CAEI
Metodologia de análise de conflito para a formulação de políticas e estratégias
By Salvador Raza
Centro Argentino
de Estudios
Internacionales
Metodologia de análise de
conflito para a formulação de
políticas e estratégias de
segurança
by Salvador Raza
Working paper # 39
1
Programa de Defensa
y Seguridad
Internacional
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Metodologia de análise de conflito para a formulação de políticas e estratégias
By Salvador Raza
METODOLOGIA DE ANÁLISE DE CONFLITOS PARA A
FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS DE SEGURANÇA
Salvador Raza1
Professor of National Security Affairs
Center for Hemispheric Defense Studies
SUMÁRIO
Esse trabalho apresenta uma metodologia de análise de conflito, sustentada por uma robusta
moldura conceitual para a formulação de políticas e estratégias de segurança. O diferencial da
metodologia, já empregada com sucesso em vários países, está na sofisticada desconstrução do
ambiente de decisão em sete eixos de análise, e sua posterior reconstrução, com o
desenvolvimento simultâneo de projeções de tendências, para a identificação das dinâmicas
críticas dos espaços de insegurança. A metodologia foi desenvolvida para ser executada de
forma colaborativa por especialistas nas diversas áreas de conhecimentos relacionadas com
segurança, sendo facilmente adaptada às práticas particulares de formulação de políticas e
estratégias de cada país.
ESTRUTURA
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................3
O PROBLEMA DOS PROBLEMAS DE SEGURANÇA...............................................................4
Breve revisão das práticas ...................................................................................................6
MOLDURA ANALÍTICA...........................................................................................................7
Componentes normativos ....................................................................................................7
Componentes Descritivos ....................................................................................................9
Lógica Articulante do Sistema ............................................................................................ 15
Erros analíticos ................................................................................................................. 17
METODOLOGIA - LÓGICA DOS PROCESSOS...................................................................... 19
Parametrização ................................................................................................................ 20
Inventario do Potencial Nacional ........................................................................................ 21
Desenho das Equações de Segurança ............................................................................... 23
Identificação das Hipóteses Transformacionais ................................................................... 25
Configuração dos Espaços de Segurança. .......................................................................... 25
ALCANCE E LIMITES ........................................................................................................... 26
1
As opiniões, conclusões e recomendações expressas nesse trabalho são da inteira responsabilidade do autor e não
refletem o entendimento de nenhuma agência, organização ou governo
2
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1.0 INTRODUÇÃO
Não há nenhuma delimitação irrefutável do escopo, escala e abrangência da segurança, nem há como se
assegurar eqüidade na distribuição de seus efeitos e consequências. No entanto, somos forçados a
problematizar as questões de segurança, seja para prevenir conflitos, seja para gerenciar a transição para
situações de não-conflito, em um mundo aonde novas tecnologias de produtos, processos e informações
vêm propulsando, com asceleração crescente, a estrutura de incertezas das condições e formas com que
a defesa possível procura dar conta das demandas prováveis de segurança.
A tentativa de dar fundamentação científica à problematização da segurança tende ao fracasso. Os
problemas de segurança estão alojados na categoria dos problemas evolutivos complexos, e a ciência
ainda não desenvolveu critérios de rigor na estruturação de problemas dessa categoria, aonde se inserem
todos aqueles desenhados no tecido social, com respostas plausíveis construídas na dinâmica política.
Reformas em sistemas de segurança, por enfrentar problemas complexos, são reconhecidamente um
assunto controverso2. As abordagens atualmente utilizadas para determinar as demandas de reforma de
segurança prescrevem três procedimentos: (a) objetivação do estado desejado como resultado da
consecução de interesses nacionais, (b) delimitação de um conjunto percebido de ameaças à essa
consecução que restringe o alcance dos objetivos de segurança definidos no processo anterior, e (c)
qualificação da lacuna entre o estado desejado no processo (a) e o ambiente restrito projetado em (b).
Essas abordagens têm falhado em apoiar o desenho de políticas que deêm conta da real estrutura de
causalidade da insegurança. A fragilidade está na necessidade de estabilizar (“congelar”) o diferencial de
insegurança para possibilitar a aplicação dos métodos atualmente praticados, fazendo com que as
políticas desenhadas enfrentem, sempre, uma situação passada, de forma reativa, enquanto o ambiente
de segurança evolui dinamicamente a cada momento, podendo, e quase sempre se mostrando,
completamente diferente, antes mesmo de que os processos de implementação das políticas tenham sido
iniciados.
Esse trabalho propõe uma metodologia desdobrada em sete dimensões analíticas para a problematização
da segurança, identificando as variáveis críticas e seus relacionamentos de causalidade, com propósito de
contribuir para a formulação de políticas e estratégias de forma dinâmica e simultânea com a evolução do
ambiente aonde os problemas emergem.
Espera-se prover uma referência de modernidade nos procedimentos analíticos para instituições e
agências governamentais envolvidas na complexa e importante tarefa de prover segurança, principalmente
no nosso Hemisfério, aonde muitos países, emergindo de períodos de relativa imobilidade conceitual,
avançam rapidamente na construção de seus próprios procedimentos e processos que lhes permitam a
construção de uma paz melhor.
2
Para uma visão abrangente dos problemas de reformas no setor de segurança, veja
http://www.ssrnetwork.net/topic_guides/general_te1.php
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2.0 O PROBLEMA DOS PROBLEMAS DE SEGURANÇA
O processo de formulação de políticas e estratégicas, entendido como a “construção de sistemas de
decisões articuladas”3, deve orientar a consecução de um resultado esperado, com a identificação e
priorização de trajetórias adequadas, exequíveis e aceitáveis para resolução das incertezas e resistências
antecipadas para a consecução desse resultado, e nesse processo, incorporar mecanismos de
aprendizagem para correção tempestiva, tanto do propósito quanto das trajetórias para sua consecução,
resolvendo incertezas e resistências desconhecidas ou não-resolvíveis4 na fase de planejamento.
Existe um problema - objeto da formulação de políticas e estratégicas - quando três condições forem
simultaneamente atendidas: (1) houver um propósito, (2) os elementos que o definem forem qualificados
em um dado domínio de aplicação, e (3) o estado desses elementos ou a condição da relação desejada
entre desses elementos ainda nao tiver ainda sido atendida. Problematizar é qualificar o propósito, as
coisas que o definem, e a medida do afastamento do estado atual das coisas em relação a esse propósito.
Dado esse entendimento de problema, a condição de atendimento (ou conhecimento) do propósito da
segurança e do estado dos elementos e relações que o definem, configuram os problemas de segurança
como problemas adaptativo complexos, com três características básicas: indefinibilidade, especificidade, e
não-prescritibilidade.
Indefinibilidade. Não é possivel estabelecer uma qualificação definitiva e final para um problema de
segurança. A completa qualificação do problema depende da completa definição de todas as soluções
concebíveis para o problema, o que é uma impossibilidade lógica, já que as informações adicionais
necessárias para entender o problema em sua completitude demandaria a elaboração de questões que
dependem do entendimento do proprio problema.
Considere-se por exemplo o que seria necessário para qualificar a natureza do problema que gera
insegurança pública. Podemos considerar como exemplo, a hipótese de que a pobreza faz com que
indivìduos com um determinado perfil sociopsicológico usem da violência ou da ameaça da violência, de
forma individual ou em grupo, organizados em gangs, para a satisfação de suas necessidades e
ambições, gerando a sensação de insegurança na população que se enxerga impotente por não contar
com uma resposta policial que impeça que a violencia os vitimize.
Sim, talvez! Mas para enfrentar a pobreza temos que reconhecer que suas causas estão alojadas na
economia, ou então na não qualificação das pessoas para o mercado de trabalho, o que orientaria as
respostas ao problema para alternativas educacionais, ou para alternativas de desenvolvimento,
dependendo do entendimento prevalente na análise. Ou podemos considerar que a causa da insegurança
decorre de uma deformação comportamental, colocando então o foco na necessidade de tratamento
psicológico para pessoas que apresentam um potencial de desvio de comportamento, que se relaciona
subsequentemente com a capacidade do sistema de saúde prover recursos físicos, financeiros e de
pessoal necessários para prover atendimento adequado à essa parcela da população, que se relaciona
com a capacidade do Estado financiar esses programas, além de todos os demais programas relativos à
infraestrutura para o necessários funcionamento da economia.
3
Ampliamos o entendimento de Mintzberg estratégia para abranger, também o de política (enquanto instruções
normativas), entendendo a diferença entre elas em termos da natureza, instrumentalidade e função de seu objeto.
MINTZBERG, H. The rise and fall of strategic plannning. Londres, The Free Press: 1994.
4
Adaptado de Cyert e March (1963), apud Shimizu, T. Decisão nas organizações, em
http://www.empresario.com.br/artigos/artigos_html/artigo_280700.html capturado em 03 junho 2010.
4
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O valor da solução muda dependendo do subsistema de referência para o desenvolvimento dos critérios
de desempenho e os efeitos que essa solução gera, diferentemente dos problemas estruturados, não são
independentes ou reversíveis. Não podemos facilmente desmantelar uma ferrovia construida para
escoamento de minérios estratégicos (em vez de usar transporte marítimo) após identificar que ela não
atende aos critérios de performance mantidos. Uma vez iniciada, muitos recursos financeiros estarão
contingenciados e uma vez seus efeitos iniciados, a ferrovia afetará a vida de milhares de pessoas.
Esse efeito de propagação e irreversibilidade dos efeitos dos problemas de segurança é comum para a
defesa, para os grande projetos de infraestrutura, e para projetos empresarias. Os decisores de problemas
complexos não podem experimentar e reverter soluções implementadas. Não existe “ensaios”. Todas as
ações contam como efetivas.
Especificidade. Cada problema de segurança é unico. Não existem problemas de segurança
recorrentes. Cada estado enfrenta problemas de segurança diferentes, fazendo com que não possa haver
transitividade direta de experiências, técnicas ou métodos de sucesso ou de insucesso de um caso para
outro.
A definição dos problemas de segurança está contingenciada pelo limite do sistema objeto da análise.
Para dar conta do problema em sua completitude de desdobramentos necessitamos ampliar o sistema.
