Artigo de Revisão
O papel de p16 e Ki 67 em carcinomas de células
escamosas de cavidade oral e orofaringe
The role of p16 and Ki 67 in squamous cell carcinomas of
the oral cavity and oropharynx
Resumo
Introdução: Os carcinomas de células escamosas de cavidade
oral e orofaringe apresentam incidência crescente no Brasil e no
mundo. Esses carcinomas são geralmente distintos quanto ao
padrão de crescimento, comportamento clínico e prognóstico.
A carcinogênese oral é um processo de múltiplos estágios que
envolvem a participação de várias proteínas que controlam o ciclo
celular, incluindo p16 e Ki 67. A proteína p16 é uma inibidora de
quinases dependentes de ciclinas e atua regulando o ciclo celular,
enquanto Ki 67 está presente no núcleo celular em divisão,
funcionando como marcador de proliferação celular. Objetivo:
O objetivo deste trabalho consistiu em revisar a literatura acerca
do papel dos marcadores tumorais p16 e Ki 67 em carcinomas
de células escamosas de cavidade oral e orofaringe. Método:
A revisão da literatura foi feita nas bases de dados Scielo e
PubMed/Medline durante o período de 2000 a 2013. Resultados:
Os resultados obtidos foram conflitantes em relação ao papel
da expressão de p16 nos carcinomas de cavidade oral, embora
sua função pareça estar associada à proliferação celular dos
carcinomas. Com relação ao marcador Ki 67, os resultados
foram menos discrepantes e os estudos demonstraram que
o aumento de sua expressão em carcinomas de cavidade oral
esteve associado ao alto grau de displasia, diferenciação tumoral
e maior agressividade do tumor. Considerações finais: Os
resultados conflitantes apresentados neste trabalho sugerem que
são necessárias novas pesquisas com critérios de avaliação mais
precisos em relação ao papel dos marcadores tumorais p16 e Ki
67 nos carcinomas de cavidade oral e orofaringe.
Descritores: Inibidor p16 de Quinase Ciclina-Dependente;
Neoplasias Bucais; Neoplasias Orofaríngeas; Imunoistoquímica;
Antígeno Ki-67.
INTRODUÇÃO
O carcinoma de células escamosas (CEC) de cabeça
e pescoço é o sexto câncer mais incidente do mundo,
constituindo mais de 90% de tumores malignos da
cavidade oral e orofaringe1. Este tipo de carcinoma está
associado a um alto índice de morbidade e mortalidade
Nathalia Machado Seixo de Britto 1
Hellen da Silva Cintra de Paula 2
Vera Aparecida Saddi 3
Abstract
Introduction: Squamous cell carcinomas of the oral cavity and
oropharynx show increasing incidence in Brazil and worldwide.
These carcinomas are usually distinct concerning the pattern of
growth, clinical behavior and prognosis. Oral carcinogenesis is a
multistage process involving the participation of several proteins
that control the cell cycle, including p16 and Ki 67. The p16 protein
is a cyclin-dependent kinases inhibitor and acts regulating the cell
cycle, whereas Ki 67 is present in the nucleus during cell division,
functioning as a molecular marker of cell proliferation. Objective:
The objective of this study was to review the literature on the role
of the tumor markers, p16 and Ki 67, in squamous cell carcinomas
of the oral cavity and oropharynx. Method: A literature review was
performed on the Scielo and Pubmed/Medline databases during
the period 2000-2013. Results: The results were conflicting
regarding the role of p16 expression in carcinomas of the oral
cavity, although its function appears to be associated with the
carcinomas cell proliferation. Regarding Ki 67, the results were
less contradictory and the studies have shown that Ki 67 increased
expression in carcinomas of the oral cavity was associated
with high-grade dysplasia, tumor differentiation and increased
tumor aggressiveness. Final comments: The conflicting results
presented here suggest that more research is needed in order
to provide more precise evaluation criteria regarding the role of
tumor markers p16 and Ki 67 in carcinomas of the oral cavity and
oropharynx.
Key words: Cyclin-Dependent Kinase Inhibitor p16; Mouth
Neoplasms; Oropharynx; Immunohistochemistry; Ki-67 Antigen.
por câncer2. Trata-se de uma neoplasia epitelial invasiva
com variados graus de diferenciação e propensa ao
aparecimento precoce de metástase em linfonodos.
