Departamento de Engenharia Mecânica
ESTUDO SOBRE A DEPOSIÇÃO DE PARAFINA EM DUTOS
Aluno: Luiz Guilherme Salge Vieira
Orientador: Luis Fernando Alzuguir Azevedo
Introdução
A deposição de parafina continua sendo um problema crítico nas operações da
indústria petroleira. Quando resfriadas, as parafinas contidas no petróleo parafínico bruto
ficam insolúveis no óleo e se tornam sólidas podendo depositar nas paredes dos oleodutos. A
solidificação ocorre após o fluido ter alcançado a Temperatura Inicial de Aparecimento de
Cristais, denominada TIAC, o que depende de cada tipo de petróleo bruto. O resfriamento é
comum em operações de produção e transporte de petróleo bruto em ambientes gelados, como
nas operações offshore e nas linhas de transporte em ambientes frios, como a Transalaska
Pipeline por exemplo. Através da transferência de calor entre o óleo e o ambiente externo a
parafina é formada. As linhas de escoamentos podem ser danificadas de forma permanente
dependendo da severidade da deposição.
O processo de cristalização e deposição modifica as condições de escoamentos do
fluido. Sabendo que o óleo fica mais viscoso e que a tubulação cada vez com diâmetro mais
reduzido, a potência para bombeamento necessária para vencer a perda de carga da tubulação
pode crescer até ficar inviável.
O depósito de parafina tem aparência de um gel e se torna cada vez mais rico em
frações pesadas e pobre em óleo, processo chamado de envelhecimento (2). Em alguns
modelos (1) o depósito é até mesmo representado como um meio poroso composto de
parafina sólida e solução no estado líquido. A dureza do depósito depende da porosidade do
gel e a tensão necessária para o arrancamento do depósito preso às paredes da tubulação está
diretamente relacionada a este fator.
Figura 1 – Depósito de parafina no interior de um duto
A espessura do depósito é frequentemente medida através de testes de queda de
pressão entre dois pontos da linha de escoamento (3) (4). Nestes casos a rugosidade
superficial do depósito é um parâmetro importante na determinação da perda de carga da
seção e consequentemente da espessura do depósito. A rugosidade do depósito de parafina
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pode modificar os valores de queda de pressão, gerando dados de espessura de depósito
maiores do que a realidade.
No presente trabalho foi feito um estudo experimental sobre as propriedades do
depósito de parafina. Foram realizados experimentos em duas seções de testes, uma de
geometria anular e a outra de geometria retangular. Na primeira foram realizados testes de
perda de carga com duto coberto por parafina e na segunda foram realizadas medidas de
condutividade térmica e porosidade de depósitos de parafina.
Objetivos
O objetivo deste trabalho é estudar as propriedades dos depósitos parafínicos para
diferentes vazões. Dado isso, três temas de estudo foram propostos: o estudo da rugosidade
superficial, da condutividade térmica e da porosidade de depósitos de parafina. No primeiro,
espera-se determinar a influência do depósito de parafina na rugosidade hidrodinâmica de
dutos. No segundo procura-se investigar a influência da vazão do escoamento na
condutividade térmica e na porosidade dos depósitos formados.
Metodologia
O fluido de teste utilizado no presente trabalho é um óleo modelo, contendo 80% de
querosene grau técnico e 20% de parafina comercial, usado para simular um petróleo
parafínico.
Seções de Testes e Análises:
- Seção anular: esta seção de testes (Figura 2) é formada por dois tubos
concêntricos formando uma seção anular. O tubo externo é feito de acrílico, e o tubo interno
em cobre. O tubo externo é totalmente transparente, o que possibilita a visualização do
escoamento. O tubo interno serve como um trocador de calor onde se pode resfriar a
superfície para permitir a deposição de parafina (Figura 3) com um escoamento de água a
temperatura controlada. Um banho termostático Thermo Scientific Haake A25, foi usado para
isso. Pelo espaço anular escoa o fluido de testes descrito acima e sua temperatura é controlada
por uma placa de aquecimento sob o tanque. A seção é imersa em um tanque com água a
temperatura controlada, para diminuir efeitos de perda de calor para o ambiente. Para o
escoamento do fluido, é usada uma bomba NETZSCH, NEMO021, e a frequência é
controlada por um inversor de frequência WEG CFW08.
