APLICAÇÃO DO PROCESSO ELETROQUÍMICO A DESCONTAMINAÇÃO DE
SOLO ARGILOSO CONTAMINADO POR SOLVENTES AROMÁTICOS
Daniely de Lucena SILVA1; Kátia Dias NERI1; Verônica Evangelista de LIMA2; Eudésio Oliveira
3
VILAR .
1
Aluna da UAQI/UEPB 2 Professora do CCT/UEPB 3 Professor do DEQ/UFCG
Laboratório de Engenharia Eletroquímica-LEEQ. Universidade Federal de Campina Grande
Avenida Aprígio Veloso, 882, CEP 58109-970, Campina Grande – PB
e-mail: [email protected]
1 Introdução
Dada a larga utilização dos
solventes orgânicos em aplicações
industriais, produtos de consumo e
materiais
de
construção,
estes
compostos estão entre os poluentes de
maior
ocorrência
em
solos
contaminados. Quando depositados no
meio ambiente, apresentam média
persistência ambiental e tendem a
evaporar se a contaminação for
superficial.
Sua
presença
na
subsuperfície, entretanto, compromete
o meio ambiente e representa um
grande risco de contaminação dos
lençóis d’água subterrâneos. Neste
caso a descontaminação se torna
necessária. Embora muitos processos
estejam disponíveis à remediação de
solos,
poucas
tecnologias
são
eficientes em configurações com alto
teor de argila. A limitação dos
processos reside na dificuldade
evidente de mobilizar contaminantes
ou transportar compostos essenciais
através
de
solos
de
baixa
granulometria, de baixa condutividade
hidráulica ou baixa permeabilidade. Os
processos eletroquímicos não são
obstruídos pelas difíceis características
de fluxo dos solos argilosos e podem
ser aplicados tanto na mobilização de
metais (por eletromigração) quanto no
deslocamento de orgânicos (por
eletroosmose). Este trabalho tem como
objetivo investigar a viabilidade da
descontaminação de solos argilosos
utilizando o processo eletroquímico
para mobilização por eletroosmose de
tolueno e xileno.
2 Metodologia
Para estudo dos fenômenos
envolvidos no processo eletrocinético,
foi construído um reator (Figura 1)
composto por um elemento anódico e
outro catódico em ADE® (ânodo
dimensionalmente estável ® De Nora)
separados por uma seção retangular
preenchida com 1700g de solo argiloso
contaminado
com
os
solventes
Tolueno
e
Xileno,
estudados
separadamente. Foram estudadas as
variáveis: Tempo de processo (de 48 a
72 h), intensidade de campo elétrico
aplicado (1 a 3 V/Cm) e umidade inicial
do solo (20 a 50%), seguindo as
condições previstas no planejamento
experimental.
Figura 1: Representação da maquete
experimental.
A eficiência do processo foi
verificada
pela
medida
de
concentração e verificação do pH do
solo em diversos pontos no espaço
intereletródico. Para verificação da
concentração, a técnica utilizada foi de
extração dos aromáticos utilizando éter
dietílico e medidas de absorbância por
espectroscopia de UV (259nm). Os
dados
obtidos
foram
tratados
estatisticamente.
3 Resultados e discussão
Os parâmetros oriundos da
análise estatística sobre os dados
coletados
correspondentes
a
eletroosmose do tolueno e xileno estão
listados no Quadro 1. Pode-se
comprovar
que
há
evidências
estatísticas suficientes para atribuir
uma relação linear ajustada aos dados
experimentais, visto que o percentual
de variância explicada pelo modelo
linear é acima de 95%.
Análise Estatística
TOLUENO
XILENO
Coeficiente de
2
correlação (R )
0,9505
0,9602
% Máxima de variância 99,94
explicada
99,64
Teste F calculado
12,0
9,6
Teste F tabelado com 8,14
95% de confiança
6,16
FCalculado/FTabelado
1,073
1,95
Erro puro
0,00120
0,00245
Falta de ajuste
0,096009
0,02514
Quadro 1: Análise da variância (ANOVA)
para C/Co dos compostos estudados.
Além dos valores tabulados, a
investigação estatística sugere uma
equação codificada que permite
identificar a resposta do sistema em
pontos diferentes dos que foram
investigados
nos
ensaios
experimentais, respeitando os limites
do intervalo de estudo para cada
variável fixados no planejamento.
A partir da análise estatística dos
resultados foi estabelecido um modelo
linear, descrito pela Equações 1 e 2,
que expressa a mobilização de tolueno
e do xileno por eletroosmose em
termos da razão entre a concentração
encontrada em determinado ponto do
solo ao final do processo (C) e a
concentração inicial (Co).
