FACULDADE DE PARÁ DE MINAS
Curso de Direito
Daniel de Sá e Castro
A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DOS JURADOS DO
TRIBUNAL DO JÚRI
Pará de Minas
2014
Daniel de Sá e Castro
A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DOS JURADOS DO
TRIBUNAL DO JÚRI
Monografia apresentada ao curso de Direito
da Faculdade de Pará de Minas como
requisito parcial para a conclusão do curso de
Bacharelado em Direito.
Orientador: Prof. Ms. Francisco José Villas
Boas Neto.
Pará de Minas
2014
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Daniel de Sá e Castro
A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DOS JURADOS DO
TRIBUNAL DO JÚRI
Monografia apresentada ao curso de Direito
da Faculdade de Pará de Minas como
requisito parcial para a conclusão do curso de
Bacharelado em Direito.
Aprovada em: _____ / _____ / _____
___________________________________
Orientador Francisco José Villas Boas Neto
____________________________________
(Titulação e nome do professor examinador)
Com muito carinho, dedico este trabalho à
minha esposa Helenísia e a minha filha
Hanna Kálita.
AGRADECIMENTO
Este trabalho não seria possível se não fosse o auxílio e o apoio de pessoas
tão especiais. Por isso, gostaria de agradecê-las por contribuírem para sua
realização.
Agradeço primeiramente à Deus, pela vida e pela oportunidade de
aprendizado constante.
À minha esposa Helenísia, pelo apoio incondicional e por acreditar que eu
era capaz, mesmo nos momentos em que eu mesmo duvidava disso.
À minha filha Hanna, que com sua simplicidade, me inspira a sonhar e a
acreditar nestes sonhos.
Aos meus sobrinhos, em especial à Ana Clara, pelo carinho e confiança.
Quero agradecer ainda, ao meu orientador Francisco José Vilas Boas Neto,
pela diligente orientação e ponderações dispensadas para a realização deste
trabalho.
Por fim, a todos os meus mestres, em especial, Giovani Mendonça, Rômulo
Mendonça, Renato Corradi, José Henrique, Leonardo Tibo, Fabrício Veiga, Ana
Paula e Evandro Alair Camargos. Meu Muito obrigado a todos!
Mergulha a mente, quando possível, no estudo.
O estudo liberta da ignorância e favorece a
criatura com discernimento.
O estudo e o trabalho são as asas que facilitam
a evolução do ser.
O conhecimento é mensagem de vida.
Não apenas nos educandários podes estudar.
A própria vida é um livro aberto, que ensina a
quem deseja aprender.
Divaldo Pereira Franco
RESUMO
O presente artigo objetiva analisar se a mídia interfere nos julgamentos do Tribunal
do Júri, atuando na formação da opinião dos jurados, influenciando assim no seu
veredicto, quando do julgamento de crimes dolosos contra a vida, de grande
repercussão. Num primeiro momento, faz-se um breve relato sobre a origem do
Tribunal do Júri, bem como sua composição por pessoas comuns, escolhidas da
própria sociedade. Em segundo momento, analisa-se os princípios constitucionais,
em especial os relativos ao Tribunal do Júri, buscando demonstrar os direitos e
garantias dispensados aos acusados e também à própria sociedade, com o fim de
assegurar um julgamento justo. Em terceiro plano procura-se demonstrar os direitos
adquiridos pela imprensa, que são garantidos pela Constituição Federal e o abuso
destes direitos, em especial pela mídia sensacionalista, abordando os métodos e
práticas que ela utiliza na manipulação da notícia e influência da opinião pública, em
confronto direto com os outros princípios fundamentais abordados. Ao final, tendo
como exemplo o “Caso Isabella Nardoni”, faz-se uma análise da cobertura
jornalística realizada pela mídia e de possíveis influências que ela exerceu nas
decisões do Júri, devido aos julgamentos e pré-condenações divulgados
exaustivamente em seus veículos.
Palavras-Chave: Tribunal do Júri; Jurados; Influência da mídia; Manipulação de
opiniões; Sensacionalismo.
SUMÁRIO
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1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8
2 O TRIBUNAL DO JÚRI.............................................................................................10
2.1 Origem do Tribunal do Júri.........................................................................................10
2.2 A composição do Tribunal do Júri......................................................................13
3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS............................................................................16
3.1 Princípios constitucionais....................................................................................
16
3.1.1 O princípio da presunção de inocência............................................................ 16
3.1.2 O princípio da ampla defesa............................................................................ 16
3.1.3 O princípio do contraditório...................................................................................
17
3.2 Princípios constitucionais do Tribunal do Júri...................................................
17
3.2.1 Da plenitude de defesa..................................................................................... 17
3.2.2 Do sigilo das votações...................................................................................... 18
3.2.3 Da soberania dos veredictos.................................................................................
19
3.2.4 Da competência para julgamento dos crimes contra a vida............................ 19
4 A MÍDIA................................................................................................................. 21
4.1 A mídia e os princípios constitucionais.............................................................21
4.2 A mídia e a publicidade dos atos processuais..................................................24
4.3 A mídia sensacionalista........................................................................................
26
4.4 A mídia sensacionalista na formação da opinião pública................................29
5 ESTUDO DE CASO...................................................................................................
33
5.1 O caso Isabella Nardoni.......................................................................................33
5.2 O caso Nardoni e a mídia.................................................................................. 35
5.3 Reportagem do Fantástico exibida no dia 20 de Abril de 2008..................... 40
6. CONCLUSÃO............................................................................................................
44
REFERÊNCIAS........................................................................................................ 45
8
1 INTRODUÇÃO
A atual Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 5º, inciso
XXXVIII, alínea ‘d’, reconhece a instituição do Tribunal do Júri com competência
para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, os quais são discriminados no
art. 74, § 1º do Código de Processo Penal, como sendo os crimes de homicídio;
instigação, induzimento e auxílio ao suicídio; infanticídio e o aborto.
Os referidos crimes são eivados de grande valor moral e ético pela
sociedade que, naturalmente, se comove quando do seu acontecimento.
Determinados fatos, devido a algumas características que lhe são peculiares,
ganham repercussão em nível nacional. A sociedade então se sensibiliza com o fato
criminoso e tenta buscar, o mais rápido possível, explicações para o ocorrido, quem
foi o seu agente e uma imediata punição que lhe seja exemplar.
Neste momento, entram em cena os grandes meios de comunicação em
massa. É por meio da televisão, jornais e de outros veículos midiáticos, que as
informações sobre o fato-crime chegam até esta sociedade ávida por explicações.
Isso faz com que as pessoas dependam do que se divulga na mídia, para que
formem opiniões a respeito do assunto.
O presente trabalho tem por objetivo principal analisar se essa mídia, ao
assumir uma postura positiva ou negativa sobre o fato criminoso, emitindo juízo de
valor sobre ele, influencia as decisões dos jurados, que também estão inseridos
nesta sociedade receptora das informações, determinando o seu veredicto.
Para tanto, faz-se necessário conhecer a origem do Tribunal do Júri, os
princípios constitucionais que o regem, bem como sua composição pelos chamados
“juízes leigos” que julgam sem a necessidade de fundamentar suas decisões.
Surge, neste contexto, a mídia, em especial a mídia sensacionalista, como
veículo formador de opiniões. Serão abordados os princípios e garantias
constitucionais que lhe asseguram a liberdade de informação e o mal uso desta
liberdade quando da manipulação da notícia e conseqüentemente da opinião
pública.
Por fim, como exemplo, será analisada a cobertura dos meios de
comunicação no caso Isabella Nardoni, com o intuito de verificar se a ampla
exposição deste caso na mídia foi fator determinante para a condenação dos
9
acusados pelo conselho de sentença, devido aos julgamentos e pré-condenações
exaustivamente divulgados em seus veículos.
A metodologia utilizada para alcançar o objetivo deste trabalho foi a
pesquisa bibliográfica.
10
2 O TRIBUNAL DO JÚRI
2.1 Origem do Tribunal do Júri
A maneira pela qual se julga os crimes dolosos contra vida no Brasil é
através do Tribunal do Júri, previsto na Constituição Federal de 1988, cujo
procedimento está regulado nos artigos 406 a 497 do Código de Processo Penal.
A palavra “júri” tem origem no termo em latim “jurare”, que significa “fazer
juramento”. Este juramento a que se faz referência é prestado pelos membros do
chamado Conselho de Sentença, previsto no artigo 472 do Código de Processo
Penal.
Art. 472. Formado o Conselho de Sentença, o presidente, levantando-se, e,
com ele, todos os presentes, fará aos jurados a seguinte exortação:
Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a
proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames
da justiça.
Os jurados, nominalmente chamados pelo presidente, responderão:
Assim o prometo.
Há muita divergência entre os doutrinadores, quanto à sua origem. Há quem
veja um fundamento divino para a legitimidade desse órgão. Neste caso, um fato
bem conhecido, ocorrido na antiguidade, foi o julgamento de Jesus Cristo, ainda que
desprovido das garantias mínimas de defesa, o qual é lembrado como um processo
com características que se assemelham ao júri.
Alguns autores visualizam o surgimento do Tribunal do Júri na antiga
Palestina, formada na época por sociedades cuja população era unida por laços de
sangue e afetividade. A esse respeito, Nucci (2008, p.41) afirma:
Na Palestina, havia o Tribunal dos Vinte e Três nas vilas em que a
população fosse superior a 120 famílias. Tais Cortes conheciam e julgavam
processos criminais relacionados a crimes puníveis com a pena de morte.
Os membros eram escolhidos dentre padres, levitas e principais chefes de
famílias de Israel.
