se ter uma idéia dessa localização, das 41 varandas, cerca
de 30%, estão acima do nível 7 de profundidade e são tipicamente do tipo 'a' e 'b',
constituindo o topo das estruturas em árvore, típicas do setor íntimo das casas.
A grande maioria das varandas, no entanto, está localizada em níveis pouco
profundos, com relação ao exterior, variando de 2 a 6 níveis, sendo que 90% estão
localizadas entre os níveis 2 e 4. Elas constituem espaços do tipo ‘c’ e ‘d’, sendo que
45% são do tipo ‘d’, ou seja, pertencem a mais de um anel de permeabilidade.
Elas estão localizadas em anéis unindo espaços do setor social (como sala de
estar e jantar) a espaços da área de lazer. Sua pouca profundidade, é coerente com sua
utilização para receber visitantes (ver casas 8, 12, 3, 10, 9,17, 5). Esse espaço é,
também, o segundo na lista dos espaços menos utilizados pela família (ver Tabela 2).
Novamente, têm-se, por um lado, a clara definição entre os espaços destinados à família
e aos visitantes e, por outro, o fato de que não é a segregação desse espaço no sistema
configuracional que o faz ser pouco usado pelos moradores.
113
5.1.7. Escritório
O escritório está presente em cerca de 60% na amostra. Sintaticamente é um
espaço pouco profundo, e geralmente encontra-se no mesmo nível das salas de estar,
jantar e do lavabo, variando entre os nível 3 e 6 de profundidade em relação ao exterior.
Nos casos mais profundos, estão próximos às salas íntimas e de TV. Apenas em dois
casos os escritórios estão localizados junto aos quartos. O nível mais profundo é
encontrado na casa 28, onde o escritório está no nível 9, formando anel com os quartos.
O outro nível mais profundo é encontrado na casa 17, um sistema dos mais profundos
da amostra, com 13 níveis. Nesse caso, o escritório está localizado no oitavo nível desta
residência.
Embora pouco profundo em relação ao exterior, os escritórios são espaços
segregados. Dos dezoito casos, cerca de 77% estão abaixo da média de integração das
casas. Não costumam fazer parte de anéis, sendo espaços terminais em mais de 83% dos
casos. O isolamento do escritório é coerente com sua pouca utilização, como foi
constatado no capítulo 3. Além dessa subutilização pelos membros da família, esse
cômodo foi o segundo espaço citado como lugar onde o visitante geralmente não tem
acesso. Marginal tanto em termos configuracionais como ocupacionais, esses dados
sugerem que o escritório está perdendo a sua função, sendo ainda mantido apenas como
um sinal de status, como comentado no capítulo 3.
5.1.8. Área de lazer
A área de lazer, conforme já mencionado, é o complexo geralmente formado por
piscina, churrasqueira, jardins e quadras de esportes. Esse conjunto compõe a área
externa da casa, normalmente ocupando os fundos ou a parte lateral do lote. Ele está
presente em mais de 59% da amostra e contribui para o aumento da integração dos
sistemas analisados, isto é, na presença da área de lazer, espaços como salas de estar, de
jantar e, em alguns casos, até quartos, são abertos para essa área “externa”. Essas
ligações criam mais um anel de permeabiliade nas residências estudadas.
114
Nas casas que têm áreas de lazer, é comum formarem-se pelo menos três anéis
envolvendo esse espaço: a) um dos anéis liga essa área a espaços do setor social,
principalmente, salas de estar e jantar; b) outro anel liga-a aos espaços do setor de
serviço e c) um terceiro anel é criado em torno da casa, através do quintal. Isso é visível,
por exemplo, nas casas 29, 5,10, 8, 9 e 17.
Esses anéis contribuem para sua pouca profundidade (entre o segundo e o quarto
nível em relação ao exterior), assim como para sua alta integração. Em mais de 73% das
ocorrências, a área de lazer é menos profunda ou igual à sala de estar, estando
localizadas nos níveis 2 e 3 de profundidade. O franco acesso à área de lazer é
favorecido pelas rotas feitas através dos quintais e jardins das casas. A ausência de
barreiras físicas facilitam o uso desse espaço para recepcionar visitantes de maneira
menos formal.
Segundo dados dos questionários, a área de lazer é o espaço destinado a grandes
recepções, como festas dançantes ou churrasco. Mais de 67% das respostas deram a ela
essa função, em vez da área interna da casa. Nesse sentido, a área de lazer também está
incluídas entre os espaços usados para receber visitantes, o sexto espaço mais citado.
Por outro lado, esse espaço nem consta da lista dos espaços de maior permanência da
família (ver Tabela 1), estabelecendo novamente a distinção entre locais acessíveis a
visitantes e lugares para os habitantes.
5.1.9. O Exterior
A relação das casas com o exterior (rua) é expressa pela medida de integração
desse espaço. Essa medida está abaixo da média de integração dos sistemas em 92,59%
dos casos, indicando a forte segregação desse espaço. Somente nas casas 3 e 8 esse
índice encontra-se acima da média.
A segregação fica evidente quando do estudo da ordem de integração das
residências. A seqüência sala > cozinha > quarto principal > exterior é predominante no
conjunto, com mais de 48,5%, sendo o exterior ainda menos integrado que o quarto
principal. Essa pouca integração com o exterior sugere a pouca importância dada à
relação entre público e privado, e aponta para a instrospecção da vida familiar nesta
amostra.
115
Diante dessa caracterização dos espaços de atividade, entendendo seus usos e
status dentro dos espaços domésticos, é possível identificar algumas características
predominantes nos sistemas dessa amostra. O gráfico 3, mostra os espaços comuns a
todos os sistemas, que foram mencionados na análise, agrupados segundo as suas
medidas de integração, da maior para a menor medida. No gráfico 4, estão os demais
espaços citados na análise, também agrupados como no gráfico 3. Esses gráficos, dão
um perfil morfológico do conjunto, indicando uma tendência da amostra, quanto a sua
organização espacial.
Espaços comuns a todos os sistemas
2
casa 1
casa 3
casa 5
casa 7
casa 9
casa 12
casa 14
casa 16
casa 18
casa 20
casa 22
casa 25
casa 27
casa 29
1,8
1,6
Integração
1,4
1,2
1
0,8
0,6
0,4
0,2
0
Circ.
Estar
Cozinha
Qto 1
Qto 2
casa 2
casa 4
casa 6
casa 8
casa 10
casa 13
casa 15
casa 17
casa 19
casa 21
casa 23
casa 26
casa 28
Média
Exterior
Demais espaços
2,2
2
casa 1
casa 3
casa 5
casa 7
casa 9
casa 12
casa 14
casa 16
casa 18
casa 20
casa 22
casa 25
casa 27
casa 29
Integração
1,8
1,6
1,4
1,2
1
0,8
0,6
0,4
0,2
0
Jantar
Varanda
copa
TV/Int.
Lazer
Escrit.
casa 2
casa 4
casa 6
casa 8
casa 10
casa 13
casa 15
casa 17
casa 19
casa 21
casa 23
casa 26
casa 28
Média
Qto
emp.
116
Tabela 12 - Integração do cômodos
Imóvel
Cômdos
Sala
Circ.
Jantar
Estar
Varanda
Cozinha
TV/Int.
casa 1
1,267
1,559
1,053
0,932
0,737
casa 2
1,01
0,766
1,046
0,936
0,766
0,753
0,908
0,765
0,816
casa 3
1,014
0,671
0,687
0,504
casa 4
1,442
1,04
1,173
1,097
1,328
casa 5
1,077
1,161
1,496
0,983
1,333
0,917
0,943
casa 6
1,097
1,16
1,277
casa 7
1,256
0,891
1,417
0,995
0,911
1,01
casa 8
casa 9
1,327
casa 10
casa 12
1,522
1,101
1,102
casa 13
1,242
0,969
1,273
1,045
1,479
1,626
1,087
copa
0,58
0,863
Lazer
0,88
0,704
0,919
0,889
1,064
1,151
Escrit.
0,969
1,151
Exterior
Qto emp.
