ISSN 0102-3209
Educação Brasileira
„ Revista do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras
[email protected]
Volume
29
Números
58 e 59
Janeiro/Dezembro 2007
Índices: Sumários Correntes (IBICT)
Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras - CRUB
SEPN Quadra 516, Conjunto D
70770-524 - Brasília - DF - Brasil
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Fax: (0**61) 3274-4621
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Educ. bras. Brasília
v. 29
nº s . 58 e 59 jan./dez. 2007
156 p.
EDUCAÇÃO BRASILEIRA, v. 1-, n. 1-, 1978, Brasília, CRUB.
Semestral
1. Educação Superior - Periódicos. I. Conselho de Reitores das
Universidades Brasileiras.
CDU 37(05)
CDD 370.5
Nota: Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores.
DIAGRAMAÇÃO
Wagner Freitas Souza
CAPA
Edson Fogaça
DISTRIBUIÇÃO E DIVULGAÇÃO
Maria Franklin de Andrade
Tiragem média: 1.000 exemplares
Sumário
Editorial ............................................................................ 7-9
TEMA
EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA:
NOVOS OLHARES
MEMORIAL
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
Suely Vilela ........................................................................................... 15-28
ARTIGOS
INOVAÇÃO / RENOVAÇÃO
Conhecimento, inovação e o novo papel das universidades
Jorge Luís Nicolas Audy ..................................................................... 31-34
GESTÃO ESCOLAR
Gestão acolhedora: estabelecendo vínculos com a
comunidade acadêmica
Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tamara Polenz e
Tania Scuro Mendes ............................................................................. 37-48
5
Planejamento estratégico como instrumento de gestão
escolar
Cátia Deniana Firmino Perfeito ........................................................ 49-61
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Educação a distância: um modelo acadêmico
Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e
Solange Giardino .................................................................................. 65-83
OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da
Ibero-América
Alina Corrêa ......................................................................................... 85-99
Intervenções educativas em ambientes virtuais:
investigando possibilidades metodológicas
Tania Scuro Mendes ......................................................................... 101-121
PRÊMIO
Terceira edição do Prêmio Construindo a
Igualdade de Gênero .................................................... 125-156
6
EDITORIAL
A revista Educação Brasileira não tem poupado esforços para
trazer nas suas publicações abordagens de temas polêmicos que se
identifiquem com a Universidade. Os textos desta edição assinalam
enormes desafios, mas também apontam soluções, e a Academia, ciente da sua missão institucional, está preparada para dar as respostas que
a sociedade espera e merece.
A primeira leitura desta revista versa sobre O ensino superior
no Estado de São Paulo: contribuição das universidades públicas
paulistas, artigo assinado por Suely Vilela. A autora elenca os inúmeros problemas que assolam o ensino superior paulista e sugere dinâmicas para solucioná-los. Quadros, tabelas e gráficos trazem informações
que, desde já, permitem a antevisão de um futuro mais próspero para as
instituições universitárias do Estado de São Paulo, notadamente para as
três universidades públicas: USP, Unesp e Unicamp.
A segunda leitura é o artigo de Jorge Luís Nicolas Audy sobre
Conhecimento, inovação e o novo papel das universidades. O autor aborda a questão de uma nova conduta para as universidades brasileiras, diante de um cenário em que ciência e tecnologia são temas
centrais de debates éticos e políticos, cabendo à Universidade revestirse de uma visão empreendedora, para inovar e desenvolver o seu plano
de gestão focado nas demandas da sociedade do conhecimento.
Dando continuidade, Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva,
Tamara Polenz e Tania Scuro Mendes são responsáveis por esta pesquisa referente à Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) – Gestão
acolhedora: estabelecendo vínculos com a comunidade acadêmica. Preocupadas em promover a permanência dos estudantes nessa
instituição de ensino, durante a graduação, as autoras formulam
questionamentos e assinalam alguns aspectos preponderantes que vêm
ao encontro dessa demanda.
7
Na seqüência, Planejamento estratégico como instrumento de
gestão escolar, artigo elaborado por Cátia Deniana Firmino Perfeito,
traz ao campo do debate acadêmico a gestão escolar à luz do planejamento estratégico. A autora justifica essa modalidade de administração
como ferramenta indispensável para tornar a instituição universitária
dinâmica e competitiva. Aponta ainda a origem e a evolução do conceito de Planejamento, chegando ao Planejamento Estratégico, os desafios que se apresentam ao gestor escolar e, por fim, mostra como a
Academia incorporou metodicamente esse instrumento de gestão.
Educação a distância: um modelo acadêmico – escrito por
Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange Giardino.
Tema muito em voga, tendo como foco a Universidade Mackenzie. Os
autores desenvolvem ações que contribuem para o fortalecimento de
projetos dessa universidade, caso do eMack, do Mack Virtual, que
dispõem de um espaço interativo on-line para atender às demandas de
estudantes que vêem na Educação a Distância uma alternativa de se
qualificarem para o mercado de trabalho.
Fazendo uma interface com o tema anterior – educação a distância –, Tania Scuro Mendes, em dupla participação na presente edição da revista Educação Brasileira, traz à tona o seu artigo Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando possibilidades metodológicas. É um trabalho que envolve catorze docentes que
atuam em disciplinas de graduação, mediante EaD virtual, e treze instituições de ensino superior da Grande Porto Alegre.
Como último tema, o artigo de Alina Corrêa – OpenCourseWare
(OCW) Universia: oportunidade para docentes da Ibero-América
– elucida como se dá a socialização do conhecimento do OCW e o
impacto da internet no ensino superior. A autora lista alternativas que
alteraram profundamente as formas de produção, de apuração, de geração e distribuição da informação no ambiente universitário.
Encerrando a edição desta revista, e dando continuidade a publicações de temas emblemáticos, o Conselho de Reitores abre espaço
para a divulgação da 3ª edição do prêmio Construindo a Igualdade
de Gênero, uma iniciativa da Secretaria Especial de Políticas para as
8
Mulheres (SPM), em parceria com o MCT, CNPq, MEC e Fundo de
Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem).
Com este número, o Conselho de Reitores atualiza a publicação
da revista Educação Brasileira, nas edições impressa e eletrônica.
Nival Nunes de Almeida
Presidente
Manassés Claudino Fonteles
Editor
9
TEMA
EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA:
NOVOS OLHARES
MEMORIAL
O ENSINO SUPERIOR NO ESTADO DE SÃO PAULO:
CONTRIBUIÇÃO DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS
PAULISTAS
Suely Vilela1
Resumo / Abstract
O artigo apresenta alguns indicadores do Ensino Superior do
Estado de São Paulo, comparativamente àqueles observados para
o Brasil, mostrando a robustez do sistema e os desafios a serem
enfrentados. Neste cenário, contextualiza-se a contribuição fundamental das três universidades públicas paulistas – USP, Unesp
e Unicamp –, principais responsáveis pela pujança do Ensino
Superior no Estado. A importância da autonomia universitária na
evolução dos indicadores das três instituições é também ressaltada. Questões que merecem iniciativas por parte dessas universidades são brevemente discutidas.
The paper shows some indeces about the Higher
Education in São Paulo State, presenting the strength of the
system compared with those found in Brazil, and also the
challenges to be faced. The fundamental contribution of the
public state universities – USP, Unesp and Unicamp —, the
main responsible for the powerful strength of the Higher
Education System in Sao Paulo State, is contextualized in
the scenario. The importance of the university autonomy
concerning the indeces evolution of those three institutions
is also presented. Questions that deserve initiatives from those
universities have been briefly discussed.
1
Professora Titular do Departamento de Análises Clínicas, Toxicológicas e
Bromatológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), e Reitora da USP .
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
15
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
Palavras-chave / Key words
Indicadores do ensino superior, sistema paulista de educação superior, autonomia universitária, USP, Unesp,Unicamp.
Higher education system indeces, higher education in São
Paulo State, university autonomy,USP, Unesp, Unicamp.
ENSINO SUPERIOR – DESAFIOS E SOLUÇÕES PARA O
BRASIL
Vivemos em uma sociedade em transformação, em que o conhecimento e, portanto, a educação desempenham papel fundamental na
vida dos cidadãos e na sobrevivência e no desenvolvimento das nações.
O paradigma da educação para o novo milênio deve se basear
em quatro pilares [1]: aprender a conhecer, aprender a viver juntos,
aprender a fazer e aprender a ser, que interagem e são interdependentes.
Essas ações, praticadas ao longo dos tempos, não raro, de forma isolada, integram-se hoje para atender às novas necessidades do estar no
mundo. Na verdade, o ser humano deverá se dispor a realizar tarefa
das mais complexas, ante as transformações hoje sentidas, despojado
do pensamento construído num passado, não tão longínquo, em que as
bases eram muito diversas.
O ensino superior, como formador de competências, que transforma decisivamente os rumos de um país, deve estar em sintonia com
as mudanças sofridas pela sociedade globalizada. É preciso refletir
sobre a sua missão e também sobre suas funções [2]. Para a consecução desse objetivo, é fundamental que se estabeleçam boas relações
com dois atores – Estado e sociedade – fortalecidas pela autonomia
institucional e pela liberdade acadêmica.
Sem prescindir dos valores acadêmicos tradicionais, um dos desafios do ensino superior é conviver com o moderno, que integra o
avanço da tecnologia à educação e o tem como pressuposto, sem prescindir da qualidade exigida pela competitividade em nosso mundo
globalizado [3].
16
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
Suely Vilela
No Brasil, os principais desafios do Ensino Superior, na atualidade, são o aumento do acesso aos jovens estudantes e a inclusão dos
mais desprovidos dos pontos de vista socioeconômico e étnico. Afinal,
segundo dados de 2005, existiam apenas 4,5 milhões de estudantes nas
Instituições de Ensino Superior (IES), o que, à época, correspondia a
2,4% da população [4]. A maior parte deles era formada por estudantes
brancos, originários de famílias com maior poder aquisitivo. Esse número representava 11% dos jovens de 18 a 24 anos, e a meta é aumentar
esse contingente para 30% até 2011.
Vencer esses desafios vem sendo também a plataforma de ideais e metas da Unesco [2], que prega a democratização do conhecimento e de seu uso ético. As formas encontradas para vencer esses
desafios dependerão das peculiaridades de cada país.
Ações são dirigidas pelo Sistema Educacional Brasileiro com o
intuito de solucionar tais impasses. A expansão de vagas envolve o
aumento do número de IES, de cursos presenciais noturnos e de cursos
a distância. Nesse particular, é importante, todavia, ter cautela, considerando-se o número de vagas ociosas. Segundo o censo de 2005 [5],
das 2.429.737 vagas oferecidas em todo o País, apenas 57% foram
ocupadas. A política de aumento de vagas deve necessariamente levar
em conta esse cenário. Também não se pode perder de vista – e isso é
prioritário – a qualidade dos recursos humanos formados. A Índia e a
China têm aumentado de forma expressiva o número de IES, e, por
conseguinte, o número de vagas, na expectativa de alcançar celeremente
o desenvolvimento sem formar, contudo, indivíduos qualificados a exercer as respectivas profissões [6].
Já para a resolução do problema de acesso a grupos pouco favorecidos do ponto de vista socioeconômico e a inclusão por etnia, programas de cotas do governo federal, ainda que cercados de polêmica, vêm
sendo implementados em muitas regiões. Além dessas ações, buscamse políticas para a permanência de estudantes nas IES, a fim de minimizar
taxas de evasão, não raro altas, que se observam em muitas regiões do
País. Somam-se a essas algumas iniciativas próprias de alguns Estados
da Federação.
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
17
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
É preciso mencionar também que, paralelamente a medidas que
visam ao aprimoramento interno dos sistemas, a internacionalização do
Ensino Superior é meta que mobiliza, na atualidade, os dirigentes das
Instituições, sobretudo das públicas. Vivemos em um mundo globalizado
e altamente competitivo, que exige o aprimoramento da formação do
professor, do aluno e da pesquisa de alto nível, atributos que a
internacionalização permite obter.
O ENSINO SUPERIOR NO ESTADO DE SÃO PAULO
Estado que representa a pujança econômica do Brasil, São Paulo
corresponde a 33,4% do PIB nacional e concentra 22% da população
economicamente ativa do País [7]. Segundo o Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS) de 2006, para o biênio 2002-2004, esse
Estado ocupava, em 2003, o 51º lugar no ranking mundial do PIB per
capita, quando analisado separadamente, aproximando-se de países
como Grécia, Finlândia e África do Sul. Nesse mesmo ano, o Brasil se
encontrava na 70ª posição no ranking.
Com tal participação expressiva no PIB brasileiro, é de se esperar que índices sociais importantes, relativos às condições de vida dos
habitantes, tais como aqueles ligados à Educação, acompanhem o status
de maior economia brasileira registrada para o Estado de São Paulo
[7]. Realmente, observa-se que tais índices se mostram relativamente
superiores, dos pontos de vista qualitativos e quantitativos, aos outros
Estados da Federação.
No âmbito do Ensino Superior, o peso de São Paulo é inconteste.
Das 2.398 Instituições do setor no Brasil, segundo dados de 2007 [5] do
Mec/INEP, aproximadamente 24% encontram-se nesse Estado. Em
2005, o corpo discente das Instituições em São Paulo correspondia a
27% dos estudantes matriculados no País.
Analogamente ao que ocorre em nível nacional, a maioria das
Instituições de Ensino Superior (IES) de São Paulo é de natureza privada, correspondendo ao setor público em torno de apenas 11% do total.
18
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
Suely Vilela
Predominam, no tocante à categoria acadêmica, Faculdades (84%) em
relação às Universidades (7%) e Centros Universitários (8%) [5]. O
setor público em São Paulo, compreendido por 52 IES, apresenta número praticamente igual de IES estaduais (23) e municipais (24), com
parcela reduzida de Federais (5) [5]. Nesse particular, o cenário difere
daquele que se observa no plano nacional, em que o número de IES
federais suplanta o das demais categorias administrativas.
Considerando-se os docentes, independentemente da categoria
da IES, em 2005 registravam-se em São Paulo aproximadamente 25%
dos docentes do País. Dos 71.957 professores das instituições paulistas,
29% eram doutores, 35% mestres e 23% possuíam especialização, além
dos 13% com graduação, apenas. A situação no País segue esse mesmo perfil com relação à qualificação docente. No entanto, as IES paulistas
envolvem 7% a mais de doutores do que o total nacional [5]. Esse
quadro é esperado, considerando-se o contingente superior de doutores
formados em São Paulo, em relação ao total do País [7]. Em 2004, eles
representavam 43 doutores por 100.000 habitantes, próximo do dobro
da média brasileira.
A pesquisa científica é, em geral, desenvolvida e liderada por
pesquisadores-doutores, titulados por IES, notadamente de caráter público. Em face da significativa contribuição de São Paulo na formação
desses recursos humanos, explica-se sua participação decisiva nos rumos da pesquisa científica da Região Sudeste e, por extensão, do País.
O gráfico 1 mostra o perfil do Estado de São Paulo no Diretório
dos Grupos de Pesquisa do CNPq no Brasil [8]. Observam-se porcentagens acima dos 50% de participação do Estado nos quesitos considerados, comparativamente à Região Sudeste. Em relação ao Brasil, o
Estado responde por 28% dos grupos de pesquisa, 29% dos pesquisadores, 35% dos pesquisadores-doutores e 28% das linhas de pesquisa
contidas nos diretórios do CNPq [8].
Indicadores da produção científica expressa em artigos internacionais indexados mostravam, segundo censo de 2004 do CNPq [6],
que 64% do que se produziu à época na Região Sudeste e 46% em
relação ao Brasil correspondiam a São Paulo. Tais dados reiteram a
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
19
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
importância do Estado à Ciência desenvolvida na região e no País, que
experimentou crescimento considerável.
4 5. 0 00
4 0. 0 00
3 5. 0 00
3 0. 0 00
55 %
2 5. 0 00
5 6%
5 3%
2 0. 0 00
1 5. 0 00
5 4%
1 0. 0 00
5. 0 00
0
S ã o P a ul o
G rup os
P e squ i sa d or e s
S u de ste
P e sq ui sa d o re s D o utor e s
Li n ha s d e p e sq ui sa
Gráfico 1 – Participação, em porcentagem, de São Paulo nos grupos,
recursos humanos e linhas de pesquisa do Sudeste, censo 2004.
Fonte: [8]
A evolução da produção científica brasileira observada em 2006,
comparativamente a 2005, é mostrada na tabela 1. Nesse particular, o
Brasil ocupava a 17ª posição em 2005 e, em 2006, passou ao 15º lugar,
traduzindo o crescimento de quase 7% no período.
O cenário resumidamente apresentado mostra um Estado com
um sólido Ensino Superior. Contudo é importante ressaltar que os indicadores favoráveis se referem, sobretudo, ao setor público. O segmento privado, que representa a maioria no Estado, como provam os números apresentados [5], deveria investir no aprimoramento do ensino, a
fim de formar profissionais de qualidade que contribuam, de forma efetiva, para o desenvolvimento da Nação. Há instituições privadas com
muitos méritos; todavia, docentes em tempo integral, com carreira es-
20
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
Suely Vilela
pecífica, sistemas de pós-graduação organizados, além de infra-estrutura para a pesquisa são características mais correntemente encontradas no setor público da educação superior [9].
Tabela 1 – Produção científica mundial em 2006
POSIÇÃO
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
PAÍS
Estados Unidos
Alemanha
Japão
China
Inglaterra
França
Canadá
Itália
Espanha
Austrália
Índia
Coréia do Sul
Holanda
Rússia
Brasil
Suíça
Taiwan
Suécia
Turquia
Polônia
Bélgica
Israel
Escócia
Dinamarca
Áustria
No.
ARTIGOS
283.935
71.174
71.033
69.423
63.906
50.520
42.841
39.162
30.338
26.963
25.610
23.300
23.041
20.005
16.872
16.781
16.545
16.428
13.693
13.002
12.470
10.241
9.798
8.770
8.240
% DO
MUNDO
32,30
8,10
8,08
7,90
7,27
5,75
4,87
4,46
3,45
3,07
2,91
2,64
2,62
2,28
1,92
1,91
1,88
1,87
1,56
1,48
1,42
1,17
1,11
0,99
0,92
2006/2005
(%)
-1,71
-3,54
-5,75
16,80
-1,69
-3,34
2,09
0,00
4,28
2,99
6,94
0,88
1,69
-16,89
6,81
0,46
5,58
-3,59
-1,28
-0,51
-2,53
-1,23
-4,01
-2,62
-4,72
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/7/07.
AS UNIVERSIDADES PÚBLICAS ESTADUAIS
PAULISTAS
As três universidades públicas do Estado de São Paulo – USP,
Unesp e Unicamp – desempenham papel de grande relevância no contexto da educação superior do Estado de São Paulo e do País.
Criadas no século passado – USP, em 1934; Unicamp, em 1966;
e Unesp, em 1976 –, são ainda muito jovens, se as compararmos às
prestigiosas instituições estrangeiras, como a Universidade de Bologna,
fundada há 918 anos. Apesar da juventude, estas instituições conquistaram gradativamente a maturidade, que hoje lhes permite figurar nos
rankings das melhores universidades do mundo. A USP é a 128ª coloEduc. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
21
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
cada na relação da Universidade de Shanghai de 2007 [10] e a primeira
brasileira classificada, seguida da Unicamp (304ª posição) e da Unesp
(449ª posição), esta última na quarta colocação entre as nacionais classificadas nesse ranking.
A autonomia universitária, resultante da Constituição Estadual,
abrangeu, a partir de 1989, as três instituições e foi certamente o
catalisador do desenvolvimento que estas experimentaram ao longo da
década de 1990, atingindo índices expressivos no início do século XXI.
É preciso ressaltar que a autonomia institucional, que garante a liberdade na tomada de decisões de cunho político, além da financeira e administrativa, e a liberdade acadêmica constituem fatores fundamentais
para que uma IES cultive e desenvolva a criatividade, a reflexão e o
espírito crítico [2].
USP, Unicamp e Unesp respondem juntas por 8% dos alunos de
graduação e 78% dos estudantes de pós-graduação do Estado de São Paulo, segundo dados de 2006 [11]. O gráfico 2 mostra o número de alunos de
ambos os níveis, correspondentes a cada uma das universidades [7].
9 7 . 23 0
1 00 . 00 0
90 . 00 0
80 . 00 0
70 . 00 0
60 . 00 0
50 . 00 0
40 . 00 0
4 7. 9 07
5 0. 8 42
17 . 2 75
3 2. 0 48
27 . 86 4
1 0 .0 9 7
30 . 00 0
1 2 . 88 1
20 . 00 0
10 . 00 0
0
G RA DU A Ç Ã O
U SP
U N IC A M P
P Ó S -G R A D U A Ç Ã O
UN E S P
TO TA L
Gráfico 2 – Distribuição de alunos de graduação e de pós-graduação nas
universidades estaduais paulistas, em 2006. Dados da Unesp, 2005.
Fontes: [12-14]
22
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
Suely Vilela
A evolução da formação de mestres e doutores a partir da autonomia universitária é apresentada no gráfico 3. Aumento expressivo na titulação
de mestres e doutores é observada no período de 1989 a 2006, nas três
universidades. O avanço significativo do sistema de pós-graduação – as
três instituições respondem hoje por 74% dos programas do Estado de São
Paulo e 21% do Brasil [11] – resultou na consolidação da formação de
competências, especialmente de doutores, para o desenvolvimento científico e a qualificação docente das IES de todo o País.
Assim é que as três universidades paulistas encontram-se entre
as principais instituições norte-americanas formadoras de recursos humanos nesse nível (quadro 1), segundo dados de 2005 [15]. A USP
titulou naquele ano 2.266 doutores, seguida da Unicamp, que formou
873 doutores, e da Unesp, responsável por 605 doutores no período.
Gráfico 3 – Evolução na titulação de mestres e doutores no período de
UNESP
USP
UNICAMP
1989 a 2006.
Fontes: [12-14]
Tal fato repercute também na qualificação dos docentes das universidades públicas paulistas. É importante ressaltar que de 90% a 96%
dos docentes possuem, no mínimo, título de doutor e, a maioria, em
torno de 80%, se dedica a essas instituições em tempo integral. Esses
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
23
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
são atributos determinantes da qualidade dos profissionais formados e
da geração do conhecimento, que pode levar ao avanço tecnológico.
Conforme dito, a autonomia financeira, além da acadêmica, permitiu
às IES estaduais estabelecer as políticas de gestão e realizar planejamentos
de longo prazo [9], para a aplicação adequada da dotação orçamentária –
em 2007, em torno de R$ 2,4 bilhões à USP, cerca de R$ 1 bilhão à Unicamp
e em torno de R$ 1,1 bilhão à Unesp – tendo como norte a excelência
acadêmica. No entanto, aos recursos do erário, nem sempre suficientes,
devem-se acrescentar outros oriundos especialmente da captação de recursos de agências de fomento por parte dos docentes. É expressivo o
valor captado pelas IES paulistas. A USP, por exemplo, em 2006, recebeu
US$ 503.961.432,78 de verba extra-orçamentária, proveniente de agências
de fomento e convênios diversos.
A produção científica decorrente do sólido sistema de pós-graduação e da pesquisa, em geral de qualidade, garantiu às três universidades
paulistas posições de destaque entre as IES brasileiras mais bem colocadas
nesse quesito, como mostra a tabela 2. Aumentos substantivos no período
de 1996 a 2006 renderam o primeiro, segundo e quarto lugares nessa classificação, respectivamente, à USP, Unicamp e Unesp. Juntas, elas representavam 46% da produção científica brasileira, em 2006.
24
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
Suely Vilela
Quadro 1 – Principais universidades formadoras de doutores
Survey
of Earned
Doctorates,
2004
Número
de Doutores,
2004
2005
Brasil
EUA
Doutores
2.266
USP
Unicamp
873
664
U. CA, Los Angeles
U. CA Berkeley
802
U. TX - Austin
U. MI
716
U. WI -Madison
664
U. CA Los Angeles
651
U. MN
Stanford U.
644
642
U.IL Urbana Champaign
637
PA State U., The
606
711
Unesp
605
OH State U., The
591
MIT
U. FL
574
Harvard U.
510
581
Fonte: NSF/NIH/USED/NEH/USDA/NASA, 2005 Survey of Earned Doctorates
Fonte: [15]
Tabela 2 – Universidades brasileiras e a produção científica no Brasil
INSTITUIÇÃO
1º. USP
2º UNICAMP
3º UFRJ
4º UNESP
5º UFRGS
6º UFMG
7º UNIFESP
8º FIOCRUZ
9º UFSC
10º UFSCAR
11º UFPR
12º UFPE
13º UFV
14º UNB
15º UFC
ARTIGOS
PUBLICADOS
2006
4.669
1.842
1.537
1.286
1.069
1.019
685
584
525
511
475
440
437
424
373
2001
2.812
1.219
1.163
1.061
635
605
347
342
292
400
261
294
140
247
170
1996
1.554
678
634
396
315
284
143
235
165
181
121
139
59
123
73
AUMENTO(%)
1996-2006
200
171
142
224
239
258
379
148
218
182
292
216
640
244
410
Fonte: O Estado de São Paulo, 1°/08/07
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
25
O ensino superior no Estado de São Paulo: contribuição das
universidades públicas paulistas
Há, no entanto, que se investir mais na inovação. Nesse ponto,
corroborando o descompasso observado no País, não há correspondência entre a produção científica e o avanço tecnológico. A despeito desse panorama, a contribuição das três instituições é significativa.
Deve-se salientar que a produção científica indexada é passo
importante rumo à internacionalização, objetivo das três universidades,
que têm privilegiado as mobilidades discente e docente e o desenvolvimento de pesquisas conjuntas. O resultado de ações nessa direção é a
visibilidade mundial que conquistaram, haja vista a classificação dessas
instituições nos principais rankings das melhores universidades do
mundo [10].