Todavia, a instituição, em sua visão moderna, encontra sua origem na
Magna Carta, da Inglaterra, de 1215, sendo a partir daí, propagado pelo mundo
ocidental perdurando até hoje. De acordo com Nucci (2008, p.33), a Magna Carta,
11
em seu artigo 48, preceituava “Ninguém poderá ser detido, preso ou despojado dos
seus bens, costumes e liberdades, senão em virtude de julgamento de seus pares
segundo as leis do país”.
Após a Revolução Francesa de 1789, tendo por finalidade combater as
idéias e métodos praticados pelos magistrados do regime monárquico (absolutista),
estabeleceu-se o júri na França, daí espalhando como um ideal de liberdade e
democracia para os outros países da Europa. Sobre esse fato, Nucci (2008, p.47)
afirma:
Lembremos que o Poder Judiciário não era independente, motivo pelo qual
o julgamento do júri impunha-se como justo e imparcial, porque produzido
pelo povo, sem a participação de magistrados corruptos e vinculados aos
interesses do soberano.
O tribunal do Júri foi instituído no Brasil, em 18 de Julho de 1822, com
competência para julgar os crimes de imprensa. Era um tribunal composto por 24
cidadãos “bons, honrados, inteligentes e patriotas”, prontos para julgar os crimes de
abuso da liberdade de imprensa, sendo que suas decisões eram passíveis de
revisão somente pelo Príncipe Regente.
Com a Constituição Imperial de 1824, o tribunal popular foi reafirmado como
órgão com competência para julgar crimes que afetavam determinados bens
jurídicos, em especial, os crimes contra a vida, passando assim, a ter sede
constitucional, incluída no capítulo relativo ao Poder Judiciário.
Com a Proclamação da República e o advento da constituição de 1890, o
Júri manteve-se, sendo, no entanto, transferido para o contexto dos direitos e
garantias individuais.
A Constituição de 1934 voltou a inserir o júri no capítulo referente ao Poder
Judiciário, para depois, na Constituição de 1937, ser totalmente retirado do texto
constitucional, no início do período ditatorial.
Com o advento da Constituição de 1946, o Tribunal do Júri voltou ao texto
constitucional, sendo reinserido no capítulo dos direitos e garantias individuais.
Sobre essa nova inclusão, discorre Nucci (2008, p.750):
(…) como se fosse uma autêntica bandeira na luta contra o autoritarismo,
embora as razões tenham sido outras, segundo narra Victor Nunes Leal, ou
seja, por conta do poder de pressão do coronelismo, interessado em
garantir a subsistência de um órgão judiciário que pudesse absolver seus
12
capangas. (Coronelismo, enxada e voto, p. 231-236). Não se estudou com a
merecida atenção a permanência ou a extinção do júri no Brasil, mas
buscou-se somente reerguer as bases das Constituições anteriores.
A constituição de 1967 manteve a instituição no capítulo dos direitos e
garantias individuais, fazendo o mesmo a Emenda constitucional de 1969. Esta
última, no entanto, somente mencionou a mantença da instituição, não se referindo
sobre sua soberania, sigilo nas votações ou plenitude de defesa.
Com o retorno da democracia no Brasil com o advento da Constituição de
1988, o júri foi previsto no capítulo dos direitos e garantias individuais, trazendo os
princípios da Soberania dos veredictos, sigilo das votações e plenitude de defesa.
Sua competência é apenas para julgar os crimes dolosos contra a vida. De acordo
com Nestor Távora (2013, p.826):
Com a Constituição de 1988, o Júri foi confirmado como direito e garantia
fundamental. Garantia de sujeição ao tribunal popular, nos crimes de sua
competência, para atendimento ao devido processo legal. E direito,
conferido de forma ampla, de participar da atividade do Judiciário, na
condição de jurado (juízes leigos).
Discorrendo sobre o assunto, destaca Nucci (2013, p.751):
Trata-se de uma garantia ao devido processo legal, este sim, uma garantia
ao direito de liberdade. Assim, temos a instituição do Júri, no Brasil, para
constituir o meio adequado de, em sendo o caso, retirar a liberdade do
homicida. Nada impede a existência de garantia da garantia, o que é
perfeitamente admissível, bastando ver, a título de exemplo, que o
contraditório é também garantia do devido processo legal. (…) as pessoas
têm direito a um julgamento justo feito por um tribunal imparcial, assegurado
a ampla defesa (…). Por outro lado, não deixamos de visualizar no júri, em
segundo plano, um direito individual, consistente na possibilidade que o
cidadão de bem possui de participar, diretamente, dos julgamentos do
Poder Judiciário.
O Tribunal do Júri está inserido como um direito e garantia fundamental no
artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, e deve ser compreendida como
um direito que o povo tem de participar diretamente das decisões do Poder
Judiciário e a garantia para os acusados ao devido processo legal, quando da
prática de crimes dolosos contra a vida sendo julgados conforme este procedimento
constitucionalmente estabelecido.
13
2.2 A composição do Tribunal do Júri
A Constituição nada fala sobre sua composição, sendo esta prevista no
Código de Processo Penal. Conforme este Código, o Tribunal do Júri é composto
por um juiz de Direito (que é o Presidente), e vinte e cinco jurados que serão
sorteados dentre os alistados. Destes vinte e cinco, sete serão escolhidos para
comporem o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.
Importante destacar o posicionamento de Nucci (2013, p.785) sobre a
composição desta instituição, diante de seu dever de julgar de forma justa e
imparcial:
A formação do corpo de jurados do Tribunal do Júri poderia, de algum
modo, afetar o princípio constitucional da plenitude de defesa? Poderia um
corpo de jurados de elevado nível cultural agir imparcialmente para julgar
um réu simplório e ignorante, autor de um crime violento? Resta-nos
analisar o que seria considerado um par, pois o júri é a instituição destinada
a promover o julgamento do réu pelos seus pares. Par é a pessoa humana,
aquele que é igual, semelhante, parceiro, lembrando-se que todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Portanto, é natural
que possa uma pessoa ignorante julgar o culto e vice-versa (...).
Somos da opinião de que o julgamento pelos pares significa apenas a
garantia de um ser humano leigo julgando outro, além do que cultura e
formação não são qualidades justificadoras da dispensa de um jurado. É
preciso lembrar que o povo julgará o homem e também teses jurídicas, de
modo que as partes precisam falar a quem possa entender o espírito da lei,
a fim de que as decisões não se distanciem em demasia da legislação penal
vigente (...).
Em suma, por ora, cremos ser preferível garantir um conjunto de jurados
preparados do que, a pretexto de afirmar uma composição mista, escolher
para a organização do júri, indivíduos incultos e totalmente impossibilitados
de compreender os assuntos debatidos em plenário.
Os jurados que irão compor o Conselho de Sentença, são pessoas
residentes na própria comarca, que serão inscritas em uma lista geral. Nas
comarcas com mais de um milhão de habitantes, serão listados entre 800 e 1500
jurados. Nas comarcas com mais de cem mil habitantes, de 300 a 700 e, nas com
população menor que cem mil, de 80 a 400 jurados, conforme artigo 425 do Código
de Processo Penal.
O exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante
e estabelecerá presunção de idoneidade moral, conforme art. 439 do Código de
Processo Penal.
Podem ser jurados os cidadãos maiores de 18 anos e será facultativo aos
14
maiores de 70 (setenta) anos (art. 437, IX, Código de Processo Penal).
Com relação à idade mínima para ser jurado, Nucci (2013, p.787) faz a
seguinte observação:
A Lei 11.689/2008 reduziu a idade mínima para ser jurado de 21 para 18
anos, ingressando na contramão das mais recentes alterações
constitucionais (...). Quer crer tenha tido o legislador bons propósitos, com o
fim de buscar integrar os jovens, muitos deles iniciando sua atividade
universitária, nos trabalhos do Tribunal do Júri. Olvidou-se, no entanto, que
o julgamento, sem fundamentação e por meio de voto secreto, é uma
responsabilidade ímpar, demandando preparo e razoável experiência de
vida. Por certo, muitas pessoas, com 18 anos, já possuem a necessária
experiência, mas outros tantos, em número incalculável, não tem a estrutura
suficiente para compreender as teses expostas e o grau de
responsabilidade que se lhes é apresentado. Tanto é realidade que ainda
perdura a atenuante obrigatória para o agente que comete delitos com
menos de 21 anos (art. 65, I, CP), devendo-se tal preceito ao grau de
imaturidade ainda persistente na formação do jovem adulto.
Além da idade, é necessário que o jurado seja pessoa de notória idoneidade,
que na prática, é apurada pela ausência de antecedentes criminais. A idoneidade
moral é a linha norteadora da formação da lista dos jurados. Deve ainda ser pessoa
alfabetizada, possuidor de saúde mental e física compatível com a função, bem
como deve estar no gozo de seus direitos políticos, além de ser brasileiro.
Na lista geral dos jurados deverá apresentar o nome e profissão e será
publicada pela imprensa, bem como afixada na porta do fórum, até o dia 10 de
Outubro de cada ano, conferindo-se publicidade ao ato de escolha dos jurados,
juízes leigos.
Em seguida à organização da pauta, o juiz presidente intimará os
representantes do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da
Defensoria Pública para acompanharem, em dia e hora designados, o sorteio dos
jurados que atuarão na reunião periódica, conforme art. 432 do Código de Processo
Penal.
Esse sorteio deverá ser feito a portas abertas, sendo que deverá sortear da
lista geral, 25 (vinte e cinco jurados) para as reuniões periódicas ou extraordinárias
(art. 433 do CPP). A lista dos sorteados será fixada no edifício do Tribunal do Júri,
para dar publicidade à escolha.