TOLUENO:
C/Co=
1,6607+
0,29175T
–
0,2955U
–
0,00225V – 0,2305TU + 0,08075TV + 0,033UV
(1)
XILENO:
C/Co = 1,483 + 0,0225T – 0,265 U + 0,1025V
– 0,0375TU + 0,005TV - 0,0125UV
(2)
Onde T é o tempo em horas do
processo eletroosmótico, U é o
percentual de umidade inicial do solo e
V designa a intensidade de campo
elétrico aplicado em V/cm. Os valores
em negrito na equação são os termos
de maior contribuição para o modelo
matemático.
A regressão é útil para fins de
previsão quando o valor de F calculado
for maior que o valor da distribuição F
com o número apropriado de graus de
liberdade no nível de confiança
estabelecido. No caso do tolueno e do
xileno, FCalculado/FTabelado tem um valor
baixo, mas o modelo empírico linear
encontrado é válido estatisticamente,
não sendo um modelo altamente
preditivo.
Na Figura 2 são mostradas as
superfícies de resposta construídas a
partir do modelo linear. Através das
superfícies de resposta pode-se
observar a influência das variáveis
tempo (T), umidade(U) e intensidade
de campo elétrico (ICE) sobre o
deslocamento
do
tolueno
por
eletroosmose, tendo C/Co como
variável de resposta.
Na Figura 2a, são verificados os
efeitos do tempo e umidade sobre o
processo, mantendo-se a variável ICE
fixada no ponto central (2 V/cm).
Observa-se que o aumento do tempo
de processo associado ao menor teor
de umidade do solo traz como resposta
maior concentração relativa (C/Co) de
tolueno junto ao ânodo. A Figura 2b
complementa essa avaliação: a
diminuição da umidade em parceria
com um aumento da intensidade de
campo elétrico, no tempo médio fixado
(60h), responde por um maior valor de
C/Co. Logo, as melhores condições
para C/Co são alcançadas nos ensaios
com menor teor de umidade, maior
força de campo elétrico aplicado e
maior tempo de processamento,
comportamento comprovado também
para o xileno
Nas condições estudadas, a razão
C/Co foi influenciada positivamente
pelo aumento do tempo (T) e da
Intensidade de Campo elétrico aplicada
(ICE).
O excesso de umidade interferiu
negativamente em C/Co. Não foram
apontadas interações significativas
entre as variáveis do processo. A
análise das superfícies de resposta
indica que, dentre o intervalo estudado,
as
melhores
condições
do
processamento foram 72 horas, 20%
umidade e 3V/cm.
a
b
c
Figura 2: Superfícies de resposta em C/Co para os parâmetros tempo, ICE e umidade, relativas
ao contaminante tolueno.
2,5
Tolueno
Xileno
2,0
max. C/Co
Um exame abrangente sobre
todas as condições experimentais para
os contaminantes em estudo revela
conclusões semelhantes que podem
ser conferidas na Figura 3. Pode-se
observar que o maior potencial (3V/cm)
e o maior tempo de eletrólise (72h)
contribuem
para
um
maior
deslocamento dos contaminantes. A
influência da umidade inicial do solo
sobre o processo, entretanto, mostrouse adversa à mobilização.
1,5
1,0
0,5
Umidade
20%
Umidade
50%
Umidade
20%
Umidade
50%
Umidade
35%
5
7
9
0,0
1
2
3
4
6
8
10
11
Ensaios experimentais
Figura 3: Ponto de máxima concentração
relativa observado para cada ensaio
experimental.
A mobilidade no meio sólido
apresentada pelo tolueno quando
estabelecidas as diversas condições
experimentais é mostrada nas Figuras
4a e 4b. O percentual deslocado por
cada seção é dado pela expressão
matemática:
C - Co
(3)
% contaminan te =
× 100
Co
onde
C
é
a
concentração
(mgContaminante/KgSolo) determinada em
cada seção ao final do processo.
Os valores percentuais negativos
aparecem nas representações gráficas
freqüentemente associados às seções
próximas ao cátodo e denotam saída
de contaminante.
O acúmulo dos compostos nas
regiões anódicas também pode ser
percebido. Os altos deslocamentos
positivos, ou seja, porções do solo
mais concentradas em contaminante
estão, via de regra, nas cercanias do
ânodo.
Os
experimentos
que
apresentaram
os
maiores
deslocamentos pontuais (acima de
140%) e estão relacionados ao limite
inferior do intervalo delimitado para o
estudo da variável umidade (20%).
