Salvador BA: UCSal, 8 a 10 de Outubro de 2014,
ISSN 2316-266X, n.3, v. 2, p. 37-54
NOVO SINDICALISMO: CLASSE SOCIAL, TRABALHO E
MOVIMENTO SOCIAL EM DEBATE
BERNARDO, Kelen Aparecida da Silva
Professora colaboradora do departamento de Serviço Social da Universidade Estadual de Ponta
Grossa-UEPG.
SILVA, Lenir Aparecida Mainardes da
Professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas e do departamento de
Serviço Social da Universidade Estadual de Ponta Grossa-UEPG.
RESUMO
Ao olhar para a história social pode-se perceber que ela foi constituída por lutas, onde em certos
momentos ocorreram avanços e em outros retrocessos, tendo como horizonte o entendimento de
sociedade dividida em classe que se complexificou ao longo do tempo é que no presente estudo, teceu-se
discussões referentes ao debate sobre a divisão social de classe, sobre a centralidade da categoria
trabalho, bem como, buscou-se conhecer o movimento social pelo trabalho intitulado de novo
sindicalismo, o qual teve inicio no final da década de 1970 e foi protagonizado pelos trabalhadores
vinculados aos sindicatos metalúrgicos do ABC paulista.
Palavras-chave: Centralidade do trabalho; Classe social; Sindicalismo.
ABSTRACT
When looking at the social history can be seen that it consisted of fights where at times there have been
advances and other setbacks, havin as horizon understanding the class division it has been further
complicated over time society is that in the present study wove up discussions regarding the debate
about the social class division, about the centrality of the working class as well, aimed to investigate the
social movement for the work titled new unionism, which began in the late 1970s and was performed by
the workers tied to metal unions ABC Paulista.
Keywords: Centralization of work; Social class; Unionism.
INTRODUÇÃO
Ao refletir sobre o mundo do trabalho, em um contexto de constantes mudanças, faz-se
necessário visualizar sua importância na vida cotidiana da classe trabalhadora. Importância essa
que vai além de viabilizar formas de sustento e sobrevivência. A inserção social, o aprendizado,
a construção e formação da identidade são possibilidades advindas por meio da experiência
com o mundo do trabalho. Partilhando do pensamento de Marx em relação ao trabalho,
entende-se que este permeia as relações sociais, sendo uma necessidade infindável da vida
social (CARDOSO, 2011).
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Pela importância social e econômica que o trabalho possui, entende-se que esse é um
direito social fundamental para a garantia e a conquista de uma vida digna. O direito ao trabalho
está previsto dentro do sistema de garantias e direitos. A Constituição Federal de 1988
(BRASIL, 2014) estabelece em seu capítulo II, artigo 6° que: “são direitos sociais a educação, a
saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição” (grifo nosso).
Ter acesso ao trabalho é um direito do cidadão. A violação desse direito
consequentemente viola outros direitos, pois sem trabalho o sujeito que vende sua força
produtiva de labor não possui recursos financeiros para uma alimentação decente ou para
providenciar uma moradia digna, e quando se trata de lazer, o mesmo não é contemplado.
Assim, o direito ao trabalho traz embutidos vários outros direitos que precisam ser garantidos
pelo Estado por meio das políticas públicas. Assim, segundo Pereira (2009) políticas públicas
são “às ações do Estado face às demandas e necessidades sociais da sociedade, que se
materializam por meio de projetos, programas e serviços. Não se pode falar em política pública
fora da relação entre Estado e sociedade.
No processo de garantia dos direitos sociais, em especial o trabalho, o Estado desponta
como ator principal, visto que ele é o agente fundamental na elaboração de políticas públicas
para o trabalho. É válido ressaltar que compreende-se o Estado pela perspectiva Gramsciana. A
partir dessa compreensão o Estado é designado como Estado ampliado, sendo esse um conjunto
das duas esferas, sociedade política (esfera estatal, que tem como função a dominação de uma
classe) e sociedade civil. O Estado é a esfera que efetiva a unificação e o domínio através da
hegemonia burguesa (a aceitação dos setores subalternos no delinear da direção social).
Para Gramsci o Estado é a junção da sociedade política com a sociedade civil, sendo
ainda, um espaço contraditório de disputa de hegemonias, de poder e de ideologias. (BOBBIO,
1994). É nesse espaço que as lutas de classe se apresentam e são gestadas. Pensar a sociedade e
não considerar as relações de classe para compreendê-la é ter um entendimento simplista das
relações existentes na realidade cotidiana. Ao discutir questões como o novo sindicalismo, as
mudanças no mundo do trabalho, a centralidade da categoria trabalho, não pode-se deixar de ter
como horizonte a luta de classes.
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A DIVISÃO SOCIAL DE CLASSE AINDA É CENTRAL PARA COMPREENDER A
SOCIEDADE?