No dia da Sessão de Julgamento, dos 25 (vinte e cinco) jurados sorteados,
se estiverem presente no mínimo 15 (quinze) o juiz presidente declarará instalados
os trabalhos. Se não houver no mínimo 15 (quinze) jurados dos 25, será feito o
15
sorteio dos suplentes e remarcada a sessão o júri.
Desta forma, o Tribunal do Júri terá a seguinte composição, de acordo com
Nucci (2013, p.786):
O Tribunal Popular é composto pelo juiz togado, que o preside, e por 25
jurados sorteados para a sessão, e não unicamente pelo magistrado e pelo
Conselho de Sentença (7 jurados escolhidos dentre os 25). Há, na
realidade, 26 pessoas envolvidas no julgamento (um juiz de direito e 25
juízes leigos), dos quais, em uma segunda etapa, atinge-se o número de
oito (um juiz presidente e sete jurados). Por outro lado, para validamente
começar seus trabalhos, devem reunir-se, pelo menos, 16 pessoas (um juiz
togado e 15 jurados). Portanto, pode-se dizer que há o Tribunal do Júri
pleno (26 pessoas), o Tribunal do Júri mínimo (16 pessoas) e o Tribunal do
Júri constituído para o julgamento (8 pessoas).
Cumpre ressaltar ainda, que o jurado somente será dispensado de compor o
Conselho de Sentença, por decisão motivada do juiz presidente, consignada na ata
dos trabalhos, conforme art. 444 do Código de Processo Penal.
16
3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
A Constituição Federal de 1988 consagrou alguns princípios que são a base
do processo penal. Esses princípios foram consagrados a fim de se obter um
julgamento justo e imparcial. Dentre eles, podemos destacar:
3.1 Princípios constitucionais
3.1.1 O princípio da presunção de inocência
É conhecido como o princípio do estado de inocência (ou da não
culpabilidade), que significa que todo acusado é presumido inocente, até que seja
declarado culpado por sentença condenatória transitado em julgado. Esse princípio
encontra-se previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição “Ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
De acordo com Távora (2013, p.55), o reconhecimento da autoria de uma
infração criminal pressupõe uma sentença condenatória transitada em julgado:
Antes deste marco, somos presumivelmente inocentes, cabendo à
acusação o ônus probatório desta demonstração, além do que o
cerceamento cautelar da liberdade só pode ocorrer em situações
excepcionais e de estrita necessidade (...). A presunção de inocência está a
exigir redobrado cuidado.(...) a própria exposição da figura do indiciado ou
réu na imprensa através da apresentação da imagem ou de informações
conseguidas no esforço investigatório podem causar prejuízos irreversíveis
à sua figura.
3.1.2 O princípio da ampla defesa
Por este princípio, entende-se que é concedido ao réu o direito de se valer
de amplos e extensos métodos para se defender da imputação feita pela acusação.
Nucci (2013, p.92), discorrendo sobre o assunto, afirma que:
Encontra fundamento constitucional no art. 5º, LV. Considerando, no
processo, parte hipossuficiente por natureza, uma vez que o Estado é
sempre mais forte, agindo por órgãos constituídos e preparados, valendo-se
de informações e dados de todas as fontes as quais tem acesso, merece o
réu um tratamento diferenciado e justo, razão pela qual a ampla
possibilidade de defesa se lhe afigura a compensação devida pela força
estatal.
17
Este princípio, no entanto, não deve ser confundido com o princípio da
plenitude da defesa, que será analisado mais detalhadamente mais à frente.
3.1.3 O princípio do contraditório
Este princípio quer dizer que a toda alegação fática ou apresentação de
prova, feita no processo por uma das partes, tem a outra parte o direito de se
manifestar, havendo equilíbrio na relação estabelecida entre a pretensão punitiva do
Estado e o direito à liberdade e à manutenção da condição de inocente do acusado.
Como afirma Elio Fazzalari (apud TÁVORA, 2013, p.59):
(...) a própria essência do contraditório exige que dele participem ao menos
dois sujeitos, um ‘interessado’ e o contra ‘interessado’, sobre um dos quais
o ato final é destinado a desenvolver efeitos favoráveis, e, sobre o outro,
efeitos prejudiciais.
Távora (2013, p.59) ainda complementa:
Ao agente, autor ou réu, será admitido a influenciar o conteúdo da decisão
judicial, o que abrange o direito de produzir prova, o direito de alegar, de se
manifestar, de ser cientificado, dentre outros. (...) por fim, importante
ressaltar o entendimento majoritário segundo o qual não é exigível o direito
ao contraditório em sede de inquérito policial, já que se trata de
procedimento administrativo de caráter informativo.
3.2 Princípios constitucionais do Tribunal do Júri
A Constituição, em seu artigo 5º, inciso XXXVIII, assentou os princípios do
Tribunal do Júri, sendo eles: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a
soberania dos veredictos; e d) a competência para o julgamento de crimes dolosos
contra a vida.
Discorreremos, a seguir, sobre cada um destes princípios:
3.2.1 Da plenitude de defesa
No Tribunal do Júri, o que se busca, não é apenas garantir uma ampla
defesa para o acusado. Vai além disso, pois contempla uma defesa plena, completa,
a mais próxima possível do perfeito (art. 5º, XXXVIII, “a”, CF/88).
18
Segundo preleciona Távora (2013, p.755):
A plenitude de defesa revela uma dupla faceta, afinal, a defesa está dividida
em técnica e autodefesa. A primeira, de natureza obrigatória, é exercida por
profissional habilitado, ao passo que a última é uma faculdade do imputado,
que pode efetivamente trazer a sua versão dos fatos, ou valer-se do direito
ao silêncio. Prevalece no Júri a possibilidade não só da utilização de
argumentos técnicos, mas também de natureza sentimental, social e até
mesmo de política criminal, no intuito de convencer o corpo de jurados.
Sobre este princípio, argumenta Nucci (2013, p.93):
Os vocábulos são diversos e também o seu sentido. Amplo quer dizer vasto,
largo, muito grande, rico, abundante, copioso; pleno significa repleto,
completo, absoluto, cabal, perfeito. O segundo é, evidentemente, mais forte
que o primeiro. (...), no Tribunal do Júri, onde as decisões são tomadas pela
íntima convicção dos jurados, sem qualquer fundamentação, onde
prevalece a oralidade dos atos e a concentração da produção de provas,
bem como a identidade física do juiz, torna-se indispensável, que a defesa
atue de modo completo e perfeito – logicamente dentro das limitações
impostas pela natureza humana. Como já tivemos ocasião de expor e tratar
com maiores detalhes, júri sem defesa plena não é um tribunal justo e,
assim não sendo, jamais será uma garantia ao homem.
3.2.2 Do sigilo das votações
Este princípio visa a garantir que o jurado possa manifestar seu voto com
tranqüilidade e isenção de pressões externas, podendo assim, decidir com íntima
convicção, de forma justa e imparcial.
O sigilo das votações envolve o voto e o local do voto. Para evitar
intimidação dos jurados, as votações ocorrem em sala especial, com a presença das
pessoas indispensáveis a esse ato, neste caso, o juiz, os jurados, o membro do
Ministério Público, o advogado do réu e os auxiliares da justiça.
Para assegurar o sigilo, é necessário que o juiz se acautele para suspender
a divulgação dos demais votos assim que se definir a votação de cada quesito,
evitando que seja o sigilo violado no caso de ocorrer uma votação unânime.
De acordo com Távora (2013, p.756):
Em síntese, não mais haverá unanimidade, na expectativa que
indiretamente o sigilo não seja quebrado, de sorte a evitar-se qualquer tipo
de pressão ou ingerência na atividade dos juízes do povo.
19
3.2.3 Da soberania dos veredictos
Conforme disposto no art. 5º, XXXVIII, 'c', da Constituição, proferida a
decisão final pelo Tribunal do Júri, não há possibilidade de ser alterada pelo tribunal
togado, quanto ao mérito.
Havendo apelação, se for provida, o máximo que o tribunal poderá fazer
será determinar novo julgamento, porém, o órgão julgador, quanto ao mérito, será,
novamente, o Tribunal do Júri, composto por outros jurados que não participaram da
decisão combatida.
Távora (2013, p.756) aborda o assunto, afirmando que:
A soberania dos veredictos alcança o julgamento dos fatos. Os jurados
julgam os fatos. Esse julgamento não pode ser modificado pelo juiz togado
ou pelo tribunal que venha a apreciar um recurso. Daí que em hipótese de
julgamento manifestamente contrário à prova dos autos, a apelação provida
terá o condão de cassar o julgamento e mandar o acusado a um novo júri.
Note-se que o tribunal não altera o julgamento para condenar ou absolver o
acusado, ou mesmo para acrescer ou suprimir qualificadora. Como a
existência do crime e de suas circunstâncias é matéria fática, sobre ela recai
o princípio da soberania dos veredictos, não podendo seu núcleo ser
vilipendiado, senão por uma nova decisão do tribunal popular. Contudo, em
prol da inocência, tal princípio não é absoluto, admitindo-se que o Tribunal
de Justiça absolva de pronto o réu condenado injustamente pelo júri em
sentença transitada em julgado, no âmbito da ação de revisão criminal.
3.2.4 Competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida
A competência encontra-se prevista no art. 5º, XXXVIII, 'd', da Constituição,
assegurando a competência mínima para o Tribunal do Júri, que deverá processar e
julgar os crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados.
Estes crimes são descritos no artigo 74, § 1º, do CPP como sendo os crimes
de homicídio; instigação, induzimento, auxílio ao suicídio; infanticídio e o aborto.
Nada impede, no entanto, que o legislador ordinário promova a inserção, em
normas processuais, de outros casos a serem julgados pelo Tribunal do Júri.
Atualmente, o Júri já julga outras infrações penais, desde que conexas com os
delitos dolosos contra a vida.
