ANEXO 8 – Tema 2014: Do tempo que temos, que uso fazemos?
(texto parcialmente retirado da revista Ser Mais.
http://www.feijoo.com.br/reflexoes/?p=5496#sthash.mZ4N88lk.dpuf)
Tempo corrido, tempo sentido…
Wagner Valença
“24h de tempo no relógio para dar conta de 36 h de atividades… Quem já se sentiu
assim? Poucas horas para o tanto por fazer!
E aí vem o stress: “não vai dar tempo”… “o que faço primeiro?”… “vão pegar no meu
pé”… “ninguém consegue” (ou consegue?)… “tempus fugit”!!!
Santo Agostinho em seu “Confissões”, já nos fez pensar que discutir o tempo é algo
muito complicado, pois o tempo parece ser algo simples até que tentemos discorrer sobre
ele.
Outros já discorreram sobre o paradoxo do tempo: é o recurso mais democrático que
existe, pois todos têm 24h e é também o mais escasso, pois, passou, passou! Não dá pra
recuperar.
A ficção até nos dá, por vezes, algumas esperanças de voltar o tempo (H.G. Wells e a
máquina do tempo, o filme O Feitiço do Tempo, entre outros), mas não dá pra viver na
ficção. Pé no chão (ou no espaço, velocidade e movimento, segundo Einstein e a própria
física quântica). Só temos hoje para usar bem, ou melhor, as 24 horas de hoje. Assim, por
mais que pareça de temos menos tempo, desde sempre ele é igual e assim será até a
ciência comprovar que o universo está, tanto quanto nosso cérebro e sua comprovada
neuroplasticidade, em constante expansão. Já existem estudos e algumas evidências desse
fenômeno, mas ainda não dá para usar esse argumento no nosso dia a dia… O de que
temos mais ou menos tempo…
Será que isto tem a ver com a experimentação do tempo que tivemos na infância,
puberdade, adolescência… Maturidade?
Para falar sobre o uso do tempo, será perda de tempo discutir o que foi colocado
acima? Filosofia? Ficção?
Seja ou não, uma coisa e/ou outra, refletir só usa parte do nosso tempo, mas traz
conhecimento, e isso não ocupa espaço. Apenas (?) nos faz começar a pensar em outras
dimensões de percepção do tempo e isso, minha experiência diz, facilita o uso do estoque
disponível. Nos dá a possibilidade de ativar mais intensamente os nossos dois hemisférios
cerebrais (racional e criativo, lógico e intuitivo) e assim, rever alguns paradigmas.
Administrar o tempo é administrar a vida e fazer dos dois, tempo e vida, o melhor uso
possível. Administrar o tempo agrega qualidade à sua vida. Assim, como gerenciar nossas
24 horas (se, fisicamente, elas continuam valendo as 24h que conhecemos)?
O trabalhador do futuro dividirá seu tempo livre, que tende a ser maior, em algumas
áreas de cuidados: cuidado com o corpo e a mente ou lazer e desenvolvimento intelectual;
cuidado com família e amigos, com a coletividade (exercício mais intenso de cidadania);
cuidado com o ócio.
Que tal começar hoje com alguma faxina? De rotinas, hábitos, pensamentos e por que
não, de algumas tarefas? Rever paradigmas.
Uma delas é sobre o direito ao ócio: já está comprovado que precisamos desse tempo,
antes chamado de tempo discricionário, na minha interpretação. Quem acha que ócio é
perda de tempo e assim pensa e diz “eu, profissional sério, jamais me permitiria ficar à toa”,
é bom rever este entendimento: ócio não é ficar à toa e para não ficar fazendo você “perder”
tempo (lembre que só tem 24 horas/dia?) procure ler um pouco, no seu horário de ócio, os
trabalhos de Paul Lafargue, Bertrand Russel e, mais atualmente, Domenico de Masi… A
importância de viver o ócio.
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Outra reflexão tem a ver com o avanço das pesquisas e algumas comprovações da
física de que às 24h de hoje, são sim, menores que antes. A expansão do universo pode
alterar a medida física da dimensão do tempo.
