UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
DEPARTAMENTO DE ECONOMIA APLICADA
MARCOS PAULO DE SOUZA
PROGRAMA UM MILHÃO DE CISTERNAS: UMA MUDANÇA PARADIGMÁTICA
DO COMBATE À SECA?(O CASO DA COMUNIDADE DE QUEIMADINHA,
BARROALTO-BA).
SALVADOR
2011
MARCOS PAULO DE SOUZA
PROGRAMA UM MILHÃO DE CISTERNAS: UMA MUDANÇA PARADIGMÁTICA
DO COMBATE À SECA?(O CASO DA COMUNIDADE DE QUEIMADINHA,
BARROALTO-BA).
Versão final do trabalho de conclusão de curso
apresentado no curso de Ciências Econômicas da
Universidade Federal da Bahia como requisito parcial para
obtenção do título de bacharel em Ciências Econômicas.
Orientadora: Profª. Drª. Gilca Garcia de Oliveira
SALVADOR
2011
Ficha catalográfica elaborada por Vânia Magalhães CRB5-960
S726
Souza, Marcos Paulo de
P1MC: uma mudança paradigmática do combate á seca?./ Marcos Paulo de souza.
_ Salvador, 2011
61 f. : il.: tab.; quad. ; mapa.
Trabalho de conclusão de curso (Graduação) - Universidade Federal da Bahia,
Faculdade de Ciências Econômicas, 2011.
Orientador: Profª.Gilca Garcia de Oliveira.
1. Desenvolvimento sustentável. Recursos hidrícos. I. Oliveira, Gilca Garcia de.
II.Título. III. Universidade Federal da Bahia.
CDD – 338.1
MARCOS PAULO DE SOUZA
PROGRAMA UM MILHÃO DE CISTERNAS: UMA MUDANÇA PARADIGMÁTICA
DO COMBATE À SECA?(O CASO DA COMUNIDADE DE QUEIMADINHA,
BARRO ALTO-BA).
Trabalho de conclusão de curso apresentado no curso de Ciências Econômicas da
Universidade Federal da Bahia como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em
Ciências Econômicas.
Aprovada em
Banca Examinadora
Orientador:__________________________
Profa. Dra. Gilca Garcia de Oliveira
Faculdade de Economia da UFBA
_______________________________
Prof. Mestre Antônio Plínio de Moura
Faculdade de Economia da UFBA
_______________________________
Mestre José Carlos Moraes Souza
Cáritas Brasileira Regional NE III
de Julho de 2011
AGRADECIMENTOS
Agradeço a toda minha família, principalmente aos meus pais Cláudio e Ana, e a meu irmão
Stênio, pessoas essenciais em minha vida e também aos primos, primas, tios, tias, avós, avôs e
amigos pelo carinho e paciência dispensados a mim. Agradeço às pessoas que pelo destino,
Deus me deu a oportunidade de conhecê-las durante o curso de Ciências Econômicas e aqui
em Salvador, a todos pela paciência em me suportar, pelo companheirismo de pessoas que
convivi mais diretamente como Dione, Erivelton, Nathan, Rone e outros.
Meus sinceros agradecimentos à profª. Gilca Garcia pela paciência e pela tolerância em me
corrigir e orientar durante todo o processo monográfico, assim como a todo o corpo docente
desta Faculdade de Ciências Econômicas pelo crescimento intelectual proporcionado.
Agradeço a contribuição e os esclarecimentos prestados pelas representantes da ASA-Bahia
entrevistadas Cleusa e Otília e do CAA Jailso, foram também fundamentais as pessoas
entrevistadas na comunidade de Queimadinha - Barro Alto, pois possibilitaram atender aos
objetivos do trabalho e perceber a sua realidade. Todos vocês enriqueceram o trabalho.
Enfim, agradeço a todos e a Deus por tudo!
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Mapa - 1 Nova Delimitação do Semiárido Brasileiro
13
Mapa - 2 Território de Irecê
42
Quadro - 1 IDH-M nos municípios do Território Irecê em relação ao Estado da
Bahia - 1991/2000
43
Quadro - 2 Número de Famílias Beneficiadas pelo Programa Bolsa Família e
Valores das Transferências Mensais(set. 2010)
44
Quadro - 3 Composição do Produto Interno Bruto (PIB), por Município, 2007 (R$
1.000,00)
45
Quadro - 4 Índice de Desenvolvimento Social e Econômico-Município Território de
Irecê
46
LISTA TABELAS
Tabela - 1
Participação da Bahia na nova região semi-árida por número de
município e área
14
Tabela - 2
Participação da Bahia na nova região semi-árida por população
14
Tabela - 3
Perfil da estrutura fundiária do Território Irecê
47
Tabela - 4
Valor Anual da Produção do Território de Irecê, por tipo de atividade,
2000
48
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo analisar a mudança paradigmática em relação às práticas
de combate à seca no Território de Irecê, na Bahia. Assim, aborda-se uma nova concepção de
desenvolvimento através da utilização de práticas de convivência com o semiárido em
oposição à perspectiva anterior de combate aos efeitos da seca, a qual teve ampla difusão por
parte do Estado em sua orientação de atuação na região semiárida. Nesse trabalho a nova
lógica é representada pela convivência com o semiárido através do Programa de Formação e
Mobilização para Convivência com o Semi-Árido: um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC).
Analisa-se os efeitos deste Programa sob a cordenação das entidades/organizações da
sociedade civil que compõem a Articulação no Semiárido (ASA), no caso, o Centro de
Assessoria do Assuruá (CAA), através do estudo de caso realizado na comunidade de
Queimadinha no Município de Barro Alto, Bahia. Para verificar a maior efetividade das ações
de convivência com o semiárido, tem-se um capítulo dedicado à realização do estudo de caso
no Território de Irecê. Com isso, se tem a nova perspectiva pautada na promoção de um
desenvolvimento sustentável para a região, pois estas ações demonstraram-se efetivas em seu
propósito de melhoria das condições de vida da população sertaneja.
Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável. Semiárido. Convivência com o semiárido.
SUMÁRIO
9
1
INTRODUÇÃO............................................................................................................
2
12
FORMAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA DA REGIÃO SEMIÁRIDA
NORDESTINA...............................................................................................................
2.1
CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO SEMIÁRIDA NORDESTINA............................. 12
2.2
3
FORMAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA E O PROCESSO DE OCUPAÇÃO DO
15
SEMIÁRIDO....................................................................................................................
ATUAÇÃO DO ESTADO NO SEMIÁRIDO NORDESTINO.................................. 21
3.1
CONTEXTO DA ATUAÇÃO ESTATAL NO SEMIÁRIDO NORDESTINO.............. 21
3.2
HISTÓRICO DA ATUAÇÃO ESTATAL NO SEMIÁRIDO......................................... 21
4
PROCESSO DE CRIAÇÃO DA SUDENE.................................................................. 28
4.1
CONTEXTO HISTÓRICO DE CRIAÇÃO DA SUDENE............................................. 28
4.2
UMA POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO PARA O
32
NORDESTE: A CONSTATAÇÃO DE CELSO FURTADO..........................................
5
CONCEITOS.................................................................................................................. 35
5.1
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL..................................................................... 35
5.2
CONCEITO DE CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO.............................................. 37
5.3
A MUDANÇA PARADIGMÁTICA REPRESENTADA PELO P1MC........................ 39
6
43
ESTUDO DE CASO SOBRE O P1MC NO TERRITÓRIO DE
IRECÊ..............................................................................................................................
6.1
CARACTERIZAÇÃO DO TERRITÓRIO DE IRECÊ................................................... 43
6.2
CONSIDERAÇÕES SOBRE O P1MC............................................................................ 50
6.2.1 A atuação e o papel da Articulação do Semiárido (ASA).........................................
50
6.2.2 Programa Um Milhão de Cisternas.............................................................................. 52
57
6.2.3 A visão sobre a percepção dos contemplados da Comunidade Queimadinha,
Barro Alto (BA) .............................................................................................................
7
CONCLUSÕES............................................................................................................... 61
REFERÊNCIAS.............................................................................................................. 63
ANEXOS
66
9
1 INTRODUÇÃO
Atualmente, têm ganhado maior dimensão a parceria das organizações da sociedade civil com
o Estado na promoção e aplicação de políticas de convivência com o semiárido, tornando
perceptível a dimensão alcançada, pois estas ações representam uma nova perspectiva de
atuação no Semiárido nordestino.
Essas considerações são feitas diante da compreensão de que durante muitos anos, mais
precisamente desde o final do século XIX, as ações do governo têm sido realizadas visando
minimizar os efeitos da seca, mas poucos foram os resultados para a maioria da população
afetada. Esse tipo de ação no semiárido, orientada na perspectiva de modificação das
características locais desconsiderou aspectos ambientais, sociais e políticos. Portanto, a nova
forma de atuar no Semiárido brasileiro exige outro tipo de concepção em que se considerem
esses aspectos de acordo com a perspectiva de promoção do desenvolvimento.
Diante disso, as novas entidades - sejam do setor público, sejam organizações/entidades da
sociedade civil - ganham força a partir do processo de redemocratização política dos anos
1980, no Brasil. No Semiárido brasileiro estas assumem papel fundamental na difusão de uma
nova concepção de desenvolvimento multidimensional com foco na sustentabilidade do
desenvolvimento. Estas entidades têm como lócus de representação o fórum de entidades que
formam a Articulação do Semiárido (ASA), a qual propõe/constrói, implanta e difunde
políticas de convivência com o semiárido.
Um bom exemplo de formulação de ação pública para a região semiárida que trabalha com
essa perspectiva é o Programa de Formação e Mobilização para Convivência com o SemiÁrido: Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC). Este Programa não é pautado no combate aos
efeitos da seca, e sim, apresenta um novo olhar sobre o semiárido, não mais visto somente
como região problema. Assim, busca-se apresentar à sociedade e aos próprios sertanejos,
muitos já desacreditados, que é possível ter uma vida com dignidade convivendo e não mais
combatendo a seca.
As entidades ao atuarem com o conceito de convivência com o semiárido constroem,
propõem e se utilizam de práticas simples que são acessíveis aos habitantes daqueles locais e
são capazes de promover melhoria na qualidade de vida de sua população. Portanto, está
10
relacionado ao desenvolvimento sustentável (DS), onde ambos consideram a justiça social
sem desconsiderar a relevância do meio ambiente. Desta forma, os conceitos de
desenvolvimento sustentável e o de convivência com o semiárido têm elementos em comum
nas dimensões econômica, social, política, ambiental e cultural.
O objetivo deste estudo foi de identificar o papel do P1MC como representante da mudança
do paradigma de combate à seca no Território de Irecê1 na Bahia, especificamente, em
Queimadinha, no município de Barro Alto (BA). E diante disso, realizar um estudo de caso na
comunidade rural de Queimadinha contemplada com o Programa para verificar os seguintes
objetivos específicos:
a) Realizar uma comparação teórica e das ações entre as políticas de combate à seca e as
de convivência com o semiárido;
b) Compreender as características (filosofia) e o funcionamento (prática) do P1MC e sua
relação com as práticas de convivência com o semiárido;
c) Verificar de que forma o P1MC vem contribuindo para a melhoria na qualidade de
vida da comunidade e das famílias em Queimadinha.
O problema descrito busca evidenciar a necessidade de novas formulações de políticas para se
atuar no Semiárido com o objetivo de promover a convivência com o mesmo, assim como,
fornecer elementos para a discussão da mudança de paradigma ao longo do processo de
investigação.
Desta forma, a questão formulada busca verificar se o P1MC tem promovido mudanças
efetivas nas condições de vida das populações do semiárido.
A Hipótese é de se afirmar que o P1MC representa uma mudança de paradigma em relação ao
combate à seca. Com base nisso, o trabalho apresenta a distinção entre o caráter da atuação do
Estado anteriormente com base na promoção de um “desenvolvimento” através de políticas de
combate à seca, e atualmente com a convivência com o semiárido.
1
O Centro de Assessoria do Assuruá (CAA) é uma Organização Não Governamental (ONG) responsável pela
implantação do P1MC1 neste Território.
11
Na construção do presente texto se utilizou em termos metodológicos revisão bibliográfica de
autores como fontes secundárias de informações. Além disso, realizou-se um estudo de caso
na comunidade de Queimadinha, onde se buscou informações quantitativas e principalmente
qualitativas para análise dos efeitos e da compreensão do Programa para as
organizações/entidades e nas comunidades, sendo que para isso foi necessária a busca de
dados primários através de entrevistas e aplicação dos formulários.
Além da introdução, este trabalho divide-se da seguinte forma, no segundo capítulo realiza-se
a caracterização da região semiárida e a descrição do seu processo de formação sócioeconômica e de sua ocupação, com isso pretende-se inserir na análise o contexto de atuação
das organizações da sociedade civil, que muitas vezes, estão em cooperação com o Estado,
com o objetivo de promover melhoria das condições de vida dos sertanejos no próprio meio
em que habitam. No terceiro capítulo, se analisa tanto a evolução histórica quanto o contexto
de ação dos principais órgãos estatais que atuaram no Semiárido brasileiro. O quarto capítulo
aborda o processo de criação da SUDENE e o contexto em que se insere. Além disso, é
tratado do documento escrito por Celso Furtado em nome do Grupo de Trabalho para o
Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), esse documento aponta a necessidade de desenvolver
uma agricultura mais apta ás condições ambientais da região semiárida nordestina. No quinto
capítulo, apontam-se os conceitos de desenvolvimento sustentável e de convivência com o
semiárido como uma nova realidade para a melhoria das condições de vida de sua população.
Neste capítulo é abordada a mudança paradigmática que este tipo de prática representa e,
ainda traz o exemplo do P1MC desenvolvido pela ASA como um dos representantes dessa
nova perspectiva para minimizar os efeitos da seca no Semiárido brasileiro. No sexto capítulo
é caracterizado o Território de Irecê e se apresenta o estudo de caso sobre o P1MC na
comunidade de Queimadinha, em Barro Alto e seus resultados. Por fim, têm-se as
considerações finais sobre a análise realizada, trazendo as últimas ponderações e sugestões
resultantes do trabalho.
12
2
FORMAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA DO SEMIÁRIDO NORDESTINO
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO SEMIÁRIDA NORDESTINA
O tema formulado trata de inicialmente fazer uma caracterização do Semiárido Nordestino a
fim de fornecer elementos que ajudem na compreensão do papel da ONG CAA que atua
principalmente no Território de Irecê, sendo válido para outras entidades que trabalham com a
mesma proposta, pois o Semiárido Brasileiro/Nordestino apresenta características que lhe são
comuns.
A atividade inicial da região semiárida foi a pecuária extensiva, com algumas pequenas áreas
de cultivo de subsistência para o abastecimento das famílias dos trabalhadores. Tem como
bioma predominante a caatinga. Na grande maioria da região, conforme Duque (2008) os
solos rasos são cobertos por uma vegetação arbustiva, onde predominam as cactáceas,
altamente resistentes à seca, porém pouco ricas em biomassa, o que não favorece a cobertura
dos solos. Segundo Silva (2008) as regiões semiáridas são caracterizadas de modo geral, pela
aridez do clima, pela deficiência hídrica com imprevisibilidade das precipitações
pluviométricas e pela presença de solos pobres em matéria orgânica.
O conceito técnico de semiárido passa a ser utilizado após o estabelecimento, na Constituição
de 1988, do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). De acordo com o
artigo 5º da Lei 7.827, de 27 de setembro de 1989, delimitava-se o semiárido como sendo a
área onde se tem precipitação média anual igual ou inferior a 800 mm e que compreendesse a
área de atuação da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE).