A importância dessas Universidades remete-lhes constantemente à responsabilidade de comandar ações para enfrentar os principais
desafios da educação. Assim sendo, em resposta à política de expansão
de vagas dirigida pelo Governo Estadual, no período de 2001 a 2006,
USP, Unesp e Unicamp encetaram esforços visando a iniciativas que
levassem à consecução desse objetivo. Cursos novos, além de cursos
noturnos já existentes, foram criados nas três universidades, em atendimento à necessidade de oferecimento de novas vagas. Novos campi
também resultaram dessa política de expansão. A racionalidade na criação foi a tônica dessas iniciativas, tendo em vista novos projetos pedagógicos e o atendimento a novas tendências da sociedade moderna,
sem descuidar da qualidade que se quer imprimir aos recursos humanos
formados. Criaram-se 2.787 vagas na USP, o que representa acréscimo de 39%, correspondente ao adicional de 13.395 novos alunos beneficiados. A Unicamp criou 900 vagas, o correspondente ao acréscimo
de 38%, representando adicional de 4.500 novos alunos beneficiados.
Na Unesp criaram-se 1.825 vagas, 36% de acréscimo, refletindo adicional de 9.125 novos alunos beneficiados.
A inclusão socioeconômica e étnica encontrou nas instituições
públicas paulistas soluções mais criativas, como alternativas às cotas,
ainda de aplicação controvertida. Visando prioritariamente ao mérito,
criaram-se o Programa de Inclusão Social (INCLUSP), na USP [16], o
Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social (PAAIS) da Unicamp
26
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
Suely Vilela
[17] e iniciativas para a inclusão social na Unesp [18], com abrangência
que ultrapassa o acesso à universidade. Tais programas, dedicados a
estudantes do ensino médio da rede pública, além de aumentarem o
acesso dos estudantes, procuram envolver ações que visam ao aprimoramento do sistema, aumentando as oportunidades a esses estudantes
de ingressar em universidades de qualidade.
Os fatos e números brevemente apresentados neste artigo dão a
dimensão da importância da USP, Unesp e Unicamp e do papel que
representam no contexto da Educação Superior do Estado de São Paulo e do País.
Há ainda muitos desafios a serem enfrentados por essas instituições. Um deles diz respeito ao aperfeiçoamento da gestão universitária, em que se possa distinguir claramente a administração da burocracia que a engessa [19]. Os meios que elas dispõem para enfrentá-los,
consideradas as suas características, as principais aqui ressaltadas, permitem que se lhes anteveja um futuro ainda melhor. Dessa forma, poderão contribuir, mais ainda, para a formação de cidadãos, conscientes
de seu papel no desenvolvimento da Nação.
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28
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 15-28, jan./dez. 2007
ARTIGOS
INOVAÇÃO / RENOVAÇÃO
CONHECIMENTO, INOVAÇÃO E O NOVO PAPEL
DAS UNIVERSIDADES
Jorge Luís Nicolas Audy1
Resumo
A Sociedade do Conhecimento apresenta novas demandas
para as Universidades, apontando para um novo papel das
instituições, atuando como protagonistas do processo de desenvolvimento econômico, social e cultural. Novos conceitos
surgem neste ambiente, tais como criatividade, inovação, novas abordagens pedagógicas, empreendedorismo. Incorporar
estes novos conceitos, buscando uma renovação necessária,
mas sem perder sua tradição e integridade, é o grande desafio
que se apresenta.
Este artigo busca identificar alguns aspectos críticos deste
processo de mudança e apontar algumas oportunidades e desafios presentes neste ambiente.
Palavras-chave / Key words
Inovação, universidade empreendedora, sociedade do conhecimento, interação universidade-empresa-governo.
Innovation, entrepreneurial university, knowledge society,
university-entrerprise-govermment interaction.
As noções de sociedade da informação e do conhecimento
demandam um conceito revisado de Universidade. Enquanto a noção
de sociedade da informação está baseada nos avanços tecnológicos, o
conceito de sociedade do conhecimento compreende dimensões sociais, éticas e políticas mais abrangentes (Unesco, 2005).
1
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul (PUCRS).
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 31-34, jan./dez. 2007
31
Conhecimento, inovação e o novo papel das universidades
A ciência e a tecnologia são temas centrais de debates éticos e
políticos no cenário do desenvolvimento da sociedade. Nesse contexto,
a inovação surge como resposta das instituições universitárias em um
contexto cada vez mais complexo, dinâmico e competitivo.
O conhecimento, por sua vez, é a base de um processo de inovação e tem como insumo fundamental a informação. O processo de
inovação e transferência de conhecimento é dinâmico, complexo e
interativo, pois as informações devem fluir entre agentes do conhecimento e sociedade.
Dessa forma, a construção do conhecimento, caracterizada pela
constante transformação de conhecimento tácito em explícito, e viceversa, beneficia-se da cooperação entre partícipes de uma rede de conhecimento. Esta rede pode ser representada, na sociedade atual, pelas
universidades, sociedade civil (incluindo empresas) e governo. As relações entre estes atores são cada vez mais importantes na construção
do conhecimento. Neste cenário, a Universidade não deve ser lugar
apenas de erudição, mas de esforço interdisciplinar de resolução de
problemas.
A compreensão deste ambiente em transformação é importante
para a definição de políticas de pesquisa, de educação e de inovação. A
sociedade do conhecimento envolve uma reorganização da própria sociedade e das suas instituições e gera mudanças nos processos econômicos, sociais e políticos, tendo por base o acesso às novas tecnologias
da informação e comunicação.
Nesta nova sociedade, a capacidade de aprender é o grande diferencial competitivo das organizações e das pessoas, demandando novas
formas de aprender. A realidade existente mostra que a aquisição do
conhecimento não está confinada no espaço (nas instituições de ensino
tradicionais) e nem no tempo (em um período único). Desta constatação
surge a noção de educação continuada, ao longo de toda a vida. Neste
ambiente de constantes mudanças são questionados antigos modelos
de aprendizagem, e emergem novas abordagens, baseadas no aprender
fazendo (learning by doing), na criatividade e na capacidade de inovar e de aprender a aprender.
32
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 31-34, jan./dez. 2007
Jorge Luís Nicolas Audy
A sociedade centrada na inovação espera das Universidades
abordagens pedagógicas que façam frente às atuais demandas, que
busquem desenvolver novas competências e conceitos de tempo e espaço no processo de aprendizagem. Nesse sentido, aprender a aprender significa aprender a refletir, levantar dúvidas, adaptar-se com rapidez e questionar continuamente o ambiente cultural envolvido. Dessa
forma, a Universidade poderá colaborar na elaboração de um projeto
global de desenvolvimento humano durável, compondo um processo de
educação que leve em conta as dimensões física, afetiva, cognitiva,
comunitária, ético-valorativa e transcendental.
A posição central da criatividade e da inovação na sociedade do
conhecimento gera um desafio que deve ser enfrentado neste início de
século: como harmonizar uma cultura de inovação com uma visão de
longo prazo sustentável, em que se faz necessário manter a qualidade e
a tradição?
Assim emerge um novo papel para a Universidade, expandindo
seu foco tradicional na formação e capacitação (ensino e pesquisa),
agregando à sua missão a atuação direta no processo de desenvolvimento econômico, cultural e social. E, ao mesmo tempo, representa
desafios na direção de gerar as condições para a análise crítica deste
processo de criação de valor e suas conseqüências, tanto internas na
própria Universidade, como externas, considerando suas conseqüências nos planos social, econômico e cultural.
A Universidade, neste cenário, deve ser empreendedora, desenvolvendo mecanismos que incorporem estas características da sociedade do conhecimento e da aprendizagem ao seu Plano Pedagógico
Institucional e ao seu modelo de gestão. Ao fazer isso, estará sendo
inovadora no seu contexto de atuação e estará respondendo às demandas que a sociedade apresenta para esta Instituição.
Na PUCRS, o que estamos tentando fazer é exatamente expandir o
impacto positivo na sociedade para além da formação e capacitação de
nossos alunos, com mais de 120 mil egressos nos seus 58 anos de existência
como Universidade. Mais recentemente, a PUCRS tem atuado como um
parceiro ativo dos governos e da sociedade, seja por meio do estímulo a
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 31-34, jan./dez. 2007
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Conhecimento, inovação e o novo papel das universidades
uma cultura empreendedora, na geração de novas empresas de base
tecnológica, na atração de investimentos de grandes empresas nacionais e
internacionais em áreas de alta tecnologia e na criação de ambientes de
inovação e pesquisa de classe mundial (como o TECNOPUC – Parque
Científico e Tecnológico da PUCRS), seja pela ampliação e qualificação do
Hospital São Lucas (maior Hospital Universitário privado do país), seja pela
constante atualização do Museu de Ciência e Tecnologia da PUCRS (principal Museu Interativo da América Latina).
Enfim, a Universidade deve colocar sua tradição e qualidade a
serviço da renovação necessária para atender ao cumprimento de sua
missão. Isto deve ser feito de forma coerente com seus princípios e
valores, o que significa não perder de vista sua finalidade primária de
formar cidadãos, atendendo à demanda social existente.
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34
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 31-34, jan./dez. 2007
GESTÃO ESCOLAR
GESTÃO ACOLHEDORA: ESTABELECENDO
VÍNCULOS COM A COMUNIDADE ACADÊMICA
Dorilda Grolli1
Lauraci Dondé da Silva2
Tamara Polenz3
Tania Scuro Mendes4
Resumo / Abstract
Encaminha-se esta pesquisa com vistas à construção de
um projeto educativo, objetivando a Gestão Acolhedora. Este
trabalho será desenvolvido em parceria com os setores diretamente envolvidos com a educação, a formação e o atendimento aos alunos na Instituição, significando uma ação
interdisciplinar. O objetivo da pesquisa é desenvolver um Programa de Gestão Acolhedora com os diversos segmentos da
Universidade, a partir dos dados analisados e categorizados
na pesquisa realizada em 2007. O caminho investigativo a ser
percorrido nesta pesquisa, a exemplo dos trilhados nas investigações desenvolvidas anteriormente, é de caráter qualitativo, segundo Bogdan (2000), sendo os dados examinados à luz
da análise de conteúdo, conforme Orlandi (1993) e Bardin
(1979), tendo em vista a construção e a conceituação de categorias para a elaboração de ações conjuntas envolvendo pesquisa-ação, consoante Demo (1994) e Brandão (2003). A perspectiva teórica é voltada para ações pedagógicas, nos espaços educativos, envolvendo atitudes voltadas ao esforço em
1
Docente e Pesquisadora da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), Doutora em
Filosofia. [email protected]
2
Docente, Pesquisadora e Diretora da Doep/Ulbra; Doutora em Educação.
[email protected]
3
Docente e Pesquisadora da Ulbra, Mestre em Educação. [email protected]
4
Docente e Pesquisadora da Ulbra, Doutora em Educação. [email protected]
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 37-48, jan./dez. 2007
37
Gestão acolhedora: estabelecendo vínculos com a comunidade
acadêmica
estabelecer vínculos significativos com os sujeitos nas relações que aí se impõem. Nesse sentido, representa a inclusão
das diferenças numa conjuntura multicultural e o aproveitamento dos conhecimentos prévios, para um trabalho
intercultural e intersubjetivo de construção do conhecimento.
No tocante ao processo de ensino e aprendizagem, a pesquisa, a partir dos indicadores para a construção dos significados
sobre gestão acolhedora e permanência, constitui programa
que promove a formação continuada de professores e funcionários, sendo preponderante o desenvolvimento de competências educadoras.
The present research is based upon the necessity of
developing an educational project facing the issue of the
Welcoming Management. This project is built in collaboration
with the departments directly involved with the education,
graduation and the answering of the needs of the students in
that institution, which means an interdisciplinary action. The
objective here is to develop a Welcoming Management
Program with all segments of the University, starting from
data analyzed and categorized in the research done in 2007.
The investigative path for this research, as of those developed
before, has a qualitative aspect to it, according to Bogdan
(2000), with all information analyzed through content
analysis, according to Orlandi (1993) and Bardin (1979),
with eyes on the construction and definition of categories,
for the elaboration of joint actions involving action-research
as shown in Demo (1994) and Brandão (2003). The
theoretical perspective implies a pedagogical action in the
educational spaces, in an effort to establish meaningful
connections with the individuals in all of the presented
relationships. In this case, it represents the inclusion of the
differences in a multicultural group and the use of previous
knowledge for an intercultural and intersubject work of
knowledge construction. For the teaching and learning
process, the research, with information from indicators for
the construction of the meanings about welcoming
management and permanence, constitutes a program that
promotes continuous education of professors and employees,
where the main objective is the development of educational
competencies.
38
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 37-48, jan./dez. 2007
Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tamara Polenz e Tania Scuro
Mendes
Palavras-chave / Key words
Gestão acolhedora, interdisciplinaridade, formação continuada.
Welcoming management, interdisciplinary, continuous
education.
APRESENTANDO O PERCURSO DA INVESTIGAÇÃO
O Programa de Gestão Acolhedora, iniciado nos anos de 2006/
2007, implica uma pesquisa institucional, vindo ao encontro da preocupação e do desejo da Instituição em promover a permanência do aluno
na universidade. Percebe-se a necessidade de ações educadoras que
tenham por finalidade a formação e a qualificação do sujeito reflexivo,
perceptivo, autônomo e construtor da própria realidade. A reflexão que
se faz a partir desta constatação inicial detém-se em três instâncias,
quais sejam: os significados dos campos do conhecimento, numa
análise histórica, epistemológica e sociocultural; uma nova visão de
cultura que se dá na interculturalidade e na intersubjetividade, o que
requer a ruptura da fragmentação curricular legada pela modernidade;
a concepção construtora e cooperadora do conhecimento que busca o desenvolvimento do pensamento crítico e a capacidade de fazer a
leitura da realidade social, contribuindo para a transformação desta realidade. Que ações, voltadas à gestão acolhedora, a universidade pode
desenvolver para articular tais instâncias e qualificar as relações entre
seus diversos segmentos?
Visando a encontrar respostas possíveis a esta interrogação, temse, como horizonte, a finalidade de desenvolver um Programa de Gestão Acolhedora com os diversos segmentos da Universidade Luterana
do Brasil, a partir dos dados analisados e categorizados na pesquisa
realizada em 2007, cujos resultados podem proporcionar maior compreensão sobre componentes da identidade do aluno, traduzidos em sua
cultura, sua linguagem e seus determinantes histórico-sociais.
O caminho investigativo a ser percorrido nesta pesquisa, a exemplo
dos trilhados nas investigações desenvolvidas anteriormente, é de cará-
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 37-48, jan./dez. 2007
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Gestão acolhedora: estabelecendo vínculos com a comunidade
acadêmica
ter qualitativo, segundo Bogdan (2000), sendo os dados examinados à
luz da análise de conteúdo, conforme Bardin (1979) e Orlandi (1993),
tendo em vista a construção e a conceituação de categorias, para a
elaboração de ações conjuntas envolvendo pesquisa-ação, consoante
Demo (1994) e Brandão (2003).
Como decorrência desse processo, encaminha-se um trabalho
de caráter interdisciplinar que compreenderá a articulação de ações
com setores envolvidos no contexto educativo desta Instituição e que
impliquem, como eixo articulador, a conceituação-foco desta pesquisa
como gestão acolhedora. Esta pesquisa será trabalhada, portanto, mediante a construção de um programa de ações conjuntas, reportando-se
à concepção cooperativa da educação.
GESTÃO ACOLHEDORA EM REALIDADES
MULTICULTURAIS
As novas demandas socioculturais, especialmente com a assimilação das tecnologias digitais, têm engendrado uma ecologia cognitiva
que altera e amplia as necessidades de inserção social. O papel da
Universidade, nessa perspectiva, é o de dar vez e voz aos sujeitos sociais e, para isso, essa Instituição precisa romper com paradigmas
condicionantes e construir novas formas de fazer educação que visem
à formação integral em processos humanizadores sustentados pela ética e pela visão de imprevisibilidade.
Essa abertura à sociedade e ao outro, que deve ser finalidade da
educação desenvolvida na Universidade, é respaldada por Prigogine
(1996), que enfatiza que a ciência não se limita mais a situações
simplificadas e idealizadas, mas, ao contrário, põe-nos diante da perplexidade de um mundo complexo e constantemente mutável.
Isso remete à idéia, comentada em nosso artigo relativo à formação de professores, da capacidade do homem de retomar-se e, ao mesmo tempo, projetar-se para o futuro. Desta reflexão explicita-se a intenção de a universidade conhecer a identidade do aluno em suas múl-
40
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 37-48, jan./dez. 2007
Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tamara Polenz e Tania Scuro
Mendes
tiplas características para pensar os espaços em que estas identidades
possam se desenvolver no universo acadêmico.
Diante desse cenário educacional, questiona-se: como a Universidade, composta por diferentes segmentos, pode desencadear ações
conjuntas que dêem conta das demandas às quais os alunos ingressantes
no ensino superior estão sujeitos?
A temática abordada nesta pesquisa traduz preocupação por parte
de todos os segmentos que compõem as gestões administrativas e pedagógicas da Universidade. Esse é o indicador preponderante para a
relevância que se dá a este estudo, constituindo o desafio que desencadeia o seu desenvolvimento.
As conclusões a que se chega a cada etapa deste processo de investigação atingem a comunidade acadêmica, envolvendo a todos no que diz
respeito aos entendimentos que são proporcionados pela análise evolutiva
que se realiza e que sinaliza as ações desencadeadas a partir desta análise.
Nesse contexto, a questão da “permanência na Universidade” envolve e
impulsiona a todos que fazem parte do espaço acadêmico.
Decorre disso a necessidade de se definir o entendimento de
permanência que está expresso na realidade em que se realiza a pesquisa. Este conceito volta-se ao investimento na formação da inteireza
do sujeito que deve ocorrer por toda sua existência e equivale à continuidade nos processos educativos. Permanência abrange o aprimoramento de conhecimentos que leva ao desenvolvimento do sujeito enquanto pessoa, com caráter social e profissional. Os seus significados
conduzem, desse modo, a uma compreensão sobre a incompletude humana. Assim, entende-se permanência na sua relação com os indicadores educacionais assumidos por esta coletividade.
O investimento nessas premissas é compromisso fundamental
da Universidade e, por isso, constitui uma das prioridades desta, desencadeando investigação institucional. Resultados de pesquisas anteriores reportam a algumas respostas sobre a questão: por que o aluno
permanece nesta Instituição?
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 37-48, jan./dez. 2007
41
Gestão acolhedora: estabelecendo vínculos com a comunidade
acadêmica
Do estudo realizado, conclui-se que os conceitos identidade,
desenvolvimento, e qualificação constituem os aspectos preponderantes para o processo de permanência na Instituição. Depreende-se, a
partir disso, a necessidade de construir significados sobre esses conceitos, percebendo, com maior clareza, a forma como se manifestam na
realidade, além de fundamentá-los para solidificar e ampliar as ações
que os promovem.
Estes entendimentos devem ser descritos, considerando, primeiramente, cada uma das três categorias mencionadas, na sua caracterização particularizada, para, depois, percebê-las na relação, na forma
como se manifestam no cotidiano da Universidade.
A compreensão do conceito identidade remete a uma construção permanente na interatividade multicultural. De caráter social, define-se na individualidade do sujeito, compondo sua inteireza como única,
indivisível e intransferível.
Essa interpretação conduz à dimensão em que o aluno se reconhece no contexto acadêmico, percebendo-se como sujeito com
potencialidades e interesses. Ao mesmo tempo, o ambiente da Universidade lhe favorece a construção evolutiva de sua própria identidade. A
partir disso, pode-se dizer que o espaço acadêmico precisa ser cada
vez mais multicultural, de forma que possibilite a inserção de todos.
Dessa forma, pressupõe um olhar que contemple a diversidade.
Pela reflexão teórica, de acordo com Morin (1995, p. 113), entende-se, por sua vez, desenvolvimento como processo que conduz à
“... finalidade... de viver verdadeiramente. Viver melhor”. Trata-se,
portanto, de desenvolvimento humano e, neste sentido, implica uma concepção histórica e multidimensional, uma vez que constitui uma busca
que envolve todas as dimensões de existência humana.
Outro significado relevante para esta categoria é buscado em
Piaget (1973), para quem desenvolvimento decorre de processos
construídos interativamente e se dá na relação com os outros e com o
meio, constituindo um princípio ativo. Sua finalidade está na aquisição
da autonomia. Decorre, ainda, de processos de participação e de construção de aprendizagem continuada.
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Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tamara Polenz e Tania Scuro
Mendes
A categoria desenvolvimento, emergente da análise sobre as respostas obtidas pelo instrumento de investigação, é tomada como caminho pelo qual pode-se ter acesso a novos espaços de trabalho e cultura.
Também promove permanência no mercado de trabalho. Abrange, por
conseguinte, conhecimento pessoal e profissional.
Prosseguindo a análise, quanto à qualificação, conforme Soares (2002, p. 41), “na base da expressão, potencial humano, sempre
esteve o poder se qualificar, se requalificar e descobrir novos campos
de atuação como realização de si”. O autor diz ainda que a função
qualificadora da educação “tem como base o caráter incompleto do ser
humano” que utiliza o seu “potencial de desenvolvimento” para significar a perspectiva permanente e continuada que ela embasa.
Assim, a terceira categoria diz respeito às motivações do aluno,
envolvendo a universidade como um todo, o seu curso e a si própria,
numa relação significativa. A qualificação surge, pois, como interpretação às manifestações sobre a conceituação, a estrutura, a organização
e a seriedade que envolve o espaço educativo, a diversidade e a amplitude curriculares, a competência dos professores e os relacionamentos
que possibilitam dentro e fora da sala de aula. Além disso, refere-se ao
desenvolvimento pessoal, claramente constatado por meio do aprimoramento de conhecimentos, implicando apropriação de competências e
habilidades.
Portanto, podemos concluir que os significados inferidos da análise
de dados pesquisados, assim como da literatura, estão em concordância e
se complementam em estreita relação, manifestando-se na concretude do
cotidiano da vida acadêmica, na dinâmica dos processos e relacionamentos
desencadeadores da formação dos sujeitos nela inseridos.
A partir dessas questões tem-se que essa realidade, desejável e
propícia ao desenvolvimento, precisa ser intensificada e ampliada de
forma a atingir todos os setores e instâncias do ambiente acadêmico,
devendo ser encaminhada como aprendizagem e qualificação do universo de sujeitos nela envolvidos. Isto pode se dar de forma sistemática
e estruturada, com base no conhecimento construído por meio desta
pesquisa.
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acadêmica
As relações teórico-práticas até então engendradas permitem
vislumbrar que o sentido primordial que se atribui a uma ação voltada
para a permanência do estudante na Universidade, mediada pela construção de sua identidade, desenvolvimento e qualificação implica
interações sociais nela entremeadas, o que, por sua vez, pode convergir
à noção de acolhimento. Conceitua-se acolhimento como uma ação
pedagógica, nos espaços educativos formais e informais, que envolve
atitudes de estabelecer vínculos significativos com o sujeito nas relações que aí se impõem. Nesse sentido, representa a inclusão das diferenças, numa perspectiva multicultural de conhecimentos prévios, para
um trabalho intercultural e intersubjetivo de construção participativa do
conhecimento, voltando-se para a formação de sujeitos reflexivos, participantes, autônomos e transformadores da sociedade.
Esta proposta solicita concepções de construção do conhecimento e
da inserção social do sujeito, o que inclui a percepção da realidade, a formação da consciência, a atitude participativa e o desenvolvimento da autonomia. Segundo Piaget (1991, p. 105), “os conhecimentos nunca derivam
exclusivamente da sensação ou da percepção, mas também de esquemas
de ações. (...) a própria percepção não consiste numa simples leitura dos
dados sensoriais, mas comporta uma organização ativa”.
O papel da universidade frente à formação do sujeito social, além
de profissional, implica necessariamente essa perspectiva construtora e
cooperadora do conhecimento. É nesse contexto que se pode dizer que
a formação acadêmica está intimamente ligada à dialética do saber, por
intermédio da qual se configura “um caminho que parte de uma visão
abstrata de um objeto de estudo até sua assimilação na concretude”
(Kosik, 1998, p. 11).
O caminho a que o autor acima citado se refere indica construção para a atitude de reflexividade, de percepção e de apropriação da
realidade, que possibilita a ruptura dos estereótipos e das conclusões
prontas, favorecendo a criação de novas ações e relações no mundo
concreto.
O conceito de acolhimento está estreitamente vinculado a essa
concepção de educação, numa atitude de dialogicidade e de
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Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tamara Polenz e Tania Scuro
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disponibilização; de aceitação do outro sem pré-julgamentos ou preconceitos; de entendimento sobre as subjetividades, conforme estas diferenças se apresentam; de negociação e de encaminhamentos que podem oferecer alternativas ou redirecionamento das questões, problemas, dúvidas e /ou conflitos.
O desenvolvimento da competência dialógica faz-se preponderante para criação de gestão acolhedora, considerando-se todas as instâncias em que ocorrem as relações na Universidade.
Para tanto, propõe-se a construção de um programa de ações que
se vincule à conceituação decorrente da compreensão da realidade, conforme análise das respostas obtidas dos alunos de graduação em 2005 (na
pesquisa “Evasão x Permanência: ressignificando a vida acadêmica”).
A concretização de um trabalho desse caráter envolve toda a
comunidade acadêmica, momento em que é preciso construir parcerias
com setores que abrangem a universidade nas diversas gestões que a
representam. Propõe-se, para isso, a construção de um programa de
gestão com ações que possam ser desenvolvidas em parcerias numa
perspectiva interdisciplinar. As expectativas em relação a essa finalidade centram-se na mobilização da comunidade educativa para empreender a compreensão das variáveis que interferem na permanência dos
estudantes na instituição e na construção e desenvolvimento do referido programa, integrando-se em ações conjuntas que promovam mudanças no contexto acadêmico, o que implica o desenvolvimento de
“Gestão Acolhedora”.
Para a continuidade e aprofundamento das proposições referidas, quer-se, num primeiro momento, buscar aproximações com a identidade do aluno da Ulbra. Isso significa saber sobre a cultura, a linguagem e o contexto sociohistórico que são constitutivos desta identidade,
que se revela multicultural. Tal conhecimento pode proporcionar ao processo de “Gestão Acolhedora” elementos para a sua intensificação e
aprimoramento.
