PREFÁCIO
Sentado em uma grama verde, a qual ainda estava banhada de
orvalho, localizado às margens de um lindo lago se encontrava um misterioso
homem, o qual balançava os dois pés dentro da água e, ali, ainda, jogava
vagarosamente pedrinhas, como se estivesse com aquele ato infantil
meditando ou tentando acertar a cabeça de algum peixe, os quais certamente
ali não mais se encontravam devido ao barulho que fazia com os pés e os
arremessos constantes.
Neste exato momento uma linda mulher se aproximou, era uma
mulata que exibia um penteado peculiar, consistente em tranças e cachos.
Seus olhos negros e grandes como duas jabuticabas avistaram rapidamente o
homem, indo a sua direção vagarosamente.
- Me desculpe lhe incomodar mestre, mais é porque confirmamos
que a guerra terá realmente um início imediato. – Ela disse ainda ao longe,
como se estivesse com medo de estar atrapalhando algo.
O homem sequer se virou, continuando a fazer os atos, como se
estivesse ponderando ainda sobre aquela afirmação. Assim, tornou a mulher:
- Os escolhidos já estão sendo concebidos. Contudo...
- Contudo o que? – O questionamento veio seco, e de forma firme.
- Lhe rogo novamente mestre se não seria mais prudente
ponderarmos outra vez com o conselho para atacarmos logo. – Ela rogou.
- O fato de você estar cego, não quer dizer que não tem ninguém a
sua volta para iluminar seu caminho... – Foi à única resposta do homem.
- Não entendo mestre?
- Se agirmos imediatamente com batalha, estaremos fechando os
olhos como cegos, e, talvez não teremos dado a oportunidade de sabermos
que naquele exato momento havia algo ou alguém iluminando para uma
alternativa melhor.
- Mais certamente não há mestre! – Agora ela clamava, inclusive, já
demonstrando um pouco de desespero. – Ele realmente retornou! Seu exército
cresceu muito, e, segundo pesquisamos, seus planos e ideais não apenas
continuam audaciosos, mais extremamente avançados. Bem como, não
podemos esquecer o que ele já fez, assim, teríamos que revidar a altura!...
- Saiba minha amiga que quando agimos somente pensando em
aniquilar o que nos faz mal, e, não buscamos uma forma mais branda,
poderemos enfrentar serias consequências. Além disso, saiba que se por
qualquer motivo retiramos do outro utilizando da força qualquer ambição que
aquele almejava, temos que ter a consciência de que não estaremos apenas
ferindo aquela pessoa, mas todos ao seu redor. Assim, se queres se vingar de
alguém saiba que estará assumindo não uma retribuição a uma eventual dor
que você entende que se encontra com este ato retribuindo na mesma moeda,
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você na realidade estará é trazendo para sigo mesmo mais ódio e maldição,
visto que destruirá a vida de várias pessoas, as quais, indubitavelmente nada
têm a ver com o ocorrido. Por isso, se queres realmente se vingar ou aniquilar,
afaste-se e deixe que o destino se encarregue pela lei universal de assim o
fazê-lo, com o menor possível de dor, ou até mesmo sem ela em alguns casos.
- Entendo mestre... – Ela afirmou mais ainda despontando em sua
voz e forma que proferiu certa relutância.
- Sei que ainda não entende de coração minha amiga. Mais queria
lhe dizer, e espero que pelo menos reflita é que nunca abandonamos a
essência dos Criadores, sempre temos seu amor ao próximo e principalmente
aqueles com que tenhamos mais afinidade, os quais estão ligados a nos por
laços de carinho e afeto direto, ao passo que, desde o mais forte e influente
ser das trevas que você agora me fala, até o simples demônio, possuem
referida essência em seus seres.
- Mais eles, ou melhor, este líder maligno em especifico, em nenhum
momento dá pelo menos a impressão de possuir qualquer bondade, muito
menos que restou alguma coisa do Criador. – Ela ainda insistiu.
- Mesmo que na maioria das vezes não a revele ela se encontra lá,
afinal, o que este ser busca é reunir seus entes queridos e o maior número de
pessoas a sua causa, e, principalmente, ao seu lado. – ele suspirou, como se
aquele fosse um assunto delicado. – Assim, mesmo que referidos intuitos
sejam desvirtuados do caminho que podemos dizer serem do bem comum, em
seu ser e consciência ele entende ser a atitude certa a tomar, e os buscam
com sede e determinação, como muitos de nós não fazemos para defender
nossos ideais. – ele ainda não olhava para trás, conversando sempre
balançando os pés e jogando pedrinhas. – Razão pela qual, o Criador não o
aniquilou, porque estaria matando seu filho que um dia poderá retornar ao lar e
caminho da luz, e, assim, em seu tempo se redimir. – ouve mais um suspiro. –
E afirmamos sermos mais instruídos, mais lhe afirmo estarmos longe dessa
perfeição, motivo pelo qual, também não caberia a nós fazê-lo, senão nos
tornaremos pior do que ele, porque estaríamos matando nosso irmão, e,
assim, retirando a chance de um dia tê-lo novamente ao nosso lado.
- Não podemos retirar a vida dele, mais ele poderá retirar a vida de
milhares! – Ela bradou, demonstrando que não estava nem perto de se
convencer.
- Você disse “poderá”? – Ele entonou a palavra chave do
questionamento.
- Sim, não posso afirmar, já que o futuro seria aleatório, dependendo
de escolhas e facetas impossíveis de se prever em definitivo, porquanto, este
encontra-se em constante modificação, como o senhor bem sabe.
- Então com que raciocínio me diz que uma coisa que “poderá” – ele
entonou novamente – seria suficiente para tomarmos uma atitude como a que
me diz seria a sensata a se fazer, a ponto de aniquilar uma vida?! – Ao final ele
parou de jogar as pedras e de balançar os pés, aguardando somente a
resposta, mais ainda não se virando para sua interlocutora.
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A mulher não respondeu, naquele momento havia sido pega de
surpresa. – Realmente seria uma imprudência tomar uma atitude tão drástica
de imediato. – Pensou. Mais decidiu ousadamente ainda questionar, agora
com prudência, porquanto, sabia que o mestre não tinha muita paciência:
- Mestre, só vou fazer mais está pergunta, e me calo após.
- Faça! – A afirmação veio seca e cortante, como se aquela conversa
já estivesse se prolongando demais.
- Então nós apenas vamos ficar olhando as coisas fluírem?
- Os escolhidos foram enviados, e, seguiremos o plano traçado pelo
Conselho Supremo a risca. Além disso, se é ou não um bom plano, não cabe a
mim ou a você dizer, visto que a decisão foi democrática.
- Mais assim declinaram... – ela fez uma pausa raciocinando se seria
prudente dizer, mais por fim viu que não tinha mais nada a perder. – porque o
senhor tem muita influência e se posicionou neste sentido.
- Bem posto! Posicionei-me e, por conseguinte, eles votaram neste
sentido, e, bem como, os outros membros que foram contra e perderam na
votação não me reprimiram. Razão pela qual, lhe peço gentilmente que não
faça diferente deles, porque, agindo assim, estará ferindo minhas escolhas e
acima disso, de todo Conselho.
A mulher nada mais perguntou, e, sequer se despediu, apenas virou
às costas indo embora.
Após sua saída, o misterioso homem continuou a balançar
calmamente os pés dentro da água e a jogar pedrinhas, como uma criança.
Em nenhum momento se virou, sabendo que aquela atitude seria necessária,
visto que não podia evidenciar que estava antes da chegada da mulher
chorando, e, ainda, neste choro de emoção pelos acontecimentos que estavam
se desenrolando seus pensamentos não paravam:
Vamos perder vários irmãos, infelizmente, e creio seriamente que ela
estará entre eles... Será que estamos realmente tomando a decisão correta?
Após alguns segundos refletindo seu próprio questionamento,
lembrou-se das palavras de seu mentor, que sempre lhe dizia em seus
treinamentos:
Você tem que pensar grande, sem querer ser grande! A grandeza
será a consequência deste ato, e virá forte e permanente, porque nela estará
presente a humildade, fonte e cominho da sabedoria... E, ao final, não se
arrependerá de nenhuma de suas escolhas, porque elas foram tomadas em
prol do bem comum, e, algo o conduziu a elas de uma forma ou de outra!
- Isso mesmo! Tenho que me manter forte, e conduzir às coisas com
sabedoria. – Ele afirmou para si mesmo, e, após, o silêncio tomou conta do
local completamente, cessando juntamente ao som às dúvidas, restando, tão
somente, uma certa paz, que ele tanto queria que reinasse, mesmo sabendo
que para isso ocorrer haveria várias desgraças, infelizmente, inevitáveis...
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CAPÍTULO 1
Brasília – Brasil, 1982
Os raios iluminavam todo o quarto, junto com estalos de trovões, os
quais mais pareciam gritos agudos de demônios queimando no fogo do
inferno, do que uma simples força da natureza.
Quando mais uma vez um raio iluminou o quarto escuro, pôde-se ver
uma cama, e deitada sobre ela uma mulher grávida chorando de dor, a cada
estalo emitido por uma nova trovoada ela se contraia, como se os demônios
que gritavam estivessem também a apertá-la.
A mulher já estava totalmente molhada de suor, quando dois
enfermeiros acenderam a luz, transferindo-a para uma maca e
apressadamente começaram a empurrá-la por um grande corredor.
Ao passarem por uma sala onde outra mulher estava a gemer,
notaram que ela estava com um homem que segurava sua mão, como se
quisesse confortá-la, neste momento um dos enfermeiros virou para o outro
falando com pesar:
- Não sei bem, mais tenho pena destas mulheres que não tem
ninguém para esta hora tão difícil.
- Eu tenho uma pessoa, ela deve estar chegando! – A mulher gritou
não por raiva pelo comentário, mas somente devido a grande dor que sentia.
O enfermeiro que falou olhou para a mulher manifestando um sorriso
como se estivesse feliz por ela ter alguém, mas o outro enfermeiro somente
confirmou com a cabeça sem demonstrar qualquer emoção, porquanto, na
realidade não queria conversar naquele momento, ele tinha uma sensação
estranha de que alguém os seguia...
Ao chegarem ao final do corredor, viraram à esquerda tomando outro
caminho ainda mais cumprido, mais uma vez o enfermeiro sentiu a estranha
sensação atrás deles, então resolveu parar subitamente e virar-se
imediatamente crendo que iria surpreender quem estava seguindo-os. Lado
outro, nada viu...
- Lucas você esta bem? – Questionou o outro enfermeiro sem nada
entender.
Com um gesto ele assentiu que sim, continuando a empurrar a
maca.
- Pode me dizer o que está acontecendo! – Suplicou o amigo.
- Não se preocupe comigo, este hospital esta me matando, não
aguento mais tanto trabalho, acho que já estou imaginando coisas. – A
resposta veio carregada por uma expressão de total tédio e cansaço mental.
Ao finalmente chegarem ao final do segundo e longo corredor, eles
entraram numa grande sala. Bem no meio dela estava uma cama com muitas
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luzes acima e dos lados, então os dois com muita cautela deitaram a mulher
sobre ela molhando as mãos devido ao intenso suor que lhe escorria pelo
corpo originado pela dor.
Antes de saírem ambos lhe desejaram o que sempre expressavam a
todas às futuras mães que levavam até àquela sala, em um som uniforme
falaram em voz alta:
- Bom parto, e fique com Deus!
Ao terminarem de pronunciar a última palavra, a mulher soltou um
abrupto grito de dor, e as luzes começaram a piscar subitamente. Os
enfermeiros ficaram parados, perplexos, terrivelmente assustados com o grito,
que mais parecia um som estridente vindo de um filme de horror.
A perplexidade dos dois foi quebrada pela equipe médica que
chegou apressadamente à sala.
- Já acabaram seus serviços? – Questionou um dos membros da
equipe.
Eles apavorados, somente assentiram com a cabeça, e saíram
correndo pela porta como se estivessem fugindo de algo. Não sabiam eles que
estavam fazendo a coisa certa naquele momento...
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A equipe médica ficou espantada com a saída às pressas dos
enfermeiros, mas o médico não quis adentrar neste fato, e somente virou-se
para uma pia e começou a lavar as mãos.
Geralmente, quando uma mãe chega à maternidade, depois de
preencher a ficha com os seus dados, é encaminhada para uma sala de
preparação para o parto, onde uma enfermeira obstétrica aferirá a temperatura,
pressão arterial, batimentos cardíacos, tipo sanguíneo, se a bolsa d'água se
rompeu e a dilatação do colo do útero com exame do toque.
Isto tudo já havia sido feito, conforme constatado pelo médico
através da ficha da paciente.
Ao analisar a ficha, o doutor teve enorme cautela, porquanto, de
tempos em tempos o médico ou as enfermeiras tinham que monitorar os
batimentos cardíacos e aferir a pressão, além de fazer exames para saber se
estava tudo bem.
Contudo, o Dr. Salomão somente estava tendo o primeiro contato
com aquela mãe naquele momento, tendo em vista que havia sito chamado às
pressas.
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E pensar que o dia havia começado tão bem hoje... - Pensou ele,
lembrando-se ainda da voz por telefone da enfermeira atônita lhe dizendo que
um taxista havia deixado uma paciente no hospital com a pressão oscilando,
sofrendo de enormes dores e prestes a dar a luz.
Após analisar novamente a ficha médica, ele iniciou todos os
procedimentos para fazer uma cesárea, já que não havia outra solução,
realmente aquela mulher estava sofrendo muito, assim, por questões de
segurança da mãe e do bebê, tinham que fazer uma cesariana.
Segundo a ficha médica, os enfermeiros já tinham executado todos
os procedimentos de praxe juntamente com outra enfermeira, e o anestesista já
havia terminado seu serviço enquanto o doutor lavava as mãos, a mãe
finalmente havia apagado, restando, tão somente, fazer o corte.
Lado outro, algo absolutamente inesperado ocorreu...
Inexplicavelmente a barriga da mãe começou a se mexer, sua pele
se contraia de um lado para o outro, parecendo que havia alguém querendo
rasgá-la! A mulher ainda misteriosamente acordou da anestesia e começou a
gritar de forma frenética, levando as duas mãos à barriga...
O Dr. Salomão ficou parado totalmente perplexo, seu coração
pulsava como uma bomba, ele nunca havia se assustado tanto, no fundo sabia
que aquilo era impossível e totalmente fora de realidade, mas seus olhos não
lhe enganavam, aquilo realmente estava ocorrendo, e ele tinha que fazer
alguma coisa.
Imediatamente olhou para o anestesista, o qual estava ainda mais
assustado, realmente não entendendo nada.
- Você não sedou ela direito! – Ele gritou o que parecia óbvio.
- Me desculpe doutor, mais ela estava bem sedada sim! Eu me
certifiquei de tudo!.. – A resposta veio em tom mais de preocupação do que
certeza absoluta.
Neste momento, todas as luzes da sala começaram a piscar, e as
principais, as quais iluminavam a mesa de parto, queimaram num estouro.
As enfermeiras que até aquele momento encontravam-se paralisadas
de medo começaram a gritar de pavor.
Às luzes devem ter queimado por falta de manutenção devido à
péssima situação financeira em que o hospital se encontra! – Pensou
assustado o doutor ponderando ainda sobre toda a situação. – Mas a barriga
desta mulher mexendo desta forma, com ela acordando de uma anestesia
geral, é totalmente fora de lógica! – Concluiu com os pensamentos em ritmo
frenético.
- Não há outra escolha, a cirurgia foi seriamente prejudicada!
Coloquem a paciente na mesa de parto ao lado! – Gritou em alto e bom tom o
Dr. Salomão para sua equipe. Com seu grito de comando às enfermeiras
pararam subitamente do estardalhaço que estavam promovendo pelo pânico,
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como se acordassem de um transe, e começaram a seguir a ordem sem
titubear.
O Dr. Salomão puxou o braço de uma enfermeira novata, e olhando
bem no fundo de seus olhos lhe disse:
- Chame para mim imediatamente um médico cardiologista, o
coração da paciente encontra-se muito acelerado. Diga também para as
secretárias da recepção para emitirem um chamado para todos os médicos que
estiverem neste hospital, preciso de toda ajuda possível, a situação está
totalmente fora de controle!
Em outro hospital, a equipe médica que acompanharia o Doutor
Salomão, seria bem mais treinada, tornando seu trabalho mais fácil. Contudo,
pelo corte de gastos na rede pública, o que lhe sobrava era apenas alguns
estagiários de enfermagem, e um anestesista, que por sinal, devia ser muito
ruim diante do que estava ocorrendo.
Ele sabia ainda que tinha que agir sozinho, mas em uma reunião
decidiram que quando ocorresse algum imprevisto, logo chamariam outro
médico para ajudar. Ainda tinha o fato de que ele não era especializado em
cardiologia.
O Dr. Salomão sabia que deveria antes de qualquer coisa procurar o
marido ou responsável daquela paciente, para lhe avisar dos sérios riscos
pelos quais ela esta passando.
Para infelicidade do Doutor, a enfermeira que saiu para procurar o
médico era igualmente às outras, uma novata, e estava demorando muito para
retornar...
- Vou somente à recepção aqui do lado, e já volto. Tenho que fazer
alguma coisa, com todos estes problemas se eu iniciar um procedimento
cirúrgico, está mulher certamente não resistirá, por isto precisamos de um
cardiologista urgente, e aquela mulher não retorna! – Disse o Doutor para os
demais membros de sua equipe saindo em disparada, quase trombando em
uma senhora que se encontrava rente à porta.
O Dr. Salomão olhou-a de cima em baixo, ela era baixa, negra,
cabelos curtos, usava diversos colares, e tinha os olhos tão penetrantes que
era impossível passar por ela despercebido.
Ele então a olhou mais uma vez, e ela lhe falou algumas palavras em
tom baixo, porém o doutor nem as ouviu, aquela não era a hora, seu tempo era
curto demais, não podia nem ter deixado a mãe naquele estado somente com
enfermeiras e um anestesista incompetente, correu até a recepção que ficava
bem próxima e se aliviou ao avistar um médico.
Aquela enfermeira me paga! Não conseguiu achar um médico que
estava embaixo do seu nariz... – Pensou em fúria.
Quando se aproximou o Dr. Salomão se espantou, o médico era
muito magro e pálido, seus olhos eram reluzentes, contudo, apesar da feição
estranha, exibia um sorriso mais do que carismático.
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- Desculpe-me Doutor, sou o Dr. Salomão! Estou com um problema
seríssimo naquela sala de parto ali na frente, o senhor é especialista em que
área?
- Em tudo meu filho! – Respondeu o velhinho em tom alegre.
- Que bom! – Disse rapidamente o Doutor Salomão no intuito de
cortar qualquer delonga na conversa – Corra então comigo para a sala de
parto! Lógico que por gentileza, pois necessito da ajuda de um cardiologista! O
senhor é clínico geral?
O velhinho somente assentiu com a cabeça já batendo em disparada
em direção à sala.
Ao se virar o Dr. Salomão viu sentado num banco frio, o que ele
supunha ser o esposo da mulher, ele se encontrava com a cabeça curvada
sobre o joelho, como se estivesse rezando, pelo menos o doutor esperava que
ele estivesse mesmo, porque naquele momento eles precisariam urgentemente
de um milagre...
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CAPÍTULO 2
Brasília – Brasil, 1982
O Dr. Salomão retornou a sala de parto, contudo, antes de adentrar
ficou chocado ao ver que a senhora que ele quase havia trombado ainda
estava lá. – Está senhora parece estar esperando alguma coisa! – Pensou.
Apesar de querer questionar o que aquela senhora fazia ali, ele
somente pediu licença e já estava quase entrando quando ela lhe falou numa
voz rouca e gasta pelo tempo:
- Você precisa ser forte meu filho, quando não tiver mais esperanças
recorra à luz...
O doutor achou aquilo estranho, contudo, sabia que não poderia
parar para pensar em nada naquele momento, ainda mais naquilo que aquela
velha estava falando. – Isto não tem o menor sentido, está mulher sequer deve
saber quem esta lá dentro, certamente se enganou, ou pode ser até mesmo
uma paciente da ala psiquiátrica... – Refletiu.
No entanto, o Dr. Salomão esfriou até a espinha quando viu no
corredor várias senhoras sentadas mais à frente, algumas negras outras
brancas, umas estavam com terços e bíblias sobre o colo, lendo em voz alta e
algumas estavam como a senhora que se encontrava à sua frente, com vários
colares e algumas fitas na mão, pareciam até baianas, todas cantavam
músicas que ele não conseguiu compreender.
Focou mais sua visão, se espantando ainda mais ao ver mais a
frente alguns senhores, eles estavam bem ao canto, alguns deles estavam de
branco, outros com roupas humildes mais bem lavadas, eram negros bem
velhos, estavam fumando cachimbos, o que o hospital logicamente não
permitia. Mais adiante ele avistou dois padres, eram inconfundíveis por causa
das batinas. E viu inclusive um monge totalmente trajado.
- O que baianas e freiras velhas, negros fumando, padres e monge
estão fazendo aqui?! E ainda por cima juntos e concentrados?! – Disse para si
mesmo totalmente perplexo.
Ele realmente não podia parar para pensar naquilo, voltou de seus
devaneios virando-se e já se preparando para adentrar na sala.
Lado outro, quando acabou de virar-se sentiu a mão da senhora
segurar firmemente em seu ombro, ela tinha uma força totalmente incompatível
a idade que aparentava. Após conseguir virá-lo novamente, ela lhe deu um
abraço inesperado, lhe falando bem rente a seu ouvido:
- Você precisa ser forte meu filho, quando não tiver mais esperanças
recorra à luz, salve primeiro o bebê, a mulher é muito importante, contudo, se
ele não nascer de nada ela servirá, nem mesmo nós que estaremos fadados
ao fim! Tudo e todos estarão perdidos! Por isto que entregamos nossas forças
a você Cosme...
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- Não sei quem você é, mas sei exatamente o que devo fazer, lhe
agradeço minha senhora, porque sei que seu intuito deve ser dos melhores,
contudo, somente para ressaltar, meu nome não é Cosme e sim Salomão. –
Respondeu o doutor pegando educadamente na mão da senhora, ela era
assustadoramente fria e áspera e, muito assustado, imediatamente retirou-a de
seu ombro.
Logo após, o doutor entrou na sala às pressas, lado outro, ouviu as
últimas palavras que a senhora falou quando ele estava prestes a fechar a
porta:
- Ele deve se chamar Marcos, como nos outros tempos, isto lhe dará
força e coragem, e o ajudará a reconhecer quem é, bem como, a quebrar a
barreira que o senhor não conseguiu fazer como seu irmão Damião
conseguiu...
O Dr. Salomão não entendeu nada. – Onde já se viu falar para um
médico sobre o nome que a criança deve ter! Isto é trabalho da família. –
Pensou.
Após o doutor entrar, a senhora ficou muito tempo olhando para a
porta, e após alguns minutos saiu em direção ao grupo que estava no corredor,
balançando a cabeça retirou de seu bolso um terço e dizendo:
- Vamos começar a enviar mais energias imediatamente, porque
deste momento em diante tudo dependera dele, de nós, e do Dr. Foliver, o
mestre sabe de tudo e de todos, não nos mandaria se não fossemos tão
necessários, e não encarnaria uma alma tão elevada como Cosme se não
acreditasse que ele teria forças suficientes para fazer este parto...
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CAPÍTULO 3
Brasília – Brasil, 1982
O Dr. Salomão finalmente entrou no bloco cirúrgico, onde
rapidamente foi conversar com o médico que estava perto da paciente, o
mesmo que ele conseguiu arrumar perto da recepção.
- Desculpe-me não ter me apresentado anteriormente, mas o senhor
estava muito nervoso, meu nome é Foliver! - Se apresentou o médico em tom
extremamente amistoso.
O Dr. Salomão levou o maior susto quando percebeu que a paciente
se encontrava sedada novamente, e toda sua equipe lhe aguardava, bem mais
calma.
- Desculpe-me... Dr. Foliver certo?
- Sim, pode me chamar assim!
- O que o senhor fez?
O velhinho sorriu, pegou no ombro direito do Dr. Salomão, puxandoo para mais próximo, sussurrando em seu ouvido:
- Eu não fiz nada... A energia do nosso Criador, e de nossos amigos
é que realmente trabalharam para retirar tudo que afligia esta mulher. Eu
somente ajudei a canalizar esta energia! Você ainda tem que tomar muito
cuidado, porque têm muitas coisas próximas a este hospital, este parto é o
mais importante da sua vida. – Certamente será o último! – Pensou o velhinho
por fim.
Mesmo confuso com tudo aquilo que aquele velhinho simpático
havia falado, o Dr. Salomão se dirigiu até à mulher que naquele momento
estava completamente sedada, como o tal Dr. Foliver havia mencionado. –
Este senhor pode falar como um louco, mais certamente tem muita
experiência! – Ponderou, e imediatamente gritou para as enfermeiras:
- Comecem rápido todos os procedimentos, vamos lá, vamos salvar
os dois!
Após todos os procedimentos, o Dr. Salomão tendo ao seu lado o
doutor que ele não conhecia, mais que devido aos fatos já nutria enorme
afeição, começou a fazer o corte, até aquele momento tudo estava indo
perfeito, foi quando percebeu que nada seria tão simples assim...
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Próximo ao hospital seguia cambaleando por uma rua totalmente
deserta um jovem que aparentava ter uns vinte e três anos, evidentemente ele
encontrava-se totalmente embebedado.
Parou subitamente e olhou para trás, vendo somente às luzes da
boate próxima a qual havia acabado de sair, - Porque fui sair desta boate
linda... estou custando a me equilibrar em pé... – raciocinou com o pouco de
discernimento que ainda lhe restava.
Quando retornou o olhar para o longo caminho que ainda tinha que
seguir, não pôde ver uma sombra negra que veio da direção do hospital, e
começou a andar bem atrás de suas costas.
A sombra seguia o jovem de perto, e quando ele passou por um
poste que iluminava o escuro beco foi possível ver o que estava seguindo o
jovem, a sombra não tinha uma forma, e certamente não era humano, e se
algum dia o foi, isto havia sido há muitos anos...
Após alguns passos o jovem começou a se sentir enjoado, parou e
colocou a cabeça entre as partes, sentindo uma golfada de vômito, virando-se
assustado ao ouvir uma assustadora voz que falava bem atrás dele:
– Isto será mais fácil do que pensei. Aquelas almas patéticas
conseguiram me expulsar de dentro daquele hospital, mais eu foi retirar a vida
de Cosme, ele poderá até fazer este parto, mais vai pagar caro por isto... –
Disse bem baixo o ser que seguia o jovem.
- Será um ladrão? – Questionou para si mesmo o jovem enquanto
ainda virava. Contudo, para seu azar não era, certamente teria desejado ser
assaltado do que passar pelo que estava prestes a ser submetido...
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CAPÍTULO 4
Brasília – Brasil, 1982
O Dr. Salomão deu início ao parto, contudo, para seu espanto mais
uma vez a barriga da mãe começou a se contrair e inexplicavelmente sua mão
foi ficando dormente, como se as veias de seus braços estivessem sendo
apertadas... Para piorar ainda mais a situação as luzes que iluminavam a
mesa, desta vez, inesperadamente se apagaram, sem qualquer estalo.
Isso realmente não pode ser problema na parte elétrica do hospital!
Acontecer uma vez tudo bem, mais duas, não seria possível. – Pensou ele
perplexo.
No meio do escuro da sala de operação, as enfermeiras começaram
a ficar apavoradas, mas dessa vez não gritaram, também após a bronca que
levaram anteriormente do doutor, aprenderam.
Foi então que o Dr. Salomão levou um susto ao ver alguma coisa em
seu bolso brilhar, com muita dificuldade devido à estranha contração das
mãos, ele conseguiu largar o bisturi e levar a mesma ao bolso pegando o
objeto, se assustando quando percebeu o que era...
Em suas mãos estava um terço, com uma grande cruz, que cintilava
uma luz muito forte.
De onde veio isso? – Raciocinou ele não entendendo de que local
tinha surgido aquele objeto, afinal, nunca havia tido um terço e nem ao menos
uma religião!
Após um pequeno momento analisando o rosário, o Dr. Salomão
lembrou-se da senhora que o havia abraçado no corredor, ela estava com um
terço como aquele...
Só pode ter sido ela! – A conclusão foi direta.
Foi quando ele olhou para sua equipe os quais não pareciam
estarem vendo aquela luz, estavam com os mesmos olhares intrigados, mas
não ao estranho objeto.
Não é para menos que estejam assim, eu que sei de onde veio já
estou perplexo, deve ser que eles não estão olhando para a luz por medo. –
Pensou ele sorrindo, afinal, realmente era muito pensar que estavam sendo
iluminados somente por um estranho terço!
Foi quando ele percebeu o que estava acontecendo. À medida que
ele levantava com sua mão direita o rosário, sua mão esquerda parou
subitamente de ficar dormente, e, ainda, às estranhas contrações na barriga da
mulher pararam, não era muito religioso, mais aquilo era realmente fascinante.
O Dr. Foliver ainda se encontrava ao seu lado, e quando percebeu a
perplexidade do Dr. Salomão com o que estava acontecendo, o velho
simplesmente bateu com afago em seus ombros dizendo com uma voz macia
e carinhosa:
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- Pode continuar o parto meu amigo, eu seguro este rosário de luz...
O último ser que afligia esta mãe, e, ainda, colocava em risco toda operação,
saiu neste momento, em breve tudo estará perfeito.
Rapidamente o Dr. Salomão regressou de seus devaneios com
aquela situação, se concentrando em seu trabalho, não fazia ideia do que
aquele velhinho carinhoso falava, mais tinha que continuar aquele parto,
porquanto, a mãe e a criança ainda corriam perigo. Neste momento ele
rapidamente entregou o rosário ao Dr. Foliver como pleiteado, e reiniciou todos
os procedimentos.
Após alguns minutos às luzes da sala da mesma forma misteriosa
que se apagaram, reacenderam, e as enfermeiras ficaram ainda mais
assustadas ao verem que o Dr. Salomão havia feito o corte perfeitamente no
escuro, e estava fazendo outros procedimentos de praxe.
Ao lado do Dr. Salomão ainda estava o Dr. Foliver, contudo, ele
nada fazia, somente dizia algumas palavras em voz baixa.
- O que o senhor está sussurrando? – O questionamento de
Salomão foi direto.
- Fique calmo meu amigo, somente estou rezando! – Após dizer
estas palavras ele pôs às mãos calmamente nos ombros do Dr. Salomão, que
sem parar com os procedimentos somente aguçou os ouvidos para ouvir o que
ele ainda estava dizendo. - Poucos médicos rezam atualmente, confiantes que
somente a ciência tem o poder. Contudo, não sabem que a ciência não é nada
sem a fé no Criador ou Criadores... Afinal, não foi um cientista Antoine
Lavoisier que chegou a conclusão de que “Na natureza, nada se cria, nada se
perde, tudo se transforma”? E, não foi outro cientista que afirmou que “A
ciência sem a religião é paralítica - a religião sem a ciência é cega”?
- Quem disse está última frase? – Questionou o Dr. Salomão
intrigado com o que acabará de ouvir, mais não tirando os olhos do que estava
fazendo, suas mãos pareciam estarem trabalhando por si só, era como se elas
houvessem adquirido algum poder mágico, ele sabia que tinha vasta
experiência, mas aquilo era surreal, ele conseguia perfeitamente raciocinar o
que o Dr. Foliver dizia e fazer tudo perfeitamente.
- Quem disse isto?! – Ironicamente respondeu o Dr. Foliver. – a
segunda afirmação é de ninguém menos do que Albert Einstein...
- Mas ele deixou transparecer que tinha algum dogma religioso? –
Lançou Salomão rapidamente mais uma pergunta, logicamente, estava
intrigado com aquilo, afinal, nunca havia se interessado por figuras da ciência,
mas aquilo lhe deixou boquiaberto ao perceber que cientistas de renome
tinham tal convicção.
- Visto da versão que as religiões atuais pregam sim, ele nunca teve
nenhum dogma, mais visto de sua própria versão, ele teve uma considerável,
talvez muito reveladora para as futuras almas encarnadas, ele disse também
que: “A religião do futuro será cósmica e transcenderá um deus pessoal,
evitando os dogmas e a Teologia”.
14
O Dr. Salomão estava boquiaberto, e vendo que ele estava assim, o
Dr. Foliver sentiu uma extrema alegria, era muito gratificante para ele poder
ajudar aquele homem a entender um pouco de fé, mesmo que por pouco
tempo. E, ele não sabia por que Cosme não havia conseguido quebrar à
barreira sozinho, mas achava aquilo o máximo, ensinar para uma das almas
mais evoluídas era surreal, e, ainda, ajudar esta alma a quebrar parte da
barreira, era ainda mais gratificante, só que, para que ele não percebesse que
estava com uma vasta habilidade, o Dr. Foliver tinha que ficar conversando,
senão ele poderia intuir que estava operando como ninguém na terra jamais
havia visto, ele buscava literalmente as habilidades da alma. Então o Dr.
Foliver não perdeu tempo, e prosseguiu na conversa:
- Até mesmo a igreja católica utiliza-se da ciência para comprovar
um milagre, ou seja, a fé completa a razão, mas nem tudo que não pode ser
comprovado através de um método racional, é digno de ser afastado pela
ciência, poderíamos dizer que ela somente não conseguiu comprovar com os
meios de que dispõem no momento, como diz o mesmo sábio cientista
Einstein: “Sem Deus, o universo não é explicável satisfatoriamente.”.
- Como assim? – Demonstrou mais uma vez sua curiosidade com a
conversa.
- A terra não era achatada antigamente meu caro Salomão? –
Rechaçou o Dr. Foliver. E, pela primeira vez durante a conversa, o Dr.
Salomão retirou completamente os olhos da barriga da mulher, olhando para o
Dr. Foliver, seu olhar transmitia a mensagem clara: Eu agora entendi tudo!
O Dr. Foliver deu um tapinha nas costas do amigo, dizendo com a
mesma voz tenra e amigável:
- A operação já está acabando, preste mais atenção no final, ela é
mais importante do que você pensa, há muita coisa em jogo neste momento!
O Dr. Salomão virou-se novamente e continuou o parto, estava
completamente espantado com o fato de que suas mãos não pararam de
trabalhar durante toda a conversa, mesmo quando ele estava perdido em seus
pensamentos. Contudo, ele não sabia que sua consciência estava agora
trabalhando aberta, deixando passar muito conhecimento acumulado em sua
alma, e que o Dr. Foliver ria daquilo tudo alegremente.
******
Quando o jovem virou-se e nada viu... Somente uma rua deserta e
escura, iluminada precariamente pelas luzes fracas da boate ao longe, logo
pensou: Que sensação estranha!
Mais a frente em um beco, uma figura sinistra se fez aparecer, era
um espectro, sua face era formada apenas por buracos, literalmente, não
possuía qualquer feição humana.
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Mais que cheiro fétido, parece carne podre! - Pensou novamente o
rapaz.
Quando o jovem se virou cambaleando, estatelou-se seu corpo que
já não tinha mais qualquer movimento próprio, a única coisa que ele via era a
face daquele ser horripilante à sua frente.
Logo após, o jovem caiu ao chão, mas ao bater ele não sentiu
qualquer dor, seu corpo já não mais o pertencia... Parecia que ele estava ali
dentro, via, ouvia, mais não sentia nada, e o que mais lhe causava pânico era
que ele não tinha literalmente mais qualquer poder de comando...
O fedor de carne pobre agora jazia em seu corpo, e o jovem se
colocou em pleno horror quando ouviu sua própria voz lhe dizer:
- Fique ai bem quietinho, somente vou precisar de seu corpinho por
alguns minutos, até matar um cretino, após lhe devolvo ele, se algo sobrar... –
Fez-se uma pausa, e concluiu: - É certo que se você viver, vai ficar muitos
anos na prisão, mais quem mandou ser tão descuidado?...
O jovem gritava por socorro, mas sua voz era inaudível, foi quando
ele percebeu que estava começando a se levantar involuntariamente, e iniciou
uma caminhada rumo ao que parecia ser um grande hospital...
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CAPÍTULO 5
Londres – Inglaterra, 1982
Sentado em uma mesa uma figura no mínimo excêntrica lia um
grosso volume de documentos velhos, que segurava com a mão esquerda
apoiando-o, ainda em sua perna, os quais mais pareciam pergaminhos
advindos dos primeiros exemplares do papiro, devido a sua tamanha aparência
primitiva.
O senhor tinha às pernas dobradas com maestria, onde se utilizava
desta técnica para apoiar os pergaminhos, devido ao fato que não gostava de
utilizar a grande mesa de mogno e pés em marfim, a qual ali se se encontrava
mais para dar a sua sala certa imponência do que por utilidade, tendo em vista
que, devido às suas várias expedições, ele que nestas não poderia contar com
o luxo de ler apoiado em uma mesa, lia daquela forma sentado, por óbvio, não
em uma poltrona como agora se encontrava, mas onde dava para esperdiçarse em seus pensamentos lançado naqueles documentos que lhe encantavam,
e, portanto, por costume assim lia sempre.
Na mão direita ele segurava um cachimbo também confeccionado
em puro marfim, com detalhes em ouro, o qual tragava somente de vez em
quando, devido ao fato de que sua atenção e prazer ali não estavam fixados,
mas sim nos pergaminhos antigos, os quais eram frutos de sua última
expedição a uma antiga civilização que muitos julgavam perdida, mas que ele
somente com a ajuda de alguns de seus fieis e igualmente excêntricos amigos
encontrou.
Ele vestia um blazer negro, o qual se assentava perfeitamente as
suas demais vestes, todas em social de alto padrão de costura, afinal um
bilionário tinha que manter as aparências, visto que suas viagens e
principalmente sua alta proximidade com a rainha já erigiram muitas suspeitas
não somente em Londres, mas em toda Inglaterra.
Após algum momento pegou delicadamente uma xicara de café que
se encontrava sobre a mesa encima de um delicado apoio, por evidente
colocado por seu mordomo Richard, o qual ele sabia que tinha mais paixão e
zelo por aquela mansão do que ele próprio, afinal, Richard e os outros
beduínos eram os quais passavam mais tempo nela.
Todos o criticavam por preferir o café ao chá da preferência dos
Ingleses, mas ele sabia que necessitava de energia devido a sua avançada
idade, e, aquela bebida além de lhe proporcionar tal poder, ainda, era
originada por uma forma de história que o seduzia, ele a bebia muitas vezes
relembrando que para chegar-se a forma como hoje a preparavam, os monges
tiveram extremo trabalho, entre torrefação, etc., era algo magnifico.
