PINHEIRONETO ADVOGADOS
www.pinheiro neto .com.br
R. Boa Vista, 254, 9º andar
São Paulo - SP
01014-907 Brasil
Tel. (55-11) 3247-8400
Fax (55-11) 3247-8600
[email protected]
Av.Nilo Peçanha, 11, 8º andar
Ed. Jockey Club - Rio de Janeiro - RJ
20020-100 Brasil
Tel. (55-21) 2506-1600
Fax (55-21) 2506-1660
SCS, Quadra 1, Bloco I, 6º andar
Ed. Central - Brasília - DF
70304-900 Brasil
Tel. (55-61) 312-9400
Fax (55-61) 312-9444
76, Shoe Lane
4th floor - London
EC4A 3JB England
Tel. (44) 207-583-5055
Fax. (44) 207-583-5037
COMPARAÇÃO DOS OBJETIVOS NEGOCIADORES
DOS ESTADOS UNIDOS SOBRE DEFESA COMERCIAL,
TAL COMO FORMULADOS NA SEÇÃO 2102, PARÁGRAFO
14, DO TRADE PROMOTION AUTHORITY, COM OS
COMPROMISSOS DE NEGOCIAÇÃO ASSUMIDOS NA
OMC E NA ALCA
PINHEIRO NETO ADVOGADOS*
ÍNDICE
I. - Introdução
II. -
Compromissos de negociação assumidos na ALCA
III. - Compromissos de negociação assumidos na OMC
IV. - O TPA e a defesa comercial nos Estados Unidos
V. - Os acordos internacionais perante a legislação e os tribunais norteamericanos
VI. - As decisões envolvendo leis norte-americanas de defesa comercial
proferidas no âmbito do mecanismo de solução de controvérsias da OMC e
sua futura implementação
VII. - Friends of Antidumping: interesses brasileiros na negociação na OMC a
respeito da defesa comercial
VIII.- As soluções aplicadas no NAFTA no que diz respeito à defesa comercial
IX. - Conclusões
*
HÉLIO NICOLETTI, MAURO BERENHOLC, MARIA CECÍLIA ANDRADE e GERALDO
V A L E N T I M N E T O , de PINHEIRO NETO ADVOGADOS .
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
I. -
-2-
INTRODUÇÃO
O escopo deste trabalho é realizar uma comparação dos objetivos negociadores dos
Estados Unidos (EUA) sobre defesa comercial1, tal como formulados na Seção
2102 (14) do Trade Promotion Authority (TPA), com os compromissos de
negociação assumidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) e na Área de
Livre Comércio das Américas (ALCA).
Para o Brasil, a negociação dos aspectos relacionados à defesa comercial no âmbito
da ALCA constitui tema de extremo interesse, pois poderá proporcionar um melhor
acesso dos produtos brasileiros a um mercado consumidor mais amplo, e permitirá o
estabelecimento de regras e princípios básicos mais transparentes para a aplicação
de legislação de defesa comercial pelos países integrantes do acordo,
conseqüentemente afastando a possibilidade de discricionariedade e protecionismo
na utilização de mencionada legislação, nomeadamente no caso dos EUA.
II. -
COMPROMISSOS DE NEGOCIAÇÃO ASSUMIDOS NA ALCA
Dentre os princípios estabelecidos para as negociações para a conformação da
ALCA na Declaração de São José de 19.3.19982, destacamos os seguintes: (i)
decisões por consenso; (ii) acordo da ALCA será congruente com as regras e
disciplinas da OMC, e deverá incorporar melhoras às regras e disciplinas da OMC,
quando possível e apropriado, tomando em conta todas as implicações de direitos e
obrigações dos países como membros da OMC; (iii) os direitos e obrigações da
ALCA deverão ser comuns a todos os países; (iv) todos os países devem assegurar
que suas leis, regulamentos e procedimentos administrativos estejam em
conformidade com as suas obrigações assumidas no acordo da ALCA.
Em relação à defesa comercial, foi instituído um Comitê de Negociação para
Subsídios, Antidumping e Direitos Compensatórios, que -- nos termos da
Declaração de São José -- tem como principais objetivos:
1
Sob este conceito entenda-se a legislação acerca de medidas antidumping, subsídios e medidas compensatórias e
salvaguardas.
2
Declaração Conjunta feita na Quarta Reunião de Ministros Responsáveis por Comércio, realizada em São José da Costa
Rica em 19.3.1998.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-3-
“To examine ways to deepen, if appropriate, existing disciplines provided in the
WTO Agreement on Subsidies and Countervailing Measures and enhance
compliance with the terms of the WTO Agreement on Subsidies and
Countervailing Measures.
To achieve a common understanding with a view to improving, where possible,
the rules and procedures regarding the operation and application of trade
remedy laws in order to not create unjustified barriers to trade in the
Hemisphere.” (grifos nossos)
O compromisso de coerência com os princípios da OMC foi reiterado na
Declaração de Toronto de 4.11.19993:
"We reaffirm our commitment to the global, rules-based, trading system under the
WTO, and our support for the launch of new, multilateral negotiations at the Third
Ministerial Conference of the WTO (...). While acknowledging that the FTAA and
WTO processes are related, we stress the distinct aim of the FTAA negotiations which is to create a Free Trade Area in a manner that is consistent with the
relevant WTO provisions.
Moreover, we are of the view that the agenda for the forthcoming WTO
negotiations should be balanced to respond to the interests of all economies. It
should also be sufficiently broad-based to allow for meaningful negotiations."
