A regulação do acesso interestadual de pacientes no Sistema Único de
Saúde
The brazilian Public Health System interstate patient access regulation
Eloni Basso Rohde1, Beatriz Figueiredo Dobashi2, Carlos Alberto Garcia Oliva3
Resumo
Este trabalho apresenta uma revisão do tema da regulação de acesso a pacientes
do Sistema Único de Saúde (SUS), com ênfase aos encaminhamentos para outras
unidades da Federação. Os estados que apresentam insuficiência e até inexistência de
alguns serviços especializados necessitam utilizar o benefício do Tratamento Fora do
Domicílio (TFD) para encaminhamento de pacientes a outros centros. O Pacto pela
Saúde propõe articulação e integração entre os estados, para que, por meio de um
processo democrático e solidário de pactuação, seja viabilizado o acesso dos usuários
a serviços resolutivos de saúde, qualificando a gestão do SUS. Cabe às Secretarias
Estaduais de Saúde a iniciativa de organizar o fluxo de pacientes entre diferentes
estados, com vistas a garantir o acesso universal, integral e equânime previsto na
Constituição Federal. Entretanto, esse processo ainda encontra-se incipiente em nosso
país, pois persistem inúmeros entraves que dificultam a garantia do acesso aos usuários
aos atendimentos indicados.
Palavras-chave
Sistemas de saúde, saúde pública, Sistema Único de Saúde, gestão
Abstract
This article shows a review on the subject of patient access to the Sistema Único de
Saúde (SUS – Brazilian public health system) regulation, highlighting the interstate
referrals within the Brazilian territory. The states that are deficient or lack some
specialized services need to use the Tratamento fora do Domicílio (TFD – interstate
patient referral) strategy. The Pacto pela Saúde (interstate health care strategy pact)
proposes articulation and integration of the federative units in order to, through a
solidary and democratic pact, the health services are made available to the users,
thus qualifying the SUS management. It is up to the states’ health secretariats to
organize the flow of patients between different states, assuring universal, integral and
equal access for all citizens, as foreseen by the Brazilian Constitution. However, this
process is still under development in our country, as there are many obstacles that
impede the patients’ access to the health care services they require.
Mestranda em Gestão de Tecnologias em Saúde. Coordenadora de Alta Complexidade da Secretaria de Estado de Saúde de
Mato Grosso do Sul. End: Rua Lauro Arruda Mendes Filho, 361 – Vila Morumbi – Campo Grande (MS) - CEP: 79052-067
E-mail: [email protected]
2
Médica Sanitarista. Secretária de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul.
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Doutor em Medicina. Membro do Grupo Interdepartamental de Economia da Saúde da Universidade Federal de São Paulo.
Docente do CPES – Centro Paulista de Economia da Saúde.
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Key words
Health systems, public health, Brazilian Public Health System, management
1. Introdução
A dificuldade em garantir o acesso do usuário aos serviços públicos de saúde
tem sido um grande desafio do SUS, que é frequente em todos os cenários:
municipal, regional, estadual e nacional. Há que se estabelecer meios e ações
para que seja garantido o acesso universal, integral e equânime, conforme
determinação constitucional. Uma importante responsabilidade do gestor estadual
do SUS é o controle do atendimento realizado em outros estados, quando a
oferta de serviços locais é insuficiente ou inexistente, objetivando a garantia
do atendimento indicado. Além disso, faz-se necessária uma análise acerca dos
gastos públicos efetuados para que o usuário receba esse atendimento, buscando
a melhor aplicação possível dos escassos recursos do setor saúde. A maioria
dos estados brasileiros enfrenta o desafio de implantar o processo de regulação
interestadual, que subsidie o planejamento e o controle mais efetivo da atenção
à saúde, visando a garantir acesso a tratamentos indicados aos pacientes e
possibilitando uma melhor oferta de recursos assistenciais. Para o controle do
acesso interestadual é de suma importância a realização de um levantamento sobre
os encaminhamentos de usuários, da origem até outras unidades da federação.
Tal diagnóstico pode instrumentalizar o gestor estadual durante o processo de
Programação Pactuada e Integrada (PPI) da Assistência Interestadual, ainda muito
incipiente no cenário nacional. Também pode contribuir na elaboração de fluxos
de regulação de acesso interestadual aos usuários do SUS, com vistas à garantia
do acesso aos atendimentos indicados. Um levantamento dessa natureza contribui
para a proposição de medidas que reduzam os encaminhamentos para fora do
estado nos casos em que o procedimento indicado estiver disponível no próprio
território, além de subsidiar estudo a respeito dos recursos financeiros aplicados
nesses encaminhamentos. O estado de origem dos usuários pode, também, obter
melhor fundamentação na elaboração de planos de investimentos em tecnologias de
saúde. Enfim, o esforço empreendido na avaliação e implementação da regulação
interestadual pode contribuir na implantação do processo de Regionalização
Interestadual, proposto nas diretrizes operacionais do Pacto pela Saúde, e na
qualificação da gestão estadual do Sistema Único de Saúde.
