MICROESTRUTURA E PROPRIEDADE MECÂNICA DE UMA LIGA DE ALUMÍNIO
AA7050 PROCESSADA POR PRENSAGEM ANGULAR DE SEÇÃO TRANSVERSAL
CONSTANTE – ECAP
Vanessa Guido1, Kátia Regina Cardoso2
1
UNIVAP/IP&D, Av. Shishima Hifumi, 2911 – Urbanova/ São José dos Campos - SP,
[email protected]
2
UNIVAP/IP&D, Av. Shishima Hifumi, 2911 – Urbanova/ São José dos Campos – SP, [email protected]
Resumo – Uma liga de alumínio AA7050 foi processada por ECAP a temperatura ambiente e a 150°C em
duas velocidades de deformação (5 mm/min e 30 mm/min). A evolução microestrutural durante ECAP e o
efeito do processamento na dureza da liga foram avaliados. Os resultados mostram o refino da microestrura
pela formação de células de discordâncias no interior de bandas de deformação e o aumento da dureza
durante os primeiros passes de ECAP.
Palavra-chave: ECAP, Liga de Alumínio AA7050, Endurecimento por conformação
Área do Conhecimento: Engenharia de Materiais
Introdução
Um dos principais mecanismos de aumento de
resistência mecânica em materiais metálicos é o
refino de grão. Quando a resistência à deformação
plástica é controlada por deslizamento de
discordâncias, a redução do tamanho de grão leva
ao endurecimento do metal de acordo com a
relação de Hall-Petch.
Métodos de deformação plástica severa, como
a prensagem angular de seção transversal
constante – ECAP (equal channel angular
pressing) permitem o refino de grão em escala
nanométrica.
ECAP tem sido utilizado nos últimos anos para
o processamento de ligas de alumínio, e mais
recentemente ligas de magnésio e titânio. Em ligas
de alumínio comerciais, tem mostrado resultados
bastante
promissores
como
refino
da
microestrutura,
estabilidade
térmica
contra
crescimento
de
grãos
até
temperaturas
relativamente altas, aumento de resistência
mecânica sem detrimento de dutilidade e
ocorrência de comportamento superplástico em
baixas temperaturas e/ou altas taxas de
deformação (Stolyarov et al., 1997; Zheng et al.,
2006). Ligas de alumínio de diferentes
composições têm sido estudadas por ECAP,
sendo que as endurecíveis por precipitação são as
que têm mostrado maior aumento na resistência
mecânica após ECAP (Zhao et al., 2004; Zheng et
al., 2006). Este resultado vem sendo atribuído ao
refino de grão associado ao endurecimento por
precipitação induzido por ECAP.
Diante deste contexto, este trabalho tem como
objetivo um estudo do processamento por ECAP
da liga de alumínio comercial AA7050. Trata-se de
uma liga de alto desempenho, largamente utilizada
na indústria aeroespacial. Esta liga, endurecível
pela precipitação da fase η’ (MgZn2) com
tamanhos típicos na faixa de 50 a 150 nm, é
comumente
utilizada
na
condição
superenvelhecida
devido
a
características
microestruturais
que
minimizam
sua
susceptibilidade à corrosão sob tensão.
Material e Processos
Corpos de prova na forma de barras cilíndricas
de 10 mm de diâmetro e 90 mm de comprimento
foram usinados a partir de placas de uma liga de
alumínio AA7050, na condição T7451. As barras
foram retiradas tendo seu comprimento paralelo à
direção de laminação da placa.
O molde foi configurado para os ensaios de
ECAP com ângulo externo ψ = 60° e ângulo
interno φ = 120°. Esta configuração será mantida
neste trabalho, não sendo, portanto, a
configuração do molde uma variável de processo
avaliada.
As amostras da liga AA7050 foram
processadas por ECAP na condição solubilizada
(W), na qual a liga é uma solução sólida
supersaturada e livre de precipitados. O
tratamento térmico de solubilização foi realizado
em amostras já usinadas para o ensaio de ECAP
a 477°C por 1 hora seguida de têmpera em água,
segundo norma AMS 2770H (AMS 2770H 2006).