Para Marx, as classes sociais surgem devido à divisão social do trabalho. Ao observar as
contradições existentes no modelo de produção capitalista, Marx definiu duas classes
fundamentais, os proprietários dos meios de produção e os produtores diretos das riquezas (os
trabalhadores), ou seja, burguesia e proletariado. Essas são as duas principais classes fundantes
que caracterizam o atual sistema econômico. Entretanto, existe uma heterogeneidade de classes
sociais que compõem as duas classes fundantes, as quais são expressões do modo de produção
capitalista. (MARX 1980 apud MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011).
Ao pensar a questão da divisão de classe, Montaño e Duriguetto (2011) apoiados no
pensamento marxista reportam ao modo de produção para explicá-la. Para os autores, o modo
de produção capitalista pode ser entendido por dois vieses, sendo pelo da determinação
econômico-político e pela relação social. A determinação econômico-político ocorre devido à
separação entre a mais-valia e os meios de produção, é a apropriação da mais mais-valia que
torna possível a geração de lucro. O viés da relação social se dá por meio da separação entre
produtor e meios de produção, visto que o capitalista necessita do trabalhador, pois não
consegue acumular sem a extração da mais-valia, bem como o trabalhador também necessita do
capitalista, uma vez que não consegue produzir sem se vincular ao capital1. Nesse processo,
ambos, capital e trabalho, precisa estabelecer uma relação de compra e venda da força de
trabalho.
Seguindo essa perspectiva, a questão de classe está atrelada a posição que o sujeito
social ocupa no sistema econômico. Portanto, as classes determinam-se no âmbito da produção,
com isso um indivíduo passa a pertencer a uma determinada classe social devido à função que
desempenha na produção. Montaño e Duriguetto (2011, p. 89) afirmam que:
Não é esfera do mercado, mas no âmbito da produção que se determinam
originalmente as classes; não é pela capacidade de consumo, mas pela função
na produção que os indivíduos passam a pertencer a uma classe social; não é
pelo tipo de renda que recebem, mas pelo papel social na produção de riqueza.
Ou seja, o tipo e o volume de renda, a capacidade de consumo, o acesso ao
mercado, são os elementos determinados das classes, o lugar e o papel na
1
O termo capital, para Montaño e Duriguetto (2011), remete a uma relação de emprego que é baseada na
exploração do trabalho pelo capital, bem como é historicamente determinada.
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esfera produtiva, são os aspectos determinantes; sua função na produção de
riqueza é a causa, sua participação no mercado é a consequência.
Para tanto, nessa esteira de pensamento, não importa o quanto o sujeito receba pelo seu
trabalho, mas sim sua função no sistema de produção. A capacidade de consumo ou o volume
de renda são determinados, mas o local, sua função e seu papel no sistema de produção são
determinantes para identificar a qual classe esse sujeito pertence. Assim, tem-se as duas classes
fundantes, detentores dos meios de produção e produtores de riqueza.
Conforme ressaltam Montaño e Duriguetto (2011) pode-se visualizar essas duas
grandes classes, mas é válido lembrar que ambas são compostas por inúmeros segmentos, os
quais são heterogêneos, são compostas por diversas categorias. Entretanto, o fator fundamental
que as dividem em duas grandes classes está ligado ao sistema de produção, onde os donos dos
meios de produção pertencem aos capitalistas (que extrai a mais-valia) e os vendedores da força
de trabalho pertencem à classe que vive do trabalho, ou seja, os trabalhadores.
O reconhecimento que vivemos em uma sociedade composta por classes heterogênea
não pode esconder as contradições existentes no capitalismo, não pode apagar a exploração de
uma classe por outra. É nessa perspectiva que Montaño e Duriguetto (2011) afirmam que:
O que ocorre é a convivência das classes fundamentais com outra diversidade
de classes, e dentro de cada uma delas uma enorme heterogeneidade. [...] No
entanto, mesmo sem se verificar uma bipolarização das classes no concreto
espaço cotidiano da sociedade capitalista, existindo hoje uma forte
“desproletarização”, um crescimento das classes médias e uma pluralidade
heterogênea de classes, isso não nega a caráter fundante das classes capitalista
e trabalhadora, e sua contradição central, a exploração da força de trabalho
pelo capital (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011, p. 90)
Portanto, a diversificação de classes no atual contexto não apaga o caráter central do
modelo de produção capitalista que é a espoliação do trabalhador, ainda se faz presente a
relação de exploração e explorado na realidade cotidiana da sociedade atual. Assim, existe uma
tentativa de mascarar e tirar de cena a noção de divisão de classe e de luta entre essas classes.
[...] essa heterogeneidade da classe trabalhadora não pode nos fazer perder de
foco o seu caráter central e universal, no MPC 2: toda ela constitui-se em
homens e mulheres ‘livres’, meros proprietários de força de trabalho,
despossuídos dos meios fundamentais de produção e consumo, obrigados
assim a vender sua força de trabalho ao capital, em troca do salário. Nesse
2
A sigla MPC é utilizada por Montaño e Duriguetto (2011) para referir-se ao Processo de Produção Capitalista.