2. A
regulação do acesso no
Sistema Único
de
Saúde
Cada vez mais os estados que possuem serviços de referência interestadual
têm exigido a utilização de mecanismos oficiais de regulação e pactuação para a
liberação de vagas para atendimento aos usuários do SUS. Isso exige integração,
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articulação e negociação entre os gestores, levando-se em conta os atendimentos
que já vêm sendo feitos pelos estados executantes.
Em 2002, foi editada a Norma Operacional da Assistência à Saúde – NOAS
01/2002, a qual definiu que a regulação assistencial deve estar “voltada para a
disponibilização da alternativa assistencial mais adequada à necessidade do cidadão, de forma
equânime, ordenada, oportuna e qualificada” (Brasil, 2002a). Até os dias atuais, este é
um dos grandes desafios enfrentados pelos gestores do SUS.
A Portaria MS/SAS nº 423, de 09 de julho de 2002, menciona que:
“Cabe ao Ministério da Saúde o papel fundamental de instrumentalizar Estados e
Municípios para a organização dos sistemas funcionais de saúde que garantam o acesso
dos cidadãos a todas as ações e serviços necessários para a resolução dos seus problemas
de saúde, otimizando os recursos disponíveis e reorganizando a assistência de modo a
favorecer a mudança do perfil de saúde da população brasileira” (Brasil, 2002b).
A norma acima enfatiza a importância de se garantir regulação do acesso
por meio de sistemas funcionais disponíveis a gestores estaduais e municipais do
SUS, de forma a favorecer assistência à saúde com resolutividade.
Um estudo realizado no estado de Minas Gerais apontou:
“Entendida como regras de proteção, regulação significa um conjunto de regras impositivas,
acompanhadas de algum mecanismo, tipicamente uma agência pública, para monitorar e
promover a submissão a essas regras, sendo que os mecanismos de elaboração das regras
e de monitoramento e controle não precisam ser localizados em uma única instituição.
Nessa concepção, o objetivo pode ser de caráter social ou econômico, e em geral visa
encorajar atividades consideradas úteis” (Menicucci, 2005, p.14).
Uma abordagem bastante instigadora sobre a definição de regulação, citada no
mesmo estudo, é de que a mesma inter-relaciona três dimensões: coordenação de
atividades, alocação de recursos e administração de conflitos (Menicucci, 2005).
Segundo Mendes, a regulação estatal compreende o seguinte grupo de
atividades:
“1. A condução política do sistema, responsável pela implementação de atividades de
caráter político-estratégico que objetivam criar projetos de governo e mobilizar vontades
políticas e recursos econômicos, organizativos e de poder para sua implantação.
2. O planejamento estratégico, função de suporte para a condução política e que demanda
a operação de potentes sistemas de informação.
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3. A comunicação social, entendida como intercâmbio de ideias, mensagens ou informações
e tem como fins a qualificação da demanda e da oferta, além da educação.
4. A análise de situação e tendências de saúde, desenvolvida com o uso da “inteligência
epidemiológica” para estabelecer tendências e monitorar e avaliar a situação dos fatores
envolvidos no processo saúde-doença.
5. A avaliação econômica dos serviços de saúde, cujo objetivo é buscar evidências sobre
a alocação e utilização dos recursos, utilizando-se como instrumentos as análises de
minimização de custos, custo-efetividade, custo-utilidade e custo-benefício.
6. A avaliação tecnológica em saúde, que busca estimar o valor e a contribuição relativa
de cada tecnologia em saúde à melhoria da saúde, considerando seu impacto econômico
e social e articulando os objetivos de contenção de custos e melhoria de qualidade, e se
respalda na medicina baseada em evidência.
7. A normalização dos processos de trabalho nos serviços de saúde, recortados por
doenças, etapas do ciclo biológico ou pela inserção no mercado de trabalho. Essa função
deve se assentar na medicina baseada em evidências e usar tecnologias de gestão da
clínica, como a elaboração de protocolos clínicos e a gestão de patologia, construindo
um sistema de gestão de processos.
8. O desenvolvimento de recursos humanos, que inclui a regulação do acesso, desempenho
e da educação dos profissionais de saúde.
9. A auditoria dos sistemas de serviços de saúde, entendida como a avaliação da qualidade
da atenção à saúde, e inclui a auditoria clínica e a organizacional.
10. A vigilância da saúde, entendida como conjunto de ações voltadas para o conhecimento,
previsão, prevenção e enfrentamento continuado de problemas de saúde, englobando a
vigilância epidemiológica, vigilância sanitária e vigilância ambiental nos seus aspectos
regulatórios.
11. O desenvolvimento científico e tecnológico, cuja regulação deve ser exercida em
primeiro lugar, pela identificação de vazios para orientar ações de fomento em ciência e
tecnologia e, em segundo, no cofinanciamento de pesquisa tecnológica” (Mendes, 2002
in Menicucci, 2005, p. 30-1).