O programa “Gestão Acolhedora” envolve, no prisma sintético,
ação construtora do conhecimento que se vincula a uma concepção de
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acadêmica
processo e de participação. Esta concepção educativa trata da questão
da interdisciplinaridade, cujo conceito é desenvolvido a seguir.
Na ótica deste estudo, entende-se interdisciplinaridade como
uma ação que se processa pelo diálogo entre as diferentes áreas do
saber, a partir do reconhecimento das suas diferenças. Essa ação tem
na vivência e na compreensão da realidade o seu campo de investigação numa dinâmica de relação entre teoria e prática.
Conforme Polenz (2000, p. 35-42), o conceito de interdisciplinaridade
implica diferentes dimensões, iniciando pelo desvelamento da realidade
numa perspectiva dialógica entre as diferentes áreas de conhecimento,
constituindo processo de crescimento pessoal e grupal, o que ocorre na
relação entre teoria e prática, com vistas à transformação.
Dessa forma, entende-se que a atitude do sujeito frente ao objeto
no processo de conhecimento é a busca pelo significado desse objeto
em sua vida real. O significado tem que ser buscado na realidade concreta. Pela reflexão, pode ser problematizado, permitindo a sua apropriação e transformação. Em uma ação pedagógica interdisciplinar, esse
processo é desencadeado em uma situação de diálogo e na relação
com os outros.
Essa concepção de trabalho pedagógico implica necessariamente uma atitude ativa do sujeito que o está conhecendo. Questionar,
problematizar, indagar são instrumentos importantes nesta construção.
Existe um movimento em que os diferentes aspectos da realidade se
articulam e interferem uns nos outros. A reflexão crítica busca perceber as contradições, estabelecer relações entre o que está claro e o que
está obscuro, entre o que foi dito e o que foi calado, entre o que é
anunciado e o que é feito.
É neste contexto que se pode dizer que a interdisciplinaridade
está intimamente ligada ao método dialético do saber. A tarefa de aprender
trata de descobrir as relações que determinam a forma como os fatos
se manifestam. A ênfase é dada ao processo de busca do conhecimento. A interdisciplinaridade pode constituir uma metodologia na qual se
criam espaços para encontros sistemáticos e continuados em que se
possa estudar, discutir e trocar idéias sobre suas percepções e convic-
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Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tamara Polenz e Tania Scuro
Mendes
ções, problematizando a realidade para construir, assim, um fazer-pensar pedagógico integrado e significado pelos sujeitos aprendentes.
Ao refletir a prática cotidiana, o grupo de interação insere-se no
contexto dessa realidade e analisa, por meio de um diálogo intercultural,
as diferentes relações que a permeiam, percebendo, com maior clareza, as contradições a ela inerentes e que bloqueiam as interações pedagógicas voltadas para o crescimento e para a transformação.
Assim, o processo implícito na ação interdisciplinar torna-se construção, tanto do conhecimento quanto do sujeito.
SÍNTESE DAS CONSIDERAÇÕES TECIDAS
O estudo descrito neste artigo trata da construção continuada de
ações conjuntas envoltas em um trabalho que está em desenvolvimento
na realidade da Universidade Luterana do Brasil, constituindo um “Programa de Gestão Acolhedora”.
Busca-se apoio na análise da perspectiva histórica e
socioeducacional, numa abordagem intercultural e intersubjetiva, que
desvendam as categorias: identidade, qualificação e desenvolvimento,
para a compreensão do contexto educativo. O estudo tem por finalidade conhecer a identidade do aluno em suas múltiplas características,
para pensar coletivamente os espaços em que estas identidades possam se desenvolver no universo acadêmico, visando à formação do
sujeito social, além do profissional. O conceito de acolhimento traduzse como ação pedagógica nos espaços educativos envolvendo atitudes
desencadeadas por esforços em estabelecer vínculos significativos com
o sujeito nas relações que ali se estabelecem. Representa a inclusão
das diferenças numa perspectiva multicultural de conhecimentos prévios, voltando-se à construção participativa do conhecimento que implica
relações interdisciplinares.
Transitando nas tramas dessas relações teóricas, as práticas
mobilizam novas direções, e o caminho investigativo prossegue.
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acadêmica
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PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO COMO
INSTRUMENTO DE GESTÃO ESCOLAR
Cátia Deniana Firmino Perfeito1
Resumo / Abstract
O presente artigo visa a destacar a importância da elaboração e da implementação do planejamento estratégico como
instrumento de gestão escolar, capaz de orientar o gestor na
realização de um trabalho sistematizado, direcionando a instituição a efetivar seus objetivos. Destaca, brevemente, a relevância do planejamento para gestão, apresenta a origem e a
evolução do conceito de planejamento, expõe definições e
esclarece acerca dos aspectos fundamentais do planejamento
estratégico.
The present article aims at to detach the importance of
the elaboration and the implementation of the strategic
planning, as instrument of school administration, capable to
guide the manager in the accomplishment of a systemize work,
directing the institution to accomplish its objectives. It
detaches, briefly, the relevance of the planning for
management, presents the origin and the evolution of the
planning concept, displays definitions and clarifies
concerning the basic aspects of the strategic planning.
Palavras-chave / Key words
Planejamento, gestão escolar, planejamento estratégico.
Planning, school administration, strategic planning.
1
Aluna especial do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Católica de
Brasília, Professora do Ensino Fundamental da Secretaria de Estado de Educação do
Distrito Federal. [email protected]
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Planejamento estratégico como instrumento de gestão escolar
I INTRODUÇÃO
Uma das principais características da sociedade do final do século passado e início deste século é a intensidade das mudanças e das
transformações. A globalização da economia, os avanços da tecnologia
e das comunicações têm promovido grandes mudanças na sociedade e
no mundo dos negócios. Tais fenômenos influenciaram tanto o mercado
mundial quanto a demanda por força de trabalho, respaldados pelos
ditames do capital.
As instituições de ensino, a exemplo de outras organizações sociais, estão inseridas neste contexto de mudanças, muitas delas inesperadas ou imprevisíveis, desafiando seus administradores. Para enfrentar os problemas advindos desse contexto dinâmico e competitivo, os
gestores estão usando de forma crescente o planejamento estratégico.
O planejamento constitui uma função gerencial relevante em que a instituição projeta-se para o futuro, delineando uma programação na qual
os objetivos são definidos, estratégias são estabelecidas e recursos são
alocados visando à sua implementação. Na prática, este processo se
reveste de grande complexidade, ocorrendo uma distância entre o processo de elaboração e sua implementação nas instituições.
O objetivo deste artigo é examinar a importância da elaboração e
da implementação do planejamento estratégico como ferramenta
gerencial, para que as instituições de ensino destaquem-se no ambiente
dinâmico e competitivo em que atuam.
II GESTÃO ESCOLAR E PLANEJAMENTO
Diante do cenário de mudanças e incertezas, os estudiosos e
teóricos vêm recolocando a dinâmica do funcionamento da escola no
centro de suas preocupações. Isto porque se reconhece que a educação, numa sociedade globalizada e numa economia centrada no conhecimento, constitui valor estratégico para o desenvolvimento de qualquer
sociedade. Assiste-se, desta maneira, a um esforço coletivo de compreender a relação escola-sociedade e entender como decisões inter-
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Cátia Deniana Firmino Perfeito
nas à instituição escolar podem capacitar melhor os que atuarão na
realidade social.
Nesta perspectiva, a qualidade de ensino apresenta-se com a
mesma importância da democratização das oportunidades de acesso à
escola. Ao mesmo tempo, a gestão das escolas e dos sistemas de ensino é considerada fundamental para superar os obstáculos políticos e
técnicos, com objetivo de melhorar a qualidade educativa.
Segundo Nóbrega (2005, p. 32), as estratégias que visam à
melhoria da qualidade educativa são resultado do processo de reforma
do Estado, apresentando configurações que dizem respeito à organização dos sistemas de ensino. Tais reformas ocorrem sob a influência do
neoliberalismo com a sua proposta de um Estado enxuto, que minimiza
as políticas públicas. Dessa forma, nos anos 90, o foco da política educacional engloba tanto o acesso quanto a qualidade da permanência do
aluno, considerando que os recursos financeiros investidos na educação eram suficientes, todavia inadequadamente empregados. Sob esta
ótica, as políticas de gestão da educação foram sendo estruturadas buscando garantir a otimização dos recursos e uma racionalização das ações
administrativas.
Nesse contexto, a gestão é colocada como ponto central no processo de mudança dos sistemas educacionais. Todavia a centralidade
dada à gestão não se refere apenas às esferas organizadoras do sistema educacional, mas também ao interior de cada unidade de ensino em
que são elaboradas propostas em prol da autonomia e da
descentralização. Constata-se, então, que o termo gestão alcança um
lugar de destaque no meio acadêmico, nos movimentos sociais, no interior das escolas e no discurso governamental. Esse processo também
foi resultado do movimento dos educadores que solicitavam maior poder de decisão, melhores salários, capacitação, melhores condições de
trabalho, salários dignos e, sobretudo, uma escola democrática e de
qualidade.
Para Lück (2000a, p. 7), a gestão escolar constitui um caráter de
atuação que objetiva promover a organização, a coordenação, a
mobilização e a articulação de todas as condições humanas e materiais
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Planejamento estratégico como instrumento de gestão escolar
na escola, com o intuito de garantir o avanço dos processos
socioeducacionais da instituição de ensino, orientadas para o desenvolvimento de cidadãos capazes de enfrentar adequadamente a sociedade
globalizada. Entende-se, dessa forma, que o objetivo final da gestão
escolar é a aprendizagem efetiva e significativa dos alunos.
Ao se discutir a gestão numa perspectiva escolar, imediatamente
pensa-se no responsável por conduzir os processos administrativos e
pedagógicos da instituição de ensino: o diretor. A ele cabe articular a
diversidade para dar-lhe unidade e consistência na construção do ambiente educacional e promover a formação dos alunos.
O maior desafio no que se refere à gestão escolar diz respeito à
qualificação do gestor. De acordo com Pazeto (2000, p. 163), o modelo
e o processo de qualificação dos atuais gestores estão baseados em
parâmetros tradicionais de administração, com predomínio das leis e do
comando a partir de decisões centralizadas na instância superior. Tal
parâmetro não comporta as novas demandas institucionais e sociais,
segundo as quais a gestão da educação assume um papel de desenvolvimento institucional, social e humano.
A sociedade atual requer um diretor que não seja meramente um
tutelado dos órgãos centrais, mas uma pessoa dinâmica, capaz de gerir
eficazmente a instituição. E uma gestão eficaz está alicerçada nos pilares da autonomia2, da liderança do diretor, da participação da comunidade e da existência de recursos sob controle local.
Diante das atuais demandas, exige-se uma profunda revisão da
formação dos gestores educacionais. Segundo Pazeto (2000, p. 165),
recomenda-se uma formação básica sólida em educação, com domínio
das ciências que lhe dão fundamentação, conhecimento científico e técnico em gestão de instituições e formação continuada, visando à associ-
2
Cf. Lück, Heloisa. A aplicação do planejamento estratégico na escola. Gestão em
Rede, Brasília, n. 19 , p. 8-13, abr. 2000. “Autonomia, no contexto da educação,
consiste na ampliação do espaço de decisão, voltada para o fortalecimento da escola
como organização social comprometida com a sociedade, tendo como objetivo a
melhoria da qualidade do ensino” (p. 21).
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Cátia Deniana Firmino Perfeito
ação entre conhecimentos e experiências. O conhecimento científico e
técnico em gestão envolve a capacidade de colocar em prática princípios básicos de administração: planejar, coordenar, dirigir, controlar e
avaliar.
Um dos princípios básicos da administração que vem merecendo
maior atenção das instituições de ensino é o planejamento. Planejar
implica um comprometimento com a ação. O planejamento só tem
significância quando é implementado e avaliado de acordo com a consecução de seus objetivos; caso contrário, resumir-se-á a uma coletânea de intencionalidades que não trazem benefícios reais à organização.
Um dos grandes desafios da gestão das instituições de ensino é
desenvolver uma maior capacidade de resposta às demandas externas.
Para isso, é necessário que seus gestores sejam capazes de utilizar
diferentes abordagens de planejamento, a fim de que as instituições
possam atingir seus objetivos e cumprir sua missão.
III ORIGEM E EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE
PLANEJAMENTO
O planejamento sempre foi um instrumento importante para o
ser humano, em qualquer setor da vida em sociedade: na empresa, em
casa, no governo e também na escola. Planejar torna possível estabelecer o que queremos a curto, médio e longo prazos; antecipar situações;
organizar as atividades; estabelecer prioridades; avaliar. Entretanto, no
setor empresarial, o movimento de planejar as ações para se chegar
aos fins da instituição decorreu de mudanças ambientais, num lento
processo.
De acordo com Tavares (2000, p. 21), as primeiras contribuições
para a construção da teoria sobre planejamento surgiram em 1904, por
meio da primeira consultora de empresas norte-americana Mary Parker
Follet. Mas foi com Taylor e Fayol, ao estudarem o fenômeno
organizacional, que surgiu na literatura a noção de planejamento.
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Planejamento estratégico como instrumento de gestão escolar
A revolução industrial deu origem ao estudo sistemático do trabalho
e dos princípios da organização e do planejamento. Taylor, pai da administração científica, dedicou-se ao estudo do fenômeno da produtividade da
organização, concluindo pela distinção entre as funções de direção das funções de execução. Foi ele quem substituiu o planejamento empírico pelo
planejamento que interviesse como função de direção e como instrumento
de organização e padronização do trabalho, sendo uma função que caberia
aos diretores. Taylor foi o precursor da análise interna como elemento do
processo de planejamento estratégico.
Fayol, por sua vez, estudou o fenômeno da produtividade, partindo das diversas funções estruturais. Segundo Arguin (1988, p. 17), a
função de planejamento foi chamada por Fayol de previsão, aparecendo no primeiro plano do processo administrativo: prever, organizar, comandar e controlar. Prever significa sondar o futuro e supõe a determinação do fim e dos meios para alcançá-lo. A previsão de Fayol prefigura
os elementos de planejamento estratégico que se encontram na literatura contemporânea.
O processo administrativo de Fayol foi retomado por diversos
autores, tornando-se um quadro de referência para explicar a função
administrativa no interior da organização. Cabe destacar que o planejamento aparece como elemento principal do processo, definindo-se em
termos de fins e meios para atingir os objetivos da organização. Arguin
(1988) apresenta o modelo administrativo para definir a tarefa do presidente dos Estados Unidos, que se refere às seguintes atividades:
PLANNING: fazer o plano das coisas a executar e propor os
métodos para atingir os fins da organização.
ORGANIZING: estabelecer as estruturas formais da autoridade,
com seus diferentes níveis.
STAFFING: recrutar o pessoal e criar condições favoráveis de
trabalho.
DIRECTING: dirigir a empresa pelo processo contínuo de tomada de decisão.
COORDINATING: relacionar em um todo harmônico as diversas
atividades do plano de ação.
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REPORTING: informar aos intermediários por meio de relatórios.
BUDGETING: realizar as diversas atividades: o planejamento
financeiro, a contabilidade e a verificação (p. 18).
Este modelo, que à primeira vista parece simplista, tornou-se referência para diversos autores. Todavia ele foi criticado por apresentar
um caráter estático, uma vez que analisava as condições para assegurar a eficiência de uma organização, abandonando o aspecto dinâmico
e criativo que envolve o processo de planejamento.
Nos últimos anos da década de 1960, autores como H. Igor Ansoff
(1965) se interessaram pelo aspecto dinâmico e estratégico da organização, analisando o ambiente externo como um elemento que influenciava o alcance dos objetivos traçados. Esse enfoque foi continuado nos
anos 1970 e 1980 por autores como Vancil e Lorange (1975), Hofer e
Schendel (1978).
De acordo com Tavares (2000, p. 22), estudiosos como Gluck,
Kaufman e Walleck (1981) analisaram o processo de planejamento e
constataram elementos comuns que permitiram traçar a seguinte evolução do processo: planejamento financeiro, planejamento a longo prazo, planejamento estratégico e gestão estratégica. Cada etapa
categorizada engloba elementos às contribuições da anterior num movimento de eliminação das distorções.
Nas décadas de 1950 e 1960 predominou o chamado planejamento financeiro, que tinha no orçamento o principal instrumento de
controle e operacionalização da gestão. Na década de 1970 vigorou o
planejamento a longo prazo que priorizou os objetivos a serem alcançados em prazos longos, entretanto não previa mudanças. Na década de
1980, privilegiou-se o planejamento estratégico que definia estratégias
que se desenvolveriam num período de tempo variável, considerando a
análise dos ambientes externo e interno. O principal problema desse
tipo de planejamento foi a dissociação entre o planejamento e sua
implementação. Finalmente, na década de 1990 surgiu a gestão estratégica, diferenciando-se pela abordagem equilibrada de todos os recursos
da organização para consecução de seus fins.
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Gradualmente, as universidades passaram a se preocupar com o
planejamento de suas ações. Inicialmente, o planejamento caracterizava-se por ser de longo prazo, de 5 a 10 anos. Posteriormente, o movimento de planejamento estratégico atinge as universidades, tendo como
principais pesquisadores e defensores Robert Cope (1978) e Robert
Shirley (1979).
O planejamento estratégico, segundo Arguin (2000, p. 20), supõe
que o sistema universitário é um sistema aberto e dinâmico, sensível ao
ambiente externo. Diante disso, o planejamento se torna um processo
continuado, centrado na qualidade das intervenções, a partir da análise
de dados quantitativos e qualitativos do ambiente interno e externo.
Diferentemente, a abordagem do planejamento convencional estabelece que a instituição superior de ensino é um sistema fechado que permite a elaboração de um planejamento definitivo, de acordo com dados
quantitativos do ambiente interno.
IV PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO
Como foi mencionado, o meio universitário incorporou, aos poucos, o conceito de planejamento estratégico como importante instrumento da gestão. Tornou-se um elemento que orienta os gestores a
pensarem nos aspectos essenciais e a concentrarem esforços nos assuntos de relevância, para que a instituição possa enfrentar as ameaças
e aproveitar positivamente as oportunidades de seu ambiente.
Do grego stratégos, que significa “general”, e tem, portanto, conotação
militar, o planejamento estratégico é assim definido por Arguin (2000):
(...) é um processo de gestão que apresenta, de maneira integrada, o aspecto futuro das decisões institucionais, a partir da formulação da filosofia da instituição, sua missão, sua orientação,
seus objetivos, suas metas, seus programas e as estratégias a
serem utilizadas para assegurar sua implantação (p. 23).
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Esse processo é expresso de acordo com a estrutura da organização, com sua cultura, com a tecnologia disponível e, como acima
citado, tendo em conta o ambiente a partir de uma reflexão sistemática
sobre a instituição que gerará dados quantitativos e qualitativos capazes
de orientar as decisões.
Dessa forma, o planejamento estratégico é um processo que parte
da realidade complexa e dinâmica da organização, envolvendo a tomada de decisão nas diversas etapas que o compõem. Segundo Lück (2000b,
p. 12), as etapas de elaboração do planejamento podem ser assim descritas: análise do ambiente interno e externo; diagnóstico; definição da
missão, da visão de futuro e valores; objetivos estratégicos; plano
operacional; questões estratégicas; metas; plano de ação e controle.
1 Análise do ambiente interno e externo
A partir do momento em que se decide por utilizar o planejamento estratégico como ferramenta de gestão, deve-se sensibilizar a equipe
que participará do processo de elaboração e de implementação. O comprometimento dos envolvidos é fundamental para que o planejamento
não se torne algo meramente burocrático. A sensibilização envolve
mostrar à equipe a necessidade de tal planejamento, suas vantagens e o
papel de cada um na sua elaboração e implementação. Após esse momento, inicia-se o processo de análise do ambiente interno e externo.
A análise é feita de maneira interativa, identificando suas possibilidades e cenários, por meio de bases conceituais que apresentem um
referencial para compreensão da realidade, utilizando, para isso, a coleta de dados quantitativa e qualitativa. A análise do ambiente externo
envolve o processo de identificação de oportunidades, ameaças, forças
e fraquezas que afetam a organização no cumprimento de sua missão.
E, do interno, objetiva evidenciar as deficiências (pontos fracos) e as
qualidades (pontos fortes), com o intuito de estabelecer quais são os
aspectos que tornam a instituição única no mercado.
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2 Diagnóstico
É a avaliação real da posição da instituição. Nesta etapa são
considerados os aspectos internos e externos a partir dos dados consistentes levantados durante a análise do ambiente interno e externo.
3 Definição da missão, visão de futuro e valores
A missão de uma empresa refere-se às suas finalidades históricas, jurídicas e sociais. É uma declaração sobre sua razão de ser, estabelecendo seu propósito e seu horizonte de atuação. Serve de critério
geral para orientar a tomada de decisões, para definir objetivos e auxiliar na escolha das decisões estratégicas.
A visão de futuro representa um estado futuro desejável da organização, indicando como esta pretende ser reconhecida. É uma projeção das oportunidades futuras da organização e uma concentração de
esforços na sua busca.
Os valores são idéias fundamentais em torno das quais a organização foi construída. Representam as convicções dominantes e as crenças. São elementos motivadores que direcionam as ações das pessoas
da organização, contribuindo para a unidade e coerência do trabalho.
4 Objetivos estratégicos
São os resultados quantitativo ou qualitativo que a organização
precisa alcançar em um prazo determinado, no contexto de seu ambiente, para concretizar sua visão de futuro e sua missão.
5 Plano operacional
O plano operacional define detalhes da operação do negócio, tais
como: o número de pessoas, a sua capacitação técnica, as tarefas a
executar, os procedimentos e tudo que possa ser planejado para garantir a qualidade dos processos.
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6 Questões estratégicas
As questões estratégicas permitem conduzir a instituição da posição que ocupa para outra que corresponda aos objetivos desejados.
Definir estratégias significa traçar caminhos necessários para o alcance das metas.
7 Metas
São quantificadores dos objetivos e permitem melhor alocação
de recursos, na medida em que se constituem um padrão de referência
para o planejamento.
8 Plano de ação
Implementa as estratégias por meio de instruções claras, estabelecendo-se o quê, como, quem será o responsável, quanto custará e o
cronograma a ser seguido.
9 Controle/avaliação
Deverá ser freqüente para conferir se as ações estão sendo executadas. Esta é a fase em que são medidos os desempenhos, checados os
orçamentos, obtidas e analisadas as informações de cada responsável, apresentadas medidas para correção de rumo, caso seja necessário.
Na empresa privada, o planejamento estratégico está voltado para
as mudanças nas atitudes e atividades empresariais que dizem respeito
à conquista de maior competitividade e melhor desempenho. Procurase assegurar o aumento da posição da organização no mercado, melhoria
dos níveis de satisfação dos clientes e maior rentabilidade. Numa universidade pública, o planejamento estratégico não está voltado à busca
do produtivismo. Espera-se que a instituição passe por mudanças que
atendam aos seus objetivos de expansão, sua liderança acadêmico-científica na região, no país ou no mundo; isto é, busca-se o aumento da
eficiência social e melhoria do desempenho da universidade.
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Planejamento estratégico como instrumento de gestão escolar
V CONCLUSÃO
Neste artigo, procurou-se destacar a importância do planejamento, evidenciando-o como uma ferramenta útil à gestão das instituições.
Foi apresentado o conceito de planejamento estratégico e foram descritas etapas relevantes para elaborá-lo.
Historicamente, o planejamento tem sido elaborado numa perspectiva burocrática, envolvendo o preenchimento de formulários, as
reproduções de anos anteriores e o atendimento às orientações de instâncias superiores do sistema de ensino de forma acrítica. O planejamento encarado como uma obrigação burocrática em nada contribui
para que a instituição escolar atinja um grau de excelência. Ele deve
ser encarado como um instrumento fundamental e dinâmico da gestão,
capaz de orientar as ações rumo ao alcance dos objetivos delineados.
Nesse sentido, a gestão também deve assumir uma função de
destaque no interior das instituições. Segundo Pazeto (2000, p.166), a
gestão das instituições de ensino é uma atividade que desafia seus gestores, uma vez que a cultura da organização apresenta ritmos próprios,
os quais exigem do administrador uma fundamentação teórica consistente, associada à flexibilidade e atenção à realidade. Deve-se considerar, ainda, a capacidade de liderar e coordenar o processo de alinhamento da missão, das políticas da instituição e dos diferentes tipos de
planejamento.
A gestão centrada na competência técnica e teórica do gestor
constitui fator determinante para que a instituição escolar possa oferecer uma educação de qualidade, comprometida com a formação de
homens e mulheres competentes, capazes de intervir positivamente na
sociedade na qual estão inseridos.
60
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 49-61, jan./dez. 2007
Cátia Deniana Firmino Perfeito
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Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 49-61, jan./dez. 2007
61
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: UM MODELO
ACADÊMICO1
Pedro Ronzelli Júnior2
José Augusto Pereira Brito3
Solange Giardino4
Resumo / Abstract
O objetivo do trabalho é apresentar o processo estratégico
e metodológico da implantação do ensino a distância (EaD)
para a Universidade Presbiteriana Mackenzie, de acordo com
as exigências do Ministério da Educação, incluindo a análise
estratégica do mercado e da infra-estrutura disponível na Instituição. O plano elaborado inclui o ambiente virtual de ensino-aprendizagem, as plataformas, a formação de professores,
a montagem dos pólos, o modelo dos cursos, a sistemática de
participação e a descrição dos integrantes da equipe.
The objective is to present the strategic and
methodological process of the e-Learning implantation at
Universidade Presbiteriana Mackenzie, according to the
Brazilian Education Ministry exigencies, including
marketing and infra-structure strategies analyses available
1
2
3
4
Parte da monografia dos autores apresentada no Curso de Estratégia e Gestão de EaD
da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, SP, 2007.