A Declaração de Buenos Aires4 revela alguns avanços. Confira-se:
"We instruct the Negotiating Group on Subsidies, Antidumping and
Countervailing Duties to intensify its work of identifying options for deepening,
where appropriate, existing disciplines on subsidies in the WTO Agreement on
Subsidies and Countervailing Measures, and to submit to the Trade Negotiations
Committee recommendations on methodologies for deepening disciplines on
subsidies by the deadline of April 1, 2002, for evaluation by the Trade
Negotiations Committee during its first meeting following that date.
We instruct the Negotiating Group on Subsidies, Antidumping and Countervailing
Duties to intensify its efforts to reach a common understanding with a view to
improving, where possible, the rules and procedures for the operation and
enforcement of trade remedy laws, so as not to create unjustified obstacles to
free trade within the Hemisphere, and to submit its recommendations on the
methodology to be used to achieve this objective by the deadline of April 1, 2002,
for evaluation by the Trade Negotiations Committee at its first meeting following
that date." (grifos nossos)
3
Declaração dos Ministros na Quinta Reunião Ministerial de Comércio, realizada em Toronto, Canadá em 4.11.1999.
Declaração Ministerial, Sexta Reunião dos Ministros de Comércio do Hemisfério, feita em Buenos Aires, Argentina em
7.4.2001.
4
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-4-
III. - COMPROMISSOS DE NEGOCIAÇÃO ASSUMIDOS NA OMC
(i)
Acordos em matéria de defesa comercial em vigor
Na OMC, a defesa comercial é objeto de três Acordos específicos: o primeiro,
referente ao Antidumping (Acordo sobre a Implementação do Artigo VI do GATT
19945); o segundo, que trata de Subsídios e Medidas Compensatórias; e finalmente,
o terceiro, que trata especificamente de Salvaguardas.
(ii)
Do Mandato Negociador de Doha
O tema da defesa comercial, que já havia sido debatido em Seattle sem qualquer
consenso em razão de interesses divergentes entre os países envolvidos, voltou a ser
discutido em Doha, e nos termos da Declaração Ministerial de 14.11.2001, as regras
hoje existentes referentes à defesa comercial também deverão ser objeto de
negociação, nos seguintes termos:
“(...)
28. In the light of experience and of the increasing application of these instruments
by members, we agree to negotiations aimed at clarifying and improving
disciplines under the Agreements on Implementation of Article VI of the
GATT 1994 and on Subsidies and Countervailing Measures, while preserving the
basic concepts, principles and effectiveness of these Agreements and their
instruments and objectives, and taking into account the needs of developing
and least-developed participants. In the initial phase of the negotiations,
participants will indicate the provisions, including disciplines on trade distorting
practices, that they seek to clarify and improve in the subsequent phase. In the
context of these negotiations, participants shall also aim to clarify and improve
WTO disciplines on fisheries subsidies, taking into account the importance of this
sector to developing countries. (…)” (grifos nossos)
IV. - O TPA E A DEFESA COMERCIAL NOS EUA
(i)
O TPA: principais diretrizes e objetivos
O TPA foi aprovado após intensas negociações com o Congresso norte-americano,
e o seu texto reflete os questionamentos e cautelas na delegação de competência ao
5
Acordo Antidumping.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-5-
Poder Executivo para negociar e celebrar acordos em nome dos EUA, ressaltando
de forma evidente os objetivos e princípios a serem observados.
São destacadas ainda preocupações do Congresso norte-americano (i) com as
recentes decisões (contrárias aos interesses norte-americanos) adotadas nos panels e
no Órgão de Apelação da OMC, que impuseram uma série de restrições ao uso de
medidas antidumping, compensatórias e de salvaguarda por parte dos paísesmembros, e (ii) com a adequada aplicação por parte dos citados panels e do Órgão
de Apelação da OMC do standard of review contido no Artigo 17.6 do Acordo
Antidumping, de modo a respeitar as decisões emitidas pelas autoridades de
determinado país-membro sempre que os fatos tenham sido estabelecidos com
propriedade e sua avaliação tenha sido imparcial e objetiva.
A Seção 2101 aponta a importância do comércio internacional para a segurança
norte-americana e reforço de sua posição de liderança no mundo.
A Seção 2102 enumera os principais objetivos dos EUA em suas negociações
comerciais, dentre os quais destacamos: (i) acesso aos mercados internacionais de
forma mais ampla, eqüitativa e recíproca; (ii) redução ou eliminação de barreiras e
outras distorções diretamente relacionadas ao comércio e que reduzam as
oportunidades de mercado para as exportações de produtos norte-americanos, ou
que de alguma forma distorçam o mercado doméstico; (iii) reforçar as regras e
procedimentos do sistema internacional de comércio (incluindo solução de
controvérsias); (iv) assegurar que as políticas ambientais e de comércio sejam
mutuamente compatíveis; (v) assegurar que as regras comerciais não reduzam as
proteções já existentes nas leis trabalhistas e ambientais norte-americanas; (vi)
assegurar acesso igualitário ao mercado internacional para as pequenas empresas.
(ii) Exame do TPA: procedimentos para as negociações em relação à
legislação de defesa comercial
Nos moldes em que foi aprovado, o TPA apresenta uma série de procedimentos que
devem ser seguidos pelo Poder Executivo dos EUA para a negociação e
implementação de acordos comerciais, sendo previsto um constante monitoramento
do Congresso norte-americano durante todas as fases da negociação.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-6-
No que se refere à defesa comercial, foram inseridos no TPA alguns dispositivos
especiais. Ressalte-se que o Presidente está dispensado de notificar6 e consultar
previamente o Congresso acerca das negociações7 que tenham sido iniciadas antes
da aprovação da TPA, mais especificamente na OMC, na ALCA e negociações
bilaterais com o Chile e Cingapura.
