SILVA, ZÉLIA LOPES DA. OS CARNAVAIS NA
CIDADE DE São Paulo nos anos de 1938 a
1945. In: FENELON, Déa Ribeiro, at all. Muitas
memórias, outras histórias. São Paulo: Olho
Dágua, 2004, p. 68-93.
As interpretações sobre os
festejos carnavalescos brincados
no país entre 1938 a1945 >
imbricamento entre memória e
história > desconsideração das
especificidades do período.
Aliado às dificuldades
conjunturais > firmou-se certa
leitura sobre essas celebrações
que aponta a inflexão em sua
estrutura como uma decorrência
da incorporação das classes
populares nos circuitos do
carnaval oficial, a partir da ação
do próprio Getúlio Vargas, seu
principal protagonista.
Leituras do carnaval- período
pós-30
Essa posição
sobre o papel
de Vargas
nesse
processo
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campos
opostos os
poucos
autores que
estudaram o
carnaval do
período.
Maria Isaura P. Queiroz
X
Rachel Soihet
Leituras do carnavalperíodo pós-30
• QUEIROZ
• SOIHET
admite que tais
estranha essa
mudanças
interpretação,
ocorreram sob
objetando que a
o beneplácito
autora
de Vargas que
promove a
desconsidera a
ascensão das
presença das
escolas e do
classes
samba como
populares nos
uma
carnavais da
decorrência de
seu
cidade, desde o
nacionalismo
início do século,
exacerbado,
e de suas lutas
não passando
tal incorporação para serem
aceitas nos
de um “arranjo
de cima” (p.69). circuitos dessas
celebrações.
Leituras do carnaval- período
pós-30
Soihet afirma, ao contrário,
que foi a partir de sua ascensão
> que “Vargas vale-se da
música popular e das
agremiações carnavalescas
como veículo para a integração
dos populares ao seu projeto de
construção de nacionalidade”.
Insiste Soihet que houve
empenho por parte das
lideranças populares para
afirmar essa presença nos
circuitos mais amplos do
sistema, garantindo a ocupação
das ruas nessas celebrações.
Leituras do carnaval- período
pós-30
Conclui que houve CONVERGÊNCIA
DE INTERESSES, o que garantiu o
“predomínio popular no carnaval e o
samba sua música característica”.
- O que se deixa de mencionar > é que
durante o período de guerra > houve
interrupção desse processo devido as
dificuldades enfrentadas pelo próprio
país, nem sempre mencionadas
nessas análises > mas que são
responsáveis pela desestruturação
definitiva das antigas formas – corso,
desfiles de rua das Sociedades
Carnavalescas - de festejar os Dias
Gordos. Essas formas já estavam em
franca superação pela emergência de
novas práticas carnavalescas
populares, como os ranchos, os
cordões que a cada carnaval
despertava mais interesse aos foliões
> imprimindo um outro perfil ao
carnaval (p. 69).
Mudanças na estrutura do
carnaval durante os anos 1930
As mudanças que ocorreram na estrutura dos
folguedos carnavalescos do Rio de Janeiro no
início dos anos 30 > projetaram-se para os
folguedos praticados em outras regiões do país,
consagrando como paradigma o baile de gala
oficial,as escolas de samba, e os desfiles oficiais,
o Rei Momo e a Rainha do Carnaval > elementos
constitutivos da nova estrutura dessas
celebrações.
Esse modelo > sofre interregno durante a Guerra
e, também, não foi aceito em todas regiões do
país, notadamente naquelas em que essas
folganças se apoiavam em outras tradições, o
que se verifica, no Norte e no Nordeste brasileiro.
Mudanças na estrutura do
carnaval durante os anos 1930
Os festejos carnavalescos no período, porém,
estiveram subordinados a injunções
conjunturais:
- Internamente, os foliões enfrentavam uma
ditadura (censura e interdições diversas) e
crise econômica (aumento dos preços,
racionamento de combustíveis e produtos
essenciais);
- Externamente > Problemas decorrentes da
Guerra > afetaram a economia mundial (
problemas de ampliação dos palcos de
guerra, dificuldade de abastecimentos em
geral)
Na cidade de São Paulo > ao longo desse
período, as brincadeiras carnavalescas >
carregam as marcas de mudanças em curso.