Mas ao sorver o líquido quase o cuspiu, porquanto devido a sua
fascinação pela leitura daqueles documentos esqueceu-se de tomá-lo quando
ainda estava quente, mas há muito tempo ele já estava gelado como um
defunto.
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Contudo, algo lhe parecia estranho, afinal, tudo estava muito quieto
como de costume, mas seus ouvidos aguçados de um caçador voraz
escutavam rastejares ao longe. Sorrateiramente apertou um botão camuflado
em sua mesa, a qual abriu um compartimento secreto, no qual ele inseriu os
pergaminhos fechando-o logo em seguida, tomou o café mesmo frio para lhe
dar mais energia, e, sorrateiramente pegou uma grosa bengala que estava
escorada na mesa, e apoiando-se na mesma levantou-se, andando
vagarosamente até à porta de saída. Mantinha a cabeça abaixada, mas seus
olhos verdes lodo olhavam em todos os cantos do imenso escritório, o qual
mais parecia uma biblioteca antiga.
Após alguns passos percebeu uma sombra fora da mansão, estava
próxima a uma das várias janelas, levou às mãos a cabeça como se estivesse
esquecido algo, e, ao virar-se de uma forma discreta olhou melhor para a sala,
percebendo não apenas uma, mas várias sombras.
Vazou a informação, mas qualquer cretino iria pensar duas vezes
antes de me desafiar! – Pensou sorrindo, tinha a certeza que nunca procurou
uma confusão, mas era aficionado por uma boa disputa, contudo, tinha que
confessar que os homens que ali estavam eram profissionais, afinal, eles
caíram em sua estranha armadilha, mas fizeram tudo como dizia o protocolo
dos agentes secretos, eram como ratos indo direto para a ratoeira, no entanto,
estes ratos eram letais...
- O jogo pode começar companheiros, venham rápido, já estou
pronto! – Gritou o senhor em alto e bom tom, erguendo sua grossa e pesada
bengala, pegando de surpresa os agentes camuflados do lado de fora de seu
escritório.
- Este senhor é um bilionário louco chefe! Está gritando para
entrarmos, acho isto muito estranho... – Disse um dos agentes de campo pelo
rádio ao chefe da operação, o qual ficou escondido no imenso jardim da
mansão, operando e dando às coordenadas.
- Não se preocupem agentes, ainda não perceberam que se trata de
um velho raquítico, eu queria vir sozinho para cumprir a missão, mas eles não
deixaram alegando que poderiam surgir complicações, por isso parem de
serem mocinhas, entrem logo e acabem com ele, mas antes façam que conte
onde estão os pergaminhos! – Respondeu o chefe o qual tinha uma voz rouca,
o que contrastava com sua tenra idade, talvez se sua idade fosse à mesma
que denotava sua voz ele pensaria duas vezes antes de ter dado aquela
ordem...
Movidos pelo impulso coercitivo do chefe, os seis agentes de campo
não mais hesitaram em imediatamente arrombarem várias janelas e
adentrarem o local, contudo, logo após o vidro quebrar-se, foram acionados
por um mecanismo silencioso barras de ferro que bloquearam todas as
entradas para o interior da mansão, mas não havia soado nenhum alarme,
pelo menos em alto volume, parecia ter sido acionado somente as barras que
impediram a saída e entrada de tudo.
- Qual a posição agentes? Há seguranças ai dentro? – O chefe da
operação estava atônito, aquilo não estava dentro do previsto, eles não haviam
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sido informados de qualquer sistema de segurança daquela forma, ainda mais
que impediam que os invasores saíssem, e não de que entrassem! – Bem que
desconfiei que estava tudo muito fácil. – Ele pensou por fim.
- Chefe, estamos presos aqui dentro, e o velho esta estranhamente
parado na nossa frente olhando-nos com sua cara de doido, acho que ele tem
algum plano que não premeditamos após as informações. – Gritou um dos
agentes respondendo o chefe e demonstrando suas preocupações com o rumo
da situação.
- Informações?! – Gritou o velho, sorrindo ao ver os ratos se
mexerem dentro da ratoeira. – Então a minha desconfiança está confirmada,
vocês foram idiotas ao pensarem que eu iria deixar que o governo fizesse meu
esquema de segurança sem que eu logo após promovesse algumas
modificações com alguns de meus amigos do ramo de... digamos... segurança!
– Arrematou ele evidenciando um sorriso malicioso, e um louco olhar como se
fosse literalmente devorá-los.
- Você escutou chefe? – Tornou a questionar o agente, o qual já
tinha deixado o áudio ligado para que o chefe pudesse acompanhar pelo
menos por áudio tudo que estava ocorrendo.
- Sim, não tenham medo. Já havia sido avisado da excentricidade
deste velho, mas ele não passa de um velho gaga, por isso andem logo.
Acabem com ele rapidamente, após, para saírem, utilizem os explosivos, mas
antes se lembrem de fazê-lo contar onde estão os papiros.
- Papiros? Que papiros chefinho! – Gritou o velho que havia
escutado as ordens devido ao volume do retorno do áudio estar no volume
máximo, aliado ao eco que proporcionava a grande sala. – Pode ficar tranquilo
chefinho que você vai sair daqui com apenas um papiro, aquele que vai ser
enviado junto ao seu corpo para quem lhe contratou. – Arrematou.
Este velho é realmente um louco, deve estar delirando! – Pensou o
chefe da operação, mas no fundo temia, afinal, tudo estava tomando um rumo
totalmente fora do que esperavam, então decidiu ordenar:
- Homens ataquem logo, o que estão esperando?!
Imediatamente os homens tomaram suas armas apontando-as ao
velho, o qual para espanto deles sorriu ainda mais quando as miras a laser
tomaram seu peito.
O velho segurava a grossa bengala, e antes do show resolveu ainda
mandar um recado:
- Chefinho! Mande um adeus aos seus homens, ou melhor, até
breve, porque em questão de momentos vocês estarão sendo sondados pelo
barqueiro da morte...
Logo após proferir isto o velho bateu sutilmente sua bengala ao
chão, e de um compartimento na mesma saiu uma pequenina bola, a qual
bateu ao chão e foi rolando em direção aos agentes.
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- Parece que sua bengala é mais sensata do que você velho, está
despedaçando de medo, e as partes tentam sair correndo de perto de ti. – E
soltaram gargalhadas, ao passo que o velho somente retirou seus óculos de
um dos bolsos levando-os aos olhos, o que fez com que os agentes sorrissem
mais com a cena, e debochassem ainda mais, chegando a um deles caçoar: Meu Deus, ele quer enxergar os homens que o eliminarão deste mundo!
Contudo, em poucos segundos a pequena esfera já havia
sorrateiramente percorrido quase toda a grande extensão da sala, e já estava
próxima aos agentes, foi quando eles perceberam que não era uma parte da
bengala que caiu, mas foi arremessada dela, e, tiveram a certeza disto quanto
o velho apertou mais um compartimento da bengala, ou melhor, do
equipamento que ele usava camuflado de bengala, fazendo a esfera explodirse como uma granada, mas ao invés de estilhaços ela lançou foi uma luz
radiante, a qual cegou instantaneamente os agentes, fazendo com que devido
ao susto começassem a atirar, contudo, o alvo não estava mais na mira, já que
os óculos que o velho havia colocado minutos antes era especialmente
confeccionado para além de lhe proteger da claridade da luz, proporcionava
visão de tudo a sua volta, principalmente dos agentes, os quais eram
visualizados utilizando-se o sistema de visão termo térmica, assim, em
segundos ele já estava protegido atrás de um móvel e as balas eram lançadas
em todas as direções, chegando ao ponto de alguns destes acertarem os
próprios companheiros.
- Equipe! Equipe! O que estão fazendo? Não deixei claro que era
para vocês extraírem a informação da localização dos papiros antes de
matarem o velho! - Gritava freneticamente o chefe da operação, sendo tomado
por um grande temor quando ouviu ao longe o velho lhe lançar uma resposta:
- Fique calmo chefinho, seus agentes ainda estão totalmente
confusos devido a um joguinho de luz que lhes proporcionei, lhe adianto que
não tenho culpa de alguns deles serem tão fracos que no choque atiraram
rumo aos próprios companheiros. Por isso, tenho que lhe avisar que devido a
um compromisso inadiável, não poderei brincar mais. Assim, seu tempo de
vida está contado a partir de agora, e pode ter certeza que em menos de seis
minutos você poderá dar ordens pessoalmente aos seus agentes, conforme
lhe falei, na embarcação da morte, isto se vocês já tiverem recebido o dinheiro
para tomarem o que me pertence, porque do contrário não terão nenhuma
moeda para pagar ao barqueiro.
É hora de abordar, tudo está fora de controle, e este velho não
parece ser o que aparentava... Bem que tentaram me avisar para tomar
cuidado. Mas quem poderia imaginar que um velho raquítico tivesse alguma
chance com seis agentes secretos treinados para matar? – Pensava
freneticamente o chefe da operação antes de lançar a ordem:
- Abortar, abortar agentes!!
Mas já era muito tarde... Em um movimento rápido o velho ergueu
novamente sua estranha bengala, pegou no cabo e apertou mais um botão
também camuflado, imperceptível aos olhos alheios, afinal, foi desenvolvida
para ser utilizada somente pelo velho, os botões antes de serem acionados
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reconheciam automaticamente às digitais, assim, se outra pessoa pegasse o
instrumento, ele não passaria de uma simples bengala.
Após poucos segundos abaixo do cabo de alça da mesma uma
pequena alavanca surgiu, o velho agora segurou a bengala como uma
espingarda, sabia que dispunha apenas de trinta balas, assim, os tiros tinham
que serem os mais certeiros possíveis, por isso levou às mãos aos óculos e
apertou mais um botão, e, em segundos o infravermelho capitou três dos seis
agentes, em um movimento rápido ele rolou para trás de outro móvel, o jogo
iria começar...
Os tiros foram certeiros no peito, o velho se vangloriou com a
pontaria de um jovem, ou melhor, como ele costumava falar aos amigos:
“Pontaria de um experiente caçador de formigas”. Falava assim porque os
amigos sempre questionaram como ele tinha a pontaria tão boa, e ele
respondia que treinava tentando atirar em pequenas formigas a metros de
distância, a partir dai acertar no peito de um animal de maior porte, neste caso
um ser humano, era tarefa fácil.
- Chefe! Três agentes foram abatidos neste momento por disparos
certeiros efetuados pelo velho em seus peitos. Espere... Outros dois foram
abatidos agora! Estou sozinho, repito que estou sozinho! Creio que ele esteja
com algum segurança, porque somente este raquítico sozinho não teria
capacidade para isso tudo! – Gritava desesperado o último agente.
Nossa... Este velho já está me dando nos nervos! – Pensou o chefe,
antes de lançar à ordem obvia:
- Rápido, saía daí! Vou te aguardar no nosso ponto de encontro,
prometo que não vou sair da propriedade antes que você apareça...
O agente tinha que ser rápido, sabia que o chefe iria cumprir a
promessa, mas também tinha ciência que ele não era um louco para ficar
aguardando por tempos.
O velho estava satisfeito, sabia que se neutraliza-se todos os
agentes provavelmente não iria encontrar o chefe, assim, era somente
aguardar que o ratinho o levasse a toca...
Para melhorar sua tática, ele ergueu-se somente um pouco, o
suficiente para que o agente o visse correndo para fora da sala, e pensasse
que ele estava tentando escapar. E, deu muito certo, porque, assim que ele
saiu da sala, o agente comunicou-se com o chefe pelo rádio:
- Chefe, já estou indo, o velho acaba de fugir da sala! E você não vai
acreditar, ele estava sozinho mesmo...
Acredito... – Pensou perdidamente o chefe, já raciocinando na
bronca ou talvez até perca do emprego que estava predestino a levar por não
tomar mais cuidado nesta operação. – Mas como poderia imaginar que este
velho seria está maquina de matar? – Questionou indignado consigo mesmo.
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O agente colocou na parede um explosivo plástico, se afastando,
mas quando este estourou ele se assustou ao ver que não havia sequer
trincado a parede.
- Chefe, creio que está mansão é altamente blindada, mas espere...
– Ele fez uma pausa boquiaberto ao perceber que as grades estavam se
abrindo. – Acho que a explosão danificou o sistema que comandava as grades,
elas estão se abrindo, já estou indo! – Articulou o agente que já estava saindo
pela janela, o velho que o vigiava pela fresta da porta sorriu olhando para sua
bengala, da qual segundos antes foi pressionado um botão secreto que liberou
às saídas.
Idiota, ele acha que alguma parte de minha mansão se danificaria
com aquela explosão de nada! – Pensou o velho sorrindo, e, já seguindo no
encalço do agente, seu sorriso malicioso se misturava ao pensando de como
iria articular sobre o envio dos corpos de volta, de repente quase soltou uma
gargalhada quando raciocinou melhor: contudo, acho que seria melhor falar
que a carne já está acabando, e, como não estou atrás de nenhum bandido
ultimamente creio que somente alguns corpos partirão ao seu destino...
somente os magrinhos... Sorriu sinistramente com água na boca, mas sabia
que não poderia se deliciar com nenhum deles, pelo menos por enquanto...
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CAPÍTULO 6
Brasília – Brasil, 1982
Logo após a longa conversa que teve com o Dr. Foliver, em minutos
o Dr. Salomão terminou a cirurgia, e a criança foi levada pelas enfermeiras já
fora de risco para uma incubadora, uma vez que havia nascido pré-matura.
Ele acabou de dar os pontos na mãe, suas mãos deslizavam
suavemente ao promoverem o fim dos trabalhos, afinal, tinha certeza que
aquela habilidade não era comum... Terminou e falou para sua equipe que a
medicassem e a levasse para um quarto, que em breve ele iria ver como ela
estava.
Logo após ele foi correndo em direção à porta de saída, com
esperanças de conversar com aquela senhora, e pedir que ela esclarecesse
tudo aquilo. Queria saber principalmente por que estava lá? E o que significava
aquele terço brilhante que pusera em seu bolso?
Contudo, ao atravessar a porta e olhar o corredor levou um susto ao
perceber que ele estava completamente vazio.
Já devem ter ido embora! – Concluiu o óbvio. Então se dirigiu à
secretária que ficava em uma mesa vendendo planos de saúde bem próximo à
porta da sala de parto:
- A que horas as pessoas que estavam ali saíram?
- Me desculpe doutor, mas ninguém se sentou hoje à tarde nos
bancos deste corredor... – A moça respondeu hesitante, afinal, não queria
dizer algo inapropriado para um médico, porquanto, necessitava de seu
emprego.
O Dr. Salomão se irritou, lhe falando de uma maneira áspera e sem
educação, o que não era comum, mas àquela garota devia estar brincando
com sua cara, ele pensava:
- A senhora esta me dizendo que não viu aquele monte de pessoas
com bíblias, e aquela senhora negra que estava aqui na porta e até me deu um
abraço??!!
A secretária ainda mais confusa lhe respondeu com mais medo e
receio nas palavras:
- Me desculpe doutor... Mas não sai daqui... E... Como lhe falei, não
vi ninguém. E sobre esta senhora que estava conversando com o senhor, para
lhe ser sincera, acho que o senhor deve estar um pouco cansado, porque o
senhor estava conversando sozinho! Até pensei em lhe perguntar se não
estava precisando de algo, mais conclui que talvez estivesse se concentrando
e aquela era a forma utilizada para tanto...
O Dr. Salomão ficou perplexo ao ouvir aquilo, não poderia ser
verdade. Lembrou-se então do Dr. Foliver, ele havia entrado naquele momento
em que aquelas pessoas estavam no corredor, decidiu então entrar na sala de
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parto, e conversar com o mesmo, e até mesmo lhe pedir de volta o terço
brilhante que lhe entregou no momento do parto.
Contudo, ao retornar à sala, ele não encontrou o Dr. Foliver, ficou
um pouco confuso, já que para sair o mesmo teria que ter passado por ele
perto da porta no corredor, mas como estava furioso com aquela tonta de
secretária, devia ter passado sem que ele percebesse.
Foi até a enfermeira que estava ali desde o começo do parto, e lhe
perguntou:
- Janice, o doutor que eu chamei para cuidar da pressão e da
aceleração cardíaca daquela mãe, ele te disse para onde iria?
A enfermeira lhe respondeu meio que sem entender:
- O que está dizendo doutor?
Ele não podia acreditar, a secretária e a enfermeira deviam estar de
brincadeira. Falou de uma maneira seria novamente, para deixar bem claro
que naquele momento ele não estava para brincadeiras:
- Escute aqui Janice, eu lhe pedi para chamar um cardiologista, para
ele examinar a paciente e controlar sua pressão que no momento que eu sai
estava alta e os batimentos cardíacos descompassados, e não poderíamos
fazer nada além dos parcos medicamentos que administrei somente para
acalmar momentaneamente, até ai você se lembra?! – Sem deixar que ela
respondesse continuou com a mesma voz furiosa: - Então, como você estava
demorando muito, não se sabe o porquê, eu saí e encontrei um médico bem
ali, pertinho da recepção, que você não teve a competência de encontrar!
A enfermeira já estava ficando mais do que confusa, e lhe respondeu
também de uma forma séria e direta, com o mesmo tom de voz, afinal, não
precisava daquele emprego como a secretária:
- Doutor, eu lhe respeito muito, mais o senhor mude o tom de voz
comigo! Eu ouvi sim o que o senhor havia me solicitado! Acontece que saí por
todo o hospital, não sozinha, e sim com mais algumas secretárias da recepção
central, não encontramos nenhum médico disponível na área de cardiologia.
Ainda, lhe digo que demorei porque tivemos que peregrinar pelo hospital,
porquanto, inexplicavelmente o som de chamada estragou bem no momento
em que a recepcionista ia chamar o médico que você necessitava. Nisso
voltamos às pressas para lhe avisar, para que o senhor pudesse analisar o que
seria feito, mas o senhor ainda não havia chegado e a pressão da mulher
havia baixado assustadoramente, e estava normal, pensamos que foram os
medicamentos utilizados pelo senhor mesmo, foi ai que o senhor chegou
apavorado foi até um canto e ficou conversando sozinho, e depois veio até
nós, dando ordens e ainda falou: “temos a chance de salvar os dois!” não me
deixou falar uma palavra sobre eu não ter encontrado algum médico, e, ainda,
ficou durante todo o procedimento cirúrgico conversando coisas que eu nem
sei falar o que... – Parou vagarosamente de falar ao perceber que o doutor não
estava mais prestando atenção, afinal, ele parecia estar perdido em seus
pensamentos.
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- Doutor! O senhor está me ouvindo? – Ela tentou chamar sua
atenção após alguns minutos sem que ele sequer piscasse.
O Dr. Salomão estava realmente vivendo um dia daqueles, mas
ainda estava racional o bastante para discernir o certo do errado, foi ai que ele
lembrou-se de algo, retornou de seus devaneios questionando:
- Janice, então me diga quem estava no momento em que o terço
começou a brilhar, e ainda me deu um tapinha nas costas me desejando boa
sorte?
- Doutor, não sei realmente o que está acontecendo! Mas o senhor
precisa descansar, vou lhe falar somente uma vez, não sei nada deste crucifixo
brilhante, somente sei que ficamos tempos no escuro, até as luzes
reacenderem. – fez uma pequena pausa para tomar ar, e prosseguiu de
maneira firme: - E quando às luzes retornaram o senhor inexplicavelmente
havia iniciado os procedimentos no escuro mesmo. Enfim, somente sei que eu
não consegui arrumar um médico cardiologista, a luz se apagou subitamente, e
a mulher começou a gemer muito, e depois de algum tempo no escuro às
luzes retornaram com o senhor já fazendo todos os procedimentos, e o senhor
estava mais calmo do que nunca, e fez o melhor parto que eu já vi o senhor ou
qualquer outro médico fazer em todos os meus vastos anos como enfermeira.
Após falar isto, à enfermeira virou as costas e começou a andar em
direção a porta, o Dr. Salomão mesmo confuso lembrou o nome que o médico
havia dito quando se apresentou e falou para a enfermeira:
- Janice, me desculpe, mas será que você pode responder somente
mais uma pergunta?
Ela então parou olhando para ele sem nada falar, era como se
quisesse dizer para ele “não”, mas sabia que tinha que escutar.
Ao perceber a parada, o doutor respirou e a olhou triunfante,
certamente aquilo mataria o assunto, portanto, arrematou:
- Ele disse que se chamava Dr. Foliver!
Janice virou no mesmo momento o corpo totalmente e soltou um
sorriso meio sem graça, falando com uma voz chorosa com mistura de raiva
pela brincadeira que aquele homem acabará de dizer:
- Doutor pare com estas brincadeiras imediatamente, e tente
descansar, porque não admito este tipo de coisa. Afinal, todos aqui sabem que
o Dr. Foliver morreu há cinco anos. E, aliás, foi na vaga dele que o senhor
entrou neste hospital. Portanto, lhe digo que gosto muito do senhor, mas ele
era um grande amigo meu e de todos e por isso não deveria brincar desta
forma.
A enfermeira saiu chorando, lembrando-se do doce Dr. Foliver, e o
Dr. Salomão fixou somente parado, perplexo, sem qualquer reação.
25
******
Do lado de fora do hospital o jovem avançada a passos longos, ou
melhor, aquilo que o dominava...
- Será neste momento que você sentirá minha fúria Cosme! – Ele
dizia com uma voz sinistramente rouca e grossa.
Um cachorro que estava revirando uma lata de lixo começou a latir
muito ao vê-lo passar, contudo, somente com um olhar o cão começou a
promover um comum choro canino, e, ainda se mijava todo de medo.
- Isso mesmo cãozinho, seja esperto e fuja, se Cosme fosse como
você já estaria longe...
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CAPÍTULO 7
Brasília – Brasil, 1982
Após a enfermeira sair, o Dr. Salomão ficou curioso, já havia lido
casos de médicos que diziam terem sido ajudados por médicos mortos, mais
achava aquilo uma grande lorota, decidiu tirar o caso a limpo, afinal, era muito
fácil, e num giro rápido saiu às pressas pelo corredor do hospital.
Ao cruzar uns sete corredores ele chegou ao seu destino, pediu à
secretária que cuidava de todos os arquivos do hospital que lhe entregasse a
pasta do Dr. Foliver, que ele queria dar uma olhada.
- Sim doutor, é pra já!... Nossa como o tempo passa depressa, já
tem cinco anos que ele se foi. Ainda me lembro, era o melhor! Tinha uma
grande simpatia, contagiava todos os pacientes e funcionários do hospital com
sua alegria, pena que ele se foi... – Ela lhe respondeu numa voz quase de
choro.
O Dr. Salomão ficou meio sem graça em ter certeza que todos
conheciam e adoravam o Dr. Foliver, somente ele não sabia nada sobre
aquele finado homem. Mais também ele não sabia nada sobre ninguém, se
preocupava tanto com o seu serviço que nunca demonstrava seus
sentimentos.
Ultimamente, ele sabia que seu tempo estava escasso até mesmo
para ele, nunca namorou, afinal, não tinha mãe nem pai, e sempre teve que
lutar pela sobrevivência, principalmente, para conseguir se formar em
medicina, teve que batalhar, fazendo vários bicos para se alimentar,
porquanto, havia conseguido passar em uma universidade pública, mas,
mesmo assim tudo era muito caro, e, ele queria sempre mais, e nesta ânsia
por trabalho, acabou sozinho, mas tinha sempre um sentimento de que a
medicina estava entranhada de tal maneira em suas veias que era o que
bastava para lhe fazer feliz, mal sabendo que ela estava penetrada ainda mais
fundo, literalmente, em sua alma...
Mais aquilo não tinha nada a ver naquele momento, espantou seus
sentimentos, e aguardou ansioso à secretária que após muito procurar,
finalmente achou a respectiva pasta, e lhe entregou com um sorriso.
O Dr. Salomão estava um pouco receoso em abri-la, mas logo um
pensamento racional tomou conta de sua mente: Deixe de ser bobo, abra logo,
isto não passa de uma brincadeira da sua equipe!
Após abri-la, ele se esfriou até a espinha, na primeira página do
arquivo tinha uma foto bem grande do Dr. Foliver, o mesmo homem que o
estava ajudando na sala de parto...
Após ver as fotos ele somente teve forças para dizer algumas
palavras sem raciocinar:
- Meu Deus, por isto ninguém via aquelas pessoas, elas estão
mortas...
27
******
O jovem não entendia nada do que estava acontecendo, ele se
sentia leve, como se estivesse flutuando dentro de seu próprio corpo, que
naquele momento já estava quase chegando ao hospital.
Ele não tinha o controle de nada, e, até mesmo percebeu que não
mais se encontrava embriagado, afinal, mal sabia ele que o álcool estava em
seu sangue naquele momento, e, ele não tinha mais a percepção deste,
porquanto, somente sentia sua alma, que mesmo sem comandar o corpo,
ainda permanecia ali dentro, totalmente a mercê do ser que lhe abduziu.
Quando sua cabeça involuntariamente olhou para baixo, ele pôde
ver seus braços, se assustando ainda mais ao perceber que ele estava
inexplicavelmente suando sangue, e muito sangue, e se apavorou ainda mais
ao ver o que estava em suas mãos...
28
CAPÍTULO 8
Londres – Inglaterra, 1982
Após uma longa caminhada o agente chegou até o ponto de
encontro que havia designado a poucos metros do grande muro aos fundos da
mansão. Pensava que àquela altura estaria com os manuscritos em mãos, e o
velho aniquilado, lado outro, o plano definitivamente não saiu como esperava...
- Ande, não temos muito tempo, em breve a guarda real pode
chegar! – Gritou o chefe ao avistar a aproximação do agente.
Quando o velho avistou-os levou um susto, nunca pensaria que eles
fossem fazer um buraco no muro, tão grande, pensou que seria menor.
Vândalos! – Pensou sorrindo.
- Está tudo aqui chefe, creio que podemos partir...
- Acho melhor vocês esperarem até o jantar! – Disse com uma voz
macia o velho que já estava ao lado de ambos, ao passo que os intrusos
quase tiveram uma parada cardíaca devido ao grande susto com a chegada
inesperada. – Se assustaram? – Caçoou ainda o velho sorrindo.
Este velho realmente é muito sinistro. - Pensou o chefe da operação.
- E ai? Ainda não responderam minha pergunta! – Retornou o velho
logicamente querendo amedrontar ainda mais os agentes.
- Não podemos ficar para o jantar, mas creio que levando em
consideração sua fortuna, ele será irresistível. O que servirá? – Retrucou o
chefe, após ver que seu agente estava totalmente abalado com a chegada
repentina, ele havia percebido nos olhos dele o medo por tudo que havia
passado no interior da mansão, e, por isso resolveu ironizar, para demonstrar
que não tinha medo dele.
- Vou jantar seu agente! E, de você penso em comer apenas o
coração... – A resposta foi seca e direta.
- Sei que você deve estar se sentindo o maioral, mas quero que
saiba que não está com esta bola toda velho, afinal, tenho que reconhecer que
você encontra-se em ótima forma para sua idade, e, ainda, que até
demonstrou ser digno de respeito. Mas a partir dai você querer colocar medo
como se fosse um canibal, já é outra história. – Retrucou o chefe no mesmo
tom de deboche.
- Não estou tentando colocar medo em vocês, longe de mim fazer
uma maldade destas. – Disse erguendo as mãos. – Mas como vocês vieram
me desaforar em minha casa, não vou lhes perdoar, agora você vai assistir eu
arrancar cada um de seus membros, ai eu vou costurar para que você não
sangre e morra rapidamente, ai eu arranco outro, e mais outro, e outro...
Neste momento o agente pensou que agiria mais rápido do que o
velho e sacou sua pistola, mas antes de erguê-la o velho apontou-lhe aquilo
que até pouco tempo eles afirmavam ser uma bengala, disparando um tiro
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certeiro em seu pescoço fazendo-o cair instantaneamente, o chefe estava
boquiaberto, e assustado procurando por sangue, o qual não jorrou do
pescoço do agente.
- Acalme-se chefinho, não o matei ainda. Somente porquanto sou
um homem de palavra e vou cumprir o que acabei de lhe jurar, que vou matálo aos poucos, bem aos pouquinhos... – sua expressão era de um verdadeiro
psicopata. – Por isto somente lhe apliquei um sedativo poderoso, retirado de
uma poderosa serpente da África.
- Não posso implorar por minha vida, afinal, pelo que vejo estou
lidando com um psicopata canibal. – Respondeu o chefe da operação.
O velho o analisou pela primeira vez não como presa, mas como
uma fonte infinita de oportunidades, a qual ele havia traçado, por isso decidiu
seguir adiante em seu plano perigoso:
- Não pode implorar por sua vida, mas pode negociá-la.
O chefe da operação o olhou com desconfiança, afinal, pelos anos
que trabalhava naquele serviço sabia que aquilo era muito arriscado, mas às
chances dele sair vivo, o que até aquele momento estava fora de cogitação
surgiam, então decidiu entrar no jogo:
- O que propõe em troca?
- Tudo, somente quero saber tudo! – Foi direto o velho.
- Tudo o que? – Tentou se fazer de desentendido somente para
avaliar suas opções.
Mas a resposta do velho tirou todas às suas dúvidas, ele não estava
para brincadeiras...
- Da próxima vez que você se fizer de desentendido, vou arrancar
sem cerimonias seu coração e comê-lo quando ainda estiver pulsando!
- Me desculpe... Sou um ex-agente da inteligência britânica. Quando
me aposentei, percebi que não tinha família, amigos, enfim vida social, tinha
sido treinado para matar, e era somente isto que eu fiz minha vida toda. Tentou
retornar, mas negaram, alegando que seria muito dispendioso manter um
agente como eu ativo, e, ainda, que era muito perigoso... – Ele mentiu em
partes, tentando mudar o rumo da conversa.
- Simplificando, eles acham que você é um velho imprestável como
eu! – Interrompeu o excêntrico senhor fazendo esta consideração direta.
- Sim, em síntese é isto! Mas eu sou jovem ainda, e decidi chamar
alguns de meus companheiros que também se aposentaram, e juntos
formamos uma empresa de serviços militares secretos privados.
- Mercenários! – Completou novamente de forma direta o velho.
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- Sim, basicamente é isso. Contudo, nosso negócio prosperou e
muito, e começamos a recrutar cada vez mais ex-agentes, e, tornamos uma
empresa global, agindo atualmente em quase todos os países. – Ele
intercalava mentiras com verdades para que o velho não desconfiasse.
- Mas porque você, um dos fundadores desta mega empresa de
mercenários, iria agir em uma operação como está?
- Porque o cliente exigiu que assim fosse feito! – Foi também direto o
chefe, nesta parte não mentindo.
- Quem era seu cliente?
- Eu não tenho acesso a todos os dados dos meus clientes, afinal,
recebo o dinheiro e faço o serviço. Mas este eu decidi antes pesquisar.
- Por quê?
- Simplesmente, porquanto, às informações eram muito precisas,
tinha acesso a dados que somente o governo britânico poderia acessar, e,
como ali trabalhei, sabia desta informação. Assim, decidimos analisar antes,
afinal, somente cumprimos missões para pequenos países, se algum grande
queria nossos serviços poderia ser uma armação para desmantelar nossa
organização.
- Bem pensado. – Concluiu o velho.
- É... Em tese seria fácil, porém cada vez que nos pesquisávamos
aparecia algo muito estranho.
- O que?
- Era como se o cliente estivesse em vários locais ao mesmo tempo,
sempre a mesma voz rouca e gasta agindo em diferentes repartições, ora do
governo, ora de empresas privadas, etc., e concluímos pelos nossos
dispositivos de tecnologia, que não se tratava de um decodificador de voz, nem
nada desta espécie, parece que este sujeito tinha acesso a todos os lugares!
Mas quem poderia ter acessos a todos os lugares?
- Qual era o nome que ele se apresentou?
- Ele disse se chamar Xotono.
O velho foi pego de surpresa, e o chefe soube disso pelo seu olhar
de espanto, um que ele não havia visto deste o momento que a equipe havia
começado a vigiá-lo a mais de três meses atrás.
- Você sabe quem ele é! Não estou certo? – Questionou o chefe
após ter enfatizado a descoberta.
- Sim, sei. Não diria quem, mas o que ele é atualmente!
- Como assim “o que ele é atualmente”? – O chefe retrucou perplexo
pela dubiedade da resposta.
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- Não posso lhe responder tudo, somente lhe garanto que você pode
ser um homem morto mesmo se eu lhe deixar ir. Apenas terá uma chance.
- Qual?
- Se aceitar trabalhar para mim!
Este velho está querendo que eu trabalhe para ele, por isto está
inventando estas histórias... – Pensou logicamente o chefe, antes de tentar
negociar, afinal, era realmente um mercenário e não um homem que os outros
exigiam respeito e companheirismo, quem pagar mais levaria os serviços de
sua agência, só que ele sabia que as pessoas que lhe contrataram eram muito
ricas, afinal, pagaram em barras de ouro, e certamente iriam encontrar outra
agência para fazerem os serviços.
- Quando minha firma ganharia com isto?
- Sua firma eu não sei, mas você ganharia sua vida novamente,
tanto neste momento quanto quando regressasse para seu quartel e
descobrisse que se encontra no centro de uma disputa mundial, que envolve
governos, bilionários, ordens secretas, igrejas e cultos diversos, congregações,
etc., há, e já ia me esquecendo das seitas satânicas onde os principais
membros são os próprios demônios, principalmente, aquele que lhe contratou
a mando de seu chefe maior...
O chefe ficou perplexo, logo pensando:
Ou este velho esta novamente brincando com minha cara, ou ele é
mais louco do que imaginei. Contudo, tenho que prosseguir.
- Você não vai conseguir meus serviços com este jogo. – Tentou
ponderar de uma maneira direta, contudo, sabia lá no fundo que além de suas
opções serem escassas, o velho parecia dizer a verdade, ele mesmo já
presenciou coisas naquele serviço que não pareciam serem deste mundo.
- Não sei se você aceitará cumprir os meus serviços, mas posso lhe
ajudar a sobreviver pelo menos em relação a quando regressar, assim, você
terá noção no que se meteu, e, se for sensato me procurará novamente para
negociarmos. – O velho foi direto.
- Como você tem tanta certeza que é está seita que quer os
pergaminhos? E, ainda, porque quer que minha firma preste os serviços para o
senhor? Logo a firma que tentou lhe matar, não seria mais sensato contratar
outra, afinal, um bilionário com influência no governo poderia inclusive ter
agentes deste próprio para lhe proteger.
- Vou responder primeiramente a última pergunta. Não quero outra
empresa, porquanto, o dono de nenhuma empresa que contratar não saberá
com precisão com quem eles estão lidando, assim, podem me desafiar, o que
não ocorrerá com a sua, porquanto você sabe muito bem o que acontece com
quem me desafia... – Fez uma pausa olhando para o agente dopado ao chão.
- Você não estava falando serio quando disse que...
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- Que iria comê-lo?! Estava sendo o mais sério possível, e, se não
acredita posso lhe fazer um vídeo para lhe provar, contudo, lhe advirto que ele
se autodestruirá após a primeira exibição, porquanto, tenho que manter minha
reputação, e às pessoas não gostam de canibais, mesmo sendo bilionários...
- Então você vai realmente...
- Não! Quer dizer... Pelo menos no momento. Vou aguardar você
retornar com a resposta, afinal, se você for me representar, tenho que reservar
contingente para tanto, mas tenho que lhe dizer que estes homens são bem
fraquinhos... – Fez cara de nojo e cutucou com a sua misteriosa bengala o
homem que ainda estava jogado ao chão como um saco de lixo.
- E sobre está sua arma, ela é um pouco excêntrica não acha?
Afinal, quem a projetou? – Tentou puxar papo o chefe, o qual já se sentia mais
à vontade após aquela conversa.
O velho lhe olhou bem nos olhos, e para sua surpresa não
respondeu, apenas virou-se e saiu andando bem devagar, como se ainda
zombasse dele ao virar as costas provando que não sentia o menor medo.
- E quanto ao corpo de meus homens que ainda se encontram em
sua mansão? – O chefe gritou impaciente.
O velho parou subitamente, virou a cabeça somente um pouco, não
a ponto de olhar diretamente para o chefe, somente queria que ele escutasse
melhor.
- Como lhe falei, tenho fins melhores para eles... E você não está na
posição de fazer nenhuma exigência, afinal, já lhe dei um de seus agentes
medíocres, para completar o que restou vivo. Assim, os mortos terão mais
utilidade comigo, pode ter certeza! – Começou a andar, e antes de sumir
gritou: - E lembre-se que estou aguardando a sua resposta, você tem no
máximo trinta dias para ter ciência no que se meteu, do contrário eu mesmo
vou aniquilar cada membro de sua organização, desta vez não com minhas
próprias mãos, somente porque estou um pouco cansado de tudo isso, assim,
para me livrar deste incomodo vou ter uma conversa com alguns amigos meus
no governo, acho que eles não vão achar nada bom uma empresa como a sua
trabalhar desta forma... – E sumiu no jardim.
O chefe estava boquiaberto, no momento em que entrou naquela
mansão, trouxe os seus mais novos homens, porquanto, tinha convicção de
que o serviço seria tão fácil que era melhor gastar menos em contingente.
Lado outro, naquele momento estava não apenas assustado, mas com um frio
na barriga, realmente aquele velho tinha muita influência, sua firma estaria
aniquilada em questão de dias se ele abrisse a boca, mas algo em seu interior
lhe dizia para confiar naquele senhor.
Após algum tempo o velho entrou em sua mansão, contudo, não se
dirigiu para a sala onde estavam os corpos, lá, sabia que seus sete
empregados de extrema confiança estavam dando cabo à bagunça, iriam
preparar os corpos, estocar a carne em frízeres inseridos em uma cozinha
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secreta na mansão, onde somente era preparada a iguaria que ele mais
apreciava, carne humana...
- Vou tomar um belo banho de banheira, repousar para recobrar
minhas energias, porque hoje tem jantar especial... – Disse para sigo mesmo
até se perdendo nas palavras ao deleitar-se com aquela estranha sensação.
Na sala de reuniões os ditos funcionários trabalhavam sem parar na
limpeza do cômodo, enquanto uma mulher varria, um deles retirava as roupas
dos agentes, afinal, em pouco tempo deveria desossar os mesmos, e tudo
deveria estar preparado quando o chefe retorna-se, por isto eles já se
preparavam para descer e incinerar tudo em uma máquina feita exatamente
para tanto.