Não obstante, o Presidente deverá, o mais rápido possível após a entrada em vigor
do TPA:
(i)
notificar o Congresso sobre as negociações em curso no âmbito da OMC e da
ALCA, assim como com o Chile e Cingapura, indicando de forma específica os
objetivos norte-americanos em cada foro;
(ii) dar início ao procedimento de consultas com os Comitês mencionados na
seção 2104 (a)(2) e com o Congressional Oversight Group8.
Essas consultas, nos termos da Seção 2102 (d), deverão ser freqüentes, dando total
conhecimento ao Congressional Oversight Group e a todos os comitês da Câmara e
do Senado que tenham jurisdição sobre as leis que possam ser afetadas pelo acordo
comercial objeto das negociações.
No curso das negociações e antes da assinatura de um acordo, deverão ser mantidas
consultas regulares com os assessores parlamentares para políticas comerciais e
negociações, os Comitês de Ways and Means da Câmara e de Finanças do Senado,
bem como o Congressional Oversight Group.9
Após a conclusão das negociações, o Presidente deverá, pelo menos 180 dias antes da
celebração do acordo, apresentar relatórios aos Comitês de Ways and Means e de
Finanças sobre as propostas apresentadas e seus impactos na legislação de defesa
comercial norte-americana, e como essas propostas se adequam aos objetivos do TPA
6
Apesar de não se aplicar ao tema em discussão neste trabalho, vale destacar que nos termos da Seção 2103(A) do TPA,
antes de iniciar qualquer processo de negociações, o Presidente deverá notificar o Congresso Nacional.
7
V. Seção 2106 do TPA.
8
Nos termos da Seção 2107 do TPA, o Congressional Oversight Group será composto por membros dos Comitês de
Ways and Means e de Finanças, além dos presidentes e membros de cada Comitê do Senado e da Câmara, com jurisdição
sobre temas específicos afetados pela negociação, todos eles acreditados como assessores oficiais das delegações
negociadoras americanas.
9
V. Seção 2102 (d)(2)(A) do TPA.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-7-
estabelecidos na Seção 2102(b)(14)10. Esse relatório também deverá ser apresentado à
International Trade Commission, que em até 90 dias antes da assinatura do acordo,
deverá apresentar ao Presidente e ao Congresso um relatório avaliando o provável
impacto do acordo comercial sobre o produto nacional bruto, importações e
exportações, produção e competitividade das empresas que possam vir a ser afetadas,
além do interesse dos consumidores11.
Para que o acordo seja implementado, o Presidente, com antecedência de 90 dias da
sua assinatura, deverá notificar o Congresso acerca de sua intenção, e
imediatamente determinar a publicação de sua intenção no Federal Register12. Em
até 60 dias após a celebração do acordo, o Presidente deverá apresentar ao
Congresso uma descrição das modificações na legislação nacional que serão
necessárias para que o acordo possa ser implementado no país. Além disso, o
Presidente deverá apresentar perante o Congresso, o texto final do acordo celebrado,
projeto de lei, exposição de motivos que o levou à celebração do mesmo e medidas
administrativas necessárias para a sua implementação13.
Por último, vale ressaltar que o mandato concedido ao Poder Executivo poderá ficar
sem efeito, a pedido de qualquer uma das Casas do Congresso, mediante uma
resolução de desaprovação pelo descumprimento das obrigações de notificação e de
consultas ao Congresso.14
(iii) O TPA e os objetivos negociadores dos EUA em matéria de defesa
comercial
Os objetivos negociadores contidos no TPA, por sua vez, confrontam-se – na área
de defesa comercial – com aqueles assumidos na OMC e na ALCA, pois
restringem, aparentemente, o teor dos compromissos e parâmetros estabelecidos nas
Declarações Ministeriais de Doha e de Buenos Aires. Isto porque, o parágrafo 14,
da Seção 2102(14), do TPA, delimita a competência do Executivo [governo] norteamericano para negociar as chamadas trade remedy laws, nos seguintes termos:
10
V. Seção 2104 (3) (A) do TPA.
V. Seção 2104 (f) (1 e 2) do TPA
12
Diário Oficial.
13
V. Seção 2105 (a) do TPA.
14
V. Seção 2105 (b) do TPA.
11
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-8-
“SEC. 2102. TRADE NEGOTIATING OBJECTIVES
(14)
TRADE REMEDY LAWS - The principal negotiating objectives of the
United States with respect to trade remedy laws are:
(A)
to preserve the ability of the United States to enforce rigorously its trade
laws, including the antidumping, countervailing duty, and safeguard laws, and
avoid agreements that lessen the effectiveness of domestic and international
disciplines on unfair trade, especially dumping and subsidies, or that lessen the
effectiveness of domestic and international safeguard provisions, in order to ensure
that United States workers, agricultural producers, and firms can compete fully on
fair terms and enjoy the benefits of reciprocal trade concessions; and
(B)
to address and remedy market distortions that lead to dumping and
subsidization, including overcapacity, cartelization, and market-access barriers.”
(grifos nossos)
Essa aparente limitação dos compromissos de negociação assumidos na OMC e na
ALCA decorre da possibilidade, concedida através do TPA ao Poder Executivo dos
E.U.A., para:
(a)
executar (fazer valer) rigorosamente suas leis de defesa comercial,
inclusive as leis de antidumping, medidas compensatórias e de salvaguardas; e
(b)
evitar acordos que diminuam a efetividade ou de disciplinas domésticas
e internacionais sobre comércio injusto, especialmente de dumping e subsídios, ou
de dispositivos domésticos e internacionais sobre salvaguardas.