Engenheiro Agrônomo, Mestre e Doutor em Fitotecnia, Especialista em Gestão e
Liderança Universitárias, Especialista em Estratégia e Gestão de EaD, Vice-Reitor da
Universidade Presbiteriana Mackenzie. [email protected]
Engenheiro Civil, Mestre em Engenharia e Doutor em Ciências da Comunicação,
Especialista em Engenharia de Computação e em Estratégia e Gestão de EaD, Gerente de Tecnologia da Informação do Instituto Presbiteriano Mackenzie.
[email protected]
Psicóloga; Mestranda em Educação, Arte e História da Cultura; Especialista em
Estratégia e Gestão de EaD; Coordenadora de EaD do Instituto Presbiteriano
Mackenzie. [email protected]
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 65-83, jan./dez. 2007
65
Educação a distância: um modelo acadêmico
at the Institution. The plan elaborated includes the virtual
environment for learning management systems, platforms,
professors training, poles set up, courses framework,
participation model, and team description.
Palavras-chave / Key words
Educação a distância (EaD), formação de professores, ambiente virtual de aprendizagem.
E-learning, teachers formation, learning management
system.
1 INTRODUÇÃO
A educação a distância (EaD) é uma modalidade educacional prevista no art. 80 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) –
Lei nº 9.394/1996. Caracteriza-se como a modalidade educacional na qual
a mediação didático-pedagógica, nos processos de ensino e aprendizagem,
ocorre com a utilização de meios e Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs), em que os estudantes e professores desenvolvem
atividades educativas em lugares e/ou tempos diversos (art. 1º do Decreto
nº 5.622/2005). O aluno terá contato com tutores virtuais e realizará parte
das atividades previstas nas disciplinas por meio das TICs.
2 A INSTITUIÇÃO
A semente foi a escola fundada em 1870 pelo casal de missionários americanos Reverendo George Witherhil Chamberlain e Sra. Mary
Annesley Chamberlain, na casa deles, acomodando três alunos, sendo
professora a própria Sra. Chamberlain. A pequena escola cresceu e,
em 1896, nasceu o Curso Superior de Engenharia, vinculado à Universidade do Estado de Nova York [State University of New
York (SUNY) – www.suny.edu]. Surgia o Mackenzie College, denominação utilizada até a obtenção da autonomia acadêmica, em 1927.
Em 1952 foi instalada a Universidade Mackenzie, integrada pela
Escola de Engenharia; Faculdade de Arquitetura; Faculdade de Filoso66
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 65-83, jan./dez. 2007
Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
fia, Ciências e Letras e Faculdade de Economia. Em 1997 foi explicitada
a identidade confessional, passando a ser denominada Universidade
Presbiteriana Mackenzie (UPM).
Com 137 anos de tradição, pioneirismo e alto padrão de ensino,
completados em outubro de 2007, a Instituição Mackenzie continua na
busca incessante de seus desígnios educacionais, aprimorando os cursos existentes e oferecendo novas opções de acordo com a exigente
demanda do mercado de trabalho globalizado.
3 EXPERIÊNCIAS EM EDUCAÇÃO VIRTUAL
Desde 2003 os recursos virtuais das novas TICs passaram a ser
utilizados em larga escala nos Colégios Presbiterianos Mackenzie. Assim,
surgiu no Mackenzie o portal eMack (www.emack.com.br), um canal
permanente de informação, comunicação e serviços educacionais digitais para a integralidade de alunos, pais e professores, além de ser aberto para outros membros da comunidade.
Esta metodologia de ambiente e serviços virtualizados já está
bem consolidada, sendo o Projeto eMack o vencedor do Prêmio eLearning Brasil 2006, na Categoria Educacional Gold. O eMack
complementa a sala de aula, possibilitando o acesso a serviços como,
por exemplo: boletim e acompanhamento escolar diário; agenda de tarefas e eventos; pergunte ao professor; conteúdo segmentado por série
e canal de comunicação por intermédio de ambiente de aprendizagem
colaborativa, na qual são disponibilizados textos complementares, listas
de exercícios, biblioteca digital, bases de dados digitais, avaliações, conteúdo de simulados e websites comentados.
O sucesso do Projeto eMack contribuiu para que a Instituição
continuasse a fazer os investimentos sistemáticos em educação virtual,
considerando o Planejamento Estratégico e suas diretrizes, que são
atualizados a cada dois anos. Dessa forma foram iniciadas as ações na
Universidade, dando vida ao Mackenzie Virtual (MackVirtual), que acolhe tanto a Educação Distribuída (ações virtuais complementares às
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Educação a distância: um modelo acadêmico
presenciais) quanto a EaD, ambas de significativa importância para os
projetos de ensino: presencial e/ou virtual.
O Projeto MackVirtual foi iniciado, ainda sem esse nome, no ano
de 2000, contando com ações pontuais em algumas áreas da UPM.
Em 2005, a reitoria assumiu o processo de implantação. Nesse momento, o projeto foi revisto, em ação conjunta com a Divisão de
Tecnologia da Informação (DTI) da Entidade Mantenedora da UPM,
para efetiva utilização nas mais variadas dimensões.
O MackVirtual compreende um espaço interativo on-line, disponível para apoio aos cursos regulares da Instituição, e ainda comporta
as novas demandas para educação virtual do modelo EaD. Destacamse, entre outras, as seguintes funcionalidades:
• Gestão de disciplinas com, pelo menos, programa, professores, objetivos, metodologia, critérios de avaliação e bibliografia;
• Disponibilização de conteúdos didáticos, como apresentações,
textos complementares, notas de aula, artigos, casos, exercícios, trabalhos, tutoriais, vídeos e simulações;
• Controle de postagem de arquivos, tanto de entrega parcial
ou final de trabalhos quanto de compartilhamento para ações
em grupo;
• Comunicação eletrônica assíncrona e síncrona, como páginas
de avisos, listas de e-mail, fóruns de discussão, chats, salas
de aulas virtuais, diálogos, wikis, blogs e glossários;
• Avaliação on-line contemplando, entre outros, questões com
feedback automático, autocorreção e publicação individualizada de notas.
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
4 PÚBLICO-ALVO
A estratégia de enfoque para a oferta dos cursos na modalidade
EaD, nos quais há predominância de ações virtuais, difere da educação
preferencialmente presencial, em face do perfil do alunado. O aluno
dos cursos de EaD, em geral, é mais velho e mais comprometido com a
atividade fim, o que representa uma das razões essenciais para o sucesso desse modelo.
A Instituição busca a qualidade no ensino-aprendizagem, padrão
associado à sua “Tradição e Pioneirismo na Educação”; assim, prepara-se para atender à demanda do mercado emergente. Nessa busca,
outras variáveis deverão ser levadas em consideração, tais como tipo,
duração e custo dos cursos, pólos regionais e outras.
5 ANÁLISE ESTRATÉGICA
A análise estratégica, ou análise de Strengths, Weaknesses,
Opportunities and Threats (SWOT), que corresponde aos Pontos Fortes, Pontos Fracos, Oportunidades e Ameaças, foi essencial para a definição do curso inicial e de outros procedimentos que levaram à decisão por utilizar a modalidade de EaD na UPM. É importante voltar a
destacar que o Planejamento Estratégico da Instituição contempla as
ações direcionadas para EaD, definindo claras diretrizes para a consecução dos objetivos propostos.
A tradição centenária do Mackenzie é o seu principal Ponto Forte. As ações educacionais têm sido pioneiras e inovadoras. Além disso, a Instituição tem sede com localização privilegiada, no centro da
cidade de São Paulo; é Instituição comunitária e filantrópica, sem fins
lucrativos; oferece bolsas de estudo parciais ou totais para alunos avaliados como carentes; preocupa-se com a formação “para a vida”, ou
seja, o aluno não é considerado como um mero “cliente”. O Mackenzie
mantém vínculo com o antigo aluno e sua família, por meio do projeto
“Prá Sempre Mackenzista” (www.mackenzista.com.br).
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69
Educação a distância: um modelo acadêmico
Ainda como Pontos Fortes da UPM, há que se destacar a Biblioteca Virtual, em franco crescimento, que disponibiliza, via internet, as
principais bases de dados nacionais e internacionais; o corpo docente
bem preparado, tanto do ponto de vista da formação acadêmica quanto
de treinamento para a EaD, com base na moderna infra-estrutura
tecnológica, com recursos especializados e atualizados de hardware e
software, ou seja, ambiente de Learning Management System (LMS)
bem consolidado; Sistema de Gestão Acadêmica próprio, facilmente
adaptável pela equipe interna da DTI para as novas demandas de ensino on-line e EAD; a participação na Associação Nacional de Escolas
Presbiterianas (Anep), uma rede de mais de duzentas escolas, em todo
o território nacional, que são pólos potenciais para as ações de EaD da
UPM.
A oferta de cursos essencialmente presenciais, até o momento, é,
sem dúvida, o principal Ponto Fraco. A este se associam como Pontos
Fracos a baixa cultura dos docentes para as ações na modalidade de EaD,
o que tem exigido forte investimento da Entidade Mantenedora em atualização pedagógica, mediada pelas novas TICs, e a necessidade de capacitar a secretaria acadêmica para a gestão de cursos de EaD.
São identificados como Oportunidades: o aproveitamento estratégico da utilização das novas TICs, permitindo novo alcance geográfico no País, e fora dele (anywhere, anytime), em qualquer lugar, a qualquer tempo, extrapolando as restrições típicas dos campi para ampliar
a oferta de novos cursos e/ou novas vagas, uma vez que não precisa de
expansão física proporcional àquela da modalidade essencialmente
presencial; a demanda latente de alunos para cursos de lato sensu,
permitindo, inclusive, a expansão da captação de alunos de quaisquer
regiões do Brasil; o atendimento à demanda por cursos de treinamento
corporativo, lato sensu e extensão, associados a empresas e universidades corporativas: resposta rápida às mudanças crescentes na
metodologia de ensino-aprendizagem presencial em oferta, melhorando
e enriquecendo as práticas pedagógicas atuais, aproveitando para gerar
novos conhecimentos e a utilização da “Marca Mackenzie” como garantia de qualidade e credibilidade dos cursos ofertados em EaD, uma
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
vez que a UPM poderá ocupar seu espaço (market share) na oferta
de cursos em EaD no mercado brasileiro.
A velocidade de mudanças das tecnologias evidencia um cenário
com variáveis de características imprevisíveis e inevitáveis, presentes
em todo o contexto da educação, permeada por novas tecnologias, o
que ocorre também no ensino tradicional, apresentando-se como a mais
forte das Ameaças ou Fatores de Risco. Dependendo de como o assunto for tratado institucionalmente, isso pode causar instabilidade e
perda de competitividade na oferta de cursos. A este cenário estão
associados custeios e investimentos crescentes em infra-estrutura, equipamentos, sistemas, suporte técnico, entre outros, bem como custos de
contínua capacitação de todos os atores organizacionais envolvidos, quais
sejam, pessoal administrativo e corpo docente. Do mesmo modo, modificações na legislação por parte de governos local, estadual e federal,
ou de seus órgãos certificadores e reguladores, podem trazer instabilidade representando Ameaças ou Fatores de Risco.
6 PORTFÓLIO DE CURSOS
Os cursos de graduação passarão por reestruturação gradual para
utilizar o que dispõe a Portaria do MEC nº 4.059, mais especificamente
o texto do § 2º ora transcrito: “Poderão ser ofertadas as disciplinas
referidas no caput, integral ou parcialmente, desde que esta oferta não
ultrapasse 20% da carga horária total do curso”. Da mesma forma,
gradualmente, as ações parciais de e-Learning serão potencializadas
nos programas de pós-graduação e nos cursos de extensão.
Destaca-se que no nível de pós-graduação lato sensu está o
ambiente que se considera apropriado para aplicação das novas técnicas, uma vez que o público que procura esses cursos já é mais maduro
e esclarecido para aproveitar adequadamente cursos em que a maioria
das ações do aluno ocorre fora da sala de aula. Isso é totalmente
diverso de tudo que se utilizou até o presente. Sem dúvida, essa
constatação pode ser aplicada para os cursos de extensão e cursos
para áreas corporativas e/ou administrativas das organizações.
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Educação a distância: um modelo acadêmico
Além de aproveitar a área acadêmica, a Instituição poderá tirar
vantagem das ações de EaD para oferta de cursos nas áreas
corporativas, tanto para os programas de novos colaboradores quanto
para cursos regulares de atualização.
7 TECNOLOGIAS NA INSTITUIÇÃO
7.1 Divisão de tecnologia da informação
O Mackenzie dispõe de infra-estrutura bem consolidada para uso
na oferta de cursos em EaD ou e-Learning e para apoio aos cursos
presenciais. A Divisão de Tecnologia da Informação tem, desde 1998,
um Provedor Internet no Data Center Mackenzie, adequado para atender às principais necessidades dos cursos de EaD, destacando-se que,
desde 2001, foram instalados os links de alta velocidade, em diversas
redes acadêmicas (Comep, Tidia e Internet 2). Todos os Laboratórios
de Informática têm tecnologia baseada nas plataformas PC e Apple e
conectividade internet.
No campo do ensino-aprendizagem virtual estão disponíveis as
plataformas Moodle, Teleduc e ClubForYou. Além disso, a WebCT foi
utilizada de 1999 até 2005, quando foi desativada. A plataforma Moodle
(www.moodle.org) desde 2005 está sendo utilizada como o ambiente
padrão da UPM. Mais de 1.300 disciplinas, cerca de 400 dos 1.500
professores e perto de 20 mil dos quase 40 mil alunos já estão totalmente familiarizados com as novas técnicas. Como meta de urgência pretende-se atingir a integralidade de disciplinas, professores e alunos até
o final do ano de 2008. O desafio é grande; porém, os resultados obtidos até o presente dão credibilidade às metas propostas.
A Plataforma Sloodle Mackenzie é outra novidade. É o ambiente Moodle associado ao Second Life, uma inovação que vem sendo
testada para ser utilizada também no contexto do ensino-aprendizagem
a distância com interface gráfica tridimensional nos endereços virtuais
do Mackenzie no Second Life (www.sloodle.org).
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
7.2
Centro de rádio e televisão
A UPM dispõe de um Centro de Rádio e Televisão (CRT), como
suporte essencial para concretizar as etapas de modificações previstas
pelas técnicas de e-Learning, que atende alunos, professores e funcionários. A equipe do CRT presta serviços de apoio educacional, fornecendo equipamentos audiovisuais e toda infra-estrutura necessária à
produção de vídeos científicos, didáticos, de treinamentos e institucionais,
bem como os programas da TV Mackenzie, incluindo: a) suporte a gravações dentro e fora de estúdios; b) desenvolvimento e implantação de
projetos técnicos de áudio e vídeo e c) viabilização de transmissões ao
vivo, via satélite, internet e videoconferência. Os principais recursos
tecnológicos disponíveis por intermédio do CRT são descritos a seguir:
• Sistema de transmissão via satélite com uplink na unidadesede, em São Paulo, SP, com cobertura de downlink em todo
o território nacional, desde 1998. Há alguns anos, o Mackenzie
já montou infra-estruturas de downlink satelital em centenas
de localidades em todo o Brasil, disponibilizando, inclusive, os
equipamentos das pontas, tais como antenas receptoras,
decodificadores e aparelhos de TV.
• Estúdios de gravação de TV, áudio e vídeo, em ambientes
com tecnologias totalmente digitais.
• Laboratórios especializados em novas tecnologias de TV Digital, Satélite, Internet e Novas Mídias de Comunicação.
• Auditórios com infra-estrutura disponível para transmissões
via teleconferência por ISDN ou IP.
• Sistema de captura, armazenamento e distribuição de vídeos digitais integrado à rede intranet e à rede internet da Instituição.
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Educação a distância: um modelo acadêmico
8 MODELO DE NEGÓCIO E DE OPERAÇÃO
Visa a atender a demanda interna dos planos educacionais dentro da visão e missão da Entidade Mantenedora, para cursos lato sensu
e de extensão, incluindo suas grandes áreas na modalidade a distância.
O Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (CPAJ),
também vinculado à Entidade Mantenedora, desde 1999 pratica ações
de EaD voltadas para cursos de extensão. Nesse contexto, a Instituição, atendendo ao Planejamento Estratégico de EaD, tem fomentado e
incentivado o desenvolvimento científico por meio das novas TICs, destacando-se que eventos educacionais virtuais, de caráter nacional e/ou
internacional, têm ocorrido constantemente, tais como cursos, simpósios
e workshops, com a utilização das novas TICs, baseadas em internet e
satélite, entre os quais:
• Primeiro MoodleMoot Brasil 2007, congresso que promove o
encontro dos usuários, futuros usuários, administradores e
desenvolvedores do ambiente Moodle no Brasil, uma realização da UPM associada à Fundação Bradesco;
• XVIII edição do Simpósio Brasileiro de Informática na
Educação (SBIE 2007), em realização da UPM, associada à
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
9 METODOLOGIAS DE ENSINO E ESTRATÉGIAS DE
APRENDIZAGEM
9.1 Alunos
Os cursos em EaD permitem maior flexibilidade na participação
do aluno e requerem que ele gerencie melhor seu tempo, realizando as
tarefas nos momentos mais adequados à sua agenda. Os encontros
presenciais nos Pólos (item 9.3) são agendados previamente. Ali a
freqüência do aluno é regida pela natureza das disciplinas. Algumas
disciplinas podem requerer maior freqüência, em função da necessidade de tarefas nos laboratórios.
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
Parte essencial do processo de aprendizagem é o desenvolvimento da metodologia de participação do aluno que requer a disposição
pessoal para ler, escrever, comunicar pensamentos e idéias, apresentar
dúvidas e dificuldades aos tutores, colegas e professores. O aluno precisa se interessar em aprender as novas TICs para utilizá-las como
instrumentos de acesso aos conteúdos ministrados. É necessário que
desenvolva competências, habilidades, atitudes e hábitos relativos ao
estudo e à realização de tarefas.
9.2 Utilização do ambiente virtual e dos espaços de
aprendizagem
O ambiente virtual de aprendizagem Moodle é utilizado como
plataforma padrão de ensino-aprendizagem do Mackenzie Virtual e tem
sido amplamente difundido junto ao corpo docente, por meio de cursos
introdutórios, mostrando as possibilidades de comunicação e interação
de que dispõem. Com vistas a estabelecer a cultura de utilização, têm
sido também imprescindíveis ações junto aos estudantes. Estas iniciativas aproveitam o interesse natural dos jovens estudantes pelas TICs e
permitem utilizá-las para transformar a sala de aula em espaço de aprendizagem ativa e de reflexão coletiva.
9.3 Pólos
O pólo é o local físico-geográfico para acesso presencial dos
alunos. Deve estar localizado em região que permita menor e mais
fácil deslocamento do estudante, a partir de sua residência ou local de
trabalho. Deve ser estruturado de modo a atender adequadamente os
alunos na modalidade de EaD.
Nos Pólos encontram-se, entre outros, biblioteca, sala de estudos, laboratórios de informática com acesso à internet banda larga e
equipamento de downlink para receber sinais de satélite, local para o
atendimento por tutores presenciais e salas de aulas por meio de sistemas de videoconferência. Nestes locais são realizadas as “aulas
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Educação a distância: um modelo acadêmico
presenciais”, as práticas de laboratório, as avaliações e outras atividades que exigem supervisão presencial.
As salas são especialmente equipadas para aulas e palestras,
com transmissão em tempo real e com interatividade, com a possibilidade também de emitir sinais da mesma programação para locais nas
instalações das próprias empresas, no caso de cursos in company. Além
do ambiente virtual de aprendizagem (Moodle), o aluno tem acesso a
materiais impressos, mídias digitais (CDs e/ou DVDs) e bases de dados de publicações digitais que o apoiarão no estudo dos conteúdos.
Em tudo o aluno é auxiliado por equipe de trabalho local que inclui, além
das ações acadêmicas, serviço de secretaria e de tesouraria.
9.4 Cursos
Os cursos são projetados para um modelo de gestão acadêmica
apropriado para o EaD. De qualquer modo, devem estar integrados
nos mesmos moldes dos denominados cursos presenciais. Apenas com
essa sistemática de gestão será possível oferecer aos alunos, independente da origem, as mesmas condições e suporte. Assim, a preocupação com os serviços a serem oferecidos nos pólos é prioritária.
Um curso na modalidade EaD é composto em parte por informações e conhecimentos construídos a distância e outra parte realizada
presencialmente nos Pólos. Os cursos são constituídos de tópicos, que
devem conter título do assunto, imagens, bibliografia, indicações de leitura e de websites, textos complementares, exercícios de fixação (como
questionário ou enquete), sala de bate-papo para os estudantes discutirem livremente o assunto após a leitura dos textos e fórum de discussão. Este é o modelo básico. Em cada disciplina, de acordo com as
características da área de conhecimento, são utilizadas uma ou mais
ferramentas de interação, com a publicação compartilhada de glossário
ou a construção de um wiki.
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
9.5
Conteúdos
Os professores especialistas são os responsáveis pelos conteúdos. São orientados sobre a melhor forma de disponibilizá-los. A construção de Objetos de Aprendizagem (Learning Objects – LO) mais
elaborados, com animação e interatividade, é normalmente realizada
por uma empresa especializada, garantindo a qualidade técnica e de
design, além da manutenção da identidade visual nas diversas disciplinas do curso.
Utiliza-se, de modo geral, um padrão de modelagem para a criação das disciplinas que inclui o logotipo da Instituição, nome da disciplina, semestre, nome do professor e ementa, calendário do curso e um
fórum de notícias para que o professor possa enviar avisos.
9.6 Sistemática de participação
Os cursos, atendendo aos critérios do MEC para EaD, têm momentos presenciais. A freqüência é determinada pela natureza da área
do curso oferecido. O encontro presencial no início do processo é importante para que os alunos se conheçam entre si, conheçam os professores e demais componentes da equipe, além dos servidores locais.
Quanto maior o envolvimento e a participação do aluno, maior é o aproveitamento, o que contribui para a redução na taxa de evasão.
O portal da UPM disponibiliza diversos tutoriais on-line e/ou para
impressão sobre os principais serviços disponíveis no ambiente de EAD.
Existe a preocupação institucional de orientar o estudante desde como
efetuar seu login, passando por recuperação de senha, abertura de
novas disciplinas, até como utilizar os recursos mais avançados de comunicação interativa.
9.7 Avaliação no pólo
Os cursos são avaliados de forma presencial, nos pólos, sob a
responsabilidade de professor ou tutor, além de avaliações contínuas a
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Educação a distância: um modelo acadêmico
distância, auto-avaliações, trabalhos em grupo, relatórios, exercícios e
tarefas.
9.8 Capacitação
Cursos de capacitação para os professores de toda a UPM estão sendo realizados desde o primeiro semestre de 2007. A ênfase
especial está centrada no ensino-aprendizagem virtual baseado na plataforma Moodle e em diversos outros recursos pedagógicos e
tecnológicos, incluindo o uso do segmento de satélite mantido pela Instituição. Foi criado um laboratório com infra-estrutura especial para a
capacitação dos professores, dispondo dos recursos necessários para
as diferentes etapas da nova vista do ensino-aprendizagem.
Os cursos têm como base as novas TICs e os ambientes de eLearning.
Foram organizados seguindo os tópicos:
Fundamentos pedagógicos e tecnológicos
• A influência das TICs na sociedade e na educação.
• Organização e construção da ação educativa em ambientes
virtuais.
• Sistemas e operações lógicas de busca de informação na Web.
• Uso de bancos de dados digitais e bibliotecas on-line.
Conhecimento e manuseio da Plataforma Moodle
• A plataforma de gerenciamento de aprendizagem Moodle.
• Interagindo, como aluno, no espaço virtual.
• Oficina I – Explorando o Moodle.
• Oficina II – Construindo um curso.
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
O docente, o discente e as ferramentas interativas no e-learning
• A importância da interação no ambiente virtual de aprendizagem – os papéis de professor e aluno.
• Ferramentas de comunicação interativas presentes no Moodle,
incluindo as potencialidades pedagógicas de fórum, wiki, chat,
portfólio e blogs.
• Fundamentos do trabalho docente (professor/tutor) em ambientes virtuais.
Um centro de apoio ao professor é mantido com profissionais e
infra-estrutura tecnológica, para que os professores possam aprender e
se desenvolver, continuamente, na utilização das potencialidades das
tecnologias disponíveis na Instituição.
9.9 Equipes
A equipe responsável pela elaboração e acompanhamento pedagógico das atividades é composta por professores especialistas/
conteudistas, design instrucional, tutores a distância, tutores ou
facilitadores locais e equipe de suporte. Os professores são estimulados a participar dos cursos de capacitação nas TICs para vivenciar a
aplicação das principais ferramentas, de modo a sensibilizá-los e criar
uma cultura de utilização desses recursos digitais, para que as estratégias de ensino-aprendizagem sejam instigantes e motivadoras.
A equipe técnico-administrativa do pólo faz a manutenção das
instalações em sua estrutura física, a coordenação das atividades do
pólo e a tutoria presencial. Também é responsável pela montagem da
grade de horários das disciplinas, de tal modo que permita aos alunos
organizarem suas agendas para execução das atividades presenciais,
em diferentes dias e diferentes períodos.
Em seguida é apresentado um descritivo sumário dos principais
membros das equipes.
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Educação a distância: um modelo acadêmico
9.9.1 Coordenador de curso
É o professor responsável por gestão e qualidade do curso. Necessariamente é um especialista em estratégia de gestão. Acompanha
e orienta todos os diferentes profissionais envolvidos.
9.9.2 Professor autor/especialista
É o professor especialista na temática da disciplina, sendo de
reconhecido prestígio. É responsável pela produção do conteúdo específico e quem prepara o material didático original da disciplina. Em
geral não ministra as aulas.
9.9.3 Professor tutor/apresentador
É o professor especialista na temática da disciplina, sendo de
reconhecido prestígio. É quem ministra as aulas por videoconferência
de um studio.
9.9.4 Designer instrucional
É o profissional com largo conhecimento de pedagogia e de
tecnologias interativas, responsável por transformar e adequar o conteúdo disponibilizado pelo professor autor/especialista para a plataforma virtual de aprendizagem (Moodle), por meio da criação do story
board do curso e desenvolvimento do lay out para posterior formatação
do material didático a ser entregue ao aluno, entre outros, tutoriais, bibliotecas virtuais, textos, animações, fotos, digitalização e criação de imagens, captura e edição de áudio e vídeo.
