Medo: Algumas considerações
numa ótica Behaviorista Radical1
Ana Rachel Pinto*
...“ corremos por causa do “medo”,
brigamos por causa da “raiva”, ficamos
paralisados pela “ira”, deprimidos pelo
“pesar”, choramos porque estamos
“tristes” (Skinner, 1989, p.160).
Exemplos como os acima
citados demonstram o que vem sendo
largamente difundido em nossa cultura,
segundo Cavalcante (1997), referente às
causas do comportamento. Numa visão
popular tem-se o costume de se
considerar que comportamentos são
causados por eventos privados. Skinner
(1974) refere que inúmeras vezes os
sentimentos são considerados
responsáveis pelo comportamento,
parecendo erroneamente, conforme
Skinner (1989), que há um impulso
interior ao qual o exterior obedece.
Numa análise skinneriana um modelo
externalista é proposto para a
interpretaçãoda determinação do
comportamento. Embora numa ótica
behaviorista radical não se desconsidere
a existência de estados internos, estes
não são tidos como determinantes de
comportamentos. A referência a seguir
pode esclarecer:
“ A objeção aos estados
internos não é a de que eles não
existem, mas a de que não são
relevantes para uma análise funcional.
Não é possível dar conta do
comportamento de nenhum sistema
enquanto permanecemos inteiramente
dentro dele; finalmente será preciso
buscar forças que operam sobre o
organismo agindo de fora” (Skinner,
1989,p.45).
não possuem propriedades especiais
(Moore, 1995, em Cavalcante, 1997).
O trecho em seguida elucida tal
afirmativa:
Tal afirmação reitera o
afastamento do behaviorismo radical
em relação a uma visão internalista,
quanto à origem do comportamento,
voltando-se então a atenção para as
relações do organismo com eventos
externos a este.
Segundo Skinner (1974), os
eventos privados não são distintos dos
eventos públicos no tocante a sua
natureza, considerando-se que ambos
são dotados de dimensões físicas. No
entanto, quanto ao fator acessibilidade
tornam-se diferenciáveis. Os eventos
privados, enquanto comportamentos
não são internos ou externos, logo não
podem, segundo Tourinho (1997), ser
confundidos com estimulações
internas. Eventos privados são
inacessíveis à observação pública
direta, mas disso não resulta que
possuam qualquer status especial, à
parte de uma natureza física, ou seja,
“Uma pequena parte do universo está
contida dentro da pele de cada um de
nós. Não há nenhuma razão para que
ela tenha uma status físico especial em
virtude de se situar nestes limites (...)”
(Skinner, 1974, p.21).
Moore (2000) considera que
os eventos privados não produzem o
« sentir », afirmando que este ocorre
como produto de contingências. Desse
modo, Santos (2000) afirma que quando
o indivíduo encontra-se frente a uma
situação em que se apresenta um perigo
real, o medo é desencadeado como sendo
oriundo de uma reação de defesa, pois
o organismo pode estar sendo ameaçado
a sofrer prejuízos. Eventos privados,
sendo produtos de contingências, não
são causas de comportamento,
incluindo-se, portanto, o sentir medo.
Neste caso:
“O comportamento deve ser
considerado não enquanto resultado
de um sentimento, seja ele medo
seja insatisfação, mas enquanto
determinado pelas relações com
condições ambientais antecedentes
e conseqüentes, a partir de uma
história prévia de interação com
circunstâncias
semelhantes”
(Tourinho, 1995, p.177).
1
Trabalho em andamento, sendo realizado como parte da avaliação para a conclusão da disciplina « subjatividade e comportamento », no Curso de Mestrado
em Psicologia , UFPA.
* Bacharel em Psicologia, aluna do curso de Mestrado em Psicologia : Teoria e Pesquisa do Comportamento. Aluna do curso de formação em Psicologia da
Universidade da Amazônia.
"
Lato & Sensu, Belém, v-2, n.3, p. 14 - 15, jul, 2001
Uma situação hipotética
simples formulada a
seguir pode servir para
maiores esclarecimentos
posteriores quando se
falar em medo:
Uma criança de sete anos tem
em casa um gato de estimação.
Repentinamente a criança pisa no rabo
do felino e este imediatamente arranha
o pé da criança. Neste momento
algumas estimulações internas ocorrem
na criança, e concomitante a este fato
ela sai correndo procurando sua mãe.
Esta atende a criança e explica para ela
que estava com medo do gato.
Dias depois e a criança vai a
escola e no caminho encontra um gato.
Ela sai correndo para casa e sua mãe
pergunta se estava com “medo” e a
garota responde que sim.
O que se pretende com a
exposição do exemplo é estar
demonstrando a influência da
comunidade verbal, no que diz respeito
ao relato verbal do sujeito acerca de
suas condições subjetivas. Desse modo
o que para a criança do exemplo dado
anteriormente, eram condições
corporais indiferenciadas, passam a ser
diferentes quando a comunidade verbal,
representada por sua mãe, quando fala
que a menina está com medo naquele
momento. Assim, ainda que os eventos
privados sejam inacessíveis à
observação direta, tornam-se
importantes “enquanto processos
comportamentais
dotados
de
dimensões públicas” (Tourinho, 1997).
E acontecimentos publicamente
observáveis são as informações de que
a comunidade verbal dispõe para tentar
descrever o evento privado (Skinner,
1974).
Espera-se também, com o
exemplo,
pontuar
que
o
comportamento de esquiva deve ser
compreendido através da identificação
das contingências controladoras, não
podendo assim ter sua origem explicada
pelo medo (Sidman, 1995). O trecho
do exemplo em que a criança evita o
gato, saindo correndo para casa, expõe
que levara a criança a correr seria a
presença, partindo-se do fato que
contingências anteriores selecionaram
tal comportamento frente à estimulação
aversiva , e não pelo fato de que estaria
sentindo medo. Com isso admite-se que
se encontra na história ambiental, numa
ótica skinneriana, as variáveis que
controlam determinado comportamento.
Partindo-se disto tem-se que
na tentativa de livrar-se do gato a criança
correu, mas para impedir que fosse
arranhada novamente, evidenciando-se
então que o correr deu-se pela
probabilidade de ser consequenciada
com a eliminação da agressão do gato, e
não em virtude do « medo » que estaria
sentindo. Tal resposta (correr), numa
visão skinneriana pode ser analisada
como esquiva, tendo-se em vista a
evitação da estimulação aversiva (gato),
presente na situação hipotética em
questão.
Dentro dessa perspectiva, em
se tratando de behaviorismo radical,
torna-se importante referir-se ao papel
do ambiente – no que diz respeito a
sua relação com o organismo – pois
contrariamente a uma explicação
internalista para o comportamento,
concebe-se que as causas deste
encontram-se no ambiente externo.
Portanto, tendo-se em vista que numa
ótica skinneriana a investigação do
evento privado, seja ele medo ou outros
sentimentos, deve centrar-se na análise
das contingências ambientais, ele não
será concebido como causa de
comportamento.
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São Paulo/Santo André : ABPMC/
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Lato & Sensu, Belém, v-2, n.3, p. 14 - 15, jul, 2001.
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