Na gestão do Prefeito Fábio Prado (19341938) > houve ensaio de institucionalização
do carnaval na cidade em torno das
Sociedades Carnavalescas e não das Escolas
de Samba, como ocorrera no Rio de Janeiro.
Mudanças na estrutura do
carnaval durante os anos 1930
A leitura dos jornais da época > sinaliza que
os festejos se organizaram a partir dos
clubes e das associações diversas que
promoveram, na conjuntura, em seus
recintos, os bailes e atividades variadas
durante os Dias Gordos, ficando em segundo
plano o carnaval de rua (p.70).
As mudanças de diretrizes gerais do país >
tiveram desdobramentos no carnaval
>marcado pelo forte esquema de segurança e
pela censura prévia, em todo o território
nacional.
Em São Paulo > O carnaval de 1938, ainda
esteve a cargo do Prefeito Fábio Prado, pois
Prestes Maia assumiu a Prefeitura da capital
em abril. Porém, submetido a muitos prérequisitos e forte censura. Os bailes, as
passeatas, os desfiles dos cordões, blocos e
ranchos só poderiam ser realizados mediante
licença da Seção de Divertimentos Públicos
da Delegacia de Costumes. Os bailes
deveriam acabar as 4hs da manhã. E os
préstitos carnavalescos dependiam de
vistoria prévia e autorização dos órgãos de
censura política e aos costumes.
Os carnavais no tempo da
ditadura: censura política e
aos costumes
A censura prévia também se
estendia às letras de música e
as fantasias que lembrassem
uniformes oficiais (p. 71).
Também estavam proibidas as
bebidas alcoólicas, o uso de
máscaras, na via pública e os
grupos de “indivíduos
maltrapilhos”, sob a
justificativa de serem blocos.
Os carnavais no tempo da ditadura.
Censura política e aos costumes
As alterações se fizeram sentir, de forma
decisiva no carnaval de 1939, sob a direção
de Prestes Maia, embora a estrutura anterior
ainda tenha permanecido.
Ocorreram os desfiles de rua das Grandes
Sociedades Carnavalescas: Tenentes do
Diabo e Fenianos > financiamento do governo
do Estado.
A Prefeitura iluminou algumas ruas e
construiu alguns espaços cenográficos nas
av. S. João, Rangel Pestana e, os tablados, na
Praça da Sé e no Largo da Concórdia.
As proibições e as advertências voltaram-se
ao porte de armas, bebidas alcoólicas,
brincadeiras que resultassem em desacato à
autoridade, brincadeiras grosseiras e o
cuidado com as crianças nos desfiles de rua
e nos bailes.
O jornal O Estado de S. Paulo > avaliou o
conjunto dos folguedos negativamente. O
carnaval de rua foi um fracasso, exceção feita
aos bailes populares nos tablados da Praça
da Sé e do Largo da Concórdia.
Os carnavais no tempo da ditadura.
Censura política e aos costumes
Essa crise constatada nas celebrações de
Momo foi evidenciada, com ênfase, pelo
OESP situação que se arrastou para os
anos seguintes.
O carnaval de 1940, por exemplo, não
contou com os desfiles de rua das
“Grandes Sociedades Carnavalescas”,
que endividadas e sem ajuda oficial não
conseguiram estruturar os seus desfiles
de rua, a exemplo de o Clube Tenentes
do Diabo.
Porém, mantinha-se o carnaval que se
projetara para a cidade durante o
processo de institucionalização, inclusive
o modelo de ornamentação das ruas com
espaços cenográficos, a partir de letras
de música de sucesso, ou de temas
alusivos a essa folia, os certames com
comissões julgadoras, o baile de gala
oficial no Teatro Municipal (p.74).
Os carnavais no tempo da ditadura.