Quanto maior o sistema, maior o número de impactos cruzados entre os componentes do sistema. A
seleção dos impactos críticos define o problema dentro do sistema que contém esses impactos. Se
mudarmos o sistema ou mudarmos os impactos críticos, temos que redefinir o problema.
Um problema de segurança é configurado na relação estabelecida entre um propósito e uma condição do
ambiente aonde esse problema é definido. As condições do ambiente são contingencialmente
estabelecidas pelo estado atual das variáveis, das relações entre as variáveis, e das relações entre essas
relações, dentro de um determinado espaço de possibilidades. A condição do ambiente dá a referência
para a medida do afastamento do estado atual das coisas em relação ao estado futuro das coisas, ou
propósito considerado.
Não-prescritibilidade. As longas cadeias de causalidades que definem a natureza dos problemas
complexos também explicam porque eles diferem dos problemas estruturados, em termos de não
podermos dizer a priori quando alcançamos “a” resposta ou solução. Em um jogo de xadres,
independentemente dos lances e estratégias, a conquista do rei adversário define o resultado.
Nos problemas complexos não há como definir aonde termina a cadeia causal, e portanto não há como
definir qual “a” resposta correta. Mais esforços, mais recursos, mais pessoas irão produzir alternativas
mais robustas, mais abrangentes, mas nem sempre haverá mais recursos disponíves, e nem sempre a
solução subótima esta condicionada a mais recursos. O desafio é sempre encontrar uma solução
aceitável, com emprego eficiente de menos recursos do que as tentativas anteriores empreendidas para
dar tratamento ao problema.
O julgamento de suficiência será sempre contingenciado no tempo, subordinando ainda as possibilidades
de resposta à interpretação da evolução de um determinado segmento significativo da estrutura de
causalidades. Mas um problema complexo pode afinal, não ter uma solução que não contrarie as
condições atuais do sistema. Uma solução conceitual não pode requerer que X e não-X ocorram
simultaneamente.
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2.1 Breve revisão das práticas
O risco das políticas e estratégias abordarem corretamente o “problema equivocado” da segurança, ou
apenas uma parcela do problema real, esta sempre presente. Ackoff5, ao discorrer sobre os problemas na
formulação de problemas, corretamente aponta que a identificação do real problema emerge a partir de
hipóteses apropriadamente formuladas.
Esse é um requisito importante, evidenciando a necessidade das metodologias de análise incorporarem
processos e mecanismos sistemáticos de reflexão crítica teoricamente embasados. Os métodos atuais de
análise de conflitos, proveem alcance limitado no reconhecimento da estrutura das causas dos problemas
reais, fornecendo uma referencia pouco consistente para a formulação de políticas e estratégias de
segurança. Nenhum dos métodos recorrentemente empregados para análise de segurança incorpora de
forma explícita, sistemática e consistente, a questão da formulação de hipóteses no centro do processo
analítico.
O método Stability Assessment Framework6, por exemplo, empregado em Moçambique (Junho 2002),
Ruanda (Outubro 2002 e Novembro 2003, e Quenia (Outubro 2003) coloca ênfase aos requisitos
organizacionais para o enfrentamento dos problemas de segurança.
Já o método Framework for Conflict Analysis7, desenvolvido pela ONU em coordenação com o Banco
Mundial, coloca ênfase na identificação dos atores envolvidos no conflito e nas organizações que,
juntamente com a ONU, podem resolver o conflito.
A Swiss Peace Foundation, em cooperação com a Austrian Development Agency (ADA), a Canadian
International Development Agency (CIDA) e a Swedish International Agency for Developmennt and
Cooperation, desenvolveu e empregou por 10 anos o método denominado FAST, Early Recognition of
Tension and Fact-Finding8, a partir da qualificação dos fatores que promovem ou inibem o
desenvolvimento de conflictos nas esferas política, histórica, social, econômica e internacional.
O Banco Mundial emprega o método Conflict Analysis Framework9 (CAF), que examina as relações
entre pobreza e o potencial para conflitos, enquanto o método da United States Agency for Aid e o Office
of Conflict Management and Mitigation, denominado Framework for Strategy and Program
Development10, com enfase na motivação para o conflito, mobilização e expansão da violência,
fragilidades institucionais, e fatores regionais.
O Department for International Development da Inglaterra (DFID) utiliza o método descrito na publicação
Conducting Conflict Assessment: Guidance Notes11, para interpretar a estrutura e atores integrantes
da dinâmica dos conflitos, com o propósito de determinar qual assistência internacional o país considera
necessária fornecer.
Há pelo menos outros nove métodos desenvolvidos por organizações de alcance global, como o United
States Institute for Peace (USIP), Departamento de Defesa dos EUA (DoD), o Fund for Peace, e o
Departamento de Estado. Há um número crescente de agências nacionais utilizando métodos baseados
5
L. Ackoff, Some unsolved problems in problem solving. Opl Res. Q.13,1-11, in R.N. Woolley and M. Pidd,
Problem Structuring – A literature Review, J. Opl Res. Soc. Vol 32, UK, 1981. pp. 197-206.
6
http://www.clingendael.nl/publications/2005/20050200_cru_paper_stability.pdf
7
http://www.undg.org/archive_docs/5329-Comon_Inter-Agency_Framework_forConflict_Analysis_in_Transition.doc
8
http://www.swisspeace.ch/typo3/en/peace-conflict-research/previous-projects/fast-international/about/index.html
9
http://siteresources.worldbank.org/INTCPR/214574-11128835084/20657757/CAFApril2005.pdf
10
http://www.usaid.gov/our_work/crosscutting_programs/private_voluntary_cooperation/conf_conflict_assessment.pdf.
11
http://www.dfid.gov.uk/Documents/publications/conflictassessmentguidance.pdf
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em capacidades. A multiplicidade de métodos atuando nos processos centrais de decisão dessas agências
e organizações demonstra a importânica do tema. Em cada caso, os métodos estão orientados para
funções instrumentais das agências de apoio, de intervenção, ou de fomento que os desenvolveu ou
emprega sistematicamente.
O elemento comum entre esses métodos praticados é a adoção do entendimento de que o problema de
segurança é um problema evolutivo complexo, com a tentativa de dar tratamento analítico adequado
problemas dessa natureza. O problema está na insuficiênica dos métodos.
Nenhum deles explicita com rigor a moldura analítica de referencia, na forma de um constructo, um
sistema de conceitos articulados com premissas próprias, provendo condições para a contínua avaliação
crítica dos processos empregados para gerar, verificar e validar os conhecimentos e práticas desdobradas
desse constructo. Nenhum deles também explicita ter sido desenhado especificamente para oferecer, de
maneira ampla, a todos os países, uma ferramenta de auto-avaliação, centrada nas necessidades de
governabilidade e gestão públicas, por meio de políticas e estratégicas que deem conta das causas dos
problemas de segurança dinamicamente considerados.
________________________________________________________________________
3.0 MOLDURA ANALÍTICA
Políticas são veículos de transmissão de diretrizes e normas gerais necessárias para dar materialidade no
tempo de um resultado intencionado, em seus vários graus e em seus vários desenhos, possibilitando a
todas as partes da organização contribuir para o esforço comum, mesmo quando elas atuam
independentemente, em um ambiente em rápida transformação.
Embora se possa acrescentar, detalhar ou modificar essa descrição geral, não há discrepâncias
substantivas na função das políticas publicas: manter, reformar ou transformar as variáveis, ou o estado
das variáveis que definem um estado de segurança, e, ou, as relações entre essas variáveis e, ainda, ou
também, as relações entre essas relações. As dificuldades emergem, primeiro, no entendimento dos
mecanismos de ação, por meio do quais uma política gera seus efeitos no ambiente, desenvolvendo e
modelando inferências e juízos auto-reguladores que promovam mudanças de forma sistemática e
sustentada; e, segundo, na qualificação dos eixos de propagação dos encadeamentos de efeitos que
devem ser alcançados.
A primeira dificuldade diz respeito aos requisitos de forma de uma política de segurança; a segunda aos
requisitos de função. Os requisitos de forma tem fundamentação sintética, enquanto que os de função
possuem fundamentação analítica.
3.1 Componentes normativos
Para dar conta dos requisitos de forma, os formuladores de políticas e estratégias definem e integram
cinco componentes normativos que os produtos resultantes devem apresentar no atendimento de suas
determinações:
1) Definir as condições de sua aplicação, com a qualificação dos elementos requeridos para o
desencadeamento autônomo das iniciativas que a política autoriza e que a estratégia dá
consecução.
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2) Especificar os resultados a serem alcançados, com a indicação das ações válidas e não válidas
para sua implementação por meio de elementos normativos (objetivos) que atendam,
simultaneamente, quatro requisitos12:
a) Inteligibilidade: o conteúdo conotativo dos objetivos deve ser claramente definido e
apresentado de forma a não criar ambiquidades ou dúvidas (que levam a interpretações
equivocadas ou tendenciosas). A inteligibilidade é fundamental para o desenvolvimento
de hipóteses plausíveis sobre condições onde as capacidades do estado poderão ser
empregadas (cenários) e para possibilitar a avaliação dos resultados alcançados.
b) Finalidade: os resultados a serem alcançados devem fazer parte de uma cadeia de
causalidade que aponte para a consecução dos objetivos de segurança e desses com os
interesses nacionais. O requisito de compatibilidade é o que assegura o vínculo entre
estratégias e resultados (fins).
c) Praticalidade: os objetivos devem ser alcançáveis dentro das possibilidades práticas,
mediante atos racionalmente instruídos. Essa condição busca previnir o potenciamente
danoso risco de objetivos definidos acima das possibilidades de produção dos Estado,
evitando que os objetivos se tornem palavras vazias de significado, comprometendo as
possibilidades da segurança. O requisito de praticalidade é o que assegura o vínculo
entre meios e estratégias.
d) Mensurabilidade: os resultados a serem alcançados com os objetivos devem ser
mensuráveis quantitivamente ou qualitativamente. Objetivos não mensuráveis não
permitem aferir a sensibilidade das alternativas de capacidades a mudanças no ambiente
de segurança.
