Centro Universitário SENAC
Luis Claudio de Oliveira Tocchio
Vídeo Game Design
Uma análise da estética conceitual do entretenimento digital
São Paulo
2007
LUIS CLAUDIO DE OLIVEIRA TOCCHIO
Vídeo Game Design
Uma análise da estética conceitual do entretenimento digital
Trabalho de conclusão de curso
apresentado ao Centro Universitário
Senac – Campus Scipião, como
exigência parcial para obtenção da
especialização em Mídias Interativas.
Orientadora: Prof. Dr. Renata Gomes
São Paulo
2004
Tocchio, Luis Claudio de Oliveira
Vídeo Game Design: Uma análise da estética conceitual do
entretenimento digital / Luis Claudio de Oliveira Tocchio – São
Paulo, 2007.
110f.
Monografia de Conclusão de Curso – Centro Universitário
Senac – Especialização em Mídias Interativas.
Orientadora: Prof. Me. Renata Gomes
1. Game Design 2. Narrativa 3. Imersão I. Título
Aluno: Luis Claudio de Oliveira Tocchio
Título: Vídeo Game Design
Uma análise da estética conceitual do
entretenimento digital
Trabalho de conclusão de curso
apresentado ao Centro Universitário
Senac, como exigência parcial para
obtenção da especialização em
Mídias Interativas.
Orientadora: Prof. Dr. Renata Gomes
A banca examinadora dos Trabalhos de Conclusão em
sessão pública realizada em ___/ ___/ ______, considerou
o candidato:
1) Examinador(a)
2) Examinador(a)
3) Examinador(a)
AGRADECIMENTOS
À. Renata Gomes, que pacientemente me
orientou, com palavras sempre gentis e
estimulantes e à Roger Tavares, por seu
apoio e amizade.
Dedico este trabalho à Bella, minha amada
esposa e a meus filhos, dádivas enviadas
por Deus.
RESUMO
Este artigo pretende analisar de forma breve e objetiva os princípios
fundamentais que inspiraram a criação de jogos eletrônicos de primeira e segunda
geração em relação aos recursos contemporâneos, com foco nas suas vertentes
narrativa e tecnológica e as perspectivas para o futuro do game design.
Palavras-chave: Game design, narrativa, programação, imersão, tecnologia, consoles,
vídeo game
ABSTRACT
This article is intended to analyze briefly and objectively the fundamental
principles that inspired the creation of the first and second generation electronic games
in relation with contemporary resources, focused on its narrative and technological ways
and the perspectives for the future in game design.
Key words: Game design, narrative, programming, immersion, technology, consoles,
video game
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Evolução do personagem Super Mario ................................................. 1
Figura 2 – Donkey Kong ........................................................................................ 2
Figura 3 – Adventure ............................................................................................. 3
Figura 4 – Frogger ................................................................................................ 5
Figura 5 – The Sims .............................................................................................. 8
Figura 6 – King´s Quest ...................................................................................... 13
Figura 7 – ET ...................................................................................................... 14
Figura 8 – Super Mario Bros ............................................................................... 17
Figura 9 – Asteroid .............................................................................................. 18
Figura 10 – Sonic ................................................................................................ 22
Figura 11 – Donkey Kong Arcade ....................................................................... 23
Figura 12 – Gabriel Knight .................................................................................. 32
Figura 13 – Wolfenstein 3D ................................................................................ 34
Figura 14 – MUD ................................................................................................. 36
Figura 15 – Controle Wiimote ............................................................................. 40
Figura 16 – Need for Speed ................................................................................ 46
Figura 17 – Myst .................................................................................................. 49
Figura 18 – Death Ilustrated (Doom Clone) ........................................................ 53
Figura 19 – Okami ............................................................................................... 60
Figura 20 – Chris Craford (Divulgação) .............................................................. 63
Figura 21 – Existenz ........................................................................................... 69
Figura 22 – Mindball ..................... ...................................................................... 78
Figura 23 – Context Aware Game ....................................................................... 82
Figura 24 – Holodeck (Star Trek) ........................................................................ 89
SUMÁRIO
1. Reflexões sobre o Game Design - 1
1.1 Game Design - 4
1.2 Etapas e procedimentos do Game Design - 6
2. Narrativas Digitais e os Adventos Tecnológicos: Motores da Criação - 15
2.1 Os Primeiros Passos da Narrativa no Game Design – 23
2.2 Game Design para os Primeiros Computadores Pessoais - 29
2.3 Diferentes Princípios Narrativos para o Game Design - 34
2.4 Maturidade do Game Design - 38
2.5 Outros elementos complementares ao Game Design - 47
2.6 Game Design Hoje - 53
3. Perspectivas para um Breve Futuro - 54
3.1 Perspectivas Futuras na visão de Chris Crawford - 62
3.2 Ambiente Virtual, Imersão e Game Design – 68
3.3 Os Horizontes do Amanhã – Game Design nas Próximas Décadas - 79
A.
Fusão entre Presencial e Digital - 85
B.
Holografia – 87
C.
Telecinese e Comando à Distância – 89
3.4 Previsões e Expectativas – 91
4. Considerações Finais - 95
5 Bibliografia - 101
1. Reflexões sobre o Game Design
Super Mario Bros – Exemplo da evolução conceitual, gráfica e tecnológica do game design
Como se define o jogo; especialmente o vídeo-jogo?
Tradicionalmente apresentados como ‘games’, os jogos eletrônicos - vistos
em seu surgimento com desdém pela indústria cultural – parecem estar
transformando radicalmente o mundo, a relação do homem com a máquina e até
mesmo nosso sentimento de integração e sociabilidade.
Isto se deve, em parte, a um nível de resposta quase imediato e sempre
crescente de público, que mostrou vivo interesse na novidade e nas
potencialidades
de
entretenimento
por
ele
oferecidas,
resultando
no
desenvolvimento de jogos cada vez mais elaborados e diferenciados e na
conseqüente melhoria do suporte técnico oferecido pela micro-eletrônica na
montagem de consoles e arcades com capacidades operacionais mais
portentosas e também na criação de uma nova linguagem, por meio da
concepção de desafios que ganharam contornos cada vez mais complexos, com
a elaboração de roteiros quase cinematográficos, como vistos na atualidade.
Especificamente em relação à jogabilidade e conteúdo das propostas de
condução narrativa não há consenso efetivo no meio acadêmico, como será
possível observar na argumentação dos principais teóricos e especialistas ao
longo deste estudo. No entanto, ainda que as opiniões sejam antagônicas, o fato
é que o game, qualquer que seja a definição e perfil encontrado para explicá-lo
na qualidade de fenômeno sóciocultural, está cada vez mais presente no
cotidiano e nos lares de todo o planeta e transforma-se de mero veículo de
diversão familiar em recurso de capacitação técnica, cognitiva e de integração.
Se acompanharmos o desenrolar da história desta tecnologia de
entretenimento, perceberemos que - mesmo com um fluxo irregular, que alterna
momentos de contagiante euforia de mercado com ocasiões de desespero ante
aquilo que parecia ser praticamente a inevitável derrocada do produto em todas
as suas versões e plataformas como visto no crash de 83 - a indústria soube
aprender com seus equívocos e conseguiu manter-se firme, com crescimento
sólido e constante, transformando-se, de apêndice do “business cultural” em um
elemento motor, que dita de forma soberana as tendências tecnológicas e até
mesmo comportamentais de uma nova geração.
Os caminhos para o estabelecimento do meio como nova linguagem
certamente passam pelo amadurecimento do recurso, seja no patamar
tecnológico, com gráficos e formas de jogabilidade cada vez mais primorosas,
seja no desenvolvimento de conteúdo, que envolve elementos diversos e
bastante específicos do meio, tais como gameplay, funfactor, interface, níveis de
desafios e processos imersivos, entre outros, que constituem o contexto narrativo
do jogo.
Obviamente, no início da era dos games não existia clareza em relação ao
papel do designer e, tampouco, a definição da função em si, com o perfil de ação
que acabou sendo-lhe conferido mais tarde com a sedimentação corporativa da
indústria de games.
Apenas a título de informação complementar, vale observar o comentário
de Shigeru Miyamoto, diretor de criação da Nintendo, em entrevista no início
deste ano:
“Quando comecei minha carreira na Nintendo não havia nada como a criação de vídeo
games na companhia. Não havia nem mesmo um estilo claro de vídeo games [no mundo]
ainda... Foi só a partir do sucesso de Donkey Kong que o
game design conquistou reconhecimento e foi considerado
oficialmente uma parte grande da empresa.” (MIYAMOTO,
2007)
No entanto, a própria dimensão alcançada
pelo segmento conduziu à criação e produção
Donkey Kong: redefinindo
conceito
de entretenimento eletrônico
de games como um laborioso processo de
inúmeras
etapas
complementares
e
subseqüentes, que devem apresentar harmonia, com o objetivo maior de
alcançar a excelência no game design.
Inúmeras
publicações
de
influentes
pesquisadores,
designers
e
profissionais do meio vêm sendo lançadas nas duas últimas décadas, tentando
cunhar um perfil mais claro para o complexo processo de game design ou, ao
menos, elucidar alguns princípios fundamentais que regem sua realização.
Em linhas gerais, pode-se aceitar como um princípio consensual entre os
autores e estudiosos do tema que o game design pode versar por oito diferentes
gêneros de criação, embora haja eventuais discordâncias em relação à fusão ou
separação de alguns dos tópicos. A listagem abaixo, baseada em texto original,
elaborado por Marc Prensky, apresenta os princípios gerais destes gêneros de
forma breve e sucinta:
-
Action Games: categoria que inclui games de rolagem lateral (side
scrollers) como Super Mario, games de labirinto (Pacman), combate a
objetos em queda (Missile Command) e shot-them-ups como Doom e
Quake.
-
Adventure Games: Estão entre os primeiros jogos de computador, como
Zork, Adventure, Zelda e Myst.
-
Fighting Games: Dois combatentes manipulados por combinações de
comandos de seus jogadores para enfrentar e derrotar o oponente,
como nos clássicos Mortal Kombat e Street Fighter.
-
Puzzle Games: Jogos de solução de quebra-cabeças, como Tetris,
Puyo Pop e Meteos.
-
Role Playing Games: Joga-se com um personagem humano ou
humanóide, com atributos e características que se aprimoram através
da aquisição de experiência ao longo da jornada. Everquest e Ultima
são alguns exemplos.
-
Simulation Games: jogos de aviação, corrida e criação de cidades,
entre outros como The Sims e Sim City.
-
Sports Games: O conteúdo, mais do que a jogabilidade, é um fator
determinante, como jogos orientados por estatísticas ao invés de ação,
controle de vários jogadores simultaneamente ou com equipamentos
adicionais, que contribuem para a diversão e jogabilidade, como no
caso de árcades com bastões de baseball, pranchas simuladoras de
esqui, etc.
-
Strategy Games: jogos de combate contra grandes armadas e
civilizações, como Civilization e Roller Coaster Tycoon.
1.1 Game Design
Game design é um termo que
certamente não pode ser definido
apenas pela sua tradução literal.
O conceito necessário para a
definição
deste
processo
envolve
inúmeras etapas, o trabalho árduo de
equipes profissionais e voltadas para
um trabalho complementar e conjunto,
criatividade e busca incessante pela melhor forma de fazer convergirem estes
elementos para a realização de um produto final que ofereça lazer e inovação ao
usuário, ainda que estes recursos se baseiem em uma construção narrativa
sedimentada nos mais tradicionais elementos dos clássicos contos de fadas,
como poderemos observar mesmo em jogos aparentemente distantes deste
conceito, como Donkey Kong, de 1981.
Richard Rouse III, escritor e projetista de jogos eletrônicos define o
conceito de game design a partir da idéia de jogabilidade.
“O game design determina quais escolhas o jogador será capaz de fazer no mundo do
jogo e que ramificações estas escolhas terão no restante do jogo. O game design
determina qual o critério de ganho ou perda o jogo deverá incluir, como o usuário será
capaz de controlar o jogo e que informações o jogo comunicará a ele, e isto estabelece o
quão difícil o jogo será. Resumidamente, o game design determina todos os detalhes de
como a jogabilidade funcionará.” (ROUSE, 2001, p. xix)
Katie Salen e Eric Zimmerman, em seu estudo, por sua vez afirmam:
“’Design’ é metade do game design. Como conceito e como prática a idéia de design
reside no centro da exploração dos games e de um jogar significativo... Assim como o
termo game, design é um conceito com muitos significados. Sua definição depende do
fato de o design ser considerado uma idéia, um conhecimento, uma prática, um processo,
um produto...
Mas e o game design? Haverá uma definição que indique um território particular para o
game design?.. Como resposta, oferecemos a seguinte definição geral: Design é o
processo pelo qual o designer cria um contexto a ser encontrado por um participante, a
partir do qual o significado emerge.” (SALEN e ZIMMERMAN, 2004, p. 46)
Finalmente, Bob Bates, apresenta o que parece ser a visão mais sucinta e
objetiva para o processo de produção de um jogo e nos oferece boas dicas para
a realização de um projeto:
“O bom design em
qualquer
campo
pode
ser
distinguido pela simplicidade.
Um bom designer irá incluir
somente aquelas coisas que
são necessárias para criar o
efeito
que
ele
deseja.
Qualquer coisa a mais é
supérflua
e
deprecia
o
objetivo geral... Enquanto o
projeto
está
em
desenvolvimento, idéias vão
aparecer...
como
você
Frogger: Padrão gráfico básico essencial e
simplicidade de comandos.
decidirá o que colocar e o que deixar fora? Uma boa forma de nivelar é avaliar o esboço
frente ao conceito. Se isso não ajudá-lo a alcançar o objetivo básico do jogo, cancele o
projeto.
Os melhores games não são enormes e esparramados; são justos e objetivos. Eles não
distraem o jogador com coisas sem relevância.” (BATES, 2004, p. 36)
1. 2 Etapas e Procedimentos do Game Design
A importância do desenvolvimento de uma nova linguagem, como vem
sendo pesquisada tanto pela indústria de games como pelos laboratórios
acadêmicos, é uma das atenções de Vicente Gosciola, que percebe não apenas
os aspectos lúdicos oferecidos pelo jogo mas, também um extraordinário recurso
hipermidiático, dotado de condições que o qualificam como instrumento nãoformal no que tange às possibilidades educativas e de aprimoramento pessoal e
profissional de seus usuários. Ele considera que
“o efeito do jogo no uso da hipermídia interessa principalmente porque pode tornar a
convivência com a obra hipermidiática mais próxima da realidade. E não importam
somente as possibilidades lúdicas para o usuário de hipermídia, mas principalmente a
possibilidade de jogo inerente ao diálogo entre a narrativa textual e a narrativa
audiovisual a ser desenvolvida pelo roteirista ou designer de hipermídia.
Espaços para a motivação em ambientes interativos não-lineraes são importantes mesmo
em produtos acadêmico-científicos. É possível oferecer ao usuário espaços e tempos para
pequenas vivências como pequenos jogos que utilizem parte do conteúdo discutido. Um
exemplo já bastante consolidado é o vídeo game.” (Gosciola, 2003, p.197).
Ainda que o tema deste trabalho procure lançar uma reflexão na dualidade
ora integrada, ora conflitante entre as propostas de condução narrativa de um
game e o aprimoramento dos aparatos informáticos para oferecer uma melhor
vivência no uso dos games a seus apreciadores, é fato que os princípios que
norteiam a elaboração do game design se estendam para muito além destes
tópicos, exigindo, naturalmente, conhecimentos e etapas muito mais abrangentes
e já profundamente analisados por um bom contingente de experts e profissionais
do assunto.
Entre os muitos estudiosos debruçados sobre os preceitos do design de
jogos eletrônicos, destacamos com facilidade o renomado pesquisador e game
designer Chris Crawford, que parece estabelecer as bases fundamentais deste
trabalho em sua obra, lançada no auge da segunda geração de jogos utilizados
em consoles domésticos, embora este material talvez exija, hoje, uma revisão
atualizada, tendo em vista os implementos e inovações que modificaram
radicalmente o mercado de games nestas três décadas de existência.
Resumidamente, sua obra pode ser apresentada com os seguintes tópicos
no que se refere aos procedimentos que compõem o desenvolvimento de jogos:
a. Escolha do Objetivo e do Tópico – Os jogos devem ter um objetivo claro
e este objetivo deve se expressar em termos do efeito produzido sobre o jogador.
“Escolha um objetivo em que você acredita, que expresse seu senso de estética e sua
visão de mundo... escolher um objetivo que satisfaça o público, mas que não é de seu
agrado, certamente produzirá um jogo anêmico” (Crawford, 1984, p.50).
Os tópicos, que podemos traduzir aqui de forma mais livre e elucidativa
como ‘temas’, podem ser diversos como, por exemplo, combate no espaço,
presente no jogo Star Raider ou a guerra entre a Rússia e a Alemanha, vista em
Eastern Front 1941, conforme nos demonstra o autor, entre outros exemplos que
facilmente nos viriam à memória.
b. Pesquisa e preparação – Uma vez definidos o objetivo e o tópico, devese aprofundar o conhecimento em tudo que diz respeito ao tema escolhido.
Crawford cita que encontrou pouca informação útil em livros de história para o
desenvolvimento de seu game Excalibur, mas foi muito bem sucedido ao
pesquisar as lendas de Rei Artur.
c. Fase de Design – O autor inicia suas produções pela elaboração dos
recursos de entrada e saída (Input/Output Structure, no original), que ele define
como a linguagem de comunicação entre o computador e o jogador. A saída de
jogo se dá por meio dos gráficos e do som. A entrada se realiza pelo contato
“táctil” do jogador com o jogo. Esta interação é de suma importância para o
jogador e pode ser conseguida pelo oferecimento de um grande número de
opções significativas, sem que isto se transforme em uma tediosa estrutura de
entrada de dados. Subseqüentemente, sugere-se a criação da estrutura do jogo
(Game Structure) que resume-se em: como transformar o objetivo e o tópico em
um sistema funcional. A estrutura de programa é a etapa responsável por
transformar a estrutura de entrada e saída e a estrutura de jogo em um produto
real. Na etapa de avaliação do design, deve-se analisar a estabilidade da
estrutura de jogo.
d. Fase de Pré-Programação – Ao transcrever toda a criação do jogo para
o papel, é importante enfatizar a experiência do jogador, mais do que as
considerações de ordem técnica.
e. Programação – O autor cita esta fase como sendo a tediosa etapa de
programar e retirar ‘bugs’ do código.
f. Playtest e Post-Morten – Após receber as sugestões e críticas do
playtesters, deve-se lapidar os últimos detalhes e lançar o produto final.
Outros autores observam o processo de game design de formas mais ou
menos similares e o próprio Crawford se utiliza cotidianamente desta metodologia
na elaboração de seus trabalhos. Surpreendentemente, em uma entrevista
concedida em 1997, Crawford afirma que o game design manteve-se estanque
em sua essência ao longo destes anos, sem apropriar-se do vasto histórico de
erros e acertos de suas produções e das expectativas do mercado para
implementar mudanças profundas e renovadoras em seus lançamentos. Em suas
palavras
“...a indústria [de games] está muito maior e mais bem fundamentada do que nos
primórdios dos anos 80... Eu acreditava que, por esta época, já estaríamos vendo uma
grande profusão de softwares de entretenimento, voltados a uma ampla gama de
interesses. Isto não aconteceu; os jogos de computador permanecem completamente
inalterados em termos de apelo básico. São precisamente o mesmo ‘fogo-neles’ de ação
rápida ou jogos de estratégia para nerds que eram lançados há 15 anos atrás”.
(CRAWFORD, 1997)
Se,
como
observa
Crawford, a indústria parece
não
sair
em
inovações,
busca
é
de
possível
considerar também que esta
verdade não é absoluta, já
que alguns experimentos têm
The Sims: Software de simulação apresentado
como brinquedo de jogar e atraindo
multidões de usuários.
surgido
ao
longo
desta
jornada,
na
tentativa
de
oferecer diferenciais, que se
manifestam efetivamente como fatores de diversão em campos inusitados e
outras propostas, fugindo ao lugar comum dos games. Um exemplo atual pode
ser observado nos próprios jogos de simulação, que vêm se apresentando não
como jogos, mas na condição de “brinquedos de jogar” (software toys), como
brevemente apontado neste estudo:
“Enquanto os jogos que se configuram ao longo de uma jornada marcam sua conclusão
com o fim do percurso espacial, o fim dos jogos de simulação fica a cargo do interator e
apenas dele. Aparentemente cientes desta perspectiva, os distribuidores da série Sims
vendem seus jogos sob a alcunha de software toys, ao invés de games propriamente
ditos.” (GOMES, 2005)
Paralelamente, outras criações surgem de forma também experimental,
tentando romper a barreira conceitual existente na repetitiva indústria de games e
propõem um fluxo de imersão diferenciado, que suscita sensações inusitadas e
até então pouco comuns ao exercício do jogar. Aparatos como Donkey Konga,
dotados de tambores, dispositivos como as maracás disponíveis para as
plataforma Dreamcast ou propostas de narrativas com formas de uso e
navegação inovadoras como as encontradas em certos títulos de Gameboy DS,
tais como Advance Wars: Dual Strike, Puzzle Quest: Challenge of the Warlords,
Nintendogs ou o surpreendente Hotel Dusk Room 215, que estabelecem novos
caminhos para a apreciação e jogabilidade mostram, no mínimo, que o setor
corporativo não está totalmente indiferente ao possível esgotamento da fórmula
existente ou, por outro lado, ao potencial ainda latente e inalcançado da maciça
parcela social constituída por não-jogadores.
Por estas e outras razões, nunca se viu tão farta profusão de títulos
voltados ao game design, com tamanha gama de vertentes autorais para se
refletir sobre estas idéias.
Em seu trabalho sobre teoria e prática do game design, Richard Rouse III,
apresenta suas considerações acerca do tema e também contribui com idéias
para um princípio de produção de entretenimento eletrônico baseado no conceito
de game design, estabelecendo três modelos de ação para o desenvolvimento de
jogos, conforme segue:
a. Começando pelo Tipo de Jogo
O autor narra este exemplo utilizando-se do termo ‘gameplay’, que
entendemos qualificar-se melhor na tradução ‘jogabilidade’. Esta versão para o
português, porém, não traduz com fidelidade a idéia defendida pelo autor, motivo
pelo qual trataremos este item denominando-o “tipo de jogo”.
“Pensar no estilo do tipo de jogo é freqüentemente mais fácil para compreender o tema,
especialmente se o tipo de jogo é similar a algum outro já existente: ‘É um jogo de
corrida!’, ‘É um simulador de vôo!’, ‘É um 3D de ação e aventura, tipo Super Mario 64!’, ‘É
um Tiro em Primeira Pessoa’ como Doom!’... Com uma idéia geral do game que o
interesse, o designer irá trabalhar naquilo que o seu game deverá conter em termos de
tipo de jogo... Dependendo do tipo de jogo que deseje criar para o jogador, será
necessário analisar o tipo de tecnologia necessária.” (ROUSE, 2001, p. 44)
b. Começando pela Tecnologia
O autor afirma ser comum hoje em dia, nas grandes empresas de
desenvolvimento de games, iniciar um projeto com uma boa parte da tecnologia
do game já desenvolvida, uma vez que alguns projetos se iniciam com base em
algum outro já existente, seja um módulo anterior ou o mesmo sistema para um
novo projeto.
“Mesmo se o projeto prevê o uso de uma nova engine (sistema de programação ‘motor’
do produto), isto normalmente significa que uma velha engine será atualizada e, como
resultado, o estilo do jogo, mais adaptado a esta engine não mudará significativamente...
O designer será apresentado a esta nova tecnologia com a tarefa de criar um game que
extrapole a sofisticada tecnologia para o máximo de efeitos.” (ROUSE, 2001, p. 45)
c. Começando pela História
“Por fim, é sempre possível que o brainstorm para o seu jogo comece com a
ambientação que você deseja empregar, uma história que deseja contar, ou um grupo de
personagens que deseja explorar. Este é, provavelmente, um ponto de partida menos
comum do que a tecnologia ou o tipo de jogo. De fato, como muitos dos jogos não
dispõem de uma história propriamente dita, a idéia de um jogo que comece pela história
pode parecer estranha... Naturalmente, o tipo de história a ser contada terá um efeito
dramático sobre o tipo de jogo (gameplay) que o projeto deverá ter.