Aqueles não eram simples funcionários, eles compartilhavam de
parte da vida do velho, afinal, haviam feito dele o que é hoje. Eram altos e
magros, havia duas mulheres e cinco homens, quatro deles filhos das
mulheres com o mais ancião.
A relação deles com o velho começou há muitos anos, quando o
velho que já era bilionário do setor industrial, e muitíssimo culto, deu início ao
seu sonho de fazer expedições em busca de tesouros perdidos.
Sobre esta história o chefe da operação já estava prestes a
descobrir, porquanto, assim que saiu da propriedade do bilionário arrastando o
seu agente de campo, o qual não havia ainda acordado totalmente, somente
gemia, ele se dirigiu para a casa de seu mentor...
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CAPÍTULO 9
Brasília – Brasil, 1982
O Dr. Salomão estava atordoado, deixou os papéis caírem e tentou
tremendo pegá-los novamente, mais ao agachar não conseguiu se levantar,
porquanto, suas pernas estavam bambas e não conseguia impulsioná-las.
A secretária do arquivo num gesto de solidariedade saiu
apressadamente de trás do balcão e foi tentar ajudá-lo, ele se recompôs
agradecendo a boa vontade da moça.
- Doutor, o senhor esta bem? Quer que eu chame um médico?
Mesmo se encontrando naquele momento em pleno estado de
pânico, ele ainda achou graça naquilo.
Chamar um médico! – Pensou. - Pelo menos ela não havia falado a
mesma frase “o senhor deve estar cansado”, se não eu iria mesmo explodir! Ele concluiu. Mas sabia que no fundo, sua racionalidade clamava mesmo era
por um psiquiatra!
Após conseguir se recompor e pegar o restante dos papéis do chão,
ele se levantou, agradecendo à secretária, e logo lhe perguntando:
- Por acaso, eu posso ficar com estes documentos por alguns
minutos?
- Pelo tempo que o senhor desejar doutor, somente terá que assinar
um protocolo.
Após todos os procedimentos de preenchimento do protocolo, que
para desespero do Doutor era enorme, a secretária liberou os documentos. Ele
sem querer perder tempo, pegou os papéis, agradeceu de uma maneira
rápida, e saiu em disparada pelo corredor.
A pressa era porque ele havia se lembrado que o Dr. Foliver, ou
melhor, seu fantasma, tinha lhe falado que havia rezado junto com a mãe, e
que ela havia se acalmado com aquilo.
Então, rapidamente ele cruzou os corredores do hospital até chegar
a um quarto escuro, onde descansava ainda ligada a alguns aparelhos a
mulher.
Ele então chegou bem perto dela, pegando firmemente em seu
braço, e dizendo serenamente:
- Por favor, acorde... Preciso lhe perguntar algo.
A mãe foi abrindo os olhos verdes e belos, por alguns instantes ele
parou ao ver aqueles olhos tão lindos, que não tinha notado na sala de parto,
então como se estivesse despertando de uma longa eternidade de escuridão a
mãe ao ver que era o Dr. Salomão, lhe perguntou:
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- Doutor, está tudo bem com o meu filho?
- Sim, ele está ótimo, em pouco tempo você já poderá vê-lo, ele
ainda está na incubadora. - Sem se esquivar, respondeu prontamente.
Ela então respirou aliviada, e, após alguns minutos curtindo o alívio
interagiu:
- Então Doutor, a que devo sua inesperada, contudo, tão grata
visita?
Sem querer perder tempo, ele mostrou a pasta com as fotografias.
- Por favor, quero que você se esforce e me diga se lembra deste
senhor?
A mulher então olhou bem para a foto, e não precisou pensar muito
para lembrar-se de onde o conhecia.
- Este senhor, é o que me acalmou na sala de parto, ele pós a mão
em minha barriga, e começou a rezar em uma língua estranha. Após, ele me
falou para ficar calma, que tudo iria sair bem, e que aquilo que estava me
afligindo era muito fraco, e somente uma oração com fé iria adiantar. Então,
após isto começamos a rezar o pai nosso, e tudo foi passando, até que o
senhor chegou à sala, e ele me deu um beijo na testa me dizendo para ser
forte, e foi falar com o senhor. – Ela respondeu sorrindo ao se recordar do
ocorrido.
O Dr. Salomão estava branco, aquilo era muito para sua cabeça
incrédula. Neste momento, vendo como o doutor estava passando mal, a
mulher decidiu perguntar-lhe:
- Doutor, o senhor está bem?
- Sim, estou... Acho que sim, somente preciso descansar! O dia hoje
foi difícil. - Ele respondeu de uma maneira pensativa, como se escolhesse as
palavras.
Logo após tocou um bip, e as caixas de som emitiram um chamado:
“Dr. Salomão, compareça à portaria de forma urgente!”
O Dr. Salomão achou aquilo estranho, porque o seu turno já havia
acabado. E, ainda, tinha o fato de que aquela voz não era da Suzana, a moça
encarregada de chamar os médicos. Bem como, Janice havia dito que o som
não estava funcionando... Mas decidiu atender ao chamado.
Antes de sair, decidiu falar uma última coisa para a mãe, a qual ele
aquela altura julgou conveniente:
- Sei que não sou seu parente, mais acho que você deveria colocar o
nome dele de Marcos, uma certa amiga me falou que ele estará melhor com
este nome.
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Ela sorriu, e lhe respondeu alegremente:
- É mesmo Doutor você também acha?
Ele ficou sem entender, será que aquela mulher havia falado com ela
também?
A mãe, então vendo que ele não entendia nada, lhe disse
calmamente:
- Venho tendo diversos sonhos, com o meu filho já velho, e sempre
lhe chamo de Marcos, e muito raramente no sonho está uma senhora negra
que me fala para ser forte, e que ele será mais forte com este nome. Eu estava
um pouco confusa, se colocaria este nome mesmo sabendo que meu marido
não gosta dele, mas já que até o senhor acha bonito, vou colocar, afinal de
contas, se não fosse pelo senhor acho que nem estaria aqui...
Ele sorriu, acenou para ela, e lhe desejou uma boa sorte, saindo do
quarto. Mal sabendo que quem realmente precisaria de sorte seria ele...
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CAPÍTULO 10
Londres – Inglaterra, 1982
O chefe da operação chegou rapidamente à casa de seu mentor, o
qual já era um senhor que contava com quase noventa anos, mas exibia um
físico ainda dos seus tempos de espionagem. Ele havia feito trabalhos
incríveis, não trabalhava para um ou outro governo, mas para vários. Diziam
que ele já havia de alguma forma trabalhado para todas às agências de
inteligências do mundo, e foi quem havia fundado a empresa de espionagem
Snipes Deltas, da qual ele agora sentia a honra de chefiar desde a
incumbência recebida do ancião há quinze anos.
- Charles?! Seu lobo magricela, venha rápido para cá que já estou
lhe vendo. – Gritou uma voz grave e rude assim que o chefe pôs os pés para
dentro da residência do ancião. Ele tinha a chave, mas o que lhe assustou
mais foi ouvir o seu nome, afinal, na agência era regra que todos deveriam ter
codinomes, e o dele denotava seu cargo “chefe”, e como não tinha família nem
amigos, era raro alguém chamá-lo pelo nome.
Contudo, o que mais lhe intrigou ao adentrar na residência, foi à
rapidez com que o velho descobriu sua chegada. Parece que ele ainda
mantém o ritmo frenético dos tempos de espionagem. – Pensou Charles em
primeiro momento sorrindo, já se dirigindo para a sala.
Ao adentrar avistou a mesma imagem de sempre, um ancião enxuto,
sentado em sua poltrona, com seu inseparável charuto na mão esquerda, o
qual ele sabia que ali se encontrava somente para manter o hábito, e, para o
velho cheirar, visto que ele estava terminantemente proibido de fumá-lo por
ordens médicas, as quais ele sempre seguiu a risca.
- Frederick, parece que o senhor não perdeu o tino e a astúcia de
perceber a presença de estranhos. Está de parabéns. – Disse Charles sorrindo
pegando na mão do ancião, o qual era a única pessoa que ele tinha maior
familiaridade na vida.
- Quando se é um agente nunca perdemos a astúcia adquirida em
anos de treinamento, quando isto ocorrer você pode se considerar um homem
morto. Mas tenho que admitir que você facilitou às coisas, suas passadas são
como elefantes chegando, e você vira o trinco da porta como um bêbado
chegando em casa não querendo acordar a esposa que imagina estar sendo
sútil, mas o barulho é inevitável. – Respondeu o velho sorrindo e beijando a
mão do rapaz em sinal de carinho.
O beijo na mão demonstrava não apenas carinho do velho com
Charles, mais a afeição que ambos tinham pelo outro, principalmente para
Charles, porquanto, este era seu único contato com uma figura que ele
considerava familiar, visto que cresceu em um orfanato, até que Frederick o
adotou quando tinha quase quinze anos, retirando-o da instituição onde ele foi
enviado quando contava apenas com cinco anos, após a morte de sua mãe
que era uma prostituta russa. Mas o velho não levou-o para sua casa para
morar com sua família, ou melhor dizendo, sua principal família, visto que ele
tinha algumas em países diversos. Ao invés disto Charles foi enviado
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diretamente para sua empresa, e foi treinado pelos melhores agentes do
mundo os quais já estavam aposentados de seus trabalhos, tendo em vista
que a empresa era dotada em sua grande essência destes agentes, escolhidos
a dedo por Frederick que comandava tudo com mãos de ferro até poucos
anos, quando sua saúde se debilitou, e ele se afastou pela primeira vez na
vida de suas ocupações, não por ele, mas a pedido de sua única filha que era
conhecida por Charles, a qual ele tinha extremo carinho e consideração, e
achava que era o momento de passar mais tempo com ela.
Para espanto de Charles, foi ele o escolhido para assumir a chefia
da organização, ao passo que, quando questionou o velho sobre a escolha
somente ouviu um xingamento e uma explicação proferida por um louco em
uma reunião em que estavam presentes os principais lideres da agência, todos
agentes reformados com alta experiência no que faziam de melhor, espionar e
matar, e isto eles souberam repassar para Charles, e ele ainda se lembrava de
cada palavra proferida naquele dia:
“Você é um retardado mesmo! Afinal, foi criado nesta agência
unicamente para ser fruto desta empresa, ou seja, de nenhum governo, não
tem família mesmo depois de velho, o que eu considero um pouco excêntrico,
devido ao fato de eu adorar ter família, por isto tenho várias pelo mundo.
Cresceu e fica o tempo todo que dispõe sozinho e nem por isto tem menos
determinação. Passou por todos os testes físicos e mentais elaborados pelas
melhores agências de inteligência. Torrou da agência milhões em
investimentos em lhe proporcionar os melhores estudos que uma pessoa
poderia ter. E, ainda, depois disso tudo questiona minha ordem? Você
realmente é um idiota! Mas é o meu idiota, e por isto vai comandar está firma
como se fosse sua. Mesmo sabendo que você é um viadinho, e que é por isto
que não forma uma família.”
Charles ainda lembrou-se dos sorrisos dos agentes na sala, os quais
queriam mesmo era soltar gargalhadas, mas não o fizeram por respeito ao
novo chefe, ao passo que, mesmo após estes dizeres nada convencionais
para a ocasião, todos ali o respeitavam bastante, e entendiam que o velho era
louco daquela forma, e não tinha jeito de mudar aquela altura da vida, mais
sabia do que estava fazendo.
Às vezes Charles sonhava que o velho era seu verdadeiro pai,
porquanto, o admirava muito, por isto comandava a firma como se fosse sua
família, a qual não formava não por ser homossexual como pensava
preconceituosamente o Frederick, afinal, se o fosse ainda poderia ter uma
família, só que diferente, mas sua decisão foi baseada em um trauma, ele na
realidade não queria ver um filho seu ser criado em um orfanato se ele
morresse, talvez até sem conhecê-lo, como achava que o fora com seu pai.
Mas nunca havia falado isto para o velho, deixava que ele pensasse o que
quisesse.
- Não tenho como lutar com seus instintos. – Respondeu Charles
sorrindo e sentando-se em uma cadeira bem próxima à Frederick, não queria
que Sandy, sua irmã de consideração, ouvisse nada, afinal, ela não tinha
conhecimento dos negócios do pai.
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- Mas o que é que o trás para está humilde residência? Sei que não
é para trazer dinheiro, tenho certeza... Então, só restam problemas... – Disse o
velho novamente em tom de brincadeira.
Realmente não era dinheiro, se o fosse não dava para trazê-lo nas
mãos, pelo menos em espécie, afinal, o velho havia faturado milhões somente
no ano anterior, o negócio dava lucros, principalmente, após Charles assumir e
aplicar suas técnicas de gestão e outras que fizeram os negócios
deslancharem ainda mais.
- Vou ser direto como o senhor gosta. O que me diz do bilionário
Arthur Meninguer Urrior?
Frederick fez cara feia, o que assustou Charles que não esperava
aquela reação, a qual nunca tinha visto antes.
- O que tem ele para lhe deixar desta forma? – Tornou a questionar
Charles.
- Você fez uma pesquisa a fundo de campo antes de aceitar o
serviço em que este velho encontra-se metido? – A resposta veio em tom de
questionamento, o que deixou Charles ainda mais apreensivo em dar a
resposta.
- Sim... – Fez uma pequena pausa pensando na melhor maneira de
dizer aquilo. – Quer dizer, eu deleguei isto para o novo setor que cuida desta
área.
O velho ficou ainda mais possesso com a resposta, e Charles sabia
os motivos, antes de sair da firma ele falou que tudo poderia mudar, menos
que o chefe da operação não cuidasse pessoalmente das pesquisas, por isto
ele bradou o que já havia concluído há anos:
- Não lhe falei seu idiota, que isto não iria funcionar! Quando o chefe
de uma missão sai para cumpri-la ele tem que saber tudo, absolutamente tudo
sobre seu alvo. E isto não se delega, afinal, mesmo sendo os melhores
agentes de inteligência a cumprir o serviço, não serão eles que vão arriscar
suas vidas, assim, nunca o serviço sai perfeito. Demorou muito para isto
acontecer!
- E tem mais... – Charles escolheu as palavras, afinal, se já estava
tudo ruim decidiu contar tudo, assim, a bronca seria rápida.
- Mais? Você diz mais? Eu sei que vocês erraram, isto já é o
bastante! – Esbravejou o velho agora chegando perto do rosto de Charles, tão
alto e tão eufórico que ele chegava a babar.
- Não fale assim tão alto, afinal a Sandy pode escutar. – Tentou
acalmá-lo. Contudo, sem qualquer sucesso.
- Pode ficar tranquilo seu idiota, porque ela saiu para fazer compras,
e, dizia ela que para ver aquele verme de seu noivo.
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- Noivo?! – Charles falou mais alto do que queria, deixando
transparecer o que escondeu por anos, seu eterno amor por Sandy.
Não precisava ser treinado para perceber aquela reação, e para
desgraça de Charles, Frederick era um senhor ainda na ativa, e percebeu
rapidamente seus sentimentos contidos naquele pequeno questionamento.
Então este idiota realmente não é gay como pensei... Ele sempre
esteve apaixonado por Sandy, como não pude notar isto? Afinal, ele sempre foi
muito reservado, mas isto durante todos estes anos eu teria notado até mesmo
pelo olhar... – Raciocinava o velho agora somente andando pela sala perdido
em seus pensamentos que lhe assombraram com aquilo mais do que o erro
com o velho Arthur, afinal, era muito mais grave o fato de Charles estar
apaixonado por sua filha do que qualquer erro que poderia ser consertado. –
Será que conto para ele algumas verdades neste momento, mas isto poderia
colocar tudo a perder... Não tenho escolha, vou ter que dissimular.
- Sim noivo, e o que você tem com isto? – Esbravejou tentando
demonstrar que não havia sequer pensado em nada.
- Desculpe senhor, é porque Sandy nunca havia me falado de
nenhum namorado, e...
- E o que? Não sabia que ela era sua confidente? Bem como, os
veadinhos são confidentes das meninas, mas disto eu desconhecia. – Tornou
a esbravejar, agora sendo mais duro, chegando a ser cruel, tentando colocar
um ponto final naquele diálogo.
- Certo senhor, me desculpe...
- Eu é que peço desculpas, fiquei muito nervoso com o caso
envolvendo Arthur e descontei em você, sei que são amigos desde que lhe
apresentei, somente quero que saiba que não deverão passar disto, correto? –
Ponderou o velho olhando bem no fundo de seus olhos.
- Lógico senhor. – A resposta foi seca, mas em alto e bom tom,
como um soldado ao seu capitão.
- Já que quer falar em lógica, porque não passamos ao fato de você
ter me incomodado para saber a respeito daquele velho louco e excêntrico do
Arthur. – Tentou Frederick retomar a conversa anterior e esquecer de vez a
outra.
- Sim senhor, eu queria saber por que meus homens, ou melhor,
nossos homens nada encontraram sobre este velho ser... digamos... uma
máquina de matar!
- Somente para deixar claro, são seus homens agora. – Disse o
velho voltando a sentar-se em sua poltrona, gostava muito de contar histórias,
e a de Arthur era uma para contar sentado.
Lógico, quando erram são meus homens, se tivessem acertado eram
dele. – Pensou Charles mordendo os dentes de raiva com a escusa do velho
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em admitir que ele cuidava muito bem da firma, mais falou, logicamente, outra
coisa:
- Os agentes pesquisaram e encontraram envolvimento com o
governo britânico, entendemos que iriamos fazer o trabalho e plantar a culpa
neste envolvimento, para deixar uma bomba estourar no colo da rainha.
- Você está louco! – O velho respondeu furioso se levantando
novamente impulsionado por sua nova raiva com o que tornou a ouvir.
- Mas o que é que tem de errado? Afinal a pesquisa não mostrou
nada de mais, além do envolvimento dele com o governo e, por óbvio, ser um
bilionário meio excêntrico, o qual tudo indica está somente ligado com
expedições para encontrar tesouros perdidos, etc...
- Está bem ai o cerne da questão! – Interveio o velho agora andando
de um lado para o outro, com ajuda de sua bengala.
Charles teve agora a convicção de que tinha feito coisa muito errada,
afinal, não viu aquele senhor daquela forma nem quando um de seus agentes
matou um presidente Africano por engano, e, levou quase sua firma a ser
fechada por uma operação do governo.
- Na primeira expedição que este velho fez, ele não foi para
brincadeira, simplesmente contratou os melhores.
- Isto já era esperado que ele iria contratar os melhores para lhe
acompanhar e fazer o serviço... – Charles interrompeu fazendo cara de nojo,
se assustando quando Frederick lhe interrompeu.
- Espere meu caro Charles, afinal, quem lhe disse que ele contratou
os melhores para lhe acompanhar nas expedições?
- Se não é, então é para que?
- Ele é um velho mais excêntrico do que você imagina... Ele
simplesmente contratou os melhores para lhe treinar, segundo minhas
informações ele treinou por quase dois anos arduamente somente para
adquirir experiência. E isto aliado a sua extrema inteligência e sabedoria, não
apenas de vida, mas lógico de conhecimento lhe tornaram, segundo pessoas
próximas a mim, em um dos melhores em seu ramo.
- Mas qual é este ramo? Achei ser somente um passa tempo.
- Passa tempo são para os fracos meu caro Charles, este velho
nunca foi disto e nunca o será, ele se aposentou de suas empresas após abrir
o capital de todas elas, assim, ele ficou durante toda uma vida seguindo outro
sonho, ser uma espécie de Indiana Jones.
- Você deve estar de brincadeira. – Charles achou até graça daquilo,
parecia que estavam falando de uma criança brincando e tendo sonhos bestas.
- Não estou, e você mesmo pode me confirmar isto, não é? – O
velho foi ríspido, acertando direto no ponto.
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Charles ficou mudo, realmente não havia parado para pensar que
aquele velho era uma espécie quase que saída da ficção, afinal, eles estavam
com a missão de pegar pergaminhos antigos em seu poder, e, a forma como
ele defendeu isto foi digna de um super-herói, meio louco, mas um ser
realmente com poderes. Por isto teve que admitir:
- Vejo que está certo, ele realmente é muito bem treinado.
- E você não sabe nem da metade. Dizem que em sua primeira
expedição, ele encontrou um tesouro Maia perdido há milênios, do qual os
melhores pesquisadores já haviam dito se tratar somente de uma lenda.
- Será este os pergaminhos que estávamos com a incumbência de...
- Não se precipite meu caro Charles, ele já fez inúmeras
descobertas, todas muito ocultas, o que tenho que admitir, mas após está
primeira dizem que ele descobriu segredos que foram vendidos por bilhões de
dólares diretamente para o vaticano, porquanto, segundo me informei este
segredo poderia abalar os alicerces daquela instituição. – Interveio o velho
antes que ele terminasse de falar.
- Credo, ele é realmente tudo isto? – Charles estava perplexo.
- E muito mais. Dizem que em sua segunda expedição, os veículos
foram parados pela tribo de sete pessoas que com ele ainda vivem, era uma
tribo de beduínos, os quais queriam fazer-lhes reféns para exigir resgates.
Para espanto do chefe da tribo, o velho não titubeou, parecia que ele
realmente queria ficar ali entre eles. O Xeque da tribo, por óbvio, achou aquilo
muito estranho, ainda mais quando recebeu uma informação de que ele era
um bilionário, o que já dava para perceber devido as suas vestimentas e estilo,
e, principalmente, pelos veículos daquela expedição. Até certo ponto o Xeque
deixou que ele ficasse, mas após algum tempo ele teria exigido que ele falasse
diretamente com os dirigentes de seus empreendimentos para pagarem o
resgate. Segundo dizem, Arthur pagou o resgate e mais uma parcela, mas não
para ser libertado, ao contrário, fez questão de ali permanecer e descobrir um
segredo daquele povo. Alguns dizem que ele se deixou capturar, e estava
realmente em expedição unicamente para descobrir tal segredo, eu sou um
dos que acredita nisto.
- Mas o que seria que beduínos poderiam ter de tão valioso? –
Charles ficou intrigado.
- Dizem não ser material, segundo informações ele queria apreender
um ritual muito antigo, o qual serviria para ele conjurar seres utilizando um
outro achado seu no Egito.
- Credo, ele então é muito mais louco do que pensava.
- Louco é pouco. Dizem que ele ficou com estes beduínos por mais
de um ano, e quando de lá saiu, levou consigo o Xeque, e uma mulher por
quem ele se apaixonou, a qual, segundo informação, já gerou filhos, os quais
ele esconde da mídia.
- Mas e o restante da tribo.
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- Toda aniquilada... – Frederick concluiu fazendo ao fim um tom de
mistério.
- Nossa, isto é muito doido. – Charles teve que admitir.
- É, está é a versão que eu mais me interessei. – O velho disse já se
sentando novamente, estava ainda eufórico com a história, mas suas pernas
não aguentavam mais um segundo.
- Como assim versão? – Questionou indignado Charles. Afinal,
queria algo concreto, não uma versão.
- Isto mesmo, somente uma versão, segundo alguns de meus
melhores homens, que se interessaram pela história dele, as lendas em volta
dele se formaram de todos os cantos no mundo da espionagem,
principalmente por governos, os quais estavam de olho em seus achados,
especialmente aqueles em que os mesmos eram encontrados, afinal, eles
queriam uma parte.
- Mas qual você acha que é a mais correta das informações? –
Charles queria ir direto ao ponto.
- Gosto mais daquela que lhe contei, mas tudo indica que ele foi
treinado por estes beduínos para conjurar mesmo um certo feitiço, etc., e, após
o Xeque queria sacrificar uma jovem somente porque ela estava apaixonada
por um sujeito viúvo, o que era proibido, porquanto, ela estava reservada para
o filho do Xeque.
- Mas o que ele fez? – Charles queria saber rapidamente, era um
sujeito calmo, mas àquele ponto estava curioso.
- Segundo informações ele na calada da noite, pegou todo o restante
de seu dinheiro na cabana do Xeque, matou ele e fugiu com a moça e o velho,
os quais segundo informações hoje são empregados em sua mansão, e teriam
tido filhos, etc. Mas tenho que admitir que esta história também é um pouco
interessante.
- Por quê?
- Simplesmente porquanto dizem que ele não apenas matou o
Xeque, mas fez questão de comer sua carne, segundo dizem, para roubar sua
alma, essência ou sabedoria, coisa deste tipo, ritual que ele teria apreendido
na tribo, e, poderia até ser a razão para ele ali estar.
Charles esfriou-se com aquele final, afinal, tinha a convicção de que
aquela história era a verdadeira, confirmada pelo próprio Arthur, um verdadeiro
canibal...
- Mas quero que saiba Charles, que independente destas histórias,
ele é um senhor muito perigoso, dizem que ele tem governos em suas mãos, o
que eu tenho quase que certeza, e, segundo informações certas, ele está
metido inclusive com seitas e outras parafernálias do mal, alguns dizem que
ele é do bem, mas eu acho que ele é do mau e pronto.
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- Como assim seitas?
- Alguns diziam que ele estava metido com a maçonaria, outros
dizem que ele era mais além, de uma ordem secreta legada diretamente dos
templários, outros que ele é um satanista, já outros que ele tem laços estreitos
com a igreja católica. Enfim, tudo é muito nebuloso com este senhor. Mas uma
coisa eu lhe garanto, todos com quem ele negocia saíram muito satisfeitos,
dizem que ele cumpre com afinco sua palavra, e, segundo um amigo meu do
governo americano e outro do governo russo, ele ajudou pessoalmente a
acabar com a guerra fria, ou seja, alguns o idolatram como ídolo.
- Muito obrigado Frederick, sua ajuda foi muito útil. – Charles foi se
levantando, afinal, já havia obtido a informação que havia buscado, e tinha
agora a confirmação de que era melhor tomar cuidado com o velho Arthur, mas
que era mais sensato trabalhar com ele do que contra ele...
- Mas você não vai me contar o que aconteceu na missão ou qual
caminho vai seguir? – Frederick ficou desapontado, por alguns minutos estava
contente em retornar a ativa e poder ajudar.
- Não meu amigo, você já ajudou muito. E também tem o fato de ser
o meu problema e meus homens como o senhor mesmo falou. – Alfinetou ao
final.
- É, mas eu ainda tenho o jeito. – O velho gritou devido ao fato de
Charles já estar cruzando à saída da sala já em direção à porta de saída.
Nunca se despedia, entendia que despedidas eram algo fúnebre, ele gostava
de cumprimentar na chegada, e na saída somente se retirava.
- Sim meu amigo, você ainda tem o jeito... – Respondeu ao longe já
saindo pela porta, e pensando:
Seu velho sacana, acha que eu não percebi que você mandou
instalar equipamentos de segurança novos que detectam a presença de
pessoas adentrando na residência, e transmite as imagens para a televisão,
celulares, etc., assim, ele soube quem chegara... Seu tino ainda parecia estar
bom, mas para outras coisas...
Após Charles se retirar, Frederick sorriu, sabia que ele havia notado
o sistema de alarme. – Ele é realmente muito especial, mesmo percebendo o
sistema deixou que eu pensasse que estava ainda na ativa. – Falou consigo
mesmo já discando o telefone, após uma pequena espera ele falou após seu
interlocutor atender do outro lado da linha:
- E ai Arthur, como vai este velho louco? – Fez uma pausa
aguardando o interlocutor responder, e então concluiu com satisfação: - Sim,
sim, minha firma vai representá-lo, ele acabou de sair, e já contei sua história.
– Mais uma pausa e uma gargalhada. – Claro que a verdadeira por último,
afinal, eu não gosto muito dela...
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CAPÍTULO 11
Brasília – Brasil, 1982
Ao chegar à recepção, o Dr. Salomão levou um susto ao saber que
ninguém o havia chamado, sem entender nada, ainda tentou argumentar com
a recepcionista:
- Mais eu ouvi uma voz me chamando pelas caixas de som! Até
achei estranho, pois não era sua voz, e meu turno já havia acabado, mas
mesmo assim resolvi atender.
A recepcionista com cara de poucos amigos, apenas balançou os
ombros como quem não sabia e não queria saber de nada, e sequer o que o
Doutor estava falando, ainda arrematando:
- Se não acredita em mim, tente falar neste som velho, ele sequer
esta funcionando! Estragou bem na hora em que fui chamar um médico a
pedido da Janice, e pelo o que ela me disse era a pedido do senhor, então...
A recepcionista foi interrompida, porquanto, naquele momento
subitamente as caixas de som começaram a emitir um barulho muito estranho,
como se estivessem rangendo, com isto o Dr. Salomão virou-se para ela, que
naquele momento já apresentava outra cara, desta vez de espanto.
De repente pela porta adentrou um rapaz inexplicavelmente todo
coberto de sangue, dos pés à cabeça, clamando:
- Me ajudem!! Por favor, me ajudem!!!
Ao ver a cena o Dr. Salomão prontamente correu para ajudá-lo.
Ao chegar perto do rapaz e pegar o seu braço, ele se assustou. Com
um olhar penetrante, o sujeito foi olhando dentro dos olhos do doutor, como se
estivesse o hipnotizando, e foi chegando cada vez mais perto de seu rosto, até
encostar os lábios frios cobertos de sangue na orelha direita do mesmo, lhe
dizendo com uma voz totalmente diferente de um ser humano, como se aquele
homem estivesse com o pior dos demônios em seu corpo:
- Sua hora chegou... Você interferiu demais nos nossos planos, e
deixou que eles influenciassem no destino de todos novamente, mas eu estou
aqui para fazer justiça, porque sou seu maior pesadelo Cosme...
O doutor começou a tremer, não conseguia parar em pé, e foi
caindo, quando de repente o homem lhe segurou com uma força incomum, e
falou novamente:
- Está com medo doutor? Onde estão eles agora para lhe guiar?
Saiba que eles são assim, somente intervindo aonde lhes interessa! Não
pensam nos homens, e lhes tratam como marionetes. E ele! Aquele que eles
rezam e vangloriam... - o homem parou e soltou um grande sorriso com
mistura de ódio. – ele os tem como mascotes!! Por isto eu estou aqui, porque
meu mestre voltou, e agora vamos tomar o que nos é de direito...
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Após estas palavras, o doutor já não escutava mais nada, estava em
completo transe. Suas mãos e pés estavam todos no ar, e seu peito estava
coberto de sangue, que ele sabia que não era do homem à sua frente, e sim
dele, uma vez que podia sentir seu peito queimar de dor.
Ao olhar para baixo, o doutor pôde ver o que estava lhe perfurando.
Era um punhal, que o homem lentamente enfiava cada vez mais em seu peito,
no objetivo único de lhe causar a maior quantidade de dor! Quando o doutor já
havia se entregado para a morte, pôde então sentir que por atrás dele vinha
uma voz linda, bela, maravilhosa, que dizia num tom bem baixo:
- Você voltou Xotono?... Ainda está seguindo seu mestre, aquele
fraco? E vejo que está ainda se aproveitando de digamos: “lixo humano” para
seus fins! Mas não ira muito adiante, como de costume...
Ao ouvir isto, o homem ensanguentado soltou o Dr. Salomão,
retirando rapidamente o punhal e se virou para aquilo que estava falando.
O doutor pôde ver quem estava discorrendo, era um homem
extremamente alto, totalmente incomum para um ser humano, devia medir
certamente mais de três metros de altura. Vestia uma túnica branca, e
sandálias amarradas aos pés. Seu cabelo era dourado como ouro, e seu rosto
branco como neve, ao ponto que sua pele chegava a brilhar!
O homem ensanguentado num gesto de fúria rapidamente correu em
direção ao ser maravilhoso que lhe afligia e lhe caçoava, dizendo numa voz
raivosa:
- Você acha que tem o poder?! Pois saiba que estamos mais do que
preparados para a luta final, e isso eu vou lhe mostrar!!!
Antes mesmo de seu agressor chegar perto, aquilo que até aquele
momento estava com um rosto e voz serenos, se transformou... Sua voz foi
ficando grossa e forte, e em um ensurdecedor grito ele modificou-se! Seu rosto
se fechou em uma cara de ódio, as pupilas foram sumindo, e os olhos
começaram a faiscar luzes, duas asas enormes se abriram em suas largas
costas, não brancas, mas cinzas como chumbo! E, com a mão direita aquele
ser pegou uma espada brilhante como diamante que se encontrava entre suas
asas, e com a mão esquerda retirou da cintura uma garrafa de vidro.
As asas se abriram ainda mais, como se estivessem dilatando das
costas, e bateram como uma águia, ao passo que seu corpo foi se erguendo
rapidamente... Quando o Arcanjo sentiu que seu oponente se encontrava bem
perto, retirou a rolha da garrafa com os dentes que estavam afiados como os
de um leão, e arremessou o líquido que ali continha em sua direção, ao passo
que ao recebê-lo na pele o homem ensanguentado parou de correr, caindo ao
chão imediatamente, soltando uma fumaça esbranquiçada, como se aquele
líquido fosse um ácido corrosivo...
O homem então gritou como se estivessem lhe retirando à pele,
enquanto muita fumaça ainda saia de seu corpo, e numa voz gasta proferiu
com misto de fúria e dor:
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- Gabriel! Vocês são fracos mesmo! Não conseguem nem lutar...
Tem que jogar água benta!!!
Sem responder o Arcanjo somente abaixou a espada e começou a
rezar:
- Senhor! Livrai das garras do mau este seu servo, ele não sabia o
que estava fazendo no momento em que foi possuído por este ser maligno!
Portanto, não merece ter tamanha atrocidade em seu corpo material, lhe dê
outra chance! Em nome do pai, do filho e do divino espírito santo! Amém...
Ao dizer estas palavras o Arcanjo levantou a espada e esperou pelo
pior, contudo, o homem ensanguentado parou, e falou no mesmo tom
diabólico:
- Você pode estar certo! Não estamos ainda com o poder em nossas
mãos para eu lhe enfrentar! Mas saiba que da mesma forma que meu mestre
conseguiu acabar com sua companheira, vamos acabar com você e com todos
de sua espécie medíocre e escrava daquele conselho patético que acata
ordens de quem não vê! Nosso rebanho esta aumentando, e o deles
diminuindo...
Ao pronunciar estas palavras o homem ensanguentado soltou um
grito de dor, se remexendo no chão, e uma fumaça cinza saiu de seu umbigo.
Em segundos o jovem começou a olhar com outra expressão, agora com
espanto, havia retomado o poder sobre seu corpo, mas ele sentia-se mal, não
acreditava no que acabara de fazer. - Eu matei um homem... – ele disse
baixinho, antes de desmaiar de dor e falta de sangue.
Na porta encontrava-se uma figura horripilante, que antes de sair
pela noite, virou-se para Gabriel proferindo em uma voz tenebrosa:
- Sua hora ainda chegará, você pode até ser mais forte do que eu,
mas saiba que meu mestre voltou, e seu rebanho ira vencer no final!
- Estarei esperando Xotono! Você sabe que não tenho ainda
permissão para acabar com você! Mas assim que tiver, certamente será o seu
fim, e vingarei o pedaço de mim retirado por vocês!... – Respondeu Gabriel em
um tom ainda mais ameaçador, nada comum ao que lhe atribui às imagens e
relatos primitivos.
Ao acabar de dizer estas palavras, Gabriel virou-se, indo de encontro
ao homem ao qual Xotono havia desencarnado, sem nenhum medo de que o
demônio pudesse lhe atacar pelas costas.
Xotono, com ódio, e olhando como se aquela cena fosse a mais
humilhante, somente se virou e sumiu na escuridão da rua, levando consigo o
punhal e procurando pelo apoio de mais pessoas que pudesse encarnar, o que
era mais do que fácil, uma vez que ali se encontrava a maioria das boates e
bordeis da região, um lugar perfeito para encontrar alguém em total
desequilíbrio espiritual e suscetível para o ato de possessão...
Ao chegar até o jovem ensanguentado que havia atacado o Dr.
Salomão, o Arcanjo já estava com outra feição, não tinha mais a cara
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demoníaca que apresentava quando pairava no ar em ataque, seus dentes
estavam normais, e suas asas estavam se recolhendo, teve pena, e
pronunciou somente algumas palavras ao jovem:
- Pobres são os jovens... Não sabem o que estão fazendo com suas
vidas, creem que estão vivendo no limite da alegria, mas estão é morrendo no
limite da angústia da alma...
Após passar pelo jovem que ainda permanecia deitado ao chão,
agora com uma grande convulsão, o Arcanjo foi andando em direção ao
Doutor Salomão. Sua face já havia voltado novamente ao estado sereno inicial,
e suas grandes asas haviam se encolhido totalmente, tornando-se quase
imperceptível em suas largas costas.
O Dr. Salomão se encontrava perplexo com tudo aquilo que havia
presenciado. Foi quando o Arcanjo, vendo sua expressão de espanto e medo,
chegou bem perto de seu ouvido falando:
- Pronto Cosme, sua missão terminou...
O Doutor Salomão ficou sem entender, ele não estava tão mal assim
a ponto de morrer, ainda mais seu nome não era Cosme, e por ser médico,
sabia o que era grave, o hospital poderia muito bem salvá-lo.
Foi quando Gabriel vendo a surpresa do Doutor chegou perto de seu
ouvido esquerdo e novamente falou:
- Está na hora companheiro, sua missão esta cumprida, pode se
levantar...
Ao dizer estas palavras, a dor foi sumindo de seu peito, e o Doutor
Salomão olhou para seu umbigo o qual foi se iluminando, após este fato ele
somente começou a se mexer suavemente, começando a se levantar sentindo
como se estivesse levitando...
Contudo à medida que se levantava, pôde perceber algo abaixo
dele, ao olhar, percebeu que seu corpo permanecia ali deitado, e o umbigo
continuava brilhando. Vendo sua cara de espanto, Gabriel lhe mencionou para
ficar calmo e tentar sintonizar os pensamentos na razão que em breve se
lembraria de tudo.
Mesmo agora a contra gosto, sua alma se levantava serenamente, a
luz no umbigo começou a ceder, e agora a mesma emanava de todo seu
corpo, como se aquela carcaça estivesse perdendo tudo de mais importante
que continha. O que na realidade era o que estava acontecendo...
Após ele terminar de desencarnar, o Arcanjo abraçou o doutor
fortemente e falou com alegria:
- Cosme, como foi mais está passagem pela terra?
O espírito do doutor parecia bastante cansado, e era grande, do
tamanho do arcanjo, nisto o doutor somente olhou para Gabriel e falou de uma
maneira serena e de fala difícil:
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- Ótimo meu amigo... Somente havia me esquecido como isto era
difícil no final, ao não lembrarmos de nada, esquecemos quem somos e a
tentação aqui é extrema... Contudo graças aos Criadores, tudo correu bem. –
Fez uma pausa para colocar ainda mais os pensamentos em ordem. – Quase
tudo, achei estranho não ter quebrado a barreira cerebral! Mais depois
discutimos isso... Como está Damião?
