Artigo Original
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Oclusão Percutânea Transvenosa de Comunicação Interatrial
Mediante Utilização do Buttoned Device
Jorge Haddad, Antonio Secches, Luiz Finzi, Hernando Nazzetta, Mauro Wanderley, Rogério Wanderley,
Maeve Correa, João Freitas, Luiz Kajita, Sandra Carvalho, Costantino Constantini, Jorge Arévalo, Elephterious
Sideris
Ribeirão Preto, SP
Objetivo - Analisar os resultados obtidos com a técnica de oclusão percutânea transvenosa de comunicação
interatrial (CIA), mediante prótese de Sideris.
Métodos - Foram realizados 36 procedimentos de
oclusão percutânea transvenosa de CIA em 32 pacientes;
27 (84,4%) do sexo feminino e cinco (15,6%) do masculino, idade média de 16 (4 - 61) anos. Os critérios de inclusão foram defeito septal atrial com repercussão clínicohemodinâmica, localizado na fossa oval, com diâmetro
<31mm e comprometendo menos que 50% da longitude do
septo interatrial. Em 28 (87,5%) pacientes foram utilizadas próteses do modelo básico e, em quatro (12,5%),
próteses do modelo autocentrável. Em 15 (41,7%) procedimentos utilizou-se a técnica de implante direto da
prótese e em 21 (58,3%) a técnica over a wire. A seleção do
tamanho da prótese foi de acordo com o diâmetro da CIA
segundo normograma de Sideris.
Resultados - Em 29 (90,63%) pacientes obteve-se
oclusão da comunicação. Em dois (6,25%), o posicionamento da prótese foi considerado inadequado e, em um
(3,12%), houve embolização da mesma para artéria pulmonar, sendo, nos três casos, retirada durante a correção
cirúrgica do defeito. Não houve morbi-mortalidade. Shunt
residual mínimo ou pequeno foi detectado com mapeamento de fluxo em cores em 3 (9,4%) pacientes, imediatamente após o procedimento. Dos 22 doentes com seguimento
>12 meses observou-se mínimo shunt residual em apenas
um (4,5%). Alteração estrutural da prótese foi detectada
em um durante o seguimento, porém, sem alterações clínico-hemodinâmicas e com oclusão total do defeito.
Conclusão - A oclusão percutânea transvenosa com
prótese de Sideris é um método seguro e eficaz no tratamento de casos selecionados de CIA. A incidência de shunt
residual, relativamente elevada imediatamente após o procedimento, diminui ou desaparece durante o período de seguimento e o mesmo, quando existente, é de pequena magnitude e não impede a normalização dos parâmetros clínico-hemodinâmicos.
Palavras-chave: cardiologia pediátrica, comunicação
interatrial, cateterismo cardíaco
Hospital do Coração de Ribeirão Preto
Correspondência: Jorge Haddad - Rua Marcondes Salgado, 1058/42 - 14010-150 Ribeirão Preto, SP
Recebido para publicação em 4/12/95
Aceito em 13/3/96
Atrial Septal Defect Percutaneous
Transvenous Occlusion With the Buttoned
Device
Purpose - To analyse the experience with the use of
Sideris’ device for percutaneous transvenous occlusion of
atrial septal defect (ASD).
Methods - Thirty six procedures of ASD occlusion
were performed in 32 patients; 27 (84,4%) female and five
(15.6%) male, mean age of 16 years (4 - 61). All patients
had secundum atrial septal defects with clinical and
hemodynamic compromise. The ASD diameter measured
<31mm and occupied less than 50% of the septal length in
all cases. The basic device was used in 28 (87.5%) patients
and the self centered model in four (12.5%). The direct implant technique was employed in 15 (41.7%) procedures
while in the other 21 (58.3%) an over a wire technique was
used. The size of the device was selected according with the
Sideris’ normogram.
Results - Occlusion of the defect was achieved in 29
patients (90.63%). In two (6.25%) the position of the device
was not adequate and in one (3.12%) the device embolized
to the pulmonary artery. In these three cases the device was
removed surgically during the defect closure. There was
neither morbidity nor mortality in this series. Trivial or
small residual shunt was detected with color flow mapping
in three (9.4%) patients immediately after the procedure. In
22 patients with 12 months follow-up, trivial residual shunt
was present in only one (4.5%). Structural modification of
the device was detected in one patient, however with completeASD occlusion and neither clinical nor hemodynamic
disturbance.