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processo e nessa relação, produzem mais-valia, apropriada pelo capital
(MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011 p. 94)
Nesse viés, Montaño e Duriguetto (2011) afirmam que existe uma condição necessária,
uma relação ineliminável no modo de produção capitalista, onde o capitalista, dono dos meios
de produção e não da força produtora, para produzir, necessita do trabalhador. O trabalhador
por sua vez, necessita do capitalista para sobreviver, pois despossuído dos meios de produção o
mesmo precisa vender sua força de trabalho, único bem que lhe cabe.
Sem desconsiderar a relevância da análise feita pelos autores supracitados, é válido
pensar nas transformações ocorridas no mundo do trabalho, pois as novas tecnologias, com a
fluidez no tempo e no espaço, a redução de postos de trabalhos, o poder imbuído ao mercado
financeiro, na eliminação do trabalho humano seria possível relativizar as firmações dos
autores a respeito da relação ineliminável entre o trabalho e capital. Então, assim tem-se uma
relação ineliminável na grande maioria dos setores produtivos, mas que atualmente a referida
relação já foi eliminada em alguns espaços da economia capitalista, uma vez que já é possível
obter lucros sem o trabalho humano. Pode-se observar um exemplo desse processo na atual
organização do mercado financeiro do capital especulativo.
Diante das discussões apresentadas pode-se considerar que vivemos em um contexto de
complexificação e heterogeneização das classes sociais, entretanto seu caráter fundante que é a
retenção da mais valia pelo capital, ainda é presente nas relações de trabalho. Trilhando por esse
caminho, visualiza-se que o discurso do abandono da luta de classes pelo olhar contemporâneo,
pós-moderno desestimulam lutas sociais utópicas, forjando a fragmentação das demandas dos
movimentos sociais. Montaño e Duriguetto (2011, p. 119) reafirmam sua concepção da
permanência de lutas de classes:
Sustentamos, portanto, que, independentemente do grau de conhecimento e
imagem que atores e analistas tenham das várias formas de lutas sociais, elas
são expressões das lutas de classes. Assim, ao pensarmos estas últimas, não
devemos desprezar as diversas lutas sociais.
Portanto, as lutas sociais advêm das expressões das lutas de classe e a negação desse
fato vem a servir a ordem vigente, transferindo o debate para o campo ideológico cultural.
Nesse sentido, perde-se o projeto teleológico de sociedade. O discurso de que a luta de classe
não existe mais na atualidade é perfeito para o capitalismo, pois atua na manutenção da ordem
vigente. Nesse viés são favorecidas as demandas e projetos individuais em detrimento de
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projetos coletivos que visam mudanças societárias, projetos que questionem o atual sistema
vigente. Assim, o grande desafio que se apresenta para os movimentos sociais, principalmente
aos ligados ao mundo do trabalho, é superar a ofensiva ideológica de que não vivemos mais em
uma sociedade dividida em classe. Essa ofensiva esconde e minimiza as contradições existentes
na sociedade de classe.
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O mundo do trabalho
Tendo Marx como referência, o trabalho é entendido como atividade que diferencia o
homem de outros animais da natureza, é através do trabalho que o homem manipula a natureza
para alcançar um objetivo fim. Assim, é por meio do trabalho que o homem controla a natureza
e ao mesmo tempo constrói a si mesmo. Segundo Marx (1932), o homem, através do trabalho,
obtém seus meios de sobrevivência ou subsistência e, neste processo, ele cria a si mesmo.
O conjunto do que se chama história mundial nada mais é que a criação do homem pelo
trabalho humano, e a emergência da natureza para o homem; ele, portanto, tem a prova evidente
e irrefutável de autocriação de suas próprias origens. (MARX, 1932).
O trabalho é uma atividade criadora teleologicamente orientada, o ser social passa a
desenvolver atividades orientadas por finalidades racionais, é esse processo que caracteriza o
trabalho como categoria ontológica do ser social. “O Trabalho, portanto, como modelo de
práxis social, caracteriza o salto ontológico, o momento fundante que peculiariza o ser social.”
(LUKÁSC, 1979 apud MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011).
Entretanto, essa concepção ontológica do trabalho sofre alterações quando a análise é
feita sobre o trabalho assalariado. Montaño e Duriguetto (2011), ao abordar a relação do
trabalhador com o produto resultante de seu trabalho, explicam que o trabalho assalariado perde
sue caráter ontológico, o qual funda o ser social e caracteriza sua “liberdade”. Assim o trabalho
no sistema capitalista passa a ser uma atividade controlada, mecânica e desumanizante. Tem-se
que, a dimensão do trabalho ontologicamente determinante do ser social passa por um processo
de desumanização no trabalho assalariado, pois o modo capitalista promove a exploração e a
alienação do trabalhador.