[Por exemplo, para] um grupo de amigos... combatendo criaturas hostis...um FPS com
times deverá ser apropriado. Qualquer tipo de história que envolva o jogador
confabulando com um grande grupo de personagens e seguindo em jornadas com o grupo
parece mais apropriada para um mecanismo do estilo RPG”. (ROUSE, 2001, p. 47)
d. Trabalhando com as Limitações
Normalmente, os game designers já contam com uma boa noção das
possibilidades de desenvolvimento do game a partir de cada uma destas
abordagens e as conseqüências provenientes de cada opção e se utilizam deste
conhecimento com bom senso e reflexão, de modo a otimizar tanto quanto o
possível a riqueza do universo em criação.
“Para cada decisão tomada para o jogo, muitas portas serão fechadas.” (ROUSE, 2001,
p.50).
De maneira inversamente oposta, os autores Katie Salen e Eric
Zimmerman comentam o processo de criação que consideram ideal para o
desenvolvimento de um game e sua trajetória consiste curiosamente em um
caminho totalmente diferente do padrão medianamente estabelecido como
processo de produção.
“Eu não tenho um processo único de design. Ao contrário, eu creio que começar sempre
do mesmo ponto levará freqüentemente ao mesmo final. Encontrar novos caminhos para
trabalhar freqüentemente leva a um design mais inovador. Naturalmente, sempre há os
ingredientes básicos do mecanismo de jogo, materiais, tema ou o mundo. Existem bons
pontos-chave e em um design equilibrado estas dimensões irão se mesclar suavemente e
dar sustentação uma a outra...
Nos estágios iniciais do design eu freqüentemente cerro meus olhos e vislumbro novos
mundos, novos sistemas e matérias, em busca de uma jogabilidade estimulante. Eu tento
desenvolver a compreensão do que desejo sentir quando jogar o jogo: a excitação, a
diversão, as escolhas, desafios...” (Salen & Zimmerman, 2004).
Ainda que este processo deixe sugerido uma perspectiva de ação menos
rotineira e mais livre para a tomada de decisões, parece improvável que
desenvolvedoras de games em geral façam a opção por este caminho, dado que
a complexidade do processo de produção de um jogo eletrônico é ampla e exige
o trabalho de muitos profissionais, bem como o controle das distintas etapas de
desenvolvimento e criação e de um cronograma sempre espartano para estas
realizações.
Em sua tese de mestrado para a Universidade de Waterloo, Anita Ching Yi
Ngai, agrega os conceitos expressos por alguns pensadores e que determinam
um perfil de criação para o desenvolvimento do game design, conforme
apresentado:
a. Interface com o usuário
“Similar aos softwares de produtividade, os games devem ter usabilidade, efetivamente e
eficientemente. As tarefas do game se dão por meio da interface... a performance do jogo
é afetada pela habilidade da interface em complementar as limitações do jogador nos
campos perceptivo, cognitivo e da memória.” (Desurvire, Caplan e Toth, 2004; Lazzaro e
Keeker, 2004)
b. Mecanismos do Jogo
“Os mecanismos do jogo determinam como os jogadores interagem com o game,
enquanto os elementos retóricos ajudam na compreensão das técnicas e regras do jogo,
a
capacitando os jogadores a administrar as tarefas do jogo.” (Davidson, 2003 ; Falstein
2004b)
c. Jogabilidade
“Diferentemente dos softwares de produtividade, os jogos oferecem experiência de
diversão, por meio de objetivos motivacionais difíceis de serem
alcançados,
acompanhados por uma sensação de sucesso e recompensa. Assim, o jogar estimula a
diversão do jogador por meio do controle da fluidez do jogo, baseado no tipo de desafio e
habilidades necessários.” (Falsteins, 2004b)
d. Narrativa
“O ato de contar histórias (storytelling) é a arte de estruturar uma sequência de eventos
lógicos, que provoquem um efeito emocional desejado. A história estimula experiências
emocionais no público somente quando as conseqüências são compreendidas e
percebidas por serem de relevante compreensão. Emoções são importantes para as
histórias pela persistência na mente do público, por terem significações próprias.” (Ngai,
2005, P.17)
A também conceituada game designer Roberta Williams, globalmente
reconhecida pela fundação, junto com seu marido, da Sierra Online Inc. e pela
criação de jogos tão inovadores e importantes em suas épocas como Mistery
House (1979), Gabriel Knight (1993) e o implacável fenômeno King´s Quest
(1984) comenta o processo de trabalho na criação de seus clássicos jogos:
“Em minha época, quando eu criava um novo jogo [do tipo] Adventure meus primeiros
pensamentos, antes mesmo de considerar qualquer estrutura de produção (framework),
eram: Qual é a história? Quem são os personagens, especialmente o personagem
principal? O que ele ou ela está tentando fazer, por exemplo, qual é a sua busca? Em que
tipo de ‘mundo’ ou ‘terra’ este game será jogado? Em outras palavras, eu sempre penso
primeiro na história, personagens e mundo de jogo. Eu precisava entender tudo isso antes
de começar a pensar a respeito de qualquer estrutura de produção, engine ou interface.
Uma vez com uma boa idéia da história básica, personagens e mundo eu podia pensar
em como iria querer que o jogo funcionasse, rodasse ou sua aparência. Coisas como
‘quantas cores’ eu poderia utilizar (um problema real naqueles primeiros dias), quantas
animações eu poderia usar e de que tipo, perspectiva de primeira pessoa ou de terceira
pessoa, ..., o quão grande um jogo poderia ser (para disquete ou CD)... Obviamente,
antes de decidir tudo isso, eu precisava saber o parâmetro das máquinas nas quais o jogo
supostamente iria rodar. Mas eu sempre iria pegar estes parâmetros e ‘forçá-los’ um
pouco mais além... Você não acreditaria quantos programadores teriam dito ao meu
marido Ken ‘ela quer que o jogo faça o quê?!!!!’ Todos os artistas, no entanto, e os
músicos e o pessoal dos efeitos sonoros me amavam, porque eu era capaz de fazer os
programadores programarem algumas ferramentas maravilhosas, que algumas pessoas
criativas poderiam utilizar para se divertir.” (JONG, 2007)
Na mesma entrevista, a designer comenta sua fonte de inspiração para o
desenvolvimento de King´s Quest:
“Eu
sempre
adorei
os
velhos contos de fadas de
eras passadas. Eu os lia e
relia.
Então,
quando
pensava em criar um jogo,
naturalmente gravitei para
o que gostava e com que
me sentia confortável. ..
então, pus esta paixão no
meu game King´s Quest. O
primeiro King´s Quest não
era realmente nada além
de um grande conto de fadas no qual alguém poderia experimentar diretamente de forma
realmente interativa, ao invés da velha forma passiva dos livros, filmes e contos orais.”
(JONG, 2007)
Especificamente no caso de Roberta Wiliams é interessante notar como
sua forma de trabalho segue um fluxo diametralmente oposto aos procedimentos
sugeridos por Richard Rouse, o que nos mostra como, independentemente da
realização de etapas similares, a forma de ação de cada profissional mostra-se
bastante particular no processo de game design, embora este ‘fluxo de trabalho’
deva, naturalmente, estar subordinado à planilha de produção e às orientações
da empresa desenvolvedora do game.
Esta é, sem dúvida, uma das determinações mais intrínsecas ao processo
de elaboração e produção de um game e muitos autores seguem este foco na
orientação dos candidatos ao crescente mercado de games, como podemos
identificar neste breve trecho do livro ‘The Art of The Game’:
“Planejar, planejar, planejar.
A lição mais significativa para se aprender sobre design de interface é planejar
antecipadamente. Muitos fatores estão envolvidos em uma interface de usuário (UI)
amigável e funcional... Quanto mais você planejar e experimentar, mas suave o processo
será”. (OMERNICK, 2004, p. 254)
“A composição visual e estética desempenha um papel estratégico no desenvolvimento
de uma interface de sucesso. Imagem e lay out não precisam ser somente sólidos e
limpos, mas também o mais eficiente e claro possível, para a compreensão dos
jogadores. Estou certo de que muitos de vocês podem pensar em alguns jogos nos quais
despendeu meia hora tentando compreender como iniciar o jogo. Um design de interface
ruim pode rapidamente confundir e frustrar os jogadores... O trabalho do designer de
Interface do Usuário requer não somente forte senso de design mas também a habilidade
para pensar logicamente e entender a psicologia do jogador e a interação do jogo”.
(OMERNICK, 2004, p. 247)
Muitos
autores
e
game designers já lançaram
obras em que apresentam
seus processos de trabalho
e o modo como entendem
ser
ideal
para
os
procedimentos de criação do
game design.
Neste
trabalho,
no
entanto, não serão listados
ET – The Game: Game design sem elaboração
toda a gama de opiniões
existentes sobre o tema, focando apenas as idéias gerais dos autores e artistas
mais conceituados do meio, como forma de oferecer uma visão geral do assunto,
para uma reflexão mais balizada.
De modo geral, nas breves citações acima, é importante observar a
presença sempre destacada com que dois destes fenômenos aparecem nas
considerações dos autores e desenvolvedores de jogos de forma bastante
recorrente, ainda que com variações em suas denominações específicas ou na
forma de apresentação, porém, mantendo os aspectos formais de suas
significações. Estamos tratando efetivamente dos elementos “narrativa” e
“tecnologia”, que parecem ora se alternar na revisão do direcionamento de
tendências para o lançamento de novos títulos, ora se complementam,
constituindo um processo de criação muito mais rico e abrangente, que prima
pela surpreendente apresentação de soluções inteligentes,
instigantes e
propositivas ao público usuário de jogos.
Ao longo deste estudo será possível observar momentos decisivos no
desenvolvimento de vários jogos e plataformas, em que a opção por uma ou outra
destas características foi determinante para o sucesso ou derrocada de uma
determinada “aposta” na criação de novos projetos.
2. Narrativas Digitais e os Adventos Tecnológicos: Motores da Criação
Muitos são os aspectos envolvidos no desenvolvimento de um game, com
inúmeras horas de trabalho de criadores, equipes de planejamento, artistas,
desenvolvedores, músicos e outros profissionais.
Questões como jogabilidade, narrativa, imersão, design conceitual e
inovação, entre outras, devem ser consideradas e respondidas adequadamente
como vimos acima, para a criação de um jogo que pretende oferecer horas de
diversão garantida ao consumidor.
Ao analisarmos o processo de criação dos games e a evolução que este
meio vem sofrendo ao longo do tempo, podemos perceber que não apenas o
aspecto tecnológico vem angariando melhorias, mas os elementos paralelos que
compõem este desenvolvimento também somam aprimoramentos, que em muito
contribuem para uma experiência mais rica da atividade fim, isto é, o jogar
efetivo.
Janet Murray, conceituada pesquisadora, responsável por Desenho e TI no
Instituto de Tecnologia da Geórgia, estabelece uma ampla reflexão sobre as
narrativas digitais e propõe, de forma acertiva, que
“o primeiro passo na criação de um universo narrativo sedutor é preparar o roteiro do
interator” (Murray, 1997).
Sua opinião é alicerçada por um maciço contingente de artistas,
desenvolvedores e autores diretamente ligados ao universo informático ou, mais
especificamente, aos jogos digitais, porém a pesquisadora vaticina princípios e
informações que nos levam a refletir quanto às potencialidades das propostas
narrativas dos roteiros para games e o universo ficcional de personagens e
mundos criados para este meio como promessas ainda pouco aprimoradas para
aquilo que se propõem:
“Enquanto formatos lineares como romances, peças de teatro e histórias de ficção têm se
tornado mais multiformes e participativos, os novos ambientes eletrônicos têm
desenvolvido seus próprios formatos narrativos. No campo da narrativa digital, os maiores
esforços criativos e sucesso comercial têm se concentrado, até agora, na área dos jogos
de computador. Muito desse empenho foi dedicado ao desenvolvimento de ambientes
visuais mais elaborados e de tempos de reação mais rápidos, avanços que
proporcionaram aos jogadores desafios mais variados à sua rapidez no gatilho contra
oponentes visualmente mais convincentes. O conteúdo narrativo desses jogos é escasso,
sendo frequentemente emprestado de outros meios ou supridos por personagens
esquemáticos e estereotipados. Essa falta de profundidade narrativa faz com que mesmo
personagens bastante populares, como os irmãos Mario e os lutadores de Mortal Kombat,
não consigam repetir seu sucesso como heróis nas telas de cinema (p. 63)... Enquanto as
narrativas dramática e escrita aproximaram-se do computador e os entretenimentos
digitais assumiram uma maior semelhança com as histórias, a ciência da computação
também está entrando em domínios antes exclusivos dos artistas criativos. Pesquisadores
nas áreas de realidade virtual e inteligência artificial que tradicionalmente buscavam
desafios técnicos e financiamentos na esfera militar têm deixado de modelar campos de
batalha e armas inteligentes para desenvolver novos ambientes de entretenimento e
novas maneiras de criar personagens ficcionais. Essas mudanças prometem ampliar
enormemente o poder de representação do computador”. (MURRAY, 1997, p. 67)
Como
visto,
embora
o
princípio narrativo possa responder
pelo andamento seqüencial das
etapas e fases do jogo e, até
mesmo
pela
possibilidade
imersão
de
potencialmente
proporcionada ao jogador, nem
sempre o fator ficcional do game,
isto é, seu contexto narrativo foi um
foco de interesse na elaboração e
criação de roteiros mais densos
Super Mario Bros: Narrativa digital sem
paralelo em outros formatos.
para
os
verificar
jogos,
se
como
pode-se
observarmos
as
primeiras plataformas de jogos eletrônicos, que pareciam destacar grandemente
uma jogabilidade voltada para o oferecimento de uma diversão despreocupada
ao usuário e quase desprovida de elementos que lhe permitissem uma
oportunidade de reflexão e considerações mais amplas.
Obviamente, mais do que uma opção estética ou conceitual, parte deste
design de narrativa incipiente com foco na ação era fruto das impossibilidades
presentes no período por conta das restrições impostas pelos chips primários e
insuficientes da hardware do período, como atestam as observações de Carl
Therrien em seu artigo:
“Nos vídeo games a representação visual começou “na unha”, com poucas formas e
poucas cores. Os primeiros jogos de arcade “Computer Space” (1971) e “Pong” (1972)
propunham universos estritamente abstratos, que podiam não ser necessariamente
associados com referências do mundo real (ficção científica e pingue-pongue). A
popularidade de elementos espaciais nos primeiros jogos não é surpresa; a despeito do
interesse dos programadores em ficção científica, um fundo negro podia descrever o
vazio espacial com custo mínimo em termos de recursos de sistema favorecendo,
portanto, gêneros como o “fogo-neles”. Durante a primeira década desta história, o apelo
do vídeo game como entretenimento podia ser encontrado em qualquer parte, que não
em seu potencial figurativo. O modo de exibição Bitmap, baseado na subdivisão da tela
em unidades distintas (pixels) às quais são associados valores individuais está atado
principalmente a dois tipos de restrição: capacidades de exibição (mais notadamente,
resolução de tela e simulação de cores) e de processamento (trabalhando com memória e
processamento de CPU). Ambos estão mui proximamente unidos: a visualização
“blocada” dos primeiros jogos pode ser explicada pela baixa resolução de tela
(teoricamente, a resolução máxima de um Atari 2600, por exemplo, é de 192 x 160
[pixels]), mas também pela impossibilidade de manipular Bitmaps detalhados (daí a
dominação de “blocos” grandes e uniformemente coloridos). Tais restrições favorecem as
exibições frontal e lateral e diferentes pontos de vista eram freqüentemente fundidas em
uma única cena”. (THERRIEN, 2003)
O autor Mark Prensky mostra como, apesar das limitações técnicas da fase
inicial do advento dos games, os desenvolvedores de jogos souberam contornar
a paupérrima apresentação dos gráficos e a lentidão da jogabilidade, por meio de
soluções interessantes e criativas, que transportavam o jogador para o rico
universo da fantasia digital:
“Designers de game freqüentemente fazem distinção entre a forma como um game é
jogado e a forma que ele aparenta. Nos primeiros dias dos vídeo games e jogos de
computador, quando a tecnologia era ainda muito nova, não havia muito que pudesse ser
feito com os gráficos. Assim, os designers concentraram-se em fazer os jogos o mais
estimulante possível. Mesmo se uma nave espacial era [apresentada como] um sinal de
‘maior que’ (>), ou se o personagem era somente um disco com uma boca, você se
divertia com o jogo porque ele oferecia muito desafio e diversão” (PRENSKY, 2000, p. 25)
Num momento em que o desenvolvimento tecnológico dos recursos,
embora promissores, ainda engatinhavam, a sedutora abertura de um mercado
no rico filão do entretenimento de massa abriu campo para pesquisas que
enveredavam por temas em busca de respostas em um universo muito além da
micro-eletrônica e cujo foco dirigia-se notadamente não para os experimentos
científicos do futuro, mas para uma das criações mais ancestrais da cultura
humana: o criativo exercício de contar boas histórias, independentemente do
veículo utilizado.
Esta jornada pelo Santo Graal da jogabilidade, aliada à diversão na
incipiente indústria dos vídeo games seria responsável por um afã de
experimentações e tentativas, visando um game design com grande poder de
empatia e facilidade de uso.
Neste sentido, clássicos da breve história dos games falam por si, ao
tornarem evidente o que fez deles obras referentes e absolutamente
conceituadas frente à vasta profusão de lançamentos que se deu no início dos
anos 80, com a participação cada vez mais expressiva de novas empresas e de
grandes corporações disputando as vendas e a preferência do público.
Esta busca por soluções diferenciadas conduziu também a criações com a
intenção de transpor as fronteiras claramente demarcadas pelo monitor de vídeo:
“Asteroids e Pacman popularizaram as telas ‘wraparound’ (contornar), onde o personagem
ou veículo podia deixar a tela de um lado e reaparecer do outro, um gesto estrutural na
direção de um mundo de jogo contínuo e sem limites” (LATHI, 2003, p. 159).
Mais à frente, o autor
enfatiza
desta
a
relevância
nova
etapa
tecnológica:
“A tela começou a se tornar
mais proximamente identificada
com
o ponto
jogador,
mais
de
do
vista
do
que
a
totalidade do universo jogável
do game” (LATHI, 2003, p.
159).
Asteriods: extrapolando os limites da tela.
De fato, nesta busca pela linha evolutiva dos games rapidamente se
sucederiam inovações técnicas e narrativas como a de Pitfall, que trazia a
sensação de continuidade e fluxo e Pac Land, que explorava o mote da jornada
do herói, mais tarde reapresentada em outras produções brilhantes como Super
Mario Bros e The Legend of Zelda.
Vale sempre ressaltar que as limitações técnicas dos primeiros
equipamentos eram também um fator de impedimento à criação de produções
mais elaboradas e pretensiosas. ‘Pong’ (1972), a primeira plataforma disponível
em larga escala ao grande público, apresentou jogabilidade muito mais intuitiva
que seu antecessor direto, ‘Computer Space’ (1971), embora este apresentasse
um conceito narrativo (ou, ao menos, uma sugestão de argumento) muito mais
claro e plausível: você, na condição de piloto de uma espaçonave, defendendose contra uma chuva de meteoros e eliminando inimigos com um canhão de tiros.
Embora o contexto de ‘Computer Space’ pudesse apresentar possibilidades
infinitamente maiores de imersão por meio da fantasia sideral, ‘Pong’ tornava-se
um sucesso pela facilidade de uso, isto é, pela jogabilidade, ainda que seu game
design apresentasse recursos visuais mais elementares, uma dinâmica mais
repetitiva e total ausência de conceitos que fizessem alusão à uma narrativa
fluída.
Cláudio Rabelo (2005) tece considerações semelhantes em sua obra ao
comentar que
“o famoso jogo River Raid está circunscrito sobre o mote de um avião que atira em alvos
móveis como navios e helicópteros suicidas, tendo que passar por retângulos que
significam combustível... qual o seu objetivo [do jogo]? Qual era a missão? Qual era o
nome do piloto?”
De fato, a ausência de informações como esta indicam o interesse da
Activision, empresa desenvolvedora do game em, no máximo, apresentar um
breve perfil de ação, que permita localizar o jogador no tema proposto,
oferecendo-lhe jogabilidade e diversão, como apontado por Mark Prensky,
poucas linhas acima, e em driblar a limitada capacidade de processamento dos
consoles e arcades de então, em busca de uma solução que otimizasse os
recursos e oferecesse facilidade de acesso ao usuário, por vezes sacrificando até
mesmo a conotação do produto final disponibilizado.
Mas este cabo de guerra entre a condução do game ora pela narrativa, ora
pela reviravolta insurgente da microeletrônica não apresentaria um vencedor,
mesmo nos dias de hoje, como se percebe, ao podermos optar pela plasticidade
hiperrealista de Need for Speed para Xbox 360 ou pela imersão lúdica e
fantasiosa de Super Paper Mario para Nintendo Wii.
A história dos games está repleta de momentos em que criatividade e
tecnologia puderam trabalhar em conjunto para oferecer diferenciais, às vezes,
absolutamente
revolucionários
e
inconcebíveis,
nos
desdobramentos
e
conseqüências para o mercado.
Um exemplo do fato pôde ser observado na época de lançamento do NES,
em que a Nintendo conseguiu não apenas o prodígio de resgatar a atenção do
público para os games como forma de entretenimento, mas transformou-o em
consumidor
ávido
de
sua
plataforma
e
viu
as
vendas
avançarem
vertiginosamente, dando-lhe uma supremacia de mercado que só encontrava
precedentes na época áurea do Atari, alguns anos antes.
A concorrência assistiu à escalada da Nintendo e, ciente da necessidade
de encontrar um novo foco para manter-se competitiva, passou a buscar
soluções, nem sempre bem sucedidas, como ocorreu com o console TurboGrafix
16, da NEC. A Sega, que amargava um segundo lugar nas vendas com seu
console Master System, percebeu que era hora de fazer frente ao NES e à Super
Mario 3 que, sozinho, amealhava US$ 500 milhões em vendas no mercado norte
americano.
Para
tanto,
era
imprescindível
que
seu
próximo
console,
Genesis/Mega Drive, estivesse disponível o mais depressa possível e que o
interesse do público pudesse se voltar à esta nova plataforma. Além de uma
paleta mais abrangente de 512 cores, que permitia disponibilizar
64 cores
simultaneamente (contra somente 16 do NES), o equipamento possuía uma CPU
de 16 bits com 7,61 Mhz e um co-processador de 4Mhz, (NES: CPU de 1,79Mhz)
responsáveis por uma performance extremamente superior ao console de 8 bits
da Nintendo.
Mesmo com toda esta capacidade de processamento, os dois primeiros
anos foram difíceis para o console, que só encontrou sucesso com a
determinação da empresa de criar um produto capaz de responder aos anseios
dos jovens, que começavam a mostrar fastio com os títulos para 8 bits. A solução
partiu de um pequeno grupo de game designers, intitulado Divisão AM8 a mais
tarde rebatizado como Sonic Team, em homenagem à mascote que salvou a
empresa e mudou os rumos do game design. Sonic The Hedgehog tornou-se um
fenômeno imediato e foi uma revolução por vários motivos: além da performance
vertiginosa e sem precedentes proporcionada pelos 16 bits, o jogo contava com
um belíssimo visual, de cores vibrantes e formas sintéticas que faziam vínculo
direto com os experimentos da emergente computação gráfica. A dinâmica do
game também se espelhava na exploração espacial do ambiente, que parecia ter
amplitude ilimitada, permitindo saltos giratórios cuja elevação trazia novidade ao
gênero plataforma e oferecia subníveis muito mais estimulantes do que o
universo de Mario Bros. De forma complementar, a simplicidade de comandos do
personagem pelo controle e o imediatismo de sua resposta de performance a
estes comandos mostraram ao mercado que a nova leva de jogos necessitava de
uma atualização na apresentação e na linguagem.
Mas o que marcou de fato o lançamento foi a criação de um mascote cujo
design conceitual encontrava eco junto a seu público-alvo: Sonic. O porcoespinho azul não tinha apenas estilo e design elegante, mas era ousado, rebelde
e ansioso, bem como os jovens da época, e transformou-se em porta voz de uma
massa descrente dos dogmas institucionais que balizaram o modo de vida das
gerações anteriores. Seu perfil detinha elementos subjetivos que iam diretamente
ao encontro do comportamento urgente e arrogante dos adolescentes e oferecia
um escape até certo ponto controlável pelos pais, circunscrito ao ambiente
familiar.
A indústria de games mostraria ter
aprendido
esta
lição,
tornando-se
mais
ousada no desenvolvimento de novos jogos e
incorporando as soluções que aliassem a
convergência de design criativo e gabarito
Sonic: Atitude rebelde e vínculo com
o público jovem .
técnico dos consoles.