Conclusion - The Sideris’ device is safe and efficient
for ASD occlusion in selected patients. Although there is a
relatively high incidence of residual shunt immediately after the procedure, the shunt itself tends to become smaller
or disappear during the follow-up and it does not preclude
clinical and hemodynamic improvement.
Key-words: pediatric cardiology, atrial septal defect,
cardiac catheterization
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Haddad e col
Oclusão percutânea transvenosa de CIA
Arq Bras Cardiol
volume 67, (nº 1), 1996
A oclusão de comunicação interatrial (CIA) por
cateterismo foi inicialmente descrita por King e Mills em
1974 1,3 e, posteriormente, por Rashkind e col 3,4, e Rome e
col 5, entretanto, diversas dificuldades e complicações evitaram uma ampla difusão da técnica. O avanço da cardiologia intervencionista na última década e o auxílio da
ecodopplercardiografia têm renovado o interesse pela
oclusão percutânea de defeitos cardíacos como técnica alternativa à cirurgia cardíaca.
O buttoned device, idealizado por Sideris e col 6,7 ,
permite a oclusão percutânea transvenosa de CIA,
interventriculares e canais arteriais persistentes e tem sido
utilizado clinicamente em mais de 400 pacientes nos diversos serviços que participam do International Trial.
O objetivo deste trabalho é analisar a experiência acumulada em 40 meses de aplicação da técnica, em portadores de CIA.
Fig. 1 - Modelo básico dobuttoned device. CO- contra-oclusor; OC- oclusor; SL- sistema de liberação.
Métodos
No período de dezembro/91 a maio/95, 36 procedimentos de oclusão percutânea foram realizados em 32 pacientes, 27 (84,4%) do sexo feminino e cinco (15,6%) do
masculino, com idade média de 16 (4 - 61) anos. Apresentavam idade <12 anos 23 (71,9%) pacientes, encontravamse entre 13 e 18 anos, cinco (15,6%), e quatro (12,5% eram
adultos. Os critérios de inclusão foram: 1) portadores de
CIA tipo óstium secundum com repercussão clínica e
hemodinâmica significativa, isto é, sintomatologia compatível com sobrecarga de câmaras ou diminuição do débito
sistêmico, desdobramento fixo da 2ª bulha, sopro sistólico
ejetivo em área pulmonar, ruflar diastólico em área tricuspídea, aumento da dimensão ventricular direita e movimento paradoxal do septo interventricular no
ecocardiograma e relação QP/QS >1,7 no estudo
hemodinâmico; 2) defeito septal interatrial tipo óstium
secundum com diâmetro <31mm e <50% da longitude do
septo interatrial e com a presença de bordas superior e inferior, ausência de extensão à cava superior ou inferior ou
outras anomalias congênitas cardíacas com indicação de
correção cirúrgica.
O buttoned device, previamente descrito na literatura
6,7
, é composto por um oclusor, um contra-oclusor e um sistema de liberação. Existem dois modelos para oclusão da
CIA, o básico (fig. 1), que pode ser implantado em forma di-
Tabela I - Normograma para seleção da prótese - modelo básico
CIA (mm)
Prótese (mm)
Sheath (French)
<10
11 - 12
13 - 15
16 - 20
21 - 22
23 - 25
25
30
35
40
45
50
8
8
8
8
9
9
Fig. 2 - Modelo autocentrável dobuttoned device. SC- sistema de autocentralização ativado. O oclusor em conjunto com o contra-oclusor apresentam uma imagem similar a um
pára-quedas; BT-buttoned. Após abotoadura o sistema de centralização forma uma
imagem de duplo oito.
reta ou over a wire e o modelo autocentrável (fig. 2), indicado em grandes comunicações 8. O modelo básico foi utilizado em 28 casos e o autocentrável em quatro. Neste último o contra-oclusor atua como mecanismo de centralização durante o posicionamento da prótese, adquirindo, em
conjunto com o oclusor, morfologia semelhante a um páraquedas. Após a abotoadura, forma um duplo oito na face direita do septo interatrial. As próteses foram selecionadas de
acordo com diâmetro do defeito, medido com cateter balão,
Tabela II - Normograma para seleção da prótese - modelo
autocentrável
CIA (mm)
CIA- comunicação interatrial; mm- milímetros
Prótese (mm)
Sheath (French)
<24
45
11
25 - 27
50
11
28 - 29
55
11
30 - 32
60
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CIA- comunicação interatrial; mm- milímetros
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seguindo normograma previamente estabelecido (tab. I e
II). Foram utilizadas próteses de 35 a 50mm de diâmetro do
modelo básico, e 50 e 60mm de diâmetro do modelo autocentrável.