São nessas perspectivas que a categoria trabalho ocupou por muito tempo a centralidade
nas discussões sobre a formação e organização da vida em sociedade. Porém, as configurações
do modelo capitalista vigente traçaram mudanças significativas no âmbito do trabalho,
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mascarando e reafirmando, novas e velhas formas de exploração da classe trabalhadora. A
precarização dos postos de trabalho e a desregulamentação dos direitos trabalhistas
apresentam-se disfarçadas nos discursos de competitividade e flexibilidade do mercado de
trabalho. Assim, o subemprego, o trabalho precário, o trabalho escravo e o trabalho precoce são
expressões que tencionam as relações no âmbito do trabalho.
São visíveis as transformações que vem ocorrendo no mundo do trabalho nas últimas
décadas. Mudanças fomentadas pelas novas tecnologias, afetando a estrutura ocupacional, a
natureza e hierarquia das funções, eliminando postos de trabalho em maior proporção que os
cria, aumentando a terceirização e precarização das relações de trabalho.
Para alguns estudiosos como Offe (1989) e Habermas (1987) esse conjunto de
mudanças que vem ocorrendo no mundo do trabalho sinaliza o fim da centralidade da categoria
trabalho, demonstrando que a “sociedade do trabalho” não é mais suficiente para explicar as
novas configurações sociais resultantes na contemporaneidade.
Na contra mão dessa linha de pensadores, entende-se que a categoria trabalho ainda é
fundamental para a compreensão das relações existentes na sociedade. Compartilha-se do
entendimento de que o trabalho ainda ocupa um lugar de destaque na organização da sociedade
atual. Antunes (2006) explica que ao invés de “adeus ao proletariado”, tem-se um amplo leque
de diferentes agrupamentos e segmentos que compõem a “classe-que-vive-do-trabalho 3”.
Novos processos de trabalho emergem, onde o cronômetro e a produção em
série são substituídos pela flexibilização da produção, por novos padrões de
busca de produtividade, por novas formas de adequação da produção à lógica
de mercado. (ANTUNES, 2006, p. 210)
Antunes (2006) afirma que a classe trabalhadora, devido as transformações ocorridas no
mundo do trabalho, tornou-se mais heterogênea, fragmentada e complexificada. São inegáveis
as transformações no sistema produtivo, as quais transforma também a vida cotidiana dos
trabalhadores, porém isso não assegura o fim da centralidade do trabalho como organizador da
vida em sociedade, uma vez que a “classe-que-vive-do-trabalho” constitui a maioria
esmagadora da população mundial.
Jeremy Rifkin em sua obra intitulada O Fim dos Empregos, de 1995 demostra a
preocupação com o emprego em contexto mundial. Afirma que os postos de trabalho vêm
3
Expressão utilizada pelo autor Ricardo Antunes (2006) para referir-se ao sujeito que vive da venda da sua força
de trabalho.
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reduzindo cada vez mais e que “a perda de empregos nas indústrias deve-se em grande parte à
introdução das novas tecnologias economizadoras de trabalho e de tempo e à reestruturação das
novas técnicas de produção.” (RIFKIN, 1995, p. 222). A competitividade leva as empresas a
demitir seus trabalhadores e o emprego de meio período vem tomando dimensões fortes na
conjuntura analisada pelo autor.
Segundo Rifkin (1995) vivemos uma dicotomia, pois tem-se um acréscimo da
população mundial em condições de trabalho, porém as tecnologias fazem diminuir
gradativamente os postos de trabalho. Assim, uma das questões que aumentou e aumentará o
desemprego é a automação. “As máquinas estão substituindo os trabalhadores em todos os
países em desenvolvimento.” (RIFKIN, 1995, p. 227)
Os apontamentos de Rifkin (1995) são relevantes, a redução de postos de trabalho, bem
como a eliminação de algumas profissões provocada pela reestruturação produtiva é visível.
Entretanto, pode-se relativizar a tese central do autor sobre o fim dos empregos, uma vez que o
capital necessita do trabalho para obter lucro. O fim do trabalho significaria a derrocada do
capital, pois o capital sem a obtenção da mais valia não obteria o lucro, por sua vez sem ter onde
vender sua força de trabalho o trabalhador não teria condições para consumir as mercadorias
produzidas pelo capital. O trabalho alimenta o sistema capitalista. Concorda-se que,
atualmente, já existem sistemas que operam sem o trabalho humano, porém a grande maioria
ainda necessita do trabalhador, seja para o trabalho produtivo ou improdutivo, mas é valido
lembrar que ambos os trabalhos estão a serviço do sistema capitalista.