As amostras submetidas à ECAP foram
processadas dentro da primeira hora após a
solubilização.
As seguintes variáveis do processo foram
avaliadas:
velocidade
de
prensagem
e
temperatura de prensagem. A configuração do
molde, como já mencionada, foi mantida
constante, e as prensagens foram realizadas pela
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Rota A na qual não é realizada nenhuma rotação
da amostra (segundo seu eixo longitudinal) entre
os passes consecutivos, Figura 1. Segundo a
literatura (Valiev et al., 2006; Gholinia et al., 2000;
Sun et al., 2002) esta rota é a mais eficiente no
refino da microestrutura.
(a)
(b)
Figura 1. (a) Rota básica de deformação por
ECAP utilizada neste projeto e (b) direções de
cisalhamento durante ECAP (Valiev et al., 2000;
Nakashima et al., 2000; Iwahashi et al., 1997).
Também com base na literatura (Schiller et al.,
2006; Sha et al., 2009; Gubicza et al., 2007; Zheng
et al., 2006) e em ensaios preliminares foram
escolhidas duas velocidades de prensagem, 5
mm/min e 30 mm/min, e duas temperaturas: T
ambiente e 150°C.
Com relação à variável número de passes, foi
investigado inicialmente, o maior número de
passes que poderia ser obtido antes do
aparecimento de trincas nas amostras. As
amostras prensadas a 150°C apresentaram as
primeiras trincas após 4 passes quando prensada
com velocidade de 5 mm/min, e após 6 passes
quando prensada a 30 mm/min.
A Tabela 1 apresenta um resumo das
condições
experimentais
utilizadas
para
processamento das amostras da liga AA7050 por
ECAP.
Tabela 1. Condições de processamento por ECAP
da liga AA7050.
Condição
Condição W
Rota
Rota A
Temperatura
Tamb
150°C
Velocidade
de prensagem
5
30
5
30
(mm/min)
Número de
1*
1
3
3
Passes
2*
4**
6**
Amostra processada por ECAP
*Amostra processada por ECAP que fraturou no
passe indicado
**Amostra
processada
por
ECAP
com
aparecimento de trincas no passe indicado
As amostras foram caracterizadas por
microscopia ótica (MO) e a microscopia eletrônica
de transmissão (MET). Para MO as amostras
foram preparadas por técnicas convencionais de
preparação metalográfica: corte, embutimento,
lixamento e polimento. O lixamento foi realizado
com lixas de grana 240 a 600; o polimento inicial
foi realizado com alumina 1 µm enquanto o final
com uma suspensão de sílica coloidal. O ataque
químico foi realizado pelo reagente Keller. As
análises por microscópia ótica foram realizadas
em um microscópio ótico da marca Olympus,
modelo BX51M no Laboratório de Metalografia da
Faculdade
de
Engenharia,
Arquitetura
e
Urbanismo da UNIVAP.
Para o MET foi utilizado à seção transversal da
barra, primeiramente foram cortados discos de 0,3
mm de espessura em uma cortadeira de precisão
(Minitom – Struers) que foram em seguida
afinados até cerca de 0,1 mm. Destes discos
foram cortados as lâminas com diâmetro de 3 mm
nas quais a obtenção de área fina se fez por
polimento iônico. As análises por MET foram
realizadas em um microscópio da marca Phillips
modelo CM120, no DEMa - UFSCar.
Os ensaios de dureza na escala Rockell B foram
realizados em um durômetro da marca Future
Tech modelo FR, do Laboratório de Ensaios
Mecânicos da UNIVAP. Os valores relatados
foram obtidos de uma média de cinco ou seis
medidas em cada amostra.
Resultados e Discussão
A liga AA7050 apresentou na condição W um
valor de dureza de 37 HRB e uma microestrutura
formada por grãos alongados e uma quantidade
muito pequena de precipitados ao longo de
contornos dos grãos.