Considerando a regulação como técnica para o equilíbrio entre oferta,
demanda e financiamento, o referido estudo menciona:
“A economia da saúde oferece algumas contribuições para entender a regulação aplicáveis
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a sistemas nacionais de saúde que ultrapassam a questão da relação estado-mercado,
embora a inclua, e que remete à definição das políticas de saúde em seus aspectos macro
e micro, sendo a regulação a utilização de diferentes técnicas, voltadas para a busca de
equilíbrio entre oferta, demanda e financiamento, com o objetivo de alcançar a eficiência
e a equidade. Em outros termos, a regulação engloba a definição de todas as regras de
funcionamento do sistema de saúde” (Menicucci, 2005, p.24).
A garantia do acesso da população a uma assistência à saúde qualificada, por
meio de uma rede organizada de serviços, requer atuação direta do Estado, por
meio de seu papel regulador. Apesar da ampla significação da regulação estatal
no sistema de saúde, este trabalho procura focalizar a importância da regulação
do acesso aos serviços de saúde pública.
O Ministério da Saúde, em conjunto com o Conselho Nacional de Secretários
Municipais de Saúde (CONASEMS), assim define a regulação do acesso à
assistência ou regulação assistencial:
“Conjunto de relações, saberes, tecnologias e ações que intermedeiam a demanda dos
usuários por serviços de Saúde e o acesso a esses. Para responder às diretrizes do SUS,
deve-se viabilizar o acesso do usuário aos serviços de Saúde de forma a adequar, à
complexidade de seu problema, a gama de tecnologias exigidas para uma resposta humana,
oportuna, ordenada, eficiente e eficaz” (Brasil, 2005, p.199).
Também aponta ações da regulação assistencial, das quais algumas são
destacadas a seguir: padronização das solicitações de internações, consultas, exames
e terapias especializadas por meio dos protocolos assistenciais; estabelecimento de
referência entre as unidades de saúde, segundo fluxos e protocolos padronizados;
organização de fluxos de referência especializada intermunicipal e interestadual;
controle e monitoração da utilização mais adequada dos níveis de complexidade;
subsídio ao redimensionamento da oferta, seja diminuição ou expansão (Brasil,
2005).
Em Nota Técnica sobre a Política Nacional de Regulação, o Departamento de
Regulação, Avaliação e Controle de Sistemas do Ministério da Saúde define:
“Uma Política de Regulação que viabilize o cuidado integral, a qualidade e a equidade na
Atenção à Saúde deve ir ao encontro das necessidades dos usuários, que são diversas, variam
dependendo do lugar, época, características geográficas, demográficas, epidemiológicas e
sociais da população, são de distintos e múltiplos usuários, são moduladas pela capacidade
de demanda e reivindicação do direito à saúde e são influenciadas pelos interesses e
capacidade de oferta dos produtores dos bens e serviços de saúde. Essa política deve,
portanto, ter como objetivo programar uma gama de ações-meio que incidam sobre os
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prestadores, públicos e privados, de modo a orientar a produção eficiente, eficaz e efetiva
das ações de saúde, contribuindo na melhoria do acesso, na integralidade e na qualidade
da atenção, na resolutividade e na humanização destas ações” (Brasil, 2006a)
O material intitulado “Curso Básico de Regulação, Controle, Avaliação e
Auditoria do SUS”, elaborado por equipes do Departamento de Regulação,
Avaliação e Controle de Sistemas (DRAC) e do Departamento Nacional de
Auditoria do SUS (DENASUS), apresenta que a estruturação da Política de
Regulação do SUS ocorreu de forma a “inscrevê-la numa Política de Saúde condizente
com os princípios do Sistema Único de Saúde, viabilizando o acesso equânime e oportuno, a
atenção integral, de qualidade, universalista e realizadora de direitos sociais” (Brasil, 2006b).
Os técnicos que construíram o referido curso reconhecem que o conceito e a
compreensão sobre regulação estatal na saúde não seriam uniformes no país e
apresentam uma reformulação de conceitos, relacionando a regulação no setor
saúde segundo a seguinte classificação: Regulação sobre Sistemas (ação sobre
sistemas de saúde), Regulação da Atenção à Saúde (ação sobre a produção direta
das ações de saúde) e Regulação do Acesso ou Regulação Assistencial (ação sobre
o acesso dos usuários aos serviços de saúde). Desta forma:
“A regulação é uma função da gestão que contempla uma atuação sobre os sistemas de
saúde, sobre a produção direta de ações de saúde nos diversos níveis de complexidade
(básica, média e alta) ambulatorial/hospitalar e sobre o acesso dos usuários para a
assistência nestes níveis” (Brasil, 2006b).
O conteúdo do Curso Básico de Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria
do SUS constituiu-se num importante precursor da Política Nacional de Regulação,
instituída pelo Ministério da Saúde em 2008, conforme relatado mais adiante.