Pretende-se, portanto, através do TPA, garantir aos E.U.A. a possibilidade de
rejeitar acordos que limitem a efetividade e a aplicação “rigorosa” de suas leis de
defesa comercial (antidumping, medidas compensatórias e salvaguardas), o que
denota um caráter de forte proteção ao atual sistema de leis norte-americanas de
defesa comercial e limitador quanto aos poderes conferidos ao negociador norteamericano.
(iv)
Breves comentários acerca da legislação de defesa comercial nos EUA
A política comercial norte-americana, além de almejar uma maior abertura e acesso
aos mercados estrangeiros15, no que diz respeito à defesa de sua indústria doméstica
15
V Trade Policy Agenda and 2001 Annual Report of the President of the United States on the Trade Agreements
Program, pp.209/210, “the Super 301 has provided a mechanism for the USTR to review U.S. trade expansion priorities
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
-9-
e implementação da legislação de defesa comercial, revela-se bastante agressiva. De
acordo com as estatísticas disponibilizadas pela OMC16, no período entre 1.7.2000 a
30.6.2001, foram iniciadas pelos diversos países-membros 313 investigações de
dumping, sendo que 77 eram por parte dos EUA, o que corresponde a 24,6% do
total das investigações naquele período. Da mesma forma, no que diz respeito às
medidas antidumping em vigor no mesmo período, das 1105 notificadas, 22%
foram adotadas pelos EUA, 20% pela União Européia, 11% pela Índia, 10% pela
África do Sul, 8% pelo Canadá e 6 % pelo México.
Ademais, a aplicação da legislação de defesa comercial nos EUA tem características
fortemente protecionistas, que se manifestam, especialmente, através da
discricionariedade e da arbitrariedade de certas decisões proferidas por suas
autoridades administrativas; no entanto, diversas decisões norte-americanas têm
sido (crescentemente) objeto de questionamento perante os sistemas de solução de
controvérsias da OMC, e também do NAFTA.
V. - OS ACORDOS INTERNACIONAIS PERANTE A LEGISLAÇÃO E
OS TRIBUNAIS NORTE-AMERICANOS
Neste sentido, e como um importante parâmetro a ser utilizado na interpretação da
real conotação – limitante ou flexível – do poder concedido ao negociador norteamericano pelo TPA, entendemos cabível um exame de determinadas normas
internas e de decisões proferidas pelos Tribunais dos EUA a respeito do confronto
entre suas leis internas e internacionais.
and identify priority foreign country practices, the elimination of which is likely to have the most significant potential to
increase U.S. exports, either directly or through the establishment of a beneficial precedent (…) The 2001 Super 301
Report identified the following trade expansion priorities: (1) reestablishing a bipartisan consensus on free trade; and (2)
moving on multiple fronts to expand trade. The report did not identify any ‘priority foreign practices’ within the meaning
of the Executive Order. However, the report identified for careful monitoring a range of measures that limit U.S.
exporters’ ability to take advantage of enhanced market access obtained through trade agreements. Examples of such
measures include certain customs valuations practices, burdensome dealer protection laws, restrictive auto policies,
onerous technical regulations, lack of transparency in regulatory law-making, agricultural practices, subsidization
practices, telecommunications trade barriers, discriminatory trade and investment measures in the auto sector,
discriminatory retail policies, discriminatory policies affecting trade in electronic commerce, non-transparent
pharmaceutical princing policies, market access barriers in the flat glass sector, and market access barriers affecting the
textile sector in various trading partners”.
16
Ver WTO Annual Report 2001, p. 72.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 10 -
Os compromissos e acordos da OMC foram aprovados e incorporados à legislação
norte-americana – através do “Uruguay Round Agreements Act (“URAA”)” – com
algumas restrições, tais como a prevalência da legislação dos EUA em caso de
incompatibilidade com as normas da OMC e a não obrigatoriedade de
implementação das decisões (proferidas pelos “panels” ou pelo Órgão de Apelação)
da OMC quando contrárias às leis norte-americanas (que somente poderão ser
declaradas inválidas pelos EUA).
Tais restrições estão previstas na Seção 102 do URAA17, que versa sobre a relação
entre os acordos internacionais e as leis norte-americanas. Vejamos:
“SEC. 102. RELATIONSHIP OF THE AGREEMENTS TO UNITED STATES
LAW AND STATE LAW.
(a)
Relationship of Agreements to United States Law.
(1)
United States Law to prevail in conflict - No provision of any of the
Uruguay Round Agreements, nor the application of any such provision to any
person or circumstance, that is inconsistent with any law of the United States
shall have effect.
(…)
(b)
Relationship of Agreements to State Law. (…)
(2)
Legal Challenge.
(A)
In General. No State law, or the application of such a State law, may be
declared invalid as to any person or circumstance on the ground that the provision
or application is inconsistent with any of the Uruguay Round Agreements, except
in an action brought by the United States for the purpose of declaring such law or
application invalid.
