Homilia no Congresso Fátima para o Século XXI
Maria, templo do Senhor, ícone do Mistério
† António Marto
Santuário de Fátima
11 de Outubro de 2007
Caros irmãos bispos, sacerdotes, diáconos e demais fiéis em Cristo: Como compreendeis, este dia foi um dia de azáfama para o bispo de Leiria-­‐Fátima e por isso, não pude acompanhar o nosso Congresso. Todavia, foi-­‐me dada a graça de poder estar aqui convosco a celebrar esta Eucaristia e de poder oferecer-­‐vos também uma meditação que espero seja breve, deixando-­‐nos inspirar, naturalmente, por toda a liturgia e toda a palavra de Deus que acabámos de escutar. Nas vésperas da celebração da dedicação da nova Igreja da Santíssima Trindade, a liturgia eucarística que celebramos convida-­‐nos a contemplar Maria, templo do Senhor para de algum modo já prepararmos a vivência da celebração de amanhã. Contemplaremos melhor este traço de Maria, Mãe de Jesus, templo do Senhor, se a considerarmos como um ícone do mistério. Um ícone -­‐ vós conheceis os ícones orientais -­‐, um ícone, no seu fragmento, remete para a totalidade do mistério de Deus connosco na sua aliança e, ao mesmo tempo, reflecte esse mistério para nós. Maria é totalmente remetida ao mistério de Deus e a nós, Igreja de Deus. Este ícone de Maria, Templo de Deus, só o contemplaremos em profundidade se o pusermos em paralelo com o outro ícone que a liturgia de hoje nos oferece na primeira leitura do Livro dos Reis: a festividade, a grande festa da entronização da Arca da Aliança no Templo de Salomão. Portanto, vamos contemplar um díptico: as duas telas. O templo de Salomão A entronização da Arca, no templo de Salomão, foi uma festa para todo o povo porque este Templo construído por Salomão foi um momento culminante duma história que tinha começado com uma promessa de Deus no Sinai: Far-­‐me-­‐ão um Santuário e eu habitarei no meio deles (Ex 25, 8). Por conseguinte, o povo vibra com a entronização da Arca porque o templo encerra toda uma história; a história do êxodo. 1/4
A história de um povo que se foi constituindo como tal à volta da Aliança de Deus com ele e de que é memorial itinerante a Arca da Aliança, que continha as Tábuas da Aliança; É também a história de um caminho, guiado por Deus, presente e acompanhante, de que é símbolo a nuvem que, ao mesmo tempo, oculta e revela; E é também a história de uma revelação de que a “glória de Deus”, que enche o Templo, é o sinal luminoso, a luz, o esplendor da beleza e da santidade de Deus, que brilha no rosto de quem O encontrou. Santa Maria, Templo do Senhor, do Altíssimo Tendo este ícone como pano de fundo, compreendemos melhor Maria Templo do Senhor, tal como nos é apresentado neste mistério único, inaudito e inimaginável da encarnação: Deus connosco, no coração e no seio de Maria. É interessante ver como S. Lucas, para falar da vinda do Espírito Santo sobre Maria, usa a expressão “cobrir com a Sua sombra”, aludindo, exactamente, a estas narrações do Antigo Testamento sobre a “nuvem sagrada”: tal como a nuvem paira sobre o Templo e é sinal de que o interior do templo está cheio da glória, da presença da santidade e da luz do Altíssimo, assim também o poder do Altíssimo cobrirá com a Sua sombra Maria e fará dela a Sua habitação. Ela, no seu coração e no seu seio fica cheia do Santo que se chama Filho de Deus; o Filho de Deus Eterno e Santo faz desta mulher casa e templo que Ele enche com a Sua presença; faz dela Arca da nova Aliança que -­‐ usando a linguagem de hoje, no prefácio da liturgia -­‐, “contém o autor da nova Lei e da nova Aliança”. Portanto, nela, celebra-­‐se a nova aliança entre o Céu e a Terra que é o próprio Jesus em pessoa, Filho de Deus e Filho