Gabriel olhou novamente para ele, decidindo somente falar:
- A sua espera amigo, a sua espera... Todos estão mais do que
contentes pelo seu grande sucesso! Mas uma vez sabemos que os Criadores
compreendem mais do que ninguém o que fazem, e quando o Conselho
Supremo lhe enviou, todos duvidaram de sua adaptação após tantos anos sem
voltar, isto provou que eles ainda podem fazer muito mais pelo próximo sem se
render às tentações, e que o futuro depende dos instruídos...
Após dizer estas palavras, o Arcanjo abraçou bem forte o doutor, e
uma forte luz emanou entre eles, formando um cilindro, um grande cilindro de
luz que subia cada vez mais enquanto eles levitavam, e tudo ficou brilhante,
onde somente olhos espirituais poderiam ver...
Gabriel abriu suas asas, e planou sobre a luz, e à medida que
subiam, iam desaparecendo, onde certamente estavam cruzando a passagem,
em uma viagem que todos desejam e merecem fazer, quando estiverem
prontos...
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CAPÍTULO 12
Londres – Inglaterra, 1982
Charles havia acabado de chegar à firma, mandou que todos
saíssem da sala de reunião, queria ficar só. Ele tinha um grande escritório
pessoal, mas gostava de tomar as decisões mais importantes ali, dizia para si
mesmo que se sentia naquele local muito mais a vontade, querendo esconder
a realidade, a qual era uma só: Ele viu tanto o velho Frederick tomar decisões
naquela sala, que sentia como se ali fosse seu refúgio, onde ele sempre
poderia contar pelo menos com a visão do amigo.
Creio que o melhor mesmo será aceitar a oferta de Arthur. –
Pensava, enquanto olhava a pasta do caso. Estava realmente convencido que
apesar de perigoso, era melhor seguir seus instintos, afinal, ele nada sabia
sobre as pessoas que o contrataram, e, segundo um levantamento da firma,
eles pareciam estarem ligados com o governo, o que dificultava muito as
coisas.
Acessou a internet e em poucos minutos já havia estornado os
valores para a mesma conta que o pagou. Em poucos minutos o seu telefone
particular tocou e ele atendeu com firmeza, já sabendo o que o esperava.
- O que significa aquele estorno para a minha conta? – Seu
interlocutor falou com indignação, era a mesma voz rouca e estranha.
Charles pensou um pouco, sua firma nunca havia feito isso, mas era
preciso, assim não mais hesitou:
- Você notou que ele está atualizado com juros maiores do que os
legais? E, ainda, contém um acréscimo para cobrir taxas de transferência e
demais?
- Notei! Contudo, estava esperando era o cumprimento da tarefa,
não a devolução do pagamento. – A resposta foi suave e em tom quase que de
ameaça.
- Não foi possível concluir o serviço, suas informações estavam
erradas, o velho matou todos os meus agentes, e escapei por pouco. – Mentiu,
não queria que eles soubessem que um dos agentes sobreviveu.
- Está me dizendo que um velho moribundo que segundo me consta
não tem sequer seguranças matou todos os seus agentes?
- Sim. – A resposta veio seca.
- Como você deixou isto acontecer?
Charles se enfureceu:
- Eu deixei acontecer?! Escuta seu idiota, vocês me pagaram para
fazer um serviço fechado, ou seja, vocês iriam fornecer todos os dados e
documentação, tanto de segurança, localização, enfim, tudo. Nunca lhe falei,
mas notei que os dados foram obtidos pelo serviço de inteligência do governo
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britânico, única razão pela qual eu decidi confiar neles. Mas, por conta disso
estou perdendo cinco milhões de libras esterlinas, mais nove agentes que são
de preços incalculáveis. Tudo, absolutamente tudo, porquanto, vocês me
forneceram dados errados, e chegarem ao absurdo de afirmarem que não
haviam sistemas de segurança mais avançados na casa, e, ainda, não me
disseram sequer do que se tratavam os supostos documentos, etc., ou seja, se
você ainda acha que o erro encontra-se em mim, creio ser melhor analisar
quem ou qual governo lhe ofereceu estas informações e cobrar deles a conta.
- Você viu ou soube quais eram os documentos? Ou melhor... – fez
uma pausa como que escolhendo às palavras. – Você por acaso deu a
entender para o velho que estava atrás dos pergaminhos? – A pergunta veio
de forma suave, parecia que o interlocutor estava gostando de parte do que
estava ouvindo.
- Como lhe falei, fomos exterminados naquela mansão, somente
estou aqui por milagre divino.
- Não creia em milagres divinos meu amigo, você pode se
desapontar. – Seu interlocutor disse agora com voz maléfica.
- Então, você aceita seu dinheiro de volta, ou quer cobrir nova oferta
agora de um valor fechado para obtermos estes tais pergaminhos? – Charles
queria acabar com aquela conversa rápido, e rezava para que ele pegasse o
dinheiro.
- Como poderia deixar meus serviços na mão de um homem como
você seu idiota, e de sua firma medíocre. Somente lhe advirto que fiquem
longe de meus interesses, do contrário em questão de pouco tempo estará na
presença de seu glorioso Deus. – A voz respondeu já desligando o telefone,
para alívio de Charles que se deixou cair confortavelmente na poltrona, agora
relaxando a tensão.
- Passar bem senhor Xotono ou Serfalos. – Disse se recordando que
ambos estes nomes o homem havia se apresentado, e, já sabendo que a
ligação havia sido finalizada, mas estava tão aliviado que queria despedir-se.
Menos um problema, estou livre destes caras ou seja lá o que são. –
Pensou por fim sorridente, mal sabendo que estes caras estavam naquele
momento arquitetando uma forma de penetrar por outras vias na mansão de
Arthur, e, se ele iria trabalhar com ele agora, iria precisar de sorte para
sobreviver à legião que enfrentaria...
52
CAPÍTULO 13
Brasília – Brasil / Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Após abraçar o Dr. Salomão, Gabriel começou a subir, em uma
velocidade assustadora, como se estivessem sendo sugados por um cilindro
de luz e força. Após alguns segundos já estavam no espaço fora da órbita
terrestre, e então veio um estalo ensurdecedor, formando somente luz... Era
como se uma estrela estivesse emanando sua luz mais e mais. Então eles
atravessaram a barreira, e definitivamente sumiram completamente da
dimensão material...
Para os céticos talvez fique difícil imaginar ao certo para onde eles
foram, mais o inevitável estava se cumprindo, a missão do Doutor Salomão
havia terminado.
Ele havia retornado ao seu lugar, a chamada dimensão sublime,
onde se encontra o local, onde dizem que tudo começou... Berço de todos
aqueles que estão aptos a ali adentrar. Para os encarnados o verdadeiro
paraíso, para todas as almas, a primeira, mais a última dimensão a ser
alcançada, por isto todos a chamavam de dimensão sublime, porque para se
chegar até ela, uma alma teria que antes passar por grandes provações, e, por
demais dimensões inferiores.
Enfim os dois estavam de volta, o lugar era maravilhoso, campos
floridos, árvores, pássaros a cantar, e rios intermináveis. E para abrilhantar
ainda mais o mar... Uma imensidão de água, a qual encantava ainda mais os
olhos.
Contudo, após uma rápida olhada em toda paisagem, o Doutor
Salomão começou a modificar sua forma completamente, os cabelos que eram
curtos, ficaram mais longos e claros, suas mãos de um branco queimado,
passaram a exibir um branco gélido, seus olhos de verdes ficaram castanhos.
Após acabar de se modificar, o Arcanjo deu-lhe uma olhada e falou
com tom de satisfação:
- Vejo meu amigo, que sua alma não deixou de materializar a forma
de sua principal passagem na dimensão material. Aquela que lhe proporcionou
a entrada nesta última dimensão de evolução. – Abriu seus longos braços. Seja bem vindo Cosme!
Quando Gabriel proferiu estas palavras, a forma de Cosme estava
completamente modificada, até mesmo suas roupas eram diferentes, vestia
agora uma túnica branca, com um vermelho vivo, e então em um tom de
preocupação, Cosme virou-se para Gabriel mencionando de maneira ríspida:
- Seja direto Gabriel! Onde se encontra Damião? Você havia me dito
que ele estava me esperando, mas agora percebo que você esta me
enganando!
- Como ousa dizer que estou lhe enganando?! Você mais do que
ninguém sabe que eu sempre cumpro ordens do conselho! - Gabriel respondeu
em mesmo tom.
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Após, ouvir isto Cosme se acalmou, no fundo sabia que Gabriel
nunca o enganaria se não fosse para seu bem, contudo, sua preocupação
somente aumentou após as palavras de Gabriel, o que teria acontecido com
Damião em sua missão? Será que estaria bem?
Gabriel vendo o rosto de preocupação de Cosme sentiu que havia
exagerado. - Me desculpe Cosme, sei que está preocupado, mas não podia lhe
contar quando estivéssemos em transição, e não sabia sequer se você saberia
suas reais formas e nome que usa nesta dimensão. Saiba que recebi ordens
claras para lhe trazer de volta para descansar, porque, segundo o Conselho,
iam precisar de você com urgência mais tarde. Eles somente me falaram que o
Damião esta em sérios apuros em sua missão, e que iria carecer muito de
você, mas não sem forças, e sim revigorado. Por isso me pediram para buscálo, ainda bem que cheguei a tempo de salvá-lo.
- Mas tudo estava devidamente previsto! Há não ser que... - Cosme
parou subitamente perdido em seus pensamentos, sentindo após um medo
profundo. Sabia que o mestre não lhe mandaria para ajudar ninguém após ter
desencarnado, isto seria muito perigoso, e, aquele punhal que o demônio
trazia nas mãos era um forte instrumento, poderia ser utilizado na dimensão
material e imaterial, por isto, certamente iria matar inclusive sua alma, A
escuridão esta com muito poder! – Ele pensou.
Gabriel somente tentou acalmar Cosme, colocando a mão sobre seu
ombro. - Acalma-se Cosme, Damião vai ficar bem, em breve Miguel vai nos
liderar na dimensão material, e nós vamos juntos ajudá-lo. Os criadores e o
Conselho sabem muito bem a hora certa de agir, afinal, quem neste universo
desafiaria a cura, poder e medicina de São Cosme e Damião?
- Não me venha com brincadeiras de divindades terrenas, somos sim
evoluídos, mas não somos santos, nem intercessores, e sim conselheiros. –
Cosme demonstrou sua humildade. – Contudo, temos limites como todos, e
todos podem chegar ao nosso nível, não sou melhor do que nenhum deles
para ser chamado de Santo, posso somente dizer que encontrei o caminho
correto e evolui ao máximo, e, agora, com conselhos, tento ajudar aqueles que
buscam o mesmo caminho.
Gabriel exibiu um sorriso de alegria, estava com saudades da
humildade de Cosme, uma das almas mais evoluídas, e um dos mais fortes,
sem dúvida essencial na batalha. Deu-lhe um tapinha nas costas, e falou
alegremente:
- Vamos! Já esta preparada sua egochê, como me aconselhou
Miguel: “Faça-o descansar, mais tarde toda sua energia será usada”.
Cosme decidiu acatar, contudo, não estava nada satisfeito com
Gabriel, sabia que ele escondia mais alguma coisa, e não era nada bom...
54
CAPÍTULO 14
Brasília – Brasil, 1982
Os dois enfermeiros que haviam levado a mulher para a sala de
parto correram para a recepção, contudo, nada poderiam fazer pelo Dr.
Salomão, ele já jazia morto...
Apesar disso, o rapaz que ali adentrara totalmente possuído pelo
demônio Xotono, estava agora agonizando ao chão, tinha ainda resquícios de
vida.
Neste momento, uma batalha pessoal se instalou nos dois
enfermeiros, eles se perguntavam se valia a pena correr para salvar a vida do
ser desprezível que matou o Doutor sem qualquer motivo aparente.
Mencionavam a si mesmos, e aos que estavam na recepção, que
não tinha mais alternativa ao rapaz.
Foi quando escutaram uma voz em seus ouvidos, doce e serena,
mas que lhes diziam em um tom quase que ameaçador:
- E se fossem seus pais, ou seus filhos?... Os quais poderiam
perfeitamente estar ali estirados naquele chão frio?... Certo é que ele matou o
Doutor! Mais será que não merece um tratamento para poder receber um
julgamento justo?
Os enfermeiros ficaram atordoados, viraram-se rapidamente, mas
não viram nada, mais uma vez estavam com aquele calafrio em todo corpo. E
decidiram rapidamente pegar o jovem no chão, colocaram-no na maca, e
saíram correndo para a sala de emergências. Atrás deles saindo pela porta,
encontrava-se uma forte luz, a qual ainda disse antes de sair pela rua algumas
poucas palavras, como às que pronunciou no ouvido dos dois enfermeiros:
- Isto mesmo Gabriel! Você cumpriu seu papel... Contudo, creio ser
cedo ainda para comemorar vitória. Ele nasceu, mas o filho da escuridão
também nascerá se não fizerem algo, e você sabe disso. Além disso, Joana
ainda corre sérios perigos! Aliás, lembre-se que sem proteção e treinamento
de nada Marcos e Joana valerão. Eu posso estar proibido de ai adentrar, mas
vocês mais do que nunca vão precisar de mim, de minha força, sabedoria, e
lealdade... Vou servir até o fim meus ideais, e as ordens do filho do criador são
plenas...
Na outra dimensão o Arcanjo Gabriel estava se dirigindo com Cosme
para o reduto de descanso, mas quando escutou o que aquela luz estava lhe
falando, soltou um suspiro de espanto, exclamando em voz alta:
- Não pode ser, ele não pode existir ainda... O traidor não!
Antes que Gabriel pudesse analisar de onde vinha à voz, o Senhor
da Luz saiu apressadamente pela porta do hospital, necessitava encontrar o
demônio Xotono e arrancar-lhe a informação de onde iria acontecer a
concepção do filho das trevas... Ainda, tinha que correr para tentar ajudar
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Damião, que corria mais perigos do que Cosme correu no hospital, o arcanjo
Miguel o aguardava impaciente...
56
CAPÍTULO 15
Londres – Inglaterra, 1982
Charles chegou à mansão de Arthur, e assustou-se ao ser recebido
por um senhor que lembrava um beduíno, até seu sotaque era diferente.
É, parece que pelo menos alguma das versões de Frederick fazem
sentido. – Pensou sorridente, já sendo conduzido pelo que, ao que tudo
indicava, era apenas um mordomo, o qual o conduziu para uma suntuosa sala.
Ao adentrar na sala Charles ficou maravilhado com a quantidade de
obras de arte que ali se encontravam, parecia um museu.
- Encantado com minha pequena coleção de preciosidades meu caro
Charles? – A voz do velho Arthur ecoou por todo canto, fazendo Charles se
sobressaltar, afinal, tinha quase que certeza que ele não havia dito seu nome.
- Me desculpe, mas creio que ainda não havíamos sido
apresentados para você saber o meu nome... – Tentou articular Charles já
estendendo a mão para cumprimentar o velho que já estava próximo. Concluiu
que ele realmente não necessitava daquela sua curiosa bengala para andar,
pelo visto somente para se defender...
- Não necessito de ser apresentado a ninguém para saber de sua
identidade e vida meu caro. A resposta veio com um sorriso irônico. – Para
isso o dinheiro foi feito, por isso digo que ele trás mais informação do que
felicidade, porquanto, a informação gera segurança e a felicidade é o oposto.
- Não entendi porque seria o oposto? – Questionou Charles.
- Porque desarma um homem com a infeliz ilusão de que se
encontra satisfeito com seu estado atual, quando, na realidade, caminha para
o mundo da ociosidade das trevas como um inseto para a luz de uma lâmpada
prestes a ser queimado.
Charles ficou surpreso com aquela resposta, mas não deixou
fascinar-se, afinal, aquele sujeito havia lhe causado um enorme prejuízo mais
cedo, o qual deveria ser recomposto.
- Sente-se meu amigo. – Tornou o velho apontando para um
pequeno sofá e algumas poltronas, por óbvio, diminutos quando comparadas a
sua enorme sala de visitas com tantas obras.
Ao se aproximar, Charles pôde notar que aqueles móveis também
pareciam ser obras raras.
- São móveis advindos do castelo de um rei muito louco, o qual
tenho grande estima. – Disse o velho ao notar que Charles estava fascinado
com os objetos.
- Deve ser que o senhor se identificou com ele. – Charles foi frio
como um iceberg.
57
- Vejo que está com um pouco de ressentimento por minha pessoa?
– Arthur respondeu em tom sarcástico, afinal, sabia que ele realmente não
gostava dele àquela altura, então falou e apontou para uma das poltronas para
que ele se sentasse rápido.
Charles sequer respondeu a pergunta, sentou-se e foi logo ao que
lhe interessava:
- Então, vamos aos negócios.
- Mas você não quer saber sobre seus homens? – Arthur questionou
pegando Charles de surpresa.
Afinal, o que teria para saber? Somente que eles estavam mortos,
simples assim. – Pensou antes de respondê-lo logo em seguida:
- Você deve estar de brincadeira não é seu velho desgraçado. – Ele
até mordeu os lábios de raiva, sua vontade era de estrangular aquele velho,
mas sabia que se pelo menos tentasse, era bem capaz dele ter alguma carta
na manga, o que certamente ele teria...
- Não estou, você não quer vê-los? – Dando um sorriso irônico.
- Porque, está na hora do jantar seu canibal?
Arthur deu uma enorme gargalhada, respondendo com sarcasmo ao
novo amigo, assim, já o considerava, afinal, tantos anos de contato com
Frederick, ele podia ver que Charles havia herdado este ritmo de trabalho, era
esperto, mas tinha o sangue quente, o que atrapalhava em certas ocasiões em
que a paciência era necessária.
- Saiba que uma ligação salvou seus homens, afinal, seus corpos já
estavam limpos e prontos para serem esquartejados e desossados...
- Seu filho de uma... – Charles ameaçou levantar-se para socar o
velho, mas antes disso Arthur somente levantou a bengala sorrindo e fazendo
sinal para tomar cuidado.
- Se for os corpos saiba que não posso levá-los, afinal, são agentes
secretos, assim, mesmo que reformados ainda o são, e, portanto, não voltarão
mais para as famílias, aqueles que tiverem uma, desta forma, é melhor tudo
ficar como está. – Charles disso com peso na consciência, queria devolver os
corpos para às famílias, mas isso certamente seria muito arriscado.
Após ver que Charles voltou ao seu lugar o velho disse sorrindo:
- Eles estão vivos seu idiota!
Aquilo pegou Charles de surpresa. – Como assim vivos, o agente foi
categórico em afirmar que os outros morreram. – Raciocinou por algum tempo.
Vendo que Charles não estava crendo, Arthur decidiu contar tudo:
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- Veja, eles realmente serviriam para meu jantar, contudo, após sua
saída, descobri que você disse a verdade, e que foi procurar a pessoa certa.
- Como assim a pessoa certa? – Charles interrompeu demonstrando
sua perplexidade, como ele poderia saber sobre sua visita à casa de
Frederick?
- Fique calado seu idiota. Como lhe explicava, a verdade é que eu
não tenho sede por comer carne humana, aprecio sim, mas somente em
ocasiões especiais, e de pessoas que julgo merecerem este fim, algumas eu
como ainda com o coração batendo, pedaço por pedaço...
Charles sentiu um calafrio ao ouvir Arthur dizendo daquela forma, ele
parecia um monstro.
- Não me julgue. – Disse Arthur ao perceber que estava sendo
avaliado. – Eu somente mato pessoas ruins.
- Ruins sob seu ponto de vista. Mas quem é você para julgar?
- A mesma pessoa que julgou que você era uma pessoa boa, e que
seus agentes mereciam viver.
- Viver, você os matou!
- Não e não! – Arthur foi agressivo. – Como lhe disse eles estão
vivos, meio tontos e machucados, mas vivos. Venha e veja. – Arthur levantouse e saiu, Charles ficou um pouco amedrontado de segui-lo, afinal, aquilo
realmente poderia ser mais um truque, mas decidiu ir e tirar a história a limpo.
Após percorrerem um longo corredor, o velho chegou até uma
parede. Charles pensou que ele estivesse louco, afinal, aquele era o fim da
linha. Contudo, para seu espanto, o velho passou às mãos na parede, ela fez
um ruído, e em questão de segundos uma voz de computador disse: “Acesso
permitido”, e a parede começou a virar-se, deixando a vista uma passagem.
Charles ficou boquiaberto, e somente seguiu o velho que entrou na escuridão.
Depois de uma curta caminhada na escuridão total, Charles
percebeu que outras portas iam se abrindo a sua frente, desta vez
automaticamente, à medida que o velho se aproximava.
Após algum tempo uma luz fortíssima iluminou todo o ambiente
cegando momentaneamente Charles que levou suas mãos instintivamente aos
olhos, mas, quando eles novamente se abriram, a perplexidade tomou conta
de seu ser, afinal, estavam em outro mundo, e somente teve tempo de dizer:
- Isto é surpreendente...
59
CAPÍTULO 16
Brasília – Brasil, 1982
O senhor da luz saiu do hospital tentando localizar Xotono pelo seu
odor fétido. O fedor seguia na direção de uma casa de prostituição.
Ao chegar ao interior da casa o Senhor da Luz viu que não seria
fácil, diversos demônios estavam naquele lugar, alguns possuíam pessoas, já
outros somente manipulavam, contudo, não viu nenhum sinal de Xotono.
Ao olhar para cima, viu uma mulher com cabelos embaraçados e
pele esbranquiçada que o olhou fixamente, ela subia as escadas
apressadamente, seus olhos eram inconfundíveis, vermelhos como fogo.
Xotono ali se encontra encarnado, e já percebeu minha presença. –
Raciocinou o Senhor da Luz.
À grande maioria das pessoas não conseguem ver os espíritos,
somente alguns, o que é uma anomalia, ao passo que, ao certo ninguém
deveria ver. Contudo, é certo para todos que na dimensão material nada é
absoluto. Por está razão, nenhum ser humano estava enxergando o que
realmente se encontrava naquele prostíbulo. Os demônios estavam
literalmente em toda parte, e, sequer se incomodaram com a presença daquele
ser de luz que ali adentrara, afinal, estavam em grande maioria...
O Senhor da Luz retirou uma grande espada da cintura, ela brilhava
amarelado como ouro, e gritou em alto e bom som para os demônios:
- Eu não estou aqui atrás de vocês! Quero somente o Xotono, por
isso se saírem do meu caminho, não haverá maiores desavenças!
O bom é que os demônios não são solidários, se algum deles estiver
em apuros, e os outros saberem que se lutarem poderá haver mais feridos do
que salvos, os dizeres são sempre os mesmos: “cada um por si” ou “um não
faz falta”.
Eles abriram espaço, e o Senhor da Luz correu em direção à escada
por onde Xotono subiu, sua túnica branca voava, e ao encostar em alguns
demônios que não abriam caminho, estes, ao tocarem na túnica rapidamente
pulavam e gritavam...
- Estão assustados com o meu truque? – Ele disse em tom de
sarcasmo.
Ele era astuto, sempre untava as vestes com água benta, ajudava
muito em uma batalha, não matava o demônio, mas fazia seu espírito ou a
matéria daquele que possuía arder como fogo, o que os atordoavam, dando
grande vantagem em uma guerra.
Ao subir às escadas, ele atravessou o corpo de vários homens que
desciam aos beijos com mulheres, eles somente sentiam um calafrio, mal
sabendo que um espírito havia passado naquele momento dentro deles. O
calafrio era proveniente não pelo atrito do espírito com a carne, mas com o seu
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atrito com a alma do individuo, o que ocorria devido ao choque de energias
imateriais das almas ao se encontrarem. Contudo, o choque era passageiro e
rápido, e o homem geralmente sequer percebia o que aconteceu, ainda mais
aqueles, eles estavam muito ocupados olhando e beijando os seios das
mulheres.
Ao terminar a subida, o Senhor da Luz viu Xotono entrando em um
quarto, o corredor era escuro, e os gritos dos demônios eram intensos e
assustadores, muito ao contrário do que o que os humanos ouviam, que era
somente muita música e gemidos de prazer sexual, regrados a drogas...
Ao adentrar no quarto, ele foi surpreendido, a mulher possuída por
Xotono, ou melhor, ele, pulou nele com a adaga que havia matado o Dr.
Salomão. Em um movimento rápido, o mesmo girou o corpo desviando-se da
mulher, e no mesmo instante virou-se com sua espada e colocou-a em seu
pescoço, falando logo em seguida em um tom totalmente ameaçador:
- Xotono... Você é tão inocente... Acha mesmo que encarnado teria
alguma chance? Em sua forma original você já não é tão rápido, encarnado
então, não vou nem comentar...
- Não estou nem ai! Pode cortar esta vadia que estou possuindo, não
vai me fazer nenhuma falta, agora para seu antigo Deus, afinal, “eles sempre
tem uma chance de melhorar...” Vai! Corta a garganta dela! Corta! Respondeu Xotono raivoso e em tom diabólico, demonstrando seu total
descaso com seus irmãos encarnados, logicamente, tinha inveja deles, por
estarem buscando uma evolução, mas seu estado atual não queria mais seguir
este caminho, mas sim o das trevas.
O Senhor da Luz sabia que Xotono iria fazer aquilo, e respondeu
calmamente:
- Eu já percebi que este seu punhalzinho, é um instrumento
poderoso, afinal, ele pode ser utilizado na dimensão material e imaterial, é uma
verdadeira arma de guerra celestial!
Ao ouvir aquilo Xotono soltou um sorriso, sentindo-se vencedor.
Contudo, antes que o demônio pudesse saborear o gostinho de
demonstrar que estava mais poderoso, o Senhor da Luz arrematou:
- Você já olhou a espada que está no pescoço desta mulher
Xotono?...
Xotono olhou para a espada, a pele da mulher começou no mesmo
momento a se arrepiar e a suar, e seu corpo começou a tremer...
- Não pode ser... Como você conseguiu a espada do Arcanjo Miguel
seu traidor?! – A resposta veio com uma voz gasta pelo medo. – Você o
matou? Mais como?
- Você não precisa saber de tudo, somente que é mesmo a espada
do Miguel, e, portanto, como você sabe, se eu cortar a cabeça da mulher não
matará somente ela, mas você também! – Ele sorriu sinistramente, naquele
61
momento ele é que parecia ser o verdadeiro demônio. – Portanto, não de um
passo, e me diz logo aonde vai ser a concepção do filho das trevas! Os
Arcanjos e demais seres celestiais não têm autorização para matarem vocês,
mas quanto a mim... – fez uma pausa de mistério – Não tenho restrições,
eliminaria você em um piscar de olhos, e não me importaria sequer com a alma
desta mulher, afinal de contas, eu sou o traidor, não é?!
Xotono estava atordoado, tinha certeza que o Senhor da Luz não
tinha nada a perder, e cumpriria facilmente o que estava falando, não entendia
como ele havia conseguido pegar a espada de Miguel, mas a conhecia, era
realmente ela, em um só movimento poderia aniquilá-lo... Ainda pensou no fato
de que seu oponente se mostrava ser naquele momento um ser muito
poderoso, afinal, ele já havia conseguido uma proeza, enganar tanto o
Conselho Supremo, como o Senhor das Trevas, aquilo era de se tirar o
chapéu, se ele pudesse usar um chapéu, afinal, estava prestes a perder a
cabeça...
Não tinha alternativa, seu mestre poderia até matá-lo por revelar o
local da concepção, mas se contasse ainda tinha uma chance de viver, poderia
perfeitamente esconder-se até que ele tivesse o poder, mais quando ele
recobra-se todos os seus poderes não adiantaria mais fugir...
Ainda muito confuso, Xotono sentiu a espada encostar a carne da
mulher, ela queimava só de chegar perto, decidiu falar rápido, sabia que o
traidor não tinha compaixão nem pelo seu Mestre, quanto mais por um
demônio como ele:
- Está certo, conto aonde vai ser a concepção!
- Boa escolha! Mas ande depressa, porque não tenho a noite
inteira...
- Ela será na Alemanha... – Antes mesmo de terminar de falar, o
Senhor da Luz desapareceu, Xotono ficou sem entender, mas muito apavorado
não quis sequer buscar respostas, desencarnou rapidamente do corpo da
mulher, e sumiu na escuridão, afinal, se algum demônio o pegasse e levasse-o
ao seu mestre, ele não teria compaixão, mas ainda tinha uma proteção, o
punhal, ele era sua garantia de vida pelo menos por algum tempo.
******
O Arcanjo Gabriel andava de um lado para o outro na dimensão
sublime, vendo aquela cena Cosme mesmo estando deitado na egochê, a qual
veda a entrada de qualquer som acústico exterior no objetivo de acalmar ao
máximo o espírito que ali se encontrasse reequilibrando suas energias,
percebeu que algo estava estranho com o Arcanjo, sabia que ele não se
irritava facilmente.
- O que aconteceu Gabriel? – Proferiu já saindo do local de
descanso.
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- Não se preocupe Cosme, somente me foi dirigido uma mensagem
de alguém que eu acreditava não mais existir no universo, ou pelo menos, que
estivesse muito bem aprisionado em alguma dimensão... – fez uma pausa
analisando toda situação, se poderia comentar mais alguma coisa – Você não
o ouviu por causa da vedação da egochê, mas como dizem, se não escutou é
porque não deveria escutar, do contrário o universo conspiraria para que fosse
diferente.
Cosme captou a mensagem, que no fundo não queria dizer aquilo,
mais que Gabriel não queria comentar o que acabara de ouvir...
- Não se preocupe meu amigo, não quero me meter em assuntos de
seu interesse, somente pensei que poderia ajudar de alguma forma. – Disse
Cosme já se virando para entrar novamente na egochê.
- Espere... – disse rapidamente Gabriel, não queria que o amigo
pensasse algo errado, mais hesitava se poderia dizer mais alguma coisa,
contudo, respirou fundo e disse calmamente:
- Sei que compreende Cosme que há certos assuntos que não posso
ainda lhe revelar, não porque não confio em você meu amigo, mais porque não
sei se ainda estaria preparado para saber, uma vez que você acabou de voltar
da dimensão material...
Cosme sequer virou-se para responder, somente levantou as mãos
como se dissesse que não queria interferir em nada que não era de seu
interesse, após voltou para seu descanso, sabia no fundo que teria uma
grande batalha em breve, do contrário não seria convocado assim tão rápido
para uma luta.
Mas antes que Cosme entrasse na egochê, Gabriel ainda pensativo
disse em tom cauteloso:
- Somente uma pergunta meu amigo! – Cosme parou, contudo, não
se virou.
Ainda mais cauteloso Gabriel perguntou:
- Você acha que o grande traidor ainda está vivo?
Cosme virou-se para o Arcanjo, entretanto, seu rosto não exibia
qualquer sentimento:
- Como você acabou de falar-me meu amigo, há certos assuntos que
também não posso ainda lhe revelar!
Gabriel ficou assustado, nunca havia recebido uma resposta direta e
seca como aquela, ainda mais vindo de Cosme. Não sabia o que pensar, se
ele sabia realmente que o traidor ainda estava vivo, ou se havia somente
jogado verde no escopo de tentar saber tudo que estava acontecendo, como
uma forma de dizer “conto o que sei, se você contar o que sabe!”.
Após analisar a situação, Gabriel preferiu virar-se e ir dar uma volta,
não tinha permissão para contar a Cosme nada, e, logicamente, ele também
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não deveria saber coisa nenhuma sobre o traidor, Cosme era honesto e um
excelente amigo, no entanto, era muito astuto e articulava as coisas de uma
forma como ele nunca vira antes, se continuassem aquela conversa, em pouco
tempo ele retiraria alguma informação que o Arcanjo não poderia lhe repassar,
por isso o melhor mesmo era se retirar.
Cosme vendo que Gabriel preferiu se retirar adentrou no recinto,
dizendo bem baixinho:
- Gabriel você não sabe de nada!...
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CAPÍTULO 17
Berlim – Alemanha, 1982
Deitada sobre uma grande cama de casal, adornada com laços e
fitas de cetim, se encontrava a jovem Estela...
Sua pele era clara como a neve, e seus cabelos castanhos eram
sedosos e macios, possuía um nariz empinado como uma modelo, o que
combinava com seu corpo magro e esguio belo e imponente, para quem há
anos encontrava-se quase que diariamente sobre aquela cama.
Seus olhos grandes e negros, na maioria das vezes transmitiam
carinho e afeto por todos que chegavam à sua volta, visto que era ali em sua
cama o único lugar capaz de encontrá-la já que não podia sequer andar em
uma cadeira de rodas, tendo em vista que possuía sérios problemas de saúde.
Há anos que ela não falava nenhuma palavra, não andava, sequer
mexia um músculo.
Tudo ocorreu após um trágico acidente quanto estava no início da
juventude, após vários tratamentos os médicos diagnosticaram que o quadro
era muito grave, e, certamente, ela ficaria tetraplégica para o resto da vida.
Vários dos médicos especialistas que seu pai procurou, alguns com
fama internacional, atestaram que ela poderia conversar perfeitamente, lado
outro, inexplicavelmente ela não emitia qualquer som, somente mexia os olhos.
Os médicos atribuíam que ela não estava falando devido ao trauma
do acidente e da perca da mãe naquele dia, contudo, quem realmente
conhecia a jovem, desconfiava de algo maior, uma vez que ela mexia os olhos
como se estivesse tentando se comunicar, e seu olhar na maioria das vezes
refletia dizeres de que algo estava errado, parecia que ela estava
constantemente em perigo, como se estivesse querendo fugir de algo,
certamente de seu corpo imobilizado...
Às vezes seu pai chegou a pensar que ela estivesse com problemas
neurológicos, levando vários psiquiatras à sua grande e imponente residência,
tudo em vão, eles continuavam a falar somente do trauma do acidente, e que
todos os exames indicavam que sua capacidade de falar estaria muito bem,
bem como, não havia nada com seu cérebro, e os constantes olhares de
pânico poderiam ser somente uma forma dela demonstrar sua aflição de se
encontrar somente deitada em uma cama sem se movimentar, como um
estado de euforia momentâneo, já que não era sempre que os olhos
transpareciam temor.
Sempre que anoitecia, seu pai chegava exausto do trabalho,
chamava-se Pierre Adele, e era considerado um dos melhores advogados
criminalistas de toda Alemanha.
Ele havia nascido na França, possuía olhos penetrantes, quarenta e
nove anos, cabelos grisalhos, de estatura alta com seus imponentes um metro
e noventa e oito, e, para completar, ainda continha uma oratória perfeita. Com
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todos estes requisitos era considerado por todos um dos homens mais belos
entre os viúvos e, também, um dos mais influentes de toda Alemanha.
Sua carreira profissional era muito promissora, mas após a morte de
sua esposa ela deslanchou, foi contratado por criminosos de todo o mundo, e,
surpreendentemente, quando não ganhava, o que era raro, conseguia uma
redução de pena tão grande que rapidamente seus clientes estavam
novamente soltos.
As línguas maldosas, sempre mencionavam que ele havia vendido
sua alma ao demônio quando sua esposa faleceu no acidente que deixou
Estela tetraplégica. Mas a comunidade acadêmica não pensava desta forma,
sempre muito cética, atribuía seu desempenho profissional e sua popularidade
com políticos, celebridades e mafiosos, somente como um fator deturbado de
trabalho, onde qualquer um que se dedicasse ao máximo para ser o melhor,
mesmo que o melhor fosse o errado, conseguiria.
Contudo, era certo que sua influência e popularidade, de nada lhe
adiantavam, tendo em vista que seu maior amor havia morrido, e seu maior
orgulho se encontrava sobre uma cama, mexendo apenas os olhos, algumas
vezes como se estivesse sendo perseguida, e quase sempre com um olhar de
apavoramento.
Pierre chegou naquela noite, e como sempre antes de qualquer
coisa, foi ver Estela. Ela olhou para ele com o pavor, e o mesmo pensou que
era a atitude de sempre, lado outro, neste dia, ela seguia o olhar para a janela,
ao passo que Pierre imediatamente escorreu os olhos para a janela, nada
vendo, somente percebendo que se encontrava aberta. Pensando que a filha
estivesse lhe falando que estava com frio, foi até a vidraça e a fechou. Após,
chegou bem perto do ouvido da jovem, e com voz suave falou baixinho:
- Eu te amo!
Contudo, Estela não mudou seu olhar, continuava a olhar para a
janela.
Querendo que a filha tivesse alguma distração, Pierre passou a
contar o que fizera no dia.
- Meu bem, você não vai acreditar! Porque hoje o papai conseguiu
algo inacreditável, salvei das garras da cadeia um dos maiores criminosos,
nem eu mesmo estava confiante em sua absolvição, mais de repente saiu o
veredicto e o juiz estava suando quando mencionou o resultado do júri, ele
estava absolvido. Eu fiquei de boca aberta, mais sinto agora que foi feita
justiça!
Estela retirou o olhar de pânico da janela, olhando imediatamente
para seu pai, o qual emitia um sorriso caloroso. Por dentro ela gritava
apavorada, contudo, nenhum som saia, tal pavor se devia porque ela sabia
que havia alguma coisa diferente de fora da janela, ela não sabia distinguir o
que era, mas exalava um odor pútrido!
Sabia que seu pai provavelmente não sentira tal odor, porquanto,
não tinha o olfato apurado como ela.
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Após ser submetida àquela cama, Estela foi adquirindo outras
habilidades, como se seu cérebro estivesse a compensar suas perdas,
contudo, entendia aquilo, mas no fundo preferia ter tudo funcionando, sem
qualquer compensação, afinal, ficar naquela cama, seu único refúgio há anos,
era pior do que uma prisão.
Neste momento, Estela percebeu que tudo parecia se encaminhar
como uma noite qualquer. Seu pai e mais duas enfermeiras haviam acabado
de lhe dar banho, e ela se preparava para dormir, ela já havia parado de sentir
o forte odor que vinha da janela, sentindo-se mais aliviada.
Deve ser apenas um pássaro carniceiro que deve ter pousado,
afinal, estou muitos andares do solo, somente poderia ser algo que voa. –
Pensou.
Mas naquela noite à última coisa que ela poderia imaginar estava
prestes a acontecer, e dali para frente, ela iria conseguir fazer qualquer coisa,
menos dormir em paz...