Diante das reflexões apresentadas pode-se considerar que o discurso de que atualmente
não existem mais lutas de classes, que o trabalho não possui mais significado social para
explicar as disputas e tensões existentes na sociedade vem a atender uma ideologia dominante,
a qual objetiva a manutenção do sistema vigente. Montaño e Duriguetto (2011), sobre essa
questão explica que:
Cria-se até um conjunto de conceitos supostamente ‘neutros’ que substituem
categorias críticas de análise que mostram as contradições da realidade: a
exploração é substituída pela ‘exclusão social’. A classe pelos vagos conceitos
de ‘cidadão” ou ‘povo’; a sociedade civil, como arena de lutas, pela dócil
noção de terceiro setor; as lutas de classes pela ‘ação social’ ou até pelo
enganoso neologismo de ‘empoderamento’; o processo de desmonte da
intervenção social do Estado tratando como ‘reforma do Estado’, ‘ajuste
estrutural’ ou ‘programa de estabilização’; a propriedade privada denominada
agora como ‘iniciativa privada’; dentre uma infinidade de conceitos
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ideológicos, que não visam outra coisa do que esconder os fundamentos das
reais contradições da ordem social vigente, resguardando e preservando a
desigualdade e a dominação de classe. (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011,
p. 108-9)
Visualiza-se claramente que há um contínuo movimento que objetiva desarticular e
desconstruir utopias e projetos que visem mudanças societárias, pois mascara-se ou
sobrepujam-se categorias carregadas de ideologias transformadoras que embasavam a análise
da realidade, por categorias apaziguadoras e vazias de sentido. Matos (2009) explica que as
mudanças no mundo do trabalho são elementos que não podem ser desconsiderados na análise
do perfil da classe trabalhadora, movimento que repercutem em sua organização e que em
muitas vezes essa classe não sabe como respondera essas mudanças. Mas isso não significa o
fim da classe trabalhadora, uma vez que as relações sociais ainda são fundamentalmente
marcadas pela separação entre os que vivem da venda de sua força de trabalho e os que vivem
do lucro resultante da exploração do trabalho alheio. (MATOS, 2009).
MOVIMENTO SOCIAL PELO TRABALHO: O NOVO SINDICALISMO
Ao nos reportar a discussão sobre divisão social de classe, lutas de classe e as relações
no mundo do trabalho é importante considerar as ações de embate que por muitas vezes,
conquistaram melhorias significativas para a “classe-que-vive-do-trabalho”. Ressalta-se que
por questões de tempo e espaço determo-nos a pensar o movimento do novo sindicalismo que
teve início no final da década de 1970.
Ao retomar a história dos movimentos sociais pelo trabalho, identifica-se os sindicatos
com sendo o de maior expressão. É valido lembrar que entende-se por movimento social como
sendo: “ações sociais coletivas de caráter sociopolítico e estrutural que viabilizam distintas
formas da população se organizar e expressar suas demandas.” (GOHN, 2004, p. 13). Os
movimentos sociais progressistas atuam com perspectivas emancipatória, de mudanças da atual
sociedade.
Gohn (2009) evidencia que era nas relações de trabalho que se sentia as desigualdades
na emergência do capitalismo, assim desde esse período (emergência do capitalismo) até a
metade do século XX a classe trabalhadora é o que motiva os movimentos sociais. É a partir da
década de 30, no contexto nacional, que são identificados os primeiros registros de uma
estrutura sindical corporativista, a qual era vinculada ao Estado, por meio do Ministério do
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Trabalho, da Justiça do Trabalho. Em 1943 foi aprovada a Consolidação das Leis Trabalhistas
(CLT), a qual reunia regulamentações referentes a organização sindical, previdência social,
justiça no trabalho e proteção ao trabalhador. Aqui, os sindicatos eram subordinados ao
governo, e nesse contexto, os sindicatos oficiais foram denominados de pelegos, pois
desempenhavam a função de amortecer os choques entre aos trabalhadores e os empregadores.
O termo pelego é uma referência a uma manta que fica entre o couro do cavalo e a sela de
montar, servindo para amortecer o impacto, assim pelego passou a ser utilizado para identificar
os dirigentes sindicais que se posicionavam entre os patrões e a classe trabalhadora. (MATOS,
2009)
Com o advento do golpe militar em 1964, vários sindicatos sofrem intervenções tendo
seus dirigentes presos ou cassados. Matos (2009) esclarece que nos primeiros anos que
precederam a o Golpe Militar foram criadas várias legislações autoritárias, assim como
diversos mecanismos, com o intuito de reduzir e cercear o poder de lutas dos trabalhadores. O
reflexo desse movimento foi a desmobilização sindical, a perda de direitos trabalhistas e o
aumento da exploração da classe trabalhadora.
Devido à conjuntura da ditadura militar, de perseguições e repressões, vivenciada no
Brasil, ocorreu o esvaziamento das entidades sindicais. Segundo Mattoso e Pochmann (1998, p.
220).
Ao final da década de 70 – enquanto o Brasil completava tardiamente a
estrutura industrial compatível com a segunda Revolução Industrial, com um
sui generis sistema produtivo de incorporação da organização da produção e
do trabalho do padrão produtivo fordista em meio a uma elevada concentração
de renda – entrava em crise a economia e o regime militar.
Na década de 1970, ocorreu a crise da valorização do capital, a qual foi provocada pela
"[...] fragilização do Sistema Monetário Internacional (fim da paridade ouro-dólar e
instabilidade nas taxas de juros) e do esgotamento do padrão de industrialização
norte-americano" (POCHMANN, 2000, p. 14). Matos (2009) coloca que o período que
compreende entre o golpe militar o surgimento do novo sindicalismo, a partir das greves de
1978, representado principalmente pelos metalúrgicos do ACB paulista, os sindicatos
vivenciaram conflitos, assim como os trabalhadores criaram formas de resistência à exploração
e a ditadura.