Em entrevista concedida em 95, ao lado de Shigeru Miyamoto, o também
diretor de games Takashi Tezuka, responsável por Yoshi´s Island, comenta mais
uma vez o tema ‘concepção vs. tecnologia’, para salientar a importância das
soluções criativas:
“A tecnologia de hardware é muito importante, mas se você se fiar demais no hardware e
não nas idéias, você não fará games. Você terá uma demonstração de software. A nova
tecnologia pode tornar as coisas mais interessantes. Por exemplo, o Nintendo 64 pode
produzir imagens avançadas, mas se isto é tudo o que iremos enfatizar, o game se
tornará chato. O problema que encaramos é como utilizar a tecnologia avançada para
intensificar a jogabilidade. A tecnologia é apenas uma ferramenta para a expressão das
idéias.” (TEZUKA, 1995)
Há, no entanto, pensadores que discordam dos preceitos narrativos como
elementos motores para o game design. Estes profissionais ficaram conhecidos
como Ludologistas e, em termos gerais, estudam o jogo como fenômeno por si
só. Seu foco de atenção está nos jogos como um todo e nos vídeo games em
particular.
Entre os expoentes desta linha acadêmica, podemos citar Espen Aarseth,
que claramente discorda das propriedades narrativas dos games, ao considerálos como objetos não textuais. Seu parecer sustenta que um jogo de xadrez não é
narrativo e que as regras que o orientam não o tornam mais textual do que, por
exemplo, as instruções existentes no verso de uma lata tornariam o produto nela
contido mais textual.
Estas ponderações parecem não levar em conta o poder hipermidiático
que os sistemas computacionais oferecem e que permitem possibilidades de
encantamento, identificação e envolvimento ainda maiores do que a literatura nos
proporciona, se somarmos ao processo textual os recursos visuais, tácteis e de
inteligência artificial, que os jogos concentram em suas produções.
Se detivermos nossa atenção às projeções de avanços tecnológicos para
as próximas décadas e o histórico de modificações e aprimoramentos por que
passam os gêneros dos games ao longo da breve história do meio, é impossível
desconsiderar as oportunidades que se vislumbram para o futuro, do crível ao
mais imponderável, na concepção de histórias e na participação imersiva do
jogador.
Com base na visão crítica e aparentemente inflexível apresentada,
Aarseth demonstra crer que damos destaque tão expressivo às histórias nas
criações digitais porque não somos tecnólogos, isto é, que na condição de
humanistas, acabamos por conferir importância ao único campo de conhecimento
pelo qual conseguimos trafegar com certa tranqüilidade. Assim, acabamos
exercitando nossa soberba ao invés do senso crítico, dando mais importância à
narrativa do que, de fato, possui.
Mesmo assim, o autor reconhece que
“o contar histórias tem sido, e ainda é, a forma dominante de expressão cultural”.
(AARSETH, 2005)
2.1 Os Primeiros Passos da Narrativa no Game Design
Também o ilustre designer de jogos Shigeru Miyamoto, da Nintendo,
comentou brevemente as limitações técnicas dos primeiros consoles e aparelhos
e as conseqüências destes entraves para um desenvolvimento mais elaborado de
criações no campo dos games. Assim descreve o artista o processo de criação de
sua obra mais reconhecida, o encanador Super Mario:
"No caso de Mario, por volta de 1980, quando não podíamos reproduzir designs
sofisticados nas máquinas de jogo para TV em virtude das limitações tecnológicas, tive
que fazer o nariz dele ainda maior e colocar um bigode, para que os jogadores pudessem
perceber que ele tinha um nariz. Tive que faze-lo usar um macacão, para que os
movimentos de suas mãos se tornassem perceptíveis. Mario foi resultado destas idéias
racionais, mais o toque de design italiano que eu adorava” (MIYAMOTO, 2002).
Diferentemente de outros criadores de jogos do mesmo período, Shigueru
Miyamoto pareceu estar sempre um passo à frente no que se refere ao game
design. Suas produções mostraram, desde o seu primeiro sucesso, Donkey Kong,
lançado em 1981, um olhar mais atento ao que poderia ser observado como uma
indicação para a criação de uma ambientação mais elaborada, que concentrasse
mais do que apenas o estilo ‘fogo neles!’, por meio de relações de proximidade
entre os personagens da trama, num primeiro esboço do que potencialmente viria
a ser um argumento para a narrativa digital. Miyamoto foi, sem dúvidas, o
primeiro game designer a se apropriar de conceitos para além do universo
restrito da tecnologia dos games pelo enfoque do devaneio e beber na fonte do
imaginário coletivo que permeia o ambiente dos mitos e do herói. Jogos
baseados em personagens heróicos não constituíam qualquer novidade já
naquela época e dispositivos como Atari, Amiga e ZX Spectrum, entre outros, já
haviam lançado jogos cujos personagens centrais eram figuras de proa como
Superman e Homem-Aranha. Além destes, alguns outros personagens
foram
desenvolvidos pelos próprios fabricantes de games, como Space Invaders, QBert e Berzerk, embora à época ainda não houvesse a consciência do potencial
representado por estes personagens como elemento visual de forte apelo junto
ao grande público, como aconteceria em um período não muito posterior com o
surgimento de Pac Man.
O caso de Donkey Kong, no entanto, se evidencia, não pelo uso do
personagem heróico, mas pela apropriação sagaz do princípio do “herói” e dos
contos infantis, oferecendo não somente jogabilidade intuitiva e funfactor, mas
também propondo imersão por meio da figura nanica de um anti-herói, que vence
desafios para salvar sua amada.
Neste sentido, a criação deste personagem e de toda a estrutura presente
no jogo se aproximam das idéias de
Joseph Campbell, como o proposto
em linhas gerais em sua obra, The
Hero with a Thousand Faces:
“Seja o herói ridículo ou sublime,
grego ou bárbaro, gentio ou judeu,
sua jornada pouco varia no plano
essencial...
todavia,
espantosamente
variações
aventura,
na
os
são
poucas
as
morfologia
da
papéis
dos
personagens envolvidos e as vitórias
conquistadas.“ (CAMPBELL, 35)
Donkey Kong continha em sua
estrutura as figuras clássicas do
Donkey Kong: Releitura de clássicos contos de fadas
vilão, do herói e da princesa indefesa presa no alto da torre, recorrendo assim ao
imaginário coletivo dos contos de fadas universais e estabelecendo um diálogo
fluído com o público jogador, que conseguia criar identidade e empatia com o
contexto do jogo, auxiliado pela dinâmica de jogabilidade básica, e já por ele
absorvido, de comandos que correspondiam aos saltos e movimento do
personagem na tela.
Assim como as criações de Miyamoto, somente outro estilo de jogo parecia
inclinar-se para o desenvolvimento de roteiros (minimamente) mais elaborados:
os RPGs eletrônicos, que buscavam transpor para o virtual o rico universo dos
jogos de mesa, construindo, para tanto, elaborados backgrounds, que situavam o
jogador em um contexto de fantasia, normalmente voltado para o período
medieval, especificamente por conta do imenso sucesso do jogo Dungeons &
Dragons.
Zork foi certamente o mais bem sucedido dos jogos pertencentes ao
gênero que ficou conhecido como ‘ficção interativa’. Embora tenha sido
claramente adaptado de seu influente direto, o ‘Colossal Cave Adventure’ (1976),
o jogo trazia inovações que contribuíam grandemente para seu game design,
como a possibilidade de indicar comandos mais complexos e que podiam
envolver a digitação de termos como verbos, substantivos, adjetivos e
preposições, que abriam possibilidades muito mais amplas e divertidas de
interação. Outra característica marcante do jogo residia no fato de que, por tratarse de um produto realizado em modo de texto, o jogo fazia uso intenso dos
elementos que caracterizam as obras literárias, tal como a descrição detalhada
de ambientes e personagens, criando uma atmosfera de intimidade e interelação
ainda maiores com este universo. Estas inovações, ainda que superficiais e
aparentemente inócuas, foram fundamentais para o processo de imersão dos
usuários, que encontravam, por meio do jogo, um ambiente em constante
modificação e cheio de surpresas a cada nova partida. O jogo lança o usuário em
um obscuro e claustrofóbico ambiente de corredores e labirintos, entremeados
por salas, que se alternavam com a presença de tesouros e criaturas.
Parte desta capacidade narrativa e imersiva do game devia-se ao seu
formato texto, que conferia um nível mais profundo de introspecção ao longo do
desenrolar da aventura, criado majoritariamente no campo do imaginário, além de
uma maior identificação com o personagem, aqui incorporado na forma de alterego do usuário, que projetava a si mesmo na pele do guerreiro virtual. A isto
deve-se acrescentar ainda o desejo de prolongar a relação catártica do usuário
com o ambiente sempre inovador e dinâmico do ficcional. Neste sentido, outras
estruturas de game design se utilizaram do mesmo recurso, como os FPS e os
God Games que, por meio do oferecimento de um campo de ação macro, em que
o jogador administra e conduz os desdobramentos de um mundo em
transformação, apresentam uma possibilidade de projeção imersiva plena, de tal
forma que a relação jogador-máquina deixa de existir na condição de pólos
eqüidistantes para amalgamar-se em uma relação una, denominada “Consciência
Ciborgue” pelo autor Ted Friedman em seu estudo “Civilization and its
discontents: Simulation, Subjectivity ans Space”:
“Como transformar esta confusão de papéis em um leve fluxo de jogabilidade?
... Você não se identifica com o computador em si... [isto é,] o prazer do jogo de
simulação vem de habitar um estado mental alienígena e não familiar: aprender a pensar
como um computador.
... A maneira como o computador ensina estruturas de pensamento... se dá por meio da
internalização da lógica de programação. Para vencer... você precisa trabalhar com as
regras do game. Eventualmente, suas decisões se tornarão intuitivas...” (FRIEDMAN,
1999)
Mais à frente, no mesmo texto, o autor define:
“Pensar como o computador” significa pensar em conjunto com a máquina, tornando-se
uma extensão do processo computacional. Isto ajuda a explicar a forma como o jogo
“suga [o jogador]”. O prazer dos jogos de computador está em entrar em um estado
mental semelhante ao do computador, respondendo automaticamente [como ele]... O
resultado é um estado semi-meditativo, no qual você não está apenas interagindo como a
máquina, mas mesclando-se a ela.” (FRIEDMAN, 1999)
Embora a base apresentada para suas considerações resida nos jogos de
simulação, outros gêneros mostram-se perfeitamente integrados aos mesmos
conceitos, tendo em vista a imersão proporcionada pela interação nestes
ambientes digitais.
Este “estado mental semelhante ao computador” é um estágio claramente
presente na maioria das sessões de jogo, sempre que há identificação do
jogador. Esta imersão consegue proporcionar a experiência ímpar de estar em
outro lugar, viver uma outra vida ou uma nova história, não necessariamente
baseada na lógica cartesiana de nosso plano existencial e que é capaz de
promover significativas transformações intelectuais e cognitivas no usuário.
Friedman ainda nos elucida os aperfeiçoamentos decorrentes desta
inversão, ao comentar:
“Devo esclarecer que, ao falar sobre ‘pensar como um computador’, não estou sugerindo
antropomorfizar, ou que máquinas possam ‘pensar’ como fazem os humanos...
pensamentos humanos são menos lineares, mais fluídos. Eu proponho que, usar os jogos
de simulação pode nos auxiliar a, intuitivamente, abraçar o caminho particularmente
diverso pelo qual computadores processam informação e nos ajudem a reconhecer como
nossas relações com computadores afetam nossos próprios pensamentos e sentimentos”.
(FRIEDMAN, 1999)
Mesmo sendo celebrada como um fator de desenvolvimento, esta
consciência ciborgue também é alvo de inúmeras críticas, que vêem nesta
transição,
não
um
intenso
processamento
mental,
mas
um
possível
comprometimento das relações sociais a partir da eventual possibilidade de,
durante esta simbiose, o usuário ser acometido de um torpor vegetativo e
alienante, potencialmente irreversível.
Se, por outro lado, estas críticas não forem procedentes e considerarmos
que a experiência vivida com os games pode nos oferecer possibilidades tão
amplas e promissoras por meio da indução de um estado simbiótico com a
máquina e de imersão plena e regozijante, é possível compreender as razões que
levam boa parte dos designers a buscar alternativas diferenciadas com o intuito
de nos oferecer novos estágios de integração neuro-computacional, seja por
meio de linhas narrativas emergentes para o meio digital ou tentando suplantar
os gargalos sempre presentes dos recursos tecnológicos.
Porém, uma parcela de estudiosos observa que nem todas as boas
histórias
podem
ser
convertidas
em
narrativas
adequadas
para
o
desenvolvimento de um game que atenda aos preceitos de jogabilidade, desafio
e condução lúdica, necessários para transformá-lo em um game de sucesso ante
os ávidos jogadores.
Chris Bateman investe nesta linha de pensamento ao considerar:
“Mas quando você tem uma narrativa em particular, como você julga se ela se adequa
aos games? E quando você tem um jogo, como você julga o que você pode fazer com
sua narrativa? [Este é] um problema que os escritores de game e outros interessados em
narrativa de games freqüentemente preferem negligenciar é que é tremendamente
ineficaz transformar uma história em jogo. Por exemplo, suponha que você tenha um
pequena história para contar. Você pode escrevê-la em prosa em poucas horas. Você
pode captar e editar um curta metragem em um dia ou mais. Mas para transformar a
mesma pequena história em um game levará centenas de horas de trabalho de um
homem.
Agora, é verdade que, ao fazer disso um game, você adiciona algo que não pode obter
em outra mídia – interatividade. Mas há um uma turbulência aí, que é o fato de que nem
todas as histórias se beneficiam da interatividade. Se você quiser contar a história de Jó,
por exemplo, há um campo muito pequeno para torná-la interativa... Argumentos
similares podem ser usados para Macbeth de Shakespeare ou, digamos, Ulisses de
James Joyce. Não é que estas histórias não possam ser versadas (ou ao menos usadas
como inspiração) para games – é mais o fato de que o que torna estas narrativas
interessantes não é necessariamente compatível com a forma interativa”. (BATEMAN,
2006)
Certamente não há ainda resposta para esta questão, mas os grandes
nomes do game design estão debruçados com empenho ímpar na tentativa de
encontrar caminhos que suplantem estes problemas.
2.2 Game Design para os Primeiros Computadores Pessoais
As limitações tecnológicas dos primeiros tempos da microeletrônica
apresentavam-se ainda mais comprometedoras no hardware espartano dos
computadores, quando da entrada destes equipamentos na vida cotidiana dos
grandes centros urbanos e, mais tarde por todo o mundo. Estes aparelhos, vistos
ainda à época de sua disseminação no mercado como máquinas voltadas
estritamente ao mundo dos negócios e das necessidades corporativas, não
contavam com recursos que fizessem uso das potenciais particularidades
multimidiáticas, por conta de uma visão bastante estreita e limitada dos
fabricantes.
Os poucos jogos para PCs disponíveis eram tidos ainda apenas como
entretenimento básico e, por conta disso, incapazes de competir em pé de
igualdade com os consoles fartamente distribuídos a preços populares nos lares
de classe média e que contavam com processadores dedicados e recursos
gráficos mais potentes, em virtude de um histórico direcionado especialmente
para o lazer familiar. Cientes destes problemas da plataforma, mas indispostas a
competir no acirrado mercado de jogos para console já fartamente dominado
pelas desenvolvedoras de peso, algumas empresas souberam encontrar
potencial para os PCs, que começavam a migrar dos escritórios para os lares, de
olho no promissor mercado de jovens e adolescentes dos ambientes familiares.
Foi neste contexto que a Sierra Online iniciou a jornada que a
transformaria em uma sólida empresa do entretenimento eletrônico. Se o
hardware dos computadores era insuficiente para as complexas animações e
texturas, o caminho possível se apresentava no desenvolvimento de uma história
mais aprofundada, com nuanças de subcamadas de informação, com uma densa
narrativa e recursos que exigiam mais reflexão e raciocínio do que destreza
manual do usuário ou o processamento de cálculos infinitos para a composição
de imagens e cenários.
A empresa já havia produzido alguns títulos de relativo sucesso, como
Mystery House (1979), considerado o primeiro adventure game para PC que
continha imagens, um upgrade natural de Zork e outros games similares. A
criação de King´s Quest (1984) ia na mesma linha de pensamento e elencava um
contexto narrativo, que mais uma vez iria à fonte dos contos clássicos para contar
a epopéia do jovem Sir Graham que, para herdar o reino de Daventry deveria
encontrar 3 tesouros, vencendo desafios e feras.
Com jogabilidade simples, o game primava por oferecer soluções criativas
e inovadoras no uso dos gráficos, permitindo, por exemplo, que o personagem
pudesse passar pela frente ou por trás de uma pedra ou árvore, um recurso
ousado para as parcas condições de animação de sprites e o uso de bitmaps
oferecidos pelos PCs.
Roberta Williams comenta o sucesso do jogo, ao afirmar que
“Foi o jogo mais bem sucedido que havíamos desenvolvido até aquele momento (1994).
Vendeu mais de um milhão de cópias em menos de um ano, o que, para aqueles dias, era
fenomenal. Estou certa de que, hoje em dia, um jogo que venda ‘apenas’ um milhão de
cópias em um ano seria considerado um monumental fracasso.” (WILLIANS, 2007)
O game design para computadores ainda conheceria outras tentativas bem
sucedidas, que se caracterizavam por um conjunto de técnicas que, somadas,
tentavam encontrar o estado-da-arte no desenvolvimento de jogos conseguindo,
muitas vezes, surpreender o mercado, como é o caso de Alone in the Dark
(1991).
Já naquela época o desejo de oferecer uma ambientação mais imersiva,
que proporcionasse navegação fluída entre os vários espaços do game e uma
sensação mais efetiva de envolvimento com o meio, era fator de interesse de
muitos dos estúdios e designers de game. Frédérick Raynal, um francês
apaixonado por informática e filmes de terror, entendeu que a soma destas
paixões poderia resultar em um produto inovador, que pudesse trazer aos
usuários dos PCs uma sensação única de envolvimento com o ambiente
claustrofóbico e aterrorizante de uma mansão misteriosa e soturna, como conta:
“Estava fascinado pelo 3D em tempo real, que se tinha finalmente tornado viável graças
aos novos demoníacos PCs a 33MHz e estava empenhado em criar uma ferramenta que
permitisse a modelação e a animação de objetos articulados a três dimensões. Estava
particularmente atraído por algumas técnicas, até então não disponíveis em tempo real:
skinnig, que constrói objetos convincentes a partir de vários componentes em vez de
utilizar uma composição de componentes fracamente coordenados; e a interpolação
temporal que ajustaria a qualidade da animação à capacidade de processamento do
computador...
Os filmes de terror eram [a esta] altura uma das minhas paixões, pelo que queria que o
cenário típico deste gênero de filmes estivesse onipresente no jogo... Infelizmente, os
computadores existentes na altura não tinham
a capacidade para apresentar
simultaneamente mais de uma personagem animada completa (150 polígonos sem
texturas e 15 articulações por personagem) e um ambiente realístico 3D. O número total
de polígonos que podiam ser utilizados para criar a personagem (cerca de 1.000 por
imagem a 60 imagens por segundo) não permitia, no entanto, reproduzir um conjunto de
personagens e ambientes suficientemente realistas para recriar a atmosfera de “casa
assombrada” dos filmes de terror. Para ultrapassar o problema, decidi que todo o poder
de processamento de polígonos do computador seria dedicado a recriar os heróis e
monstros em 3D. Para os fundos existia apenas uma solução: utilizar bitmaps para
modelar os fundos (o ambiente). Mas estes deveriam ser vistos em perspectiva, de modo
a encaixarem com os personagens 3D. Assim, uma segunda ferramenta foi criada: um
modelador de ambientes. Consegui então usar a ferramenta para revestir a casa com um
modelo de arames 3D. todas as formas da mobília e das paredes foram desenhadas em
linhas brancas sobre fundo preto, formando uma malha de cubos e outras formas ocas...
Em adição a toda essa tecnologia, que constituía o aspecto que mais se destacava em
Alone in the Dark, coloquei grande esforço no modo de jogar e na ergonomia, que na
altura considerava essencial para um jogo de computador. Mas o objetivo do jogo,
emprestado dos filmes de terror, manteve-se, a meu ver, essencial: lutar para sobreviver
numa situação de puro terror.” (RAYNAL, 2002, p. 16)
Alone
in
the
Dark
foi
apresentado na caixa do produto
como o “1º jogo de aventura 3D
em tela cheia” e foi o precursor
ainda de um dos mais ricos filões
dos jogos de ação da atualidade,
gênero
que
ficou
conhecido
como ‘Survival Horror’ e que
geraria filhotes campeões de
venda,
como
Silent
Hill
e
Gabriel Knight: Texturas e modelagens associadas à narrativa
soturna, criando um novo gênero.
Resident Evil, para ficar apenas
nos clássicos do gênero.
Alguns meses antes do lançamento de Alone in the Dark, outro retumbante
sucesso de vendas seria lançado, aproveitando-se da ínfima performance dos
computadores de maneira criativa para criar uma experiência de imersão e
jogabilidade radical e sem precedentes para o dispositivo, porém, sem o mesmo
brilhantismo de Raynal na criação de um universo ficcional instigante e, para
desagrado dos fãs de jogos como King´s Quest, apresentando uma narrativa
muito menos elaborada.
Os game designers que desenvolviam este produto também procuravam o
‘toque de Midas’ na criação de um game que pudesse aliar o máximo de
performance dos computadores pessoais e uma jogabilidade mais ousada, com
visual dinâmico e sedutor, uma intenção nada fácil de ser convertida em
realidade, com os microcomputadores tão básicos em suas funções multimídia.
Isto, no entanto, não refreou a tenacidade de uma dupla de jovens e
inspirados desenvolvedores, que se propuseram a encontrar condições de
aproveitar-se desta lacuna de mercado e suplantar os desafios instigantes que o
microcomputador apresentava. Foi assim que os profissionais da ID Software,
John Carmack e John Romero, unidos a um time de aficionados programadores e
gamers, encontraram seu nicho e despontaram com uma novidade sem
precedentes na seleta produção de jogos eletrônicos, ao desenvolverem um
sistema de programação que conseguia utilizar-se de forma racional e
significativa da limitada capacidade de processamento dos computadores
pessoais, que começavam a receber as primeiras placas de vídeo VGA. Esta
alquimia digital conseguiu gerar o objeto de desejo número um de todos os
gamers do mundo daquela época, e que respondia pelo nome de Wolfenstein 3D
(1992), o primeiro FPS para PC, com gráficos vibrantes e jogabilidade
vertiginosa.
A solução encontrada para Wolfenstein foi criar um ambiente de simulação
de 3D com um labirinto texturizado de paredes e alguns objetos do mundo real
como lâmpadas, plantas e animais. Ainda que os gráficos não fossem
particularmente impressionantes, a atenção dada aos detalhes de textura criava
uma atmosfera rica e dinâmica surpreendente para a época e para os
equipamentos disponíveis. Nem tudo em Wolfenstein era apuro tecnológico, no
entanto. Parte do encantamento e da imersão proporcionados pelo jogo residia
na presença de um elemento que se encarregava de maneira simples em
transportar o jogador para dentro dos perigosos labirintos nazistas e fazê-lo
sentir-se na pele do espião da Aliança J. “BJ” Blazkowicz: a renderização da
imagem de uma mão na base da tela e que sustentava a arma portada pelo
personagem. Este recurso visual aparentemente simples, reforçava a sensação
de presença ‘real’ dentro do ambiente do jogo e a conexão entre o jogador e o
protagonista do game.
Sean Sylvis, em seu trabalho de revisão sobre o jogo comenta a forma
criativa e inteligente como John Carmack, programador chefe do jogo, conseguiu
evitar as limitações de processamento e dinamizar a experiência do jogo:
“Em virtude das limitações do hardware que rodaria Wolf3D, havia muitos truques
gráficos que Carmack usou para que o jogo pudesse rodar mais rapidamente. Por
exemplo, ao invés de desenhar e texturizar o teto e o piso, a metade superior da tela foi
colorida com uma cor (cinza escuro) para o teto e a parte inferior com outra cor (cinza
claro) para o piso. Adicionalmente, todas as paredes foram alinhadas pelos eixos X, Y e
Z. As paredes eram inseridas sempre em ângulos de 90º para que a engine (isto é, o
programa ‘motor’ de renderização do jogo) pudesse tirar vantagem [da repetição
sistemática] quando fizesse os cálculos de renderização”. (Sylvis, 2001)
De maneira complementar, o
sistema do jogo fazia uso de
efeitos
sonoros
que
implementavam a experiência
de jogabilidade e imersão, por
meio
das
interjeições
dos
guardas (“Halt!”, “Ein Spion!”,
etc.).