Ocorre predominantemente em usuários de álcool e
tabaco, do sexo masculino, com idade média entre 50
e 70 anos. O CEC está associado também as infecções
virais pelo Papilomavírus humano (HPV)3.
1)Graduação em Biomedicina. Biomédica.
2)Mestrado. Biomédica e Docente.
3)Doutorado. Docente.
Instituição: Pontifícia Universidade Católica de Goiás e Associação de Combate ao Câncer em Goiás.
Goiania / GO – Brasil.
Correspondência: Hellen da Silva Cintra de Paula - Rua 239 Nº 52 Qd. 89A Lt.29 Setor Leste Universitário – Goiânia / GO – Brasil - CEP 74605-070.
Artigo recebido em 10/09/2014; aceito para publicação em 12/12/2014; publicado online em 15/04/2015.
Conflito de interesse: não há. Fonte de fomento: não há
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O papel de p16 e Ki 67 em carcinomas de células escamosas de cavidade oral e orofaringe.
Estes carcinomas são geralmente distintos quanto
ao padrão de crescimento, comportamento clínico e
prognóstico. Tumores de cavidade oral costumam ser
mais diferenciados do que os carcinomas de orofaringe.
Porém, carcinomas de orofaringe apresentam uma alta
tendência de recorrer localmente e gerar metástase2.
Modelos em animais e análises moleculares indicam
que os CEC de cabeça e pescoço resultam do acúmulo
de múltiplos eventos genéticos ou alterações de genes
críticos. As células anormais resultantes resistem à
apoptose, logo apresentam vantagens proliferativas
sobre as células normais e sobrevivem ao sistema
imune do paciente2.
O fator de risco mais importante para o CEC de
cabeça e pescoço é o uso abusivo do tabaco e do
álcool1. Um efeito carcinogênico em potencial pode ser
estabelecido se o uso do álcool e do tabaco acontecer
de forma simultânea. Metabólitos do álcool, como o
acetaldeído, interferem na síntese e no reparo do DNA.
O papel carcinogênico do álcool parece residir na sua
capacidade como solvente na parte tecidual, o que
potencializa os efeitos dos constituintes do tabaco e
assim seus efeitos carcinogênicos4.
Cerca de 25% dos casos de carcinomas de células
escamosas de cabeça e pescoço estão relacionados
ao HPV. O HPV mais detectado é o tipo 16, presente
em 90% a 95% dos casos seguido pelos HPV 18, HPV
33 E HPV 352.
Os HPV de alto risco, 16 e 18, codificam duas
oncoproteínas virais importantes, E6 e E72. A proteína
E7 do HPV 16 é capaz de ligar se à proteína do
retinoblastoma (pRb), que regula a transição G1/S do
ciclo celular, inativando-a5. Enquanto que a proteína
E6 expressa suas atividades oncogênicas por meio
da imortalização das células primárias, transformação
de linhagens celulares estabelecidas, resistência à
diferenciação celular terminal e abolição do ponto de
checagem do ciclo celular5. Esses dois mecanismos
podem contribuir de forma importante para a
carcinogênese. Portanto, os carcinomas de células
escamosas de cavidade oral associados ao HPV
representam um grupo tumoral específico, diferente
dos demais carcinomas, já que estudos de caso
controle comprovaram que as ações oncogênicas do
HPV ocorrem de forma independente aos fatores de
riscos para o desenvolvimento do carcinoma de cabeça
e pescoço4.
A carcinogênese oral é um processo de múltiplos
estágios. Lesões precursoras, invasão e metástase
estão muitas vezes presentes de forma simultânea e
a proliferação de células tumorais malignas envolve
mecanismos de perda de controle do ciclo celular.
Assim, estudos que investigaram a expressão de
proteínas envolvidas no mecanismo biomolecular da
carcinogênese oral demonstraram um significativo
interesse para a identificação de biomarcadores
que tenham potencial preditivo e prognóstico para
carcinomas orais e de orofaringe6.
Brito et al.
Um dos marcadores que vem sendo estudado em
carcinomas de cavidade oral e orofaringe é a proteína p16,
que age como supressora tumoral, inibindo as quinases
dependentes de ciclina (CDK4 e CDK6) que regulam o
ponto G1 de checagem do ciclo celular3. Alterações em
p16 são frequentemente observadas em vários tipos de
tumores, incluindo os carcinomas de células escamosas
de cavidade oral. Esse marcador é pouco expresso
em epitélio normal e hiperexpresso apenas em células
proliferativas e lesões inflamatórias7. A proteína p16 atua
no controle do ciclo celular, promovendo a parada do
ciclo e a apoptose. Assim, interrompe a proliferação pela
manutenção de um estado de fosforilação da proteína
do retinoblastoma6. A hiperexpressão de p16 tem
sido descrita em resposta a inativação da pRB, como
acontece durante a ação da oncoproteínas E7 do HPV8.