******
Naquele mesmo instante, o Senhor da Luz quebrava todas as
barreiras físicas do tempo e do espaço, rompimento incompreensível ainda
neste estágio da inteligência humana, mais perfeitamente possível em planos
superiores.
Havia demorado muito para arrancar do demônio Xotono a
informação do local da concepção, por esta razão questionava se ele e Miguel
teriam o tempo necessário...
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CAPÍTULO 18
Londres – Inglaterra, 1982
Arthur e Charles pareciam se encontrarem naquele momento no
subsolo da mansão. Mas Charles não estava crendo em seus olhos,
porquanto, o local era enorme, era como se eles tivessem adentrado em um
estádio de futebol, eles estavam somente na porta de entrada, e a sala era
enorme, a perder de vista.
À medida que eles iam entrando Charles percebeu que o teto estava
muito acima de suas cabeças, raciocinou que um complexo daquele tamanho
não poderia encontrar-se sob o solo, porquanto, tamparia toda a região de sua
grande mansão, olhou para o relógio, que tinha medidor de pressão, e,
percebeu que estavam em um subsolo enorme, se assustando.
Como viemos parar tão abaixo do solo sem que eu notasse a
descida? – Pensou ele intrigado.
Vendo a cara de espanto, Arthur tratou de explicar:
- Quando passamos por aquele corredor escuro, você deve ter
sentido a sensação de que portas estavam sendo abertas, correto?... –
Charles balançou a cabeça afirmativamente, estava tão concentrado na
explicação que não queria sequer falar. – Na realidade andávamos era em
uma esteira, e, o barulho de portas, eram os níveis de descida.
- Que interessante... – Charles conseguiu naquele momento
compreender, então passou a olhar o grande salão, ao passo que Arthur
prosseguiu nas explicações:
- Isto foi desenvolvido por um de meus sócios para deixar algum
intruso sem noção de onde estava, afinal, se ele conseguisse chegar até aqui
sozinho, o que já seria um grande feito, deste recinto ele não sairia, quer dizer,
sairia... – fez uma pausa olhando para sua bengala, arrematando: – Mas não
com vida.
Charles estava extasiado, não conseguia acreditar na
engenhosidade deste sujeito, por isso sequer se incomodou com o tom de
ameaça.
- Quem é este sócio? – Quis por óbvio saber.
- Não posso lhe contar, afinal, ele assim como você será daqui para
frente, não é apenas um sócio, mas acima disto um amigo, e, saiba que tenho
extrema descrição com todos, creio que isso seja o motivo de eu ter tantos
amigos.
- É, e o dinheiro ajuda um pouco não acha, afinal, isso aqui deve ter
custado bilhões. – Disse erguendo as mãos para demonstrar o volume e tentar
expressar um pouco seu entusiasmo com aquilo tudo à sua frente.
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- Creio que você esteja muito enganado meu caro, e, você mais do
que ninguém deveria saber que dinheiro não é a maior das riquezas no mundo
atual.
- Então o que seria? – O questionamento veio em tom mais de
deboche, devido à entonação fraca que Charles alçou, como se somente
perguntasse para cumprir um protocolo de conversa, porquanto, sua opinião já
estaria formada.
- Informação. – Respondeu Arthur secamente.
Charles saiu de seus devaneios e o olhou atônito, nunca havia
parado para pensar naquilo, realmente fazia sentido, afinal, quem detém
informações é muito mais poderoso e, ainda, obtém grandes fortunas com as
mesmas se souber trabalhá-las.
- Vejo que entendeu meu caro Charles. – Ele concluiu batendo
fortemente no ombro do amigo.
- Sim, é lógico, e o senhor tem toda razão. Mas deve ser que o
sujeito que projetou e construiu está fortaleza para o senhor queria muito uma
informação que o senhor detinha, e ela deveria ser muito valiosa.
- Nem tanto. Mas quero que saiba que esta sala era muito mais
pequena do que o castelo que ele tinha fincado em um punhado de areia que
jorrava ouro negro.
Charles entendeu, a informação deveria estar ligada ao petróleo em
países situados no oriente médio.
- Eu o senhor não pretende pagar com informação, correto? Porque,
já pode ficar sabendo que não trabalho desta forma. Eu obtenho as
informações, não as tomo para minha empresa, a qual deve visar somente os
lucros obtidos com elas.
- Não é para sua empresa, a informação que tenho é para você! –
Respondeu Arthur para espanto de Charles que se virou encarando-o agora
assustado.
- Como assim para mim? Eu não quero nenhuma informação!
- Será que não quer mesmo?... – Arthur fez o questionamento
deixando que ele raciocinasse um pouco.
Contudo, após pensar por um longo período Charles ainda não havia
obtido a resposta, e desistiu de procurá-la.
- Me desculpe. Não me lembro de nenhuma informação que queira a
ponto de rejeitar receber milhões por ela. – Ele foi direto e conciso, afinal, não
queria cair em algum jogo do velho, onde ele iria ver se havia algo, então dizer
que a teria, afinal, isso era possível de se cogitar tratando-se de uma pessoa
como aquele a sua frente.
- Tenho a informação sobre quem é o seu pai. – Ele foi direto.
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A resposta de Arthur pegou-o como um soco.
Charles quase estremeceu as pernas, mas manteve-se firme, afinal,
aquele velho somente poderia estar brincando, ele mesmo já havia se
incumbido de tentar obter esta resposta durante anos, tudo quando já estava à
frente de sua agência, utilizando, por conseguinte, todo poderio da mesma,
contudo, nada havia encontrado...
- Você está enganado. Eu já tentei saber sobre esta indagação e não
consegui, e trabalho com isso, então, esqueça. – Respondeu Charles olhando
para o vão, como se estivesse pensando que se isso realmente fosse possível
ele realmente daria qualquer coisa.
- Deve ser porque você não procurou com as peças certas, ou
melhor, sem algumas peças... – Fez uma pausa sorrindo. – Mas eu não estou
falando que vou conseguir, eu lhe afirmo que já tenho está informação, e,
somente se você aceitar meus termos, e mudar-se para está base me
repassando toda a sua base da agência irei lhe contar, você poderá fazer
exames, enfim, o que quiser! E ao fim vai ter a certeza que a resposta esteve o
tempo todo na sua cara, e, ainda, você verá porque não havia conseguido
obter a mesma muito tempo antes...
Como assim irei saber por que não a obtive antes? – Pensou
nervoso, a proposta do velho era inviável, mas, por outro lado, não seria ruim
contar com uma sede daquela...
- E ai? É pegar ou largar. – Arthur instigou.
- Quero saber se eu receberei tão somente esta migalha. – Quis
bancar o difícil, afinal, era um negociador, e, ainda, precisava manter a firma.
- Não chamaria isso de migalha, afinal, é o que sempre buscou em
toda a sua vida, e sei muito bem que daria está firma para obter está resposta.
– o valho fez uma pausa avaliando se prosseguia, e concluiu que deveria. –
Lado outro, sua firma não vale nada para mim se não vir acompanhada de
você, assim, você tem que entender que não quero seus serviços, mas sim o
seu apoio. Isso aqui é bem maior e de mais valor do que esta sala, porquanto,
tem muita coisa em jogo.
- Quero então saber o que está em jogo. – Charles não entregava os
pontos, se não obteria a resposta naquele momento queria pelo menos algo
concreto no momento.
Arthur se enfureceu com a atitude de Charles, então, de forma
abrupta resolveu literalmente rasgar a verdade toda, mas, por óbvio, sem lhe
revelar qualquer plano, porquanto, não havia ainda obtido sua confiança:
- Você é um idiota mesmo. Acha que vai mexer com os seres que
lhe contrataram e sair simplesmente livre somente devolvendo o dinheiro?
- Como assim seres?
- Sim, seres, eles não são simples pessoas, são uma organização
muito mais poderosa do que governos, afinal, eles manipulam alguns governos
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cujos os chefes se aliam aos mesmos, promovem pactos, enfim, se ainda não
se ligou você deve ser muito otário mesmo.
Charles começou a ligar tudo, ainda não havia entendido
completamente, mas sabia que tudo tinha ligação com o fato de que seus
contratantes Xotono e Serfalos, como se denominaram, pareciam migrarem de
um local ao outro, como...
- Espere, quer dizer que eles migram por governos e organizações
porque é uma espécie de...
- Sim eles são demônios, muito poderosos por sinal, e, ao que tudo
indica eles são quem coordenaram às atividades de uma organização secreta
que vai causar muito estrago neste mundo se não agirmos rápido.
Aquilo era demais para Charles, sempre foi muito cético, não
acreditaria nesta história se não tivesse presenciado tudo.
- Mas como ele pode acabar com minha organização? – Se
preocupou.
- Eles destroem tudo que não está bem protegido, e, principalmente,
aqueles que não cooperam com eles.
- Mas então no que consistirá o serviço de minha organização neste
local? E que prova você me daria de que aqui estaríamos livres de sermos
aniquilados por está suposta organização demoníaca? – Charles foi direto ao
ponto.
- Não posso te dar mais nenhuma informação se não tiver a certeza
de que estará comigo. – Ele respondeu já descendo uma pequena escada
rumo a um dos pequenos carros que ali aguardavam para levar os ocupantes
daquela sala a se locomoverem com mais comodidade, afinal, era quase que
uma pequena cidade no subterrâneo da Inglaterra, algo inimaginável.
Charles sem outra alternativa, seguiu-o, adentrando com o mesmo
em um dos pequeninos carros, ao passo que o motorista somente seguiu em
frente, como se já soubesse o local onde o velho queria ir. Eles já haviam
percorrido salas e mais salas do que pareciam escritórios, ali tinha salões de
jogos, um pequeno campo de futebol, academia, piscina, salas de pesquisa
cientifica, biblioteca, enfim, uma gama de setores, tudo separado, mas ao
mesmo tempo Charles notou que tudo estava interligado.
- Porque não tem ninguém trabalhando aqui, somente este
motorista?
- Porque ainda não começamos às atividades, afinal, a segurança e
inteligência tem que vir primeiro, e, este motorista é uma das pessoas de
minha mansão. Os times já estão todos formados, lado outro, aguardávamos a
composição de uma equipe de alto nível e comprometimento para nos somar.
Quando o carro parou Charles não acreditou, no interior de uma sala
de vidro todos os seus agentes estavam sendo cuidados por uma pequena e
desengonçada senhora que vestia um roupão. Ele julgou que ela seria uma
71
médica, saiu rapidamente do pequeno carro e tentou entrar na sala, mas antes
de adentrar sentiu somente uma pequena dor que foi tomando conta de todo o
seu corpo e apagou, ao passo que seu corpo caiu estirado ao chão...
******
Serfalos andava de um lado a outro de uma sala, não em forma
imaterial, mas material, ocupava a carcaça humana de um alto chefe do
exército, ele queria convencer o governo do País em atacar Arthur.
- Isto será muito difícil, lado outro, terei que tentar, afinal, o mestre
precisa do caminho livre o quanto antes. – Ele dizia para si mesmo, ao passo
que seus passos não paravam.
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CAPÍTULO 19
Berlim – Alemanha, 1982
Minutos após estar pronta para dormir, Estela ao invés do odor,
havia avistado algo que passou rapidamente de fora da janela. Era uma
espécie de sombra...
Rapidamente iniciou uma desesperada tentativa de se comunicar
através dos olhos com seu pai, contudo, para seu desespero ele muito
cansado, não olhou para seus olhos, somente lhe deu um beijo no rosto e
retirou-se do quarto, sendo acompanhado pelas duas enfermeiras.
Quando todos saíram do quarto e apagarem a luz, o que estava de
fora da janela resolveu entrar...
Estela olhava apavorada para a sombra que ainda estava de fora da
janela, seu corpo logicamente não se mexia, nem sua boca emitia qualquer
som, contudo, seu coração batia tão acelerado, que ela podia ouvir suas
batidas.
Em poucos segundos ela pôde ver o que literalmente atravessava a
janela e estava vindo em sua direção. Tentou fechar os olhos e abri-los
novamente, na tentativa de acordar de algum pesadelo, lado outro, sabia que
aquilo era assustadoramente real.
Quando aquilo que já havia atravessado completamente a janela
tomou forma, ela não pôde acreditar... Seu coração que já batia acelerado
passou a saltitar em seu peito, e seu corpo literalmente esfriou-se.
Ela pela primeira vez em anos estava sentindo algo, mas nada bom,
era uma dor, não entendia o que era, por óbvio, devido a todos os
acontecimentos que lhe deixaram atordoada. Mas parecia que
inexplicavelmente quem vinha em sua direção além do odor fétido, emitia
alguma espécie de energia, a qual da mesma forma inexplicável estava lhe
causava enorme dor, parecendo que tal dor não vinha de seu corpo, mas de
sua alma, o que era a realidade naquele momento...
Após algum tempo, que parecia uma eternidade, mas que na
realidade foi em questão de segundos, ela viu que se tratava eram de duas
sombras.
A primeira já estava formada e encontrava-se no quarto, e, quando
acabou de se materializar, Estela não pôde acreditar, era um cachorro, não um
simples cão, este possuía olhos sinistros, pelos curtos e negros, dentes
enormes e extremamente afiados, babava abundantemente, e fedia fortemente
a enxofre.
Os passos do cão eram tão rápidos que Estela não conseguia
acompanhá-los com o olhar, porquanto, o mesmo parecia levitar, em questão
de segundos já se encontrava ao lado da cama da jovem.
Estela não conseguia tirar os olhos do cachorro, mas algo atraiu sua
atenção, a segunda sombra já estava dentro do quarto, havia adentrado
73
enquanto ela olhava o cachorro atravessando à janela, e, quando ela tentou
avistar melhor que forma tinha, não conseguiu, tendo é que desviar o olhar
imediatamente, porquanto, a dor aumentou inexplicavelmente somente de
olhar diretamente para a outra sombra.
Seu cérebro mal podia processar a dor, por evidente, ela não
compreendia o que estava ocorrendo, mas naquele momento o cachorro
perdeu a importância, parecia que o que acabará de entrar no quarto
conseguia ser mais estranho e assustador do que o cão, e ela sabia por
instintos naturais que o era...
Neste momento, igualmente por instinto de sobrevivência, ela tentou
novamente virar o rosto, e quando finalmente conseguiu desejou não tê-lo
feito! Aquilo que entrou por último no quarto certamente não era humano,
parecia um espectro.
A cada passo que ele dava em sua direção, Estela sentia aumentar
mais a forte dor, como se sua alma estivesse sendo arrancada de seu corpo.
Contudo, ela não conseguia mais desviar o olhar, era como se estivesse presa
àquela visão, sendo hipnotizada. Ela não entendia de espiritualidade, mas no
fundo sua consciência sabia que aquilo que vinha em sua direção tinha um
enorme poder.
O espectro então abriu suavemente os olhos, os quais até aquele
momento estavam fechados, como se estivesse mentalizando algo, Estela não
sabia o quê era, mas certamente não era boa coisa.
Os olhos do espectro eram ainda mais aterrorizadores, e Estela
sentiu como se aquilo estivesse prestes a encarnar em seu corpo... - Será que
vou ser possuída por um espírito do mau? – Pensou a jovem. Seu pensamento
era certo, mas não era a forma de possessão que ela tinha em mente.
Contudo, para seu desespero, quando aquele ser totalmente
diferente de tudo que ela viu na vida chegou mais perto, Estela pôde ver não
se tratar de um espírito, mas na realidade inacreditavelmente de um jovem...
Ela presumia ser um jovem, porquanto, seu rosto encontrava-se
inteiramente dilacerado, estava literalmente em carne viva, assustadoramente
destacando seus olhos, os quais não eram de nenhuma cor natural para os
mesmos, eram espelhados, refletindo a expressão de espanto de Estela.
- Através de meus olhos, você pode vislumbrar a fraqueza de sua
alma! – Disse o rapaz, com uma voz totalmente diferente de qualquer humano,
abrindo ainda mais os olhos para que ela pudesse ver bem seu reflexo.
Quando ele chegou ao seu lado, ela finalmente conseguiu desviar o
olhar dos olhos daquele ser, contudo, ao olhar para baixo assustou-se ainda
mais, porquanto, além de não possuir pele no rosto, ela viu que ele não a tinha
em todo o corpo, e suas veias pulsavam como se por elas não corressem
sangue, mas pequenas serpentes ou vermes entre músculos.
- Desculpe minha aparência, mas parece que nenhum corpo humano
consegue suportar o poder de minha alma sem se decompor! – Mencionou o
jovem com um sorriso sinistro no canto inferior da boca, mostrando ainda que
74
não possuía também dentes... – Lado outro, para cumprir o que venho fazer
tenho que aqui dentro estar.
Sutilmente o jovem, ou melhor, o que sobrou dele, chegou bem
próximo a Estela, e foi retirando a coberta vagarosamente, parou, abaixou-se
sobre ela, sussurrando em seu ouvido palavras que aterrorizavam ainda mais
sua mente, deixando ainda cair de sua boca um sangue negro e fétido, como
se estivesse a cada momento derretendo:
- Não se assuste Estela, você deveria estar alegre, afinal foi à
escolhida...
75
CAPÍTULO 20
Londres – Inglaterra, 1982
Quando Charles acordou estava deitado em uma das camas se
perguntando o que havia acontecido, e notou que a pequena médica olhava
para ele com cara de descrença.
A estranha medida parecia ser uma velha asiática, tinha a cara
fechada, pele desbotada que entregava que estava ali há muitos dias não
vendo o sol. – Se é que ela já o viu algum dia. – Pensou ele após o raciocínio
anterior, o que devido ao seu treinamento fazia instintivamente, mesmo ainda
atordoado com o súbito desmaio.
A médica conversou com Arthur em mandarim, Charles sabia falar
várias línguas, afinal, isso poderia salvar-lhe a vida em uma missão, mas
mandarim ele não dominava, somente entendeu a mulherzinha dizer que “os
Ingleses são idiotas mesmo”, e algo como “eles não queimam como os russos
porque não tem tanto álcool no sangue”. Arthur sorriu e foi de encontro à
Charles.
- Acho que você conheceu Kim Jon.
- Kim o quê? Estou é a perguntar como vim parar aqui deitado,
afinal, somente me lembrava de ter corrido para encontrar meus homens e...
- E ai você sentiu a força que enfrenta um homem que se move em
um ambiente estranho sem tomar a devida cautela, afinal, você poderia estar
somente indo de encontro aos seus amigos, mas também poderia querer
matar a cientista presente nesta sala, que posso afirmar, é um contingente
humano que vale bilhões.
- Cientista? Bilhões? Do que você está falando?
- A doutora Kim é uma das maiores cientistas do mundo. Ela
encontra-se em nossa equipe desenvolvendo alguns suvenires para nossa
causa, e, chamei-a para tratar de seus homens, afinal, o hospital será ocupado
por uma equipe vinda de um País bem distante, e, por isso, nenhum médico
comum poderia aqui entrar, nem seus homens poderiam ser levados a um
hospital, afinal, conforme combinado, caso você não voltasse eu iria cumprir o
que disse. Assim, resolvi chamá-la, ela foi uma das primeiras a chegar à
Inglaterra, e está muito brava com você, primeiro, porque ela acha que vocês
estão barrando o início de seus estudos, e, segundo por que...
- Barrando início de seus estudos, o que eu tenho a ver com isto? –
Questionou incrédulo Charles, já havia recuperado suas forças, e já estava
preparando-se para levantar-se.
- Para eu colocar tudo em funcionamento tenho que primeiramente
ter uma equipe de segurança e de apoio interno e externo na área de
inteligência e espionagem, tanto corporativa quanto as demais. Por isso a Dra.
Kim está tão furiosa.
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- E do que mais está velha maluca me culpa? – Questionou em tom
de sarcasmo já se pondo de pé.
- Primeiramente, tenho que adverti-lo que ela fala Inglês meu caro
Charles, e, como ela ainda encontra-se nesta sala próximo a você...
Charles ficou até vermelho. – Desculpe senhora, estou muito grato
por ter me ajudado e, principalmente, por estar cuidando tão bem de meus
homens. Eu somente estava... – Mas antes de terminar a doutora resmungou
de longe saindo da sala após trocar o soro de um dos homens:
- Não precisa falar nada seu Inglês idiota. Falei para Arthur que se
um velho raquítico utilizando-se somente de uma pequena arma avançada já
fez isso tudo com sua equipe, não estaremos em boas mãos aqui embaixo!
Mas ele insiste que você e sua empresa são os melhores para servir a nossa
causa. Assim, quero que saiba que se algo acontecer a minha pesquisa por
sua culpa ou de algum de seus homens não vou usar estas armas sofisticadas
do Arthur para colocá-los somente paralisados, vou usar uma comum, capaz
de estourar de vez estes seus miolos.
- Nossa, aonde você arrumou está mulher? Acho que ela vale
bilhões porque tem um monte de gente querendo alguma recompensa por sua
cabeça. – Disse Charles após certificar-se de que a franzina mulher nervosa e
rabugenta realmente havia saído da sala.
- Não se engane meu caro Charles, está mulher salvou a vida de
seus homens. Afinal, minhas armas são sofisticadas, as balas são
desenvolvidas para parecer que penetraram totalmente na pele, perfurando.
Contudo, elas se estouram, fazem uma ferida superficial, e injetam uma
substância paralisante e um veneno mortal que se não aplicado o antidoto em
algumas horas a pessoa morre.
- Então quer dizer que se eu demorasse mais algumas horas você
realmente iria comer meus homens?
- Somente para você posso confessar que pedi para desenvolver
uma arma assim, para manter o sujeito vivo por algum tempo, até eu chegar
em casa com o corpo etc., afinal, comer um alimento fresco tem outro gosto. –
Disse o velho com expressão de um psicopata, diferente de seu ar simpático
que exibe na maior parte do tempo.
Charles esfriou-se, olhou para seus homens e deu graças a Deus de
ter aceitado a proposta rapidamente, do contrário não queria nem imaginar, só
de pensar já lhe ansiava vômito.
- Mas o que é que me derrubou desta forma?
- Mesmo que vocês vão fazer os trabalhos que estamos
combinando, tinha que já ter outros brinquedinhos para nós proteger até lá,
assim, mandei instalar um dispositivo de segurança que fosse acionado caso
alguém conseguisse passar pelos outros mais acima, assim, quando alguém
tenta entrar em qualquer sala sem a devida identificação e autorização, além
de receber uma descarga elétrica, é acertado por sons supersônicos que são
inseridos diretamente em seus ouvidos por sensores, os quais medem a
77
extensão do dano, atordoam o sujeito que sofre uma espécie de choque
também em uma região especifica do cérebro, assim, além de perder o senso
de direção por atingir o labirinto, desta forma, se ele não cai por um, cai por
outro, sucessivamente.
Mesmo sendo vítima do equipamento, Charles estava novamente
encantado, aquilo era demais.
- E ai chefe, quero que você traga sua equipe amanhã mesmo para
este complexo, o setor que vocês irão ocupar tem mais de dois mil metros
quadrados, já está equipado com o que há de melhor em relação a
espionagem e inteligência, e as armas estão na sala principal de armamento,
todas estão na ala de ciência e mecânica armamentista avançada, ao lado do
seu setor, afinal, eles ficam lá fazendo inovações e melhorias, após é somente
você se dirigir a eles é pegar os brinquedinhos. Tenho que lhe confessar que
nenhuma ainda chega perto de minha bengalinha mágica, mas já ouvi dizer
que o chefe deste setor é um russo que desenvolveu um armamento atômico
único.
- Como assim ouviu falar, você não o conhece?
- Ninguém conhece realmente uma pessoa meu caro Charles, na
maioria das vezes morremos sem conhecermos nós mesmos.
- Quero dizer...
- Sei o que quer dizer seu idiota. Somente quero a confirmação que
amanhã estará aqui, assim, poderei liberar a vinda em definitivo da doutora
Kim e mandar que os outros venham finalmente para cá.
- Mas o que vocês, ou melhor, nós vamos fazer neste lugar?
- Você vai ver com o tempo, mas após algum tempo vai perceber
que será mais fácil enumerar o que não vamos fazer... – Respondeu Arthur
deixando o mistério tomar conta de suas verdadeiras intenções.
- Mas ainda não combinamos os valores que serão pagos a minha
empresa...
- Valores? Primeiramente quero que saiba que estamos salvando
sua empresa, se continuarem naquele local por mais três ou quatro dias o
sujeito que o contratou vai aniquilar totalmente a mesma. E ainda tem o fato
que tenho algo que lhe interessa mais do que dinheiro...
Algo que me interessa mais do que dinheiro, será que realmente ele
sabe quem é meu pai?... – Pensou quase deixando transparecer um sorriso de
alegria somente em fantasiar com a possibilidade.
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CAPÍTULO 21
Berlim – Alemanha, 1982
Estela já estava totalmente perplexa, perturbação que aumentou
após o homem, ou melhor, monstro estar terminando de retirar o cobertor que
antes lhe cobria o corpo, deixando-a somente coberta por uma camisola
transparente, a qual em questão de minutos foi rasgada com força pelo
monstro, deixando-a completamente nua.
O jovem abriu a boca, e de dentro desta saiu sua língua, a qual era
bifurcada, e mexia-se como duas serpentes. E, em um movimento rápido e
repugnante começou a lamber todo corpo da jovem...
Ela não queria acreditar, sentia que aquilo não poderia estar
acontecendo, mas seu maior desespero ainda estava por vir...
Naquele exato momento, seu pai apareceu na porta, ela sentiu um
alívio ao vê-lo, pensando logicamente que ele iria agir rapidamente, e tudo iria
acabar.
Mas contrariando seus pensamentos, seu pai parecia estar confuso.
Olhava-a, mas não como se estivesse prestes a ajudá-la, seu olhar era
inconfundivelmente de vergonha.
Ela em um sussurro quase inaudível falou pela primeira vez em
tantos anos:
- Pai...
Mais não obteve resposta... Seu pai ficou espantado pelo fato de
ouvir a voz de sua filha novamente após tantos anos, mas não reagiu.
Estela ficou tão perplexa com a atitude dele, que sua mente não
mais estava ali naquele quarto, parecia que jazia fora de seu corpo, pensava
nos tempos em que era criança, nas brincadeiras com seu pai, nos jantares em
família, com ele todas as noites vindo ao seu quarto para lhe dar um beijo...
Contudo, foi rapidamente trazida de volta de seus devaneios por
uma dor dilacerante, a qual desta vez vinha certamente de seu corpo.
Inicialmente ficou chocada, porquanto, não sentia dor há tanto tempo
em seu corpo, que mal poderia acreditar que aquilo era realidade.
Foi quando notou que suas pernas estavam se mexendo, e então
logo pensou que seria um milagre! Deus estava trazendo de volta seus
movimentos! Poderia correr para escapar!
Contudo, sua alegria logo foi desmontada, apesar de estar se
movimentando, diante da dor que estava sentindo, preferiria estar novamente
tetraplégica...
Era como se aquele sujeito estivesse rasgando-a... Foi quando ela
notou que o rapaz que a segurava estava penetrando seu pênis em sua vagina
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fortemente, e ele fazia isto com ódio, certamente não com prazer... Seus olhos
espelhados a fixavam de uma forma tão sinistra que ela conseguiu por
segundos ao invés de sua imagem ver no fundo deles, e neste momento teve a
certeza que o inferno existia, e que boa parte dele estava dentro daquele
olhar...
Na medida em que o rapaz ia penetrando em seu corpo, ela tremia,
mais não era de medo, e sim de dor. Parecia que ela estava recebendo uma
descarga elétrica que passava por todo seu corpo, chegando até os seus fios
de cabelo...
Neste momento, quando não aguentava mais tanta dor, ela começou
a gritar, de uma forma nunca vista antes...
Seu pai inexplicavelmente ainda estava ali parado, perplexo, mas
extremamente parado, somente olhando tudo acontecer.
Quando ela olhou-o novamente, agora com olhar de indignação, ele
somente deixou cair uma lágrima sussurrando:
- Me desculpe, eu não tive opção... – E saiu correndo pelo corredor.
Estela já estava quase desmaiando, mas antes pôde ver uma forte
luz entrando pela janela, ela tentou fixar o olhar nela, e antes de desmaiar
percebeu que a mesma estava formando a figura de um homem, após isto
somente viu escuridão...
Antes que a luz tomasse a forma completa do homem, o sinistro
cachorro que desde quando chegou estava parado como uma estatua ao lado
da cama da jovem Estela, soltou um grande uivo, saindo correndo em direção
à luz, e à medida que ele corria foi se transformando em algo ainda mais
sinistro...
O homem que estava segurando Estela somente olhou para o lado,
e exclamou em tom bem alto:
- Segure-o Sífilis, eu já estou acabando...
Em plena transformação, o cachorro continuava avançando, e
quando chegou próximo ao Senhor da Luz, abriu sua enorme boca que
apresentava dentes extremamente afiados, e desta saiu um hálito fétido de
podridão da carne, o qual rapidamente recendeu em todo quarto...
Contudo, quando atacou passou diretamente pelo corpo do Senhor
da Luz, como se atravessasse uma cortina de fumaça, patinando logo após,
fazendo uma curva fechada no objetivo de retornar para efetuar um novo
ataque.
Ao chegar a sua forma materializada, o Senhor da Luz olhou o rapaz
possuindo o corpo de Estela sobre a cama, concluindo ter chegado tarde
demais.
Demorei muito tempo encontrando e arrancando daquele traste do
Xotono a localização da concepção... – Pensou se lamentando.
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Em seu íntimo ele sabia que tentou ser o mais rápido possível, até
mesmo quando o demônio falou que era na Alemanha seu primeiro
pensamento foi de culpa por não ter presumido antes o local, já havia estudado
a grande mudança repentina do advogado pai de Estela, mas nada havia
encontrado em sua vida que detinha algum pacto, ainda mais daquele grau.
Contudo, algo lhe retirou de seus devaneios, antes de voltar a atacálo novamente, algo surpreendente estava acontecendo, misteriosamente o
cachorro estava tentando se levantar, como se estivesse se transformando em
um homem, os pelos caiam abruptamente, mas o fedor ainda era extremo, e a
feição de homem não foi completamente concluída, somente ficando algo
indefinido, mas extremamente estranho a qualquer coisa que já habitou a
terra...
Com olhar de desprezo, o Senhor da Luz que acabara de se formar
em forma materializada por completo, mencionou sutilmente para a coisa que
se transformou à sua frente:
- Sífilis, foi este o nome que ganhou seu cão imundo! Agora sei
quem é você! – Fez uma pausa certificando que era ele mesmo. – Tinha
certeza que você não poderia mais encarnar em humanos... Afinal de conta
sempre foi tão fraco... Contudo, esperava que fosse um pouco mais forte, e
conseguisse quebrar esta barreira criada por mim quando deixei a casa de seu
mestre... Mas agora vejo que você é fraco demais... – Ele instigava. – Afinal,
somente conseguiu quebrar esta maldição em partes, e, ainda assim, se
transforma em algo ainda pior! Algo que poderíamos mencionar... – Ele
procurava às palavras, não por falta de definição, mas em tom de completo
deboche. – Seria... Nem humano nem cachorro! – Fez mais uma pausa, desta
vez para sorrir. – Desculpe-me, mas pensei agora e fiquei surpreso, você
conseguiu se transformar em algo mais feio do que era!
O cachorro que não tinha mais quase nenhum pelo, agora o olhava
com ódio mortal, e foi tentando novamente ficar somente nas patas traseiras,
se levantando aos poucos... Foi quando de seu umbigo foi saindo uma fumaça,
e desta fumaça foi se materializando a figura de um velho... Ele cheirava a
enxofre puro, e sua forma era de um homem acabado pela idade, barbas
longas e cabelos brancos, contudo, manchados, diante de estarem banhados
em sangue...
O Senhor da Luz não se mexeu, e ficou mudo, parecia que curtia
aquela situação.
Após estar totalmente formado, o corpo do cachorro que agora era
irreconhecível caiu ao chão, e a alma que dele saiu virou-se exclamando com
ódio:
- Seu traidor! Sabia de nosso segredo, e ajudou-o a enganar a todos.
Eu soube quando você sumiu que ele não poderia ter acabado com você!
Afinal de contas, foi você o único capaz de seguir o plano a risca... – Ele
trincava os dentes em ódio ao falar. – O mais forte, e o melhor deles, ele e
você enganou a todos nós. Achamos que estávamos matando seu filho ao
ajudá-lo, contudo, criamos um dos maiores mártires que este mundo já
presenciou, sendo suas palavras difundidas por todos os cantos do universo
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material e imaterial, e você ajudou mais do que nunca a fazer isto, mas lembrese que o preço foi grande! E por isto você também paga por ele até hoje...
Portanto, acho que deve tirar este sorriso sarcástico do rosto!
- No fundo você sabe muito bem que aquilo não foi um plano... Eu
realmente o traí, mas soube reconhecer meu erro a tempo, e pedi perdão. – O
senhor da luz agora respondia com ódio, mas às lágrimas escorriam pelo seu
rosto. – O importante para mim é que eu recebi seu perdão, porque ele é
bondoso e misericordioso, sabe quem tem sinceridade nas palavras!
Realmente pago até hoje pelo meu erro, não porque ele me cobra, mas
simplesmente para recuperar sua confiança. – O senhor da luz estava com
enorme ódio interior, mas prosseguiu: - Ele sabia que você estava lá, e tentou
persuadir seus discípulos a convencê-lo a não seguir seu caminho... Você
tentou impedir que ele fosse morto, não por amor, mais porque descobriu que
assim ele seria mais poderoso e traria mais confiança e sabedoria aos
homens, além de obter grande respeito... Por isso, não tenho tempo a perder
com você, não vou deixar que você e seu amigo cumpram o que vieram fazer.
Contudo, com mais desprezo ainda em sua expressão, o velho lhe
respondeu com uma pitada de sarcasmo, parecia que havia ganho o jogo:
- Você impedir nos dois? Se fosse somente um, eu creio que você
teria alguma chance, mas se esqueceu de que sou o mais forte agora das
profundezas após você sair do meu caminho?
O Senhor da Luz respondeu com um sorriso nos lábios, às lágrimas
já haviam secado:
- Sei sim... E é por isto que trouxe um amigo... Este que está bem ai
atrás de você! Ele queria conhecer este novo rei das profundezas.
Ele tem algum plano, quer me confundir, afinal ninguém o ajudaria...
– O velho ficou a pensar. – Ele não tinha amigos! – Prosseguia em seus
pensamentos, até que impaciente respondeu:
- Se eu não me virar ele vai me atacar de surpresa?! – Soltando
uma enorme gargalhada.
Contudo, a gargalhada foi interrompida, o demônio sentiu uma doce
voz em seu ouvido, e pôde perceber que o Senhor da Luz não estava
blefando, sendo que a voz somente falou suavemente:
- Há quanto tempo Serfalos, estava com saudades de suas
histórias...
O velho sussurrou, desta vez com enorme medo, o qual invadia todo
o seu ser:
- Não pode ser verdade...
- Vire-se, não gosto de atacar ninguém pelas costas como você fez
com a Aurora! Saiba que Gabriel ainda procura você, ele sabe que Xotono
somente foi um instrumento seu, e se achar não terá o mesmo respeito... - A
82
voz doce mais uma vez veio retumbar em seu ouvidos para seu total
desespero.
Ao se virar o velho viu o que temia, um Arcanjo... Não um simples
Arcanjo! Mas o mais poderoso, não teve dúvidas, já havia encontrado com ele
muitas vezes em batalhas desde os tempos primitivos, era sem sombra de
dúvidas Miguel...
- Como você pode estar ajudando este traidor? Não se lembra de
quem ele é?! – Serfalos tinha que questionar, porquanto, estava mais perplexo
com a situação do que com o fato de estar prestes de ser atacado por um
Arcanjo poderoso.
Miguel sorriu, e a resposta ainda veio com uma voz angelical:
- Não, não sei desta história... Pelo que sei ele traiu, pediu perdão e
se redimiu, e paga até hoje pela incompreensão de todos! O nosso Criador,
Deus, Criadores, seja lá o que você fala, não se pauta na penalidade ou no
ódio, mas sim no amor e perdão sinceros! Pelo que sei, foi você quem
realmente o traiu... Dizem que há milhares de anos, você era um grande
Arcanjo do Senhor, e, além de buscar ser mais que todos, ainda cometeu o
erro de matar um de seus irmãos! – Miguel fez uma pausa, tentando escolher
bem as palavras. – Contudo, posso lhe dizer que estará salvo da morte neste
momento, uma vez que eu ainda não tenho permissão para lhe exterminar, e,
ainda, tem o fato de que eu não tiraria este prazer do Gabriel de acabar com
você no tempo certo, por ter matado sua companheira...
Após dizer estas palavras, Miguel foi mudando sua forma de
angelical para uma bem mais estranha, agora estava mais parecendo um
demônio, foram surgindo brancas asas em suas costas, grandes como a de
uma águia, seu rosto foi se transformando em um misto de ódio e poder...
Após ver que Miguel estava prestes a enfrentar Serfalos, o Senhor
da Luz virou-se para a cama de Estela, a qual já havia acordado novamente, e
estava gritando de dor. Passou a mão atrás da nuca retirando a espada de
Miguel e correu pelo grande quarto rumo à cama, contudo, quando menos
esperava o rapaz que segurava a moça virou-se, e com um olhar penetrante
disse calmamente:
- Como vai traidor?! Estava com muitas saudades, afinal, não
esqueci que também me traiu...
O Senhor da Luz não podia acreditar no que estava vendo, aquilo
era pior do que estava prevendo...
- Não pode ser... Você não pode ter conseguido entrar nesta
dimensão e se encarnar em um humano, ele não permitiria! Você estava preso
em redes eletromagnéticas, e em uma dimensão espelhada só sua!
- Não diria que encarnei em um corpo humano, afinal, este corpo
sequer aguenta meu enorme poder, ele está se decompondo não vê!? – Ele
respondeu com um sorriso nos lábios que escorria sangue e pus.
83
O Senhor da Luz então resolveu ficar em silêncio, aquela situação
não lhe permitia sequer falar, e tinha que pensar em uma maneira de
escapar...
- Mas quem você pensa que é para falar comigo de igual para igual,
eu sou tudo que vocês temeram por todos estes anos, me chamaram de todos
os nomes, Satanás, Diabo, rei das trevas, arcanjo caído, tudo! Mas o mundo
esqueceu que eu sou um Deus!... Lúcifer... – O jovem falou com ar triunfante.
O Senhor da Luz tentou acalmar-se, não poderia deixar se abalar.
