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6 mai 2015 O Globo FLÁVIA MILHORANCE flavia. milhorance@ oglobo.com. br
Alzheimer: novas respostas
Brasileiros descobrem como molécula pode ajudar no diagnóstico precoce da
doença
Pesquisadores da UFRJ descobrem aminoácido que está associado ao mal de Alzheimer, o que pode
facilitar o diagnóstico precoce da doença. De momentos de silêncio profundo e frases desconexas para
aqueles de lucidez surpreendente: “sei que há um passado e sei que vivi” é uma das deixas do poeta
Edwin Honig, diagnosticado com o mal de Alzheimer e personagem do documentário “Primo de segundo
grau”, exibido no festival “É tudo verdade”. Vêm ganhando destaque as produções cinematográficas sobre
a doença à medida que esta, com o aumento de casos, se torna uma rotineira batalha para as famílias em
todo o mundo. E se para quem presencia a progressão dos sintomas há tantas perguntas, não é diferente
para a ciência. Mas, agora, uma nova resposta vem de pesquisadores brasileiros, que descobriram uma
molécula que poderia ser usada no diagnóstico precoce da doença.
FOTOS DE DIVULGAÇÃO
Árdua batalha. O poeta Edwin Honig, diagnosticado com o mal de Alzheimer, é personagem do
documentário “Primo de segundo grau”, que retrata seus últimos cinco anos de vida
O estudo é da UFRJ e foi publicado ontem na “Translational Psychiatry”, que faz parte da revista
“Nature”, uma das mais reconhecidas do ambiente científico. Nele, os pesquisadores mostram que os
níveis elevados do aminoácido chamado D­serina — responsável pela sinalização das sinapses, pontos de
conexão entre os neurônios — estão associados ao declínio cognitivo no Alzheimer.
Na primeira etapa das pesquisas, o grupo analisou cérebros de indivíduos que morreram com o mal e
comparou com os de outros sem a doença. Com isso, os cientistas notaram que a D­serina era muito
elevada no hipocampo e no córtex, regiões cerebrais afetadas pelo Alzheimer. E que também estava acima
da média no líquor (líquido presente entre o cérebro e o crânio) dos doentes. Depois, buscaram o
mecanismo para esse processo: e mostraram, em camundongos, que o aumento da D­serina pode ser
causado pelo acúmulo dos oligômeros do peptídeo beta­amiloide, toxinas que se acumulam no cérebro do
doente.
TESTES REALIZADOS EM HUMANOS
Por fim, os pesquisadores fizeram testes em cerca de 50 indivíduos e comprovaram que o nível de D­
serina no líquor era claramente superior nos doentes ou nos que tinham maiores chances de desenvolver
a doença. Além disso, quanto maior o nível da molécula, pior o declínio cognitivo.
— A D­serina vai aumentando à medida que a doença progride — explicou o médico neurocientista
Rogério Panizzutti, autor principal do estudo e diretor do Laboratório de Fronteiras em Neurociências da
UFRJ. — O exame do líquor hoje é invasivo, mas já é usado em outros casos, como na meningite.
Acreditamos que esta poderia ser uma ferramenta também para o Alzheimer.
O grupo de pesquisa começou a fazer testes num número maior de pacientes para comprovar as
descobertas e, inclusive, já pediu a patente ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) do uso
da D­serina como biomarcador para o Alzheimer. Num panorama otimista, a expectativa é que em cinco
anos eles consigam concluir o estudo e já resolvam questões regulatórias para o uso do método.
— Estamos indo muito bem — garante Panizzutti, explicando que o biomarcador poderia ser usado
sozinho ou em conjunto com outras moléculas que vêm sendo estudadas com o mesmo fim.
O Alzheimer é a principal forma de demência — problema que afeta 44 milhões de pessoas no mundo,
segundo dados do grupo Alzheimer’s Disease International. No Brasil, são em média 1,2 milhão de
pessoas com o mal. Mas apenas uma em cada quatro pessoas são diagnosticadas. Não existem exames
para isso, apenas o olhar clínico de profissionais. E, muitas vezes, o diagnóstico é tardio.
Outros grupos de pesquisa no mundo buscam biomarcadores para identificar a doença. Até agora, os
estudos não foram colocados em prática. Segundo o neurocientista Stevens Rehen, pesquisador do
Instituto D’Or, um dos empecilhos é que os biomarcadores se manifestam em estágios avançados da
doença.
— O principal desafio hoje é ter um diagnóstico precoce, porque é o primeiro passo para a busca de um
tratamento, e esse estudo faz isso — afirma Rehen, que comemorou a publicação brasileira. — Essa
pesquisa tem uma importância imensa, especialmente para o Brasil, que vive com dificuldades de fazer a
ciência avançar.
O envelhecimento populacional e o estilo de vida pouco saudável são fatores que têm elevado o
número de doentes. Nos EUA, eram 4,7 milhões em 2010, e a estimativa é que subam a 13,8 milhões
em 2050. Além disso, o custo mundial com a doença é estimado em US$ 605 milhões. Mas, para além de
índices, filmes como “Primo de segundo grau”, do cineasta Alan Berliner, que acompanhou seu primo
pelos últimos cinco anos de vida, ou “Para sempre Alice”, estrelado por Julianne Moore no papel da
professora que aos poucos perde a memória e a tonicidade do corpo, mostram que a doença é uma das
que mais afetam famílias, financeira e emocionalmente.
— Está se tornando um problema grave de saúde pública — acrescenta Rehen.
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