“Os gráficos e o som estabeleciam
Wolfenstein 3D: Programação ousada criando
ambientação dinâmica e inovadora.
apropriadamente o ‘clima’ do jogo e tornavam o ambiente realista o bastante para que o
usuário pudesse perder-se dentro dele”,
complementa o estudo.
O sucesso absoluto de vendas de Wolfenstein mostrou ao mercado que
aquele era um momento para se produzir e oferecer jogos com dinâmica
eletrizante e o máximo aproveitamento de chips e placas de vídeo, mesmo que
isto significasse sacrificar o enredo e apresentar somente um breve contexto, que
servisse como justificativa para uma profusão seqüencial e repetitiva de tiros,
uma fórmula ainda hoje bem sucedida, como se observa em games como Counter
Strike e Resident Evil 4, por exemplo.
2.3 Diferentes Princípios Narrativos para o Game Design
De certa forma, esta opção pela estética e pela dinâmica, em detrimento
da narrativa, vinha ao encontro de interesses da indústria microeletrônica da
época, propensa a exibir a seus possíveis consumidores as bugigangas
informáticas por eles produzidas como sendo o nirvana da tecnologia, e que
continham todas as inovações técnicas indispensáveis à vida moderna, com
reprodução do ritmo frenético de nosso modus vivendi em uma meta-realidade
digital distante da fluidez onírica de Shangri-La e mais próxima da fragmentação
excêntrica da linguagem “videoclíptica”, que mostrava imediata identificação com
o público jovem do final do século. Não por acaso, a ascensão dos jogos
eletrônicos, ocorrida durante o advento do que se considera como a segunda
geração dos games, com o lançamento dos primeiros consoles domésticos, se
deu em um momento em que a linguagem do vídeo tornava-se compacta e
portável, podendo ser produzida e distribuída pelo próprio usuário, adotando um
perfil mais fragmentado e ruidoso (ainda hoje vigente na estética videográfica) e
a música pop deixava para segundo plano os rocks sinfônicos das grandes
bandas dos anos 70 para ressurgir com efeitos sonoros e batidas sintetizadas
que denotavam absoluta sintonia com a emergência dos games e as conotações
virtuais das primeiras produções de arte em pixel. Mesmo na moda, era possível
observar com facilidade a saída de formas orgânicas com cores vivas e
complementares, de óbvia alusão à vida floral, à Terra e a uma filosofia de paz e
equilíbrio, para vestimentas de corte anguloso, com cores cítricas, vibrantes e
contrastantes, com clara referência aos sistemas assépticos dos equipamentos
digitais e à sintetização artificial e plástica da vida.
Este foco da indústria de jogos se torna mais evidente quando nos
confrontamos com as opiniões de pesquisadores respeitáveis como Chris
Crawford, já anteriormente citado e Janet Murray, para quem os verdadeiros
talentos na arte da narrativa digital permanecem ainda adormecidos.
Para a autora, os enredos desenvolvidos para as ciber-histórias estão
ainda muito longe do ideal, ante tudo que podem oferecer, já que se encontram
em um estágio limitado não somente pela capacidade de processamento dos
computadores atuais, mas sobretudo pela falta de ousadia dos autores de
histórias digitais.
Em sua análise, a fusão dos diversos talentos de uma nova geração de
criadores, livres das amarras dos modelos de produção ainda vigentes, poderia
levar efetivamente ao uso de todo o potencial narrativo para a criação de jogos e
literatura para os novos meios.
“A criação de enredos digitais, assim como outros aspectos do meio, ainda está num
estágio incunabular. Os recursos tecnológicos dos desenvolvedores de jogos estão mais
redirecionados para os visuais em rápida transformação do que para a narração de
histórias expressivas. As redes de fluxo de consciência dos pós-modernistas e o
exibicionismo repleto de links das novelas da web enviam-nos de tela em tela, cheios de
esperança, em busca de histórias coerentes. Os cd-roms mais cinematográficos oferecem
segmentos de histórias mais extensos, mas aprisionam estas narrativas numa estrutura
de ramificações superficiais que frustra o nosso desejo de participação e de agência. Os
Muds oferecem grandes oportunidades para a participação em ambientes narrativos
regulados por fórmulas, mas as histórias geradas coletivamente são difusas e repetitivas.
Nenhum destes formatos coloca a capacidade de processamento do computador
diretamente nas mãos do escritor. Os experimentos dos laboratórios de computação
indicam a possibilidade de ferramentas narrativas muito mais poderosas, mas elas estão
ainda muito longe do desejo dos contadores de história, que querem, apenas, encantarnos
ou
agarrar-nos
pelos
colarinhos para contar algo
mais real do que a realidade.
Apenas quando estes esforços
disparatados
começarem
convergir
que
ganhará
forma
é
corpo
de
arte
o
como
a
meio
uma
expressiva.
Parece-me bastante possível
que um futuro Homero digital
surja, combinando a ambição
literária, a relação com um a
Mud Games: Texto como elemento para a fantasia.
vasta platéia e a perícia computacional. Mas, por enquanto, precisamos prestar uma
atenção muito grande para escutar, em meio à cacofonia do ciberespaço, os primeiros e
hesitantes acordes do bardo que desperta.” (MURRAY, 1997, p.201/202)
Henry Jenkins, diretor do programa de estudos comparativos de mídia no
Massachusetts Institute of Technology (MIT), segue por outra vertente e avalia o
conceito que permeia os aspectos narrativos do desenvolvimento de um jogo à
luz de uma corrente de pensadores que enxerga o game não como uma jornada
do herói ou uma sucessão de desafios, mas como um advento não-linear
baseado nas escolhas múltiplas oferecidas por uma territorialidade espacial
presente no universo do jogo.
Para o autor, a criação de games deve-se basear não no desenvolvimento
de um roteiro de eventos coeso, que se complementem de forma lógica,
subsequente e linear, mas por meio do que ele e outros autores classificam como
‘Spatial Stories’, um importante recurso de criação e condutor fundamental dos
jogos:
“De Certeau (1984b) chama grande atenção para as relações espaciais como princípio
central de organização para todas as narrativas: “Toda história é uma história de viagem –
uma prática espacial” (p.115). Nossa necessidade cultural por narrativa pode ser
conectada à nossa busca pelos espaços primitivos, memoráveis e críveis, e histórias são
feitas para levar em conta nossa posse atual ou desejo territorial. Considere, por exemplo,
a emergência da ficção científica no final do século 19 e começo do 20 como forma de
criar espaço imaginários para nossa exploração intelectual. As histórias de aventuras de
Julio Verne foram tiradas de séculos de textos de viagens, à medida em que recontam
uma variedade de jornadas à lua, sob o mar, ao centro da Terra e ao redor do mundo... O
ponto central da Nintendo é esta constante apresentação de espaços espetaculares... A
arte do game design vem da construção da multitude de diferentes caminhos com os
quais podemos interagir com estes notáveis espaços visuais” (JENKINS, 2005)
Mais à frente, no mesmo artigo, o autor sugere que games não são
histórias tradicionais:
“Nas narrativas da Nintendo, os personagens representam um papel mínimo,
apresentando traços que são largamente capacidades de ação: habilidades de luta,
modos de transporte, objetivos pré-estabelecidos... O personagem é pouco mais do que
um cursor que media as relações do jogador com o mundo da história.”
As opiniões do autor, ainda que conceitualmente estabelecidas e
solidamente embasadas, parecem não levar em conta que o game, assim como
toda estrutura de comunicação digital, é um meio que ainda inicia sua trajetória
como elemento de difusão e, como tal, carece de uma linguagem própria,
certamente
ainda
em
formação.
Diferentemente,
Janet
Murray
mostra
predisposição na crença de que este melhor aproveitamento das potencialidades
narrativas
digitais
surgirá,
à
medida
em
que
houver
maturação
no
reconhecimento e uso do recurso.
Mais á frente neste estudo, observaremos ainda a proposta ‘Story
Environments’ que apresenta outro viés de concepção e condução narrativa,
como será visto em detalhes no tópico ‘Horizontes do Amanhã’.
2.4 Maturidade do Game Design
Todo meio de comunicação passa, inevitavelmente, por um período de
avaliação, aceitação e apropriação por parte do usuário, princípio que já foi
objeto de estudos de muitos pesquisadores.
O próprio conceito de “remediação”, elaborado pelos pesquisadores Jay
David Bolter e Richard Grusin para compreender a relação entre diferentes
mídias e, particularmente, a incorporação de mídias anteriores por mídias mais
avançadas, considera essa apropriação de recursos anteriormente vigentes pelas
novas tecnologias.
“Segundo esta teorização, as aplicações em hipermídia herdam propriedades das
tecnologias de representação que procuram suplantar (imprensa, pintura, fotografia,
telégrafo, telefone, cinema, vídeo), ao mesmo tempo que as reconfiguram segundo as
estratégias de remediação características do meio digital (jogos de computador, realidade
virtual, fotorealismo gráfico, internet, computação ubíqua).” (PORTELA, 2006)
Assim como o cinema pode ser entendido como a extensão dinâmica do
advento da fotografia e o surgimento de uma programação televisiva apropriouse, inicialmente, das atrações provenientes do rádio, até que se estruturassem
uma linguagem e estética próprias (que pode ser entandida como tendo surgido,
de fato, somente com a reformatação extraordinária da edição pulsante da MTV,
mais de 40 anos depois da disponibilização do veículo), também as mídias
digitais estão em busca, mais de 20 anos após sua disseminação no mercado, de
sua identidade própria, provavelmente multifacetada. Os games, por sua vez,
vêm se apropriando inicialmente de abordagens já seculares e estabelecidas,
como as dos contos e da literatura, compondo uma estrutura de apresentação em
que se somam, ainda, vertentes mais recentes, como a narrativa do cinema
contemporâneo, sobretudo, da linguagem canônica imposta pelos grandes
estúdios e da própria televisão. Composto por este amálgama de mídias diversas,
o game apresenta-se como um modelo em que se permite (e deseja) a
participação efetiva do interessado, agora também na condição de agente da
ação.
De toda forma, qualquer que seja o veículo de comunicação, esta
maturidade chega por meio do próprio processo de existência, uso e
reconfiguração do veículo, de forma adaptativa e cíclica, muitas vezes, sofrendo
abalos nos alicerces que parecem já estabelecidos, para que se insurjam
renovação e diretrizes de ação até então imprevistas.
No meio televisivo o exemplo já apresentado da MTV é, certamente, o mais
apropriado para indicar como se estremecem estruturas arcaicas por meio da
renovação da linguagem, promovendo, às vezes, radicalizações sem volta.
Na Game Developers Conference deste ano, a grande estrela presente foi
o homem que encontrou o caminho da reinvenção dos games, quando este
mercado parecia fadado ao esquecimento: Shigeru Miyamoto, a quem Will Wright
teria se referido como ‘o Steven Spielberg dos vídeo games’ e também ‘nosso
herói’.
Em sua fala, Miyamoto comentou o que chama de visão corporativa da
Nintendo, em uma palavra: risco. E continuou, afirmando que a companhia
sempre tentou se distinguir, assumindo riscos.
“[Miyamoto afirma que] um bom exemplo é o DS, com seu dispositivo de duas telas
sensíveis ao toque. O objetivo último destes jogos é ser divertido. Mas ele comentou que
nenhum dos jogos rivalizou com os riscos do Wii. O GameCube estava a meio caminho
de alcançar uma maior audiência. Ele desejava que tivesse apelo a um número maior de
pessoas e esta é a razão porque o controle tinha um botão A enorme, com uma cor
diferente. Mas a interface era muito complicada para os não-gamers.
Com o Wii, a Nintendo escolheu o grande risco de mudar tudo, incluindo o controle. Ele
dizia que os jogadores tinham ficado muito acostumados a jogar com
as duas mãos...
Então ele mudou para sua visão pessoal... Ele sempre centrava
foco na visão principal do elemento de diversão durante o desenrolar
do jogo. Em seu caso, ele sempre lutou por [uma experiência] positiva:
a face feliz do jogador.
‘O que estou fazendo é apenas me certificar de que o jogo é
tão gostoso de jogar quanto o possível’, ele disse. ‘Nós, como game
designers, sempre repetimos o mesmo erro’ de criar o mesmo jogo
Wiimote: uma nova forma
de jogar?
para nós mesmos, não do ponto de vista de um
(TAKAHASHI, 2007)
jogador”
Tão importante quanto a maturidade do game design, no entanto, é o
processo de aprendizado e plenitude cognitiva dos usuários de games, que
constróem um repertório comportamental e de ampla significação, que os torna
extremamente sagazes e faz com que as futuras experiências se tornem mais
interessantes, prazerosas e imersivas.
Marc
Prensky
elabora
uma
eficiente
ponderação
acerca
destas
características do meio digital e complementa estas considerações, ao afirmar:
“Todo meio de comunicação tem sua própria linguagem – conjuntos de significados e
atalhos que são tomados como verdade por todos que estão acostumados com o meio,
mas que foram aprendidos antes de serem completamente apreciados ou mesmo, às
vezes, compreendidos na sua totalidade... Há também uma linguagem ou ‘retórica’ dos
games de computador, que é partilhada por todos os jogadores, aprendida por meio de
muitas experiências anteriores e, com freqüência, absolutamente opaca para os nãojogadores de games.
Entre as coisas que todo jogador de games tacitamente conhece, faz e procura estão:
-
Todas as coisa podem e devem ser clicadas;
-
Você ‘constrói’ coisas ao clicar em um ícone e arrastá-lo para onde quiser;
-
Você move pessoas selecionando-as e clicando onde quer que elas vão;
-
Há surpresas escondidas, comumente conhecidas como “easter Eggs” para você
encontrar;
-
Há quase sempre mais de uma maneira para se fazer alguma coisa;
-
Você deve tentar [realizar] alguma coisa várias vezes, antes que funcione;
-
Há quase sempre ‘trapaças’ ou caminhos para contornar algo;
-
Jogos sempre podem ser salvos e recarregados mais tarde;
-
Jogos são ‘justos’. Eles não matam você sem te dar uma chance e não exigem
recursos que você não possa adquirir.
A linguagem dos jogos de vídeo e de computador é importante porque, para todos
aqueles familiarizados com ela, certas coisas são extremamente óbvias e transparentes,
mas para os que estão de fora, estas coisas são normalmente difíceis de adivinhar.”
(PRENSKY, 2001, p. 05-30)
Como atestam diversas análises muito apropriadamente, ainda que não
faltem boas idéias para a criação de novos jogos, há um tempo de carência para
que
as
empresas
desenvolvedoras
compreendam
detalhadamente
as
características e a performance de cada nova geração de consoles até que estas
idéias possam ser incorporadas à linha de produção de suas equipes.
Um articulista do site Slate aponta que ainda não foi desenvolvido
qualquer game para a plataforma PS3 até o momento que mereça uma nota “A”
com louvor e que pouco mais de uma dúzia deles deve merecer não mais que um
“B negativo”. No entanto, segundo o texto, o gamer encontrará sem grande
esforço mais de 60 jogos desenvolvidos para PS2 aptos a receber nota máxima e
uma marca superior a 300 títulos dignos de uma nota “B”, como pode-se observar
em listagens disponíveis no site MetaCritic.
No entanto, não se pode crer, por conta destes problemas de percurso,
que os games cairão no ostracismo de tempos passados. Alguns estudiosos
conseguem enxergar melhoras significativas no aprimoramento dos games em
todas as vertentes que envolvem o design e estes avanços, de fato, não podem
ser negados.
No entanto, encontraremos com certa facilidade opiniões que confirmam o
longo trajeto a ser trilhado antes que a apresentação do jogo seja de tal forma
surpreendente que nos faça confundi-lo com a própria realidade.
Mesmo com todo esse avanço, alguns autores não conseguem esconder a
decepção com o incipiente aprimoramento da linguagem, especialmente na
mesmice encontrada nos gêneros, temas, jogabilidade e a absoluta falta de
criatividade na elaboração de roteiros narrativos minimamente coesos, fluídos e
inteligentes na esmagadora maioria dos lançamentos.
James Surowiecki, também colaborador do site Slate, apresenta sem
meias palavras seu desagrado em relação ao tema em outra matéria:
“A questão real, no entanto, é: por que parece estar ficando mais difícil fazer jogos
excelentes. Graficamente, é claro, os jogos parecem nunca ter sido melhores. Mas em
termos da experiência de jogar games – ao menos na forma tradicional single-player –
não está claro que estamos melhores hoje do que há uma década atrás. Os rankings de
‘melhores games da história’ são geralmente dominados por games antigos (pré 2001)...
Isto se dá, em parte, em função da nostalgia, mas também reflete o amplo senso de
descontentamento com os jogos de hoje.” (SUROWIECKI, 2005)
O autor prossegue, pouco adiante em seu texto, comentando um dos
pontos mais polêmicos da vanguarda dos aprimoramentos gráficos das novas
plataformas, como segue:
“Uma das origens deste descontentamento (...) está no que pode ser chamado de
‘paralaxe da realidade’: depois de um certo ponto, o quão mais ‘real’ um jogo fica, no
gráfico e na experiência, mais difícil é para o game parecer real... a mesma lógica se
aplica à jogabilidade e à narrativa. Depois de um certo montante de aprimoramento
gráfico, torna-se difícil suspender a descrença e imergir verdadeiramente... Imperfeições
que poderiam ser descritas como resultado inevitável das limitações tecnológicas dos
primeiros jogos agora se evidenciam de forma incomumente frustrante... às vezes, são
coisas pequenas [que nos frustam. Por exemplo]... Porque posso pular pelo muro mas
não por esta cerca? E, algumas vezes, as falhas são imensas: Porque estas histórias não
fazem qualquer sentido? Uma pessoa faria algo desse tipo [de ação estúpida], mesmo? .”
(SUROWIECKI, 2005)
2.5 Sonorização: Uma Outra Abordagem Narrativa
Também a sonorização mostra-se fundamental para o desenvolvimento de
uma ambientação imersiva nos jogos e é elemento imprescindível para a
condução narrativa de certos games. Alguns deles, especialmente, foram
concebidos desde o primeiro lampejo criativo como games cuja narrativa e fruição
só se manifestam por meio da interação proporcionada pela música presente ou
pelos efeitos sonoros, responsáveis pela mudança de fases, apresentação e
superação de certos objetivos ou ambientação climática, como veremos adiante.
Interessante matéria disponível online já atenta para o mérito deste
recurso, imprescindível na complementação da jogabilidade e vivência imersiva.
“Som e música são freqüentemente esquecidos como elementos do vídeo game design.
Deve ser porque o som afeta você com mais sutileza do que o visual espetacular ou a
jogabilidade em hipervelocidade. De fato, muitas vezes a marca de um design de som
superior é que você não o percebe conscientemente. Em lugar disso, trabalha em você
subconscientemente – elevando a tensão, manipulando o humor, e atirando você no
mundo do jogo, de forma leve e inexorável.
Considere o agourento som ambiente de Resident Evil, os efeitos de que são compostos a
tensão e o horror, à medida em que você se lança sobre os implacáveis zumbis
mastigando seus camaradas do Alpha Team. Mesmo os games do começo como Space
Invaders deviam muito de seu compulsivo apelo por entrar em sua cabeça com o
repetitivo e maquinal baque surdo. Muito adequadamente projetados, som e elementos
visuais trabalhavam em conjunto para produzir uma experiência maior que a soma de
suas partes.
Jogadores mais dedicados passaram a apreciar o quão bons música e som podem ser
para a plena jogabilidade. Os arcades clássicos do começo como Pac-Man e Defender
baseavam-se em esquemas de som soberbos para nos prover com sonatas, melodias,
bips e zumbidos que nunca havíamos ouvido antes... Um grande exemplo de design de
som simples e efetivo, Space Invaders deve larga parte de seu apelo à sua trilha sonora
ameaçadora e paranóica. Não a música em si, mas a trilha de áudio surda vai acelerando
seu tempo à medida em que os invasores inimigos vão pressionando, cada vez mais
próximos”
” (MCDONALD, 2001)
Este recurso, também conhecido como música interativa, foi tema de
interessante análise de Ryan Barrett, como segue:
“A música é um dos mais poderosos caminhos para inspirar nossos sentimentos e
emoções... Se bem feita, a música pode ser também tremendamente efetiva nos vídeo
games”. (BARRETT, 2001)
De acordo com suas observações, a música interativa desempenha papel
fundamental na dinâmica do jogo, como observa:
“Qualquer um que tenha jogado Super Mario Bros deve se lembrar da vigorosa seqüência
de acordes “cartunescos” que tocava quando o temporizador ia caindo abaixo de um
minuto e o tema familiar tocava aflitivamente. Nada mudava na jogabilidade, mas o
‘tempo’ [da música] impingia uma necessidade quase palpável de uma velocidade
galopante para vencer cronômetro. Podia ser cruel, mas era muito funcional.” BARRETT,
2001)
O valor da música como elemento condutor no game design não é novo,
certamente, ainda que só atentemos para este fato apenas eventualmente.
O celebrado designer Miyamoto já mostrava especial atenção à influência
de som e música no processo de criação do jogo como trilha sonora capaz
sustentar sua dinâmica e oferecer deleite na jogabilidade, como pode-se observar
neste breve trecho da
entrevista concedida em 1998 à Nintendo Online
Magazine, ao tratar do tema na concepção do game Ocarina of Time,
desenvolvido na esteira de sucesso da franquia Zelda e lançado naquele ano
para a plataforma Nintendo 64:
“Kushida: Junto com os gráficos, o som desempenha um importante papel em ‘Ocarina of
Time’. Com a Ocarina (instrumento de sopro globular feito de porcelana, terracota ou
pedra, semelhante a uma flauta) na condição de subtítulo do jogo, é seguro assumir que a
música está atrelada à história?
Miyamoto: Acho que é hora de posicionar o palco para a Ocarina. Sim, a chave para este
jogo é a música. É a chave para iniciar os eventos ou resolver os problemas.
Basicamente, fizemos com que a música tivesse um papel que você esperaria que fosse
desempenhado pela magia nos jogos tradicionais. Vale atentar que o diretor da equipe de
jogo é Kouji Kondou, que vem trabalhando conosco desde Super Mario Brothers. Nossa
idéia é mesclar lenda e música juntas.
Kushida: Mesmo deixando de lado a Ocarina, os sons parecem casar perfeitamente com
o ambiente de Hyrule.
Miamoto: Desta vez queríamos capturar de verdade a natureza de Hyrule e isso se refletiu
na sonorização também. Então, com o auxílio de Kondou, fizemos um CD de [música]
ambiente para coisas como o som do oceano ou do correr do rio” (KUSHIDA, 1998)
Ao final da Game Developers Conference 2006, em São Francisco, a
pesquisadora Gianna Cassidy, da universidade de Glasglow Caledônia, na
Escócia, apresentou seu trabalho “Optimising Player Experience with Music:
Soundtrack vs. Personal Choice”, que estuda o impacto emocional da música no
decorrer das partidas de games sobre os jogadores. Neste estudo, é possível
observar que, durante as partidas, jogadores que optam pelo uso de suas
próprias trilhas sonoras, em detrimento das composições feitas especialmente
para os jogos, mostram significativo ganho de desempenho na jogabilidade. Este
fenômeno suscita forte questionamento em relação à produção musical para este
meio e deve ser analisado com especial atenção, visto que a confirmação desta
hipótese sugere a potencial rejeição não apenas da trilha sonora, mas a própria
derrocada de um título, mesmo que em outros quesitos do game design sua
qualidade e competência sejam inquestionáveis.
Em estudo da mesma autora para o eMotion Lab, em parceria com o Dr.
Raymond MacDonald, entitulado “The Effects of Aggressive and Relaxing Music
on Driving Game Performance”, que complementa as idéias anteriormente
apresentadas,
percebe-se
um
quadro
menos
complicador
para
os
desenvolvedores ao propor que, durante partidas de jogos de corrida, os
jogadores influenciados pela audição de músicas de cunho mais agressiva não
se
tornam,
necessariamente
mais
violentos
ao
volante.
O resultado mais interessante observado é que o impacto emocional provocado
pelas músicas não apresenta correlação direta com o eventual aprimoramento de
performance dos jogadores.
“Eu esperava que a música agressiva fizesse as pessoas dirigirem um pouco mais
depressa. Isto aconteceu, no entanto, e fez com que eles batessem em um número maior
de cones e barreiras que os outros. Houve
mais batidas quando os jogadores eram
impossibilitados de ouvir até mesmo seu
próprio carro. Eu teria esperado que [o uso
de músicas mais tranqüilas, porém] os
deixasse mais relaxados e mais precisos.