3) Especificar o escopo de autoridade das instituições e indivíduos responsáveis pelas ações de
segurança, explicitando os limites autorizados das decisões possíveis.
4) Qualificar critérios e métricas para a avaliação dos resultados alcançados.
5) Definir procedimentos que serão empregados para controlar e supervisionar os processos que a
implementação das políticas e estratégias desencadeiam.
A formulação desses componentes normativos é resultado do entrechoque de diferentes percepções e
prioridades imaginadas pelos diferentes atores que contracenam num cenário político concreto, traduzido
num conceito que se materializa impondo “soluções de compromisso”sobre os componentes normativos
da segurança para lidar com a presença simultânea de atores com diferentes funções de satisfação, cada
um deles, em alguma medida, pleiteando a consecução de suas demandas.
12
Esses requisitos foram originalmente apresentados em Raza, S. "Projeto de Força: o elo ausente em reformas de
defesa", discutido em painel sobre Estratégia e o Uso da Força no no Seminário "Research and Education in Defense
and Security Studies" (REDES), realizado em Agosto de Projeto de Força: o elo ausente em reformas de defesa
2002 em Brasilia, Brasil.
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3.2 Componentes Descritivos
Para dar conta dos requisitos de função da segurança utilizamos o conceito de “variedade”, que define os
elementos distinguíveis em um sistema, independentemente da ordem de sua ocorrência, necessários e
suficientes para descrever as características essenciais do objeto da investigação no nível de abstração
que se estabelece para análise.
A definição da variedade de um sistema delimita fronteiras (estabelecendo categorias funcionais) entre
elementos interrelacionados que, de forma cooperativa, cumprem um dado propósito comum.
Para estabelecer essas fronteiras é necessário critérios de recorte que identifiquem os elementos de
propagação da segurança – que promovem sua geração, capilaridade e reformulação continua, confome o
sistema que a define evolue constantemente, enquanto ela se define e evolui solidariamente.
Utilizando conceitos da Teoria dos Conjuntos, formulada por M. D. Mesarovic13, que propõe um conjunto
de axiomas para explicar por meio de um tratamento analítico as propriedades formais gerais dos
elementos componentes de sistemas abertos, podemos definir sete eixos de propagação da segurança.
Cada um dos sete eixos de propagação da segurança designa um conjunto de elementos integrantes do
ambiente, que se submete a determinados critérios de recorte, conformando cada um desses eixos como
uma parcela do sistema que pode ser vista, em si mesmo, como uma totalidade. O conceito de arranjo traz
implícita a idéia de recursividade, a idéia de um subsistema, em si mesmo um sistema, dentro de um
sistema maior. Com isso, possibilita recortar os elementos que integram um determinado eixo e tratá-lo
separadamente, com certo grau de independência analítica, tendo como referência sua contribuição para
o todo.
A tabela 1 diferencia os domínios de competência desses sete eixos, que são conceitualizados a seguir,
sem que a ordem de sua apresentação tenha nenhum significado de prioridade, preferência ou valor.
Tabela 1: Eixos de Propagação da Segurança
Domínios
1.Tecnologico
2.Político-Economico
3.Energético
4.Socio-Humano
5.Geoestratégico
6.Informacional
7.Ambiental
Eixos de Propagação da Segurança
Aumento do Grau de Complexidade
Sustentaçao Dinâmica de Prioridades
Controle do Graus de Autonomia
Abrangencia dos Propósitos
Contrução de Autoproteção
Potencialização dos Ciclos de Decisão
Incremento do Fluxo da Diversidade
1. Eixo de Propagação no Domínio Tecnológico
Para além das técnicas que criam ou limitam a possibilidade de se fazer algo na quantidade requerida, ou
qualitativamente melhor, os eventos no eixo de propagação da segurança tecnológica criam condições de
possibilidade de se fazer algo diferente, de forma diferente, para gerar um resultado melhor, ou então para
criar a necessidade de algo ainda não existente, mais que, quando disponível, tornar-se-á apreciado pelo
valor que agregará.
13
MESARORIC, M. D. Foundations for a General Systems Theory. New York, EUA: John Willey & Sons, 1964,
pag. 1-24.
9
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A capacidade da tecnologia gerar segurança aparece enquanto acumulo de conhecimentos instrumentais
na superação de determinadas formas de produção e sociabilidade que possibilita a superação do
pragmático-imediato. Isso faz com que a dimensão tecnológica do problema da segurança trate das
capacidades para (a) assegurar a transposição de barreiras cognitivas, culturais, e técnicas, (b) para
aperfeiçoar conhecimentos, produtos, processos e sistemas, (c) para desenvolver conhecimentos,
produtos, processos e sistemas inovadores que atendam à requisitos de eficiência, eficácia e eficiência
distintos dos existentes, e (d) para conceber ambientes organizacionais que integrem estruturalmente a
concepção do novo em todos processos em todos os níveis da ação pública e privada.
Essa definição desfaz e agrega em um mesmo eixo de propagação as distinções artificialmente
construídas em tecnologias de produtos de processos e de informação, qualificando a natureza da
tecnologia no processo de superação de estados de segurança que ela mesmo promove em cada
momento histórico, construindo e reconstruindo standards comerciais, de produção industrial e agropecuários, e de serviços publicos em quanto avança o grau de maturidade das práticas de governo e
gestão, permitindo ao sistema manter-se em equilíbrio estável enquanto progride para graus maiores de
complexidade por meio da adaptação, modernização, ou transformação de seus elementos, relações e
relações entre relações14.
2. Eixo de Propagação no Domínio Político-Econômico
A conversão de concepções políticamente defendidas de segurança em planos de ação de
desenvolvimento sustentável pertinentes requer mecanismos e regras de conteúdo para a construção de
critérios para a superação de disputas na alocação eficiente de recursos escassos sobre o que, como e
para quem produzir.
A dimensão da sustentabilidade da segurança empresta e aplica conceitos e argumentos nãocontraditórios que instruem a formulação de políticas públicas e da econômica para a formação desses
critérios, sem transferir para os critérios de criação da norma as decisões daquilo que se quer construir.
Logo, as questões e decisões de sustentabilidade da segurança são eminentemente políticas, instruídas
por critérios econômicos, no domínio das alterações das condições de poder existentes, do
desenvolvimento de novos mecanismos de formação de vontade política, e a resolução dos problemas de
criação e alocação eficiente de recursos, particularmente no que diz respeito ao uso de recursos comuns,
os quais geralmente são controlados pelo Estado, e no que diz respeito à remoção das restrições
estruturais no processo de criação da força motriz para a promoção do desenvolvimento econômico social
politicamente sustentável.
3. Eixo de Propagação no Domínio Energético
A importância e a amplitude do impacto da composição das matrizes energéticas para a segurança não
pode simplificada.
Nos eventos que antecederam a I Guerra Mundial, a Inglaterra teve que decidir entre adotar ou não o
petróleo como elemento de propulsão de seus meios navais. Na garantia da segurança, a conversão da
matriz energética de carvão para petróleo se mostrava estratégico15. O petróleo não deteriora como o
carvão, apresenta rendimento 78% maior e ocupa 30% a menos de volume para armanezamento,
possibilitando o reabastecimento em alto mar, aumenta o alcance estratégico e a velocidade do
14
Para ampliar o estudo das especificidades do design de tecnologia, recomenda-se Brian, Arthur W. The Nature of
Technology:What it is and how it evolves. New York, Free Press, 2009.
15
YERGIN, Daniel. The Prize: Epic quest for oil, money and power. Nova Iorque: Free Press, 1991. Ver:
“Speed!”, p. 155-6.
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deslocamento dos meios navais para áreas de conflito, e possibilita maior ascelaração em manobras
táticas. Mas abandonar o carvão em favor do petróleo significava abandonar fontes de energia seguras e
abundantes na Grã-Bretanha, tendo que passar a assegurar a continuidade do acesso ao petróleo aonde
ele existia, na Pérsia. Winston Churchill, convenceu a House of Commons a adotar o petróleo como
fonte primária de energia para a Marinha Inglesa, remodelando a trajetória dos conflitos do Século XX.
Os eventos que definem o Eixo de Propagação da Dimensão Energia estão atrelhados ao desenho da
matriz energética nacional dos paises; interligando, por sua natureza, interesses de segurança nacional
em uma rede de objetivos compartilhados, que se desdobram em aliancas de segurança e defesa,
acordos diplomáticos e outros mecanismos para assegurar o acesso e manutenção das cadeias de
suprimento.
O Eixo de Propagação da Dimensão Energética da Segurança abrange todas as formas de energia
praticadas e antecipadas, incluindo a energia potencial acumulada nos alimentos, necessaria para a
sustentação da vida, ampliando o conceito do Balanço energético, que fornece a matriz nacional de
energias renováveis e não-renováveis, para abranger (a) a estrutura do mercado interno de energia
(ofertas e demandas setorizadas), (b) a formação e transformação de estoque, (c) os meios distribuição,
(d) os processos de recuperação e tratamento de dejetos e fontes exauridadas em cadeias de valor que se
extendem até os pontos de intesecção e fusão com as cadeias desenvolvidas nas demais dimensões de
segurança.
4. Eixo de Propagação no Domínio Socio-Humano
O entrelaçamento dos processos sociais na produção e reprodução da segurança criam as condições
necessárias para a superação de um determinado momento histórico. A segurança, ao mesmo tempo em
que é construida pelas relações sociais, gera as condições para a superação de padrões produzidos por
ela própria16.
A cada questão respondida pela segurança ao ser social, geram-se novas necessidades de superação da
insegurança na cotidianidade pragmática, determinando todas as demais mediações, já que se trata da
superação da relação primígena homem - natureza.
Nesse sentido, a segurança humana converte-se em um processo de objetivação do ser social em uma
práxis orientada para a satisfação de suas necessidades no entorno expandido de suas relações sociais.