Sabia que agora ele e Miguel estavam correndo sérios perigos, afinal, tinha
que concordar com ele, porquanto, realmente não estavam na presença de
qualquer ser. Estava na presença de um dos mais fortes espíritos de todo o
universo, ele era realmente um verdadeiro Deus mitológico, mais ainda um!
Tramando um plano rápido, respondeu em um tom ainda mais ameaçador:
- Deus? Você acha que algum dia foi um Deus? – E percebendo que
Lúcifer havia parado resolveu prosseguir com o plano improvisado. – Não
questiono que você tinha muito poder, e, utilizando deste começou a punir
aqueles que faziam o mau no começo dos tempos! Dizem que os Criadores
foram claros que a punição somente consistiria em uma sanção com o fim de
que a alma destes homens e seres pudessem retornar ao caminho da luz!
Contudo, com sede de poder você começou a articular maneiras de
literalmente devorar almas, e com isto aumentar ainda mais o seu poder! Você
conseguiu, mas lembre-se: os criadores são tudo, seus poderes são infinitos, e
nem você, nem seus seguidores vão conseguir o que desejam! Seu semideuzinho de merda!
O jovem se levantou finalmente deixando Estela, ao passo que o
Senhor da Luz pensou ter conseguido, contudo, ao invés de parar a concepção
após a instigação, o jovem disse o que ele mais temia:
- Acabei! Está terminado seu fraco! Agora nem seu mestre poderá
interferir, afinal de contas o que esta dentro de Estela é uma vida, ele não se
atreveria a retirá-lo. Além disto, quem é você para falar de criador ou criadores,
você não estava lá, ainda não era sequer projeto seu merda. Além disso, pelo
o que me consta, o seu Criador fez uma promessa a Noé, então vocês não
podem quebrar sua promessa, estou certo?
Não podia ser. O senhor da luz se recusava a acreditar, como ele
conseguiu bem de baixo de seus narizes promover aquela façanha, e, ainda,
utilizando-se de uma lei divina que mesmo que burlada por fins escusos
deveria prevalecer?
No outro canto do quarto uma batalha ainda maior era travada, onde
Miguel tinha mais poder, contudo, Serfalos estava consumido pelo ódio, e sua
força estava assustadora, parecia que quanto mais ódio, mais poder ele
sugava da energia ruim que penetrava aquele quarto, a qual em sua grande
maioria vinha de seu mestre Lúcifer o qual o Arcanjo ainda não sabia de sua
existência no recinto...
84
CAPÍTULO 22
Londres – Inglaterra, 1982
Após um tempo analisando seus homens Charles e Arthur
retornaram a sala de visitas.
Charles ainda estava maravilhado com o que viu, se havia ainda
alguma relutância em aceitar o trabalho a mesma já estava fora de questão,
afinal, nunca, absolutamente nunca em sua existência e de sua firma poderiam
contar pelo menos com um por cento do poderio e imponência daquela sede.
- O senhor viaja por todo o mundo em expedições a procura destes
objetos exóticos, o que lhe move? – Charles tentou puxar conversa olhando
em direção aos vastos objetos que se espalhavam por toda a grande sala.
Arthur ficou maravilhado com o questionamento de Charles, nunca
imaginava que alguém como ele poderia ter um interesse tão filosófico, até
mesmo pensou se poderiam em algum tempo serem realmente amigos.
- O que me move é a sensação de liberdade. Sempre fui predatório
no mundo dos negócios, mas quando estou na floresta os riscos são mais
acirrados, e, ao mesmo tempo parece que o jogo entre vida e morte é mais
legítimo, visto que geralmente em minhas expedições luto contra a natureza, e,
também com armadilhas e outros dispositivos elaborados por povos primitivos
para proteger suas preciosidades. Desta forma, creio que após conquistar tudo
no mundo financeiro, ainda me faltava algo, então, decidi iniciar minhas
expedições, e me apaixonei, principalmente, quando vou de encontro a
civilizações e culturas antigas.
- E o que ou quem mais lhe causa interesse ou paixão nesta sua
busca? – Charles pensou um pouco, queria formular ainda mais sua pergunta,
mas Arthur estava sedento em responder, parecia que há anos não tinha uma
conversa daquelas.
- Sempre tive interesse em desvendar mistérios, em grande parte
dos que já consegui, desvendei ao mundo, como uma forma de compartilhar
minhas realizações, e, também, não posso mentir, de me sentir mais realizado,
afinal, em tão raras exceções nós queremos mesmo é desvendar algo ou obter
valores financeiros, visto que na maioria queremos mesmo é a glória destas
conquistas, e, elas vêm em sua grande maioria pelo reconhecimento das
pessoas.
- Então é por isto que sempre revela seus achados?
- Quem lhe afirma que eu revelei todos os meus achados?! – A
resposta veio seca, não pode raiva, mais porque ele estava prestes a revelar
algo que poucas pessoas sabiam.
Vendo que Arthur não gostou do questionamento, o qual mais
pareceu uma inquirição, resolveu mudar o rumo da conversa para o que queria
perguntar antes:
– Melhor dizendo, qual o mistério ou pessoa que mais lhe intriga?
85
Arthur parou um pouco para pensar, não porque estava com dúvida
sobre o mistério ou a pessoa que mais lhe intrigava, mas, porquanto, não sabia
se Charles ainda estava preparado para um diálogo daqueles, mas resolveu
adentrar somente um pouco, afinal, há muitos anos não dispunha de uma
pessoa para pelo menos sonhar que fosse seu amigo de verdade, sem
qualquer interesse tanto de sua parte quanto da pessoa.
- Creio que o maior mistério e ao mesmo tempo pessoa em minha
concepção tanto de vida quanto de explorador seja Jesus Cristo.
Charles ficou espantado com a resposta, nunca pensou que ele
fosse se intrigar por um homem que ao que tudo indicava tinha sua vida aberta
e baseada em religiosidade.
- Porque o espanto meu caro? – Arthur ficou confuso com tamanha
perplexidade que viu nos olhos e expressão de Charles.
- É porque a vida deste homem além de estar ligada a uma religião,
não creio que esteja eivada de mistérios, e, ainda, tem o fato de que Jesus
nada escreveu, assim, creio que se ele tivesse escrito algo e principalmente
interpretado suas ideias para os mais humildes entendo que ele teria feito
ainda mais seguidores, e deixado pelo menos mistérios para você então
encontrar.
Arthur sorriu. - Isto está ficando muito interessante... – Pensou.
- Primeiramente, creio que todos podem tentar melhorar aquilo que
foi feito, quando sequer fazem a metade do que a pessoa o fez. – ele falava
gesticulando com às mãos, como um professar lecionando ou ministrando uma
palestra para uma plateia cativante. – Em minhas expedições ao retornar
sempre escuto: “mas porque você não passou pelo tal caminho seria mais
divertido!” e outros: “Se fosse eu faria assim.”, ou seja, eles acham que fariam
melhor, simplesmente porque alguém fez o que ele nunca fará, mas ele ainda
é petulante o bastante para questionar as escolhas e criticar.
- Não estou criticando, somente tenho uma ideia, e tenho quase
certeza disto. – Tentou ponderar Charles.
- Ainda bem que você falou “quase”, porque você está muito errado
meu novo amigo...
- Por quê? – Ele realmente não entendia com a aquele ponto de
vista.
- Na minha concepção Jesus é ainda hoje o maior enigma a ser
desvendado, onde, alguns estudiosos levantam até mesmo hipóteses dele
nunca ter existido! Ainda há o fato de que nas passagens existentes em textos
antigos somente aparece parte de sua vida. Quanto a sua forma de atuar, creio
que ele somente fez seguidores porque fez exatamente da forma que foi feita.
- O que lhe faz ter tanta certeza disto? – Charles não estava nada
convencido.
86
- É simples meu caro, tenho a certeza de que ninguém gosta de ter
ideias impostas por outra pessoa, ainda mais quando se é uma pessoa
humilde. Eles não entendem bem se a ideia for formulada, e, por isso mesmo,
ou seja, por esse excesso de explicações da ideia, passam a questioná-la
ainda mais, e, exatamente nesta fase de questionamento muitos se estressam
e desistem de pensar nela, afinal, não são estudiosos, mas somente humildes
trabalhadores.
- Entendo... – Ele começou a entender o que Arthur queria explicar,
vendo que realmente fazia sentido.
- Se você entende, não preciso ir mais longe, somente concluir que
se Jesus também fez seguidores, é porque não escreveu nada.
- Disto tenho que discordar veementemente. – Charles quase pulou
da cadeira em sinal de total discordância.
- Por quê? – Arthur questionou fazendo ainda cara de espanto.
- Porque não é lógico. – A resposta veio seca.
Mas Arthur já esperava por aquilo, e tinha a resposta na ponta da
língua:
- É sim meu caro. Ele simplesmente deixou suas ideias e ideais
plantados e solidificados em parábolas e ensinamentos simples, e deixou que
os mais simples o passassem como entendiam aos seus semelhantes. Assim,
levando suas palavras aos analfabetos, os quais entenderiam melhor os
vocábulos ditos do que escritos por óbvio, porque a maioria não sabia sequer
ler. E, ainda, deixou nas mãos de alguns outros ditos discípulos a incumbência
de pregarem e escreverem o que entenderia sobre ele. – Fez uma pausa
erguendo às mãos como pedindo atenção. – E, ouso ir além, afinal, com está
simples atitude sabia ele incitou até seus perseguidores em continuar lhe
perseguindo mesmo após sua suposta morte. Agindo assim, perpetuou suas
palavras e seu ser terrestre como o principal dos homens que por aqui passou,
sem escrever nada e dizendo e ensinando em parábolas e pequenos gestos e
atitudes, os quais abrem a imaginação do ser humano, deixando que ele
raciocine livremente para retirar a sua versão, não uma imposta, mas aquela
que ele entende mais conveniente, e, deste modo, poder perpetuá-la pelos
séculos.
Charles estava boquiaberto, nunca havia parado para pensar
naquilo.
- Tenho que confessar que isto realmente faz sentido. Mas tenho
ainda uma pergunta... – Ele pareceu hesitar, estava com medo de que Arthur
não entendesse a brincadeira.
- Pode perguntar, não tenha acanhamentos bobos comigo.
- É desta sua paixão que você começou a comer a carne e a beber o
sangue?
Para alegria de Charles Arthur quase se dobrou de tanto rir.
87
- Poderia ser meu caro, nesta você me pegou, mas tenho que dizer
que não. – Já respondeu olhando para o relógio e se assustando com a
velocidade que o tempo passou, então decidiu concluir a conversa, afinal, tinha
uma importante conferência para tratar do início dos trabalhos.
- Me desculpe meu caro Charles, a conversa está agradável como
poucas que tive nestes últimos anos, mas em alguns minutos tenho que estar
em uma conferência exatamente sobre o início de nossos trabalhos. Devo
então lhe dizer que estou muito grato de você estar junto ao nosso
empreendimento, e amanhã esperamos você e toda a sua equipe do setor de
escritório, etc., ocasião em que podem se dirigir diretamente para a sala que
lhe apresentei hoje, podem entrar pela mansão que um de meus empregados
irá lhe guiar por mais amanhã somente, porquanto, espero que a partir deste
dia você se sinta em casa para adentrar quando bem entender, afinal, é nosso
chefe de segurança.
- Mas é o senhor que vai gerir todo o empreendimento? – Charles
questionou já se levantando, não queria atrasar o novo amigo, mas tinha que
saber de detalhes.
Contudo, Arthur não tinha muito a explicar:
- Como você vai perceber mais adiante, eu sou somente uma peça
em um jogo muito mais complexo, mas pode inicialmente se reportar a minha
pessoa, mais adiante você vai conhecer o resto dos conselheiros.
- Conselheiros? – Charles queria obter o máximo de informação,
afinal, permaneceram discutindo sobre outras coisas e ele gostou tanto do
papo que se esqueceu de tratar dos assuntos mais importantes.
- Sim, conselheiros. Mas pode ficar tranquilo que eles estão em
vários Países, e somente eu, por enquanto, represente nosso empreendimento
aqui na Inglaterra.
- Desculpe. Somente para constar, meus homens estarão naquele
local amanhã quando eu chegar, não é?
- Porque, está com medo de eu resolver fazer uma boquinha à
noite? – Questionou sorrindo Arthur, já saindo da sala, estava muito atrasado,
afinal, os Conselheiros não esperavam nem um segundo, e ele não queria
decepcionar seu grande amor que se encontrava entre eles, longe, mais
sempre perto dentro de seu coração...
Charles tornou a se sentar, e ficou ali por algum tempo, tinha agora
convicção que estava tomando uma decisão muito séria, mas pelo todo, sabia
que estava lidando com tubarões. E, pelo que pôde ver, eles tinham poder não
apenas aquisitivo, de armamento e de instalações, tinham uma organização
mais confiável que um governo, afinal, são poucos países que podem contar
com uma sede como aquelas, se é que existe alguma no mundo igual.
Contudo, um pensamento não saia de sua cabeça. Quem será meu pai? Será
que já o conheço? O raciocínio era frenético, e ele não queria acreditar que
finalmente estava pronto para descobrir a verdade, contudo, não tinha
conhecimento, mas teria infelizmente pouco tempo com o mesmo...
88
CAPÍTULO 23
Berlim – Alemanha, 1982
O Senhor da Luz não podia acreditar, afinal, aquilo não poderia estar
acontecendo, ele e Miguel se começassem a lutar, com certeza iriam ser
massacrados somente por Lúcifer, afinal de contas, ele realmente era um
Deus, banido, segundo lendas pelo Criador ou Criadores, mas um Deus
mitológico!
Olhou para trás e viu que Miguel retirou sua harpa celeste, e em um
movimento rápido as cordas foram se mexendo para trás, até formar um arco.
Retirou dentre às asas algumas flechas, em movimentos tão rápidos que
quando o Senhor da Luz piscou ele já estava apontando para Serfalos.
Foi neste momento que o Senhor da Luz teve uma ideia que poderia
salvar suas vidas, afinal de contas, sabia que Miguel sequer tinha percebido
que o jovem que molestava a inocente Estela na verdade era Lúcifer, por isso
ele não sabia o perigo pelo qual estavam passando...
Eles tinham uma chance, Lúcifer iria certamente desencarnar para
lutar, afinal, encarnado seus poderes eram ínfimos, isto lhes daria uns três
segundos. Além disso, ele precisava de mais, então decidiu enganá-lo... Se
isto fosse possível...
Imediatamente colocou seu plano em execução, afinal, não tinham
tempo...
- Acho que você se enganou Lúcifer, não estamos em dois, estamos
em três, olhe para trás... – Fez uma pausa indicando com a cabeça, e ainda
arrematando. – Meu mestre decidiu vir pessoalmente! Acho melhor você virarse, afinal, como sabe, ele seria incapaz de atacar alguém pelas costas...
Lúcifer somente deu um sorriso respondendo calmamente:
- Jogar um jogo destes comigo traidor, é motivo para eu não
somente lhe matar, mas para fazer isto com muita dor e prazer, lógico que este
último sentimento seria meu!
Contudo, à medida que o Senhor da Luz não respondeu, Lúcifer
ficou parado a pensar, por um momento raciocinando, mas a tentação foi bem
maior, e no momento em que inclinou a cabeça para trás rapidamente, o
Senhor da Luz também em um movimento rápido lhe jogou água benta.
A água benta logicamente não iria lhe ferir, contudo, a mesma lhe
assustou devido a fumaça que ela fez ao bater no corpo por ele encarnado, o
qual já estava somente em carne devido à decomposição.
Nesse momento o Senhor da Luz aproveitou a oportunidade para
sair correndo na direção de Miguel, batendo nele com tanta força que os dois
saíram voando pela janela, que se quebrou.
Na queda Miguel ainda agarrado ao senhor da Luz perguntava aos
gritos, demonstrando sua indignação com aquela atitude:
89
- Por quê?! Por que fez isto?!
- Depois lhe explico! Agora voe e atravesse a barreira! Rápido!
Rápido!
Miguel mesmo sem entender nada abriu suas imensas asas, e
plainou no ar, o Senhor da Luz se agarrou fortemente ao seu corpo, e em
apenas seis fortes batidas de asas o Arcanjo já havia atingido uma velocidade
maior do que a da luz, e após um grande estrondo, os dois atravessaram para
outra dimensão...
******
- Serfalos, está foi a última vez que aquele verme do traidor que se
alto denomina atualmente como “senhor da luz” atravessou o meu caminho.
Quero que você ache e mate-o, ou melhor, após aniquilar o nascimento de
Joana, vá atrás dele com alguns seres abomináveis, cães do inferno,
serpentes de fogo, o que for preciso, mas não o mate, traga-o para mim, vou
brincar um pouquinho. – Lúcifer quase trincava os dentes de tanto ódio.
- Sim mestre...
Eles saíram pela janela sumindo na escuridão, deixando a pobre
Estela sobre a cama, totalmente perplexa, com os olhos abertos, mas os
pensamentos longe, bem longe...
90
CAPÍTULO 24
Dimensão Suprema, 1982 ano terrestre
Uma grande explosão surgiu no céu da dimensão suprema, e, logo
após abrolhou uma bola de fogo nele, a qual foi descendo igual a um meteoro,
até que ao chegar mais próximo ao chão foi perdendo força, e já se podia ver o
que estava dentro dela, era Miguel e agarrado a ele estava o Senhor da Luz.
Quando chegaram ao chão, o Arcanjo abriu suas grandes asas, e
começou a plainar, até encostar os pés suavemente ao chão. Quando sentiu o
mesmo, o Senhor da Luz deitou-se, a grama era macia, e perto deles havia
uma montanha.
Miguel estava furioso, pegou o braço do amigo e começou a arrastálo para dentro de uma fissura na montanha, era muito escuro, o Senhor da Luz
tentou se livrar do Arcanjo, mas ele o agarrava com tamanha força que não
conseguiu se mover.
Ao adentrar na montanha, o Arcanjo não perdeu tempo, e foi logo
esbravejando:
- Onde é que você estava com a cabeça de fazer aquilo seu louco!!!
Poderíamos ter morrido ao atravessar a barreira em tamanha velocidade! –
Fez uma pausa rodopiando e tentando manter a calma, mas
imediatamente, e antes que o Senhor da Luz pelo menos abrisse a boca já
estava vociferando novamente:
- E é melhor que você seja rápido no que tem a dizer, porque em
questão de minutos todos saberão que eu estou aqui, e se descobrirem você,
certamente vão pensar que eu sou também um traidor, então seja breve que
tenho que te levar de volta... E dependendo do que você me falar eu nem te
levo, acabo com você aqui mesmo!
O Senhor da Luz já estava acostumado ao temperamento de Miguel,
ele não era o mais calmo dos Arcanjos, mas aquele humor era compreensível,
afinal, ele liderava todo o Exército Supremo, o que certamente não devia ser
nada fácil, mas sabia que ele era um bom amigo, um dos poucos que sobrou,
então com muita calma e moderação mediu e teceu suas palavras:
- Você sentiu quem era o espírito que estava possuindo aquele
rapaz que molestava a jovem Estela?
Miguel deu de ombros, realmente não sabia quem era. Portanto, o
Senhor da Luz disse calmamente:
- Era o Lúcifer!
- Lúcifer? – Miguel disse e começou a sorrir após pronunciar o nome.
Contudo, ao perceber que o rosto do Senhor da Luz não mudava de
expressão, o sorriso foi perdendo força, dando lugar a uma cara de espanto.
- Como assim? Você está falando sério?
91
- Lógico que estou! Acha que iria perder a chance de matar Serfalos
com você? Há milênios que o Conselho Supremo não libera uma morte de um
demônio, não perderia esta oportunidade! Vi que era ele quando se virou, já
havia sentido a presença de uma grande força, mais nunca imaginei que seria
ele...
Miguel estava espantado, não queria acreditar naquilo.
- Então foi por isso que você ficou conversando com ele durante
algum tempo, eu estava tão entretido com a batalha que estávamos para travar
com Serfalos que mal olhei para o garoto. Deve ser por isso que o conselho
nos enviou, eles não só queriam que matássemos Serfalos, como também
impedíssemos a concepção matando Lúcifer.
- Não sei bem... Acho que não nos colocariam em tamanho perigo.
Bem como, mesmo se assim tivessem procedido, deve ser que eles não
devem estar sabendo que ele conseguiu recuperar a totalidade de sua força,
que, segundo presenciei, encontra-se maior do que era antes. Assim, é certo
que não conseguiríamos matar ele sozinhos, e, ainda por cima tinha Serfalos,
o qual estava muito forte também...
Miguel ouviu somente balançando a cabeça, ainda não podia
acreditar, de repente se virou para o Senhor da Luz rapidamente, dizendo com
afoito:
- Vamos rapidamente! Vou te levar de volta antes que alguém
perceba sua presença. Após, tenho que comunicar ao conselho o que
descobrimos, e que fracassamos em evitar a concepção, Gabriel deve estar
indo com Cosme neste momento para poderem ajudar Damião no parto de
Joana, pelo que parece por lá as coisas também não estão nada boas, poucos
demônios atormentaram o parto de Marcos, segundo me consta somente
Xotono. Mas no de Joana disseram que foi enviado uma Legião de demônios
para o local, pelo jeito eles temem o nascimento de Joana mais do que o de
Marcos, por isso tenho que ir ajudar os Arcanjos, afinal, se a Joana não nascer
na terra estaremos perdidos...
- E mais! - Continuou Miguel. – Não vá lá, porque se não os Anjos e
Arcanjos podem te matar. Lembre-se que o conselho e principalmente ele não
queria revelar a verdade agora, eles temem por uma revolta ainda maior.
O Senhor da Luz somente assentiu com a cabeça, deu as mãos a
Miguel, e em um estouro desapareceram...
******
Lúcifer e Serfalos chegaram à uma dimensão isolada, segura para
eles.
92
- Sei que devo caçar o Senhor da Luz, mas estarei muito fraco após
a batalha, e, eles conseguiram fugir meu mestre de forma muito fácil, me
desculpe. – Serfalos falou em tom de tristeza.
- Não conseguiram não! – Lúcifer respondeu com um sorriso nos
lábios.
- Não entendo?
- Eles pensam que me enganaram, contudo, não quis travar aquela
batalha, afinal, poderia acontecer alguma coisa com Estela, e, principalmente,
com o que ela agora representa.
Serfalos sorriu, estava maravilhado com a astúcia de seu mestre...
******
Marcos jazia dentro de uma incubadora, sua mãe ainda estava no
quarto sequer fazendo ideia do rebuliço que estava acontecendo na entrada do
hospital.
Os policiais estavam muito nervosos, questionaram os funcionários
sobre os acontecimentos, e concluíram que nada fazia sentido, eles diziam que
somente viram uma forte luz e desmaiaram, isso realmente era incomum.
Os enfermeiros que havia levado o jovem à sala de emergências
estavam naquele momento dando suas versões:
- Já te falei senhor policial que quando chegamos o Dr. Salomão já
estava morto, e o sujeito que o matou jazia agonizante ao chão, ao passo que
todas as pessoas que estavam na recepção no momento dos acontecimentos
estavam desmaiadas.
- Não tinha outros homens? – O policial insistia.
- Não, somente vimos isso!
O interrogatório prosseguiu, ao passo que invisíveis aos olhos
humanos comuns estavam treze Anjas divididas vigiando à entrada do
hospital, e, principalmente, o local onde Marcos estava.
Gabriel às enviou após saber dos acontecimentos, elas eram muito
bem treinadas, e fariam a vigília com muita prudência.
- Você acha que algum dos demônios irá retornar? – Umas das
Anjas disse a outra que estava ao seu lado.
- Não creio nesta possibilidade Marreria, acho que todos eles estão
indo para impedir o nascimento de Joana conforme Miguel havia descoberto,
dizem que lá será uma batalha e tanto...
93
CAPÍTULO 25
Londres – Inglaterra, 1982
Arthur estava sentado em uma poltrona aconchegante próximo a
grande mesa da sala de reuniões localizada no complexo que havia
apresentado a Charles há pouco tempo. Estava olhando para mais de vinte
monitores, todos estavam ainda estabelecendo a conexão com os vários
membros do Concelho ao redor do mundo, nenhum deles apresentava imagem
até que todos estivessem online, isso foi projetado para não ocorrer decisões
sem a presença de qualquer parte, e, até mesmo para se certificarem que tudo
estava bem com todos.
A Dra. Kim ainda estava na ala médica acabando de medicar os
homens. Arthur havia dado ordens claras para que fossem dopados até o dia
seguinte, primeiramente, para não ter que dar explicações, e, segundo,
porquanto, sabia que estava lidando com agentes perigosos, eles haviam
bobeado com ele ao acharem que seria um serviço fácil, mas isto certamente
não iria se repetir.
De repente todos os monitores ligaram ao mesmo tempo, e os
cumprimentos foram sendo dados, um a um. Arthur saldou a todos, contudo,
os membros perceberam como sempre que havia um em especial, o qual era
dirigido para uma mulher que ele reluziu um sorriso ao avistá-la no monitor, no
qual, abaixo de sua imagem linda, continha a descrição de: “Brazil”.
- Venho avisar a todos que amanhã iremos iniciar o funcionamento
deste nosso complexo da Inglaterra. – Arthur disse com alegria.
- Já não era a tempo, afinal, os demais já estão em funcionamento
há algumas temporadas. – Disse a mulher a qual Arthur sorrira minutos antes,
demonstrando que não havia espaço ali para romances infantis, estava para
trabalho serio, não para troca de olhares.
- Me desculpe minha querida Antonieta, sei que os complexos de
vocês já estão em funcionamento há algum tempo, contudo, vocês têm que
admitir que o da Inglaterra sofreu modificações que atrasaram seu
funcionamento.
- Admitir isto é possível. Mas o senhor também tem que admitir que
mudou drasticamente o projeto geral, e iniciou uma verdadeira fortaleza, não
creio que seja necessário tamanho poderio somente em um País. – Disse
agora um sujeito baixinho, o qual se apresentava com uma aparência anêmica
no vídeo, com a legenda “Japão”, o qual externava seu descontentamento com
Arthur.
- Sei também disso, mas recebi informações tanto do Vaticano
quanto de ordens secretas diversas, bem como, de chefes de outras religiões
que admitiram que o maior perigo encontra-se aqui na Europa, por isso decidi
reforçar meu aparato, e vocês sabem que paguei todos os acréscimos de meu
dinheiro.
- Não estamos questionando sua honestidade meu amigo, somente
estamos preocupados se o senhor vai conseguir colocar tudo em
94
funcionamento até o ato de fusão mundial, e, principalmente, se realmente
confia nesta empresa de segurança que contratou, afinal, recebemos
informação que eles lhe atacaram tentando roubar uma de nossas principais
fontes de segurança até o momento. – Desta vez disse um simpático senhor
no monitor escrito “França”.
- Lhe agradeço Nicola por tal consideração de preocupação para
com a minha pessoa, diante de tais questionamentos que estou sofrendo
desde que estes monitores foram ligados. Mas tenho que advertir vocês que
somente temos está vantagem porque eu a encontrei em minhas últimas
expedições. E, quanto há empresa de segurança, quero advertir que Frederick
não é apenas meu amigo, mas meu irmão de sangue, o qual conforme é de
conhecimento de vocês está seriamente doente, e me pediu para cuidar de
seus negócios sem retirar das mãos de meu querido Charles.
- Exatamente ai está à questão, este sujeito tem grande influência
sobre seus homens, os quais o respeitam muito, creio que até mais do que
respeitam Frederick. Então nos diga se você crê que ele vai se portar como
deve ao descobrir a verdade sobre seu pai? Afinal, pelo que me consta, ele
somente aceitou o trabalho para descobrir este segredo, porquanto, pelo
levantamento de meus agentes secretos, a empresa de espionagem deles tem
milhões em caixa, com serviços transbordando. – Desta vez questionou uma
senhora negra linda onde seu monitor tinha a legenda do “Canadá”.
- Michelli, tenho que lhe dizer que não posso responder sua
pergunta, afinal, seria o mesmo que pedir para vocês me dizerem se os
governos, religiões e entidades secretas que vocês contrataram para fazerem
a segurança de suas unidades são confiáveis, porquanto, ao que me consta,
tivemos problemas com um agente ligado ao governo alemão.
O sujeito do monitor da Alemanha quase tossiu de tanto nervosismo,
era alto e branco como leite, tendo os cabelos vermelhos como fogo.
- Já solucionei este problema. – Ele respondeu demonstrando uma
expressão clara de vergonha.
- Quer dizer, nós solucionamos este problema não é Richard?!
Berrou Arthur demonstrando que não queria ouvir
questionamentos. E arrematando antes que viessem mais comentários:
mais
– Então saibam que amanhã estaremos iniciando nossos trabalhos
nesta unidade, se não há nada a tratarem passarem bem, que estou exausto.
Todos assentiram com a cabeça, e em segundos os monitores foram
desligados, menos o da primeira mulher de nome Antonieta que estava no
Brazil como dizia a legenda.
- O que é Antonieta, tem ainda alguma pergunta? Porque sabe que
somente podemos tomar decisões quando estamos interligados mutuamente.
– Questionou Arthur agora com mais calma, afinal, não tinha a menor vontade
de ser indelicado com o amor de sua vida.
95
- Não meu amigo, mas fico pensando se esta sua mania de
grandeza não atacou seu juízo. – Ela foi ríspida, demonstrando que pelo
menos a primeira vista o amor não era recíproco.
Arthur respirou tentando manter a calma, sabia onde ela queria
chegar, mas desta vez não iria lhe dar o gostinho de começar uma briga.
– Não sei do que está falando minha querida Antonieta.
- Sabe sim meu caro Arthur, recebi informações que você tem saído
em expedições de investigações ultrassecretas, e, recentemente, pelo que me
consta uma gangue inteira de suspeitos de estupro e outras atrocidades foram
assassinados a sangue frio. – Ela fez uma pausa observando a expressão de
seu interlocutor que ficou inerte. – O que eu achei mais interessante é que os
corpos foram encontrados faltando tão somente partes de carne, isto não lhe
diz nada?
Arthur sorriu, estava muito alegre, afinal, se Antonieta teve o trabalho
de lhe observar era porquanto estava sentindo alguma coisa por ele...
- Me desculpe, mas creio que o que você disse anteriormente já
eliminou qualquer chance de resposta, afinal, eram uma gangue do mau e digo
que graças a Deus foram eliminados, muitas crianças irão agradecer por não
terem a infância perdida.
- Mas eu disse ainda um complemento, que eles eram suspeitos! – A
mulher disse rangendo os dentes, afinal, tinha confirmado suas suspeitas,
sabia que Arthur somente se esquivava para se vangloriar ainda mais com
seus feitos.
Arthur deu mais um sorriso, só que este foi de total ironia.
- Posso lhe garantir que confirmei antes se eles realmente eram
culpados. E não houve sequer tortura.
- Você me diz isto com está naturalidade? – A mulher disse agora
erguendo as mãos demonstrando sua perplexidade,
- Já discutimos isto antes Antonieta. Tenho que livrar o mundo
destas pessoas, e o sistema é totalmente falho contra eles, principalmente
quando envolve gangues em que há drogas e demais ramificações que retiram
qualquer chance dos governos legalmente os pegarem.
- Até que entendo sua atitude meu amigo. – Ela entonou mais a
palavra “amigo”, como uma forma de dizer que sua preocupação não passava
daquele sentimento de amizade. – Mas para que comer suas carnes, isto é
nojento. – Ela disse agora dando um tapa na mesa, demonstrando também
seu nervosismo com a situação.
Se ela está nervosa com isto é porque eu tenho uma chance, afinal,
ninguém se preocupa assim com outra pessoa se não há nenhum sentimento.
– Pensou Arthur quase explodindo de tanto amor.
- Me desculpe, mas você sabe os meus motivos...
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- Sei por que uma vez você tentou até me explicar, mas até hoje não
engoli estas suas desculpas. – Ela se mantinha firme.
- Você é vegetariana?
- Você sabe que não, afinal, já me levou para jantar várias vezes!
- Então me diga qual a diferença entre a carne humana e a de um
animal? – Ele foi quase que sarcástico na pergunta.
- De novo com isso Arthur... – Ela disse agora com desanimo. – Será
que você não tem outra desculpa, você sabe que há muita diferença.
- Sim, a uma grande diferença, há de que os animais não nos fazem
mal, os humanos sim. – Ele respondeu com o mesmo sarcasmo anterior.
- Mas isto não justifica matar um semelhante.
- É exatamente neste ponto que eu queria chegar minha cara
Antonieta. Você está diante de algo que foi criado por nossos antepassados
para protegerem nossa espécie, afinal, é mais sensato pregar que não
devemos comer nossos semelhantes, isto é apenas nossos instintos de
sobrevivência e perpetuação de nossa espécie falando.
- Você não quer realmente dizer que somos como os animais?! – O
questionamento veio seguido de um tom de reinvindicação de plausividade
com as ideias e ideais.
- Digo que o homem estava na natureza há milhares de anos. Que
ele era fraco do ponto de vista físico comparado com outras espécies.
Contudo, era forte devido a seu cérebro e capacidade de união. Lado outro, o
homem nunca tratou as diferenças como fatores que devem ser analisados,
assim, se são diferentes de sua espécie, ou seja, a humana era e ainda o é
caça. E digo mais, chegaram ao ponto de até mesmo diferenciar seres de sua
própria espécie como não dignos de mesmo tratamento somente por serem
diferentes, como ocorre até hoje infelizmente com negros e demais classes
menos favorecidas por este próprio pensamento.
- Não queira me dizer que os homens sejam racistas com os
animais, e, por isto, você seria diferente tratando todos da mesma forma, até
mesmo na hora de comer. – Ela respondeu demonstrando não estar
convencida, o que já estava presente em sua expressão de ceticismo.
- Não digo isso, mas te digo que um animal mata por instinto de
sobrevivência, não por prazer, ao contrário do homem. Assim, eu mato por
instinto de sobrevivência de meus semelhantes.
Antonieta tinha que concordar que aquilo era verdade, contudo, era
muito pouco para fazê-la mudar de pensamento quanto ao resto.
– Certo, então me diga no que isso ajudaria em sua explicação para
o canibalismo?
97
Arthur sorriu, ela estava começando a entender, se não a entender,
pelo menos ela demonstrava que o queria, que tinha curiosidade por suas
razões, isso já bastava.
- Eu vivo como em uma selva, e caço qualquer coisa para sobreviver
e manter vivos os meus semelhantes, mesmo que isto implique em aniquilar
seres de minha própria espécie, e, como na selva, como minha caça.
- Mas somos civilizados, você é a pessoa mais culta que conheço! –
ela respondeu arregalando os olhos de perplexidade.
- A civilização está desmoronando minha cara Antonieta, estamos
muito ligados a ideais legalistas e de direitos humanos, quando os julgados
não ligam para isso, afinal, matam e não estão nem ligando. Assim, eu cuido
para que pelo menos uma parte pague por seus erros.
- Você é um louco. Como pode comparar desta forma os animais
aos humanos, e ser o poder de polícia, legislador, julgador, executor, etc., isto
é inimaginável nos dias atuais, o era de forma absurda nos tempos medievais
e afins, e nós sabemos que levava em sua grande maioria das vezes a
excessos.
- Tenho que lhe confessar que tenho carinho pelos animais, mais do
que pelos seres de minha própria espécie, e, não é apenas isto que me faz
pensar desta forma...
- O que mais lhe faz pensar assim?... – Ela questionou voltando ao
tom de desanimo, sabia que ele iria tentar novamente lhe explicar o
inexplicável.
- Os animais matam por instinto de sobrevivência ou para
perpetuação da sua espécie, não por prazer ou para se vangloriar dos demais
ou acumular riquezas. Penso ainda que eles estão realmente em constante
evolução, mas não para modificação de sua escala de raça evolutiva material,
ou seja, do corpo, ou imaterial consistente na chamada alma.
- O que quer dizer por escala de raça nesta ordem? Entendi que esta
escala seria em nossos seres tanto na ordem de nosso corpo físico quanto do
que chamamos de alma, se ela existir. Contudo, não vislumbro porque você
colocou como escala. – Questionou novamente já deixando a descrença de
lado, Arthur tinha este poder, quando via que seu interlocutor estava cansado
de uma linha de raciocínio, ele mudava um pouco de foco criando um atalho
mais interessante, e ela estava agora muito interessada no mesmo.
Arthur sorriu, tinha agora certeza que se não estiva levando sua
conversa para uma convicção plena de sua amada, pelo menos ela estava
prestando atenção em seus motivos, isto era um grande passo.
- A teoria da evolução originada principalmente por Darwin, propõe
um conceito de evolução das espécies, onde estaríamos inseridos. Acredito
nesta evolução, lado outro, creio que ela vá ainda mais além, não apenas do
corpo material, mas também da alma. Contudo, muitos de nós colocamos
como se tivéssemos descendido do macaco, etc. Ou seja, colocam uma escala
de evolução das espécies, onde evoluiríamos gradativamente, mas colocam
98
como se estivéssemos evoluído de um ser que não acompanhou nossa
evolução. Posso até parar para pensar que nós assemelhamos a eles, mas,
isto para na semelhança, porquanto, se realmente tivéssemos a mesma raça,
porque eles não acompanharam nossa evolução? Às vezes penso que
poderíamos ser uma espécie diferente de macacos que evoluíram mais
dominando os demais. Lado outro, não acredito nisto com muita convicção,
mas é um dos meus pensamentos fortes para explicar pelo menos nosso corpo
material igual aos deles, apesar de ter o porco como na minha concepção e da
ciência o animal com o cérebro e demais órgãos mais próximo ao nosso, o que
deixa à incógnita: seriamos mais próximos do macaco que se assemelha ao
nosso exterior corporal ou do porco que se assemelha na ordem mais interna.
Ele explicava suas convicções de maneira frenética, e prosseguiu:
- Após concluir isso refutei completamente a ideia que teríamos
descendido de algum animal. Creio que já fomos uma raça menos inteligente,
comparada a animais e, assim, sucessivamente evoluímos gradativamente de
um tronco universal único, mais, porquanto, enquanto alguns primavam pela
força, nós evoluímos na inteligência. Assim, temos que ter amor pelos animais
e ajudá-los a evoluírem na escala evolutiva tanto material quanto imaterial, e,
fazendo isto estaríamos evoluindo ainda mais, talvez para um sentido mais
amplo de sabedoria e de liberação de poderes até mesmo considerados
atualmente paranormais, chegando-se a escala que poderia comparar
atualmente a um anjo.