(B)
Procedures Governing Action. In any action described in subparagraph
(A) that is brought by the United States against a State or any subdivision thereof
(i)
a report of a dispute settlement panel or the Appellate Body convened
under the Dispute Settlement Understanding regarding the State law, or the law of
any political subdivision thereof, shall not be considered as binding or otherwise
accorded deference; (…)” (grifos nossos)
17
Incorporada ao United States Code (título 19, capítulo 22, seção 3512), que consiste em uma consolidação e
codificação das leis norte-americanas.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 11 -
Dessa forma, resta claro, com base na legislação que internalizou os Acordos da
Rodada do Uruguai, que nenhuma norma ou decisão da OMC (ou de outros acordos
internacionais) será de aplicação obrigatória nos EUA ou mesmo prevalecerá sobre
lei interna norte-americana.18
Ao analisar os acordos da OMC em face da legislação norte-americana, Stephen
Orava e Daniel Crosby concluíram o seguinte19:
“Thus, international legal obligations created under the auspices of the WTO,
whether specific commitments under the agreements or dispute settlement findings,
cannot override or amend U.S. law. This approach is expressly set out in the U.S.
Statement of Administrative Action (“SAA”) that accompanied the URAA:
‘The WTO will have no power to change U.S. law. If there is a conflict between
U.S. law and any of the Uruguay Round agreements, section 102(a) of the
implementing bill makes clear that U.S. law will take precedence:
“No provision of any of the Uruguay Round Agreements, nor the application of any
such provision to any person or circumstance, that is inconsistent with any law of
the United States shall have effect.”
Moreover, as explained in greater detail in this Statement in connection with the
Dispute Settlement Understanding, WTO dispute settlement panels will not have
any power to change U.S. law or order such a change. Only Congress and the
Administration can decide whether to implement a WTO panel recommendation
and, if so, how to implement it.” (grifos nossos)
Além disso, e apesar da Suprema Corte dos EUA ter assumido posição no sentido
de que “if the United States is to be able to gain the benefits of international
accords and have a role as a trusted partner in multilateral endeavors, its courts
should be most cautious before interpreting its domestic legislation in such a
manner as to violate international agreements”20, o Tribunal Federal de Recursos
(“U.S. Court of Appeals for the Federal Circuit”), ao dispor sobre o GATT de 1947,
decidiu nos seguintes termos:
18
A título comparativo, enquanto no sistema legal brasileiro, quaisquer tratados ou acordos internacionais, desde que
obedecidos os procedimentos de assinatura, aprovação pelo Congresso Nacional (CF, art. 49, inciso I), ratificação pelo
Executivo, e promulgação por Decreto Presidencial, equiparam-se à lei ordinária, no mesmo nível hierárquico (a
prevalência entre ambos dá-se em função da superveniência no tempo), no sistema legal norte-americano, no tocante à
matéria de defesa comercial, os tratados e acordos internacionais são considerados hierarquicamente inferiores às leis
internas.
19
In “A WTO Guide For Global Business”, Editora Cameron May, 2002 (págs. 349 e 350).
20
In Vimar Seguros y Reaseguros, S.A. v. M/V Sky Reefer (1995).
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 12 -
“Even if we were convinced that [U.S. Department of] Commerce’s interpretation
conflicts with the GATT, which we are not, the GATT is not controlling. While we
acknowledge Congress’s interest in complying with U.S. responsibilities under the
GATT, we are bound not by what we think Congress should or perhaps wanted to
do, but by what Congress in fact did. The GATT does not trump domestic
legislation; if the statutory provisions at issue here are inconsistent with the
GATT, it is a matter for Congress and not this court to decide and
remedy.”21(grifos nossos)
Assim, ao analisarem a questão do conflito entre as normas do direito interno norteamericano e as obrigações contidas nos acordos da OMC à luz das supra
mencionadas decisões proferidas pelos tribunais superiores dos EUA, os mesmos
autores Stephen Orava e Daniel Crosby concluíram o seguinte22:
“Thus, if a U.S. court were to determine that a U.S. statute conflicts with WTO
obligations, it will only give effect to the statute, and will defer to Congress to
address any inconsistency with U.S. obligations under the WTO.” (grifos nossos)
Portanto, com base na legislação, doutrina e jurisprudência acima elencadas, parecenos que em caso de conflito de quaisquer leis norte-americanas com o disposto nos
acordos da OMC  e em momento futuro provavelmente também com as
normas acordadas no âmbito da ALCA , deverá prevalecer o teor contido nas
leis norte-americanas; o próprio Poder Judiciário dos EUA aponta ser da
competência do Congresso  e não dos Tribunais  a decisão e solução a respeito
de qualquer incompatibilidade existente entre as leis norte-americanas e tratados
internacionais firmados pelos EUA.
VI. - AS DECISÕES ENVOLVENDO LEIS NORTE-AMERICANAS DE
DEFESA COMERCIAL PROFERIDAS NO ÂMBITO DO MECANISMO
DE SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS DA OMC E SUA FUTURA
IMPLEMENTAÇÃO
A OMC recentemente pronunciou-se de forma contrária à determinadas leis dos
EUA em matéria de defesa comercial, a exemplo das discussões envolvendo a
Emenda Byrd e a Lei Antidumping de 1916.
21
22
In Suramericana de Aleaciones Laminadas, C.A. v. United States (1992).
In “A WTO Guide For Global Business”, Editora Cameron May, 2002 (pág. 351).
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 13 -
No caso da Emenda Byrd -- também conhecida como “Continued Dumping and
Subsidy Offset Act of 2000”, e que possibilita ao governo norte-americano
distribuir, aos produtores domésticos afetados, os valores arrecadados com a
imposição de medidas antidumping ou compensatórias--, foi divulgado, em
16.9.2002, o relatório do “panel”23 estabelecido a pedido dos países reclamantes
(tais como Canadá, México, Brasil e Comunidade Européia). A decisão proferida
pelo “panel” foi contrária aos EUA, determinando que referida emenda é
inconsistente, dentre outros, com determinados artigos dos Acordos Antidumping
e sobre Subsídios e Medidas Compensatórias, e recomendando ao Órgão de
Solução de Controvérsias (OSC) da OMC que requeresse aos EUA a adequação da
Emenda Byrd às obrigações previstas em tais acordos, inclusive através da sua
revogação.