0,881
0,881
0,863
0,803
0,78
0,871
0,601
0,747
0,529
0,601
0,668
0,772
0,678
0,73
0,562
0,666
0,436
0,97
0,737
0,814
0,737
0,696
0,677
1,513
1,202
0,847
0,997
0,761
0,863
1,121
0,651
0,737
0,635
0,601
0,58
0,825
0,863
1,005
0,924
Qto 2
0,954
1,083
1,161
Qto 1
0,771
0,728
0,675
0,511
0,884
0,837
0,714
0,837
0,868
0,709
0,821
0,745
0,745
0,598
0,598
0,563
1,057
0,75
0,74
0,977
1,171
0,887
0,654
0,709
0,878
0,887
0,496
0,768
0,589
0,626
casa 14
1,359
1,414
0,955
0,841
casa 15
1,722
1,464
0,791
0,887
0,636
0,65
0,938
0,804
0,643
0,663
0,457
0,499
0,6
casa 16
1,25
1,25
0,938
0,833
1,184
casa 17
1,021
0,968
0,798
0,695
0,846
1,356
0,678
0,931
0,671
1,006
0,866
0,866
0,547
1,962
1,177
0,736
0,736
0,759
casa 18
casa 19
1,681
1,239
casa 20
1,387
1,757
0,85
casa 21
1,327
1,206
0,737
casa 22
casa 23
1,308
1,424
1,206
0,844
0,86
1,306
0,919
0,968
0,629
1,146
0,663
0,976
0,909
0,538
0,664
0,492
0,664
0,737
0,698
0,737
0,712
0,627
0,867
0,702
0,759
0,822
0,664
0,595
1,02
0,761
1,08
0,894
1,103
0,833
1,119
0,619
0,746
0,749
casa 25
1,268
1,268
1,197
0,691
1,118
casa 26
1,263
1,569
0,941
1,233
1,177
casa 27
1,346
1,463
1,173
0,989
0,961
0,989
1,147
1,019
0,934
0,917
0,934
0,651
0,677
casa 28
1,273
1,096
0,869
0,558
0,913
0,646
0,704
0,906
0,863
0,72
0,72
0,6
0,621
0,916
1,046
1,071
0,705
0,787
0,735
0,64
0,705
0,63
0,993
0,961
0,947
0,932
0,924
0,839
0,763
0,739
0,664
0,647
casa 29
Média
1,385
1,185
0,898
1,327
1,264
1,115
1,038
0,822
0,629
5.2. Os sistemas e o modo de vida
Diante das evidências sobre uso dos espaços e suas características sintáticas, a
clara distinção entre habitantes e visitantes é visível na configuração dos sistemas
estudados. Estes últimos podem ser classificados, a grosso modo, em dois tipos: a)
sistemas compostos por uma forte estrutura em árvore do setor íntimo em contraste com
a estrutura bem anelar que integra os setores social, de serviço e de lazer; b) sistemas
com estrutura tipicamente em árvore em todos os setores, ou que possuem, no máximo,
um anel. Nos dois grupos, existe uma constante: o isolamento espacial dos espaços
destinados aos aposentos dos moradores das residências analisadas.
Entre as casas que compõem o grupo b, chamam a atenção as casas 7, 13, 18, 20
e 14, que possuem um único anel formado pelo acesso principal e o de serviço. No
sistema formado pela casa 7 encontra-se um segundo anel, mas este é formado por uma
construção anexa, enquanto a casa 21 é uma típica estrutura em árvore, já que o único
anel existente é formado por espaços externos à casa, os quintais.
A grande maioria das residências, mais de 77% dos casos da amostra, faz parte
do primeiro grupo. Nestas casas, o número de anéis formado pelo setor social, de
serviço e de lazer dá a estas uma permeabilidade muito grande. Se por um lado, esses
setores são muito permeáveis, dando uma característica anelar ao sistema, por outro,
contrastam com a estrutura em árvore formado pelo setor íntimo (ver Anexo 3).
O controle do acesso ao setor íntimo é muito evidente. Geralmente só se tem um
único acesso, o qual é feito através dos espaços de circulação. Às vezes, este acesso se
dá por mais de um espaço convexo de circulação, o que aumenta a segregação desse
setor em relação ao setor social (ver casas 1 e 6). Em outros casos, o acesso é feito só
através das salas de TV ou íntima (ver casas 4 e 5). Nestes casos, estas salas fazem o
papel de circulação em direção aos quartos. Há situações que usam os dois recursos, ou
seja, circulação e sala íntima ou de TV, como é o caso das casas 8 e 17.
As salas de TV e íntima - assim localizadas próximas aos quartos – funcionam
como espaços de transição entre uma estrutura anelar e outra em árvore. Esses espaços,
juntamente com as circulações, fazem o papel de controladores do fluxo de pessoas para
as áreas mais isoladas do sistema. Segundo Amorim, “o acesso controlado determina
uma clara identificação da fronteira do setor, cruzar essa fronteira sem permissão pode
ser entendido como uma transgressão do código de comportamento social”186.
Isso explica porque as salas de TV e íntima são pouco usadas para receber
visitantes, como já foi mencionado. Somente as pessoas mais íntimas chegam a esses
cômodos. Estas salas são, portanto, elementos muito importantes na estrutura das casas
estudadas. São localizadas de maneira que estabelecem fronteira entre os setores,
resguardando assim a privacidade da família. Dessa forma a configuração dessas
residências revelam uma estrutura com características, ao mesmo tempo, informais
(quando do franco acesso aos espaços do setor social) e formais (na restrição aos
espaços dos setor íntimo).
Do ponto de vista da relação entre membros do núcleo familiar e pessoas extragrupo, essa fronteira indica que alguns espaços têm seu uso limitado para estes últimos.
Os espaços como sala de estar, jantar, varandas e área de lazer são espaços reservados
aos visitantes, uma vez que são pouco usados pelos habitantes, enquanto as salas de
TV/Íntima, como misto de espaços para visitantes e habitantes, são mais segregadas.
Os espaços do setor social são muito integrados e formam um complexo anelar
envolvendo também o setor de serviço e lazer. Aqui um paradoxo em face da literatura
existente, pois os espaços mais integrados dos sistemas, não são os espaços mais usados
pelos habitantes e sim reservado aos visitantes. Hanson, por exemplo, comentou como a
formalidade do “parlour” nas residências da classe trabalhadora inglesa, pela qual este
espaço somente é utilizado em momentos muito especiais, coincide com sua enorme
segregação.187
A estratégia configuracional detectada na localização da sala de TV e íntima,
como espaços mediadores (além das circulações) pode sinalizar ainda mais uma divisão
da estrutura doméstica que corresponde ao modo de vida nessas casas. Além da
separação entre espaços para visitante e habitantes, há uma divisão entre os cômodos
destinados aos habitantes. Basicamente, as dependências mais usadas coletivamente por
estes são a cozinha e salaTV/íntima. A cozinha é, entre estes, o espaço com acesso
menos controlado e o espaço eleito para interação familiar. Essa preferência é
explicitada pelo proprietário da casa 19 quando afirmou que: “momento em família é na
186
No original: “controlled access determines a clear identification of the sectors’ boundaries. Crossing
the ‘clear boundaries‘ without permission could be understood as a transgression of social codes of
behaviour”. AMORIM, 2001, pág. 19.4. (minha tradução)
187
HANSON, 1998, pág. 128.
119
cozinha; na cozinha tem uma mesa feita só para nós (com 5 lugares). (...) quando tem
uma visita é na sala de jantar onde tem uma mesa maior”.
Os quartos, por outro lado, são os lugares que marcam o processo de
individualização nas relações intra-grupo. Esse processo é caracterizado pelo isolamento
espacial e pela infraestrutura encontrada nesses cômodos, como vimos. Essa
individualização é reafirmada pelo proprietário da casa 18 quando declarou: “O quarto é
grande, tem TV, vídeo, tem a sacada, tem o banheiro. Onde envolve lazer (TV, vídeo) é
no quarto. Na sala tem tudo, mas é mais formal. (...) o quarto é muito agradável, eu
tenho uma liberdade, eu não fico preso.”
Essa característica foi detectada configuracionalmente quando da análise da
medida de simetria, indicando que haveria uma forte classificação das pessoas e/ou
práticas que se realizam em nível local, ao mesmo tempo em que haveria uma fraca
classificação em nível global. A evidência aqui tratada parece confirmar a hipótese da
literatura em termos de categorias excludentes, típicas de uma classificação forte, que se
manifestam na exacerbação do individualismo pela segregação dos quartos
superequipados, e pelo isolamento/exclusividade de utilização do espaço da sala como
instância formal. Por outro lado, a proliferação de anéis, que permite um aumento da
integração em termos globais, parece facilitar a re-união da família, de outra maneira
separada dos seus quartos. Isto potencializa a acessibilidade aos locais de convívio
coletivo – cozinha e salas íntima e/ou de TV. Entretanto, uma pesquisa mais
aprofundada será necessária para a verificação desta hipótese.
Se na idade média o espaço doméstico era um misto de público e privado, com a
idade moderna esse passou a ser um espaço de domínio unicamente privado. O que se
têm nesta amostra é a confirmação, ou mesmo a exacerbação, do processo de
caracterização do espaço doméstico como sendo espaço estritamente privado,
culminando no isolamento social. Isto é, essa característica do isolamento social chegou
individualmente aos membros da família, na medida em que cada um tem seu “mundo”
no próprio quarto.
Na relação habitantes e empregados, os sistemas apresentam características
interessantes. O setor de serviço, composto por área de serviço e, em muitas casas,
também pela dependência de empregada (quarto e banheiro), são espaços muito
segregados, conforme já mencionado. Segundo Trigueiro, nos sobrados coloniais
estudados em Recife, os espaços destinados aos serviçais eram, também, segregados
120
espacialmente. Assim como nos sobrados, as dependências de empregadas também são
segregadas na amostra estudada, estando em 100% dos casos abaixo da média de
integração das casas. Por outro lado, as dependências de empregada estão, em alguns
casos, tão próximas do exterior quanto os espaços para receber visitantes, e em outros
casos, tão profundas quanto as salas de TV/íntima, ou os quartos dos habitantes. Os dois
casos, entretanto, evidenciam a distância socio-morfológica dos empregados do
convívio familiar mais íntimo.
A análise configuracional das residências estudadas permitiu constatar alguns
elementos do jeito de viver em família em Brasília, para a faixa social que estudei. Esse
jeito combina concepções modernas (conquista da individualidade), heranças históricas
(a permanência da sala de visitas), e novas escolhas (a cozinha como espaço de convívio
familiar), que apontam para uma nova síntese socio-espacial do espaço doméstico
contemporâneo.
121
Conclusão___________________________________________
O estudo morfológico e o levantamento sobre a utilização dos cômodos em 27
casas do Distrito Federal permitiu entender como a configuração do espaço está
relacionada com o modo de vida das pessoas que as habitam. O estudo da sua
configuração revelou a estrutura espacial como uma condição para as práticas sociais
nas residências. Casas podem ser aparentemente muito diferentes, mas muito parecidas
quando estudadas sob o ângulo das suas estratégias espaciais, as quais estão imbuídas de
características sociais que constituem estilos e jeitos de viver. Essa perspectiva faz do
estudo morfológico uma área importantíssima para a arquitetura como atividade
profissional e acadêmica que concebe e constrói espaços residenciais.