Apesar de o termo regulação, quando referido à Saúde, representar diferentes
conceitos, entendimentos e aplicações, optou-se por destacar aqui os conceitos
apresentados pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), que
faz uma diferenciação entre regulação assistencial e regulação do acesso:
“Regulação assistencial: definida no Pacto pela Saúde, como o conjunto de
relações, saberes, tecnologias e ações que intermedeiam a demanda dos usuários por
serviços de saúde e o acesso a eles. Regulação do acesso: estabelecimento de
meios e ações para a garantia do direito constitucional de acesso universal, integral e
equânime, independente de pactuação prévia estabelecida na PPI e/ou da disponibilidade
de recursos financeiros” (CONASS, 2007, p. 31-32).
Essa diferenciação propõe que a programação da assistência à saúde deva
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se basear nas necessidades de saúde da população, e não na disponibilidade da
oferta. Dentre os diversos instrumentos e mecanismos de regulação assistencial,
destacam-se: Processo de Diagnóstico Prévio das Necessidades de Saúde da
População e de Planejamento/Programação, Regionalização, Cadastro Nacional
dos Estabelecimentos de Saúde (CNES), Complexos Reguladores, Protocolos
Clínicos, Indicadores e Parâmetros Assistenciais, Cartão Nacional de Saúde e
Programação Pactuada e Integrada da Assistência (CONASS, 2007).
Como bem destacado pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde,
a Programação Pactuada e Integrada (PPI) da Assistência é um dos principais
instrumentos e mecanismos de regulação assistencial (CONASS, 2007). A PPI
é definida como:
“Um processo instituído, no âmbito do SUS, para a definição da programação da
atenção à Saúde e alocação dos recursos da assistência à Saúde nos estados e municípios
brasileiros, resultante da definição, negociação e formalização de pactos entre os gestores”
(Brasil, 2005. p.175).
O objetivo da PPI é definir, com transparência, os fluxos da assistência a ser
prestada pelas redes de serviços e os limites financeiros destinados aos gestores
do SUS (Brasil, 2005). Essa programação deve fundamentar-se no diagnóstico
das necessidades de saúde da população e refletir as prioridades estabelecidas.
Segundo o CONASS, “o que não se pode perder de vista são as metas e os objetivos a
serem atingidos a partir das programações das ações, sejam eles os pactuados em nível nacional,
regional ou municipal” (CONASS, 2007, p.125).
Em dezembro de 2001, por meio da Portaria MS/GM nº 2.309, o Ministério
da Saúde criou a Central Nacional de Regulação da Alta Complexidade (CNRAC),
com o objetivo de organizar e estabelecer mecanismos de regulação da referência
interestadual. A CNRAC regula o fluxo de referência interestadual de usuários
que precisam de atenção de alta complexidade de caráter eletivo, nas áreas de
cardiologia, neurocirurgia, ortopedia, oncologia e epilepsia (Brasil, 2001). Os
procedimentos dessas áreas, que são regulados pela CNRAC, são custeados
pelo Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC), não onerando o
teto financeiro de estados e municípios que encaminham pacientes (CONASS,
2007).
Devido à necessidade de aperfeiçoar o processo regulatório da assistência de
alta complexidade entre os entes federados, em fevereiro de 2006, foi publicada
a Portaria MS/SAS nº 39, que criou as Centrais Estaduais de Regulação de Alta
Complexidade (CERAC) (Brasil, 2006c). As CERAC devem interagir diretamente
com a CNRAC, por meio informatizado, “contemplando desde o cadastro do paciente
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que necessita de um procedimento de alta complexidade inexistente ou insuficiente em seu estado
até o seu deslocamento e a realização do procedimento no estado executante” (CONASS,
2007, p.58).
O Conselho Nacional de Secretários de Saúde definiu com propriedade o
importante papel de cada Central Estadual de Regulação de Alta Complexidade
na garantia da assistência à saúde:
“A CERAC solicitante é a responsável pelo cadastro do paciente na CNRAC, pela inclusão
do laudo médico no sistema informatizado e também pelo deslocamento do paciente e do
acompanhante, se necessário, garantindo a chegada em tempo hábil para a realização
do procedimento. Também é sua responsabilidade o retorno para o estado de origem,
utilizando para isso verba do Tratamento Fora do Domicílio – TFD, conforme portaria
SAS/MS n. 55, de 24 de fevereiro de 1999” (CONASS, 2007, p. 58).
Os benefícios do Tratamento Fora do Domicílio devem ser concedidos pelo
gestor quando as alternativas de tratamento existentes no município ou estado de
origem do paciente estiverem esgotadas ou ausentes e enquanto houver possibilidade
de recuperação do mesmo (Brasil, 2005). O TFD consiste em:
“Fornecimento de passagens para atendimento especializado de diagnose, terapia ou
cirurgia, concedido exclusivamente a pacientes atendidos na rede pública ou conveniada/
contratada do SUS. Consiste também em ajuda de custo para alimentação e pernoite
a pacientes e acompanhante (se este se fizer necessário), após a devida comprovação da
necessidade, mediante análise sócio-econômica efetuada por assistente social vinculado
à rede pública de Saúde ou ao setor de assistência social do município de origem do
paciente” (Brasil, 2005, p. 239).