Antonieta ficou muda na tela, sua expressão era de intensa
perplexidade, não com o que acabara de escutar, mas com o fato que não
bastava apenas ela ter ficado obcecada estranhamente por aquele homem tão
intenso e viril, mas pelo fato dele fazer com que ela pelo menos sentisse um
pouco do que ele pensava, ele quase a convencia de suas loucuras,
porquanto, ele tinha sempre uma resposta para tudo, e lhe assustava o fato
dele ter uma gama de conhecimento inimaginável, e traçar seus ideais não
apenas na ordem cientifica, mas acima de tudo na religiosa, misturando tudo
para formar um pensamento que mesmo que estivesse distorcido da realidade
ela tinha que admitir que fazia algum sentido.
Os pensamentos mais revolucionários foram os que modificaram o
mundo, e, na maioria das vezes para melhor... – Ela pensou.
- Entendo... – Fez uma pausa procurando a forma de lançar mais um
questionamento, o que estava difícil devido ao fato de ter se convencido
anteriormente, mas ainda não engolia o canibalismo dele, aquilo era horrível
de todos os pontos que pensava.
- Pode perguntar, te garanto que te responderei todos os seus
questionamentos com amor e paciência, como sempre o fiz. – Arthur abriu seu
coração ao prever que aquele era o momento de ser mais delicado para fisgar
pelo menos um pouco daquele amor que ele tanto ansiava.
- Somente tenho dúvidas como você ainda me explicaria à diferença
total social, cultural, e, principalmente, de posicionamentos que enfrentamos
atualmente, visto do ponto de vista de sua colocação anterior, porque não
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entendo que você queira dizer que evoluiria a um estado único se somos tão
diferentes.
Arthur suspirou aliviado, estava esperando uma pergunta capciosa,
mas aquilo era um manjar dos deuses, era a certeza que ela não tinha mais
nada para questionar, somente estava fazendo aquela pergunta para tentar
achar algum argumento para refutar sua exposição anterior, teia que ele não
iria cair como uma mosca.
- Conforme lhe disse, não há que se cogitar em um animal atual que
o homem poderia ter evoluído, ele evoluiu de um tronco comum. Lado outro,
ele é um ser único em sua espécie, pelo menos por enquanto! Assim, se no
decorrer dos anos neste planeta adquirimos pelos, os perdemos, fomos
grandes, pequenos, etc., isto não foi evolução no sentido de animal passar a
humano, mais no sentido de adaptação ao ambiente e, principalmente, de
evolução de nosso raciocínio lógico. Ou seja, há negros, e nem por isto eles
são diferentes, somente estão mais adaptados ao ambiente em que viviam na
evolução, qual seja, o calor da África, etc., onde o corpo na ordem evolutiva
liberou mais melanina para adaptação, ao passo que, os albinos estavam no
frio, razão pela qual, tem ausência de cor, etc. Ou seja, do ponto de vista
biológico evoluímos de acordo com nossas necessidades tanto ambientais
como de nossa sociedade como um todo. Portanto, do ponto de vista
fisiológico somos diferentes por está razão.
Ele olhou bem no fundo dos olhos dela, como se dissesse, espere
minha amada, ainda vou completar, então prosseguiu:
– Lado outro, você foi além, dizendo sobre diferenças mais
interiores, as quais têm que partir para o sentido de que todos os seres estão
em constante adaptação ao seu estado interior acompanhando a mesma
escala evolutiva do corpo em seus atos. Assim, teríamos que entrar em
questões culturais de cada região, religiosas, e tantas outras, as quais trariam
este fator de modificação. Agora sobre a ordem espiritual, não vejo outra
explicação a não ser uma ordem também evolutiva trazida pela elevação do
chamado espírito, visto que não seria crível conceber que alguém nasceria na
África na miséria, enquanto outro nasceria aqui na Inglaterra filho de uma
rainha! E, ainda, no que podemos chamar de fim ambos teriam o mesmo peso
e medida em seus atos, escolhas, etc., isto seria inconcebível do meu ponto de
vista. E digo mais, creio que um Deus que conceba isto como justo, se assim
realmente fosse aplicado, não seria digno de ser elevado como tal, visto que
não estaria promovendo a igualdade entre seus filhos.
Antonieta estava novamente perplexa e agora totalmente perdida na
avalanche de ideias e pensamentos que lhe foram jogados como sacos
pesados em seu cérebro. Era uma mulher inteligente, lado outro, Arthur estava
promovendo seus pensamentos em uma ordem frenética, partia do ponto de
vista de vários ângulos. Ela tinha que concluir que ele pelo menos buscou
vários estudos e reflexões antes de tomar suas decisões e escolhas. Não tinha
ainda um pensamento formado, mas uma coisa era certa, ele estava
finalmente arrancando dela após tantos anos algum sentimento...
100
- O que diz? – Clamou Arthur para que ela prolongasse a conversa,
afinal, somente de dialogarem e ele poder olhar seus olhos já era motivo para
ele ter em suas mãos todas as riquezas do mundo.
- Somente digo que você é o homem mais misterioso que eu já
conheci. E creio que para realmente decifrar este mistério necessitarei de mais
tempo... – Ao final ela perdeu-se em seus pensamentos, porquanto, seu corpo
queria dizer que estava pegando o primeiro voo para encontrá-lo, mas seus
pensamentos diziam que ele ainda era um problema maior do que o fascínio
que causava.
- Enquanto vida eu tiver saiba que eu estarei lhe esperando. Então
lhe digo minha amada que se queres tempo, não peça a mim, mas sim ao ser
onipotente, mas confuso que acreditas como seu criador, porquanto, somente
ele poderia retirar de nós a oportunidade de vivermos nosso amor.
Antonieta estava arrepiada, nunca esperava uma declaração linda
como aquela, afinal, desde que se conheceram sempre recebeu galanteios
dele, mas nunca diretos e com tanta intensidade. Somente teve tempo de sorrir
e desligar seu monitor, do contrário Arthur teria visto uma lágrima escorrer por
seu rosto...
Arthur abaixou os ombros, tinha ainda esperanças de viver seu
grande amor, mesmo que isto custasse sua fortuna.
Após olhou para os demais monitores, havia se safado por pouco de
todos os componentes do Conselho, afinal, sabia que se a conversa deles
prosseguisse não teria mais argumentos, porquanto, realmente estava muito
atrasado no início dos trabalhos, mas tinha a convicção de que havia montado
uma excelente equipe, sabia que poderia cumprir para com sua missão, mas
um medo não saiu de sua mente:
Será que vamos conseguir barrar tamanha desgraça que está por
vir? – Seus pensamentos tilintavam, afinal, a incerteza era sua maior aliada, já
salvará sua vida em muitas vezes, e tinha a convicção que fez o certo ao
aumentar seu poderio naquela nação...
101
CAPÍTULO 26
Dimensão Suprema / Vilarejo na França, 1982.
Gabriel já estava impaciente, todos os Arcanjos e Anjos aguardavam
Miguel, encontravam-se sentados na grama à beira de um lago na Dimensão
Suprema, mas nem sinal dele...
Cosme muito poderoso, já havia recobrado suas energias, e reunido
alguns amigos seus para a batalha. Na realidade eles eram apenas espíritos
comuns extremamente evoluídos, mas que na linguagem da terra eram tidos
como: “santos ou espíritos de luz”, encontravam-se na última escala para se
tornarem Anjos, para por último caso conseguissem se tornarem Arcanjos,
uma força que até então era tida como a mais poderosa entre os entes do
bem, os quais eram comandados por Miguel, que decidiu unir forças com todos
estes entes mais evoluídos e formar o que diziam Exército Celestial.
Lado outro, o termo exército era repugnado pela maioria de seus
membros, visto que eles entendiam que ele pressentia um tom muito pejorativo
de batalha física, o que não era o fim da coalizão e formação deste grupo, mas
sim manter a ordem.
Contudo, os Arcanjos Gabriel e Antanael, bem como, a Anja Serena
e o santo Expedito gostavam muito deste termo, os primeiros porque estavam
sempre sedentos por combate, a segunda porque era uma defensora ferrenha
da casta das Anjas e Arcanjas, tidas erroneamente como seres sensíveis, o
que contrastava com o espírito das mesmas. O último, Expedito, porquanto,
era o chefe da ala dos santos na área de combate.
Em suma, todos eles não acreditavam em paz sem luta, por isso
estavam sempre em constantes debates junto ao núcleo dos que pregavam a
filosofia e o diálogo.
Os espíritos de luz não acompanhavam os guerreiros, lado outro,
Cosme teve a ideia de juntar este grupo de amigos para lhe acompanhar junto
aos Arcanjos e Anjos celestiais, unicamente na tentativa de amparar seu
grande amigo de encarnações Damião, bem como, mormente, proteger o
nascimento de Joana na terra.
Expedito estava muito envolvido com uma batalha travada em outra
frente, em uma dimensão tida como a mais perigosa, o chamado inferno, eles
tinham que tirar de lá um ser, e não poderia ir pessoalmente, mas reservou
alguns dos melhores de seus homens para amparar o amigo.
Quando menos esperavam, uma forte luz branca começou a
aparecer na água do lago próximo a eles...
A água começou a borbulhar, e todos se levantaram estranhando e
em prontidão para o pior. Lado outro, de dentro dele saiu Miguel, ele estava
completamente molhado, todos que o aguardavam soltaram um suspiro de
alívio, e alguns tornaram a se sentar na grama em sinal de alívio.
- Não se sentem, peguem às armas supremas! – Ordenou de pronto
Miguel, já deixando claro que não tinham tempo. Ao passo que os Santos
102
começaram a pegar espadas brilhantes, e os Anjos e Arcanjos harpas
celestiais com várias flechas e também espadas e correntes.
Menos Gabriel, que continuava imóvel, com olhar de desconfiança
para Miguel que já acabara de sair completamente da água e se dirigia ao
grupo em passos curtos.
Quando finalmente Miguel chegou bem próximo à Gabriel, este não
se conteve:
- Miguel! Sei que é meu superior, e lhe devo enorme respeito, mas
poderia me dizer por que estava usando a água como condutor, será que você
estava tão longe assim para querer viajar tão rápido, e a ponto de arriscar sua
vida em uma transição de risco?
Miguel fuzilou Gabriel com um olhar penetrante e frio, nos mesmos
passos curtos se dirigiu em direção ao Arcanjo, e quando chegou bem perto de
seu ouvido falou calmamente, mas com a voz áspera e fria como seu olhar:
- Falou bem no começo Gabriel, ao dizer que sou seu superior e
sobre respeito que deve a mim! Mas o final me soou como um
questionamento, não como uma preocupação de amigo. Portanto, é bom medir
suas palavras, porque não estou de bom humor, e se quer me interrogar, o
faça diretamente!
Gabriel abaixou a cabeça envergonhado pedindo desculpas. Miguel
sorriu, abraçou o amigo, dizendo:
- Não tem problema meu amigo.
Contudo, ao abaixar a cabeça Gabriel viu que o amigo somente
estava com sua harpa celestial nas costas.
Onde será que Miguel deixou sua poderosa espada? – Indagou
somente para ele mesmo, preferindo deixar esta pergunta somente no
pensamento devido à resposta anterior, sabia que Miguel não estava nada
calmo, e um questionamento desses poderia colocar a perder até mesmo a
batalha que estavam para enfrentar...
Cosme correu ao encontro de Miguel, e o abraçou.
- Meu amigo, quanta saudade! Queria conversar mais com você,
mas como demorou tanto, tenho que te apressar o máximo, Damião corre
perigo, e precisa de nós de forma urgente.
- Sei disso! – respondeu Miguel diretamente, também não querendo
maiores delongas, somente acrescentando:
– Não precisa se preocupar, iremos agora mesmo, e pela água, é
bem mais rápido!
- Como assim pela água? Não temos o poder de viajar assim!
Podemos morrer, é muito rápido e perigoso. - Cosme disse arregalando os
103
olhos demonstrando seu medo tremendo, seguidos por todos, os quais se
entreolhavam assustados.
Miguel olhou todos os Arcanjos, Anjos e Santos que ali estavam,
deviam ser uns cinquenta ao todo, e após um longo suspiro começou a dizer:
- Primeiramente agradeço por terem vindo. Damião precisa de nossa
ajuda, e Joana precisa mais ainda. Os dois correm mesmo sérios perigos,
Lúcifer enviou uma grande legião de demônios para lá. – Todos ouviam
imóveis. - O filho das trevas foi concebido, não consegui evitar, cheguei tarde e
o próprio Lúcifer é quem promoveu a concepção, não Serfalos como
pensávamos!
Após proferir as últimas palavras o que era silêncio, virou burburinho,
todos se viraram uns aos outros com caras de espanto e falando que aquilo
não poderia ser verdade.
Miguel soltou um grito de fúria fazendo todos se assustarem, logo
em seguida ele vociferou como um animal selvagem sedento de fome:
- Não temos tempo para questionamentos! Vou transportá-los pela
água, porque não temos tempo para ir pelo modo normal da luz, então os que
quiserem podem ficar, mas os que forem que venham rápido!
Após falar, Miguel se virou indo até a ponta do lago. Mesmo com
extrema desconfiança todos que ali estavam decidiram lhe seguir.
Miguel ergueu às mãos, rezou algo em uma língua estranha a todos
os presentes, depois levou às mãos até a testa dizendo:
- Senhor dê-me o poder de levar todos estes irmãos através do
condutor universal, não temos tempo! – Após, a água foi ficando escura, todos
estavam espantados, Miguel estava com poderes nunca antes vistos e
alcançados por qualquer ser, ele se abaixou e tocou na água, de repente
começou a aparecer imagens, era de um quarto escuro iluminado somente por
velas, e de aparência humilde. Às janelas eram de madeira lascada, e na
parede havia uma lareira.
Deitada sobre uma cama encontrava-se uma mulher grávida, e em
volta dela um homem que aparentava ser seu esposo, e mais três crianças. A
criança mais nova foi até a porta abrindo-a, entrando um senhor.
Cosme ao ver aquilo soltou um enorme sorriso, sabia que era
Damião que ali entrará, ainda iria fazer o parto...
A alegria de Cosme foi cortada quando ele avistou a única janela de
vidro no quarto, era possível ver o lado de fora da casa que se encontrava
coberto de neve, a qual caia fortemente.
Contudo, algo atraiu a atenção de todos, inexplicavelmente o vidro
da janela estava começando a trincar-se, e em segundo apareceram às
feições de vários demônios, alguns estavam batendo fortemente na janela,
eles estavam quebrando a barreira dimensional, não podiam ser vistos pelos
104
seres encarnados, mas em breves todos que estavam naquele quarto estariam
mortos e estilhaçados quando conseguissem o que tentavam.
De repente algo ainda mais assustador apareceu, muitas armas, os
demônios estavam com poderio celestial, onde a sua maioria poderia
certamente ferir ou aniquilar não só a matéria, mas as almas das pessoas que
estavam naquele quarto, porquanto, todas elas eram certamente armas
celestiais advindas da era medieval da grande batalha mitológica.
Miguel não sabia como eles conseguiram aquelas armas, mas este
era um assunto para ser resolvido depois, porque com aquelas armas tudo
mudava drasticamente, afinal, os demônios além de serem vários, eram
capazes de aniquilar qualquer alma, até mesmo a deles. Então ele olhou para
todos, dizendo calmamente:
- Bem, já analisamos a área, chegaremos lá rapidamente, mas a
viajem poderá nos deixar um pouco zonzos devido à extrema velocidade de
quebra de partículas de nossas essências, portanto, ao chegarmos, quero que
vocês rapidamente se abaixem ao chão, eu os protejo até que consigam ficar
em pé. – Fez uma pausa, olhando nos olhos de cada um, era um olhar de
transmissão de confiança, Miguel sabia que todos ali estavam com medo. Após, tomem cuidado, não quero ter nenhuma baixa hoje, precisaremos de
todas as almas superiores, porque o pior ainda está por vir, pelo que pude
perceber, além da própria barreira de divisão do plano material com o celestial,
Damião conseguiu criar uma barreira cósmica de proteção em volta da casa,
que os demônios estão tentando neste momento quebrarem...
Após, Miguel mandou que todos dessem as mãos e entrassem na
água, ao passo que, mal haviam entrado, já estavam caídos ao chão cheio de
neve da França, todos estavam tontos, e alguns vomitavam, não haviam
sequer visto a viajem, a qual foi literalmente em um piscar de olhos.
Gabriel que também estava muito tonto, somente conseguia ver a
sombra de Miguel, o qual atirava flechas em todas as direções em grande
velocidade.
Há medida que todos recobravam a consciência, podiam ver a
grande quantidade de demônios, eles estavam por todas as partes, até sobre a
casa, e quando perceberam a presença deles, imediatamente começaram a
avançarem em ataque, estava formada a batalha...
Miguel rezava em várias línguas, intercalando flechas com água
benta naqueles que conseguiam se aproximar mais. Gabriel nunca tinha visto
tamanho poder, Miguel poderia facilmente vencer todos os demônios sozinho
com aquela agilidade.
Neste momento, Gabriel levou à mão direita as costas, retirando sua
harpa, puxou as cordas formando um arco, e retirou flechas das costas em
movimentos rápidos, acertando vários demônios em segundos. Nisto vários
Arcanjos que já haviam se recuperado fizeram a mesma coisa, os santos ainda
estavam no chão, alguns ainda agonizavam tontos, outros já tentavam ficar em
pé, e às Anjas principalmente Serena estava estraçalhando demônios com
correntes e umas pequenas espadas, como leoas caçando.
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Nisto Miguel olhou para Gabriel ordenando:
- Me de cobertura meu amigo. Serfalos está na janela, ele vai
arrebentar a barreira, se conseguir invadirá a casa e matará a todos!
Nisto Miguel abriu suas longas asas, em apenas uma batida ele
voou para muito alto, alguns demônios olharam para cima, e avistaram algo
impressionante...
Os outros que não viram Miguel falar com Gabriel ficaram com medo
e até pensando que ele havia abandonado a batalha, contudo, se
impressionaram ao perceberem que ele sumiu, mas que algo estava perto de
acontecer.
Ao chegar ao alto, Miguel plainou, virou-se rapidamente de costas a
batalha, e começou a bater suas enormes asas indo em velocidade
inquantificável à casa. A cada batida de asas se formava uma forte rajada de
ventos que jogava ao chão vários demônios.
Seu poder era incrível, até mesmo os demônios estavam perplexos,
sem contar Gabriel e os outros, a batalha parou por algum tempo, todos não
conseguiam se movimentar direito com os ventos que vinham do céu.
Ao ver que os demônios caiam ao chão, os santos que já se
encontravam de pé, tentavam avançar com suas espadas, cortando suas
gargantas. Miguel ao ver que os amigos dariam agora conta dos demônios
sozinhos, como uma águia avistou sua presa, sem dúvida Serfalos.
Logo após, voou ainda mais alto, até sumir, Gabriel ao olhar aquilo,
por minutos achou que Miguel os havia abandonado.
Neste momento, uma grande bola de fogo começou a cair do céu, os
demônios pararam para ver o que era aquilo e até mesmo os santos que
tentavam cortar as gargantas destes pararam devido ao susto.
Serfalos que até aquele momento sequer havia virado de costas
para a batalha que era travada, agora olhou para cima, afinal, aquela bola de
fogo estava vindo bem em sua direção!...
106
CAPÍTULO 27
Berlim – Alemanha, 1982
Sentado em uma poltrona em uma grande sala da sede do governo
da Alemanha encontrava-se o mesmo homem que há horas atrás estava em
videoconferência com Arthur, ele analisava vários documentos, batendo na
mesa em tom de descontentamento.
De repente uma mulher entrou na sala.
- O que deseja senhor. – Ela questionou seguido de um largo
sorriso.
- Feche a porta. – A ordem foi direta e seca.
A mulher fechou a porta se dirigindo a uma poltrona de canto que
Richard que era seu chefe apontara. Ela odiava está mania dele de ficar
apontando para os lugares ao invés de falar o que queria rápido para ela não
ter que ficar olhando para aquela cara estranha e branquela do mesmo.
- Vou ser bem direto! – A mulher suspirou de alivio com o que
acabara de ouvir, voltando deste estado após as palavras seguintes do
homem:
- Quem está espionando meus documentos?
A mulher ficou pálida, tendo falar:
– Senhor, não ssee iii... – Ela começou a gaguejar.
- Quer dizer “não sei do que está falando”, mas, não consegue não
é? – O questionamento veio agora em tom de deboche.
- É isso senhor, estou nervosa porque o senhor parece estar me
acusando. – Ela tentou justificar a gagueira.
- E estou mesmo! Afinal se alguém tem acesso a tudo que tenho é
você...
Ele terminou deixando as palavras se esgotarem no tempo, como
que esperando que ela completasse que outras pessoas que ele não tinha
conhecimento que estavam tendo acessos ao seu gabinete.
- Isso é realmente verdade, contudo, nos últimos meses o senhor
está recebendo muitas pessoas, principalmente, os que chegam portando uma
estranha identificação azul que não tem nenhum símbolo. – Ela tentou achar
uma explicação.
Richard estremeceu, realmente tinha recebido vários membros do
Conselho no último mês, eles se apresentavam à secretária através de uma
carteira azul, ao passo que, ele já havia deixado ordens claras para deixarem
entrar mesmo se ele estivesse em reunião.
107
- Alguma destas pessoas ficou sozinho em minha sala? – O
questionamento agora mudou o tom, fazendo Rochele ficar mais calma, e
pondo-a a pensar.
- Não senhor... – Ela fez expressão que estava tentando forçar o
pensamento. – Creio que somente os chefes de estado, mas eles não
portavam estes documentos, e, mesmo assim, eles ficaram sozinhos somente
pelo tempo em que o senhor se despedia de convidados ou cancelava as
reuniões na sala ao lado.
- Pode se retirar! – Ele ordenou já se levantando e retornando para a
grande mesa.
Rochele saiu rapidamente para a recepção. Ao chegar ela avistou
todo o saguão, e vendo que ninguém olhava pegou um pequeno aparelho
celular digitando rapidamente um número. Após algum tempo, o interlocutor
atendeu a ligação:
- O que quer minha querida Rochele? – A voz era rouca, mas muito
amável.
- Temos que retirar todas as escutas e grampos da sala do Richard,
ele parece que desconfiou de algo! – Ela foi direta e seca.
- Como assim está desconfiando de algo? – O interlocutor mudou o
tom de voz, agora estava evidente que ficou preocupado com o que acabará
de ouvir.
- Ele me fez vários questionamentos, avise a KGB que teremos que
interromper a missão, e pode providenciar meu retorno para a Rússia o quanto
antes, porque creio que em questão de horas estarei em grandes apuros... –
Ela desligou o telefone, abriu-o retirando o chip quebrando-o, após foi ao
banheiro o jogou no vaso dando imediatamente a descarga.
Terei que sair sozinha mesmo, até aqueles paspalhos vierem possa
já estar perdida. – Pensou já se dirigindo para o vestiário.
Ao adentrar o vestiário tomou um enorme susto, um homem alto e
corpulento a esperava.
- Sente-se meu bem, precisamos conversar! – Ele ordenou exibindo
um sorriso brilhante, seus dentes eram todos de metais diversos, parecia que
misturou ouro, diamante, prata, cobre, tudo...
- Não tenho nada para conversar. – Ela disse tentando voltar ao
corredor.
Lado outro, em um movimento muito rápido, o homem voou em seu
pescoço, enlaçando-a sem oportunidade de defesa.
Ela era uma agente da KGB altamente treinada, contudo, ao tentar
sair dando uma cotovelada no homem quase quebrou seu cotovelo.
108
- Vejo que percebeu que não são somente os meus dentes que são
confeccionados em metais. – O homem disse bem próximo ao seu ouvido, em
tom de ironia, complementando:
– E sobre conversarmos, estou cancelando, porque já vi que você
não é muito magrinha, não faz o meu estilo.
Nisto ele torceu a cabeça dela quebrando seu pescoço de uma
forma tão abrupta e brutal que seu rosto foi parar em sentido oposto ao corpo,
e o estranho homem ficou olhando o mesmo agora que estava à frente do seu.
De uma forma demoníaca ele sorriu ao ver o sangue escorrer pelo
nariz da moça que havia morrido instantaneamente, após deu um beijo em
seus lábios, dizendo com o mesmo tom irônico:
- Você beija muito bem!
Soltou o corpo que se estatelou ao chão, saindo pela porta sorrindo,
afinal, havia cumprido parte do trabalho, agora tinha que viajar para a
Inglaterra, tinha contas para acertar com um velho, esta seria sua próxima
missão.
Ao sair do vestiário, ele sacou um telefone do bolso, o qual somente
tinha um número na agenda, o qual enquanto chamava estava gravado no
visor como: “cliente atual”.
- Senhor, já eliminei a agente da KGB que estava prestes a
abandonar a missão, após somente temos que fazer pensar que foi Richard
que matou ela, exibindo a fita dele a interrogando momentos antes para a
polícia local, a qual vou deixar na delegacia por um mensageira, já que estou
em direção a Inglaterra neste momento para cumprir a segunda parte de
minhas missões. Vou ligar para Richard agora, para que ele vá ao vestiário,
isso será fácil, ai a policia terá todas às evidencias.
- Certo Carbono, muito bem, seu dinheiro para este primeiro trabalho
será transferido neste momento, vá com bastante prudência para a Inglaterra,
e tenha mais cuidado ainda, porque incriminar Richard para tirá-lo do jogo será
fácil, mas seu próximo alvo será mais difícil de eliminar. – Respondeu uma voz
estranhamente grossa do outro lado da linha.
Carbono olhou para o celular com impaciência, não acreditava que
seu cliente estava duvidando de seu poder, mas resolveu somente responder
de uma maneira rápida, afinal, ainda tinha que arrumar um mensageiro antes
de pegar o voo:
- Certo senhor Xotono...
109
CAPÍTULO 28
Vilarejo na França, 1982
Serfalos não entendia o que poderia ser aquilo, era tão rápido que
ele não tinha tempo para pensar, então em um movimento rápido ele levantou
às mãos e começou a mencionar algumas palavras em voz alta, em uma
língua totalmente desconhecida para os seres terrestres, era Argemano, uma
língua mitológica dos Arcanjos, o que ele era antes de partir para o lado das
trevas.
Contudo, não sabia que aquilo que estava indo em sua direção não
era uma simples bola de fogo, era Miguel, ele voava em tamanha velocidade
que o fogo se formava como um meteoro entrando na atmosfera terrestre.
Quando viu que sua magia mitológica não adiantou em nada,
Serfalos tentou correr, saindo de perto da janela, como Miguel queria.
Contudo, não deu tempo de ir muito longe, a Bola de fogo o acertou
em cheio, após houve uma grande explosão...
O poder do impacto foi tão grande que estourou a barreira
dimensional, razão pela qual no local do impacto formou-se uma enorme
cratera já na dimensão material, e devido ao grande calor da bola de fogo a
neve de toda região derreteu-se imediatamente...
Todos que estavam perto foram arremessados, e os que estavam
dentro da casa correram para a janela, exceto Damião e a mãe.
Neste momento, a mãe que estava completamente suada e cansada
de fazer força se aliviou, o bebê finalmente havia nascido, e foi levantado por
Damião, ela chorava, era uma pequenina menina, Joana finalmente voltava a
terra após muitos anos...
******
- Como assim acusado de homicídio?! – Arthur bradou no telefone.
Após o interlocutor ter explicado, ou pelo menos tentado explicar ele
logo retrucou:
- Tenho que iniciar meu complexo, ligue para outros membros, sei
que isso parece ser coisa de um desafeto, lado outro, você têm que saberem
resolver seus próprios problemas. – Bateu o telefone com extrema força,
literalmente, bufando de fúria.
Tenho que fazer tudo, e depois dizem que eu atraso para começar
meus trabalhos, não veem que eu tenho muito trabalho! – Ele pensou ainda
com raiva. Não sabendo que o problema estava naquele momento viajando ao
seu encontro, Carbono dormia na viagem, sonhando com morte e dinheiro...
110
CAPÍTULO 29
Londres – Inglaterra, 1982
No dia seguinte, ao se aproximar da mansão do velho Arthur,
Charles não podia acreditar, havia uma dezena de helicópteros já na pista de
pouso e muitos outros se preparando para pousar. Carros de todos os tipos e
estilos chegando, era como se fosse ocorrer uma festa, contudo, ele sabia
muito bem no que se consistia aquela festa.
Tenho que confessar que não será fácil fazer a segurança desta
mansão, afinal, mesmo ela ficando muito afastada da cidade de Londres, o que
ajudará na instalação dos dispositivos de seguranças na área externa, isto
também será um bloqueio para o caso de necessitarmos de evacuação. – ele
pensava e passava a mão na barba por fazer que adquirira em pouco tempo
de literal caos daqueles dias – Lado outro, facilita no setor de descrição, afinal,
a imprensa não liga muito para Arthur pelo que pesquisei, ele não é nenhum
artista, mas certamente com tanta movimentação, se fosse à área urbana iria
atrair a atenção de vários fotógrafos e demais transeuntes. – Igualmente na
noite anterior seus pensamentos ainda não paravam, e agora novamente
próximo à mansão eles pareciam lhe afligir ainda mais.
Parou próximo ao portão, e imediatamente ouviu uma voz eletrônica
dizer para descer do veículo e colocar mãos e olhos em sensores disponíveis
em um pequeno compartimento próximo à grade, localizados em uma pequena
mais eficiente guarita de segurança inteligente e totalmente automatizada.
Não terão ainda às minhas informações, afinal, não fui submetido a
nenhuma leitura para carregar no sistema. – Raciocinou ele o que parecia o
óbvio, somente parecia, porque após decidir colocar às duas mãos no
compartimento inferior e a cabeça no superior, em questão de minutos várias
luzes iniciaram o processo de identificação, o qual foi muito rápido, quando se
virou notou que havia outra guarita no lodo oposto do veículo, a qual também
emitia uma luz parecida com um laser, ela parecia que estava sondando todo o
automóvel.
Será que ele conta também com scanners para o veículo? – e
prosseguiu em seus pensamentos – Isto é realmente fascinante, não notei
nenhum destes equipamentos em minha última visita, e tenho certeza que não
dei meus dados fisiológicos para este scanner me identificar, além disso não
havia dados sobre nenhum destes dispositivos nos arquivos que recebi para
meu serviço anterior... – Parou subitamente, devido a um pensamento que lhe
fez paralisar até a alma, ele era simples, porém direto ao ponto:
Será que o velho estava querendo que entrássemos em sua
mansão, e, por isto plantou informações falsas e facilitou nossa entrada
naquele dia? Se assim o fosse, ele pôde nos surpreender ao invés do inverso,
como o fez!
Estava muito intrigado, mas retornou à realidade após a voz
eletrônica emitir um som de que estava tudo em perfeita ordem e o portão
abrir-se automaticamente.
111
Ele retornou ao veículo agora com mais este pensamento, não podia
acreditar que havia sido engado por um velho.
Ao adentrar na mansão Charles foi cumprimentando a multidão que
entrava, muitos usavam jalecos, outros paletós, mas ele tinha apenas uma
certeza, eles não eram apenas bem vestidos, eram muito eficientes em seus
ramos.
Pelo que pôde perceber, parecia que alguns já se conheciam,
falavam em várias línguas, se abraçavam e outros pareciam não serem muito
amigos. Como ele falava várias línguas foi cumprimentando-os nas línguas que
ele percebia que eles falavam, e à medida que eles lhe saldavam, ele
percebeu que os que saiam do heliporto também tinham que passar por uma
guarita eletrônica como ele passou, estava muito satisfeito com o que o velho
já havia feito em termos de segurança.
- Charles! – Uma voz grossa e em tom antipático soou ao longe, e
ele não precisou sequer se virar para saber que se tratava da Dra. Kim. Mas
por educação virou-se exibindo um sorriso, e respondendo:
- Bom dia Dra. Kim, fico feliz em vê-la.
- Bom dia somente se for para você! Eu não dormi nada cuidando e
dopando aqueles desgraçados de seus homens.
- Dopando? – O questionando veio com uma expressão de
perplexidade.
- É lógico, acha que eu sou aquele velho maluco do Arthur para
colocar aqueles psicopatas para dormir utilizando armas sofisticadas boladas
em meu laboratório!
- Foi à senhora que inventou aquela... – Antes mesmo dele
questionar ela respondeu, parecia que não queria perder muito tempo naquela
conversa, assim ela foi falando e andando, e Charles teve que admitir que a
mulher realmente tinha fibra.
- Claro, como tantas outras que estão em meu laboratório, contudo,
devo admitir que aquela em especial não foi por mim desenvolvida, mas por
alguém muito especial... – Ela fez uma pausa perdida em seus pensamentos,
como se estivesse lembrando-se do criador com carinho, sentimentos que
Charles até então achava que ela seria incapaz de ter. – Mas tenho que lhe
advertir que conto com um time de primeiro nível, não chegam aos meus pés,
mas são muito bons.
Humildade também não deve ser o seu forte. – Charles somente
pensou, não ousaria dizer isto nunca em voz alta, afinal, tinha amor por sua
vida.
- Creio que o velho não lhe explicou que você e sua equipe
trabalharão com conexão mais direta ao meu laboratório.
- Não. – Charles resolveu resumir suas respostas para afirmativas e
negativas. Eles já estavam entrando na mansão e ele percebeu que a Dra. Kim
112
somente recebia cumprimentos, mas nunca os respondiam, sequer balançava
a cabeça.
Ela deve ser muito importante mesmo. – Pensou o que parecia ser o
óbvio.
- Então, ele somente tem tempo para conversar de bobagens e
utilizar meus produtos, mas agora já sabe desse detalhe. – Ela foi seca.
- Ele somente conversa bobagens? – Ele questionou em tom de
brincadeira.
- Isso também, mas não subestime ele, afinal, é simplesmente a
mente mais poderosa que eu já conheci. Dizem que todos são ignorantes só
que em assuntos diferentes. Eu diria que Arthur é uma pessoa que sabe de
tudo um pouco, e esse pouco é o muito de outras pessoas. – A Dra. Kim
rasgou-se em elogios, ao seu modo, mais elogios, assustando muito Charles
com a forma que ela dizia tudo aquilo.
Será que essa velha tem alguma queda por aquele velho louco? –
Se perdeu novamente em seus pensamentos.
- No que está pensando? – A Dra. Kim o tirou de seus pensamentos,
ao perceber que algumas vezes ele ficava aéreo.
- Me desculpe. – Ele tentou se recompor de seus devaneios,
mudando o rumo da conversa. – Mas o que vamos fazer?
- Isso é óbvio seu besta. Eu chefio o laboratório de ciência e
tecnologia, desenvolvo armas e outros produtinhos de inteligência. E como
você vai ser o chefe de segurança e de inteligência, creio que não preciso dar
maiores explicações.
Nossa, ela chama de produtinhos uma coisa como aquela bengala,
acho que vou gostar mais desta mulher do que estava pensando... – Pensou
agora sorridente.
- Tire este sorriso de seus lábios, afinal, não sabe ainda a dimensão
de seus trabalhos e, principalmente, responsabilidades.
Charles estremeceu.
- Mas... – Tentou falar, sendo novamente interrompido.
- Mas o que?! Você ainda acha que vai somente ficar aqui dentro
fazendo segurança meu caro? – Agora foi ela que sorriu.
- Não, mas... – E foi novamente interrompido.
- E ai está o “mas” novamente, pare de dizer isso!
Ele quase que gritou, mudando sua expressão. Contudo, a doutora
não dava trégua:
113
– Nunca pense dessa forma Charles, afinal, este local é uma
fortaleza. Sabe aqueles scanners? – ele somente afirmou com a cabeça. –
Eles foram todos desenvolvidos por minha equipe, quando o sujeito coloca a
mão ou o carão lá, o sistema de computação acessa um banco de dados de
todas as agências de inteligência do mundo. Lógico, tenho que admitir que
sem eles saberem. Assim, ele após mapeia tudo, e, somente após certificar
que o sujeito não é nenhum criminoso ou algo deste tipo, ele libera os dados
para nosso sistema, o qual averigua se é algum amigo de Arthur fazendo uma
visita, algo raro – ela fez cara de desdém – ou se é alguém que trabalha aqui,
e libera ou não sua entrada.
- Nossa! – Ele disse não contendo seu espanto com o que acabará
de ouvir. – Mas ele é tão rápido, como é possível fazer isso tudo em questão
de segundos?
- Digamos que você tem privilégios meu caro, mas nunca saberá de
tudo, somente do essencial. – A resposta veio seca, como todas às outras. – E
não quero que você fique de papinho com estes sujeitos. – Disse ao ver que
ele estava respondendo os cumprimentos que lhe eram dirigidos pelas
pessoas que também estavam adentrando na mansão, ao contrário dela que
os ignoravam.
- Mas eu somente estou cumprimentando eles. – Ele tentou se
justificar.
- Começa assim, após eles se aproximam, e ai você acha que são
seus amigos.
- Mas eles não são da confiança de Arthur?
- Meu caro, você é o chefe de segurança! – Ela berrou novamente,
fazendo com que algumas das pessoas que passavam naquele momento perto
deles pulassem de espanto.
- Sei disso, mas não devemos presumir que não são de confiança. –
Ele respondeu com convicção.
A Doutora fez cara de descrença, a qual em questão de minutos deu
lugar a uma de fúria, ao passo que ela parou de andar e berrou ainda mais
alto:
– Escuta aqui seu idiota, porque vou lhe explicar somente mais uma
vez. Eles são os mais altos profissionais em seus ramos, podem ser honestos,
enfim, tudo. Contudo, o que estamos fazendo envolve muito mais do que
profissionalismo, assim, eles podem muito bem mudar de time! Bem como, tem
o fato de que vão ficar à maior parte do tempo confinados neste local. Assim,
você tem que treinar seus homens para se aproximarem deles, mas não muito,
somente a ponto de analisarem algo suspeito, etc.
- Então vamos espionar a equipe? – Ele estava espantado com a
cautela que a Doutora tinha, a ponto de desconfiar de todos sem qualquer
motivo para tanto.
114
- Isto será seu maior trabalho aqui, porque quem está de fora sequer
sabe deste lugar, e os que sabem estão aqui dentro, então, então... – Ela
deixou o resto para que ele pudesse raciocinar.
Charles tinha que admitir que a Dra. Kim estava certa, aquilo era
realmente necessário.
Após começaram a caminhar novamente até chegarem à parede da
noite anterior. Já haviam algumas pessoas próximos a ela, as quais abriram
passagem após verem que era a Dra. Kim que esperava.
Ela realmente é muito importante. – Charles concluiu, afinal,
cumprimentar alguém que não responde ainda era razoável, mas abrir espaço
era demais.