Figura 2: Desenho da montagem com geometria anular para deposição de parafina
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Figura 3: Desenho dos tubos concêntricos gerando a seção anular com o deposito sobre o tubo de
cobre
O controle da temperatura do tubo de cobre é feito por meio de termopares que foram
inseridos por dentro da parede de cobre permitindo a medição de temperatura a 0,5mm da
superfície externa do tubo de cobre (Figura 4).
Figura 4: Desenho do tubo de cobre, com os termopares inseridos
Medidas de queda de pressão são feitas com o uso de um sensor de pressão a
membrana, Validyne DP 103, com precisão de 0,01 mmH2O. O sensor foi calibrado com o
auxílio de um manômetro de coluna de óleo, Dwyer. Testes iniciais foram feitos onde se
determinou a perda de carga na parte final da seção de testes, onde o escoamento é
hidrodinamicamente desenvolvido. Tomadas de pressão foram instaladas a 600 e 1000 mm do
inicio do canal. Testes de queda de pressão com querosene escoando isotermicamente a 33°C
foram realizadas. A correlação de Collebrook foi utilizada para avaliar os dados dos
escoamentos turbulento com a correção de diâmetro hidráulico proposta por Jones and Leung.
Onde Dh é o diâmetro hidráulico definido como
e Pm é o perímetro molhado, e
, onde At é a área transversal
.
Os dados laminares foram analisados usando o fator de atrito laminar para geometria
anular concêntrica, f=95/Re. Os testes laminares foram realizados apenas como forma de
avaliar o uso apropriado da correlação em uma faixa maior de vazões. Na figura 5 encontra-se
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o gráfico da queda de pressão pelo n° de Reynolds. Neste gráfico, medidas são comparadas
com dados obtidos utilizando as correlações propostas.
Figura 5: Gráfico da queda de pressão para o escoamento isotérmico de querosene variando com o
numero de Reynolds
A rugosidade do depósito foi determinada, mas não se obteve boa repetitividade dos
dados. Identificou-se a necessidade de corrigir possíveis fontes de erro experimental.
- Seção Retangular: esta seção de testes é formada por duas paredes de aço inox
separadas por espaçadores de acrílico, possibilitando a visualização da formação de depósito
(Figura 6). Nas placas superior e inferior estão instalados sensores de temperatura termopares
e na placa inferior sensores de fluxo de calor. As placas ficam em contato com trocadores de
calor por onde circula água proveniente de banhos termostáticos. Essas placas são removíveis,
o que facilita a remoção do depósito ao fim dos testes.
Figura 6: Desenho da montagem com geometria retangular para deposição de parafina.
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O teste de deposição com escoamento consiste em manter a vazão de escoamento e
manter uma condição inicial isotérmica (35°C), onde a temperatura é superior à temperatura
inicial de aparecimento de cristais (TIAC=33°C). A partir de um instante inicial resfria-se a
placa inferior até uma temperatura 23°C abaixo da TIAC. O depósito é formado
gradativamente, conforme a figura 7.
Figura 7: Formação de parafina na placa inferior devido à um gradiente de temperatura.
Durante todo o teste, é medido o fluxo de calor que cruza a placa resfriada, a
temperatura no seio do escoamento e a temperatura na superfície das placas. A medida da
espessura do depósito formado é feita por uma câmera de resolução de 1388x1040 pixels
acoplada a uma lente de aumento de 10x que foi calibrada com auxílio de uma régua
micrométrica. Depois de atingir regime permanente – quando o fluxo de calor e a espessura
do depósito param de variar com o tempo – o deposito é removido e analisado por
cromatografia gasosa. As medidas de porosidade são feitas a partir do resultado da
cromatografia gasosa, usando a hipóteses simplificadoras de que o líquido dentro do depósito
não muda de composição. A condutividade térmica do depósito é calculada utilizando a
espessura do depósito medida, a diferença de temperaturas ao longo do depósito (TIACTparede), e o fluxo de calor que atravessa o depósito. Esse cálculo toma como hipótese
simplificadora que a temperatura da interface seja a TIAC em regime permanente.
Onde h é a espessura do depósito formado quando atinge o regime permanente, q” é o
fluxo de calor por unidade de área que atravessa o depósito em regime permanente, T wall é a
temperatura da superfície interna da placa fria (Figura 8).