Para satisfazê-las, diversas formas mediativas são criadas e recriadas na relação entre homem-homem e
homem-ambiente para o pleno exercício da cidadania no estado de direito, criando relações estabilizadas
entre o homem e o ambiente social, de onde a percepção de segurança emerge como resultado e
condição de possibilidade para a praxis na forma de (a) acesso às fontes de informação e possibilidade
de manifestar suas preferências e opções políticas e pessoais, (b) capacidade de ir-e-vir e se organizar
em grupos sem prejuizo da vida ou propriedade, (c) evolução auto-regulada e auto-sustentada dos
estatudos políticos e legais que regem as relações entre indivíduos e capital, e (d) possibilidade de
progressão entre patamares de potencial de acesso à bens e serviços públicos e privados para a
satisfação de necessidades autonomamente determinadas.
16
Essa abordagem reflete o pensamento de Lukáks sobre a centralidade do trabalho na definição do estatuto
ontológico explicativo da natureza humana. Enquanto útil para a composição pragmática das variáveis analíticas, a
metodologia não desdobra em praxis o pensamento maxista, já que o próprio Lukáks cria categorias analíticas que
propiciariam a apreensão do movimento do real refuta a existência nem de uma teoria, nem de nem uma
epistemologia em Max. Para ampliar, veja LUKÁCS, Gyorgy. Ontologia do ser social: Os princípios ontológicos
fundamentais de Marx. Trad. Calor Nelson Coutinho. – São Paulo: Ciências Humanas, 1979.
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5. Eixo de Propagação no Domínio Geoestratégico
O domínio geoestratégico reflete de dependência entre o projeto de força nacional e o contexto estratégico
do sistema nacional e internacional de segurança. Esse contexto é permeado por uma densa rede de
alinhamentos de interesses implicitos ou codificados em alianças, arranjos e tratados, e outros
relacionamentos ainda não sujeitas a regulação, onde as decisões que devem ser tomadas dão origem a
novas e particulares situações para a segurança17. Nesse contexto, o projeto de força define a habilidade
potencial dos arranjos de capacidade de defesa integrar meios materiais, humanos, de informação e de
organização executarem tarefas de defesa, segundo condições previamente especificadas, com uma
determinada expectativa de sucesso.
Essas capacidades são projetadas para atender às demandas do uso de força para a consecução de
objetivos politicamente determinados. A natureza dessas capacidades – instrumental na prática da
violência sob a autoridade do Estado e da Lei – define competências que seus elementos componentes
devem assumir e circunscrevem seu uso sob orientação de diretrizes políticas extraídas e conjugadas na
rede de alinhamentos que integra o contexto estratégico para a defesa dos intreresses do Estado por meio
da dissuasão ou, se a dissuasão falhar, com o emprego da força.
A capacidade de gerar dissuasão dependerá sempre da exiquibilidade das ações e da credibilidade da
intenção, enquanto que o uso da força estará sempre condicionado ao equilíbrio que a dissuasão
adversária produz em nossa análise de adequabilidade, exiquibilidade e aceitabilidade de custos e riscos,
criando uma condição de mutua dependência das percepções que interpretam o potencial de autodefesa
dos estados no sistema de segurança internacional.
Essa condição contingencia a intencidade e velocidade da propagação da segurança no domínio da
geoestratégia ao contexto político da sociedade onde ela ocorre, e da posição na hierarquia de decisões
onde as alternativas de uso da força são formuladas em atendimento a tres niveis de prontidão
(readiness18).
1) Prontidão operacional. Instrui os níveis de treinamento e manutenção necessários para a
pronta resposta às demandas de segurança. Altos níveis de prontidão operacional exigem que os
meios de resposta permaneçam quarnecidos e disponíveis para o pronto emprego, gerando
fadiga de pessoal e aumentos da taxa de avarias de material, exigindo demandas logísticas que,
se não atendidas, podem comprometer o grau de sucesso tático esperado.
2) Prontidão estrutural. Instrui a formulação dos procedimentos e arquitetura de relacionamentos
por meio dos quais, quando necessário, a prontidão operacional possa ser aumentada ou o
número de tarefas que devem ser simultaneamente executadas possam ser incrementadas,
assegurando que os mecanismos necessários de comando e controle estejam presente. A
17
Para um detalhamento dessa condição, veja apud. Mannheim, K. Ideology & Utopy: An Introduction to the
Sociology of Knowledge. London, UK: Hancourt, 1936. pp.112.
18
Para detalhes a respeito de graus de prontidão, veja BETTS, Richard. Military Readness: concepts, choises,
consequences. Washington, DC. EUA: Brookings, 1995. Para identificar sua aplicação prática na determinação dos
requisitos de capacidade, veja o relatório sobre a reforma de defesa nos EUA denominada Bottom-up Review,
elaborada sob os auspícios do então secretário de Defesa dos EUA Les Aspin.Esse relatório recomendava,
expressamente, atenção para a importância dos graus de prontidão e determinava a reavaliação dos critérios de sua
aplicação para as forças. USA. Department of Defense. Report on the Bottom-up Review. Washington, EUA: DoD
Printing Office, 1993. pp.77.
12
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prontidão estrutural também tem seus custos. Altos graus de prontidão estrutural imobilizam
capital e deixam inativos custosos recursos de manutenção (bases, estaleiros, etc.). Além disso,
uma elevada prontidão estrutural demanda uma estrutura de pessoal pesada no topo, sob a
premissa de que é mais complexo e demorado preparar oficiais do que praças. Nesse sentido,
altos graus de prontidão estrutural estão associados com conceitos de emprego estratégico que
apostam na disponibilidade de tempo para sua ativação, muitas vezes incompatível com as
formas e dimensões temporais que os combates e crises vêm tomando atualmente.
3) Pronditão mobilizacional. Instrui sobre as prioridades de conversão dos recursos sociais,
tecnológicos, industriais e economicos nacionais de tempo de paz em capacidade militares que
preencham os vazios criados propositalmente na prontidão estrutural para minimizar seus custos
intrínsicos. A prontidão mobilizacional tem seu custo computado basicamente em termos das
demandas de preparação e manutenção de um inventário de possibilidades de conversão.
Os estados pretendidos dos graus de prontidão são contingenciados pelas possibilidades de
financiamento de projetos (dotações orçamentárias19) e pela capacidade da base industrial nacional
(aonde se aloja o complexo industrial de defesa do país) sustentar o esforço requerido no tempo e espaço
em atendimento as expectativas de emprego do poder nacional de autodefesa, de acordo com os
conceitos estratégicos praticados segundo a doutrina em vigor, dentro dos limites que as normas de
comportamento autorizam para o uso da força.
Os critérios de composição de capacidades de acordo com os graus de prontidão requeridos irão definir os
graus de agregação requeridos dos elementos integrantes da estrutura de força na forma de sistemas
singulares ou compostos de sistemas para assegurar o homomorfismo entre capacidades de defesa e
demandas de segurança, atuando como agentes de transformação de um conjunto de elementos
(condição de capacidade de usar a força) em outro (condição de não-necessidade de usar a força),
preservando no segundo a interrelação entre os componentes encontradas no primeiro
As capacidades nacionais, enquadradas enquanto poder nacional, continuamente reformula em
atendimento à percepão da evolução do ambiente estratégico, promovem a autodefesa ao assegurar a
criação das condições de possibilidade para a decomposição e recomposição dinâmica de meios de força
(incluindo os meios não-militares) em atendimento a expansão e retração de tarefas, assegurando que os
20
vínculos de comando e controle sejam mantidos, provendo o fluxo logístico necessário para a
19
Para um detalhamento do papel do orçamento no planejamento de defesa, veja. Petrei, H. Presupuesto y Control:
Pautas de reforma para a América Latina. New York: Banco Interamericano de Desarrollo, 1997. Veja ainda,
Gutiérrez, I.C. El Gasto Militar. Madri: Eudema, 1994. Para uma aplicação prática, evidenciando o relacionamento
entre a programação e a orçamentação, veja USA: United States Coast Guard: Budget Estimates. Washigton, D.C:
Department of Transportation, 2001. Embora a Guarda Costeira Americana exercite um modelo de orçamento
denominado Performance-Budget, as relações entre as demandas programáticas e possibilidades orçamentárias são
claramente evidenciadas, no caso, fazendo dos programas descritores de elementos de desempenho que as
capacidades da Guarda Costeira Americana deve atender para a consecução de seus objetivos sob uma ponderação
de custos.
20
Para uma ampliação do impacto das estruturas organizacionais nas possibilidades operaciaonais, veja USA,
Department of the Army. US Army Field Manual 100-5, blueprint for the AirLand Battle. Washington DC:
Brassey’s (US), Inc, 1991. Veja, ainda Deichman, P.F. der. Spearhead for Blitzkrieg: Luftwffe Operations in Support
of The Army: 1939-1945. New York, USA: IVY Books, 1996. O livro de Diechman é relevante para iluminar o
papel functional da doutrina na relação entre estruturas organizacionais e estruturas de força.
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manutenção do esforço no tempo e espaço, com o que emprestam credibilidade à intenção, se
necessário, do uso da força, criando a condição de possibilidade para segurança geoestratégica.
6. Eixo de Propagação no Domínio Informacional
O eixo de propagação da segurança no domínio informacional abrange a geração, arquivo, recuperação, e
processamento da informação que habilite indivídos e organizações a colaborarem (a) no reconhecimento
e enquadramento de problemas, (b) na avaliação das soluções encontradas, indicando seus graus de
relevância para os problemas percebidos, (c) na gestão dos processos de implantação das decisões, (d)
na interconceção dos resultados de decisões complementares de maneira eficiente, e (e) na comunicação
de intenções e resultados, perfazendo todos esses processos em ciclos (ciclos de decisão) cada vez mais
complexos, mas cada vez mais rápidos.
A aceleração necessária da escala da transformação do conhecimento para assegurar o provimento de
segurança em ciclos de decisão mais rápidos e mais complexos necessita ser acompanhada de
mecanismos para assegurar a incorporação dinâmica de lições aprendidas, que permitam rápido
reconhecimento e explicação dos processos de mudanças, com a identificação dos distintos estados do
sistema de segurança, acomodando as alternativas a disponibilidade dos recursos.
