76 Guilherme Gomes Ferreira prontas, como aquelas engendradas de sua própria ação”. Isso significa entender que gênero e sexualidade, assim como raça/etnia, classe social, geração e outros determinantes que os sujeitos experimentam são condições concretas, e de forma objetiva refletem no modo como os sujeitos atuam em sociedade; influenciam, portanto, na vida cotidiana – o “ser social que determina sua consciência” (MARX, 2008, p. 47). Além disso, a identificação desses sujeitos em relação a essas categorias diferenciadoras é fundamental para compor seus processos identitários, o que pode ser fragmentado pela negação realizada pelos próprios sujeitos sobre seus pertencimentos de classe, raça, território, etc.: essa alienação se dá, ao mesmo tempo, por um processo de introjeção da subalternidade e da desvalorização que sofrem essas categorias no social; e pela reprodução do instituído, qual seja, a valorização das categorias dominantes, reforçando estereótipos que se pretenderia combater. Não é possível teorizar sobre gênero e sexualidade sem voltar à história, entendo-os como processo histórico e não por meio de etapas, como já dito. Além disso, nem todas as críticas feitas ao marxismo em relação às análises de gênero e sexualidade correspondem à realidade. Há, por exemplo, um mito bastante problemático da ausência da análise sobre subjetividade em Marx, cuja principal intenção é demonstrar que a teoria marxiana não se preocupa com o cultural, ou que nega sua importância. Esse mito afirma que, ao não considerar pertinentes as questões culturais e da subjetividade, o marxismo disputa com os chamados novos movimentos sociais o conceito de identidade: de um lado a defesa de uma identidade unificada na questão classista, de outro, os novos movimentos da esquerda política, como os da política sexual e de gênero, a defesa de uma análise pós-estruturalista e de uma identidade fragmentada e particularista (BUTLER, 2000). O que essa premissa deixa de considerar é que a teoria marxiana também considera a importância da cultura, do contrário, não seria possível pensar o conceito de totalidade social (tendo em vista que a realidade não é dicotômica nem fragmentada), tampouco o conceito de reprodução capitalista, na medida em que essa reprodução depende da criação de uma cultura dominante; os aspectos culturais são analisados, portanto, para a conformação da riqueza simbólica humana, mas também como elemento de dominação/alienação/aculturação/criação de necessidades. Além disso, Silveira (2002, p. 105) lembra que “o acesso às formulações de Marx permite a percepção de como a individualização do homem e sua personalidade constituem-se na concretude da vida social, no interior de um determinado processo histórico que interpela e marca o sujeito”. É, portanto, na relação