Não aconteceu. A troca de música causou a
desaceleração por um trecho mas também
distorceu suas habilidades de estimar o quão
rápido
estavam
correndo.
Em
outras
Música nos games: alterando a
performance dos jogadores.
palavras, eles pensaram que estavam dirigindo muito mais brandamente do que
realmente estavam.” (CASSIDY, 2005)
Assim como em outras áreas do game design, também a produção de
sonorização conta com um vasto número de especialistas, que primam pela
criação de recursos da melhor qualidade, do mais tradicional ao mais incomum,
focando a unidade com o desenvolvimento do game.
A experiência vivida por meio de Nights Into Dreams (1996), jogo
desenvolvido para Sega Saturn, pode não ser única, mas é certamente
inovadora. O game propõe um misto de agilidade acrobática de seu personagem
com a soma de elementos sonoros e musicais que fazem com que o mais
interessante de cada partida não seja o objetivo de conquistar o pódio com a
maior pontuação possível de ser alcançada, mas a vivência rica do jogo, que se
complementa por meio da construção melódica e seqüencial de sons diversos,
com os belíssimos gráficos 3D do ambiente virtual do game.
Em termos de conceito e jogabilidade pode-se dizer que o game deve algo
de sua inspiração à estrutura dinâmica de Sonic The Hedgehog (1991) e Gunstar
Heroes (1993), pela dinâmica urgente e juvenil própria dos lançamentos da Sega
e também pela qualidade das trilhas sonoras destes games, que tornaram-se
referências em suas épocas e ícone atemporal, como no caso das composições
musicais de Sonic.
Em Tokyopia,
um site
que
abriga
jornalistas,
artistas,
editores,
compositores e designers ligados ao mercado de games do Japão, o analista
Justin Keeling comenta a preciosidade e o gabarito técnico de Nights, bem como
a importância de um game design cujo andamento é conduzido pela
musicalidade:
“Nights é um extraordinário híbrido de puzzle musical com o gênero de corridas. Você voa
através de um percurso de corrida aérea, pontuada de trechos curvos com anéis. Toda
vez que você passa por um destes trechos ouve um sino badalar. Você tem três segundos
para encontrar o próximo trecho e voar através dele. Cada badalar sucessivo eleva uma
escala tonal: do-ré-mi e assim por diante.
Se você aprende bem os caminhos, pode conectar estas badaladas em alta velocidade
em uma série de notas que – e esta é realmente a grande sacada vital de Naka (Yuji
Naka, produtor e programador chefe do game) – complementa uma fantástica trilha
sonora.
Mesmo hoje o resultado é uma jogabilidade orgânica e enlevante. As pessoas que
conhecem o jogo não jogam Nights para chegar ao final. Elas o jogam em virtude da
excepcional união ‘segundo-a-segundo’ destas badaladas por puro deleite. E música tem
tudo a ver com isso.
Os gráficos? Continuam a parecer belos. Inicialmente eles eram espantosos. Em 5 anos?
Eles serão, provavelmente, uma piada. Mas a música de Nights era uma das grandes
trilhas sonoras de seu tempo. E, nos próximos 10 anos, continuará sendo o ingrediente
mágico de um clássico de todos os tempo.
Lição: boa música sempre irá durar mais que bons gráficos”. (KEELING, 2004)
De fato, a observação final de Keeling parece encerrar as dúvidas em
relação ao papel imprescindível da trilha sonora no game design e muitos
produtos devem grande parte de sua fama à sonorização competente que
acompanha o resultado final. Talvez o maior exemplo da atualidade resida, por
razões óbvias, no game Guitar Hero, que tem uma lista de canções que cativaram
o interesse e o coração de multidões por todo o planeta. Neste caso, vale
salientar ainda o diferencial de jogabilidade, por meio da surpreendente interface
do hardware, que conta com um admirável controle em forma de guitarra, que
testa as habilidades do usuário. Porém, mesmo games que mantém sua estrutura
de criação dentro de um perfil comum de jogabilidade e design, sem apostas em
interfaces inovadoras, como se vê no caso de games como a série de corrida
Ridge Racer, lançada para Playstation, são capazes de atrair um vasto público
interessado (o jogo encontra-se hoje em sua sétima versão, já para PS3) ao
saber dosar a união criteriosa e eficaz de boa jogabilidade e temas musicais
inspirados de boa qualidade.
Por fim, este tópico não estaria completo sem um breve comentário sobre
Myst, o game lançado em 1993 para PCs e que propunha uma incomum
sensação de envolvimento com a fascinante e inóspita ambientação presente no
jogo. Grande parte desta sensação imersiva do game advinha, no entanto, do
clima feérico ao qual
o
jogador
era
induzido, por meio
de
intervenções
sonoras de efeitos e
musicalidade,
conferiam
estranheza
que
singular
ao
evento, tornando a
experiência do jogo
inovadora e insólita,
porém
Myst: Beleza com ambientação misteriosa e soturna
profundamente marcante e sedutora.
2.6 Game Design Hoje
Para que possamos vislumbrar as inovações que se esboçam no horizonte
futuro do game design, é imperativo que observemos se esta indústria está atenta
às adaptações procedimentais que se fazem necessárias para a sobrevivência e
renovação de sua linha de produtos.
Ainda que boa parte do setor se mostre reticente ao risco de mudanças e
seja relativamente conservadora no modus operandi e no lançamento de
experimentações conceituais, há exemplos que mostram certo sopro revigorante
nos títulos atualmente disponibilizados.
Abaixo, estão listados alguns destes games que apresentam conceito e
desenvolvimento criativo, com grandes doses de inspiração e
que indicam a
condição de serem precursores potenciais de nichos a serem explorados:
•
Grand Theft Auto;
•
Half Life;
•
Nintendogs;
•
Soul Caliber;
•
Viewtiful Joe;
•
Spore
Em um ou outro aspecto, todos os games citados apresentam diferenciais
que os transformam em referências para o exercício do game design como um
processo dinâmico e evolutivo.
3. Perspectivas para um Breve Futuro
Ainda há muito a ser comentado em relação ao aprimoramento técnico dos
games e consoles, bem como os aspectos narrativos que começam a compor boa
parte dos games, independentemente de gênero. Isto faz com que até mesmo
temas anteriormente áridos ao desenvolvimento mais profundo de um histórico ou
situação que contextualize a presença de personagens e o pano de fundo da
ação contemplem as possibilidades de uma roteirização com desdobramentos em
múltiplas camadas e ramificações. Bons exemplos são Half Life, o game que
trouxe diferencial e contexto aos FPS, por meio da criação de uma ambientação
complexa e de densa trama, envolvendo instâncias governamentais, seres
alienígenas bizarros e cientistas perturbados com uma sucessão de mistérios
lúgubres, ou os God Games, que começam a apresentar outras propostas e
histórias mais elaboradas e impactantes.
A própria dinâmica de criação de novas plataformas e games da
atualidade, imposta pelo anseio de certa parcela do mercado e pela perspectiva
de ampliação da base de jogadores pelas empresas do setor, faz com que
propostas de um viés inovador estejam sempre em elaboração, ainda que a
aceitação do público alvo em relação a estes produtos seja bastante incerta e
temerária para esta indústria.
Ed Barton, analista de games da Screen Digest, uma companhia de
pesquisa na área de multimídia com mais de 30 anos de mercado, tem observado
esta resistência das empresas desenvolvedoras e vem afirmando que esta opção
pela reutilização de velhas franquias, em detrimento de experimentações em
outros formatos de jogabilidade e narrativa digital, é uma “síndrome comum na
indústria do vídeo game”:
“Títulos inovadores e maravilhosos são às vezes ignorados (pelos consumidores),
enquanto títulos repetitivos com menor grau de aprimoramento na jogabilidade e nos
gráficos acabam oferecendo um melhor retorno [financeiro] aos distribuidores de jogos”.
(Ed Barton, 2007)
O analista compara esta situação à outra equivalente, vivida pelas grandes
empresas do mercado fonográfico, que mantêm um permanente lançamento de
sucessos nada inovadores com nomes de peso como Madona e Elvis Presley,
para garantir retorno efetivo de investimentos com pequena margem de erro,
podendo assim, ao menos teoricamente, atualizar seu catálogo com novas
bandas e outros lançamentos de menor apelo comercial.
Também a questão narrativa, como elemento de peso no processo de
criação e design de um game, parece adquirir um grau ainda maior de relevância
quando é possível observar-se que, em muitos casos, a decisão para a
concretização de uma ou outra idéia se dá baseada em inúmeros fatores e
critérios, que parecem ter pouco a ver com o objetivo final desejado (ou , às
vezes, pretensamente proposto) que é a diversão do consumidor final.
O tema desta questão não é novo e vem sendo abordado em uma série de
artigos em revistas especializadas e sites que tratam o game com seriedade e
uma abordagem madura e profissional.
Um dos mais contundentes críticos deste modelo de desenvolvimento de
jogos que privilegia as decisões das planilhas tecnocratas, deixando aspectos
realmente cruciais do game design para segundo plano, e que se pode ver em
inúmeros jogos disponíveis hoje para download na internet, é o articulista e editor
da revista digital Game Zero, que atende pelo sugestivo e instigante codinome
R.I.P.
Em sua análise, R.I.P. afirma encontrar um elevado grau de amadorismo
no mundo corporativo das empresas desenvolvedoras de jogos eletrônicos e
mostra temor em relação à forma como este mercado será percebido pelo usuário
futuramente.
Em sua opinião, que não difere de outros entendidos do tema, a
criatividade é fator fundamental no game design, sem o qual os recursos
inovadores da microeletrônica estarão reciclando somente as velhas fórmulas
conceituais, sob uma nova roupagem tecnológica, dando mais densidade e foco
às observações já apresentadas de Crawford.
“Você também tem games sendo projetados ou conceitualizados por equipes de
marketing, ou grupos de gerenciamento que, na melhor das hipóteses, também não têm
jogado um game desde o Atari 2600 que tinham quando eram crianças, ou que jogam
ocasionalmente, e isto é somente passivo. Destas pessoas, você também consegue
idéias para games do tipo 1) o que é mais vibrante no mercado (isto é, ‘Igual ao Mario’
sendo o exemplo mais lugar-comum ou 2) ‘Eu nunca vi um jogo como este, então isto
deve ser inovador’ vindo de alguém que não é um gamer e que não consegue perceber
que sua ‘nova idéia’ é como um cavalo morto que não há nem mesmo como bater com
uma vareta. Não, estes cenários não são exclusividade do vídeo game. De fato, isto já
ocorreu com várias linhas de brinquedos e séries de desenho animado ao longo dos anos.
Mas o fato é que este tipo de desenvolvimento de games é a forma surpreendente como
a maioria dos títulos é criada. É até mesmo freqüentemente considerado como sendo um
modelo de vendas.
É muito difícil oferecer exemplos sem que alguém comece a reclamar de difamação, mas
é evidente se você já esteve presente a dúzias de encontros em feiras de negócios,
apenas para ouvir de cada empresa a respeito de seu clone de Doom/Quake como o
‘mais inovador título já criado’... Claro que há alguns lançamentos novos. Claro que seu
jogo pode fazer mais [do que os jogos antigos]
porque a máquina em que você está rodando o jogo
é 100 vezes melhor do que o 486DX2 66/Pentium
180, com uma placa de vídeo de 1MB/4MB (que era
comum para os gamers quando Doom e Quake
estavam no topo da lista).
Mas a tecnologia é o que, freqüentemente, tem
tornado seus jogos melhores e não a inovação”
(R.I.P., 2000)
Clones de Doom: centenas
Ainda assim, um sem número de pesquisas segue em curso neste
momento, buscando estabelecer os alicerces da próxima geração de games,
como apontam as informações disponíveis em relação à ubiqüidade, realidade
virtual, realidade aumentada, os sensores de presença associados a programas
de reconhecimento de voz, imagens e expressões faciais do usuário e outros
aparatos, que podem ser vistos inicialmente com estranhamento pelo usuário
comum, dado que propõem uma nova usabilidade ou filosofia de comportamento,
não mais audacioso, no entanto, do que foi, provavelmente, a apresentação
pública do primeiro fonógrafo com a voz de Caruso impressa em cilindros de cera
ou dos veículos automotivos de motor à explosão, que apareceram para disputar,
com muito barulho e cheiro de óleo queimado, as ruas com carroças de tração
animal.
Paralelamente, muitos esforços são dedicados à pesquisa de novas
abordagens plásticas e visuais, na tentativa de ampliar as possibilidades de
apresentação dos gráficos para além do fotorealismo de alguns e do traço
cartunesco de outros.
Algumas destas propostas conseguiram transformar-se em produtos de
aceitação relativamente boa e alcançaram até mesmo reconhecimento da crítica
na condição de criações de gabarito artístico, como os já citados Okami, Hotel
Dusk Room 215 e o inusitado Electroplankton.
Mais idéias e concepções inovadoras vêm sendo pesquisadas, criadas e
sugeridas, em busca de diferenciais conceituais para o game design, aliando
beleza, vigor estético e princípios de jogabilidade a atraentes e insólitos
lançamentos, como apresentados abaixo:
•
Rez: Game desenvolvido para os consoles de sexta geração (Dreamcast /
PS2) que apresenta uma espetacular fusão de gráficos baseados em
estruturas poligonais básicas e visual baseado na obra do artista plástico
Wassily Kandinsky. A sincronia entre os elementos visuais e sonoros cria um
produto único, inusitado e quase hipnótico;
•
Shadow of Colossus: Game já amplamente citado em trabalhos acadêmicos e
artigos, por sua característica ímpar de imagens renderizadas em 3D, com
uma paleta de cores absolutamente não fotorealística, que lhe confere certa
harmonia de contrastes e beleza soturna;
•
Evil Genius: O game, criado para PC em 2003, destaca-se pela singularidade
do conceito e do design, com uma ambientação que remonta os thrillers
clássicos de espionagem dos anos 60 em que o jogador assume o papel do
vilão megalomaníaco;
•
Mono: Freeware que combina jogabilidade, música e uma explosão de cores,
baseado no mesmo princípio dos games de tiro;
•
Okami: Reconhecido como o estado-da-arte em termos de jogabilidade
intuitiva, gráficos primorosos, baseados na arte oriental, sons, música e
etapas subsequentes de desafio;
•
Katamari Damacy: Frente às limitações apresentadas pelo sistema, os
desenvolvedores do jogo foram capazes de criar uma pérola do game design
atual, com centenas de objetos simultâneos de visual infantil e vagamente
cubista. O objetivo básico do game é rolar para coletar objetos.
Para o futuro a curto prazo, no entanto, independentemente da incessante
procura pelos caminhos do game design, os analistas de mercado apostam que o
usuário tende a voltar-se para os gráficos realísticos mais uma vez, deixando de
lado toda a jogabilidade proposta pela tecnologia inovadora da Nintendo, como
aponta este estudo do Wedbush Morgan Securities, em que o analista Michael
Patcher prevê que o PS3, da Sony deverá liderar a disputa nas vendas
(conhecida como Market Share) do mercado americano. O estudioso ressalta,
porém, que esta vitória deverá se dar não apenas pela qualidade gráfica superior
do produto ou do lançamento de games mais primorosos, mas pelo apoio
oferecido pela indústria cinematográfica a um ou outro leitor de DVDs da nova
leva de consoles, Blueray, aposta da Sony e HD DVD, da Microsoft.
“Independentemente do esforço dos três fabricantes de console em lançar conteúdo
exclusivo, estamos na expectativa de que a última rodada na guerra dos consoles seja
decidida pelos estúdios de cinema.” (PATCHER, 2007)
“Se os estúdios abraçarem o padrão Blueray da Sony para os DVDs de alta definição,
acreditamos que a Sony irá ganhar uma vantagem insuperável sobre a Microsoft. Se os
estúdios abraçarem o formato rival da Sony, o Toshiba HD DVD, acreditamos que a
Microsoft possa manter seu movimento de vantagem inicial e dominar as vendas de
software nos anos que virão... Também esperamos que o mercado de entretenimento
interativo cresça entre os pré-adolescentes até 2009. Depois de 2009 esperamos
rendimentos de fontes não tradicionais (games online, jogos casuais, conteúdo para ser
baixado e games contendo propaganda), que deverão crescer em um nível significativo...”
(IVAN, 2007)
Outro aspecto que desponta como probabilidade para as novas fronteiras
do game design é o da jogabilidade por meio de novos controles, a exemplo do
Wiimote, controle desenvolvido pela Nintendo para seu mais recente console e
que, dado o sucesso com que foi recebido não somente pela comunidade gamer,
mas até mesmo por uma ampla faixa de jogadores casuais e não-jogadores, já
vem sendo utilizado como base para a criação de recursos com o mesmo
princípio de ação e até mesmo controles com características semelhantes, em
pesquisas já tornadas públicas pelos dois outros pesos pesados dos consoles,
Sony e Microsoft.
A expansão de mercado conquistada pela Nintendo não foi um ‘chute’
casualmente bem sucedido. De fato, a empresa já vinha perseguindo com afinco
há muitos anos este desejo. Em entrevista concedida em 1991 à Game Power
Magazine, o ilustre criador Miyamoto já declarava este empenho em criar um
produto que pudesse ser recebido pelo público sem resistência e que oferecesse
diversão a todos, de maneira fácil e intuitiva, como segue neste breve trecho,
disponível online:
“I: Por favor, conte-nos suas resoluções para o futuro.
M: Gostaria de criar algo para todo mundo e qualquer jogador. Algo que faça as pessoas
dizerem: ‘Games são para todo mundo!’.” (1991)
O site da CNN também informa detalhes sobre o longo processo de
pesquisa até chegar à revolucionária criação:
“A Nintendo projetou dúzias de protótipos antes de deparar-se com o Wiimote. Miyamoto
conta que as primeiras versões pareciam-se mais com um controle tradicional. Alguns
eram excêntricos, outros complicados. Os designers chegaram à versão atual retornando
ao decreto de Iwata para combater a indiferença, não a competição”. (O’BRIEN, 2007)
A tecnologia desenvolvida pela Nintendo parece ter, de fato, apresentado
o argumento definitivo de que é preciso renovar na forma de uso e jogabilidade,
tanto quanto nos gráficos ou na maneira como será contada a história.
Atentos, os fabricantes começam a apresentar novidades, como é o caso
da pesquisa proposta pelo desenvolvedor Paul Coultron, que busca novas formas
de aproveitamento da tecnologia de sensores do Wiimote em outro aparato, que
não compete diretamente com o mercado de consoles, e que está intimamente
presente no cotidiano de uma imensa maioria de habitantes dos grandes centros
urbanos: o celular.
Coultron antevê o largo potencial de uso dos sensores em games para os
dispositivos móveis, um campo até então impensado e inexplorado. O
desenvolvedor foi além da mera teorização, apresentando em recente palestra
formas de interagir com os games por meio da tecnologia, ao inclinar os
aparelhos e sacudi-los como forma de obter resposta às ações que se
desenrolam no ambiente virtual. Em sua opinião, o uso de câmeras também pode
ser aproveitado como recurso para a criação de novos jogos para celulares,
podendo ser utilizadas como miras em embates entre diferentes usuários no
mundo real, da mesma forma que projetos já existentes (a exemplo de Mogi, que
será abordado mais à frente) oferecem diversão real em interações com o digital.
Estas perspectivas demonstram que a evolução dos games está calcada,
claramente, na pesquisa de novos meios e suportes, mais do que as questões
narrativas que vimos apresentando no decorrer desta análise, embora a presença
destes elementos não possa ser ignorada e tenha demonstrado, em pontuais
momentos da história dos games, importância crucial.
Há autores que observam a questão com desapaixonada isenção,
testemunhas de um fato que pode conduzir à criação de novas formas de
diversão por um ou outro caminho, independentemente de nossos interesses e
anseios.
Em seu livro, Andrew Rollings e Ernest Adams fazem seus prognósticos
em relação ao tema:
“Muitos aspectos do game desgin são independentes do hardware que roda os jogos:
assunto, tema e estilo de arte, por exemplo. Contudo, o futuro do entretenimento
interativo está bastante próximo do futuro do hardware de computação.
Neste momento, a ênfase principal no design de hardware está em fazer os jogos
parecerem e soarem melhores e, de fato, a quantidade de melhorias audiovisuais nos
últimos 20 anos tem sido atordoante. Mas o hardware para games faz muito mais do que
isso: determina quão complexos e quão inteligentes os jogos podem ser. E isso, por sua
vez, afeta o tipo de jogos que podemos fazer.
Nós apenas começamos a construir games que simulam o comportamento em um nível
acima do trivial, por exemplo. Para simulações mais poderosas, precisaremos de
máquinas mais poderosas.
Hardware especializado para games deverá incluir redes neurais de processamento e
chips com reconhecimento de voz ou sintetizadores da fala. Deveremos ver chips
especiais dedicados à solução de problemas de exploração ou para a simulação de
milhares de micro automações, como [a apresentação de imagens simuladas de] formigas
no formigueiro ou soldados no campo de batalha. Em um futuro à frente deverá haver
chips que conheçam regras gramaticais de uma língua e que poderão gerar diálogos reais
imediatos, mais do que respostas pré-gravadas.
Quando estes dispositivos sairão dos laboratórios para os produtos de consumo é uma
outra história, dependendo mais de quanto custaria para construir do que quão útil será
nos games. Mas a pesquisa e desenvolvimento de hardware para games já está
chegando e irá crescer, agora que o desenvolvimento de games está começando a ser
reconhecido como um assunto legítimo de estudo acadêmico.” (ROLLINGS / ADAMS,
2003 533/534)
Realmente, o progresso do fenômeno ‘game’ como objeto de estudo
parece prosseguir com fôlego, da mesma forma como, paralelamente, as
empresas fabricantes de equipamentos mantêm-se na intensa tarefa de
pesquisar as possibilidades que se descortinam para o hardware de amanhã.
A própria urgência autofágica desta indústria a impede de deixar para o
amanhã o próximo passo na corrida desenvolvimentista de consoles, sob riscos
que variam da perda de uma significativa parcela de mercado até a irrefreável
derrocada. Chris Lewis, responsável pela área de Home e Entertainement da
Microsoft reforça a constância de desenvolvimento em sua recente declaração:
“Sempre que você desenvolve alguma coisa, isto já está ‘velho’... É claro que já estamos
pensando a respeito disso... estamos constantemente pensando a respeito do próximo
aparelho, nós temos que fazê-lo...você não pode descansar nas láureas deste negócio, os
consumidores não deixarão. Os desenvolvedores certamente não nos permitirão. Portanto
isso está acontecendo neste momento.” (LEWIS, 2006)
A nota ainda observa que, provavelmente, o Xbox 360 estará no auge de
sua performance por volta de 2010. Seria ingênuo considerar que as demais
fabricantes estão impassíveis a esta movimentação. Suas equipes de pesquisa
certamente já têm planos com perspectivas para os próximos consoles.
No campo da criação conceitual, porém, outros autores também
vislumbram perspectivas, o que corrobora o dinamismo deste mercado em várias
frentes, como se pode ver na proposta de Chris Crawford e sua nova criação
conceitual
Storytron,
bem
como
as
inovações do console Wii, da fabricante
Nintendo ou os caminhos potenciais da
narrativa cada vez mais cinematográfica
Storytron: Proposta narrativa de Crawford
dos novos games.
3.1 Perspectivas Futuras na visão de Chris Crawford
Como já foi afirmado anteriormente, o game designer e escritor Cris
Crawford, notabilizado por sua contundente opinião em relação à paralisia
vigente na esfera decisória das empresas desenvolvedoras de games, mantém
inalterada sua crítica e torna claro que, em sua concepção, esta inércia
experimentalista deverá se prolongar por tempo indeterminado e preocupante,
uma vez que esta postura se contrapõe à necessidade de ampliar a base de
audiência dos apreciadores de jogos, como forma de fortalecer o mercado,
solidificar o volume de vendas e minimizar custos de produção.
Em termos materiais e de recursos, o aprimoramento tecnológico deverá
se dar continuamente pelo implemento dos gráficos, som e, eventualmente, o
meio para interação, ou seja, o sistema de controles, aparatos e mediadores.
Esta possibilidade parece mais provável tendo em vista o próprio histórico
de lançamento dos consoles, que privilegiam o desenvolvimento de recursos
existentes praticamente desde que os primeiros games ganharam a sala de estar.
Crawford mostra-se claramente pessimista em relação ao desenvolvimento
de novas linguagens para os games, ao ser questionado sobre o tema em
recente entrevista:
“de fato, não tenho visto [em vinte anos] nenhuma tentativa séria nesta direção...