Apesar da proteína p16 ser exaustivamente estudada em
carcinomas de colo uterino, seu papel na carcinogênese
oral ainda é controverso9.
Outra proteína bastante estudada em tumores é a
proteína nuclear Ki 67. Ki 67 está presente no núcleo
celular em divisão e o gene que codifica esta proteína
está localizado no cromossomo 1010. Geralmente, Ki 67
é utilizado para detecção e quantificação da proliferação
celular. O aumento da sua expressão está associado
ao grau de diferenciação tumoral, sendo utilizado como
marcador em vários tipos de tumores11. A expressão
de proteínas como Ki 67, associada com a proliferação
celular tumoral, vem sendo evidenciada em muitos
estudos por meio da técnica de imunoistoquimica12.
O objetivo deste estudo consistiu em revisar a
literatura nacional e internacional acerca do papel de p16
e Ki 67 nos carcinomas de cavidade oral e orofaringe, em
trabalhos que utilizaram o método de imunoistoquímica.
MÉTODOS
Nesta revisão da literatura foram pesquisados artigos
publicados nas bases de dados SciELO e PubMed/
Medline, durante o período de 2000 a 2013. As palavraschave utilizadas sobre o tema foram baseadas na lista
do MeSH e DeCS. Os seguintes termos em inglês foram
selecionados para a realização da busca: p16, Ki 67, oral
cancer, oropharynx cancer and immunohistochemistry.
Em português, foram utilizados os termos p16, Ki 67,
câncer oral, câncer de orofaringe e imunoistoquímica.
Combinações entre os termos foram utilizadas para
pesquisa em todos os bancos de dados, sendo que
as referencias dos artigos escolhidos também foram
verificadas para identificar outros estudos que pudessem
ter sido omitidos na busca eletrônica. Foram considerados
somente limites de tempo (2000 a 2013) durante a
busca, sendo que todos os artigos encontrados foram
selecionados posteriormente por critérios de inclusão
e exclusão, após leitura dos respectivos resumos. As
publicações escolhidas foram obtidas para reavaliação
de seus resultados.
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O papel de p16 e Ki 67 em carcinomas de células escamosas de cavidade oral e orofaringe.
RESULTADOS
Durante o período analisado, foram encontrados
na literatura cinco estudos que investigaram, com
o uso do método de imunoistoquímica, o papel dos
marcadores tumorais p16 e Ki 67 em carcinomas
de células escamosas de cavidade oral e orofaringe
(Tabela 1). O primeiro estudo selecionado13 analisou a
expressão de p16 em um grupo de 225, diagnosticados
no período de 1978 a 2000 e submetidos à cirurgia
exclusiva ou radioterapia seguida de cirurgia. As
amostras compreenderam 44 tumores de cavidade oral,
24 tumores de faringe e 147 tumores de laringe. A baixa
expressão de p16 foi encontrada em 48% das amostras
analisadas, se correlacionou ao estágio T avançado
dos tumores e esteve associada significativamente
com tumores inicialmente irradiados e sem resposta
terapêutica. A análise por regressão múltipla revelou que
o sítio tumoral é o mais importante fator independente
que afeta a expressão de p16. Nenhuma associação
significativa foi detectada entre a expressão de p16 com
Brito et al.
o sexo, idade, grau tumoral, metástase ou recorrência do
tumor após tratamento cirúrgico. Os autores concluíram
que a baixa expressão da proteína p16 está associada
a uma maior proliferação das células tumorais, afetando
assim o tamanho do tumor. Porém, não significa maior
proporção de metástase linfonodal ou pior prognóstico
para pacientes submetidos a tratamento cirúrgico.