9.9.5 Web designer
É o profissional da área de design e comunicação visual que, sob
a orientação do designer instrucional, é o responsável técnico pelo
desenvolvimento do material didático.
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
9.9.6 Professor-tutor a distância
É o orientador acadêmico responsável por atendimento e acompanhamento virtuais dos alunos. Deve ter formação superior compatível com o conhecimento específico da disciplina. Deve também ter
amplo domínio das plataformas utilizadas, para garantir a resolução de
problemas no uso do ferramental. Estimular, motivar e contribuir para o
desenvolvimento da capacidade de organização e de realização das
atividades acadêmicas e de auto-aprendizagem dos alunos são tarefas
inerentes às suas funções.
9.9.7 Facilitador
É o orientador acadêmico com formação superior adequada para
atender aos estudantes em suas dificuldades operacionais durante o
desenvolvimento das atividades nos pólos presenciais. Deve orientar
os alunos para o ensino-aprendizagem a distância, buscando evidenciar
a necessidade da autonomia de aprendizagem. Orienta os alunos, individualmente ou em grupos, para construção de uma metodologia própria de estudo.
9.9.8 Equipe de apoio na sede
É composta por profissionais que atendem às áreas de studios e
de suporte tecnológico e outros: manutenção do ambiente virtual de
aprendizagem, manutenção da conectividade por web e satélites e de
captação, armazenamento e transmissão de áudio e vídeo.
9.9.9 Equipe de apoio no pólo
É composta por profissionais que atendem às áreas técnico-acadêmicas, além de oferecer biblioteca, secretaria, tesouraria, laboratórios e
infra-estrutura.
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Educação a distância: um modelo acadêmico
9.10 Titulação do curso de EaD
O estudante, depois de concluído o curso, será titulado de acordo
com as especificidades deste, na modalidade de EaD da UPM, recebendo o certificado ou diploma que couber, de acordo com a legislação
do MEC.
10 ESTRATÉGIAS DE MARKETING NA OFERTA DE
CURSOS
Para a oferta de cursos serão usados os canais oficiais da Instituição para campanhas de comunicação e marketing, quais sejam: Portal
Mackenzie; Portal Mackenzista (antigos alunos); Revista Mackenzie;
jornais e revistas regionais; TV Mackenzie; Editora Mackenzie; Campanhas de e-mail marketing e outros veículos e mídias internos e externos, próprios e/ou de parceiros.
11 RESULTADOS
O crescimento da UPM em número de cursos e de alunos será
acelerado com a modalidade de EaD extra-campus, tanto na forma
semipresencial (20% facultado pelo MEC) quanto no modelo a distância. Isso atende ao Planejamento Estratégico Institucional em vigência,
concorrendo para geração de dividendos educacionais positivos e necessários tanto para a área acadêmica quanto para a sua área
corporativa e dos públicos que com elas interagem.
12 AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à Entidade Mantenedora, nas pessoas do
Diretor Presidente, Dr. Marcos José de Almeida Lins, e do Diretor
Administrativo-Financeiro, Dr. Gilson Alberto Novaes, e à Universidade Presbiteriana Mackenzie, na pessoa de seu Magnífico Reitor,
Dr. Manassés Claudino Fonteles, pelo desprendimento em criar as fa-
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Pedro Ronzelli Júnior, José Augusto Pereira Brito e Solange
Giardino
cilidades para a participação no Curso Estratégia e Gestão de EaD,
realizado na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, SP.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, M. E. B. Informática e educação: diretrizes para uma formação
reflexiva de professores. São Paulo, 1996. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Educação: supervisão e currículo. PUC-SP.
______. Educação a distância na internet: abordagens e contribuições dos
ambientes digitais de aprendizagem. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 29,
n. 2, 2003.
GIUSTA, A. S. Educação a distância: uma articulação entre a teoria e a
prática. Belo Horizonte: Editora PUC-Minas, 2003.
HITT, M.; IRELAND R. D.; HOSKISSON R. E. Administração estratégica.
São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.
JAQUES, P. A. Técnicas de disponibilização de informação através da
internet em vista da educação à distância. Porto Alegre: 1997. Mestrado
em Informática. PUC-RS.
KENSKI, V. O papel do professor na sociedade digital. In: Ensinar a
ensinar. São Paulo: Pioneira, 2001.
MORIN, E. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Portaria n. 2.253, 18 out. 2001. Trata da
oferta de disciplinas que, em seu todo ou em parte, utilizem método nãopresencial na organização pedagógica e curricular de seus cursos superiores
reconhecidos. Brasília. D.O.U., 19 out. 2001, seção 1, p. 18.
NUNES, I. B. Noções de educação à distância. In: Educação à distância.
Brasília, Ined/UNB-CAD, 1991.
PORTER M. Vantagem competitiva: criando e sustentando um desempenho
superior. Rio de Janeiro: Campus, 1989.
TORI, R. A distância que aproxima. Revista Brasileira de Aprendizagem
Aberta e a Distância. Disponível em: <http://www.abed.org.br/publique/cgi/
cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=608&sid= 69&UserActiveTemplate=1por>.
Acesso em: 15 jul. 2007.
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OPENCOURSEWARE UNIVERSIA:
OPORTUNIDADE PARA DOCENTES DA IBEROAMÉRICA
Alina Corrêa¹
Resumo / Abstract
O presente artigo pretende trazer à discussão iniciativas de
colaboração em massa na Internet. Para tanto, apresentará o
projeto OpenCourseWare como exemplo que surge, em 2001,
para promover a socialização do conhecimento.
The present article intends to discuss the mass
collaboration on the World Wide Web and presents the
OpenCourseWare Project as an example that emerged in 2001
to promote the knowledge socialization.
Palavras-chave / Key words
OpenCourseWare, internet, colaboração, ensino, educação.
OpenCourseWare, Internet, collaboration, teaching,
education.
1
Diretora-Geral do Univesia Brasil. Formada em Filosofia e Arquitetura pela Universidade de São Paulo (USP); Mestre em Administração Mercadológica pela Escola de
Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Eaesp);
Moot corp pela Universidade do Texas, Austin; MBA em International Business
pela Escuela Superior de Administración y Dirección de Empresas (Esade), Barcelona, Espanha.
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OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da IberoAmérica
INTRODUÇÃO AO OPENCOURSEWARE
A possibilidade de interação e compartilhamento trazida pela
Internet revolucionou as formas de se obter e distribuir informações e
conceitos. Participar ativamente desses espaços é dever das instituições de ensino superior, como disseminadoras de conhecimento de alta
qualidade.
O OpenCourseWare (OCW) é um exemplo de iniciativa que,
nos últimos tempos, surgiu para promover a socialização do conhecimento.
Em abril de 2001 o Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT)
lançou a iniciativa OCW-MIT, com o objetivo de oferecer o material
didático que seus docentes utilizam para o ensino. Esta ação teve um
grande impacto e impulsionou a adesão de outras Universidades de
prestígio internacional, gerando projetos próprios de coordenação com
o OCW-MIT.
O Universia, presente atualmente em onze países, se comprometeu
desde o início com esse projeto e, recentemente, estabeleceu um acordo de
colaboração com a Universidade Politécnica de Madrid, para estimular o
desenvolvimento do projeto OCW Universia na Ibero-América.
O IMPACTO DA INTERNET NO ENSINO SUPERIOR
A Internet é cada vez menos um espaço dirigido pelas empresas
e instituições para se tornar cada vez mais um lugar social, dominado
por pessoas anônimas. Um lugar em que a qualidade e o rigor da informação não dependem apenas de quem a edita, mas também da capacidade de cada indivíduo de averiguar ou discernir onde está aquilo de
que necessita.
Esta nova forma de comunicação pode converter-se exclusivamente em um espaço para o lazer e com conteúdos pouco rigorosos.
Ou pode também encaminhar-se para o enriquecimento da difusão e da
participação global do conhecimento.
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Alina Corrêa
A universidade trabalha para o futuro, tendo por base o conhecimento. E tem conseguido manter o ritmo que marcava o mercado digital dentro da organização:
• E-learning
• Campus virtuais para professores e alunos
• Digitalização de documentos
• Publicação das classificações na Internet
• Matrícula on-line
• Canais de TV e rádio.
Agora, tem um novo desafio:
• Expor-se ao exterior na nova Internet
• Partilhar o conhecimento
• Utilizar novas ferramentas de comunicação para a formação
• Estar presente nos novos ambientes virtuais (comunidades,
blogs, multimídia).
E procurar compreender os jovens, para poder entender a linguagem deles e continuar a liderar o Ensino Superior neste novo contexto.
A PALAVRA-CHAVE: COLABORAÇÃO
A produção colaborativa é a nova marca da Internet atualmente.
O surgimento da Wikipedia, o sucesso do Youtube, a explosão dos blogs
e os espaços criados nos grandes portais para que o usuário não só
comente e debata a reportagem divulgada como também envie sua
própria notícia são exemplos dessa nova onda.
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OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da IberoAmérica
Este movimento veio alterar de forma profunda as tradicionais
formas de produção, apuração, geração e distribuição da informação. E
essa mudança se espalha em todos os ambientes. Até mesmo na indústria – em que o valor do “segredo industrial” sempre foi inquestionável
– é possível observar uma grande mudança de paradigma. Um novo
neologismo começa a ser ouvido nos corredores do mundo dos negócios: wikinomics, que pode ser traduzido como uma ação coletiva que
ocorre quando um grande número de pessoas trabalha independentemente para um mesmo objetivo. É o que acontece com o Linux, um dos
grandes sucessos no uso de colaboração em massa.
E não poderia ser diferente no mundo acadêmico. Há muito se
discute a transformação do professor de “sábio” para “guia”. Colossi,
Consentino e Queiroz (2001) defendem que “o professor transformase em condutor, em bandeirante ou desbravador de conhecimentos”.
Associado a esse novo papel, exige-se a configuração de novas tendências ou correntes pedagógicas, que efetivamente representem transformações similares, não só nos alunos (ou aprendizes, como se quer
hoje), mas também na qualificação dos professores. Desejam-se professores e alunos que interajam nesse ambiente colaborativo como verdadeiros construtores de disciplinas, num processo evolutivo que transforma a disciplina, adequando-a às necessidades do ambiente. Os professores, atuando como verdadeiros tutores dos alunos, e os alunos,
transformando-se de simples receptores passivos do conhecimento em
solucionadores de problemas, construirão um todo agindo diretamente
na construção da disciplina e no perfil profissional dos alunos.
A Internet aparece, então, como uma importante ferramenta para
auxiliar nessa interação, trazendo acesso a conteúdos que o aluno pode
levar à sala de aula. E desta reunião de materiais colhidos em diversas
fontes e levados à discussão no ambiente acadêmico é que sairá a
capacidade de análise e interpretação, e a ampliação, de maneira significativa, das perspectivas de abordagem de cada tema.
Mas nem tudo estará resolvido. O grande dilema da colaboração
em massa ainda é a qualidade e confiabilidade das informações despejadas em volume exponencial e sem qualquer tipo de crivo. Apesar da
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criação de mecanismos que pretendem regular a intervenção dos usuários, como sistemas nos quais a própria comunidade de leitores atribuiu
uma nota para cada participação, ou “denuncia” o mau uso por parte de
um integrante, a realidade é que isso não é suficiente.
A tendência, então, é a do surgimento de espaços de colaboração com chancelas de qualidade, em que a assinatura de quem organiza
a coleta das informações garante a confiabilidade no material acessado.
Esses espaços tornam-se os locais ideais de presença dos conteúdos
gerados nas instituições de ensino superior.
OS CONCEITOS OPENCOURSEWARE E O SITE OCW
Neste contexto de colaboração de alta qualidade aparece o
OpenCourseWare como uma ferramenta de capacitação e democratização em escala global. O OCW é uma iniciativa editorial eletrônica
em grande escala que reúne materiais utilizados por professores de
graduação e pós-graduação no processo de ensino e aprendizagem. É
um conjunto de documentos oferecidos gratuitamente pela Internet, sem
restrição de propriedade intelectual. Atualmente, participam desta inovação mais de 100 instituições de educação superior e organizações
associadas de todo o mundo, com o objetivo de proporcionar o livre
acesso aos materiais didáticos para educadores, estudantes e autodidatas do mundo inteiro.
Hoje, o OpenCourseWare MIT, fundador do projeto em abril de 2001,
em colaboração com a Fundação William and Flora Hewlett e a Fundação
Andrew W. Meellon, conta com 8,5 milhões de acessos e já foi visitado por
usuários de 202 países e cidades-estados do mundo todo. Utilizando a página de feedback do MIT OCW, os usuários enviaram mais de 4.100 mensagens de e-mail, reconhecendo a liderança do MIT no sentido de fornecer
informações gratuitas e acessíveis pela Web.
O êxito alcançado pelo projeto possibilitou a criação de um modelo eficiente em que outras universidades adaptam e publicam seus
próprios materiais pedagógicos gerando sinergias, espaços e colabora-
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OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da IberoAmérica
ção. Para essas Universidades, a permanência no OpenCourse aporta
diversos benefícios, tais como:
• Impulsiona o desenvolvimento de conhecimento ao liberar
recursos didáticos;
• Estimula a inovação e o aperfeiçoamento dos recursos de
aprendizagem docentes utilizados pelos professores;
• Favorece a aproximação dos professores com as TICs;
• Projeta nacional e internacionalmente a missão da instituição.
O OCW não é uma plataforma de cursos a distância. O
OpenCourseWare limita-se a oferecer acesso livre e gratuito a um conjunto de materiais educativos. Não prevê qualquer processo de matrícula e nenhum pagamento pela prestação do serviço. É preciso lembrar
que o ensino a distância pressupõe um sistema de estudo visando à
certificação, enquanto o OCW é apenas um sistema de consulta a conteúdos pedagógicos.
Exemplos de recursos que podem ser publicados na plataforma:
• Planejamento de cursos: programa, temários, objetivos pedagógicos, calendários, etc.;
• Conteúdos: bibliografia, documentos, material audiovisual,
material auxiliar, etc.;
• Atividades pedagógicas: exercícios, testes, avaliações, projetos, práticas de laboratório, etc.
Os conteúdos disponibilizados no OCW são de acesso irrestrito.
Assim, qualquer pessoa pode utilizar os materiais em seu formato original ou modificá-los para ajustá-los às suas necessidades. No entanto
existem alguns requisitos para o uso do conteúdo disponibilizado:
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• Não pode ter fins comerciais;
• Deve incluir uma referência à instituição que o publica originalmente e, caso seja procedente, o nome do autor do material;
• O material resultante do uso do OCW deve ser livre para
utilização por terceiros e ficará sujeito a estes mesmos requisitos.
O OCW E O UNIVERSIA
O Universia, como rede integradora do meio acadêmico, foi convidado a participar do projeto. Por meio de seu portal global
www.universia.net e de portais regionais em cada país onde atua, o
Universia atende aos diversos públicos do Ensino Superior, oferecendo
conteúdos e serviços para pré-universitários, universitários, pós-universitários, gestores e docentes, tendo como principais linhas estratégicas:
• Emprego e Desenvolvimento Profissional;
• Formação;
• Observatório;
• Redes Sociais.
Sua participação no OCW visa a divulgar e estimular as universidades parceiras a ingressarem no projeto OpenCourseWare, para contribuir
com a disseminação do conhecimento e enriquecer a plataforma com os
materiais de aula das 1.056 instituições de ensino superior nos onze países
(Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Costa Rica, Espanha, México, Peru, Portugal, Uruguai e Venezuela) que formam a Rede Universia.
O OCW Universia é formado por um conjunto de universidades
espanholas, portuguesas e latino-americanas que optaram por aderir ao
OCW devido à afinidade cultural e geográfica do espaço ibero-americano.
Atualmente, as universidades que integram o OCW Universia são:
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OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da IberoAmérica
• Universidade Federal de Santa Catarina
• Universidade Estadual de Campinas
• Universidade Federal de Alagoas
• Universidade Federal do Piauí
• Universidade Federal Rural de Pernambuco
• Universidade de Sorocaba
• Universidade de Taubaté
• Universidade Politécnica de Madri
• Universidade Carlos III de Madri
• Universidade de Sevilha
• Universidade de Santiago de Compostela
• Universidade de Cantabria
• Universidade de Barcelona
FUNCIONAMENTO DA PLATAFORMA
A plataforma colaborativa é acessada pelo link: http://
ocw.universia.net/. Somente instituições conveniadas ao projeto podem
incluir materiais, referências ou objetos de aprendizagem utilizados por
seus docentes em suas aulas. Isso garante a qualidade e confiabilidade
de tudo o que é publicado pelo OCW.
No momento da publicação é possível escolher uma área temática
já listada ou facilmente criar uma nova, que represente melhor o teor do
material a ser disponibilizado. A forma de estruturação dos conteúdos é
bastante flexível e respeita o caráter individual de cada objeto a ser
distribuído.
O ambiente é amigável e de fácil entendimento, tanto para quem
publica quanto para quem acessa essas informações. O endereço traz
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detalhes de toda a sistemática e regras de uso do sistema, explicitando
seus conceitos, as razões para incorporar-se ao projeto, aspectos jurídicos e demais informações. Além disso, apresenta áreas de notícias de
interesse, artigos e respostas a perguntas freqüentes.
É possível localizar materiais em mais de sessenta áreas temáticas
diferentes, número que se amplia conforme novos temas são publicados. A busca é simples e o resultado lista diretamente todo conteúdo
disponível classificado de acordo com a área escolhida.
INDICADORES DE IMPACTO E EVOLUÇÃO DOS
PROJETOS OPENCOURSEWARE NO MUNDO
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OpenCourseWare-MIT:
• 8,5 milhões de acessos ao OpenCourseWare-MIT, média de
423.000 acessos/mês. Incremento de 56% em um ano.
• 83% dos estudantes do MIT consideram que o
OpenCourseWare-MIT reforça a imagem da instituição.
• 74% dos professores do MIT já publicam seus cursos.
• O perfil das pessoas que acessam está distribuído em 16% de
professores, 32% de estudantes, 47% de autodidatas e 5%
outros.
OpenCourseWare no mundo:
• A Espanha é o terceiro país europeu em acessos, depois da
França e Alemanha, e o 17º no mundo.
• Foram traduzidos 250 cursos para outros idiomas, dos quais
90 para o espanhol.
• Existem mais de 80 OpenCourseWare sites em distintos países do mundo.
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O MOVIMENTO OPENCOURSEWARE NO MUNDO
Harvard Law School
França
Telecom Paris
Berkm an Center
Ecole
Johns Hopkins School of
Polytechnique
Public Health
Techniques
Tufts University
Avance´es
University of Michigan
Ponts et
School of Information
Chausse´es
University of Notre Dame
Ecole des Mines
Utah State University
de Paris
Reino Unido
The Open University
Canadá
Capilano College
Vietnã
FETP
OpenCourseW are
Chimie Paris
Physique-Chim ie
Índia
Agronomie
Rai University
Statistiques et
Som aiya Vidyavihar
Econom ie
Eaux et Forets
Arts et Me´tiers
China
Japão
Áustria
Peking University
Keio University
Tsinghua University
Kyoto University
Beijing Jiaotong
Osaka University
University
Tokyo Institute of
University of the
Dalian Univ. of
Technology
W estern Cape
Technology
Universitat Klagenfurt
África do Sul
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University of
Central South University
Tokyo
Xi'an Jiaotong University
W aseda
Brasil
Universidade Federal
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OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da IberoAmérica
OS ASPECTOS JURÍDICOS: A LICENÇA CREATIVE
COMMONS
Os materiais que uma Instituição disponibiliza e publica constituindo um site OpenCourseWare estão subordinados à licença Creative
Commons.
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Pela licença Creative Commons, o autor cede os direitos de uso do
conteúdo disponibilizado e o site OCW de sua universidade assume sua
utilização de acordo com os princípios de respeito ao autor e à sua obra.
A GESTÃO DE CONTEÚDOS OCW – UNIVERSIA
O projeto OCW Universia oferece às instituições integrantes
orientação para o desenvolvimento da plataforma de gestão e publicação dos conteúdos que constituem o site OCW de cada universidade. O
material disponibilizado no espaço mantido pela instituição será compartilhado com outras universidades e usuários por meio da plataforma
OCW Universia.
Essa assistência consiste fundamentalmente na disposição de um
sistema gestor de conteúdos baseado no eduCommons, um projeto Open
Source desenvolvido pelo Center for Open and Sustainable Learning
da Utah State University, especificamente desenhado para a criação de
projetos OCW.
As principais características do sistema gestor de conteúdos são:
• Processo claro e simples para a criação de categorias e cursos e para o incremento de materiais.
• Incorporação de meta-dados no processo de catalogação e
nos formatos de armazenamento e de publicação.
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• Possibilidade de estruturação flexível de conteúdos.
• Completo suporte de edição em HTML.
• Possibilidades de incorporação de conteúdos por meio da importação de um arquivo comprimido “zip”.
• Completa gestão de meta-dados e de exportação e importação por meio de formatos padronizados.
• Especificação baseada nos padrões IEEE 1484.12.1-2002
Learning Object Metadata Standard (IEEE LOM) e ISSO
15836 Dublin Core Metadata (Dublin Core).
• Importação / exportação de cursos e materiais em pacotes
IMS.
• Possibilidade de acesso a conteúdos por meio de fontes RSS.
• Gestão completa de fluxo de trabalho.
• Incorporação de mecanismos de gestão de propriedade intelectual e de licenças de utilização.
• Facilidade de implementação e de personalização com a imagem institucional de cada Universidade.
Além disso, são oferecidos um conjunto de manuais de uso e de
administração, um pacote padrão para a importação da planilha da matéria e um suporte técnico on-line.
AS OFICINAS OCW NOS OCW SITES
A experiência mostra que as Oficinas OCW são um suporte necessário para as instituições interessadas em promover um OCW site.
Os serviços que a Oficina oferece são de vários tipos: docentes, técnicos, biblioteca e jurídicos.
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OpenCourseWare Universia: oportunidade para docentes da IberoAmérica
Funções associadas à Oficina OCW:
• Impulsionar a participação dos professores e proporcionarlhes a informação, formação e assessoramento necessários.
• Adaptar o modelo OCW às características da Universidade e
à concepção do projeto OCW-Universia.
• Assessorar juridicamente a Universidade e os professores e
estabelecer um protocolo jurídico de participação que ofereça garantias a todas as partes.
• Colaborar na limpeza da propriedade intelectual dos conteúdos, e, no caso, procurar ou gerar recursos alternativos.
• Vigiar a qualidade dos conteúdos e impulsionar sua melhora
constante.
• Proporcionar meios técnicos para adaptar os conteúdos a sua
difusão por Internet: uso do gestor de conteúdos, elaboração
do material multimídia, gravação de vídeos.
• Procurar soluções eficientes que simplifiquem a incorporação de conteúdos educativos na rede em diferentes cenários
e com diferentes objetivos.
• Manter o OCW site da Universidade.
• Coordenar-se com outros OCW sites nacionais e estrangeiros.
• Elaborar reportes e propor melhorias aos órgãos de direção
da Universidade.
PROCEDIMENTOS PARA ADESÃO AO PROJETO
A adesão ao Consórcio OCW Universia é possível por meio da
assinatura de um Acordo de Cooperação no qual a instituição de ensino
superior se compromete a:
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Alina Corrêa
• Desenvolver um site OCW da universidade no qual estejam
publicadas no mínimo dez matérias sobre os princípios do Consórcio.
• Colaborar e promover um espaço comum entre todos os membros do Consórcio.
Para aderir ao projeto OCW Universia basta solicitar a participação
da universidade à equipe de Relacionamento com Universidades pelo email: [email protected] ou telefone (11) 3179-0770.
Uma vez assinado e recebido o acordo, será enviada ao responsável pelo OCW na instituição uma senha de acesso à área restrita em
que se encontrarão toda informação e auxílio necessários para que o
projeto OCW seja desenvolvido.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
COLOSSI, Nelson; CONSENTINO, Aldo; QUEIROZ, Etty. Mudanças no
contexto do ensino superior no Brasil: uma tendência ao ensino
colaborativo. Revista da FAE, v. 4, n. 1, jan./abr. 2001. Curitiba-PR: UniFAE.
WEBGRAFIA
http://www.ocwconsortium.org/
http://ocw.universia.net/
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INTERVENÇÕES EDUCATIVAS EM AMBIENTES
VIRTUAIS: INVESTIGANDO POSSIBILIDADES
METODOLÓGICAS
Tania Scuro Mendes1
Resumo / Abstract
O estudo objetivou investigar concepções de aprendizagem de professores que atuam em ambientes virtuais, analisando possíveis relações entre suas orientações
epistemológicas e suas intervenções metodológicas; analisar
processos metodológicos desenvolvidos em ambientes virtuais, discriminando suas características e possibilidades de
interações; investigar as abordagens de professores em relação a possibilidades metodológicas advindas de processos
educativos on-line; subsidiar professores que atuam em disciplinas de Educação a Distância (EaD) virtual no trato de questões metodológicas. Os sujeitos da pesquisa submetidos à
análise qualitativa foram constituídos por quatorze professores atuantes em disciplinas de graduação, oferecidas mediante
EaD virtual, e três instituições de ensino superior da grande
Porto Alegre (RS) que apontaram, entre outros aspectos, a
necessidade de implementação do caráter interativo das ferramentas desses ambientes para que permitam ampliar possibilidades metodológicas voltadas à sociocognição implicada em
trabalhos cooperativos.
The objective of this study is to investigate conceptions of
apprenticement for professors working in virtual
environments, analyzing possible relations between
epistemological orientations and methodological
interventions; to analyze methodological processes developed
1
Mestre e Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), Professora na graduação e pós-graduação da Universidade Luterana do
Brasil (Ulbra), Canoas, RS.