Ninguém muda até que esteja com dores” (CRAWFORD, 2006)
Para ele, a indústria de games deveria se espelhar no consolidado
mercado cinematográfico, que conseguiu se estabelecer como uma potência com
visão
de
entretenimento
de
massa
sem esquecer
a
necessidade
de
diversificação, atenta ao constante exercício de reciclagem.
“Meu conselho para a indústria dos games seria sinceramente que copiem Hollywood
mais de perto. A indústria de games realmente opera em um modelo muito similar a
Hollywood com uma imensa exceção, que é o fato de não terem um sistema de
‘semeadura’ de novos conceitos. Hollywood sabe que precisa de novas idéias... [e] tem
um sistema para dar honras a idéias estranhas que não são necessariamente comerciais.
A indústria de games não faz nada assim e esta é a razão porque não tem novas idéias e
mantém-se reciclando sempre as mesmas velhas idéias... Quando eu olho 20 anos para o
futuro, vejo exatamente a mesma indústria de games” (CRAWFORD, 2006)
O autor não está sozinho em sua avaliação, como atesta o artigo online da
Gamethink, ao considerar a mesmice dos aspectos visuais dos gráficos
comumente visto nos jogos, que observa:
“Comparado à arte contemporânea os games são extremamente conservadores. À
despeito das tentativas isoladas para produzir algo novo, o paradigma dos gráficos para
game permanece rígido. [O gráfico] evoluiu dos pixels para os sprites e então, após um
parêntese com os vetores, [seguiu para] o 3D baseado em polígonos e foi só. Inovações
como o cel-shading (texturas de sombreamento) são sugadas pelo paradigma, que as
adapta e as uniformiza. Existe um vasto campo para progredir neste domínio. Um
ilustrador de estilo marcante pode trazer personalidade ao conceito que pode, por sua
vez, inspirar um game. E há uma série de técnicas usadas em CGI que ainda não
encontraram uma aplicação nos games.” (CULKIER, 2006)
Ainda que estas observações façam sentido à luz dos fatos atuais, vale
considerar, apenas para o livre exercício das ponderações, que além das
experiências com cel-shading (a exemplo o excelente Jet Set Radio), outras
técnicas têm sido incorporadas com padrões gráficos diferenciados, como podese observar em propostas como Hotel Dusk Room 215, Okami, Meteos, Trauma:
Under The Knife, Wario Ware e outros jogos, que sugerem outra abordagem
visual para os games. Ainda que sejam iniciativas
tímidas frente à profusão de lançamentos de jogos
com padrão gráfico convencional, vale levar em
conta que também no campo da jogabilidade e da
narrativa,
outras
experimentações
têm
sido
apresentadas.
Okami: Design inovador e
jogabilidade diferenciada.
Independentemente
das
características
visuais do game, no entanto, Crawford parece ter
uma visão mais ampla em relação às incertezas do game design contemporâneo
e entender com certa clareza a necessidade imprescindível de um ponto de
equilíbrio nos aspectos conceituais e mercadológicos da questão, como forma de
vencer os atuais desafios para a sobrevivência do mercado de games, ao afirmar
a importância de buscar novas estratégias, que tragam frescor e inovação para a
criação de jogos. Ao sugerir que esta indústria copie o modelo do cinema
canônico, o autor propõe o caminho da pesquisa em novos campos, técnicas,
idéias, princípios de jogabilidade e narrativa, conceitos e abordagens imersivas,
da mesma forma que a máquina de ‘block busters’ hollywoodiana investe de
maneira racional um expressivo montante em novos talentos e produções, às
vezes bizarras para os padrões de uma determinada época, mas que apontam
uma nova tendência ou acabam por criá-la, a despeito do ceticismo vigente.
De certa forma, este princípio de ação esboçado pelo autor vai de encontro
aos primeiros dias do game design quando, pela falta de um padrão testado e
estabelecido, os jovens artistas, engenheiros e técnicos, recém convertidos à
condição de criadores de games, contaram com uma iminente oportunidade de
concepção e produção de novas propostas de diversão por meio da
microeletrônica. De outra forma, jamais seria possível vermos sucessos como
Pacman e Pitfall, que foram idealizados na contramão dos bem-sucedidos jogos
espaciais e de tiro, ou mesmo The Legend of Zelda, que propunha o desenrolar
de uma história de múltiplos desdobramentos como motor da aventura.
Reforçando a questão dos gráficos, há pouco abordada, já se vislumbra na
atualidade - e contrapondo-se ao pensamento de Crawford - uma nova linha de
pensamento, desta vez assentada sobre o sucesso da plataforma tecnicamente
menos desenvolvida da última geração de consoles, mas tremendamente
revolucionária da Nintendo (apenas para efeito de comparação o PS3 da Sony
utiliza um poderoso processador de 3.2 Ghz, enquanto o Wii apresenta somente
729Mhz de processamento). Embora algumas análises tenham chegado a sugerir
que o console da Nintendo sequer podia ser considerado de próxima geração, o
produto faz uso de todo arsenal de boas histórias de seu antecessor Gamecube,
além dos novos jogos especialmente criados para usufruto pleno do perfil
infinitamente mais interativo e cativante dos joysticks remotos. As empresas
concorrentes já se mostram empenhadas em utilizar-se dos mesmos recursos de
interatividade oferecido pelo Wiimote em suas plataformas, para gerar um novo
grau de envolvimento de seus usuários com a nova leva de games de seus
consoles, visando também ampliar o nível de aceitação de seus equipamentos
junto a não-jogadores e novos interessados potenciais.
Neste sentido, vale ressaltar que a estratégia da Nintendo em busca de
novos
interessados,
que
em
nada
se
assemelham
ao
adolescente
“gamemaníaco”, começou, de fato, ainda antes do lançamento de seu
revolucionário console, por meio de propostas de jogabilidade que incluíam
aparatos como o já antiquíssimo Virtual Boy, os já citados tambores de Donkey
Konga e a plataforma DS, evolução do mini-console Gameboy, que possibilita
ações muito inovadoras na jogabilidade, com telas touch screen e princípios de
usabilidade que permitem migração de dados, animações e diferentes
visualizações do mesmo game de uma tela para outra. A própria idéia do
Wiimote, o joystick sem fio do novo console, não é recente e sua realização era
desejada há mais de dez anos, mas inviável técnica e financeiramente, dados os
custos de produção do aparelho e a adaptação de sensores capazes de
interpretar adequadamente os movimentos necessários ao desfrute dos jogos.
Contudo, tais perspectivas não parecem mudar a opinião do designer.
Suas observações, aliás, foram de tal forma abaladoras no meio profissional do
game design que não faltam manifestações contra e a favor de suas idéias.
Entre estas muitas manifestações, o site Gamasutra promoveu em 2006
uma ampla reflexão entre vários profissionais da área com uma pergunta objetiva
e simples: “Chris Crawford está certo?”
Em mais de duas dúzias de respostas que alternam humores e opiniões,
muitas são as ressalvas levantadas, que observam dificuldades com tempo
necessário e as condições para a criação de games, a resposta de público em
relação aos títulos e outras questões. Seguem dois destaques comentados na
matéria, que abordam diferentes colocações e pontos de vista:
“Antes de mais nada, quem decide quão rápido a indústria deveria evoluir e inovar? Esta
medida é inteiramente subjetiva. Na mesma linha, quem decide o que é inovador? A
indústria não tem um padrão objetivo para inovação, então outra vez a questão cai na
crença pessoal... Creio que a maior falha no argumento do Sr. Crawford é que ele está
em busca de uma revolução na indústria dos games e mascarando este desejo
chamando-o de inovação, como agora. Se o Sr. Crawford está à procura de revolução eu
o convidaria a aplicar-se ao trabalho na indústria e demonstrar o que ele está buscando
por meio do trabalho, ao invés de ficar na segurança, com comentários paralelos – Brian
Heins, Obsidian Entertainement
...
Ele está certo. A despeito dos ângulos empresarial e criativo dessa questão, parte do
problema está na tecnologia com que temos que trabalhar. No momento, criar qualquer
tipo de conteúdo com significado exige um enorme esforço de um grupo de pessoas... O
hardware no qual trabalhamos também não ajuda muito: ótimos gráficos, mas sem muita
musculatura de CPU que possamos usar para problemas gerais de programação...
Precisamos investir mais em ferramentas e técnicas que reduzam o tempo de
desenvolvimento e liberem os desenvolvedores de tarefas mundanas (quantas vezes
teremos que escrever o código fonte?) e então poderemos trabalhar nas coisas que nos
atraíram para a indústria. – Amonn Phillip, Nokia”. (HONG, 2006)
De volta a Crawford, observamos que, para dar concretude às suas idéias
e opiniões, o autor entende que outras abordagens devem ser concebidas e
testadas, apresentando novos caminhos para a disseminação de uma cultura
gamer verdadeiramente sólida e propõe, como parte de sua contribuição neste
campo, a realização de um novo conceito de jogabilidade por ele denominado
Storytronics, ou a contação de histórias por meio da interatividade, apresentada
pelos recursos digitais contemporâneos. Sua criação propõe um caminho
diferenciado do padrão, instando à interação com outros personagens, mais do
que somente a reação aos estímulos do jogo
Assim como as novas possibilidades apresentadas pela jogabilidade
intuitiva do console Wii, é possível considerar que sua proposta busca também
estreitar o contato com o público não-jogador, como observa o autor:
“Histórias interativas apelam a um outro tipo de público. O tipo de pessoa que gosta de
games poderá não gostar de histórias interativas... a ênfase [do produto] está no drama...
usando a interface lingüística e não a espacial”. (CRAWFORD, 2006)
Experiências
como
o
Storytronics
deverão
permitir uma fluidez sem igual no que tange às
possibilidades narrativas do game se,
uma
vez
disponível o sistema, o público potencial assimilar a
dinâmica de interação, compreender a proposta social
da atividade e, efetivamente, passar a fazer uso dos
recursos prometidos pelo criador.
Neste caso, torna-se imperativo considerar
Crawford: Gênio polêmico
questões importantes a serem respondidas, tais como: será a totalidade de
elementos e diferenciais desta produção adequada para alcançar também o
usuário padrão dos games tradicionais, em princípio mais facilmente seduzido
por recursos que envolvam algum preceito de narrativa e jogabilidade,
solidificando, assim, uma base de usuários que compense a demanda de
produção e os custos de seu desenvolvimento? Paralelamente, será possível por
meio desta empreitada alcançar uma nova audiência, até o momento
absolutamente desinteressada em relação aos jogos eletrônicos, da mesma
forma que, em dado momento da breve história dos games, a abordagem
inusitada de The Sims conseguiu atrair uma nova parcela de gamers e, antes
ainda, Zork, com seu princípio de imersão interativa primária arregimentou
milhares de usuários de linhas de comando para as catacumbas virtuais?
3.2 Ambiente Virtual, Imersão e Game Design
De fato, não parece haver alternativa fácil para aplacar estas dúvidas.
Marc Prensky, pesquisador dos processos de aprendizado baseados em
estruturas narrativas de games, levanta ponderações semelhantes às de
Crawford, ao considerar que não basta a fusão de duas linguagens que se
mostrem potencialmente complementares para se obter um produto cativante de
sucesso comercial garantido. Seu raciocínio baseia-se no processo de
interatividade oferecido pelos sistemas digitais, associado às estruturas de
roteirização da literatura e do cinema e a forma pela qual estes campos de ação
podem se somar, na produção de um novo modo de entretenimento
contemporâneo.
“Muitos, especialmente aqueles com um passado na literatura e no cinema, estão
convencidos de que a narrativa é, de longe, o caminho mais poderoso para cativar as
pessoas. O motivo de ser tão cativante é porque este é um caminho maravilhoso para
estimular nossas emoções. Estimular a emoção é, de fato, o objetivo primário da escrita
de ficção, como qualquer autor de livros confirmará.
Um grande questionamento que defronta gente da ‘narrativa’ e profissionais dos games é
como combinar narrativa com games. Os computadores digitais introduziram os
consumidores de entretenimento e histórias à interatividade. Assim, um grupo grande e
variado de pessoas criativas está se debatendo arduamente para encontrar caminhos
para colocar narrativa e interatividade juntas, criando ‘histórias interativas’ que podem,
por exemplo, ser incluídas em games. Uso o termo ‘se debatendo’ porque não está
exatamente claro como fazer isto e muitas alternativas deste encontro foram testadas e
falharam. No surgimento inicial dos jogos de computador, as pessoas de Hollywood (que
vêem a si mesmas como os mestres da narrativa) tentaram combinar-se e trabalhar com
os gamers de Silicon Valley (que vêem a si mesmos como os mestres da interatividade) e
os resultados iniciais foram desapontadores.” (PRENSKY, 2000, p.05-17)
No que se refere ás possibilidades de refinamento de técnicas para o
aprimoramento dos jogos, para que o jogador tenha a real sensação de imersão,
um longo caminho ainda está por ser trilhado. Obviamente, a indústria de games
não está apenas deitada sobre os louros do sucesso despreocupadamente e
muitas pesquisas seguem em busca de potencialidades que agreguem novas
funcionalidades e meios de interação do usuário no ambiente digital e uns com
os outros efetivamente.
O princípio de imersão mostra-se de fundamental relevância neste sentido,
uma vez que oferece possibilidades reais de diálogo fluído com novas realidades
e mostra potencial não apenas no campo fictício, mas também na qualidade de
solução para muitas questões do cotidiano, com aplicações na área de design
residencial e de mobiliário, turismo e medicina, entre outros.
Obviamente, é na área dos games que sua aplicação é imediatamente
assimilada e mais sedutora, bem como no campo ainda árido e pouco explorado
da arte hipermidiática.
Diana Domingues dá especial destaque à idéia de imersão nos ambientes
virtuais como uma inovadora experiência, ao analisar este fenômeno e afirmar
que
“no realismo virtual ocorrem situações que são metáforas de espaço-tempo em realidade
virtual totalmente imersiva... o ciberespaço está conferindo uma natureza experiencial
para a ficção, da ordem da simulação interativa comportamental. Dessa maneira,
questões como o abstrato e o figurativo na construção do virtual podem levar-nos a
situações diversas em ambientes interativos, ganhando taxas de realismo surpreendente,
onde até mesmo o abstrato se torna real. A simulação em realidade virtual gera, por
vezes, efeitos de dinâmica de um corpo em que o feedback da pessoa que interage no
ambiente dá graus de realidade antes não alcançados.” (Domingues, 2003, p.60-62)
Arlindo Machado parece concordar com estas observações e já salientava
as diferentes propostas de imersão proporcionadas no momento da concepção
do design de games:
“Os atuais ambiente tecnológicos de imersão e de agenciamento estão promovendo a
ocorrência de um fenômeno novo, que poderíamos definir como sendo a hipérbole do
sujeito, uma espécie de narcisismo radical e auto-referenciado, em que a única
identificação possível é a do sujeito com ele mesmo. O intertator quase sempre se insere
nestes ambientes como o seu sujeito e, na maioria dos casos, é impossível vivenciar as
narrativas interativas senão encarnando a sua personagem principal, aquela em função
da qual os eventos acontecem....
Há, portanto, nos meios digitais, dois tipos principais de imersão, ou seja, de
representação do interator no interior da cena. Podemos acompanhar as peripécias da
ação de um ponto de vista externo, como um observador, enquanto dirigimos a
personagem que os representa no interior da cena, tal como acontece, por exemplo, num
vídeo game como Mortal Kombat. Ou, então, de forma mais imersiva, podemos visualizar
a ação de um ponto de vista interno, através de um efeito de câmera subjetiva, como
acontece em Doom, em que os meus opositores se dirigem a mim (isto é, à tela que estou
visualizando, como se eu estivesse realmente presente na cena). Em alguns vídeo
games, como no simulador de corridas Indianópolis, o interator pode decidir se quer
adotar um ponto de vista externo (como o de uma câmera de televisão que transmite a
corrida) ou interno (como o do piloto de um carro). Em outros (como na disputa narrativa
de John Sanborn Psyquic Detective), o interator pode escolher a personagem que vai
controlar e ao mesmo tempo assumir o seu ponto de vista em câmera subjetiva.”
(MACHADO, 2002)
Porém, no que tange à definição efetiva do conceito de imersão, parece
haver certo consenso de vários autores, em relação à obra e às opiniões de
Janet Murray, que propõe:
“’Imersão’ é um termo metafórico derivado da experiência física de estar submerso na
água. Buscamos de uma experiência psicologicamente imersiva a mesma impressão que
obtemos num mergulho no oceano ou numa piscina: a sensação de estarmos envolvidos
por uma realidade completamente estranha, tão diferente quanto a água e o ar, que se
apodera de toda a nossa atenção, de todo o nosso sistema sensorial... A imersão pode
requerer um simples inundar da mente com sensações, a superabundância de estímulos
sensoriais experimentada na sala de televisão em Fahrenheit 451, de Bradburry. Muitas
pessoas ouvem música desta maneira, como um aprazível afogamento das partes verbais
do cérebro. Mas num meio participativo, a imersão implica aprender a nadar, a fazer as
coisas que o novo ambiente torna possíveis.” (MURRAY, 1997 p. 102)
Alison McMahan insere suas considerações na mesma linha de
pensamento e descreve:
“Imersão significa que o jogador foi ‘capturado’ no mundo da história do jogo (o nível
diegético) mas também se refere ao amor do jogador pelo jogo e a estratégia ali presente
(nível não-diegético).
Está claro que, se estamos falando do vídeo game no nível diegético e imersão no nível
não diegético, então, estamos falando de duas coisas diferentes, com possíveis grupos
conflitantes de convenções estéticas... Muitos pesquisadores parecem concordar que o
foto e áudio-realismo totais não são necessários para o ambiente de realidade virtual para
produzir um senso de imersão do observador, a sensação de que o mundo em que se
está é real e completo... Também é aceito como verdade que quanto mais envolvente for
a exibição da tecnologia de Realidade Virtual (tela maior, melhor sistema de som no
enredor) mais imersivo será. No entanto, é plenamente possível estar totalmente imerso
na Realidade Virtual pela tela do computador, já que a imersão não é totalmente
dependente das dimensões físicas da tecnologia.“ (MCMAHAN, 2003, p. 68)
Muitos autores apresentam estudos aprofundados no que concerne à
imersão e, não raro, fazem referência às suas potencialidade no desenvolvimento
e usufruto dos jogos.
Mesmo no cinema tem sido bastante comum e freqüente tratar do tema,
embora, por vezes, o viés adotado para o desenvolvimento do roteiro beire o
catastrófico apocalíptico como bem demonstram produções como O Passageiro
do Futuro, Johnny Minemonic, 13º Andar, Matrix e o polêmico Exiztenz, de David
Cronenberg. Mas poderão os avanços tecnológicos atingir um patamar de
realidade que possa nos iludir a ponto de perdermos o próprio senso de
realidade? Se tomarmos por base o Holodeck de Jornada nas Estrelas, veremos
que o objetivo maior do espaço virtual encontra-se na oportunidade de fazer o
participante (ou gamer) sentir-se integrante de uma narrativa ficcional, porém,
podendo neste caso, ter controle absoluto sobre o faz-de-conta. Como
apresentado em vários filmes da série onde, a qualquer momento, uma ordem
proferida pelo tripulante da Enterprise mostrava-se suficiente para encerrar ou
alterar o programa, conforme as preferências do usuário que, embora plenamente
inserido na história, detinha total consciência da realidade imaterial do conto ao
seu redor.
Diferentemente desta proposta, em Existenz Cronemberg propõe uma
preocupante realidade em que, ao participar de uma aventura no game, o
protagonista passa a perder o referencial do que lhe é imputado como ficção e
daquilo que constitui sua realidade, tal o grau de imersão proporcionado, que faz
com que o usuário não consiga distinguir o momento de transposição de um
universo para outro e vice-versa.
Em seu ensaio vencedor do prêmio da Academia Brasileira de Letras,
André Azevedo Fonseca comenta a estrutura conceitual e narrativa do filme e o
modo como somos capturados pela mescla de diferentes existências, presencial
e digital, ao comentar:
“Em , o cineasta canadense David Cronemberg sonhou a história de um grupo que joga
um vídeo-game com conexão orgânica. Para entrar no ambiente virtual, os jogadores
primeiro fazem uma cirurgia para ligar o cabo do equipamento diretamente na medula.
Quando começam a jogar, todos os sentidos biológicos são "transportados" para dentro do
jogo — ou melhor, a realidade sensorial externa é substituída pela realidade virtual interna
através de estímulos eletrônicos diretamente enviados ao cérebro, que mimetizam em
todo o corpo a ambientação, os sons e o cheiro do jogo. Aqueles jogos tridimensionais
com capacete parecem pré-históricos, pois em eXistenz o vídeo-game é vivenciado
fisiologicamente pela visão, tato, olfato, audição e paladar. Durante as peripécias do jogo
é possível caminhar na rua, ir a um restaurante, comer um besouro exótico e
experimentar seu gosto, sentir suas perninhas roçando na língua. Este filme, como todos
do Cronemberg, é repleto de ambigüidades, pois depois de algumas idas e voltas, nem o
espectador nem os personagens sabem direito o
que é realidade e o que é Apesar de ainda ser pura
ficção científica, e apesar de ainda necessitar de
exaustivos debates sobre bioética, passo-a-passo
essa parece ser a tendência de desenvolvimento
dos jogos eletrônicos que, por sua vez, têm
influenciado
decisivamente
o
paradigma
de
recepção da tecnologia digital. A geração anterior
de "analfabites" talvez não esteja preparada para eXistenz: Imersão total e perda do senso
de realidade.
isso. A atual geração lida com mais naturalidade
com computadores, conexões em rede e intervenções cirúrgicas no próprio corpo.
Quando as pessoas estarão dispostas a conectar a própria alma na Internet, a fazer
downloads de sonhos, a transitar nas mentes de multidões, eis uma boa questão.
(FONSECA, 2004)
O teórico e artista do ZKM, Centro de Artemídia de Karlsruhe, Peter
Weibel observa como esta integração entre diferentes realidades deverá,
realmente, aproximar-se do universo feérico proposto por Cronenberg, quando da
apropriação do usuário das ferramentas para a criação e edição do vídeo digital,
ao considerar que, por meio da imersão virtual o observador (e, por extensão,
consideramos aqui inclusa a figura do jogador) torna-se interface entre o mundo
real e virtual, como postula seu texto:
“Uma causa no mundo real terá efeito no mundo virtual e, inversamente, uma causa no
mundo virtual terá efeito em outro mundo virtual paralelo ou no mundo real. As interações
controladas pelo observador entre os mundos reais e virtuais e entre diferentes mundos
virtuais paralelos nas instalações baseadas no computador ou na rede capacitam o
espectador a ser o novo autor, o novo câmera, o novo editor, o novo narrador.
O
observador será o narrador nas instalações multimídia do futuro. Isso pode acontecer
localmente ou pode ser controlado remotamente por meio da rede. Os observadores
criam, por meio de sua navegação, novas formas de narrativa, baseadas em rede ou no
computador” (WEIBEL, 2005, p.352)
Muito de uma agradável e efetiva experiência imersiva deve-se à condição
de veracidade que o ambiente virtual é capaz de nos oferecer durante o decorrer
de um jogo. Como já foi apontado anteriormente, Zork inseria o gamer de maneira
arrepiante e claustrofóbica nas escuras masmorras do jogo, utilizando-se
somente da tela negra do monitor e de comandos de ação, respondidos de
maneira crível pelo sistema e Wolfenstein 3D mergulhava o jogador em um
ambiente paranóico, onde soldados nazistas podiam ser ouvidos à distância e
cada corredor era um novo perigo em potencial.
Estas e outras propostas buscam disponibilizar ao jogador um espaço para
a vivência do jogo tão real quanto a realidade e que possa, desta forma, inseri-lo
na fantasia de um novo ambiente.
O próprio conceito de ‘realismo’ no que tange às questões imersivas, no
entanto, é largamente passível de questionamento no âmbito dos games, já que
não pode ser configurado somente por meio do grau de qualidade de imagem
apresentada no jogo, embora seja esta a forma mais recorrente pela qual tanto o
público quanto a mídia conferem ou não a qualificação de um jogo.
Gek Siong Low apresentou um breve estudo, poucos anos atrás, na
Universidade de Stanford, que baseia suas idéias justamente na amplitude deste
conceito:
“Não há dúvida de que o realismo é algo muito importante nos jogos de computador de
hoje. Os desenvolvedores de jogos alardeiam-no como seu principal elemento de vendas
e os fabricantes de consoles de vídeo game confrontam qualquer um que tenha o melhor
hardware para os melhores gráficos para renderizar o maior número de polígonos no
menor tempo possível. Os gamers e as revistas de game, da mesma, forma, fazem furor
a respeito, ou se ressentem em relação à falta disto. No entanto, ‘realismo’ não é um
conceito facilmente definível. Aquilo que parece ser ‘realístico’ no jogo de computador
pode parecer muito contraditório. Os jogadores ignoram plenamente muitos aspectos
obviamente inconsistentes dos games para computador. Por exemplo, você pode
arrebentar um carro em um jogo de corrida e ainda continuar na corrida, quando, na vida
real, o impacto iria destruir totalmente o carro, deixando o piloto seriamente contundido.