A amostra processada por ECAP na
temperatura ambiente com velocidade de 5
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mm/min fraturou já no primeiro passe. A
prensagem com velocidade de 30 mm/min
possibilitou apenas um passe já que a amostra
fraturou durante o segundo passe.
A dureza da amostra após 1 passe de ECAP
na
temperatura
ambiente
prensada
com
velocidade de 30 mm/min foi de 87 HRB. A
microestrutura desta amostra por MO apresenta
grãos alongados, de menor tamanho que na
condição W e bandas de deformação no interior
dos grãos. Essas bandas se desenvolvem porque
a restrição à deformação imposta pelos grãos
vizinhos faz com que seja energeticamente mais
favorável a deformação pela divisão em bandas.
Observações por MET mostraram a presença de
subgrãos alongados e de largura aproximada
entre 150 a 400 nm, uma alta densidade de
discordâncias arranjadas nos contornos desses
subgrãos e presença de muita franja.
A Tabela 2 apresenta os valores de dureza
após o processamento por ECAP a 150°C, nas
duas velocidades de prensagem, 5 mm/min e 30
mm/min.
A dureza das amostras após os primeiros
passes de ECAP a 150°C (2 e 3 passes) foi maior
que a da amostra após 1 passe de ECAP a
temperatura ambiente, este resultado deve-se ao
encruamento da liga devido à deformação plástica
induzida, mas também devido ao endurecimento
por precipitação da liga. No entanto, também é
observada nos resultados uma redução da dureza
nas amostras prensadas com o maior número de
passes, comportamento que pode ser resultante
tanto de processos de recuperação quanto do
superenvelhecimento, ou seja, do crescimento dos
precipitados e de sua transformação para fases
mais estáveis.
duras as amostras prensadas a 30 mm/min. No
entanto, a dureza da amostra após 4 passes a 5
mm/min já é inferior ao da amostra após 6 passes
a 30 mm/min. Acredita-se que o calor adicional
gerado pela deformação numa velocidade maior
(aquecimento adiabático) pode ser o responsável
pelo maior numero de passes.
Após 3 passes de ECAP com velocidade de 5
mm/min a microestrutura é formada por grãos
alongados e bandas de deformação são
observadas em apenas alguns grãos. É observada
uma alta densidade de precipitados, Figura 2(a). A
amostra com 4 passes apresenta microestrutura
bastante similar a anterior, mas apresenta um
maior número de grãos contendo bandas de
deformação, Figura 2(b). O aumento no número
de passes aumentou a quantidade de bandas, e
causou uma diminuição no espaçamento médio
entre elas.
Observa-se que nas amostras prensadas a 30
mm/min e temperatura de 150ºC houve uma
grande quantidade de bandas de deformação
distribuídas de forma mais homogênea do que na
amostra prensada com velocidade de 5 mm/min,
Figura 2(c) e 2(d).
Tabela 2. Dureza na escala Rockwell B (HRB)
para amostras: na condição T7451, condição
solubilizada, W, e processadas por ECAP a partir
da condição W, pela Rota A a 150°C.
Liga
AA7050
Velocidade de
prensagem
T7451
W*
3**
Rota A
4** 3**
5
mm/min
87
37 93
(HRB)***
* Condição Solubilizada
** Número de passes
*** Dureza na escala Rockwell B
87
6**
30
mm/min
93
88
O efeito da variável velocidade de prensagem
parece não ter sido muito significativo na variação
da dureza das amostras, sendo ligeiramente mais
Figura 2 Micrografias por microscopia ótica da
amostra processada por ECAP (a) 5 mm/min com
3 passes; (b) 5 mm/min com 4 passes; (c) 30
mm/min com 3 passes e (d) 30 mm/min com 6
passes.