Com relação à Lei Antidumping de 1916 -- que permite, sob determinadas
condições, a propositura de ação cível e criminal perante os tribunais norteamericanos contra importadores que tenham vendido nos EUA determinados
produtos estrangeiros a preços que caracterizem a prática de dumping --, o Órgão de
Apelação da OMC atendeu às reclamações européia24 e japonesa25, e concluiu que
referida lei é inconsistente, dentre outras coisas, com o artigo VI do GATT 1994 e
determinados artigos do Acordo Antidumping, recomendando ao OSC que
requeresse aos EUA a adequação de referida lei às obrigações previstas em tais
normas.
Dessa forma, e apesar do relatório do “panel” – referente ao julgamento da Emenda
Byrd – ainda não ser definitivo, as decisões proferidas no âmbito do mecanismo de
solução de controvérsias da OMC determinaram a inconsistência existente entre
determinadas leis norte-americanas de defesa comercial26 e os acordos da OMC; por
conseguinte, a não implementação das recomendações feitas pelo OSC em um
futuro próximo demonstrará uma postura protecionista e inflexível por parte dos
EUA, o que de algum modo deverá refletir-se na atuação e comprometimento de
seus negociadores nas negociações da ALCA e da OMC.
23
WT/DS 217 e WT/DS 234.
WT/DS 136.
25
WT/DS 162.
26
Emenda Byrd e Lei Antidumping de 1916.
24
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 14 -
VII. - FRIENDS OF ANTIDUMPING: INTERESSES BRASILEIROS NA
NEGOCIAÇÃO NA OMC A RESPEITO DA DEFESA COMERCIAL
Os interesses brasileiros estão claramente delineados nos documentos apresentados
perante o Negotiating Group on Rule27, e consistem, resumidamente, no seguinte:
(i)
critérios mais apropriados para a definição do “produto sob investigação” e
de “produto similar”, de forma a limitar arbitrariedades das autoridades nacionais;
(ii)
definição mais clara do termo “indústria doméstica”;
(iii) elevar o percentual mínimo de apoio da indústria doméstica para início das
investigações (standing rules);
(iv) maior clareza nas regras para início das investigações (alteração do artigo
5.3. do Acordo Antidumping que estabelece que “the authorities shall examine the
accuracy and adequacy of the evidence before initiating the investigation”);
(v)
maior precisão e clareza no que diz respeito às regras para determinação do
valor normal em transações entre empresas coligadas;
(vi)
maior clareza na avaliação dos fatores para a determinação do dano;
(vii) maior clareza no que diz respeito aos conceitos, metodologias,
procedimentos aplicáveis para revisões com base no artigo 9.3 (antidumping duty
assessment), artigo 9.5 (new shipper reviews), artigo 11.2 (revocation reviews) e
artigo 11.3 (sunset reviews); e
(viii) definição de uma metodologia mais clara para construção do preço de
exportação, conforme delineado no artigo 2.3 do Acordo Antidumping, e que
permita a comparação entre preços de forma justa.
27
V. TN/RL/W/6, de 26.4.2002, apresentado pela Missão Permanente do Brasil junto à OMC e TN/RL/W/10, de
28.6.2002, Second Contribution to Discussion of the Negotiating Group on Rules on Anti-dumping Measures,
apresentado pelo grupo denominado “Friends of Antidumping”, integrado pelos seguintes países: Brasil, Chile,
Colômbia, Costa Rica, Hong Kong, China, Israel, Japão, Coréia, Noruega, Taiwan, Penghu, Kinmen e Matsu, Cingapura,
Suíça e Tailândia.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 15 -
Estas propostas, apoiadas pelo Brasil, visam ao aperfeiçoamento do sistema, de
maneira a evitar a utilização abusiva e/ou distorcida da legislação de defesa
comercial. O teor do referido documento indica que, mais do que princípios, as
autoridades brasileiras desejam que as discussões sejam ampliadas, com o
estabelecimento de conceitos claros e critérios bem definidos para a aplicação das
regras do Acordo Antidumping, que têm sido utilizadas muitas vezes de maneira
arbitrária e discriminatória – principalmente pelos países mais desenvolvidos – na
aplicação de direitos antidumping.
VIII. - AS SOLUÇÕES APLICADAS NO NAFTA NO QUE DIZ RESPEITO
À DEFESA COMERCIAL
O NAFTA adotou como solução com relação à defesa comercial a aplicação das
legislações nacionais, com recurso a um painel binacional como instância
revisora28, tendo sido criado um mecanismo específico de solução de controvérsias
em matéria de dumping e direitos compensatórios em seu Capítulo XIX, que tem as
seguintes premissas:
(i)
todas as partes do NAFTA têm o direito de aplicar a sua legislação
antidumping e de direitos compensatórios29 em relação aos bens importados do
território de quaisquer das partes;
(ii) todas as partes têm o direito de alterar a sua legislação nacional, desde que
haja notificação prévia a outra parte e que a alteração não atinja diretamente os bens
importados de quaisquer das partes, e ainda que a proposta de alteração esteja em
conformidade com a legislação da OMC e com os objetivos do NAFTA.
Nos termos do artigo 1904(2), a revisão do painel binacional será feita de modo a
determinar apenas se a decisão que impôs o direito antidumping ou compensatório
estava de acordo com a respectiva legislação do país importador, tendo como base
“the relevant statutes, legislative history, regulations, administrative practice and
judicial precedents to the extent that a court of the importing Party would rely on
28
Em substituição à revisão judicial, nos termos do artigo 1904(1) do NAFTA.