Censura política e aos costumes
Na execução dessas decisões, em 1940,
alguns logradouros públicos receberam
ornamentação específica, a exemplo de, a
montagem de tablados na Praça da Sé (com o
tema “Mal-me-quer”); no Largo da Concórdia,
no Brás, (inspirado no tema “Passarinho no
relógio”) e em Santo Amaro (com o tema
“Maria Cachucha”); a preparação do Largo do
Arouche e Santana para as batalhas de
confete, e da Avenida S. João, para os
desfiles dos blocos, ranchos e cordões,
durante o carnaval.
Os temários foram inspirados em marchinhas
carnavalescas, compostas para essas
festanças e que estavam fazendo sucesso
nas rádios e, também, em tradições
populares européias. As escolhas recaíam
em letras ou temas que carregavam certos
elementos críticos e irreverentes, e passíveis
de associação aos festejos carnavalescos e
explorados em seus múltiplos sentidos .
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• A montagem do tablado “Passarinho do
relógio”, no Largo da Concórdia, por exemplo,
inspirou-se na marchinha de autoria de
Haroldo Lobo e Milton de Oliveira. Foi gravada
por Araci de Almeida, e satirizava (de forma
sutil) - desconsiderando a censura oficial certas preocupações presentes nos circuitos
governamentais em relação à disciplina para o
trabalho. A letra é a seguinte:
• Cuco-cuco-cuco!
• O passarinho do relógio está maluco
• Ainda não é hora do batente
• Ele fica impertinente
• Acordando toda a gente
• (fazendo)
• Eu pego às oito e quarenta e cinco
• E levanto às sete, pra tomar banho e café
• Pois quando são mais ou menos três e cinco
• Ele começa: cuco-cuco-cuco
• e só termina quando estou de pé/(pois é, pois
é)
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• A letra traz essa possibilidade de leitura,
por se colocar muito próxima ao universo
do “samba malandro regenerado”,
analisado por Claudia Matos, no livro
Acertei no milhar, no qual o malandro (ou
sambista) em que pese ter aderido ao
sistema, ainda apresenta dificuldades para
se enquadrar às suas regras, o que fica
subentendida nas letras daquelas canções.
Mesmo que não houvesse referência direta
às posturas vigentes de disciplina para o
trabalho, o cuco funcionava
metaforicamente como o obstáculo para
impedir a quebra dessa disciplina, papel
que, em regra, nas letras do samba
malandro regenerado, era assumido pela
mulher.
• -( MATOS, Claudia. Acertei no milhar.
Malandragem e samba no tempo de
Getúlio. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982).
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• No tablado da Praça da Sé, a referência foi a
marcha rancho “Malmequer”, de Newton Teixeira e
Cristovam de Alencar, gravada por Orlando Silva,
cuja letra traduzia uma desilusão amorosa, tão ao
gosto do temário lírico-amoroso, de vertente
romântica que se delineava no âmbito do samba
produzido no período. A letra é a seguinte:
• Eu perguntei a um malmequer
• Se meu bem ainda me quer
• E ele então me respondeu, que não
• Chorei, mas depois eu me lembrei
• Que a flor também é uma mulher
• Que nunca teve coração
•
• A flor-mulher
• Iludiu meu coração
• Mas, meu amor
• É uma flor ainda em botão
• O seu olhar
• Diz que ela me quer bem
• O seu olhar
• É só meu, de mais ninguém...
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• Os versos dessa cançoneta
celebram o amor não
correspondido entre um homem
apaixonado e uma jovem e bela
mulher, impiedosa e sorrateira,
cuja simbologia remete ao amor
impossível de Pierrô por
Colombina, eternizado nos muitos
carnavais ao longo dos tempos e,
atualizado pelos poetas populares,
nos versos dessa canção de 1940,
alegoricamente tematizado.
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• Já o mote de “Maria Cachucha”,
considerado pelo jornal de difícil
tradução cenográfica, apoiava-se
numa linhagem de tradição
cultural popular, que remontava
ao início do século XIX. Originária
de Cádiz foi descrita, segundo
Câmara Cascudo, como “uma
dança espanhola de par solto,
sapateada com castanholas e
cantada”, que tinha como suporte
uma canção popular de
marinheiros, nascida entre 18101812 - la “Cachucha”. Ambas
foram difundidas na Europa e na
América Latina, de acordo com o
musicólogo mexicano Vicente T.