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O ano de 1978 inaugurou, com a onda de greves detonadas a partir do ABC
paulista, uma outra fase de afirmação das organizações coletivas dos
trabalhadores no cenário político e social, iniciando uma nova etapa nas
relações de trabalho e na dinâmica brasileira. (MATOS, 2009, p.103)
Nesse contexto, Matos (2009) relata que as greves do ABC paulista, as quais iniciaram
em 1978 e tinham como principal pauta de reivindicação o aumento dos salários, provocaram
abalos que culminaram na criação do Partido dos Trabalhadores (PT), bem como na criação da
Central Única dos Trabalhadores (CUT) em 1980.
Apesar de as greves, do ABC paulista, não terem sido convocada pelos sindicatos, as
ações mostravam um forte entrosamento dos trabalhadores entorno do movimento, indicava
também, um profundo descontentamento com a política salarial da ditadura militar. O sindicato
com maior representatividade e poder de negociação e que destacou-se por dar início a onda
grevista foi o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, o qual tinha como
presidente Luis Inácio Lula da Silva, uma liderança reconhecida nacionalmente. Buscava-se
naquele momento, romper com a estrutura que atrelava os sindicatos ao governo e dificultava a
realização de uma mobilização consciente dos trabalhadores. (MATOS, 2009).
Segundo Antunes (2006) o novo sindicalismo nasce no Brasil em um contexto
permeado peles seguintes fatos:
 Expressiva redução do operariado fabril e industrial devido à adoção de novas
tecnologias no sistema de produção;
 Crescente subproleterização do trabalho, por meio do trabalho precário, parcial,
temporário entre outros;
 Forte processo de terceirização do trabalho “que tanto qualifica como desqualifica e
com certeza desemprega e torna muito menos estável a condição operária.”
(ANTUNES, 2006, p. 150);
 Crescente processo de intelectualização do trabalho industrial;
Diante
de
um
contexto
visivelmente
desfavorável
aos
interesses
da
“classe-que-vive-do-trabalho” a reorganização sindical desponta como uma alternativa de
embate. Matos (2009), explica que as décadas de 1970 e 1980 foram marcadas por intensas e
volumosas greves, greves por categorias, por setores e greves nacionais marcaram a história do
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“Novo Sindicalismo”. Assim, o movimento sindical se consolida na década da 1980 como um
ator social significativo, atundo na defesa dos interesses da classe trabalhadora e da
democracia.
A explicação do crescimento dos movimentos grevistas está na reivindicação básica dos
trabalhadores, os quais buscavam reajustes salariais que repusessem as perdas provocadas pelas
altas taxas de inflação que naquela conjuntura atingiu patamares elevadíssimos. (MATOS,
2009).
Mattoso (1995) ao refletir sobre o movimento tratado aqui, enfatiza que:
Entrava na sena política e social nacional uma classe trabalhadora bastante
ampliada, diversificada e concentrada nos setores dinâmicos da acumulação e
que, não se contentava com os temas exclusivamente sindicais, reivindicavam
um “outro” desenvolvimento. (MATTOSO, 1995, p.125)
Apesar de aparentemente as reivindicações dos trabalhadores serem puramente
econômica e reivindicalista, ela passa ater demissões políticas, uma vez que vem a público
mostrar a perversidade do modelo econômico de arrocho salarial implantada pela ditadura
militar. (MATOS, 2009).
Assim, o novo sindicalismo é um movimento da classe trabalhadora que assume um
posicionamento político frente ao sistema econômico, o qual surge em função do movimento
democrático. A redemocratização do país, materializada pela aprovação da Constituição
Federal de 1988, assim como as eleições diretas para presidente, acaba por encerrar de certa
forma a “era” do novo sindicalismo no contexto nacional.
Na década de 1990 as propostas neoliberais frearam o sindicalismo brasileiro. Matos
(2009) pontua que ocorreu um refluxo nos movimentos sindicais devido a vários motivos
(redução de filiação, dificuldade de mobilização, problemas financeiros, indefinições quanto ao
posicionamento político entre outros). Segundo Antunes (2006) houve um desmonte do
sindicalismo brasileiro, pois grande parte das lideranças sindicais abandonou a perspectiva
socialista e anticapitalista, passando a atuar na manutenção da ordem vigente.
