CONSELHO FEDERAL DE BIOLOGIA - CFBio
Atuação do Biólogo na Aquicultura
Wagner Cotroni Valenti*
Aquicultura é a reprodução, desenvolvimento, manutenção e produção
de organismos com hábitat predominantemente aquático em qualquer um de
seus estágios de desenvolvimento, ou seja, ovos, larvas, esporos, sementes,
juvenis e adultos. Utiliza recursos naturais, tais como terra, água, energia,
organismos vivos que integram a fauna e a flora visível e de microorganismos.
As espécies cultivadas são algas, plantas aquáticas, peixes, anfíbios (rãs),
tartarugas, jacarés e vários invertebrados como mexilhões, ostras, camarões,
siris, caranguejos, holotúrias, ouriços, entre outros. Uma característica
essencial é que as espécies usadas na aquicultura ainda não estão
domesticadas e pouco se sabe sobre suas necessidades e características em
qualquer um dos níveis de organização considerado, desde o molecular até o
populacional. Então, conhecimentos da biologia básica dessas espécies e das
características ecológicas de seus ambientes naturais são essenciais. Essas
matérias fazem parte do conteúdo de várias disciplinas do curso de Ciências
Biológicas, como Invertebrados I e II, Vertebrados, Fanerógamas,
Criptógamas, Microbiologia e Ecologia.
Além dos grupos de organismos acima citados, muitos outros
invertebrados são cultivados com o objetivo de alimentar larvas e juvenis de
espécies aquícolas carnívoras (tais como, rotíferos, nematódeos,
microcrustáceos) e de formas jovens herbívoras, que se alimentam de algas
(tais como clorofíceas e diatomáceas). Portanto, conhecimentos de biologia
ligados ao estudo dos Invertebrados, Plantas Inferiores e Ecologia são
fundamentais; esses conhecimentos estão contidos nas disciplinas de
Invertebrados I e II e Sistemática e Morfologia de Criptógamas.
Os sistemas de aquicultura (as estruturas) dividem-se basicamente em
viveiros escavados; tanques de alvenaria/fibra; e gaiolas flutuantes
(tanques-rede) colocadas em represas ou em ambientes naturais de água
doce, salobra (estuários) ou marinha, inclusive em mar aberto; cercados
instalados dentro de corpos de água naturais/represas; long-lines ou
bandejas para a produção de moluscos, que são instalados diretamente em
baias e outras regiões costeiras.
Os viveiros escavados, sejameles de água doce, salobra ou marinha,
representam ecossistemas em fase inicial de sucessão ecológica e contem
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uma comunidade diversificada de organismos das comunidades bentônica,
planctônica, e eventualmente nectônica, além dos organismos do neuston e
pleuston. Ocorrem no seu interior os processos de fotossíntese, respiração,
nitrificação, um fluxo de energia e a ciclagem de nutrientes minerais. O manejo
correto dessas comunidades é essencial para o sucesso dessas criações ou
cultivos. Evidentemente que os conhecimentos ministrados nas disciplinas
Ecossistemas, Ecologia de Populações e Ecologia de Comunidades são
essenciais para o correto manejo dos viveiros.
Os tanques contêm uma grande diversidade de bactérias e protozoários
e frequentemente são usados para manter larvas náuplius ezoéasque são
alimentadas com algas.Muitas vezes, os tanques são acoplados a biofiltros,
que funcionam com populações de bactérias nitrificantes. Estas fazem o
processo de nitrificação para manter os níveis de compostos nitrogenados
combatíveis com a espécie que está sendo cultivada. Evidentemente, que
conhecimentos de bacteriologia, protistas e de invertebrados são essenciais
para planejar e operar adequadamente esses sistemas.
As outras estruturas usadas na produção de organismos aquáticos são
instaladas diretamente em ambientes naturais (ou ligeiramente modificados) e
são totalmente dependentes desses ambientes para o funcionamento
adequado. Portanto, é necessário avaliar a capacidade de carga que esses
ambientes podem suportar, estimar os serviços ambientais necessários para
manter os cultivos compatíveis com as necessidades das espécies alvo,
conhecer as características de cada espécie que se pretende cultivar para
avaliar se são compatíveis com o local, etc.Tudo isso requer sólidos
conhecimentos de biologia básica e aplicada.
A partir de 2007, a FAO (organização para a agricultura e alimentação
da ONU) passou a defender a proposta de que a aquicultura deve ser
praticada com uma abordagem ecossistêmica. Estruturas e sistemas de
produção devem ser planejados e manejados como ecossistemas de modo a
elevar sua capacidade de produção, com baixo impacto ambiental.Isso viria a
reduzir a liberação de subprodutos impactantes do meio e os riscos ambientais
decorrentes da atividade. A aquicultura depende fundamentalmente dos
ecossistemas nos quais está inserida. É impossível produzir sem provocar
alterações ambientais. No entanto, pode-se (e deve-se) buscar reduzir o
impacto sobre o meio ambiente a um mínimo indispensável, de modo que não
haja redução da biodiversidade, esgotamento ou comprometimento negativo
de qualquer recurso natural e alterações significativas na estrutura e
funcionamento dos ecossistemas. Isto é uma parte do processo produtivo. Não
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se pode desenvolver tecnologia visando aumentar a produtividade sem avaliar
os impactos ambientais produzidos.
Fica evidente, pelo exposto acima, que o biólogo tem um perfil adequado
para atuar na aquicultura. Sua formação é ampla, o que permite um
entendimento global dessa atividade multidisciplinar. O biólogo certamente tem
um papel fundamental no processo de desenvolvimento da aquicultura,
contribuindo e atuando na atividade para a produção de alimentos de alta
qualidade e geração de renda com baixos custos ambientais, de forma
sustentável e perene.
A produção de organismos aquáticos é um processo amplo, que
envolve um conjunto de elementos que se interrelacionam em cadeia. Esses
elementos permeiam aspectos econômicos, sociais e biológicos. Portanto, a
aquicultura é uma atividade multidisciplinar que deve contar com atuação de
vários profissionais, com diferentes formações. Devido, ao fato de lidar com
organismos da fauna e flora que ainda não são domesticados, os
conhecimentos de biologia básica são essenciais. Por isso, cerca de 50% ou
mais dos profissionais que atuam nessa área no Brasil são biólogos. No
exterior, esse percentual é ainda maior. São profissionais renomados, que
estão inseridos no mercado de trabalho há décadas prestando serviços
importantes para a sociedade. Portanto, não há nenhuma justificativa para
elaboração de qualquer matéria legislativa que venha a limitar ou impedir aos
profissionais formados em biologia de atuarem na aquicultura.
*Conselheiro do CRBio-01 (SP,MT, MS), Professor da Universidade Estadual Paulista,
Fellow of World Aquaculture Society
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