Em julho de 2009, considerando a necessidade de padronizar o funcionamento
das CERAC e a importância de definir normas e parâmetros para o funcionamento
das Centrais de Regulação nos estados e no Distrito Federal, além das diretrizes
do Pacto pela Saúde, o Ministério da Saúde publicou a Portaria MS/SAS nº
258, aprovando regulamento e orientações técnicas “com o objetivo de disciplinar e
otimizar as atividades da CNRAC e das CERAC, em todo o território nacional” (Brasil,
2009). Essa nova norma incluiu a especialidade de Gastroenterologia no elenco de
procedimentos regulados pela CNRAC. Porém, não são todos os procedimentos
das especialidades priorizadas pelo Ministério da Saúde que estão sob regulação
da CNRAC. Além desse problema, existem os procedimentos das demais áreas
da atenção especializada que, sem a intermediação da CNRAC, geram inúmeras
dificuldades aos gestores do SUS que não possuem essa oferta de serviços, quanto à
obtenção de vagas para a garantia do acesso dos usuários à assistência indicada.
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Sistema Único
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O Brasil, com suas dimensões continentais, revela diferenças importantes na
rede de serviços especializados, sendo que poucos estados possuem capacidade de
ofertar assistência à saúde em todos os níveis de complexidade que um sistema
de atendimento integral requer. Medidas de articulação entre diversas unidades
federadas, baseadas em relações de cooperação, intermediadas e apoiadas pelo
Ministério da Saúde, poderão possibilitar o acesso ao cuidado integral àqueles
cidadãos que residem em estados pouco resolutivos em determinadas áreas da
assistência especializada em saúde.
Nessa perspectiva, a experiência da União Europeia pode representar
“união de esforços para conceber a integração regional com exercício de soberania dividida
em que primam estratégias de cooperação (práticas intergovernamentais e tomada de
decisão consensual)” (Guimarães & Giovanella, 2006). As autoras referem em
seu artigo que, apesar de cada Estado-Membro da União Europeia ter a
responsabilidade pela organização dos serviços de saúde, os princípios de
proteção social compartilhados garantem aos cidadãos o acesso regulado à
saúde em outro Estado-Membro. “A revisão de projetos de cooperação e assistência em
saúde entre regiões ou Estados-Membros, vários destes localizados nas fronteiras, demonstra
que objetivam melhorar possibilidades de acesso e ampliar serviços ofertados” (Guimarães
& Giovanella, 2006). Foram constituídas instâncias decisórias que tratam de
assuntos de políticas, de regulação e econômicos para resolver situações de
interesse comum, além de representar os cidadãos, Estados-Membros e a própria
União Europeia. Assim, a integração é afirmada como alternativa viável de
redução de diferenças regionais, superando conflitos e promovendo acordos
(Guimarães & Giovanella, 2006).
O estudo citado instiga a reflexão sobre a importância do estabelecimento
de mecanismos formais de integração e cooperação entre diferentes instâncias
de governo no sentido de que, efetivamente, haja impacto positivo no acesso
dos usuários aos serviços de saúde. A seguir, são apresentadas as alternativas
definidas mais recentemente para a organização do fluxo de pacientes do SUS
entre os estados brasileiros.
3. O
pacto pela saúde e a
Regulação
do
Acesso Interestadual
A Portaria MS/GM nº 399, de 22 de fevereiro de 2006, estabeleceu as
diretrizes do Pacto pela Saúde, contemplando os acordos firmados entre os
gestores do SUS em três dimensões: pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão
(Brasil, 2006d). Dentre as diretrizes operacionais para a Gestão do SUS, no
que se refere à Regulação da Atenção à Saúde e à Regulação Assistencial, foi
adotado o seguinte conceito para Complexo Regulador:
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“Estratégia da Regulação Assistencial, consistindo na articulação e integração de
Centrais de Atenção Pré-hospitalar e Urgências, Centrais de Internação, Centrais de
Consultas e Exames e Protocolos Assistenciais com a contratação, controle assistencial,
avaliação, programação e regionalização. Os complexos reguladores podem ter abrangência
intramunicipal, municipal, micro ou macro regional, estadual ou nacional, devendo esta
abrangência e respectiva gestão serem pactuadas em processo democrático e solidário,
entre as três esferas de gestão do SUS” (Brasil, 2006e, p. 35).
Verifica-se, então, que o Ministério da Saúde propõe uma estratégia de
articulação e integração entre os entes federados, para que, por meio de um processo
democrático e solidário de pactuação, seja viabilizado o acesso dos usuários aos
serviços de saúde. Está prevista a abrangência nacional dessa estratégia, quando
as necessidades da população extrapolem os limites territoriais do estado.