De acordo com Matos (2009), forem diversos os motivos que levaram ao desmonte a
atuação sindical na década de 1990. Entretanto, pode-se destacar três níveis de problemas, são
eles:
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A experiência dos trabalhadores com as transformações no mundo do
trabalho, decorrentes da chamada reestruturação produtiva; a permanência
dos elementos centrais da estrutura sindical corporativista (o sindicato único,
o poder normativo, o imposto...) e as opções políticas das lideranças da CUT
em um quadro marcado pelos condicionantes relacionados aos dois níveis
anteriores. (MATOS, 2009, p. 126)
O processo de reestruturação produtiva vivenciada a partir da década de 1990 trouxe
impactos negativos sobre o sindicalismo, pois diversas manobras foram tomadas para dificultar
a atuação sindical como: transferências de unidades de produção para locais de menor atuação
sindical; propostas de “trabalho participativo”; desregulamentação do mercado de trabalho;
encolhimento de setores tradicionais vinculados ao sindicalismo operário, resultando na
fragmentação das organizações sindicais. (MATOS, 2009).
Gohn (2004) ao pensar os movimentos sociais relata que é possível observa que após a
virada do milênio o perfil dos movimentos sociais alterou-se, pois a conjuntura política também
foi modificada. Ao longo da década de 1990, os movimentos sociais em geral, abandonaram
algumas propostas e passaram atuar de forma mais propositiva, atuando em rede e em parcerias
com outros atores sociais.
Pode-se observar que ocorreu um enfraquecimento significativo na atuação sindical,
provocado pela introdução de ideais neoliberais. Segundo Antunes (2006) vivemos uma crise
global dos sindicalismos. Crise provocada por fatores que afetam o mundo todo. Seguindo a
linha de pensamento do autor já citado, as seguintes questões são fatores que favorecem essa
crise: a) uma crescente individualização das relações de trabalho, as ações não são mais
pensadas no âmbito coletivo, mais sim no âmbito individual; b) um movimento contínuo de
desregulamentação e flexibilização das do mercado de trabalho; c) desmonte e esgotamento do
modelo sindical até então vigente.
Conforme Antunes (2006), um dos fatores que contribuem para o enfraquecimento do
movimento sindical é a incapacidade dos sindicatos de incluírem em seus movimentos os
trabalhadores da economia informal, trabalhadores parciais, precários e terceirizados. Uma vez
que a estrutura sindical tem heranças verticais, vinculadas a categorias específicas,
desconsiderando o processo de heterogenização do mundo do trabalho. Essa dificuldade aliado
aos fatores de reestruturação produtiva já mencionados, acaba por enfraquecer o sindicalismo,
pois o mesmo vem mostrando-se incapaz de adotar práticas horizontalizadas que contemplem
as diversas modalidades de trabalho.
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Outra questão pontuada por Antunes (2006) é que o corporativismo que objetiva a
defesa de interesses de categorias específicas, enfraquece a luta pela perspectiva classista, “um
corporativismo societal, excludente, parcializador e que preserva e mesmo intensifica o caráter
fragmentado e heterogêneo da classe trabalhadora”. (ANTUNES, 2006, p. 68). Outro fator que
contribui para o enfraquecimento dos sindicatos é que o principal espaço de atuação das
relações de trabalho foi transferido para os espaços de atividades e empresas locais, individuais
e personalizadas saindo do cenário público e nacional. (ANTUNES, 2006).
Diante das questões apontadas, Antunes (2006) coloca que o sindicalismo tem um
desafio urgente, o desafio de efetivar uma ação sindical que possibilite respostas para as
demandas imediatas do mundo do trabalho e ao mesmo tempo não perder de vista o ideário de
uma estratégia anticapitalista e socialista.
Ao abordar os movimentos de lutas com ideários de mudanças societárias, Montaño e
Duriguetto (2011) explicam que a consciência sindical não visa questionar o sistema vigente,
mas sim reivindicar melhores condições para a venda e a compra no mercado da força produtiva
do trabalhador, sendo assim:
A consciência sindical promove a ‘luta sindical’, uma luta que, sem
ultrapassar o plano reivindicativo, torna-se claramente reformista; isto é, sem
conseguir desvendar e compreender as leis que governam o MPC, a luta
sindical visa, na prevenção da ordem social, sua lógica e fundamentos, às
alterações nas condições e compra e venda de força de trabalho; visa a
melhores condições para a exploração da força de trabalho, não sua superação.
(MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011, p.103)
Nesse viés, as lutas sindicais são lutas econômicas, as quais visam melhorar as
condições de compra e venda do trabalho no mercado capitalista. Sem desconsiderar seu grau
de importância, ela não questiona o sistema vigente, serve em sua essência para amenizar a
exploração dos trabalhadores pelos donos dos meios de produção. Entretanto, as lutas sindicais
podem ser um momento de coalizão dos trabalhadores para posteriormente transformar em luta
política, a qual visa uma mudança societária. A coalizão entre os trabalhadores pode ocorrer em
dois momentos, o primeiro é o sindicato, o qual está vinculado ao espaço de trabalho, o segundo
é o partido político sendo esse externo ao ambiente de trabalho. (MONTAÑO; DURIGUETTO,
2011).
Nessa linha de pensamento, os movimentos sindicais, apesar de, em sua essência não
objetivarem mudanças no modelo econômico, os mesmos são um momento necessário para que
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os trabalhadores possam unir-se e alcançar a consciência de classe e com isso iniciar um
movimento revolucionário.