Todos os pacientes foram previamente estudados com
ecodopplercadiograma por via transtorácica e/ou transesofágica. O diâmetro da CIA e a dimensão das bordas superior e inferior foram determinados em diversos planos. A
dimensão do ventrículo direito (VD) e a movimentação do
septo interventricular foi determinada no modo M. A presença de shunt ao nível da comunicação foi confirmada por
Doppler pulsado e mapeamento do fluxo em cores. O estudo
foi realizado por via transesofágica nas seguintes situações:
1) avaliação pré-procedimento - quatro (8%) pacientes, nos
quais o estudo transtorácico foi considerado insatisfatório;
2) avaliação intra procedimento - 12 (40%) pacientes, segundo disponibilidade do equipamento na sala de
hemodinâmica, idade e peso do paciente e condições técnicas consideradas adequadas; 3) no período de seguimento
- dois (6,7%), nos quais a existência e quantificação de
shunt residual não foi conclusivamente determinada pelo
estudo convencional.
Foi realizado estudo hemodinâmico completo e determinado o tamanho da CIA por cateter balão, segundo técnica de King e col 9, com controle ecocardiográfico simultâneo (fig. 3).
Todos os pacientes receberam três doses de cefalexina
(50mg/kg/dia) com intervalo de 6h, iniciando-se a série na
sala de hemodinâmica. Aspirina 5-10mg/kg/dia por via
Fig. 3 - Determinação do diâmetro da CIA mediante cateter balão com controle
ecodopplercardiográfico simultâneo. A e B) imagens radiológicas do cateter balão; em
A) insuflado no átrio esquerdo (AE) e no momento da determinação do stretched
diameter e em B) observa-se o entalhe do balão ao nível do septo interatrial durante a
passagem do átrio esquerdo para átrio direito (AD); C e D) determinação do diâmetro da
comunicação interatrial (CIA) com cateter balão com controle ecocardiográfico do defeito (C) e da oclusão do mesmo com cateter balão (D). O mapeamento de fluxo em cores
demonstra ausência de shunt durante a oclusão temporária. R- referência radiológica.
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oral foi mantida por oito semanas a partir do 1º dia pós implantação da prótese.
Os controles clínicos, radiológicos e ecocardiográficos
pós procedimento foram realizados no 1º dia, um mês, seis
meses e, a seguir, anualmente.
O procedimento de oclusão (fig. 4) foi: 1) por via
transvenosa femoral percutânea, cateterizando-se o átrio
esquerdo (AE) e a veia pulmonar superior esquerda através
da CIA; 2) mediante utilização de guia metálico
intercambiável, é introduzido um long sheath de oito a 11
French de diâmetro, de acordo com a prótese utilizada (tab.