Atualmente, os critérios de acordo com Lei Complementar nº125/2007 para a Nova
Delimitação, aprovada em 2007, são que os municípios devem ter: I - precipitação
pluviométrica média anual inferior a 800 milímetros (isoieta de 800 mm); II - Índice de aridez
de até 0,5 calculado pelo balanço hídrico que relaciona as precipitações e a evapotranspiração
potencial, no período entre 1961 e 1990; e III - risco de seca maior que 60%, tomando-se por
base o período entre1970 e 1990. Com essa nova formulação foram incluídos mais 102
municípios aos 1.031 que já faziam parte do semiárido, somando 1.133 municípios no total
(SILVA, 2008; BRASIL, 2009).
13
Com a mudança dos critérios para definição de uma região semiárida com os nove estados da
região Nordeste e, com a incorporação de uma parte de Minas Gerais, passa a abranger uma
área de 982.563 mil km² (Mapa 1), onde viviam cerca de 22 milhões de pessoas, que
representavam 46% da população nordestina e 13% da brasileira, no ano de 2009
(MALVEZZI, 2007).
Mapa 1 – Mapa do Semiárido Brasileiro
Fonte: BRASIL, 2009
Malvezzi (2007) revela que o Semiárido brasileiro é o mais chuvoso e também o mais
populoso do mundo, uma vez que, nas regiões do planeta definidas como semi-áridas, a
precipitação neste é bem inferior a média anual de 750 mm, podendo variar de 800 mm/ano a
250 mm/ano, de acordo com o município dentro da região.
14
No caso da Bahia, de acordo com a Tabela 1, observa-se grande participação de seus
municípios na região semiárida, quase 64% do total de municípios. Além disso, ocupa 40% da
área de todo o Semiárido brasileiro, e quase 70% de toda a área estadual.
Tabela 1 - Participação da Bahia na nova região semi-árida por número de município e área, 2008
Estado
BA
Municípios
nº
%
No.
Municípios RSA* RSA
417
265
23,4
Área
%
Estado
63,9
Estado
(Km2)
564.273,00
%
RSA (Km ) RSA
393.056,10
40
2
%
Estado
69,7
Fonte: BRASIL. 2008, p.32 apud SAMPAIO, 2008, p.219. Tabela adaptada pelo autor, 2011.
* Região semi-árida
A Tabela 2 mostra a participação do estado da Bahia quanto à população residente no
semiárido, onde este possui cerca de 31% da população de todo o semiárido e ainda tem quase
50% de sua população vivendo nesta região.
Tabela 2 - Participação da Bahia na nova região semi-árida por população, 2008
Estado
BA
População
Total RSA Total Estado
6.453.283 1 3.070.250
% RSA
30,9
% Estado
49,4
Fonte: BRASIL.2008, p.32 apud SAMPAIO, 2008, p.219. Adaptada pelo autor, 2011.
* Região semi-árida
Ainda como característica apresenta a vegetação caatinga, único bioma exclusivamente
brasileiro, e solos cristalinos, presentes em cerca de 70% da região, que dificulta a absorção
de água pelo solo e a torna geralmente salinizada (SILVA, 2008).
O Semiárido brasileiro apresenta déficit hídrico, devido à alta evapotranspiração, ou seja,
evapora mais água que cai no solo com a chuva. Segundo Malvezzi (2007) a
evapotranspiração é de 3.000 mm/ano, assim ocorre um elevado déficit hídrico, essa já uma
compreensão que muda, pois antes só se compreendia que faltava chuva, deixando de se
compreender a irregularidade desta no tempo e espaço. Embora isso ocorra, o problema não é
a falta d’água, mas sim a forma como ela é aproveitada e usada. Aqui vale a consideração
feita por Celso Furtado de que a “água está no Nordeste” se referindo aos rios e projetos de
armazenamento de água. Mas, se pode formular também que o Nordeste é que não está com a
água, ou seja, o que falta é dar condições de acesso a todos, não restringindo seu
15
armazenamento em propriedades privadas ou grandes projetos de irrigação sem possibilitar
condições mínimas de acesso à água de boa qualidade a toda população.
A área chamada sertão segundo Furtado (1989) é uma corruptela de desertão. Algo que é
típico do semiárido é a irregularidade nas chuvas, tanto em termos de tempo, quanto de
espaço. Com base em Andrade (1980) ao mesmo tempo em que o clima marca e define a
região semiárida, é no clima que se assenta o problema da seca, que tanto preocupa sua
população. Daí se tem a imagem da região associada ao fenômeno climático que se
transforma em calamidade social nos períodos de grandes estiagens.
O fenômeno da seca não pode ser simplesmente explicado por fatores climáticos analisando
somente o quadro natural. Além das características acima descritas, tem-se a presença de
fatores econômicos e sociais que fazem parte de seu processo histórico de formação. Furtado
(1989) justifica o fato de não se ter desenvolvido uma economia ecologicamente mais
adaptada, como ocorreu em outras áreas mais inóspitas, devido a região semiárida não ter sido
um projeto autônomo de ocupação. Com isso, entende-se que a seca não é simplesmente um
problema climático, envolve aspectos econômicos, sociais e políticos que conformaram e
conformarão a região.
2.2 FORMAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA E O PROCESSO DE OCUPAÇÃO DO
SEMIÁRIDO
Na época do Brasil colônia, a coroa portuguesa doou grandes áreas de terra para que se
explorasse alguma atividade com a finalidade de exportação e de abastecimento da metrópole.
Essa monocultura inicialmente foi a cana-de-açúcar voltada para o abastecimento do mercado
externo.
No Nordeste, principalmente, permaneceram os grandes latifúndios voltados para a produção
de açúcar com os engenhos na zona da mata, e a pecuária extensiva e posteriormente o
algodão na região semiárida.
A existência da monocultura do açúcar na região da zona da mata possibilitou o
desenvolvimento de outras atividades econômicas, sendo que no Nordeste se expande a
pecuária extensiva com o objetivo de abastecer a região litorãnea e as fazendas de cana de
16
açucar com proteína animal, couro e animais para tração. Essa atividade se expande pela
região semiárida por sua disponibilidade de terras sem outra utilização específica
(ANDRADE, 1980).
A própria produção de alimentos para os escravos, nas terras do engenho, tornava-se
antieconômica nessas épocas. “A extrema especialização da economia açucareira constitui, na
verdade, uma contraprova de sua elevada rentabilidade” (FURTADO, 1986, p.54). A pecuária
é dependente da economia açucareira e surge com a proibição da criação de gado na faixa
litorânea pelo Governo Imperial, deslocando essa atividade para a região semiárida e o
processo de ocupação e expulsão dos indígenas seguirá a expansão da pecuária extensiva ali
praticada. Os motivos para que isso ocorresse foram o fato de não se querer outra atividade
concorrendo em terras e o desvio de recursos que poderia ser destinado ao cultivo da cana de
açúcar sendo empregada na criação de gado e a outra possibilidade é que o decreto imperial
proibindo a criação de animais devido à ocorrência de invasões do gado nos canaviais
prejudicando a produção dos engenhos (FURTADO, 1989; CHACON, 2007).
A região semiárida tem sua imagem associada à região problema do Brasil devido a aspectos
de sua formação histórica, econômica, social e política. Nessa região se desenvolveu uma
atividade marginal que servia à atividade principal, a da produção de açúcar para exportação.
Assim, a atividade pecuária se instala de forma extensiva com grandes latifúndios onde se
estabelecem e se instalam às margens pequenos agricultores. Segundo Chacon (2007), esse
modelo se formou a partir do sistema de sesmaria e se valeu de formas pré-capitalistas de
exploração como a parceria e a meação.
O Sertão nordestino foi integrado na colonização portuguesa graças a
movimentos populacionais partidos de dois focos: Salvador e Olinda. Foram
estas duas cidades que se desenvolveram como centros de áreas de terras
férteis de “massapé” e, conseqüentemente, como centros açucareiros que
comandaram a arremetida para os sertões à cota de terra onde se fizesse a
criação de gado indispensável ao fornecimento de animais de trabalho-bois e
cavalos- aos engenhos, e ao abastecimento dos centros urbanos em
desenvolvimento. (ANDRADE, 1980, p. 161).
Essa lógica econômica e social deu início ao processo de povoamento do Semiárido
Brasileiro.
A penetração ao interior baiano se deu pela subida da vertente atlântica nos rios:
Jequitinhonha, Paraguaçu, Itapicuru, Real, dentre outros. Esse tipo de ocupação deu início ao
surgimento de povoamentos ao longo das margens dos rios, facilitando a comercialização via
17
cabotagem. A conquista dos sertões foi feita pelos vaqueiros, muitos deles escravos, e por
pessoas livres que, não dispondo de prestígio em Salvador, eram obrigadas a se submeterem a
proteção de algum grão-senhor para os quais estabeleciam os currais (ANDRADE, 1980).
Segundo Silva (2008), além do movimento de expansão da pecuária e nas áreas de agreste;
houve no processo de ocupação a entrada via rio São Francisco ao interior nordestino de
expedições em busca de minérios e também devido à ocupação holandesa, favoreceram o
deslocamento de pessoas do litoral para o semiárido.
A atividade econômica da pecuária foi marginal e dependente da economia açucareira e
quando esta entra em decadência a pecuária passa a crescer vegetativamente, por exigir pouca
monetização. Segundo Furtado(1986) a decadência da economia açucareira, a partir da
segunda metade do século XVII, determinou a transformação progressiva do sistema pecuário
em economia de subsistência.
A baixa produtividade agrícola, a falta de outras opções e a baixa monetização da economia
fez com que ali se desenvolvesse segundo Andrade (1980) uma civilização que procurava
retirar do próprio meio o máximo, a fim de atender às suas necessidades. Assim, as pessoas
daquela região se alimentavam de produtos agrícolas de subsistência, leite e carnes apenas
aproveitando as condições oferecidas pela caatinga.
Conforme Andrade (1980) apesar da atividade agrícola ser contemporânea do desbravamento
do interior e da criação do gado, a agricultura ficou relegada a segundo plano, pois a
prioridade foi dada à pecuária, com isso os alimentos tinham preços elevados devido às
grandes distâncias entre as zonas produtoras e a zona litorânea, principal consumidora.
Junto à pecuária se tem o desenvolvimento da agricultura de subsistência que servia para
abastecer principalmente trabalhadores que lidavam com o gado.
O algodão abriu a possibilidade do desenvolvimento do trabalho temporário e assalariado, já
que havia dificuldades para se implantar o trabalho escravo devido à exigência de um grande
investimento dado que a região estava sujeita às secas periódicas e onde os proprietários mais
sólidos migravam para outras áreas. Outra característica do algodão é que seu ciclo da
18
plantação até a colheita era curto, fazendo com que se tornasse dispendiosa a compra de
escravos.
“Nos fins do século XVIII e no século XIX, pelos mesmos motivos que ocorreram no
Agreste, a agricultura tomou com o surto algodoeiro, rápido desenvolvimento no Sertão”.
(ANDRADE, 1980, p.174) da mesma forma que possibilitou o sistema de meação com a
disponibilização de pequenas áreas para o plantio do algodão às pessoas livres e aos
vaqueiros, os quais plantavam também produtos alimentícios para sua subsistência. Mas esse
produto passa por uma queda na produção com a recuperação do mercado pelos EUA após o
período da Guerra de Secessão e entra em decadência sua região produtora nordestina
(ANDRADE, 1980).
As formas de reprodução do capital são capazes de caracterizar diferentes regiões, pois uma
atividade principal subordina as demais formas de reprodução. Assim, este local será
caracterizado pela sua principal atividade. Isso ocorreu no Semiárido brasileiro, pois esteve
essa atividade (algodoeiro-pecuária) subordinada à atividade principal, a açucareira. Com a
exploração do açúcar no Caribe no século XIX, nesse período, o capital internacional estará
interessado no Nordeste “algodoeiro-pecuário”, dedicando ao processo de comercialização.
Nesse período, o poder econômico e político começou a escapar das mãos da burguesia
açucareira do “velho” Nordeste (OLIVEIRA, 1977).
O tipo de formação econômico-social do Nordeste desde a colonização, fez surgir uma
estrutura produtiva marcada pela desigualdade econômica e social entre as classes, evidente
no tipo de constituição da estrutura fundiária ali presente. A esse respeito Andrade (1980) já
indicava que uma das causas que contribuem para agravar o problema da seca que persiste
desde a colonização e faz muitos sertanejos se deslocarem para as grandes cidades é a
estrutura fundiária concentrada.
Economicamente o semiárido é marcado pelas desigualdades, apresentando grande
concentração fundiária com imensas áreas nas mãos de poucas pessoas. Assim como,
apresenta grande numero de minifúndios que ocupam a maior parte da população, no entanto
não ocupam a maior parte da área. Segundo Brasil (2005, apud SILVA, 2008) cerca de 90%
das propriedades possuem área inferior a 100 hectares e estas representam apenas 27% da
19
área total dos estabelecimentos agrícolas. Assim como, apresenta áreas e setores modernos e
alta competitividade, apresenta na maior parte da região uma produção de subsistência.
Observada em suas linhas mais gerais, a economia das zonas semiáridas
apresenta-se como um complexo de pecuária extensiva e agrícola de baixo
rendimento. Do ponto de vista do trabalhador rural, a atividade mais
importante é agrícola; do ponto de vista do proprietário das terras, a
pecuária. (GTDN, 1959, p.87).
O Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste faz um relato sobre os aspectos
econômicos seca, o qual segundo Silva (2008) apresenta um diagnóstico preciso da seca como
crise de produção de uma economia debilitada pela baixa produtividade e pelo reduzido grau
de integração nos mercados. Onde a agricultura de subsistência, é a parte mais frágil da
economia do Semiárido. Ainda sobre a constatação do GTDN, as obras e a assistência
emergencial no combate à seca não foram capazes de resolver os problemas da maioria da
população (SILVA, 2008).
As terras de melhor produtividade que poderiam ser utilizadas para produção de alimentos,
são utilizadas para culturas mais rentáveis como a cana de açúcar. Enquanto isso, as menos
produtivas, aquelas da região semiárida, eram destinadas a pecuária e a agricultura de
subsistência, como essa região sofre com o problema da seca, tem-se, portanto, um problema
sócio-econômico com a potencialização da fome.
Não se trata apenas de uma questão climática, qual seja, a irregularidade no tempo e no
espaço da chuva combinados a fatores característicos do semiárido, como o solo cristalino e a
alta evapotranspiração.
Se a seca fosse um fator decisivo no desenvolvimento do Nordeste, as zonas
da mata e do agreste, onde não há secas e nem maiores irregularidades na
distribuição das chuvas, teriam conhecido outra forma de desenvolvimento.
Esse discurso do atraso como conseqüência da seca, serve de sustentação
para a concentração de terra e capital. (JESUS, 2009, p.15).
Ao transformar a região do café no centro industrial do país, tem-se uma redefinição da
divisão regional do trabalho. Nessa configuração, Oliveira (1977, p.37) diz que:
(...) a região Nordeste passa a ser de um lado, sistematicamente, a
reserva do exército industrial de reserva: as migrações Nordeste - São
Paulo chegam a constituir um formidável contingente que vai suprir os
postos de trabalho criados pela industrialização, e contribuir para
manter baixos os níveis de salário real de toda a massa trabalhadora.