Percebe-se que os crimes enumerados são carregados de forte clamor
social, onde a repercussão poderá alcançar patamares alarmantes, levando a
população a buscar os responsáveis, as razões e fatos que dão uma explicação
20
para o cometimento do delito.
Como visto, a Constituição Federal de 1988, firmou um posicionamento de
que todo acusado tem o direito a um julgamento justo e imparcial, assegurada a
plenitude de defesa e marcado pelo estrita observância dos procedimentos formais
previstos em lei.
No entanto, não obstante todas estas garantias que procuram assegurar ao
réu um julgamento justo e imparcial pelo Tribunal do Júri, a mídia, embora essencial
para a democracia, pode interferir neste processo de garantias, influenciando os
jurados, levando-os a tomarem decisões contrárias às provas apresentadas nos
autos ou nos debates orais.
21
4 A MÍDIA
Para melhor compreensão deste trabalho, faz-se necessária a definição de
alguns termos: mídia, influência e sensacionalismo.
Para Venício A. de Lima (2004, p.50) mídia é definida como sendo:
(...) quando falamos da mídia, estamos nos referindo ao conjunto das
emissoras de rádio e de televisão (aberta e paga), de jornais e de revistas,
do cinema e das outras diversas instituições que utilizam recursos
tecnológicos na chamada comunicação de “massa”.
Influência, neste trabalho tem a definição dada por Noelle-Neumann (apud
TEIXEIRA, 2011, p.56) como sendo “o processo pelo qual o indivíduo modifica a sua
própria representação da realidade social a partir do que é apresentado pelos e nos
meios de comunicação”.
Conforme o Dicionário da Comunicação, citado por Teixeira (2011, p.20),
considera-se sensacionalismo:
Estilo jornalístico caracterizado por intencional exagero da importância de
um acontecimento, na divulgação e exploração de uma matéria, de modo a
emocionar ou escandalizar o público. Esse exagero pode estar expresso no
tema (no conteúdo), na forma do texto e na apresentação visual
(diagramação) da notícia. O apelo ao sensacionalismo pode conter objetivos
políticos (mobilizar a opinião pública para determinar atitudes ou pontos de
vista) ou comerciais (aumentar a tiragem do jornal) (...).
4.1 A mídia e os princípios constitucionais
A mídia sensacionalista, na sua busca pela audiência, utiliza-se de métodos
e técnicas para tornar a notícia atrativa ao grande público. Dessa forma, o interesse
que predomina não é o de transmitir informações verídicas. A verdade, neste caso,
não é sua prioridade.
No entanto, à mídia, de forma geral, é garantido o direito à liberdade de
expressão, a chamada liberdade de imprensa.
A Constituição Federal eleva o direito à liberdade de expressão, inserindo-o
no capítulo dos direitos e garantias fundamentais. Deste direito à liberdade de
expressão, nasce a chamada liberdade de imprensa, que se refere ao direito de a
todos informar, comunicar ou declarar opinião, como também, o direito de ser
22
informado.
Artigo 5º - (…)
(…)
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença;
(…)
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a
defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;
Para tratar dos meios de comunicação social e da liberdade de imprensa, o
legislador constitucional originário empregou artigo próprio, que lhes confere
tratamento privilegiado, nos seguintes termos:
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão
qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à
plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de
comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e
XIV.
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política,
ideológica e artística.
Luiz Roberto Barroso (2001, p.10) discorre sobre o assunto, afirmando que:
A liberdade de informação diz respeito ao direito individual de comunicar
livremente fatos e ao direito difuso de ser deles informado. A liberdade de
expressão tutela o direito de externar idéias, opiniões, juízos de valor e
manifestações do pensamento em geral. Tanto em sua dimensão individual
como, especialmente, na coletiva, entende-se que as liberdades de
informação e de expressão servem de fundamento para o exercício de
outras liberdades, o que justifica sua posição de preferência em tese
(embora não de superioridade) em relação aos direitos individualmente
considerados.
A liberdade de informação, considerando mais restritamente a liberdade de
imprensa, é imprescindível para a existência de uma democracia, quando leva ao
conhecimento da população eventos ocorridos no passado ou ainda em curso,
principalmente aqueles que poderão influenciar decisivamente o seu cotidiano.
A mídia exerce um papel social, não somente nos aspectos culturais e
econômicos da sociedade, mas também nas questões jurídicas, quando dá
23
publicidade aos atos processuais, fazendo com que a sociedade interaja mais com o
judiciário.
A publicidade dos atos processuais pela mídia, além de ser um direito da
sociedade de ser informada dos atos do judiciário, constitui-se também, em tese,
uma garantia do acusado, pois proporciona maior segurança contra a ilegalidade e
parcialidade no seu julgamento.
No entanto, essa liberdade de informar não deve ser entendida como uma
liberdade absoluta. Muito pelo contrário, essa liberdade de informação deve ser
ponderada, frente a outros direitos fundamentais igualmente garantidos pela
Constituição.
Como bem ensina Fábio Costa Soares (2011, sem paginação):
Entretanto, isso não significa que a liberdade de comunicação não deva ter
compromisso com os demais direitos consagrados à pessoa no Texto
Constitucional. Assim, se até mesmo a liberdade de ir e vir pode sofrer
restrições para preservação de outros direitos fundamentais, o mesmo
poderá ocorrer com a liberdade de comunicação. O caput e o parágrafo
primeiro do artigo 220 da Constituição de 1988 indicam a existência de
outras normas constitucionais que devem ser observadas, por
reconhecerem direitos com igual status na Constituição.
Apesar da inegável relevância para a promoção da cidadania, sendo
instrumento fundamental da democracia, a liberdade de comunicação está
inserida no contexto das liberdades públicas e, portanto, não é o
único direito ou interesse protegido pela norma constitucional.
A relevância da liberdade de comunicação não pode ser elevada a
patamar que fulmine os demais direitos fundamentais reconhecidos ao
cidadão pela Constituição de 1988. A dignidade da pessoa humana é
fundamento do Estado Democrático de Direito (CRFB/88, artigo 1º, III) e
dele decorrem a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem
das pessoas (CRFB/88, artigo 5º, X).
Afirma ainda Barroso (2001, p.11):
A colisão de princípios constitucionais ou de direitos fundamentais não se
resolve mediante o emprego dos critérios tradicionais de solução de
conflitos de normas, como o hierárquico, o temporal e o da especialização.
Em tais hipóteses, o intérprete constitucional precisará socorrer-se da
técnica da ponderação de normas, valores ou interesses, por via da qual
deverá fazer concessões recíprocas entre as pretensões em disputa,
preservando o máximo possível do conteúdo de cada uma. Em situações
extremas, precisará escolher qual direito irá prevalecer e qual será
circunstancialmente sacrificado, devendo fundamentar racionalmente a
adequação constitucional de sua decisão.
Dessa forma, é certo que o direito de informar, exercido pela mídia, é
fundamental numa sociedade democrática. A informação é essencial, no entanto,
24
não deve fugir ao seu objetivo principal que é o de proporcionar à sociedade
informações verdadeiras, diante de uma situação em que é possível formar opiniões,
principalmente aquelas ligadas aos crimes contra a vida.
Ainda na visão de Barroso (2001, p.10),
É fora de dúvida que a liberdade de informação se insere na liberdade de
expressão em sentido amplo, mas a distinção parece útil por conta de um
inegável interesse prático, relacionado com os diferentes requisitos exigíveis
de cada uma das modalidades e suas possíveis limitações. A informação
não pode prescindir da verdade, pois é isso que as pessoas legitimamente
supõem estar conhecendo ao buscá-la. Decerto, não se cogita desse
requisito quando se cuida de manifestações da liberdade de expressão. De
qualquer forma, a distinção deve pautar-se por um critério de prevalência:
haverá exercício do direito de informação quando a finalidade da
manifestação for a comunicação de fatos noticiáveis, cuja caracterização vai
repousar, sobretudo no critério da sua veracidade.
É essencial que a notícia veiculada pela mídia, corresponda aos fatos, de
forma exata e imparcial, para que não confunda o receptor da informação,
induzindo-o a formar uma opinião errada sobre o assunto tratado.
4.2 A mídia e a publicidade dos atos processuais
Numa democracia, como é o caso do Brasil, é de suma importância que os
atos da administração pública sejam transparentes. Desta forma, incluindo os atos
do Poder Judiciário, deve-se observar o princípio da publicidade.
Em relação à publicidade dos atos do Poder Judiciário, a Constituição
Federal determina:
Art. 5º - (...)
(...)
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a
defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;
e
Art. 93 – (...)
(...)
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei
limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus
advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do
direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse
25
público à informação;
O princípio da publicidade é uma importante ferramenta para a fiscalização
da atividade do Poder Judiciário, assegurando transparência aos seus atos, e como
consequência, fornecendo mais credibilidade em suas decisões.
Discorrendo sobre este princípio, Portanova citado por Ednara Pontes de
Avelar (2007) assevera:
Em verdade é interesse da própria justiça que seus trabalhos sejam
públicos. A publicidade é um anteparo a qualquer investida contra a
autoridade moral dos julgamentos. O ato praticado em público inspira mais
confiança do que o praticado às escondidas. A publicidade dos atos
processuais, portanto, interessa igualmente ao Poder Judiciário e aos
cidadãos em geral. A publicidade garante mais confiança e respeito, além
de viabilizar a fiscalização sobre as atividades dos juízes.
Não obstante a publicidade dos atos processuais visar, dentre outros, à
efetivação da justiça, a mídia sensacionalista, no intuito de aumentar sua audiência,
vem na contramão deste objetivo.
Os meios de comunicação, que em regra são grandes corporações, que
subsistem pela venda de seu principal produto, a notícia, segue a premissa de que,
o que não interessa não vende.