Dentre os eixos estruturantes do Pacto pela Saúde foi estabelecido que a
Regionalização “é a diretriz que orienta o processo de descentralização das ações e serviços
de saúde e os processos de negociação e pactuação entre os gestores” (Brasil, 2006f, p. 15)
e, no desenho das Regiões de Saúde, apresenta a seguinte classificação: Regiões
de Saúde Intramunicipais, Regiões de Saúde Intraestaduais, Regiões de Saúde
Interestaduais e Regiões de Saúde Fronteiriças (Brasil, 2006f).
Em virtude da correlação com o objeto deste artigo, transcreve-se, a seguir,
a caracterização dada pelo Ministério da Saúde às Regiões Interestaduais:
“São compostas, seguindo os critérios gerais já descritos acima, por municípios
territorialmente contíguos, mas pertencentes a estados diferentes (dois ou mais) – situação
comum a áreas limítrofes entre territórios estaduais. O desenho dessas Regiões de Saúde
deve ser o que melhor responder às necessidades de saúde locais. Elas devem constar no
Plano Diretor de Regionalização (PDR) dos estados envolvidos. Isso quer dizer que
uma mesma Região de Saúde Interestadual fará parte de mais de um PDR” (Brasil,
2006f, p. 24).
Quanto ao reconhecimento das Regiões de Saúde Interestaduais, o Ministério
da Saúde, com vistas a subsidiar o processo de qualificação da elaboração e
revisão do Plano Diretor de Regionalização, recomenda:
“Os gestores de municípios situados em dois ou mais estados com os gestores estaduais
identificam a Região de Saúde e formam seu colegiado de Gestão Regional. Este, por
sua vez, informa às respectivas Comissões Intergestores Bipartites dos estados envolvidos
sobre a organização da nova Região de Saúde Interestadual. As CIB a reconhecem
comunicando o fato à Comissão Intergestores Tripartite e ao Ministério da Saúde, para
que façam o acompanhamento” (Brasil, 2006f, p. 26).
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Sistema Único
de
Saúde
Como se verifica, o Pacto pela Saúde propõe a implantação de processo
regulatório interestadual, objetivando o atendimento integral das necessidades
populacionais na área da saúde, com acompanhamento do Ministério da Saúde. O
que falta é a concretização dessas propostas, para que o usuário tenha garantido
seu direito de acesso universal e integral a ações e serviços de saúde. Como
o processo de Regionalização propõe o estabelecimento de Regiões de Saúde
Interestaduais, que se limitam a municípios contíguos de diferentes estados,
os gestores estaduais precisam ampliar as ações de regulação, já que, muitas
vezes, os encaminhamentos são feitos para unidades da federação localizadas
a longas distâncias.
Tendo presente a necessidade de fortalecimento dos instrumentos de
gestão do SUS, que garantem a organização das redes e fluxos assistenciais,
provendo acesso equânime, integral e qualificado aos serviços de saúde, bem
como a necessidade de fortalecer o processo de regionalização, hierarquização
e integração das ações e serviços de saúde, o Ministério da Saúde instituiu,
por meio da Portaria MS/GM nº 1559, de 01 de agosto de 2008, a Política
Nacional de Regulação do SUS para que a mesma seja implantada em todas
as unidades da federação, como instrumento que permita a plenitude das
responsabilidades sanitárias assumidas pelas três esferas de governo (Brasil, 2008).
Esse novo regramento organiza as ações da Política Nacional de Regulação do
SUS em três dimensões:
I – Regulação de Sistemas de Saúde: tem como objeto os sistemas municipais,
estaduais e nacional de saúde e, como sujeitos, seus respectivos gestores
públicos, definindo, a partir dos princípios e diretrizes do SUS,
macrodiretrizes para a Regulação da Atenção à Saúde e executando
ações de monitoramento, controle, avaliação, auditoria e vigilância desses
sistemas;
II –Regulação da Atenção à Saúde: exercida pelas Secretarias Estaduais
e Municipais de Saúde, conforme pactuação estabelecida no Termo
de Compromisso de Gestão do Pacto pela Saúde; objetiva garantir a
adequada prestação de serviços à população e seu objeto é a produção das
ações diretas e finais de atenção à saúde, estando, portanto, dirigida aos
prestadores públicos e privados e, como sujeitos, seus respectivos gestores
públicos, definindo estratégias e macrodiretrizes para a Regulação do
Acesso à Assistência e Controle da Atenção à Saúde, também denominada
Regulação Assistencial e controle da oferta de serviços executando ações
de monitoramento, controle, avaliação, auditoria e vigilância da atenção
e da assistência à saúde no âmbito do SUS; e
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III – Regulação do Acesso à Assistência: também denominada regulação
do acesso ou regulação assistencial, tem como objetos a organização,
o controle, o gerenciamento e a priorização do acesso e dos fluxos
assistenciais no âmbito do SUS e, como sujeitos, seus respectivos gestores
públicos, sendo estabelecida pelo complexo regulador e suas unidades
operacionais; esta dimensão abrange a regulação médica, exercendo
autoridade sanitária para a garantia do acesso baseada em protocolos,
classificação de risco e demais critérios de priorização (Brasil, 2008).