O teste de deposição sem escoamento consiste em preencher a cavidade da seção de
testes com a solução de parafina e mantê-lo isotérmico inicialmente. A partir de um instante
inicial resfria-se a placa inferior até uma temperatura 5°C inferior à temperatura da placa
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superior. Esta diferença de temperaturas foi escolhida devido a baixa incerteza experimental
(Figura 15). Com o fluxo de calor que atravessa o depósito a diferença de temperaturas entre
as interfaces superior e inferior do depósito (tomadas iguais à temperatura das placas) e a
espessura entre placas, que é constante, pode-se estimar a condutividade térmica do depósito
estático.
Figura 8
Resultados
Os resultados de condutividade térmica foram inicialmente inconclusivos, acredita-se
que existam erros experimentais que impeçam a determinação mais precisa desta grandeza. A
principal fonte de incerteza experimental neste experimento é a falta de controle da
temperatura ambiente, que modifica a medida de fluxo de calor. Além disso existe formação
de um filme de depósito próximo ao acrílico o que impede a correta determinação da
espessura de depósito.
As incertezas experimentais foram calculadas seguindo o método proposto por Kleine e
McClintock:
δR²=(
+ ... + (
Para os casos não estáticos, pode-se observar que os dados da espessura do depósito e
as temperaturas da placa fria apresentam um espalhamento considerável - 30% (Figura 10) e
40% (Figura 11) respectivamente.
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Figura 9: Evolução média da condutividade térmica do depósito com o tempo.
Figura 10: Evolução média da espessura de depósito com o tempo para diferentes números de
Reynolds.
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Figura 11: Evolução da temperatura de placa fria com o tempo para diferentes números de Reynolds.
Para isso foram refeitos testes com maior controle de temperatura ambiente, com o
objetivo de reduzir a deposição na parede de visualização, melhorando a medição da
espessura real do depósito. Os dados da espessura do depósito, condutividade térmica e as
temperaturas da placa fria apresentaram um menor espalhamento - 2% (Figura 12), 1%
(Figura 13) e 1,2% (Figura 14) - respectivamente.
Figura 12: Espessura do deposito para diferentes números de Reynolds.
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Figura 13: Evolução da condutividade térmica para diferentes números de Reynolds após atingir o
regime permanente.
Figura 14: Evolução da temperatura de placa fria com o tempo para diferentes números de
Reynolds.
A espessura de depósito cai com o aumento da vazão (Figura 12). A condutividade
térmica não segue a tendência esperada, já que a condutividade deveria aumentar com a
quantidade de sólidos no depósito, o que cresce com a vazão. Uma das explicações para este
fato pode ser o aumento da quantidade de sólidos em depósitos espessos comentada na
literatura (6) (7).
Outra hipótese seria a de que a formação de depósito na parede de visualização seja
maior em vazões mais baixas o que dificultaria a identificação da interface nestes casos,
aumentando a incerteza destas medidas.
Visto que ainda existe depósito na parede de acrílico, acredita-se que somente o
aquecimento do ar ambiente não seja suficiente para impedir a formação de depósito na
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parede de visualização. Alguns testes recentes foram feitos com um jato quente incidindo
sobre esta parede e verificou-se que este método é mais eficiente em impedir a formação do
depósito. O jato provoca aumento no coeficiente de troca por convecção e faz crescer a
eficiência na transferência de calor do ar quente para a superfície. Essa má determinação da
espessura do depósito faz com que a incerteza varie em até 50% (Figura 9).
Outra fonte de incerteza experimental é a hipótese simplificadora de que a temperatura
da interface é sempre igual à TIAC em regime permanente, o que pode não ser verdade em
alguns casos.
Figura 15: Incerteza da condutividade térmica com uma diferença de temperatura entre as placas
para o teste estático.
Para os testes de condutividade sem escoamento, foi decidido manter uma variação de
5 °C entre as placas superior e inferior, devido a baixa incerteza experimental deste caso. É
importante frisar que se deseja escolher a menor diferença de temperaturas para que se possa
obter um depósito com temperatura o mais homogênea possível. Foram realizados vários
testes e pôde-se observar que os dados apresentam uma repetitividade nos resultados (Figura
16), com um espalhamento de 1,3%. O espalhamento desses dados é diretamente relacionado
o espalhamento nos dados de fluxo de calor, devido ao baixo valor absoluto medido (em torno
de 200 W/m2).