Como podemos entender o que torna um game mais ‘realístico’ e por que alguns games
são [considerados] realísticos enquanto outros não?..
Realismo em jogos de computador pode ser alcançado de muitas formas diferentes.
Talvez o mais efetivamente direto e reconhecível seja a qualidade gráfica dos games. A
primeira coisa que as pessoas percebem sobre um jogo de computador é quão ‘real’ os
gráficos se parecem. A importância da percepção para nós está expressa no adágio ‘Ver
para Crer’. ” (LOW, 2001)
No entanto, não podemos limitar a experiência da percepção de um game
somente àquilo que envolve o discernimento visual e a beleza dos gráficos, já
que nossa imersão se dará também por uma série de outros aspectos
complementares de clara relevância no conjunto de elementos componentes do
game design, como temos visto ao longo deste estudo. Estes recursos, de fato,
tornam-se imprescindíveis para que possamos, efetivamente, vivenciar com
riqueza a interação que um determinado jogo possa nos oferecer, escolhendo
caminhos, combatendo oponentes e indo muito além, realizando feitos
plenamente possíveis no ambiente virtual, mas que, enfatizando nossa
experiência imersiva, são deixados para um segundo
plano em virtude do grau de complexidade que envolve sua produção e, por
extensão, os exponenciais custos envolvidos. No entanto, se não houver uma
cuidadosa atenção para estes demais fatores, o princípio da jogabilidade corre o
risco de ficar tão vazio de substância que pode inviabilizar por completo o bom
usufruto de um game que, de outra forma encontraria plenas condições para
tornar-se um best seller. No mesmo estudo, Low ressalta a necessidade de
atentar para as condições de interação.
“A idéia de percepção como ação necessária é mais aparente nos jogos de computador
em três dimensões. A percepção do espaço em três dimensões exige que o jogador se
mova pelo espaço, de modo a poder percebê-lo. Somos capazes de perceber nossa
realidade tridimensional porque nossos olhos alternam constantemente [o foco] e nosso
cérebro é capaz de processar estas mínimas diferenças de imagem na percepção
tridimensional do espaço. Uma pintura estática na tela não iria ajudar muito para fazer
com que o jogador sentisse o jogo ‘real’ que pode ser explorado, já que os olhos do
jogador não podem lhe dizer se isto é apenas uma imagem ou um plano. Portanto, o
único recurso é mudar a vista, como se o jogador estivesse movendo sua cabeça para
olhar em diferentes direções. Alguns jogos são planejados de modo que encontrar certos
objetos importantes exigem uma mudança na direção da visão para se perceberem pistas
sutis... por esta razão tanto esforço é feito para simular os sistemas baseados no mundo
real em jogos de computador, para tornar tudo ‘eliminável’ [fraggable] para utilizar a
terminologia de Quake. Mesmo em jogos cuja perspectiva não é em primeira pessoa
encontramos a necessidade de agir para perceber os objetos. Quando o jogador iniciante
joga Space Invaders como ele sabe que os blocos brancos representam abrigo contra as
bombas dos aliens? Fácil, ele se move para baixo deles e descobre que as bombas não
irão atingi-lo.” (LOW, 2002)
Além das pertinentes ponderações acima apresentadas, percebemos que
mesmo o foto-realismo disponível nos consoles atuais, que apresenta uma
qualidade visual impressionante e uma capacidade de combinação de polígonos
incontável, somada a mapas de texturas, iluminação e animação fascinantes, não
é suficiente para criar uma ilusão perfeita o bastante para enganar os nossos
sentidos. Muito provavelmente, isto jamais virá a ocorrer de fato.
Passada mais de uma década deste movimento inicial em direção ao
realismo fotográfico nos games, tornado universal a partir do lançamento do
console Playstation em 1995, a crítica e os gamers começaram a dar indicações
de que os belos gráficos disponíveis, sozinhos, não são suficientes para o
desenvolvimento de um bom jogo e que a mesmice de outros quesitos faz
lembrar o período negro que antecedeu ao crash dos anos 80, quando a criação
quase serial de jogos praticamente idênticos em proposta, jogabilidade, desafio e
vaziez narrativa, afugentaram os potenciais interessados e os jogadores
tradicionais.
É inegável que, em um primeiro momento, a migração para as novas
plataformas, que ofereciam capacidade de processamento e estética visual
ímpar, se deu de forma consistente e que o olhar do usuário foi seduzido pela
plasticidade inovadora dos ambientes 3D.
Porém, à medida em que as gerações de jogadores avançou em idade e
no apuro do olhar, as empresas aperceberam-se de que alguns modelos de jogos
já não correspondiam às expectativas do público jovem e puseram-se a pesquisar
novos caminhos em busca do amadurecimento da linguagem.
Tecendo paralelos entre a criação de gráficos digitais e outras expressões
da arte como o cinema, a escultura e as artes pictóricas e considerando as
diferenças estéticas entre as escolas de arte, que variam do realismo
renascentista de Michelângelo às abstrações concretistas dos escultores
contemporâneos, entre outros exemplos, o escritor e mod-maker de games David
Hayward, também questiona a qualidade atual da capacidade de criação de
modelos 3D fotorealistas e comenta em seu artigo sobre o futuro da estética nos
games:
“Então, como está o nosso progresso em direção ao fotorealismo? Obviamente não
chegamos lá ainda e não estaremos em breve. Pegue qualquer coisa que esteja no limite
do fotorealismo como [por exemplo], Project Offset ou Unreal Engine 3. Você certamente
encontrará algumas coisas muito bonitas e visualmente impressionantes, mas ainda
assim não boas o bastante para nos ludibriar. A despeito dos elementos de qualidade
cinematográfica é possível ver as linhas poligonais nos modelos se olhar [atentamente]. O
fotorealismo só será alcançado quando, na condição de fotógrafo ou designer de alto
gabarito, eu puder intercalar as duas partes do meu portfolio e enganar as pessoas” .
(HAYWARD, 2005)
O autor finaliza suas considerações ao observar que
“A escultura e a pintura emergiram do início do neolítico ‘tosco’ para as eventuais
representações de alta fidelidade da Renascença e dos períodos posteriores. De forma
similar, em virtude de um hardware inicial limitar as representações a abstrações
simplistas, os objetos animados feitos em pixels dos primeiros jogos, são o equivalente
das pinturas nas cavernas”. (HAYWARD, 2005)
Este problema com os gráficos em 3D certamente está longe de uma
solução real e efetiva e sua existência exigiu que se produzisse um termo que
pudesse servir para identificá-lo, o que fez ressurgir o conceito de Uncanny
Valley, traduzido para o português como Vale Sombrio e que pretende
demonstrar o fenômeno já comentado de que, quanto mais realística se torna a
imagem de personagens dos games, mais arrepiante é o resultado final.
O termo é antigo e origina-se das pesquisas do cientista japonês Masahiro
Mori, especialista na construção de robôs e que observou pela primeira vez o fato
de que, à medida em que os robôs iam se humanizando nas formas, as pessoas
tendiam a querer aproximar-se das criações, porém, somente até um certo grau
de ‘humanidade’ das máquinas. O cientista verificou que, quando um robô
consegue um nível de identidade que se aproxime 99% das características
fisionômicas de um ser humano, nossa tendência é dar atenção justamente ao
1% ausente no nível de perfeição da obra, o que faz com que vejamos o robô
como se fosse um cadáver animado, um ponto paradoxal da conquista científica
no qual a simulação da vida se torna tão boa que é ruim, conforme afirma o
colunista do site Slate, Clive Thompson.
Thompson traçou um esclarecedor paralelo deste efeito no 3D dos games
atuais em um artigo que afirma que
“Á medida em que os jogos desenvolveram gráficos realísticos cada vez melhores,
começaram
a sofrer
mais e mais deste mesmo enigma.
Os jogos caíram
inesperadamente no ‘Vale Sombrio’.
Todo jogo altamente realístico tem o mesmo problema. Os humanos de Resident Evil
Outbreak são realísticos, mas suas expressões faciais são tão morbidamente estranhas
que são quase tão assustadoras quanto os zumbis contra os quais você está lutando. Os
designers de 007: Everything or Nothing trabalharam duro para fazer a adorável Shannon
Elizabeth e renderizá-la como um replicante estrábico.
O ‘Vale Sombrio’ pode tornar os jogos menos atraentes. Isto é particularmente verdadeiro
em jogos narrativos, que se baseiam em personagens críveis com os quais supostamente
você deve se identificar. A coisa toda resume-se a suspender a descrença e imergir. Mas
isto é difícil de fazer quando os personagens dão calafrios. Você batalha impiedosamente,
resolve quebra-cabeças de queimar os miolos, ‘varre’ com os inimigos e como você será
recompensado? Com uma chance de assistir seu avatar andar afetado pela tela em
alguma paródia fantasmagórica de humanidade.
... Ao invés disso, talvez eles [os designers] devessem tentar suplantar o problema, indo
na direção oposta, de encontro à simplicidade da baixa resolução [de imagem]... Alguns
dos melhores game designers entendem isso... Jet Grind Radio, a velha série Fear Effect
e, mais recentemente, Viewtiful Joe usam todos o estilo grosseiro das animações de celshading para criar personagens que são cartunescos e ainda assim que passam grande
vivacidade. Lara Croft é outro bom exemplo. Mesmo com seus jogos ficando
graficamente mais precisos, os designers deixaram Croft como uma figura bem estilizada,
o melhor para fazer com que os jogadores de identifiquem com ela. E o único game
designer que vem produzindo uma cadeia de 20 anos de personagens populares é
Shigeru Miyamoto, o arquiteto de estilo visual do tipo Disney da Nintendo”. (THOMPSON,
2004)
A busca por novos horizontes para o jogo eletrônico como linguagem, no
entanto, envereda por inúmeras áreas e mostra o empenho e a seriedade com
que a indústria tem se voltado para além do joystick tradicional, seja pelas
revelações das pesquisas atuais ou pelas novas insurgências narrativas.
Um exemplo pode ser visto na Finlândia, com o projeto Console Demo,
onde os pesquisadores da unidade de pesquisa de game design da universidade
de Oulu desenvolvem uma simulação do ambiente de uma pequena cidade, que
o usuário pode explorar caminhando. Por meio de realidade aumentada, o
jogador visualiza na tela do dispositivo móvel o espaço virtual correspondente à
região em que se encontra fisicamente.
Também na Escandinávia, projeto semelhante segue em pesquisa. O
projeto Battlebot pode ser classificado como um game de nova geração, que
estabelece um combate virtual apropriando-se das interações sociais tornadas
possíveis por meio da tecnologia mobile. O game permite que os jogadores
configurem seus robôs, com certas características que ficam armazenadas em
seus aparelhos. Quando um Battlebot encontra-se a uma determinada distância
de outro, através do contato entre os usuários, estas características são
confrontadas e o melhor ‘robô’ vence a batalha.
Aplicações como esta encontram um universo muito mais amplo de
possibilidades de interação, somadas à tecnologia sensorial dos controles
desenvolvidos para o console Wii.
3.3 Os Horizontes do Amanhã – Game Design nas Próximas Décadas
Em seu artigo de capa da edição brasileira nº 64, a revista especializada
em games Eletronic Gaming Monthly apresenta algumas previsões de destacadas
autoridades do meio gamer e perspectivas para os games, da concepção inicial
ao usuário final, nos próximos 20 anos.
No parágrafo inicial já nos deparamos com a opinião de um dos designers
de games mais badalados do momento, o criador de Gears of War, que vaticina:
“O maior obstáculo que enfrentamos no momento tem relação com a interface.
Precisamos de avanços significativos nesta área para que possamos realmente criar uma
paisagem interativa para os sonhos.” (BLESZINSKI, 2007)
Embora a interface seja o gargalo mais visível para a criação do vídeo
game do amanhã outras necessidades se apresentam e mostram a complexidade
de uma realização como esta e o alto nível de desafio a ser superado pelos
pesquisadores.
De fato, neste momento, as gigantes do mercado, Microsoft, Sony e
Nintendo, já trabalham com empenho, desenvolvendo pesquisas nos campos
mais diversos e que pretendem ditar o perfil de console e jogabilidade já na
virada deste século; uma verdadeira corrida do ouro em forma de bits.
Este exercício de antecipação das potencialidades do hardware e, mais
importante, dos anseios do público-alvo, não constitui tarefa fácil e mostra que,
mesmo decisões aparentemente óbvias e dadas como certas para agradar o
público podem amargar grandes prejuízos ou selar definitivamente o destino de
uma grande empresa, como é possível de se observar em alguns exemplos de
um passado não muito remoto:
•
O lançamento do console Jaguar pela Atari em 1993, que teoricamente
apresentava 64 bits de performance, mas com games de baixa
qualidade visual, jogabilidade inconsistente e total ausência narrativa,
em um momento em que o mercado contava com bons consoles de 32
bits da Sega e Nintendo, com inúmeros títulos sensacionais e
aguardava, para breve, o lançamento do revolucionário Playstation da
Sony;
•
A saída da Nintendo de uma parceria com a Sony, que resultaria no
lançamento do Playstation e sua opção em manter os limitados cartuchos
como mídia para os jogos desenvolvidos para o Nintendo 64, minando o
interesse de desenvolvedores e usuários;
•
A opção recente da Sony em desenvolver e lançar um hardware poderoso
e ostensivamente caro, voltado para as necessidades futuras dos
usuários, como a tecnologia de DVDs Blueray, afastando consumidores
potenciais pelo preço elevado, bem como desenvolvedoras de games,
pelos altos custos de produção para a plataforma.
Muitos são os exemplos que poderiam ser apontados e que evidenciam a
importância das opções afinadas com o público do momento, o mercado, a
flutuação da estabilidade econômica e outros fatores, que podem destruir um
sonho ou consolidar uma marca.
A matéria apresentada na EGM versa também por outros fatores
determinantes do design para o game do futuro, tais como: novos controles em
desenvolvimento, os displays que deverão dar suporte e visibilidade para os
jogos, os gêneros e o que o futuro reserva a cada tipo diferente de jogo e por fim,
o próprio game, os jogadores e a indústria como um todo.
Longe de querer reproduzir aqui as minúcias da reportagem e as opiniões
dos editores, pretendemos fazer um breve apanhado destas ricas informações,
de modo a apreender um painel mais amplo em relação ao universo futuro dos
games, somando a este conteúdo as opiniões de outros pesquisadores e
estudiosos, bem como indicadores de tendências de mercado, que se estende
dos game designers aos grupos de investidores.
Abaixo, os principais tópicos da revista:
•
Controles:
Assim como o produto Mindball, vendido como um jogo de puro
entretenimento, outros projetos seguem em busca de novas formas de criar
experiências diferenciadas na usabilidade do game. O Project Epoc, da
empresa
Emotiv
Systems,
propõe
um
aparato
com
sensores
eletroencefalográficos presos à cabeça do jogador para “ler” suas feições
faciais, emoções e até comandos mentais complexos para objetos
presentes em um jogo.
A Invensense, outra fabricante de hardware para games, está projetando
controles com sensores de movimento
mais
avançados
para
a
próxima
geração de consoles. Mesmo soluções
como Eyetoy, câmera que capta os
movimentos do corpo, desenvolvida
para Playstation 2, favorecem apostas
neste sentido.
Katherine
Isbister,
professora
do
Mindball: controle por ondas cerebrais.
Laboratório de Pesquisa em Videogames, do Instituto Politécnico
Renssealer, também faz ponderações em relação aos leitores de reação
dos jogadores e vê nesta tecnologia as chances de um futuro brilhante e
revolucionário para o game design:
“Acho que a maior parte dos games de hoje são feitos para atingir o lado reptiliano de
nosso cérebro, do tipo que exige uma reação de atacar ou fugir, emoções exacerbadas.
Conversei com alguns criadores de jogos que estão tentando criar experiências
emocionais mais fortes, e muitos deles dizem que o gargalo aperta na captação de
reações do jogador. Na minha opinião, o que vai acontecer com estes sensores e as
várias maneiras de obter dados emocionais e sociais é que vamos ter mais pontos
culminantes – momentos de emoções fortes, que os criadores serão capazes de gerar, e
por isso vamos voltar a investir em enredos”. (ISBISTER, 2007)
•
Jogos:
Amy Henning, diretora da Naught Dog, empresa desenvolvedora de games de
sucesso como Crash Bandicoot, de 1996, para Playstation, afirma que, assim
que ficar para trás nossa obsessão pelo realismo fotográfico, os artistas darão
vazão à sua criatividade, por meio de produções bastante insólitas e
inspiradas.
“O equipamento quase chegou a um ponto em que somos capazes de criar um simulacro
convincente da realidade. Mas, como a perfeição continua um pouquinho fora do alcance,
parece que todo mundo está obcecado com o realismo como objetivo final. Quando as
limitações gráficas já não forem mais problema, acho que a nossa mídia vai amadurecer e
chegar ao lugar em que a simulação já não importa, em que o importante é a expressão.
Parece inevitável passarmos pelo mesmo tipo de evolução que a arte ocidental passou na
virada do século. Uma vez que o realismo foi alcançado, os artistas se sentiram livres para
desenvolver formas de expressão mais ousadas e abstratas.” (HENNING, 2007)
A matéria ainda comenta que a Inteligência Artificial será imprescindível para
a construção de enredos mais consistentes e interativos que possam
substituir as hoje tradicionais animações que dão sentido ao curso da história.
Warren Spector, um designer de games veterano no mercado, comenta:
“Do ponto de vista gráfico, grandes avanços virão quase que naturalmente. Aperfeiçoamentos
do mesmo calibre em termos de comportamento e atuação, no entanto, vão exigir muita
dedicação e vontade de resolver problemas.” (SPECTOR, 2007)
Peter Molineaux, designer do espetacular Fable, concorda:
“Com inteligência artificial adequada, poderemos fazer com que os personagens aprendam
com o jogar, reajam ao que ele [o jogo] faz e criem segmentos de jogo essencialmente
esculpidos por cada jogador”. (MOLINEAUX, 2007)
A reportagem também dá conta de que os jogos serão criados, em grande
parte, pelos próprios jogadores, embora esta contribuição não vá ser
revolucionária para modificar o modelo de ação das empresas.
“Quando era rapaz, era capaz de criar níveis para Lode Runner ou Excitebike em poucas
horas. Agora, são necessárias equipes inteiras de ilustradores, designers e programadores,
que trabalham meses para finalizar apenas uma missão de Halo. Simplesmente não há como
um jogador médio conseguir fazer isso.” (GRIESEMER, 2007)
Por fim, neste tema, a matéria afirma que os games tendem a ser mais curtos
e com missões ou objetivos mais específicos, talvez até mesmo aproveitando
o sucesso de alguns produtos para lançá-los não como continuações, mas
como capítulos, com tempos de liberação e custos de produção menores.
•
Online:
Para dar continuidade à tendência de conectividade plena, o futuro online
deverá contar, na esmagadora maioria dos jogos, com a possibilidade de
usuários conectados divertirem-se interpretando o papel hoje reservado à
máquina e encarnarem inimigos e zumbis nas aventuras de outros usuários,
um artifício conhecido como Cosplay, originado pela fusão das palavras
‘costume’ e ‘play’, criando uma nova abordagem e contexto para o modo
multiplayer de jogo e possibilitando a criação de enredos ainda mais
primorosos, por meio de conexão em tempo integral.
“Esta palavra [online] provavelmente vai parecer deslocada e antiquada. Todos os aparelhos
vão estar em rede o tempo todo. E, assim, acho que os jogos estarão ‘conectados’ de algum
modo e terão algum aspecto de comunidade e de conteúdo evolutivo por meio de episódios e
expansões, microtransações e conteúdo criado pelos usuários.” (HENNING, 2007)
•
TVs:
Segundo a reportagem, a chegada dos displays holográficos é apenas uma
questão de (pouco) tempo e trará uma nova relação de interatividade do
usuário com o jogo.
Os celulares e dispositivos móveis também contarão com telas de resolução
cada vez melhores e até mesmo projeção de imagens nas superfícies mais
diversas. Também segue em estudo a disponibilização de telas desenvolvidas
em tecidos sintéticos que possam ser facilmente transportadas pelos usuários
e utilizadas em quaisquer ambientes.
Porém, com o advento desta maravilhas visuais serão necessários também
muitos aprimoramentos na criação de games, como afirma Tim Sweeney,
executivo-chefe de desenvolvimento de Gears of War:
“[os jogos vão precisar de mecanismos anti-distorção melhores para] reparar o tremor
constante de pixels e polígonos – área que estamos atrás dos filmes em CGI”. (SWEENEY,
2007)
•
Gêneros:
-
Games de tiro:
Jaime Griesemer afirma que
“nos próximos 20 anos as pessoas vão se cansar de atirar contra alienígenas, nazistas,
zumbis e terroristas... Mas... simplesmente não existem assim tantas ambientações...
Como resultado, acho que veremos muitos jogos de tiro sem disparos, transformando
games de ação na perspectiva em primeira pessoa, sem armas.” (GRIESEMER, 2007)
-
RPGs:
“[O RPG] realmente se baseia na capacidade de luta do personagem. Se [o termo] fosse
exato, você faria o papel de um personagem e não de uma arma... Isto significa que
precisamos pensar mais à respeito da estrutura de personagem... a evolução dos RPGs é
oferecer às pessoas toda a abrangência de ser o que elas bem entenderem”.
(MOLINEAUX, 2007)
-
Corrida:
O gerente geral da EA Black Box, Hanno Lemke considera que será
possível, por meio da interconexão das redes de consoles, fazer
downloads de modelos de carros, conceito visto em feiras de automóveis,
participar de chats sobre as novidades do game e até mesmo aproveitar as
ferramentas disponíveis no jogo para criar suas próprias partes do carro.
-
Raciocínio:
Ficarão cada vez melhores, à medida em que nosso cérebro também
processar mais informações e mostrar-se mais sagaz.
-
Plataforma:
A função multiplayer deverá ser incorporada ao gênero, permitindo que
vários jogadores percorram níveis e enfrentem desafios conjuntamente.
Ted Price, presidente da Insomniac, também aposta na possibilidade de
customização de objetos criados e disponibilizados pelos próprios gamers
para a comunidade.
-
Esportes:
As jogadas reais, assistidas na tv, deverão ficar armazenadas no console
do game e poderão ser jogadas pelos usuários para testar as condições do
momento.
-
Luta:
Não deverá mudar muito no futuro, No entanto, há indícios de que o
jogador poderá ‘treinar’ os personagens adversários, utilizando-se de uma
melhor I. A., presente no jogo.
•
Indústria:
Deverá evoluir em todos os aspectos e, segundo Peter Moore, vice-presidente
corporativo da Microsoft, pretende perder a aura de mídia bastarda,
transformando-se em algo onipresente e de massa. Segundo as expectativas
do mercado, a transação de conteúdos online, estimada em cerca de US$ 215
milhões em 2006 deverá ultrapassar os US$ 7,2 bilhões em 2011, assim como
a receita gerada pela presença cada vez mais significativa de anúncios nos
games deverá saltar dos US$ 120 milhões atingidos em 2006 para um
patamar de US$ 720 milhões em 2010.
Por outro lado, os custos de produção de games subirão vertiginosamente,
com equipes cada vez maiores de profissionais diversos para fazer frente ao
poder de processamento dos novos consoles e recursos.
•
Jogadores:
John Welch, presidente do site PlayFirst.com acredita que a palavra ‘gamer’
deve ser banida, uma vez que, muito em breve no futuro todos serão usuários
da mídia game, que estará disseminada em todas as necessidades do usuário
com o meio digital.
Katherine Isbister, afirma que
“As crianças vão se sentir ainda mais atraídas pelos jogos e os pais passarão a ver isso como
uma parte importante do desenvolvimento. Crescer dentro de mundos digitais vai ensinar às
crianças um novo tipo de experiência digital e elas acabarão levando essas lições para a vida
adulta. Vão misturar a realidade dos jogos à realidade cotidiana e a encararão como
experiência social.” (ISBISTER, 2007)
Adiante, seguem impressões de outras referências, que reforçam estas idéias,
ou refutam as previsões da revista, com base em outras considerações.