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
in virtual environments, determining its characteristics and
possibilities of interaction; to investigate the different
approaches of professors on methodological possibilities from
online educational processes; to assist professors working
in disciplines of virtual EaD that consist of methodological
issues. The subjects of this research, analyzed through a
qualitative approach, that are fourteen professors working
in disciplines offered through virtual EaD by three
educational institutions from the greater area of Porto Alegre-RS, pointed out, among other issues, the necessity of
implementation of the interactive aspects of these
environments tools, in an effort to extend the methodological
possibilities facing social-cognition implied in cooperative
works.
Palavras-chave / Key words
EaD virtual, aprendizagem, ferramentas, professores, alunos.
Virtual EaD, learning, tools, teachers, students.
A utilização de recursos telemáticos digitais na educação tem
acirrado a necessidade de reflexão e revisão de práticas educativas nos
âmbitos não-presencial e, por extensão (devido à demanda de concorrência), presencial. Tal situação pode engendrar a quebra do paradigma
empirista que prestigia as funções informativa e instrucionista do que
até então comumente evidenciamos em processos educativos oferecidos de modo on-line.
Na vertente da busca de clareza de aspectos, especialmente
epistemológicos, implicados na concepção e utilização de ambientes e
ferramentas informacionais, cresce a quantidade de pesquisas e estudos que evidenciam o embate por condições que imprimam às ações
educativas características metodológicas que viabilizem uma nova visão de aprendizagem no processo de construção compartilhada de conhecimento desenvolvido em comunidades cooperativas e solidárias que
habitam ambientes virtuais, de modo a se enfatizar a função construtiva, reflexiva e criativa que tais ferramentas possibilitam.
Nesta direção argumentativa, compete-nos avançar para estu102
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Tania Scuro Mendes
dos que abordem diferentes metodologias que atinjam os perfis sociais,
cognitivos e motivacionais dos estudantes nas suas interações com a
EaD on-line. Daí a necessidade de verificarmos, em pesquisa empírica,
como se dão as articulações entre diferentes metodologias e suas possibilidades de enriquecimento nos processos educativos mediados por
ambientes virtuais que utilizam tecnologias de comunicação digitais.
Confrontando-nos com as possibilidades desafiadoras advindas
das tecnologias telemáticas nos processos educativos, importa indagarmos: Que intervenções educativas podem dar conta da complexidade
interativa em processos de educação on-line, constituindo-se como possibilidades metodológicas abertas nos ambientes virtuais de ensino-aprendizagem?
Para buscarmos possíveis respostas ao problema proposto, traçamos os seguintes objetivos:
• Investigar as concepções de aprendizagem de professores que
atuam em ambientes virtuais, analisando possíveis relações
entre suas orientações epistemológicas e suas intervenções
metodológicas;
• Analisar processos metodológicos desenvolvidos em ambientes virtuais, discriminando suas características e possibilidades de interações;
• Investigar as abordagens de professores atuantes em ambientes virtuais em relação a possibilidades metodológicas
advindas de processos educativos on-line;
• Subsidiar os professores que atuam em disciplinas de EaD no
trato de questões metodológicas, tendo em vista o processo
ensino-aprendizagem em ambientes virtuais.
A REDE TEÓRICA
O ciberespaço está abrindo possibilidades e configurações bem
distintas das desenvolvidas na tradição escolar para as pessoas aprenEduc. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 101-121, jan./dez. 2007
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
derem. As interações na teia telemática propiciadas pela internet abrem
fronteiras de salas de aula convencionais e consolidam comunidades
virtuais que desencadeiam processos de aprendizagem diferenciados
dos até então instituídos ao longo da história. Novos espaços e tempos
educativos têm sido constituídos na era da internet, onde e quando atuamos interligados em rede ciberespacial. Estamos inseridos nessas relações, diante de uma nova cultura de transformação ecológica.
O advento da cibernética e a relação entre sujeito epistêmico e
máquina, denominada por Lévy (1994) como ecologia cognitiva, por
implicar o estudo das dimensões técnicas e coletivas da cognição, situam, em uma mesma paisagem, homens, natureza e máquina.
Face a esse cenário educacional, precisamos discriminar como
se ensina e como se aprende nas relações virtuais. Para tanto, é indispensável inquirir, primeiramente, o que é aprender e ensinar nesse novo
contexto educativo. Importa, assim, trazer a contribuição de Hogetop e
Tijiboy (2005) que sintetizam:
As diferentes compreensões do que é ensinar e aprender têm se
modificado, acompanhando as novas descobertas e percepções
das biociências, neurociências, ciências cognitivas, tecnologias
e demais evoluções do pensamento. Tais avanços mostram que
a vida é aprender; que há uma trama unindo processos vitais e
cognitivos. Assim sendo, aprender implica estar constantemente interagindo, constituindo uma interlocução entre saberes
pessoais com saberes socais, trocando certezas por incertezas e
estas, por sua vez, por certezas relativas (p. 276).
Se o conceito de aprendizagem tem se transformado, especialmente
com as contribuições de Piaget no século passado, mais ainda vem exigindo
novos olhares em relação às possibilidades da EaD virtual.
A aprendizagem em rede traz consigo diferentes sujeitos, com
especificidades próprias de interesses, de estilos, e participar
desse processo de construção significa compreender essa dinâmica diferenciada. Todos têm um objetivo comum, um lugar
de convergência aonde chegar, mas os caminhos traçados são
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próprios, únicos. E é nesse caminho que surgem e emergem os
diferentes olhares, das diferentes opções que enriquecem o caminho próprio e o do outro, ao serem desafiados a trocar e compartilhar suas experiências e reflexões, articulando conceitos e
práticas administrativas e pedagógicas da gestão e da integração
das tecnologias com vistas a propiciar uma escola pública de
qualidade e condizente com o paradigma da sociedade atual
(Rubin et al., 2005, p. 5).
Palloff e Pratt (2002) explicam que a aprendizagem em ambientes
virtuais ocorre a partir de um processo que se estrutura sobre três pilares,
sendo eles concernentes a: o que oferecer, como oferecer e de que forma
será feita a mediação pedagógica, o que permite desenhar a aplicabilidade
e as possibilidades de sucesso ou de fracasso desses ambientes. A primeira
etapa, segundo as autoras, é a mais importante, pois implica a opção por
uma matriz epistemológica educacional. Se a definição da concepção de
educação a ser oferecida for sociointeracionista, a escolha das ferramentas
de interação multidirecionais será prioridade. A segunda etapa é construída
a partir da escolha da tecnologia adequada à realidade dos sujeitos envolvidos no processo. Cada grupo pertencente à rede, interagindo em dada realidade, vai demandar um tipo de aparato tecnológico adequado às necessidades do curso que garanta o acesso de todos. A terceira etapa é engendrada pelo trabalho de diálogo, discussão e definição da arquitetura do ambiente por equipe multidisciplinar de tecnólogos e educadores que precisam
compartilhar conhecimentos pedagógicos e tecnológicos.
Nesse sentido,
(...) o que define a mudança de aprendizagem com o uso do
computador não é o uso, por si mesmo, da máquina, mas a arquitetura pedagógica projetada com determinada intenção e disponibilidade ao meio disponibilizado. Encontra-se subsumido no
nosso entendimento que o uso massivo de computadores na
educação pode vir a ser uma forma a mais de dominação e que
pode não significar a grande revolução do processo educacional a menos que assumamos essas noções híbridas em suas
intensidades e multiplicidades. Assumamos um conceito de
aprendizagem como criação, como abertura, o movimento de
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
desterritorialização, de acolhida do estrangeiro-em-nós, tomando-se a si mesmo como objeto de invenção, para fazer desse
processo muito mais de invenção do que de solução de problemas. Tem-se, então, que o cenário de aprendizagem é o espaço
por meio do qual se estabelece a conexão entre o conhecido e o
desconhecido, e esse espaço é o caos. É desse lugar que falamos de ambientes de aprendizagem como espaços
transdisciplinares baseados numa realidade multidimensional,
estruturada em múltiplos níveis, em lugar da realidade
unidimensional do pensamento clássico (Franciosi e Medeiros,
2005, p. 70 e 71).
Com essa orientação analítica, em situação de EaD virtual, o
aluno não deve ser visto como objeto, mas sim como sujeito, o que
demanda a criação de situações de ensino-aprendizagem através das
quais possa, como destaca Peters (2001), organizar seus estudos mediante interações com diferentes objetos de conhecimento.
Cabe-nos salientar que isso não significa respaldar concepções
racionalistas que situam apenas os interesses e iniciativas dos alunos
como preponderantes. Essa proposição guincha a pergunta: o que seria
ensinar em ambientes virtuais? Seria criar condições interventivas para
que processos de aprendizagem se desenvolvam, dando lugar a
metodologias interativas que desencadeiem práticas educativas que atendam às necessidades dos alunos e desafiem-nos a formular construções de concepções sociocognitivas? Mas, especificamente, que
metodologias seriam essas, considerando o contexto de Educação a
Distância virtual?
Uma resposta a essa questão pode ser construída, mais uma vez,
a partir das colocações de Palloff e Pratt (2004) que nos alertam, antes
de tudo, sobre quem são os sujeitos inter-relacinados nas metodologias.
Nesse prisma, temos o aluno que quer, entre outros aspectos,
interatividade, comunicação, direção adequada, sentido de comunidade,
capacidade para executar tarefas exeqüíveis, feedback. Presente na
mesma interação, está o professor que, também sendo aprendiz, aprende a lidar com situações inesperadas, complexas e inovadoras que lhe
exigem trabalhos de reconectividade para se tornar, conforme sublinha
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Lévy, apud Kenski (2001), o ponto de referência na orientação de seus
alunos no processo individualizado de apropriação do conhecimento que
se dá na construção coletiva mediada por aprendizagens cooperativas
em ambientes digitais de aprendizagem.
Prossegue a autora, citando Lévy, ao se referir ao professor atuante em ambientes virtuais:
Sua competência deve deslocar-se no sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento. O professor torna-se o animador da inteligência coletiva dos grupos que estão a seu encargo. Sua atividade será centrada no acompanhamento e na gestão das aprendizagens; no incitamento da troca de saberes, na mediação relacional e
simbólica, na pilotagem personalizada por percursos de aprendizagem, etc. (Lévy, apud Kenski, 2001, p. 79)
As redes solidárias entrelaçadas por relações alunos-professores – que constituem uma sociedade da aprendizagem – são geralmente consolidadas pela implementação de cursos em plataforma virtual
para EaD na internet. Os recursos mediatizados em plataformas virtuais, como destaca Guir, apud Alava (2002, p. 63), embora constituam
lugares de recontextualização e de ação que levam os professores
a redefinir seus papéis e sua competência, por si sós, não alavancam
inovações didáticas. Por conseguinte, tais recursos exigem a utilização
de metodologias interativas que possibilitem a formação de relações
dialógicas que consolidem compartilhamento de aprendizagens em rede.
Desse modo, o ambiente virtual de aprendizagem precisa
compatibilizar ferramentas e metodologias que atendam a princípios
interacionistas. Tal relação traz como tônica, na visão de Pretto (2000),
valores como trabalho coletivo, solidariedade e ética para esse novo
pensar e viver, aspectos esses que precisam ser agregados aos processos metodológicos propostos mediante ferramentas da EaD virtual.
Adentrando nessa perspectiva, é necessário, consoante Almeida
(2003), criar uma rede de interdependência em contínuo estado de
provisoriedade, constituindo uma unidade dinâmica que se desenvolve de forma relacional e pluralista (p. 201), por meio da qual são
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
desencadeados processos colaborativos no contexto em que a interação
e a coletividade, como explica Cerqueira (2005), sobrepõem-se à individualidade e à competição. Para tanto, como sublinha Sciotti (2004), é
indispensável a criação de espaços de aceitação e convivência em
patamares de equilibração entre o possível e o desejável, mediante ações
da comunidade de aprendizagem em ambientes virtuais.
A estrutura aberta em rede virtual de aprendizagem, que implica
as ferramentas e as interações metodológicas estabelecidas através
delas, permitem, na ótica de Lévy (1999, p.126), que
(...) a cultura das redes, ou cibercultura, [que] se dá exatamente
na articulação entre os princípios de interconexão das comunidades virtuais e da inteligência coletiva. Os interesses comuns
dessas pessoas, desterritorializadas, mas permanentemente
conectadas, criam novas formas de comunicação permanente e
universal e transformam todo o espaço virtual em um infinito
canal interativo de múltiplas aprendizagens.
Esse contexto de redefinição de processos educacionais subsidiados por tecnologias digitais está provocando, ainda que muitos professores e instituições insistam em não se abrirem a essa necessidade,
transformações radicais do modo como se ensina e como se aprende e,
com isso, de como os sujeitos operam transformações em suas competências. Mais do que ampliar metodologias, urge que construamos alternativas para darmos conta dessa nova realidade, pois, na verdade,
não tem sentido o homem querer desviar-se das máquinas, já que,
afinal de contas, elas não são nada mais do que formas
hiperdesenvolvidas e hiperconcentradas de certos aspectos de sua
própria subjetividade (Guattari, 1996, p. 177).
2
Justificamos a amostra, constituída por quatorze sujeitos, apenas, devido a pesquisa
requerer uma análise pormenorizada das falas e das posturas educativas dos participantes.
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Tania Scuro Mendes
ENTRELAÇANDO A REDE TEÓRICA COM OS DADOS
EMPÍRICOS
Constituíram sujeitos dessa investigação quatorze professores que
atuam ou atuaram em disciplinas de cursos de graduação oferecidos na
modalidade de EaD virtual e três instituições de ensino superior da grande
Porto Alegre – RS2. Tais sujeitos foram intencionalmente escolhidos,
mediante convites de participação à pesquisa.
Na primeira etapa investigativa foram desenvolvidas entrevistas
semi-estruturadas que foram gravadas e protocoladas através de transcrições das falas registradas. Na segunda, foram coletados dados referentes ao desenvolvimento de ações metodológicas propostas pelos professores, sendo esses relacionados com suas falas.
Os dados coletados através das entrevistas e das proposições
metodológicas desenvolvidas pelos professores foram analisados qualitativamente, mediante estudo que privilegia elementos da metodologia
qualitativa de pesquisa apoiada em Cook e Reichard (1986), Coehn e
Manion (1989) e Bardin (1977) que explicitam o processo de Análise de
Conteúdo.
Com os dados submetidos à lente analítica, constatamos inicialmente que há divergências quanto à visão de similaridade ou diferenciação de processos educativos desenvolvidos em ambientes virtuais e os
desenvolvidos de modos não-virtuais por parte dos sujeitos da pesquisa.
Metade dos professores entrevistados argumentaram sobre as diferenças entre essas instâncias de aprendizagem, especialmente em relação
às formas de interação.
Convém sublinhar que essas interações, como destacam Lévy et
al. (1999), não se restringem à conexão física (condição não suficiente
para participar dos novos processos de inteligência coletiva), mas ao
tipo de relacionamento interpessoal adotado, o qual pode ser passivo e
unidirecional ou, então, dialógico e interativo.
Para Almeida (2001), o sujeito, ao atuar nesse meio digital, vai
constituindo uma rede de interações composta por nós e ligações entre
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
idéias, teorias, conceitos e crenças. Assim,
na rede, todos os participantes são potencialmente ativos emissores, receptores e produtores de informações; co-criadores de uma
densa trama de inter-relações entre pessoas, práticas, valores, hábitos, crenças e tecnologias em um contexto caracterizado pela
diversidade, evolução e interdependência entre todos os seus componentes. A rede constitui um espaço de mútua influência, intervenção e sonhos, onde a alteração em um elemento implica em
mudança em todos os demais (Almeida, 2005, p. 2).
Devido à flexibilidade nas ações interlocutoras em espaços e tempos que extrapolam o aqui e agora, os processos educativos on-line
ganham, na visão dos entrevistados, novas abordagens.
Depurando as falas sintetizadas nas nomenclaturas das categorias, a
seguir salientadas, podemos inferir que, apesar dessa diferenciação entre
as concepções de processos educativos em ambientes virtuais e não virtuais, todos os entrevistados expressaram que, em ambas as situações, a
ênfase da aprendizagem está na construção cognitiva que, numa dinâmica progressista, implica um processo interativo onde e quando o sujeito
precisa da mediação dos outros para desenvolver aprendizagens que,
embora individuais, acontecem no coletivo. Desse modo, o sujeito reflete sobre conteúdos, elabora conceitos e os transpõe para a vida
prática, possibilitando que a aprendizagem constitua-se na transformação
por argumentações mais consistentes.
Tais argumentações são elaboradas e socializadas através de
registro escrito, já que uma das principais características do ambiente
virtual, como sublinham Rubin et al. (2005), são os registros das interações
entre os participantes que ocorrem nos espaços de comunicação mediante fórum, chat, e-mail, etc, com atividades realizadas individualmente,
ou em grupos, utilizando-se, por exemplo, portfólios.
O registro possibilita, na concepção de Prado (2003, p. 3),
a revisitação de trajetórias próprias e de outros, compartilhadas
no ambiente virtual. Isto significa que cada participante pode
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ser leitor de si mesmo e do outro, além de escritor ora individual,
ora em grupo e/ou coletivo no âmbito da turma. Este movimento
individual e coletivo de pensamento e explicitação sobre a ação,
reflexo e articulações entre diferentes vivências e teorias constitui uma nova forma de aprender.
Essas novas formas de aprendizagem estão correlacionadas aos
novos modos de construção sociocognitivos engendrados na comunicação em rede, em que a passividade do receptor, como explica Demoly
(2005), é objetivamente abalada, em virtude da necessidade concreta
de produções textuais.
A participação em redes de conversações é capaz de operar o
deslocamento da posição de autoria e, por extensão, das relações de
poder. Maraschin (2005, p. 142) explicita:
(...) as redes de conversação acopladas às tecnologias da informação e da comunicação podem operar voltadas a um exercício
capaz de promover o enriquecimento da experiência, pela possibilidade de escuta, expressão e ação. Essas análises tomam como
observáveis da rede de conversações, tanto a produção escrita
– síncrona ou assíncrona – desses coletivos quanto suas intervenções orais – videoconferências. De um modo recorrente, (...)
a participação de redes telemáticas de conversação convoca a
constituição recursiva de um plano de tensão entre diferentes
modos de expressão, ação, significação. A necessidade de se
autonarrar para dar-se a conhecer em um coletivo pode promover efeitos de inclusão e de autoria.
Prosseguindo a análise para a busca da fundamentação
epistemológica das intervenções educativas dos docentes nas mediações on-line, de modo a darem conta das proposições elucidadas, encontramos, nas respostas dos entrevistados, que 100% alegam desenvolver abordagens interacionistas, enveredando pelas perspectivas:
construtivista de Piaget (50%); sociointeracionista de Vygotsky (30%)
e progressista de Paulo Freire (20%). Esses fundamentos teóricos abraçados remetem-nos ao desenvolvimento de aprendizagens autônomas.
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
As aprendizagens em meios digitais oportunizam, segundo Peters
(2003), o autoplanejamento e a auto-organização, que são precondições
inusitadamente favoráveis para este tipo especial de aprendizagem. Entre
os exemplos citados pelo autor estão o hipertexto e a hipermídia, através dos quais o sujeito seleciona os caminhos de aprendizagem baseando-se em seus próprios interesses e associações, tendo em vista seu
estilo cognitivo. E continua: a falta de limites, a incerteza, a
inconcebilidade e a vacuidade do espaço por trás da tela do monitor
mudam totalmente a situação (p. 269).
As aprendizagens auto-reguladas pelos alunos solicitam outro
perfil de professor, pois, conforme adverte Peters (2001a),
há o perigo de que formas antigas de aprendizagem sejam
reproduzidas na mídia eletrônica. Dessa maneira, o aluno dependente tornar-se-ia ainda mais dependente. Eis por que novos métodos para novas mídias devem ser desenvolvidos e
implementados. Dentro de pouco tempo, veremos que essas
novas mídias oferecem oportunidades para o autodidata (...)
Compreenderemos que essas novas mídias não são destinadas
à apresentação de conhecimento, mas antes para a construção
de estruturas pessoais de conhecimento, uma tarefa a ser realizada pelo aluno, individualmente (p. 124).
Na ótica de Terçariol et al. (2005), da qual compartilhamos, os
professores responsáveis pela disciplina desempenham papel fundamental no processo de aprendizagem, uma vez que funcionam como
consultores, articuladores, orientadores e problematizadores no processo de desenvolvimento do aluno.
No entanto, resgatando as palavras de Teixeira (2004), a maior
dificuldade é que cada professor deve debruçar-se sobre o estado de
autonomia intelectual do aluno para poder ajudá-lo a partir do estágio
em que ele se encontra. Uma das possibilidades para se alcançar essa
perspectiva é a postura pesquisadora do educador, aliando a criticidade
à criatividade, para investigar condições de intervenções educativas
que visem à construção da autonomia intelectual do educando.
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Mas como conceber a pesquisa no processo educativo?
Para entrarmos nessa questão, enveredemos pelas condutas
metodológicas, verificando como os entrevistados localizam-se em relação aos procedimentos de suas ações educativas. Questionados em
relação a que metodologias que propõem dariam conta da orientação
epistemológica explicitada, 15% dos sujeitos da pesquisa as concebem
centradas nas ferramentas do ambiente virtual de aprendizagem.
Alguns exemplos pertinentes a essa categoria são discriminados por
eles: diálogos via correio eletrônico e chats; discussão em
videoconferências; interação com a midioteca (biblioteca virtual). Assim, o ambiente informatizado de aprendizagem disponibilizado deve, na
visão desses sujeitos, comportar condições físicas e de navegabilidade
que, por si sós, alimentariam o processo metodológico.
De outro modo, a expressiva maioria dos professores (75%) estabelece a relação entre as ferramentas do ambiente virtual e as suas proposições metodológicas, abrindo possibilidades de intervenções que podem ir além da estrutura do ambiente, pois implicariam relações contextuais
estabelecidas em processos colaborativos de aprendizagem. Nessa vertente, são apontadas estratégias tais como: fóruns com resolução de problemas e discussão dos retornos e provocações para aguçar a capacidade de
questionamento do aluno; cases com situações práticas reais e cotidianas;
pesquisas bibliográficas de levantamento de dados relacionadas a projetos
de pesquisa com saídas de campo, para que o aluno identifique e selecione
as fontes de informações que possam desenvolver o processo de investigação; visitas e análises de conteúdos de sites, desencadeando simulações
envolvendo relação teoria-prática (especialmente na formação em serviço); trabalhos em grupos virtuais, visando ao alcance coletivo de metas
como análises cooperativas; produções coletivas de memorial reflexivo que,
consoante Rubin et al. (2005), apontem conhecimentos prévios, dificuldades, formas de superação, avanços e pontos marcantes sobre as experiências no curso, bem como diversidades e diferenças nas trajetórias sociais.
Todas essas proposições aparecem motivadas pela democratização nas
participações e flexibilidade nas comunicações que possibilitam a autoridade compartilhada.
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possibilidades metodológicas
As sugestões elencadas situam-se na vertente epistemológica
interacionista que fundamenta uma pedagogia relacional, segundo a qual
o professor ou tutor não são o centro do processo ditando o percurso a
ser trilhado. Desse modo, os membros da comunidade on-line passam,
como destaca Fichmann (2005), a se enxergar dentro do contexto das
atividades que executam, criando a possibilidade de intervir em seu
próprio funcionamento e participar da manutenção de sua identidade.
Paloff e Pratt (2004), apud Araújo (2005), enfatizam que o instrutor ou tutor devem evitar o comportamento de palestrante e a exposição a longos textos orais ou escritos, mediante apresentações eletrônicas (Power Point e slides). Segundo elas, a estratégia mais eficaz é
(exemplificando) propor um parágrafo de conteúdo e fazer algumas
perguntas para que os próprios aprendizes iniciem o processo e explorem as idéias.
Além disso, subsidiando-nos nas explicações de Araújo (2005), o
papel do tutor on-line é fornecer grande quantidade de feedback, em
um tom amigável e pessoal, para a contribuição dos aprendizes. Cabe
sublinhar também que entre as funções do tutor está a de indicar os
serviços que levam o aprendiz a ser mais autônomo, uma vez que, amparados em Pratt e Paloff, (2004), não podemos pensar que todos os
alunos têm a capacidade de agirem independentemente.
Encaminhando a análise para outras possibilidades
metodológicas, que podem ser implementadas na EaD virtual, as respostas podem ser agrupadas em três categorias: a primeira, sobre a
qual recai a ênfase, é concernente a possibilidades vinculadas à
melhoria no caráter interativo das ferramentas (53,8% da incidência de proposições). São citadas nessa classe novas ferramentas para
bate-papo; messager para identificar as pessoas que conhece e aceitar
ou não o convite para conversar; link para notícias (eventos, reclamações, comemorações); qualificação de fóruns mediante maior interação
e caráter socioafetivo; sites com espaço para apresentação de Power
Point como mapas conceituais; gravação com interação mais direta;
espaços compartilhados de convivência, como Fórum Cafezinho não
síncrono, para conversas informais de apresentação.
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Todos esses aspectos que dizem respeito à melhoria do caráter
interativo das ferramentas do ambiente virtual de aprendizagem permitem
situações comunicativas. Contudo importa a ressalva de Pretto (2000):
o uso dessas tecnologias será um fracasso, se insistirmos na
sua introdução como ferramentas, apenas como meros auxiliares do processo educacional, de um processo caduco, que continua sendo imposto no cotidiano das pessoas que vivem outro
momento histórico. Em todas essas situações, a distinção entre
a educação presencial ou a distância faz pouco sentido, pois
estando essas tecnologias presentes, mudam a dimensão espaço-tempo e, com isso, essa distinção presencial-a distância esvazia-se de sentido (p. 1).
Uma segunda categoria refere-se à melhoria do processo
metodológico, o que convergiu para uma porcentagem de 38,4 % dos
itens elencados pelos entrevistados. Foram por eles apresentadas as
seguintes proposições: corrigir as rotas de relações com os alunos (a
impessoalidade colabora com o desrespeito); tratamento lúdico dos conteúdos mediante, por exemplo, jogos educacionais; proposição de dossiê
eletrônico de tarefas com a elaboração de portfólios; construção de
textos coletivos com as falas de todos os alunos.