A ‘consciência sindical’ é aquela que atinge com máximo um nível
reivindicatório, e se desenvolve no trabalhador organizado em sindicatos, sem
dispor de conhecimento cientifico e crítico da realidade social. Forma-se aqui
a consciência-em-si, como superação parcial da alienação. A
consciência-em-si desenvolve uma crítica imediata, vivencial, espontânea a
partir da experiência direta dos sujeitos, sem conseguir desvendar as leis da
ordem do capital. (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011, p. 103)
A transposição da consciência sindical, reivindicatória para uma consciência de
totalidade se dá pelo processo que Marx denominou de transição da “classe em si” à “classe
para si”, ou seja a passagem da consciência sindical para a consciência política. (MONTAÑO;
DURIGUETTO, 2011). Esse processo instrumentará a classe trabalhadora possibilitando uma
visão totalitária e dialética, a qual criará as condicionalidades necessárias para estabelecer uma
luta verdadeiramente revolucionária.
Ao refletir sobre as questões pontuadas referentes ao processo do novo sindicalismo, a
trajetória as lutas e a mobilização social, pode-se considerar que o novo sindicalismo
representou um movimento importantíssimo na luta contra a exploração exacerbada do capital
em relação à classe que vive da venda de sua força produtiva. Contudo, esse movimento acabou
por sucumbir-se diante das propostas neoliberais, seguido a linha de pensamentos de Montaño e
Duriguetto (2011), os quais apoia-se em Marx, é possível dizer, sem desconsiderar a
importância do movimento do novo sindicalismo na conquista de melhorias para os
trabalhadores, que por se tratar de um movimento sindical reivindicatório o mesmo não
conseguiu ultrapassar a consciência de “classe em si”, não atingindo a consciência de “classe
para si”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos pontos abordados no presente trabalho sobre lutas de classes, centralidade do
trabalho e movimento social pelo trabalho pode-se pontuar algumas considerações.
Primeiramente, reconhece-se que a constituição da atual sociedade não pode ser pensada de
forma aleatória, uma vez que as classes que a compõe complexificou-se, tornando-se mais
diversificada e heterogênea. Entretanto, concorda-se com a afirmação de Montaño e Duriguetto
(2011), que a heterogeneidade das formas do capital aferir lucros e acumular riqueza não deixe
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de expressar a característica estruturante do capitalismo ainda presente nas relações sociais que
é a apropriação da riqueza advinda do trabalho alheio.
Seguindo essa perspectiva teoria concorda-se que ao se tratar de mudanças societária a
“classe-que-vive-do-trabalho” ainda é potencialmente a única capaz de realizar a revolução.
Todas essas propostas de sujeitos, alternativos (ou substitutivos) à classe
trabalhadora, remetem a um debate polêmico, controvertido, e ainda em aberto.
Por enquanto, se trata de transformar o MPC, ficamos com a “classe
trabalhadora” (particularmente operária) como sujeito por excelência
potencialmente revolucionário, que pode e precisa se articular à pluralidade de
setores e grupos sociais de alguma forma oprimidos, subalternizados,
discriminados. (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011, p. 130)
No que tange a centralidade da categoria trabalho, é possível considerar que esta ainda
ocupa um lugar de destaque quando se objetiva entender as relações e contradições existente na
sociedade. Defende-se que o trabalho ainda constitui-se uma categoria fundamental para
explicar a sociedade, uma vez que ainda é possível dizer que vivemos na sociedade do trabalho,
claro que não desconsidera-se as mudanças ocorridas no mundo do trabalho, mas que a
“classe-que-vive-do-trabalho” ainda é composta pela maioria população do planeta.
(ANTUNES, 2006).
Quanto aos movimentos sindicais pelo trabalho, esses são de estrema importância, uma
vez que atuam no tencionamento das relações de exploração, reivindicando melhores condições
de trabalho. Entretanto, faz-se necessário a transposição da consciência sindical, a qual ainda
não questiona o sistema vigente, para a consciência revolucionária, que objetiva uma mudança
estrutural, questionando o sistema capitalista e propondo novas alternativas de enfrentamento e
superação desse sistema.
Entende-se que esse processo de superação de uma consciência para outra é oneroso e
demorado, ainda mais considerando que o mesmo exige uma participação efetiva dos
movimentos sociais, os quais atualmente encontram-se segmentados por setores e despossuídos
de projetos societários. Junto a esses fatores, acrescenta-se a dificuldade de participação da
população, cultura não construída ainda em nosso país, isso se deve a questão de que
constitucionalmente tem-se o direito de participar a 26 anos contra 488 anos em que o direito a
participação não era garantido, onde não havia espaços formais para a participação social.
Portanto, a sociedade civil deve instrumentalizar-se e intelectualizar-se para a construção de
uma nova cultura de participação democrática.
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Ao termino do presente trabalho, verifica-se que o mesmo possibilitou desvelar
criticamente, mesmo que em pequenas proporções, a atual configuração da sociedade que é
imbricada de contradições.
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