A. Fusão entre Presencial e Digital
Entre as muitas promessas que o game design delineia encontra-se a
proposta, há muito desejada, porém ainda utópica,
da jogabilidade livre da mediação dos controles
(joysticks) e a imersão plena, assunto também
brevemente abordado neste estudo.
Uma
das
propostas
que
objetiva
disponibilizar estas ferramentas é o , que poderia
ser
livremente
traduzido
como
‘Jogo
de
Reconhecimento de Contexto’.
De acordo com um estudo conjunto do
Technology
Horizons
Program
e
do
grupo
Context Aware Game: Convergência
independente de pesquisas Institute for the Future, o advento do jogo se daria
utilizando-se de
“...informações digitais e físicas sobre o status atual do jogador para moldar como o jogo
será jogado. A integração de contextos físicos e digitais move a experiência através do
que esperamos de um game, jogado nos mundos digital e físico”. (TESTER, 2006, p. 161)
Para a aplicação de um game com esta magnitude e grau de
complexidade, faz-se necessário o uso de artifícios ainda incomuns no jogo
tradicional, como segue:
-
Ambiente: a localização do jogador e de objetos pertinentes ao game,
identificados por meio de etiquetas RFID, por exemplo;
-
Atividade Física: o movimento do corpo, seja o deslocamento espacial
entre diferentes localidades (ruas) ou gestos mais sutis como um aceno
de mão;
-
Informações do Corpo: dados fornecidos pelo corpo e que contribuem
para o processo de adaptação do jogo, tais como: batimentos
cardíacos, nível de stress ou atividade cerebral.
-
Contexto com o Grupo: alguns jogos só poderão ser resolvidos pelo
empenho coletivo, através de comentários, interpretações, votação ou
informações complementares pulverizadas entre elementos do grupo.
A idéia mostra que uma proposta desta ordem exibe condições de
aplicação prática efetiva, como visto desde 2003 no Japão, com a realização do
game Mogi, da empresa Newt Games, que se utiliza de interface GPS dos
celulares para apresentar a proximidade do jogador em relação a marcadores
virtuais existentes em determinados espaços da cidade para a coleta de itens
diversos que podem ser trocados entre os participantes.
Outra proposta também já realizada e que envolve os princípios de
ubiqüidade das redes de informação, somados a um contexto de jogo com
objetivos lúdicos e de pesquisa, aconteceu na Universidade de Singapura
envolvendo nada menos que Pacman, o maior ícone da comunidade gamer,
desta vez personificado por um dos jogadores participantes do game, com o
objetivo de reproduzir o comportamento do herói em um ambiente externo, no
campus da universidade e confrontando-se com outros participantes que
assumem o alter-ego dos vilanescos fantasmas do game.
Assim como no jogo original, o sistema mostra um alto nível de desafio e a
necessidade de uma estratégia intuitiva e sagaz para ser bem sucedido.
A julgar pelas perspectivas tecnológicas que se delineiam, diversões como
esta apresentam vastas possibilidades para o futuro dos games.
O texto do Institute for the Future ainda apresenta importantes
considerações em relação ao Context Aware Gameing, como um claro indicador
da evolução tecnológica, por meio das seguintes reflexões:
-
Todos poderão jogar estes novos games:
-
Os jogos ocorrerão em qualquer lugar, a qualquer tempo, com qualquer
coisa:
-
O espaço do game e o espaço real se tornarão um só:
-
A presença de outros jogadores será essencial para os Context Aware
Games:
-
Os jogos mais extasiantes virão de baixo para cima, isto é, do usuário
para o mainstream:
B. Holografia
Também na técnica já bastante conhecida e pesquisada da holografia
alguns anseios do game design residem.
Os relatos da criação e possibilidade de oferecimento do vídeo holográfico
em escala comercial, a custo administrável e possível de ser produzido para o
mercado em geral vem se tornando cada vez mais freqüentes nas revistas
científicas e veículos especializados.
Recente informação do blog Inspire informa que o MIT tem avançado
velozmente neste campo de atuação. A matéria apresenta uma breve descrição
do processo de realização do vídeo holográfico:
“Um modulador converte o sinal de vídeo em vibração. Quando um feixe laser passa pelo
modulador as vibrações modificam o brilho e a freqüência da luz. A luz alterada é lançada
na tela e as variações de intensidade e freqüência criam a holografia tridimensional. “
(GEEST, 2007)
O diretor do Celab, programa de eletrônica para consumo do MIT, V.
Michael Bove Jr observa, no mesmo artigo:
“A tirania da tela bidimensional de tv e do computador chegarão logo ao fim. Um grupo de
pesquisadores do MIT vem propondo um caminho para desenvolver um sistema de vídeo
holográfico que funcione no hardware de computadores para o público, tal como os PCs
com placas de vídeo e consoles de vídeo game.
A tela, dizem os pesquisadores, será pequena o bastante para integrar um centro de
entretenimento [doméstico] com resolução tão boa quanto a de tvs analógicas
convencionais, ao custo de somente algumas centenas de dólares...
E o sistema poderia ser um implemento natural para a visualização de jogos e mundos
virtuais.” (BOVE, 2007)
Obviamente as pesquisas seguem em curso com franco interesse dos
grandes fabricantes de produtos de entretenimento e informática, prevendo-se a
revolução que esta descoberta poderá trazer para os games, oferecendo um grau
de ambientação e imersão jamais sonhado, por exemplo, pelos primeiros
jogadores de Doom. Outros grupos de pesquisa também se mostram
empenhados na empreitada, tais como a 3D Holomedix e Holovisions.
Ainda assim, levando-se em conta a frenética ansiedade com que o
mercado de games vem buscando sistematicamente um patamar cada vez mais
imperativo de realismo nos gráficos, um aparato como o proposto pelos
pesquisadores do MIT pode não contar com uma resposta de público maciça dos
gamers atuais, considerando que a qualidade de imagem sugerida nos estudos
equivale, até o momento, à de um monitor convencional de raios catódicos,
imensamente inferior ao mais básico monitor de plasma atual.
Por outro lado, abre-se aí também um vasto terreno para o uso criativo do
desenvolvimento de jogos que proponham interação mais elaborada e afinada
com estruturas narrativas mais complexas e instigantes e que ofereçam uma
imersão mais consistente, que prenda a atenção e o interesse do jogador, a
despeito de a experiência apresentar uma menor acuidade de qualidade nos
gráficos.
C. Telecinese e Comando à Distância
Uma proposta que vai um passo adiante na ousadia das experimentações
encontra-se no produto disponibilizado pela Interactive Productline, desde 2003,
conhecido como Mindball.
O produto, embora já seja largamente comercializado, parece ter ainda um
longo caminho de pesquisa para seu aperfeiçoamento e propõe, de forma
inusitada, a realização de partidas de um jogo por meio da movimentação de uma
bola sobre uma superfície sensível a impulsos elétricos enviados pelos
participantes da brincadeira. Sentados em extremidades opostas do tabuleiro,
dois jogadores afixam faixas à cabeça com eletrodos responsáveis pela recepção
e envio das ondas cerebrais alfa e teta que, transmitidas a um software de
mediação, que mede o grau de relaxamento dos participantes faz com que a bola
seja encaminhada para o campo do usuário intranquilo, que perde a partida.
Os desenvolvedores do produto afirmam que o objetivo do recurso é
apenas o de entreter as pessoas por meio do relaxamento, em contrapartida à
adrenalina e agitação típicas dos games em geral.
O artigo online da Slate Magazine, embora mostre certo ceticismo em
relação às potencialidades apresentadas pelo aparelho, levanta observações de
cunho técnico extremamente interessantes ao considerar que
‘Mindball não é [um aparelho] mágico, mas deveria funcionar. Você realmente pode usar
eletrodos de superfície para medir ondas alfa e teta e elas podem realmente refletir um
certo estado mental. Não há razão para que não possamos entrar em confronto,
relaxadamente, uma vez que a máquina esteja em um ambiente adequado, com um
técnico para monitorar os eletrodos e calibrar o equipamento” (ENGBER, 2006)
Para além do combate mental proposto pelos produtores, no entanto, o
produto certamente mostra grandes probabilidades de implementação em jogos
futuros, associado a outros aparatos que proporcionem uma sensação de
imersão plena, como no caso das projeções holográficas em escala humana (o
promissor Holodeck) e que permita uma interação do usuário com o meio digital
sem fazer uso de pesados equipamentos e sensores.
Ainda que esta possibilidade mostre-se tão fantasiosa quanto o próprio
universo de Warcraft, sua aplicação não pode ser descartada, se considerarmos
que, em pouco mais de 20 anos passamos dos blocos monocromáticos de
movimentação vertical nos monitores de raios catódicos para as artes poligonais
com milhões de cores e texturas em telas de plasma de até 100 polegadas. Um
feito inimaginável para os jovens jogadores de Atari, como observam alguns
autores.
3.4 Previsões e Expectativas
As opiniões que seguem mostram haver certas coesões de pensamento e,
em
alguns
casos,
considerações
absolutamente
conflitantes
entre
os
profissionais ligados ao meio. Isto demonstra a dificuldade em se estabelecer
uma reflexão tão subjetiva e com base em dados ainda inconsistentes, como a
possibilidade de o mercado sofrer uma guinada realmente irreversível em direção
à redução de complexidades nos gráficos e polígonos, em favor de uma
experiência de jogabilidade mais rica, como apresentada recentemente pelo
console Wii (e, como observado, excepcionalmente bem recebida pelo mercado e
– mais ainda – por uma parcela cada vez maior de não-jogadores que despertam
para o fenômeno) ou, ao contrário, retomar o desejo por gráficos de imagens de
qualidade
fotorealista
de
consoles
mais
sofisticados,
entendendo
que
jogabilidade não constitui o foco mais importante do desenvolvimento de games,
sem esquecer as pesquisas que envolvem a elaboração de games mais
complexos, com roteiros densos e dramáticos e uma narrativa que possa
transportar o gamer para universos imaginários sem precedentes.
Alguns autores, mesmo cientes do risco de um equívoco que possa
comprometer suas reputações futuras, arriscam tendências e palpites.
“Tentar prever a futura trajetória dos vídeo games é altamente problemático, talvez até
uma empreitada imprudente. A rapidez da mudança tecnológica e a imprevisibilidade do
desenvolvimento é considerável. Sentado na sala de estar, no final dos anos 70, jogando
Space Invaders no Atari VCS, teria sido certamente impossível de prever os ambientes
3D pseudo-fotorealísticos vivenciados em um sistema surround Dolby Digital 5.1,
tornados possíveis por meio do Xbox e do Playstation 2, por exemplo. O futuro do vídeo
game não é difícil de adivinhar meramente em virtude do andamento da mudança
tecnológica e do potencial criativo localizado sob as pontas dos dedos dos
desenvolvedores e designers. De fato, em contraste absoluto com o posicionamento
tecnologicamente determinista, o mecanicismo dos consumidores e a resistência são
fatores importantes e significativos na formação do vídeo game como um conjunto de
práticas culturais.
Realidade virtual e jogos online são, talvez, os exemplos mais óbvios de falsos inícios,
resultantes da resistência do consumidor. Enquanto a desenvolvedora britânica Virtuality
extasiou [o mercado] com seus novos [equipamentos] operados por fichas, baseados em
headsets em meados dos anos 90, a realidade virtual e toda a parafernália a ela
associada não teve qualquer impacto nas vendas para o mercado doméstico.
À despeito dos experimentos de pré-produção com joysticks e headsets para seu console
Jaguar da Atari, que não obteve sucesso além do circuito de apresentações de negócios,
e do console Virtual Boy, da Nintendo, lançado com um pouco mais de publicidade, mas
com
considerável apatia do consumidor... as tecnologias de realidade virtual
simplesmente não impactaram o [mercado de] entretenimento por computador, da forma
como proponentes como Rheingold (1991) previram... (NEWMAN, 2005, p. 163)
Dando continuidade a estas considerações, o autor observa:
Parte do problema com as previsões para o videogame é que elas tendem a inferir
exclusividade mútua. Os possíveis futuros são sempre apresentados como oposições
binárias:
-
O futuro dos games será alcançado online ou nos equipamentos de próxima geração
dos mobiles?
-
O futuro é single-player, multi-player (ou multi-player massivo)?
-
Continuarão os vídeo games a serem distribuídos como produtos completos ou em
episódios, talvez em resposta ao feed-back dos jogadores?
-
Os games ficarão mais longos ou mais curtos? Games de 100 horas dominarão ou os
games rápidos de 10 minutos alcançarão o triunfo?
-
Os games trarão a sua influência dos filmes ou haverá uma retranca que verá o
ressurgimento da jogabilidade sobre os gráficos?
Não há razão para que os vídeo games não possam se desenvolver em todas estas áreas
simultaneamente. Atualmente, por exemplo, os jogos retrô estão no páreo com o Xbox e o
Playstation 2, na busca de antigos catálogos [de jogos] das desenvolvedoras ansiosas por
capitalizar o fenômeno retrô que se ergueu com o portfolio do Game Boy Advance...
Vídeo game pode ser disponibilizado através de uma grande variedade de mídias. Desta
forma, o vídeo game não será distinguível por sua uniformidade, mas pela sua
diversidade (NEWMAN, 2004, p. 168/169)
Para Andrew Glassner, o game design desenvolve-se em um conceito por
ele defendido e denominado como “Story Environments”, uma linha de
pensamento que propõe a participação do jogador em espaço virtuais que
objetivam a troca de experiências sociais criadas por desenvolvedores de games
e contadores de histórias.
O autor propõe o seguinte contexto para a apresentação da idéia:
“A chave para a criação de uma nova forma de ficção participativa é a criação de
sistemas que sejam programáveis e adaptativos. Estas são qualidades que as pessoas
têm em abundância, razão pela qual um ‘dungeon master’ (mestre de jogo de RPG) pode
conduzir um jogo de D&D. Eu vejo este novo tipo de histórias acontecendo dentro de
ambientes de histórias. São mundos onde a trama, personagem, física, som, aparência
visual, comportamento e tudo que há em uma história é mediado por um software
adaptativo, que administra e mantém o ambiente.
... A diferença entre os mundos imaginários da televisão e o cinema e os que podemos
criar no computador é que podemos participar ativamente e mudar o ambiente
computadorizado... podemos habitar e nos movermos através deles... podemos agir por
nós mesmos e ver os efeitos da ação no mundo.
... Quando pudermos criar estímulos sensoriais que façam o ambiente imaginário parecerse, ter o toque e o gosto [do ambiente] verdadeiro, teremos cuidado da parte da presença.
Esta tecnologia Holodeck pode ser criada em mundos ao nosso redor ou (utilizando-se
estímulo cortical direto) pode ser criado, literalmente, dentro de nossas mentes.
... Embora ninguém saiba como criar hoje um ambiente perfeitamente realista, simulado,
é
indubitável
que
continuaremos a nos mover
cada vez mais perto desta
idéia ao longo do tempo...
Os ambientes baseados em
computador
nos
transportarão para locais e
tempos
cada
vez
mais
críveis e responsivos... Mas
esta tecnologia por si só não
será suficientemente uma
forma
participativa
de
história
viável.
(GLASSNER, 2004, p. 329.)
Holodeck: Ficção ou realidade alcançada?
O autor mostra acreditar verdadeiramente na criação de um universo de
fantasia virtual, plenamente imersivo e que permitirá não apenas navegação e
usufruto do recurso mas também a administração do espaço e o uso segundo
suas próprias características ou melhor, daqueles criadas pelos jogadores para
seus avatares. Observando os detalhes da proposta de Glassner, é possível
perceber semelhantes conceituais entre suas idéias e o projeto Storytron de
Crawford, já anteriormente citado e também com as opiniões e desejos de Janet
Murray, tornando-nos claro que o contingente de pensadores que vêm
elaborando teses e novas vertentes para o game design baseado na estrutura
narrativa vem ganhando projeção e encontrando novos discípulos, de maneira
sólida, ainda que paulatina.
De maneira complementar, vale salientar o potencial de propostas como o
Eyetoy da Sony, que, assim como os controles Wiimote, também sugere uma
participação mais ativa do jogador e aponta para um futuro onde sensores
diversos (imagem, som, movimento e até ondas mentais, como visto) deverão
outorgar nova dinâmica ao prazer da jogabilidade.
4. Considerações Finais
O tema deste estudo propõe, como visto, uma reflexão sobre os princípios
que nortearam a criação e o desenvolvimento dos primeiros grandes sucessos,
que alicerçaram a indústria dos games como conhecemos hoje. Muito há que ser
observado ainda nesta efervescente indústria para que possamos ratificar as
afirmações destes pesquisadores como verdades absolutas, mas está claro que
muito do que já foi proposto mostra sensatez e coerência e indica os novos
rumos para um bem sucedido game design.
Vale atentar para a opinião de certos autores, que apontam as
características que tornam marcante a criação de um jogo ou o desenvolvimento
de um produto voltado para o entretenimento eletrônico, que consiga obter
condições para transformar-se no próximo ícone do mundo dos games.
Em palestra proferida em 1999 ao público presente à Game Developers
Convention, Shigueru Miyamoto, sempre visionário e ponderado, comentava a
necessidade de trabalho conjunto e coeso entre designers e programadores:
“Na melhor das hipóteses, deve-se estar integrado com programadores talentosos e os
programadores devem ser capazes de fazer o jogo por si próprios e mantê-lo divertido...
no extremo oposto... não podemos nos esquecer da importância da inventividade humana
e criatividade no game design. Naturalmente, é a expressão única e inovadora de idéias
que origina a criação de novos jogos”. (MIYAMOTO, 1999)
Um artigo online da BBC, que avalia as perspectivas em relação à próxima
geração de consoles, pós Wii-PS3-360, confirma esta atenção para o fato e a
propensão para ousar além dos limites e romper barreiras técnicas, conceituais e
estéticas, focadas na excelência do game design. No texto, dois altos executivos
da indústria de games, Rory Armes, gerente geral da Electronic Arts na Europa e
Simon Gardner, o presidente da Climax Studio, uma desenvolvedora com quase
dez anos de estrada e alguns produtos respeitáveis no mercado, abordam os
aspectos técnicos que envolvem a produção e disponibilização dos avançados
recursos – sobretudo técnicos – brevemente presentes
nos
consoles,
considerando, de maneira surpreendente, que este fator somente não será o
bastante para atrair a atenção do público, provavelmente em virtude do padrão
isonômico
das
plataformas,
todas
com capacidades
de
processamento
certamente inimagináveis para os equipamentos atuais, mas provavelmente
equivalentes entre si.
Os experts ressaltam, no entanto, que há um grande campo a ser
explorado para os potenciais aprimoramentos no uso dos recursos da geração
atual de consoles.
O vice-presidente executivo e gerente geral para negócios internacionais
da Electronic Arts (a maior desenvolvedora de games do mercado), Gehard Florin
atenta para o fato de que o processo através do qual a indústria compreende e se
apropria das capacidades de processamento dos consoles a cada nova geração
é relativamente lento, o que faz com que jogos realmente impressionantes para
cada plataforma só venham a ser desenvolvidos depois de um certo período de
maturação deste conhecimento:
“Neste momento, os vídeo games usam, provavelmente, de 30% a 40% da capacidade do
novo hardware. Você só aprende o que pode fazer com estas plataformas depois de
algum tempo e, como resultado, o uso de 100% do Playstation 2 é próximo o bastante do
ponto inicial dos jogos de PS3 hoje. Nós sequer começamos a ver o poder do PS3 e ainda
levará um bom tempo até explorarmos sua totalidade.” (FLORIN, 2007)
Cory Barlog, diretor do game God of War 2, comenta que o grande apelo
para que ainda se produzam games para o PS2 está no fato de seu time de
especialistas em game design e programação dominar com mestria os
procedimentos para a criação de jogos para o console.
“Neste ponto, conhecemos intimamente o hardware [do PS2}, conhecemos todos os
truques. Mas, quando você começa a trabalhar com um novo console, é como se você
tivesse que apertar o botão ‘reset’. Você tem que reaprender tudo.” (BARLOG, 2007)
Outro fator preocupante para a indústria reside na escalada vertiginosa de
custos para a produção de games para cada nova geração de consoles, tendo
em vista os custos de produção com design gráfico dos jogos, que exigem
sistematicamente mais idéias e criatividade, mais texturas e acabamento, mais
modelagens e iluminação das seqüências, mais polígonos que construam de
forma crível estes objetos e, consequentemente, mais processamento de dados e
tempo para a elaboração e finalização de um produto tão complexo.
Para tentar minimizar este problema, a criatividade de soluções deve se
estender para além do game design, impelindo as áreas administrativas a buscar
receita em outras fontes de renda, como observa Florin, em outro trecho do
artigo:
“Para sobreviver e expandir, as desenvolvedoras devem mover-se além dos jogos para
consoles e computador, e firmar-se em três ‘pernas’ adicionais:
-
Jogos para haldhelds
-
Celulares e móbiles, que estão em alta e chegando e
-
Comunidades online, a ‘quinta perna’.” (FLORIN, 2007)
Porém, de nada servirá às empresas desenvolvedoras de games amortizar
custos da alta tecnologia das novas plataformas e até mesmo tornar os games
mais baratos por meio de parcerias as mais diversas, se o resultado final não
encher os olhos do gamer e tocar seu coração, com uma história envolvente,
intrigante e sedutora. Neste sentido, Rory Armes alerta que as empresas ainda
têm muito que aprender no que diz respeito à necessidade de contar histórias de
forma eficiente neste novo meio:
“Em algumas áreas estamos tentando esquecer do hardware, indo na direção contrária.
Temos ido muito mal permitindo que a tecnologia determine nossa criatividade. O que
precisamos fazer como empresa é começar a ignorar a tecnologia e aprender nosso
trabalho na contação de histórias.” (ARMES, 2007)
Da mesma forma, Gardner vem corroborar estas impressões, ao observar
a necessidade de utilizar-se de todo este arsenal tecnológico proporcionado
pelas inovações dos novos consoles, com a finalidade indiscutível de
desenvolverem-se jogos mais interessantes e melhores:
“Podemos jogar mais polígonos lá e ter uma IA melhor, mas se isso não se transformar
em um jogo melhor, então não será muito útil” (GARDNER, 2007)
Peter Molyneaux, CEO e diretor de criação da Lionhead Studios, mostra
não ter dúvidas em relação à importância da cultura game em nosso cotidiano em
um breve futuro. Em recente entrevista, o criador observa com inspiradora
confiança:
“Nós seremos emocionalmente influenciados pelos games, tanto quanto somos pelos
filmes, fotos ou músicas. Nós iremos rir e sorrir, e falaremos sobre eles e estaremos
emocionalmente cercados por eles.” (KAP, 2006)
4.1 Narrativas e Novas Tecnologias
Como visto, muitas são as opiniões que corroboram a idéia de um game
design a cada dia mais propenso a uma concepção narrativa.
A própria dinâmica cíclica do hardware, que se renova com maravilhas
tecnológicas sem precedentes a cada novo lançamento de consoles, acaba por
favorecer o intento daqueles em busca de mais do que tiros e sobresaltos em
plataformas diversas. De fato, à medida em que os jogadores habituam-se às
clássicas estruturas de concepção e design de jogos existentes há décadas, seus
criadores necessitam de estratégias e de um arsenal de criatividade mais
ousados e impetuosos, visando não somente satisfazer este público, mas propor
alternativas que possam fidelizar a nova base de jogadores casuais e nãojogadores que começa a manifestar-se com interesse para esta forma de
entretenimento.
Fatalmente, caminhamos no rumo de games mais elaborados, com I.A.
mais primorosa e complexa, que ofereça ambientes imersivos, avatares
independentes e processos de jogabilidade ainda não concebidos nas pesquisas,
mas que serão o cerne dos games de amanhã.
Mesmo que as discussões acadêmicas de hoje em torno da narratologia
pareçam meras expeculações e conjecturas, o roteiro para a criação de games
será um elemento cada vez mais elaborado, antevendo possibilidades de ação e
jogabilidade revolucionários para os padrões vigentes no limiar deste século,
propondo-nos imersões singulares e marcantes, que certamente contribuirão em
campos hoje superficialmente atingidos, como o processo de formação cognitiva,
a semiótica e a radical modificação de nosso modus vivendi contemporâneo,
assumindo o game como parcela cotidiana, fundamental e indissociável de
nossas vidas.
Assim como nosso cognitivo apropriou-se da linguagem cinematográfica,
permitindo-nos conceber o traslado de um personagem por meio da fusão de
duas tomadas que apresentem sua subida e descida de um veículo, também
estaremos aptos, em um curto prazo a fazer uso das possibilidades narrativas
que as mídias digitais e particularmente os games nos oferecerão.
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