O estudo sintático e de uso das casas revelou características muito peculiares da
amostra selecionada. A cozinha e os quartos, por exemplo, são os primeiros indicativos
dessa sua peculiaridade. A cozinha, apresenta-se, quanto ao uso, mais próximas das
casas coloniais do que das casas modernistas, pois é lugar de permanência.
Sintaticamente, ela está mais próxima das casas modernistas do que das coloniais, pois
não são mais espaços isolados espacialmente, mostrando o novo status desse ambiente.
Os quartos, por sua vez, são o símbolo do isolamento social confirmado pela sua
segregação espacial, revelando o caráter estritamente privativo do espaço doméstico.
De uma maneira geral, as características configuracionais e de uso das
residências dessa amostra são expressas pela clara divisão entre espaços destinados aos
visitantes e aos habitantes. Essa separação define os quartos e suas dependências
(banheiro, roupeiro etc) como espaços de uso mais intenso dos habitantes e, como
espaços coletivos para o uso destes, as salas de TV/íntima e a cozinha. Com exceção da
cozinha, os demais espaços de maior uso dos habitantes têm o acesso altamente
controlado. Por outro lado, os espaços destinados aos visitantes, ou seja, os espaços do
setor social (sala de estar, jantar e varandas) e de lazer, são altamente permeáveis.
Nessa amostra, constata-se um processo constante de isolamento social
detectado na configuração espacial dessas casas, onde o afastamento e o
enfraquecimento da relação com exterior é evidente. A configuração das casas é
122
coerente com a separação entre habitantes e visitantes, até o isolamento dos membros do
núcleo familiar, quando cada um tem seu “espaço” de privacidade.
Do ponto de vista estritamente sintático, esse conjunto revela características
próprias que o difere de alguns estudos de casas pré-modernistas (coloniais ou ecléticas)
e modernistas. Essas casas têm características diferentes das casas modernistas como,
por exemplo, seu alto grau de funcionalidade (significando pouco investimento em
espaços de circulação). Por outro lado, têm características muito modernistas como a
fluidez espacial, detectada pelo baixo grau de fechamento. O isolamento do setor íntimo
em relação exterior e da integração da cozinha, indicam uma configuração mista de
características modernas e pré-modernistas nessas residências.
Além disso, esse conjunto é homogêneo em relação às médias de integração dos
seus sistemas (que são consideradas altas) e possui uma certa uniformidade quanto à
ordem de integração dos seus principais espaços. Essas características sinalizam uma
tendência na configuração espacial dessas casas. Diante dessa tendência é possível
afirmar que existe um genótipo do conjunto estudado, o qual indica um misto de
características pré-modernistas, modernistas e pós-modernistas. Isso revela que as casas
estudadas em Brasília, ao mesmo tempo em que adotam apenas algumas das premissas
do Movimento Moderno, resgatam alguns atributos seculares do espaço doméstico
brasileiro, e exploram novas possibilidades em sua constituição morfológica.
Em relação à aplicação da teoria da Sintaxe Espacial, é certo que uma teoria é
criada com o objetivo de se constituir em “linguagem universal” onde comparações
possam ser feitas e, justamente por isso, ousamos em comparações com estudos feitos
em outras regiões do país e em até em outros países. No entanto, a falta de estudos de
casas da região Centro-Oeste, utilizando a Sintaxe Espacial, para uma maior
aproximação da análise feita nesse trabalho, reforçou a convicção da importância da
continuidade dessa pesquisa, em Brasília. Nesse sentido, alguns aspectos ainda precisam
ser investigados como, por exemplo, a alta integração do setor social em contraste com
o seu pouco uso por parte dos moradores. A possibilidade de entender esse paradoxo
exige maior tempo de pesquisa e talvez uma fonte maior de dados.
Outro aspecto, em relação à teoria é a necessidade de aprofundar o estudo de
suas hipóteses. Conforme foi mencionado no capítulo 4, percebeu-se uma possível
inconsistência teórica em relação à medida de simetria. Isso porque as hipóteses
123
levantadas não foram verificadas na amostra, sinalizando para a necessidade de um
maior rigor na demonstração matemática de algumas variáveis da Sintaxe.
Finalmente, o estudo do espaço arquitetônico sob esse enfoque, além de
importante, como já foi mencionado, é extremamente interessante. Embora, em alguns
momentos, tenha sido muito exaustivo, dadas as dificuldades enfrentadas em um estudo
exploratório (isso leva a considerar possível margem de erro), o desafio de fazê-lo o
tornou ainda mais prazeroso. A experiência desse estudo me inspira a continuar
pesquisando o que mais a configuração espacial pode nos revelar sobre os espaços
arquitetônicos.
124
Bibliografia__________________________________________
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26. HOLANDA, Frederico. O espaço de exceção, Tese de doutorado apresentada na
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27. JAMESON, Fredric. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. Ática,
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29. LEMOS, Carlos A .C. Cozinhas, etc. Editora Perspectiva, São Paulo, 1978.
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30. LEMOS, Carlos A. C. Alvenaria Burguesa: breve história da arquitetura residencial
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31. LEMOS, Carlos A. C. História da casa brasileira. Editora Contexto, São Paulo,
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32. LOUREIRO, Cláudia. Classe, controle, encontro: o espaço escolar. Tese de
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33. LYOTARD, Jean-François. The Post-modern condition: A report on Knowledge.
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34. MONTEIRO, Circe Gama. Activity Analysis in houses of Recife, Brasil. In.: Anais
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35. PEPONIS, J. Espaço, cultura e desenho urbano no modernismo tardio e além dele.
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36. PEPONIS, J. The spatial culture of factories. Human Relations, 38, 1985, pp. 357390.
37. PROST, Antoine. e VINCENT, Gérard. Org. História da Vida Privada: Da Primeira
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38. RYBCZYNSKI, Witold. Casa: pequena história de uma idéia. Editora Record, Rio
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39. SHANON, C E WEAVER, W. The mathematical theory of communication.
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40. TRAMONTANO, Marcelo, PRATSCHKE, Anja e MARCHETTI, Marcos. Um
toque de imaterialidade: O impacto das novas mídias no projeto do espaço
doméstico. 1998. (mimeo).
41. TRAMONTANO,
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Habitação,
hábitos
e
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tendências
contemporâneas metropolitanas. 1998. (mimeo).
42. TRAMONTANO, Marcelo. Novos modos de vida, novos espaços de morar – uma
reflexão sobre a habitação contemporânea. Tese de Doutoramento, Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, 1998.
43. TRIGUEIRO, Edja, B.F, MARQUES, Sônia e CUNHA, Viviane. The mysterry of
the social sector: Discussing old and emerging spatial structures in Brazilian
127
contemporary homes. In: Anais do 3º International Space Syntax Symposium,
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44. TRIGUEIRO, Edja, B.F. Sobrados coloniais: um tipo só?. 1995 (mimeo).
45. TRIGUEIRO, Edja, B.F. The dinner procession goes to the kitchen: a suntactic
approach to nineteenth and early twentieth century British houses. In: Anais do 1º
International Space Syntax Symposium, Volume II, Londres, 1997, pág. 19.1ss.
46. VAUTHIER, L.L. Casas de residência no Brasil. In: Arquitetura Civil I, FAUUSP e
MEC-IPHAN, São Paulo, 1975.
47. VERÍSSIMO, Francisco Salvador & BITTAR, Wiliiam Seba Mallmann. 500 anos
da casa no Brasil – as transformações da arquitetura e da utilização do espaço de
moradia. Ediouro Publicações S.A, Rio de Janeiro, 1999.
128
Anexos
129
Anexo 1
Universidade de Brasília
Mestrado em Arquitetura e Urbanismo
Tema: Espaço Doméstico Contemporâneo em Brasília
Aluna: Franciney Carreiro de França
QUESTIONÁRIO
I – IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO
1.1 - Nome:________________________________________Período:_______Turma:_______
II – IDENTIFICAÇÃO DA MORADIA
2.1 – Endereço: ____________________________________________________________
Setor_________________________
Cidade____________________
2.2 – Situação da moradia:
Própria
Alugada
Cedida
2.3 - Desenhe o lote com suas dimensões;
Desenhe a planta baixa da sua casa (indicando os acessos: portas
internas e externas) com as dimensões aproximadas dos cômodos;
localizando-a no lote;
Desenhe, se existente, a área de lazer (churrasqueira, piscina, etc).
Caso necessite de mais espaço, usar o verso dessa página.
III – DESCRIÇÃO DA MORADIA
3.1 – A casa foi projetada para a sua família ?
3.2 – Quantos m2 de área construída tem a casa:
3.3 – Quantos pavimentos:
3.4 – Quando foi construída a casa:
3.5 – Quantos m2 tem o lote:
Sim
Não
a - até 100 m2
b - mais 100 até 200m2
c - mais 200 até 300 m2
d - mais 300 até 400 m2
e - mais 400 até 500 m2
f - mais de 500 m2
a – um c – três
b – dois d – mais de três
a – década de 60
b – década de 70
c – década de 80
d – década de 90
a) até 350 m2
b) mais 350 até 500m2
c) mais 500 até 1000 m2
d) mais 1000 m2
130
IV – UTILIZAÇÃO DOS ESPAÇOS
4.1. Enumere, de acordo com a importância, os 3 espaços de maior tempo de permanência da família:
1 – para o primeiro espaço de maior tempo;
2 – para o segundo espaço de maior tempo;
3 – para o terceiro espaço de maior tempo.