El-Mofty & Patil (2006)14 analisaram carcinomas
tonsilares HPV-positivos com morfologia basaloide nãoqueratinizante e imunofenótipo característico. O objetivo
do estudo foi analisar a expressão de p16 e Ki 67 em
carcinomas orofaríngeos e identificar os tumores com
morfologia não-queratinizante. Os tumores e controles
foram submetidos à detecção e genotipagem de HPV,
usando a reação em cadeia da polimerase (PCR). Na
análise foram revistos 235 carcinomas, incluindo 141
de amígdalas e 94 de base da língua. Deste total,
36% dos tumores tonsilares e 32% dos carcinomas da
base da língua eram não-queratinizantes (NKCa) e os
demais representavam a forma clássica queratinizante
dos carcinomas espinoce­
lulares (KSCC). O DNA de
Tabela 1. Características dos cinco estudos incluídos nesta revisão.
Autores, ano de
publicação
Marcadores
estudados
Yuen et al,
2002
p 16
El-Mofty & Patil,
2006
p 16
Ki 67
Carcinomas não
queratinizantes de
orofaringe e tonsilas
235
Vékoni et al,
2008
p16INK4a, Ki 67,
E2F1, p53, ciclina
D1, policomb BMI-1,
MEL-18
e EZH2
Tumores mioepiteliais
de glândulas salivares
84
Carcinomas de
cavidade oral
50
Carcinomas de
cavidade oral
34
p 16
Abrahao et al, 2011 p53
hTERT
Dragomir et al,
2012
p 16
Ki 67
P53
Sítios anatômicos
avaliados
Carcinomas de
cavidade oral,
orofaringe e laringe
Total de casos
analisados
225
Resultados encontrados
p16 esteve associada ao estágio T
avançado e aos tumores sem resposta
terapêutica
p16 mostrou-se útil na identificação
de lesões displásicas e sua baixa
expressão estava relacionada à
transformação neoplásica.
A expressão de Ki 67 mostrou
ter importante valor prognóstico,
especialmente na identificação
de lesões agressivas e de alta
proliferação tumoral.
p16 demonstrou alta expressão em
tumores benignos se comparado
às células normais das glândulas
salivares.
Ki 67 esteve presente nas neoplasias
mioepiteliais primárias e parece
contribuir para a transformação
neoplásica mioepitelial e crescimento
de tumores agressivos.
p16 não se demonstrou útil na
diferenciação do epitélio não displásico
e displásico da mucosa oral.
A expressão de p16 não apresentou
diferenças significativas com
relação aos parâmetros clínicos e
histopatológicos, porém demonstrou
ser útil na identificação de lesões
displásicas.
A expressão de Ki 67 se mostrou útil
na identificação de formas agressivas
de CEC de cavidade oral com alta
expressão na frente de invasão.
Abreviações: CEC = Carcinoma de células escamosas.
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O papel de p16 e Ki 67 em carcinomas de células escamosas de cavidade oral e orofaringe.
HPV, particularmente do tipo 16, foi detectado em 10
(100%) de 10 NKCa e em apenas 2 (20%) de 10 KSCC
(P =.0014). Os NKCas foram fortemente reativos para
p16, enquanto os KSCC mostraram reatividade focal e
fraca. A detecção de Ki 67 foi mais alta nos NKCa, em
comparação com KSCC. Os autores concluíram que
os NKCa das amígdalas e base da língua são subtipos
distintos de carcinoma de células escamosas de cabeça e
pescoço com alta prevalência de HPV e um imunofenótipo
característico. O estudo demonstrou que a investigação
de p16 pode ser útil na identificação de lesões displásicas
e que a diminuição da sua imunoexpressão é um fator
de previsão para transformação neoplásica enquanto
que a avaliação da expressão de Ki 67 possui um valor
prognóstico na identificação de formas mais agressivas
e de alta proliferação de células tumorais em carcinomas
orais.
O estudo de Vékony et al (2008)12 analisou tumores
mioepiteliais de glândulas salivares. O estudo investigou
a expressão de E2F1, p16INK4a, p53, ciclina D1, Ki
67 e do grupo de proteínas policomb BMI-1, MEL18 e EZH2, em 49 tumores benignos e 30 tumores
malignos mioepiteliais primários, além de cinco
recidivas histologicamente benignas. Os achados foram
correlacionados com as características histopatológicas.
Tumores benignos mostraram um maior percentual
de células com expressão de p16(INK4a) (P = 0,002),
comparado com o tecido normal das glândulas
salivares. Entre os tumores benignos, o tipo de células
claras tinha a maior fração de proliferação (P = 0,05).
Este estudo foi o primeiro a demonstrar que a via de
senescência regulada por p16 (INK4a) está envolvida no
desenvolvimento de tumores mioepiteliais. Os autores
sugerem que a inativação adicional de p53 e Ki 67 nas
neoplasias primárias malignas e benignas contribui
para a transformação neoplásica mioepitelial e para o
crescimento dos tumores agressivos.