Esses requisitos fazem com que o domínio informacional da segurança esteja intimamente relacionado (1)
à capacidade de pesquisa, invenção, inovação, prototização e desenvolvimento; (2) à capacidade de
transmitir e incorporar novos conhecimentos em competências individuais e institucionais transformadas
(ensino e educação), para dar interconectividade a essas competencias na resolução de problemas antes
não incluidos nas dimensões técnica e cognitivas de possibilidades; (3) à amplicação contínua da base
computacional e do controle das redes de transmissão dos dados computados; e (4) ao design de formas
organizacionais inovadoras para suportar acelerados processos integrados de gestão que assegurem o
relacionamento de meios de natureza diferente e fins compartilhados entre agencias e organizações
diferentes.
7. Eixo de Propagação no Domínio Ambiental
O reconhecimento da segurança ambiental como dimensão da segurança foi formalizado em relatório
publicado em 1982 pela Comissão Independente sobre Questões de Desarmamento e Segurança
presidida por Olaf Palme (ICSDI 1982). Este relatório definiu a segurança ambiental em distinção a
segurança geoestratégica, atribuindo ao escopo dessa última a construção da dissuasão e o provimento
da defesa, enquanto definia o escopo da segurança ambiental funcionalmente, como esforço de
cooperação para fazer face aos problemas globais e aos problemas relacionados com o futuro da
humanidade e a sua sobrevivência, incluindo ai diversos tipos de ameaças não militares, como as
relacionadas com os problemas econômicos e de escassez de recursos, o crescimento demográfico e a
destruição do ambiente.
Veiga da Cunha21, Administrador da Divisão dos Assuntos Científicos da Organização do Tratado do
Atlântico Norte (OTAN), explicou muito bem a progressão da consolidação desse eixo nos sequintes
termos:
21
Veiga da Cunha, L. Segurança Ambiental e Gestão dos Recursos Hídricos. Texto disponível em
http://www.aprh.pt/congressoagua98/files/com/c11.pdf
14
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"Em 1985 a expressão do Novo Pensamento Político de Gorbachov lança a noção de
'segurança ampla' (comprehensive security), cujo objectivo foi definido como sendo a
sobrevivência da humanidade. As ameaças à segurança considerada nestes termos incluiam
não apenas as ameaças militares, com destaque para as ameaças nucleares e a guerra
generalizada, mas também as ameaças económicas e as ameaças ambientais, especialmente
as relacionadas com as questões ambientais globais. O relatório Brundtland, publicado há
uma década (WCED 1987), faz referência às tensões ambientais como fontes de tensões
políticas e de conflitos militares, ou seja como uma questão de segurança. Devido à crescente
escassez de recursos ambientais e à progressiva degradação da sua qualidade, a relação
entre a gestão dos problemas ambientais e a segurança nacional e internacional passa a ser
aceite e o ambiente a ser considerado como uma preocupação de segurança. O relatório
Brundtland defende uma completa integração das perspectivas ambientais num novo
entendimento dos factores económicos, sociais e políticos e argumenta que a noção de
segurança no sentido tradicional, isto é em termos de ameaças políticas e militares à
soberania nacional, deve ser alargada por forma a incluir os impactos das tensões
ambientais aos níveis local, nacional, regional e global. Como é sabido os problemas de
segurança ambiental não encontram frequentemente solução dentro dos limites das fronteiras
dos Estados, por estas não corresponderam normalmente a fronteiras ecológicas. O ambiente
e a ecologia atribuem normalmente prioridade ao conceito de interdependência sobre o
conceito de independência.”
Essa formalização encontra forte respaldo empírico nas questões comtemporâneas, com aporte conceitual
da Teoria dos Regimes, enquanto um conjunto de conceitos teóricos relacionados com os limites de
expansão do fluxo de diversidade das variáveis de segurança em função (a) da sobre-utilização de
recursos renováveis, (b) do esgotamento da capacidade de auto-depuração do ambiente, e (c) do
empobrecimento dos espaços vitais, construíndo requisitos de governança para habilitar ou inibir a
possibilidade de modelos de desenvolvimento.
Combinados, os eventos desenvolvidos nesses sete eixos de propagação da segurança são necessários e
suficientes para dar conta da variedade da segurança. A ausência de um desses eixos tende a ser
equivocadamente preenchida por ideologias ou doutrinas, removendo a capacidade da metodologia
efetivamente capturar e comunicar a estrutura real do problema da segurança.
Os eventos desenvolvidos nesses eixos ganham significado analítico na medida em que sua participação
é reconhecida na formação dos impactos múltiplos e simultaneos que formam a realidade percebida. A
reconstrução dessa realidade, aonde emergem os problemas de segurança, é um esforço de síntese das
dinâmicas críticas regidas por um conjunto de equações que, em conjunto compõem a lógica articulante
do sistema de segurança.
3.3 Lógica Articulante
O descritor de um fenômeno de segurança, por exemplo, “Segurança Pública”, não deve ser confundido
com a sintese rigorosa e precisa do problema. Esse equívoco é muito comum, sob a premissa falsa de
que todos os participantes de um esforço de formulação de políticas e estratégicas compartilham do
mesmo entendimento do problema, ou usam critérios compartilhados para defini-lo. Assim como migração
ilegal, pobreza, subdensenvolvimento são descritores fenomenológicos, que ganham significado no
constructo de segurança no entrelaçamento de causas.
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A definição do problema da segurança pública, por exemplo, possuirá tantas diferentes alternativas
quantas forem as pessoas participantes do processo de definir o conceito. Como vimos na definição da
natureza dos problemas complexos, não se pode qualificar um problema de segurança sem também
qualificar todo e completamente o ambiente aonde ele emerge e ganha significado. Remover a restrição
para se obter um descritor simples seria aceitar que uma única relação de causalidade possa sintetizar
todas as relações desenvolvidas nas múltiplas dimensões da arquitetura de causalidades da segurança.
A lógica articulante da segurança (LAS) é o que dá significado ao estado de segurança em cada momento
histórico, para cada pais particular, explicando como e porque o funcionamento dos subsistemas (setores
de causalidade) integram o todo para gerar um determinado comportamento ou estado do sistema. A
inovação da metodologia proposta nesse trabalho está na articulação dos processos em torno desse
conceito. Um exemplo metafórico pode auxiliar sua compreensão.
A lógica que define o conceito de uma motocicleta pode ser sintetizado no descritor “Harley Davidson”,
uma “motomachine” que projeta a image mental da maquina com seu barulho típico (patenteado). O que
faz de uma Harley uma motocicleta não é o barulho, obviamente, apesar desse ser o qualificador de uma
subcategoria na categoria das motocicletas. A categoria das motocicletas é descrita pela combinação,
dentre outras, das teorias explicativas do ciclo de combustão com as teorias explicativas das transmissões
de potência, e delas com as teorias explicativas da dinâmica do movimento em equilibrio sustentado em
duas rodas apenas, em combinação com as teorias que explicam o atrito das rodas com o solo para limite
desse equilíbrio por variação das condições do ambiente.
Não há critério objetivo único aceito para qualificar essa arquitetura como verdadeira ou falsa. A verdade
da arquitetura de relacionamentos depende das teorias aceitas como válidas. A Harley possui certamente
potência de motor suficiente para impulsionar um pequeno aeroplano, somente não tem a aerodinâmica
adequada. Mas a categoria das motos (pelo menos até hoje), bloqueia o fluxo de variedade na categoria,
para não incluir cadeias de causalidades relacionadas com a sustentação aerodinâmica.
Nesse contexto, a pergunta, porque a Harley não voa, somente pode ser considerada como válida ou não
válida, mas não pode ser julgada como certa ou errada. A ampliação da categoria muda a natureza do
problema e, simultaneamente, a natureza da resposta. Nada impede que projetemos como solução
conceitual uma Harley “fly_machine” com estrutura aerodinâmica e asas, diferente da Harley
“moto_machine”. Esse projeto conceitual vai responder ao problema formulado dentro dos limites do
sistema de causalidades, de acordo com os critérios elaborados para avaliar seu desempenho dentro
desse sistema.
A lógica articulante do conceito de motocicleta explica sua função e define sua natureza, desdobrando os
efeitos da solução que ela é portadora por toda a estrutura de onde o problema emergiu: rapidez no
deslocamento em áreas urbanas de tráfico intenso, ou então exploração lúdica da autonomia e velocidade,
conforme conceitualizado junto com o conceito que o explica.
A lógica articulante de uma determinada condição de segurança permanece estável enquanto ela for
capaz de atender critérios de performance (métricas) estabelecidos na contrução simultânea da solução
conceitual e do problema. Essa métricas irão prover o indicador do grau de atendimento do problema pelas
políticas e estratégias, permanecendo válidos durante o período de tempo o espaço de possibilidades que
circuncreve as relações mantem sua consistência interna e externa, e esse espaço de possibilidades
permanece consistente enquanto as premissas que sustentam as relações de causalidade permanecem
válidas.
Enquanto essa cadeia se autosustentar, os efeitos da solução irão se propagar alterando os valores das
variáveis e das relações entre elas. Isso implica que a solução para um problema de segurança não
possui um valor em si mesmo, mas sim que sua utilidade estará sempre contingenciada ao arranjo
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temporalmente definido das variáveis que estabilizam ou redefinem constantemente o problema dentro de
uma mesma LAS.
3.4 Erros analíticos
Os dois conceitos estruturantes da metodologia proposta – eixos de propagação e lógica articulante da
segurança – enquanto possibilitam a análise rigorosa de uma situação em constante evolução, devem
evitar quatro desvios metodológicos recorrentes: inércia, auto-sustentação, acomodação e singularidade
induzida.
1. Inércia: Esse tipo de erro ocorre quando a análise do problema de segurança tende a extrapolar para
o futuro os problemas e características do presente; ou seja, o ambiente futuro tende a ser modelado por
uma descritibilidade plausível (dar convencimento a partir do que aceitamos como verdadeiro hoje). Com
isso, apresenta um “erro de partida” ao restringir a incorporação de mudanças paradigmáticas.