Tendo acesso privilegiado aos atos processuais, que em regra são públicos,
manipula-os e transmite-os à população, de forma sensacionalista, de acordo com o
que mais lhe interessa e não ao ouvinte, este quer veracidade.
Quando ocorrem casos de potencial repercussão e comoção da população
em geral, é uma grande oportunidade para aumentar sua audiência e seu lucro.
Para isso, contam com a colaboração de certos agentes públicos que lhes repassam
informações privilegiadas, transmitindo-as com exclusividade, quando estas
informações estão ainda em fase inicial de investigação.
Faz-se necessário, no entanto, uma análise mais acurada no modo de
atuação e dos métodos utilizados pela mídia sensacionalista, para compreender
como ela exerce influência sobre a população e, conseqüentemente, sobre os
jurados que comporão o Conselho de Sentença.
26
4.3 A mídia sensacionalista
A elaboração de um noticiário não é diferente de um enredo de novela.
Todos os dias assistimos aos mais diversos temas tratados pelos meios de
comunicação, desde o esporte à política, da corrupção ao homicídio, e mais uma
série de assuntos que passaram a fazer parte de nossa vida. São histórias que se
repetem, e a cada chamada de reportagem, surgem novas surpresas para despertar
o interesse do telespectador.
(...) a notícia é um produto da mídia, algo extremamente comercial: o
envolvimento do público garante a audiência e, por consequência, o
faturamento do veículo. Assim, o que diferencia um jornal sensacionalista
de outro, tido como sério, é apenas a intensidade das emoções (TEIXEIRA,
2011, p.23)
Sendo o produto principal da mídia sensacionalista a audiência, as notícias a
serem veiculadas passam por um filtro de seleção rigoroso, para então vir a público
apenas aquelas que mais atraem as massas, exercendo uma forte influência sobre
elas.
Explica Ciro Marcondes Filho (apud TEIXEIRA, 2011, p.23) que
Notícia é a informação transformada em mercadoria com todos os seus
apelos estéticos, emocionais e sensacionais; para isso a informação sofre
um tratamento que a adapta às normas mercadológicas de generalização,
padronização, simplificação e negação do subjetivismo.
Atuar no jornalismo é uma opção ideológica, ou seja, definir o que vai ao ar,
como, com que destaque e com que favorecimento, corresponde a um ato
de seleção e de exclusão. Este processo é realizado segundo diversos
critérios, que tornam o jornal um veículo de reprodução parcial da realidade.
Definir a notícia, escolher a angulação, a manchete, a posição na página ou
simplesmente não dá-la é um ato de decisão consciente dos próprios
jornalistas. É sobre a notícia que se centra o interesse principal no
jornalismo.
É importante considerar, no entanto, que a notícia não é tão somente uma
mercadoria consumida deliberadamente pela coletividade, mas, também, um dos
pilares da sociedade democrática de direito.
Neste sentido, Teixeira (2011, p.24) faz uma ressalva:
Quando um crime é abordado com sensacionalismo, deixa-se evidente a
inconformidade com comportamentos brutais, o que é considerado certo ou
errado na sociedade. Desta forma, as pessoas tendem a buscar por justiça,
27
e os meios de comunicação ratificam este comportamento quando
estimulam as ações da massa.
Nos noticiários sensacionalistas, destacam-se os telejornais policiais. Para
Lígia Lana citado por Teixeira (2011, p.24), os telejornais policiais poderiam ser
chamados de telejornais dramáticos, por possuírem características semelhantes “(...)
aos programas de auditório e de reality shows. Interessa a esses programas
selecionar ou construir situações dramáticas e comoventes, experiências que
provoquem a emoção dos telespectadores (...)”.
Para Teixeira, nestes noticiários, para tornar uma notícia espetacular e
sensacional exagera-se na linguagem, na cobertura do fato e nas imagens,
buscando a comoção e o envolvimento emotivo do público.
Já na mídia impressa, o título dado à manchete precisa atrair a atenção e o
interesse do consumidor para a compra daquele produto.
Para Rosa Nívea Pedroso (apud TEIXEIRA, 2011, p.27):
(...) o trabalho de manipulação do noticiário precisa continuar na próxima
edição, apresentando, novamente, o singular numa embalagem
espetacular, capaz de provocar sensações, medos, ansiedades,
curiosidades, fantasias, projeções, identificações. E as sensações são
desprovidas de um sentimento estético, pois não estabelecem uma relação
com o senso crítico do leitor.
Ainda na visão desta autora, o público satisfaz suas vontades através da
leitura de tragédias e fatos violentos:
O jornalismo sensacionalista, pela maneira própria de engendramento
discursivo, estrutura, representa e permite o acesso ao mundo da liberdade
pela exploração dos temas agressivos, homicidas e aventureiros, que não
podendo realizar-se na vida cotidiana, submetida à lei e à censura, tendem
a realizar-se, projetivamente, na leitura. Isto é, na realização da construção
(PEDROSO apud TEIXEIRA, 2011, p.28).
Márcia Franz Amaral citada por Teixeira (2011, p.29), faz a seguinte divisão
sobre o sensacionalismo:
(...) divide-se o sensacionalismo em três categorias: gráfico, linguístico e
temático. O primeiro é destinado aos leitores que não possuem o hábito da
leitura, então o jornal utiliza mais elementos visuais em detrimento do fato
propriamente dito. Na categoria linguística, há uso da linguagem para
chamar a atenção; e, por fim, o temático, é destinado para descrever a
28
categoria das matérias que vendem. Neste aspecto, não há preocupação
com o interesse social da reportagem, mas do seu conteúdo (que deve
despertar emoções no leitor).
Quando se trata da mídia televisiva, a exposição dos fatos exercem um
impacto ainda maior no telespectador, influenciando decisivamente na formação de
sua opinião. De acordo com Teixeira (2011, p.28):
Além disso, quando tratamos da mídia televisiva, a exposição dos fatos
toma maiores proporções. O trágico e o violento ganham imagens, sons,
angulações e movimentos. A respeito disso, no processo de conhecimento
humano, o saber e a representação mental é que formam a imagem que
temos sobre algo ou alguém (Santaella; Nöth, 1999). Portanto, ao vermos
cenas acompanhadas de narrativas chocantes, adquirimos uma
determinada representação mental para, desta forma, formamos juízo de
valor sobre o assunto ou acontecimento.
Importante ainda mencionar, para o propósito deste trabalho, o chamado fait
divers1, técnica presente na prática do jornalismo sensacionalista, utilizada para
atrair ainda mais o grande público e influenciá-lo, de acordo com objetivos préestabelecidos.
De acordo com Teixeira (2011, p.29):
Assim, o fait divers é carregado de informações curiosas, atraentes ao
público, que realmente incitam ao consumo pelo jornal e à audiência tão
almejada pelos veículos eletrônicos. Portanto, o fait divers não se distancia
da linguagem sensacionalista do jornalismo.
O fait divers precisa conter assuntos relativos ao cotidiano das pessoas, que
estejam próximos da sua realidade e despertem interesse pelo tema. A respeito
desta prática, Pedroso (apud Teixeira, 2011, p.30), discorre sobre o assunto,
afirmando que:
O fait divers como informação auto-suficiente traz em sua estrutura
imanente uma carga suficiente de interesse humano, curiosidade, fantasia,
impacto, raridade, humor, espetáculo, para causar um efeito de algo vivido
no crime, no sexo e na morte. Consequentemente, provoca impressões,
efeitos e imagens (que estão comprimidos nas formas de valorização
gráfica, visual, espacial e discursiva do fato-sensação).
1
O termo francês fait divers, traduzido para a Língua Portuguesa como “fatos diversos”, é considerado
uma categoria presente na prática jornalística por apresentar assuntos inusitados e que teoricamente não se
incluiriam em uma editoria tradicional como política, economia, esportes, geral, turismo, internacional, etc.
(TEIXEIRA, 2011, p.28).
29
Verifica-se então que a prática sensacionalista é uma forma de distorcer a
realidade, utilizando informações inverídicas a fim de manipular a opinião pública.
Desta forma, o resultado da guerra pela audiência resulta em reportagens onde a
verdade está em segundo ou terceiro plano.
No noticiário sensacionalista, sempre há a tentativa de fazer crer que aquilo
que é apresentado é algo sério e verídico.
Para Teixeira (2011) os estudos acerca da psicologia humana demonstram
que o público não adquire apenas opinião com base nos meios de comunicação,
mas tende a tomar atitudes violentas conforme os estímulos a que está submetido.
4.4 A mídia sensacionalista na formação da opinião pública
O termo opinião provém do latim opinio e significa apreciação, parecer,
convicção, crença, idéia, julgamento, pensamento, ponto de vista.
Para Tupã Gomes Corrêa (apud TEIXEIRA, 2011, p.35):
A opinião pública é parte do processo de comunicação, porquanto pode ser
entendida como um dos efeitos ao nível da comunicação coletiva,
pressupondo para tanto a existência de um estímulo, mensagem ou
conteúdo de significados, produzido ou emitido por alguém, e captado pelo
todo ou parte da sociedade (...).
Nesta ótica, os profissionais de comunicação “são determinantes para o
processo de formação da opinião pública, pois grande parte do conhecimento da
população advém dos noticiários, jornais, revistas e programas divulgados nas
mídias eletrônicas”. (TEIXEIRA, 2011, p.35).
A exposição excessiva de alguns casos na mídia é prática comum na
televisão, pois através da intensidade das imagens é possível aumentar a
curiosidade do telespectador, estimulando o consumo de jornais e a audiência de
programas televisivos e de rádio.