Gary Steigman, professor da Universidade do Estado de Ohio, Estados Unidos, já
comentou que, diferentemente do que previam as leis de gravidade formuladas por Isaac
Newton e revisadas por Albert Einstein, o Universo está em expansão. Outros estudiosos
afirmam que a Terra está girando em torno do seu eixo imaginário com maior velocidade.
Considerando que a unidade de tempo que utilizamos é a do dia solar (24h) que é o giro
do planeta em relação ao Sol, temos que saber que existe também o dia sideral
(23h56m04s) o giro da Terra em relação ao espaço sideral. Essa constatação já dá
evidências de mais uma hipótese de percepção do tempo a ser considerada, além das
citadas anteriormente.
Nossa noção de passagem do tempo deriva, segundo alguns autores, do movimento de
objetos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos, como o nascer e o pôr
do sol (fatores externos) e fome, sono, cansaço (fatores internos). Se alguém tirar estes
sinais sensoriais da nossa vida, simplesmente perdemos a noção da passagem do tempo.
Não dá para negar quanto isso interfere na nossa percepção de tempo. Esta constatação
fez com que, por exemplo, na maioria das UTI’s dos hospitais, fossem retirados relógios
para que os pacientes não tivessem a leitura (percepção) do tempo passando e que, com
isso, a angústia em permanecer no ambiente fosse aumentando.
“A percepção do tempo também é impactada por questões psicológicas, pois nem
sempre o que chamamos de “falta de tempo” é uma questão física. Pode ser uma realidade
psicológica, termo usado por Hilário Franco Junior no livro O ano 1000, no qual lembra que
o tempo não passa na mesma velocidade para todas as pessoas em todas as
circunstâncias”. (Eliane Lobato, em matéria publicada na Revista Isto É, nº 2046, ano 32, pg.5).
Esta consideração dá explicações consistentes do porquê quando fazemos o que
gostamos, temos a percepção / impressão de que o tempo passa muito rápido e quando
fazemos o que não gostamos, o tempo custa a passar.
Mais uma hipótese a considerar: Zygmunt Bauman, sociólogo e pensador polonês, nos
provoca a olhar o mundo, a modernidade, as relações pessoais e profissionais, o próprio
amor, através de um olhar diferente de anos atrás! O mundo, a modernidade, e tudo mais
são, no seu pensamento, líquidos. Os estados, transitórios e voláteis. E assim, a percepção
do tempo é significativamente impactada.
A globalização, palavra onde estão contidos os prós e os contras da vida
contemporânea e suas consequências políticas e sociais, pode ser um conceito meio difuso,
mas ninguém fica imune aos seus efeitos. A rapidez da troca de informações e as respostas
imediatas que esse intercâmbio acarreta nas decisões diárias afetam nossa percepção
sobre o tempo. (Interpretação e associação livre ao tema, sobre ensaio de Gioconda Bordon
sobre o autor). Nesse contexto, insere-se a figura do workaholic, cuja melhor tradução e
interpretação para mim é “aquele profissional que trabalha demais por prazer ou vício. É o
que está pilhado (todo o tempo em 220volts)”.
O termo não significa necessariamente que a pessoa realmente goste do trabalho, mas
simplesmente sente compulsão em fazê-lo. Tanto que algumas pessoas expressam sua
devoção com a carreira dirigida dessa forma, “workaholicamente”, de maneira positiva,
enquanto outras consideram essa postura altamente prejudicial. Isto pode se originar em
várias causas (inclusive psicológicas), dentre as quais está a competitividade de mercado,
empresa e pessoas nos tempos atuais.
Sem considerar outras implicações e consequências (família, saúde, stress, vínculos
sociais etc) é inegável não reconhecer que, para esses profissionais, 24h sempre será
pouco e a constatação do “liquido” fica evidenciada. Como exemplo de ação para evitar /
corrigir problemas como esses e suas causas e consequências, a Nokia implantou o
programa “Apagar as luzes”: de segunda a quinta, às 20h, e as sextas, às 19h, todos os
andares da empresa ficam às escuras.
Como disse anteriormente, provocativamente, estas são apenas algumas reflexões
sobre tempo. Reafirmo, “algumas”!
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Anexo 8