A inércia leva à construção de problemas de segurança pela simples extrapolação de tendências. Para
isso, assume como premissa a ocorrência de uma transição clara e linear do ambiente atual para o
projetado e, com isso, deixa de fora a realidade expressa pela “dependência sensível das condições
iniciais”, segundo a qual pequenas diferenças de insumo podem transformar-se rapidamente em
esmagadoras diferenças de resultado. E isso é mais verdadeiro quando a escala de tempo é muito grande,
possibilitando a ocorrência de rupturas de tendências. No início, há uma coincidência da série de eventos,
mas após algum tempo, com a ocorrência dos pontos de crise, as variações produzem resultados que se
bifurcam de forma a gerar estados de segurança qualitativamente tão diferentes, que não guardam mais
praticamente nenhuma semelhança com as condições iniciais ou mesmo entre si.
2. Auto-sustentação: O erro de auto-sustentação ocorre no enquadramento dos problemas de
segurança quando as condições necessárias dos eventos que definem o ambiente de segurança são
criadas e mantidas pelos próprios eventos, em um processo auto-mantenedor de retroalimentação
dinâmica.
Nesse caso, os eventos tendem a adquirir vida própria, tomando formas que não as esperadas. Isso
ocorre quando as premissas acabam tornando-se “verdades” subsumidas. Após ter se qualificado um
evento, aquilo que era uma premissa, passa a ser considerado como fato, fazendo com que haja uma
natural relutância em se alterar sua arquitetura após todo o trabalho envolvendo o sua elaboração, tal
como ocorreu, por exemplo, na década de 60, com o estabelecimento de 23 dias de alerta para o
planejamento da OTAN, que acabou tornando-se um índice rígido, mesmo tendo sido alterada a base
referencial que havia sido empregada para a delimitação daquele período de alerta22.
22
Para uma excelente perspectiva sobre o processo de decisão da OTAN e mais especificamente dos EUA relativo
ao período de alerta, veja SOKOLSKY, J. J. Seapower in the Nuclear Age. Annapolis, USA: Naval Institute Press,
1991. Sokolsky argumenta que a reformulação do conceito de emprego das forças americanas, denominado
Resposta Flexível, ao estabelecer escalões e graus diferenciados de resposta à possível ameaça soviética, demandou
a reformulação do sistema de mobilização e de deslocamento da forças para a Europa, com o que implicou na
reformulação das próprias forças de escolta e da estrutura organizacional. O resultado foi não somente uma
diminuição do tempo de resposta dos primeiros escalões mas de toda a força. A análise de Sokolsky é importante
por segregar no conjunto dos arranjos de capacidade americanas, a importância da otimização do fluxo marítimo
como efetivos provedores da flexibilidade da resposta. A aplicação do constructo de defesa como ferramenta
analítica no trabalho de Sokolsky foi extremamente útil. Possibilitou desdobrar conclusões sobre os argumentos
apresentados, evideciando relacionamentos e articulações que iluminam aspectos do projeto de força americano.
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3. Acomodação: A acomodação tipifica o erro analítico de procurar balancear (acomodar) interesses à
disponibilidade de recursos no enquadramento do problema. Ou seja, o problema de segurança passa a
ser aquele onde os recursos disponíveis podem dar conta.
Quanto menor o número de parâmetros considerados nas dimensões de análise, mais a solução
antecipada (implicita) do problema que está sendo enquadrado fica reduzido a uma questão de mais e
mais recursos financeiros. Com isso, determinados setores ou instituições com impacto em um domínio
específico da segurança acabam ganhando autonomias indevidas e indesejáveis na solução do problema
de segurança.
A hipótese implicita, construída em bases falsas, é que dado mais recursos orçamentários, e deixado
trabalhar com autonomia, um dado setor sabe o que fazer para resolver o problema de segurança. A
análise corre então o risco de torna-se meramente ferramenta para validar a manutenção de decisões ou
núcleos de poder, com consequências danosas para a governabilidade.
4. Singularidade induzida: A singularidade induzida diz respeito à tendência do analista escolher
variáveis estritamente focadas dentro de sua área de conhecimentos. A singularidade induzida decorre da
dificuldade humana de conviver com idéias contraditórias simultaneamente. O que faz com que os
analistas sintam-se mais a vontade quando os problemas são estritamente focados dentro de suas áreas
de conhecimento ou capacidades reconhecidas.23
A análise de segurança justificada em argumentos selecionados exclusivamente vinculados no eixo
geoestratégico, por exemplo, elaborada exclusivamente por especialistas militares, tende a fazer com que
a defesa necessite, sempre, de mais recursos, para fazer mais do mesmo, independentemente da
reconfiguração do problema de segurança. Note-se que a justificativa da necessidade pode ser
absolutamente consistente com o problema apresentado, tornando difícil ao decisor perceber que o
equívoco está na análise, por não incluir outras dimensões simultaneas e necessárias para a configuração
do problema real, e não o desejado.
A possibilidade do erro de singularidade, além do grau de conhecimento necessário para o tratamento de
todas as dimensões de segurança, leva, naturalmente, à necessidade de equipes multidisciplinares de
analistas.
Veja, ainda: GADDIS, J.L. We now know: rethinking Cold War History. New York, EUA: Oxford University Press,
1997. ZISK, K.M. Engaging the enemy: organizational theory and Soviet Military Inovation, 1955-1991. New
Jersey, EUA: Princeton University Press, 1993. MAY, Ernest. American Cold War Strategy. New York, EUA:
Harvard University, 1993. SMITH, J. Cold War. 2.ed. Oxford, UK: Oxford University Press, 1998. WERTHEIN,E.,
BAHJAT, A. e WATSON,B. Cronology of the Cold War at Sea: 1945-1991. Annapolis, USA: Naval Institute Press,
1998.
23
Esse fenômeno é explicado pela psicologia como dissonância cognitiva. Trata-se da possibilidade de solução de
um conflito interno pela negação de um de seus polos inconcialiáveis. Para uma apresentação detalhada desse
fenômeno, veja LINDLEY, Gardner. HALL, Calvin S. e THOMPSON, Richard F. Psicologia. trad. Eliezer
Shneider. Rio de Janeiro: Koogan, 1977, pp. 394. Para uma análise desse fator na formulação de cenários, veja
CHUYEV, Yu V. e MIKHAYLOV, Yu V. Soviet Military Thought.nr.16: Forecasting in Military Affairs. trad.
DGIS Multilingual Section Translation Bureau – Secretary of State Department – Canada. Moscou, URSS.:
Washington, D.C., EUA: U.S Government Printing Office, 1980. pp. 133 Estes autores categorizam este problema
como sendo “inércia psicológica”.
18
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Conforme Karl Popper24 explica, as conseqüências desses quatro erros“... possibilitam que
convenientes adaptações sejam formuladas para fazer com que as conclusões atendam às
expectativas”. Esse é um excelente sumário da necessidade de uma metodologia consistente, articulada
com uma moldura analítica robusta, para dar conta de problemas complexos emergentes no ambiente de
segurança.
________________________________________________________________________
4.0 METODOLOGIA – A LÓGICA DOS PROCESSOS
Métodos não asseguram a verdade do problema ou a propriedade da solução, apenas emprestam rigor na
execução dos processos para evitar erros analíticos. Já as metodologias se caracterizam por
empreenderem um nível de abstração mais elevado no tratamento dos fenômenos, criando categorias,
critérios de inclusão e exclusão nessas categorias, e instruindo o processo de transformação dos
25
conteúdos entre categorias sucessivas . Metodos portanto, são instrutores de ordem que se deve impor
aos diferentes processos necessários para atingir um fim antecipado, enquanto as técnicas descrevem os
passos necessários para a consecução das etapas que os métodos estabelecem.
Segundo essa classificação a lógica dos processos proposto nesse trabalho se enquadra como uma
metodologia. Suas etapas são descritoras de categorias de processos, admitindo a construção de métodos
adaptados às circunstâncias e condições particulares de cada país, instrumentalizadas por técnicas
voltadas para a consecução do propósito particular de cada etapa que os processos descrevem.
A Figura 1 apresenta o diagrama em blocos da metodologia. Seu propósito é apresentar a metodologia em
uma forma graficada, facilitando o entendimento das categorias que seus elementos definem, e dos fluxos
de transformação que instrui o encadeamento de processos. O detalhamento dos processos é
apresentado no anexo.
Figura 1: Diagrama em blocos
24
POPPER, K.R. A lógica da pesquisa científica. trad. Leonidas Hegenberg. São Paulo: Cultrix, 1972. pag 86.
Para outros entendimentos de metodologia veja JOLIVET, Regis. Curso de Filosofia. 13. Ed. Rio de Janeiro:
Agir, 1979. Pag. 71. BUNGE, Mario. La ciência, su método y su filosofia. Buenos Aires: Siglo Veinte, 1974, pag.
55. Ou ainda CERVO, Amado L. e BERVIAN, Pedro A. Metodologia Científica. 2.ed. São Paulo: McGraw-Hill,
1978.
25
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Parametrização
Inventario do Potencial
Nacional
Desenho das Equações de
Segurança
Identificação das Hipóteses
Transformacionais
Configuração dos Espaços
de Insegurança
4.1 Parametrização
A parametrização explicita os fatores que instruem e condicionam a análise, o escopo e escala das
alternativas possíveis e prováveis de resposta ao problema de segurança identificado, por meio (1) do
propósito e do horizonte temporal, (2) do enquadramento da problemática, e (3) do enquadramento dos
requisitos de desempenho.
1. Propósito intencionado e horizonte temporal de prospecção: Explicita o decisor e a forma
desejada do produto resultante, com a clarificação da função de transformação esperada dos efeitos
desse produto na instituição (governo ou agencias), no ambiente, e na relação entre o ambiente e as
agências de governo dentro de um determinado horizonte temporal.
2. Enquadramento da problemática: Sumariza e qualifica as condições de contorno percebidas que
justificam a intenção declarada no propósito, utilizando tres elementos:
a) Fatores geradores: qualificação das condições que geram a necessidade da análise e, por
consequinte, da revisão de políticas e estratégias de segurança, tais como alterações no
ambiente estratégico, alterações nas diretrizes ou prioridades governamentais.
b) Impactos: projeção da relevância e pertinência dos efeitos percebidos dos fatores geradores na
consecução dos interesses nacionais.
c) Compromissos e resistências: qualificação da estrutura de incentivos e restrições à
transformação do status quo.