Sala de estar
Sala de jantar
Cozinha
Mezanino
Quartos
Sala de TV
Qual?_______________
Varanda
Escritório/biblioteca
Outro?
Qual a principal atividade no espaço mais utilizado?_________________________________
____________________________________________________________________________
4.2. Enumere os 3 espaços de menor tempo de permanência da família:
1 – para o primeiro espaço de menor tempo;
2 – para o segundo espaço de menor tempo;
3 – para o terceiro espaço de menor tempo;
Sala de estar
Sala de jantar
Cozinha
Mezanino
Quartos
Varanda
Sala de TV
Escritório/biblioteca
Outro?
Qual?_________________
(Desconsiderar espaços como: despensa, lavabo, área de serviço, banheiro, etc.)
4.3. Enumere os 3 espaços mais utilizados para receber visitantes:
1 – para o primeiro espaço mais utilizado;
2 – para o segundo espaço mais utilizado;
3 – para o terceiro espaço mais utilizado;
Sala de estar
Sala de jantar
Sala de TV
Quartos
Mezanino
Varanda
Cozinha
Escritório/biblioteca
Área de lazer
Outro?
Qual?____________
Por que esse é o espaço mais utilizado? ______________________________________________
_____________________________________________________________________________
4.4. Enumere os 3 espaços onde normalmente o visitante não tem acesso:
1 – para o primeiro espaço;
2 – para o segundo espaço;
3 – para o terceiro espaço;
Sala de estar
Sala de TV
Mezanino
Sala de jantar
Quartos
Varanda
Cozinha
Escritório/biblioteca
Área de lazer
Outro?
Qual?___________
131
(Desconsiderar espaços como: despensa, lavabo, área de serviço, etc.)
4.5. Qual o espaço MAIS utilizado quando há festas/recepções? (Escolha apenas uma das opções).
a) Área social interna da residência
b) Área externa (jardins, pátio, área de lazer, etc)
Por que esse espaço? _____________________________________________________________
______________________________________________________________________________
4.6 - Assinale com um X as atividades referentes a cada espaço:
Cômodos
Tarefas
Domésticas1
Lazer
Passivo2
Lazer
Interativo3
Necessidades Necessidades Trabalhar/
Comuns4
Privadas5
Estudar
Outro?
Qual?
Sala de estar
Sala de jantar
Cozinha
Sala de TV
Escritório/Biblioteca
Quartos
Sala íntima
Dependência de empregada
Mezanino
Varanda
Área de lazer (churrasqueira,
piscina, sauna, quadra de
esportes)
Outros? Quais?
Legenda:
1 – Tarefas domésticas (cozinhar, lavar louça, lavar roupa, passar)
2 – Lazer passivo (ver TV, ler, ouvir música, jogos de computador, fazer ginástica)
3 – Lazer interativo (encontrar amigos, beber, namorar)
4 - Necessidades comuns (tomar café, almoçar, jantar)
5 - Necessidades privadas ( escovar, tomar banho, dormir, repousar, fazer amor)
4.7. Assinale com X a localização dos equipamentos:
Cômodos
TV
Aparelhos de Computadores
som
Equip. de
ginástica
Outro Equip.
Qual?
Sala de estar
Sala de jantar
Sala de TV
Cozinha
Escritório/ biblioteca
Quartos
Sala íntima
Dependência de empregada
Mezanino
Varanda
Área de lazer
Outro espaço? Qual?
V – INFORMAÇÕES GERAIS
5.1 – Quantos veículos há no domicílio? _______________
5.2 – Quantos televisores? ________________
5.3 – Quantos vídeos-cassete? _____________
5.4 – Quantos computadores? _________
Com acesso à Internet ?
Sim
Não
132
5.5 – Morar neste bairro é:
a) muito ruim
b) ruim
c) regular
d) bom
e) muito bom
Por
que?_______________________________________________________________________
5.6 – Morar na sua casa é: a) muito ruim
b) ruim
c) regular
d) bom
e) muito bom
Por que ?_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
5.7 – O que você mais gosta da casa quanto à distribuição dos espaços ou dos espaços em si? Por que?
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
5.8 – O que você mudaria na casa em relação à distribuição dos espaços ou dos espaços em si? Por que?
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
VI – IDENTIFICAÇÃO DOS HABITANTES
6.1 – Nº de habitantes:______
6.2 – Nº de adultos (acima de 18 anos):______
6.3 - Nº de adolescentes (de 12 a 18 anos): _____
6.4 - Nº de crianças (abaixo de 12 anos): ______
6.5 – Quantos trabalham (ocupação remunerada): ______
6.6 – Grau de instrução das pessoas que possuem as maiores rendas (citar o grau de parentesco):
Primeira pessoa (pai, mãe, etc):______________ Segunda pessoa (pai, mãe, etc): _____________________
Instrução:
a - nenhum
Instrução:
a - nenhum
b - primeiro grau incompleto
b - primeiro grau incompleto
c - primeiro grau completo
c - primeiro grau completo
d - segundo grau incompleto
d - segundo grau incompleto
e - segundo grau completo
e - segundo grau completo
f - terceiro grau incompleto
f - terceiro grau incompleto
g - terceiro grau completo
g - terceiro grau completo
h - pós-graduação incompleta
h - pós-graduação incompleta
i - pós-graduação completa
i - pós-graduação completo
6.7 – Classificação da ocupação das pessoas que possuem maiores rendas:
Primeira pessoa: a – Empregado em empresa de setor privado, público ou de economia mista;
b – Profissional liberal ou trabalhador sem vínculo de emprego;
c – Empregador titular ou proprietário(a) de empresa;
d – Vive de rendimentos de capital, inclusive aluguéis;
e – Aposentado;
f – Servidor público
g – Outra
Segunda pessoa: a – Empregado em empresa de setor privado, público ou de economia mista;
b – Profissional liberal ou trabalhador sem vínculo de emprego;
c – Empregador titular ou proprietário(a) de empresa;
d – Vive de rendimentos de capital, inclusive aluguéis;
e – Aposentado;
f – Servidor público
g – Outra
133
6.8 – Local de trabalho da principal ocupação da:
Primeira pessoa com maior renda: a - em casa
b - fora de casa (empresa, órgão público, outros, indeterminado)
c – não trabalha
Segunda pessoa com maior renda: a - em casa
b - fora de casa (empresa, órgão público, outros, indeterminado)
c – não trabalha
Outras pessoas (citar o grau de parentesco):
Quem: ______________________ a – em casa
b – fora de casa c – não trabalha
Quem: ______________________ a – em casa
b – fora de casa c – não trabalha
6.9 – Renda familiar mensal:
a - até 10 salários mínimos
b - mais de 10 até 20 salários mínimos
c - mais de 20 até 30 salários mínimos
d - mais de 30 até 40 salários mínimos
e - mais de 40 até 50 salários mínimos
f - mais de 50 salários mínimos
134
Anexo 2 – Roteiro de entrevista
a) Quanto tempo você passa em casa, tirando o tempo de dormir:

num dia comum

num fim de semana
b) Quais as principais atividades num dia comum ?

descreva as atividades;

descreva o ambiente onde elas acontecem;

o que caracteriza esse espaço para essa atividade ?
c) c) Quais as principais atividades num final de semana ?

descreva as atividades;

descreva o ambiente onde elas acontecem;

o que caracteriza esse espaço para essa atividade ?
d) Há um momento em que todos (ou a maioira) dos habitantes se reúnem ? Para quê ?

descreva a atividade e o ambiente onde isso acontece
e) Descreva os espaços mais usados para receber visitantes, porque esses espaços?
f) O quem mais gosta de fazer em casa ? Onde ?
g) O que gostaria de fazer em casa e não o faz por falta de lugar apropriado ?