Mendonza, citado por Cascudo.
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• A “cachucha”
era muito
popular no
Brasil de
meados do
século XIX,
principalmente
nos teatros das
cidades e
vilarejos. De
acordo com o
folclorista, eram
cantados no
Brasil muitos
versinhos,
possivelmente
com a música
da cachucha ou
maria-cachucha,
como os que se
seguem:
• “Maria Cachucha
• quem é teu
pimpão?
• - É um moço
bonito
• Chamado Janjão!
• Maria Cachucha
• Com quem
dormes, tu?
• - Com um
marinheiro
• Chamado Angu! –
Os carnavais de rua – os
tablados oficiais
• Se o temário era de difícil “tradução
cenográfica”, como pensava o jornalista
de o Correio Paulistano, o sentido
popular e sensual da “mulher-símbolo”
que servia de inspiração não podia ser
mais apropriado para um cenário
carnavalesco, uma vez que a dança, a
música e a própria personagem
sinalizavam para a “liberalidade e
sensualidade” que alguns sujeitos ainda
projetavam para a folia e, também, o
sentido popular que se queria sedimentar
nessas festanças. Além disso, os
personagens dos versos poderiam ser
pensados como ícones do
desregramento: uma mulher popular,
desejada e sensual e um marinheiro,
também famoso pelo desregramento nos
amores e “desejos do baixo ventre”,
como diria Bakhtin (muito sexo, comida e
bebida).
• Não sabemos se essas projeções foram
motivadoras de um carnaval de rua irreverente
e animado, uma vez que os cenários nem
sempre são suficientes para tornar a folia
efetivamente bem sucedida. Mas, podemos
afirmar que os tablados já haviam conquistado
certa legitimidade, ao oferecerem aos foliões
sem muitos recursos os bailes populares de
rua que, pela sua animação, já haviam
conquistado fama e espaço na imprensa.
• Nos anos seguintes (1941/1945), a tendência
ao esvaziamento do carnaval de rua se
acentuou em favor de um carnaval em
espaços fechados, fossem eles tradicionais
como os clubes, ou novos, como os estádios
de futebol, a exemplo do Pacaembu, cuja
diretoria promoveu animados bailes durante o
carnaval de 1942.
• Assiste-se, ainda nesse ano (1942), a
algumas batalhas de confete em bairros como
Bela Vista, Cambuci e Largo do Arouche. E,
também, ocorrem alguns desfiles de blocos,
ranchos e cordões, organizados pelo Centro
Paulista dos Chronistas Carnavalescos, na
Avenida S. João, embora não seja possível
dimensionar sua real repercussão.
Os carnavais no tempo da ditadura.
Censura política e aos costumes
As proibições, contudo, foram recorrentes
nesse período e também o esvaziamento
desses festejos. Porém, elas se
acentuam entre os anos de 1943-1945. O
carnaval de 1943, por exemplo, sofre
sérias restrições dos órgãos de
Segurança. As proibições gerais emitidas
pelo secretário de Segurança são as
seguintes:
1. “Os bailes carnavalescos, blocos,
cordões e outros agrupamentos, bem
como as passeatas, só poderão ser
realizadas com a devida licença das
autoridades competentes;
2. A exibição de estandartes ou alegorias,
para fins carnavalescos, só será
permitida quando autorizada por esta
Secretaria e demais autoridades
competentes;
3. Os bailes carnavalescos se iniciarão às
22 horas e se encerrarão às 4 horas, não
se tolerando qualquer prorrogação;
Os carnavais no tempo da ditadura.
Censura política e aos costumes
4. Não será permitido o uso de
objetos que se possam tornar
instrumentos de agressões,
tais como latas, fragmentos de
madeira e semelhantes;
5. Proíbe-se também o uso, à
guisa de fantasia, de
uniformes, distintivos,
emblemas, bonés, botões,
golas, fitas, etc, adotadas
pelas classes armadas Esta
medida se torna extensiva
também a quaisquer outros
uniformes, afim de que não se
confundam os fantasiados
com quem, pela sua função
pública ou particular, seja
obrigado, a usá-los;
Os carnavais no tempo da ditadura.