20
Com isso, se percebe o papel secundário que coube ao Nordeste e principalmente à região
semiárida no processo de industrialização do Brasil e o descompasso no desenvolvimento
entre regiões.
21
3
A ATUAÇÃO DO ESTADO NO SEMIÁRIDO NORDESTINO
3.1 CONTEXTO DA ATUAÇÃO ESTATAL NO SEMIÁRIDO NORDESTINO
Os setores com maior participação no que hoje é o Nordeste foram: a economia algodoeira e
açucareira. Mas, estas atividades declinam a partir da segunda metade do século XIX, o que
dificultou o crescimento nordestino e a produtividade da economia nordestina. Como estas
eram as principais culturas a região em sua grande maioria fica estagnada, exceção em parte
da Bahia com o cultivo do cacau.
A expansão da economia nordestina, durante esse longo período, consistiu,
em última instância, num processo de involução econômica: o setor de alta
produtividade ia perdendo importância relativa e a produtividade do setor
pecuário declinava à medida que este crescia. Na verdade, a expansão
refletia apenas o crescimento do setor de subsistência, dentro do qual se ia
acumulando uma fração crescente da população. Desta forma, de sistema
econômico de alta produtividade a meados do século XVII, o Nordeste se foi
transformando progressivamente em que grande parte da população produzia
apenas o necessário para subsistir. A dispersão de parte da população, num
sistema de pecuária extensiva, provocou uma involução nas formas de
divisão do trabalho e especialização, acarretando um retrocesso mesmo nas
técnicas artesanais de produção. (FURTADO, 1986, p.64).
Segundo Silva (2008), é diante das calamidades causadas pela ocorrência do fenômeno
climático da seca que se tem a atuação estatal objetivando minimizar os seus efeitos, que
ganham destaque nacionalmente, principalmente com a grande seca de 1877-1878. Com isso,
o governo é chamado a participar com maior efetividade na busca por uma solução. A partir
daí o Estado será elemento essencial no papel de iniciativas de mudança do quadro regional. É
diante desta perspectiva de evidenciar a forma como se deu a ação estatal no semiárido, que se
tem a seção seguinte.
3.2 HISTÓRICO DA ATUAÇÃO ESTATAL NO SEMIÁRIDO
No Semiárido brasileiro, o estado esteve condicionado a fatores e interesses políticos em sua
atuação, iniciando-se com a fase hidráulica após a criação da Comissão Científica por parte do
Governo Imperial de estudos do Nordeste Semiárido, em 1856, a qual irá propor mudanças na
intervenção governamental e outras soluções para a região. Muitos dos estudos apontavam
para realização de obras de combate à seca. Apesar da diversidade das propostas oriundas dos
estudos realizados, prevalece a escolha pela solução hidráulica pela açudagem e irrigação que
22
resultou em obras voltadas para descedentação animal. É dessa fase o Departamento Nacional
de obras de Combate à Seca (DNOCS) e seus antecessores (SILVA, 2008).
As calamidades da seca ganham destaque nacionalmente com a grande seca de 1877-1879,
com isso, o governo é chamado a participar com mais efetividade na busca por uma solução
(FURTADO, 1989).
Pode-se observar que a atuação do Estado no Semiárido, até a final da década de 1950, foi
marcada por três etapas de políticas ou práticas de combate à seca. Um dos motivos para que
esta dita “solução” não fosse efetiva é porque serviu para reforçar o clientelismo, perpetuando
as alianças com o poder local.
Com a criação da Inspetoria de Obras Contra a Seca (IOCS) através do Decreto n 7.619, em
21 de outubro de 1909, o órgão se torna mais técnico e realiza estudos de ordem física e
geográfica. Mas, o conhecimento sobre os aspectos sócio-econômicos foram limitados, com
isso não se preocupou com a população pobre sertaneja (SILVA, 2008).
Segundo Santos (2008), a ação pública de combate às secas por meio de obras de
armazenamento de água na região nordestina remonta desde o ano de 1832. Com base em
Vidal (2007, apud SANTOS, 2008) as ações da IOCS ganham força, e esse órgão, que
inicialmente era de caráter provisório, torna-se definitivo com a criação da Inspetoria Federal
de Obras Contra a Seca (IFOCS), em 1919, ganhando mais força no tipo de ação
governamental implementada na região.
As ações do IFOCS na realização de estudos para o melhor conhecimento da região
semiárida. “(...) na primeira década deste século, representou, em alguma medida, um esforço
racionalizador; é notável, mesmo nos seus primórdios, o esforço despendido no estudo da
ecologia regional e recrutamento de especialistas em diversas áreas”. (OLIVEIRA, 1977, p.
44).
Em 1945, a IFOCS foi transformada em Departamento Nacional de Obras Contra a Seca
(DNOCS) com a finalidade de realizar obras e serviços permanentes e desenvolver ações em
situações emergenciais (POMPONET, 2009).
23
A IFOCS e o DNOCS foram responsáveis pela construção de barragens, perfuração de poços,
construção de açudes e de estradas de rodagem na zona semiárida, além dos estudos
ecológicos, geológicos, hidrológicos, botânicos e pedológicos. No entanto, em termos de
entendimento da estrutura sócio-econômico não se avançou, fazendo com que a atuação do
Estado estivesse voltada para construção de obras para armazenamento de água e no socorro
às vítimas em situações emergenciais.
“A ação do DNOCS revestiu nas secas ou nas “emergências”, como são denominadas as
épocas em que a intensidade da irregularidade se agrava, formas típicas de uma acumulação
primitiva”, relata Oliveira (1977, p. 48) referindo-se às obras e outras ações como as frentes
de trabalho com recursos públicos. Essa estrutura de poder das oligarquias nordestinas é
reforçada com a manipulação das frentes de trabalho em troca de voto, servindo as obras
públicas para fins eleitorais da chamada “oligarquia algodoeiro-pecuária”. Assim, órgão como
o IFOCS e DNOCS foram capturados pela oligarquia algodoeira - pecuária, servindo aos
interesses desta.
O período de 1919 até 1950 é, segundo Vidal (2007, apud SANTOS, 2008), considerado o
auge da implantação da “solução hidráulica” no Nordeste. É nesse período em que há a queda
da supremacia econômica da oligarquia algodoeiro pecuária, devido à maior atenção dada a
industrialização no Centro- Sul do país a partir do período Vargas em que se tem a captura do
DNOCS pela oligarquia local algodoeiro-pecuária.
Tem-se uma noção do poder da oligarquia nordestina nesse órgão com o fato do IFOCS e
posteriormente o DNOCS nunca ter realizado uma obra fora do Nordeste, apesar de ter sido
criado para atuar em qualquer lugar do território nacional que apresentasse esse problema
climático. Isso, segundo Oliveira (1977, p.45), “é um resultado de sua captura pela oligarquia
regional, e não uma intenção ou objetivo inicial”, tendo sido subordinado aos interesses
políticos e econômicos, sendo instrumento de concessão de privilégios para políticos locais e
fazendeiros. Com isso, a ação do Estado com seus investimentos/recursos não foi capaz de
transformar as condições sociais do Nordeste algodoeiro-pecuário.
Uma segunda fase apontada é a de criação de programas isolados e de órgão que atuassem
cada um em sua linha de atuação, sendo desta fase a Companhia Hidrelétrica do São
Francisco (CHESF), Companhia do Vale do São Francisco (CVSF) que depois se tornará a
24
Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF), e Banco do
Nordeste (BNB). Somente posteriormente com a criação da Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) é que se integram os diversos órgão estatais sobre
sua coordenação.
Como parte desta segunda fase, está presente o Instituto do Açúcar e do Álcool, pois com a
decadência da burguesia açucareira, esta procurará meios de se manter dominante sobre a
zona produtora nordestina.
“A criação do Instituto do Açúcar e do Álcool, cuja missão primordial era na
verdade estabelecer uma divisão regional do trabalho da atividade açucareira
em todo país, protegendo da produção concorrente dos Estados de São Paulo
e do Rio de Janeiro”. (OLIVEIRA, 1977, p.59).
Segundo Oliveira (1977) isso serviu para a manutenção da mesma forma de reprodução do
capital da atividade açucareira nordestina, ao mesmo tempo em que acelera a capitalização da
economia açucareira do Sudeste.
Em termos das relações entre as classes regionais, Oliveira (1977) diz que o Estado que fica
no Nordeste é um Estado imobilista. Mesmo em 1953, o Banco do Nordeste do Brasil (BNB),
criado em 1952, se restringe a atuar na área chamada Polígono da Secas, onde ficou sendo
utilizado para financiar atividades agropecuárias, como resultado da apropriação da direção
do BNB pela oligarquia agrária. Sinal disso é o fato de ser sediado no Ceará, Estado onde foi
mais forte a política de combate à seca. Somente em 1961, é que sua área de atuação se
estende para a mesma área da SUDENE e passa a financiar projetos industriais (SANTOS,
2008).
Na década de 1950 se tentou abandonar o conceito de “combate a seca” e adotar uma proposta
de convivência, mais adaptada as condições naturais da região. Foi diante do intuito de
demonstrar que houve propostas que se assemelhavam à de convivência que se tem a seção
dedicada ao documento do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste
publicado ainda em 1959. A respeito disso, se desloca a abordagem da questão da dimensão
climática para a econômica e social. Deixa-se de acreditar que o problema da seca,
basicamente a miséria e a fome, é puramente a falta d’água e se tem uma dimensão mais
ampla que afeta a produtividade da região. Essa baixa produtividade é agravada pela
25
irregularidade das chuvas e se reflete em aspectos sociais, demonstrados pela fome, miséria e
pobreza formando o quadro típico das secas (POMPONET, 2009).
A terceira fase é marcada pela pressão sofrida no Governo de Juscelino Kubitschek, pelos
movimentos de camponeses, essa agitação popular entre 1958-1959 dará surgimento às Ligas
Camponesas pelos motivos que serão posteriormente tratados. Desse contexto surge a
Operação Nordeste e depois a SUDENE.
Um dos fatores que irão influenciar na criação da SUDENE será o fato da região Nordeste, da
economia açucareira têxtil, conforme Oliveira (1977), não sendo capaz de mudar sua
composição orgânica, não gerou um novo proletariado. Desta forma, os operários
enfrentavam-se também com a burguesia como se fossem camponeses, somando-se ao
movimento de trabalhadores rurais que será apoiado por Francisco Julião na formação das
ligas camponesas. Essa agitação deixa a classe política à procura de soluções que possam
amenizar a situação.
Além disso, contribui para o surgimento da SIDENE, o conflito entre as forças populares e as
decadentes forças dominantes locais, burguesia industrial e oligarquia latifundiária em que
segundo Oliveira (1977) desemboca claramente na perda de hegemonia daquelas classes
dominantes. Isso ocorre num momento de expansão do capitalismo monopolista do CentroSul.
Desta forma, o que aparece como resultado de conflitos regionais ou dos “desequilíbrios
regionais”, como parece ser o caso de Celso Furtado, o que ocorreu na verdade foi “(...) o
conflito de classes que aparece sob as roupagens de conflitos regionais ou dos “desequilíbrios
regionais” chegará a uma exacerbação cujo resultado mais imediato é a intervenção
“planejada” do estado no Nordeste, ou a SUDENE” (OLIVEIRA, 1977, p. 99).
Com a criação da Superintendência do Desenvolvimento Econômico do Nordeste (SUDENE),
em 1959, esta passa a ser supervisora do DNOCS, que passa a atuar de forma diferente. Mas,
com o Golpe Militar de 1964, e ao ocorrer uma nova seca entre 1969-1970, volta-se a utilizar
os mesmos mecanismos de combate à seca com a construção de grandes projetos de irrigação
e mesmos favorecimentos políticos (FURTADO, 1989).
26
Celso Furtado no Documento divulgado pelo Grupo de Trabalho Para o Desenvolvimento do
Nordeste (GTDN), em 1959, fez uma divisão em duas partes das ações do Governo. No curto
prazo, as restringiu ao assistencialismo com a distribuição de alimentos e a criação de frentes
de trabalho. E, no longo prazo, consistia na construção de obras optando pela “solução
hidrológica”, obras, na maioria das vezes realizadas em propriedades particulares
beneficiando a oligarquia local.
Guardadas as devidas considerações, a criação da SUDENE é o momento de um novo tipo de
ação implementada pelo Estado, pois essa entidade tem como objetivo o planejamento do
desenvolvimento do Nordeste. Assim, “resumidamente, o Estado que no primeiro momento
que antecede a SUDENE, se propõe a confrontar os problemas do Nordeste, nada mais era do
que um mantenedor e reprodutor da estrutura e das relações de dominação dela resultante”.
(SANTOS, 2008, p.38).
A partir dos 1980, a atuação estatal no Semiárido estará mais voltada para a disponibilização
de crédito especificamente para os grandes agricultores. São dessa época, programas como o
POLONORDESTE com o objetivo de estimular a formação de associações nos povoados
rurais, mas sem uma vinculação mais profunda em defender os interesses dos pequenos
agricultores e em engajar um projeto de discussão política.
Nas décadas de 1990/2000 se tem projetos/programas voltados mais para pequenos
agricultores para a concessão de crédito para financiamento da produção como o Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) ou de compra de
equipamentos, mas não se tem um efetivo acompanhamento técnico da atividade produtiva,
resultando no endividamento de parte dos agricultores.
Embora se possa criticar o DNOCS por ter sido apropriado por interesses escusos e não ter se
preocupado com a população mais pobre, ele foi um órgão criado para a proposta de
“combate”. Portanto, ele foi criado para promover a realização de obras para amenizar a
situação de flagelo das pessoas da região semiárida, estas foram executadas com a proposta
que lhe pareceu ser mais viável, a de combate, através da modificação das condições naturais
da região, e não da adaptação do homem ao meio ambiente.
27
E assim, pode-se considerar que, conforme Pomponet (2009) a forma como o semiárido é
tratado explicam a derrocada das políticas estatais aplicadas ao longo do século XX. Essas
podem ser explicadas pela manutenção do status quo e por uma intervenção que
desconsiderou a realidade, resultando em um cenário de pobreza, desigualdade e falta de
oportunidades.
28
4
PROCESSO DE CRIAÇÃO DA SUDENE
4.1 CONTEXTO HISTÓRICO DE CRIAÇÃO DA SUDENE
No período de criação da SUDENE o Brasil passava por problemas nas contas externas,
devido a dívidas contraídas e pela construção de Brasília teve-se que aumentar a quantidade
de moeda em circulação, o que fez com que a inflação se elevasse. Neste período, segundo
Furtado (1989) há um clima de insatisfação com o governo de grande parte dos governadores
nordestinos que apoiaram o candidato de oposição a Kubitschek. Além disso, os militares
elaboraram um relatório descrevendo as ações governamentais na seca de 1958, que
apresentava o favorecimento político da oligarquia nordestina do que viria a se chamar a
“indústria das secas”. Termo/conceito esse, segundo Furtado (1989), usado para descrever a
utilização dos recursos ditos para socorrer os sertanejos que sofriam com a seca por uma
parcela de comerciantes e fazendeiros em benefício próprio, onde muitas vezes
superfaturavam e utilizavam trabalhadores fantasmas nas frentes de trabalho.
Diante desse contexto, de 1958 a 1959, o Nordeste passa por um momento de
descontentamento social, pois segundo Furtado (1989, p. 35) “aumentava o nível de emprego,
mas reduzia-se o salário real”. O Nordeste é visto nacionalmente como região problema,
sendo associado a imagem de pobreza, fome, terra esturricada/seca e crianças e mulheres
caminhando longas distância para pegarem água.