135
Anexo 3 – Plantas baixas, Plantas de convexidade
e Grafos justificados
Casa 1
Grafo – casa 1
Casa 2
Casa 2
Grafo – casa 2
136
Casa 3
Casa 3
Casa 3 – Grafo justificado
137
Casa 4
Casa 5
Casa 4 – Grafo justificado
Casa 5 – Grafo justificado
138
Casa 6
Casa 7
Casa 7
139
Casa 8
Casa 8
Casa 8
140
Casa 9
Casa 9
Casa 9
141
Casa 10
Casa 12
Casa 10
Casa 12
142
Casa 13
Casa 14
Casa 13
Casa 14
143
Casa 15
Casa 16
Casa 15
Casa 16
144
Casa 17
Casa 17
145
Casa 18
Casa 18
146
Casa 19
Casa 20
Casa 19
Casa 20
147
Casa 21
Casa 23
Casa 21
Casa 23
148
Casa 22
Casa 22
Casa 22
149
Casa 25
Casa 25
Casa 25
150
Casa 26
Casa 27
Casa 26
Casa 27
151
Casa 28
Casa 28
152
Casa 29
Casa 29
Casa 29
153
Anexo 4 – Tabelas de Integração
CASA 1
número
Espaço
7 Sala de jantar
9 Jardins internos/cir.
1 Quintal
14 Circulação
2 Hall de entrada
3 Garagem
6 Quintal fundos
28 Circulação
8 Sala de estar/tv
11 Copa
13 Lavanderia/oficina
17 Circulação
31 Área de lazer
4 Varanda
10 Escritório
16 Quarto2
5 Corredor lateral ext.
15 Quarto1
27 Circulação
32 Exterior
29 Quarto empregada
12 Cozinha
19 Suíte
18 Banheiro
22 Quarto3
24 Quarto4
23 Quarto2
30 Banheiro
empregada
20 Suíte
25 Quarto4
21 Banheiro suíte
26 Banheiro quarto4
Média
Integração
1,559
1,502
1,322
1,267
1,192
1,192
1,081
1,067
1,053
1,014
0,965
0,965
0,954
0,932
0,881
0,881
0,863
0,863
0,863
0,803
0,780
0,737
0,737
0,711
0,711
0,687
0,665
0,605
0,588
0,555
0,483
0,461
0,904
Tipo
(a,b,c,d)
c
d
d
b
c
d
d
c
c
b
a
b
d
c
b
b
c
a
c
a
b
a
b
a
a
b
a
a
b
b
a
a
154
CASA 2
Número Espaço
11 Sala de estar
8 Hall
17 Circulação
7 Varanda
10 Varanda
6 Área de lazer
18 Escada
3 Circulação
9 Corredor externo
4 Circulação
5 Corredor externo
1 Garagem
13 Circulação
14 Sala de Jantar
15 Lavabo
16 Cozinha
25 Sala íntima
12 Escritório
24 Jardim
22 Circulação
2 Quintal
21 Qto empregada
20 Despensa
26 Circulação
23 Jardim
33 Suíte3
34 Exterior
19 Banh. Empregada
28 Suíte2
27 Suíte1
32 Banh. Suíte3
29 Circulação Suíte
31 Banh. Suíte1
30 Banh. Suíte2
Média
Integração
1,046
1,022
1,010
0,936
0,936
0,871
0,871
0,863
0,863
0,823
0,801
0,766
0,766
0,766
0,766
0,766
0,753
0,747
0,735
0,729
0,705
0,668
0,658
0,635
0,622
0,601
0,601
0,539
0,529
0,523
0,494
0,449
0,440
0,386
0,726
Tipo
(a,b,c,d)
d
d
c
d
d
c
b
d
d
c
c
d
d
c
a
c
b
a
c
c
c
a
a
b
a
b
a
a
b
b
a
b
a
a
155
CASA 3
Número
Espaço
2 Hall de entrada
4 Circulação
9 Escada
6 Circulação
8 Circulação
33 Circulação
10 Sala de estar
1 Quintal
13 Sala de estar
11 Sala de estar
3 Corredor lateral ext.
14 Área de lazer
15 Sala de estar/jantar
5 Escritório
34 Mezanino
22 Circulação
35 Circulação
7 Lavabo
61 Estar subsolo
19 Cozinha
21 Despensa
18 Escada
36 Suite1
32 Corredor lateral ext.
17 Varanda
71 Exterior
12 Sala de estar
39 Circulação
16 Jardim interno
24 Circulação
40 Circulação
38 Cozinha mezanino
65 Estar subsolo
62 Circulação
63 Depósito
64 Estar subsolo
20 Copa
37 Closet1
26 Área de serviço
44 Circulação
45 Suite4
58 Depósito
42 Suite3
41 Suite2
66 Copa subsolo
69 Banheiro subsolo
70 Sauna
47 Estar superior
Integração
0,908
0,898
0,859
0,851
0,837
0,818
0,816
0,811
0,811
0,808
0,779
0,772
0,765
0,730
0,724
0,722
0,700
0,693
0,689
0,687
0,683
0,678
0,678
0,673
0,671
0,666
0,664
0,642
0,634
0,610
0,609
0,606
0,589
0,587
0,581
0,581
0,580
0,576
0,563
0,563
0,562
0,548
0,530
0,528
0,513
0,507
0,507
0,504
Tipo
d
c
b
c
d
b
c
c
d
c
c
d
d
a
b
c
b
a
d
b
a
c
b
c
c
a
a
c
a
c
b
a
b
b
a
a
a
b
b
c
c
a
b
b
b
a
a
c
156
46 Varanda superior
52 Banheiro suite1
27 Circulação
59 Closet4
30 Quarto empregada
43 Suite3
56 Closet2
67 Adega
68 Adega
48 Circulação
28 Quarto empregada
29 Banheiro empregada
60 Banheiro suite4
31 Banheiro empregada
53 Banheiro suite3
55 Varanda superior
57 Banheiro suite2
51 Quarto
49 Banheiro superior
50 Closet
54 Varanda superior
Média
0,501
0,499
0,493
0,490
0,489
0,467
0,464
0,451
0,451
0,450
0,436
0,436
0,433
0,433
0,415
0,415
0,412
0,403
0,401
0,401
0,363
0,603
c
a
b
b
b
b
b
a
a
b
a
a
a
a
a
a
a
b
a
a
a
157
CASA 4
Número
Espaço
5 Sala de estar/jantar
10 Sala íntima
8 Varanda
14 Sala íntima
11 Cozinha
2 Hall de entrada
9 Circulação
3 Garagem
7 Área de lazer
16 Circulação
24 Corredor lateral externo
1 Quintal
25 Varanda
13 Varanda
20 Área de serviço
27 Varanda
15 Escritório
4 Quintal
23 Varal
6 Corredor lateral externo
12 Lavabo
29 Suite1
32 Suíte2
28 Quarto
30 Banheiro social
31 Quarto
37 Exterior
26 Banheiro externo
18 Quarto empregada
19 Banheiro empregada
21 Circulação
33 Closet2
34 Closet1
22 Quarto empregada
35 Banheiro suíte1
36 Banheiro suíte2
Média
Integração
Tipo (a, b, c, d)