3. Enquadramento dos requisitos de desenho das políticas e estratégias de segurança: Essa
etapa é fundamental para instruir a abrangência, foco e nível de agregação/desagregação das
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informações que devem ser empreendidas na análise para que possam atender adequadamente aos
requisitos de formulação de políticas e estratégias. A definição desses requisitos é desenvolvida por
correlação a níveis de maturidade analítica, expressos em termos da capacidade institucional de
conceitualizar soluções, corrigir desvios e atualizar dinamicamente as soluções conceitualizadas a partir
da análise dos desvios.
a) Indefinição de alternativas: Não há clareza quanto ao estado futuro da segurança que as
alternativas estratégicas devem dar consecução, nem há critérios para definir esses propósitos
em resposta a um problema analiticamente qualificado.
b) Incerteza de alternativas: Se conhece os propósitos que definem as alternativas, há critérios
para construi-las, entretanto, esses critérios não são consistentes, não há dados estruturados
para aplicar esses critérios, nem ha procedimentos (métodos) consistentes para essa aplicação
(há objetivos, mas esses objetivos não são traduzidos em metas realizáveis - adequadas,
exequíveis e aceitáveis). Se sabe aonde se quer chegar, mas nao se tem clareza das alternativas
para chegar lá.
c) Inconsistência de alternativas: Não se conhece a distribuição de probabilidades que
relaciona a seleção de uma opção estratégica com seus impactos, entretanto não é possível
identicar a alternativa mais favorável (há alternativas, mas não há mecanismos para contruir
critérios de preferencia e estruturar decisões sobre qual alternativa escolher).
d) Incompatibilidade de alternativas: Se conhece a distribuição de probabilidades dos impactos
das opções estratégicas, é possível identificar uma alternativa preferida, entretanto, mas não se
conseque qualificar se a alternativa oferece uma resposta ao problema formulado (não se sabe
se a escolha efetuada pode efetivamente resolver o problema percebido).
e) Inaceitabilidade de alternativas: Ha possibilidade de que a alternativa implementada de
conta do propósito antecipado, mas não há procedimentos para medir e corrigir o desalinhamento
de metas, recursos e propósitos, ajustando, dinamicamente, metas, recursos e propósitos (não
há ferramentas de gestão estratégica na magnitude e qualificação necessárias e desejadas).
4.2 Inventario do Potencial Nacional
Nessa etapa a metodologia proposta isola e interpreta o entrelaçamento de fenômenos que qualificam o
ambiente de segurança segundo cada um dos eixos de propagação da segurança, extraindo tensores,
dependentes e independentes, buscando uma apreensão da realidade, que procura essencialmente
desvendar seu movimento para transformá-la.
Tensores dependentes aparecem, desaparecem ou variam a medida que o investigador introduz, tira ou
modifica outros eventos. São portanto a propriedade ou fator que é efeito, resultado, conseqüência ou
resposta a algo que foi manipulado. Os tensores independentes são determinantes para que ocorra
determinado resultado efeito ou conseqüência, sendo selecionados e manipulados a fim de se descobrir
se eles tem influência ou modificam os eventos dependentes.
O inventário do potencial nacional qualifica esses tensores, na forma de recursos e competências
tangíveis, intangíveis, e transformacionais do estado. Os dados não disponíveis no inventário do potencial
nacional são listados como Lacunas de Informação. Essas lacunas são retomadas e incorporadas nas
hipóteses sobre o estado das variáveis de análise e seus relacionamentos.
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Há diversas técnicas que podem ser utilizadas para estruturar bancos de dados dos elementos
habilitadores dos tensores, na forma por exemplo de recursos físicos (materiais estratégicos, industrias
críticas), recursos de transformação (sistema educacional) e recursos ideacionais (inovação). Note-se que
na extração dos tensores dentro de cada Eixo, por exemplo, a variável submarinos, ou aeronaves de
combate somente possuem significado enquanto habilitadoras de uma competencia ou habilidade, como
por exemplo, estabilização do entorno entratégico regional.
Apresenta-se abaixo alguns tensores tipificados nos eixos de propagação de segurança26.
1. Aumento do grau de complexidade
a. Institucionalização da intencionalidade da inovação nas instituições governamentais.
b. Controle das matrizes tecnológicas nos segmentos estratégicos.
c. Mecanismos de proteção de patentes de farmacos e transgênicos.
d. Conectividade das bases de conhecimento.
e. Estoques de energia
2. Sustentaçao Dinâmica de Prioridades
a. Resiliência das plataformas ideológicas dos partidos políticos.
b. Capacidade de financiar projetos de investimento.
c. Alinhamento estratégico de recursos e objetivos nos planos de governo.
d. Taxas de aceleração dos indicadores macro-econômicas
3. Controle do Graus de Autonomia
a. Diversidade das fontes da matriz energética nacional.
b. Graus de redundância energética
c. Alcance da infraestrutura de distribuição de energia.
d. Autosuficiência na geração de matrizes agrícolas geneticamente transformadas.
4. Abrangencia dos propósitos
a. Desequilibrio do balanço demográfico.
b. Ruptura de padrões societais.
c. Rapida dispersão da diversidade cultural de imigrantes.
d. Alinhamento das prioridades e estrutura das relações político-militares.
5. Contrução de Autoproteção
a. Permeabilidade do acesso ao mercado ilegal de armas.
b. Geração de estabilização do entorno entratégico regional.
c. Alinhamento do Projeto de Força com a política exterior.
d. Potencialização do Projeto de Força pela Indústria de Defesa Nacional.
e. Integração de perceção e dos critérios de decisão das agências.
6. Potencialização dos ciclos de decisão
a. Maturidade estratégica das instituições públicas.
b. Velocidade dos ciclos de decisão estatal.
c. Inclusividade do sistema educacional.
26
Para a contrução de outros indicadores, veja Tellis, A., et. al. Measuring National Power in the Postindustrial
Age. Rand, California, 2000.
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d. Mecanismos de difusão da inovação.
e. Criação e gestão de estoques de conhecimentos úteis (actionable knowledge)
7. Incremento do Fluxo da Diversidade
a. Compromisso político com standards ecológicos internacionais.
b. Modelagem de ecosistemas.
c. Processamento de dejetos urbanos.
d. Domínio de marcas e padrões (national brands).
4.3 Desenho das Equações de Segurança
A variancia da relação entre tensores dependentes e indepedentes, para cada pais, em cada período
histórico, define a relação entre o significado que atribuímos a algo e sua interpretação27. Por meio dele
podemos explicar que cada condição de segurança percebida possui uma determinada dimensão
semântica (significado político), que depende de como consideramos a interpretação de seu significado
por outros observadores (países) e vice-versa. Reduz-se, desta forma, os elementos de saída à mesma
natureza política dos elementos de entrada, permitindo o estabelecimento de uma relação que admite um
tratamento de ambos segundo os mesmos critérios.
As equações de segurança capturam em forma narrativa as dinâmicas críticas entre os tensores,
estabelecendo um agente (ator individual ou institucional), que explora tensores, para alcançar um
propósito (objetivos). Por exemplo:
Lideranças religiosas exploram desiquilíbrios étnicos para criar percepções de assimetrias
no acesso às formas de riqueza, contribuindo para a ruptura e substituição de padrões
societais nacionais por padrões sectários que sustentem posições políticas.
Ou ainda:
A exploração de espaços não-governados por grupos extremistas, e a ausência de vontade
política para confrontar esses grupos tem apresentado oportunidades para grupos
extremistas transitar, recrutar e operar, criando mecanismos de auto-sustentação na
economia local.28
As equações de segurança capturam a LAS, conformando a teoria da segurança, que rege a explicação
do fenômeno, sua condição de manifestação e evolução. A determinação das equações de segurança
pressupõe quatro processos, cada um deles com possibilidade de apoio por inúmeras técnicas.
1) Identificação dos agentes de mudança: qualificação de atores (indivíduos, grupos,
entidades, organizações, etc.), fatores (acordos, alianças, etc.) e condições (eleições
presidenciais, novas tecnologias, crises econômicas), com capacidade de gerar a percepção
coletiva de que as necessidades fundamentais, padrões de vida, interesses ou valores podem
ser transformados para uma condição que não atende às expectativas e necessidades com
consequências negativas.
27
BRUYNE, P. HERMAN, J. e SCHOUTHEETE, M. Dinâmica da pesquisa em ciências sociais: os polos da
prática metodológica. 5 ed. trad. Ruth Joffily Rio de Janeiro: Francisco Alves. 1991. pag. 190.
28
O primeiro exemplo foi extraido da análise da situação de segurança no Afeganistão em 2010 e o segundo da
análise da situação de segurança em Bangladesh em 2008 (versões não sigilosas) realizadas pela Agência de
Reconstrução e Estabilidade do Departamento de Estado – S/CRS).
23
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2) Modelagem das Dinâmicas críticas: representação gráfica dos relacionamentos entre as
variáveis qualificadoras dos tensores para entendimento das cadeias críticas de eventos que
explica como ambiente de segurança funciona. Esses relacionamentos possibilitam a
identificação da ocorrência de ciclos com três características:
a. Positivos: os efeitos os efeitos gerados no encadeamento de variáveis dependentes e
independentes reforça uma determinada tendência ou comportamento do sistema,
aumentando a intensidade da consequência que define o ciclo. Por exemplos, ciclos de
violência, migração regional, crises econômicas.
b. Negativos: os efeitos gerados no endadeamento de variáveis dependentes e
independentes tendem a se cancelar mutuamente. Por exemplo, desaceleração econômica,
dissuação.
c. Equilíbrio dinâmico: os efeitos gerados no encadeamento de variáveis dependentes e
independentes flutua na definição de positivo ou negativo do ciclo. Por exemplo, endemias
versus saúde publica; unidade nacional versus preservação das identidades dos grupos
sociais.
Há diversas técnicas para essa modelagem. A Figura 1 – Diagramas de Impactos, apresenta um
exemplo nocional da aplicação dessas técnicas para a modelagem de um diagrama de impactos
desenvolvido para identificar a estrutura de relacionamentos do terrorismo com o tráfico de drogas
visando a formulação de uma estratégia governamental de enfrentamento da condição de
insegurança em uma região do Perú29.