A grande arma da TV é o fato de mostrar o acontecimento, muitas vezes em
tempo real, diferentemente de outros meios de massa como o jornal e o
rádio. Isto faz com que a imagem tenha um forte poder emocional e
apelativo, pois traz as pessoas para “dentro” da notícia. As lentes de
aproximação ou zoom da câmara simulam aquilo que o observador humano
faz ao processar a imagem dos olhos: presta atenção no detalhe, sem
perda total da visão do conjunto. Esse é o diferencial: o impacto e as
sensações que as imagens podem causar ao público. Assim, no
30
telejornalismo, é comum a imagem tornar-se a própria notícia (TEIXEIRA,
2011, p.37).
Não se pode ignorar o fascínio que a mídia exerce sobre as pessoas. É só
observar a imensa participação em votações nas edições dos realitys shows
apresentados na televisão brasileira.
Teixeira (2011, p.39) discorre sobre o assunto afirmando que:
É indiscutível o fascínio que as mensagens televisivas exercem sobre as
pessoas. Pode-se dizer que o espetáculo midiático tornou-se uma válvula
de escape para o telespectador, que fornece, cada vez mais, audiência a
programas que relatam o cotidiano humano, como os reality shows. Por
exemplo, como explicar os mais de 2 bilhões e 500 milhões de votos nas 10
edições do Big Brother Brasil? Os números da participação popular são
alarmantes e demonstram que o público não somente alimenta esse tipo de
espetáculo, mas gosta da interação proporcionada pela mídia.
No mundo tão competitivo como o dos noticiários, é fundamental atrair e
conquistar o telespectador com mensagens atrativas, não se importando se aquilo
que está sendo divulgado condiz com a verdade.
No anseio de captar a atenção do grande público, os noticiários carregam
as ferramentas da dramatização para as redações. Assim, é comum vermos
a “reconstituição” de crimes, recheada de detalhes gráficos e informações
precisas de técnicos e autoridades policiais. Tudo para tornar a notícia mais
atrativa para as pessoas. (TEIXEIRA, 2011, p.40).
Outra técnica utilizada pela mídia para atrair o grande público é o chamado
melodrama.
Jean-Marie Thomasseau (apud MENDES, 2013, p.73), discorre sobre esta
técnica diariamente utilizada pelos meios de comunicação para atrair e influenciar
ainda mais o grande público.
A palavra melodrama, com efeito, traz ao pensamento a noção de um
drama exagerado e lacrimejante, povoado de heróis falastrões derretendose em inutilidades sentimentais ante infelizes vítimas perseguidas por
ignóbeis vilões, numa ação [...] que embaralha todas as regras da arte do
bom senso, e que termina sempre com o triunfo dos bons contra os maus,
da virtude sobre o vício. Este esquema, se não é inteiramente falso, é por
demais simplificador.
Diante da utilização de tantos artifícios no intuito de transformar a notícia em
algo espetacular e atraente para o público, Teixeira (2011, p.50) adverte:
31
Portanto, partindo do pressuposto que o telejornalismo tem natureza
espetacular, a transformação de notícias em espetáculos midiáticos é mais
do que uma tendência: é a consolidação da existência da TV. Assim, é
inegável que a exibição de shows em detrimento da informação asseguram
a audiência, porém o jornalismo corre o risco de perder o interesse público,
uma das razões de sua origem.
Outro detalhe importante que merece ser esclarecido é sobre o
comportamento do indivíduo receptor da notícia no meio da multidão2.
Para Le Bon (apud TEIXEIRA, 2011, p.51):
(...) as qualidades do caráter individual do homem são apagadas dentro de
uma multidão e o heterogêneo se perde em detrimento do homogêneo.
Portanto, aquelas decisões que necessitam de elevada aptidão do indivíduo
não devem ser tomadas pela multidão (...).
O autor discorre procurando explicar os motivos que fazem as pessoas
integrarem uma multidão. Um dos motivos é:
Um dos motivos que fazem a pessoa integrar uma multidão é o sentimento
de invencibilidade que o grupo oferece. Assim, a ação se dá pelos instintos
e não pela racionabilidade, características muito visíveis na multidão
anônima (que não representa classe ou instituição). Nesse tipo de
classificação, os sentimentos primitivos tornam-se latentes e incontroláveis,
desaparecendo do indivíduo qualquer senso de responsabilidade.
(TEIXEIRA, 2011, p.52).
De acordo com Teixeira (2011, p.52), o autor ainda compara o
comportamento da multidão com o comportamento dos jurados do tribunal do júri,
afirmando que:
(...) as pessoas responsáveis pelo julgamento podem condenar determinada
atitude que individualmente não reprovariam. Dessa forma, o jurado, uma
vez que dotado de anonimato, incorpora juízos de valores externos, um
sentimento que não é seu, para fazer parte do grupo.
Ainda na visão de Teixeira (2011, p.54), em toda multidão existe um líder,
um chefe, onde, por instinto, as pessoas se colocam sob sua autoridade, para serem
conduzidas:
2
“Multidão” refere-se ao que Le Bon, citado por Teixeira (p.17) conceitua sobre a irracionalidade dos
indivíduos. Para ele, diante de acontecimentos nacionais ou fatos socialmente repudiáveis, as pessoas passam a
agir com impulsividade, instabilidade, irritabilidade, entre outros sentimentos.
32
Nos grupos humanos, o líder possui um papel considerável. Sua vontade é
o núcleo em torno do qual se formam e se identificam as opiniões. A
multidão é um rebanho que não poderia prescindir de mestre.
Além disso, Teixeira (2011, p.55) discorre ainda que para evitar o
isolamento, os indivíduos tendem a calar seus posicionamentos ao imaginar ou
perceber que a opinião das pessoas que os rodeiam é diversa das suas. Desta
forma, a opinião pública, na verdade, tem grande relação com a opinião das pessoas
que se expressam nos meios de comunicação.
Dessa forma, a opinião da multidão tem uma forte relação com aquilo que
lhe é passado por quem a conduz, neste caso, a mídia.
33
5 ESTUDO DE CASO
Quando ocorre um homicídio, em que devido às circunstâncias que o
envolve, o torna capaz de despertar o repúdio e indignação da sociedade, a mídia,
percebendo o interesse desse grande público, passa a utilizar todos os métodos e
técnicas que lhe são peculiares, para realizar a cobertura do caso, da forma que
mais atrairá os espectadores.
Diante de um fato de grande repercussão, a sociedade tem interesse de
acompanhar o desenrolar das investigações e ver os culpados na cadeia.
A mídia deveria, neste caso, transmitir para essa sociedade ansiosa por
justiça, informações verídicas, contribuindo assim, para a formação da opinião
pública centrada na verdade.
No entanto, na sua busca insaciável pela audiência e pelo lucro, a mídia
trata as informações, transmitindo-as da forma mais dramática e sensacionalista
possível, no intuito de garantir o aumento de sua audiência por um tempo
prolongado. A busca pela verdade não é sua principal meta.
No meio deste grande público alcançado pela mídia, estão os jurados que
vão formando sua opinião tendo por base estas informações e já decidindo o seu
veredicto.
Dessa forma, a mídia tira do acusado, a oportunidade de exercer
plenamente o seu direito de defesa, pois, diante da gigantesca e bem equipada
mídia, com suas notícias sensacionalistas e melodramáticas, inútil é o discurso do
advogado no plenário no intuito de convencer os jurados.
É o que se verifica na cobertura do caso que ficou conhecido como “O Caso
Isabella Nardoni”, que na época virou um espetáculo midiático.
5.1 O caso Isabella Nardoni
O caso Isabella Nardoni refere-se ao assassinato da menina Isabella de
Oliveira Nardoni, de cinco anos de idade, que foi arremessada do sexto andar do
Edifício London, na Vila Guilherme, em São Paulo, na noite de 29 de março de 2008.
Na noite fatídica, a vítima se encontrava na residência de seu pai Alexandre
Alves Nardoni e de sua madrasta Ana Carolina Trotta Peixoto Jatobá.
Após ser arremessada do apartamento, a menina chegou a ser socorrida
34
pelos bombeiros, mas não resistiu aos ferimentos e morreu a caminho do hospital.
Durante a realização de intensa investigação policial, onde cada detalhe era
minuciosamente divulgado pelos principais noticiários do país, toda a suspeita recaia
sobre o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, como sendo os autores do
assassinato.
No dia 27 de março de 2010, cerca de dois anos após a morte de Isabella
Nardoni, o Plenário II, do 2º Tribunal do Júri da Capital de São Paulo, julgou o caso e
condenou Alexandre Nardoni a uma pena de 31 anos e um mês de reclusão,
enquanto Anna Carolina Jatobá foi condenada a 26 anos e oito meses de prisão
(JUSBRASIL, 2010, sem paginação).
5.2 O caso Nardoni e a mídia
A mídia transformou o Caso Nardoni, num enorme melodrama, como se
fosse o enredo de uma novela.
Diariamente, os principais noticiários do país, traziam as ‘novas’ informações
sobre o caso.
Com o intuito de se chegar ao fim proposto neste trabalho, realizou-se um
levantamento das reportagens exibidas nos principais noticiários, de abrangência
nacional, entre a data do fato (29/03/2008) e a data do julgamento (27/03/2010).
Estes noticiários são: A Revista Veja, o Jornal Folha de São Paulo, edição on-line e
o Fantástico, noticiário da Rede Globo de Televisão.
A Revista Veja, um dos principais periódicos semanais do país, de alcance
nacional, dentre a data do fato e o julgamento dos acusados, publicou 16 matérias
sobre o caso, conforme quadro abaixo:
35
QUADRO 1
Reportagens publicadas na Revista Veja, no período de 29 de março de 2008 a
27 de março de 2010.