1,442
d
1,328
d
1,173
d
1,134
b
1,097
c
1,040
c
1,040
c
0,989
c
0,970
d
0,952
b
0,952
c
0,917
d
0,901
c
0,893
c
0,885
c
0,834
a
0,814
a
0,801
c
0,788
c
0,776
c
0,765
a
0,737
b
0,737
b
0,716
a
0,716
a
0,716
a
0,696
a
0,687
a
0,677
a
0,677
a
0,615
b
0,594
b
0,594
b
0,507
a
0,492
a
0,492
a
0,837
158
CASA 5
Número Espaço
14 Área de lazer
11 Varanda
13 Varanda
15 Varanda
12 Sala íntima
10 Sala de TV
20 Corredor lateral externo
34 Suíte do casal
16 Área de serviço
4 Corredor lateral externo
7 Circulação
5 Sala de estar/jantar
19 Circulação
28 Circulação
1 Quintal
6 Circulação
32 Suíte1
21 Corredor lateral externo
17 Cozinha
3 Hall de entrada
33 Suíte2
35 Suíte3
36 Circulação suíte do casal
2 Garagem
31 Sauna
18 Copa
24 Quarto empregada
26 Circulação
23 Quarto empregada
38 Banheiro suíte do casal
8 Banheiro
9 Escritório
29 Banheiro
30 Banheiro
39 Closet1
22 Lavabo
45 Exterior
41 Closet3
43 Closet2
37 Closet suíte do casal
25 Banheiro empregada
27 Quarto do caseiro
40 Banheiro suite1
42 Banheiro suíte3
44 Banheiro suíte2
Média
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,513
d
1,496
d
1,374
c
1,346
c
1,333
d
1,295
d
1,202
d
1,202
c
1,171
d
1,161
c
1,161
d
1,077
d
1,052
d
1,028
b
1,005
d
1,005
c
0,997
b
0,990
c
0,983
c
0,962
c
0,962
b
0,962
b
0,942
b
0,910
c
0,880
a
0,863
c
0,863
b
0,863
b
0,852
a
0,852
a
0,847
a
0,847
a
0,774
a
0,774
a
0,765
b
0,761
a
0,761
a
0,744
b
0,744
b
0,724
a
0,677
a
0,677
a
0,615
a
0,601
a
0,601
a
0,960
159
CASA 6
número
Média
Espaço
7 Sala de estar
12 Varanda
10 Sala de jantar
4 Área de lazer
8 Escada
13 Varanda
9 Circulação
6 Hall de entrada
11 Sala de TV
24 Circulação
18 Cozinha
1 Quintal
35 Corredor lateral ext.
2 Entrada principal
16 Escada
17 Circulação
25 Circulação
14 Circulação
20 Depósito
5 Garagem
3 Quintal
36 Escritótio
19 Área de serviço
23 Circulação
29 Suíte
26 Sala íntima
27 Banheiro
28 Quarto1
30 Quarto2
31 Banheiro
32 Quarto3
15 Ateliê
37 Exterior
21 Cozinha2
22 Quarto empregada
33 Closet
34 Banheiro suíte
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,277
d
1,187
d
1,160
d
1,121
d
1,097
b
1,097
d
0,989
c
0,970
c
0,943
c
0,943
b
0,917
c
0,901
d
0,893
c
0,878
c
0,870
c
0,841
d
0,814
b
0,807
b
0,807
a
0,776
d
0,759
c
0,737
a
0,726
c
0,664
c
0,651
b
0,635
a
0,635
a
0,635
a
0,635
a
0,635
a
0,635
a
0,631
a
0,601
a
0,580
a
0,580
a
0,537
b
0,453
a
0,811
160
CASA 7
número
Média
Espaço
2 Sala de estar
1 Quintal
7 Circulação
6 Cozinha
3 Garagem/varanda
4 Corredor lateral
15 Cozinha
12 Suíte
5 Sala de jantar
25 Exterior
16 Área de serviço
8 Quarto
9 Quarto
10 Quarto
11 Banheiro
14 Banheiro suíte
23 Escada externa
18 Sala de estar anexo
19 Cozinha anexo
13 Suíte
17 Área de serviço
21 Circulação anexo
24 Sótão
20 Quarto anexo
22 Banheiro anexo
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,417
d
1,348
d
1,256
b
1,083
c
1,062
c
1,023
d
1,023
c
1,005
b
0,891
a
0,863
a
0,850
b
0,825
a
0,825
a
0,825
a
0,825
a
0,825
a
0,789
b
0,778
c
0,757
c
0,708
a
0,628
a
0,614
c
0,594
a
0,588
a
0,489
a
0,876
161
CASA 8
Número
Média
Espaço
6 Sala de estar/lareira
23 Escada
24 Escada
25 Sala TV
7 Sala de jantar
8 Varanda
29 Circulação
4 Hall de entrada
15 Circulação
9 Área de lazer
10 Circulação
26 Suíte1
2 Quintal
14 Cozinha
37 Escada
33 Suíte2
19 Área de serviço
31 Quarto
30 Banheiro social
32 Quarto
16 Circulação
5 Corredor lateral externo
17 Quarto empregada
18 Quarto empregada
20 Depóstio
21 Depósito
22 Churrasqueira
1 Quintal
38 Sala mezanino
11 Quarto
27 Closet1
13 Lavabo
3 Garagem
34 Closet2
36 Closet
39 Sala mezanino
44 Exterior
40 Suíte3
12 Banheiro
28 Banheiro suíte1
35 Banheiro Suíte2
42 Varanda
41 Banheiro Suíte3
43 Depósito mezanino
Integração Tipo (a,b,c,d)
1,010
d
0,995
b
0,965
b
0,924
b
0,911
d
0,880
d
0,841
b
0,809
c
0,785
d
0,771
d
0,728
b
0,728
b
0,712
c
0,704
a
0,704
b
0,675
b
0,668
c
0,668
b
0,661
a
0,661
a
0,652
c
0,648
c
0,626
a
0,626
a
0,618
a
0,618
a
0,618
a
0,612
d
0,600
b
0,595
b
0,595
b
0,590
a
0,562
c
0,559
b
0,550
a
0,511
b
0,511
b
0,507
b
0,499
a
0,499
a
0,474
a
0,442
b
0,436
a
0,387
a
0,662
162
CASA 9
Número
Média
Espaço
2 Hall de entrada
9 Sala de estar/jantar
1 Quintal
11 Circulação
7 Varanda
28 Escada
3 Garagem
4 Corredor lateral externo
8 Circulação
5 Varanda
10 Cozinha
12 Circulação suíte
6 Área de lazer
29 Circulação
35 Exterior
13 Quarto
14 Quarto
15 Banheiro social
24 Despensa
25 Churrasqueira
26 Sauna
30 Escritório
20 Despensa
21 Banheiro
22 Quarto empregada
23 Despensa
16 Suíte
27 Cozinha
17 Banheiro suíte
32 Varanda
31 Banheiro escritório
18 Varanda
19 Jardim interno
33 Jardim interno
34 Jardim interno
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,522
c
1,327
c
1,255
d
1,191
b
1,161
d
1,132
b
1,043
c
0,967
c
0,948
c
0,919
c
0,919
b
0,902
b
0,884
c
0,884
b
0,868
b
0,837
a
0,837
a
0,837
a
0,822
a
0,822
a
0,822
a
0,714
b
0,709
a
0,709
a
0,709
a
0,709
a
0,703
b
0,693
a
0,683
a
0,584
b
0,570
a
0,563
a
0,563
a
0,484
a
0,484
a
0,851
163
CASA 10
número
Média
Espaço
10 Sala de estar/jantar
21 Circulação
12 Cozinha
7 Hall de entrada
11 Sala de estar
22 Sala de TV
34 Varanda
6 Circulação
16 Área de serviço
2 Garagem
35 Área de lazer
3 Corredor lateral externo
4 Corredor lateral externo
14 Cozinha
1 Quintal
23 Circulação
30 Circulação suíte2
8 Lavabo
9 Escritório
27 Suíte1
15 Despensa
17 Circulação
32 Closet2
5 Corredor
24 Quarto
25 Quarto
26 Banheiro social
28 Closet1
31 Suíte2
36 Exterior
18 Banheiro empregada
19 Quarto empregada
20 Quarto empregada
33 Banheiro suíte2
29 Banheiro suíte1
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,242
d
1,101
b
1,064
c
1,009
c
0,969
c
0,969
b
0,889
d
0,881
c
0,881
c
0,828
c
0,821
d
0,801
d
0,788
c
0,775
a
0,757
c
0,757
b
0,757
b
0,745
a
0,745
a
0,745
b
0,718
a
0,702
b
0,605
b
0,598
a
0,598
a
0,598
a
0,598
a
0,598
b
0,598
a
0,598
b
0,563
a
0,563
a
0,563
a
0,499
a
0,494
a
0,755
164
CASA 12
Espaço
12 Circulação
8 Hall de entrada
16 Circulação suíte
10 Cozinha
23 Varanda
13 Sala de estar/jantar
11 Varanda
21 Suíte do casal
2 Garagem
7 Área de serviço
15 Circulação
3 Entrada
5 Pátio de serviço
6 Área de lazer
1 Jardim
24 Exterior
4 Corredor lateral externo
20 Banheiro suíte
14 Escritório
9 Quarto empregada
17 Quarto
18 Banheiro
19 Quarto
22 Banheiro empregada
número
Média
Integração Tipo (a,b,c,d)
1,479
d
1,328
c
1,177
c
1,151
c
1,151
d
1,102
c
1,079
d
1,057
c
1,035
d
1,035
c
1,015
b
0,996
c
0,977
c
0,977
d
0,925
d
0,878
c
0,809
c
0,784
a
0,750
a
0,740
b
0,709
a
0,709
a
0,709
a
0,563
a
0,964
CASA 13
número
Espaço
7 Circulação
5 Sala de estar/jantar
9 Cozinha
3 Sala de estar/jantar
8 Área de serviço
2 Garagem
6 Quintal fundos
10 Lavabo
11 Jardim interno
12 Quarto
13 Quarto
14 Banheiro social
15 Quarto
4 Corredor lateral
16 Depósito
1 Quintal
17 Exterior
Média
Integração
1,626
1,273
1,171
1,045
1,045
0,944
0,887
0,887
0,887
0,887
0,887
0,887
0,887
0,770
0,681
0,665
0,496
0,937
Tipo
(a,b,c,d)
c
c
c
c
c
c
c
a
a
a
a
a
a
c
a
b
a
165
CASA 14
número
Espaço
6 Circulação
9 Sala estar
2 Hall de entrada
10 Circulação
14 Cozinha
8 Corredor lateral
7 Quarto
1 Quintal
4 Suíte
3 Corredor lateral
5 Banheiro
15 Área de serviço
11 Banheiro
12 Escritório
13 Quarto
19 Exterior
17 Banheiro suíte
16 Quintal fundos
18 Quintal fundos
Média
número
Média
CASA 15
Espaço
5 Sala de estar/jantar
7 Circulação
16 Quintal fundos
2 Garagem
6 Circulação
1 Quintal
3 Corredor lateral
8 Circulação
11 Suíte
4 Corredor lateral
9 Banheiro
14 Cozinha
15 Área de serviço
17 Exterior
12 Quarto
13 Quarto
10 Banheiro suíte
Integração Tipo (a,b,c,d)