I e II); 3) um guia metálico 0,018 é posicionado na veia pulmonar superior esquerda; 4) flexionando-se as hastes do
oclusor, este adquire uma configuração cilíndrica que permite introduzí-lo no sheath. O oclusor é introduzido sobre
o guia metálico 0,018", previamente posicionado na veia
pulmonar superior esquerda (técnica over a wire). Esta
modificação técnica, utilizada a partir de 1993, confere
maior estabilidade ao oclusor durante todo o procedimento e permite uma melhor centralização, ao nível do defeito,
que a obtida com a técnica de implante direto; 5) mediante auxílio de um cateter especial, o oclusor é conduzido até
o AE, onde readquire a forma romboidal; 6) após o
posicionamento do oclusor, na face esquerda do septo
interatrial, o sheath é deslocado até a parte inferior do átrio
direito (AD) próximo ao orifício da veia cava inferior; 7) o
guia de liberação é passado através da válvula de látex do
contra-oclusor e o mesmo é introduzido no sheath, sendo
conduzido até o AD com o cateter auxiliar; 8) mediante
movimentos opostos e simultâneos do sheath e do guia de
liberação, empurra-se o primeiro e traciona-se o segundo,
o contra-oclusor é ancorado na face direita do septo e, ao
mesmo tempo, abotoa-se o loop do oclusor na válvula de
látex do contra-oclusor, fixando-se a prótese; 9) confirmado
o adequado posicionamento da prótese retira-se o guia
0,018. Corta-se e retira-se o guia de liberação, liberando-se
Fig. 4 - Esquema de utilização do modelo básico dobuttoned device. A) diagrama do
oclusor expandido e com as hastes flexionadas; B) diagrama do contra-oclusor livre e no
interior do sheath com o guia de liberação através da válvula de látex; C) diagrama da
abotoadura de ambos os componentes da prótese. O botão do oclusor é passado através
da válvula de látex do contra-oclusor. A prótese permanece fixada à guia de liberação
mediante a alça de fio de nylon; D) diagrama da liberação da prótese. O guia de liberação é cortado no extremo que permanece fora dosheath, sendo retirado tracionando-se
sobre os fios de nylon. A alça do fio de nylon é retirada tracionando-se um dos extremos
da mesma, liberando-se a prótese. AD- átrio direito; AE- átrio esquerdo; BT- button;
COC- contra-oclusor; FN- fio de nylon; GL- guia de liberação; OC- oclusor; SH- sheath;
SIA- septo interatrial; VL- válvula de látex.
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a prótese ao se tracionar um dos extremos da alça de fio de
nylon. Um esquema da utilização dos diferentes elementos da prótese é ilustrado na figura 3; 10) quando a prótese
utilizada é do modelo autocentrável oclusor e contraoclusor são introduzidos em conjunto. Posicionada a
prótese no AE, o mecanismo de autrocentralização é ativado, o oclusor ancora-se na face esquerda do septo e se
realiza a abotoadura e liberação da prótese da forma já
descrita.
O procedimento foi realizado por implante direto da
prótese nos primeiros 15 (41,7%) procedimentos e pela técnica over a wire nos últimos 21 (58,3%).
Resultados
Obteve-se sucesso em 29 (90,63%) pacientes, nos
quais a prótese foi liberada e o defeito ocluído (fig. 5,6).
Em quatro pacientes em que a técnica utilizada foi de implante direto, devido ao deslocamento do oclusor para o
AD, durante as manobras de centralização ou de introdução do contra-oclusor, o mesmo foi retirado por via
percutânea e uma nova prótese implantada com sucesso
em um 2º procedimento.
Em 2 (6,25%) pacientes, não foi possível ancorar a
prótese no septo interatrial devido a deficiência da borda superior da comunicação, em um caso, e da borda inferior, em
outro. Em um (3,12%) paciente houve embolização da prótese para artéria pulmonar após seu posicionamento inade-
Fig. 5 - Oclusão de CIA. A) injeção em veia pulmonar superior direita demonstrando CIA
ampla; B) determinação do tamanho da CIA com cateter balão (23 mm); C-D) imagem
radiológica da prótese implantada ocluindo a CIA em OAE e OAD, respectivamente. As
estrelas marcam as extremidades do oclusor. A seta indica a marca radiopaca dobutton
do lado direito do contra-oclusor demonstrando a abotoadura dos componentes. CIAcomunicação interatrial; OAD- oblíqua anterior direita; OAE- oblíqua anterior esquerda.
Fig. 6 - Oclusão de CIA. Estudo ecocardiográfico transesofágico peri-procedimento. A)
observa-se defeito septal interatrial grande; B) prótese implantada ocluindo a CIA; C)
mapeamento de fluxo a cores revelando ausência de shunt. AD- átrio direito; AE- átrio
esquerdo.
quado. No procedimento cirúrgico de correção do defeito,
retirou-se a prótese mediante pequena arteriotomia pulmonar. Neste caso, a presença de extensão da comunicação à
cava inferior, não observada no ecocardiograma prévio, determinou a impossibilidade de fixação da prótese no septo
interatrial.
Não houve, em nossa casuística, morbi-mortalidade e
nos últimos 18 pacientes o índice de sucesso foi de 100%.
O mapeamento de fluxo em cores demonstrou shunt
residual imediatamente após o procedimento em três
(9,4%) casos. O mesmo foi quantificado segundo o protocolo internacional do buttoned device 11 (tab. III), de acordo com a magnitude e repercussão hemodinâmica. A incidência e magnitude do shunt residual diminuiu progressivamente durante o seguimento (fig. 7), estando presente em
apenas 4,5% dos 22 pacientes com seguimento >um ano.