Mais um reflexo dos efeitos contrários
entre hidratação do meio e transporte
do contaminante.
142,5
144,4
% Tolueno
% Tolueno
80,1
3,5
10,9
0,6
-31,9
-33,8
0,2
0,3
-44,8
-7,4
0,1
-26,7
0,2
0,3
-25,9
-26,7
0,4
0,5
0,6
-40,1
-15,0
-18,3
-26,4
-20,5
-22,0
-42,1
0,7
0,8
0,9
1,0
Posição normalizada a partir do cátodo
a
0,1
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0
Posição normalizada a partir do cátodo
b
Figura 4: Percentual de tolueno deslocado eletroquimicamente em cada seção de
amostragem nas condições de 72h, umidade 20%. a) ICE de 1V/cm. B) ) ICE de 3V/cm
A técnica eletroquímica, por si só,
não
conduz
à
remoção
de
contaminantes do meio e sempre deve
estar associada a um método de
extração. Para fins de remediação é
importante que se identifique a melhor
localização para instalação dos meios
de extração. Um conhecimento da
distribuição do contaminante no solo
após o processo eletroquímico é,
portanto, fundamental nas aplicações
de campo. As Figuras 5a e 5b revelam
a distribuição percentual do tolueno
após o processamento eletroquímico
tendo como base de cálculo a
concentração total no solo. Dentro das
condições de trabalho, foi possível
mobilizar
53,5%
e
43%
da
concentração inicial de tolueno e
xileno, respectivamente, estando estes
percentuais acumulados nas três
porções imediatamente próximas ao
ânodo (ver Figuras 5a e 5b).
A reação dominante e mais
importante de transferência de elétrons
que ocorre nos eletrodos durante o
processo eletrocinético é a eletrólise da
água:
H2O → 2H+ + ½ O2 (g) + 2e2H2O + 2e- → 2OH- + H2(g)
Eo=-1,23(ânodo)
Eo=-0,83 (cátodo)
.
30
21,7
19,7
24,4
25
% Tolueno
% Xileno
20
11,7
10,6
9,6
9,2
18,0
15
11,1
10
6,6
5,5
5,4
7,9
7,8
6,8
6,6
0,2
0,3
5,5
6,0
5,8
5
0
0,1
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0
0,1
Posição normalizada a partir do cátodo
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0
Posição normalizada a partir do cátodo
a
b
Figura 5: Distribuição percentual presente no solo após a eletrólise, nas condições de
72h, 20% umidade e ICE 3V/cm; a) Tolueno ; b) xileno.
A migração dos
íons H+
impulsionada pelo campo elétrico
através do solo resultou num gradiente
de pH bem estabelecido entre os
eletrodos: valores acima de 11 nas
regiões muito próximas ao cátodo e
valores abaixo de 2, nas vizinhanças
do ânodo.
A Figura 6a descreve as
observações finais quanto ao pH da
matriz argilosa (50% de umidade inicial)
CÁTODO
contaminada com tolueno para o
período de 72 horas de processamento
eletrocinético.A Figura 6b apresenta
resultados semelhantes para o xileno.
Em ambos os casos, aproximadamente
80% do material sólido em estudo
adquiriu caráter ácido. Nota-se a
ausência de regiões com pH inalterado
(o pH inicial do solo foi 8), reflexo da
ampla ação dos íons H+ e OH- sobre
todo o meio poroso.
CÁTODO
ÂNODO
14
1 V/cm
3 V/cm
12
12
1 V/cm
3 V/cm
10
Escala de pH
10
Escala de pH
ÂNODO
14
8
6
8
6
4
4
2
2
0
0
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
Posição normalizada a partir do cátodo
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
Posição normalizada a partir do cátodo
a
b
Figura 6: Perfis de pH após 72 horas de processamento eletrocinético, com 50% de
umidade inicial do solo; a) Contaminante tolueno; b) Contaminante xileno.
4 Conclusão
Conclui-se que a mobilização de
contaminantes orgânicos em solo
argiloso é possível através de um
processamento eletroquímico, sua
eficiência,
entretanto
depende
docontrole adequado das condições de
processo, incluindo as alterações do
pH do meio.
De fato, o fluxo eletroosmótico é
função de muitos parâmetros incluindo
os tipos de argilas minerais, espécies
iônicas presentes em solução, pH do
meio, força iônica e temperatura, é
importante avaliar a contribuição de
cada um destes termos para o
transporte
dos
orgânicos
aqui
investigados.
1,0
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