Atendendo aos princípios advindos de uma postura epistemológica
interacionista, essas metodologias acabam customizando o ambiente
virtual de suporte ao curso, conferindo ao tutor funções que tendem a
se transformar cada vez mais.
Perrenoud (2000) já alertava que na educação do futuro haverá
uma nova organização do trabalho docente e que a educação será mais
personalizada, apresentando novas ferramentas, mais precisas, de avaliação formativa e de regulamentação; que nenhuma tecnologia poderá
fazer efeito sem mediação pedagógica. Por isso, o autor vê como con3
Araújo (2005) adverte que o instrutor deve limitar sua participação para, aproximadamente, um quarto ou até metade do material on-line, provendo contexto para discussão e dando ganchos para comentários, bem como ser rápido em responder aos
alunos, quer por mensagem pessoal, quer frente ao grupo.
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
dições do professor do futuro uma qualificação maior, ampla cultura na
área das ciências humanas, forte orientação para as práticas reflexivas
e capacidade de inovação. Todavia alerta que o futuro não vai resolver
por si os problemas da educação, tendo em vista que a escola do futuro
pode ser ainda menos igualitária e eficaz que hoje.
Os entrevistados destacaram ainda, em porcentagem menor (7,6%),
aspectos que foram agrupados na terceira categoria, relativa à melhoria
no âmbito administrativo-pedagógico: intensificar os atendimentos;
monitoria para explicações administrativas e técnicas nas redes digitais;
necessidade de o instrutor evitar participar demais das discussões3.
Das análises e discussões dos dados levantados na pesquisa
empírica, articulados na sua trama teórica, podemos cerzir algumas
considerações que seguem...
TECENDO CONSIDERAÇÕES NÃO CONCLUSIVAS
FRENTE AOS DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA EAD
VIRTUAL
Embora as proposições metodológicas orientadas geralmente pela
epistemologia interacionista privilegiem a construção cognitiva, elas
apresentam íntima relação com as possibilidades das ferramentas que
integram os ambientes virtuais de aprendizagem. A maioria dos docentes entrevistados aponta a necessidade de melhoria no caráter interativo
das ferramentas para que permitam qualificar os processos educativos
e para que ampliem possibilidades de sociocognição.
Mesmo reconhecendo que o processo de aprendizagem se desenvolve no âmbito individual, e de modo autônomo, as possibilidades
metodológicas vislumbradas por esses professores enfatizam trabalhos
cooperativos – atendendo à perspectiva piagetiana de que a autonomia
é construída na cooperação –, condição que precisa ser contemplada
pelas ferramentas do ambiente virtual de ensino-aprendizagem, de maneira a possibilitarem trabalhos docentes mais interativos.
Diante das necessidades elucidadas, dois desafios impõem-se na
116
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Tania Scuro Mendes
construção de ambientes virtuais de ensino-aprendizagem:
Como abrir esse ambiente, que tem uma estrutura sistêmica,
mesmo apresentando hipertextos e diferentes tipos de links, para processos de criação pelos alunos, que podem ir além do estabelecido nos
limites da plataforma virtual do curso?
Como extrapolar, nesse sistema virtual aberto, a disciplinaridade
e, envolvendo a relação ensino-aprendizagem-pesquisa, constituir sínteses criativas metadisciplinares?
Dos vários impactos, de naturezas pedagógica, social, econômica, que são deflagrados através dos dados submetidos à análise mediante a pesquisa desenvolvida, o que mais instiga a mudança de atitude
em relação à EaD virtual é o que diz respeito a que as plataformas
virtuais dos cursos oferecidos precisam criar, através de suas ferramentas, possibilidades para ações metodológicas que suplantem as formas convencionais de ensino-aprendizagem, superando as perspectivas instrucional, técnica e funcionalista e, como extensão da utilização
de recursos digitais, ampliem as condições interativas nas estruturas
abertas em redes que hospedam sociedades de aprendizagem.
Como explicita Ramal (2000), nosso pensamento acostumado a
se organizar em imagens e linearidade passa, com tais ambientes virtuais, a trabalhar com links – nós e redes –, o que distende as capacidades intelectuais do homem4. Isso requer, segundo a autora, que a formação de professores tenha mais ênfase em psicologia e ecologia
cognitiva.
Nós não teremos limites para o nosso desenvolvimento humano se fizermos da técnica um instrumento de apropriação de
nós mesmos e de nossa cultura (Pellanda, 2005, p. 67). Porém, como
alerta Alves (2003), a vida não pode ser trocada pelo fascínio dos meios
4
Segundo Schaff (1992), assistimos a duas grandes revoluções da interação humana
com a tecnologia. A primeira pode ser situada entre o final do século XVIII e início do
século XIX, quando se substituiu a força física do homem pela energia das máquinas.
Hoje, temos a segunda revolução, caracterizada pela ampliação das capacidades intelectuais através da tecnologia.
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Intervenções educativas em ambientes virtuais: investigando
possibilidades metodológicas
tecnológicos, pois, no interior de uma sociedade desigual, infelizmente,
todos esses avanços tecnológicos continuarão privilegiando uma
parte da população (...). A maior parte das escolas [e, ousamos
dizer, de cursos de EaD virtual] continuarão com fórmulas pedagógicas ultrapassadas, tendo acesso a poucos recursos
tecnológicos, [com] resultados comprometedores para o futuro
profissional desses alunos (Moran, 2004, p. 7), tendo em conta a
inviabilidade de ações metodológicas que propiciem o desenvolvimento
de competências (hoje mais do que nunca) fundamentais para a inserção cidadã.
Se a inovação tecnológica da EaD virtual trazia a esperança de uma
inovação pedagógica, especialmente porque aquela nasceu colaborativa,
hoje a perplexidade convida-nos a refletir. No afã de oferta de cursos online, e com novas demandas da economia do conhecimento, temos assistido
à tecnologia da EaD virtual abrigando (ou seria suportando, no sentido de
desagrado?) práticas pedagógicas inadequadas à atualidade e que, mesmo
não combinando com a inovação engendrada pelas comunidades virtuais
de aprendizagem, insistem no álibi da democratização do ensino. No entanto quantidade nem sempre á qualidade!
Por isso, resta darmos mais atenção às intervenções educativas
em ambientes virtuais, investigando possibilidades metodológicas.
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PRÊMIO
Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
TERCEIRA EDIÇÃO DO PRÊMIO
CONSTRUINDO A IGUALDADE DE GÊNERO
Nilcéia Freire
Ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres
Resumo / Abstract
O Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero – concurso
de redações e artigos científicos na área das relações de gênero, mulheres e feminismos – é uma iniciativa da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres/Presidência da República,
do Ministério da Ciência e Tecnologia, do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, do Ministério
da Educação e do Fundo de Desenvolvimento das Nações
Unidas para a Mulher, e tem como objetivos estimular e fortalecer a pesquisa no campo dos estudos das relações de gênero, mulheres e feminismos, buscando contemplar a intersecção
com as seguintes abordagens: classe social, geração, raça,
etnia e sexualidade; e sensibilizar a sociedade para tais questões.
The Prize “Building Equality of Gender” – a competition
of scientific essays and articles about the issues of gender
relations, women and feminisms – is an initiative of the
Brazilian Government’s Special Secretariat of Policies for
Women, the Ministry of Science and Technology, the National
Council for Scientific and Technological Development, the
Ministry of Education, and the United Nations’ Development
Fund for Women. It aims to stimulate and to strengthen
research on gender relations, women and feminisms, with the
intent to contemplate the intersection among the following
approaches: social and generational inequalities, race,
ethnic groups and sexuality, as well as to sensitize society to
such issues.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
Palavras-chave / Key words
Relações de gênero, mulheres, feminismos.
Gender relations, women, feminisms.
APRESENTAÇÃO
A terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
é uma iniciativa da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres
(SPM) que legitima os estudos de gênero no universo acadêmico e
mobiliza estudantes e professores do ensino médio a refletirem sobre
questões da maior urgência no ambiente escolar do país.
O prêmio se reveste da maior importância, já que se trata da
concretização de prioridades reafirmadas no II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM) e da consolidação de ações conjuntas
entre o CNPq, MCT, MEC e Unifem, que vêm sendo desenvolvidas
desde 2005, através do Programa Mulher e Ciência.
O II PNPM reafirma os princípios de contribuição com a educação pública na construção social de valores que garantam a inclusão
das questões de gênero, raça e etnia nos currículos; que reconheçam e
busquem formas de romper com as práticas educativas, a produção de
conhecimentos, a educação formal, a cultura e a comunicação
discriminatórias.
No contexto das ações do Programa Mulher e Ciência, o Prêmio
Construindo a Igualdade de Gênero se insere também no conjunto de
esforços que a SPM vem fazendo no sentido de aprofundar as recomendações referentes à educação recebidas pelo governo brasileiro do
Comitê da Organização das Nações Unidas, que zela pela implementação
da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), quando da apresentação do VI Relatório Brasileiro em julho de 2007.
Entre essas recomendações está a intensificação dos esforços
para acelerar e aprofundar as mudanças culturais. Reconhecendo os
esforços empreendidos pelo setor educacional brasileiro para transfor-
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
mação das relações de gênero, o comitê aponta, entre os campos que
merecem prioridade, a atenção à tendência de direcionamento de homens e mulheres a carreiras específicas e o problema da reafirmação
de estereótipos de gênero associados às áreas de atuação profissional.
No enfrentamento dessas questões, o Programa Mulher e Ciência tem ampliado o alcance de suas iniciativas para o apoio a projetos e
pesquisas através de parcerias com a Capes e o Inep, sendo estas
voltadas para os programas de pós-graduação e para a análise dos
indicadores de gênero sobre a participação das mulheres nas carreiras
acadêmicas. Os espaços abertos nas instituições de ensino e pesquisa
em todos os níveis dos sistemas de educação, ciência, tecnologia e inovação do país são fundamentais para a construção de ambientes
propiciadores de novas culturas que incluam as reflexões sobre as relações de gênero.
Em seu terceiro ano de existência, o Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero já atingiu um total de 4.489 participantes, dos quais
29% do sexo masculino e 71% do sexo feminino. Dos participantes
40% são da Região Sudeste, 25% do Nordeste do país, 19% do Sul,
12% do Centro-Oeste e 4% da Região Norte.
Entre os temas abordados estão: o enfrentamento à violência de
gênero, ao racismo, à homofobia; a crítica aos estereótipos de gênero
tão recorrentemente presentes na mídia; a Lei Maria da Penha; a participação política das mulheres; retomadas de histórias de feminismos;
a fome zero; sexualidade; homens feministas; mulheres nas ciências.
Tais “temas que não ganham concursos” nos dão a certeza de que
estamos no caminho certo.
Esperamos que a leitura dessas redações e artigos – ora expressão de duras realidades, ora de perspectivas de mudanças – seja
inspiradora para novas ousadias e que possam ser um material provocador de novas leituras por se tratar de textos transformadores de mentalidades e práticas.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
RESUMOS DOS ARTIGOS CIENTÍFICOS PREMIADOS 1
CATEGORIA GRADUADO
A dimensão do enfoque de gênero no Programa Bolsa
Família: ranços e avanços na promoção do empoderamento
das mulheres nos municípios baianos
Autora: Bárbara Maria Santos Caldeira2
Universidade de Burgos, Espanha
Universidade Católica do Salvador – UCSal
Orientadora: Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti
Resumo
As políticas de ações afirmativas direcionadas às mulheres integram hoje o quadro de metas e problemas a serem superados pelos
planejamentos de políticas públicas com recorte social no cenário brasileiro. O Programa Bolsa Família, que tem como objetivo combater a
pobreza e reduzir a fome das famílias inseridas no contexto de
vulnerabilidade social, traz através de suas diretrizes e normativas ações
complementares de apoio ao programa e às gestões municipais. A dimensão do empoderamento feminino surge nesse quadro como ele-
1
Os artigos científicos e as redações encontram-se disponíveis no endereço:
http://www.cnpq.br/premios/2007/construindo_igualdade/index.htm
2
Licenciada em História pelas Faculdades Jorge Amado; Doutoranda em História pela
Universidade de Burgos; Coordenadora de Apoio a Projetos, Programas e Conselhos
da Secretaria Municipal de Assistência Social de Alagoinhas, BA; Assessora de Projetos Sociais da ONG Centro de Formação Talita; integrante do Núcleo de Pesquisa
e Estudos sobre Juventude, Identidade, Cidadania e Cultura (NPEJI), alocado ao
Mestrado em Família na Sociedade Contemporânea da UCSal.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
mento de fundamental importância para avaliação acerca da eficiência
e eficácia relacionadas aos instrumentos de acompanhamento das
condicionalidades e da oferta dos serviços sociais básicos de saúde,
educação e assistência social como promotores da inclusão social. O
objetivo desse artigo é apresentar algumas considerações acerca das
perspectivas defendidas pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS) que afirmam o crescimento de elementos que
justifiquem o aumento do empoderamento feminino das beneficiárias
do Programa Bolsa-Família, através da transferência direta da renda e
pelo índice ocupacional na gestão do programa pelas mulheres. A
metodologia de pesquisa é enveredada pelo levantamento quantitativo,
com amostragem de 96 municípios baianos, sobre os instrumentos de
acompanhamento e avaliação pelas gestões locais, ademais da contribuição dos grupos focais com representantes governamentais, sociedade civil e mulheres beneficiárias do programa.
Palavras-chave
Programa Bolsa Família, gênero, empoderamento, políticas
sociais.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
Economia feminista: uma proposta epistemológica em
defesa do pluralismo
Autora: Brena Paula Magno Fernandez1
Orientador: Marcos Barbosa de Oliveira 2
Universidade de São Paulo – USP
Resumo
A Economia Feminista é um dos mais recentes programas de
pesquisa em ciência econômica. Desde a publicação de Beyond
economic man, organizado por Ferber e Nelson (1993), ele vem se
desenvolvendo com crescente força, sobretudo nos Estados Unidos.
Entretanto a pesquisa feminista, em geral, e a economia feminista, em
particular, são freqüentemente consideradas como menos objetivas do
que as pesquisas tradicionais, e isto porque estas últimas seriam livres
de valores, enquanto que as primeiras não.
Na primeira parte do trabalho, traçamos algumas definições centrais da Economia Feminista. A partir daí propomos, tomando por base
o modelo crítico do filósofo da ciência Hugh Lacey (1998, 1999), que
todo conhecimento científico é produzido mediante a subordinação a
alguma estratégia de pesquisa, que carrega consigo a marca dos valores sociais mais prementes e que impõe limites à parcela da realidade
que pode ser acessada pela investigação. Segundo essa abordagem, há
(e deve haver) uma interação profunda entre ciência e valores, que é
essencial para a metodologia científica. Sendo assim, três principais
teses são defendidas: (i) almejar a objetividade não significa defender
uma metodologia isenta de influências valorativas, (ii) a neutralidade é
(e deve ser) defensável para o conjunto da prática científica e, finalmente, (iii) a defesa da pluralidade de abordagens científicas é o meio
através do qual a neutralidade da ciência como uma prática social pode
1
2
Pesquisadora de Pós-Doutorado da USP, Bolsista do CNPq.
Professor do Departamento de Filosofia da Educação e Ciência da Educação da USP.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
ser salvaguardada.
Nosso intuito será explicitar que as características dominantes
herdadas da ciência moderna positivista – racionalidade, objetividade,
abstração, análise quantitativa e neutralidade axiológica – têm sido culturalmente associadas ao rigor e à masculinidade, ou seja, que essas
categorias supõem valores sexistas androcêntricos. Enquanto isso, outras formas ou abordagens do conhecimento, que têm sido sistematicamente alijadas da instância oficialmente considerada como ‘científica’,
carregam um viés para a cooperação, as análises qualitativas e verbais,
a concretude e o comprometimento explícito com valores. Estas propostas têm sido associadas à vagueza, à imprecisão teórica e à feminilidade.
Estas metáforas são assimétricas, na medida em que o dualismo
masculino/feminino é hierárquico: atividades, valores e métodos associados ao gênero masculino seriam ‘objetivos’ e, conseqüentemente,
universalizáveis, ao passo que seus correlatos vinculados ao gênero
feminino seriam ‘subjetivos’ e, portanto, deveriam restringir-se ao âmbito do particular e do específico. Assim, triunfa o rigor (hardness) da
ciência masculina sobre a imprecisão e a vagueza (softness) das abordagens, métodos e valores alternativos – ‘femininos’.
No âmbito socioeconômico, é justamente a essa tarefa que se
propõe a Economia Feminista: revelar esses efeitos perversos e essas
relações desiguais de poder. Ou seja, a crítica feminista à Economia
que discutiremos nesse trabalho pretende reconceitualizar aquelas categorias nada neutras com as quais se define, se mede e se estuda o
fenômeno econômico na teoria neoclássica, colocando em questão a
suposta objetividade que o modelo tradicional reclama possuir. Além
disso, ela também se propõe a desenvolver novas perspectivas e novas
formas de ver o mundo social e econômico que permitam tornar visível
o que tradicionalmente a disciplina mantém como oculto.
Palavras-chave
Economia feminista, epistemologia feminista, Hugh Lacey, neutralidade de valores, objetividade, pluralismo.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
O jovem macho e a jovem difícil: sexualidade, subjetividade
e governo no discurso curricular
Shirlei Rezende Sales do Espírito Santo1
Marlucy Alves Paraíso2
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Resumo
Este artigo trata de fragmentos dos discursos do currículo escolar e do currículo do Orkut. O trabalho argumentativo é desenvolvido
com base nos dados do currículo de uma escola pública de ensino médio, bem como dos fóruns, tópicos e scraps postados nas comunidades
e nos perfis das/os alunas/os dessa escola no Orkut. O Orkut é um site
de relacionamentos que se autodefine como: “uma comunidade on-line
criada para tornar a sua vida social e a de seus amigos mais ativa e
estimulante”.
O objetivo é analisar o processo de produção de subjetividades
juvenis no discurso do currículo escolar e do currículo do Orkut. Orkut
é compreendido como possuindo um currículo cultural, o qual é definido como parte de uma “pedagogia cultural” que, “de maneira mais
ampla, nos ensina comportamentos, procedimentos, hábitos valores, e
atitudes, considerados adequados e desejáveis, através de diferentes
artefatos, como o cinema, a televisão, as revistas, a literatura, a moda, a
publicidade, a música, etc.” (Paraíso, 2001, p. 144).
A metodologia utilizada para a coleta de dados foi a observação
participante, com o uso de algumas técnicas etnográficas, como o registro em diário de campo e entrevistas semi-estruturadas.
1
Doutoranda em Educação pela UFMG e membro do Grupo de Estudos e Pesquisas
em Currículos e Culturas (GECC) da Faculdade de Educação da UFMG.
2
Professora da Faculdade de Educação da UFMG, Coordenadora do GECC e
Orientadora da pesquisa que subsidia este trabalho.
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
O argumento desenvolvido é de que a sexualidade é um dispositivo acionado no discurso do currículo escolar e do currículo do Orkut,
para o governo da juventude. Nesses discursos é possível perceber
uma intensa regulação da sexualidade juvenil pautada na
heteronormatividade. A regulação se dá por meio da tecnologia da
“zuação”, a qual é composta por várias técnicas como o sarcasmo, a
ironia, o deboche, o repúdio, a interdição, etc. No caso dos garotos, há
nos discursos uma declarada homofobia, demandando o Jovem MACHO. Quanto às garotas, a regulação incide sobre a quantidade de
parceiros nas práticas de “ficar” ou “pegar”, demandando a Jovem
DIFÍCIL.
É possível perceber nos discursos analisados uma espécie de
guia cotidiano para que as/os jovens possam conduzir a própria existência. Essa condução se dá de maneira dispersa e heterogênea. As mais
variadas condutas juvenis são alvo de toda uma tecnologia de poder que
governa a juventude, ao mesmo tempo em que lhe imprime técnicas de
autogoverno. A sexualidade é o dispositivo acionado nesse processo.
Ela é interrogada, questionada, avaliada, por meio da tecnologia da zuação,
não apenas como um modo de relação entre dois parceiros, mas como
formas que o jovem e a jovem devem regular sua conduta, a partir de
um lugar relacional, no cotidiano de seus comportamentos mais corriqueiros, tanto no currículo escolar quanto no Orkut. Nesses discursos,
são demandadas a subjetividade do jovem macho e da jovem difícil, as
quais entram em confronto com outras subjetividades lá produzidas e
em outros discursos. É preciso ressaltar, no entanto, que nenhuma classificação – entre o que é risível, engraçado, aceitável ou não – está
estabelecida com exatidão, em uma espécie de linha divisória clara e
definitiva.
No contexto atual, em que tanto a cibercultura como a educação
são divulgadas como importantes instrumentos para o desenvolvimento
e o progresso nacional, o discurso do currículo escolar e do Orkut assumem uma posição estratégica. A produção do jovem macho e da jovem
difícil pode contribuir para o acirramento das desigualdades sexuais e
de gênero. Essas subjetividades, no entanto, vão disputar com outras
disponibilizadas em outros discursos, especialmente dos movimentos
134
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
feministas e GLBTTT (gays, lésbicas, bissexuais, transexuais,
transgêneros e travestis). Nesses é possível encontrar formas de valorizar as subjetividades marginalizadas e repudiadas no currículo escolar
e no Orkut.
A tecnologia da zuação e todo aparato de técnicas acionadas
produzem não apenas aquilo que é considerado anormal e patológico,
como também visam a demarcar as fronteiras dos comportamentos
considerados normais. Discutir tão intensamente a sexualidade no currículo escolar e no Orkut, com base em uma moral patriarcal,
heteronormativa e homofóbica, intensifica o poder de governo e
autogoverno da juventude e pode ajudar a reforçar determinados tipos
de relações sociais, em que as diferenças são vividas em termos de
desigualdade e injustiça.
Palavras-chave
Gênero, sexualidade, subjetividade, governo, discurso curricular.
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CATEGORIA ESTUDANTE DE GRADUAÇÃO
Participação política e as relações de gênero: o caso do
Orçamento Participativo de Belo Horizonte
Autora: Uriella Coelho Ribeiro
Orientadora: Dra. Marlise Miriam Matos
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Resumo
Este trabalho pretende ser um instrumento de discussão sobre a
participação política das mulheres no âmbito da democracia brasileira.
Buscamos compreender os condicionantes da participação política feminina, na tentativa de elucidar elementos constitutivos dessa participação, especificamente no Orçamento Participativo de Belo Horizonte
(OP-BH). Desde a década de 1970, num movimento crescente e consistente de pressão social rumo ao processo de redemocratização brasileira, observamos uma retomada na importância da construção de
uma sociedade civil e autônoma. Este movimento abriu espaço, inclusive institucional, para a emergência daquilo que os estudos da participação em Ciência Política vêm designando por “instituições híbridas”, como
é o caso dos Orçamentos Participativos, que parecem caminhar em
direção à consolidação de uma combinação fértil e promissora entre
representação e participação popular. A partir de então, o que se tem
constatado no Brasil é a discussão, proposição, implantação e
implementação de diversos arranjos e mecanismos de participação popular. Este crescimento da participação é sustentado pela aposta na sua
potencialidade inclusiva e, portanto, no seu impulso à consolidação democrática no Brasil. Porém estes arranjos tendem a reproduzir desigualdades mais amplas presentes na estrutura social, porque, segundo
Avritzer (s/d), o “associativismo se organiza obedecendo a padrões de
desigualdade”. Partindo desta assertiva, cabe a este trabalho investigar
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como que, e se, as desigualdades de gênero presentes na estrutura
social brasileira estão sendo reproduzidas nessas esferas políticas brasileiras a partir da experiência do OP de Belo Horizonte. Nossa discussão parte da constatação de que existe uma presença predominantemente feminina nas primeiras plenárias e uma ocupação majoritariamente masculina das posições de liderança na Comforça (comissão
fiscalizadora) do OP-BH, o mesmo se observando nos COPs (conselhos fiscalizadores) de outros OPs, como por exemplo nos de Porto
Alegre, Recife e Suzano-SP.
A nossa proposta é guiada pelo princípio da paridade na participação (Fraser, 2001), o qual requer arranjos sociais e institucionais
que permitam uma interação mais simétrica entre membros enquanto
pares. O objetivo é demonstrar que para existir uma paridade efetiva na
participação de homens e mulheres na esfera política, tomando-se aqui
como patamar desta participação o OP-BH, torna-se necessária a consumação de precondições materiais e simbólicas. Tratamos como exemplo de precondição material, uma eqüitativa distribuição de recursos
financeiros e de tempo que permita a entrada de pessoas nessa esfera
e que também garanta o direito a “voz” independente a todos os participantes. As precondições simbólicas pressupõem, por sua vez, que padrões de valoração cultural promovam igualdade e respeito entre todos
os membros participantes. Valores que deveriam garantir maiores oportunidades na participação, abolindo da esfera política idéias que, de alguma forma, depreciem qualquer grupo de pessoas ou suas características peculiares. Nosso trabalho propõe pôr em xeque padrões
institucionalizados – sejam materiais, sejam simbólicos – que excluam
grupos considerados diferentes, ao negar-lhes a condição de pares na
interação. Para atingir o objetivo proposto, analisamos documentos e
informações em material de divulgação da Prefeitura de Belo Horizonte e em seu próprio sítio, buscando compreender o projeto político que
estrutura o OP-BH, suas prioridades e prerrogativas. Além disso, acompanhamos o processo do OP-BH 2007/2008 desde o seu início (8/5/
2006) até seu encerramento (15/12/2005). Os resultados do trabalho
também levam em conta as análises das entrevistas realizadas com
mulheres delegadas e membros da Comforça do OP-BH.
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Palavras-chave
Orçamento participativo, paridade participativa, relações de gênero.