Figura 2: Diagrama de Impactos
29
O trabalho foi elaborado dentro do Programa NationLab do Center for Hemispheric Defense Studies, em conjunto
com o Trabalhos similares foram empreendidos em diversos países com propósitos acadêmicos e instrumentais.
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3) Extração das equações de segurança: identificação dos caminhos críticos de propagação de
efeitos da segurança. Essa descrição deve evitar prescrever ações ou recomendações para a
modificação dos ciclos, limitando-se a identificar a estrutura de causalidade dos fenômenos
percebidos.
4) Redação da LAS: narrativa da teoria de segurança explicativa da natureza e tendência de
evolução do fenômeno.
4.4 Identificação das Hipóteses Transformacionais
O estado de cada tensor no tempo, a relação entre os tensores, e a relação entre as relações capturados
pelas equações de segurança informa a estrutura de causalidade da segurança, condicionada pelas
hipóteses transformacionais. Essas hipóteses estabelecem um fator de teste para os limites das
inferências ou especulações obtidas sobre as relações entre os agentes de transformação, os tensores e
os propósitos. Incorporam, assim, na análise de segurança, elementos que permitam explicitar seus
próprios limites, empregando dois tipos de hipóteses – paramétricas e relacionais.
1. Paramétricas: são hipóteses sobre as causas de transformação dos tensores. Por exemplo, (1)
desequilíbrios étnicos são agravados quando as etnias incluidas em um mesmo espaço vital
possuirem histórico de confrontação violenta e (2) padrões societais são rompidos quando
os núcleos de poder não conseguem rapidamente transformar e impor novas normas de
comportamento.
2. Relacionais: são as hipóteses de transformação das relações entre os tensores, apoidas por
teorias e conceitos contruidos sobre evidencias empíricas. Por exemplo, a explicação oferecida
pela Ciência Política para a correlação entre desiquilíbrios étnicos e ruptura de padrões
societais.
A formalização de cada hipótese deve ser acompanhada de suas variáveis de controle, na forma de
métricas, cada um deles qualificando elementos que permitam aferir o impacto da implementação futura
das políticas e estratégias. Nesse sentido, as métricas são elementos mensuráveis que permitem
identificar as taxas de mudança do ambiente em direção a uma condição pretendida, diferente da atual,
conforme as hipóteses de transformação sejam exercitadas para gerar ou contrapor efeitos no ambiente.
25
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Uma métrica descreve o conceito do que será avaliado, enquanto que um indicador descreve a condição
empírica observada30. Por exemplo:
Hipótese paramétrica: As diferenças políticas entre grupos societais aumenta com o nível
de violência sistemática praticada.
Métrica: atrocidades cometidas contra grupos opostos
Indicadores: número de sequestros e vandalismo registrados em X meses pelo grupo A
contra o grupo B.
4.5 Configuração dos Espaços de Insegurança.
Um Espaços de Insegurança descreve um estado de equilíbrio contingencial de uma parcela do ambiente
de segurança que oferece algum grau de previsibilidade temporária de desenvolvimento de efeitos
negativos aos interesses do Estado. Cada espaço de insegurança qualifica um conflito, distinto em sua
natureza e estrutura de causas dos demais.
A contingencialidade dos espaços de insegurança é função da ocorrência de janelas de vulnerabilidades.
A temporariedade da previsão dos efeitos decorre da forte dependência das trajetórias de eventos para
com as condições iniciais. Uma alteração inicial mínima nos tensores pode expandir seus efeitos
exponencialmente ao ponto de alterar completamente as condições de segurança existentes por efeito
cumulativo e multiplicativo.
Um espaço de segurança poderia descrever a emergência de violência urbana durante as eleições
presidencias, intencionalmente provocada por um grupo radical, mas sem representatividade política, para
evitar que um dado candidato majoritário, contrário a seus interesses, seja reeleito. Nesse cado, a janela
de vulnerabilidade é dada pelas eleiçoes presidenciais, que reduz o grau de liberdade (aleatoriedade) da
manifestacao do fenômeno descrito, criando o espaço de possibilidade para a escalada de tensões,
demandando respostas de grande envergardura, sem que existam tensores instalados que possam
impedir ou mitigar os efeitos antecipados.
As narrativas dos espaços de insegurança respondem aos requisitos estabelecidos na parametrização,
comunicando a percepção do analista sobre um dado fenômeno, para permitir aos formuladores de
políticas e estratégias diagnosticar o potencial de danos aos interesses e objetivos de segurança,
contruindo soluções que alterem as causas geradoras do conflito, transformando as relações entre os
elementos que constroem essas causas ou neutralizando janelas de vulnerabilidade para a materialização
dos danos potenciais.
_____________________________________________________________________
5.0 ALCANCE E LIMITES
Implementar a metodologia deve ser o primeiro passo na formulação de políticas e estratégicas de
segurança. Os conhecimentos que ela produz, estrutura e disponibiliza não somente instruem, como
também facilitam o proprio processo de formulação das políticas por oferecer os pontos de impacto
requeridos para reformular os tensores, e por também evidenciar a estrutura de propagração dos efeitos
30
Para exemplos de métricas orientadas para avaliação de sucesso em ambientes de conflito, veja United States
Institute of Peace. Measuring Progress in Conflict Environment (MPICE). USIP, 2010. Embora as terminologia seja
diferente da praticada nesse trabalho, os conceitos são convergentes.
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das ações estratégicas requeridas para transformar a estrutura de causalidade das dinâmicas críticas,
removendo as causas da insegurança, ou modificando a percepção da ocorrencia de janelas de
vulnerabilidade que dão vazão aos efeitos possíveis dessas causas.
A metodologia foi desenhada para atender à um largo expectro de demandas, atendendo aos sequintes
requisitos de design:
1) Simplicidade dos processos. A metodologia possui apenas 5 macro-processos: Parametrização,
Inventário do Potencial Nacional, Desenho das Equações de Segurança, Identificação das
Hipóteses Transformacionais, e Configuração dos Espaços de Insegurança. Uma vez entendida, a
metodologia é simples de executar. Já tendo sido aplicada em vários paises, como Peru, Jamaica,
Guatemala, El Salvador, México e Paraguai, com escopo e propósitos diferenciados, com grande
sucesso, provendo elementos essencias para a tomada de decisão.
Um dos marcos de simplicidade, é a absorção nesses apenas 5 macro-processos dos
procedimentos de elaboração de cenários. O analista constrói os elementos de prognosticação no
desenvolvimento das etapas prescritas pela metodologia, nesse sentido, embora simples, nenhum
dos macro-processos deve ser “cortado”, com risco do comprometimento da integridade dos
resultados.
2) Robustes da moldura conceitual. O sistema de conceitos que sustenta a metodologia é consiste
com marcos teóricos e metodológicos praticados. Alguns de seus elementos foram modelados
espelhando práticas recorrentes de formulação de políticas públicas. A base conceitual da
metodologia é ampla e sofisticada, construindo um acervo multidisciplinar, desdobrado
principalmente da Epistemologia, da Filosofia Lógica, das Teorias da Ciência Política, das Relações
Internacionais, da Pesquisa Operacional, da Teoria da Complexidade, da Teoria dos Sistemas, da
Engenharia de Produção, da Teorias da Administração e da Teconologia da Informação.
3) Interconectividade. A metodologia pode ser facilmente desdobrada em métodos que se conectam
com processos de formulação de políticas e estratégias particulares de cada país. Seus processos
atendem plenamente tanto aos métodos baseados em objetivos (Objectives Based Planning)
como aqueles baseados em premissas (Assumptions Based Planning), mas especialmente aos
métodos baseados em capacidades (Capabilities Based Planning).
Os espaços de Segurança configurados ao final do processo delineiam completamente as áreas de
missões (espaços de capacidades) empregadas pelos métodos por capacidades, enquanto provê,
simultaneamente, os elementos essenciais dos cenários necessários para os métodos por objetivos
ou por premissas.
4) Colaboração. A metodologia foi concebida para ser implementada com o apoio de um facilitador,
“expert” na metodologia, com múltiplos participantes, “experts” em várias áreas do conhecimento.
A construção do Diagrama de Impactos, por exemplo, e principalente, exige o compartilhamento de
entendimentos do fenômeno sob várias perspectivas para ser adequadamente formulado na
amplitude e profundidade requerida para a elaboração dos tensores nos sete eixos de propagação
da segurança.
Finalmente, a metodologia foi desenhada com uma “arquitetura aberta”, admitindo (demandando seria um
termo melhor) seu contínuo aperfeiçoamento pela inclusão/revisão de novos processos, maiores e
melhores explicações dos processos, recomendação de técnicas, e compartilhamento de lições
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aprendidas e de “boas práticas” em sua implementação. Para esse propósito, formou-se uma
comunidade de práticas (community of practice). Caso deseje fazer parte desse esforço, por favor entre
em contacto com [email protected]. ou visite o blog http://salvadorraza.blogspot.com.
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Anexo - Metodologia de Análise de Conflitos
1) PARAMETRIZAÇÃO
a) Propósito intencionado e horizonte temporal de prospecção
b) Enquadramento da problemática
i) Fatores geradores
ii) Impactos
iii) Compromissos e resistências
c) Enquadramento dos requisitos
2) INVENTARIO DO POTENCIAL NACIONAL
a) Tensores do Grau de Complexidade
b) Tensores da Sustentação Dinâmica de Prioridades
c) Tensores do Controle dos Graus de Autonomia
d) Tensores da Abrangência dos Propósitos
e) Tensores da Construção de Autoproteção
f) Tensores de Potencialização dos Ciclos de Decisão
g) Tensores de Incremento do Fluxo da Diversidade
3) DESENHO DAS EQUAÇÕES DE SEGURANÇA
a) Identificação dos agentes de mudança
b) Modelagem das Dinâmias críticas
c) Extração das equações de segurança
d) Redação da LAS
4) IDENTIFICAÇÃO DAS HIPÓTESES TRANSFORMACIONAIS
a) Hipóteses paramétricas, métricas e indicadores
b) Hipóteses relacioais, métricas e indicadores
5) CONFIGURAÇÃO DOS ESPAÇOS DE INSEGURANÇA
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