Censura política e aos costumes
6. Fica expressamente proibido o uso de
máscaras de qualquer espécie e bem assim
outros meios que sirvam para dificultar a
imediata identificação das pessoas;
7. Fica proibida nos dias 6,7, 8 e 9 do
corrente, a venda de bebidas alcoólicas (...);
8. Durante os folguedos fica permitido o uso
de lança-perfumes (...)
9. É proibido o uso de pós-ácidos, e outras
substâncias irritantes que se destinam a fins
carnavalescos;
10. As autoridades policiais deverão dar todo
o apoio aos representantes dos Juizes de
Menores e aos agentes fiscais federais,
estaduais e municipais a serviço de suas
repartições;
11. É vedada, nos festejos carnavalescos,
qualquer manifestação ou alusão referente ao
atual conflito mundial;
12. Não se permitirão, nas passeatas ou
agrupamentos carnavalescos, críticas ou
alegorias que objetivem o governo ou a sua
orientação política internacional” (OESP,
7/5/1943).
Interdições e desobediências
Apesar dessas proibições terem um
caráter generalizado para todo o país,
nem sempre o folião levou a sério os
interditos,insurgindo-se, ao seu modo,
“aos excessos de zelo” das
autoridades.
O carnaval, nesse contexto, provocou
debate sobre se seria ético cair ou não
na folia, face ao quadro de guerra.
Porém, à medida que a crise avança e
as posições polarizam-se; a defesa
(expressa nos jornais) é para o folião
cair na folia como forma de esquecer
as agruras e as dificuldades
decorrentes do alto custo de vida, do
racionamento dos combustíveis e de
alimentos, vividas cotidianamente.
Interdições e desobediências
O envolvimento e o posicionamento do
país na guerra, ficaram registrados nas
músicas que embalaram a folia durante
esses anos, independente das
proibições oficiais.
Os compositores populares
engajaram-se no processo
manifestando, a partir das letras de
suas músicas, os seus alinhamentos
políticos. As suas críticas voltam-se
para Hitler nas letras das marchinas
“Adolfito mata-moros”(João de Barros/
Alberto Ribeiro), “Que passo é esse
Adolfo?”(Haroldo Lobo/Roberto
Roberti) “Abaixa o braço”( Elpídio
Viana/Nelson Trigueiro). Os
compositores, usando o deboche e a
sátira imprimem derrota àquele que
aparece nesse cenário como o chefe
todo poderoso e invencível. Nas
alegorias adotadas ele sofre derrotas e
é enganado até por uma (esperta)
cigana.
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A marcha “Adolfito Mata-Moros”, de João de Barros e
Alberto Ribeiro, ridiculariza Adolfo Hitler, caracterizandoo como matador, de eficácia duvidosa. O seu
destroçamento já se expressa no diminutivo do nome e
no bigode, a partir do qual tenta desqualificá-lo em sua
pretensão de homem todo-poderoso que objetivava
dominar o mundo. O texto é o seguinte:
A los toros
A los toros
A los toros
Adolfito mata-moros
Adolfito bigodinho era um toureiro
Que dizia que vencia o mundo inteiro
E num touro, que morava em certa ilha
Quis espetar a sua bandarilha
Trá lá lá lá lá lá
Lá lá lá lá lá lá
Lá lá lá lá lá lá
Trá lá lá lá lá lá
Mas o touro não gostou da patuscada
Pregou-lhe uma chifrada
“Tadinho” do rapaz!
E agora o Adolfito caracoles
Soprando pelos foles
Perdeu o seu cartaz
Interdições e desobediências
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Opõem-se, nessa alegoria o Touro (o líder inglês) e o Toureiro (Hitler) que
não era tão habilidoso como supunha, sendo derrotado por uma única
chifrada, para deleite da platéia que perde o respeito por ele. As suas
ações são qualificadas de farras, e sua derrota digna de pena,
completando a desmontagem do personagem, que sofre um verdadeiro
charivari coletivo, já que a letra tem um alcance bastante amplo.