O estudo de Abrahao et al. (2011)15 avaliou padrões
de expressão das proteínas p53 e p16, em relação à
expressão de subunidade hTERT da telomerase. Foram
analisadas 30 amostras de CEC de cavidade oral, 15
amostras de desordens potencialmente malignas da
mucosa oral e cinco casos de hiperplasia epitelial oral.
Na avaliação imunoistoquímica, não houve relação entre
a expressão de p53 e o grau de displasia do tumor. A
expressão de p16 foi evidenciada em 26,7% dos casos
de desordens potencialmente malignas da mucosa
oral, 43,3% dos casos de CEC de cavidade oral e em
dois casos de hiperplasia epitelial oral, mas não foi útil
para diferenciação entre o epitélio não displásico e o
epitélio displásico. A expressão da telomerase hTERT foi
observada em todas as amostras de hiperplasia epitelial
oral e nas amostras potencialmente malignas da mucosa
oral, mas não foi útil na diferenciação de hiperplasia
e displasia do epitélio oral. Portanto, a avaliação
da expressão dos marcadores p16, p53 e hTERT
apresentada no estudo, não demonstrou nenhuma
relação entre tais marcadores e o grau de displasia
Brito et al.
nos casos de desordens potencialmente malignas da
mucosa oral, ou com o grau de diferenciação de CEC de
cavidade oral.
Dragomir et al (2012)10 analisou características
clinicas, histopatológicas e imunoistoquímicas de 34
casos de carcinomas de células escamosas de cavidade
oral, sendo que em 11 casos foram identificadas lesões
epiteliais displásicas adjacentes. O estudo avaliou
a expressão das proteínas p16, Ki 67 e p53, tanto no
tumor em geral quanto na frente de invasão. Foram
predominantes dentre as amostras, carcinomas bem
diferenciados (52,9%) e estadiamento I/II (88,3%). A
expressão de p16, p53 não apresentaram diferenças
significativas com relação aos parâmetros clínicos e
histopatológicos, no entanto, a alta expressão de Ki 67
esteve associada ao alto grau de diferenciação tumoral e
alto grau de displasia. O estudo destacou a importância
da imunomarcação de p16 na identificação de lesões
displásicas e a importância preditiva de p53 e Ki 67 na
identificação de formas mais agressivas de carcinomas
orais, vez que a expressão desses marcadores estava
aumentada na frente de invasão.
DISCUSSÃO
De acordo com os estudos analisados verificou-se
que a expressão de p16 se apresentou alta nos casos de
tumores benignos12 e em carcinomas não queratinizados
de cavidade oral associados ao HPV14. Sua baixa
expressão é observada em carcinomas queratinizados
de cavidade oral demonstrando que esse foi um fator de
transformação neoplásica14. A baixa expressão de p16
também esteve relacionada a estágios TNM avançados,
já que gera maior proliferação das células tumorais13.
Porém, foram descritas diferenças significativas na
expressão de p16 em diferentes sítios anatômicos,
não havendo associação deste marcador com idade,
sexo, metástase ou recorrência tumoral pós-tratamento
cirúrgico13.
Existem controvérsias entre os três estudos
reportados, em relação à expressão de p16 em lesões
displásicas e não displásicas. Segundo Abrahao et
al (2011)15, a expressão de p16 nos casos de CEC de
cavidade oral, desordens potencialmente malignas e
hiperplasia epitelial oral, não foi útil na diferenciação
entre o epitélio não displásico e displásico, enquanto que
para Dragomir et al (2012)10 e El-Mofty & Patil (2006)14 a
expressão deste marcador se demonstrou importante na
identificação de lesões displásicas.
Como demonstrado nas pesquisas revisadas uma
baixa expressão de p16 pode ser um indicativo de
proliferação tumoral, porém, sem nenhum significado
prognóstico. Por outro lado, a alta expressão de p16 nos
tumores benignos e associados ao HPV demonstra que
essa proteína está possivelmente desempenhando seu
papel na tentativa de interromper a proliferação tumoral,
o que resultaria em melhor prognóstico para a doença.
Segundo Wittekindt et al (2012)4, o inibidor transcricional
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O papel de p16 e Ki 67 em carcinomas de células escamosas de cavidade oral e orofaringe.
de p16 é a proteína pRb. Assim, nos tumores HPV
positivos, a proteína pRb é inativada pela proteína E7
do HPV, o que resultaria em desrepressão de p16 e
aumento da sua expressão.