Segundo essa nova Política, a regulação do acesso à assistência será efetivada
pela disponibilização da alternativa assistencial mais adequada à necessidade do
cidadão, destacando-se a padronização das solicitações de procedimentos por meio
de protocolos assistenciais e o estabelecimento de referências entre as unidades
com diferentes níveis de complexidade, de abrangência local, intermunicipal
e interestadual, segundo fluxos e protocolos pactuados. Cabe à área técnica
da regulação do acesso, estabelecida por meio de Complexos Reguladores, a
definição das autorizações para TFD (Brasil, 2008).
A Política Nacional de Regulação do SUS estabelece como atribuições da
regulação do acesso:
“Garantir o acesso aos serviços de saúde de forma adequada; garantir os princípios
da equidade e da integralidade; fomentar o uso e a qualificação das informações dos
cadastros de usuários, estabelecimentos e profissionais de saúde; elaborar, disseminar
e implantar protocolos de regulação; diagnosticar, adequar e orientar os fluxos da
assistência; construir e viabilizar as grades de referência e contrarreferência; capacitar
de forma permanente as equipes que atuarão nas unidades de saúde; subsidiar as ações
de planejamento, controle, avaliação e auditoria em saúde; subsidiar o processamento
das informações de produção e subsidiar a programação pactuada e integrada” (Brasil,
2008).
A mesma Política estabelece que o Complexo Regulador é a estrutura que
operacionaliza as ações de regulação do acesso e que o Complexo Regulador
Estadual pode, mediante pactuação, ter as seguintes características:
“Gestão e gerência da Secretaria de Estado da Saúde, regulando o acesso às unidades
de saúde sob gestão estadual e a referência interestadual e intermediando o acesso
da população referenciada às unidades de saúde sob gestão municipal, no âmbito do
Estado” (Brasil, 2008).
Destaca-se ainda que, para a implementação da Política Nacional de
Regulação, cabem aos estados as seguintes atividades:
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A
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Sistema Único
de
Saúde
“Cooperar tecnicamente com os municípios e regiões para a qualificação das atividades
de regulação, controle e avaliação; compor e avaliar o desempenho das redes regionais de
atenção à saúde; realizar e manter atualizado o CNES; coordenar a elaboração de protocolos
clínicos e de regulação, em conformidade com os protocolos nacionais; operacionalizar
o Complexo Regulador em âmbito estadual e/ou regional; operacionalizar a CERAC;
estabelecer de forma pactuada e regulada as referências entre estados; coordenar a elaboração
e revisão periódica da programação pactuada e integrada intermunicipal e interestadual;
avaliar as ações e os estabelecimentos de saúde, por meio de indicadores e padrões de
conformidade, instituídos pelo Programa Nacional de Avaliação de Serviços de Saúde
– PNASS; processar a produção dos estabelecimentos de saúde próprios, contratados e
conveniados; contratualizar os prestadores de serviços de saúde e elaborar normas técnicas
complementares às da esfera federal” (Brasil, 2008).
4. A
importância da
Regulação
do
Acesso Interestadual
e os desafios
para sua implantação
Infelizmente, apesar dos avanços conquistados pelo sistema público de saúde
brasileiro, ainda verifica-se a fragmentação na organização dos serviços e no
planejamento das ações, dificultando a definição de pactuações que garantam serviços
de referência assistencial e refletindo-se em falta de resolutividade no SUS.
Ao longo dos últimos anos, efetivaram-se alguns avanços na capacidade de
resposta dos gestores do SUS diante dos inúmeros problemas de saúde, especialmente
na esfera municipal e estadual. Contudo, muito há que se construir no âmbito
interestadual, com vistas à eficiência, eficácia e efetividade da atuação gestora do
SUS.
Apesar dos propósitos do Ministério da Saúde de regulamentar, entre os estados,
a regulação do fluxo de pacientes que necessitam de atenção de alta complexidade,
inúmeras são as dificuldades para a obtenção desse atendimento especializado.
Quando se trata de garantir assistência especializada interestadual, o gestor do
SUS esbarra em inúmeros entraves operacionais para a obtenção de vagas, como
por exemplo: desigualdades de rotinas, protocolos e fluxos de regulação entre
os estados; inexistência de rotinas, protocolos e fluxos de regulação em diversos
locais; insuficiência de profissionais capacitados; falta de conhecimento e prática
sobre regulação em todos os níveis de assistência; dificuldades de integração com
a esfera federal e, o mais grave, a falta de entendimento de que o sistema público
de saúde brasileiro é único em todo o território nacional e que deve garantir a
equidade do acesso e a atenção integral, independentemente da origem do usuário,
sendo, portanto, de responsabilidade de todos os entes federados, como prevê a
Constituição Federal.