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Figura 16: Condutividade térmica média do teste estático após atingir o regime permanente.
Os resultados obtidos com as medidas de composição indicam que quanto maior a
vazão maior a quantidade de frações pesadas, dando indícios de enriquecimento em frações
pesadas, à medida que se aumenta a vazão do escoamento.
Amostras de depósito obtidas nos testes da seção retangular foram utilizadas para
estimar a porosidade do gel. Esta seção permite a abertura ao fim de cada teste para a retirada
do depósito para análise. O depósito dos testes estático e com escoamentos é analisado
posteriormente.
Pode-se observar (Figura 17) que quanto maior a vazão maior a quantidade de frações
pesadas, indicando a existência de um n° de carbono crítico (8) por volta de C29. Pode-se
observar que para moléculas abaixo do carbono crítico quanto menor a vazão maior a
porcentagem da molécula no gel. Para moléculas acima do carbono crítico, quanto maior a
vazão maior a porcentagem da molécula no gel.
Figura 17: Frações de cada componente obtido por cromatografia gasosa para diferentes nº de
Reynolds.
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Para o cálculo da porosidade do gel, tomamos como hipótese a constante composição
do líquido dentro do gel. Desta forma calculamos a porosidade a partir dos dados de
composição do depósito (Figura 18).
Figura 18: Frações de querosene e parafina presentes em uma amostra de depósito gerado com
vazões diferentes e estático.
Conclusões
O estudo permitiu a identificação da evolução da composição do depósito com a
vazão. Além disso, foi possível identificar possíveis fontes de erro experimental, o que
permitirá o aprimoramento do sistema de medição montado.
Nos testes de medição de rugosidade identificou-se um vazamento no circuito de
mangueiras para a medição da pressão. As mangueiras foram trocadas por tubos finos em aço
inox com anilhas de dupla vedação. Acredita-se que nos próximos testes será possível obter
resultados mais conclusivos.
Nos testes de condutividade térmica, acredita-se que a má visualização da interface
entre o depósito sólido e o líquido seja a maior fonte de erros experimentais. Outra fonte de
erro identificada é a hipótese que a temperatura da interface seja sempre igual à TIAC. Um
sistema de aquecimento por jato quente foi montado para aquecer a parede de acrílico e evitar
o depósito na parede, melhorando a qualidade da visualização. Além disso, a temperatura da
interface será medida por um dispositivo já fabricado que permite a inserção de um termopar
na seção de testes.
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Referências
1- BANKI, R.,HOTEIT, H., FIROOZABADI, A.(2008). Mathematical formulation and
numerical modeling of wax deposition in pipelines from enthalphy-porosity approach and
irreversible thermodynamics. Int. Journal of Heat and Mass Transfer, 3387-3398.
2- SINGH, P., VENKATESAN, R., FOGLER,H.S. (2001). Formation and aging of incipient
thin film wax-oil gels. Materials, Interfaces and Electrochemicam Phenomena, 1059-1074.
3- BROWN, T.S., NIESEN, V.G., ERICKSON, D.D. (1993). Measurement and Prediction of
the
Kinectics of Paraffin Deposition. SPE. Huston.
4- CREEK, J.L., LUND, H.J., BRILL, J.P.,VOLK, M. (1999). Wax Deposition in Single
Phase Flow. Fluid Phase Equilibria, 801-811.
5- BOTT, T. R., GUDMUNDSSON, J. S. (1977), Deposition of Paraffin Wax from Kerosene
in Cooled Heat Exchanger Tubes.
6- SINGH, P., VENKATESAN, R., FOGLER,H.S.(2001) Morphological Evolution of Thick
Wax Deposits During Aging, Fluid Mechanics and Transport Phenomena,6-18
7- HOTEIT,H.,BANKI,R.,FIROOZABADI, A. (2008) Wax Deposition and Aging in
Flowline from Irreversible Thermodynamics, Energy & Fuels 2693-2706.
8- SINGH, P., YOUYEN, A., FOGLER,H.S.(Existence of a Critical Carbon Number in the
Aging of Wax Oil Gel
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