O planejamento não é algo externo, ele se adapta e, segundo Oliveira (1977, p. 244) “não
pode realizar a superação da contradição básica do sistema capitalista”. Isso é dito porque
continua a antítese entre trabalho pago e não pago, ou seja, maior exploração dos recursos,
meios de produção, enquanto se acumula o máximo possível.
Embora se pretendesse uma mudança econômica e social na região, se observa que no
Nordeste, o que se verifica é que não houve o fortalecimento das empresas nordestinas
essencialmente, mas sim, a expansão para o Nordeste de oligopólios de empresas do CentroSul. Portanto, o planejamento estatal serviu para a manutenção da ordem social e da mesma
estrutura de poder em um momento em que boa parte do povo nordestino estava descontente
com a situação em que se encontrava (OLIVEIRA, 1977).
29
A criação da SUDENE é fruto, inclusive, do medo do descontentamento social em relação a
possíveis forças políticas contrárias a Kubitschek que poderiam ser fortalecidos em relação
aos adversários. No entanto, a classe proprietária não parecia tão afetada conforme relata
Furtado, na seca de 1958, devido a ação do poder público permitir que as estruturas
tradicionais de classe sobrevivam (GTDN, 1959).
A difícil situação em que se encontram os trabalhadores sem terra do
Nordeste, constantemente a agravar-se, sobretudo a partir de 1959, faz com
que a massa camponesa procure por si mesma uma solução e afaste a
possibilidade de solução do problema agrário regional, através da
colonização. (ANDRADE, 1980, p.250).
Houvesse nessa época um clima revolucionário que não fosse apaziguado poderia resultar em
grandes mudanças para as elites locais do Nordeste, conforme alerta o Governador Aluísio
Alves (apud ANDRADE 1980, p.251) “ou as elites decifram o Nordeste em 62, abrindo uma
porta de esperança, ou então serão responsáveis - porque advertidas – do imprevisível
revolucionário.”
Conforme relata Furtado (1989) a ação do governo, sob controle da classe latifundiária,
reforçava as estruturas existentes e agravava os efeitos sociais da seca. Beneficiava-se uma
pequena parcela da população (comerciantes e fazendeiros) que obtinham ganhos com a seca
e a miséria de grande parte da população.
Muitas das águas represadas encontravam-se em terras irrigadas de fazendeiros que se
beneficiaram de recursos do governo federal, com isso, tem-se o aprofundamento da estrutura
fundiária da região semiárida com a concentração de grandes extensões nas mãos de poucos.
Para Furtado (1989) o que nos faltava era uma lei regulamentando o uso das águas e das terras
nas bacias de irrigação beneficiárias do investimento público. Mas isso iria de encontro à
“indústria da seca”, a qual detinha muito poder político para a defesa dos seus interesses.
Celso Furtado defendia a aprovação da Lei de Irrigação, que foi proposta na década de 1960,
e possibilitaria modificar a estrutura fundiária nordestina com a destinação de terras antes
monopolizadas com o cultivo do açúcar para a produção de gêneros agrícolas alimentares.
Isso facilitaria o processo de industrialização no aspecto do fornecimento de gêneros agrícolas
a menores custos. Nesse aspecto, seria uma medida importante para o processo de
industrialização pretendido pela SUDENE para o Nordeste, pois reduziria os custos com a
30
alimentação dos trabalhadores, reduziria seu custo de reprodução, e possibilitaria que as terras
fossem mais bem distribuídas. Mas não foi possível aprová-la no Congresso devido a grande
resistência de políticos pertencentes à oligarquia nordestina (FURTADO, 1989).
Devido à expansão da economia do Centro-Sul, com produtos agrícolas, além da atividade
açucareira e algodoeira, a economia nordestina sofre com a concorrência, fazendo que se
dependa cada vez mais da agricultura de subsistência, ao mesmo tempo em que reduz os
preços de produtos excedentes comercializados. Nesse clima,
(...) a dissolução desse semi-campesinato, quer pela expulsão das terras –a
elevação da renda da terra abria para os proprietários uma possibilidade de
especialização nas antigas culturas de subsistência, isto é, uma forma de
concentração em capital variável- quer pelo aumento do sobre-trabalho,
reforçando os mecanismos do trabalho semi-compulsório, e “cambão”. É
nesse contexto, e exatamente nessas zonas, que a pax agrariae nordestina
entra em colapso, e esse semi-campesinato aparece como ator políticos por
excelência, sob a égide das ligas Camponesas de Francisco Julião.
(OLIVEIRA, 1977, p.81).
Esse movimento será um dos representantes da luta camponesa e seguindo seu exemplo
começam a surgir outros movimentos semelhantes na reivindicação de direitos e lutando pela
posse/propriedade da terra.
Outro fator que influenciará para o surgimento de nova atitude em relação à participação do
governo no Nordeste serão as Ligas Camponesas, de onde primeiro se teve registro de
reivindicação de direito pela terra. A participação nas ligas representava uma alternativa à
condição de miséria, pobreza e desesperança em que se encontravam, uma vez que, ao se
organizarem, eles poderiam juntos buscar uma melhora em suas condições de vida. Portanto,
houve nesse período temeridade por parte do governo brasileiro e dos EUA que proporão o
acordo Aliança para o Progresso para conter a onda de revoltas que poderiam resultar em uma
revolta socialista na região ou simplesmente a difusão dos ideais socialistas.
Apesar das críticas feitas por Chico de Oliveira à SUDENE, conforme será abordado, é
possível reconhecer em termos de propostas, que esta modificou e melhorou a infra-estrutura
da região Nordeste, embora estejam direcionadas mais a manutenção da estrutura social
vigente que era a principal causa da pobreza causada pela seca, não conseguindo se isentar do
favorecimento da classe que política e economicamente se beneficiava da “indústria da seca”.
31
(...) a SUDENE foi um empreendimento de uma audácia inédita na história
nacional. Ela anunciava um dos dois novos casos: se os vencedores tivessem
sido as forças populares, o Nordeste e o Brasil hoje seriam muito diferentes;
tendo sido vencedoras as forças do capitalismo monopolista, chamadas a
socorrer combalidos latifundiários e barões do açúcar, essa vitória também
mudou o curso da história. (OLIVEIRA, 1977, p. 18).
A percepção contida em Oliveira (1977) é de que a SUDENE implanta um padrão dito
“planejado”, mas a crítica está na necessidade de relacionar não só aspectos econômicos, mas
também sociais e políticos. Desta forma, é preciso observar o planejamento como
conseqüência das relações sociais intrínsecas ao sistema capitalistas, como sinaliza Oliveira
(1977) com base em pronunciamento proferido por Paul Baran em 1963 na conferência da
SUDENE, quando disse que não é o planejamento que planeja o capitalismo. Desta forma, a
ordem das coisas se inverte e a lógica capitalista é que determinará o planejamento.
Diante do clima de agitação social registrado no Nordeste na década de 1950, a massa agrária
que pela primeira vez aparecia no Nordeste como agente político autônomo reivindicando
direitos e indo de encontro aos interesses dos latifundiários, representou uma ameaça à classe
proprietária.
Tais “forças populares” são constituídas pelos semicamponeses, pequenos
sitiantes, meeiros, arrendatários, cuja expressão política mais evidente
passou a serem as Ligas Camponesas, mas que também estavam
representados em sindicatos, de diversa filiação e orientação, inclusive da
Igreja Católica. (OLIVEIRA, 1977, p. 92).
O conflito entre as forças populares e as forças dominantes decadentes locais- burguesia
industrial e oligarquia latifundiária- segundo Oliveira (1977) desemboca claramente na perda
de hegemonia daquelas classes dominantes. Isso ocorre num momento de expansão do
capitalismo do Centro-Sul.
Desta forma, o que aparece como resultado de conflitos regionais ou dos “desequilíbrios
regionais” como parece ser o caso para Celso Furtado, na verdade para Francisco de Oliveira
o que ocorreu foi: “o conflito de classes que aparece sob as roupagens de conflitos regionais
ou dos “desequilíbrios regionais” chegará a uma exacerbação cujo resultado mais imediato é a
intervenção “planejada” do Estado no Nordeste, ou a SUDENE”. (OLIVEIRA, 1977, p. 99).
32
Assim, o mesmo considera que não faz sentido falar que a SUDENE foi resultado dos
conflitos de classes em escala regional e sim, uma solução para resolução dos conflitos de
classes em escala nacional.
4.2 UMA POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO PARA O NORDESTE: A
CONSTATAÇÃO DE CELSO FURTADO
Embora o documento com o título de Uma Política de Desenvolvimento Econômico para o
Nordeste tenha sido publicado em nome do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do
Nordeste (GTDN), em 1959, como documento oficial do Governo, na verdade ele foi escrito
por Celso Furtado quando foi chamado para chefiar o GTDN, enquanto ocupava uma das
diretorias do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE).
Essa análise foi feita no intuito de demonstrar que no final da década de 1950, mais
precisamente em 1959 quando o Documento é publicado havia se constatado que a forma de
atuação do Estado na região semiárida não teve os efeitos esperados em termos de
modificação estruturais mantendo a região condenada ao atraso, à baixa produtividade, à
pobreza e à miséria. Nesse documento, é relatado que o alcance do problema da seca está em
suas conseqüências sociais, isso o leva a ser uma catástrofe social. E constata que esta ocorre
devido a pouca resistência da produção agrícola aos baixos índices de chuvas e sua
irregularidade no tempo e no espaço, sendo que, a agricultura de subsistência é a mais afetada,
por ser esta uma atividade praticada pelos trabalhadores rurais que não tem meios de se
precaverem contra a seca e por ser praticamente sua única atividade.
As obras hidráulicas com o objetivo de armazenagem de água para produção agrícola irrigada
foram implantadas e difundidas desconsiderando as particularidades ambientais e sociais de
cada local. Desta forma estas,
(...) expressam um método mecanicista de análise que fragmenta e simplifica
a realidade, desconhecendo a integridade, a inteireza e as interconectividades
dos ecossistemas e dos sistemas sociais e culturais. Além disso, a
generalização de soluções concorre, muitas vezes, para a perpetuação de
problemas de ordem ecológica, social e econômica. (SILVA, 2008, p.152).
Segundo Silva (2007) as políticas de combate à seca (emergenciais e estruturais) entram em
crise ainda na primeira metade do século XX. Com a mudança no final da década de 1950, as
políticas governamentais são orientadas a um projeto nacional de integração e
33
desenvolvimento. Assim se teve o direcionamento das políticas oficiais para modernização
econômica e técnica das atividades produtivas no Semiárido.
Para Silva (2007) a criação da SUDENE em 1959, representa uma tentativa de mudança na
orientação nas formas de atuação do governo no Nordeste. Mas esse processo é interrompido
no Regime Ditatorial, dando lugar a partir de 1970 a uma política de pólos de modernização
agrícola e pecuária na região semiárida, que dará grande ênfase à agricultura irrigada voltada
para a exportação e para a monocultura.
As medidas de represamentos de água (tipo barragens, açudes e outros) que deveriam estar
combinadas ao melhor aproveitamento da água e da terra não trouxeram grandes
modificações à estrutura produtiva da região semiárida. O que se observa é que essas medidas
serviram mais para dessedentar o gado beneficiando o setor pecuário e em menor medida o
setor de produção de alimentos.
GTDN (1959, p.30) diz que “esta constituiu um dos casos mais flagrantes de divórcio entre o
homem e o meio, entre o sistema de vida da população e as características mesológicas e
ecológicas da região”.
Celso Furtado já indicava que para aumentar a produtividade da economia da região
semiárida, seria necessário considerar as condições ecológicas do local, tendo como
elementos as características dimensionais e de organização que melhor se adaptam a uma
unidade econômica especializada na cultura de xerófilas e na pecuária. Continuando com a
concepção da necessidade do desenvolvimento sustentável para o Semiárido brasileiro, seria
necessária a reorganização de suas atividades econômicas, objetivando elevar seu nível de
produtividade o que terá necessariamente de se basear numa utilização intensiva de mão de
obra barata (GTDN, 1959).
Observa-se que não houve mudanças significativas para a população mais carente em termos
de políticas públicas. Somente a partir dos anos 1980, com o processo de redemocratização é
que surgirão novas formas de atuação por parte do Estado baseadas agora na promoção do
desenvolvimento sustentável (SILVA, 2008).
34
Apesar de se ter construído uma imagem de que os problemas da região semiárida estavam
associados aos períodos de estiagem e à característica aridez da região como motivos para os
problemas se estagnação e subdesenvolvimento local.
Somente após décadas de uma batalha perdida contra essas condições
ambientais, as autoridades governamentais decidiram mudar o enfoque das
ações e partiram para adotar políticas de adaptação à realidade sócioambiental local, buscando identificar suas riquezas naturais e sua vocação
econômica e, a partir daí, desenvolver projetos com o objetivo de estimular o
dinamismo econômico regional. (SAMPAIO, 2008, p.212).
Realmente a forma de concepção de política pública para o semiárido se desloca do combate à
seca para a convivência com o semiárido. Nesse processo a sociedade civil organizada foi
determinante para pressionar e, ao mesmo tempo, apresentar alternativas além das
historicamente realizadas que incentivavam a indústria da seca.
35
5 CONCEITOS
5.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A abordagem a ser dada aos principais conceitos e autores reflete suas contribuições para
delimitação do tema. Assim, é feita diante da necessidade de evidenciar o que se deseja como
proposta de desenvolvimento sustentável para a região semiárida, pois o conceito de
convivência com o semiárido está relacionado à formulação de um desenvolvimento que seja
efetivamente capaz de transformar a realidade da região semiárida, voltando-se para a
discussão de aspectos ambientais, sociais e econômicos em uma única orientação.
O desenvolvimento proposto é o que se aproxima da realidade local e das necessidades da
população com a definição de objetivos e prioridades, e que possa ser capaz de modificar a
realidade social. Desta forma, se encaixa a concepção de Furtado (1980) e Sen (2000) e
adotado por Silva (2008), no qual, quando um projeto social dá prioridade à efetiva
transformação das condições de vida da maioria da população, o crescimento se
metamorfoseia em desenvolvimento.
Só há desenvolvimento quando os benefícios do crescimento servem a
ampliação das capacidades humanas, entendidas como o conjunto das coisas
que as pessoas podem ser, ou fazer na vida. E são quatro as mais
elementares: ter uma vida longa e saudável, ser instruído, ter acesso aos
recursos necessários para um nível de vida longo e ser capaz de participar da
vida da comunidade. (VEIGA, 2008, p.23).
Segundo a Comissão Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMD) das Nações
Unidas (CMMD, 1987, p.43 apud Mueller 2005, p.2):
Desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que garante o
atendimento das necessidades do presente sem comprometer a capacidade
das gerações futuras de atender suas necessidades. Engloba dois conceitos
chaves, o de necessidade, em particular as necessidades básicas dos pobres
de todo mundo, aos quais se deve dar absoluta prioridade; as de limitações,
impostas pelo estado da tecnologia e pela organização social, á capacidade
do meio ambiente de assegurar que sejam atendidas as necessidade presentes
e futuras.
O conceito de desenvolvimento sustentável é aqui entendido segundo Nobre (2002, p.22),
como “aquele que atende às necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade
das futuras gerações de atenderem às suas próprias necessidades”. Conforme lançado em
1987, pelo Relatório Brundtland, também conhecido como Nosso Futuro Comum, este
conceito estabelece uma nova relação homem-natureza através da incorporação do conceito
36
de sustentabilidade ao desenvolvimento que não necessitaria de adjetivação, uma vez que,
somente se estabelece desenvolvimento com sustentabilidade. Assim, se difunde a
importância de garantir para as gerações futuras a satisfação de suas necessidades.
A idéia de Amartya Sen (2000) de entender o conceito de desenvolvimento como capacidade
de expansão das liberdades reais, onde desconstrói a visão do desenvolvimento como o
crescimento do PNB, PIB, PIB per capita, restringindo-se a avaliação de variáveis
macroeconômicas. Mas outros elementos são determinantes para a efetivação das liberdades
como fatores sociais, econômicos, culturais e ambientais, pois podem proporcionar meios
necessários para que este ocorra, como o progresso tecnológico, liberdade política e religiosa,
e etc..O desenvolvimento torna-se real com promoção destas liberdades.
Sen (2000, p.19) “considera a liberdade o principal fim do desenvolvimento”. A liberdade de
participação política ou a liberdade de acesso à educação básica conduzem ao
desenvolvimento. Com isso, desconstrói o argumento econômico de que há uma relação
precisa entre o maior nível de renda per capita e a liberdade, por exemplo, em termos de
expectativa de vida e qualidade de vida.
Há certas liberdades que devem ser consideradas ao falarmos de desenvolvimento, como a de
participar da vida política, a oportunidade de receber a educação, ter direito a uma vida longa
e saudável. Assim, as liberdades substantivas seriam alcançadas ao se ter liberdade política,
social e econômica. Esse tipo de abordagem se encaixa nos objetivos das políticas de
convivência com o semiárido de promoção da sustentabilidade e garantia de melhor qualidade
de vida, para que isso ocorra de forma efetiva e eficaz traz os aspectos econômicos, sociais,
políticos, culturais e ambientais para a discussão e aplicação pela população do Semiárido
brasileiro.
Considerando o processo hístórico que caracteriza a formação do Semiárido brasileiro, para
que ações que visem o desenvolvimento sejam eficazes é necessário que as medidas adotadas
tenham como consideração fundamental a resolução das carências da maioria das pessoas. A
análise de
Sachs (2004) chama atenção para a necessidade de um desenvolvimento
includente, onde se tenha a inclusão justa, pois a maioria das pessoas pobres estão
praticamente excluídos deste processo, entendido como acesso a totalidade dos direitos
humanos.
37
Pode-se então compreender que o desenvolvimento, assim como o conceito de convivência
com o semiárido que será tratado posteriormente ambos representam as mudanças
paradigmáticas. No caso do DS em oposição ao desenvolvimento enquanto somente como
crescimento econômico e, em relação ao conceito de convivência uma mudança em relação ao
paradigma do combate á seca.
5.2 CONCEITO DE CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO
A convivência com o semiárido representa um conceito que visa dar novas perspectivas para a
região semiárida, criando melhores condições de vida para a população sertaneja. Nessa
perspectiva requer que o homem se adapte ao meio em que vive de forma a harmonizar as
relações homem-natureza. Esta proposta está em oposição à anterior de enfrentamento à
natureza.
O segredo da convivência está em compreender como o clima funciona e
adequar-se a ele, não se trata mais de “acabar com a seca”, mas de adaptar-se
de forma inteligente. É preciso interferir no ambiente, é claro, mas
respeitando as leis de um ecossistema que, embora frágil, tem riqueza
surpreendentes. (MALVEZZI, 2007, p. 26).
A abordagem do desenvolvimento vem se modificando, diante disso, utiliza-se do seguinte
referencial:
Apresentando um discurso renovador e comprovando, com seus
experimentos, a possibilidade de um desenvolvimento sustentável com base
na convivência com o Semi-Árido brasileiro. O Semi-Árido passa a ser
concebido enquanto um espaço no qual é possível construir ou resgatar
relações de convivência entre os seres humanos e a natureza, com base na
sustentabilidade ambiental e combinando a qualidade de vida das famílias
sertanejas com o incentivo às atividades econômicas apropriadas. (SILVA,
2008, p.24).
Diante dessa perspectiva de alternativa de desenvolvimento sendo capaz de promover a
melhoria das condições econômicas, a justiça social e o respeito ao uso dos recursos
ambientais tendo como pressuposto a melhor adaptação das pessoas às condições daquele
meio. Com isso, pode-se chamar essa “convivência”, como uma forma de “desenvolvimento
sustentável” para a região semi-árida, por ser capaz de agregar desenvolvimento humano,
melhoria na qualidade de vida, e a sustentabilidade ambiental.
Ao se tratar do desenvolvimento sustentável no semiárido é preciso considerar as
características da região como o clima, aspectos sociais e a pobreza, diante disso,
38
A implementação do desenvolvimento sustentável para a região semi-árida
nordestina, sem dúvida, constitui um grande desafio para a sua população e
órgãos envolvidos. Desafio, por se tratar de uma região onde estão presentes
a pobreza, desertificação, êxodo rural, condições climáticas adversas, e que
só poderá ser compreendida se forem considerados todos esses aspectos.
(FALCÃO, 2005, p.16).
Este é um ambiente complexo por se ter além de questões climáticas; desigualdades sociais,
baixos índices de desenvolvimento humano, concentração fundiária, que são problemas que se
acentuam ainda mais. O que torna relevante o
(...) estabelecimento de um aproveitamento racional e ecologicamente
sustentável da natureza em benefício das populações locais, levando-as a
incorporar a preocupação com a conservação da biodiversidade aos seus
próprios interesses, como um componente da estratégia de desenvolvimento.
(SACHS, 2000, p.53 apud SILVA, 2007, p.477-478).
Josué de Castro aponta como principal causa para que a seca seja encarada como calamidade
conforme Silva(2008) no regime inadequado da estrutura agrária na região, a concentração de
terra, expresso no latifúndio e nos minifúndios, sendo esta a causa central do problema.
A convivência com o meio ambiente é um imperativo fundamental para o
aproveitamento apropriado dos recursos naturais, com a ação humana
buscando conciliar ou corrigir as tendências negativas sem agravá-las. Para
garantir sua perpetuidade, a população necessita aprender a viver em
harmonia com o código da natureza do seu meio, buscando a adaptação ao
seu habitat, e não a partir de uma relação de estranhamento, de destruição ou
combate. (SILVA, 2008, p.108).
Outra relação que se tem no discurso da convivência com o semiárido é a relação com o local,
valorizando suas potencialidades e sua diversidade cultural formando uma identidade do
território e um aprendizado a partir da relação entre o sujeito e as experiências adquiridas de
acordo com a realidade do Semiárido brasileiro.
Na intenção de demonstrar os principais elementos que servem para a especificação dos
mecanismos necessários que compõem os requisitos a serem atendidos pelas instituições que
se propõem serem capazes de atuar na promoção da sustentabilidade do desenvolvimento
através da convivência com o semiárido, segue que,
Para que a convivência com o semiárido seja sustentável do ponto de vista
econômico, as tecnologias propostas têm que ser de baixo custo e de
replicação fácil pelas famílias agricultoras da região. Para que seja
sustentável do ponto de vista ambiental, essas tecnologias devem ser
respeitosas do meio ambiente. Finalmente, para que haja convivência
socialmente sustentável, essas mesmas tecnologias devem ser fruto de um
processo pedagógico e político que aproveite o saber das famílias produtoras
e dialoguem com elas, permitindo-lhes apropriarem-se do mesmo e difundilo de forma autônoma. (...). Portanto, fica claro que os aspectos
39
organizativos e educativos estão intimamente interligados com os aspectos
tecnológicos. (DUQUE, 2008, p. 137).
A convivência é antes de tudo conviver com as características e limitações da natureza
(CHACON, 2007). O sucesso dessas práticas está na aproximação entre comunidades, poder
público e as entidades/organizações da sociedade civil com o objetivo de garantir condições
mínimas de vida das famílias das comunidades rurais do Semiárido. No Semiárido
(...) foi construída uma cultura de resistência e solidariedade, que ajudou o
sertanejo a transcender as adversidades, especialmente aqueles ligados à sua
própria organização social e à sua relação com o meio ambiente,
especialmente no que se refere ao acesso ou a não à água. Chacon (2007,
p.31)
É essa compreensão da realidade do semiárido que se faz necessária na realização de políticas
que tenham o objetivo de desenvolver de forma sustentável.
5.3 A MUDANÇA PARADIGMÁTICA REPRESENTADA PELO P1MC
Será abordado o porquê de esta concepção representar uma mudança de paradigma, onde se
tem a importância do conceito de convivência com o semiárido representando outra
perspectiva de desenvolvimento para o semiárido. Com isso, espera-se evidenciar a oposição
entre estas formas de atuação e de concepção do fenômeno da seca no semiárido.
Conforme o dicionário Aurélio, paradigma é um modelo, padrão. O termo paradigma
representa a aceitação de determinadas teoria, métodos e aqueles objetos durante certo
período. Mas Kuhn além de demonstrar que a ciência evolui por rupturas, também a cada
momento ela seleciona aquelas teorias, aqueles métodos que são válidos por determinado
tempo, mas esse processo de mudança não quer dizer que todos aceitem facilmente a
mudança.
Segundo Abramovay (2007) o paradigma é um conjunto de crenças comunitariamente
partilhadas pelos cientistas sobre o que, como e para que pesquisar. E a mudança de
paradigma ocorre quando os próprios resultados começam a colocar em xeque o que se
acreditava anteriormente, assim o novo surge da ruptura. Foi o que ocorreu com o paradigma
da solução hidrológica do combate à seca que via como causa única o fenômeno climático da
escassez de chuvas, deixando de perceber as inter-relações ali existentes que possibilitam o
40
enriquecimento de uma pequena parcela da sua população. Enquanto isso, a parcela dos
camponeses é subjugada e submetida a condições degradantes.
Não é possível fornecer uma explicação única para definição e solução dos problemas do
Brasil e do Nordeste, pois
É difícil não exagerar com respeito ao Nordeste do Brasil. Aí tudo escapa as
explicações fáceis. A sociedade não é fruto nem de conquista nem de um
projeto de colonização. Desde seus primórdios, tudo se apresenta como
definitivo com traços básicos que persistiriam por séculos. (FURTADO,
1989, p.15).
Essa citação transmite a noção do desafio que é implantar políticas de mudança sociais, em
geral no Brasil, mas essa mudança é ainda mais complexa e necessária no Nordeste semiárido
devido à condição de sua fragilidade.
“Julgamentos superficiais sobre o fenômeno e interesses políticos locais conduziram à
construção de explicações reducionistas dos problemas regionais como produtos de condições
naturais adversas do clima, da terra e de sua gente” (SILVA, 2007, p. 467). Na perspectiva de
mudança da imagem de fragilidade associada à região semiárida, o pensamento de que o
problema se restringe a fatores climáticos, deve ser repensado. Portanto outros fatores de sua
formação sócio-econômica como grande concentração fundiária, políticas públicas de
combate à seca, economia marginalizada, pobreza, degradação ambiental, práticas políticas
como coronelismo e o clientelismo fazem parte do contexto que leva ao agravamento dos
problemas sociais da região, que apresenta geralmente os piores indicadores sociais do país.
Com a ocorrência de secas prolongadas na segunda metade do século XIX, devido à situação
de calamidade que colocou em risco o povoamento e as atividades econômicas, teve-se início
estudos científicos sobre este fenômeno natural. Segundo Silva (2007) a visão parcial do
semiárido como a região das secas conduziu a adoção de soluções fragmentadas, cujo núcleo
gerador é o combate à seca e aos seus efeitos.
Surgem novas abordagens para a problemática na metade do século XX onde está presente a
análise sociológica com a ênfase na forma de ocupação e exploração da região desde os
colonizadores que levava à concentração de riqueza e poder político e à disseminação da
situação de pobreza e miséria para a maior parte da população. Isso é uma quebra de
41
paradigma e desmistificou as ações de combate à seca que, além de ineficazes reproduziam as
estruturas locais de dominação (SILVA, 2007).
Ao se pensar no desenvolvimento sustentável não se pode modificar a natureza de forma
indiscriminada, como se o homem pudesse se apropriar e controlar tudo. Mas o que se propõe
com o desenvolvimento sustentável é conviver de forma mais harmônica com o meio
ambiente. O homem modifica a natureza segundo Silva (2007) conhecendo as causas naturais
da seca e agindo sobre os seus efeitos para promoção do progresso da humanidade, daí a
crença de que o combate à seca represente a modernidade e o progresso.
Para Buarque (2001, p.224 apud Silva 2007, p.480), “na modernidade técnica, o avanço
técnico define a racionalidade econômica, subordinando a ela os objetivos sociais e ignorando
os valores éticos”. Assim, outros valores ficam sujeitos à lógica econômica.
Segundo Silva (2008) a crítica contra a política de combate à seca é, principalmente, a crítica
da exploração política da miséria nos períodos de seca. Embora já indicado por Celso Furtado
no final da década de 1950, a necessidade da formulação de uma nova proposta de
desenvolvimento diante da constatação dos problemas enfrentados pela região Nordeste, essa
discussão volta à tona somente após a redemocratização, pois sem a consolidação de um
processo democrático é muito difícil ter soluções vindas do próprio seio da sociedade.
Com a redemocratização nos anos 1980, a proposta para o desenvolvimento da região
semiárida se modifica, há uma aproximação da realidade local com a entrada em cena de
outros sujeitos. Nessa proposta o Estado não é mais o protagonista como antes, e sim a
sociedade civil organizada e, não tem a monopolização pelas elites dominantes. A população
é agente de modificação e o conhecedor da própria realidade do semiárido (SILVA, 2008;
DUQUE, 2008).
Para Silva (2008) uma das principais causas para o fracasso das políticas públicas implantadas
no Semiárido brasileiro é a falta de participação ativa e autônoma. Diante disso, se procura
dar maior atenção à necessidade destes aspectos para o sucesso das políticas de erradicação da
pobreza e da miséria implantadas pelas organizações.
42
Os projetos e os programas das entidades/organizações que trabalham com a proposta de
convivência têm a compreensão de que o desenvolvimento é uma construção societária, ou
seja, pode-se construir um novo paradigma de desenvolvimento, onde conforme Veiga (2008)
se tem a presença dos esforços culturais, econômicos, políticos e sejam todos subordinados á
finalidade da melhoria das condições de vida.
Neste sentido, o P1MC representa uma tentativa de promoção do desenvolvimento sustentável
nas localidades rurais dos municípios do Semiárido brasileiro, pois vê como necessária a
capacitação da população para resistir aos efeitos da seca, dando condições de elevação do
nível de vida de sua população.
43
6 ESTUDO DE CASO SOBRE O P1MC NO TERRITÓRIO DE IRECÊ
6.1 CARACTERIZAÇÃO DO TERRITÓRIO DE IRECÊ
Na caracterização do Território de Irecê, pretende-se seguir uma lógica de delineamento do
tema aqui formulado para a descrição dos aspectos que serão relevantes na compreensão da
importância do P1MC para a população beneficiada e para a comunidade rural onde será
realizado o estudo de caso.
Os municípios que compõem o Território de Irecê são: América Dourada, Barra do Mendes,
Barro Alto, Cafarnaum, Canarana, Central, Gentio do Ouro, Ibipeba, Ibititá, Ipupiara, Irecê,
Itaguaçu da Bahia, João Dourado, Jussara, Lapão, Mulungu do Morro, Presidente Dutra, São
Gabriel, Ubaí e Xique-Xique, com uma população de 418.166 pessoas. Este Território tem
uma área total de 26.730 km² e está localizado na região Centro-Oeste do estado da Bahia,
Mapa 2 (PDRS, 2010).
Mapa 2 - Território de Irecê
Fonte: BRASIL, 2010
44
O processo de povoamento e formação do Território de Irecê é marcado pela busca de
condições de subsistência garantindo a segurança e alimentação. Assim, conforme Brasil
(2010, p.23) “nesse sentido, o processo de povoamento, já em meados do século XIX, com
início da exploração agrícola, pecuária e de minérios, dentre outros, deu-se de modo peculiar.
As características do clima, solo e recursos hídricos determinaram a dinâmica de ocupação”.
Há diferenciação na demonstração da concentração demográfica no Território nas zonas mais
propícias à agricultura, principalmente do feijão, enquanto em municípios como Xique-Xique
e Itaguaçu- pertencentes à zona caatinga e Beira Rio- há baixa concentração demográfica.
A zona Caatinga e Beira Rio é a menos povoada do Território e um dos maiores vazios
demográficos do Estado, com densidade de 5,1 hab/km2. Faz parte desta área, os municípios
de Xique-Xique e Itaguaçu da Bahia, os maiores do Território em extensão e com densidades
demográficas de 7,9 hab/km2 e 2,6 hab/km2, respectivamente. O destaque é Xique-Xique, com
a 2ª maior população do Território (BRASIL, 2010).
A atividade agropecuária constitui a principal atividade para a região, principalmente em
termos de pessoas empregadas. E há uma grande parcela da população vivendo na zona rural,
cerca de 60%, de acordo com o censo 2000.
Em termos de indicadores sociais, embora tenha melhorado, é significativo o atraso relativo
em relação à renda per capita e o alto analfabetismo se comparado a média do Brasil e do
Estado. Segundo Brasil (2010, p.32) no Território, em torno de 66% da população sobrevive
com renda per capita de até ½ salário mínimo representando 58,7% de famílias com tal renda.
Além de o analfabetismo acometer a 23,8% da população, sendo refletido nos baixos
indicadores sócio-econômicos.
Houve melhoria no IDH-M dos municípios do Território de Irecê do ano de 1991 para 2000,
mas mesmo assim o índice médio para o território encontra-se abaixo da média para o Estado.
45
Quadro 1 - IDH-M nos municípios do Território Irecê em relação ao Estado da Bahia - 1991/2000
Município
1991
2000
IDH-M Classificação
IDH – Classificação
no Estado
M
no Estado
BAHIA
0,601
0,693
0,604
0,505
Território Irecê
América Dourada
0,492
280
0,564
393
Barra do Mendes
0,554
86
0,636
154
Barro Alto
0,532
136
0,621
208
Cafarnaum
0,475
324
0,598
307
Canarana
0,529
144
0,601
295
Central
0,534
129
0,614
241
Gentio do Ouro
0,519
182
0,575
376
Ibipeba
0,513
204
0,629
183
Ibititá
0,490
284
0,602
292
Ipupiara
0,588
41
0,670
61
Irecê
0,596
34
0,666
67
Itaguaçu da Bahia
0,440
391
0,586
354
João Dourado
0,472
333
0,596
312
Jussara
0,469
345
0,567
391
Lapão
0,521
174
0,621
210
Mulungu do Morro
0,475
325
0,578
372
Presidente Dutra
0,507
235
0,614
242
São Gabriel
0,474
328
0,619
221
Uibaí
0,521
172
0,615
234
Xique-Xique
0,495
265
0,580
365
Fonte: BRASIL, 2010.
Os dados sobre o Território demonstram a situação de pobreza de sua população, e que estes
fatores estão relacionados ou correlacionados à baixa escolaridade de sua população se reflete
no rendimento das famílias e no nível de escolaridade dos filhos, além do fato de não se ter
atividade econômica mais dinâmica e que proporcione maiores rendimentos à população. Isso
resulta que “para o conjunto do Território, 43% da população é classificada como pobre e
outros 33% (um terço) estão abaixo da linha da pobreza”. (BRASIL, 2010, p.33). Neste
sentido, os programas de transferência de renda como o Bolsa Família são bastante relevantes.
Em setembro de 2010 foram beneficiadas aproximadamente 63.000 famílias no Programa no
Território de Irecê (Quadro 2).
46
Quadro 2 – Número de Famílias Beneficiadas pelo Programa Bolsa Família e Valores das
Transferências Mensais (set. 2010)
Município
Nº de Famílias
América Dourada
Barra do Mendes
Barro Alto
Cafarnaum
Canarana
Central
Gentio do Ouro
Ibipeba
Ibititá
Ipupiara
Irecê
Itaguaçu da Bahia
João Dourado
Jussara
Lapão
Mulungu do Morro
Presidente Dutra
São Gabriel
Uibaí
Xique-Xique
Total
2.772
2.100
2.228
2.801
4.113
2.863
1.769
2.656
3.155
1.326
6.884
2.306
3.244
2.685
4.094
2.393
2.351
3.182
2.379
7.586
62.887
Transferência Mensal
R$
291.241,00
213.876,00
220.408,00
291.689,00
412.833,00
292.822,00
176.804,00
260.464,00
308.447,00
128.752,00
662.114,00
241.737,00
316.214,00
269.355,00
421.790,00
247.326,00
226.861,00
334.159,00
231.749,00
804.080,00
6.352.721,00
Fonte: BRASIL, 2010
Mas essa configuração econômico e social em que faltam oportunidades e o fornecimento de
uma infra-estrutura e de serviços de qualidade, conforme BRASIL (2010) tem como
conseqüência no Semiárido brasileiro a falta de perspectiva para o viver no e do campo.
Resulta com isso, no êxodo rural, aumentando o inchaço urbano ao mesmo tempo em que
ocorre a desvalorização do trabalho do camponês/agricultor familiar.
Ao analisar o PIB per capita se observa a situação de pobreza e de falta de atividades
produtivas que garantam renda à população, embora esta seja uma situação geral do semiárido
brasileiro, em que a grande fonte de renda é originária do setor de serviços, demonstra a
dependência que há dos Programas Sociais e das Prefeituras, pois esta geralmente é o grande
empregador dos municípios (Quadro 3).
47
Quadro 3 - Composição do Produto Interno Bruto (PIB), por Município, 2007 (R$ 1.000,00)
Composição do PIB por setores
PIB per
Município
Agropecuária Indústria
Serviços
Impostos capita
América
10.835
3.373
30.103
1.658
2.914
Dourada
Barra
do
6.556
3.307
28.801
1.212
2.842
Mendes
Barro Alto
4.425
4.149
25.008
1.282
2.538
Cafarnaum
8.077
6.165
32.913
1.497
2.680
Canarana
10.542
4.068
44.742
2.482
2.616
Central
3.960
2.537
32.964
1.313
2.443
Gentio do Ouro
4.636
7.421
18.904
789
2.372
Ibipeba
4.913
2.540
31.453
2.749
2.776
Ibititá
8.874
5.694
35.724
2.011
2.810
Ipupiara
1.740
2.540
20.950
1.437
2.986
Irecê
11.062
28.586
243.248
32.597
5.034
Itaguaçu
da
5.336
3.311
20.873
811
2.418
Bahia
João Dourado
16.905
6.411
44.543
2.947
3.399
Jussara
4.430
3.568
25.690
11.130
2.347
Lapão
27.186
8.004
50.237
2.879
3.455
Mulungu
do
4.603
3.142
24.333
1.195
2.419
Morro
Presidente
7.400
3.933
26.807
1341
2.856
Dutra
São Gabriel
6.469
4.801
37.025
1.873
2.717
Uibaí
5.208
3.379
26.414
1.235
2.641
Xique-Xique
15.509
11.679
93.371
47.024
2.741
Total
168.666
118.608
894.103 119.462
2.850
%
13
9,1
68,7
9,2
Fonte: BRASIL, 2010, p.54
Observando os indicadores de renda e de desenvolvimento econômico e social, constata-se que de
modo geral os municípios do Território de Irecê não apresentam um bom desempenho. De acordo
com a classificação dos municípios tem-se Irecê que se situa na melhor posição (18º) quanto
ao IDS como tal quanto ao IDE (34º) e em priores condições se tem o município de Mulungu
do Morro em IDS (373º) e Itaguaçu da Bahia em IDE (378).
48
Quadro 4 - Índice de Desenvolvimento Social e Econômico, Município Território de Irecê, 2000.
Municípios
América Dourada
Barra do Mendes
Barro Alto
Cafarnaum
Canarana
Central
Gentio do Ouro
Ibipeba
Ibititá
Ipupiara
Irecê
Itaguaçu da Bahia
João Dourado
Jussara
Lapão
Mulungu do Morro
Presidente Dutra
São Gabriel
Uibaí
Xique-Xique
Irecê
IDS
Classif.
4.979,52
5.045,25
4.985,73
4.988,28
4.997,41
5.028,26
4.977,56
5.008,10
5.000,62
s/d
5.129,68
4.950,74
5.030,38
4.984,10
4.979,28
4.940,01
5.010,33
4.973,43
4.974,18
5.005,91
4.974,02
IDE
236º
71º
207º
198º
169º
92º
242º
144º
162º
s/d
18º
349º
87º
215º
237º
373º
141º
260º
256º
150º
11º
4.988,73
4.989,65
4.987,61
4.988,37
4.989,20
4.989,02
4.987,93
4.989,80
4.990,42
s/d
5.005,52
4.987,01
4.989,41
4.987,83
4.989,79
4.987,24
4.988,50
4.988,65
4.988,20
4.995,51
4.955,00
Classif.
216º
170º
330º
246º
195º
205º
293º
166º
139º
s/d
34º
378º
182º
302º
167º
362º
234º
219º
266º
68º
14º
Fonte: BRASIL, 2010
A configuração da atual estrutura fundiária no Território de Irecê se deve muito à intervenção
estatal com sua atuação modernizante financiando os agricultores. Ao observar a estrutura
fundiária do Território de Irecê verifica-se maior representatividade de propriedades com
menor de 10 hectares, 66,3% dos estabelecimentos. (BRASIL, 2010).
Tabela 3 - Perfil da estrutura fundiária do Território Irecê, 2000
Participação no total (%)
Grupos
de
área
dos
Pessoal
Valor
da
estabelecimentos rurais
Nº de Estab.
Ocupado
Produção
Área
1. Até 10 hectares
66,26
26,11
9,46
57,77
2. Mais de 10 a 20 hectares
13,35
11,61
6,89
14,69
3. Sub – Total (1+2)
79,60
37,73
16,35
72,46
4. Mais de 20 a 50 hectares
12,10
19,04
14,17
15,03
5. Mais de 50 a 100 hectares
4,12
13,09
10,73
5,77
6. Sub – Total (3+4+5)
95,82
69,85
41,25
93,27
7. Mais de 100 a 200 hectares
2,19
11,32
11,09
3,17
8. Mais de 200 a 500 hectares
1,33
10,87
14,86
2,21
9. Sub – Total (7+8)
3,53
25,94
5,38
22,19
Fonte: BRASIL, 2010
49
Percebe-se que no Terrritório de Irecê se tem um quadro muito comum no semiárido, com
grande número de pequenas propriedades, os chamados minifúndios e do outro lado um
pequeno número de grandes propriedades ocupando grandes áreas. Utilizando os dados, quase
80% dos estabelecimentos têm até 20 hectares, no entanto estas ocupam apenas 16,35 % da
área e 72,46 % do pessoal ocupado. Mas quando se analisa as propriedades com mais de 100
hectares, estas possuem 3,53 % do número total de estabelecimento, enquanto em termos de
área têm aproximadamente 26%.
A agricultura da região é pouco diversificada, pois predomina o tri-consórcio: feijão, milho e
mamona desde os anos 1980. Há atualmente a necessidade de maior diversificação com
culturas aptas ao ecossistema local, pois a seca ainda constitui o maior problema à produção.
É preciso um modelo apropriado de desenvolvimento, sendo este baseado na convivência e
não no combate ás características físicas e ambientais.
Atualmente tem se difundido o plantio/cultivo da mamona com o advento do biodiesel, o que
manteve seu preço em um patamar favorável, além do fato desta cultura ser mais resistente a
irregularidade de chuvas. “A cultura da mamona é difundida em todo o Território e de grande
importância para a Bahia, representando 57%, 46% a 48% de área colhida, produção e valor
da produção, respectivamente” (BRASIL, 2010, p.51). Mas é bom ter cautela para que a
agricultura na região mantenha a diversidade e não se volte somente para o monocultivo.
As atividades de produção vegetal predominam na região, embora menos apta ao semiárido
que a caprinocultura e ovinocultura, a atividade predominante na pecuária é a bovinocultura
com 29,4% de participação na geração de valor para o Território (Tabela 4).
50
Tabela 4 - Valor Anual da Produção do Território de Irecê, por tipo de atividade, 2000
Tipo de Atividade
1. Produção animal
1.1 - Grande Porte
1.2 - Médio Porte
1.3 - Aves e pequenos animais
2. Produção Vegetal
2.1 - Lavouras Permanentes
2.2 - Lavouras Temporárias
2.3 - Fruticultura e Horticultura
Valor
da
Produção
(1.000,00)
Valor
%
14.509
29,4
11.456
23,2
1.271
2,6
1.782
3,6
34.809
70,6
2.558
5,2
23.695
48
8.108
16,4
2.4 - Silvicultura e exploração florestal
Total
448
0,9
49.318
100
Fonte: BRASIL, 2010
6.2
CONSIDERAÇÕES SOBRE O P1MC
6.2.1 A atuação/papel da Articulação do Semiárido (ASA)
A ASA é uma rede de articulação e um espaço de discussão que reúne um conjunto de
entidades que trabalham com a convivência com o semiárido, que vão desde sindicatos,
associações, entidades religiosas, ONGs e outros. Sendo assim, a ASA é o sujeito político
destas entidades/organizações que têm como objetivo a formação e a mobilização para a
convivência das comunidades com o semiárido.
A Articulação do Semiárido (ASA) nasce do descontentamento com a situação de flagelo dos
sertanejos e da necessidade de políticas públicas que modificassem o quadro de pobreza e
miséria decorrentes da seca. Até então, a ação governamental esteve muito vinculada a
construção de obras de combate à seca e a medidas emergenciais com a criação de frentes de
trabalho ou a distribuição de água em carros pipas. Portanto, é do desgaste e do
descontentamento que os camponeses e organizações da sociedade civil (igrejas, sindicatos e
outras) irão contestar esse modelo de atuação, exigindo ações efetivas e de longo prazo
(DUQUE, 2008).
Na seca de 1992/93 houve uma movimentação por parte da sociedade civil organizada,
cobrando do governo federal medidas mais eficazes e ações permanentes, esse movimento
ocupou a sede da SUDENE, em Recife. Isso resultou na criação do Fórum Nordeste,
51
composto por mais de trezentas organizações que elaboraram o documento “Ações
Permanentes para o Desenvolvimento do Nordeste Semi-árido Brasileiro”, resultando na
formulação do Projeto Áridas por parte do governo, já propondo o desenvolvimento
sustentável para o Nordeste (SILVA, 2007).
O surgimento da Articulação do Semiárido (ASA) se dá em 1999, durante a Terceira Sessão
da Conferência das Partes das Nações Unidas da Convenção de Combate à Desertificação
(COP3), ocorrida em Recife-Pernambuco, em que se unem entidades/organizações da
sociedade civil para constituir a ASA e divulgar a Declaração do Semi-árido. Com a
ocorrência de mais uma grande seca, diversas organizações da sociedade civil criam um
Fórum Paralelo para participarem. O P1MC é fruto dessa articulação e foi formulado entre
2000/2001 para a capacitação das famílias e das comunidades para a questão da convivência
com o semiárido, que vai além da simples construção das cisternas, passa pela discussão da
cidadania e das relações de gênero (SILVA, 2007).
“A ASA – Articulação do Semi-Árido - é um fórum de organizações da sociedade civil, que
vem lutando pelo desenvolvimento social, econômico, político e cultural do semi-árido
brasileiro, desde 1999”. (JESUS, 2009). Atualmente estão ligadas a ASA mais de 750
entidades dos mais diversos seguimentos, como igrejas católicas e evangélicas, ONGs,
associações de trabalhadores/trabalhadoras rurais e urbanos, associações comunitárias,
sindicatos e federações de trabalhadores/ trabalhadoras rurais. Todas trabalhando juntas para
implementação de uma melhora na qualidade de vida dos sertanejos.
Ação da ASA é diferenciada,
O que faz a diferença no caso da ASA é que, graças a uma ampla
articulação, estas tecnologias e outras são difundidas em todo o semi-árido
brasileiro, obedecendo a um processo pedagógico que transforma os (as)
produtores (as) em experimentadores (as) e divulgadores (as), despertando
sua autonomia e auto-estima, suscitando sua iniciativa, libertando as famílias
camponesas da velha dependência do assistencialismo, ou seja, criando as
condições da sustentabilidade do processo de criação, experimentação e
replicação de tecnologias. (DUQUE, 2008, p.139).
A ASA preza em suas políticas o resgate do saber popular dos produtores rurais e os incentiva
ao intercâmbio de experiência. Com isso, se cria uma rede de divulgação e difusão de novas
experiências.
A criação da ASA representa um marco na formulação de práticas e políticas para o
semiárido, pois passa a se valorizar o protagonismo dos atores sociais locais e a
52
sustentabilidade em sua atuação. Essa atuação é diferente daquela que vinha sendo
implantada, pois desconsiderava a população local nas tomadas de decisão.
Como geralmente são conhecidos sem maiores preocupações com a
mobilização das populações autóctones, fazendo que - as participar de
discussões mais ampla sobre a realidade regional em múltiplas dimensõeseconômicas, sociais, políticas e ambientais-seus resultados quase sempre têm
sido um fracasso. (LOPES; LIMA, 2005, p.12).
A consolidação da ASA enquanto uma rede de entidades se deu no ano 2000. Mas o P1MC
iniciou-se com uma fase de testes que durou de 2001 e 2003. A partir de julho de 2003 se
consolida e se inicia o P1MC nacional/atual, que até o momento construiu 320.000 cisternas,
segundo informação contida no site da ASA. O envolvimento do Estado se deu com a
proposição e cobrança da sociedade civil organizada por mudanças na sua forma de intervir
no semiárido. Então, são as entidades as grandes responsáveis para a transformação da
política pública.
De acordo com Cleusa A. Silva, coordenadora da ASA/Bahia, a atuação se dá em todo
Semiárido baiano e está dividida em 13 micro-regiões. A ASA a nível estadual tem autonomia
para desenvolver projetos e programas, e na Bahia em parceria com o Governo do Estado
realizou-se o Projeto Cisternas dentro do Programa Água para Todos, nesse caso, voltado para
abastecimento familiar e também para produção. Em convênio com o INGÁ se tem o
Aguadas, este contemplava outras tecnologias, como o barreiro trincheira, tanque de pedra e
outros.
A ASA também visa contribuir para criar espaços de atuação das organizações e movimentos
sociais, libertando as populações sertanejas da condição de submissão/dominação política
historicamente constituída e contribuir para o desenvolvimento com sustentabilidade.
6.2.2 O Programa Um Milhão de Cisternas
A contextualização realizada ao longo deste trabalho da forma como procedeu o Estado e a
sua caracterização, junto com os conceitos tratados, servem para compreender a dimensão que
ganha um programa desta natureza diante de tantos problemas ao longo de séculos de
exclusão de direitos civis básicos como é o caso do acesso ao recurso água. Com isso, se
aborda o P1MC na perspectiva de demonstrar os aspectos que o faz ser diferente dos outros
tipos de ação-referente ao combate à seca- praticadas no semiárido, ficando perceptível outro
53
tipo de lógica que orientará a nova formulação de políticas baseadas no conceito de
convivência com o semiárido.
A concepção atual vê como essencial o envolvimento da sociedade e principalmente da
comunidade na discussão das propostas de convivência com o semiárido. O P1MC é resultado
da ação das organizações da sociedade civil e conta com a colaboração do governo federal
(Ministério do Meio Ambiente e Ministério do Desenvolvimento Social), da iniciativa privado
como a FEBRABAN e de agências de cooperação internacional e outras organizações. Esse
programa conta com a participação das famílias, da comunidade e de suas organizações
(LOPES; LIMA, 2005).
O processo de implantação do P1MC e de outros programas da ASA são os mesmos . Esses se
iniciam com o contato com a Comissão Municipal de Recursos Hídricos, onde esta não está
formada se ajuda em sua constituição. Posteriormente, esta Comissão define as
comunidades/povoados a serem priorizados no Programa. Há nessas comunidades/povoados a
formação de uma Comissão para escolha das famílias para serem beneficiadas. Escolhidas as
famílias de acordo com os critérios estabelecidos, se inicia a construção, sendo condição para
o recebimento da cisterna a participação no curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
Anteriormente ao P1MC alguns governantes nordestinos, na década de 1970 e meados de
1980, incentivaram a construção de cisternas para pequenos agricultores sertanejos.
Entretanto, diferentemente do que agora ocorre, não contavam com a participação das
famílias, além disso, foram mal construídas e logo não serviram para o armazenamento
d’água (LOPES; LIMA, 2005).
Compreende-se que o P1MC não se constitui somente da construção das cisternas, pois está
ligado a garantia de subsídios para um possível desenvolvimento sustentável. E para que isso
ocorra
(...) seus componentes mais importantes são a mobilização das famílias, o
controle social da execução do programa, a capacitação dos beneficiárioscursos de formação de pedreiros, gerenciamento dos recursos hídricos e
compreensão da realidade sócio-econômica, política e ambiental do semiárido- e o fortalecimento institucional da sociedade civil, com base em
diferentes instrumentos de comunicação. (LOPES; LIMA, 2005, p.12).
Através da utilização de uma metodologia participativa e democrática voltada para a
convivência com o semiárido, o P1MC e as ações de convivência apresentam outra
54
perspectiva para que o sertanejo possa se relacionar de forma mais harmônica com o ambiente
em que habita. A ASA argumenta que o aproveitamento máximo dos recursos hídricos através
do Programa só será possível mediante ações concretas de educação que possibilite uma nova
percepção aos atores regionais. Para Lopes e Lima (2005) deve se buscar, o estabelecimento
de uma nova organização social no semiárido, onde as políticas públicas sejam efetivamente
voltadas para melhorias das condições de vida, fortalecendo e afirmando a região como
possível do ponto de vista sócio-econômico.
A responsabilidade sobre a gestão dos convênios de financiamento do Programa com o
governo, agências multilaterais, iniciativa privada e outros, é da Associação do Programa Um
Milhão de Cisternas Rurais (AP1MC), esta é a Unidade Gestora Central (UGC) que repassa
os recursos às Unidades Gestoras Estaduais (UGE) para que estas executem a construção das
cisternas conforme as metas definidas anualmente (LOPES; LIMA, 2005).
As unidades micro-regionais atuam dando suporte técnico e operacional. Além de serem
responsáveis pela construção das cisternas nas comunidades e povoados, tem responsabilidade
na gestão dos recursos garantindo eficiência e eficácia ao programa. São elas que implantam o
Programa.
Os resultados do P1MC para a população beneficiada são: melhora da saúde devido a
qualidade maior da água; poupa tempo, principalmente das mulheres, para abastecer a família
com água; melhora qualidade de vida da populações beneficiadas.
Dando continuidade ao P1MC, a ASA cria o Programa Uma Terra Duas Águas (P1+2) com o
intuito de diminuir o monopólio sobre os dois recursos naturais mais necessários no
Semiárido brasileiro: a terra e a água. Neste Programa se implantam duas cisternas na
propriedade agrícola, uma destinada à produção e a outra para uso doméstico, priorizando as
comunidades que já tenham recebido o P1MC.
As cisternas de placa de cimento do P1MC têm capacidade de armazenamento de 16 mil
litros. Essa tecnologia constitui no recolhimento da água precipitada sobre o telhado com uma
calha ou bica que é levada até a cisterna onde é armazenada, ainda faz parte a bomba para
retirar a água da cisterna. Além disso, se tem uma parte importante do Programa, se não a
principal, o Curso de Gestão dos Recursos Hídricos (GRH) para as famílias. Este curso é
55
ministrado durante dois dias, tem duração de 16 horas, sendo pré requisito para o recebimento
das cisternas. Utiliza-se uma metodologia que discute vários temas como: agroecologia, os
cuidados necessários no manuseio da água e da cisterna, a preservação do meio ambiente, o
acesso a políticas públicas e outras de acordo com os princípios da convivência com o
semiárido.
A metodologia da ASA aplicada ao P1MC obedece a uma ordem, sendo primeiro o processo
de mobilização, segundo capacitação de pedreiros e das famílias da comunidade e depois a
construção das cisternas. Após isso, se faz o controle social com o incentivo à participação
das pessoas (PONTES, 2009).
Métodos como o do P1MC desenvolvem formas racionais de utilização dos recursos naturais
(no caso a água) de forma mais sustentável, integrando, mobilizando e formando as pessoas
na tentativa de construção de uma sociedade mais igualitária, e com isso, cidadã. Essas
políticas públicas são capazes de melhorar/elevar a qualidade de vida do sertanejo e
possibilita a elevação da sua auto-estima, preservação de suas tradições e costumes resultando
em uma sobrevivência mais digna.
Identifica-se a comunidade e a prioriza utilizando dados secundários como locais de menor
IDH e menor índice pluviométrico. Os critérios de escolha das famílias beneficiadas
obedecem ao preenchimento dos seguintes requisitos: família carente residente na zona rural
da região semiárida sem fonte de água potável próxima à residência, mulher chefe de família,
número de crianças entre 07 e 14 anos, idosos na família e a presença de pessoas deficiente na
família. Cabe às famílias ajudar na construção da cisterna, providenciar a água utilizada para
fazer a massa, cavar o buraco e acomodar o pedreiro.
O P1MC permite a união entre agentes (Estado, componentes da ASA e outros) e sujeitos
(comunidade) para garantir uma vida mais digna. Mas para que alcance os resultados
esperados as entidades da ASA despenderam significativo esforço técnico e político,
combinando-o com intensa mobilização de entidades e, de forma a estabelecer compromissos
entre os níveis municipal, estadual e regional (LOPES; LIMA, 2005).
Para entender o P1MC na Bahia, entrevistou-se a Coordenadora da ASA Bahia, Cleusa A.
Silva e Jailso Francisco da ONG CAA. Entidade/organização que atuou na localidade de
56
Queimadinha, no município de Barro-Alto, e já atendeu a mais de 4 mil famílias na Unidade
de Gestão Municipal (UGM), que se estende aos Territórios de Irecê, Velho Chico e Chapada.
A comunidade de Queimadinha será analisada neste estudo de caso.
De acordo com Cleusa A. Silva (Coordenadora ASA-Bahia) a principal dificuldade na
execução do Programa tem relação com o uso e a forma de lidar com os recursos públicos. O
grande problema é com a legislação e com a burocracia, pois não há instrumentos adequados
para avaliação e controle dos recursos de acordo com o funcionamento das organizações da
sociedade civil. Então, os órgãos do Estado que fiscalizam têm outra leitura, não vêem a
compreensão metodológica. Para os representantes da ASA e do CAA, Jailso Francisco,
existe a necessidade de se ter instrumentos de avaliação mais adequados ao Programa.
As transformações no Programa se deram com respeito a própria concepção de conseguir
imbuir nos sertanejos a percepção de que o Semiárido pode ser um espaço de transformação e
mudança, dando condições para que se possa ter uma vida digna.“A mudança do paradigma,
olhar para o semiárido com outro olhar, vê que as pessoas tenham hoje alegria em viver no
semiárido (...) vê que o pessoal acredita e começa a perceber e a sentir a beleza que é viver
nessa terra (...)”. (Entrevista Cleusa A. Silva - Coordenadora ASA-Bahia concedida ao autor).
A mudança no foco das políticas públicas significa uma transição, concordando com Roberto
M. Silva (2008), na medida em que a mudança do paradigma do combate à seca para a
convivência é algo concreto. Mas ainda não é algo definitivo, pois na ação estatal são presente
as duas concepções.
O que faz o Programa romper o paradigma, em relação ao combate à seca e a “indústria da
seca”, é que se passa a integrar toda a comunidade em torno de um objetivo comum que vai
além da construção física das cisternas. Envolve todo um processo de mudança e
descobrimento de que é possível garantir condições melhores de vida às famílias, basta saber
conviver com a seca.
A hipótese levantada do P1MC ser um representante da mudança de paradigma em relação ao
combate à seca foi contestada na realização da entrevista com a coordenadora da ASA Bahia,
pois para esta somente o P1MC não é capaz de proporcionar essa mudança no paradigma.
Embora o conjunto de ações da ASA sim, as diversas propostas e práticas de convivência com
57
o semiárido são capazes de transformar a realidade daquela comunidade, pois elas incluem as
famílias como agentes de sua própria transformação. Sem contar que o essencial e o
diferencial das ações da ASA estão na capacidade de despertar as comunidades para uma
nova realidade, baseada em práticas mais adaptadas ao local, na criação de uma consciência
coletiva, no despertar para consciência política. (Cleusa A. Silva - Coordenadora ASA Bahia).
De acordo com Jailso Francisco - Coordenador do P1MC no CAA, a principal diferença das
políticas de convivência com o semiárido em relação às de combate está no respeito à
diversidade existente no semiárido nos seus diversos âmbitos, na cultura, ao meio ambiente a
uma agricultura sustentável, a produção agro-ecológica. Tudo isso, vai de encontro a uma
produção com agrotóxico, com veneno e outras práticas inadequadas. O que a ASA faz é
chamar a sociedade para um debate para mostrar às potencialidades existentes no semiárido
para que se possa ter uma vida digna.
Diferentemente das políticas de combate à seca, as de convivência com o semiárido estão
fundamentadas em melhorar realmente a vida das famílias, enquanto o combate à seca tem
uma série de interesses escusos por trás, não estando preocupadas em satisfazer as principais
demandas sociais, mas sim em satisfazer interesses econômicos ou políticos das grandes
oligarquias.
6.2.3 A percepção sobre os contemplados da Comunidade Queimadinha, Barro Alto
(BA)
Na comunidade de Queimadinha, localizada a 15 km da sede do município de Barro Alto Bahia, foram contempladas 20 famílias com o Programa, em 2010, tendo sido entrevistadas
oito famílias que responderam a um formulário com o objetivo de identificação do perfil das
famílias e dos efeitos do P1MC. Não foi utilizado critério estatístico para determinação do
número de formulários aplicados. Foram buscados aspectos qualitativos na realização do
estudo de caso, tanto nas entrevistas com os representantes das organizações atuantes quanto
na aplicação dos formulários aos contemplados com as cisternas do P1MC.
O acesso a água pela população local era precário na medida em que se deslocavam por
grandes distâncias, em torno de 3 a 4 Km, para terem acesso a água doce no povoado de
Formosa em um açude ou “tanque de barro” também no município de Barro Alto. Essa
58
distância era percorrida diariamente por algumas famílias, às vezes de bicicleta e a pé por não
terem outros meios de locomoção. A outra forma de acesso a água era e ainda é através da
água do chafariz, que é salobra sendo mais utilizada para outras demandas da família que não
a dessedentação. Mas foi relatado por algumas famílias que muitas vezes eles bebiam desta
água. Algumas famílias, diante da impossibilidade de buscarem água pagavam o carro-pipa
para se abastecerem.
Mais remotamente, antes da água do poço artesiano que distribui para os chafarizes, havia um
tanque de cimento que era abastecido por carro pipa fornecido pela Prefeitura. Essa prática é
típica da indústria da seca, e ainda continua presente em muitos locais do Semiárido
nordestino, favorecendo a dependência política com a vinculação do abastecimento à benesse
dos políticos locais. De acordo com as informações levantadas, 62,5% dos entrevistados
dependiam de fonte externa para se abastecerem com água doce. O restante utilizava-se de
tanques de cimento da família ou algum açude “tanque de barro” na localidade.
A maioria dos entrevistados mora há muitos anos na comunidade, o tempo de residência
mínimo foi de três anos. A maioria sempre morou ou se casou com pessoas da comunidade.
Assim 50% são originários dali e o restante de localidades/povoados próximos. As famílias
são compostas, em média, por 4 pessoas. A média de idade dos entrevistados foi de
aproximadamente 45 anos e apresentam baixa escolaridade, principalmente entre os mais
velhos com dois casos de analfabetismo. A maioria dos entrevistados não concluiu o ensino
fundamental básico. A maioria dos entrevistados foi composta por trabalhadores e
trabalhadoras rurais, cerca de 62,5% (cinco pessoas) e o restante, 25% são funcionárias
públicas (duas pessoas) e somente uma aposentada.
Dois entrevistados não souberam o tamanho da área de cultivo, mas a média dos demais ficou
em, aproximadamente, 6 hectares, demonstrando a presença dos minifúndios tendo como
principais culturas as de sequeiros típicas da região – feijão, mamona e milho, fazendo uso de
alguma pequena criação, geralmente galinha e porco. Essas informações são típicas do perfil
da agricultura familiar da região semiárida, pois atuam voltados basicamente para subsistência
e comercializando o excedente, tendo na mamona o caráter meramente comercial. Observa-se
que nenhum dos entrevistados criava bode, animal bastante adaptado as características locais.
Pôde-se constatar que os critérios de escolha das famílias foram obedecidos pela comissão
municipal, onde todos os beneficiados não possuíam uma forma adequada de água potável.
59
Além desse critério chave, as famílias são de baixa renda possuindo algum benefício
governamental, onde 50% dos entrevistados recebem Bolsa Família e uma delas é aposentada
satisfazendo os critérios de famílias com mulheres chefe de família com crianças e pessoas
idosas.
As cisternas em sua maioria (75%) são de uso exclusivo da família, mas ocorreu que em 25%
dos casos, as famílias dividem com o vizinho.
Sobre os principais usos da água, somente uma pessoa disse usar para lavar roupa, além de
beber e cozinhar, porque ela havia colocado água do carro pipa na cisterna. A respeito da
suficiência das cisternas, apenas 12,5% respondeu não achar suficiente a quantidade de água
para passar o período de seca/estiagem, mas pode-se observar que isso não ocorreria devido a
capacidade das cisternas - que são de 16 mil litros - mas sim, devido a pouca chuva.
Observou-se que a maioria das famílias (62,5%) não percebe a dimensão mais ampla do
Programa, pois ao se perguntar sobre se houve outro benefício com o P1MC, não houve
percepção de outro resultado além da própria cisterna. Os demais (37,5%) trataram dos
cuidados com o meio ambiente e sobre o reforço que houve na união na comunidade com o
P1MC. Mas, a ampla maioria (75%) foi capaz de perceber uma maior independência quanto
aos políticos locais em relação a “favores” prestados com abastecimento por carro pipa, por
exemplo. Constaram também como aspecto positivo, a qualidade da água armazenada, que
houve melhora na saúde das famílias e que ajudou em poupar tempo, já que não têm que se
deslocar para buscarem água, podendo ser a melhora na qualidade de vida das famílias.
A respeito do Programa, todos acham que todas as famílias que foram contempladas com as
cisternas, realmente necessitavam, demonstrando que não há no P1MC o uso do jogo político
conforme é comum em muitos programas e projetos governamentais onde o objetivo principal
não é beneficiar a quem mais precisa, mas sim, aquele “aliado político”.
Não ficou perceptível se havia a discriminação de gênero na realização da tarefa de buscar
água, já que geralmente caberia à mulher a função de cuidar dos afazeres domésticos, assim
como não ficou perceptível que crianças também realizassem essa tarefa. As respostas obtidas
apontaram que o deslocamento para o abastecimento de água era realizado tanto pelo homem
quanto pela mulher. Mas é típica da região semiárida no período da seca a imagem das
60
mulheres e crianças se deslocando grandes distâncias com lata na cabeça para buscarem água
para a família.
Sobre o curso de Gerenciamento dos Recursos Hídricos foi relatado que apresenta boas
técnicas de manuseio e cuidados com a água e com as cisternas. Ficou clara a importância
desse não só como requisito para obtenção das cisternas, mas também no despertar da
comunidade para os cuidados com o meio ambiente dentro das práticas de convivência com o
semiárido. A crítica transmitida sobre o Curso se refere ao aspecto que deveria ser mais
prático que teórico, já que grande parte dos contemplados/beneficiados são analfabetos e
algumas tarefas a serem realizadas se sentiam meio constrangidos ou não entendiam bem o
que estava sendo transmitido. Uma crítica de aspecto técnico é que algumas cisternas
racharam a cobertura, mas nada que comprometesse a estrutura ou a qualidade da água.
Na comunidade foram relatadas diversas demandas, sendo as mais recorrentes: banheiros
sanitários, cisterna de produção e orelhão.
De modo geral o Programa beneficiou quem realmente mais necessitava e trouxe consigo a
garantia de acesso a uma água de qualidade. Apesar de recente, os resultados são favoráveis e
trazem uma melhora na qualidade de vida, além de ser uma nova concepção na formulação de
política pública voltada para o Semiárido brasileiro.
Em termos dos resultados apontados pelos entrevistados da ASA e CAA em relação às
comunidades, concordam que tem havido em certa medida o empoderamento das políticas de
convivência ali implantadas resultando em um processo de desenvolvimento de novas
perspectivas e novas práticas. As demandas sociais que culminam em programas e projetos
partem da realidade, da vivência das pessoas.
Pode-se dizer com base no estudo de caso realizado que há um certo consenso, dos
coordenadores entrevistados das entidades, de que o P1+2 seja o próximo passo em termos de
perspectiva de futuro para as políticas de convivência com o semiárido e de como torná-las
mais independentes, pois garantido o acesso a água para consumo é necessário que estas
famílias tenham melhores condições de produzir, garantido a segurança alimentar e
comercializando seus excedentes.
61
7 CONCLUSÕES
A história da região semiárida é marcada por ações de apropriação e descrença quanto às
possibilidades de se viver e, viver bem, neste local. Por isso, se tem a concepção de local
atrasado, de região problemática, de terra sem oportunidades, que expulsa sua própria gente.
Essa configuração vem se modificando e está relacionada a maiores estudos sobre o
desvendamento da estrutura sócio-econômica e da difusão das práticas e do conceito de
convivência com a semiaridez.
Diferentemente da lógica do combate à seca, o que está orientando as ações do CAA e de
outras organizações que compõem a ASA é a adaptação do homem ao ambiente como
requisito para que haja a sobrevivência adequada. Em suas ações, nos programas e projetos,
busca-se estabelecer mais harmonia na relação homem-natureza e não sua oposição e
combate.
O P1MC possibilita e torna possível à população sertaneja viver na região semiárida com
mais dignidade ao garantir um elemento básico para a sobrevivência humana que é a água.
Mas também foi possível constatar que o Programa apresenta-se para a comunidade
pesquisada como mais uma obra, não sendo possível enxergar perspectivas de mudança na
forma de se perceberem enquanto agentes ou sujeitos capazes de modificar sua própria
realidade, podendo-se dizer que se observou falta de empoderamento das famílias. Desta
forma, embora essa nova proposta tenha bons resultados, deve-se buscar fornecer elementos
mais concretos de mudança de perspectiva para o Semiárido brasileiro para promoção do
desenvolvimento.
A proposta do trabalho indaga sobre o processo de convivência com o semiárido, e percebe
que este representa uma mudança na concepção de políticas para melhora nas condições de
vida da população sertaneja. Mas essas ainda precisam de uma melhor difusão e compreensão,
tanto por parte do poder público por não ter um regimento/legislação específica, como
também, por parte dos beneficiários, pois muitos ainda têm a compreensão de que as cisternas
do P1MC são mais uma obra. Diante disso, se faz necessária a continuidade aos projetos e
programas de convivência com o semiárido e que essas organizações/entidades que o
implantam continuem primando pelo objetivo real de fornecer elementos para a melhoria na
qualidade de vida.
62
Podem ser observados como fruto do trabalho da ASA e dos resultados reais de seus
programas ao se verificar, conforme relato dos entrevistados, que a percepção do Estado vem
se modificando, pois este passa a propor e a buscar a ampliação de ações de convivência com
o semiárido, como é o caso do P1MC. Assim como a interação e o apoio destas entidades,
diferenciando de outras épocas em que elas que buscavam a colaboração e o apoio do Estado.
Em termos de perspectivas de avanço destas ações, aponta-se para a importância de se
implementar também as cisternas e /ou programas voltados para produção como próximo
passo no fornecimento de subsídios para uma condição de vida melhor dos sertanejos.
63
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CENTRO DE ASSESORIA DO ASSURUÁ-CAA. Projetos desenvolvidos. Disponível em:
<http://caabahia.org.br/projetos/.html>. Acesso em: 18 jun. 2010.
66
ANEXO A- QUESTÕES PARA ENTREVISTA –MONOGRAFIA-MARCOS PAULO DE SOUZA
Nome:
Entidade/instituição:
Função:
ASA:
1- O que vem a ser a ASA?Qual seu papel? Princípios...
2- Qual sua função na ASA? Há quanto tempo atua nesta organização?
3. Onde atua a ASA? Atua em todos os municípios do Semiárido baiano?
4. Quais os principais programas/projetos de atuação? Onde atua?
5. Qual é a função/papel da ASA no PM1C?
ESPECÍFICOS:
Programa
6. Desde quando este Programa encontra-se em execução? Onde se realiza o P1MC?
7. Quais têm sido os principais desafios para a execução do Programa?
8. Quais as principais transformações ocorridas ao longo do tempo no Programa?
9. Quais os resultados esperados com P1MC? Eles têm sido alcançados?
10. Consideram que o P1MC é uma quebra de paradigma na forma de se estabelecer políticas para a
região semiárida?
11. No seu ponto de vista: Quais as diferenças entre as ações/propostas de convivência com o semiárido
em relação aquelas de combate à seca?
12. Considera que a "indústria da seca" ainda exista?
13. O que você considera que significa o P1MC:
Ações de convivência com o semiárido? Políticas de convivência com o semiárido? Práticas de
convivência com o semiárido?
Por quê?
Estado
14. Como se deu o envolvimento do Estado com o PM1C?
15. No estado da Bahia, existe um órgão/secretaria que atua mais fortemente junto ao programa? Qual?
Responsável.
16. Como se estabelece a relação entre Estado-ASA (Executor)-Programa?
17. Quais as principais dificuldades encontradas em relação ao poder público/Estado (seria a burocracia, a
falta de cooperação/apoio, outras)?
67
18. É possível identificar os principais entraves para que o estado/ou a ação governamental absorvesse a
proposta de convivência com o semiárido? Qual seria?
Comunidade
19. Qual é o critério de escolha da comunidade a ser beneficiada?
20. Qual o principal aspecto/característica que facilita a obtenção de sucesso na implantação do P1MC na
comunidade?
21. Qual a principal dificuldade encontrada em relação à comunidade? (seria no processo de mobilização,
falta de organização comunitária, descrença quanto aos resultados?)
22. Quantas famílias já foram atendidas pelo PM1C na Bahia?
23. Uma comunidade com água encanada, mas salobra, pode receber as cisternas do P1MC?
24. Quais os resultados têm sido alcançados pelas comunidades no âmbito do P1MC? Eles têm sido
alcançados?
Programa
25. Quais as perspectivas de futuro para este tipo de prática/política/ação? O que vem sendo
pensado/proposta/planejado...
26. Qual o próximo passo para tornar estas comunidades independentes?
68
ANEXO B- FORMULÁRIO- COMUNIDADE
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
COMUNIDADE:_________________MUNICÍPIO______________DATA________
Pessoais
1. Nome ___________________________________________________________
2. Idade:_______________ 3. Nº de pessoas na família______________________
4. Origem__________________________5. Escolaridade____________________
6. Posse da terra
a) ( ) Própria b) ( ) arrendada c) ( ) Posseiro d) ( ) outra ____________
7. Qual o tamanho da sua propriedade agrícola?____________________________
8. Há quanto tempo reside na propriedade(roça) ou na comunidade?____________
9. Principal atividade
a) ( ) Trab. rural ( )Agricultor c) trab. urbano d) ( ) aposentado e)( ) outro___
10. Quais os principais cultivos?__________________________________________
11. Faz alguma criação? Quais?__________________________________________
Comunidade
12. De que forma sua família era abastecida antes do P1MC?
a) ( ) Carro-pipa b) ( ) poço artesiano c) açude d) ( ) cacimba e) ( ) outro____
13. Havia dependência de fonte externa à comunidade?______________________
14.Houve algum programa estatal de qualquer natureza?
a)( ) Não
b) ( ) sim. Qual?_____________________________________
15. Houve alguma ação de combate à seca?___________________________________
16. Quando foram construídas as cisterna?____________________________________
17. A cisterna é para uso exclusivo da família?
a)( ) Sim
b)( ) Não. De quem mais?______________________
18. Qual é o uso dado a água da cisterna?
a)( ) beber b) ( ) cozinhar c) ( ) higiene da família d) lavar roupa e) animais
f) ( ) outros________________________________
19. a água da cisterna é suficiente para as necessidades da família?
a) ( ) Sim b( ) não. Por que?___________________________
20. Com o Programa(P1MC), houve maior independência em relação aos políticos
locais?_________________________________________________________
21.Além da construção das cisternas, quais os resultados/benefícios do Programa na
comunidade ou na família_____________________________________________
Programa
22 considera justo os critérios de escolha das famílias beneficiadas pelo Programa? Realmente
atendeu àquelas que mais necessitavam?_________________________
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23. Com o P1MC houve melhoria das condições de saúde das famílias?___________
____________________________________________________________________
24. Quem era o responsável por buscar água?________________________________
25. foram ensinada técnicas/práticas de convivência com o semiárido?
a) ( ) sim b) ( ) não. Por quê?__________________________
26. O que achou do curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos?
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________
27. Qual o maior benefício das cisternas para sua família? (3 em ordem de importância)
___________________________________________________________________________
_________________________________________________________________
28. O que esperam para o futuro da comunidade após a garantia da água potável para as
famílias?____________________________________________________________________
________________________________________________________________
29. Tem alguma sugestão de melhoria no
P1MC?_______________________________________________________________
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