de Maria. O seu “sim” torna-­‐a o templo onde Deus recebe acolhimento. Esse Deus, que não vive entre as pedras, vive neste “sim”, dito de corpo e alma inteiros. Deus fez de um ser humano o lugar da Sua habitação e inabitação. Ó Mistério tremendo e fascinante ao mesmo tempo! Só podia vir da loucura do Amor eterno e santo. Aos homens não era dado imaginar isso. Por isso, o símbolo do Templo e da Arca adquire agora uma força de realidade inaudita: Deus presente na carne (corpo) de uma pessoa, carne que se torna a Sua morada no meio da criação, carne que reflecte e irradia para nós este mistério. 2/4
Maria, templo do Senhor, é o espelho da Igreja Contemplámos, de facto, a beleza, a riqueza, a grandeza inimaginável, insuperável, imperscrutável deste mistério de Deus na Sua Aliança com a humanidade que toma traços humanos em Maria e através de Maria. Mas contemplemo-­‐lo para nós, e então, Maria aparece-­‐nos como espelho da Igreja porque ela existe à medida de Cristo e de Deus, habitada por Ele. E para que é que existe a Igreja de Deus senão para ser habitação de Deus no mundo? Sem isso, não tem outra razão de ser. Porque Organizações não governamentais de beneficência ou de solidariedade há muitas. Quanto mais formos inabitação de Deus em nós, mais seremos Igreja e mais a Igreja será ela mesma, aquilo que Deus quer que Ela seja: habitação de Deus no meio dos Homens, lugar de encontro que, irradie como Maria, a beleza e a riqueza da santidade de Deus, do Seu amor, da Sua misericórdia, da Sua ternura para toda a humanidade. Mas também cada um de nós em particular é templo de Deus a partir do baptismo. Por isso, a oração colecta que ouvimos nos lembrava a graça baptismal “para que, à semelhança de Maria, através da graça baptismal, sejamos moradas dignas da Tua glória”. O Santuário, caminho para a santidade Como é que se pode acolher Deus, senão deixando que Ele seja Deus em nós e connosco? Essa atitude chama-­‐se adoração. Adoração em espírito e verdade. Que Deus seja Deus em nós e connosco! Que Ele trabalhe, que Ele nos trabalhe! E que nós deixemos que Ele nos trabalhe com o Seu espírito de santidade e de vida. E isso ilumina também a missão deste Santuário de Fátima. Que o Santuário seja um caminho para a santidade dos homens que a ele peregrinam. Que nesta etapa da peregrinação da vida, cada paragem, aqui, seja como encontrar um oásis espiritual que lhe oferece o conforto, a consolação, a frescura, o retomar energias, o encontro verdadeiro com Deus, com o Deus Santo através do Coração Imaculado de Maria: “O meu Imaculado Coração conduzir-­‐te-­‐á até Deus”, disse Nossa Senhora a Lúcia e di-­‐lo a nós hoje. Por isso, fazemos votos que este Santuário seja tenda do encontro de Deus com o Seu povo, lugar da revelação do Seu amor e da Sua misericórdia para com a humanidade, templo da reconciliação e da paz. Isso é feito não só por aqueles que trabalham aqui permanentemente mas também pelos peregrinos que aqui vêm. É obra de todos. E que o Santuário possa também oferecer uma pastoral bem pensada e bem estruturada da santidade. A santidade da vida quotidiana que engrandece, enobrece e embeleza a nossa vida; uma santidade que seja verdadeiramente popular, quer dizer, acessível a todos, 3/4
para todos, de todas as idades, condições e estados de vida; desde as crianças aos idosos, os solteiros, casados, viúvos, celibatários... todos possam encontrar aqui um raio, um pequeno raio de beleza da santidade de Deus. Daí a nossa prece à Mãe celeste: Nossa Senhora, Templo do Senhor, Arca da Aliança, Porta do Céu, rogai por nós. † António Marto, Bispo de Leiria-­‐Fátima 4/4
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