O artigo 1902 (1) do NAFTA ressalta que “antidumping law and countervailing duty law include, as appropriate for
each Party, relevant statutes, legislative history, regulations, administrative practice and judicial precedents”.
29
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 16 -
such materials in reviewing a final determination of the competent investigating
authority”30.
Portanto, o modelo adotado pelo NAFTA reforça às partes a possibilidade de
aplicação de suas leis internas de defesa comercial (antidumping e medidas
compensatórias), e a revisão do painel binacional estará limitada a determinar se as
medidas impostas estavam (ou não) de acordo com a legislação de antidumping ou
de medidas compensatórias do país importador. Caso este modelo sirva de
parâmetro para a ALCA, e tendo em vista o teor da legislação interna (conforme
previsto na Seção 102 do URAA) e da decisão proferida pelo Poder Judiciário
norte-americano com relação à aplicação das normas do GATT 1947, parece-nos
que, em princípio, existiria o risco para o Brasil de que tal sistema
permitisse/legitimasse a continuidade da política protecionista dos EUA em matéria
de defesa comercial.
Por outro lado, cabe mencionar que, de um total de 32 casos já encerrados no
âmbito do mecanismo de solução de controvérsias previsto no Capítulo XIX do
NAFTA31, em que houve revisão, por um painel binacional, de determinações (de
direitos antidumping ou de medidas compensatórias) administrativas dos EUA, em
4 casos foram revertidas as decisões das autoridades norte-americanas; outros 5
casos tiveram reversão/confirmação parcial da determinação, 3 casos tiveram
confirmada a determinação e 20 casos foram extintos em razão de acordo ou
renúncia. Embora coubesse um exame mais detalhado a respeito do teor dessas
revisões, os números acima podem indicar32 (em sentido contrário àquele apontado
no parágrafo anterior) um alento quanto à possibilidade -- a partir da adoção na
ALCA do modelo hoje utilizado pelo NAFTA -- de se reverter eventual decisão
impositiva de direitos antidumping ou de medidas compensatórias por parte dos
órgãos da administração norte-americana.
Cabe também destacar como fator especial nesse acordo (NAFTA) a possibilidade
concedida aos particulares para pleitearem diretamente a instalação de um painel, o
que permite uma melhor defesa de seus interesses no âmbito do referido acordo
regional. Entretanto, essa alternativa, aparentemente interessante, poderá revelar-se
30
Grifos nossos.
Informações obtidas no site www.nafta-sec-alena.org.
32
12,5% dos casos revistos foram revertidos, ou 28,1% se contados também os casos em que houve reversão parcial da
determinação impositiva de direitos antidumping ou de medidas compensatórias.
31
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 17 -
contrária aos interesses do governo brasileiro. Isso porque, ao permitir aos
particulares que utilizem tal mecanismo diretamente, poderia desencadear uma
utilização abusiva  principalmente por parte de poderosas empresas e grupos
econômicos sediados nos países desenvolvidos  e de modo a (i) gerar desgaste
nas relações entre os governos dos países envolvidos, ou ainda (ii) acentuar o
desequilíbrio de forças hoje existente entre países com diferentes níveis de
desenvolvimento econômico.
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 18 -
IX. - CONCLUSÕES
PROPOSTAS NOS DIVERSOS FOROS DE NEGOCIAÇÃO
DATA
ALCA
OMC
TPA
7.4.2001
14.11.2001
6.8.2002
intensificar os esforços para esclarecer e melhorar as i) preservar a capacidade de
alcançar um entendimento disciplinas
previstas
quando possível, as regras e preservando,
ao
de
a
defesa
mesmo comercial;
procedimentos relativos à tempo, os conceitos básicos,
operação e aplicação de leis princípios e a eficácia destes
antidumping, de forma a não acordos, seus instrumentos e
obstáculos objetivos.
criar
rigorosamente
Antidumping, legislação
comum a fim de melhorar, Acordo
DUMPING
no aplicar
ii)
que
venham a enfraquecer a
eficácia
das
doméstica
injustificados ao comércio
acordos
evitar
legislações
e internacional
relacionadas com o comércio
do Hemisfério.
desleal,
especialmente
dumping e subsídios.
i) intensificar o trabalho de esclarecer e melhorar as i) preservar a capacidade
identificação de opções para disciplinas
SUBSÍDIOS E MEDIDAS
COMPENSATÓRIAS
o aprofundamento, se for o Acordo
caso,
disciplinas Medidas
das
relativas
aos
previstas
de
Subsídios
no de aplicar rigorosamente a
e legislação
e
subsídios preservando,
ao
mesmo
Medidas princípios e a eficácia destes
Compensatórias da OMC;
ii) apresentação ao Comitê
defesa
Compensatórias, comercial;
existentes no Acordo de tempo, os conceitos básicos,
Subsídios
de
acordos, seus instrumentos e
seus objetivos.
ii)
evitar
acordos
que
venham a enfraquecer a
eficácia
das
legislações
doméstica e internacional
relacionadas
com
o
de Negociações Comerciais
comércio
de
especialmente dumping e
recomendações
metodologias
aprofundar
para
as
sobre subsídios.
JUR_SP 134961v1 15.175352
sobre
disciplinas
subsídios.
desleal,
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 19 -
Não consta do mandato Não consta do mandato i) preservar a capacidade
negociador
SALVAGUARDAS
Aires.
de
Buenos negociador de Doha.
de aplicar rigorosamente a
legislação
de
defesa
comercial;
ii)
evitar
medidas
que
enfraqueçam a eficácia da
legislação
doméstica
e
internacional de medidas de
salvaguarda.