No estudo ecocardiográfico pré-procedimento o diâmetro do VD era superior ao valor máximo normal e o septo
Fig. 7 - O gráfico ilustra a incidência e magnitude de shunt residual durante a evolução
em 22 pacientes com 12 meses de seguimento.
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Tabela III - Quantificação do shunt residual após oclusão de CIA com prótese
Shunt
Eco bidimensional
Ausente
Mínimo
Pequeno
Moderado
Grande
MFC
Defeito
SVD
Não visível
Não visível
Não visível
Visível
Visível
Ausente
Ausente
Ausente
Ausente/Presente
Presente
Ausência de shunt
Jato <1mm na origem
Jato 1 - 2mm na origem
Jato >2mm na origem
Jato largo ou múltiplo
CIA- comunicação interatrial; ECO- ecocardiograma; MFC- mapeamento do fluxo a cores; SVD- sobrecarga ventricular direita.
interventricular apresentava movimentação paradoxal nos
32 pacientes. O aumento do diâmetro ventricular direito era
de até 25% do valor máximo em sete (21,9%) casos, entre
25% e 50% em 14 (43,7%) e >50% em 11 (34,4%). Nos 22
pacientes com seguimento >12 meses houve normalização
do diâmetro do VD, exceto em uma paciente adulta (61
anos) na qual observou-se redução do diâmetro ventricular,
porém, permanecendo acima do valor máximo normal,
apesar da oclusão completa do defeito.
Uma paciente, durante o 2º ano de seguimento, apresentou uma gravidez que cursou sem intercorrências e culminou com parto normal. No controle radiológico aos 24
meses de evolução, observou-se migração do núcleo central
do contra-oclusor que encontrava-se alojado na junção da
cava inferior com o AD. O oclusor e o componente não metálico do contra-oclusor permaneciam posicionados no
septo interatrial e o defeito totalmente ocluído. Realizados
exames radiológicos semanais durante um mês, não se observou modificação da posição do componente metálico do
contra-oclusor, decidindo-se manter conduta conservadora.
Nas restantes 31 próteses não houve alterações estruturais.
Discussão
A correção cirúrgica da CIA constitui um método terapêutico eficaz e com baixa mortalidade (<1%). Entretanto,
a morbidade, a cicatriz residual e o desconforto decorrentes do procedimento cirúrgico são desvantagens que poderiam ser evitadas pela correção do defeito por cateterismo
cardíaco. O procedimento de oclusão por prótese deve apresentar morbi-mortalidade menor e eficácia semelhante à cirurgia, para constituir o tratamento de eleição na correção
do defeito septal atrial.
Atualmente, são passíveis de correção por cateterismo
defeitos do tipo óstium secundum cêntricos, e sem extensões às cavas superior ou inferior e com bordas de dimensões suficientes para permitir ancorar a prótese na superfície
septal 10. O diâmetro da comunicação é uma das limitações
do método, podendo ser ocluídos defeitos <31mm e inferiores a 50% da longitude do septo interatrial, devido à necessidade de utilizar uma prótese com diâmetro pelo menos
duas vezes maior que o da comunicação. Os defeitos com
estas características constituem aproximadamente 50% das
comunicações localizadas na fossa oval.
A determinação ecocardiográfica da localização e
morfologia do defeito e da presença e dimensões das bordas
da comunicação permitem selecionar os casos com alto índice de sucesso. Em nossa casuística, a existência de bordas
deficientes em dois casos, e de extensão a cava inferior em
um paciente, foram determinantes do insucesso na primeira
circunstância e complicação na segunda. A avaliação com
mapeamento do fluxo a cores da oclusão temporária com
cateter balão permite excluir defeitos secundários e/ou extensões a veia cava superior ou inferior.
A técnica over a wire, modificação introduzida em
1993, confere ao oclusor maior estabilidade durante o procedimento e facilita uma centralização adequada ao nível
da CIA quando comparada com a técnica de implante direto. Nos quatro pacientes nos quais o oclusor foi retirado via
percutânea, e o defeito ocluído em um segundo procedimento, houve deslocamento do oclusor para o AD durante
as manobras de centralização ou de introdução do contraoclusor. Estes quatro procedimentos foram realizados nos
dois primeiros anos de nossa experiência pela técnica de
implante direto. Acreditamos que, nos quatro casos, a modificação técnica mencionada evitaria o deslocamento do
oclusor permitindo sucesso no 1º procedimento.