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Penetras no “Clube do Bolinha”: a carreira política das
mulheres na Câmara dos Deputados
Autora: Fernanda Nunes Feitosa Barros
Orientador: Luis Felipe Miguel
Universidade de Brasília – UnB
Resumo
Dados de uma ampla amostra, de quase 12 mil discursos pronunciados nas duas últimas legislaturas, revelam que as parlamentares do
sexo feminino falam sobre temáticas diferentes das dos homens – elas
se pronunciam mais sobre família, infância ou educação, e menos quando o assunto é, por exemplo, política econômica. Trata-se de uma “perspectiva feminina” diferenciada que se incorpora ao parlamento, como
querem alguns, ou o insulamento das deputadas nestas questões representa o reforço de um estereótipo que veda o acesso delas às posições
centrais do campo político? Neste último caso, a diferença de ênfase na
ação política das mulheres se deve não a uma “sensibilidade” diferente,
mas às oportunidades abertas a elas no campo político. Ao mesmo tempo em que são mais permeáveis à presença das mulheres, tais temas
estão associados a posições menos prestigiadas. Estabelece-se, assim,
uma “divisão sexual do trabalho político”, em que correspondem às
mulheres as posições menos propícias à acumulação de capital político.
Palavras-chave
Política, mulheres, cotas, representação, igualdade.
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Relações de gênero e rock’n’roll: um estudo sobre bandas
femininas de Florianópolis
Autor: Rodrigo Cantos Savelli Gomes
Orientadora: Maria Ignez Cruz Mello
Universidade do Estado de Santa Catarina – Udesc
Resumo
Esta investigação tem como objetivo refletir sobre como as relações de gênero, instituídas de poder, prestígio, hierarquia e discriminações afetam, modelam e estruturam o discurso e a performance musical das integrantes das bandas femininas da região da Grande
Florianópolis, Santa Catarina. Sendo a música uma das manifestações
culturais mais próximas do cotidiano das pessoas, esta pesquisa parte
do princípio que a mesma pode estar diretamente afetada por essas
determinações (Brett e Wood, 2002), seja reproduzindo, afirmando, seja
contestando modelos e costumes vigentes.
Num primeiro momento, este trabalho consistiu em uma sondagem sobre quais são os grupos femininos, quem e quantas são as integrantes, onde moram, onde e para que tipo de público se apresentam,
que instrumentos e estilos de música tocam ou cantam. Indiscutivelmente, um dado que veio à tona logo nas primeiras buscas é que a
quantidade de grupos formados exclusivamente por homens supera
exorbitantemente o número de grupos musicais femininos.
Em Florianópolis, foram encontrados cinco grupos musicais formados apenas por mulheres. Entre Elas – conjunto de pagode que vem
se destacando há cerca de um ano na região; Declínio do Sistema –
conjunto de hip-hop que explora em suas letras questões relacionadas à
temática feminina, preconceito sexual e racial; Dorotéia vai à Praia –
grupo que se tornou nos últimos anos um dos principais representantes
na cidade no gênero rock’n’roll; Cabeça de Alface – formado em 2003
por três garotas – desenvolve um trabalho de composições próprias, no
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estilo rock alternativo; Carpe Diem Septem – banda de rock constituída recentemente por cinco adolescentes que vem, aos poucos, realizando apresentações musicais nos bares e eventos da cidade.
Durante a pesquisa foi possível perceber que, no rock, a presença de mulheres é muito mais significativa que em outros gêneros musicais. A evidência surgiu ao perceber que, das 23 bandas levantadas
durante a investigação (tanto nacional quanto regionalmente), dezenove
se enquadram neste gênero. A mesma constatação se deu em
Florianópolis, onde das cinco bandas femininas três são adeptas do
rock’n’roll.
Neste processo, percebemos que a preferência das mulheres pelo
rock promoveu o surgimento de uma nova categoria ou subgênero, conhecido como “rock com vocal feminino”, e a promoção de encontros e
festivais específicos para elas, como por exemplo o Festival de Rock
Feminino de Rio Claro (SP); Felina, Festival de Rock Feminino de
São Paulo (SP); Festival Nacional de Punk Feminino de Goiânia
(GO); Festival de Música Mulheres no Volante de Juiz de Fora (MG);
Festival Kaoscinha de Joinville (SC); a criação da Rádio Feminina
de Goiânia (GO), especializada no gênero rock’n’roll, bem como a criação do programa Mundo Rock de Calcinha filiado à rádio Mundo
Rock de São Paulo (SP).
Apesar da ampla atuação das mulheres neste gênero musical, o
rock ainda é entendido como um universo masculino, conforme vários
autores puderam constatar (Walser, 1993; Chaves, 2006; Media, 2006;
Sartori, 2006; Jacques, 2007). Contudo percebemos ao longo do trabalho que a participação feminina no rock abriu espaço para o surgimento
de uma nova categoria – rock com vocal feminino –, bem como a
promoção de eventos musicais específicos para elas, o que tem demonstrado que sua participação ao longo dos anos não as coloca como
meras coadjuvantes, mas sim como condutoras de transformações significativas para este universo musical.
A crescente participação das mulheres no meio musical – seja
como produtoras, seja como consumidoras – faz transparecer a necessidade de novos estudos e reflexões sobre o tema pela musicologia
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contemporânea, ainda pouco pesquisado, apesar da conquista de novos
espaços e da crescente visibilidade de grupos femininos.
Palavras-chave
Relações de gênero e música, bandas femininas, etnomusicologia.
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MENÇÃO HONROSA
Categoria Graduado: Dijaci David de Oliveira, da Universidade de Brasília (UnB), tendo como orientadora a Profª Lourdes Maria
Bandeira, com o trabalho “Desaparecidos civis: um problema de gênero e geracional”; Elizabeth da Penha Cardoso, da Universidade de
São Paulo – USP, tendo como orientador o Prof. Bernardo Kucinski,
com o trabalho “Presença da imprensa feminista no Brasil”.
Categoria Estudante de Graduação: Lucas Coradini, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), tendo como
orientadora a Profª Anita Brumer, com o trabalho “Autonomia e projetos profissionais das jovens na agricultura familiar do Rio Grande
do Sul”; Daphne Oliveira Soares, da Universidade Federal da Bahia
(UFBA), tendo como orientadora a Profª Ilka Bichara, com o trabalho
“Um estudo exploratório sobre o turismo sexual na cidade de Salvador, através da visão dos facilitadores dessa prática”.
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REDAÇÕES PREMIADAS – ETAPA NACIONAL
CATEGORIA ESTUDANTE DO ENSINO MÉDIO
Tema: Marias de Nascimento
Isabella Luchi Coutinho
CEFET – Vitória – ES
“Acordei assustada, olhei o calendário e fiquei surpresa. Já havia
passado 6 meses que estava aqui. É muita hipocrisia de minha parte
dizer que meus dias têm sido bons. O quê? Acha que eu estou exagerando? Espero que não. Tudo bem... desculpe-me. Você não tem culpa
de eu ter sido idiota. Ah, você nem pensa! Nunca achei que fosse discutir com um diário. Se é que posso chamar essa droga de papel higiênico de diário! Uma hora o Ailton vai descobrir e... Todos os dias ele
vem com aquela conversa: Que droga, Maria! Onde é que você tá
enfiando essa merda desse papel que acaba toda hora? Se ele
descobre, eu apanho de novo.
Droga! Ouvi o barulho do carro. Vou parar por aqui, ele está
chegando. Ai, meu Deus! Ouço risadas... Acho que ele trouxe mais
meninas. Coitadas! Elas não sabem. Não sabem como é viver aqui.
Acham que é uma Agência de Modelos... Vão parar de rir daqui a
pouco”.
“Mas, que droga! Isso é insuportável! Não posso agüentar. Lembra-se das meninas de ontem? Pois é... já pararam de rir.
Ele é imundo! Todos eles são! Que droga de bordel nojento! Ailton
nojento! Você e essa sua barriga saliente, sua cara de vagabundo! Ser
imundo! Ainda me lembro daquele dia. Não posso esquecer, nunca conseguirei. Ele rasgou minha roupa e começou a beijar meu corpo. Eu me
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debati, chorei, gritei, rezei... E ele continuou. Arrastou aquela barba
nojenta pelo meu pescoço, seios, umbigo... Argh, aquela barba nojenta!
Então, tirou as calças e... Um grito de dor saiu dos meus lábios. Era um
ódio profundo. Ódio de todos, dele, do mundo! E o sangue começou a
descer pelas minhas pernas... e as lágrimas pelo rosto.”
“Aqui é Maria do Nascimento, 17 anos. Por favor, se alguém
encontrar esse bilhete, informe aos meus pais que eu... Diga a eles que
os amo. É... diga isso. Eu não queria ter fugido de casa, sabe? Eu, eu só
queria ser empresária, dona da minha própria grife, ser modelo! Ah,
droga! DROGA! Ele tá vindo... Não deixe, Mãe! Por favor?! Não
deixe ele me pegar...”
“Eu consegui! Eu fugi! Mas não vou durar muito, ele tá bravo
comigo. É porque eu ajudei as meninas a fugirem ontem. Eu ia com
elas, mas elas ligaram a caminhonete e aceleraram. Eu não consegui
correr o suficiente... Daí, vi Ailton correndo com o cinto na mão e tentei
fugir. Achei uma cabaninha e aqui estou. Mas ele vai me achar, sei que
vai.”
“Por que dói tanto, mãe? Por quê? Por que fui tão idiota? Por
que você não me avisou que ia ser assim...?”
“Na semana passada eu senti muito enjôo e vomitei bastante.
Achei que estava grávida. Só não sabia de quem... Afinal, ninguém aqui
se preocupa com isso. No desespero fui falar com Ailton. Mas que
burra eu sou! Tão ingênua... Pensei que ele fosse se sensibilizar. Afinal
de contas, tratava-se de uma criança, de uma vida. Eu falei... ele me
ouviu e refletiu alguns segundos. Logo após, deu uma gargalhada e
começou a socar a minha barriga. Ele me bateu tanto, tanto... Comecei
a cuspir sangue. Parecia que quanto mais sangue ele via, mais me espancava. Mas isso não foi nada. Pior foi ele ter me jogado no chão e,
como naqueles filmes de luta livre, atirou-se contra mim. Eu gritei. Pude
ouvir, também, o grito daquela criança dentro de mim. Imediatamente
comecei a sangrar – dessa vez não era pela boca. Senti um líquido
quente descer e quando percebi, Ailton havia saído, deixando-me sem
forças para levantar.”
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“De quem é a culpa, mãe? Minha? Sua? De quem? Sei que não
sou a primeira, e muito menos a última a passar por isso. Sei que, como
eu, existem muitas Marias do Nascimento por aí! De quem é a culpa?
Desse bando de políticos que desviam verba do país? Desse bando de
‘patricinhas e mauricinhos’ que não sabem nem fritar um ovo, torram o
dinheiro dos pais e ainda por cima reclamam por só terem ido aos 39
dos 40 Micaretas do ano? Será que os culpados são os machistas nojentos que batem em suas mulheres? Ou será que a culpa é dos pais
que largam os filhos ao ‘Deus dará’ para encher a cara de cachaça?
Que dão um pacotinho de baseado, crack e maconha pro filho ir fazer
uma entrega na boca de fumo ali do lado? DE QUEM É A CULPA,
MÃE? Eu só queria ter meu próprio negócio. Minha grife de moda...
Por que aquela indústria me recusou, mãe? Por quê? Eu era muito mais
inteligente e prestativa que aquele retardado do Jorge que foi contratado! Por que não eu? Por que eu sou MULHER? Por que eu sou NEGRA? Foi por isso? Esse emprego era a minha única oportunidade de
aprender como se gerencia uma grande empresa, e ainda juntar um
bom dinheiro... Seria perfeito!
Será que se, hoje, eu fugisse e tentasse mais uma vez eles me
dariam uma chance? Quer saber? Se não me aceitaram enquanto jovem e bonita, com certeza não vão me aceitar maltrapilha, marcada e
estuprada.
Mãe, diga para mim: qual é o sentido da vida? Diga-me, pois já
esqueci. E pensar que nesse exato momento existem pessoas rindo,
dançando, sonhando com um futuro brilhante...
Ele me achou. Ouço seus passos. Vai me matar, eu sei. Mas isso
não importa mais. Agora estou calma. Já estou morta. Quer dizer, eu
não morri para o mundo; o mundo é que morreu para mim.”
***
“Querido diário, hoje saí cedo de casa para ir à praia com minhas
amigas. Chegando lá, notei que um homem bonito e bem vestido me
olhava. Passados alguns minutos, ele se aproximou e me entregou um
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cartão. Olhei para ele, sorri e agradeci. Quando ele se afastou, amassei
o cartão e o joguei no lixo. Se tivesse sido ontem, talvez até aceitasse.
Mas, hoje, não aceitaria tal convite de modo algum! Não depois do
sonho que tive”.
Já sei! Está se perguntando o que estava escrito no cartão, não
é?! Pois bem, vou te contar. Nele, lia-se: “Agência de Modelos, venha realizar seu sonho e se tornar uma mulher poderosa!”
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Tema: O Encontro – da diversão à reflexão
Fernanda Resende Serradourada
Colégio Olimpo – Goiânia – GO
Assustadas com a recente morte de Rapunzel, cujo cabelo ficara
preso na roda de um carro, quebrando o seu pescoço, e com a Bela
Adormecida que, traumatizada com um desquite litigioso, está internada numa clínica fazendo sonoterapia, as quatro amigas mal conseguem
tomar seu chá. Estes seus encontros semanais, outrora tão cheios de
alegria, confidências e reminiscências, estão se tornando aborrecidos.
Cinderela suspira:
— Os tempos mudaram, nós estamos ficando velhas...
Chapeuzinho Vermelho ajeita distraidamente o seu chapeuzinho
laranja ocre. Era mais uma vítima da mídia que, mesmo gostando tanto
do vermelho, adotara o laranja porque era a última moda parisiense. Ela
havia se envolvido, recentemente, num processo de agressão com o
Lobo Mau (que, aliás, já estava envolvido em um processo de desapropriação com os três porquinhos).
— Não pode se queixar da vida, Cin, observa Branca de Neve,
cuja palidez havia cedido lugar a um bronzeamento artificial. Você se
casou com um príncipe, sua sapataria vai bem...
— Pois eu largaria tudo isso. Lembram-se daquele príncipe lindo, gentil e romântico com o seu cavalo branco, o sonho de toda mulher? Pois é, menina, acabou se transformando num barrigudo que só
sabe assistir futebol e beber cerveja enquanto eu cozinho, lavo e PASSO! E pensar que um dia eu fui chamada de Pantera Borralheira. Velhos tempos...
— Não acredito!
— Que canalha!
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— E eu, gorda desse jeito e ainda chamada de Mariazinha...
quem fala é a irmã de Joãozinho, protagonista de um famoso caso de
desencaminhamento de menores na floresta. Ela come compulsivamente.
Seu analista já lhe explicou que ela come para se autopunir de um sentimento incestuoso por Joãozinho, que também é enorme de gordo.
— Você também sente falta dos velhos tempos, Branca? Diz
Mariazinha.
— Deus me livre! Vocês não sabem o que era cuidar da casa
para sete anões. Todos os dias fazer as sete caminhas, lavar sete
cuequinhas... Uma vez um deles se embriagou e invadiu o meu quarto,
mas com a ajuda da bruxa eu o atirei pela janela.
— Com a ajuda da bruxa? Mas vocês não eram inimigas?
— Que nada! As bruxas eram mulheres bonitas, inteligentes,
insubmissas... Já viu onde vai dar, né? Com mulheres assim os homens
ficaram com tanto medo que as chamaram de bruxas, e elas acabaram
sendo queimadas na fogueira durante a Idade Média. Foi o pior massacre da literatura infantil...
— Coitadas...
— Bom, já que começamos com as revelações, vou contar do
meu caso com o cocheiro. O príncipe, afinal, só queria saber de futebol
e cerveja, quando muito ele queria acariciar o meu pé, diz Cinderela.
— O tal que era um rato e virava cocheiro com o toque de varinha mágica?
— É esse mesmo!
— E o seu príncipe encantado, Branca? O que acordou você
com um beijo depois da morte, depois que você mordeu a maçã envenenada. Você também se arrependeu?
— Só posso dizer que, comparando os dois, gostei mais da maçã.
— Vocês é que são felizes, diz Cinderela, apontando para
Chapeuzinho e Mariazinha, que está com a boca cheia de biscoito. Não
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tiveram “príncipes encantados” em suas vidas. Vejam a Bela Adormecida, esta pelo menos teve a coragem de pedir desquite. Nós não podemos. O tal “e viveram felizes para sempre” é um compromisso moral.
Parece que não temos saída. Quer dizer, ninguém pode nos culpar por
termos amantes. Eu não posso ver um rato sem pensar num cocheiro e
usar a minha varinha mágica. E a Branca aqui pega qualquer um também.
— Não sendo anão...
— Nós fomos bobas, isso sim, continua Cinderela. A Rapunzel
continuou com suas tranças porque seu príncipe encantado a proibiu de
cortar os cabelos, e olhem o que aconteceu. Se no nosso tempo já
existisse feminismo, Lei Maria da Penha... Nossas histórias seriam outras!
— Certo! Eu botava os anões a trabalhar para mim. E não seria
comprometida com o príncipe só porque o beijo me ressuscitou. Ele não
me compraria por tão pouco! Diz Branca de Neve.
— E eu, em vez de ficar em casa sendo subordinada ao príncipe,
ia sair, arranjar um emprego, estudar Comunicação, sei lá... Diz
Cinderela.
— Meu analista disse que a culpa do meu trauma de infância foi
minha dependência excessiva do Joãozinho, diz Mariazinha.
— E eu me deixei enganar inocentemente por um lobo! Exclama
Chapeuzinho. Se já existisse a Lei Maria da Penha, eu ganharia o processo de agressão com o Lobo Mau, e a Rapunzel não estaria morta!
— Poderíamos fazer algumas passeatas, queimar alguns sutiãs,
idolatrar Simone Beauvoir...
— É isso aí! Mostraríamos quem é o verdadeiro sexo frágil e não
seríamos discriminadas apenas por não termos uma genitália masculina
entre as pernas!
— E nós não seríamos mais vítimas da mídia, nem de modas e
tratamentos sádicos, teríamos mais amor próprio!
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— Sim! Acabaríamos com aquelas piadinhas preconceituosas e
idiotas, não é mesmo Cin?
Mas Cinderela não estava ouvindo. Seu olhar fixo num canto da
sala e um sorriso malicioso. Lentamente, sem desviar o olhar, ela procura na bolsa pela sua varinha mágica.
— O que é, Cin?
— Sssshh. Acho que vi um rato. E dos grandes!
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Tema: Uma certa Maria
Leonardo Francisco de Azevedo
Colégio Tiradentes – Lavras – MG
Sou uma simples Maria, uma Maria como tantas outras, casada,
40 anos, cinco filhos lindos e um marido. Moro no subúrbio de uma
grande cidade, e meu trabalho consiste em tentar pôr em ordem minha
casa e fazer com que meus filhos freqüentem a escola, apesar das
dificuldades de comprar caderno e lápis para eles. Meu marido trabalha
na construção civil, metade do seu salário vai para o boteco da esquina.
Ou seja, tenho que me virar nesse mundão de Deus com o pouco de
dinheiro que me resta.
Tempos atrás, meus filhos já tinham ido para a escola, eu coloquei a roupa suja na bacia e estava indo para a “biquinha” ali embaixo,
quando comecei a ficar meio tonta. As pessoas, as crianças, as casas,
os postes, tudo começou a girar. Depois disso, comecei a cair e, a partir
daí, parece que pousei em outro lugar, numa outra época, em outro país.
Ao passar por onde estava comecei a lembrar de tudo que eu já
tinha lido no livro de História do meu filho mais velho (meu sonho era
ser professora de História). Parecia que estava numa cidade medieval,
numa época de guerra. Eu via homens saindo para a luta, e suas mulheres sendo deixadas em casa com cintos de castidade, e eles levando as
chaves dos cadeados. As mulheres ficavam ali, sem ação, esquecidas
com aquele metal desconfortável no meio de suas pernas.
Continuando minha caminhada, fui transportada para uma praça. Vi
uma mulher pregada num toco bem no centro e com um monte de madeira
em sua volta. Fiquei aterrorizada com aquilo, e havia um homem dizendo
que tal mulher era uma bruxa que estava elaborando em seu esconderijo
planos terríveis contra a amada Igreja deles. Simplesmente colocaram fogo
em sua volta – ela ficou ali no meio esperando para se tornar carvão –,
enquanto as pessoas batiam palmas e gritavam.
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Saí desesperada dali e tropecei no pé de um indivíduo, caí bem no
meio de uma rua de Londres, onde estava acontecendo uma passeata
de mulheres. Pelo que pude ouvir de um grupo de homens e mulheres
conservadores na beira da rua, eram umas tais sufragistas que queriam
também votar, o que era exclusivo para homens. Fiquei encantada com
a coragem e ousadia daquelas mulheres, que levantaram a cauda de
seus vestidos e iam se arrastando e gritando por aquelas ruas.
Fiquei ali olhando aquilo quando pisquei os olhos e me vi numa
rua de São Paulo, no meio de um comício em que uma tal candidata à
deputada estadual, Patrícia Galvão, que as pessoas chamavam de PAGU,
fazia um discurso emocionado sobre o papel das mulheres na política e
na sociedade. Fiquei impressionada com a indignação daquela mulher
em cima daquele palanque, desafiando os poderosos de seu tempo.
Achei muito interessante aquilo tudo, mas resolvi continuar a caminhada. Entrei num beco ali perto e saí numa rua dos Estados Unidos, em
que mulheres gritavam e queimavam sutiãs, no meio da rua. Fiquei apavorada com aquilo. Eu, com pouquíssimos sutiãs na minha gaveta, e elas ali
queimando os seus. Só depois que li as faixas e ouvi o comentário dos que
estavam observando o movimento que fui entender que aquilo fazia parte
de uma manifestação de umas tais feministas que reivindicavam seus direitos. Novamente presenciei a força das mulheres.
Fiquei meio perdida no meio daquela confusão e, sem querer,
entrei num mercado ali perto e caí numa rua de Paris, em que Simone
de Beauvoir fazia parte de uma manifestação do Mouvement de
Libération des Femmes, MLF, a favor do direito ao aborto e à prevenção da gravidez. Fiquei impressionada com a coragem daquela mulher,
que já não era mais tão jovem, mas que lutava com gana e garra por
aquilo em que acreditava.
Tudo começou a girar, caí no meio de um show da Rita Lee, ouvi
uma música que me contagiou por inteira e me fez lembrar daquilo que
eu tinha acabado de vivenciar:
Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 125-156, jan./dez. 2007
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Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
“Mexo e remexo na inquisição
Só quem já morreu na fogueira sabe o que é ser carvão
[...]
Minha força não é bruta
Não sou freira, nem sou puta
Porque nem toda feiticeira é corcunda
Nem toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho que muito homem
Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque
Fama de porra louca... tudo bem
Minha mãe é Maria ninguém
[...]”
Depois, num susto total, acordo em cima da minha cama, com
todas as minhas vizinhas em volta, falando alto, colocando compressa
na minha testa, tirando minhas sandálias. Comecei a observar aquelas
mulheres, todas no mesmo ofício que o meu, ralando na mão de marido
e se multiplicando para dar conta das vontades dele, das necessidades
dos filhos e da ordem da casa e, além disso, agüentando a humilhação
das pessoas na rua, que nos chamam de folgada, à toa, sem trabalho.
Hoje, penso em tudo que vi e vivi naquela experiência louca e
decido que não continuarei nessa minha posição. Deixei de lado meus
estudos, minhas vontades, meus sonhos para agradar o meu marido,
esperando que ele me desse um futuro bom e promissor, mas ganhei em
troca essa mísera casa no subúrbio, estando vulnerável a todo e qualquer tipo de violência.
Basta! Foram muitas as mulheres que já ralaram e lutaram nessa
vida contra essa nossa posição imposta. Está na hora de sair dessa
minha inércia e tornar a atriz principal da minha vida. E vou começar
agora...
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Educ. bras., Brasília, v. 29, nos. 58 e 59, p. 125-156, jan./dez. 2007
Terceira edição do Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero
RELAÇÃO DAS(OS) PREMIADAS(OS) POR UNIDADE DA
FEDERAÇÃO
Unidade da
Federação
Candidatos (as)
Jones Pedro Gomes
Escola Estadual Dr. Antônio
Gomes de Barros – Novo Lino –
AL
Raul Holanda Oliveira
Magalhães
EEFM Deputado Joaquim de
Figueiredo Correia – Iracema – CE
ALAGOAS
CEARÁ
DISTRITO
FEDERAL
ESPÍRITO
SANTO
GOIÁS
MARANHÃO
João Paulo Sousa Maciel CEM 01 de São Sebastião – DF
Isabella Luchi Coutinho
CEFET
Fernanda Resende
Serradourada
Danilo Almeida Silva
Colégio Olimpo
Maiara Larissa Daronco
MATO GROSSO
MINAS GERAIS
PARÁ
PERNAMBUCO
RIO DE JANEIRO
RIO GRANDE DO
NORTE
Leonardo Francisco de
Azevedo
Zilmara Zamyla da Silva
Almeida
Adélia Andrade de Araújo
Pedro Eduardo Ferreira
Mikael Nilton de Araújo
RIO GRANDE DO Melissa Vanzella
SUL
Bruna Angélica Borges
RONDÔNIA
Filipe de Freitas Serafim
SÃO PAULO
Escola
Centro de Ensino Inácio
Passarinho – Caxias – MA
Colégio Mãe da Divina Providência
– Primavera do Leste – MT
Colégio Tiradentes
Colégio Pitágoras de Carajás –
Parauapebas – PA
Escola de Aplicação Prof. Chaves
– Aliança – PE
CES – Petrópolis – RJ
Escola Estadual Vicente de Fontes
– João da Penha – RN
Instituto Rio Branco – São
Leopoldo – RS
Escola Estadual de Ensino
Fundamental e Médio Carlos
Gomes – Cocoal – RO
Escola Municipal de Ensino Médio
Vereador Antonio Sampaio – São
Paulo – SP
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MENÇÕES HONROSAS CONCEDIDAS
Unidade da
Federação
SÃO PAULO
SÃO PAULO
156
Candidatos (as)
Escola
Valdemar Alves Ferreira Escola Estadual Prudente
de Moraes – São Paulo –
SP
Eraldo Souza dos santos CEFET – São Paulo – SP
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