1,414
c
1,359
b
1,140
c
0,955
b
0,955
b
0,930
c
0,841
a
0,822
c
0,768
b
0,752
c
0,736
a
0,707
b
0,654
a
0,654
a
0,654
a
0,589
a
0,561
a
0,544
b
0,431
a
0,814
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,722
d
1,464
b
1,220
d
1,171
c
1,045
c
0,976
d
0,976
d
0,944
b
0,887
b
0,861
c
0,836
a
0,791
c
0,714
c
0,650
a
0,636
a
0,636
a
0,610
a
0,949
166
CASA 16
número
Média
Espaço
2 Garagem
4 Corredor lateral
14 Área de serviço
7 Sala de jantar
10 Circulação
13 Cozinha
3 Sala de estar
16 Quarto TV
1 Quintal
5 Circulação
15 Despensa
17 Varanda
21 Quintal
8 Quarto do dono
9 Quarto da filha
11 Banheiro2
12 Quarto
18 Circulação
22 Exterior
6 Banheiro1
19 Quarto fundos
20 Banheiro fundos
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,406
d
1,324
c
1,324
c
1,250
d
1,250
c
1,184
c
0,938
c
0,938
b
0,900
b
0,865
c
0,833
a
0,833
a
0,833
a
0,804
a
0,804
a
0,804
a
0,804
a
0,703
b
0,643
a
0,625
a
0,536
a
0,536
a
0,915
167
CASA 17
Número
Espaço
9 Circulação
12 Escada
7 Sala de jantar
21 Sala íntima
10 Cozinha
22 Circulação
38 Circulação
8 Sala de estar
13 Circulação
6 Corredor lateral ext.
16 Área de serviço
4 Varanda
5 Hall de entrada
25 Suíte2
26 Suíte master
11 Despensa
23 Suíte1
24 Circulação
27 Varanda
20 Área de lazer
39 Corredor lateral ext.
14 Escritório
15 Lavabo
2 Garagem
3 Varanda
17 Circulação
32 Circulação suíte master
36 Circulação
29 Banheiro suíte2
1 Quintal
30 Banheiro suíte1
31 Varanda
28 Varanda
18 Banheiro de empreg.
19 Quarto empregada
33 Banheiro suíte master
34 Closet suíte master
37 Sacada
40 Exterior
35 Banheiro suíte master
Média
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,021
b
1,003
b
0,968
c
0,968
b
0,846
d
0,815
b
0,804
b
0,798
c
0,781
b
0,731
d
0,731
d
0,695
d
0,666
c
0,663
b
0,663
b
0,659
a
0,647
b
0,647
b
0,640
b
0,629
d
0,623
d
0,619
a
0,619
a
0,616
c
0,609
d
0,599
b
0,558
b
0,547
b
0,542
a
0,540
c
0,532
a
0,532
a
0,527
a
0,499
a
0,499
a
0,474
b
0,470
a
0,462
a
0,457
a
0,409
a
0,653
168
CASA 18
Número
Espaço
6 Escada
5 Circulação
14 Circulação
7 Cozinha
2 Garagem
3 Sala de estar
24 Terraço
9 Banheiro
15 Suíte casal
17 Suíte2
18 Quarto
8 Circulação
1 Quintal
4 Sala de jantar
25 Terraço
26 Depósito
19 Varanda quartos
21 Banheiro suíte
16 Sacada suíte do casal
23 Banheiro suíte2
11 Quintal fundos
10 Quarto empregada
27 Exterior
20 Varanda quartos
22 Banheiro suíte
12 Banheiro
13 Quintal fundos
Média
Integração
1,356
1,327
1,177
1,006
0,945
0,931
0,931
0,866
0,866
0,866
0,843
0,790
0,701
0,678
0,678
0,678
0,671
0,657
0,643
0,643
0,624
0,600
0,547
0,529
0,520
0,499
0,499
0,780
Tipo (a,b,c,d)
b
c
c
b
c
c
b
a
b
c
c
b
b
a
a
a
c
b
a
a
b
a
a
a
a
a
a
169
CASA 19
número
Espaço
2 Varanda
5 Sala de estar
1 Quintal
4 Varanda
12 Corredor lateral
7 Circulação
8 Circulação
3 Varanda
6 Cozinha/copa
13 Quintal fundos
14 Corredor lateral
15 Exterior
9 Quarto
10 Banheiro
11 Quarto
Média
Integração Tipo (a,b,c,d)
1,962
d
1,681
d
1,308
d
1,308
d
1,308
d
1,239
d
1,239
c
1,177
d
1,177
c
0,942
d
0,905
d
0,759
a
0,736
a
0,736
a
0,736
a
1,147
CASA 20
número
Média
Espaço
4 Circulação
3 Sala de estar
2 Garagem
10 Copa
7 Suíte
5 Quarto
6 Banheiro
8 Quarto
9 Quarto
12 Cozinha
15 Corredor lateral
1 Quintal
13 Área de serviço
14 Quintal fundos
11 Banheiro suíte
16 Exterior
Integração
1,757
1,387
1,146
1,146
0,976
0,909
0,909
0,909
0,909
0,850
0,850
0,753
0,753
0,676
0,643
0,538
0,945
Tipo (a,b,c,d)
c
c
c
c
b
a
a
a
a
c
c
a
c
c
a
a
170
CASA 21
número Espaço
2 Sala de estar/jantar
1 Quintal
3 Circulação
6 Cozinha
8 Corredor lateral
10 Corredor lateral
4 Quarto
5 Banheiro
11 Exterior
9 Quintal fundos
7 Quarto
Média
Integração
1,327
1,206
1,206
0,737
0,737
0,737
0,664
0,664
0,664
0,531
0,492
0,815
Tipo (a,b,c,d)
b
c
b
b
c
c
a
a
a
c
a
CASA 23
número
Média
Espaço
2 Garagem
3 Sala de estar
4 Circulação
8 Cozinha
10 Quintal fundos
1 Quintal
9 Corredor lateral
11 Corredor lateral
5 Quarto
6 Quarto
7 Banheiro
12 Exterior
Integração
1,424
1,424
1,306
1,119
1,119
1,045
0,979
0,922
0,746
0,712
0,712
0,627
1,011
Tipo (a,b,c,d)
d
c
c
c
d
c
c
c
a
a
a
a
171
CASA 22
número Espaço
17 Circulação
12 Escada
10 Sala de jantar
19 Suíte1
5 Garagem
23 Sala superior
1 Garagem
11 Bar
16 Circulação
6 Escada
18 Circulação suíte do casal
20 Circulação suíte2
21 Circulação suíte3
7 Cozinha/copa
4 Hall de entrada
14 Varanda
13 Sala de estar
32 Banheiro suíte1
9 Lavabo
24 Área de lazer
3 Quarto empregada
2 Escritório
35 Exterior
22 Sala de TV
27 Banheiro suíte do casal
28 Banheiro suíte3
29 Suíte3
30 Suíte do casal
31 Suíte2
33 Banheiro suíte2
15 Depósito
34 Área verde (fundos)