Do exposto, e a partir do exame do quadro comparativo acima, verifica-se que a
amplitude das discussões foi sendo reduzida no decorrer do tempo, sendo o mandato
negociador de Buenos Aires (ALCA) mais amplo que o mandato de Doha (OMC).
Enquanto o mandato negociador para a ALCA busca alcançar um entendimento
comum a fim de “incrementar”, quando possível, as regras e procedimentos
relativos à operação e aplicação dos “trade remedy laws”, de maneira a “não criar
obstáculos injustificados ao livre comércio no Hemisfério”, no mandato de Doha
(OMC) são mencionadas apenas diretrizes gerais quanto à matéria, no sentido de
uma maior “clareza e incremento” das disciplinas existentes nos Acordos sobre a
Implementação do artigo VI do GATT 199433 e sobre Subsídios e Medidas
Compensatórias, sempre “preservando” os conceitos básicos, princípios e
efetividade de tais acordos, bem como de seus instrumentos e objetivos.
O TPA, como visto, apresenta um complexo processo de consultas e notificações ao
Congresso norte-americano, além de uma linguagem dúbia porém restritiva quanto
à capacidade do negociador norte-americano. Isto porque, ao mesmo tempo em que
garante aos EUA a execução “rigorosa”34 de suas leis de defesa comercial -redação de cunho protecionista --, permite também evitar acordos que diminuam a
efetividade (i) de disciplinas domésticas e internacionais sobre comércio injusto,
especialmente de dumping e subsídios, ou (ii) de dispositivos domésticos e
internacionais sobre salvaguardas35, demonstrando um certo alento no tocante à
flexibilidade do negociador norte-americano de ao menos considerar a assunção de
33
Acordo Antidumping.
Nos termos da seção 2102, parágrafo 14, do TPA: “...to enforce rigorously its trade laws...”
35
Nos termos da seção 2102, parágrafo 14, do TPA.
34
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 20 -
compromissos que estejam em consonância com disciplinas internacionais já
acordadas pelos EUA.
O Brasil, conforme demonstrado nos documentos de trabalho apresentados perante a
OMC, busca obstar ou minimizar a forma discricionária e arbitrária com que os
países mais desenvolvidos, a exemplo dos EUA, vêm utilizando a legislação de
defesa comercial. Os interesses brasileiros neste tema são mais amplos e ultrapassam
o mandato negociador de Doha, o que deverá gerar dificuldades durante as
negociações não apenas naquele fórum mas também no âmbito da ALCA. Ressalte-se
que, apesar dos EUA ainda não terem apresentado a sua manifestação sobre o tema,
já se declararam contrários a qualquer aprofundamento na OMC que ultrapasse o
mandato de Doha. Além disso, essa discussão deverá esbarrar em dois fortes óbices:
(i) o TPA ; e (ii) a desigualdade econômica e política hoje existente entre os diversos
países que deverão integrar a ALCA. De qualquer forma, durante as negociações, os
EUA não poderão evitar que lhes seja cobrado o cumprimento dos objetivos
estabelecidos na Seção 2012 do TPA, especialmente no que diz respeito à
reciprocidade no acesso aos mercados internacionais.
O que nos parece mais provável é que os EUA limitar-se-ão apenas às propostas
que serão apresentadas no âmbito da OMC. Ao Brasil, talvez seja conveniente
aguardar as primeiras propostas apresentadas naquele foro de negociação, para
então avaliar como as mesmas serão conduzidas no âmbito das Américas.
Vale ainda ressaltar que o teor de sua legislação interna (conforme previsto na
Seção 102 do URAA), bem como da decisão proferida pelo Poder Judiciário norteamericano com relação à aplicação das normas do GATT 1947, reforça o
entendimento de que o TPA concedido ao Executivo norte-americano possui caráter
protecionista, sendo mais restritivo que os compromissos de negociação assumidos
nas Declarações Ministeriais de Doha (OMC) e de Buenos Aires (ALCA).
Duas conseqüências se inferem do fato de o sistema legal norte-americano não
permitir a aplicação de tratado internacional cujas regras sejam menos rígidas que
as leis internas daquele país. A primeira é que, em sendo menos rígido para os EUA
o resultado do acordo negociado, sua aplicação interna não será possível, por
princípio de ordem pública. Por outro lado, é compreensível que a autoridade norteamericana à frente do processo de negociação sinta-se mais cerceada, preocupada
JUR_SP 134961v1 15.175352
PINHEIRONETOADVOGADOS
- 21 -
em preservar a imagem do país e não permitir avanços em discussões sobre
questões que sabe adrede de impossível aplicação interna.
Parece-nos, ainda, que o acompanhamento das possíveis implementações, ou não,
das recomendações já feitas ou ainda por fazer da parte do OSC da OMC aos EUA
com relação às suas leis internas em matéria de defesa comercial -- com base nas
decisões acima citadas36 --, servirá como um importante indicador a respeito do
nível de protecionismo e comprometimento norte-americano, inclusive no tocante
às reais limitações ou flexibilidades conferidas através do TPA ao Poder Executivo
dos EUA para as atuais negociações em matéria de defesa comercial no âmbito da
ALCA e da OMC.
OBS: Segue anexo ao presente relatório o texto elaborado pelo escritório Felsberg e
Associados.
36
Em especial das decisões relativas à Emenda Byrd e à Lei Antidumping de 1916.
JUR_SP 134961v1 15.175352
Download

ALCA - Comparação de objetivos negociadores