Edição - data
Título da matéria
Edição n°. 2055, 09 abr. 2008. p.97
‘O ANJO E O MONSTRO’. “(…)
Alexandre Nardoni é tido como uma
pessoa violenta pelas testemunhas
ouvidas...”
Edição n°. 2056, 16 abr. 2008. p.94
‘Revelações aumentam a suspeita em
torno do pai e da madrasta...’
Edição n°. 2057, 23 abr. 2008
‘Para a polícia, não há mais dúvidas sobre
a morte de Isabella: FORAM ELES’.
Edição n°. 2058, 30 abr. 2008. p.85
‘AINDA MAIS ACUADOS’, (...) revelação
do horário em que a família chegou em
casa no dia do crime complica situação do
pai e da madrasta de Isabela’.
Edição n°. 2059, 07 mai. 2008. p.41
‘CARTAS: Como designar o ato de o pai
matar a filha? Acredito que o país todo
quer justiça, mas qualquer pena será
pouco para esse crime!’.
Edição n°. 2060, 14 mai. 2008. p.102
‘Nada
como
um
crime
100%
monstruoso(...)’, ‘Ninguém pode ser
condenado por antecipação; mas o pai e a
Madrasta de Isabella, denunciados como
réus, não vão ser condenados por
antecipação. Quem vai condená-los ou
absolvê-los é a Justiça de São Paulo’.
Edição n°. 2061, 21 mai. 2008. p.09
‘O casal Nardoni, de São Paulo, por
exemplo, acusado do crime bárbaro de ter
matado a menina Isabella, poderá, à luz
das mudanças feitas na Câmara dos
Deputados, ser levado ao tribunal em
menos tempo (...), em oito anos’.
Edição n°. 2062, 28 mai. 2008. p.104
‘Agora eles são reus’
36
Edição - data
Título da matéria
Edição n°. 2088, 26 nov. 2008. p.93
Capa: ‘A VIDA ATRÁS DAS GRADES’,
‘(...) no curso de quase sete meses, o
casal acusado do assassinato da menina
Isabella, filha de Nardoni e enteada de
Anna Carolina, amargou uma sucessão de
derrotas processuais (teve negados nove
pedidos de soltura), já que a brutalidade
do crime os coloca na mais infame das
categorias da cadeia, aquela que é
desprezada até mesmo pelos párias”.
Edição n°. 2089, 03 dez. 2008. p.35
OPINIÃO DO LEITOR ‘Essa revista
conceituada e com credibilidade junto ao
povo brasileiro mostrou a realidade em
que vive esse casal, em total desapego e
falta de arrependimento pelo crime que
cometeu (...) nós brasileiros estamos
cansados de ver nossas crianças serem
vítimas de supostos seres humanos.
(Patrício Lemos, Recife)’
Edição n°. 2089, 03 dez. 2008. p.35
OPINIÃO DO LEITOR: ‘no Brasil, qualquer
prisão, antes de transitar em julgado a
sentença penal condenatória, constitui
medida de exceção, independentemente
da gravidade do delito imputado. Mas
parece que a garantia constitucional não
vem sendo observada em relação ao
casal Nardoni’.
Edição n°. 2157, 24 mar. 2010. p.6
‘JULGAMENTO DO CASAL NARDONI –
Alexandre Nardoni e Anna Carolina
Jatoba irão a júri popular à partir de
segunda-feira. Eles são acusados do
assassinato da menina Isabella Nardoni,
em março de 2008’.
37
Edição - data
Título da matéria
Edição n°. 2157, 24 mar. 2010. p.98
‘CARA A CARA COM OS JURADOS - No
julgamento de Alexandre Nardoni e Anna
Carolina Jatobá, acusados pela morte da
menina Isabella, o embate não será entre
a culpa e a inocência, mas entre a certeza
e a dúvida’.
Edição n°. 2158, 31 mar. 2010. p.84
A MORTE, MINUTO A MINUTO: A
PROVA CABAL – Por meio do
cruzamento de horários de telefonemas e
de cronometragens feitas no local do
crime, o Ministério Público conseguiu
descobrir a hora exata em que Isabella foi
atirada, e constatou que Alexandre
Nardoni e Anna Carolina Jatobá estavam
no apartamento nesse exato instante.
Edição n°. 2158, 31 mar. 2010 p.12
UM ESPETÁCULO DE JULGAMENTO –
Foram eles (...)
Edição n°. 2158, 31 mar. 2010 p.80
A JUSTIÇA FOI FEITA!
Fonte:
VEJA,
revista
semanal.
São
Paulo:
Abril.
<http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx>. Acesso em: 28 mar. 2014.
Disponível
em:
Observa-se que em algumas publicações, como a edição nº. 2055, na
página 97, de 09 abril de 2008 (11 dias após os fatos), estavam estampadas a foto
da vítima Isabella e, ao lado, a foto do casal Nardoni. O título da matéria era bem
sugestivo: ‘O ANJO E O MONSTRO’. Em certo ponto da matéria, o autor argumenta
que “Alexandre Nardoni é tido como uma pessoa violenta pelas testemunhas
ouvidas...”.
O Jornal Folha de São Paulo, em sua edição digital, publicou mais de 402
reportagens, dentre o dia 29 de março de 2008 e 27 de março de 2010.
No quadro abaixo, há uma seleção de reportagens publicadas na edição online do jornal, dos primeiros 30 dias da ocorrência do fato e dos 15 dias que
antecederam ao julgamento:
38
QUADRO 2
Seleção aleatória de reportagens publicadas no Jornal Folha de São Paulo,
edição on-line, nos primeiros 30 dias após o fato, e nos últimos 15 dias que
antecederam o julgamento pelo Tribunal do Júri
Data - hora
Título da matéria
02/04/2008 - 16:02
Polícia pede prisão temporária de pai e
madrasta de Isabella.
07/04/2008 – 15:00
Justiça autoriza quebra do sigilo telefônico
do pai de Isabella.
07/04/2008 – 21:57
Análise aponta que não havia sangue no
carro do pai de Isabella.
08/04/2008- 13:39
Vídeo mostra ida de família Nardoni a
mercado antes do crime.
09/04/2008 – 14:26
Promotor do caso Isabella adota cautela e
critica imprensa.
09/04/2008 - 18:48
Promotor do caso Isabella nega ter acusado
pai pelo assassinato.
10/04/2008 – 13:24
Caso Isabella: pedreiro relata arrombamento
em sobrado vizinho.
11/04/2008 - 08:14
Para peritos, madrasta trocou de blusa após
morte de Isabella.
11/04/2008 - 07:26
Pai e madrasta de Isabella não chamaram os
bombeiros.
15/04/2008 - 02:36
‘Anna gritava palavrões no jardim do prédio’,
diz síndico.
15/04/2008 - 09:02
Para Instituto de Criminalística, pegada é
compatível com calçado da madrasta
17/04/2008 - 20:18
Laudos reforçam suspeitas contra pai e
madrasta de Isabella.
39
Data - hora
Título da matéria
16/04/2008 – 16:28
Sangue encontrado em lençol é de Isabella,
conclui laudo.
17/04/2008 - 00:51
Para mãe de Isabella, casal pode estar
ligado à morte da filha.
18/04/2008 - 08:20
Perícia descarta hipótese de 3º suspeito no
caso Isabella.
19/04/2008 - 20:47
Para perícia, pai jogou Isabella do 6.º andar
25/04/2008 - 16:13
Camiseta do pai teria vômito de Isabella, diz
Jornal Nacional.
26/04/2008 - 14:49
Morte de Isabella é 'barbaridade imensa',
define Lula.
27/04/2008 - 08:18
Caso Isabella: ciúme foi motivação do crime,
diz polícia.
28/04/2008 - 07:54
Laudo não confirma sangue nem vômito de
Isabella.
15/12/2009 - 20:00
Justiça marca julgamento do casal Nardoni
para março de 2010
22/02/2010 - 19:04
Defesa dos Nardoni recorre e julgamento
pode ser adiado
21/03/2010 - 08:04
Prova técnica será decisiva no júri do caso
Isabella
21/03/2010 - 10:25
Pai de Nardoni confia na inocência de filho e
nora.
21/03/2010 - 16:29
Pichação contra o casal Nardoni é feita em
frente ao fórum
22/03/2010 - 07:44
Casal Nardoni deixa presídios em Tremembé
e segue para SP
Fonte:
ESTADÃO
–
Tópicos.
Notícias
sobre
"Caso
Isabella".
Disponível
<http://topicos.estadao.com.br/noticias-sobre-caso-isabella,39>. Acesso em 28 mar. 2014.
em
A edição on-line do Jornal, que foi objeto desta pesquisa, nos últimos 30 dias
antes do julgamento, publicou 06 reportagens sobre o caso, noticiando sobre a
preparação do julgamento. No entanto, nos primeiros dias após os fatos, a cobertura
40
foi intensa.
A Rede Globo de Televisão, dentro do mesmo período, exibiu cerca de 75
vídeoreportagens em seus noticiários (GLOBO, 2014). O programa Fantástico, um
dos principais programas jornalísticos da televisão brasileira, de alcance nacional,
sempre exibia reportagens divulgadas como sendo ‘exclusivas’, dentre elas, será
analisada uma, veiculada no 20 de Abril de 2008.
O critério de seleção desta reportagem, deve-se ao fato dela ter sido exibida
como sendo ‘exclusiva’ e ao visível pré-julgamento que apresentava sobre o caso, a
menos de 30 dias dos fatos, quando as investigações ainda estavam sendo
realizadas.
5.3 Reportagem do Fantástico exibida no dia 20 de Abril de 2008
No intuito de verificar possível influência da mídia sobre os jurados do
Conselho de Sentença, em casos de grande repercussão, será tomado como
exemplo para análise, a vídeo-reportagem exibida no programa Fantástico, da Rede
Globo de Televisão, transmitida no dia 20/04/2008 (GLOBO, 2014).