Os estudos que avaliaram o marcador Ki 67
demonstram sua alta expressão em carcinomas e tumores
malignos da cavidade oral e expressão mediana em
tumores benignos12. Os resultados obtidos na pesquisa,
de modo geral, se apresentam coerentes já que Ki 67
está associado ao grau de diferenciação e displasia
tumoral10, crescimento tumoral agressivo12 e possui um
importante valor prognóstico na identificação de formas
agressivas de tumores com alto índice de proliferação
de células tumorais14. Portanto, sua expressão elevada
em tumores de cavidade oral e orofaringe demonstra
que esse tipo de tumor possui uma alta capacidade de
proliferação e alta agressividade, representando um
fator de mal prognóstico.
Embora os estudos revisados tenham analisado
os marcadores p16 e Ki 67 em CEC de cavidade oral,
usando o método de imunoistoquímica, em grupos com
maior prevalência de indivíduos do sexo masculino e com
idade média de 50 anos, algumas discrepâncias foram
detectadas, como mostra a tabela 1. Sítios anatômicos
diferentes, diferenças no número de casos analisados
e critérios de inclusão e exclusão também discrepantes
foram observados, resultando certamente em conclusões
conflitantes entre os autores, principalmente com relação
ao marcador p16.
Enquanto alguns autores concluíram que a baixa
expressão de p16 esteve associada à proliferação celular
e ao tamanho do tumor13, associações significativas não
foram observadas em relação à metástases linfonodais15.
O papel prognóstico de p16 nos carcinomas de
cavidade oral e orofaringe não está bem estabelecido,
bem como sua importância nas lesões displásicas de
cavidade oral. Por outro lado, a maioria dos estudos
não avaliou a expressão de p16 em relação a aspectos
tumorais relevantes como a sobrevida dos pacientes,
a classificação TNM e a presença de HPV, abordada
somente em um estudo14.
Mesmo com dados, avaliações e conclusões
conflitantes dos artigos reportados nesse estudo, a
expressão de p16 parece estar associada à proliferação
celular dos carcinomas da cavidade oral e orofaringe13.
Sua baixa expressão parece representar um fator de
mal prognóstico, já que esse participa do controle do
ciclo celular levando as células tumorais à apoptose. O
marcador Ki 67 foi o que apresentou menos resultados
discrepantes e sua expressão mediana ou alta em
carcinomas de cavidade oral e orofaringe parece
representar alto grau de displasia, baixa diferenciação
tumoral e maior agressividade do tumor, representando
também mal prognóstico12.
O que se espera para estudos futuros é que
incluam avaliações mais precisas sobre o tema
abordado. Números maiores de casos reportados e
melhor classificados, em que o foco seja estabelecer
Brito et al.
qual a função de cada marcador, ao invés de
correlacioná-los, já que suas funções particulares
ainda não estão esclarecidas. O estabelecimento
de um ponto de corte (cut off) para a expressão
dos marcadores em função dos aspectos tumorais
também parece ser um aspecto relevante a ser
abordado, uma vez que cada estudo utiliza valores
diferentes. Estudos com acompanhamento por maior
período de tempo e seguimento destes pacientes em
longo prazo são necessários a fim de se estabelecer
o valor prognóstico dos marcadores. Outro aspecto
relevante que também precisa ser abordado diz
respeito a expressão de Ki 67 e p16 com relação a
infecção pelo HPV. Diferente dos carcinomas de colo
uterino, em que a associação desses marcadores e a
presença do DNA do HPV já está bem estabelecida,
nos carcinomas de cavidade oral, seus significados
permanecem inconclusivos.
CONCLUSÕES
Os dados, avaliações e conclusões dos artigos
revisados nesse estudo são conflitantes. A expressão
de p16 parece estar associada à proliferação celular
dos carcinomas da cavidade oral e sua baixa expressão
parece representar um fator de mal prognóstico, já que
participa do controle do ciclo celular levando as células
tumorais à apoptose. O marcador Ki 67 apresentou
menos resultados discrepantes e sua expressão
mediana ou alta em carcinomas de cavidade oral parece
se associar ao alto grau de displasia, baixa diferenciação
tumoral e maior agressividade do tumor, representando
também um fator de mal prognóstico.
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Artigo 10 - Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço