SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MAURO ROBERTO DE SOUZA DOMINGUES
AS IMPLICAÇÕES DA PROVA BRASIL NA POLÍTICA DE FORMAÇÃO DOS
PROFESSORES DA SEMEC ENTRE OS ANOS DE 2005 A 2011
Belém
2013
MAURO ROBERTO DE SOUZA DOMINGUES
AS IMPLICAÇÕES DA PROVA BRASIL NA POLÍTICA DE FORMAÇÃO DOS
PROFESSORES DA SEMEC ENTRE OS ANOS DE 2005 A 2011
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação, da Universidade
Federal do Pará, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em
Educação, tendo como orientadora a Profª Drª Ney
Cristina Monteiro de Oliveira.
Belém
2013
2
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Sistema de Bibliotecas da UFPA
______________________________________________________
Domingues, Mauro Roberto de Souza, 1972As implicações da Prova Brasil na política de formação dos
professores da SEMEC entre os anos de 2005 a 2011 / Mauro
Roberto de Souza Domingues. – 2013.
Orientadora: Ney Cristina Monteiro de Oliveira.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Pará, Instituto
de Ciências da Educação, Programa de Pós-Graduação em
Educação, Belém, 2013.
1. Educação e estado – Belém (PA) , 2 . Avaliação educacional
– Belém (PA) , 3 . Professores – Formação – Belém (PA) , 4.
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Brasil).
I . Título.
CDD 22. ed. 379.098115
3
MAURO ROBERTO DE SOUZA DOMINGUES
AS IMPLICAÇÕES DA PROVA BRASIL NA POLÍTICA DE FORMAÇÃO DOS
PROFESSORES DA SEMEC ENTRE OS ANOS DE 2005 A 2011
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação, da Universidade
Federal do Pará, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em
Educação.
Data da aprovação: 28/07/2013
Banca Examinadora:
________________________________________________ - Orientadora
Profª. Drª. Ney Cristina Monteiro de Oliveira, UFPA
________________________________________________ - membro interno
Profº. Drº. Gilmar Pereira da Silva, UFPA
________________________________________________ - membro externo
Profª. Drª. Flávia Obino Corrêa Werle, UNISINOS
4
Ao meu pai e grande amigo,
Claudio Roberto das Mercês Domingues (in
memoriam), pelo exemplo de honestidade,
estudo, trabalho e dedicação à família.
5
AGRADECIMENTOS
A DEUS, o eterno criador, fonte de minha saúde, paz e felicidade. O meu refúgio nos
momentos de alegria e mais difíceis de minha vida.
A três pessoas especiais na minha vida que são a fonte de minha inspiração: à minha mãe e
amiga Francina de Souza Domingues, agradeço pela força e total apoio nessa jornada de
estudo; à minha esposa, Cylene Margareth Ramos Monteiro, e ao meu filho, Vitor Monteiro
Domingues, dedico todo o esforço e a dedicação desta pesquisa.
Ao meu irmão, Claudio Roberto das Mercês Domingues Junior, familiares e amigos, em
especial para a minha tia de coração, Luci Vale Lima. Às amigas de profissão Profª. Drª.
Izabel Rodrigues, Profª. Msc. Maricilda Barros e Profª. Msc. Socorro Cabral, por
compartilharem comigo a etapa inicial deste processo de formação.
À minha querida orientadora, Profª. Drª. Ney Cristina Monteiro de Oliveira, pela
responsabilidade, competência, tranquilidade, sabedoria, serenidade e amizade, qualidades
que foram fundamentais na condução e conclusão desta pesquisa.
À Profª. Drª. Fávia Obino Corrêa Werle e o Profº. Drº. Gilmar Pereira da Silva, por terem aceitado
o convite para participar desta banca de defesa, o que valorizou este trabalho devido às suas
riquíssimas contribuições.
Ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Pará (UFPA), em especial aos professores da Linha de Pesquisa Políticas Públicas
Educacionais.
Ao Profº. José dos Anjos Oliveira, da Universidade Federal do Pará (UFPA), pelas
importantes sugestões e pela revisão desta pesquisa.
Aos irmãos de orientação e de jornada: Profª. Msc. Aurea Andrezza Silva dos Santos, ao
mestrando Gabriel Pereira Paes Neto e demais mestrandos da turma de 2011.
À Secretaria de Estado de Educação (SEDUC) e à Secretaria Municipal de Educação de
Belém (SEMEC), pela liberação concedida para cursar o Mestrado Acadêmico.
6
..., é urgente que a avaliação tenha em conta princípios de
solidariedade,
justiça,
equidade,
conhecimento,
aprendizagem com prazer, enfim, qualidade científica,
pedagógica e democrática. O facto de isto ser difícil não
torna a tarefa impossível como podemos constatar quando
dialogamos e desenvolvemos projectos com educadores e
professores comprometidos e críticos que realizam o seu
trabalho modificando os quotidianos escolares e criando
condições para que os seus alunos, por vezes nas
condições mais adversas, progridam em termos de saber e
de conhecimento (AFONSO, 2007, p. 13).
7
RESUMO
Esta pesquisa investigou as implicações da Prova Brasil na política de formação dos
professores da Secretaria Municipal de Educação de Belém – Pará, portanto nosso objeto de
estudo se concentrou na política de avaliação externa chamada de Prova Brasil e na área da
formação de professores. Objetivamos identificar o contexto do surgimento dessa política de
avaliação externa da educação básica, assim como analisar a relação da Prova Brasil com a
política de formação de professores desta Secretaria e verificar as orientações pedagógicas
que foram trabalhadas com esses profissionais. A metodologia que utilizamos para construir a
caminhada do estudo foi respaldada pela pesquisa bibliográfica e pela análise de conteúdo de
documentos. Essas análises nos permitiram identificar também as diversas implicações
decorrentes desse modelo de avaliação externa da educação básica. Tais implicações estão
relacionadas com a competitividade entre escolas e professores, com a criação de padrões de
aprendizagem com foco em algumas áreas do conhecimento, com a limitação dos currículos
escolares e das formações dos professores, dentre outros. Essas análises nos permitiram
entender a relação da Prova Brasil com a política de formação de professores da Secretaria
Municipal de Educação de Belém. Com isso, conseguimos verificar que as orientações
pedagógicas que foram trabalhadas com os professores que atuam nas séries avaliadas pela
Prova Brasil se fortaleceram por meio do programa de formação de professores chamado de
alfabetização matemática leitura e escrita, que se adequou totalmente às diretrizes, aos
tópicos, aos temas e aos descritores dessa política de avaliação.
Palavras-chave: Avaliação Externa. Prova Brasil. Formação de Professores.
8
ABSTRACT
This research investigated the implications of Test in Brazil training policy for teachers of the
Municipal Education Belém - Pará, so our object of study focused on the evaluation policy
called external Tasting Brazil and in the area of teacher training. We aimed to identify the
context of the emergence of this policy external evaluation of basic education, as well as to
analyze the relationship of Test Brazil with the policy of this Department teacher training and
check the pedagogical guidelines that have been worked with these professionals. The
methodology we use to build the walk of the study was supported by the literature search and
the content analysis of documents. These analyzes also allowed us to identify the various
implications of this model of external evaluation of basic education. These implications are
related to competitiveness between schools and teachers, with the creation of learning
standards focusing on some areas of knowledge, with the limitation of school curricula and
training of teachers, among others. These analyzes allowed us to understand the relationship
of Test Brazil with the policy of teacher of the Municipal Education Bethlehem With this, we
can see that the pedagogical guidelines that have been worked with teachers working in series
evaluated by Test Brazil were strengthened through teacher training program called
mathematical literacy reading and writing, which are fully adapted to the guidelines, the
topics,
the
themes
and
descriptors
that
policy
evaluation.
Keywords: External Evaluation. Test Brazil. Teacher ofTraining.
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURAS
Figura 1. Modelo Pós-Burocrático de Regulação na Educação voltado para uma lógica
estritamente econômica .................................................................................................................
Figura 2. Exemplo de questão de português ..................................................................................
Figura 3. Exemplo de questão de matemática ...............................................................................
Figura 4. Ciclo que se estabelece decorrentemente das avaliações externas ................................
Figura 5. O site do ALFAMAT .....................................................................................................
Figura 6. Provas de 2009, 2010 e 2011 do programa ALFAMAT ..............................................
Figura 7. Capa das provas do ALFAMAT ....................................................................................
Figura 8. Questões da prova de língua portuguesa do ALFAMAT ..............................................
Figura 9. Questões da prova de matemática do ALFAMAT ........................................................
QUADROS
Quadro 1: Características em comum entre os modelos de produção e as avaliações externas ....
Quadro 2. Aspectos positivos e negativos das avaliações externas no contexto internacional .....
Quadro 3: Análise das Portarias que tratam da Prova Brasil (ANRESC) e do SAEB ..................
Quadro 4: As matrizes de referência, os tópicos, os temas e os descritores da Prova Brasil ........
Quadro 5: Metas do IDEB até o ano de 2021 ................................................................................
Quadro 6: Nível de risco para as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação que adotam
como referência as avaliações externas .........................................................................................
Quadro 7: O IDEB observado nos anos iniciais do Ensino Fundamental .....................................
Quadro 8: 1º Curso ECOAR........................................................................................................
Quadro 9: 2º Curso ECOAR...........................................................................................................
Quadro 10: 3º Curso ECOAR.......................................................................................................
40
79
80
106
118
119
119
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121
33
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86
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110
10
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ALFAMAT - Alfabetização Matemática, Leitura e Escrita
ANATEL - Agência Nacional de Telecomunicações
ANEB - Avaliação Nacional da Educação Básica
ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica
ANPED - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
ANRESC - Avaliação Nacional do Rendimento Escolar
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD - Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
BM - Banco Mundial
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina
CIDE - Centro de Investigación y Desarrolo de La Educación
CNE - Conselho Nacional de Educação
EAD - Educação a distância
ECOAR - Elaborando Conhecimento para Aprender a Reconstruí-lo
ENADE - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes
ENCCEJA - Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos
ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio
EQT - Escola de Qualidade Total
FHC - Fernando Henrique Cardoso
FMI - Fundo Monetário Internacional
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização
dos Profissionais da Educação
FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério
GESTAR II - Programa Gestão da Aprendizagem Escolar
GQT - Gestão de Qualidade Total
HP - Hora Pedagógica
IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IESAM - Instituto de Estudos Superiores da Amazônia
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPES - Instituições Públicas de Educação Superior
IPESs - Instituições Públicas de Ensino Superior
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MARE - Ministério da Administração e Reforma do Estado
MEC - Ministério da Educação
MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
NIED - Núcleo de Informática Educativa
OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
PAEBES - Programa de Avaliação da Educação Básica do Espírito Santo
PARFOR - Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica
PBQP - Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade
PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais
PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos
PNE - Plano Nacional de Educação
QT - Qualidade Total
SABE - Sistema de Avaliação Baiano de Educação
11
SADEAM - Sistema de Avaliação do Desempenho Educacional do Amazonas
SAEB - Sistema de Avaliação da Educação Básica
SAEGO - Sistema de Avaliação da Educação do Estado de Goiás
SAEMS - Sistema de Avaliação da Educação Básica de Mato Grosso do Sul
SAEPE - Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco
SAERJ - Sistema de Avaliação da Educação do Estado do Rio de Janeiro
SAERS - Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Rio Grande do Sul
SAPED - Sistema de Avaliação Periódica de Professores de Sergipe
SARESP - Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
SAVEAL - Sistema de Avaliação Educacional de Alagoas
SEMEC - Secretaria Municipal de Educação Belém
SEDUC - Secretaria de Estado de Educação
SIADE - Sistema de Avaliação do Desempenho das Instituições Educacionais do Sistema de
Ensino do Distrito Federal
SIMAVE - Sistema Mineiro de Avaliação da Educação
SIMCE - Sistema de Medida da Qualidade do Ensino
SPAECE - Sistema Permanente da Avaliação Educacional Básica do Ceará
TIC - Tecnologias de Informação e Comunicação
UEPA - Universidade do Estado do Pará
UFPA - Universidade Federal do Pará
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................
1 O ESTADO NA CONFIGURAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
EDUCACIONAIS .........................................................................................................
1.1 O ESTADO E SUA RELAÇÃO COM O MODELO PRODUTIVO E AS
RECONFIGURAÇÕES NA SOCIEDADE CAPITALISTA ...........................................
1.2 A CRISE DO CAPITAL E AS REFORMAS DO ESTADO NO CONTEXTO
INTERNACIONAL E NACIONAL SOB A INFLUÊNCIA DAS AGÊNCIAS
MULTILATERAIS DE FINANCIAMENTO ..................................................................
1.3 A AVALIAÇÃO COMO POLÍTICA PÚBLICA: SOB A ÉGIDE DAS
AGÊNCIAS MULTILATERAIS DE FINANCIAMENTO .............................................
1.4 AS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS IMPLEMENTADAS NO
BRASIL A PARTIR DA DÉCADA DE 1990 ..................................................................
2 AS POLÍTICAS DE AVALIAÇÕES NO CONTEXTO INTERNACIONAL E
NACIONAL: BASES LEGAIS DA REGULAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA E
EXPERIÊNCIAS VIVIDAS ........................................................................................
2.1 A AVALIAÇÃO EXTERNA COMO INSTRUMENTO DE PADRONIZAÇÃO
DO CONHECIMENTO EM DIVERSOS PAÍSES ..........................................................
2.2 A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
BRASILEIRA ....................................................................................................................
2.3 A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO PRESENTE NA LEGISLAÇÃO
EDUCACIONAL BRASILEIRA ......................................................................................
2.3.1 Como a avaliação externa é tratada na Constituição Federal de 1988 ..............
2.3.2 O tema avaliação nos aportes legais: na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação
Nacional (LDB), no Plano Nacional de Educação (PNE) e no
Projeto de Lei n°
8.035 de 2010 ............................................................................
2.3.3 Portarias que tratam do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e
da
Prova Brasil ......................................................................................................
2.4 OS INSTRUMENTOS DA PROVA BRASIL, OS MODELOS DE QUESTÕES E
QUESTIONÁRIOS UTILIZADOS ..................................................................................
2.4.1 As matrizes de referência da Prova Brasil ...........................................................
2.4.2 Modelos de questões utilizados na Prova Brasil ..................................................
2.4.3 Questionários da escola, do professor, do aluno e do diretor .............................
2.5 A AVALIAÇÃO EXTERNA COMO INSTRUMENTO DE CONSOLIDAÇÃO
DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA (IDEB)
...........................
2.6 DO SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO PARA OS SISTEMAS LOCAIS:
A EXPERIÊNCIA SE DESCENTRALIZOU ...................................................................
15
25
25
33
42
47
50
50
61
63
65
68
71
76
76
78
81
85
88
3 A POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO
NACIONAL E LOCAL ............................................................................................... 96
3.1 SIGNIFICADO E PERSPECTIVAS SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES 96
................................................................................................................
3.2 AS IMPLICAÇÕES DAS AVALIAÇÕES EXTERNAS TENDO COMO FOCO A 103
PROVA BRASIL ..............................................................................................................
3.3 AS FORMAÇÕES REALIZADAS NA SEMEC ENTRE OS ANOS DE 2005 A
2011, NORTEADAS PELO IDEB E PELA PROVA BRASIL ....................................... 106
13
3.4 A IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA ALFAMAT EM 2009 .................................
3.5 O MODELO DE AVALIAÇÃO QUE DEFENDEMOS ............................................
116
127
CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 131
REFERÊNCIAS ..............................................................................................................
137
14
INTRODUÇÃO
Ao iniciarmos este trabalho de pesquisa intitulado “As implicações da Prova Brasil na
política de formação dos professores da SEMEC entre os anos de 2005 a 2011”, partimos de
vários questionamentos, para entendermos por que a avaliação como política pública foi
ganhando uma centralidade na escola e na sociedade, pois, de acordo com Romão (2007), a
avaliação até recentemente aparecia pouco nos congressos de educação e nos currículos dos
cursos de Pedagogia. Nesse contexto, Gomes (2002) destaca que o Brasil era um país onde,
até meados da década de 1980, praticamente não existia a avaliação em nível de sistemas ou
redes de ensino. Entretanto, no decorrer dos anos, a avaliação saiu da esfera pedagógica no
seu aspecto mais microinstitucional do processo de aprendizagem, que é a sala de aula 1, e se
avolumou até chegar a ser uma medida externa à ação pedagógica da prática do professor,
influenciando diretamente sua formação. Hoje a avaliação se tornou um elemento principal
para disseminar na escola e na sociedade a lógica da competitividade, com ênfase no produto
e no resultado.
Para entender essa transição, consideramos importante discutir a avaliação a partir do
seu aspecto conceitual, em seguida apresentar os tipos de avaliações, posteriormente analisar
a avaliação como política pública e por fim identificar quais as transformações que ela foi
tomando nos últimos anos, na perspectiva de entender como a avaliação foi deslocada da ação
do cotidiano escolar para se transformar em uma ação de política pública.
Para Luckesi (2008), a palavra avaliação tem sua origem no latim a-valere, que
significa “dar valor”. Portanto, para fins didáticos, apresentamos e dividimos a avaliação em
informal e formal. A avaliação informal se caracteriza por ser
uma ação corriqueira e espontânea realizada por qualquer indivíduo acerca de
qualquer atividade humana; é, assim, um instrumento fundamental para conhecer,
compreender, aperfeiçoar e orientar as ações de indivíduos ou grupos. É uma forma
de olhar o passado e o presente sempre com vistas ao futuro (BELLONI ET AL,
2007, p. 14).
Segundo esses autores, essa avaliação, como ação corriqueira e espontânea, é realizada
diariamente em nossas vidas, quando decidimos o que comer, quando optamos por qual roupa
devemos usar, ou então qual ônibus ou trajeto pegar/seguir para chegar a um determinado
lugar. A avaliação informal, portanto, é natural, instintiva e assistemática. Já a avaliação
formal é
1
A avaliação era apenas um instrumento de acompanhamento da prática pedagógica, parte integrante do
processo de aprendizagem, um momento de tomada de decisão, de averiguação, que servia como instrumento
de organização, de reorganização e de replanejamento das atividades.
15
um processo sistemático de análise de uma atividade, fatos ou coisas que permite
compreender, de forma contextualizada, todas as suas dimensões e implicações, com
vistas a estimular seu aperfeiçoamento (BELLONI ET AL, 2007, p.15).
Partindo do entendimento inicial de que existem esses dois tipos de avaliação, vamos
encontrar, nesta última, duas categorias: a avaliação educacional e a avaliação institucional.
Para os autores acima, a avaliação educacional está relacionada com a avaliação da
aprendizagem e com o desempenho escolar a partir de um currículo. Já a avaliação
institucional se caracteriza por avaliar instituições ou políticas públicas. Portanto, como
percebemos, a avaliação se caracteriza por ser muito abrangente, como nos diz Luck (2012).
Assim, temos a avaliação como política pública educacional, que se manifesta por meio das
avaliações externas, também chamadas de avaliações padronizadas, ou em larga escala.
Nesta pesquisa, vamos utilizar a nomenclatura da avaliação externa que “pode
designar avaliação de uma instituição, realizada por profissional ou firma especializada neste
tipo de consultoria, abrangendo todo o escopo ou apenas parte das ações institucionais”
(WERLE, 2010, p. 22).
Nessa perspectiva, esclareceremos que o nosso estudo vai se concentrar na Prova
Brasil, como política pública educacional de avaliação externa do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), para desvelar sua implementação e
fortalecimento, assim como suas implicações no programa de formação de professores da
Secretaria Municipal de Educação de Belém (SEMEC), chamado de Alfabetização
Matemática, Leitura e Escrita (ALFAMAT), que é realizada no Núcleo de Informática
Educativa2 (NIED). Portanto, nosso objeto de pesquisa é a Prova Brasil e a Política de
Formação de Professores da SEMEC, que está localizada na Avenida Governador José
Malcher, 1291, Nazaré, CEP: 66060-230, Belém – Pará.
De acordo com Gutierres et al (2011), esta Secretaria de educação possui sob sua
coordenação cinquenta e nove (59) escolas, cinquenta e três (53) unidades pedagógicas ou
anexos e trinta e quatro (34) unidades de Educação infantil. Trabalham nessas escolas
aproximadamente 2.400 professores, que lecionam para aproximadamente 70.000 alunos.
Nesse contexto, o nosso problema de pesquisa surge pelo envolvimento que tivemos
com a formação de professores, quando passamos a integrar a equipe de formação de
professores da SEMEC, no período de 2005 a 2010. Nesses cinco anos atuando na área da
formação de professores e também como aplicadores durante dois anos da Provinha Brasil em
2010 e da Prova Brasil em 2011, tivemos a oportunidade de ouvir nos momentos das
2
http://nied-alfamat.blogspot.com.br/
16
formações e das avaliações, em depoimento de algumas professoras que atuavam nas séries
avaliadas pela Prova Brasil, suas angústias com as mudanças que ocorreram em suas
formações a partir do surgimento dessa avaliação em plena fase do desenvolvimento do
Neoliberalismo, que se caracteriza por ser um
movimento ideológico, em escala verdadeiramente mundial, como o capitalismo
jamais havia produzido no passado. Trata-se de um corpo de doutrina coerente,
autoconsciente, militante, lucidamente decidido a transformar todo o mundo à sua
imagem, em sua ambição estrutural e sua extensão internacional. ( )
Economicamente, o neoliberalismo fracassou, não conseguindo nenhuma
revitalização básica do capitalismo avançado. Socialmente, ao contrário, o
neoliberalismo conseguiu muitos dos seus objetivos, criando sociedades
marcadamente mais desiguais, embora não tão desestatizadas como queria. Política e
ideologicamente, todavia, o neoliberalismo alcançou êxito num grau com o qual
seus fundadores provavelmente jamais sonham, disseminando a simples idéia de que
não há alternativas para os seus princípios, que todos, seja confessando ou negando,
têm de adaptar-se a suas normas (ANDERSON, 1995, p. 22-23).
Para Neto e Maciel (2011, p. 36), o Neoliberalismo pode ser definido também como
um “projeto político, econômico e social de caráter hegemônico que está fundamentado na
subordinação da sociedade ao mercado livre e à não-intervenção do poder público, sendo o
mercado livre responsável pela preservação da ordem social”. Portanto, o Neoliberalismo,
como ideário político, econômico, social e ideológico, impulsionou as Reformas do Estado
que acontecerem mundialmente. Para Rezende (2004), essas reformas se caracterizaram por
uma série de cortes e ajustes estruturais que se materializaram pela restrição orçamentária,
pela reforma fiscal, pela redução dos gastos públicos e pela privatização. Portanto, esses
cortes e ajustes foram resultado dos ditames de mercado, das pressões em torno dos processos
de diminuição e de minimização do Estado, que contribuíram para que o Estado se
reformasse. Decorrentes desse movimento ideológico tivemos as políticas públicas
implementadas que influenciaram na redução do papel do Estado, com uma série de medidas
que atingiram diretamente os serviços públicos, das quais podemos citar a restrição
orçamentária, a reforma fiscal, a privatização de serviços públicos essenciais, dentre outros.
Para Afonso (2009), o Estado não é sinônimo de governo, mas talvez seja a sua
representação social mais frequente. Nesse contexto, Torres (1993) descreve que o Estado
apresenta um pacto de dominação social, do qual participam as classes sociais.
Simultaneamente, o Estado é visto como
uma entidade administrativa auto-regulada, isto é, um conjunto de instituições,
rotinas organizacionais, leis e, sobretudo, burocracia, que é responsável por
implementar esse pacto de dominação (TORRES, 1993, p.44).
Esse Estado autorregulador foi lentamente se transformando no que se chama hoje
Estado avaliador, exatamente para atender às exigências vindas das mudanças internacionais.
17
Nesse sentido, Afonso (2009) faz uma análise sobre o surgimento do Estado avaliador, que
teve início a partir da década de 1980, quando a avaliação começou a ter grande importância
para os governos neoliberais, “passando a admitir a lógica do mercado, através da importação
para o domínio público de modelos de gestão privada, com ênfase nos resultados ou produtos
dos sistemas educativos” (AFONSO, 2009, p. 49). Assim, a avaliação passou a influenciar
diretamente a área da política educacional, com a implementação das avaliações externas.
No contexto internacional, dois países se destacaram como os pioneiros nesse modelo
de avaliação educacional em momentos de Reformas do Estado: os Estados Unidos e a
Inglaterra, que, embora sejam “países diferentes, ocupando lugares distintos no sistema
mundial, estão a percorrer caminhos bastante semelhantes no desenvolvimento das políticas
de avaliação” (AFONSO, 2009, p. 62).
Em seguida, esse modelo de avaliação educacional se estendeu para os outros
continentes, como resultado das orientações das agências multilaterais de financiamento, que,
de acordo com Frigotto (2010) e Haddad (2008), são o Banco Mundial (BM), o Fundo
Monetário Internacional (FMI), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o
Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD). Romão (2007) destaca
que essas agências são as responsáveis em criar modas na área educacional. Nesse bojo,
vamos ter os sistemas nacionais de avaliações, que fazem parte de um projeto maior, com
intenções classificatórias e excludentes.
Portanto, durante as décadas de 1980 e 1990, a América Latina passou a ser palco de
uma série de reformas educativas, e cada país sancionou sua Lei de Educação, de acordo com
Beech (2009). Assim, o Brasil aprovou em 20 de dezembro de 1996, por meio da Lei 9.394, a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Essa reforma deu lugar a uma grande
variedade de regulamentações, projetos e programas, dentre os quais destacamos o surgimento
do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), que legitimou a avaliação externa
neste nível de ensino.
O Ministério da Educação (MEC), por meio do INEP, é quem direciona essa política
de avaliação, que engloba uma série de avaliações externas as quais atingem todos os níveis
de ensino, do fundamental ao superior. Compõem esse conjunto de avaliações a Provinha
Brasil, criada em 2008, a Prova Brasil, cujo nome oficial é Avaliação Nacional de
Rendimento Escolar (ANRESC), que foi criada em 2005, o Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM), o Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos
(ENCCEJA) e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE).
18
Diante dessas diversas avaliações do INEP, concentramos nossos comentários iniciais
sobre a Prova Brasil, que é o objeto deste estudo, instituída pela Portaria ministerial nº 931,
de 21 de março de 2005. Sua primeira edição, que ocorreu neste mesmo ano, avaliou as
habilidades em Língua Portuguesa, com o foco em leitura, e em Matemática, com o foco na
resolução de problemas. Dentre outras características, destacamos que a Prova Brasil é uma
avaliação realizada a cada dois anos e que avalia apenas estudantes do ensino fundamental, de
4ª/5º ano e 8ª/9º séries.
Um aspecto a ser considerado quanto às avaliações externas é que, independentemente
do segmento ou série, elas contribuem para a criação de padrões de aprendizagem, conforme
destaca Barroso (2003), à medida que avaliam determinados aspectos dos currículos e não
levam em consideração a diversidade regional e cultural. Nesse contexto, as redes estaduais e
municipais de ensino passam a ter como referência para as suas ações as avaliações do
governo federal.
Segundo Afonso (2007), as avaliações externas são instrumentos para que sejam
introduzidas as lógicas de mercado na educação, já que servem para induzir a concorrência
entre as escolas, incentivando as políticas de escolha, estimulando a competição entre os
estudantes para que fiquem cada vez mais bem classificados nos rankings escolares, que, na
opinião do autor, servem somente para “culpabilizar as escolas, os professores e os estudantes
que não forem capazes de produzir resultados que apresentem vantagens competitivas”
(AFONSO, 2007, p. 11). Destacamos ainda que os discentes são afetados pela limitação dos
currículos escolares e os docentes pela limitação das suas formações.
Em relação à formação dos professores, Freitas (2003) destaca que, apesar de os
governantes considerarem os professores como agentes significativos no processo das
reformas educacionais, as decisões que são tomadas não surgem do debate com a categoria de
professores, portanto essas políticas e os programas têm como objetivo a formação de
professores não reflexivos e obedientes, que apenas reproduzam fielmente o currículo e as
políticas prescritas pelos governos. Ressaltamos também as afirmações de Freitas (2007)
sobre o SAEB, em que a autora destaca que, durante a criação formal desse sistema, não
houve um “amplo envolvimento de professores e profissionais que atuavam nos sistemas
estaduais de ensino” (idem, 2007, p. 124).
A partir das argumentações apresentadas, observamos que existe uma reorganização
dos currículos em função dos interesses do mercado de trabalho, com ênfase em algumas
disciplinas, geralmente na língua materna de cada país e na disciplina matemática. Entretanto,
o Projeto de Lei nº 8035/2010 para o decênio 2011-2020 passou a dar ênfase também à
19
disciplina ciências, e como consequência desse processo existe uma considerável pressão
sobre os professores para ensinar meramente visando a testes (APPLE; JUNGEK apud
AFONSO, 2009, p. 41).
Diante dos questionamentos apresentados sobre a limitação dos currículos e da pressão
exercida no corpo docente, relacionamos esses aspectos com a nossa experiência adquirida
como formadores de professores da SEMEC. Assim, sentimo-nos instigados a levantar a
seguinte questão norteadora:
Como se desenvolveu a política de avaliação da Educação Básica, especificamente da
Prova Brasil, e qual sua articulação com a política de formação de professores da SEMEC?
Para dar conta do questionamento levantado, buscamos alcançar respostas para outros
questionamentos:
1 - Quais são os princípios e as diretrizes do programa de formação de professores da
SEMEC no período de 2005 a 2011?
2 - O Programa de Formação de Professores da SEMEC sofreu algum nível de
adequação a partir da implementação da Prova Brasil?
3 - Quais foram as orientações pedagógicas dadas aos professores que trabalham com
as turmas avaliadas pela Prova Brasil, e suas aproximações com as diretrizes da Prova Brasil?
Diante dessas questões norteadoras, elaboramos os objetivos desta pesquisa, que, em
seu aspecto geral, procurou analisar a implicação da Prova Brasil na política de formação de
professores da Secretaria Municipal de Educação de Belém, e que teve como objetivos
específicos:
a)
Identificar em que contexto se desenvolveu a Política de Avaliação da Educação
Básica chamada de Prova Brasil;
b)
Analisar a relação da Política de avaliação Prova Brasil com a Política de
Formação de Professores da Secretaria Municipal de Educação de Belém;
c)
Verificar quais as orientações pedagógicas dadas aos professores que trabalham
com as turmas avaliadas pela Prova Brasil entre os anos de 2005 a 2011, e
detectar suas aproximações com as diretrizes da Prova Brasil.
Para tornar a pesquisa viável, optamos pelo recorte temporal de 2005 a 2011, pois,
como a avaliação Prova Brasil ocorre de dois em dois anos, tivemos condições de analisar o
desdobramento dessa avaliação a partir do ano de 2005, ano da sua implementação, e as
conformações que ocorreram nos anos subsequentes, que foram os anos de 2007, 2009 e
2011, que resultaram num total de sete anos. Paralelamente, analisamos, de acordo com os
20
objetivos propostos, as adequações realizadas nas formações dos professores da SEMEC, que
foi o lócus da pesquisa.
Diante da escolha do objeto e pela necessidade dele gerada, o tipo de pesquisa que se
adequou foi a abordagem qualitativa, considerada uma importante baliza para a opção teóricometodológica deste enfoque, com base nas reflexões de Bogdan e Biklen (1991) e na
pertinência dos estudos desses autores em face do problema da pesquisa e dos objetivos
pretendidos. Segundo esses autores:
O objectivo dos investigadores qualitativos é o de melhor compreender o
comportamento e experiências humanas. Tentam compreender o processo mediante
o qual as pessoas constroem significados e descrever em que consistem estes
mesmos significados. Recorrem à observação empírica por considerarem que é em
função de instâncias concretas do comportamento humano que se pode reflectir com
maior clareza e profundidade sobre a condição humana (BOGDAN E BIKLEN,
1991, p. 70).
Também concordamos que “A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há
uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o
sujeito e o objeto” (CHIZZOTTI, 2010, p. 79). Portanto, esse sujeito (o pesquisador) vai
interpretar (analisar) o fenômeno que surge a partir do objeto, atribuindo-lhe um significado
(as respostas encontradas na pesquisa, ou verdades provisórias). Para que o pesquisador
encontre suas respostas, é necessário que sejam utilizadas as técnicas de pesquisa, pois
A pesquisa qualitativa privilegia algumas técnicas que coadjuvam a descoberta de
fenômenos latentes, tais como a observação participante, história ou relatos de vida,
análise de conteúdo, entrevista não diretiva etc., que reúnem um corpus qualitativo
de informações (CHIZZOTTI, 2010, p. 85).
Nesse contexto, consideramos que a análise de conteúdo de documentos foi
fundamental para que pudéssemos desvelar os fenômenos decorrentes do nosso objeto de
pesquisa, já que a análise de conteúdos
é um método de tratamento e análise de informações, colhidas por meio de técnicas
de coleta de dados, consubstanciadas em um documento. A técnica se aplica à
análise de textos escritos ou de qualquer comunicação (oral, visual, gestual)
reduzida a um texto ou documento. O objetivo da análise de conteúdo é
compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou
latente, as significações explícitas ou ocultas (CHIZZOTTI, 2010, p. 98).
Respaldados na pesquisa qualitativa, tivemos condições, a partir dos subsídios teóricometodológicos, de analisar as implicações de uma política educacional de avaliação do âmbito
federal que está em plena vigência, que é a Prova Brasil, na política de formação dos
professores do município de Belém. Foi com base nessas relações de análises que chegamos a
entender as influências da política de avaliação externa na política de formação de
professores.
21
Consoante os fundamentos teóricos do enfoque de pesquisa assumidos como
referencial para o presente estudo, delineamos três etapas de pesquisa inter-relacionadas, para
viabilizarmos o projeto de investigação.
A primeira etapa da pesquisa foi o levantamento bibliográfico da literatura
especializada de autores que serviram como referencial teórico para nossa pesquisa, já que
nos permitiu uma análise inicial da viabilidade do que queremos investigar, assim como nos
ajudou na delimitação mais precisa do problema da pesquisa, na familiaridade com os temas,
na orientação mais adequada sobre o tipo e procedimentos da pesquisa, segundo Moroz e
Gianfaldoni (2006).
A segunda etapa da pesquisa foi composta pela análise documental, que “é a fonte de
coleta de dados que está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se
denomina de fontes primárias” (MARCONI E LAKATOS, 2010, p. 48). Nessa perspectiva,
realizamos, inicialmente no site do Ministério da Educação3 (MEC) e no do INEP4, a coleta
de todos os documentos oficiais disponíveis que correspondem ao nosso objeto de pesquisa,
que foi a Prova Brasil, entre os anos de 2005 a 2011. Assim, realizamos a análise das leis, das
portarias, das resoluções, das matrizes de referência e dos questionários da Prova Brasil. Em
seguida, efetuamos a pesquisa documental na SEMEC, analisando as portarias e as
publicações que estavam vinculadas à política de formação de professores no período
compreendido entre os anos de 2005 a 2011.
Nossa intenção, ao analisar esses documentos da esfera federal e da municipal, foi
tentar desvelar qual é a concepção de avaliação utilizada pela Prova Brasil, assim como
descobrir qual foi sua articulação com a política de formação dos professores, e dessa forma
entender os princípios e as diretrizes do programa de formação de professores no período de
2005 a 2011, com o intuito de encontrar as respostas para a questão norteadora e
consequentemente atingir os objetivos elaborados para esta pesquisa.
Na terceira etapa da pesquisa realizamos a sistematização e a análise dos dados, que,
de acordo com Bogdan e Biklen (1991), é o momento determinante para a organização
sistemática dos materiais que foram se acumulando no decorrer da pesquisa, cujo objetivo
principal é de “apresentar aos outros aquilo que encontrou” (BOGDAN E BIKLEN 1994, p.
113). Assim como as outras etapas da pesquisa, essa também mereceu atenção especial, pois
permitiu que chegássemos às respostas elaboradas em nossos objetivos. Portanto, diante da
3
4
http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=324;id=210;option=com_content;view=article
http://portal.inep.gov.br/web/prova-brasil-e-saeb/prova-brasil-e-saeb
22
necessidade gerada pelo objeto, fomos conduzidos a adotar a pesquisa qualitativa numa
perspectiva crítica, pois,
Em geral, a finalidade de uma pesquisa qualitativa é intervir em uma situação
insatisfatória, mudar condições percebidas como transformáveis, onde pesquisador e
pesquisados assumem, voluntariamente, uma posição relativa. No desenvolvimento
da pesquisa, os dados colhidos em diversas etapas são constantemente analisados e
avaliados. Os aspectos particulares novos descobertos no processo de análise são
investigados para orientar uma ação que modifique as condições e as circunstâncias
indesejadas (CHIZZOTTI, 2010, p. 89).
O que nos incomodou foi a ênfase que as redes de ensino na esfera federal, estadual e
municipal estão dando para as avaliações externas, e como isso vem afetando diretamente a
formação dos professores. Nesse contexto, nossa posição foi a de analisar as consequências
desse processo no aspecto da formação de professores, apontando as críticas desse modelo
hegemônico de avaliação, assim como nos posicionando a favor de outros modelos de
formação e avaliação.
Após comentar sobre o referencial teórico-metodológico, apresentamos o modo como
a pesquisa está estruturada. Ela está composta de introdução, três seções e um tópico de
conclusão, como segue. Na seção 1, intitulado: O Estado na Configuração das Políticas
Públicas Educacionais, apresentamos inicialmente uma análise ao longo dos anos dos diversos
modelos de Estado na sociedade capitalista e sua relação com a educação.
Em seguida, discorremos sobre a crise do capital da sociedade capitalista e sua relação
com as reformas do Estado que foram decorrentes dessa crise, apresentando análises sobre a
influência das agências multilaterais de financiamento nas reformas educacionais.
Finalizando esta seção, discutimos sobre as Políticas públicas educacionais de
regulação e controle decorrentes das reformas do Estado, com foco nas políticas públicas
educacionais implementadas no Brasil a partir da década de 1990.
Na seção 2, que possui como título: As Políticas de Avaliações no Contexto
Internacional e Nacional: Bases Legais da Regulação da Educação Básica, a solidificação da
Prova Brasil e a replicação nos Estados e Municípios, iniciamos com uma análise de como se
procedeu à implementação das políticas públicas de avaliação no setor educacional, levando
em consideração a realidade de diversos países como os Estados Unidos, Inglaterra, França,
Portugal, Espanha, Chile e Brasil.
Em seguida, analisamos as bases legais da regulação da educação básica por meio da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e do Plano Nacional de Educação
(PNE), e como a Avaliação é tratada nessas leis.
23
Concluindo esta seção, concentramos nossas análises sobre as portarias que tratam do
Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e sobre a Prova Brasil, com destaque para
os aspectos que consideramos mais importantes para esta pesquisa, relacionando com os
diversos instrumentos utilizados pela Prova Brasil: as diretrizes, os temas, os descritores, as
provas e os questionários aplicados nas escolas.
Na seção 3, com o título: A Política de Formação de Professores da SEMEC entre os
anos de 2005 a 2011, norteados pela avaliação externa, apresentamos o significado e as
concepções sobre a formação de professores, e a partir de subsídios teóricos fazemos uma
análise sobre as diversas implicações das avaliações externas para a educação, para os
discentes e os docentes.
Concluindo nossa pesquisa, apresentamos de que forma ocorreram as formações
realizadas na SEMEC entre os anos de 2005 a 2011, mostrando sua metodologia, o referencial
teórico, e como essas formações foram se adequando a partir da implementação da Prova
Brasil, com destaque para o programa de formação de professores chamado de ALFAMAT,
que teve início em 2009. Ao final, concluímos que a política de formação de Professores da
SEMEC tem atendido, em grande medida, às orientações da Prova Brasil.
Diante de todas essas análises, propomos um modelo de formação de professores que
considere uma concepção de formação mais ampla e crítica, bem como indicamos um modelo
de avaliação que contemple a utilização de diversos instrumentos, modelo esse que vai de
encontro ao proposto pela Prova Brasil.
24
1 O ESTADO NA CONFIGURAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS
1.2 O ESTADO E SUA RELAÇÃO COM O MODELO PRODUTIVO E AS
RECONFIGURAÇÕES NA SOCIEDADE CAPITALISTA
De acordo com Cretela Júnior (2000), a palavra Estado vem do latim status e significa
estar firme. Segundo esse autor, desde Platão, Aristóteles e Cícero, encontramos escritos
sobre os sistemas de governos e os sistemas políticos. Entretanto, para Maluf (1998), foi
somente com Maquiavel, no século XVI, que a expressão Estado foi introduzida na literatura
científica. Apesar de o significado da palavra ser simples e direto, o mesmo não acontece com
sua definição, que é objeto de discordância devido às suas várias concepções, que vão estar
associadas a uma determinada doutrina. Nesse contexto, vamos ter o
conceito hegeliano do Estado como suprema encarnação da idéia; os conceitos
totalitários de todas as teorias que sorveram a seiva do Leviatã de Hobbes; a
concepção do Estado como “super ser coletivo” etc.., bem como a teoria fascista,
segundo a qual a Nação não faz o Estado, mas este é que faz a Nação (MALUF,
1998, p. 21).
Portanto, o nosso estudo se insere numa política pública instituída num determinado
momento do Estado capitalista brasileiro, que, após vinte anos de profundas reformas, faz-nos
questionar: qual o papel do Estado na condução de uma política pública educacional? Como
esse Estado tem se comportado? Que perspectivas de Estado têm sido necessárias para
comportar um projeto de educação? É nesse sentido que vamos nos reportar ao conceito de
Estado em Gramsci (1980) quando ele nos diz que o Estado é um Estado sempre em intenção,
por ele comportar em seu interior diversas forças em disputa dos seus interesses. Por isso há a
luta hegemônica e a luta contra-hegemônica; por esse motivo há sociedade política e a
sociedade civil, e isso tudo está disputando um modelo de sociedade dentro do papel do
Estado.
Gramsci (1980), para pensar o Estado na sociedade capitalista, trouxe o conceito de
bloco histórico, de superestrutura, de infraestrutura, de sociedade política, de sociedade civil e
de hegemonia.
Consideramos importante discutir esses conceitos, pois eles nos darão subsídios para
entendermos as mudanças que ocorreram no Estado Brasileiro e para relacionarmos sua
atuação com os modos de produção, com a crise do capital e com a implementação das
políticas públicas educacionais. Nesse sentido, iniciamos nossos comentários e análises com o
bloco histórico.
25
Para Gramsci (1991), o bloco histórico está relacionado com dois elementos
fundamentais que são a infraestrutura e a superestrutura, os quais irão formar um conjunto
complexo, contraditório e discordante. Assim, vamos ter na infraestrutura a base econômica e
os modelos de produção da sociedade e na superestrutura temos o conjunto das relações
sociais de produção, as relações culturais, os sujeitos representados pela sociedade política
(autoridades que estão no poder) e pela sociedade civil (igreja, escola, família, mídia, dentre
outros). Todos esses elementos fazem com que o bloco histórico se torne contraditório e
conflitante, pois cada um deles irá defender seus interesses.
Ainda quanto à noção geral de Estado, o autor divide a sociedade em sociedade
política e sociedade civil. A primeira representa os lugares de decisão da condução dessa
sociedade e está constituída pelos governos, pelos partidos políticos, pelos elementos
jurídicos, administrativos e pelas forças de segurança. Já a sociedade civil é composta pela
massa dos trabalhadores organizados.
Por meio da ação dos elementos que compõem a sociedade política, da formulação das
leis, dos aspectos administrativos, da ação das polícias, da atuação das escolas na formação
dos sujeitos na sociedade civil, o Estado apresenta para a sociedade uma direção consensual
que chamamos de Hegemonia, a qual
pressupõe indubitavelmente que se deve levar em conta os interesses e as tendências
dos grupos sobre os quais a hegemonia será exercida [...] O conceito de hegemonia é
aquele no qual se alinham as exigências de caráter nacional (GRAMSCI, 1980, p.
33-130).
Portanto, esses interesses são de uma elite dominante que obviamente constrói uma
hegemonia por meio das questões políticas, culturais e ideológicas, e assim passa a criar um
consenso na sociedade. Para enriquecer esse debate sobre a hegemonia, podemos dizer
também que ela é a
capacidade de direção cultural e ideológica que é apropriada por uma classe,
exercida sobre o conjunto da sociedade civil, articulando seus interesses particulares
com os das demais classes de modo que eles venham a se constituir em interesse
geral [...] Ela também busca o consenso nas alianças de classe, tentando obter o
consentimento ativo de todos, segundo os padrões de sua direção (CURY, 1989, p.
48).
Para Delgado et al (2003), a hegemonia não está dissociada do bloco histórico,
entretanto é importante entender que toda ação contrária a esse movimento político, cultural e
ideológico é chamada de contra-hegemonia; portanto, a partir do momento em que são criadas
novas formas éticas-políticas, estamos criando ações contra-hegemônicas, conforme Gramsci
(1999).
26
Desse modo, esse Estado, agindo por meio dessa direção consensual que é a
hegemonia, será o “autor de todas as tentativas destinadas a cristalizar permanentemente um
determinado estágio de desenvolvimento, uma determinada situação” (GRAMSCI, 1980, p.
95), que terá como missão a função educativa e formativa para
criar novos e mais elevados tipos de civilização, adequar a “civilização” e a
moralidade das mais amplas massas populares às necessidades do desenvolvimento
continuado do aparelho econômico de produção (GRAMSCI, 1980, p.91).
Nesse contexto, é a escola que vai exercer essa função educativa e formativa, que
passa a ser uma das funções de maior relevância do Estado, definido por Gramsci (1980)
como Estado ético e de cultura e que tem por característica
elevar a grande massa da população a um determinado nível cultural e moral, nível
(ou tipo) que corresponde às necessidades de desenvolvimento das forças produtivas
e, portanto, aos interesses das classes dominantes (GRAMSCI, 1980, p. 145).
O Estado, por meio da escola, terá a grande responsabilidade no cumprimento desse
papel de exercício da hegemonia, porque ela é considerada um dos componentes do aparelho
ideológico da sociedade. Assim, a escola será a grande responsável por preparar, formar e
educar as futuras gerações a partir de um conceito das visões de mundo de um projeto de
sociedade que se tem. Portanto a maioria das futuras gerações constituirá a base para os
modos de produção da sociedade capitalista porque passará a trabalhar nas fábricas e, assim,
articulará os interesses das classes dominantes. A escola se torna, então, “uma instituição
social que, mediante suas práticas no campo do conhecimento, valores, atitudes e, mesmo, por
sua desqualificação, articula determinados interesses e desarticula outros” (FRIGOTTO,
2010, p. 47).
A sociedade capitalista, preocupada em implementar a sua lógica econômica,5 com
ênfase na acumulação e na exploração do trabalho, desenvolveu ao longo dos anos expressões
dessa lógica empresarial que passaram a se tornar modelos de produção que foram se
aperfeiçoando e tinham (têm), dentre outros objetivos, aumentar o lucro e estimular a
competição.
Esses modelos são conhecidos como Taylorismo, Fordismo, Toyotismo e Gestão de
Qualidade Total (GQT). No decorrer deste capítulo, vamos analisar o contexto do surgimento
de cada um, assim como suas características e realizar comparações, a fim de mostrar como os
modelos de produção foram fundamentais para sustentar o modelo de Estado correspondente.
5
No decorrer desta pesquisa vamos encontrar expressões que consideramos como sendo sinônimos, variando
somente de acordo com o autor: Lógica do Capital: Antunes (2008), Lógica Empresarial: Gentili (2001), Lógica
Econômica: Barroso (2005) e Lógica de Mercado: Afonso (2009) e Rezende (2004).
27
Segundo Neto (1988), o aparecimento desses modelos de produção está ligado a suas
raízes históricas, já que
o capital, ao abrir novas frentes de acumulação ao final do século XIX e início do
século XX, defronta-se com a recolocação dos limites representados por sua frente à
habilidade do trabalho vivo, e, na busca de superação desses limites, encontrou o
taylorismo/fordismo (NETO, 1988, p. 60).
O Taylorismo, primeiro modelo de produção, foi idealizado pelo norte-americano
Frederik Winslow Taylor, que introduziu a Teoria da administração científica. A finalidade
deste modelo era melhorar a organização do processo de trabalho (RAGO E MOREIRA,
2003).
Para Neto (1988), o Taylorismo surgiu no final do século XIX e início do século XX, e
foi o modelo de produção que predominou no mundo nas primeiras décadas do século XX,
adotado tanto nos países capitalistas, como Estados Unidos da América, França, Itália e
Alemanha, quanto nos países socialistas, como a Rússia, em pleno período da revolução
bolchevique.
O Taylorismo tinha como características a fragmentação do trabalho, aprofundando
sua divisão. Havia “as fases de planejamento, concepção e direção, de um lado, e a das tarefas
de execução, de outro” (RAGO e MOREIRA, 2003, p. 19).
O Taylorismo teve também a finalidade de centralizar as decisões na direção da
fábrica ou empresa, ficando para o operariado apenas a função de realizar as instruções,
tornando-se também um operário dócil, submisso e alienado6. Na verdade, este modelo
defendia a padronização dos serviços do operariado, já que
levou à conversão de inúmeros operários desqualificados em operários
semiqualificados (taylorizados) adaptados ao novo sistema de trabalho. O efeito
imediato foi a melhoria dos ganhos destes grupos de trabalhadores, como previa
Taylor, às custas da redução significativa dos operários qualificados (RAGO e
MOREIRA, 2003, p.45).
De acordo com os autores acima, nesses momentos de perdas da compreensão da
totalidade do trabalho, percebemos uma estratégia da classe dominante de aumentar os custos,
diminuindo a formação do operário, segmentando-a, fragmentando-a e padronizando sua
produção.
6
Para Santos (1982, p.11), alienado é aquele que se torna “[...] escravo das coisas e dos progressos da
humanidade que se voltam contra ele, [...] vítima de condições externas (econômicas, políticas e sociais), [...]
despedaçado.”
28
Lima (2011) destaca também, no Taylorismo, o controle e o estudo do tempo gasto
pelo trabalhador para a realização das tarefas, em que era utilizado o cronômetro com o
objetivo de executá-las em um menor tempo possível.
Com a evolução do processo produtivo, temos, por volta de 1940, o surgimento do
modelo de produção chamado de Fordismo, que é
a forma pela qual a indústria e o processo de trabalho consolidaram-se ao longo
deste século, cujos elementos constitutivos básicos eram dados pela produção em
massa, através da linha de montagem e de produtos mais homogêneos; através do
controle dos tempos e movimentos (ANTUNES, 2008, p. 24).
As principais características do Fordismo são: mão de obra pouco qualificada, maior
divisão do trabalho e acréscimo da premiação como lógica de recompensa. Esse modelo de
produção coincide com o período do modelo de Estado chamado de bem-estar social que
estava pautado no princípio de proporcionar e garantir as condições mínimas de
renda, alimentação, saúde, habitação e educação a todos os cidadãos, enquanto
direito político adquirido. O papel a ser desempenhado pelo Estado é aquele de
tentar conciliar interesses distintos, isto é, de um lado os interesses da classe
trabalhadora, e de outro, os interesses do capital (NETO e MACIEL, 2011, p. 38).
Para Frigotto (2010), esse modelo de Estado desenvolveu políticas de estabilidade no
emprego, de subsídio no transporte, de renda, de produtividade, de previdência social, de
seguro-desemprego, assim como o direito à educação, dentre outros.
De acordo com Neto e Maciel (2011), esse modelo de Estado teve sua base teórica
consolidada na Europa em 1947, e a primeira nação que adotou essa política de Estado foi a
Grã-Bretanha; entretanto, após menos de duas décadas de vigência desse modelo de Estado,
ocorreu o seu enfraquecimento “ocasionado, principalmente, pela crise do modelo de
produção fordista” (NETO e MACIEL, 2011, p. 38).
Neves (2005) corrobora as ideias dos autores acima e afirma que
Com o esgotamento, porém, das formas de acumulação da produção de natureza
fordista, a partir dos anos 70 deste século, começam a ser introduzidas mudanças
substanciais na organização da produção e do trabalho que vêm apontando para um
patamar superior de inserção científica no conjunto das atividades econômicas e
político-sociais (NEVES, 2005, p. 21).
Para Neto (1988), tanto o Taylorismo quanto o Fordismo foram utilizados como
modelos de produção na sociedade. Sobre eles o autor destaca que
o fordismo, enquanto processo de trabalho organizado a partir de uma linha de
montagem, deve ser entendido como desenvolvimento da proposta taylorista [...] O
fordismo caracteriza o que poderíamos chamar de socialização da proposta de
Taylor, pois, enquanto este procurava administrar a forma de execução de cada
trabalho individual, o fordismo realiza isso de forma coletiva, ou seja, a
administração pelo capital da forma de execução das tarefas individuais se dá de
uma forma coletiva, pela via da esteira (p. 35-36).
29
Observamos que a cada modelo de produção que surge vamos ter o aperfeiçoamento
de um sobre o outro. Nesse ciclo que se estabelece, temos o aparecimento do modelo de
produção chamado de Toyotismo, que, para Antunes (2008), aconteceu por volta da década de
1960 na indústria automobilística japonesa7, com a finalidade de fazer o trabalhador operar
simultaneamente várias máquinas. Essa característica foi chamada de automação flexível,
como resposta à crise financeira, fazendo com que a produção fosse aumentada, sem, no
entanto aumentar a quantidade de trabalhadores, reforçando a lógica do capital de acumulação
e exploração do trabalho.
De acordo com Frigotto (2010), a partir do Toyotismo temos o surgimento do modelo
de Estado mínimo, que “significa o Estado máximo a serviço dos interesses do capital”
(FRIGOTO, 2001, p. 59). Para Silva (2001), esse Estado mínimo, que interfere pouco na
economia, mas que mantém o controle e a regulamentação das atividades econômicas
realizadas pelas instituições privadas, deixa que os mecanismos de mercado possam agir
livremente.
Ao contrário do modelo de Estado que o antecedeu, este veio com uma série de
medidas, dentre as quais destacamos o fim da estabilidade no emprego, os cortes radicais nas
despesas previdenciárias, a implementação das políticas de privatizações de vários serviços
públicos estratégicos, como água, luz e telefone.
Frigotto (2010) destaca que o Toyotismo foi se aperfeiçoando e contribuiu para o
surgimento do modelo de produção chamado de Gestão de Qualidade Total (GQT), que,
segundo Longo (1996), pode ser definido como
uma opção para a reorientação gerencial das organizações. Tem como pontos
básicos: foco no cliente; trabalho em equipe permeando toda a organização; decisões
baseadas em fatos e dados; e a busca constante da solução de problemas e da
diminuição de erros (LONGO,1996, p. 9).
De acordo com Silva (1995), no Brasil, o desenvolvimento do conceito de Qualidade
Total (QT), que foi aperfeiçoado pelos japoneses, influenciou o modelo de Gestão de
Qualidade Total (GQT), implantado pelo Presidente Fernando Collor de Melo, por meio da
Portaria nº 365, de 26 de junho de 1990. A GQT se materializou com o Programa Brasileiro
7
Para Silva (1995), após a Segunda Guerra Mundial, devido à rendição e ocupação do território japonês pelos
norte-americanos, que estava devastado sobre os diversos aspectos na indústria, na habitação, na alimentação,
estes introduziram o controle de qualidade no Japão. No ano de 1946, os norte-americanos passaram a ensinar
seus métodos de administração para os japoneses, porém, após um período de adaptação, os japoneses criaram o
seu próprio padrão de controle de qualidade e, pouco tempo depois, por volta de 1949, já tinham superado os
norte-americanos. O que contribuiu também para a criação de um novo modelo de produção foi o fato de que
para os japoneses o taylorismo e o fordismo já estavam ultrapassados; portanto, como destaca a autora, apesar de
os norte-americanos terem implantado a ideia do controle de qualidade, foram os japoneses que deram esse
grande salto de qualidade.
30
da Qualidade e Produtividade (PBQP) e invadiu os diversos setores da sociedade, como as
empresas, as indústrias, a saúde e o setor educacional.
Nessa configuração da maximização do mercado e da minimização do Estado que dão
ênfase na Gestão de Qualidade Total (GQT), essa maximização é uma estratégia do
neoliberalismo8 que, de acordo com Silva (2001), passou a utilizar essa lógica na educação.
Assim, observamos que os princípios de eficiência, de eficácia e de produtividade se
transmutaram da fábrica para a escola, porque é neste espaço que serão preparados os
trabalhadores, os sujeitos produtivos, portanto, é com essa lógica que entendemos a função da
escola em preparar, formar e reproduzir a mão de obra que será utilizada no mercado de
trabalho.
Para Silva (1995), a temática da qualidade na educação não é novidade, pois, desde
1930, com os pioneiros da educação, assim como nas décadas de 1950 e 1960, com a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação, na década de 1970, por meio da Lei 5.692/71, com a
implantação do ensino profissionalizante, e na década de 1980, com as políticas educacionais
voltadas para uma democratização da educação, tentou-se uma nova estruturação do sistema
educacional na perspectiva de proporcionar uma melhoria da qualidade na educação.
Nesse contexto, Gentili (2001) destaca o programa Escola de Qualidade Total (EQT)
desenvolvido no Brasil por Cosete Ramos, que foi coordenadora adjunta do Núcleo Central de
Qualidade e Produtividade, cujo departamento era subordinado ao Ministério da Educação
(MEC). Esse programa se baseou na experiência educacional de algumas escolas norteamericanas, com a finalidade de introduzir a lógica empresarial de controle da qualidade na
área educacional. O programa foi fundamentado em quatorze estratégias que estão
relacionadas com a filosofia da qualidade, do treinamento, da liderança, da produtividade, do
aperfeiçoamento, da melhoria, da transformação e da avaliação.
Entretanto, Silva (1995) destaca que, ao se tratar de qualidade na educação, esta não
pode ser pensada sob os mesmos parâmetros da qualidade empresarial, isto é, não se deve
fazer a transposição da lógica empresarial, que é permeada pelos princípios da concorrência,
8
Aposta no Estado fraco, que vai apenas avaliar os resultados almejados pelo mercado. A avaliação tem um
sentido, uma razão, uma lógica no Estado neoliberal que é de verificar se os resultados alcançados estão dentro
dos padrões e das exigências do mercado, propiciando assim um feedback que permita a adequação das
regulações às exigências que possam facilitar a acumulação e a reprodução do capital. Está aí a importância da
avaliação para o neoliberalismo, não como prestação de contas ao social, mas mercadológica; como informação
que permita os rearranjos necessários para que a eficiência e a eficácia exigidas na racionalidade econômica
possam ser atingidas como um instrumento poderoso de ajuste mercantil (MAUÉS, 2008, p. 102).
31
da produtividade, da competitividade, para a escola, como no modelo proposto pela Escola de
Qualidade Total (EQT).
Para Silva (1995), a qualidade na educação se refere a
escola bem equipada, com condições materiais de pleno funcionamento, com
pessoal de apoio preparado, com gestão administrativa com autonomia. Falar de
qualidade na educação é valorizar o pessoal docente enquanto categoria e não como
meros trabalhadores da educação [...] Qualidade do ensino também implica em
pedagogia e didática que levem os educadores a um ensino questionador, crítico,
com diálogo, existente no ensinar a pensar e a “aprender a aprender” e não serem
meros repetidores do saber já existente (p. 105-106).
Diante do exposto sobre os modelos de produção, faremos a relação de alguns
princípios desses modelos com os modelos hegemônicos de organização na educação, e assim
percebemos sua influência na escola no que diz respeito a todos os seus aspectos, como as
formas de organização, as formas de administração e de formulação das políticas públicas,
que, no caso desta pesquisa, são as avaliações externas. Observamos o conhecimento dividido
por séries (a divisão do trabalho), a padronização do conhecimento por meio das diretrizes das
avaliações externas (a padronização da produção), o tempo das aulas dividido em 45´, 50´, 1h
(o controle do tempo), a meritocracia (a lógica da premiação).
Essa breve análise da estreita relação entre o Estado, os modelos de produção e a
educação (escola) está respaldada em Gramsci (1980), Amaral (2002), Silva (2001) e Gentili
(2001). Essa tríade sempre esteve e provavelmente estará em sintonia por meio da hegemonia,
influenciando as políticas educacionais, que estarão ou passam a estar subordinadas a toda
uma lógica de mercado, conforme cita Afonso (2009).
Além dessa relação entre os três elementos citados anteriormente, apresentamos um
quadro, no qual selecionamos e relacionamos o que consideramos de mais importante em
cada modelo de produção, que foram se aperfeiçoando ao longo dos anos e se tornaram
modelos hegemônicos. Assim, procuramos associar essas características com a política de
avaliação externa, pois, conforme visto anteriormente, a avaliação, por ser um instrumento
poderoso de ajuste mercantil, vem despertando grande interesse no MEC.
Neste sentido, entendemos que, enquanto os modelos de produção foram passando por
um processo de renovação ou adaptação que levou décadas, a política educacional de
avaliação externa, que vem sendo implementada e aperfeiçoada nas redes de ensino do Brasil,
está ocorrendo de uma forma bem mais rápida, conforme apresentado no quadro a seguir.
32
Quadro 1: Características em comum entre os modelos de produção e as avaliações externas.
Modelos de produção
Taylorismo: Padronização da mão de obra.
Avaliações externas
- Contribuem para a padronização do
conhecimento em todas as redes de ensino
Fordismo: Acréscimo da premiação e mão de - Estimulam a competitividade por meio da
obra pouco qualificada (limitada).
premiação de escolas, professores e alunos. Os
considerados melhores são aqueles que atingem
os melhores resultados ou índices;
- Estabelecem a limitação do currículo com foco
em apenas algumas áreas do conhecimento.
Toyotismo e Gestão de Qualidade Total - Passam a se tornar um importante instrumento
(GQT): adotam a filosofia da melhoria da para a melhoria da qualidade do ensino permeada
qualidade e da avaliação.
por princípios de eficiência, de eficácia, de
produtividade e competitividade.
Fonte: Elaborado pelo autor da pesquisa
Ao trazermos já para este capítulo o debate entre o Estado, os modelos de produção e
os processos hegemônicos de educação (dos quais a escola faz parte), observamos que as
mudanças que foram sendo realizadas na escola tiveram e têm como objetivo a formação de
sujeitos que se adequassem a esse projeto de sociedade. Desse modo, observamos a influência
desses modelos de produção na escola na perspectiva de adaptar essas instituições aos ditames
do capital. Queremos, com isso, enfatizar que, nos últimos vinte anos no Brasil, estamos
passando por um processo de reconstrução hegemônica de um projeto de educação, e que
temos na avaliação, especificamente na avaliação externa, um vetor desse processo.
Nosso objetivo, nesse tópico, foi apresentar e analisar a forma como os modelos de
produção vão se aperfeiçoando ao longo dos anos, gerando a necessidade de uma nova
exigência do papel do Estado realizada pelo capital, que passará por crises cíclicas, conforme
veremos a seguir.
1.2 A CRISE DO CAPITAL E AS REFORMAS DO ESTADO NO CONTEXTO
INTERNACIONAL E NACIONAL SOB A INFLUÊNCIA DAS AGÊNCIAS
MULTILATERAIS DE FINANCIAMENTO
Para iniciar esta análise sobre a crise do capital, é necessário que entendamos o que
vem a ser esta crise. Segundo Frigotto (2010, p. 66), “a crise é um elemento constituinte,
estrutural, do movimento cíclico da acumulação capitalista, assumindo formas específicas que
variam de intensidade no tempo e no espaço”. Conforme o autor, como essas crises variam de
intensidade de acordo com o tempo e o espaço, a tendência é que elas venham a acontecer
33
cada vez mais fortes, o que constata ao comparar as crises de 1914 e 1929 com as que
aconteceram entre as décadas de 1970 e 1990 no final do século XX, em que esta última
ocorreu de forma mais acentuada.
Nos períodos em que o capitalismo entrou em crise, aconteceram as transformações do
Estado que ficaram conhecidas como as Reformas do Estado. Essas crises são (ou foram)
consequência da redução da taxa de lucro e da concentração do capital, que tem no próprio
Estado o elemento fundamental, que passa a intervir no setor econômico para que sejam
criadas novas estratégias de aumento da taxa de exploração da força de trabalho. Essas crises,
que aconteceram na década de 1980 e 1990 do século passado, foram decorrentes do modelo
de Estado conhecido como Bem-Estar Social ou Estado Providência9. Barroso (2005) faz uma
análise precisa do período dessa crise ao comentar que
Finalmente, a partir dos anos de 1980, através do tatcherismo e do regganismo,
assistiu-se ao surgimento das chamadas “políticas neoliberais” (com a redução do
papel do Estado e a criação de mercados, ou quase-mercados, nos sectores
tradicionalmente públicos – saúde, educação, transportes etc.). Estas “políticas
neoliberais” afectaram directamente muitos outros países e foram adoptadas como
referencias para os programas de desenvolvimento conduzidos pelas grandes
organizações internacionais (FMI, Banco Mundial, OCDE etc.) no que foi designado
por “consenso de Washington (BARROSO, 2005, p. 741).
G. Silva (2003) define esta crise como sendo estrutural por atingir a superestrutura e a
infraestrutura, e se transforma em períodos de renovação do modo de dominação da classe
dominante a partir do momento em que passa a utilizar o poder do Estado para aumentar o
acirramento das relações de força, achatando as classes dominadas.
Essa crise, motivada pela queda da taxa de lucro, foi apresentada pelos
neoconservadores como um distúrbio, uma “anormalidade” do sistema, produzida
por fatores “externos”. Por essa razão, não tardaram em atribuir ao modelo de
Estado de Bem-Estar Social, sobretudo ao seu caráter intervencionista e ao sistema
de proteção social, as causas da crise. Alarmaram o mundo com a tese da
“ingovernabilidade”, ao mesmo tempo que empreendiam uma ofensiva contra os
direitos conquistados pelas classes populares nas décadas anteriores como forma de
recompor as condições de acumulação do capital (G. SILVA, 2003, p. 54).
9
Entretanto, enquanto nos países europeus tivemos um modelo de estado chamado de Bem estar-social, no
Brasil tivemos um Estado desenvolvimentista que se caracterizou pela ênfase “na reforma do sistema financeiro,
destinada a subordiná-la ao crescimento industrial e reduzir os ganhos especulativos. Nela o Estado aparece
como centro planificador de um desenvolvimento basicamente autárquico, com ênfase na integração do sistema
industrial e na internalização de toda a indústria “de ponta”. Além do que esboçava a possibilidade de incorporar
os assalariados organizados através da adoção de uma política negociada de rendas. Os simpatizantes dessa
orientação concentravam-se principalmente na indústria privada nacional e na burocracia empresarial do Estado”
(JUNIOR, 1994, p.156).
Para Freitas (2007), esse modelo de Estado correspondeu ao período compreendido entre 1930-1980. No entanto,
para Sallum Junior (1994), ao final da década de 1970, esse Estado desenvolvimentista entrou em crise por conta
da crise política mundial. Portanto, para o Brasil, restaram duas alternativas: a primeira seria se adequar a uma
vertente neoliberal ou se adequar a uma vertente nacional desenvolvimentista. Diante dessas duas vertentes o
Brasil enveredou pela vertente neoliberal.
34
Para Frigoto (2001), essa ofensiva aos direitos conquistados é uma das consequências
do modelo de Estado Neoliberal, que se ajusta ao mercado por meio de um desmonte do
Estado, que “é incapaz de democraticamente atender direitos como o da educação, saúde e
habitação.” (FRIGOTO, 2001, p. 80). De acordo com o autor, esses direitos não devem ser
mercantilizáveis, pois esse desmonte vai implicar a perda deles. Além disso, esse modelo de
Estado tenta mudar o foco da causa (ou do problema) da crise para outros focos que não são o
motivo real para que esta ocorra.
Nessa perspectiva, Afonso (2009) coloca em discussão a causa da crise da economia
mundial e questiona se esta é culpa da educação, tese que é defendida por muitos autores,
como Fischer; Mandell (1988), Ray; Mickelson (1993 apud AFONSO, 2009, p. 86). Daí a
necessidade de se fazerem reformas na área da economia. Entretanto, não concordamos com o
argumento anterior e entendemos que “a crise na educação é antes de tudo o reflexo da
estagnação econômica” (LEVIN apud AFONSO, 2009, p. 87), conforme visto no início deste
tópico.
Como consequência dessa crise, vamos ter as reformas do Estado que aconteceram
inicialmente no contexto internacional na Inglaterra e nos Estados Unidos da América, e
posteriormente passariam a servir de modelo para o resto do mundo, inclusive para o Brasil.
De acordo com Rezende (2004), o programa de reformas na Inglaterra, conhecido como Next
Steps, adotou uma série de medidas que influenciaram diretamente os serviços públicos e
estratégicos da sociedade por meio da restrição orçamentária, da reforma fiscal, da redução
dos gastos públicos e da implementação da lógica de mercado no setor público, decorrente da
privatização das empresas estatais que ofereciam serviços públicos essenciais, como saúde,
educação, energia elétrica, telefonia, dentre outros. A grande inovação foi o surgimento das
agências centrais e descentralizadas, com a finalidade de regular, de prestar esses serviços
públicos, assim como fiscalizar se as metas dessas empresas foram atingidas. Portanto, com
esse novo modelo de Estado regulador e avaliador10 é que a lógica da avaliação ganha maior
destaque, já que
Os serviços públicos, como saúde, energia, educação, telecomunicações, previdência
etc. também sofrem, como não poderia deixar de ser, um significativo processo de
reestruturação, subordinado à máxima da mercadorização, que vem afetando
fortemente os trabalhadores do setor estatal e público (ANTUNES, 2008, p. 107).
10
Vamos aprofundar essa definição mais adiante, mas podemos antecipar dizendo “que define as grandes
orientações e os alvos a atingir” (LESSAR, BRASSARD; LUSIGNAN, 2002, p. 35 apud BARROSO, 2005. p.
732).
35
De acordo com as análises apresentadas até o momento sobre o Estado e suas crises,
entendemos que, no momento em que temos a mudança da configuração do papel do Estado
Neoliberal a partir do último quartel do século XX, que passa a adotar uma nova forma de
administração, com ênfase nos princípios da flexibilização, da competitividade, da
participação e da qualidade total, sob a influência dos chamados homens de negócio,
conforme descreve Frigotto (2010), ocorre a criação de uma nova configuração, uma nova
regulação, que vai seguir uma série de orientações, de indicações e regras das agências
multilaterais de financiamento, cuja função principal é realizar empréstimos financeiros aos
países que, em troca, passam a efetuar o corte nas despesas públicas e implementam políticas
de ajuste estrutural em todos os setores da sociedade, inclusive no setor educacional.
Para Haddad (2008), o surgimento do BM e do FMI aconteceu após a Segunda Guerra
Mundial, quando os principais países do mundo resolveram criar essas instituições
internacionais com a finalidade de gerenciar acordos, tratados e políticas no campo
econômico. Nesse contexto, em 1944, na cidade de Bretton Woods, nos Estados Unidos,
temos a criação dessas duas instituições, o BM, cuja função se destinava a auxiliar na
reconstrução e desenvolvimento dos países, e o FMI, com a finalidade de fiscalizar e
promover a estabilidade do sistema econômico.
Essas instituições se tornaram determinantes para a realização das Reformas de Estado
que aconteceram a partir da década de 1980 do século passado e que afetariam diversos
setores da sociedade. Os governos locais, ao realizarem esses acordos, passariam a seguir as
orientações universais voltadas para uma lógica econômica.
Tais orientações tinham (têm) como objetivos principais realizar o corte das despesas e
os ajustes estruturais, conforme já foi comentado, visando alcançar a eficácia dos sistemas
sem aumentar o gasto, isto é, ampliando o serviço, porém sem aumentar a quantidade de
recursos, conforme cita Haddad (2008).
Essas reformas, ao se estenderam para os outros continentes, como resultado das
orientações das agências multilaterais de financiamento, com o discurso oficial de
desenvolvimento, demonstram que, por ser o capital “um sistema global, o mundo do trabalho
e seus desafios são também cada vez mais mundializados, transnacionalizados e
internacionalizados” (ANTUNES, 2008, p.119).
É nesse contexto de Pós-Estado desenvolvimentista que as reformas foram colocadas
em prática no Brasil, durante a década de 1990, no período do Governo do Presidente
Fernando Henrique Cardoso (FHC), em que ocorreu o fortalecimento do neoliberalismo como
36
ideologia11 que norteou a política de Estado brasileiro. Em decorrência desse fortalecimento,
o governo brasileiro, para se adequar a esse novo modelo de ajuste estrutural, justificou a
necessidade do empréstimo financeiro junto aos organismos de financiamento mundial.
Na ocasião, o Presidente FHC encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de
Emenda Constitucional nº 173, que trata sobre as reformas do aparelho Estatal Brasileiro
conhecido como Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado, que definiu quatro setores
de atuação. No primeiro setor, temos o núcleo estratégico, que é o governo em si. No segundo
setor, temos as atividades exclusivas do Estado, isto é, aqueles serviços que só o Estado pode
oferecer. O terceiro setor é chamado de serviços não exclusivos, isto é, aqueles serviços que o
Estado vai operar simultaneamente com instituições públicas não estatais e privadas. Por fim,
temos o setor de produção de bens e serviços para o mercado. Esse projeto, elaborado pelo
então Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), mais precisamente pelo
Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, se tornou um plano decisivo para legitimar a reforma
neoliberal.
A análise de Nogueira (2011) sobre a reforma do Estado que aconteceu no contexto da
América do Sul nos ajuda a entender que tivemos um período de reformas que fracassaram
por não terem resolvido os problemas sociais. Esse período teve como característica uma
reforma do tipo passivo que se adaptou ao processo de globalização, apresentando novos
modelos de gestão, conforme citado anteriormente, com o objetivo de reduzir o papel do
Estado por meio de diversos mecanismos de privatização, de terceirização, de flexibilização,
de parcerias entre o setor público e o privado, estimulando a competição, apresentando um
“quadro meio darwinista, em que os melhores ou os mais determinados e empreendedores
teriam tudo para progredir” (NOGUEIRA, 2011, p.50).
De acordo com o autor acima, não havia a necessidade de se fazer uma reforma que
fosse orientada pelo mercado, reforma esta que se expressou mais como um desmonte do
Estado, que passou a transferir para a sociedade civil responsabilidades e atribuições que eram
antes exclusivas do Estado, como a saúde, a educação, o transporte e as telecomunicações.
Como consequência, não tivemos uma melhor distribuição de renda, mas apenas um aumento
da exclusão social e uma reforma voltada para os interesses do mercado.
A reforma brasileira teve como um dos objetivos primordiais realizar o ajuste fiscal,
em que o mecanismo principal adotado foi o processo de privatização. Para tal, seria
11
Nesse contexto, entendemos ideologia como o conjunto de “ideias, valores, concepções, conhecimentos etc.”
(FRIGOTO, 2010, p.18), repassados na dinâmica social. Em certa medida, esse conjunto, quando apropriado
pela classe dominante, serve para implantar um sistema de dominação de uma classe sobre a outra.
37
necessário obter um controle maior sobre o sistema burocrático 12, que se materializou por
meio da criação de novas instituições chamadas de agências centrais e descentralizadas,
porém essa descentralização permitia requerer um controle menor sobre a burocracia. Assim,
fica evidenciada uma primeira contradição fundamental, uma vez que é difícil realizar um
ajuste sem ter um controle, pois “é exatamente nessa tensão entre maior e menor controle que
está a raiz dos problemas de implementação das reformas administrativas” (REZENDE, 2004,
p. 17).
Dessa forma, o Estado brasileiro passou a realizar parcerias com a iniciativa privada e
promoveu a transferência do controle das políticas estatais para as agências reguladoras. Na
área das telecomunicações quem passou a controlar foi a Agência Nacional de
Telecomunicações (ANATEL). No setor da energia elétrica o controle ficou sob a
responsabilidade da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), e assim por diante.
De acordo com Santos (2008), essas agências passaram a adotar os princípios da
eficiência, da eficácia e da produtividade, na prestação desses serviços públicos. Entretanto,
faltou um melhor esclarecimento por parte dos responsáveis dessas reformas, já que,
conforme G. Silva (2003),
Os autores da “reforma” do Estado não informaram que a crise fiscal tem como
origem a utilização do orçamento do Estado segundo os interesses da acumulação do
capital, ou seja, voltado prioritariamente para manter a margem de lucro do setor
privado (G. SILVA, 2003, p. 76).
Seguindo nossa análise sobre o Plano diretor, detectamos uma segunda contradição
envolvendo as instituições, em que algumas sofreram mudanças e outras não, pois, se
considerarmos que uma reforma exige mudanças, então se subentende que deve envolver toda
uma estrutura da sociedade, porém o governo brasileiro definiu que o Estado brasileiro
passaria a ter quatro setores diferentes: o núcleo estratégico, que vamos chamar de setor um,
representado pela Presidência da República, pelos Ministérios, pelos Tribunais, pelo
Ministério Público e pelo Legislativo; o setor dois, com funções exclusivas do Estado; o setor
três, com serviços não exclusivos do Estado; e o setor quatro, responsável pela produção de
bens e serviço. O plano diretor determinava que o núcleo estratégico não fosse afetado pelas
mudanças organizacionais nem gerenciais, conforme Rezende (2004). Assim, o ajuste fiscal
deveria acontecer somente nos setores dois, três e quatro, deixando de fora o setor um.
12
Ao comentarmos sobre o sistema burocrático, consideramos importante nos basearmos em uma definição de
burocracia, pois, de acordo com Motta (1994, p. 7), “O termo “burocracia” tem sido utilizado em vários sentidos.
Tem sido usado para designar uma administração racional e eficiente, para designar o seu contrário, para
designar o governo de altos funcionários, para designar organização. Na realidade burocracia é tudo isso, na
medida que burocracia é poder, controle e alienação”.
38
Outro aspecto fundamental para o sucesso ou insucesso das reformas é a necessidade
de cooperação entre as agências, pois, de acordo com Rezende (2004), a falta dessa
cooperação foi um fator que contribuiu para que as reformas falhassem. Como o plano diretor
previa a criação de duas instâncias com poder de decisão, envolvendo o governo e a sociedade
civil, que seriam compostas pela Câmara e pelo Conselho da Reforma do Estado, com o
objetivo de aumentar a participação social, essa cooperação não aconteceu, deixando o
MARE isolado, o que resultou na extinção desse Ministério.
Por meio das análises de Rezende (2004) e Nogueira (2011) sobre as reformas do
Estado no contexto brasileiro, percebemos que essas, além de serem orientadas pelos
interesses do mercado, apresentaram contradições e falhas de planejamento e execução.
Assim, tivemos também as reformas educacionais implementadas no contexto internacional e
nacional, uma vez que
o novo modelo de gerenciamento proposto para o setor educacional funda-se em
princípios da moderna administração pública cujas bases estão vincadas na gestão
empresarial, incorporando, desse modo, princípios como flexibilidade, agilidade,
eficiência, eficácia e produtividade (NETO, 2009, p.197).
Para Neto (2009), esse novo modelo, chamado também de gerencial, na verdade é uma
estratégia neoliberal. Gentili (2001) afirma que essa estratégia se dá na perspectiva de
aprofundar os interesses do capital, da exploração do trabalho, visando ao aumento do lucro e
da produção, sendo necessária para tal a geração de recursos humanos, que encontra no
campo educacional uma área estratégica. Nesse contexto, Rosar (2002) destaca diversas ações
que se transformaram em diretrizes nas reformas educacionais da América Latina, que foram
resultado das parcerias dos empresários com a Comissão Econômica para a América Latina
(CEPAL), como os parâmetros curriculares para o ensino fundamental, a gestão da qualidade
total, a reforma no ensino médio, dentre outras. Haddad (2008) destaca que existe uma
prevalência da lógica financeira sobre a lógica social e educacional, na perspectiva de que
essas duas últimas estejam a serviço ou de acordo com os interesses do mercado com o
objetivo de perpetuar essa lógica.
Barroso (2005) faz uma análise das consequências das políticas neoliberais de
reformas e sua influência direta no setor educacional, no qual temos uma série de regulações
que o autor define como pós-burocráticas e que apresentam como características o
desenvolvimento de uma maior autonomia das escolas, promovendo a diversificação da oferta
escolar, o equilíbrio entre a centralização e a descentralização e o acréscimo da avaliação
externa como política educacional, conforme esquema a seguir.
39
Figura 1. Modelo Pós-Burocrático13 de Regulação na Educação voltado para uma lógica
estritamente econômica
Fonte: Barroso (2005, p. 737).
Motta (1994) serviu como referência para que entendêssemos o significado do termo
burocracia, que é amplo e complexo. Assim, para introduzir a lógica econômica na educação
(representada pela instituição escola), provavelmente a ideologia neoliberal optou pelo
segundo sentido de burocracia que o autor descreve, que é o de ineficiência. Portanto, sob esta
ótica decorrente do Estado Neoliberal, temos o surgimento do modelo de governança e de
regulação na educação chamado de pós-burocrático, conforme ilustrou Barroso (2005) a partir
da análise da experiência europeia, pois
No domínio da educação, a influência das ideias neoliberais fez-se sentir quer por
meio de múltiplas reformas estruturais, de dimensão e amplitude diferentes,
destinadas a reduzir a intervenção do Estado na provisão e administração do serviço
educativo, quer por meio de retóricas discursivas (dos políticos, dos peritos, dos
meios de informação) de crítica ao serviço público estatal e de “encorajamento do
mercado”. Este “encorajamento do mercado” traduz-se, sobretudo, na subordinação
das políticas de educação a uma lógica estritamente econômica (“globalização”); na
importação de valores (competição, concorrência, excelência etc.) e modelos de
gestão empresarial, como referentes para a “modernização” do serviço público de
educação; na promoção de medidas tendentes à sua privatização (BARROSO, 2005,
p.741).
Barroso (2003) destaca ainda que Este modelo de regulação se organizou em torno de
dois referenciais principais: o do “Estado avaliador” e o do “quase-mercado14”. Nesse
contexto, uma nova relação entre o Estado e a educação surge, já que
13
Mesmo que Barroso (2005) tenha tomado como referência a experiência de Portugal, consideramos importante
sua análise, pois o autor apresenta de forma objetiva e com destaque a importância da avaliação nesse modelo de
regulação na educação. Por esse motivo, para esta pesquisa, utilizamos esse modelo como referência para nossas
análises.
14
O recurso ao conceito de quase-mercado para interpretar as modificações em curso na educação pública
permite-nos compreender a aplicação, na gestão dos sistemas educacionais, dos princípios e valores da iniciativa
privada, que trazem consigo um projeto de sociedade que certamente não contém a utopia da transformação.
Sem dúvida, a avaliação é um processo capaz de direcionar projetos e ações e o que se evidencia com as práticas
em curso é a perspectiva da reprodução e intensificação das desigualdades educacionais e sociais (SOUZA e
40
O Estado não se retira da educação. Ele adopta um novo papel, o do Estado
regulador e avaliador que define as grandes orientações e os alvos a atingir, ao
mesmo tempo que monta um sistema de monitorização e de avaliação para saber se
os resultados desejados foram ou não, alcançados. Se, por um lado, ele continua a
investir uma parte considerável do seu orçamento em educação, por outro, ele
abandona parcialmente a organização e a gestão quotidiana, funções que transfere
para os níveis intermediários e locais, em parceria e concorrência com actores
privados desejosos de assumirem uma parte significativa do “mercado” educativo
(LESSAR, BRASSARD; LUSIGNAN, 2002, p.35 apud BARROSO, 2005. p. 732).
O Estado, ao absorver a lógica da iniciativa privada, cujos princípios estão centrados
na eficiência, na eficácia e na produtividade, passa a concentrar sua preocupação apenas nos
resultados, “deixando a economia para a responsabilidade do mercado, assumindo o papel de
regulador e avaliador, diferente daquele que vinha desempenhando” (MAUÉS, 2008, p. 90). É
nesse contexto que
a emergência do estado-avaliador (evaluative state),.., traduz um retrocesso
considerável, não apenas porque promove a recuperação e actualização de muitos
pressupostos positivistas e quantitativistas tornados anacrônicos pelo próprio
desenvolvimento e aperfeiçoamento das teorias da avaliação, mas sobretudo porque,
do nosso ponto de vista, favorece a desvalorização da multirreferencialidade dos
processos avaliativos, que tem vindo a ser reconhecida como novo ponto de chegada
para superar a crise dos paradigmas tradicionais neste domínio (AFONSO, 2009,
p.128).
Concordamos com o autor e entendemos que o Estado regulador e avaliador se
caracteriza a partir do momento em que passa a centralizar suas ações. Dessa forma, os
resultados alcançados decorrentes desse processo são avaliados de acordo com os princípios
citados anteriormente e passam a estar submetidos à lógica do mercado.
Esse Estado regulador e avaliador, que também se torna um Estado mínimo, passa a
interferir diretamente na educação por meio das políticas públicas educacionais, que vão se
modificando a partir desse modelo de Estado vigente. Nesse contexto de reformas do Estado e
surgimento do Estado regulador e avaliador, temos a fala da Presidente do INEP no Seminário
Internacional de Avaliação Educacional que aconteceu entre os dias 1 e 3 de dezembro de
1997, na cidade do Rio de Janeiro, no qual afirmou que
com a atual reforma, sai de cena o Estado-executor, assumindo seu lugar o Estadoregulador e o Estado-avalidor. Essa mudança de paradigma exige uma verdadeira
reengenharia do setor público. Trata-se da difícil tarefa de substituir controles
burocráticos por uma nova cultura gerencial, que incorpora a política de avaliação
como elemento estratégico da gestão pública (CASTRO, 1998, p. 9).
No item seguinte comentaremos sobre a definição de políticas públicas a partir de
diversos autores e apresentaremos também suas características.
OLIVEIRA, 2003, p. 890). Corroborando essa citação, Freitas (2007) afirma que “A lógica de quase-mercado
implica a noção de privatização na educação...não se pode menosprezar o potencial pedagógico da prática da
avaliação externa na criação de condições de difusão de uma cultura receptiva a tais fórmulas” (FREITAS, 2007,
p. 170).
41
1.4 A AVALIAÇÃO COMO POLÍTICA PÚBLICA: SOB A ÉGIDE DAS AGÊNCIAS
MULTILATERAIS DE FINANCIAMENTO
Ao iniciarmos este tópico, chamamos a atenção para o interesse das agências
multilaterais de financiamento na avaliação, pois, diante das análises apresentadas até o
momento, observamos que a avaliação passou a ganhar uma centralidade e importância sobre
as demais políticas públicas implementadas no mundo. De acordo com Haddad (2008), essas
agências sempre apresentam receitas educacionais, e dentre essas temos as avaliações dos
estabelecimentos de ensino que se configuram por meio das avaliações externas, como o
SAEB e o ENEM. Observamos que “países diferentes, ocupando lugares distintos no sistema
mundial, estão a percorrer caminhos bastante semelhantes no desenvolvimento das políticas
de avaliação” (AFONSO, 2009, p. 62). Sendo assim, compreendemos por que cada vez mais
as políticas educacionais que estão sendo implementadas mundialmente acontecem de forma
padronizada, e a política de avaliação não foge a essa regra.
Consideramos importante comentar sobre a definição e característica de uma política
pública, pois é por meio dela, e sob a influência desses organismos de financiamento, que
essas reformas acontecem. Porém, diante das análises que foram feitas até o momento,
podemos perceber que nem sempre a implementação de uma política tem a ver com a
resolução de um problema. Existe algo que foge a essa definição, que são os interesses
econômicos que estão por trás das políticas públicas.
Sendo assim, o Estado (e/ou governos), ao decidir ou ao ser forçado a realizar as
reformas, necessita de capital, de financiamento, e com isso tem de recorrer aos organismos
de financiamento internacional, que Frigotto (2010) denomina de “senhores do mundo”,
Desse modo, essas instituições passam a implementar suas políticas voltadas para uma lógica
de mercado e não para a resolução de um problema em si, conforme citado anteriormente.
A partir dessa nova relação entre Estado e educação em períodos de reformas, e da
influência das agências multilaterais de financiamento, temos as reformas educacionais que se
materializam por meio das políticas públicas. Para Secchi (2010), a definição de política
pública está associada inicialmente ao termo inglês policy, estando relacionada com as
orientações envolvendo a decisão e a ação. Assim, as políticas públicas “tratam do conteúdo
concreto e do conteúdo simbólico de decisões políticas, e do processo de construção e atuação
dessas decisões” (SECCHI, 2010, p. 1). No glossário da obra deste autor, encontramos de
42
uma maneira simples e objetiva outra definição para política pública que “é uma diretriz
elaborada para enfrentar um problema” (Idem, 2010, p. 124).
Para Souza (2007), a política pública é uma área multidisciplinar que envolve teorias
do campo da sociologia, da política e da economia, e assim possui inter-relações com o
Estado, com a política, a economia e a sociedade.
A Política pública também pode ser definida como “As ações governamentais [...]
Assim, há políticas públicas de saúde, de educação e outras” (VIEIRA, 2009, p. 21). Dessa
forma, temos as políticas públicas educacionais, que passam a ser implementadas e adquirem
um formato para atender aos novos interesses ou alvos. Portanto
A expressão Política Educacional pode assumir significados diversos. Quando usada
com letras maiúsculas, refere-se ao setor da Ciência Política que estuda as iniciativas
do Poder Público em educação (VIEIRA, 2009, p. 21).
Dentre as diversas conceituações existentes, concordamos que a política pública é
“uma regra formulada por alguma autoridade governamental que expressa uma intenção de
influenciar, alterar, regular, o comportamento individual ou coletivo através do uso de sanções
positivas ou negativas” (LOWI apud REZENDE, 2004, p.13). Complementando esta
conceituação, Rezende (2004) atribui essas ações como parte do Estado, que serve de
instrumento de materialização para que seus objetivos possam ser atingidos. Apoiados em
Souza (2007), entendemos a política pública
como o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, colocar o “governo
em ação” e/ou analisar essa ação (variável independente) e, quando necessário,
propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável dependente). A
formulação de políticas públicas constitui-se no estágio em que governos
democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e
ações, que produzirão resultados ou mudanças no mundo real (SOUZA, 2007, p.
69).
De acordo com a autora acima, as políticas públicas, após sua formulação, se
transformam em “planos, programas, projetos, base de dados ou sistemas de informação e
grupos de pesquisa. Quando postas em ação, ficam submetidas a sistemas de
acompanhamento e avaliação” (SOUZA, 2007, p. 70).
As políticas públicas educacionais implementadas a partir de 1970 do século XX
passaram a utilizar uma série de medidas como consequência das reformas com objetivo de
“ampliar os períodos de escolaridade obrigatória, igualar as condições de escolarização”
(FRIGOTO, 2001, p. 104). Nas décadas seguintes, passa a ser colocada em prática a “idéia
meritocrática, em suas origens associada ao desenvolvimento do mercado como mecanismo
de atribuição de recompensas” (Idem, p.103), com ênfase na qualidade em detrimento da
igualdade. Nesse contexto, é importante entender que, conforme Enguita (2001),
43
A problemática da qualidade esteve sempre presente no mundo da educação e do
ensino, mas nunca havia alcançado antes esse grau de centralidade. Ela vem
substituir a problemática da igualdade e a da igualdade de oportunidades, que eram
então os coringas desse jogo (ENGUITA, 2001, p. 96).
Neste momento, é importante fazermos uma análise sobre o significado dessa
qualidade. Para Vieira (2008), o conceito de qualidade é variável e está relacionado com as
circunstâncias temporais e espaciais e, sob a ótica educacional, está associado com um
determinado momento histórico. A autora faz uma análise sobre o conceito de qualidade na
escola do passado, em que alguns valores eram cultivados e significavam um indicador de
qualidade, como o ensino de prendas domésticas para as alunas. Hoje esse indicador não se
sustenta nas escolas, e o discurso de qualidade utilizado atualmente está associado com os
resultados das avaliações externas. Assim, concordamos com a autora quando afirma que a
qualidade é um conceito dinâmico. Porém, devemos ter cuidado para não associarmos a
qualidade na educação somente com os resultados das avaliações externas, o que é
frequentemente utilizado nos documentos oficiais da Prova Brasil, que iremos apresentar no
capítulo seguinte.
Para Frigotto (2010), o conceito de qualidade é um dos jargões utilizados pelos
homens de negócio, cujo objetivo é implantar a lógica e os critérios empresariais na educação,
pois
A investida para se implantarem os critérios empresariais de eficiência, de
“qualidade total”, de competitividade em áreas incompatíveis com os mesmos, como
educação e saúde, desenvolve-se hoje dentro do setor “público”. O que é, sem
dúvida, profundamente problemático é a pressão da perspectiva neoconservadora
para que a escola pública e a universidade em particular [...] se estruturem e sejam
avaliadas dentro dos parâmetros da “produtividade e eficiência empresarial”
(FRIGOTTO, 2010, p. 163).
Corroborando essa análise, encontramos em Neto e Maciel (20 11) a crítica da
transposição do conceito de qualidade da área empresarial para a área educacional. Nessa
perspectiva, a escola passa a ser vista como uma empresa. Na verdade, é “uma tentativa de
transformar a escola numa empresa produtiva” (NETO e MACIEL, 2011, p. 62). A crítica
desses autores é que, se esse conceito na área empresarial ainda não conseguiu se firmar e
comprovar sua eficiência, como fazer essa transposição para a educação? Ainda sobre essa
transposição de conceitos da área empresarial para a área educacional, devemos compreender,
conforme Vieira (2008), que
O trabalho que se desenvolve numa instituição educacional, qualquer que seja a sua
complexidade, envolve um processo cujos resultados são apenas parcialmente
mensuráveis ... O produto da aprendizagem pode não apresentar resultados a curto
prazo. Do mesmo modo, um processo que produz resultados efetivos em
determinada realidade, pode não surtir os mesmos efeitos em outra (VIEIRA, 2008,
p. 45).
44
Nesse contexto, concordamos com Frigotto (2010), Vieira (2008), Neto e Maciel
(2011) e entendemos por que a educação é uma área incompatível para se implantar a
qualidade nessa ótica. Entretanto, esses princípios de qualidade sob uma ótica empresarial
estão, do nosso ponto de vista, intimamente atrelados à avaliação na educação por meio das
avaliações externas, pois, ao fazermos uma analogia com o setor educacional, conseguimos
perceber que, ao terminar um tempo de escolarização ou próximo de terminar um ciclo, o
aluno é submetido a um teste de avaliação e é com essa lógica de critério empresarial e na
preocupação com a qualidade no processo produtivo, conforme descreve Gentili (2001), que
os exames nacionais de avaliação passam a ter uma centralidade na educação como forma de
garantir esse controle da qualidade. Como consequência desse processo temos a pressão, o
acúmulo e a sobrecarga de trabalho decorrentes desses princípios, que vêm aumentando nos
indivíduos que fazem parte da escola, mais precisamente sobre os docentes e discentes.
As condições de trabalho do professor e sua remuneração tendem a piorar, pois, de
acordo com Lima (2011), dentre as diversas influências do Banco Mundial na educação,
podemos citar a recomendação aos governos locais para que economizem nos salários dos
docentes e passem a aumentar a quantidade de alunos por sala. Neste sentido, observamos, a
princípio, duas implicações. A primeira é a sobrecarga do trabalho docente com um número
elevado de alunos por sala e a outra diz respeito à qualidade do processo de aprendizagem dos
alunos, que também passa a ser seriamente comprometida.
Essa qualidade citada com frequência nos documentos oficiais da Prova Brasil, que
tanto é apregoada nesse modelo de GQT, na verdade é uma falácia, pois a conclusão a que
chegamos é a existência de uma intencionalidade em implantar na educação uma qualidade,
com um discurso dualista. Se as agências de financiamento internacional recomendam aos
governos que aumentem a quantidade de alunos por sala de aula, assim como orientam para
que sejam economizados os salários dos professores, o que temos não é qualidade na
educação, mas uma precarização, pois, com base nas análises que foram feitas até o momento,
chegamos à conclusão de que esse é o objetivo. Esses princípios da qualidade total foram e
estão sendo introduzidos nas políticas públicas educacionais, assim como aconteceu com o
Taylorismo e o Fordismo, e se materializaram nas escolas como uma nova forma de
administração, conforme citado anteriormente, que incentiva a competitividade, a
concorrência, dentre outros aspectos. Nesse contexto de qualidade, a melhor escola é aquela
que tem bons resultados nas avaliações externas, demonstrando eficiência e qualidade, ou
aquela onde os alunos e professores passam a ganhar prêmios de acordo com os seus
45
desempenhos no ranking das avaliações externas, que, sob o nosso ponto de vista, vêm
reforçando nas escolas um caráter competitivista, concorrencial e celetista?
O nosso entendimento sobre a qualidade na educação caminha numa perspectiva
contra-hegemônica e parte do princípio de que ela deve ocorrer a partir de um
movimento em favor de um ensino mais ativo, mais participativo, mais centrado nos
interesses dos alunos, etc., pode explicar-se de qualquer forma, como um
movimento centrado nos aspectos qualitativos do ensino ou, caso se prefira, a favor
da melhoria da qualidade da educação (ENGUITA, 2001, p. 98).
Nossa intenção ao levantarmos esses questionamentos é alertarmos sobre as diversas
situações que consideramos negativas para os alunos e professores nesse contexto das
avaliações externas, que já ocorreram em outros países, como apresentaremos no segundo
capítulo.
A escola que vem predominando ao longo dos anos é uma escola que exclui e que
apresenta uma formação dualista, que adestra e disciplina os filhos dos trabalhadores para
atender às necessidades do mercado e uma escola formativa que prepara os filhos das classes
dirigentes para governar. Fica nítido, portanto, o objetivo da escola em articular determinados
interesses e desarticular outros. Nesse bojo de interesses de uma sociedade que exclui,
concordamos com Antunes (2008), quando afirma que essa exclusão vai se estender para os
sistemas educacionais por meio da implantação dos sistemas nacionais de avaliações.
Assim, a avaliação passou a ser adotada como elemento central na política educacional
em vários países, disseminou-se e ganhou força na sociedade capitalista, já que
O Estado centraliza para si a função de avaliar a Educação, pois o mercado, por si
só, não dá conta de regular esse “serviço”. O Estado necessita avaliar para
selecionar, classificar, controlar e fiscalizar. Se a finalidade é medir a eficácia, a
relação entre custos e resultados, a avaliação precisa ser tratada como assunto de
primeiro escalão (MAUÉS, 2008, p. 90)
Portanto, o Brasil passaria a se adequar a essas orientações, com a implementação de
políticas públicas que estivessem associadas e/ou voltadas para o mercado de consumo de
serviços educacionais. Para isso utilizaria dois instrumentos importantes, a avaliação e o
currículo, pois “o governo apostava que a lógica do jogo do mercado poderia fazer com que a
população buscasse as escolas mais bem avaliadas para os seus filhos, pressionando todo o
sistema para uma melhoria da qualidade” (HADDAD, 2008, p. 11). Nesse conjunto de
reformas educativas, a política de avaliação na educação passou a ser implementada com
grande força e centralidade e se efetivou por meio da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996. No item seguinte abordaremos como aconteceu esse processo de implementação.
46
1.4 AS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS IMPLEMENTADAS NO BRASIL A
PARTIR DA DÉCADA DE 1990
Conforme visto anteriormente, no último quartel do século passado aconteceram
diversas mudanças no contexto internacional e nacional, e, após a implementação das
reformas econômicas nos países centrais, essas reformas se estenderam para os outros
continentes, como foi o caso da América Latina, durante as décadas de 1980 e 1990. Nesse
período o Brasil passa pela transição de um regime ditatorial para um regime democrático, em
que surge “um intenso movimento democrático” (VIEIRA, 2009, p. 129), de
redemocratização, que resultou na promulgação da Constituição Federal em 05 de outubro de
1988, conhecida também como a Constituição Cidadã, a qual apresentou como uma de suas
características “a presença do povo e a valorização da cidadania e da soberania popular”
(TÁCITO, 2002, p. 55).
Entretanto, conforme descreve Vieira e Farias (2011), essa democracia não foi fruto da
concessão do regime militar, mas, resultado de uma conquista que nasceu a partir da
mobilização dos movimentos sociais populares, que foram iniciados a partir do final da
década de 1970, com a greve dos metalúrgicos das cidades paulistas de Santo André (A), São
Bernardo do Campo (B) e São Caetano do Sul (C), que ficou popularmente conhecida como a
greve dos metalúrgicos do ABC paulista. Em seguida, outros movimentos sociais populares
foram surgindo, e assim eles
emergiram no contexto social e político brasileiro com uma fantástica capacidade
criativa, organizativa e mobilizadora, principalmente na década de 80, sendo
responsáveis por expressivas conquistas que garantem melhorias na qualidade de
vida de amplos setores sociais, afirmação de direitos e exercício da cidadania para
um número cada vez maior de agrupamentos humanos, construção de identidades
coletivas e auto-estima pessoal e social de setores e grupos historicamente
discriminados ou oprimidos (BRITO, 2005, p. 3).
Brito (2005) destaca o surgimento dos movimentos ligados às necessidades coletivas
relacionadas com a saúde, a moradia, o trabalho, dentre outros, com destaque para o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), para os movimentos relacionados
com a identidade coletiva, como o das mulheres, dos negros, dos portadores de necessidades
especiais, dos índios, dos grupos de orientação diferenciada, dentre outros. Na esfera escolar,
o movimento ocorre, segundo Vieira (2009),
simultaneamente ao processo de redemocratização do país, quando crescem as
reivindicações participativas, por parte de diversos atores sociais. Tais
circunstâncias geram pressões, por formas de operacionalização mais abertas e
eficazes, de políticas e de gestão educacional (VIEIRA, 2009, p. 35).
47
Nesse contexto de contradições, de mobilizações sociais, de falhas políticas e fortes
interesses do capital, o Brasil aprovou a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que
estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), as quais criaram uma série
de novas regulações, definidas por Beech (2009) e Vieira (2009) como um conjunto de
regulamentações, projetos e programas.
Para Frigotto (2010), a LDB sofreu várias modificações por sugestões de
parlamentares com tradição oligárquica. Por isso, diversos avanços nesta Lei foram alterados
ou retirados, transformando a LDB em uma matriz cultural escravocrata, oligárquica, elitista e
despótica. Contrário a essas modificações,
Florestan Fernandes, um dos parlamentares que mais se empenhou na defesa das
propostas dos educadores progressistas, representados num fórum permanente de 34
instituições científicas e sindicais da área, reiteradamente tem mostrado como as
forças conservadoras se opunham à promulgação de diretrizes e bases que
configurassem um amplo reforço à escola pública, laica e unitária (FRIGOTTO,
2010, p.169).
Mesmo diante dessas manobras políticas, a LDB foi implementada e apresentou as
seguintes regulações:
I - O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (FUNDEF), criado por meio da Lei nº 9.424/96, com objetivo de
assegurar a universalização do Ensino Fundamental e uma remuneração mais digna para os
profissionais do magistério. Em substituição ao FUNDEF, que teve dez anos de existência, é
criado o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (FUNDEB), por meio da Lei nº 11.494/2007, com vigência até o
ano de 2021, atingindo as creches, a pré-escola, a educação básica, o ensino médio, a
educação especial e a educação de jovens e adultos.
II - O Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado pela Lei nº 10.172/2001, com
vigência de 2001 até 2010, que trouxe diversos princípios, diretrizes, prioridades, metas e
estratégias de ação na perspectiva de melhorar a qualidade do ensino em nosso país.
III - O Programa Educação para todos, que teve como objetivo proporcionar uma
educação básica para todas as crianças com a finalidade de reduzir o analfabetismo entre os
adultos até ao final da década.
IV - Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que foram os documentos
elaborados nas áreas da Língua Portuguesa, da Matemática, de Ciências Naturais, da História,
da Geografia, da Arte e da Educação Física, com objetivo de realizar uma renovação e
reelaboração da proposta curricular. Além desses foram elaborados outros documentos que
48
abordavam a Pluralidade Cultural, a Orientação Sexual, o Meio Ambiente e a Saúde
(BRASIL, 1997).
V - As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação
Básica e de nível Superior, que foram criadas por meio da resolução do conselho nacional de
educação/conselho pleno, de 18 de fevereiro de 2002, com o objetivo de preparar os
professores para o ensino, para o acolhimento do trato da diversidade, para o exercício de
atividades de enriquecimento cultural, para o aprimoramento de práticas investigativas, para a
elaboração de projetos, o uso de tecnologias de informação e comunicação e o
desenvolvimento de hábitos para o trabalho de colaboração e em equipe.
VI – A instalação de uma política efetiva de avaliação no Brasil, instituída pelo
Sistema Nacional de Avaliação para a Educação Básica, criado por meio da Portaria nº 1.795,
de 27.12.1994, que formalizou a criação do Sistema de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), do Exame Nacional de Cursos, instituído por meio da Lei nº 9.131/1995, e do Exame
Nacional para Concluintes do Nível Médio, estabelecido por meio da Portaria nº 24, de 23 de
março de 2004, que instituiu o ENEM.
Com esse conjunto de regulações, em particular neste último item, temos a
implantação de um modelo hegemônico de avaliação. Nesse contexto, a educação, torna-se
um instrumento de disputa hegemônica, quando articula os interesses da classe dominante,
suas concepções, com os conteúdos curriculares na escola, conforme Frigoto (2010). A
hegemonia apresenta como uma de suas funções a articulação dos interesses particulares, em
prol dos interesses da sociedade, fazendo com que os interesses particulares se tornem
também interesses de toda a sociedade. Assim, devemos ter um olhar crítico quanto à
implementação desse conjunto de ações.
Todas as argumentações e análises apresentadas neste capítulo, no qual tratamos da
função do Estado na sociedade capitalista, bem como de suas crises e das reformas de Estado
que aconteceram no final do século passado, serviram para destacar o motivo de a avaliação
ter se tornado um instrumento importante nesse Estado neoliberal. Nosso objetivo é, a partir
dessas análises, aprofundar no capítulo seguinte como a avaliação tornou-se um instrumento
central nesta virada de milênio no mundo globalizado, assim como nas redes educacionais de
ensino do Brasil.
49
2 AS POLÍTICAS DE AVALIAÇÕES NO CONTEXTO INTERNACIONAL E
NACIONAL: BASES LEGAIS DA REGULAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA E
EXPERIÊNCIAS VIVIDAS
2.1 A AVALIAÇÃO EXTERNA COMO INSTRUMENTO DE PADRONIZAÇÃO DO
CONHECIMENTO EM DIVERSOS PAÍSES
Neste capítulo vamos analisar como aconteceu a implementação das políticas públicas
de avaliação no setor educacional, levando em consideração a realidade de diversos países
como os Estados Unidos da América do Norte, Inglaterra, França, Portugal, Espanha, Chile e
Brasil. Nosso objetivo ao apresentar tais realidades é identificar os diversos aspectos, sejam
eles positivos ou negativos, resultantes dessas experiências, para que possamos perceber os
efeitos concretos que essas avaliações têm provocado em suas realidades. Dentre esses
efeitos, destacamos o preparo dos alunos somente para realizarem as avaliações externas, a
competição e a concorrência entre as escolas, a punição, a discriminação e a segregação.
De acordo com Faria e Figueiras (2007), o instrumento avaliação era algo destinado
quase que exclusivamente aos formuladores de políticas e aos gerentes de escalões superiores
do governo nos Estados Unidos da América na década de 1960, portanto sem grandes
repercussões na década de 1970. Entretanto, nas duas décadas seguintes, a avaliação passou a
ser um instrumento principal para as reformas do Estado implementadas no setor público,
iniciando pelos países centrais15 (Estados Unidos, Inglaterra e França), depois pelos países
semiperiféricos (Portugal e Espanha) e por fim nos países periféricos (Chile e Brasil).
Nesse contexto, a avaliação foi destaque e ganhou centralidade também nas diversas
Conferências Sociais Internacionais de Educação durante a década de 1990, com destaque
para a Conferência Mundial sobre Educação para Todos realizada em Jontiem, Tailândia,
onde foi reforçada a importância dos sistemas de avaliações para avaliar os resultados das
aprendizagens, segundo Faria e Figueiras (2007).
15
De acordo com Kawasaki (1997), os países centrais se caracterizam por serem industrializados e por serem os
responsáveis pela grande parte das transações econômicas e financeiras do mundo. Já os países periféricos são
aqueles que vivem à margem dessas transações econômicas.
50
É importante destacar que diversos fatores contribuíram e contribuem para que a
política de avaliação fosse ganhando força ao longo dos anos; entre eles podemos citar como
principal o fator econômico, associado aos interesses das agências multilaterais de
financiamento, assim como as forças políticas e empresariais de cada país, que buscam
utilizar a avaliação como política educacional para que passem a transformar a educação em
mercadoria, lógica esta que vai predominar por meio da implantação dos sistemas de
avaliações nacionais.
Antes de comentar sobre a avaliação externa em diversos países, consideramos como
necessário o entendimento sobre os riscos dessas avaliações para as redes de ensino, escolas,
professores e alunos. Schwartzman (2011) classifica essa avaliação como de alto risco quando
afeta diretamente escolas, professores e alunos, no que diz respeito ao recebimento de verbas,
salários e ingressos na universidade. Entretanto, a mesma avaliação pode ser de baixo risco
para um país e de alto risco para outro, ou, de acordo com a rede de ensino, pode variar com o
nível de ensino em que está sendo aplicada. Nesse contexto, é importante entendermos em
que nível a avaliação se encontra nesses países que iremos comentar, para que tenhamos o
discernimento de perceber o que é melhor para o aluno, para o professor e para a escola, se
são apenas os resultados obtidos nessas avaliações ou a aprendizagem dos alunos.
Para descrever como aconteceu a implementação das políticas de avaliações nos
Estados Unidos, que compreende os anos de 1981 a 2001, e na Inglaterra, durante o Governo
de Margareth Teacher, recorremos a Afonso (2009), que fez um detalhamento sobre essa
política nesses países. Na França, consultamos como referências Levasseur (2005) e Emin
(2005), conforme detalhamento abaixo.
Estados Unidos da América
A avaliação externa foi uma política central nas reformas educacionais que aconteceu
neste país a partir da década de oitenta do século XX, em decorrência da divulgação dos
baixos índices de aprendizagem que os alunos norte-americanos estavam apresentando nos
testes internacionais relacionados com as disciplinas fundamentais. Como consequência desse
processo, foi elaborado um relatório chamado de “A Nation at Risk” (A nação em Risco), que
alcançou uma grande repercussão na opinião pública, sendo um fator determinante para a
discussão pública sobre a situação da educação nesse país, já que esses resultados
apresentavam um “indicador de vulnerabilidade nacional, face ao grau de desenvolvimento e
ao nível educativo de outros países industrializados” (RAMIREZ, 1992, p.413 apud
AFONSO, 2009, p.66).
51
A primeira reforma aconteceu durante a administração do presidente Ronald Wilson
Reagan, que governou durante os anos de 1981 a 1989. Segundo Afonso (2009), ela ocorreu
de forma esperançosa, entretanto, com os baixos resultados apresentados nas avaliações
internacionais dos alunos, aumentaram as preocupações dos grandes grupos econômicos com
a diminuição da competitividade dos Estados Unidos perante os outros países
industrializados.
Diante desse quadro conjuntural, o presidente Reagan recebeu o apoio dos governantes
estaduais, dos empresários, dos meios de comunicação e consequentemente da opinião
pública para divulgar a reforma educativa, que seria bem diferente dos anos anteriores, já que
passaria a ter um maior controle na avaliação e no currículo, tendo como características
principais promover a competição entre as escolas, estimulando as capacidades individuais e
seletivas, com o objetivo de melhorar a situação econômica e a produtividade da Nação.
Entretanto para House (1990 apud AFONSO, 2009), com o fim do segundo mandato de
Reagan, a avaliação externa passou a ser utilizada como instrumento de responsabilização em
vez de instrumento de diagnóstico.
Entre os anos de 1989 a 1993, a avaliação continuou sendo uma política educacional
valorizada, e assim começaram as discussões sobre a implantação de um novo sistema de
avaliação nacional, que contou com o apoio de grandes empresários, tendo em vista promover
a competição entre as escolas e realizar a prestação de contas com a sociedade.
Entretanto, durante os dois mandatos desse presidente, observamos que aconteceu um
retrocesso na democracia, e acentuou-se um modelo de educação mais elitista, deixando de
lado a preocupação com a aprendizagem e os problemas sociais, que acarretou como
consequência uma “uniformidade cultural, na privatização das escolas públicas e no apoio à
reorganização dos currículos em função dos interesses do mercado de trabalho” (GIROUX,
1992, p. 5 apud AFONSO, 2009, p. 69).
Já no governo do presidente Bill Clinton, que governou o país entre os anos de 1993 e
2001, existia uma grande esperança, ainda no início de seu mandato, pelo histórico de sua
filiação partidária democrata, de que seu governo pudesse romper com as políticas
educacionais que até então tinham sido implementadas, e que fosse dada uma ênfase na
questão da equidade e da diversidade, “porém, não passou muito tempo sem que a literatura
começasse a trazer indicações muito pouco optimistas em relação ao cumprimento destes
objectivos” (AFONSO, 2009, p. 69).
Passados vinte anos de análise sobre a política de avaliação na educação norteamericana, observamos que suas ações serviram de referência para outros países,
52
principalmente para os países da América Central e América do Sul. Entretanto, já podemos
encontrar relatos de autoridades educacionais americanas que questionam esse modelo, como
a educadora Diane Ravitch16, que trabalhou na gestão do presidente Bill Clinton no National
Assessment Governing Board, instituto responsável pelos testes federais. Antes, ela defendia
as reformas educacionais em que se dava grande destaque às metas e às avaliações externas, e
hoje essa educadora se mostra preocupada com a educação americana, pois, segundo ela, este
sistema educacional está preparando os alunos somente para realizarem as avaliações
externas.
Inglaterra
As reformas do Estado que aconteceram a partir da década de oitenta do século XX
influenciaram também o setor educacional durante o governo da primeira ministra Margaret
Hilda Thatcher. Dentre as diversas reformas podemos destacar a implementação de um
currículo nacional com ênfase em três disciplinas: inglês, matemática e ciências, assim como
a criação de um novo sistema de exames nacionais, como descreve Afonso (2009), com a
justificativa de informar aos pais o desempenho escolar dos alunos e a qualidade das escolas.
Diante das argumentações apresentadas, podemos entender que o objetivo principal foi
o mesmo adotado nos Estados Unidos, isto é, promover a competição e a concorrência entre
as escolas por meio dos sistemas nacionais de avaliações.
De acordo com Afonso (2009), nestes dois países a avaliação educacional foi umas das
principais áreas em que as mudanças se concentraram. O objetivo era aumentar os interesses
da empresa privada no sistema educativo público. Em decorrência dessa influência, a
educação passou a se tornar um instrumento de mercadorização, em que os índices
educacionais foram se tornando instrumentos principais para que se introduzisse a política de
quase-mercado na educação. De acordo com Souza e Oliveira, (2003) e Freitas (2007), essa
política se caracteriza pela introdução dos princípios e valores da iniciativa privada na
educação pública, tendo na avaliação externa um recurso para a difusão dessa cultura de
eficiência, de eficácia e produtividade. Portanto, essas duas nações passaram a reforçar a
adoção das políticas de diferenciação e estratificação, com vistas a apoiar o processo de
acumulação capitalista, pois, segundo Barroso (2005),
Nestes países o que está em causa não é uma simples alteração dos modos de
regulação pelo Estado, mas a substituição parcial da regulação estatal por uma
16
http://www.fiquealerta.net/2010/08/educacao-nao-as-avaliacoes-padronizadas.html
53
regulação de iniciativa privada através da criação de quase-mercados educacionais
(BARROSO, 2005, p. 733).
Nesse contexto, onde temos a educação se transformando em mercadoria em
decorrência dos índices adotados nos sistemas de avaliações, consideramos a presença de
alguns elementos essenciais decorrentes das avaliações externas, como o estabelecimento dos
índices, que tem a função de ranquear as escolas, promovendo a competitividade das
instituições escolares, abrindo espaço para a livre escolha dos pais ou responsáveis, portanto,
transformando a educação em mercadoria.
Nosso posicionamento diante dessa realidade é que não devemos estimular essa
competitividade, essa seletividade, essa discriminação, por meio das políticas de avaliações
externas, pois entendemos que se torna necessário o envolvimento de todos os agentes
educacionais na perspectiva de que possamos tomar a consciência de esclarecer a toda
sociedade escolar sobre o efeito negativo desse modelo de avaliação. Para tal, nossa
contribuição nesta pesquisa é analisar os efeitos que essa política pode causar sobre a
realidade escolar. Defendemos um modelo de avaliação que utilize diversos instrumentos e
que envolva todos os entes responsáveis, desde o governo federal, estadual e municipal,
passando pelos secretários de educação, diretores, coordenadores, professores, alunos e seus
responsáveis, e não somente centrado no professor e no desempenho dos alunos, isto porque:
Uma sociologia da avaliação deve abranger toda a variedade de actividades
avaliativas no contexto do sistema educativo, desde os julgamentos que os
professores fazem sobre cada aluno na sala de aula, até aos vários e mais formais
modos de julgar o processo dos alunos na escola como um todo, que possibilitam a
responsabilização do professor, da escola, das autoridades locais e, em última
instância, de todas as formas de provisão da educação a nível nacional
(BROADFOOT, 1981, p.198 apud AFONSO 2009, p.16).
França
De acordo com Levasseur (2005), que é chefe do departamento de avaliação do aluno,
órgão ligado ao Ministério da Juventude, da Educação Nacional e da Pesquisa, nas três
últimas décadas a avaliação como sistema educativo passou por vários processos e
modificações, e foi ganhando cada vez mais importância enquanto política educativa na
perspectiva de que estaria contribuindo para o sistema educativo ao permitir diagnosticar e
agir neste sistema, obtendo dessa forma um controle em todos os seus níveis.
No departamento que está sob a responsabilidade de Levasseur (2005), existem as
avaliações diagnósticas e as avaliações balanço, nome adotado pela França para as avaliações
externas. As primeiras se caracterizam por serem um instrumento utilizado para os
professores, enquanto as segundas são uma regulamentação do sistema educativo, cuja
metodologia da avaliação se caracteriza pela amostragem dos estabelecimentos de ensino,
54
com normas padronizadas e questões fechadas, que são aplicadas em alunos que estejam no
fim da escola primária e no fim do ensino fundamental, com intervalos de dois a cinco anos.
Seus objetivos servem para indicar aos responsáveis pelas políticas educativas se as metas
foram ou não alcançadas. Outra característica é que essas avaliações ocorrem em nível
nacional envolvendo os programas das disciplinas e os professores, levando em consideração
o contexto de ensino.
Em relação à divulgação dos resultados dessas avaliações, é elaborado um dossiê
completo que corresponde ao princípio da transparência com objetivo de colocá-lo à
disposição de todos os indivíduos que fazem parte do sistema educativo, informando, dentre
outros itens, as provas e as competências que foram avaliadas, assim como os resultados
apresentados e um comentário técnico elaborado por pedagogos sobre os resultados. Todas
essas informações servem para que sejam tomadas decisões de acordo com o grau de
responsabilidade relacionado com a ação pedagógica, isto é, no âmbito escolar e/ou em nível
nacional envolvendo os governantes. De acordo com Levasseur (2005), essa transparência
pode apresentar um risco para os agentes públicos e para as instituições, pois estes podem não
ter os meios necessários para que as decisões sejam tomadas, porém esta ação faz parte desse
processo participativo. Entretanto, além dos resultados nacionais que servem de referência,
não é dispensada a análise individual feita pelo professor sobre a turma (alunos); portanto
todos os indivíduos que fazem parte do sistema educativo francês são responsabilizados e
valorizados. Nesse contexto educacional, a avaliação torna-se
um revelador, uma alavanca de reflexão para o melhoramento da qualidade do
ensino e do sistema educativo, é uma ferramenta de auxílio na decisão de ir rumo à
vitória de todos os alunos e à vitória da escola (LEVASSEUR, 2005, p. 25).
Segundo Emin (2005), a maneira como a avaliação é tratada na França é resultado do
comportamento da sociedade, que é bastante questionadora, pois seus indivíduos querem
saber se os 7% do orçamento destinados para a educação são gastos com eficiência. Para isso,
torna-se essencial que o serviço público educacional seja o mais transparente possível.
De acordo ainda com Emin (2005), para que a divulgação dos resultados se torne
produtiva, estes não devem se limitar a estabelecer classificações entre os países, pois deve-se
levar em consideração um aspecto importante que é a especificidade de cada país, o resultado
da sua história, da sua cultura e das escolhas relacionadas aos aspectos políticos.
Ainda sobre os resultados das avaliações externas na França, existem leis que
determinam que não deva ser instigada a concorrência entre as instituições e os agentes do
sistema educativo. Esses resultados devem servir apenas como um instrumento para melhorar
55
esse sistema. Nesse contexto, observamos a preocupação das autoridades francesas com o
cuidado dos resultados, assim como sua divulgação pela mídia. Cuidado esse que
consideramos fundamental para preservar todos os agentes que fazem parte da escola.
Espanha
Após o comentário de como a avaliação externa aconteceu nos países centrais sob o
ponto de vista econômico, percebemos que não houve unanimidade de ações nessa política;
portanto podemos dizer que, a partir do exemplo francês, Espanha e Portugal (mesmo que no
início das ações mais democráticas) caminharam na mesma perspectiva, isto é, adotando um
modelo de avaliação que não servisse apenas aos interesses do acúmulo do capital, mas sim
preparando o indivíduo para uma formação mais humana. Para iniciarmos essas análises sobre
Portugal e Espanha, buscamos apoio também nas pesquisas de Afonso (2009).
Vamos comentar agora sobre o contexto em que as avaliações externas foram
implementadas na Espanha. Por volta do ano de 1982, o Partido Socialista Operário Espanhol
chegou ao poder com muitas expectativas para a realização de reformas consideradas
importantes. Em relação ao setor educacional, existia a proposta de uma valorização docente e
uma reforma atingindo todos os níveis de ensino, com vistas a garantir uma igualdade de
oportunidade, assim como de garantir uma participação democrática, entretanto, para a
realização de reformas, foram necessários recursos financeiros que não estavam garantidos
devido à crise que vinha atingindo todo o sistema capitalista.
Devido também aos fatores citados acima, somente em 1989 o governo lançou a lei
chamada de Libro Blanco para La Reforma del Sistema Educativo, que segundo Afonso
(2009), mesmo apresentando contradições e limitações, representava um esforço na
perspectiva de modernizar o sistema educativo.
Dentre as principais mudanças dessa reforma, tivemos a ampliação da escolaridade
básica, que se tornou obrigatória e gratuita até aos dezesseis anos, a adoção de uma nova
grade curricular, a melhoria da formação inicial e continuada dos docentes e um melhor
controle de fiscalização no setor educacional. Em relação à avaliação, sua função foi de
promover a regulação do processo educativo, envolvendo diversos agentes que faziam parte
do sistema educativo, os alunos, os professores, os programas e o sistema, não centrando
apenas a responsabilidade no professor e aluno. Foi adotado também um modelo de avaliação
contínua, respeitando e acolhendo a diversidade, não se limitando apenas a utilizar a avaliação
como instrumento de seleção de alunos. Portanto, por essas diversas características da
56
avaliação externa na Espanha, percebemos que este país caminhou no sentido oposto ao
modelo de avaliação externa adotado nos Estados Unidos e na Inglaterra.
Portugal
Nesse país, o modelo de avaliação adotado enquanto sistema foi o da avaliação
formativa, aprovado em 1986 pela Lei de Bases do Sistema Educativo. Segundo Afonso
(2009), essa lei estava muito distante da política neoliberal que surgia no contexto
internacional. Dentre as características dessa lei podemos citar a promoção escolar contínua
dos alunos, o maior investimento na educação com vistas a garantir uma educação menos
seletiva e mais justa.
Entretanto, com a criação da união europeia, as ideias neoliberais se propagavam por
todo o continente e atingiram também o setor educacional no período compreendido entre
1985 e 1995, com a presença de um governo de centro-direita. Nesse contexto, o modelo de
avaliação formativa proposto inicialmente era incerto, pois estava em jogo também a questão
da retenção escolar, da garantia aos direitos sociais e culturais, principalmente dos alunos
excluídos.
Portanto, o sonho de uma escola básica democrática teve que ser adiado, devido às
condições para a aplicação de um novo modelo de avaliação, que não foram disponibilizadas.
Nesse contexto, surge uma grande pressão de grupos políticos e sociais que defendiam um
modelo de avaliação com características seletistas e meritocráticas, típicas das avaliações
externas adotadas nos Estados Unidos e Inglaterra.
Diante desse cenário, podemos perceber que a intenção de se criar uma lei com vistas
a implantar o modelo de avaliação formativa teve como óbice a posse de um governo com
tendências neoliberais, que estrategicamente mudou o foco das políticas educativas
democráticas para uma política que defendia um “maior controle sobre os resultados/produtos
da educação escolar, e com a promoção da seletividade, da competição e do mercado
educacional” (AFONSO, 2009, p. 83).
As análises sobre como uma proposta de avaliação formativa foi implementada em
Portugal, mesmo com diversas dificuldades, levam-nos a nos esforçarmos sempre por meio de
estudos, das fundamentações, das argumentações e das socializações com a categoria de
professores e outros agentes da escola pública, para que seja colocado em prática um modelo
de avaliação mais amplo e justo, pois
É nesse sentido que pode ser pensada (como utopia realizável) uma avaliação
formativa que articule os interesses do Estado e da Comunidade, vise altos padrões
57
de qualidade científica e democrática na escola básica, valorize a autonomia
profissional dos professores, e recupere para o processo pedagógico novas formas
participação, de solidariedade e de reciprocidade (AFONSO, 2009, p. 85).
Após essa breve análise sobre os continentes da América do Norte e Europeu, vamos
iniciar nossa análise em dois países da América do Sul, o Chile e o Brasil. De acordo com
Faria e Figueiras (2007), apesar das especificidades de cada país, as reformas educacionais
que acontecerem no continente sul-americano apresentaram algumas características em
comum, dentre elas podemos citar a grande atenção na educação básica, a descentralização
dos sistemas e o aumento do setor privado nesta área educacional. Em relação à avaliação,
esta passou a fazer parte da agenda principal dos governos e ganhou força por meio da
sensibilização dos formadores de opinião e da geração de um consenso sobra a necessidade da
implantação desse sistema.
Chile
Para relatar sobre como as reformas aconteceram no Chile, recorremos à pesquisa de
Gentili (2001), pois, de acordo com o autor, dentre as diversas reformas educacionais
colocadas em prática na América Latina, as reformas educacionais ocorridas no Chile
representaram o melhor exemplo de como os princípios da qualidade total foram colocados
em prática em maior intensidade em relação aos outros países do continente. Neste país,
tivemos como reformas principais a descentralização das escolas primárias e pré-primárias
para os municípios, a transferência das escolas técnicas de nível médio para as entidades
privadas e a criação de linhas de crédito para custear as escolas particulares subsidiadas.
De acordo com os dados estatísticos da educação chilena, após dez anos de
implantação desse modelo educacional, tínhamos, em 1991, 31,9% de alunos da educação
básica estudando em escolas privadas que recebiam apoio estatal, e no ensino médio o
percentual era de 40,9%. De acordo com Gentili (2001), esses dados estavam em pleno
crescimento e, caso não tivesse ocorrido nenhuma alteração nessa taxa, provavelmente esse
percentual ultrapassaria os 50% de alunos matriculados nas escolas particulares.
Nesse contexto educacional, temos a implantação do Sistema de Medição da
Qualidade do Ensino (SIMCE), implantado ainda durante a ditadura militar de Pinochet em
1988. Esse sistema de avaliação tinha como objetivo melhorar a qualidade da educação,
entretanto a “retórica da qualidade se inscreve na ofensiva antidemocrática que os setores
neoconservadores levam a cabo contra a escola pública e contra o direito à educação das
maiorias” (GENTILI, 2001, p. 159).
58
De acordo com a pesquisa de Faria e Figueiras (2007), o SIMCE apresenta como
características ser um sistema de avaliação censitário, entretanto não avalia escolas que
estejam em locais isolados e que tenham turmas com menos de dez alunos. Os resultados
dessas avaliações são divulgados amplamente em toda a sociedade por meio da imprensa, em
jornais nacionais, regionais e locais.
Sua aplicação ocorre anualmente, em séries alternadas, sendo que em um ano a série
avaliada é a quarta série do ensino fundamental e no outro a série avaliada é a oitava série, e
ainda no terceiro ano a série avaliada é a segunda série do ensino médio. As provas
inicialmente eram objetivas, de múltipla escolha, além de uma redação, e testam o
conhecimento em matemática e espanhol para todos os alunos, sendo que é realizada também
uma prova que testa os conhecimento em ciências naturais e ciências sociais para 10% de
alunos do ensino básico. No ensino médio é recolhida uma amostra de provas realizadas nas
áreas de física, química e biologia.
Em 1999, foram introduzidas perguntas abertas e um questionário contendo questões
relacionadas à autoestima dos alunos, dentre outros aspectos. Além dos alunos, os professores
e os pais também preenchem um questionário. Após a divulgação dos resultados, “os
estabelecimentos que têm melhores pontuações no SIMCE recebem um acréscimo no
financiamento público a título de incentivo, assim como seus professores recebem um
incentivo financeiro” (WEINSTEIN, 2001 apud FARIA e FIGUEIRAS, 2007, p. 348).
A forma como a política de avaliação é conduzida neste país passou a ganhar elogios
das instituições internacionais. Gentili (2001) utiliza um trecho do texto da Comissão
Econômica para a América Latina (CEPAL), Comissão essa ligada à Organização das Nações
Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), no qual se fazem referências às
reformas educacionais no Chile. O documento diz:
o modelo chileno é o que melhor soube resolver, desta perspectiva, o problema da
qualidade no campo educacional. Sua lógica foi implacável e bem sucedida:
somente há qualidade quando o mercado opera em todo e qualquer espaço de ação
pedagógica, em todo e qualquer nível de decisão política, em todo e qualquer dos
infinitos fragmentos em que se transformou aquilo que, uma vez, chamou-se “escola
pública” (GENTILI, 2001, p.169).
Fica comprovada nesse discurso a lógica de qualidade que estão propagando, por meio
das avaliações externas, instituições como a UNESCO e CEPAL, uma lógica totalmente
atrelada ao mercado.
Romàn (1999), apud Faria e Figueiras (2007), aponta uma série de efeitos negativos
decorrentes do SIMCE, dentre eles podemos citar os mais graves como a premiação, a
punição, a discriminação e a segregação, que se manifestam nas escolas por meio da expulsão
59
de alunos que apresentam problemas de aprendizagem e baixos rendimentos nas avaliações.
Outro efeito negativo citado pelos autores é a distorção e a limitação dos currículos, uma vez
que as escolas voltam suas atenções somente para as disciplinas que são avaliadas no SIMCE.
No contexto chileno, o sistema de avaliação da educação é considerado pelos especialistas
como sendo de alto risco por proporcionar consequências fortes para as escolas, professores e
alunos.
Como consequência da centralidade que a política de avaliação passou a ter no Chile,
surgiu o interesse de outras instituições, mais especificamente das instituições privadas, que
se sentiram estimuladas a ingressarem nesse ramo da avaliação. Assim, no ano de 2000, o
Centro de Investigación y Desarrolo de La Educación (CIDE) passou a realizar avaliações
externas procurando atingir os aspectos que não eram levados em consideração pelo SIMCE.
Dessa forma, “a avaliação já se transformou em serviço no mercado educacional do país para
aqueles estabelecimentos ou empresas que podem custeá-lo” (FARIA e FIGUEIRAS, 2007,
p.354).
Após todas essas análises, apresentamos um quadro com o objetivo de sintetizar os
diversos aspectos que consideramos positivos e negativos quanto à avaliação no contexto
internacional.
Quadro 2. Aspectos positivos e negativos das avaliações externas no contexto
internacional
Aspectos positivos adotados pela França e
Espanha
_ Quando os resultados das avaliações servem
como indicador aos responsáveis das políticas
educativas se as metas foram ou não alcançadas.
_ Quando avalia e envolve todos os agentes
envolvidos do processo: alunos, professores e
governantes.
_ Utiliza um modelo de avaliação contínua
(envolvendo professores, alunos e o próprio
sistema educativo), respeitando e acolhendo a
diversidade, não se limitando apenas em utilizar a
avaliação como instrumento de seleção de alunos.
Aspectos negativos adotados pelos Estados Unidos
da América do Norte, Inglaterra e Chile
- Prepara os alunos somente para realizarem as
avaliações externas.
- Quando os resultados servem para estimular a
competição e a concorrência entre as escolas.
- As escolas e professores que apresentam melhores
resultados nas avaliações recebem incentivo
financeiro.
- Professores e alunos que não se destacam nessas
avaliações passam a sofrer uma série de retaliações,
como a punição, a discriminação e a segregação.
Fonte: Elaborado pelo autor da pesquisa
No contexto das avaliações externas, percebemos claramente o interesse da lógica de
mercado que estamos abordando desde o início deste texto. A partir dos diversos aspectos
apresentados nessas realidades educacionais, iniciaremos nossos comentários sobre a
avaliação externa no contexto educacional brasileiro.
60
2.2 A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Constatou-se que foram necessárias mais ou menos cinco décadas para que a
avaliação (externa, em larga escala, centralizada e com foco no rendimento dos
alunos e no desempenho dos sistemas de ensino) viesse a ser introduzida como
prática sistemática no governo da educação básica brasileira. O interesse estatal pela
avaliação, mesmo presente desde os primórdios da pesquisa institucionalizada e do
planejamento educacional no Brasil (anos de 1930), somente ao final dos anos de
1980 culminou no delineamento de um sistema nacional de avaliação, que propunha
articular medida, avaliação e informação educacionais e estas ao planejamento da
área (FREITAS, 2007, p. 51).
A avaliação em larga escala no Brasil não é novidade, porém foi a partir da década de
1990, conforme visto anteriormente, que a avaliação externa ganhou força e passou a ter uma
centralidade por parte do governo federal. Nesse contexto, destacamos o levantamento
histórico bastante primoroso feito por Freitas (2007) sobre o sistema de avaliação brasileiro,
que teve início em 1930 do século XX, em pleno Estado Novo, pois, já nesse período, o Brasil
demonstrava interesse em quantificar a educação, e esse interesse se manifestou pela criação
do Instituto Nacional de Pedagogia (INEP) em 1937. No ano seguinte, em 1938, de acordo
com Mendonça (2005), esse Instituto passou a se chamar Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (INEP), e, por meio do Decreto-Lei nº 580, de 30 de julho de 1938, passou a ter
diversas atribuições, como: organizar documentos históricos referentes às doutrinas técnicas
pedagógicas; fomentar o intercâmbio pedagógico com as instituições educacionais do país e
do exterior; promover pesquisa na área da psicologia aplicada à educação, prestar assistência
técnica aos serviços estaduais e municipais; divulgar conhecimentos referentes à teoria e à
prática pedagógica, dentre outras.
Durante as décadas de 1940, 1950 e início da década de 1960, as pesquisas
continuaram tendo como foco a avaliação da aprendizagem. No período compreendido entre
1964 e 1970, as pesquisas sobre avaliação realizadas na área educacional não apresentavam
metodologias que tivessem cunho científico. Entre os anos de 1970 e 1976, é que surgiram
estudos voltados para a elaboração do currículo e avaliação de cursos e programas, sendo
estes financiados pelo INEP. É importante destacar que, em 1972, o INEP passou a se chamar
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, sendo transformado em órgão
autônomo.
Atualmente o INEP mantém o mesmo nome de 1972, e com a aprovação da Lei nº
9.448, de 14 de março de 1997, esse órgão passou a integrar a estrutura do Ministério da
Educação (MEC), transformado-se em Autarquia Federal vinculada a esse Ministério, com
sede e foro na cidade de Brasília (DF), tendo como finalidades: organizar e manter o sistema
61
de informações e estatísticas educacionais; planejar, orientar e coordenar o desenvolvimento
de sistemas e projetos de avaliação educacional, visando ao estabelecimento de indicadores de
desempenho das atividades de ensino no País; apoiar os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios no desenvolvimento de sistemas e projetos de avaliação educacional; desenvolver
e implementar, na área educacional, sistemas de informação e documentação que abranjam
estatísticas, avaliações educacionais, práticas pedagógicas e de gestão das políticas
educacionais; subsidiar a formulação de políticas na área de educação, mediante a elaboração
de diagnósticos e recomendações decorrentes da avaliação da educação básica e superior;
coordenar o processo de avaliação dos cursos de graduação, em conformidade com a
legislação vigente; definir e propor parâmetros, critérios e mecanismos para a realização de
exames de acesso ao ensino superior e promover a disseminação de informações sobre
avaliação da educação básica e superior.
O MEC, por meio do INEP, é quem direciona a política de avaliação, que engloba uma
série de avaliações externas atingindo todos os níveis de ensino, do superior ao ensino
fundamental. Para Gatti, Barreto e André (2011, p. 39), a implementação do Sistema de
Avaliação foi “motivada pela necessidade de incrementar o controle da educação nacional por
parte do governo central”. Nesse contexto, vamos ter o ENADE, instituído em 2004, que
avalia as Instituições Superiores, os cursos e os estudantes. Na educação básica, vamos ter o
ENCCEJA, o ENEM, a Prova Brasil (ANRESC) criada em 2005 e mais recentemente a
Provinha Brasil, aplicada pela primeira vez em 2008. O foco de nossa pesquisa está
concentrado na Prova Brasil, mas isso não impede que façamos um breve comentário sobre as
demais avaliações externas, na perspectiva de saber quais são e a quem estão direcionadas.
Vamos começar pelo ENCCEJA, que é uma avaliação externa criada em 2002,
realizada anualmente e que avalia as habilidades e competências básicas dos jovens e adultos
que não frequentaram a escola em idade apropriada. Nesta avaliação, o candidato se submete
a uma prova e, alcançando o mínimo de pontos exigido, obtém a certificação de conclusão
daquela etapa educacional a que se submeteu. As Secretarias Estaduais e Municipais é que
escolhem a adesão a esse sistema de avaliação, sendo portanto opcional, e ao aderirem as
certificações dos alunos são feitas diretamente nessas Secretarias Municipais e Estaduais de
Educação.
O ENEM, criado em 1998, pode ser utilizado pelas universidades de forma
complementar ou em substituição aos processos seletivos para o ingresso do aluno ao ensino
superior. De acordo com o MEC, os objetivos do ENEM são o de democratizar as
62
oportunidades de acesso às vagas federais de ensino superior, assim como de possibilitar a
mobilidade acadêmica e induzir a reestruturação dos currículos do ensino médio.
A Prova Brasil, criada em 2005, objeto de estudo desta pesquisa, será profundamente
comentada e analisada mais adiante, porém podemos adiantar que se trata de uma avaliação
externa, aplicada aos alunos da quarta série e oitava série do ensino fundamental, e que tem o
foco definido em duas áreas do conhecimento: língua portuguesa e matemática.
Por fim, temos a Provinha Brasil, que é uma avaliação externa aplicada aos alunos
regularmente matriculados no segundo ano do ensino fundamental com provas de português e
matemática. Sua primeira aplicação aconteceu no ano de 2008. Verificamos, portanto, que
essas duas avaliações, a Prova Brasil e a Provinha Brasil, são aplicadas no ensino
fundamental. Nesse contexto, observamos o quanto a avaliação externa ganhou a centralidade
como política educacional, questão essa que a todo momento estamos reafirmando nesta
pesquisa, por conta dos interesses que justificamos no primeiro capítulo.
Um estudo sobre esses exames pode ser feito a partir dos documentos no site do
MEC17, do qual retiramos as informações do ENCCEJA, do ENEM e da Provinha Brasil. Já
para a Prova Brasil, também utilizamos este site, porém ampliamos nossas pesquisas em
outros documentos, como em Brasil (2008) e nas portarias que tratam especificamente sobre
esta avaliação. A partir do resgate histórico do processo de implantação dos sistemas de
avaliações em diversos países e no Brasil, iniciaremos a seguir as análises sobre como a
política de avaliação apareceu na legislação brasileira.
2.3 A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO PRESENTE NA LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL
BRASILEIRA
Neste tópico vamos abordar como a política de avaliação da educação básica é tratada
sob o aspecto normativo jurídico-legal e político-administrativo na Constituição Federal de
1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), na Lei 10.172, de 9.1.2001,
no Projeto de Lei nº 8.035, de 2010, que se refere ao Plano Nacional de Educação (PNE) e nas
Portarias referentes à Prova Brasil.
Segundo Freitas (2007),
No Brasil, o período 1988-2002 registrou a criação, a institucionalização, o
desenvolvimento e a consolidação do SAEB, tendo este somado com a instituição de
exames nacionais e com a montagem de um sistema nacional de informação
educacional, viabilizado com a revisão metodológica das estatísticas educacionais e
17
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content;view=article;id=12485;Itemid=784
63
com inovações possibilitadas pela informatização de dados da educação (FREITAS,
2007, p. 63).
Para essa autora (FREITAS, 2007, p. 2), a avaliação externa, que ela denomina de
larga escala, se firmou como uma “ação educativa estatal na regulação da educação básica
brasileira”, já que esses quatorze anos contribuíram para essa solidificação, porém, a cada
ano, novas portarias e resoluções são elaboradas como forma de aprimorar essa política do
governo federal, pois, de acordo com Freitas (2007), o Estado utiliza-se de diversos
mecanismos, dentre eles o normativo jurídico-legal e o político-administrativo, para efetivar a
regulação da política de avaliação. A seguir vamos apresentar, de acordo com o nosso ponto
de vista, onde esses aspectos da avaliação foram aparecendo nesses documentos. Entretanto,
queremos ressaltar que, durante a realização das análises desses documentos, utilizamos como
instrumento de pesquisa a análise de conteúdo de documentos, pois consideramos que,
conforme Franco (2008),
O ponto de partida da Análise de Conteúdo é a mensagem, seja ela verbal (oral ou
escrita), gestual, silenciosa, figurativa, documental ou diretamente provocada.
Necessariamente, ela expressa um significado um sentido. Sentido que não pode ser
considerado um ato isolado (FRANCO, 2008, p.19).
No contexto da avaliação de uma política pública, no caso específico desta pesquisa,
na qual pretendemos desvelar as estratégias, a ideologia, os significados e as implicações da
política de avaliação externa no cenário educacional brasileiro, entendemos que, por meio da
análise dos documentos, “o investigador ao ler ou ouvir um discurso [...], deve ser
capaz de poder compatibilizar o conteúdo do discurso (lido ou ouvido) com alguma,
ou algumas, teorias explicativas. Assim, poderá descobrir se está lidando com
abordagens do tipo “construtivistas”, “neoliberais”, “behavioristas”; “positivistas”,
estruturalistas”, “dialéticas”, “críticas”, e outras (FRANCO, 2008, p. 30).
Essas análises foram importantes para que pudéssemos
identificar o encadeamento sócio-político das propostas e de suas estratégias de
implementação, em face dos objetivos explicitados. Permite tomar em consideração
o contexto sócio-político-econômico no qual a política setorial é formulada e
implementada [...] Tem como objetivo contribuir para a explicitação do texto escrito
e do seu discurso ideológico, buscando esclarecer os significados e implicações das
proposições consubstanciadas nas diretrizes, estratégias e linhas de ação da política
examinada[..] Assim a análise documental deve contribuir, também, para a
interpretação dos resultados apresentados nos vários tipos de relatórios (BELLONI
ET AL, 2007, p.55).
A partir do respaldo da análise de conteúdo dos documentos, iniciamos pela
Constituição Federal de 1988 as análises sobre os aspectos relacionados com a avaliação
externa.
64
2.3.1 Como a avaliação externa é tratada na Constituição Federal de 1988
É importante destacar que no texto inicial da Constituição Federal, em 1988, não
constava um artigo específico sobre a avaliação externa. Esse interesse aparece no artigo 3º da
Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, no seu inciso I, § 3º, que faz referência à
necessidade de assegurar e regular por meio da avaliação periódica externa a qualidade dos
serviços prestados pela administração direta e indireta. É nesse contexto de pós-reforma de
Estado brasileiro que a avaliação externa emerge no texto constitucional de 1988.
Para Freitas (2007), o problema da avaliação educacional na Constituição Federal de
1988, quando se refere à garantia do padrão de qualidade, deve ser questionado, pois, segundo
a autora, este figura como um dos princípios básicos da educação, portanto esses
questionamentos devem perpassar sobre o conceito de qualidade a partir de que ótica, assim
como esclarecer para quem, para que, como e a partir de qual padrão e como essa qualidade
deve ser estabelecida. Esses aspectos não estão definidos concretamente na Constituição
Federal de 1988.
Diante das controvérsias e dos objetivos de como a avaliação externa foi
implementada e vem sendo conduzida no cenário educacional, tanto internacional quanto
nacional, chamamos a atenção para o Artigo 205, que diz o seguinte:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
(BRASIL, 1988, p. 34).
Entendemos que a educação, por possuir diversos objetivos, como o de exercício da
cidadania e da qualificação para o trabalho, deve contribuir também para o pleno
desenvolvimento da pessoa, e não o contrário. Porém, ao enfocar o artigo 205, queremos
questionar se esse pleno desenvolvimento está sendo respeitado pelas avaliações externas. Até
o momento, o que temos visto, com base nas experiências internacionais e nacionais,
conforme a pesquisa de Sousa e Arcas (2010), é que esse direito constitucional não está sendo
respeitado, uma vez que essas avaliações centralizam a formação, seja do professor seja do
aluno, apenas em algumas áreas do conhecimento, limitando, portanto, o pleno
desenvolvimento da pessoa.
Outro questionamento que fazemos é quanto ao artigo 210 da Constituição Federal de
1988, em que é assegurado o
respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais, porém, devido
à
padronização das avaliações externas, entendemos que a liberdade para os docentes
65
trabalharem nessa perspectiva de respeito a esses valores não está sendo considerada, pois
existe toda uma pressão em cima de determinados conteúdos específicos ou áreas do
conhecimento, que geralmente estão centrados na língua portuguesa e na matemática, com
exclusão da história, da geografia, da arte, da educação física e da música. Entendemos que,
dessa maneira, não será possível formar uma cidadania plena a partir de valores artísticos,
culturais, nacionais e regionais quando a escola está se ocupando mais acentuadamente tão
somente dos conceitos da língua portuguesa e da matemática.
Já no artigo 3º da Emenda Constitucional nº 14, de 12/9/1996, referente ao
destacamos no
Artigo 211,
§ 1º a garantia do padrão mínimo de qualidade, porém, neste artigo, não fica definido em que aspecto
essa qualidade deve ser oferecida. Não estando clara essa definição, entendemos que essa generalidade na lei abre espaço
para a qualidade defendida pela UNESCO e CEPAL, conforme visto anteriormente, em que temos uma qualidade atrelada à
lógica de mercado, que estimula a concorrência, a competição e a seletividade, dentre outros aspectos. E essa melhoria da
qualidade do ensino é reforçada também no artigo
4º da Emenda Constitucional nº 59, de 11/11/2009,
referente ao artigo 214 da Constituição Federal.
Brasil (2006) destaca que mais importante do que gerir a qualidade na educação é
fundamental sua definição e explicitação. Nesse contexto, encontramos na publicação do
INEP-MEC de 2004, chamada de Os indicadores da Qualidade na Educação, sete dimensões:
o Ambiente Educativo; a Prática Pedagógica; a Avaliação; a Gestão Escolar Democrática; a
Formação e Condições de Trabalho dos Profissionais da Escola; o Ambiente Físico Escolar; e
o Acesso, a Permanência e Sucesso na Escola. Sendo assim, vamos comentar agora sobre os
aspectos que estão relacionados a cada uma dessas dimensões.
Em relação ao ambiente educativo, espera-se que a escola seja um espaço que
promova o ensino e a aprendizagem dos alunos, que possa proporcionar a vivência de valores
da nossa sociedade, promover a socialização, o respeito, a amizade, a solidariedade, dentre
outros aspectos.
Sobre a prática pedagógica, espera-se que o professor desenvolva com seus alunos
uma ação planejada para que possa alcançar um dos maiores objetivos dessa ação que é fazer
o aluno aprender de forma significativa e com autonomia. Para tanto, torna-se necessário que
o professor consiga identificar o que os alunos já sabem e o que precisam ainda saber,
portanto é fundamental observar, conhecer, compreender as diferenças, identificar os
interesses dos alunos, conhecer suas dificuldades e suas potencialidades.
A dimensão da avaliação torna-se um elemento fundamental do processo educativo e
deve envolver toda a comunidade escolar, diretores, coordenadores, professores e alunos. A
avaliação deve ser um instrumento participativo. É por meio dela que o professor consegue
66
identificar como está ocorrendo a aprendizagem dos alunos, quais instrumentos e aspectos
estão sendo utilizados e avaliados, para que de acordo com o nível de aprendizagem o
professor possa ter parâmetros sobra sua prática pedagógica.
Sobre a gestão escolar democrática, esta deve ocorrer de modo que as decisões e as
informações aconteçam de forma compartilhada, com o envolvimento dos pais, dos alunos,
dos professores e demais funcionários de maneira transparente e participativa.
No que diz respeito à formação e condições de trabalho dos profissionais da escola,
deve ser garantida a formação continuada dos professores, assim como salários dignos e
condizentes com a grande função e importância típicas do magistério.
Em relação ao Ambiente Físico Escolar, este deve ser limpo, organizado, arejado,
seguro e equipado com diversos recursos pedagógicos na perspectiva de proporcionar aos
professores, alunos e demais servidores um espaço aconchegante, criativo e motivador.
Todos esses aspectos devem priorizar a última dimensão que é o acesso, a
permanência e o sucesso do aluno na escola, para que este possa concluir cada etapa de ensino
na idade adequada. Qualidade na educação, como acabamos de apresentar, não deve ser e não
é somente o desempenho dos alunos nos resultados das avaliações externas, existem outros
aspectos ou dimensões que devem ser levados em consideração.
É importante que seja estabelecido o debate sobre a melhoria da qualidade do ensino
considerando as dimensões acima que, dentre os objetivos propostos, perpassam pela
melhoria das escolas, das condições de trabalho da carreira docente, independentemente do
nível de ensino, e da aprendizagem dos alunos.
Precisamos esclarecer mais este conceito de qualidade na educação, pois não
concordamos com fato de que o INEP, ao criar o Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica18 (IDEB), adote esse índice para todas as escolas do Brasil, sabendo da diversidade
regional, cultural e socioeconômica existente no país. Isso porque temos escolas bem
estruturadas em todos os aspectos, com um plano de carreira docente, mas também escolas em
condições precárias sendo avaliadas por um mesmo índice.
Conseguimos vivenciar tais realidades, ao trabalhar na aplicação da Provinha Brasil
em 2010 e na Prova Brasil em 2011, quando constatamos essas diferentes realidades nas
escolas federais, estaduais e municipais, inclusive realidades bem diferentes na mesma rede
de ensino, conforme comentários que faremos adiante.
18
índice este, que iremos comentar mais detalhado adiante.
67
Por ser a educação dever do Estado, este, ao propor no artigo 37 a eficiência como um
dos seus princípios e assim contribuir para o pleno desenvolvimento da pessoa, deveria
também priorizar e colocar em prática efetivamente essa obrigação, além de oferecer a todas
as escolas públicas, independentemente da esfera de atuação (federal, estadual ou municipal),
o mesmo nível de infraestrutura, de trabalho e aprendizagem para os docentes e discentes.
Somente após essa igualdade de condições é que deveriam ser implantadas as avaliações
externas, pois atualmente todas as escolas estão sendo avaliadas pelo mesmo parâmetro
(IDEB). Portanto, ao se falar de qualidade na educação, esta deve ter como referência aquelas
instituições que possuem pelo menos boa qualidade de trabalho e remuneração docente, boas
condições de segurança e de instalações físicas, com diversos espaços que possam contribuir
para a aprendizagem dos alunos.
2.3.2 O tema avaliação nos aportes legais: na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), no Plano Nacional de Educação19 (PNE) e no Projeto de Lei nº
8.035 de 2010
Conforme visto no primeiro capítulo, o Brasil aprovou a Lei 9.394, de 20 de dezembro
de 1996, que estabeleceu a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a qual
criou uma série de regulamentações, projetos e programas. Segundo Beech (2009), podemos
dizer que foi o início da regulação da educação brasileira. Na LDB, vamos encontrar no Título
IV, que trata da organização da educação nacional, no artigo 9º, a incumbência da União em
elaborar o Plano Nacional de Educação (PNE), em regime de colaboração com os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios. Dentre as diversas prioridades dessa lei, encontramos no
item VI a garantia do processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino
fundamental, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino.
Porém, assim como na Constituição Federal de 1988, na LDB e nos demais documentos que
iremos analisar, não fica bem esclarecido de que forma essa melhoria da qualidade do ensino
vai se materializar. Reiteramos que falta nesses documentos um posicionamento a partir de
uma matriz teórica sobre a qual qualidade esses documentos se referem. Nesse contexto,
novamente recorremos a Freitas (2007), que problematiza essa qualidade a serviço de quem,
para quê e como estabelecê-la.
19
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10172.htm
68
O PNE, que foi criado por meio da Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001, para o decênio
2001-2010, possui sete artigos. No artigo 4o, fica definido que a União instituirá o Sistema
Nacional de Avaliação e estabelecerá os mecanismos necessários ao acompanhamento das
metas constantes do Plano Nacional de Educação.
Para cada nível de ensino foi estabelecido um conjunto de diagnósticos, diretrizes,
objetivos e metas. Portanto neste documento vamos procurar destacar a questão da avaliação
para o nível de ensino correspondente da Educação básica.
Nas diretrizes ficaram estipulados a consolidação e o aperfeiçoamento do Sistema de
Avaliação da Educação Básica (SAEB).
Nos objetivos e metas, encontramos no item nº 26 o seguinte texto: “Assegurar a
elevação progressiva do nível de desempenho dos alunos mediante a implantação, em todos
os sistemas de ensino, de um programa de monitoramento que utilize os indicadores do
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica e dos sistemas de avaliação dos Estados e
Municípios que venham a ser desenvolvidos”.
Já no Projeto de Lei nº 8.035, de 201020, encontramos um documento mais estruturado
no que diz respeito à avaliação da educação básica, pois, neste projeto de Lei, que foi
constituído de doze artigos, vamos ter no seu artigo segundo dez diretrizes que têm os
seguintes objetivos:
I – Erradicar o analfabetismo;
II – Universalizar o atendimento escolar;
III – Superar as desigualdades regionais;
IV – Melhorar a qualidade do ensino;
V – Formar para o trabalho;
VI – Promover a sustentabilidade socioambiental;
VII – Promover o aspecto humanístico, científico e tecnológico do País;
VIII – Estabelecer metas de aplicação de recursos públicos em educação como
proporção do produto interno bruto;
IX – Valorizar os profissionais da educação; e
X – Difundir os princípios da equidade, do respeito à diversidade e a gestão
democrática da educação.
Como anexo, temos vinte (20) metas e cento e sessenta e nove (169) estratégias. A
meta que trata especificamente da avaliação da educação básica é a meta nº 7, que vem
20
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content;view=article;id=16478;Itemid=1107
69
reforçando a necessidade de se atingir as médias nacionais para o Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica (IDEB), índice este que comentaremos mais adiante.
Na meta nº 7, há um reforço da necessidade da avaliação nas estratégias 7.1, 7.2, 7.3,
7.4, 7.24 e 7.25.
Na estratégia 7.1 o documento vem reforçando a necessidade de formalizar e executar
as ações articuladas objetivando alcançar as metas de qualidade estabelecidas para a educação
básica pública, por meio de estratégias de apoio técnico e financeiro procurando melhorar a
gestão educacional, a formação dos professores e os serviços de apoio escolar.
Na estratégia 7.2 fica bem definida a necessidade de se fixar, acompanhar e divulgar
bienalmente os resultados do IDEB das escolas da rede pública da educação básica e dos
sistemas de ensino da União, dos Estados e Municípios.
A estratégia 7.3 destaca a necessidade de se prestar assistência técnica e financeira
entre os entes, com vistas a priorizar as redes de ensino com IDEB abaixo da média nacional.
A estratégia 7.4 vem reforçar a necessidade de se aprimorar os instrumentos de
avaliação da qualidade do ensino fundamental e médio, com destaque para a inclusão do
ensino de ciências nos exames finais do ensino fundamental.
A estratégia 7.24 destaca a necessidade de orientar as políticas das redes e sistemas de
educação na perspectiva de atingir as metas do IDEB, procurando reduzir a diferença entre as
escolas com os menores índices e a média nacional, garantindo a equidade da aprendizagem.
Porém nossa crítica vai justamente quando a meta destaca a necessidade de atingir os índices
do IDEB. Começamos a questionar de que forma as redes de ensino estarão elaborando
estratégias para atingir essa meta. Serão estratégias positivas? Será que podemos nivelar
(igualar), por números, escolas com realidades socioeconômicas diferentes e colocar no
mesmo ranking? Conforme foi comentado anteriormente a partir da realidade das escolas
federais, estaduais e municipais, não consideramos justo ter um mesmo índice para realidades
tão diferentes.
A estratégia 7.25 vem justamente justificar o porquê da necessidade de incluir a
disciplina de ciências como mais uma prova na avaliação externa da educação básica,
conforme estratégia 7.4, já que seu objetivo é fazer com que os resultados do IDEB sejam
comparados com os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA).
Novamente questionamos os aspectos que estamos sempre colocando em foco, que é a
melhoria da educação por meio das avaliações externas. Será que o objetivo, ao comparar os
resultados do IDEB com os resultados da prova PISA, vai ajudar em algo para a melhoria do
ensino de ciências das escolas públicas do Brasil? Ou apenas serão focados alguns assuntos
70
específicos dessa disciplina, mais uma vez? Entendemos que essa ação servirá somente para
chamar a atenção em mais uma área do conhecimento, assim como já existe na língua
portuguesa e na matemática, em detrimento das outras áreas, contribuindo, portanto, para a
limitação dos currículos dos alunos e da formação dos professores.
Como podemos observar, o projeto de Lei nº 8.035 de 2010, para o decênio 20112020, passa a dar ênfase, além das disciplinas de língua portuguesa e matemática, à disciplina
de Ciências, o que ocorre devido à necessidade do mercado em preparar indivíduos que
possam manusear e/ou utilizar os recursos tecnológicos. A Associação Nacional de PósGraduação e Pesquisa em Educação (ANPED), preocupada com essa nova categoria que
surge, que é a tecnologia, passa a realizar debates a partir da década de 1990, com a finalidade
de estudar as implicações das novas tecnologias na sociedade, no trabalho e
consequentemente na educação, conforme descreve Frigotto (2010).
Nesse contexto de implementações de avaliações, com foco em algumas disciplinas,
entendemos o motivo da ênfase das avaliações na educação básica, pois, segundo Frigotto
(2010), essa ênfase é o resultado da necessidade da realização da integração da economia a
fim de que sejam formados trabalhadores flexíveis, adaptáveis para que possam atender à
lógica do mercado, e assim ficarem sujeitos a um processo de segmentação e exclusão. E, da
forma como está sendo efetivada, a avaliação só vem reforçar este processo.
Desse modo, temos também uma nova base científico-técnica que são a
microeletrônica, a microbiologia e a engenharia genética, e “os novos senhores do mundo
empenham-se pelo controle privado desta nova base” (FRIGOTTO, 2010, p.156). Se for para
justificar essa necessidade apresentada pelo autor, entendemos perfeitamente a necessidade da
inclusão da disciplina ciências nas avaliações externas, pois o que está por trás disso é mais
uma questão mercadológica do que a melhoria da qualidade da educação. A seguir,
apresentaremos, por meio das Leis e Portarias, o aspecto normativo que vai dar a
materialidade ao Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e à Prova Brasil
(ANRESC).
2.3.3 Portarias que tratam do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e da
Prova Brasil
O SAEB foi instituído por meio da Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995, na
perspectiva de “fazer com que a avaliação e a informação se revestissem de caráter normativo
no país” (FREITAS, 2007, p. 83). De acordo com a autora, seus objetivos estavam vinculados
71
com a necessidade de monitorar a eficácia das políticas, de organizá-las de forma sistêmica e
de transformar em domínio público as informações geradas por tal sistema. Nesse sentido, é
necessário recorrermos às experiências internacionais para entendermos como aconteceram lá
fora experiências similares às que estão ocorrendo aqui.
Para Freitas (2007), o SAEB caminha numa perspectiva de mobilização do sistema
educacional e social, assim como de regulação da gestão e do ensino com vistas a uma lógica
de mercado. Concordamos com a autora, pois entendemos que esse processo de divulgação
das informações como é feito hoje pelos meios de comunicação geralmente mostra apenas os
resultados entre escolas melhores e piores, isto é, o aspecto concorrencial. A mídia ou os
governos não procuram levar em conta os diversos aspectos, como o tipo de formação que é
dada aos professores, as peculiaridades regionais e locais das escolas, assim como o plano de
carreira dos docentes, dentre outros.
Ainda sobre a lógica de mercado e com base em autores que abordam a questão da
privatização na educação, tendo na avaliação um dos seus instrumentos, destacamos Freitas
(2007), ao afirmar o aspecto privatista da avaliação da educação básica, já que desde sua
origem o SAEB se baseou na experiência e no conhecimento do setor privado para sua
implementação.
Outro aspecto destacado por Freitas (2007) é que, com a mudança de governo em
200321, esperava-se que ocorressem alterações na lógica da política de administração da
educação básica no que se refere à avaliação. Entretanto essa política foi se aperfeiçoando no
que se refere ao aspecto normativo jurídico-legal e político-administrativo. Desse modo,
vamos ter a publicação de sete portarias que estão disponíveis no site do INEP 22, que tratam
do SAEB e da Prova Brasil. Para efeito didático, apresentamos, no Quadro 3, apenas os
pontos que consideramos mais importantes nessas portarias, já que muitos dos artigos e
parágrafos se tornam repetitivos. Assim, vamos dar um destaque apenas para os itens novos
que foram surgindo nos documentos seguintes.
21
Quando assumiu a Presidência da República Federativa do Brasil, por eleição direta, o metalúrgico Luiz Inácio
Lula da Silva, governou o Brasil por dois mandatos, de 2003 a 2010.
22
http://www.inep.gov.br/
72
Quadro 3. Análise das Portarias que tratam da Prova Brasil (ANRESC) e do SAEB
Portarias
Aspectos que consideramos mais importantes
1 – Portaria nº 931 de 21 de - Define que a ANEB e a Prova Brasil (ANRESC) passam a se
março de 200523
tornar avaliações integrantes do SAEB.
- Objetivo é avaliar a qualidade do ensino ministrado nas escolas,
desenvolver uma cultura avaliativa, concorrer para a melhoria da
qualidade do ensino e para a redução das desigualdades.
2 – Portaria nº 69 de 4 de - Define que a avaliação aplicará testes de língua portuguesa com
maio de 2005
foco nas competências e habilidades de leitura definidas na matriz
do SAEB, nas escolas públicas da zona urbana, nas turmas de 4ª e
8ª séries do ensino fundamental regular de 08 anos e nas turmas de
5º e 9º ano em escolas que estejam organizadas no regime de 09
anos para o ensino fundamental.
- Fica definido o mês de novembro para aplicação da prova.
3 – Portaria nº 47 de 3 de - Estabelece que a Prova Brasil será realizada em regime de
maio de 2007
parceria com os Estados e Municípios por meio de um Termo de
Adesão.
- A Prova Brasil será aplicada nas escolas da rede pública da zona
urbana com pelo menos 20 alunos matriculados.
- O teste de matemática é introduzido, e o foco da prova é na
resolução de problemas.
- Os resultados da Prova Brasil serão utilizados para subsidiar a
formulação de políticas educacionais
4 – Portaria INEP nº 87 de - Os resultados do SAEB permitirão identificar os problemas e as
07 de maio de 2009
diferenças regionais do ensino, irão produzir informações sobre o
contexto socioeconômico, cultural e escolar que influenciam o
desempenho dos alunos.
- Desenvolver a competência técnica e científica na área da
avaliação educacional.
- Os resultados da Prova Brasil fornecerão dados para o cálculo do
IDEB.
- Define que as escolas da zona rural que tenham a partir de 20
alunos passem a realizar a Prova Brasil.
5 –Portaria nº 149 de 16 de - É definido que a divulgação dos resultados de desempenho na
junho de 2011
Prova Brasil está condicionada à participação mínima de 50% de
alunos matriculados.
6 – Portaria nº 403 de 31 de - Poderão participar da avaliação Prova Brasil todos os municípios
outubro de 2011
que possuem nas suas turmas regulares no mínimo 10 alunos.
- Não serão calculadas e divulgadas as médias das escolas do 5º
ano/4º série dos municípios que aderirem a essa edição da prova
7 – Portaria nº 410 de 3 de - Fica definido que os municípios que implantaram o Ensino
novembro de 2011
Fundamental de nove anos em 2008 poderão requerer ao INEP que
os resultados da Prova Brasil e do IDEB de suas escolas não sejam
divulgados.
Fonte: elaborado pelo autor da pesquisa
23
Essa portaria, que institui o SAEB, é composta por dois processos de avaliação: a Avaliação Nacional da
Educação Básica – ANEB e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar – ANRESC, chamada popularmente
de Prova Brasil. A primeira edição da Prova Brasil aconteceu em 2005. Neste mesmo ano, ela avaliou as
habilidades em Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas). Outra
característica é que avalia apenas estudantes de ensino fundamental, de 4ª série/5º ano e 8ª série/9º ano das
escolas públicas.
73
Na primeira portaria destacamos quatro aspectos. O primeiro é a institucionalização da
Prova Brasil como avaliação integrante do processo da avaliação da educação básica, sendo
que esta se caracteriza por avaliar alunos do ensino fundamental de forma censitária, enquanto
a ANEB realizará uma avaliação por amostragem, envolvendo os alunos do ensino
fundamental e médio.
O segundo aspecto refere-se ao objetivo dessas avaliações de mensurar a qualidade do
ensino nas escolas, pois entendemos que essas provas não são capazes de avaliar todos os
aspectos do ensino. Elas podem servir como parâmetro sobre determinado assunto ou área do
conhecimento. Nesse contexto, entendemos que, para se fazer uma avaliação do ensino, é
necessária a utilização de diversos instrumentos, conforme indica Boas (2007), assim como é
necessário um modelo de avaliação mais amplo, que envolva os diversos agentes do sistema
educacional: alunos, professores, coordenadores, diretores, secretários de educação e
ministros da educação.
O terceiro e o quarto aspectos referem-se ao desenvolvimento de uma cultura
avaliativa e à redução das desigualdades. Sobre a cultura avaliativa, não é especificada na
portaria a partir de qual matriz teórica essa cultura se desenvolverá e nem como, entretanto,
diante das experiências das avaliações externas em outros países, entendemos que essa cultura
avaliativa caminha numa perspectiva de competição, de concorrência, de segregação e de
discriminação, além de contribuir também para a institucionalização das consultorias dos
sistemas da avaliação nos Estados e municípios da Federação. Diante dessas análises, não
concordamos com a ideia de que essas avaliações podem contribuir para a melhoria da
qualidade do ensino, muito menos para a redução das desigualdades; pelo contrário, devido a
esses aspectos dessa cultura avaliativa, entendemos que essas desigualdades tendem a
aumentar ainda mais.
Na segunda portaria destacamos três aspectos. O primeiro é a priorização da língua
materna nesse processo avaliativo, o segundo aspecto é a priorização das escolas que serão
avaliadas, isto é, as escolas públicas do ensino fundamental localizadas na zona urbana, e o
terceiro aspecto corresponde à definição do mês em que a avaliação será realizada,
apresentando, portanto a característica de uma avaliação que se preocupa apenas com o
resultado, o produto final, em detrimento do processo de aprendizagem.
A terceira portaria trata do regime de parcerias da União com os Estados e municípios
pelo termo de adesão, que implica a transferência de recursos financeiros. Na verdade, esse
termo é uma nova regulação que passa a submeter as duas esferas de governo às
determinações do governo central, dentre as quais podemos destacar as metas definidas no
74
IDEB. Ainda nesta portaria ficou estabelecida a inclusão dos testes de matemática que,
juntamente com os testes de língua portuguesa, irão compor a Prova Brasil. No que fiz
respeito aos resultados dessas avaliações, ficou decidido que estes servirão para a formulação
de políticas públicas.
Na quarta portaria destacamos três aspectos importantes. O primeiro trata da influência
dos resultados dessas avaliações na identificação dos problemas e diferenças regionais, como
se a redução das desigualdades no ensino já tivessem sido superadas, algo que não aconteceu,
conforme relato feito durante a aplicação da Prova Brasil.
O segundo aspecto dessa portaria que nos chamou atenção é sobre o desenvolvimento
da competência técnica e científica na área da avaliação educacional, pois entendemos que
isso reforça o caráter da cultura avaliativa numa perspectiva de implantação de consultorias
nesse contexto das avaliações externas. Por fim, temos a participação das escolas da zona
rural na Prova Brasil e a incorporação dos resultados dessa prova no IDEB em 2009. Portanto
os resultados de 2005 e 2007 deixaram de fora as escolas da zona rural, não representando a
realidade do contexto educacional brasileiro.
Sobre as três últimas portarias de 2011, chamou-nos a atenção o aspecto da “não
divulgação” dos resultados, principalmente das escolas que aderiram ao ensino fundamental
de 9 anos. Não conseguimos entender por que essa preocupação da não divulgação desses
resultados, já que nessas portarias não tem nenhum esclarecimento e foi o próprio governo
federal que implantou esse sistema de nove anos. Entendemos que isso fere o artigo 37 da
Constituição Federal sobre a publicidade e defendemos uma divulgação com responsabilidade
e imparcialidade, conforme feito no sistema educacional Francês.
A partir das análises das Portarias da Prova Brasil e dos questionamentos da qualidade
da educação, expressão esta que permeia esses documentos, concordamos com Gatti, Barreto
e André (2011), os quais afirmam que, com a implementação do Sistema de Avaliação, em
particular o da educação básica, que tem no IDEB sua referência de metas, os Estados e os
municípios passaram a ter como obrigação alcançar tais resultados, para atingirem um
determinado padrão de qualidade. As autoras chamam a atenção para o fato de que essa
melhoria “tende, portanto, a traduzir-se fundamentalmente no seu equacionamento em termos
da capacidade de alcançar um bom resultado na pontuação do Ideb” (GATTI, BARRETO E
ANDRÉ, 2011, p. 41). Nossa preocupação é com a qualidade do processo da aprendizagem
dos alunos e com a formação dos professores, já que, diante desse contexto de pressão sobre
resultados, esses dois aspectos acabam se tornando secundários ou de menor valor para os
formuladores das políticas educacionais.
75
A partir das análises de Frigotto (2010), Vieira (2008), Neto e Maciel (2011) sobre
qualidade, conforme visto no primeiro capítulo, defendemos a proposta de Enguita (2001),
que associa essa qualidade na perspectiva de um ensino que seja bem mais ativo e
participativo por parte do aluno, tendo como foco os seus interesses.
Em relação à formação dos professores, essa qualidade deve estar voltada para uma
perspectiva de promover “a valorização social da profissão, os salários, as condições de
trabalho, a infraestrutura das escolas, as formas de organização do trabalho escolar e a
carreira” (GATTI, BARRETO E ANDRÉ, 2011, p.15). Como ressaltam as autoras, esses
múltiplos fatores não podem ser desconsiderados, muito menos esquecidos, quando se tratar
da implementação de políticas que tenham o objetivo de promover uma educação de
qualidade. Diante das análises sobre as portarias da Prova Brasil e do SAEB, apresentamos a
seguir as diretrizes utilizadas pela Prova Brasil, assim como os seus diversos instrumentos.
2.4 OS INSTRUMENTOS DA PROVA BRASIL, OS MODELOS DE QUESTÕES E
QUESTIONÁRIOS UTILIZADOS
Mais do que o Saeb, a criação da Prova Brasil, em alguma medida, e, sobretudo, a
instituição do Ideb têm dado indícios de alterações bem mais substantivas no manejo
do currículo no cômputo nacional e nas políticas e nas práticas docentes (GATTI,
BARRETO E ANDRÉ, 2011, p.41).
Com base na afirmativa acima, com a qual concordamos plenamente, iniciamos o
comentário sobre o nosso objeto de pesquisa, que é a Prova Brasil, uma política pública de
avaliação, do tipo externa, que envolve professores, diretores, técnicos e alunos das escolas
públicas. Nosso objetivo ao realizar a análise dessa política pública de avaliação é “conhecer
seus fatores positivos, apontar seus equívocos e insuficiências, com a finalidade de buscar seu
aperfeiçoamento ou reformulação”. (BELLONI ET AL, 2007, p.45)
Assim como foi realizado com as leis que tratam das avaliações externas e das
Portarias da Prova Brasil, também utilizaremos a análise de conteúdo de documentos para
examinar os instrumentos da Prova Brasil, que são: as matrizes de referência, os temas, os
tópicos, os descritores, alguns exemplos de provas de português e matemática, os
questionários da escola, do professor, do aluno e do diretor.
2.4.1 As matrizes de referência da Prova Brasil
De acordo com Brasil (2008), as matrizes de referência da Prova Brasil são os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), com foco nas disciplinas de língua portuguesa e
76
matemática. Na língua portuguesa existem seis tópicos que são a base do conteúdo da prova,
sendo os mesmos para a 4ª série/5º ano e 8ª série/9º ano; entretanto, para este último, o nível
de dificuldade é maior nas questões. Os tópicos são os seguintes:
I – Procedimento de leitura;
II – Implicações do suporte, do gênero e/ou enunciador na compreensão do texto;
III – Relação entre textos;
IV – Coerência e coesão no processamento do texto;
V – Relações entre recursos expressivos e efeitos de sentido;
VI – Variação linguística.
A prova de matemática é elaborada tendo como base quatro temas, e, assim como na
prova de língua portuguesa, os temas são os mesmos para a 4ª série/5º ano e 8ª série/9º ano;
entretanto, para este último, o nível de dificuldade é maior. Os temas da prova de matemática
são baseados nos seguintes conteúdos: I – Espaço e forma; II – Grandezas e medidas; III –
Números e operações/álgebra e funções e IV – Tratamento da informação.
Os descritores se caracterizam por serem “uma associação entre conteúdos curriculares
e operações desenvolvidas pelo aluno, que traduzem certas competências e habilidades”
(BRASIL, 2008, p.18). Para a prova de língua portuguesa existem quinze (15) descritores,
para a prova de matemática existem vinte e oito (28) descritores para a 4ª série/5º ano e trinta
e sete (37) para a 8ª série/9º ano. A seguir, apresentamos um quadro de como as matrizes, os
tópicos, os temas e os descritores estão dispostos por disciplina.
77
Quadro 4. As Matrizes de referência, os tópicos, os temas e os descritores da Prova Brasil
Fonte: Brasil (2008).
Após a exposição das matrizes de referência, vamos apresentar, de acordo com Brasil
(2008), dois exemplos de questões para a 4ª série/5º ano, uma de língua portuguesa,
correspondente ao tópico de procedimento de leitura, e um exemplo de questão de
matemática, correspondente ao tema espaço e forma. É importante ressaltar que a Prova Brasil
é composta de 22 questões de língua portuguesa e 22 questões de matemática e deve ser
realizada juntamente com o preenchimento do questionário socioeconômico do aluno em um
tempo de 2h e 40 minutos.
Nossa opção por esse recorte das séries justifica-se por serem estas o foco do
programa de formação de professores ALFAMAT.
2.4.2 Modelos de questões utilizados na Prova Brasil
Tópicos da Língua Portuguesa
O ensino da Língua Portuguesa, de acordo com os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), deve estar voltado para a função social da língua. Esta é requisito
básico para que a pessoa ingresse no mundo letrado, para que possa construir seu
processo de cidadania e, ainda, para que consiga se integrar à sociedade de forma
ativa e a mais autônoma possível (BRASIL, 2008, p.19).
78
A função social da língua portuguesa deve estar associada ao entendimento e
participação do aluno na produção e leitura de textos de diversos gêneros. Portanto, de acordo
com os tópicos da língua portuguesa, vamos listar seus descritores e, em seguida,
apresentaremos uma questão como exemplo, conforme consta no documento oficial24, para
que o leitor entenda o modelo de questão da Prova Brasil.
No tópico I da Língua portuguesa, que trata dos Procedimentos de leitura, temos
cinco descritores com as seguintes funções: Localizar informações explícitas em um texto
(ver exemplo de questão a seguir); Inferir o sentido de uma palavra ou expressão; Inferir uma
informação implícita em um texto; Identificar o tema de um texto e Distinguir um fato da
opinião relativa a esse fato.
Ao apresentarmos esse modelo de questão da Prova Brasil na área da língua
portuguesa, observamos que o foco é a leitura, e o aluno tem quatro alternativas para marcar
uma única resposta. Entretanto chamamos a atenção para a importância da produção de texto
de diversos gêneros (aspecto esse que não é estimulado nessa avaliação) para que a função
social da língua portuguesa seja exercida plenamente.
Figura 2. Exemplo de questão de português
Fonte: Brasil (2008).
Temas da matemática
A matriz de referência que norteia os testes de Matemática do Saeb e da Prova Brasil
está estruturada sobre o foco Resolução de Problemas. Essa opção traz implícita a
convicção de que o conhecimento matemático ganha significado, quando os alunos
têm situações desafiadoras para resolver e trabalham para desenvolver estratégias de
resolução (BRASIL, 2008, p.106).
24
http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/prova%20brasil_matriz2.pdf
79
No tema I de matemática que trata do Espaço e Forma temos cinco descritores com as
seguintes funções: Identificar a localização/movimentação de objeto em mapas, croquis e
outras representações gráficas (ver exemplo de questão abaixo); Identificar propriedades
comuns e diferenças entre poliedros e corpos redondos, relacionando figuras tridimensionais
com suas planificações; Identificar propriedades comuns e diferenças entre figuras
bidimensionais pelo número de lados e pelos tipos de ângulos; Identificar quadriláteros
observando as relações entre seus lados (paralelos, congruentes, perpendiculares) e
Reconhecer a conservação ou modificação de medidas dos lados, do perímetro, da área em
ampliação e/ou redução de figuras poligonais usando malhas quadriculadas.
Figura 3. Exemplo de questão de matemática.
Fonte: Brasil (2008).
Diante da apresentação dos tópicos, temas e descritores da Prova Brasil, é importante
esclarecermos por que esses elementos foram selecionados. Conseguimos encontrar as
respostas mais esclarecedoras no I Seminário do Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica25 (IDEB), realizado na cidade de Belém-PA pela Universidade da Amazônia
(UNAMA), nos dias 28 e 29 de novembro de 2012, por meio da Drª. Clara Etiene Lima de
Souza, representante da Diretoria de Avaliação da Educação Básica do INEP.
25
http://www.unama.br/ideb/index.php?option=com_content;view=article;id=25;Itemid=2
80
Segundo a representante do INEP, essas provas são baseadas nos tópicos, temas e
descritores, que representam o padrão mínimo de conhecimento correspondente às séries;
entretanto, de acordo com a fala da própria representante, o problema é que muitas escolas
acabam achando que esses elementos são o currículo, limitando, portanto, todo o trabalho
pedagógico. A seguir, apresentamos sua fala na íntegra:
“uma matriz de avaliação não pode, não deve ser confundida com o currículo
daquela série ... quando o INEP define uma matriz ele faz várias reuniões, vários
estudos e chega num grupo de elementos básicos, que ele acredita que é o mínimo
que aquelas crianças devem saber até o final daquele ciclo, mas o INEP não quer e
o MEC, que as escolas achem que isso é tudo que a gente espera deles, não é,
porque isso iria de encontro a toda uma discussão sobre o currículo, não é isso, a
gente tem que considerar outros fatores que as avaliações em larga escala não
conseguem medir, então, só está nessa escala os componentes básicos de leitura que
a avaliação em larga escala consegue medir, mas a gente nunca pode reduzir o
nosso planejamento da escola a essa matriz porque é reduzir demais o conteúdo, as
competências e habilidades da aprendizagem”.
Entretanto, a partir da experiência internacional, mais especificamente a norteamericana, observamos que, ao preparar os alunos somente para realizarem as avaliações,
provavelmente todas as ações pedagógicas estavam voltadas para os elementos das avaliações
externas. Mais adiante, quando comentarmos sobre os sistemas de avalições nas redes
estaduais e municipais, poderemos observar que, ao se adotar alguns mecanismos de estímulo,
como a premiação ou bonificação para professores e alunos, estes mecanismos provavelmente
servirão para concentrar todas as ações da prática pedagógica nos descritores da Prova Brasil,
e isso é um fator sério e preocupante, como afirma a representante do INEP.
A avaliação que fazemos sobre essa maior atenção das escolas ou Secretarias de
Educação somente para os descritores da Prova Brasil é que falta uma maior divulgação dessa
questão pelo INEP, pois não encontramos esse esclarecimento no site desta autarquia e muito
menos nos meios de comunicação. Só pudemos ter acesso a essas informações por conta da
participação no evento.
2.4.3 Questionários da escola26, do professor27, do aluno28 e do diretor29.
Nesta seção, comentaremos sobre os questionários da Prova Brasil de 2007, que estão
disponíveis no site do MEC. De acordo com o interesse, para quem quiser aprofundar suas
análises, sugerimos a pesquisa nos sites que se encontram na nota de rodapé.
26
Fonte: http://portal.inep.gov.br/web/prova-brasil-e-saeb/questionarios-socioeconomicos
Fonte: http://portal.inep.gov.br/web/prova-brasil-e-saeb/questionarios-socioeconomicos
28
Fonte: http://portal.inep.gov.br/web/prova-brasil-e-saeb/questionarios-socioeconomicos
29
Fonte: http://portal.inep.gov.br/web/prova-brasil-e-saeb/questionarios-socioeconomicos
27
81
Abordaremos a dinâmica de aplicação dos questionários e quem os preenche. O
responsável pela aplicação dos questionários assim como das provas é o aplicador 30, que, ao
chegar à escola, se identifica ao diretor, ou na da ausência deste, ao coordenador pedagógico
do turno, explicando a finalidade de sua presença na escola, o tempo de aplicação, o que será
necessário para a realização da avaliação (como o espaço de uma sala de aula); em seguida é
perguntado se a turma que será avaliada está presente na escola; em caso afirmativo, os
trabalhos são iniciados.
Em seguida, esses questionários são entregues pelo aplicador da Prova Brasil, mas
somente o questionário da escola é preenchido por ele (com a orientação de que seja feito ao
final de todos os trabalhos); os demais são preenchidos pelos professores, alunos das turmas
avaliadas e pelo diretor da escola. A seguir apresentaremos o quantitativo das questões em
cada questionário e as temáticas abordadas.
O questionário da escola
É composto de quinze (15) questões. Na primeira questão são avaliadas as condições
de conservação do prédio da escola no que diz respeito ao telhado, paredes, piso, portas,
janelas etc. De acordo com o grau de conservação o aplicador tem as seguintes opções de
respostas: adequado, regular, inadequado e inexistente.
Na segunda questão é avaliado o nível de iluminação e o grau de ventilação, tendo
como respostas as opções sim e não. Na terceira questão é avaliado o estado de conservação
da entrada do prédio, corredores, salas de aula, cozinhas, banheiros.
A quarta questão é composta de quinze (15) subitens, que estão relacionados com o
aspecto de segurança da escola. As questões cinco (5), seis (6) e sete (7) referem-se à
quantidade de equipamentos na escola (computadores, televisão, antena parabólica,
videocassete, máquina de xérox, mimeógrafo, projetor de slides, retroprojetor, impressora,
dentre outros), o nível de conservação destes e se existe depredação ou pichação na escola.
As questões que vão de oito (8) a quatorze (14) estão relacionadas com a presença de
biblioteca na escola. Caso exista este espaço, as outras questões referem-se ao responsável por
este espaço, se existe o serviço de empréstimo de livros para professores, alunos e
comunidade extraescolar. A última questão sintetiza, a partir de todos os itens mencionados, o
estado da escola a partir dos conceitos de péssimo, ruim, razoável, boa ou ótima.
30
Geralmente selecionados pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Educação.
82
Em relação às questões de número um (nº 1) a quatorze (nº 14), consideramos que são
itens que permitem uma avaliação por parte do aplicador; entretanto, em relação à última
questão (nº 15), chamamos a atenção para o nível de subjetividade, pois será que o aplicador a
partir desses instrumentos terá condições de classificar a escola dentro dessa escala que vai de
péssimo a ótima? Entendemos que não, pois não é apresentado nenhum parâmetro para este
aplicador em relação às escolas da mesma rede de ensino.
O questionário do professor
Em geral, é aplicado na mesma hora em que a turma está sendo avaliada, neste caso as
turmas da 4ª série/5º ano do ensino fundamental. Esse questionário tem a finalidade de coletar
dados sobre a formação profissional, a prática pedagógica e o perfil socioeconômico e
cultural. É composto de cento e dezenove questões (119), que estão relacionadas ao sexo,
idade, etnia, nível de escolaridade e formação; carga horária de trabalho; a faixa salarial; o
tempo de ensino no magistério; em quantas escolas leciona; situação trabalhista (estatutário,
prestador de serviço, outras); atividades pedagógicas desenvolvidas com os alunos nas aulas
de língua portuguesa e matemática; os recursos pedagógicos que são utilizados com os alunos;
se existe projeto pedagógico; se existe conselho de classe; se o conteúdo previsto para a série
correspondente foi aplicado durante o ano; quais os possíveis fatores que podem estar
dificultando a aprendizagem dos alunos (a localização da escola, as condições de
infraestrutura física e/ou pedagógica, o nível de cultura dos pais, o meio em que o aluno vive,
dentre outros); a relação entre diretor e equipe técnica da escola com os professores e alunos;
o nível de segurança vivido pelo professor na escola (se já foi vítima de assalto na escola, se
já sofreu agressão física ou verbal dos alunos); se a escola tem livro didáticos e os utiliza.
Diante desse universo de questões que devem ser respondidas pelos professores,
encontramos somente três questões (que são as de nº 11, 12 e 13) que se referem a sua
formação continuada e estão relacionadas com a participação em formações, sua carga horária
e se estes conhecimentos adquiridos têm contribuído para a melhoria da prática pedagógica.
Para nossa análise, fica bem definido que a Prova Brasil não está muito interessada
com a formação dos professores. É necessário que tenhamos um perfil dos professores que
trabalham nas turmas avaliadas pela Prova Brasil, e que a formação continuada dos
professores tenha uma atenção especial, pois em nenhum momento é abordado o tipo de
formação que o professor gostaria de ter e quais aspectos deveriam ser abordados nessa
formação.
83
O questionário do aluno
É composto por quarenta e quatro (44) questões que têm a finalidade de conhecer o
perfil do aluno em relação aos bens materiais que este possui, sua condição de moradia, o
nível de estudo dos pais, o incentivo dos pais ou responsáveis para a leitura, assim como a
participação destes nas reuniões escolares e no auxílio das tarefas escolares.
Um aspecto que nos chamou atenção foram as questões de nº 40 e 41, em que é
perguntado se o aluno faz o dever de língua portuguesa e matemática em casa, porém não é
feita nenhuma referência às outras áreas do conhecimento, isto é, se o aluno gosta de música,
de artes, se pratica atividade física e/ou recreativa. No nosso ponto de vista, essa estratégia já
é uma forma de deixar subentendido ao aluno que somente deve-se dar atenção a essas duas
áreas do conhecimento, algo que vem reforçar a limitação dos conteúdos curriculares
trabalhados com os alunos.
O questionário do diretor
Esse questionário tem a finalidade de coletar dados sobre o estilo gerencial, assim
como conhecer o perfil socioeconômico e cultural dos diretores. Esse questionário possui uma
certa similaridade com o questionário do professor, em relação às questões referentes ao sexo;
idade; etnia; nível de escolaridade e formação; sua carga horária de trabalho e faixa salarial.
As demais questões dizem respeito aos aspectos administrativos e pedagógicos; entretanto
duas questões nos chamaram a atenção, que foram as de nº 22 e 23, pois elas se referem,
respectivamente, à ação do diretor em promover alguma atividade de formação e à proporção
de docentes que participaram de algum tipo de formação continuada nos últimos dois anos.
Esse espaço ou momento, em que cabe ao diretor a responsabilidade de promover
também a formação continuada na escola, deve ser exercido de forma ativa. Este momento é
fundamental para que sejam implementadas análises e discussões sobre um novo modelo de
formação de professores e de avaliação da aprendizagem, modelos estes que apresentaremos
no final desta pesquisa.
Sobre o que é feito com os resultados desses questionários, também conseguimos
encontrar as respostas mais esclarecedoras no I Seminário do Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB), realizado na cidade de Belém-PA.
Neste evento, a Diretora de Avaliação informou que os dados referentes a esses
questionários têm sido solicitado pelo presidente da República Federativa do Brasil e pelos
órgãos de planejamento na perspectiva de entenderem, por exemplo, a relação da estrutura da
escola com o seu desempenho nas avaliações externas. Ainda sobre os resultados desses
84
questionários, a representante do INEP destacou que esses dados também estão disponíveis
para as universidades e para os pesquisadores, a fim de possam aprofundar a pesquisa nessa
área e cruzar informações sobre o desempenho dos estudantes nas avaliações com os salários
dos professores, ou cruzar dados sobre a violência da escola com os desempenhos dos
estudantes, e assim por diante.
Diante da exposição detalhada da Prova Brasil, entendemos que esta ainda é uma
política insuficiente e necessita ser reformulada para que possa oportunizar aos alunos e aos
professores um currículo mais amplo e completo, pois consideramos que tanto a língua
portuguesa quanto a matemática são importantes para a formação do aluno, porém o
conhecimento não deve se resumir apenas a essas duas áreas, aspecto esse que, infelizmente, é
central nas avaliações externas.
Neste sentido, Belloni et al (2007) argumentam ser fundamental que a avaliação de
uma política pública possa indicar alternativas de ações modificadoras da atuação, alternativas
estas que apresentaremos no capítulo seguinte, ao indicar modelos de avaliações a partir do
que propõe a Prova Brasil, assim como modelos de formações de professores.
2.5 A AVALIAÇÃO EXTERNA COMO INSTRUMENTO DE CONSOLIDAÇÃO DO
ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA (IDEB)
De acordo com o site do IDEB, este índice foi criado em 2007 31 pelo INEP por meio
do Decreto nº. 6.094, de 24 de abril de 2007, e constitui o indicador que mede a qualidade da
educação. Segundo Fernandes (2007), o IDEB é calculado a partir das taxas médias de
aprovação em cada etapa de ensino (4ª série/5º ano, 8ª série/9º ano e o 3º ano do ensino
médio) e das pontuações médias dos resultados obtidos na Avaliação Nacional do
Rendimento Escolar (ANRESC), conhecida popularmente como Prova Brasil, e na Avaliação
Nacional da Educação Básica (ANEB).
No contexto da educação básica brasileira, o IDEB torna-se o principal instrumento
em que os sistemas municipais, estaduais e federal de ensino se baseiam para atingir suas
metas de qualidade no ensino, servindo também para mostrar as condições de ensino no
Brasil. De acordo com o MEC, em 2008, todos os 5.563 municípios brasileiros aderiram ao
compromisso de utilizar o IDEB como índice nas suas redes de ensino. Sua organização segue
uma escala que vai de zero a dez.
31
http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=336
85
O novo indicador passou a ser utilizado em 2005, e teve como média nacional a nota
3,8 para os primeiros anos do ensino fundamental. Em 2007, a média foi 4,2; em 2009, foi 4,6
e, em 2011, a média foi 5,0, conforme quadro abaixo.
Quadro 5. Metas do IDEB até o ano de 2021.
IDEB
2011
2013
2015
2017
2019
2021
Anos iniciais do Ensino Fundamental
4,6
4,9
5,2
5,5
5,7
6,0
Anos finais do Ensino Fundamental
3,9
4,4
4,7
5,0
5,2
5,5
Anos do Ensino Médio
3,7
3,7
4,3
4,7
5,0
5,2
Fonte: Projeto de Lei nº 8.035/2010
De acordo com Gatti, Barreto e André (2011), a meta de nota 6,0 até 2021 tem a
finalidade de fazer com que os estudantes tenham o mesmo desempenho dos países
desenvolvidos que compõem a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico (OCDE), composta pelos 30 países mais ricos do mundo 32. Como temos que
alcançar uma meta até 2021, a pressão em cima das escolas, da formação dos professores e
dos alunos será intensificada e limitada, conforme já apontam as pesquisas relatadas em
outros países.
Apesar dessas implicações, já temos na cidade de Belém (PA) duas escolas federais 33 e
uma escola municipal34 que ultrapassaram e alcançaram a meta prevista para 2021, de acordo
com o resultado do IDEB 2011. Entretanto a maioria das escolas ainda não alcançou estes
índices.
Ainda sobre o IDEB, queremos problematizar dois aspectos. O primeiro trata de
escolas com contextos e realidades diferentes e o segundo diz respeito à vinculação das
escolas a este índice para o recebimento de recursos federais e à punição. Iniciamos tratando
do contexto de escolas com realidades diferentes. A mídia, por meio dos jornais locais e
nacionais, ao divulgar os resultados das avaliações externas, em particular o IDEB, apenas
destaca a melhor e a pior escola situadas no ranking (IDEB). Ainda não vimos nessas
reportagens o questionamento sobre a situação de escolas com condições bem diversas
(localização de bairros de periferia e centro, nível de violência, contexto socioeconômico,
32
Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, República Checa, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia,
Hungria, Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Coreia, Luxemburgo, México, Holanda, Nova Zelândia, Noruega,
Polônia, Portugal, República Eslovaca, Espanha, Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido e Estados Unidos.
33
A Escola Estadual de Ensino Médio e Fundamental Tenente Rego Barros e a Escola de Aplicação da
Universidade Federal do Pará (UFPA), que atingiram a note 6,1 no IDEB, ultrapassando a meta para 2021.
34
Escola Municipal de Ensino Fundamental Professora Ernestina Rodrigues.
86
dentre outros) sendo avaliadas da mesma forma. O que temos visto de forma recorrente em
nosso Estado, em particular na capital paraense, é o posicionamento da Escola Estadual de
Ensino Médio e Fundamental Tenente Rego Barros35 sempre em primeiro lugar no IDEB nos
últimos anos.
Questionamos se é justo avaliar, a partir de um mesmo índice, escolas com essas
condições, que consideramos adequadas, e aquelas que correspondem ao universo maior das
escolas públicas da rede estadual de ensino de Belém.
É importante relatar que trabalhamos na aplicação da prova Brasil em 2011 e tivemos
a oportunidade de aplicar a avaliação em escolas estaduais na cidade de Belém, podendo
comprovar a diversidade de condições de trabalho dos docentes e de aprendizagem dos
alunos, isto é, escolas que apresentam condições precárias de trabalho, que funcionam em
centro comunitários, onde os alunos e professores vivem em condições precárias com
banheiros impróprios para o uso, salas muito quentes, poucos recursos didáticos na escola,
sem sala de vídeo, biblioteca, laboratórios de informática, além de violência frequente na
frente da escola, como assaltos e furtos. Entretanto, em outras escolas da mesma rede de
ensino, e em alguns casos bem próximas uma das outras, observamos condições totalmente
contrárias. Nesse contexto, fazemos novamente o questionamento: é justo avaliar com os
mesmos critérios escolas com condições tão diferentes? Esses argumentos reforçam minha
hipótese anterior sobre os índices (que definem padrões) que acabam não levando em
consideração as diversas condições socioeconômicas das escolas, apesar de ter um
questionário específico para isso, mas que não vai interferir nos resultados. Não consideramos
justo, portanto, avaliar realidades e situações tão diferentes, a partir de um mesmo modelo de
prova ou índice.
Sobre a relação do recebimento de recursos federais associado com o IDEB, queremos
destacar uma reportagem recente no site do jornal Estadão36, em que o Ministro da Educação,
Aloizio Mercadante, afirmou: "Se teve escola que recebeu apoio para estimular sua
recuperação e a resposta foi não participar do Ideb, ela será punida", disse o ministro Ao
fazermos a leitura dessa reportagem ficamos muito preocupados, por dois aspectos, o primeiro
35
É uma escola vinculada ao Ministério da Aeronáutica, que compõe a rede federal de educação, e que atende
em sua maioria alunos filhos de militares que pagam uma mensalidade Nessa escola, aplicamos a Provinha
Brasil em 2010, e observamos que existe toda uma estrutura física (salas de aula arejadas ou climatizadas, salas
de leitura, salas de vídeo, salas de informática, quadra polivalente, auditório com capacidade para mil pessoas,
parque, etc...), assim como um plano de carreira dos professores que estimula a formação profissional em nível
de cursos de mestrado e doutorado. Esses aspectos provavelmente fazem o diferencial na motivação e
desempenho dos professores na melhoria da aprendizagem dos alunos, e consequentemente nos resultados dessas
avaliações externas.
36
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,mec-vai-investigar-escolas-sem-ideb-,917184,0.htm
87
diz respeito ao bom uso do dinheiro público, que deve ser investido com seriedade e
honestidade, sendo necessária a investigação caso tenha ocorrido desvio; porém o que nos
chamou mais atenção foi o aspecto da punição atrelada aos resultados do IDEB, isto é, caso as
escolas consigam alcançar o índice, está tudo bem, porém, se as escolas não alcançarem ou se
não apresentaram resultados neste índice, essas escolas serão punidas.
Essa fala nos reporta às experiências das avaliações internacionais, como acontece no
Chile, onde a punição, a discriminação e a segregação estão arraigadas. Por esse motivo
fizemos questão de apresentar alguns aspectos que consideramos negativos das experiências
internacionais das avaliações externas, aspectos esses que não são poucos e de vez em quando
estão relacionados com nossa realidade, pois até o momento o governo está enviando
recursos, mas já tem um indicativo de punir as escolas. Quem garante que essa ameaça não se
fortalecerá ainda mais no futuro para aquelas escolas que ficarem abaixo do IDEB? Que tipo
de ameaças ou retaliações sofrerão os professores e alunos? Para isso, devemos refletir
bastante com base nas experiências internacionais sobre o fortalecimento dessas ações
punitivas, seletistas e discriminatórias que prejudicarão toda uma comunidade educativa.
Diante desses aspectos que apresentamos, consideramos que o IDEB pode até servir
como parâmetro para tomada de decisão de novos processos de planejamento; entretanto não
deve ser apenas o único, pois há a necessidade de outras avaliações processuais, que levem
em conta outros instrumentos além da prova, conforme descreve Boas (2007), que considera
importante nesse processo de aprendizagem a utilização de entrevistas, de relatórios, de
portfólios, da observação, de dossiês, da autoavaliação. Porém, como a atenção e a pressão
estão voltadas somente para algumas disciplinas, alguns critérios e um único instrumento (a
prova), os outros instrumentos acabam perdendo espaço nesse processo de aprendizagem.
2.6 DO SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO PARA OS SISTEMAS LOCAIS: A
EXPERIÊNCIA SE DESCENTRALIZOU
A adesão subnacional à regulação avaliativa levou a que, no período 1992-2002,
nove unidades federativas (segundo informes do INEP) se empenhassem na
organização de sistemas próprios de avaliação: dois estados da Região Sudeste
(Minas Gerais e São Paulo), três da Região Nordeste (Ceará, Pernambuco e Bahia),
dois da região Norte (Rondônia e Tocantins), um da Região Sul (Paraná) e, na região
Centro-Oeste, o Distrito Federal (Brasília) (FREITAS, 2007, p.154).
Essa citação nos permite compreender a amplitude que a avaliação externa alcançou
na área educacional, a partir do momento em que alguns estados e municípios tomaram a
iniciativa de implementar seus próprios sistemas de avaliação; entretanto a maioria destes
88
sistemas é criada tendo como referência o sistema do governo federal, que Werle (2010)
denomina como primeiro plano de segmentação, e dos estados e municípios, que ela chama de
segundo plano e terceiro plano de segmentação, respectivamente.
De acordo com a autora acima, essas semelhanças se caracterizam também pela
utilização pelos estados e municípios do banco de questões do INEP para a realização das
avaliações, e assim passam a focar também nas mesmas áreas do conhecimento (língua
portuguesa e matemática) das avaliações do governo federal. Nesse contexto, concordamos
com Werle (2010), na perspectiva de que essas avaliações do segundo e terceiro planos de
segmentação deveriam focar outras áreas do conhecimento, isto é, aquelas que não são
avaliadas pelo primeiro plano de segmentação. Diante da expansão das avaliações externas no
contexto educacional brasileiro, é fundamental o desenvolvimento de pesquisas no contexto
do segundo e terceiro planos de segmentação. Assim, é
necessário promover estudos que busquem dados do contexto sócio-político-cultural
e correlacionam informações já disponíveis a estes elementos de contexto, em vez de
produzir mais e mais informações pela multiplicação de testes externos (WERLE,
2010, p.34).
A partir da necessidade exposta pela autora, consideramos que já existem condições
para que as pesquisas nesses níveis de segmentação venham a ser ampliadas e aprofundadas,
pois campo para tais pesquisas já existe, devido ao surgimento de um número considerável de
sistemas estaduais e municipais de avaliações existentes em todas as regiões do Brasil. Freitas
(2007), Luck (2012) e Werle (2010) destacam, por região, os estados que já possuem seus
sistemas próprios de avaliação. Assim temos:
1 - Região Norte:

Amazonas: Sistema de Avaliação do Desempenho Educacional do Amazonas
(SADEAM);

Tocantins: Coordenadoria de Avaliação de Desempenho.
2 - Região Nordeste:

Alagoas: Sistema de Avaliação Educacional de Alagoas (SAVEAL);

Sergipe: Sistema de Avaliação Periódica de Professores (SAPED);

Ceará: Sistema Permanente da Avaliação Educacional Básica (SPAECE);

Pernambuco: Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco (SAEPE);

Bahia: Sistema de Avaliação Baiano de Educação (SABE).
3 - Região Sudeste:

Minas Gerais: Sistema Mineiro de Avaliação da Educação (SIMAVE);
89

São Paulo: Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
(SARESP);

Rio de Janeiro: Sistema de Avaliação da Educação do Estado do Rio de Janeiro
(SAERJ);

Espírito Santo: Programa de Avaliação da Educação Básica do Espírito Santo
(PAEBES).
4 - Região Centro-Oeste:

No distrito federal, Brasília: Sistema de Avaliação do Desempenho das Instituições
Educacionais do Sistema de Ensino do Distrito Federal (SIADE);

Goiás: Sistema de Avaliação da Educação do Estado de Goiás (SAEGO);

Mato Grosso: Programa de Avaliação do Primeiro Ciclo de Alfabetização;

Mato Grosso do Sul: Sistema de Avaliação da Educação Básica de Mato Grosso
do Sul (SAEMS).
5 - Região Sul

Rio Grande do Sul: Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Rio Grande
do Sul (SAERS).
Diante da diversidade de sistemas estaduais existentes atualmente, vamos concentrar
nossas análises no Sistema de Avaliação da Rede de Escolas de São Paulo (SARESP). Ao
apresentarmos esse sistema, temos dois objetivos. O primeiro é chamar a atenção de que ele
foi implantado na década de 1990, no auge das mudanças estruturais do Estado e
consequentemente da educação. O segundo é apresentar como esse sistema de avaliação se
aperfeiçoou e quais as implicações desse sistema para o corpo docente e discente. Esse
sistema de avaliação estadual se assemelha com as avaliações do governo federal, por serem
avaliações externas (avaliações elaboradas e geralmente aplicadas por membros externos à
escolas), padronizadas (mesma prova para toda série da rede de ensino) e em larga escala
(atinge todas as séries da rede educacional).
Para analisar o SARESP, recorremos à pesquisa realizada por Souza e Arcas (2010),
nas escolas estaduais de São Paulo, que investigaram uma série de implicações decorrentes
desse sistema de avaliação estadual. O SARESP foi implantado em 1996, com uma
desconfiança inicial por parte dos professores, já que passou a responsabilizá-los diretamente
a partir do ano de 2000 nesse sistema de avaliação estadual, e concomitantemente instituiu o
Bônus Mérito baseado no índice do SARESP.
90
Em relação às escolas, aquelas que apresentavam um desempenho considerado
insuficiente passaram a ter um apoio pedagógico por meio de consultorias. Desse modo, a
lógica empresarial de realizar consultorias passa a estar atrelada aos resultados das avaliações
externas. Portanto as implicações dessas consultorias perpassam pela perda ou redução da
autonomia da equipe técnica das escolas, pois provavelmente deverão se adequar a uma série
de orientações pedagógicas voltadas exclusivamente para os conteúdos adotados pelo
SARESP.
Outro aspecto a ser considerado na pesquisa de Souza e Arcas (2010) é que essa
política de avaliação estadual, a partir do momento em que define somente com base nas
avaliações do governo federal o que e como avaliar, passa, portanto, a limitar o currículo e a
formação dos professores, pois, como já dissemos, as avaliações do governo federal
geralmente focam em duas áreas do conhecimento. Como consequência desse processo, temos
novamente a lógica empresarial que passa a promover o treinamento dos professores em
detrimento da formação. Quanto aos alunos, percebe-se a lógica do treinamento em
detrimento da aprendizagem. Assim, a avaliação externa definitivamente ganha a centralidade
no sistema estadual de ensino paulista, pois, de acordo com Oliveira,
a avaliação assumiu finalidades mais classificatórias e menos formativadiagnóstica, visando incentivar a competição e a melhoria do desempenho por meio
de incentivos financeiros...Os professores passaram a ser mais diretamente
responsabilizados pelo desempenho dos alunos, tendo suas atividades pedagógicas
mais reguladas e controladas e seu desempenho mais associado à idéia de
certificação de competência e a incentivos ou punição financeira (OLIVEIRA, 2009,
p. 242).
De acordo com as pesquisas de Souza e Arcas (2010), ficou constatado também que o
SARESP não introduziu grandes mudanças na prática pedagógica. O que se verificou foi o
reforço às práticas tradicionais de avaliação da aprendizagem. Nesse contexto, indagamos:
será que estaria ocorrendo aprendizagem? Ou o SARESP estaria apenas preparando alunos
para os testes? Diante do que foi analisado, entendemos que está se criando uma cultura
também de apenas preparar os alunos para realizarem testes, conforme o que aconteceu nos
Estados Unidos, segundo o relato de Diane Ravitch.
Outro aspecto levantado pelos autores está relacionado com o tipo de cultura avaliativa
que estaria sendo forjada a partir dessa avaliação em larga escala. Segundo Souza e Arcas
(2010), essa cultura estaria voltada para uma perspectiva meritocrática devido ao bônus
mérito. Nossas análises nos levam a concluir que essa cultura avaliativa está contribuindo
para o aumento da competição, da concorrência e da discriminação entre docentes,
91
ratificando, portanto, por meio desse bônus, os princípios da eficiência, da eficácia e da
produtividade.
Até o momento, o SARESP é o sistema de avaliação estadual mais desenvolvido no
Brasil, por conta do tempo de criação, já que em 2013 completa dezessete anos. Além do
Estado de São Paulo, temos outros Estados, como o Espírito Santo, o Ceará e o Amazonas,
que passaram a adotar a premiação como uma de suas diretrizes, conforme veremos a seguir.
Nas pesquisas de Gatti, Barreto e André (2011), constatou-se que as Secretarias
Estaduais de Educação do Espírito Santo, Ceará e Amazonas implementaram a premiação ou
a bonificação por desempenho. A Secretaria Estadual de Educação do Espírito Santo instituiu
o bônus desempenho, que se caracteriza pela premiação em dinheiro concedida aos
profissionais desta secretaria que alcançaram bons resultados no PAEBES.
A Secretaria Estadual do Ceará instituiu em 2009 a premiação “Aprender pra Valer”,
regulamentada em lei, que leva em consideração o desempenho no SPAECE e determina
valores pecuniários que são distribuídos aos servidores das escolas premiadas. Essa premiação
também se estende para os alunos que se destacam no ensino médio, os quais recebem
microcomputadores.
Na Secretaria Estadual de Educação do Amazonas, foi instituído o Prêmio “Escola de
Valor”, que paga o 14º e 15º salários aos professores das escolas que alcançaram ou
ultrapassaram as metas do SAEB, do ENEM e do SADEAM.
Em relação aos aspectos desfavoráveis desse processo de premiação e bonificação,
Gatti, Barreto e André (2011) destacam: a dificuldade de se fazer uma avaliação justa e
precisa desses professores premiados, a diminuição de cooperação entre os professores
(competitividade), a concentração somente nos critérios utilizados nas avaliações (limitação
do currículo) e, por fim, o aumento de custos para implementar tais medidas. Quanto a este
último item, entendemos que, por serem os custos elevados, esses recursos deveriam ser
aplicados em escolas que tivessem mais necessidades ou então na construção de mais escolas.
Diante dessas pesquisas, posicionamo-nos totalmente contrários à premiação ou à
bonificação, já que
essa medida pode levar a um estreitamento (ou empobrecimento) do ensino por
focalizar apenas os aspectos incluídos nas avaliações externas, que servem de
critério para a premiação (GATTI, BARRETO E ANDRÉ, 2011, p. 210).
Em relação à implantação dos sistemas de avaliações nos municípios brasileiros,
vários passaram a criar seus próprios sistemas. Estes também adotam como referência as
92
avaliações padronizadas do governo federal. De acordo com Werle (2010), os municípios que
se destacam são: São Paulo, Rio de Janeiro, Teresina, Campo Grande e Marília.
Gatti, Barreto e André (2011) chamam a atenção para esse contexto das avaliações
externas sobre a situação de algumas prefeituras que, por não terem uma tradição de ensino e
no trato com o currículo, passam a ser alvos fáceis da consultoria das empresas privadas na
compra dos kits ou sistemas de ensino apostilados. Segundo as autoras, o MEC ainda não
entra nessa “caixa preta”.
Nesse contexto, vamos encontrar professores que aprovam a utilização desses
materiais e professores que não se sentem confortáveis com a utilização de tais recursos,
porque nem sempre eles permitem que os docentes consigam superar as dificuldades de
aprendizagem dos alunos, pois esses sistemas apostilados ou kits contribuem para a
“alienação dos professores e das escolas quanto à sua capacidade de decisão sobre o
currículo” (idem, 2011, p.48)
Em relação ao Estado do Pará, ainda não existe um sistema de avaliação estadual,
entretanto a SEDUC vem desenvolvendo uma série de ações na perspectiva de melhorar os
índices do IDEB. Dentre essas ações do governo, temos a publicação de quatro ações que
foram divulgadas no início de 2011 pelo então Secretário de Educação Nilson Pinto por meio
do site37 desta secretaria: “Temos que pôr em prática quatro ações: Melhorar a qualificação
da educação dos nossos professores, melhorar a estrutura física das escolas, melhorar a
forma de encaminharmos os processos de trabalho e ainda, premiar, por desempenho e
mérito, o profissional que se destacar”,
Diante das ações que o governo propõe, provavelmente essa melhoria da qualificação
se refere a uma formação centrada nas diretrizes da Prova Brasil. Sobre a melhoria da
estrutura física das escolas, entendemos que deveria ser introduzida pelo menos uma
padronização de no mínimo boas condições de trabalho para toda a rede estadual de ensino,
acabando, portanto, com escolas que funcionam em centros comunitários sem as mínimas
condições, conforme relatado anteriormente.
Porém, esses problemas ainda não foram resolvidos nem superados, mas já se fala em
premiação daqueles professores que se destacarem. Entendemos que os docentes que
trabalham nas escolas estaduais que funcionam em centros comunitários é que deveriam ser
premiados pelo esforço e dedicação, independentemente dos resultados nas avaliações
externas.
37
http://www.seduc.pa.gov.br/portal/?action=Destaque.show;iddestaque=990;idareainteresse=1
93
Portanto, é necessário retomar e finalizar a discussão sobre a relação do Estado
Avaliador e assim fazer a relação com a limitação do currículo e a pressão existente no corpo
docente, pois, conforme Maués (2009),
O Estado-avaliador estipula as metas a serem atingidas e estabelece mecanismos de
verificação dos resultados obtidos. O docente tem a obrigação de atingir tais
resultados, sob pena de que a instituição ao qual está vinculado possa deixar de
receber recursos, como uma forma de penalização (MAUÉS, 2009, p.13).
Essa citação esclarece o real objetivo desse Estado avaliador que, mediante
mecanismos de verificação (as avaliações externas), estipula as metas por meio dos índices
(IDEB) e define concretamente a punição, atrelada aos baixos resultados ou desempenhos
nessas avaliações externas.
Diante de todas as análises que foram feitas sobre as redes de ensino, apresentamos a
seguir três níveis de risco para que as redes estaduais e municipais de educação possam
perceber em que nível se encontram quando adotarem as avaliações externas como referência
na formulação das políticas públicas educacionais. Para chegarmos à elaboração desses níveis
nos baseamos nas experiências internacionais e nacionais relatadas nesta pesquisa.
Quadro 6. Nível de risco para as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação que adotam
como referência as avaliações externas
Níveis de Risco
Ações (Consequências)
Nível I
- As Secretarias de Educação adotam as diretrizes das avaliações
externas;
- As Secretarias introduzem testes simulados com base nas diretrizes das
avaliações externas;
- Limitam o currículo de alunos e a formação dos professores.
Nível II
- Somados aos itens anteriores;
- As Secretarias de Educação introduzem a Premiação e/ou bônus por
mérito ou desempenho;
- Implantação das consultorias de formação de professores (reduzindo
bastante a autonomia dos professores);
- Implantação das consultorias de avaliação.
Nível III
- Somados aos itens anteriores;
- Punição de escolas, professores e alunos que não alcançarem os índices
estipuladas pelas metas
Fonte: Elaborado pelo autor da pesquisa.
Esse quadro representa o esforço de uma sistematização do contexto atual das
avaliações externas. É lógico que algumas ações podem ser alteradas dependendo da situação
de cada rede de ensino. Diante de todas as análises que foram feitas até o momento é que
elaboramos esses três níveis de risco. Para chegarmos a essa elaboração, relacionamos os
diversos aspectos das avaliações externas que foram surgindo ao longo dos anos e que nos
serviram para indicar em que nível a SEMEC se encontra. É com base nesses níveis que
94
iremos analisar, no capítulo seguinte, a influência da Prova Brasil na política de formação de
professores da rede municipal de Belém, pois
a política nacional de avaliação sofre incrementos consideráveis, no decorrer da
primeira década dos anos de 2000, do que certamente decorrem repercussões nos
currículos, na formação e na própria avaliação do desempenho dos professores,
concebida, sobretudo, em função dos resultados de rendimento dos alunos (GATTI,
BARRETO, ANDRÉ, 2011, p. 40).
95
3 A POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO NACIONAL
E LOCAL
A “formação continuada” é uma realidade no panorama educacional brasileiro e
mundial, não só como uma exigência que se faz devido aos avanços da ciência e da
tecnologia que se processaram nas últimas décadas, mas como uma nova categoria
que passou a existir no “mercado” da formação contínua e que, por isso, necessita
ser repensada cotidianamente no sentido de melhor atender à legítima e digna
formação humana. Por isso, este movimento de educação de adultos assume, nos
dias atuais, uma outra configuração que abarca todas as dimensões do conhecimento
humano, com responsabilidades e compromissos que ultrapassam a concepção que o
gerou. A “formação continuada” hoje precisa ser entendida como um mecanismo de
permanente capacitação reflexiva de todos os seres humanos às múltiplas
exigências/desafios que a ciência, a tecnologia e o mundo do (não) trabalho colocam
(FERREIRA, 2006, p. 19-20).
Diante dessa ampla e complexa atividade, repleta de responsabilidades e
compromissos que é a formação de professores, consideramos importante neste capítulo
iniciar a discussão a partir do sentido etimológico da palavra formação; em seguida
discutiremos como este campo de atuação vem se tornando uma área de estudo na educação a
partir de diversos autores e depois apresentaremos as diversas políticas de formação
coordenadas pelo governo federal. Apresentaremos também duas concepções de formação de
professores, uma que leva em consideração a formação do tecnólogo do ensino e a outra que
pretende formar um agente social, conforme descreve Veiga (2002). Por fim, concentraremos
nossas análises na formação dos professores realizadas na Secretaria Municipal de educação
de Belém (SEMEC), tendo como período escolhido os anos de 2005 a 2011, para mostrar
quais as reformulações que essas formações sofreram no decorrer desses anos provocadas
pela Prova Brasil.
3.1 SIGNIFICADO E PERSPECTIVAS SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES
De acordo com Veiga (2008), a palavra formação no seu sentido etimológico vem do
latim formare, que significa dar forma. Para Ferreira (1989), a palavra formação significa o
ato ou modo de formar. Nesse contexto, a formação de professores “constitui o ato de formar
o docente, educar o futuro profissional para o exercício do magistério. Envolve uma ação a ser
desenvolvida com alguém que vai desempenhar a tarefa de educar, de ensinar, de pesquisar e
de avaliar” (VEIGA, 2008, p.15).
Concordamos com a autora quando ela diz que este processo possui múltiplas faces,
que tem um início, porém nunca terá um fim. Sendo assim, é lógico entender que a formação
96
do professor inicia-se na academia e deveria ou deve se estender durante o cotidiano da
prática pedagógica do professor, isto é, na escola.
Para Santos (2002), D´ávila e Sonevile (2008), a literatura que trata desse campo
educacional, especificamente ligada à educação básica sobre a formação dos professores, vem
ganhando destaque a partir da década de 1980 do século passado, como consequência do
processo de redemocratização em nosso país; por conseguinte, também passamos a ter nesses
últimos anos um aumento de publicações e eventos científicos que, dentre outros objetivos,
apresentam os desafios que os docentes têm que enfrentar diante do cenário de incertezas e
desânimo que são verificados no cotidiano da escola pública, que se manifestam por meio dos
baixos rendimentos escolares dos alunos, da evasão escolar, das condições precária das
escolas, da falta de uma política de valorização do magistério, dentre outros aspectos. Aos
desafios, que não são poucos, conforme visto anteriormente, somam-se outros, como os de
resolver problemas de alimentação e doenças dos alunos, ajudá-los a superar
problemas emocionais, orientá-los em relação ao comportamento sexual, trabalhar
com a prevenção ao crime e às drogas, entre outros. Como conciliar as atividades de
assistente social, de psicólogo, de profissional da saúde pública com o exercício do
magistério? (SANTOS, 2002, p.160-161).
Diante de todos esses desafios, apresentamos as políticas de formação que são
coordenadas pelo governo central. Para nos ajudar nesses comentários, recorremos às
pesquisas de Gatti, Barretto e André (2011), que retratam quais e como essas políticas foram
implementadas, pois
o governo federal, detectando a grande dispersão e a fragmentação das políticas
docentes no país, bem como os descompassos entre os programas de formação [...]
tomou uma série de iniciativas, tendo em vista promover suas articulação,
particularmente no âmbito das instituições públicas...Elas visam a fazer face à
demanda pela formação inicial em nível superior exigida pela Lei nº 9.394/1996,
(LDB) e pela formação continuada...delineia uma política nacional de formação
docente orientada pela perspectiva de instituição de um sistema nacional de
educação (GATTI, BARRETTO, ANDRÉ, 2011, p.49).
Portanto, como primeira iniciativa vamos ter em 2006, por meio do Decreto nº
5.800/2006, a criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB) 38, que se caracterizou por ser
um sistema integrado que envolve as instituições públicas de ensino superior (IPESs), cujo
objetivo é oferecer, por meio da Educação a Distância (EAD), cursos a uma parcela da
população que possui dificuldade em obter a formação em curso superior. Para a realização
dessas ações, a parceria com os municípios foi e ainda é fundamental, pois nessas localidades
são criados os polos de Educação a Distância (EAD), que permitem aos alunos realizarem
38
O Decreto nº 5.622/2005 antecedeu a criação da UAB, porém permitiu o ordenamento legal da EaD e passou a
equiparar os cursos a distância aos presenciais, garantindo a equivalência dos diplomas e certificados dos cursos
superiores.
97
suas atividades pedagógicas presenciais, assim como entrarem em contato com seus
formadores e tutores.
Freitas (2007) faz uma crítica à expansão desenfreada dos cursos superiores de
pedagogia e das licenciaturas nesse contexto da EAD. A autora apresenta diversos aspectos
negativos, dentre os quais citamos: a retirada da formação numa ambiência universitária, a
redução do espaço de discussão sobre os fundamentos epistemológicos e científicos da
educação, o barateamento e a aceleração dos cursos de formação.
Diante das políticas de formação que estão sendo apresentadas nesse contexto da
EAD, relatamos alguns aspectos que vão ao encontro dos argumentos apresentados até o
momento sobre essa modalidade de educação. Esse relato vem reforçar a necessidade da
realização de cursos à distância em algumas áreas do conhecimento e localidades, assim como
chamar a atenção sobre o barateamento dos cursos de formação. Durante os anos de 2008 a
2011, trabalhamos como formador e tutor, respectivamente, nos seguintes cursos: Educação
de Surdos sob o Enfoque da Inclusão (2008-2009) e Estratégias Pedagógicas para o Aluno
com Deficiência Mental (2010-2011). Esses cursos foram realizados em parceria com o MEC,
com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), com a UAB, com a
Universidade do Estado do Pará (UEPA) e a Secretaria de Estado de Educação (SEDUC).
No curso realizado em 2008-2009, os Professores da UEPA e SEDUC trabalharam
como Formadores e Tutores39 à distância, ministrando cursos para professores das diversas
redes de ensino público, de norte a sul do Brasil. Para a realização desse curso, era necessária
a existência de toda uma estrutura presencial e a distância, como salas de informática nos
polos locais (onde os professores-cursistas deveriam ter acesso a computadores para que
pudessem acessar as atividades pela internet, assim como se comunicar com os tutores ou
formadores a distância). Os Tutores locais que recebiam bolsas da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) desempenhavam, dentre outras
funções, a articulação com esses alunos, tiravam as dúvidas de acesso e envio das atividades
para que estas pudessem ser realizadas e enviadas a tempo para o tutor à distância ou
formador. Durante os anos de 2008 e 2009, observamos que o percentual de frequência, de
participação e de conclusão nas turmas em que estávamos trabalhando foi em torno de 80%.
Nos anos de 2010-2011, atuamos como tutor a distância de duas turmas e tivemos uma
frustração no que diz respeito à participação dos alunos, no acesso, no envio das atividades e
término do curso. Como tínhamos reuniões regulares com nossa coordenação local na UEPA,
39
http://uab.capes.gov.br/index.php?option=com_content;view=article;id=73;Itemid=29
98
fomos informados de que, a partir do ano de 2010, ficaria suspenso o pagamento da bolsa da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) para o tutor local
que atuava nesses cursos a distância devido à Resolução CD/FNDE nº 26, de 5 de junho de
2009. Essa suspensão da bolsa para o tutor local perpassa pela crítica de Freitas (2007) sobre
o barateamento dos cursos de formação de professores nessa modalidade de ensino.
Por mais que nós fizéssemos um grande esforço de acesso diário às atividades pela
internet, o retorno dos alunos não era o esperado, pois o tutor local, que nos outros anos fazia
a articulação nos municípios com os alunos, não estava mais presente. A conclusão a que
chegamos é que a falta de uma remuneração ou bolsa para o tutor local contribuiu para a
ausência de pessoas interessadas que pudessem atuar nessa função.
Esses aspectos indicam que a EAD, como todo instrumento ou recurso, tem o seu
valor, entretanto a forma como é utilizada é que determina a sua eficácia. É lógico que a
discussão sobre o uso da EAD não acaba aqui e também não é nossa intenção aprofundar esse
aspecto neste momento. Nossa intenção foi trazer para esse breve debate um pouco de nossa
experiência, dos avanços e dificuldades que encontramos nesta área da formação de
professores no uso da EAD.
A outra iniciativa no que diz respeito à formação dos professores pelo governo federal
foi a criação do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR),
em que as Instituições Públicas de Educação Superior (IPES) ficam responsáveis por
ministrar os cursos de nível superior aos professores que atuam nas escolas públicas dos
Estados e Municípios, mas que ainda não possuem uma formação adequada, conforme prevê a
LDB. Nesse contexto, tanto a UAB quanto o PARFOR se caracterizam por realizarem a
formação inicial dos professores.
No nível da formação continuada coordenada pelo governo federal, vamos ter o
programa Pró-Letramento40, instituído em 2005 e que tem como público-alvo os professores
das séries iniciais, com o objetivo de orientar o trabalho dos professores na perspectiva de
contribuir para a melhoria da qualidade da aprendizagem da leitura/escrita e matemática. É
um curso semipresencial com carga horária de 120h, sendo 84h presenciais e 36h a distância.
Outro programa de formação continuada do governo federal é o Programa Gestão da
Aprendizagem Escolar41 (GESTAR II), que possui uma carga horária de 300h, divididas em
atividades presenciais e a distância e oferece para os professores dos anos finais do ensino
fundamental uma formação em língua portuguesa e matemática. Entretanto, sob o nosso ponto
40
41
http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=698;id=12346;option=com_content;view=article
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content;view=article;id=12380;Itemid=642
99
de vista, o fato de esses cursos estarem voltados apenas para as duas áreas do conhecimento
que são avaliadas na Prova Brasil reforça nossas fundamentações e argumentações anteriores
sobre a perspectiva de uma educação de qualidade voltada somente para atender às
necessidades dos resultados das avaliações externas e do IDEB. Nesse contexto, concordamos
que
O modelo de formação docente que subjaz à oferta de cursos no âmbito federal
examinado [...] busca adequar-se ao paradigma hegemônico na vasta literatura
contemporânea sobre a formação de professores (GATTI, BARRETTO, ANDRÉ,
2011, p.81).
De acordo com o Parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE), CNE/CP nº
9/2001, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação dos Professores da
Educação Básica, no artigo 6º, §3º, fica explícito que as formações dos professores não devem
se restringir somente às necessidades das atividades específicas da sala de aula, mas que estas
devem proporcionar também ao professor uma formação mais ampla, pois
os documentos oficiais, emanados do poder central, têm destacado não apenas a
necessidade de os docentes possuírem uma cultura geral que os situe no mundo
contemporâneo, como também conhecimento que lhes forneçam uma visão ampla
sobre o papel econômico, político e social da educação (SANTOS, 2002, p.158).
Entretanto, observamos que, devido à grande atenção que o governo federal, os
estados e os municípios estão dando para os sistemas de avaliações, conforme apresentamos
no capítulo anterior, a necessidade apresentada por Santos (2002) está sendo deixada de lado,
pois, conforme as pesquisas de Souza e Arcas (2010), o que existe são formações de
professores limitadas, centradas, com o foco em apenas algumas áreas do conhecimento, ou
mais especificamente nas áreas que são exigidas nas avaliações externas.
Para Veiga (2002), a globalização passa a ter influência nesse processo já que vem
provocando grandes transformações em diversos setores da sociedade e no campo da
educação não é diferente, pois esse processo exige cada vez mais uma série de mudanças de
paradigmas nas práticas educativas, na organização do trabalho escolar e consequentemente
na formação dos professores. É nesse cenário de globalização e de reformas que Veiga (2002)
apresenta duas perspectivas de formação de professores, uma que leva em consideração a
formação do tecnólogo do ensino e a outra perspectiva é a do professor como agente social.
Na perspectiva do tecnólogo do ensino, as ações das formações estão concentradas nas
diretrizes curriculares e nas prescrições legais a partir da LDB. Conforme descreve a autora,
as características dessa tendência são a de proporcionar uma formação como parte de um
projeto político pedagógico que esteja de acordo com os interesses e orientações dos
100
organismos internacionais de financiamento na perspectiva de associar diretamente a
educação com o processo econômico de produtividade da sociedade capitalista.
Nessa perspectiva, a formação dos professores acontece para atender ao
desenvolvimento das competências técnico-profissionais, isto é, adequando a formação de
acordo com as exigências do mercado. E essas exigências são norteadas por um saber fazer
em que o foco está centrado no treinamento e na formação limitada, pois
Essa perspectiva de formação centrada nas competências é restrita e prepara, na
realidade, o prático, o tecnólogo, isto é, aquele que faz, mas não conhece os
fundamentos do fazer, que se restringe ao microuniverso escolar, esquecendo toda a
relação com a realidade social mais ampla que, em última instância, influencia a
escola e por ela é influenciada...reduzindo-se a uma formação pragmatista, simplista
e prescritiva (VEIGA, 2002, p.72-73).
No nosso ponto de vista, esse modelo de formação de professores que a autora
descreve está relacionado diretamente com o modelo das formações que estão sendo
realizadas no contexto das avaliações externas que vivemos atualmente, em períodos de
ENEM, Prova Brasil, Provinha Brasil, dentre outros.
Diante do que foi apresentado e analisado no segundo capítulo, observamos que,
devido ao surgimento dessas avaliações, algumas Secretarias de Educação de diversos estados
da federação e municipais passaram a criar seus próprios sistemas de avaliações e esse
aspecto vem afetando diretamente a formação de professores. Uma das principais funções
dessas formações é a realização do treinamento dos professores e alunos para responderem às
questões dessas avaliações. Esse aspecto será confirmado mais adiante quando apresentarmos
a proposta de formação de professores denominada de ALFAMAT.
Ao defender a formação do professor na perspectiva do agente social, Veiga (2002)
afirma que essa concepção considera a educação como uma prática social, sendo também um
instrumento de emancipação do professor, portanto uma formação mais sólida. Assim, tanto a
formação inicial quanto a continuada levam em consideração diversos aspectos críticos da
política global, da dimensão sociopolítica da educação e da escola, dos saberes múltiplos que
perpassam pelos saberes disciplinares, curriculares, de experiência profissional, da cultura e
do mundo, onde a pesquisa é utilizada como instrumento de produção de conhecimento, onde
a autonomia é exercitada pelos professores, e em decorrência desse processo temos a ação
coletiva de todos os integrantes que fazem parte do trabalho pedagógico. E, por fim, essa
perspectiva também leva em consideração os aspectos relacionados à sua categoria, à sua
carreira e suas condições de trabalho e salário.
De imediato percebemos que a formação do agente social se diferencia radicalmente
da do tecnólogo do ensino, pela sua abrangência na formação. Neste sentido, o cenário em
101
que vivemos atualmente, no qual as avaliações externas são implementadas e utilizadas pelas
redes de ensino como sendo talvez a única opção de melhoria da qualidade da educação e que
sempre encontramos tanto nos documentos oficiais quanto nas propagandas do governo, levanos a entender o porquê de as formações estarem sendo conduzidas para uma formação na
perspectiva do tecnólogo. Dentre os diversos aspectos que podemos analisar, consideramos
que essas formações, além de limitadas e focadas somente em alguns aspectos ou áreas do
conhecimento, não permitem que o professor reflita sobre as políticas educacionais
implementadas e nem reajam frente ao contexto em que vivem.
Freitas (2007) também faz uma análise sobre essa dicotomia na formação dos
professores ao apontar que os aspectos epistemológicos e científicos têm sido reduzidos, em
favor de uma formação de professores conteudista e pragmática. Nesse sentido, Freitas (2003)
defende novas formas de organização de desenvolvimento de espaços de formação de
professores com o objetivo de discutir e refletir sobre os referenciais teóricos que orientaram e
orientam as formações de professores. A autora destaca a concepção denominada de Base
Comum Nacional, concebida como forma de resistência aos processos de desqualificação e
desvalorização do professor.
Essa concepção está centrada nas múltiplas dimensões da formação humana que
consideram os aspectos cognitivo, ético, político, científico, cultural, lúdico e estético.
Portanto, esse modelo de formação vai de encontro a um currículo mínimo, proposto nas
avaliações externas, que considera somente alguns referenciais, diretrizes e parâmetros “tão
ao gosto das políticas educacionais atuais e de regulação do trabalho” (FREITAS, 2003,
p.1119). Nesse contexto, defendemos e apoiamos também a concepção da Base Comum
Nacional, devido a todas as características apresentadas.
Com o advento das avaliações externas, que possuem um foco centrado em algumas
áreas do conhecimento, temos observado as implicações dessas avaliações para as formações
dos professores, que privilegiam apenas o aspecto técnico, conforme a pesquisa de Souza e
Arcas (2010). Em relação ao campo da formação dos professores, entendemos que
alternativas existem, porém o que está acontecendo é a centralidade nos conteúdos das
avaliações externas, que provocam uma limitação da formação dos professores e que, de
acordo com as análises feitas anteriormente, têm a intenção de formar o tecnólogo do ensino.
Diante dessas análises sobre as formações de professores, comentaremos a seguir o que
consideramos como sendo as implicações das avaliações externas para a educação e
consequentemente para a formação do professor.
102
3.2 AS IMPLICAÇÕES DAS AVALIAÇÕES EXTERNAS TENDO COMO FOCO A
PROVA BRASIL
Por entendermos que a Prova Brasil é uma política pública de avaliação externa,
apresentaremos a seguir uma série de implicações decorrentes desse processo de avaliação em
conformidade com Michael Apple na perspectiva de que “a avaliação deve ser problematizada
no contexto de alterações mais amplas que dizem respeito, nomeadamente, a pressões
econômicas e ideológicas” (APPLE apud AFONSO, 2009, p.33).
Sendo assim, é importante problematizar os aspectos das avaliações externas.
Conseguimos identificar sete implicações a partir das leituras realizadas até o momento com
base nas pesquisas de Barroso (2003), Barreto (2001), Souza e Arcas (2010), Krawczyk
(2005), Frigotto (2010), Afonso (2009) e Werle (2010). De acordo com as pesquisas desses
autores, cujo objeto está relacionado também com as avaliações externas, procuramos
sistematizar e apresentar como as implicações das avaliações externas estão interrelacionadas. Esse processo nos ajuda a compreender melhor as implicações da Prova Brasil
para a escola, professores e alunos.
Como primeira implicação decorrente da avaliação externa, temos a criação de
padrões de aprendizagem no contexto internacional e nacional que “resulta da sobreposição
ou mestiçagem de diferentes lógicas, discursos e práticas na definição e acção de políticas, o
que reforça o seu caráter ambíguo e compósito” (BARROSO, 2003, p.24-25). Essa citação
nos permite entender por que nas três últimas décadas as avaliações externas se propagaram
por diversos países, conforme visto no segundo capítulo, justamente devido a toda uma lógica
de mercado, que está permeada por princípios da eficiência, da eficácia e da produtividade,
típicas desse processo do Estado neoliberal. A Prova Brasil, sendo uma política de avaliação
em larga escala, se enquadra neste modelo de padronização de aprendizagem, já que possui
uma série de descritores que são trabalhados nas diversas redes de ensino. Mesmo que eles
sirvam como os conhecimentos mínimos que devem ser esperados nos alunos das séries
iniciais, acabam por contribuir para essa padronização.
A segunda implicação é a limitação do currículo dos alunos e dos professores, pois
percebemos que o foco está centrado geralmente em algumas áreas do conhecimento, em sua
maioria na língua portuguesa e na matemática, que passam a estar de acordo com a
necessidade do mercado de trabalho. Nesse contexto, entendemos porque basta que o
trabalhador apenas saiba ler e que tenha desenvolvido o raciocínio lógico para que consiga ou
103
esteja apto ao trabalho, já que esses aspectos contribuem para a relação de quase-mercado,
aspectos estes que são concorrenciais, conforme descreve Barreto (2001).
A terceira implicação, decorrente da anterior, é a limitação dos programas
relacionados às formações dos professores. A partir das pesquisas realizadas por Souza e
Arcas (2010), no Estado de São Paulo, sobre o Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar
do Estado de São Paulo (SARESP), constatou-se que as formações estão focadas apenas nas
áreas do conhecimento que são exigidas nos testes padronizados das avaliações nacionais, isto
é, predominantemente em língua portuguesa e matemática.
A quarta implicação é a criação dos índices educacionais, dentre os quais citamos o
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que no nosso ponto de vista serve
para mensurar determinado aspecto; entretanto, esses índices servem também para estimular a
competitividade entre as escolas e os professores. De acordo com as pesquisas de Krawczyk
(2005), temos a introdução, em algumas redes de ensino, do “abono salarial”, que vai estar
atrelado aos resultados alcançados nas avaliações externas. A partir do momento em que
temos a divulgação dos resultados por meio do ranking, inicia-se, segundo Frigotto (2010),
uma simbiose, fazendo com que os professores passem a ser remunerados de acordo com
esses resultados, que, conforme o autor, são consequência de sua produtividade.
A quinta implicação é a criação dos sistemas estaduais e municipais de avaliação que
surgem na perspectiva de reforçar a limitação do currículo, a formação dos professores, a
competitividade, e o preconceito com as escolas que apresentam baixos índices, dentre outros
aspectos. Como as redes estaduais e municipais de ensino possuem apenas como referência as
avaliações do governo federal, Werle (2010) classifica esses sistemas de planos de
segmentação, sendo o primeiro plano no âmbito federal, o segundo no âmbito estadual e o
terceiro no âmbito municipal, com destaque para as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro,
Teresina, Campo Grande e Marília. Infelizmente essa ampliação apenas reforça a política de
avaliação com uma concepção classificatória, alimentando uma postura competitiva e
meritocrática, como no SARESP, em detrimento de uma avaliação formativa proposta por
Souza e Arcas (2010).
A sexta implicação é o surgimento do que APPLE (1993, p. 236 apud AFONSO,
2009, p. 91) denomina de Apartheid Educacional, a partir do momento em que passa a
selecionar os melhores alunos em algumas escolas com base nos resultados que são
divulgados por meio dos índices ou ranking. Divulgação essa que apenas expõe os docentes e
discentes e nunca o Estado, que tem o dever constitucional de oferecer a educação pública de
104
qualidade que defendemos nos diversos aspectos apresentados nos capítulos anteriores, que
perpassa também pela obrigação de garantir o pagamento do piso nacional dos professores.
A sétima implicação, decorrente das demais, é a condição prévia para a privatização
do ensino público, a partir da criação de um currículo nacional de acordo com os interesses do
mercado do trabalho, com normas e políticas de privatização e mercadorização. Segundo
Apple apud Afonso (2009), essas ações estão de acordo com os interesses da classe dominante
e, como consequência, vamos ter a liberação de linhas de crédito, com envolvimento de custos
altos para a implantação e/ou execução dos sistemas de avaliação e consequente escassez de
recursos como, por exemplo, para o financiamento de pesquisas educacionais que também
podem trazer benefícios para o sistema educacional, conforme descreve Barreto (2001). Essa
inversão de prioridades na liberação de recursos se torna uma grande contradição, que serve
apenas para saciar os interesses da classe dominante, enquanto ainda encontramos escolas
com condições precárias de trabalho para os docentes e de aprendizagem para os alunos.
Nesse contexto de implicações das avaliações externas, temos um ciclo que se
estabelece e que vem ganhando cada vez mais força nas redes públicas de ensino em nosso
país. Na figura 4, apresentamos este ciclo como forma de sintetizar as análises realizadas até o
momento. É bem provável que outras implicações estejam atreladas neste ciclo, assim como a
ordem delas pode ser alterada. Com o aprofundamento de nossas pesquisas poderemos
ampliar estes elementos, mas até o momento foram essas as implicações que conseguimos
identificar.
105
Figura 4. Ciclo que se estabelece decorrentemente das avaliações
externas
1 – Criação de padrões
de aprendizagem no
contexto internacional
e nacional
7 – Contribui para a
privatização do ensino
público
6 – Surgimento do
Apartheid Educacional
2 – Limitação do
currículo dos alunos e
dos professores
3 – Limitação dos
programas de
formações dos
professores
5 – Criação dos
sistemas estaduais e
municipais de
avaliação
4 – Criação dos índices
educacionais
estimulando a
competitividade entre as
escolas e professores
Fonte: Elaborado pelo autor da pesquisa.
No contexto das avaliações externas, ciclo é outro recurso que nos permite analisar
quais dessas implicações já estão sendo vivenciadas na Secretaria Municipal de Educação de
Belém, que apresentaremos no próximo tópico.
3.3 AS FORMAÇÕES REALIZADAS NA SEMEC ENTRE OS ANOS DE 2005 A 2011,
NORTEADAS PELO IDEB E PELA PROVA BRASIL
A partir de 2005, sob uma nova gestão municipal e sobre forte influência dos últimos
resultados do IDEB42, a SEMEC elegeu a categoria dos professores alfabetizadores como uma
das prioridades na sua política de formação continuada, tendo em vista o quadro que se
apresentava sobre a aprendizagem dos alunos, pois tanto os resultados de 2005 quanto os de
2007 indicavam dados bem abaixo da média nacional, conforme o quadro 7.
Na tentativa de mudar essa realidade nada animadora em relação à aprendizagem da
leitura e conhecimento matemático, em comparação com a média nacional, vamos ter na
42
Que motivaram inclusive o surgimento do Programa ALFAMAT, devido “o baixo ideb da rede de Belém
desde 2005”. Fala da coordenadora do NIED, Professora Maria Isabela Faciola Pessôa.
106
SEMEC três momentos distintos em relação à formação dos professores do ensino
fundamental das séries iniciais. O primeiro iniciado em 2005, por meio do programa chamado
de “Elaborando Conhecimento para Aprender a Reconstruí-lo” (ECOAR), que formou
praticamente todos os professores que atuavam no ciclo I e II43 da rede municipal de Belém.
O segundo momento iniciado em 2008 com o programa “Expertise em Alfabetização” e o
terceiro momento iniciado em 2009 com a criação do programa “Alfabetização Matemática
Leitura e Escrita” (ALFAMAT), que atua diretamente com os professores do ciclo II.
Quadro 7: O IDEB observado nos anos iniciais do Ensino Fundamental
Local
2005
2007
2009
2011
Brasil – Média Nacional44
3,8
4,2
4,6
5,0
IDEB observado na Rede Municipal de Belém45
3,0
3,4
3,9
4,4
Fonte: MEC/INEP
1º Momento das Formações: o curso de seis dias
Sobre o primeiro e o segundo momentos da formação de professores, aproveitaremos
nossa experiência na área, por termos atuado nessa equipe durante cinco anos, isto é, entre os
anos de 2005 a 2010, assim como nos valeremos das publicações que foram utilizadas em
cada um dos módulos para relatar a metodologia utilizada nessas formações. Também
aproveitaremos a publicação de Demo (2011), que fez um breve relato sobre a experiência
desse programa de formação de professores na SEMEC, que oferecia cursos intensivos de seis
dias, de segunda a sábado, nos turnos da manhã e da tarde, com carga horária de quarenta e
quatro horas semanais, ocasião em que era entregue o kit do professor, contendo uma pasta,
um compêndio, um diário de bordo (preenchido diariamente pelos professores cursistas e
onde estes avaliavam o curso sobre as temáticas abordadas, a metodologia utilizada, o tempo
de realização do curso), uma caneta e papel rascunho.
Como a SEMEC pretendia formar um grande número de professores, necessitava de
um espaço amplo para acomodá-los. Assim, a Secretaria firmou um convênio com o Instituto
de Estudos Superiores da Amazônia (IESAM), por meio do qual eram garantidos seis salas de
43
A SEMEC não utiliza a nomenclatura (ou denominação) de seriação em suas escolas; estas foram substituídas
pelo sistema de ciclos. Sendo assim, no ciclo I temos três séries: a alfabetização, o primeiro e o segundo ano do
ciclo. No ciclo II temos o primeiro e o segundo anos, que correspondem, respectivamente, à 3ª e à 4ª séries. O
ciclo III corresponde à 5ª e à 6ª séries e o ciclo IV corresponde à 7ª e à 8ª séries.
44
45
http://ideb.inep.gov.br/resultado/resultado/resultadoBrasil.seam?cid=33348
http://ideb.inep.gov.br/resultado/resultado/resultado.seam?cid=33348
107
aula e o auditório para a realização dos cursos. Outra preocupação da Secretaria era garantir a
presença de todos os professores no curso em horário integral e assim evitar a dispersão. Para
isso, a SEMEC oferecia almoço gratuito para todos os professores durante a realização de
cada curso, no restaurante localizado ao lado da Basílica de Nazaré.
A metodologia adotada no ECOAR era bem diversificada. Em cada dia tinha uma
questão norteadora sobre cada temática do curso, e era solicitada a leitura de textos, com
produção e apresentação escrita individual e em grupo. As outras metodologias utilizadas no
curso exploravam os recursos da dramatização, da poesia, da pesquisa e a análise e debate de
filmes relacionados com o contexto educacional. A seguir, comentaremos sobre estes
cursos46, destacando suas temáticas, suas edições, o quantitativo de professores que
participaram de cada curso e o ano em que estas formações ocorreram.
1º Curso
O primeiro curso, que teve a temática aprendizagem e alfabetização, tinha um
compêndio com 164 páginas, foi realizado em nove (9) edições e o objetivo era realizar a
formação para todos os professores que atuavam no ciclo I e II. Esse quantitativo atingiu 931
professores nos anos de 2005 a 2006. Por se tratar de um curso de formação continuada, os
textos desse primeiro curso procuraram aprofundar ou relembrar a temática dos diversos tipos
de alfabetização: da aprendizagem, da ecológica, da tecnológica do professor e da científica.
Os outros temas abordados foram: a avaliação da aprendizagem no currículo escolar, a
importância da pesquisa na prática pedagógica e o desafio do projeto pedagógico na escola. A
seguir detalharemos a metodologia de cada dia de curso.
Quadro 8. 1º curso ECOAR
Dias
1º dia
2º dia
3º dia
46
Atividades
- A questão norteadora tinha como tema principal o processo de aprendizagem do aluno. Os
textos tratavam sobre a alfabetização ecológica, a alfabetização tecnológica do professor, a
metodologia da alfabetização e as novas tecnologias na educação. A partir da questão
norteadora e dos textos disponíveis era solicitado do professor a produção escrita individual
sobre um dos textos lidos. Por fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- A questão norteadora abordava o processo avaliativo da prática do professor e a partir
dessa questão norteadora o professor optava pela leitura de um dos três textos sobre a
avaliação. Depois era solicitada uma produção em equipe sobre a questão norteadora,
seguida de exposição e debate sobre a temática. Por fim, o professor preenchia o diário de
bordo.
- Este dia era destinado exclusivamente ao recurso da dramatização, em que as equipes
deveriam elaborar uma peça sobre o bom e o mau desempenho do aluno e do professor.
Pelo turno da manhã as equipes se organizavam por sala, onde preparavam o roteiro e
http://expertiseemalfabetizacao.blogspot.com.br/
108
4º dia
5º dia
6º dia
ensaiavam. Pelo turno da tarde as apresentações iniciavam. Por fim, o professor preenchia o
diário de bordo.
- A temática central abordava a questão da pesquisa como princípio educativo, era
disponibilizado o estudo de quatro textos sobre a pesquisa, na perspectiva de oferecer ao
professor subsídio teórico da importância da prática da pesquisa no processo de
aprendizagem do aluno. Por fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- No turno da manhã, eram formadas dez equipes, sendo duas por sala; de posse de um
roteiro que constava no compêndio, os professores iriam concentrar sua pesquisa de acordo
com as temáticas: leitura e aprendizagem (biblioteca), leitura e consumidor (supermercado),
leitura e religiosidade (igreja), espaço de leitura (banca de revista), a leitura na escola
pública, a leitura na escola particular, a leitura no lanche (lanchonetes, sorveterias), a leitura
arquitetônica (prédios, casas), a leitura na farmácia, a leitura ecológica (a poluição sonora,
visual e ambiental nas imediações). A partir dessas temáticas os professores realizavam suas
pesquisas nos espaços correspondentes. No turno da tarde as pesquisas realizadas pelos
professores eram socializadas no auditório. Por fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- No último dia do curso cada professor elaborava ou reelaborava seu projeto pedagógico
individual e finalizava com o preenchimento do diário de bordo.
Fonte: SEMEC (2005)
2º Curso
No segundo curso a temática era de leitura e escrita, o compêndio utilizado era de 239
páginas. Este segundo módulo foi realizado em sete (7) edições e contou com a participação
de 782 professores entre os anos de 2006-2007. Assim como no curso anterior, a metodologia
adotada foi a mesma no que diz respeito à leitura e à produção escrita, assim como na
dramatização e na pesquisa. Os textos estavam enfocando a aprendizagem e a construção do
conhecimento, o ensino e aprendizagem da leitura e escrita, as práticas de alfabetização, a
avaliação da aprendizagem e a pesquisa como princípio educativo. A seguir vamos detalhar
mais a metodologia de cada dia de curso.
Quadro 9. 2º curso ECOAR
Dias
1º dia
2º dia
3º dia
4º dia
Atividades
- A questão norteadora tratava sobre a aprendizagem e a reconstrução do conhecimento e os
textos tratavam sobre o saber pensar, as bases biológicas da aprendizagem e
desenvolvimento humano. Após a escolha de um dos textos e a leitura, era solicitada a
produção escrita individual do professor e por fim o professor preenchia o diário de bordo.
- A questão norteadora pedia a elaboração de um texto sobre o processo de ensinoaprendizagem da leitura e escrita da criança. A partir da questão norteadora o professor
optava pela leitura de três textos: a psicogênese da língua escrita, alfabetização e leitura.
Logo após, era solicitada a produção em equipe sobre a questão norteadora, seguida de
exposição e debate sobre a temática. Por fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- Este dia era destinado exclusivamente ao recurso da dramatização, em que as equipes
deveriam elaborar uma peça sobre as práticas de alfabetização a partir dos seguintes temas:
Eu finjo que ensino, o aluno finge que aprende; O alfabeto não alfabetizado; Pesquisa na
alfabetização; Alfabetização inclusiva; O professor que não alfabetiza; O ambiente
alfabetizador ideal; Inclusão digital na alfabetização; O professor que faz a diferença na
alfabetização; Para avaliar na alfabetização e os Recursos didático-pedagógicos para
alfabetizar. Pelo turno da manhã as equipes se organizavam por sala, onde preparavam o
roteiro e ensaiavam. Pelo turno da tarde as apresentações iniciavam. Por fim, o professor
preenchia o diário de bordo.
- O tema era sobre a avaliação da aprendizagem, e eram disponibilizados quatro textos,
109
5º dia
6º dia
sendo escolhido um, para que fosse respondida a seguinte questão norteadora: Expresse sua
concepção de avaliação relacionando-a a práticas contextualizadas no seu ambiente
educativo. Neste dia era solicitada uma produção individual sobre a temática acima. Por
fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- A metodologia utilizada era a pesquisa, com o tema sobre o analfabetismo funcional. Pela
manhã, eram formadas dez equipes, sendo duas por sala; de posse de um roteiro que
constava no compêndio, os professores iriam concentrar suas pesquisas nos textos bíblicos,
em notas de compras, em gráficos, extrato bancário, ingresso de cinema, charge, texto
jornalístico, texto publicitário, cardápio e convites. No turno da tarde as pesquisas realizadas
pelos professores eram socializadas no auditório. Por fim, o professor preenchia o diário de
bordo.
- No último dia do curso cada professor elaborava ou reelaborava uma proposta de
avaliação e intervenção para ser trabalhada com sua turma. Por fim, o professor preenchia o
diário de bordo.
Fonte: SEMEC (2006).
3º curso
Neste curso a temática trabalhada era o conhecimento lógico-matemático, o
compêndio utilizado tinha 192 páginas, foi realizado em sete (7) edições e contou com a
participação de 782 professores, nos anos de 2006-2007. Apesar de a metodologia manter, nos
seis dias de curso, a leitura, a produção escrita individual e em grupo, o diferencial neste
módulo foi a substituição do recurso da dramatização (que foi utilizado nos dois primeiros
cursos) pela Oficina de jogos matemáticos, na qual os professores tiveram a oportunidade de
confeccionar jogos educativos com o objetivo de utilizarem esse recurso na sala de aula com
seus alunos.
Os textos utilizados neste módulo enfatizavam o conhecimento lógico-matemático, o
ensino e a aprendizagem da matemática e o uso das tecnologias na aprendizagem da
matemática. A seguir apresentaremos com mais detalhes a metodologia e temáticas adotadas
em cada dia de curso.
Quadro 10. 3º curso ECOAR
Dias
1º dia
2º dia
3º dia
Atividades
- A questão norteadora tratava sobre os aspectos etimológicos e conceituais da matemática,
procurando relacionar esse conhecimento com o dia a dia dos alunos. A partir da questão
norteadora eram disponibilizados aos professores textos que tratavam sobre a natureza do
saber matemático e suas competências. Após a escolha de um dos textos e da leitura, era
solicitada a produção escrita individual dos professores. Por fim, o professor preenchia o
diário de bordo.
- A questão norteadora pedia a elaboração de um texto sobre como trabalhar as dificuldades
das crianças no ensino da matemática. Para respaldar essa produção escrita, o professor
tinha como opção de leitura textos sobre a construção dos conceitos de números pelas
crianças, a utilização do corpo no ensino da matemática e a escrita da linguagem
matemática. A Produção do texto era em equipe sobre a questão norteadora, em seguida era
feita a apresentação, análise e discussão sobre o texto produzido. Por fim, o professor
preenchia o diário de bordo.
- Neste dia o foco principal era a confecção, utilização e fundamentação do jogo como
material didático, na perspectiva de levar essa prática para a sala de aula, cujo objetivo
110
4º dia
5º dia
6º dia
principal era tornar a aprendizagem da matemática para as séries iniciais algo mais concreto
e prático. Para auxiliar o professor nesse processo de construção, eram disponibilizados ao
professor textos sobre a importância e a utilização dos jogos para as séries iniciais. Pela
parte da manhã os professores, a partir de suas vivências e dificuldades, confeccionavam os
jogos e na parte da tarde cada equipe apresentava para a turma sua produção. Em seguida
era colocada em discussão a finalidade prática de cada jogo, na perspectiva de atender às
necessidades dos alunos na escola. Por fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- Neste dia o foco estava voltado para os projetos de aprendizagem e como fazer a avaliação
da aprendizagem nesses projetos. Para subsidiar essa temática, os textos utilizados estavam
relacionados com projetos de ensino da matemática e textos sobre a avaliação. Portanto, a
partir da vivência do professor, da necessidade da sua turma e da fundamentação teórica
disponível, era solicitada do professor a elaboração de um projeto para solucionar ou tentar
solucionar uma dificuldade encontrada na turma sobre a aprendizagem da matemática. Essa
atividade era realizada pelo turno da manhã e tarde. Por fim, o professor preenchia o diário
de bordo.
- A metodologia utilizada neste dia era a pesquisa, com o tema sobre a matemática no
cotidiano. Pela manhã, eram formadas dez equipes, sendo duas por sala; de posse de um
roteiro que constava no compêndio, os professores iriam concentrar suas pesquisas nas
formas geométricas encontradas no cotidiano, no supermercado (fazendo a relação de preço
e quantidade), o estudo das tabelas das lanchonetes, os gráficos e tabelas presentes nas
mídias, os produtos mais vendidos no Ver-o-peso, os diversos preços e composições do
tacacá e açaí. Por fim, o professor preenchia o diário de bordo.
- Com base na metodologia, nos textos, nas vivências e necessidades de cada professor,
neste dia cada docente elaborava uma proposta de material didático próprio para ser
trabalhado com sua turma e por fim o cursista fazia o preenchimento do diário de bordo.
Fonte: SEMEC (2006).
Ainda em 2006, foi elaborado o curso ECOAR - Mediadores de leitura, específico
para os professores lotados nas salas de leitura das escolas. O curso aconteceu em duas
edições neste mesmo ano e formou um total de 253 professores. O foco da formação também
estava concentrado na alfabetização, no letramento e na matemática. Por fim, nos anos de
2007 e 2008, foi realizado um curso com a temática sobre a educação ambiental e a
sustentabilidade. Assim como nos demais, este curso foi realizado em seis dias, com textos
que exploravam os conceitos e as práticas de educação ambiental, o currículo, a
interdisciplinaridade e a pesquisa socioambiental. Nesses dois anos aconteceram sete edições,
das quais participaram 754 professores.
Ao realizar a descrição desses cursos, procuramos destacar os aspectos mais
importantes. Como esse programa de formação não era o escopo de nossa pesquisa, sugerimos
a quem quiser se aprofundar sobre o assunto que procure a SEMEC para tentar esclarecer
outras dúvidas que não foram abordadas aqui.
Nossas análises sobre o primeiro momento da formação dos professores
Pudemos observar que nessas formações as atenções estavam voltadas para o processo
de alfabetização dos alunos, para o exercício da produção escrita do professor, para a
111
valorização do corpo docente da própria rede de ensino para atuar como formador e para o
preenchimento do diário de bordo como instrumento de avaliação do curso.
O foco para se trabalhar nas formações dos professores das séries iniciais deve ser
também as áreas da alfabetização, do letramento e do conhecimento matemático, pois esses
conhecimentos permitirão que o indivíduo possa ingressar no mundo letrado, o que vai
contribuir para o seu processo de construção da cidadania. À medida que o indivíduo vai
avançando nas séries, espera-se que ele possa atuar em nossa sociedade de uma forma mais
participativa, crítica e autônoma. Nesse contexto, entendemos que
Alfabetização é dar acesso ao mundo da leitura. Alfabetizar é dar condições para que
o indivíduo-criança ou adulto tenha acesso ao mundo da escrita, tornando-se capaz
não só de ler e escrever, enquanto habilidades de decodificação e codificação do
sistema da escrita, mas e, sobretudo, de fazer uso real e adequado da escrita com
todas as funções que ela tem em nossa sociedade e também como instrumento na
luta pela conquista da cidadania plena (SOARES, 1998, p.33).
Em relação ao conhecimento matemático, concordamos com o texto dos Parâmetros
Curriculares Nacionais já que:
As necessidades cotidianas fazem com que os alunos desenvolvam uma inteligência
essencialmente prática, que permite reconhecer problemas, buscar e selecionar
informações, tomar decisões e, portanto, desenvolver uma ampla capacidade para
lidar com a atividade matemática. Quando essa capacidade é potencializada pela
escola, a aprendizagem apresenta melhor resultado (BRASIL, 1997, p. 37).
Entretanto, para se formar indivíduos participativos, críticos, autônomos, devem ser
levados em consideração na formação dos professores o aspecto cognitivo, o ético, o político,
o científico, o cultural, o lúdico e o estético. Freitas (2003) descreve esses aspectos como
sendo as múltiplas dimensões da formação humana.
O exercício ou o resgate da produção individual do professor a partir das leituras dos
textos tentando fazer a relação com a sua prática pedagógica contribuiu positivamente na
elaboração ou reelaboração do projeto pedagógico, da proposta de intervenção com foco na
avaliação e no uso do material didático. Outro aspecto a considerar foi que a equipe de
formação de professores era composta exclusivamente de professores concursados da própria
rede de ensino, o que, no nosso ponto de vista, é positivo, pois valorizou o docente da própria
rede sem que houvesse a necessidade de se contratar empresas ou profissionais de outras
redes de ensino. O preenchimento do diário de bordo nos cursos permitia uma avaliação
imediata sobre o bom andamento ou não das atividades realizadas nas formações, o que
favorecia uma intervenção rápida da coordenação sobre eventuais problemas que poderiam
surgir.
112
Diante do que foi apresentado sobre esse primeiro momento das formações,
consideramos que o aspecto negativo ficou por conta da formação que, de acordo com o que
percebemos, aconteceu a partir da perspectiva do tecnólogo do ensino, cujo foco era a
dimensão cognitiva. Devido ao fato de a carreira do magistério não ser curta e por ser repleta
de desafios, é necessária e fundamental uma formação que não leve em consideração apenas o
aspecto pedagógico. Por isso é importante que os outros aspectos da dimensão da formação
humana, que citamos anteriormente, sejam também contemplados. Nesse sentido, poderia ser
pensada uma proposta de formação na qual, além do aspecto da alfabetização, pudessem ser
trabalhados simultaneamente outros aspectos da dimensão proposta por Freitas (2003), o que
provavelmente contribuiria para uma formação mais sólida e completa para o professor.
2º Momento das Formações: Expertise em alfabetização
Após os cursos de seis dias, a metodologia das formações passaram por reformulações
e esse foi o aspecto que deu início ao segundo momento de formação de professores da
SEMEC, que foi chamado de “Expertise em alfabetização”, cujo objetivo principal era
alfabetizar a criança no primeiro ano do ciclo. Outro aspecto considerado como um
diferencial foi que o local da formação passou a ser a escola. Foram formados grupos de
escolas localizadas nos bairros e, de acordo com a localização das escolas, a escolhida era
aquela mais equidistante entre as demais. Essas formações aconteciam uma vez por mês, com
quatro horas de duração, no horário da hora pedagógica (HP)47 do professor, sob a
coordenação de dois formadores.
Essa formação era específica para todos os professores do ciclo I. Entre os anos de
2008 a 2010, juntamente com outro formador, realizávamos a formação para os professores de
10 escolas, o que dava uma média de quarenta (40) professores por formação. As nossas
atribuições como formador eram:

Realizar as formações mensais para o grupo de escolas tendo como foco a
alfabetização, o letramento e a matemática;

Realizar o assessoramento pedagógico mensal para todas as turmas na escola;

Analisar, tabular e socializar mensalmente a psicogênese da escrita de todos os
alunos;
47
De acordo com SEMEC (2003), foi uma política de valorização na formação dos professores de Belém,
implantada desde 1998, quando foram acrescentados 25h/a no vencimento do professor para que ele possa
realizar a sua formação continuada, o seu planejamento, a confecção do material didático, etc.
113

Mediar os relatos sobre os processos e/ou experiências relacionados com as
aprendizagens dos alunos.
Conforme citado, observamos que o foco continuava voltado para as áreas de
alfabetização, do letramento e da matemática. Essa nova metodologia de formação era
trabalhada por oito duplas de formadores e atingiu um quantitativo de aproximadamente 950
professores durante os três anos. A partir de 2008 passamos a observar a preocupação dos
professores e coordenadores das escolas, assim como da equipe de formação, com os
descritores de outra avaliação externa que tinha sido realizada de forma piloto pelo MEC em
2008 que foi a Provinha Brasil, na qual trabalhamos como aplicadores. Foi devido também ao
nosso trabalho de formador e por estarmos vivenciando no cotidiano das escolas a chegada
das avaliações externas no ensino fundamental que nos sentimos instigados e motivados a
realizar a pesquisa sobre a Prova Brasil. A seguir, serão apresentadas nossas análises sobre
essa segunda etapa da formação dos professores.
Nossas análises sobre o segundo momento da formação dos professores
Sobre esse segundo momento da formação de professores, nossas considerações estão
relacionadas com a utilização da escola como espaço de formação, com a preocupação e
persistência do processo de alfabetização das crianças na perspectiva de alfabetizar o aluno na
primeira série e com a socialização de cada escola sobre o nível da psicogênese da escrita dos
alunos.
A partir do momento em que a escola passou a ser o local da formação, essa ação
fortaleceu e valorizou o local de trabalho do professor, além de contribuir para agregar os
docentes das escolas, pois essa formação serviu para mostrar aos outros professores da rede de
ensino as condições que o professor tem em relação aos seus recursos e instrumentos
pedagógicos.
Essa formação serviu também para socializar os problemas, os avanços e as
dificuldades de diversas ordens que são vivenciados na escola. Essa aproximação e esses
momentos de socialização proporcionaram muitos ganhos relacionados ao aspecto
pedagógico, principalmente no que se refere à aprendizagem dos alunos, e garantiram a
inovação da prática coletiva desses profissionais, pois “a formação personalista e isolada pode
originar experiências de inovação, mas dificilmente levará a uma inovação da instituição e da
prática coletiva dos profissionais” (IMBERNÓN, 2006, p.80).
Como o foco continuava sendo a leitura, a escrita e o conhecimento lógico
matemático, as ações se intensificaram. A avaliação do nível da psicogênese da escrita dos
114
alunos de cada escola, que era socializado e analisado mensalmente, permitiu ao professor
entender que é possível alfabetizar a criança da escola pública na primeira série, mesmo com
todos os problemas e dificuldades nela vivenciados.
Assim como no primeiro momento da formação, entendemos que esse segundo
momento da formação dos professores também aconteceu na perspectiva do tecnólogo do
ensino, já que o foco ficou centrado apenas no aspecto cognitivo. Outro aspecto negativo foi a
utilização da prova como o único instrumento de avaliação, que era utilizado na socialização
do nível da psicogênese da escrita dos alunos, pois defendemos outros instrumentos além da
prova, como os relatórios, os portfólios, as observações, dentre outros.
Como essas formações passaram a acontecer a partir de 2008, ano do surgimento da
Provinha Brasil, observamos a preocupação dos coordenadores e dos formadores da equipe de
formação com essa avaliação externa. Com isso, suas atenções se voltaram também para os
seus descritores, aspecto esse que contribui para a limitação da formação do professor e do
currículo do aluno, conforme apresentamos anteriormente quando falamos sobre as
implicações das avaliações externas.
Também foi considerada negativa a sobrecarga do trabalho dos formadores que
também eram (são) professores, pois a quantidade elevada de escolas (aproximadamente 10),
de professores (40) e de turmas para cada dupla de formadores assessorarem estava
contribuindo para o aumento da sobrecarga de trabalho desses formadores, o que está
relacionado diretamente com o processo de intensificação do trabalho docente, como descreve
Hypólito (1999) e Cunha (1999).
Vivenciamos esse modelo de formação e trabalhamos nesta equipe do ECOAR até
dezembro de 2010 e no início de 2011, após sermos aprovado no processo seletivo do
programa de pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Pará (UFPA), fomos
liberados para cursar o Mestrado em Educação na Linha de Pesquisa Políticas Públicas
Educacionais.
Entretanto, o Programa de Formação de Professores Expertise em alfabetização
continuou com suas atividades e, de acordo com o site48 desse programa de formação, outros
cursos foram implementados.
Um aspecto positivo é que, apesar de as suas atenções terem se voltado para os
descritores da Provinha Brasil, o programa atingiu todos os professores do ciclo I e atendeu ao
que determina a LDB (2011) no seu artigo 62, §1º, segundo o qual “A União, o Distrito
48
http://expertiseemalfabetizacao.blogspot.com.br/
115
Federal, os estados e os municípios, em regime de colaboração, deverão promover a
formação inicial, a continuada e a capacitação dos profissionais de magistério”.
Devido à preocupação da SEMEC em melhorar os índices do IDEB, outros
departamentos se integraram nas formações dos professores da SEMEC. Assim, temos o que
consideramos como o terceiro momento da formação dos professores do ensino fundamental
que foi o programa ALFAMAT, o qual apresentaremos no tópico a seguir.
3.4 A IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA ALFAMAT EM 2009
O 3º Momento das Formações: o programa “Alfabetização Matemática Leitura e
Escrita” (ALFAMAT)
Conforme expusemos anteriormente, diante de um contexto de demanda de formações
que pudessem atender a todos os segmentos de professores da SEMEC, surge o ALFAMAT,49
e o NIED passou a ser o departamento responsável pelas formações dos professores que
atuavam no ciclo II, que corresponde às turmas de 4ª série/5º ano, turmas estas avaliadas pela
Prova Brasil. É nesse período que surge o terceiro momento de formação continuada de
professores da SEMEC, que teve início em 2009, pois, até o ano de 2008, o NIED
concentrava suas formações praticamente para os professores que lecionavam nas salas de
informática das escolas municipais.
Antes de fazermos nossas análises sobre esse programa é importante ressaltarmos que,
na fase final desta pesquisa no ano passado, enfrentamos alguns óbices, como a transição
política da gestão municipal por conta das eleições para prefeito de 2012. Isso impossibilitou
o acesso aos documentos oficiais (relatórios e publicações) referentes ao ALFAMAT, pois,
quando estivemos no NIED, fomos informados pela sua coordenadora, Professora Maria
Isabela Faciola Pessôa, que, devido ao fato de esses documentos estarem em fase final de
conclusão, nossas análises não poderiam ser realizadas naquele momento. Esse fator
dificultou outras análises que poderiam ter sido feitas.
Diante dessa dificuldade e para dar conta desse processo histórico de instalação do
ALFAMAT na rede municipal de Belém, vamos nos valer dos depoimentos e dos discursos
proferidos pelas autoridades da SEMEC presentes no seminário que aconteceu nos dias 28 e
29 de novembro de 2012, na cidade de Belém, do qual participamos, cujo nome foi Seminário
IDEB: Qualidade social da educação em debate, que ocorreu no auditório da Universidade da
49
http://nied-alfamat.blogspot.com.br/
116
Amazônia (UNAMA) e contou com o apoio e participação dos representantes do MEC, da
SEDUC e da SEMEC.
Sendo assim, tivemos todo o cuidado e a atenção especial de concentrar nossas ações
nas duas fontes documentais a que tivemos acesso. A primeira foi o site do programa, no qual
constam seus objetivos e suas provas. A segunda fonte foi o evento citado anteriormente, do
qual trazemos como referência a fala da coordenadora dessa política.
Neste evento, a coordenadora do NIED, Professora Maria Isabela Faciola Pessôa,
apresentou para o público presente o programa ALFAMAT, seus objetivos, sua trajetória, o
quantitativo de professores formados, a matriz teórica e a metodologia utilizada. Por se tratar
de um evento público com uma fala oficial sobre o programa de formação que estávamos
investigando, consideramos relevantes essas informações para nossas análises sobre o objeto
da pesquisa.
A análise de conteúdo como nosso instrumento
Assim como fizemos no segundo capítulo, no qual realizamos a análise de conteúdo de
documentos, aqui também utilizaremos esse instrumento de pesquisa para fazer nossas
análises, pois concordamos com Franco (2008) quando afirma que as mensagens, sejam orais
ou escritas, são importantes, já que elas expressam um significado e portanto não podem ser
consideradas uma ação isolada. Assim, tanto as informações disponíveis no site do
ALFAMAT quanto a fala da coordenadora do NIED nos ajudaram a encontrar as respostas
que foram formuladas nos objetivos de nossa pesquisa. Desse modo, vamos iniciar essas
análises pelo site, nossa primeira fonte documental sobre esse programa de formação, onde
constam também as provas com o mesmo formato da Prova Brasil, incluindo seus descritores,
e as quais são utilizadas para avaliar os alunos a cada dois meses.
A – A MENSAGEM ESCRITA
No site do ALFAMAT, que apresentamos a seguir, pudemos observar dois aspectos
importantes, no primeiro (1) verificamos que ele disponibiliza provas semelhantes ao modelo
aplicado pela Prova Brasil. O outro aspecto (2) se refere aos objetivos do ALFAMAT e
consideramos como sendo o principal, que é o de “possibilitar a vivência e discussão de
metodologias para o ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa e Matemática. As referidas
metodologias norteadas pelos descritores da Prova Brasil, instrumento de avaliação do
Ministério da Educação (MEC)”.
117
Figura 5. o site do ALFAMAT
1
2
Fonte: http://nied-alfamat.blogspot.com.br/
118
Figura 6. Provas de 2009, 2010 e 2011 do programa ALFAMAT
Fonte: http://nied-alfamat.blogspot.com.br/2010/01/provas-do-alfamat-2010-1-prova-de.html
Figura 7. Capa das provas do ALFAMAT
Fonte: http://pt.scribd.com/doc/73749951/C22ano-maio2011finaliz
As figuras 6 e 7 ilustram os anos, as provas e as áreas do conhecimento (língua
portuguesa e matemática) que tiveram centralidade durante o programa de formação de
professores ALFAMAT a partir de 2009.
119
Figura 8. Questões da prova de língua portuguesa do ALFAMAT
Fonte: http://pt.scribd.com/doc/73749951/C22ano-maio2011finaliz
Essas quatro primeiras questões da prova de língua portuguesa do ALFAMAT
referem-se ao tópico I da Língua portuguesa da Prova Brasil, que trata dos Procedimentos de
leitura e está relacionado com a função de localizar informações explícitas em um texto. Essas
questões possuem totais semelhanças com o modelo apresentado na figura 2, inclusive o
número de alternativas e os comandos.
120
Figura 9. Questões da prova de matemática do ALFAMAT
Fonte: http://pt.scribd.com/doc/73749951/C22ano-maio2011finaliz
Essa questão de matemática do ALFAMAT está relacionada com o tema I da Prova
Brasil de matemática que trata do Espaço e Forma. Nesse tema existem cinco descritores e a
questão acima possui a seguinte função: identificar a localização/movimentação de objeto em
mapas, croquis e outras representações gráficas. Assim como na prova de língua portuguesa
do ALFAMAT, a questão acima possui total semelhança com o modelo apresentado na figura
3, inclusive o número de alternativas e o comando.
Os objetivos que constam no site do programa, como oportunizar momentos de
vivências e discussões sobre metodologias de ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa e
Matemática, são fundamentais para o processo de alfabetização das crianças, portanto devem
permear todas as propostas pedagógicas do ensino fundamental, pois elas vão ao encontro do
que propõem Soares (1998) e Brasil (1997).
Após a apresentação e análise sobre a mensagem escrita no ALFAMAT, encontrarmos
a resposta para o nosso segundo objetivo desta pesquisa, pois observamos a relação existente
entre a Política de avaliação Prova Brasil e a Política de Formação de Professores da
Secretaria Municipal de Educação de Belém. Diante das análises que apresentamos sobre os
três momentos da formação que foram realizados na SEMEC, comprovamos que essa relação
121
foi indireta com os dois primeiros momentos de formação, isto é, com o programa ECOAR e
com o programa Expertise em alfabetização, já que o elemento motivador para o surgimento
desses dois programas foram os resultados do IDEB (que é composto também pelo
desempenho dos alunos na Prova Brasil, conforme apresentado no item 2.5 desta pesquisa).
Entretanto, com o programa ALFAMAT, cujo público-alvo são os professores que
atuam no ciclo II, que tem as turmas avaliadas pela Prova Brasil, as diretrizes desse programa
de formação de professores tiveram como referência os descritores dessa prova, portanto essa
relação foi direta, conforme mostramos na Figura 7 e apresentaremos também mais adiante
quando nos referirmos aos objetivos desse programa de formação de professores na página.
B – A MENSAGEM ORAL
Apresentaremos a fala da coordenadora do NIED que ocorreu no Seminário IDEB:
Qualidade social da educação em debate, e que corresponde à nossa segunda fonte
documental sobre essa formação. Resolvemos dividir a apresentação em quatro momentos.
No primeiro, apresentaremos as justificativas para o surgimento do programa ALFAMAT. No
segundo, mostraremos os objetivos do programa. No terceiro, os conteúdos trabalhados e no
quarto momento as metodologias que foram utilizadas.
I - Justificativas para o surgimento do Programa ALFAMAT
De acordo com a fala da coordenadora do NIED, Professora Maria Isabela Faciola
Pessôa, “o Programa ALFAMAT iniciou em 2009” e o aspecto fundamental para a criação
desse programa foi “o baixo ideb da rede de Belém desde 2005”. Segundo a coordenadora, o
que contribuiu para que o NIED ficasse como a responsável pela formação dos professores
deste ciclo foi que a ex-secretária de educação
a Professora Terezinha Gueiros, sempre apostou nas potencialidades do uso da
informática na educação, tanto é que possui um programa próprio de informática
educativa e criou o grupo de informática educativa justamente para dar a formação
em informática educativa para os professores da rede, principalmente para aqueles
lotados na sala de informática. Além disso, hoje, todas as escolas da rede contam
com sala de informática, então, já que ela acredita no potencial desses recursos e que
todas as escolas possuem sala de informática, então, por que não investir na
formação dos professores de maneira que eles usem essas ferramentas para melhorar
a aprendizagem dos seus alunos.
O momento em que vivemos está repleto de tecnologias de informação e
comunicação, as chamadas TICs. Dentre essas tecnologias destacamos a televisão e o
computador. Kenski (2007) ressalta a importância da utilização desses instrumentos no
processo de aprendizagem do aluno quando mediada pelo professor para a transmissão de um
122
determinado conteúdo escolar, pois esses instrumentos, ao explorarem “a imagem, o som e o
movimento, oferecem informações mais realistas em relação ao que está sendo ensinado” (p.
45). Essas experiências oportunizam novas relações com o saber, o que vai possibilitar a troca
de informações na escola entre os alunos e os professores. O recurso das tecnologias de
informação e comunicação está respaldado na LDB (2011) no seu artigo 62, §2º, que diz: “A
formação continuada e a capacitação dos profissionais de magistério poderão utilizar
recursos e tecnologias de educação a distância”.
Entretanto, observamos que o elemento motivador para a criação desse programa de
formação de professores com esse formato, cujo foco está centrado nas diretrizes da Prova
Brasil, foi o resultado obtido pelas escolas da rede municipal de Belém no IDEB. Esse aspecto
nos permite afirmar que, na ausência do IDEB ou das avaliações externas, a escola
provavelmente trabalharia outros instrumentos de avaliação, assim como um novo formato de
formação de professores que atendesse à formação do agente social proposto por Veiga
(2002) ou da Base Comum Nacional proposta por Freitas (2003).
II - Objetivos do Programa ALFAMAT
Segundo a coordenadora do NIED, o objetivo geral do programa ALFAMAT é de
“melhorar a aprendizagem dos alunos em língua portuguesa e matemática a partir do uso
das diversas ferramentas disponíveis no espaço escolar na perspectiva de refletir
positivamente nos resultados da Prova Brasil”. Dentre os objetivos específicos, a
coordenadora destacou:

integrar as ações educativas desenvolvidas pelos professores da sala de
aula e das salas de informática da rede

elaborar e orientar a aplicação dos testes a fim de que os alunos se
familiarizem com as questões de múltipla escolha e com a folha de
resposta que caracterizam a Prova Brasil”.
Destacamos como importante a integração das atividades entre os docentes dos
diversos espaços da escola, do professor de sala de aula, do professor da sala de informática e
da coordenação pedagógica, pois essa integração contribui bastante para o que Imbernón
(2006) denomina de inovação da prática coletiva dos profissionais envolvidos nesse processo
e esse aspecto provavelmente pode influenciar positivamente no processo de aprendizagem
dos alunos.
Entretanto, para nós a expressão “familiarizarem com as questões” denota o treino dos
alunos para realizarem a Prova Brasil, aspecto que se assemelha à experiência dos Estados
123
Unidos com as avaliações externas, pois, segundo a educadora Diane Ravitch, esses testes só
ajudaram a preparar os alunos para realizarem esse tipo de avaliação. Diante desse relato,
consideramos o preparo do programa de formação como um aspecto negativo, uma vez que
está relacionado, no nosso entendimento, com a limitação do currículo do aluno e da
formação do professor.
III - Conteúdos trabalhados no Programa ALFAMAT
Sobre os conteúdos trabalhados no programa, observamos que os elementos
norteadores “são as matrizes de referência, os tópicos de língua portuguesa, os temas de
matemática e seus descritores usados na elaboração dos itens da Prova Brasil”. Lembramos
que, conforme visto no segundo capítulo desta pesquisa, os tópicos da língua portuguesa são
seis, com quinze descritores, e os temas para matemática são quatro, com vinte e oito
descritores. A coordenadora destacou também em sua fala que eles “estão cientes que estamos
aplicando um teste que vai avaliar determinadas habilidades e competências dos alunos,
apenas algumas habilidades e competências, não todas, então, esse tipo de avaliação deve
ser complementada pela escola”.
Por diversas vezes estamos reiterando a importância de se trabalhar nas séries iniciais
a alfabetização, o letramento e o conhecimento matemático. Assim, concordamos com Soligo
(2010) quando destaca que os conhecimentos exigidos na Prova Brasil são fundamentais para
a vida dos alunos, conhecimentos estes que foram apresentados no segundo capítulo desta
pesquisa quando abordamos os descritores dessa avaliação, especificamente quando trata, no
tópico I da Língua portuguesa, sobre os Procedimentos de leitura.
Entretanto o foco somente nos descritores e nos testes do programa de formação que
têm como alvo a Prova Brasil provavelmente não está permitindo ao docente trabalhar as
outras áreas do conhecimento, como a história, a geografia, as artes, por exemplo, assim como
outros elementos do currículo. As Matrizes de referência da Prova Brasil não são e não devem
se resumir ao currículo escolar; elas são apenas o referencial curricular sobre o que será
avaliado em cada disciplina da Prova Brasil, isto é, em língua portuguesa e matemática.
IV – A metodologia utilizada no Programa ALFAMAT
A - Oficinas
Como é desenvolvido esse programa de formação de professores? Primeiro por meio
de oficinas destinadas aos próprios professores, então, nessas oficinas a gente
124
propõe metodologias que podem ser aplicadas na sala de aula e no final de cada
oficina o professor ele já sai com propostas de atividades que podem ser
desenvolvidas tanto pelo professor de sala de aula quanto pelo professor da sala de
informática.
B - Quantitativo de formadores, professores e alunos envolvidos
o público-alvo desse programa, hoje, conta com 530 professores que atuam não só
na 3ª série como também na 4ª série, desses 530 professores, 415 estão lotados em
sala de aula e 115 estão lotados em sala de informática. Esse programa tem esse
público-alvo, mas abrange cerca de treze mil alunos de 56 escolas da rede municipal
de ensino. A carga horária dessas oficinas é de quarenta e oito horas anuais, ou seja,
isso corresponde a dezesseis oficinas no ano, oficinas de duração de três horas, em
média são trabalhadas oito oficinas no primeiro semestre e oito oficinas no segundo.
C - Testes
Sobre a aplicação dos testes (ou provas):
Eles são bimestrais para os alunos, e com as mesmas características da Prova Brasil,
esses testes inclusive são todos elaborados no grupo e são realizados desde 2009,
quatro anuais e todos eles com questões inéditas.
D - Estratégias metodológicas: hora pedagógica (HP), o curso de introdução digital e a
parceria com a coordenação pedagógica da escola
Quais são as nossas estratégias metodológicas? Uma delas é a utilização da HP dos
professores para o desenvolvimento das oficinas. O que vem a ser a HP? A HP é a
Hora Pedagógica do professor, é uma hora remunerada que o professor tem,
correspondente a 20% da sua carga horária para poder cuidar de sua formação.
Então, dos cinco dias da semana que o professor atua, um deles é destinado a sua
formação e na maioria das vezes esse dia destinado a sua formação ele se encaminha
ao nied justamente para participar das oficinas. Então, a gente disponibiliza todos os
dias da semana para a realização dessas oficinas, sendo que há dias específicos para
os professores regentes e há dias específicos de oficinas para os professores da sala
de informática. Para os professores regentes a gente reserva de 2 a 5 feira nos três
turnos, ... porque o CII ele só acontece nos 3 turnos, de manhã, intermediário e tarde,
então o professor tem cumprir a sua HP obrigatoriamente no seu horário de trabalho.
... Já o dia de sexta-feira é o dia de HP do professor da sala de informática.
Um curso de introdução à educação digital a todos os professores regentes,
considerando que muitos deles desconheciam ou não sabiam digamos mexer no
computador ou muito menos usar o computador para o processo educativo, então, a
gente procurou dar esse curso para ele para que ele pudesse utilizar esse recurso e
também estreitar a parceria com o professor da sala de informática.
...uma outra estratégia que nós consideramos muito importante é a parceria com a
coordenação pedagógica da escola, o nosso grupo, gente, não é um grupo grande, é
um grupo pequeno, nós temos apenas 7 professores trabalhando diretamente com o
ALFAMAT e não exclusivamente com o ALFAMAT, então, são 7 professores, uma
coordenadora pedagógica, 3 técnicos de informática, nos temos uma pessoa que
125
trabalha todo apoio logístico no que tange ao empacotamento das provas, a
distribuição e recebimento das provas pela escola, então, o nosso grupo não é
grande, então, não tem como a gente estar constantemente na escola, quem está na
escola e quem pode fazer essa comunicação conosco é a coordenação pedagógica
que está diretamente na escola, que pode acompanhar já que conhece as nossas
propostas, o que trabalhamos nas oficinas.
Após a apresentação da mensagem oral sobre a metodologia do programa ALFAMAT,
consideramos como um avanço o processo de formação ter atingido todos os professores que
atuam no ciclo II, garantindo, portanto, a formação continuada dos professores, o que atende à
LDB. Outros três aspectos importantes foram a utilização da Hora Pedagógica (HP),
garantindo a formação do professor de forma remunerada e no seu horário de trabalho (como
professor da rede, podemos complementar essa informação sobre os turnos de trabalho que
são o da manhã: 7:30 - 10:30, o do intermediário: 11:30 - 14:30 e o da tarde: 15:30 - 18:30), o
curso introdução à educação digital, que foi importante para a inclusão digital 50 do professor,
e a articulação com a coordenação pedagógica da escola, no intuito de acompanhar e integrar
as ações da SEMEC.
Entretanto, o fato de as orientações pedagógicas estarem relacionadas diretamente com
os descritores da Prova Brasil deve estar influenciando na redução da autonomia do professor
ao ter que seguir sugestões metodológicas. Outro aspecto negativo é a centralidade somente
nos 4 testes bimestrais, o que torna o tempo curto para que o docente possa utilizar outro tipo
de avaliação que não seja a prova ou o teste.
Diante do relato apresentado ficou claro que o conteúdo trabalhado nas oficinas é
avaliado por meio da aplicação de testes que são realizados a cada dois meses pelos alunos
(sendo aplicados no total quatro testes ao ano). Esses testes possuem como referência os
descritores e as características da Prova Brasil, o que deve implicar a limitação do currículo
do aluno.
Outro aspecto negativo que conseguimos identificar nesse processo de formação para
os formadores é a sobrecarga do trabalho docente, pois, de acordo com o relato, são apenas 7
professores responsáveis pela formação de 530 professores. Todo esforço é válido quando se
trata do processo de alfabetização da criança, entretanto, por conta de cada rede de ensino ter
que alcançar um índice, observamos que as atenções da proposta de formação, suas
metodologias e orientações se voltaram para os descritores da Prova Brasil, o que exerceu
uma pressão nos docentes e alunos por conta dos resultados.
50
“um conjunto de ações em prol do desenvolvimento de habilidades pessoais para utilização das tecnologias de
informação e de comunicação capazes de utilizar suas funções em sua vida diária” (MELO, 2006, p.9).
126
Após a transcrição e análise da mensagem oral, encontramos a resposta que faltava
para o nosso outro objetivo da pesquisa, pois, diante do que foi apresentado sobre o
ALFAMAT, verificamos que as orientações pedagógicas dessa formação tinham como
referência os tópicos, os temas e os descritores da Prova Brasil, assim como o formato das
provas e os enunciados das questões, portanto as aproximações dessa formação com as
diretrizes da Prova Brasil foram totais.
Diante do que foi apresentado sobre o ALFAMAT, concordamos com Oliveira e
Pacheco (2008), segundo os quais as avaliações externas contribuem para a restrição do
trabalho do professor, ou seja, seu trabalho passa a ficar limitado somente aos conteúdos que
são utilizados nessas avaliações e esse aspecto ficou bem evidente nas análises apresentadas.
Nesse sentido, devemos ter o cuidado para que esses conteúdos não se tornem os únicos a
serem valorizados na escola. Portanto torna-se fundamental a utilização de instrumentos que
contemplem outros conteúdos e outras áreas do conhecimento.
Os comentários dos autores acima refletem perfeitamente o que já apresentamos no
segundo capítulo desta pesquisa, tanto em nível internacional quanto nacional, portanto, após
a apresentação sobre a justificativa, os objetivos e a metodologia do ALFAMAT, a conclusão
a que chegamos é que a formação dos professores está caminhando no mesmo sentido das
demais redes de ensino que foram apresentadas, em que as ações passam a estar centradas nos
descritores da Prova Brasil ou de outras avaliações externas. Ao adotar quatro testes anuais, o
programa vai repercutir no trabalho do professor no que diz respeito à sua autonomia e na
aprendizagem dos alunos, o que evidencia o seu preparo para realizarem somente as
avaliações externas.
Mesmo com toda essa preocupação de se adequar aos testes das avaliações externas,
ainda observamos que existem escolas da rede municipal de Belém com um IDEB abaixo da
média. Somos favoráveis e entendemos a importância do ato de avaliar, no entanto
defendemos um modelo de avaliação mais completo e justo, que leve em consideração todo o
processo educativo e que utilize diversos instrumentos avaliativos, conforme citado
anteriormente. Nesse contexto, defendemos outro modelo de avaliação, como a avaliação
formativa reguladora, que apresentamos a seguir.
3.5 O MODELO DE AVALIAÇÃO QUE DEFENDEMOS
Diante da centralidade que as avaliações externas estão alcançando nas Secretarias
Estaduais e Municipais de Educação, defendemos outro modelo de avaliação, que é a
127
avaliação formativa reguladora, pois é uma alternativa para avaliar melhor o aluno por ser
mais completa que a adotada pela Prova Brasil. De acordo com F. Silva (2003) e Perrenoud
(1999), a avaliação formativa reguladora tem como finalidade ser um instrumento educativo
que informa e faz uma valorização do processo de aprendizagem seguido pelo aluno, com o
objetivo de lhe oportunizar, em todo momento, as propostas educacionais mais adequadas.
Esse modelo de avaliação torna-se “instrumento privilegiado de uma regulação contínua das
diversas intervenções e das situações didáticas” (PERRENOUD, 1999, p. 14).
De acordo com F. Silva (2003), a avaliação formativa reguladora apresenta como
características ser democrática, constante, diversificada, sistemática e intencional. Ela é
democrática por permitir a participação ativa de professor e aluno no que diz respeito à
definição de seus objetivos, dos seus critérios, dos seus instrumentos e dinâmicas. Esta
avaliação permite que o aluno possa aplicar os seus conhecimentos, assim como expressar
suas dúvidas, suas inseguranças e suas incertezas, favorecendo o diálogo e a participação.
Ela torna-se constante por acompanhar todo o processo de ensino e aprendizagem dos
alunos no cotidiano escolar; assim, permite uma melhor intervenção didática por parte do
professor na perspectiva de proporcionar uma aprendizagem qualitativa e contextualizada.
Esse modelo de avaliação diverge totalmente do modelo adotado pelas avaliações externas,
que são avaliações pontuais.
A avaliação formativa reguladora também torna-se diversificada devido à utilização de
diversos instrumentos, o que permitiria a obtenção de uma grande quantidade de informações
sobre o trabalho do professor, assim como sobre a aprendizagem dos alunos. Entretanto, é
importante ressaltar que essa diversidade, como destaca F. Silva (2003), não significa a
utilização de diversos instrumentos aleatórios, pois sua diversidade tem a função de melhor
“compreender o objeto avaliado para melhorar sua qualidade e não classificá-lo, diagnosticar
e intervir e não selecionar e excluir” (F. SILVA, 2003, p.15).
É importante a utilização de diversos instrumentos de avaliação por parte do professor
e da escola, instrumentos esses que vão além da prova, mas que também levem em
consideração as entrevistas com os alunos, os relatórios, os portfólios, as observações, os
dossiês, a autoavaliação, dentre outros. Essa diversidade de instrumento é proposta por Boas
(2007), e com ela concordamos perfeitamente por considerarmos que se integra na proposta
da avaliação formativa reguladora.
Às três características apresentadas somam-se outras duas na avaliação formativa
reguladora: a sistematização e a intencionalidade. É fundamental que o docente saiba o que
ele quer avaliar no aluno, a partir dos objetivos que constam no projeto político pedagógico
128
cujo foco é o processo de ensino e aprendizagem. Assim, é fundamental o entendimento do
docente sobre:

O que é avaliar?

Para que avaliar?

O que avaliar?

Quando avaliar?

Como avaliar?

O que fazer com os resultados das avaliações?
De acordo com o autor acima, esses questionamentos fazem parte da dúvida de muitos
docentes, principalmente no que diz respeito ao momento de implementação da avaliação no
trabalho pedagógico. Segundo ele, o domínio sobre esses questionamentos será fundamental
para que o docente desenvolva sua autonomia didática, o que permitirá uma base sólida e
consciente na sua prática educativa, que está relacionada com o planejamento, com o processo
de ensino-aprendizagem e a avaliação.
Silva (2003, p.16) defende
a construção de uma cultura avaliativa que rompa com a concepção de uma
avaliação que está tão presente nos nossos sistemas de ensino cuja ênfase está
centrada na memorização e que por sua vez é autoritária, seletiva, excludente,
classificatória, punitiva e terminal.
Por entendermos que a avaliação não deve se resumir apenas a uma única atividade e
somente nos finais dos ciclos escolares, como é o caso proposto pela Prova Brasil,
concordamos que:
a função maior da escola é perpetuar o conhecimento já produzido pela humanidade
ao lado do papel socializador e que essas duas tarefas da escola devem estar a
serviço da inclusão social, do crescimento e do enriquecimento dos sujeitos,
estranhamos caso a avaliação esteja concorrendo para a segregação e a exclusão
(FERNANDES, 2003, p. 95 ).
Destacamos também a importância do ato de avaliar na educação, conforme proposto
por Fischer (2010). No contexto atual, em que a ênfase está voltada apenas para o resultado
final, isto é, para o produto da aprendizagem, não podemos nos tornar reféns apenas dos
resultados das avaliações externas, já que estas não consideram como o aluno aprende, pois,
se acreditamos que há um processo não observável, ou seja, que algo acontece com
o aluno (na “caixa preta”) quando ele está aprendendo; e que este processo é tão ou
mais importante do que o produto final; se concordamos que perguntar, levantar
hipóteses é tão ou mais importante do que responder; se assumimos que errar é parte
indispensável do processo construtivo de conhecer; se apostamos em tudo isso,
então a sala de aula não pode ser como antes; a ação docente não pode ser como
129
antes. Em outras palavras, o processo avaliativo não pode se resumir somente a
provas e testes com hora marcada (FISCHER, 2010, p. 45-46).
De acordo com a autora acima, quando os professores ou redes de ensino passam a
concentrar suas ações somente nas provas ou nos momentos específicos pré-agendados, eles
não estão realizando a avaliação. O que está ocorrendo, de fato, é a verificação da
aprendizagem. Nesse contexto, entendemos que o MEC/INEP, por meio das avaliações
externas, mais especificamente a Prova Brasil, está realizando a verificação da aprendizagem,
pois
A avaliação só pode ser entendida como tal quando é processo, isto é, quando se
manifesta como busca de compreensão dos avanços, limites e dificuldades que os
estudantes estão encontrando para atingir os objetivos estabelecidos em determinada
etapa (FISCHER, 2010, p. 47).
Para que tal ação seja realizada, é fundamental a utilização de outros instrumentos,
conforme descritos anteriormente, assim como a valorização da avaliação realizada pelo
professor, da participação ativa do aluno, dos coordenadores e diretores.
Esperamos realmente que a avaliação externa possa servir como parâmetro para que os
seus resultados subsidiem a formulação de políticas públicas, como está descrito nos
documentos oficiais, conforme visto no decorrer desta pesquisa, e para que providências
sejam tomadas na perspectiva de que essas avaliações possam ajudar na aprendizagem dos
alunos.
Todas essas questões são importantes, entretanto o que achamos danoso são os efeitos
dessas avaliações, o que estão fazendo dos resultados para punir alunos, professores, escolas e
redes de ensino. Com isso, passam a segregar e a discriminar todos os que fazem parte do
processo educativo, assim como limitam a formação do professor e do aluno.
130
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa concentrou suas atenções na Prova Brasil, uma das políticas de
avaliações externas do governo federal, e nas implicações que ocorreram a partir do seu
surgimento na Política de Formação de Professores da SEMEC. Nesse contexto, observamos
uma mudança de comportamento no que diz respeito ao direcionamento das políticas de
formação que passaram a afetar o cotidiano da escola, do professor e do aluno sob o discurso
da melhoria da qualidade do ensino. Esse processo de formação de professores que está sendo
adotado na rede municipal de educação de Belém vem sendo direcionado a partir de uma
perspectiva limitada e pragmatista, na qual a melhoria da qualidade do ensino está atrelada ao
resultado alcançado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que perpassa
também por um viés na perspectiva de atender às demandas do mercado.
Sendo assim, objetivamos, a partir da avaliação externa chamada Prova Brasil,
identificar o contexto do seu surgimento, analisando sua relação com a política de formação
de Professores da Secretaria Municipal de Educação de Belém, verificando quais as
orientações pedagógicas que foram dadas aos professores que trabalharam com as turmas
avaliadas pela Prova Brasil nos anos de 2005 a 2011 e assim detectar suas aproximações com
os tópicos, temas e descritores utilizados na Prova Brasil.
Na primeira parte desta pesquisa, na qual apresentamos o conceito de Estado a partir
da visão gramsciana, procuramos analisar o papel do Estado e sua relação com os modelos de
produção da sociedade capitalista. Dentro desse contexto, conseguimos entender por que e
como a avaliação externa passou a ser um instrumento para a garantia dos interesses dessa
sociedade. Pudemos constatar a influência direta dos princípios do modelo de Gestão de
Qualidade Total sobre as políticas públicas educacionais, em que se tem na avaliação um
instrumento importante e estratégico desse modelo, cuja finalidade principal é a introdução da
lógica empresarial de controle da qualidade na área educacional.
Aprofundando ainda nossas análises sobre o Estado, passamos a entender a causa das
crises, que são cíclicas, da sociedade capitalista, para a qual o fator principal está relacionado
com a acumulação do capital, que resultou na mudança estrutural denominada de Reforma do
Estado. Essa reforma, que aconteceu diversas vezes no século passado, teve a sua última
ocorrência a partir da década de 1980 do século XX em sua forma que consideramos mais
acentuada, tendo iniciado na Europa e se estendido para o resto do mundo até chegar ao
Brasil, com a lógica de um Estado regulador e avaliador norteado por princípios (da empresa
privada) de eficiência, eficácia e produtividade.
131
Esses princípios foram (são) propagados pelos organismos de financiamento
internacional e atingiram diversos setores da sociedade, inclusive as políticas públicas
educacionais, dentre elas a política de avaliação externa, que passou a ser utilizada nos
diversos níveis de ensino, do superior ao ensino fundamental, com o discurso de que os
resultados dessas avaliações podem ajudar na melhoria da qualidade do ensino. Entretanto,
não aceitamos que a lógica das empresas privadas seja aplicada na escola por meio das
avaliações externas, pois concordamos com outros autores citados no decorrer desta pesquisa,
os quais afirmam que a área educacional é uma área incompatível para se aplicar os princípios
empresariais, já que na escola estamos convivendo com indivíduos, com alunos, com crianças
e não com objetos. Nessa perspectiva de associar o aluno com um objeto, ou de apenas
resumir uma escola a números, é que vamos encontrar o conceito de qualidade citada com
frequência nos documentos oficiais da Prova Brasil.
Na segunda parte da pesquisa, que teve como título “As políticas de avaliações no
contexto internacional e nacional: bases legais da regulação da educação básica e
experiências vividas” iniciaramos apresentando e analisando a experiência do contexto
internacional sobre a avaliação externa. O que concluímos a partir dessas experiências foi que
nos países pesquisados a avaliação externa passou a ser uma política que contribuiu para a
padronização do conhecimento por centralizar as avaliações somente em algumas áreas,
geralmente na língua materna e na matemática, além de estimular a competição e a
concorrência entre as escolas. Com isso, as escolas e os professores que apresentaram os
melhores resultados nas avaliações começaram a receber incentivo financeiro e os professores
e alunos que não se destacaram nessas avaliações passaram a sofrer uma série de retaliações,
como a punição, a discriminação e a segregação. Isso ficou evidente quando apresentamos o
modelo de avaliação externa adotado na educação chilena.
No caso do Brasil, pudemos constatar que a preocupação com a avaliação externa não
é recente. A partir do final do século XX, como resultado das reformas do Estado, a avaliação
externa passou a ganhar a centralidade nas políticas públicas educacionais por meio dos
exames de avaliações externas, como o Enade, o Enem, a Prova Brasil e a Provinha Brasil.
O processo de análise dos documentos oficiais da Prova Brasil (as portarias, as provas,
os descritores, os temas e os tópicos) possibilitou o entendimento sobre o modelo de avaliação
que é utilizado nessa avaliação externa, com o foco somente em duas áreas do conhecimento,
em detrimento das outras áreas, portanto é limitada. A utilização de apenas um único
instrumento, a prova de múltipla escolha, permite que o aluno marque aleatoriamente e acerte
sem saber a questão, sendo esta uma possibilidade real. É uma avaliação pontual, que ocorre a
132
cada dois anos e que não leva em consideração o processo de aprendizagem do aluno, apenas
o produto final.
Após essas análises, queremos chamar a atenção para um aspecto que nos deixa
bastante preocupados que é o entendimento de todos aqueles que fazem parte das redes de
ensino de que os descritores dessas avaliações externas acabem se confundindo com o
currículo que deve ser adotado ou praticado na escola, o que pode se tornar um objeto de
pesquisa para ser aprofundado num outro momento por nós.
Diante do que foi apresentado, entendemos que o modelo de avaliação adotado pela
Prova Brasil é um modelo incompleto, pois se concentra somente nas áreas da leitura e
matemática, e limitado em relação ao instrumento aplicado, já que utiliza apenas a prova. Por
isso mesmo é que as redes de ensino, as escolas, os coordenadores pedagógicos e os
professores devem fortalecer a avaliação institucional da escola, a avaliação realizada pelo
professor, que deverá se valer de diversos instrumentos, como as entrevistas com os alunos,
os relatórios das atividades, os avanços dos alunos nos portfólios, as observações no processo
de aprendizagem dos alunos, os dossiês de outros professores das séries anteriores, a prova e a
autoavaliação do aluno, caso seja possível, sobre seu desempenho nas atividades realizadas.
A utilização dos diversos instrumentos citados não constitui algo simples e fácil.
Devido ao processo de avaliação ser algo que deve acontecer durante todo o ano letivo e não
somente em determinados períodos do ano, ou a cada dois ou três anos ou nos finais de ciclos
ou séries, reafirmamos a defesa de um modelo de avaliação na perspectiva da avaliação
formativa reguladora por entendermos que ela é mais completa, justa, diversificada e
inclusiva. Totalmente o oposto do modelo adotado pelas avaliações externas que, por meio de
alguns instrumentos, como os ranking (IDEB), acaba se tornando uma avaliação autoritária,
seletiva, excludente, classificatória, punitiva e terminal.
A criação dos sistemas de avaliação nos Estados da Federação (em sua maioria) e nos
municípios (ainda em sua minoria) contribui para o surgimento da consultoria, impulsionada
também pelo recebimento de verbas do governo federal, de acordo com o desempenho obtido,
por exemplo, no IDEB. Nesse aspecto, vimos dois momentos: o primeiro quando o governo
incentiva com recursos federais as redes de ensino com baixo ideb (positivo) e o segundo
momento a partir da fala do ministro da educação quando ele afirma que as escolas que
receberam dinheiro e apresentaram um baixo ideb serão punidas. Isso reforça nossas análises
sobre o atrelamento do desempenho das escolas aos índices propostos pelas avaliações
externas, que apresentam características classificatórias, limitadas, punitivas e excludentes.
133
A partir das experiências internacionais e nacionais, já temos subsídio para
analisarmos os impactos das avaliações externas. Esperamos que os aspectos negativos dessas
experiências possam servir de alerta para toda a comunidade escolar, a fim de que não nos
tornemos sujeitos passivos e submissos desse modelo de avaliação que pune, que discrimina,
que classifica e que rotula alunos, professores, escolas e redes de ensino.
A terceira parte da pesquisa, que teve como título “A Política de Formação de
Professores no Contexto Nacional e Local”, nos permitiu ter um olhar diverso sobre a
concepção de formação de professores. A partir do ponto de vista de alguns autores,
concentramos nossas análises em três concepções de formação de professores. A primeira,
chamada de Tecnólogo do ensino, se mostrou como sendo um modelo de formação de
professores com um viés pragmatista, um modelo de formação de professores com um caráter
hegemônico.
A segunda e a terceira concepções de formação de professores apresentaram
semelhanças, como é o caso do Agente Social e o da Base Comum Nacional, modelos estes
mais amplos, completos, diversificados e que também são importantíssimos por poderem
servir como forma de resistência ao processo de desqualificação e desvalorização do
professor, assim como atendem a uma necessidade de formação que leve em consideração os
diversos aspectos da formação humana. São, portanto, modelos de formação que caminham
numa perspectiva totalmente contra-hegemônica.
Essas concepções ajudaram em nossas análises para que pudéssemos entender como
ocorreram as formações de professores realizadas pela SEMEC entre os anos de 2005 a 2011,
formações estas que foram norteadas a partir dos resultados do IDEB, em que tivemos o que
consideramos três momentos de formações de professores das séries iniciais. No primeiro
momento, chamado de “ECOAR”, com os cursos de seis dias, houve a aproximação com uma
formação mais completa e ampla, porém ainda distante da concepção do agente social ou da
Base Comum Nacional, mas abordou temas importantes para o processo de aprendizagem da
criança, como a psicogênese da escrita, o conhecimento lógico matemático e a educação
ambiental.
No segundo momento de formação, com o programa “Expertise em Alfabetização”,
observamos que, apesar da importância com a alfabetização do aluno ainda na primeira série,
a formação passou a estar focada na perspectiva do tecnólogo do ensino.
No terceiro momento da formação dos professores por meio do programa ALFAMAT,
constatamos que a relação da Prova Brasil com a Política de Formação de Professores da
SEMEC foi direta, já que as análises de conteúdo dos documentos escritos e orais mostraram
134
que as formações se adequaram totalmente aos tópicos, aos temas e aos descritores dessa
avaliação externa do governo federal.
Observamos que esse programa de formação intensificou a utilização do instrumento
prova ao aplicar quatro vezes o teste durante o ano e verificamos também que as orientações
pedagógicas que foram dadas aos professores que trabalharam com as turmas avaliadas pela
Prova Brasil estavam focadas no único instrumento de avaliação que é a prova, inclusive com
os comandos e formatos de questões adotados pela Prova Brasil.
Diante dessas características apresentadas sobre o ALFAMAT, consideramos que, de
fato, a SEMEC já possui um sistema de avaliação municipal de aprendizagem todo
estruturado, com modelos de provas, conteúdos e datas periódicas de aplicação. Por isso,
entendemos que sua ação caminha numa tendência de um modelo hegemônico de avaliação e
formação de professores.
Seria desejável que as avaliações externas pudessem apenas servir como parâmetros
para que os seus resultados subsidiassem a formulação de políticas públicas como está
descrito nos documentos oficiais, conforme visto no decorrer desta pesquisa, para que
providências fossem tomadas na perspectiva de que essas avaliações realmente ajudassem na
aprendizagem dos alunos com o objetivo de melhorar a qualidade do ensino.
Entretanto, essa melhoria da qualidade do ensino não deve estar atrelada somente aos
resultados obtidos nas avaliações externas ou nos seus índices, pois há uma série de fatores
que estão relacionados para que essa melhoria da qualidade do ensino seja efetivada, como a
melhoria das estruturas físicas das escolas, a melhoria das condições de trabalho do professor,
a disponibilidades de salas com diversos recursos pedagógicos, a implantação de um plano de
cargos e salários para o magistério, o respeito ao pagamento do piso nacional dos professores,
dentre outros aspectos.
O Estado cumpre o seu papel de regulador e avaliador ao utilizar os resultados das
avaliações externas como parâmetro para que o governo federal possa ter parâmetros sobre
como está ocorrendo a aprendizagem dos alunos. O que consideramos danoso para as redes de
ensino, para as escolas, para os professores e alunos são as formas como os resultados dessas
avaliações estão servindo para se padronizar a aprendizagem a partir dos seus tópicos, temas e
descritores. Consequentemente, limita-se a formação do aluno e do professor e estimula-se a
concorrência entre os entes, o que vai automaticamente definir os melhores e os piores na
perspectiva de se incluir de fato a lógica da empresa privada na escola pública. Nesse bojo de
implicações, temos o surgimento de uma área que consideramos muito propícia em tempos de
135
globalização de mercados que é a das consultorias dos sistemas de avaliações das redes de
ensino.
Diante desse contexto e a partir das políticas educacionais existentes ou prescritas
pelos governos, defendemos novas formas de organização na escola, na perspectiva de que
possam atuar tanto nas esferas da avaliação quanto na área das formações de professores com
vistas a se alcançar modelos contra-hegemônicos.
Após considerarmos como respondidas nossas questões, temos plena consciência de
que existem outras indagações que ficaram para além deste texto, como a realização de
entrevistas com os professores que participam do programa de formação de professores
ALFAMAT e a verificação das mudanças ocorridas no cotidiano da sala de aula a partir da
fala do professor no que diz respeito a sua autonomia, assim como pesquisas sobre o grau de
intensificação do trabalho docente e dos formadores decorrente do surgimento das avaliações
externas. Essas são questões que não faziam parte dos objetivos de nossa pesquisa, mas nos
deixaram bastante motivados para elaborar um outro projeto com o qual possamos trabalhar
mais adiante.
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