Esta reportagem, divulgada como 'exclusiva' apresentava a versão policial
para o crime. Essa versão ganhou cor, movimento e animação gráfica, sendo
apresentada na forma de uma simulação virtual.
Teixeira (2011, p.107) descreve a cena exibida da seguinte forma:
Logo no início, os peritos fazem uma ressalva: alguns personagens foram
omitidos para uma melhor visualização das ações relevantes ao
entendimento do caso. Os personagens presentes não possuem
características idênticas dos envolvidos, da testemunha e da vítima.
Garagem do edifício London, 23h36min. Alexandre Nardoni desliga o carro.
Na frente, ele e Anna Jatobá. A madrasta se vira e agride Isabella, que
estava sentada atrás do pai. Com uma chave ou um anel, ela fere a menina
na testa. Por causa do ferimento, vestígios de sangue são encontrados na
lateral da cadeirinha, no encosto do banco do motorista e no chão do carro.
O sangue é revelado em azul pelo reagente.
Segundo os peritos, o sangramento foi estancado por uma fralda entre o
carro e o apartamento. A fralda foi encontrada dentro de um balde, já em
processo de lavagem. Na foto, mais uma vez, os pontos azuis são sangue
revelado pelo reagente químico.
Alexandre anda pelo apartamento com Isabella no colo. Logo no começo do
corredor cai uma gota de sangue. Mais alguns passos e o sangue volta a
pingar. Ao chegar na sala, Alexandre joga Isabella no chão com força. Os
exames de raio x mostram que a agressão provocou lesões na bacia, na
vulva e no punho direito da menina. O ferimento na testa mancha a roupa
41
de Isabella, na altura da perna esquerda e da direita. O sangue também cai
no chão.
Em seguida, na versão da polícia, Anna Jatobá se aproxima da menina,
aperta o pescoço dela e provoca asfixia. Na foto feita pelos peritos, as
marcas da esganadura.
Na cena seguinte, Alexandre caminha até a cozinha, pega uma faca e uma
tesoura multiuso, vai até o quarto dos outros dois filhos ao lado do de
Isabella. Ajoelha-se na cama e tenta cortar a tela de proteção da janela com
a faca. Desiste e corta com a tesoura. O resultado é este: Alexandre pega a
menina e vai em direção ao quarto dos filhos. No caminho, cai mais sangue
no chão. A mancha é visível a olho nu. No quarto, ele sobe na cama com
Isabella no colo e caminha, com alguma dificuldade, em direção à janela.
No chão, ao lado da cama, outra gota de sangue. No lençol, marcas do
solado da sandália de Alexandre e da palma da mão de uma criança suja de
sangue. Ainda sobre a cama, os peritos encontram uma sequência de
passos e de manchas de sangue.
De acordo com a polícia, o pai então joga a menina. No parapeito da janela
mais sangue. Na fachada do prédio, o rastro deixado pelas mãos de
Isabella. Na camiseta de Alexandre, marcas da tela de proteção. O impacto
da queda é ouvido pelo porteiro. Ele abre a janela, vê o corpo de Isabella no
jardim e liga para o morador do primeiro andar, e chama o socorro.
Para Teixeira (2011, p.109), a advertência inicial dada pelo repórter de que
se tratava apenas de uma simulação dos fatos, perde o sentido no decorrer das
cenas exibidas. Para o autor, os verbos utilizados na descrição dos fatos, apresenta
ao telespectador Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá como sendo,
indiscutivelmente, os autores do crime.
No início da matéria, o telespectador já recebe todas as informações do que
supostamente teria acontecido. Os verbos na voz ativa (desliga o carro; a
madrasta se vira e agride Isabella; ela fere a menina na testa) mostram
que o sujeito está, naquele momento, praticando a ação. Isto pode parecer
simples, mas muda todo o contexto da enunciação. Neste caso, não há
espaço para dúvidas, por mais que no início do áudio há explicação de que
se trata apenas da versão policial. Portanto, o discurso do repórter está
baseado nas fontes oficiais para se legitimar.
A insistência da reportagem em mostrar minuciosamente os detalhes, com o
foco nos ferimentos, no sangue encontrado no carro e no apartamento e nas lesões
no pescoço da vítima, é uma técnica típica do sensacionalismo que busca o exagero
e o sofrimento alheio para chamar a atenção do público e comovê-lo, como foi visto
em capítulo anterior.
Teixeira (2011, p.110) finaliza com a seguinte indagação:
42
Diante de palavras tão fortes, como ficar alheio a este caso bárbaro que
tirou a vida de uma garotinha de apenas 5 anos? A repetição, típica do
jornalismo sensacionalista, é inegável neste caso.
(...) porém, num caso com tanta repercussão como esse, em que a
sociedade brasileira ficava a par – dia após dia – de um fato novo sobre a
morte de Isabella torna-se imprudente explicitar juízo de valores. E se
realmente houvesse provas inocentando o pai e a madrasta de Isabella,
como ficaria a imagem (e a vida) deles perante a família, os amigos e uma
sociedade inteira, que os julgou e os condenou desde o primeiro dia?
Conrado Moreira Mendes (2013, p.191), que em sua tese de doutorado faz
uma análise minuciosa do Caso Isabella Nardoni, discorre sobre as cenas
observando:
Acerca da linguagem visual, é importante salientar que o enunciador faz uso
muito mais corrente da iconização para reconstituir a morte de Isabella a
partir do ponto de vista da acusação do que da defesa do casal suspeito.
Apenas uma simulação computadorizada se refere à versão de Alexandre
Nardoni, segundo a qual, uma terceira pessoa teria sido o autor da morte de
Isabella. Por outro lado, utilizam-se muito mais frequentemente imagens
(simulações gráficas computadorizadas, simulações com bonecos,) que
indicavam participação de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá como
possíveis autores do crime. Isso retoma, de certo modo, a questão
epistêmica da subseção anterior, pois, por meio das imagens, intensifica-se
um crer-ser, ainda que não se soubesse-ser de forma efetiva.
Teixeira (2011, p.112) conclui sua dissertação, fazendo uma análise da
influência que a mídia sensacionalista exerceu sobre a opinião pública. Para ele, os
métodos e técnicas utilizadas para despertar no grande público emoções extremas
em relação ao caso, foram decisivas na condenação antecipada dos acusados,
quando nem sequer havia ainda encerrado a fase inquisitória.
Ao investigarmos as propriedades do sensacionalismo, desvendamos muito
mais que isso: os efeitos psicológicos que a intensidade, a repetição, o
exagero e o apelo emotivo causam nas pessoas. O direcionamento que a
mídia dá ao fato se torna determinante para a formação da opinião pública –
como vimos nos ensinamentos de Gustave Le Bon, ao dizer que o indivíduo
age com irracionalidade quando está em massa. Essa mesma massa foi
capaz de acender o desejo de justiça nas pessoas e provocar a ira de uma
sociedade que clamava pela prisão dos culpados. No caso Isabella, mesmo
antes do julgamento, (concluído em 27 de março de 2010), os indiciados já
haviam sido “condenados” pela população. O direito à ampla defesa,
garantido pela Constituição Brasileira, praticamente inexistiu neste caso.
Quando uma reportagem dava voz aos advogados do casal, logo outra
entrevista era usada para contrapor a versão ora apresentada.
43
Depreende-se então que, neste caso concreto, a mídia, ao transmitir
informações
eivadas
de
juízo
de
valor,
pré-julgamentos,
apresentando
sistematicamente os acusados como os autores dos fatos, quando as investigações
ainda estavam em curso, influenciou as decisões dos jurados, que também
participavam da sociedade receptora das informações, determinando um veredicto
de condenação em desfavor dos acusados.
44
6 CONCLUSÃO
É possível afirmar que a mídia influencia a decisão dos jurados do
Tribunal do Júri, no julgamento de casos de homicídios, em que, pelas
peculiaridades do fato criminoso, há grande repercussão na sociedade.
Casos de homicídios que geram grande comoção são sistematicamente
explorados pela mídia que, na corrida pela audiência, transmite para a sociedade
informações tendenciosas, inverídicas ou ainda, colhidas em fase de inquérito
policial que ainda não passaram pelo crivo do contraditório e da ampla defesa.
Desta forma, a mídia, como formadora de opinião, gera informações que na
maioria das vezes, passam por um rigoroso filtro de seletividade, não para apurar a
verdade, mas para ser colocado no ar apenas aquilo que mais atrai as massas, não
se preocupando com o desrespeito aos direitos que são constitucionalmente
garantido aos acusados. Cada chamada, dá grande ênfase à culpabilidade do
acusado e apela pela sua condenação.
Os jurados, por sua vez, são pessoas comuns, que estão inseridas nesta
sociedade e são persuadidos com estas informações, de forma contínua e
sistemática. Assim, vão formando sua opinião, com base nas informações que lhe
são trazidas pela mídia.
Desta forma, o jurado, que deveria formar sua opinião com base nas provas
apresentadas durante os debates orais da sessão, já chegam com sua opinião
formada, convencidos pela mídia da culpabilidade do réu, apenas para dar seu
veredicto de condenação.
Conclui-se, por este trabalho, que as garantias constitucionais, que visam
um julgamento justo e imparcial para o acusado, são violadas pelo abuso da mídia
que, pela sua sede desenfreada pela audiência, contribui para a efetivação das mais
absurdas injustiças, influenciando os jurados com informações inverídicas, levandoos a darem um veredicto de condenação, mandando para o cárcere, quem sabe, um
inocente.
45
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Download

a influência da mídia nas decisões dos jurados do tribunal do júri