25 Lavanderia
8 Banheiro empregada
26 Banheiro
Média
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,308
c
1,255
b
1,206
d
1,080
c
1,055
c
1,020
c
0,998
c
0,967
c
0,967
c
0,938
b
0,929
b
0,929
b
0,929
b
0,919
c
0,910
d
0,860
b
0,844
a
0,780
a
0,767
a
0,761
b
0,749
b
0,737
a
0,737
a
0,731
b
0,698
a
0,698
a
0,698
a
0,698
a
0,698
a
0,698
a
0,693
a
0,659
a
0,599
a
0,591
a
0,580
a
0,848
172
CASA 25
número
Média
Espaço
9 Circulação
12 Sala de jantar
6 Sala de estar
13 Cozinha
18 Área de lazer
3 Garagem
4 Área de serviço
10 Escada
1 Quintal
5 Corredor lateral
24 Sala íntima
7 Garagem
11 Banheiro
14 Escritório
17 Churrasqueira
8 Hóspedes
19 Circulação
15 Área de serviço
23 Despensa
16 Circulação
2 Quintal
33 Exterior
26 Suíte do casal
27 Circulação
25 Varanda
28 Quarto
20 Banheiro empregada
21 Ateliê
22 Quarto empregado
30 Closet suíte
29 Quarto
31 Banheiro
32 Banheiro suíte
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,268
c
1,268
d
1,197
d
1,118
c
1,103
d
1,089
d
1,076
c
1,062
b
1,049
d
0,966
c
0,894
c
0,876
c
0,867
a
0,867
a
0,867
c
0,833
a
0,817
b
0,809
c
0,772
a
0,765
c
0,759
a
0,759
a
0,702
c
0,696
b
0,691
c
0,674
a
0,629
a
0,629
a
0,629
a
0,566
b
0,555
a
0,555
a
0,469
a
0,845
173
CASA 26
número
Média
Espaço
7 Sala de jantar
16 Circulação
3 Varanda
6 Varanda
9 Cozinha
2 Corredor lateral
4 Corredor lateral
8 Sala de estar
10 Área de serviço
1 Quintal
20 Circulação suíte casal
5 Quintal fundos
17 Quarto
18 Banheiro
19 Quarto
11 Circulação
15 Quintal fundos
13 Área fundos
21 Closet casal
24 Exterior
22 Banheiro suíte
12 Quarto empregada
14 Banheiro empregada
23 Suíte casal
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,569
d
1,263
b
1,233
d
1,177
d
1,177
c
0,996
c
0,996
d
0,941
a
0,941
c
0,925
d
0,908
b
0,863
c
0,822
a
0,822
a
0,822
a
0,797
c
0,729
b
0,709
c
0,672
b
0,664
a
0,655
a
0,595
a
0,595
a
0,523
a
0,891
174
CASA 27
número Espaço
10 Sala de jantar
18 Circulação quartos
11 Sala de estar
20 Circulação
9 Copa
13 Sala de estar
33 Área de lazer
30 Quintal
1 Varanda
16 Sala de TV
6 Cozinha
4 Corredor lateral ext.
21 Suíte2
24 Suíte1
23 Banheiro
25 Escritório
19 Escritório suíte
5 Área de serviço
34 Varanda
2 Quintal
12 Lavabo
14 Sala de estar
3 Garagem
31 Quintal
32 Quintal
15 Sala de estar
17 Sala de TV
7 Despensa
22 Banheiro suíte2
29 Banheiro suíte1
26 Suíte master
8 Quarto empregada
37 Exterior
27 Closet suíte master
28 Banheiro suíte master
35 Quarto empregada
36 Banheiro empregada
Média
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,463
d
1,346
c
1,173
c
1,173
d
1,147
c
1,019
d
1,019
c
1,009
b
0,989
d
0,989
b
0,961
c
0,943
d
0,934
b
0,934
b
0,917
a
0,917
a
0,878
c
0,855
c
0,855
d
0,841
c
0,834
a
0,814
c
0,788
c
0,748
a
0,748
a
0,742
c
0,737
a
0,721
a
0,706
a
0,706
a
0,691
b
0,677
b
0,651
a
0,558
a
0,558
a
0,554
b
0,465
a
0,867
175
CASA 28
número
Média
Espaço
12 Circulação
25 Escada
11 Sala de jantar
26 Circulação
14 Circulação
15 Cozinha
7 Área de lazer
13 Banheiro
27 Circulação
10 Sala de estar
19 Área de serviço
37 Suíte3
28 Sala de jogos
17 Sala de som e bar
5 Corredor lateral
22 Circulação
8 Hall de entrada
6 Corredor lateral
2 Quintal
35 Suíte2
36 Suíte4
42 Escritório
32 Suíte1
16 Copa
1 Acesso principal
3 Garagem
38 Closet3
20 Quarto de passar roupa
29 Sala de jogos
4 Quintal
18 Sala de TV
21 Quarto empregada
23 Despensa
24 Quarto empregada
9 Escritório
43 Exterior
40 Banheiro suíte4
41 Banheiro suíte2
33 Closet1
34 Banheiro suíte1
30 Varanda
39 Banheiro suíte3
31 Varanda
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,273
c
1,189
b
1,096
d
1,096
c
1,016
c
0,913
b
0,906
d
0,900
a
0,894
c
0,869
c
0,869
c
0,863
c
0,840
b
0,818
b
0,787
c
0,778
c
0,768
c
0,728
c
0,720
d
0,720
c
0,720
c
0,720
d
0,708
b
0,704
a
0,700
d
0,700
b
0,681
b
0,677
a
0,674
b
0,660
c
0,646
a
0,621
a
0,621
a
0,621
a
0,615
a
0,600
c
0,583
a
0,583
a
0,575
a
0,575
a
0,558
b
0,558
a
0,472
a
0,758
176
CASA 29
número Espaço
11 Sala de estar
21 Escada
8 Hall de entrada
14 Copa
22 Sala de TV
9 Hall de entrada
1 Quintal
15 Cozinha
12 Sala de jantar
2 Acesso principal
16 Área de serviço
23 Circulação
3 Quintal
4 Corredor lateral
24 Suíte do casal
25 Circulação suíte1
13 Lavabo
10 Escritório
6 Corredor lateral
5 Corredor lateral
7 Área de lazer
34 Exterior
31 Suíte2
32 Suíte3
17 Quarto empregada
18 Banheiro empregada
19 Quarto empregada
20 Área de serviço
26 Suíte1
27 Banheiro suíte1
28 Closet suíte do casal
29 Banheiro suíte do casal
30 Banheiro suíte2
33 Banheiro suíte3
Média
Integração
Tipo (a,b,c,d)
1,327
c
1,185
b
1,071
c
1,071
c
1,046
b
0,999
c
0,946
d
0,916
c
0,898
a
0,847
c
0,816
c
0,816
b
0,801
c
0,801
c
0,787
b
0,787
b
0,773
a
0,735
a
0,711
c
0,705
c
0,705
c
0,705
a
0,640
b
0,640
b
0,630
a
0,630
a
0,630
a
0,630
a
0,613
a
0,613
a
0,613
a
0,613
a
0,520
a
0,520
a
0,786
177
Anexo 5 – Integração normalizada
Para efeito de comparação com universo mais amplo, foram pesquisadas a
menor e maior médias de integração, entre os estudos de Hanson, Trigueiro e Amorim.
Nesses estudos estão: casas vernaculares na França, casas de arquitetos em Londres, e
casas de arquitetos famosos do movimento moderno (Loos, Meier, Botta e Hejduk),
estudadas por Hanson; casas de arquitetos modernistas do Recife, estudadas por
Amorim; sobrados coloniais e casas modernistas em Natal estudados por Trigueiro.
As medidas de integração desses estudos são apresentadas em RRA (Real
Relative Assymmetry, ou Relativa Assimetria Real), medida tradicionalmente utilizada
na literatura para o estudo de espaços internos de edifícios. A RRA é, na verdade, a base
para a medida de integração, que é simplesmente o inverso da RRA, utilizada neste
trabalho. Para que não houvesse confusão entre as duas maneiras de se calculara
integração, optou-se por se fazer esse estudo em separado, a título de um exercício
comparativo com outros trabalhos disponíveis na literatura. Isso ajuda a entender o
quanto integrado são os sistemas aqui estudados, diante das pesquisas já realizadas. Os
dados usados nessa comparação estão nas tabelas desse anexo.
Em todo esse universo disponível, a casa mais integrada foi uma casa vernacular
estudada por Hanson, (com índice de 0,600) e a casa mais segregada foi uma residência
de Loos, também estudada por ela (com de 1,968). Para melhor visualização dos dados
da amostra, diante desses conjuntos, aqueles foram normalizados188 entre 0 e 1, onde os
valores mais próximos de zero significam, aqui, maior integração, e os valores mais
próximos de 1, maior segregação. Os valores normalizado dessa amostra estão na
Tabela 5g desse anexo.
Após essa normalização, a média do conjunto estudado foi de 0,498. A baixa
medida indica que, de maneira geral esse conjunto é pouco segregado, confirmando a
análise feita em relação aos estudos de Trigueiro e Amorim. Isso significa que as casas
estudadas em Brasília são exemplos de sistemas que – a partir das hipóteses encontradas
na literatura – deveriam favorecer um uso mais intenso e informal de seus espaços.
188
Para o cálculo de normalização será usada a fórmula: Vnorm = (V – Vmin)/(Vmáx – Vmin), onde
Vnorm é o valor gerado entre 0 e 1; V é o valor a ser normalizado; Vmin é o valor mínimo da faixa de
valores definida e o Vmáx é valor máximo da faixa de variação.
178
Tabela 5 a- Casa vernaculares
da Normandia - França
(HANSON, 1998, pág.84)
Imóvel
casa7
casa15
casa6
casa9
casa17
casa16
casa1
casa10
casa11
casa3
casa12
casa13
casa2
casa4
casa5
casa8
Média
Entr. do conj.
RRA
média
1,52
1,40
1,30
1,15
1,15
1,14
1,12
1,12
1,10
1,02
0,96
0,96
0,95
0,93
0,89
0,60
1,08
0,841
Entropia
0,61
0,72
0,71
0,49
0,68
0,68
0,76
0,78
0,86
0,84
0,69
0,76
0,66
0,60
0,66
0,42
Tablea 5b - Casas de arquitetos
em Londres
(HANSON, 1998, pág.227)
Imóvel
RRA
(média)
casa10
1,912
casa18
1,880
casa9
1,842
casa14
1,667
casa17
1,646
casa13
1,490
casa11
1,449
casa2
1,434
casa5
1,379
casa1
1,342
casa4
1,313
casa3
1,297
casa12
1,294
casa6
1,292
casa16
1,280
casa8
1,197
casa7
1,038
casa15
0,815
Média
1,420
Entr. do conj.
Tabela 5c - Casa das
"estrelas" arquitetônicas
(HANSON, 1998, pág. 267)
Imóvel
Loos
Hejduk
Botta
Meier
Média
Entropia
do conj.
RRA
(média)
1,968
1,832
1,396
1,388
1,646
0,975
0,865
Tabela 5d - Casa de arquitetos modernista em Recife
(AMORIM, 1999, pág. 77)
RRA
Entropi Integração Índice de
a
Imóvel
Média
Mínima
Funcion.
Svenson
0,884
0,432
0,74
1,229
0,750
Reynaldo
1,255
0,878
0,84
0,832
0,600
Domingues
1,261
0,846
0,87
0,825
0,740
Campelo
1,279
0,754
0,85
0,825
0,710
Borsoi
1,460
0,873
0,77
0,734
0,730
Esteves
1,537
0,918
0,87
0,684
0,690
Amorim
1,566
0,912
0,75
0,682
0,730
Pontual
1,559
1,065
0,79
0,672
0,650
Média
1,35
0,81
0,81
0,700
Entr. do conj.
0,936
179
Tabela 5e - Sobrados coloniais em Recife
(TRIGUEIRO, 1995, pág.12-13)
RRA
Entropia Integração
Imóvel
Máxima Média Mínima
Sobrado 1
1,390
1,009
0,575
0,855
1,053
Sobrado 2
1,317
0,952
0,467
0,809
1,137
Sobrado 3
2,337
1,538
0,827
0,803
0,711
Sobrado 4
2,029
1,512
0,854
0,861
0,693
Média
1,25
0,83
0,90
Entropia do conj.
0,954
Tabela 5f – Casas modernistas em
Natal, casas reformadas e
não-reformadas e
novas construção
(TRIGUEIRO, 2000, pág. 40.2)
Imóvel RRA
(média)
conv2
1,78
reform2
1,58
conv9a
1,58
conv3
1,50
moder9
1,43
nova7
1,40
moder3
1,35
reform1
1,35
conv9a
1,34
conv1
1,32
moder7
1,31
reform3
1,30
moder10
1,28
reform5
1,28
nova12
1,24
moder5
1,23
moder4
1,20
nova10
1,20
nova6
1,16
moder8
1,14
conv5
1,11
moder1
1,08
moder1
1,08
moder2
1,05
reform4
1,02
conv4
1,02
moder6
1,00
média
1,27
Entropia
0,930
do conj.
Tabela 5g – Casas da amostra
Imóvel
casa19
casa23
casa12
casa5
casa15
casa20
casa13
casa16
casa1
casa26
casa7
casa27
casa9
casa22
casa25
casa4
casa21
casa14
casa6
casa29
casa18
casa28
casa10
casa2
casa8
casa17
casa3
Média
Entro.
RRA
RRAn
(Média)
0,952
0,257
1,064
0,339
1,091
0,359
1,101
0,366
1,145
0,398
1,148
0,401
1,141
0,395
1,180
0,424
1,209
0,445
1,204
0,442
1,221
0,454
1,226
0,458
1,266
0,487
1,231
0,461
1,263
0,485
1,276
0,494
1,356
0,553
1,343
0,543
1,310
0,519
1,339
0,540
1,384
0,573
1,382
0,572
1,386
0,575
1,442
0,615
1,588
0,722
1,612
0,740
1,751
0,841
1,282
0,498
0,925
180
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Configuração espacial e modo de vida em casas de Brasília