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Conforme a Política Nacional de Regulação recentemente instituída pelo
Ministério da Saúde, cabe ao gestor estadual do SUS a regulação interestadual da
assistência à saúde da população (Brasil, 2008). Essa regulação inclui a realização
prévia de um diagnóstico dos encaminhamentos para outros estados, bem como
um processo de programação e pactuação que permitam o gerenciamento
adequado dessa atuação estatal. Tal levantamento pode orientar um processo
de pactuação da Secretaria Estadual de Saúde de origem do usuário com
outras unidades da federação que possuam serviços de referência interestadual,
com vistas a possibilitar o acesso a serviços do SUS aos pacientes, garantindo
a integralidade da assistência à saúde definida pela Constituição Federal. Essa
pactuação desencadearia a elaboração e a padronização de fluxos de regulação
de acesso interestadual, por meio de mecanismos específicos.
A realização de um diagnóstico sobre os encaminhamentos de pacientes
para outros estados poderá permitir, a cada ente federado, a elaboração de
uma proposta para a criação de Regiões de Saúde Interestaduais, conforme
preconiza o Pacto pela Saúde, fortalecendo o processo de Regionalização. Todas
essas medidas poderão contribuir para a superação de entraves na obtenção
de vagas para atendimentos ainda não disponíveis no território estadual. Por
outro lado, deve ser melhorada a utilização dos serviços especializados locais,
evitando-se deslocamentos desnecessários de pacientes e oportunizando assistência
mais próxima possível da residência dos usuários. Ressalta-se a importância
de que esse processo de regulação interestadual seja coordenado e apoiado
pelo Ministério da Saúde, promovendo a integração entre os diversos estados
brasileiros e a redução de diferenças regionais, além de estimular os acordos
e as decisões consensuais. As ações de regulação, quando efetivas, possibilitam
aos usuários uma melhor oferta de procedimentos de saúde, garantem o acesso
a serviços resolutivos, racionalizam o uso dos recursos no sistema, contribuindo
para qualificar a gestão do SUS, assim como a assistência à saúde prestada à
população.
Referências
Brasil. Ministério da Saúde. Portaria MS/GM nº 2.309, de 19 de dezembro
de 2001. Institui, no âmbito da Secretaria de Assistência à Saúde/SAS, a
Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade/CNRAC. Brasília,
2001.
_____. Ministério da Saúde. NOAS 01/2002 (Norma Operacional
Assistencial de Saúde). Brasília, 2002a. 109p.
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A
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Sistema Único
de
Saúde
_____. Ministério da Saúde. Portaria MS/SAS nº 423, de 9 de julho de 2002.
Detalha as atribuições básicas inerentes a cada nível do governo no controle,
regulação e avaliação da assistência à saúde no SUS. Brasília, 2002b. 16p.
_____. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Secretários Municipais de
Saúde. O SUS de A a Z: garantindo saúde nos municípios. Brasília: Ministério
da Saúde, 2005. 240p.
_____. Ministério da Saúde. Departamento de Regulação, Avaliação e
Controle de Sistemas; Departamento Nacional de Auditoria do SUS.
Curso básico de regulação, controle, avaliação e auditoria do SUS. Brasília, 2006a.
Mimeografado.
_____. Ministério da Saúde. Departamento de Regulação, Avaliação e
Controle de Sistemas. Nota Técnica: Política Nacional de Regulação. Brasília,
2006b. 11p. Mimeografado.
_____. Ministério da Saúde. Diretrizes operacionais: pactos pela vida, em defesa do SUS
e de gestão. Série Pactos pela Saúde, v. 1. Brasília, 2006c. 74p.
_____. Ministério da Saúde. Portaria MS/GM nº 399, de 22 de fevereiro de
2006. Divulga o Pacto pela Saúde 2006 – Consolidação do SUS e aprova as
Diretrizes Operacionais do Referido Pacto. Brasília, 2006d. 23p.
_____. Ministério da Saúde. Portaria MS/SAS nº 39, de 6 de fevereiro de 2006.
Institui a descentralização do processo de autorização de procedimentos que
fazem parte do elenco da CNRAC. Brasília, 2006e. 25p.
_____. Ministério da Saúde. Regionalização Solidária e Cooperativa: orientações para
sua implementação no SUS. Série Pactos pela Saúde, v. 3. Brasília, 2006f. 42p.
_____. Ministério da Saúde. Portaria MS/GM nº 1559, de 1º de agosto de 2008.
Institui a Política Nacional de Regulação do Sistema Único de Saúde – SUS.
Brasília, 2008.
_____. Ministério da Saúde. Portaria MS/SAS nº 258, de 30 de julho de
2009. Aprova o regulamento técnico, as orientações técnicas para inclusão
de laudo de solicitação e o elenco de procedimentos definidos como de alta
complexidade, com o objetivo de disciplinar e otimizar as atividades da
CNRAC e das CERAC, em todo o território nacional. Brasília, 2009.
CONASS. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Regulação em Saúde.
Brasília, 2007. 174 p.
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Janeiro, 17 (4): 1031 - 1046, 2009 –
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Recebido em: 21/05/2009
Aprovado em: 17/11/2009
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