Serro e Diamantina de José Moreira de Souza
Antônio de Paiva Moura
SOUZA, José Moreira de. Cidade momentos e processos: Serro e Diamantina
na formação do Norte Mineiro no século XIX. São Paulo: Marco Zero, 1993. 265 p.
Tese de mestrado em sociologia urbana. Procura estudar a formação da Macrorregião
Norte de Minas a partir das cidades do Serro e de Diamantina.
A trama histórica se explicita a partir das lutas por conquistas de espaços físicos;
a vigência das oligarquias no interesse da consolidação do Estado por oposição ao
projeto liberal na formação da Nação; competição e associação entre as cidade do Serro
e Diamantina; dinâmica histórica na acumulação e distribuição de renda na região Norte
de Minas.
A historiografia mineira se caracteriza por uma linha conservadora de uma
visão bajulatória e, portanto, carente de espírito crítico. Digamos, nesse oceano de
historiografia conservadora, desde os primórdios até nossos dias, encontra-se um
arquipélago de historiadores independentes, isolados e solitários. A primeira ilha desse
arquipélago é Joaquim Felício dos Santos que, em 1868, publicou seu “Memória do
Distrito Diamantino na Comarca do Serro Frio (Província de Minas Gerais). Tipografia
Americana, Rio de Janeiro. Foi ousado na visão crítica do passado colonial mineiro.
Atualíssimo em seu tempo. Há um século e meio de nossos dias, seguia a escola
romântica de Augustin Thierry, narrativa em que o historiador tentava recriar a
atmosfera dos tempos antigos, valorizando humildes cidadãos anulados pelas classes
dominantes. Não mais a bajulação dos poderosos como fizeram Simão Ferreira
Machado no “Triunfo Eucarístico”; Basílio da Gama, em “O Uraguaia” e Santa Rita
Duração em “O Caramuru”, no auge do ciclo do ouro.
A segunda ilha de nosso imaginário arquipélago é Francisco Iglésias. Sua
publicação, “Política econômica do governo provincial mineiro”, é de 1858, tese para
concurso de livre-docente da história econômica, da então Universidade (estadual) de
Minas Gerais. Iglésia escolheu o período provincial mineiro (1835-1889) exatamente
por este constituir-se em um desafio aos historiadores. A lucidez e a imparcialidade de
Iglésias pode ser exemplificada no debate sobre a esperteza do governo central com
relação à província. Fica clara a intenção daquele em subtrair as rendas da província
para depois socorrer-lhe com favores e daí conseguir sua submissão. Nenhum
historiador mineiro havia sido capaz dessa análise até então.
Antes de José Moreira de Souza, em “Cidade: momento e processo”, é claro,
existem outras ilhas. Mas, na rota que estamos seguindo, ele se constitui na terceira e
última. O cientista social não pode estar subjugado ao aspecto do pacto da luta política.
Moreira soube aplicar seus conhecimentos de sociologia e de ciências sociais de modo
geral. Foi com muita propriedade que aplicou na narrativa a terminologia de processo
social, isto é, as alterações ocorridas na sociedade Norte-Mineira em função das lutas
travadas no interior de sua estrutura.
Diamantina e Serro foram privilegiadas na análise de Moreira. Não pela lisonja,
mas pela sinceridade; pelo alto nível e por seu ideal humanístico ali expresso. Nenhum
outro estudioso foi capaz de dizer que “quanto mais indignadas as elites dominantes,
tanto menos oferecem oportunidade à manifestação dos dominados”.
Publicado no jornal “Gazeta Tijucana”, Diamantina, n. 24, novembro de 1994.
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