Já a marchinha “Que passo é esse, Adolfo?”, de Haroldo Lobo e Roberto
Roberti, satiriza, de forma jocosa e desqualificadora, o estilo marcial das
legiões hitleristas. Os autores ridicularizam na letra, de forma contundente,
esse estilo, concluindo que se trata de um “passo de ganso” que não
agrada a ninguém. E, só pode ser fruto da astúcia e do ardil de uma
cigana que quis brincar com o próprio Hitler. A letra é a seguinte:
Que passo é esse, Adolfo
Que dói a sola do pé
É o passo de gato,
Não é
É o passo de rato,
Não é
É o passo de ganso
Qüem, qüem, qüem, qüem
Esse passo muita gente já dançou
ôôô
Mas a dança não pegou, ô
Ô Adolfo, a cigana te enganou
Ôôô
Sai pra outra que a turma não gostou
O charivari era uma brincadeira executada, durante o carnaval, que
ridicularizava aqueles que tinham comportamentos considerados danosos
ou impróprios pela coletividade, que, nessa ocasião, eram castigados por
meio de insultos e impropérios. Consultar sobre o assunto: ZEMON,
Natalie Davis. Culturas do povo. Sociedade e Cultura no início da
França Moderna. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990, p. 101/102.
Interdições e
desobediências
• Apesar da força satírica dessas
canções, elas não foram as
favoritas dos foliões, não se
sabe se devido às proibições,
ou pelo desinteresse dos
próprios pândegos (p. 86-90).
• Assim, os carnavais desses
anos de guerra ficaram
circunscritos aos espaços
fechados ou aos redutos
populares tradicionais. Porém,
sem o brilho dos carnavais de
outrora.
Considerações finais
Essa é avaliação dos jornais do período,
embora não seja consensual. O OESP
qualificava o fim dos Dias Gordos, posição
não partilhada pelo Correio Paulistano.
Independente dessas avaliações, depreendese que os festejos carnavalescos desse
período estiveram marcados por muitas
proibições e um policiamento ostensivo
voltado para o controle das manifestações
populares. Suas práticas foram cerceadas,
em decorrências de fortes proibições e
interditos que estabeleceram censura prévia
as suas canções, indumentárias, alegorias,
brincadeiras jocosas, e aos desfiles de suas
agremiações nos logradouros públicos.
1. No entanto, nem sempre tais empecilhos
arrefeceram os foliões que continuaram
brincando o carnaval, mesmo que em
espaços fechados.
Considerações finais
2. As tensões permearam essas
folganças, marcados por
confrontos recorrentes entre a
policia e foliões. Por essas
avaliações, as medidas
impopulares eram difíceis de
serem controladas pela polícia
que não conseguia autuar os
bares ou impedir que foliões
criassem de improviso, letras
picantes parodiando outras
canções sob as quais não recaiam
quaisquer interditos. A própria
polícia evidencia essas
dificuldades, atribuindo os
excessos ao abuso de bebidas.
Considerações finais
3. É possível falarmos em mudanças e uma
delas diz respeito ao corso que deixou de
acontecer na cidade, em 1943, como uma
decorrência do racionamento de combustível
devido aos esforços de guerra. Porém, essa
forma já apresentava sinais de esgotamento,
por não ser mais do agrado de seus antigos
participantes (membros das elites) por se
achar “muito misturada”.
Esse processo também atingiu as Grandes
Sociedades Carnavalescas que, em 1940,
encerraram sua etapa de participação nos
carnavais da cidade.
Em seu lugar, passaram a ocupar espaço
nessas celebrações os cordões, as escolas
de samba dos grupos negros e de outros
segmentos das classes populares que se
tornaram as atrações dos carnavais
organizados pelas rádios e jornais da cidade,
implementando as mudanças sinalizadas na
década de 30 e, oficializadas no final da
década de 60.
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APRESENTAÇÃO CARN