A microestrutura por MET das amostras que
sofreram ECAP a 150°C com velocidade de 30
mm/min é apresentada nas micrografias da Figura
3. Sua microestrutura apresenta subgrãos
alongados com largura média de 200 nm e uma
alta densidade de precipitados. Os contornos de
subgrãos desta amostra são mais bem definidos
que os da amostra após 1 passe à temperatura
ambiente. No entanto, micrografias com maior
aumento mostram regiões de células de tamanho
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entre 50 e 100 nm, com contornos indefinidos e
grande quantidade de franjas resultantes do alto
nível de tensões internas e distorções elásticas do
cristal. Após 6 passes de ECAP a microestrutura
apresenta subgrãos um pouco menores que o da
amostra com 3 passes, com largura entre 100 e
200 nm, e também uma alta densidade de
precipitados.
- AMS 2770H- Aerospace Material Specification Heat Treatment of Wrought Aluminum Alloy Parts,
Issued Jun 1974, Revised Aug 2006, Superseding
AMS 2770G, SAE International.
- Iwahashi, Y; Horita, Z; Nemoto, M; Langdon, TG;
Acta Mater 45, p. 4733, 1997.
- Gholinia, A; Prangnell, PB; Markushev, MV; Acta
Mater. 48, p.1115, 2000.
- Gubicza, J; Schiller, I; Chinh, NQ; Illy, J;
Materials Science Forum 537-538, p. 169-176,
2007.
- Nakashima, K; Horita, Z; Nemoto, M; Langdon,
TG; Mater Sci Eng A 281, p. 82, 2000.
Figura 3. Micrografias por MET da liga na
condição W à 150ºC. (a) 30 mm/min com 3
passes. (b) 30 mm/min com 6 passes.
Conclusões
- O refino da microestrutura das amostras durante
ECAP se deu pela formação de células de
discordâncias e subgrãos no interior de bandas de
deformação.
- O aumento da temperatura de ECAP, de
ambiente para 150°C, levou à formação de
subgãos com contornos melhor definidos,
resultado de processos de recuperação dinâmica
durante a prensagem.
- Intensa precipitação é observada por MET nas
amostras após ECAP a 150°C, o que é não é
verdade para a amostra que sofreu ECAP a
temperatura ambiente.
- O processamento por ECAP acarretou um
grande aumento de dureza da liga quando
comparada com a condição W. As amostras que
sofreram ECAP a 150°C apresentaram dureza
superior ao da amostra prensada a temperatura
ambiente (1 passe) devido ao encruamento e ao
endurecimento por precipitação da liga.
- O aumento no número de passes de ECAP a
150°C causou uma redução da dureza,
comportamento que pode ser resultante tanto de
processos
de
recuperação
quanto
do
superenvelhecimento, ou seja, do crescimento dos
precipitados e de sua transformação para fases
mais estáveis.
- Sha, G; Wang, YB; Liao, XZ; Duan, ZC; Ringer,
SP; Langdon, TG; Acta Materialia 57, p. 31233132, 2009.
- Stolyarov, VV; Latysh, VV; Shundalov, VA;
Salimonenko, DA; Islamgaliev, RK; Valiev, RZ;
Mater Sci Eng A234-236, p. 339, 1997.
- Sun, PL et al., Scripta Materialia 47, p.377,
2002.
- Valiev, RZ; Islamgaliev, RK; Alexandrov IV,
Progress in Materials Science 45, p. 103, 2000.
- Valiev, RZ; Langdon, TG; Progress in Materials
Science 51, 881–981, 2006.
- Zhao, YH; Liao, XZ; Jin, Z; Valiev, RZ; Zhu, YT;
Acta Materialia 52, p. 4599, 2004.
- Schiller, I; Gubicza, J; Kovács, Zs; Chinh, NQ;
Illy, J; Materials Science Forum 519-521, p. 835840, 2006.
- Zheng, LJ; Li, HX; Hashmi, MF; Chen, CQ;
Zhang, Y; Zeng, MG; Journal of Materials
Processing Technology 171, p. 100-107, 2006
Agradecimentos
Os autores agradecem à FAPESP pelo
financiamento deste trabalho (Processo 05/034405).
Referências
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