O shunt residual é relativamente freqüente após a
oclusão de defeitos cardíacos com prótese, entretanto, tende
a diminuir ou desaparecer durante o seguimento 11-15. A avaliação com ecocardiografia demonstrou shunt residual mínimo ou pequeno em três (9,4%) pacientes imediatamente após a oclusão. A incidência e magnitude do shunt residual diminuíram progressivamente durante o seguimento,
e dos 22 doentes com evolução >12 meses, o mesmo foi detectado em apenas um (4,5%), sendo de grau mínimo. A
normalização da sobrecarga de volume é indicativa de um
tratamento eficaz, motivo pelo qual achamos que, em todos
os casos, a oclusão foi clinicamente eficiente. A incidência
de shunt residual em nossa casuística, é favorável quando
comparada com a do Clamshell International Trial 16 que
apresenta 33% de shunt residual imediatamente após o procedimento. Outrossim, estudos com mapeamento do fluxo
a cores após correção cirúrgica demonstraram shunt residual em 7,4% e 15,4% dos casos 17,18.
Possíveis alterações estruturais da prótese devem ser
exaustivamente pesquisadas durante o seguimento. As fraturas das hastes da prótese que foram observadas com o
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Clamshell, determinaram a retirada da prótese dos estudos
internacionais 16,19 e a introdução de modificações estruturais da mesma. Acredita-se que a resistência das articulações da estrutura metálica resultou insuficiente ao ser submetida ao movimento decorrente do batimento cardíaco. O
buttoned device não apresenta estruturas articuladas, entretanto, três pacientes na experiência internacional, um deles na presente série, apresentaram distorções do núcleo
metálico da prótese. A distorção foi registrada em próteses
produzidas no final de 1992; detectado o defeito, foi corrigido, não observando-se alterações estruturais nas próteses
posteriormente utilizadas. Na paciente de nossa casuística,
a embolização do núcleo metálico do contra-oclusor à junção da cava inferior com AD, não apresentava alterações
clínicas, hematológicas ou hemodinâmicas e não houve migração posterior do núcleo. Manteve-se conduta conservadora e, após 12 meses de evolução, a paciente continua
assintomática sem modificações no aspecto radiológico.
Os elementos que constituem a prótese, poliuretano,
aço inox e fios de nylon têm sido amplamente utilizados em
diversas especialidades médicas não havendo relatos de
rejeição ou outros efeitos indesejáveis.
Os estudos experimentais 6 demonstram a completa
endotelização da prótese entre a 8ª e 12ª semana após o implante. A profilaxia da endocardite infecciosa (EI) é realizada durante os primeiros três meses de seguimento, mantendo-se posteriormente nos casos com shunt residual. De-
monstração experimental de completa endotelização da
prótese, ainda na presença de defeitos residuais, possibilitará suspender a profilaxia da EI neste casos. Na experiência internacional com o buttoned device não se verificou
nenhum caso de EI ainda na presença de defeitos residuais.
A ausência de insucesso e complicações nos últimos
18 pacientes, é atribuída, por nós, a uma maior experiência
tanto na seleção dos pacientes quanto na técnica de utilização da prótese.
O custo de qualquer procedimento intervencionista
constitui uma preocupação justificada, devido a limitação
dos recursos da saúde e a condição sócio-econômica de
grande parte da população. O procedimento descrito acrescenta ao gasto normal de um cateterismo cardíaco, o custo
da prótese, que representa 25% a 50% de uma endoprótese
vascular coronária (stent). Comparada à cirurgia, a oclusão
percutânea requer uma internação mínima (um dia), sem
precisar cuidados intensivos pós-procedimento. A oclusão
percutânea transvenosa da CIA apresenta custo menor que
o tratamento cirúrgico e constitui um procedimento intervencionista relativamente econômico.
De acordo com os resultados obtidos, concluímos que
o buttoned device é uma prótese estável, segura e eficiente
no tratamento de CIA tipo óstium secundum e constitui
uma alternativa ao tratamento cirúrgico.
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Oclusão Percutânea Transvenosa de Comunicação Interatrial