Todos foram abrindo espaço para ele e a Dra. Kim se aproximarem
da sala onde havia o estranho elevador, à medida que esperavam que o
elevador retorna-se a Dra. Kim ficou satisfeita, ela notou que Charles já havia
mudado de expressão, cumprimentava as pessoas, mas seu olhar havia
mudado, tinha amizade neles, mas era falsa, ele parecia uma raposa,
sorrateira e astuta.
Creio que o velho Arthur não perdeu o tino para escolher às pessoas
que ficam ao seu lado, este rapaz parece perfeito para o trabalho. – Pensou
deixando transparecer o que nem de longe parecia um sorriso, mas era o mais
perto que uma pessoa como ela conseguia expressar.
******
Uma das Anjas olhava com ternura pelo vidro da incubadora.
- Clissida, será que algum dia poderemos ter a oportunidade de
gerar algo tão lindo e meigo assim? – Ela disse para a Anja que estava com
ela fazendo a guarda direta de Marcos.
- Já tivemos esta oportunidade e não valorizamos Gena. – A
resposta foi direta, demonstrando que a outra Anja não nutria o mesmo
sentimento, ou pelo menos não o externava.
Neste momento Gena deixou cair uma lágrima...
115
CAPÍTULO 30
Vilarejo na França, 1982
Os demônios e os seres celestes que não foram arremessados
pararam de lutar, estavam todos naquele momento olhando espantados e
horrorizados à cratera que se formou.
Bem como, o esposo e os três filhos da mãe da pequena Joana
ainda olhavam incrédulos, mas não viam nada além da cratera ao longe, afinal
de contas, não possuíam o dom da visão através da barreira, e a luta estava
literalmente ocorrendo em outra dimensão.
Por outro lado, Damião entregou a pequena Joana para a mãe que a
olhava com toda a ternura, deu um beijo na testa de ambas, e colocando as
mãos para trás, retirou das costas uma espada enorme reluzente, a qual o pai
da pequena Joana podia jurar que não estava ali, devido ao seu enorme
tamanho, lado outro, se ele soubesse o poder daquele objeto, não teria
duvidado de que realmente estava ali, só que até aquele momento na forma
imaterializada.
A mãe e todos os que estavam no quarto se espantaram, o que era
aquilo? O pai de Joana até esqueceu-se da cratera, dizendo assustado:
- Por favor senhor Damião, não machuque minha mulher e filha! – E
já se preparava para avançar. Mas vendo a grande espada reluzente, viu que
não teria chances de lutar, então soltou o ar dos pulmões, e abaixou os
ombros implorando:
- Sei que não sou páreo para o senhor, mas se poupar as vidas dos
meus filhos e esposa, não resistirei em lhe entregar a minha, contudo, se
encostar neles, lhe juro por tudo que é mais sagrado que acabarei com o
senhor nem que seja no inferno!
Contudo, Damião virou-se calmamente, respondendo-o com uma
voz suave e doce:
- Bom! Muito bom... Quero que você sempre tenha esta
determinação de protegê-la!
O pai parou perplexo, afinal, o que aquele homem estava dizendo?
O que queria portando aquela espada? É verdade que ele sempre foi tão bom,
considerado até mesmo um santo por todos da região, que mesmo assolada
pela pobreza sempre o tinham para defender seus interesses, e para benzer e
fazer partos.
Nisto, Damião quebrou seus pensamentos, ele levantou a espada,
foi correndo em direção ao pai e os filhos os quais ainda estavam próximos à
janela, o pai que ainda estava atordoado com seus pensamentos somente teve
tempo de empurrar os filhos para o lado, Damião avançou saltando pela janela,
que se quebrou totalmente com o impacto, e ele literalmente sumiu na
escuridão...
116
Todos no quarto ficaram perplexos, após ouviram vários gritos de
dor, correram novamente para a janela, ou melhor, o buraco que agora a
mesma era, contudo, quase nada viram, tão somente, a grande cratera, e mais
ao longe quase que sumindo na escuridão, faíscas da espada que Damião
segurava cintilando no negrume...
******
Muito longe da batalha Expedito conseguiu com muito custo adentrar
na dimensão prisioneira denominada por todos como inferno.
Ele por óbvio não poderia ter em sua companhia nenhum ajudante,
porquanto, além de difícil de ali adentrar, era um local extremamente perigoso,
um mínimo de descuido lhe custaria à existência, porquanto, eles não
admitiam nenhum ser evoluído naquele recinto, ali era o lar dos demônios e
afins, adentrar ali sem ser convidado seria o mesmo que pedir para morrer.
Seu disfarce era perfeito, estava utilizando uma vestimenta rasgada,
e, havia modificado suas feições junto ao núcleo de ciência avançada.
Contudo, era difícil esconder sua força e poder, os quais mesmo
após tentarem, não conseguiram barrar completamente. Assim, ele emitia uma
energia fora do comum, e, caso levanta-se um mínimo de suspeitas em pouco
tempo seria descoberto.
Tenho que encontrar logo aquele maluco do Nimrod. – Pensou ele
se locomovendo vagarosamente.
Tinha um mapa, contudo, aquilo era um mundo totalmente diferente,
uma dimensão tão vasta como a material e às demais, nunca havia estado ali,
mas sentia estranhamente que tinha extrema intimidade com o local.
No núcleo de ciência e tecnologia, somente conseguiram localizar a
essência mínima de Nimrod, e traçarem uma zona de limite de onde ele
poderia estar.
Assim, adentrou diretamente nesta zona por um buraco negro criado
exatamente pelo mesmo núcleo da Dimensão Superior, onde seus membros
conseguiam manipular com extrema eficiência tudo, ou melhor, quase tudo,
visto que sabiam que havia sempre algo a mais para descobrir.
Expedito e os demais membros do Conselho Supremo, sabiam que
Nimrod com o enorme poder que tinha poderia já ter partido daquele local,
colocando em risco sua missão. Lado outro, tinha que arriscar, afinal, muita
coisa estava em jogo, e, não apenas o sujeito, mais o bem que ele portava era
de vital importância para a causa em que lutavam.
O local era estranhamente assustador. Era como se tudo houvesse
morrido, desde plantas até a cor do céu. Expedido caminhava sob uma água
malcheirosa e ramos de plantas que mais pareciam uma sopa pútrida.
117
- Por favor, me dê algo para comer! – Uma senhora que estava
enrolada sob uma poça lhe rogou.
Não posso fazer caridades, afinal, se alguém desconfiar de algo,
poderão descobrir tudo. – Ele raciocinou virando imediatamente o rosto, com
dificuldade, visto ser difícil para ele deixar um semelhante naquela situação.
- Isso mesmo, vire o rosto para mim, como minha família virou. Você
é lixo, eu matei eles e se tivesse força lhe mataria também!!!! – A velha gritava.
Pobre alma, não sabe e esta longe de redimir-se. – Pensou.
Ao longe, uma sombra estava observando Expedito... E, o ser que
ela representava pensava de uma forma astuciosa:
Ele não me parece ser um ser do bem, os mesmos não aguentariam
virar a face para uma mulher naquela situação, mais quem é você?!
Após perceber que a voz da velha se distanciava à medida que ele
avançava, ele virou novamente o rosto, e seguiu seu caminho rumo ao local
onde poderia encontrar o objeto que fora buscar, e, quem sabe, o homem que
o portava não resolveria se juntar a ele.
Lado outro, repentinamente ele esfriou todo o seu ser após escutar
um grito de sofrimento, e, ao virar-se, viu que alguns demônios estavam
torturando uma jovem próximo a um rochedo.
Isto vai ser mais difícil do que eu estava pensando... – Ele concluiu
em pensamento ao perceber que evitar ajudar o próximo era algo inimaginável
naquela situação, mais tinha que o fazê-lo.
Ao perceber a presença de Expedido passando os demônios
começaram a tentar farejar alguma coisa.
Eles já estão perdendo a essência humana e regredindo a um ser
primitivo. – Ele concluiu em pensamento percebendo que o que se falava do
inferno era realidade, os seres ali destruíam tudo, até a si próprios. Alguns
regredindo tanto que retornavam a uma condição de literal animal.
Após perceberem que Expedito passou direto, os seres retornaram à
sessão de tortura.
À medida que Expedito avançava a sombra que lhe seguia ao longe
se esguiava-se para não ser percebida, e continuava tendo os seus
pensamentos:
Este ser não é comum, ele esconde algo, posso perceber que ele
tem poder, mais não quer usá-lo, ou não pode.
Expedito finalmente chegou a um penhasco enorme, de onde se via
uma planície de caos. Era literalmente a visão de tudo de ruim que poderia
haver no mundo. Para onde se olhava se via atrocidades, gritos, e choro, muito
choro.
118
O Conselho tinha que intervir nesta dimensão, afinal, deixar que eles
próprios busquem a luz é muito pouco. Aqui quem entra ruim sai pior ainda,
porquanto, continua sem amor e esperança, isso não é um local de cura como
deveria ser. – Ele estava indignado com aquela situação. Já imaginava que o
local seria daquela forma, contudo, somente quando ali estava teve a real
proporção da dor e sofrimento.
- O que procura? – A sombra que estava atrás de uma árvore, ou o
que sobrou de uma, porquanto, era morta, lhe disse.
Expedito quase caiu do penhasco de tanto susto. Sua primeira
reação foi colocar a mão na cintura para pegar a espada, lado outro, lembrouse que teve que deixá-la, visto que o Conselho não queria nenhuma luta no
inferno. Assim, ele estava literalmente arriscando a própria existência.
- Me desculpe senhor, mais não quero confusão, estou somente no
meu canto. Fui enviado agora, e ainda estou confuso. – Ele tentou dissimular.
- Não perca seu tempo tentando me confundir meu caro. Sei que é
algum militar ou afim, visto que por instinto levou a mão a cintura em sinal de
pegar uma espada. Mais fique tranquilo. Não quero lhe machucar, somente
quero saber por que está neste local. – O sujeito disse ainda escondido atrás
da árvore.
- Procuro uma pessoa. – Ele decidiu após algum tempo revelar,
afinal, não tinha muito a perder, porquanto, estava lidando com alguém muito
astuto.
- Quem seria?
- Ele se chama Nimrod.
Em questão de segundo o ser que estava escondido se fez
aparecer, correu em direção de Expedito pegando-o de surpresa, ao passo
que, como estava à beira do precipício e sem nenhum objeto para fazer sua
defesa ficou imóvel, somente vendo o homem retirar uma espada e colocá-la
em seu pescoço, advertindo:
- Não tente nada sujeito, você poderá morrer em questão de
segundos caso não siga esta minha orientação. Como me encontrou?!
- Nimrod?... É você mesmo?! – Mesmo com uma espada em seu
pescoço Expedito não escondeu a alegria de ter encontrado o sujeito que se
escondeu do Conselho por muito e muito tempo...
- Me chamo Expedito. Venho em paz. – Ele dizia erguendo às mãos.
- Porque veio? O que quer de mim?
- Estamos em apuros, e necessitamos de que você devolva o item
que roubou quando partiu.
- Não roubei nada, somente peguei aquilo que me era de direito,
afinal, foi eu quem o encontrei! – Ele berrou se derramando em ódio.
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- Acalme-se, somente estamos esperando que compreenda que não
necessitamos apenas do item, mais principalmente de você.
- Eu? O que querem comigo?! – Agora o sujeito estava confuso,
afinal, se aquilo era verdade a coisa realmente era muito séria, porquanto, o
Conselho nunca aceitaria sua volta se não fosse à última opção.
- Você está enganado Nimrod, ninguém nunca quis o seu mau. Sou
o novo chefe do Exército Celeste em relação aos homens ditos comuns, e,
posso lhe afirmar com enorme sinceridade que poderíamos tê-lo caçado como
eu estou fazendo agora, e lhe encontrado.
- Porque não fizeram?
- Simplesmente porque o Conselho entendeu que você protegeria o
item melhor do que eles.
- Não compreendo?!
- É simples, como você tirou o item do loca, outro poderia fazê-lo, e
este alguém poderia ter más intenções, coisa que você nunca teve.
Nimrod não podia acreditar, aquilo realmente fazia sentido, ele
sempre se perguntou por que eles não lhe procuraram com maior afinco.
- Tenho que lhe confessar que quando realmente necessitamos lhe
encontrar foi extremamente difícil, nunca pensaríamos que você iria se
esconder logo no covil deles. – Expedito foi sincero.
- Pensei muito a respeito, e conclui que este seria o último lugar
onde tanto o Conselho e principalmente Lúcifer ou seus seguidos pensariam
que iria me esconder.
- Foi muito inteligente.
- Digamos que aprendi com a vida, ou melhor, existência.
- Mais porque não ficou e lutou por seus ideais.
- Eu iria ficar, contudo, vi que não tinha muita saída. Posso lhe
confessar que nós vamos para lugares tão longe para fugir daquilo que temos
medo que nos esquecemos de que a verdadeira paz estaria em ficar lutar e
terminar com ele de uma vez por todas. Ou simplesmente pedir para o pai para
dar um fim, em breve você estará aliviado. Contudo, eu não fiz assim, e me
arrependo, porquanto, este local não é fácil...
- Mais você largou tudo, até mesmo seu grande amor. – Expedito
ainda queria entender a atitude.
- Tinha uma causa para lutar, e, ela não quis me seguir, assim,
quando o amor se esvai não insista. Deixar é melhor do que tentar e ambos
sofrerem.
120
- É, sei que a existência é sua, contudo, creio que fez a escolha
errada.
- Somente quando olhamos verdadeiramente para o passado nos
damos conta que estávamos de alguma forma seguindo um caminho, que
culminou naquele momento, o qual triste ou alegre, bom ou mau é nosso,
somente nosso. Assim, lhe respondo, somente assim.
Expedido estava assustado como em tempos não se sentia, era a
primeira vez que via Nimrod pessoalmente, é isso não lhe deixou mais
confortável, parece que à medida que ia conhecendo o sujeito o medo
aumentava, devido ao fato dele ter mais conhecimento de que ele, além de
que realmente poderia fazer um enorme estrago caso quisesse.
- Está resposta não é tão convincente. – Expedito não entregava os
pontos, afinal, tinha que admitir que Nimrod era extremamente inteligente,
contudo, não poderia transparecer isso.
- Pode não lhe convencer, mais será a única que terá! – Nimrod não
foi apenas seco, mais rude na forma de se expressar, queria deixar claro que
não retornaria.
- Porque não me entrega o objeto, caso não queira então voltar!? –
Bradou agora Expedito tentando demonstrar ausência de medo, se é que isso
seria possível após todo ocorrido.
O homem andou de um lado para o outro antes de respondê-lo,
como se estivesse estudando-o, após proferiu com uma voz muito
ameaçadora:
- Apesar de tentar transparecer o contrário, você está com medo
meu jovem.
Este ser maldito, sabe ser mais poderoso do que eu, infelizmente... –
Pensou Expedito antes de responder:
- Pode estar certo, contudo, você deveria saber que foi o medo que
salvou o homem durante sua evolução, porquanto, se fosse destemido ao
extremo teria sido totalmente exterminado, razão pela qual, em certas ocasiões
é bom ter medo!
- Mas não vai ser o seu medo que conseguirá obter o objeto que se
encontra em meu poder... Será? – O questionamento veio após um certo tom
de mistério.
- Não sei se será, mas que eu vou levar este objeto por bem ou por
mal eu vou! – Concluiu Expedito já fechando os punhos, e, dando um curto
passo para à frente, como se já estivesse preparado para lutar.
- Você já deve ter ouvido falar de mim, mas sabe a fundo quem eu
realmente sou? – O homem para espanto de Expedito, o qual esperava um
contra ataque imediato, questionou com a voz pacifica.
121
- Sei o seu nome, e, alguns de seus feitos, mas posso lhe afirmar
que serão os últimos se não me entregue este objeto por bem.
- Sabes que me chamo Nimrod, mais sabia que fui um dos primeiros
guerreiros após a passagem da era mitologia e início desta nova era na
dimensão material? Pode analisar, encontro-me, inclusive, citado na bíblia com
a minha ascendência e descendência.
- Não gosto de ler a bíblia! – Expedito foi seco.
- Pois deveria, porque se assim o fizesse poderia lhe explicar porque
tenho ressentimento com o que Deus praticou contra minha posteridade, e,
entenderia um pouco minha relutância em contribuir para com a sua causa.
Se estiver dizendo a verdade parece estar entrando por outra
vertente, na qual vislumbro que talvez queira contribuir caso deixe-o prosseguir
em sua explicação, creio ser melhor ouvi-lo. – Raciocinou Expedito, dizendo
após um tempo de medição sobre qual caminho escolher:
- Certo, me conte os motivos que te levaram a odiar seu Deus!
- Me desculpe meu jovem, mas não odeio meu Deus, apenas estou
muito furioso com o que ele fez a minha posteridade.
- Então, me conte o que ele fez, que podemos talvez entrar em um
acordo.
Nimrod olhou Expedito, já sabia que ele era uma pessoa integra, por
isso resolveu contar os motivos de sua relutância em contribuir para com os
seus anseios...
122
CAPÍTULO 31
Berlim – Alemanha, 1982
Estela encontrava-se estirada perplexa sobre a cama macia, que
naquele momento mais parecia um caixão frio que guardava seu corpo
trucidado pelo estupro.
Próximo à janela percebeu que os monstros ainda não tinham ido
embora. Estavam discutindo, onde ela percebeu que eles diziam sobre um tal
Senhor da Luz...
Após, a última coisa que se lembrou antes de desmaiar foi os olhos
negros de trevas daquele que lhe violentará, posteriormente a escuridão foi se
propagando mais e mais, e mal sabia ela que ela estava se alastrando naquele
exato momento em seu interior...
******
Finalmente Marcos teve alta após dias na incubadora, sua mãe já
havia recebido dias antes, lado outro, ele estava muito debilitado, ficando,
assim, um pouco mais.
Quando finalmente pegou-o nos braços após dias de espera, a mãe
não conteve o choro, afinal, estava segurando naquele exato momento nos
braços aquilo de mais rico que poderia ter na vida, porquanto, aquele ser tão
diminuto e franzino era parte sua, era sua essência mais pura...
Contudo, exatamente naquele momento eles não eram os únicos a
estarem naquele local, havia muita coisa oculta ali.
123
CAPÍTULO 32
Vilarejo na França, 1982
Damião era muito mais poderoso que Cosme, ele estava encarnado,
mas tinha quebrado a barreira das dimensões em todos os sentidos.
Assim, ele se lembrava de que era um espírito de luz, ou melhor,
“um santo”, tendo poderes de cura, podia ver através de todas às dimensões,
e, possuía, inclusive, o dom de tocar em objetos espirituais.
Por conta destes poderes à espada que segurava era do Arcanjo
Miguel, tinha sido entregue pelo Senhor da Luz, o qual quando foi levado da
dimensão suprema por Miguel passou na casa do amigo e entregou-lhe a
espada a mando do Arcanjo e de seu mestre.
A espada cintilava na escuridão, os demônios caiam as dúzias,
gargantas cortadas, peitos estilhaçados, a maioria correu para a escuridão,
certos de que sem Serfalos eram incapazes de vencer.
Eles corriam, ao passo que, nenhum entendia o que acertou seu
mestre, ele devia estar dentro da cratera, só que a escuridão dentro do buraco
era tanta, que eles não conseguiam enxergar nada lá embaixo, e não tinham a
menor curiosidade de descobrir, afinal de contas eram demônios, e entre eles
imperava a famosa lei do “melhor um do que todos”, esta era a que sempre
prevalecia.
Assim todos correram para a escuridão, não sendo seguidos pelos
seres celestiais que ali se encontravam, afinal de contas, de nada adiantava
matá-los, melhor deixarem alguns fugiram para contarem aos outros e,
principalmente, para Lúcifer que perderam a batalha e que Joana conseguiu
nascer.
Todos os Arcanjos, Anjos e Santos se juntaram perto de Damião.
Cosme estava tão alegre que não conseguiu conter a emoção e começou a
chorar ao abraçar o amigo.
Contudo, Damião não perdeu tempo:
- Também estou com saudades meu amigo, mas tenho que alertálos que Miguel está correndo sério perigo!
- Para onde ele foi? - Questionou Cosme.
Damião somente virou-se em direção a cratera, ninguém falou mais
nada...
******
Algum tempo se passou, o qual eles não souberam precisar.
Estavam todos pensando em uma forma de ajudar, mais como? Era a principal
pergunta.
124
Foi quando Gabriel retirou da cintura uma luz misteriosa, era um
rosário, ele brilhava fortemente emitindo uma luz própria. Chegando bem perto
da cratera ele o levantou, contudo, para seu espanto o buraco era muito
grande, e a luz não conseguiu chegar até o fundo.
Todos se faziam a mesma pergunta: “como Miguel conseguiu fazer
aquilo?”.
- É quase que certo que se destruiu no impacto, afinal de contas, sua
força sobre Serfalos foi tamanha que quebrou a barreira dimensional,
porquanto, como vimos, estávamos no plano espiritual, e ele conseguiu atingir
o plano material com tamanha força que abriu a cratera na outra dimensão,
isto não é comum, somente uma força muito poderosa poderia ter
proporcionado tamanha destruição, e creio que ele infelizmente não
sobreviveu... – Disse uma Arcanja chamada Cíbilis.
- Larguem de questionar, ele ainda está vivo! – Damião berrou.
- Como tem certeza disso? – Questionou agora uma das Anjas que
ali estava, se assustando com a forma que ele entonou, afinal, fúria não era
comum em Damião, e todos sabiam disso.
- Posso senti-lo, contudo, está muito fraco! – Após olhou para
Gabriel. - Ande o que está esperando! Entre lá Gabriel, e pegue-o! Afinal são
vocês Arcanjos que possuem asas justamente para esta hora, estou correto?
Se existia alguém com grande autoridade, este ser era Damião, ele
tinha a confiança de todos. Gabriel sem titubear abriu às enormes asas,
segurou bem forte o rosário, e voou para dentro da cratera. Todos ficaram
observando na borda até a luz sumir na escuridão, realmente o buraco era
maior do que todos imaginavam...
O tempo foi passando e todos já se questionavam o que estava
ocorrendo. Afinal, não era possível que ele ainda não tivesse chegado ao
fundo.
Neste momento Gabriel saiu com Miguel desacordado em seus
braços, ele estava muito ferido, mas não parecia estar com nada quebrado.
- O que viu lá embaixo? – Questionou Damião eufórico.
- Este buraco é enorme, e lá embaixo ele se abriu ainda mais,
parece que ao chegarem ao fundo, eles lutaram fortemente, formando no
impacto desta batalha diversos túneis. É literalmente algo assustador, até para
mim que já vi de tudo. – Respondeu ainda ofegante.
- E Serfalos, algum sinal dele? – Novamente interrogou Damião.
Gabriel antes de responder tomou um pouco de ar, estava muito
ofegante.
- Não, nada... Não tinha nenhuma marca que ele fora aniquilado por
Miguel, encontrei marcas raspadas na parede, creio que ele conseguiu de
alguma forma fugir.
125
Damião balançou a cabeça entristecido, dizendo com melancolia:
- Miguel é o melhor líder que já vi, quando viu que Serfalos entraria
no quarto e certamente mataria a todos que ali se encontravam, usou este
poder incrível, arriscando sua própria vida pelo ideal de nossos criadores. Mas
creio que sei como Serfalos se safou.
- Como? – Questionou diretamente um dos Santos que ainda
limpava sua espada.
Damião o olhou com respeito, e respondeu-o sem rodeios:
- Seu mestre deve ter vindo lhe salvar.
- Lúcifer! – Alguns dos Anjos, Santos e Arcanjos que ali estavam
começaram a dizer em voz baixa, quase que perdidos em seus pensamentos
de medo e pavor.
- Isto mesmo, ele voltou! E mais forte do que nunca, temos que nos
prepararmos porque a batalha vai ser longa e horripilante para ambos os
lados.
- Não deve ser ele! – Intercalou Gabriel em tom severo, mais devido
ao medo do que a certeza. - Como tem tanta certeza meu amigo? Afinal, se
fosse ele quem salvou Serfalos, certamente não teria deixado Miguel vivo.
Damião sorriu ironicamente, ao passo que todos o olharam com
espanto.
- Porque a ironia? – Questionou Gabriel demonstrando nervosismo
com a atitude.
- Me desculpe Gabriel, mas vejo que a inocência ainda atrapalha o
raciocínio de todos vocês!
Gabriel não respondeu, ao invés disso ficou perdido em seus
pensamentos, realmente não sabia onde teria agido com ingenuidade.
Damião com suas pequeninas mãos pegou nas grandes mãos de
guerreiro celestial de Gabriel, dizendo em tom sereno:
- Seja sempre dessa forma meu amigo, puro de coração, nunca
pense com maldade.
- Não entendi? – Questionou Gabriel com espanto com o carinho
repentino de Damião, após primeiramente tê-lo ironizado.
- Você tem que entender que Lúcifer não age com instintos animais,
por impulso ou vingança. Ele é um ser extremamente inteligente e sensato em
seus atos.
- Como assim? Da forma que você fala é como se admirasse aquele
monstro. – Questionou indignado agora um dos Santos que ali estavam.
126
Damião fulminou o santo com um olhar tão feroz que fez com que o
interlocutor abaixa-se a cabeça. Vendo que ele desviou o olhar, Damião soltou
as mãos de Gabriel, indo de encontro ao Santo, e pegando em seu queixo, fez
com que ele levantasse a cabeça e o olhasse diretamente nos olhos. - Qual o
seu nome meu caro? – Interrogou com um voz cortante de ódio.
- Nicolau – Respondeu gaguejando.
Damião olhou bem no fundo de seus olhos:
- O único ser ou seres que eu admiro, ou até mais que isto, posso
afirmar que idolatro, são os Criadores! – à medida que falava ele apertava
ainda mais o maxilar do homem, como se quisesse que ele prestasse extrema
atenção – Contudo, tenho extrema estima por você ter vindo até este local
ajudar, isto mostra que você é digno de minha explicação. Mas nunca
demonstre tamanho medo de olhar nos olhos de seu interlocutor. Afinal, tal
atitude não demonstra somente medo, mas acima de tudo incredibilidade, o
que eu não tolero.
Fez uma pausa, e para alívio do Santo ele retirou os olhos furiosos
dele soltando seu maxilar, olhando agora para todos ao seu redor, os quais
estavam espantados com a ferocidade de Damião, principalmente, Cosme que
se questionava em pensamento:
Damião está estranhamente mudado de alguma forma, não sei se
para melhor...
- Olhem todos! – Disse gritando. – O que devem saber sobre Lúcifer
não é que não devem subestimá-lo, ou sentir raiva dele, afinal, todos sabemos
que suas energias são retiradas de raiva, ódio, dor, etc. O que na realidade
temos que ter certeza é que ele é muito mais inteligente do que qualquer um
de nós. Ele pensa há anos luz de nós, afinal, ele é um Deus.
- Como assim um Deus?! – Todos questionaram em uníssono,
menos Gabriel e outros Arcanjos que sabia que ele estava certo.
- Não vou entrar em detalhes – respondeu prontamente cortando
qualquer interrupção - o que realmente devem saber é que ele não quer
aniquilar seus inimigos, ele não quer sair por ai matando todos!
- Então o que ele quer? – Questionou o mesmo Santo Nicolau, agora
olhando bem no fundo dos olhos de Damião, demonstrando que havia
apreendido a lição.
- O que ele quer? E vocês ainda têm dúvidas de seus verdadeiros
interesses? – Fez uma pausa. E vendo que ninguém respondeu, disse em alto
e bom tom:
- Ele quer conversão para o mau! Quando ele vê alguém forte como
Miguel, ele não pensa em matá-lo, o que ele certamente poderia fazer
facilmente, ele quer demonstrar que não é um monstro, e ainda tentar impingir
nos pensamentos do seu oponente que ele lhe deve a vida!
127
Todos se entreolharam, aquilo fazia realmente sentido, afinal, Lúcifer
sempre se mostrou tendente a buscar seguidores, e não oponentes.
Damião sorriu ao perceber que eles estavam entendendo, então
resolveu continuar:
- Foi assim com Jesus! Ele poderia tentar lutar e matá-lo, mas não,
ele sabia que Jesus era forte demais, e serviria muito mais aos seus ideais
caso mudasse de lado, então ele resolveu tentar convertê-lo ao seu lado,
oferecendo tudo, só não esperava que estava lidando com um ser muito mais
evoluído mentalmente do que ele.
- Entendi meu amigo! – Respondeu Gabriel. – Mas você acha que
ele tentou converter Miguel?
- Não, ainda não! – Respondeu Damião com ar de mistério.
- Mas e se ele... – Gabriel começou a dizer, mais foi imediatamente
interrompido por Damião.
- Nunca mais diga assim meu amigo! Afinal de contas, quando diz o
“mas se ele” – ele entonou a curta frase – esta questionando um evento futuro
que não é passível de ser compreendido neste estágio de tempo, assim,
somente saberemos o que realmente ira ocorrer, no seu devido tempo.
- Sei disso... – Gabriel tentou dizer mais foi interrompido por Damião
que não o deixou continuar:
- Este é o mistério não somente da vida, mas de toda existência,
porquanto, se soubéssemos do amanhã, ele não teria graça, vocês sabem
muito bem que isso se aplica tanto na encarnação quanto no plano chamado
superior. – ele olhava nos olhos de cada um, mais principalmente no de
Gabriel – Deste modo, temos que ter confiança não apenas nos Criadores,
mas, principalmente, em Miguel, porque Lúcifer somente o converterá se ele
permitir, e isso é muito improvável na minha concepção, e você deveria pensar
o mesmo, afinal, ele é seu líder e irmão não é Gabriel?!
- Sim... - Gabriel respondeu envergonhado, contudo algo lhe
chamou a atenção, era a espada na mão de Damião, com certeza era a
espada de Miguel, então decidiu questionar:
- Onde conseguiu a espada de Miguel?
Damião ficou sem palavras, e Gabriel percebeu, mas ele conseguiu
consertar um pouco sua dúvida inicial:
- Ele me entregou hoje, temendo o pior...
Gabriel confirmou pela voz de Damião que ele mentira, mas decidiu
ficar calado, não tinha tempo de discutir, afinal, tinha extrema consideração por
Miguel, mesmo sabendo que eles estavam escondendo algo, assim, tinha que
levá-lo urgente para a dimensão suprema para ser tratado. Então somente
respondeu:
128
- Damião, você vai desencarnar agora, e virá conosco? Ou ainda
tem que fazer algo?
- Tenho que ficar mais dois dias, não chegou minha hora, preciso
ainda treinar e orientar os pais de Joana...
Cosme ficou chateado, estava com muita saudade do seu mais
nobre companheiro, mas o que era dois dias para quem esperou mais de 40
anos encarnado. Despediram-se e partiram.
Todos utilizaram a forma convencional através da luz para se tele
transportarem, afinal, Miguel era o único que conseguia transportar com
segurança através da água, e ele ainda continuava desacordado.
Enquanto eles subiam gradativamente, Damião somente pegou a
espada no chão e dando meia volta foi em direção a casa, tinha muito serviço.
Atrás da casa, estava o Senhor da Luz, ele encontrava-se escondido
aguardando Damião, precisavam resolver tudo antes de sua partida...
129
CAPÍTULO 33
Londres – Inglaterra, 1982
Ao chegarem ao subsolo tudo estava muito diferente do dia anterior
em que Charles esteve lá. Nos carrinhos haviam funcionários trazendo e
levando às pessoas, ao passo que ele e a Dra. Kim aguardaram o retorno de
um deles para evitarem de andar. Muitos estavam com roupas de ginástica,
correndo em uma pista.
- A senhora não é adepta a uma corrida? – Puxou papo Charles,
querendo quebrar o gelo que havia se formado desde que teve que aceitar a
verdade por ela exposta.
- O que lhe faz pensar assim, seria o meu corpo ou minhas atitudes?
Charles gelou novamente, parecia que a mulher nunca abaixava a
guarda.
- Não... Não quis dizer isto, somente...
- Somente estava tentando puxar conversa, certo?
- Sim...
- Pois saiba que sou uma cientista, e sei muito bem dos benefícios
de se fazer exercícios, por está razão prático ordinariamente. Contudo, em
horários não determinados como estes macacos aqui, eu faço assim que tenho
tempo e vontade, não quando um horário me ordena.
- A senhora parece não ser adepta a horários.
- Não sou mesmo, creio que tudo tem que ser feito com inspiração,
assim, corro e faço exercícios no momento em que estou inspirada para isto, e,
trabalho quando estou inspirada, assim é que faço meu cérebro funcionar.
Contudo, tenho horários, mas é para reuniões, etc., ou seja, o que depende de
outras pessoas, mas nunca para fazer algo tão banal como exercícios,
programas de televisão, etc.
Um dos pequenos carros se aproximou e a Dra. Kim adentrou
falando para Charles com o mesmo tom autoritário:
- Se apresse porque tenho que apresentar o seu escritório e ir para
uma reunião.
Após os dois entrarem um sujeito gordo entrou, foi o último para
alivio de Charles, o qual ficou espremido com o rapaz.
- Dra. Kim, a senhora vai ficar em seu laboratório? – Perguntou o
motorista.
- Sim... Mais depois quero que espere para levar Charles, é próximo,
mais quero que me espere. – fez uma pausa de intriga, estava raciocinando de
onde conhecia aquele rapaz...
130
- A senhora deve estar intrigada como lhe conheço. – O motorista
disse sorrindo.
- Claro. – A resposta foi seca como de costume.
- Todos estão, foi uma exigência do Sr. Arthur, além dele nos fazer
assinar termos sigilosos, tivemos que memorizar cada rosto, nome e o local de
serviço de cada pessoa que aqui estiver.
- Nossa isto deve ter sido difícil? – Disse Charles em solidariedade,
afinal, a Dra. Kim estava ainda fulminando o sujeito com os olhos, certamente
procurando por algo que o incriminasse.
- Até que não foi. – fez uma pausa olhando para Charles com um
sorriso malicioso – Afinal, recebendo a grana que ele nos paga decoramos até
a bíblia. Além disso, fui taxista durante muitos anos aqui em Londres, e, assim,
para quem teve que decorar todas as ruas para obter a licença, isso até que foi
fácil.
Após alguns segundos eles já estavam em frente ao setor da Dra.
Kim, ela saltou do veículo agradecendo ao rapaz, e, lembrando-o de esperar,
mas Charles notou que ela não perguntou sequer o seu nome, certamente era
por alguma razão que não lhe interessava.
- Vamos Charles, não tenho o dia todo!
- Mas a senhora não falou que meu setor seria outro?
- É lógico, mas lembro de ter lhe falado que nossos setores são
conectados, e, ainda, você tem que pegar seus lacaios, por isso pedi para o
motorista esperar.
Após a Dra. Kim colocar as mãos e os olhos em scanners, as portas
do setor se abriram, e Charles pôde ver a grandeza daquele laboratório, era
enorme, e já havia vários funcionários fazendo diversas coisas, sendo que
alguns testavam armas em uma cabine de vidro, a qual ele percebeu que era a
prova de som, outros pesquisavam componentes químicos em grandes
máquinas, mais alguns estavam em computadores espalhados, e outros...
- Espere... Aqueles são os meus homens?! – Disse ele ao mesmo
tempo espantado e indignado, ao avistar seus homens amarrados em uma
pequena sala de vidro.
- Lógico, ontem dopei eles, mas parece que alguns deles foram
treinados para alguns truques, então chamei Arthur e ele autorizou que eu os
colocasse naquela sala até sua chegada.
Charles não protestou, ela tinha novamente razão, seus homens
eram perigosos, e poderiam facilmente matá-la mesmo que estivessem
amarrados ou dopados, assim, era mais seguro fazer os dois e ainda prender.
- Quando eles vão acordar? – Ele quis saber.
- Quando você desejar. – Ela respondeu ainda dando uma piscadela.
131
- Não entendi.
- O composto químico que estão utilizando encontra-se em um
aparelho que desenvolvi para uma arma. – ela apontou para os homens indo
na direção deles – Assim, um aparelho próximo capta ondas cerebrais, e, a
medida que tenha alguma, o composto químico é liberado. Assim, a medida
que o sujeito vai acordando ele volta ao sono, sempre em pequenas
quantidades, ficando, portanto, em um estado de vigília eterna, nem acordado
nem dormindo. – ela olhou novamente para Charles mudando sua expressão,
afinal, via que ele parecia estar com medo de tudo aquilo – Isso facilita muito
quando necessitamos que o prisioneiro fique de prontidão para prestar
informações, etc.
- Mas eles não iriam prestar quaisquer informações! – A resposta
veio em tom de revolta.
- Eu sei disso, mas quis testar meu produto em agentes altamente
treinados.
Charles ficou ainda mais furioso.
– Eles não são cobaias! – Disse ele bufando de ódio.
- Não se preocupe meu caro, todos somos cobaias de algo maior,
assim é a vida, quem sabe não descobrimos após a chamada morte que nossa
vida foi somente um teste para algo maior, não é isso que a maioria das
religiões prega?!...
- Não quero discutir filosofia com a senhora, somente solte meus
homens, e já!
A Dra. Kim chamou-o para o local, digitou uma pequena combinação
numérica, e em segundos uma pequena porta se abriu, logo após pegou um
pequeno aparelho e desligou-o.
- Pode aguardar ai dentro, em segundos eles irão acordar, converse
com eles e após me chame para abrir a porta e soltá-los se tudo estiver certo.
– disse a pequena mulher se virando e trancando novamente a porta de vidro.
Em segundos os agentes foram acordando, eles estavam muito
preocupados com a presença de Charles.
- Me desculpe chefe, não sabíamos que aquele velho tinha tanto
poderio bélico, fomos pegos de surpresa pela primeira vez na vida. – Tentouse justificar o primeiro, ao passo que os demais somente abaixaram a cabeça.
- Lógico que falharam somente uma vez na vida, porque se já
tivessem falhado desta forma com certeza não mais as teriam.
- Onde estamos. – Tornou a questionar o que se justificou em nome
dos amigos.
- Estamos na base de ciência e tecnologia de nosso novo trabalho.
132
- Nossa ainda bem. – Disse um deles erguendo a cabeça.
- Por quê? – Charles se intrigou com a resposta do agente.
Como algo poderia estar bem para eles! – Ele ainda pensou.
- Primeiramente pensei ontem que havíamos morrido. – O agente
falava olhando para o nada, parecia que estava contando sua vida em um divã.
– Após fomos levados para uma cozinha, onde achei que seriamos comidos,
pensei que aquilo era o inferno. Depois o velho entrou na cozinha e disse a um
negro esquisito que era para descer conosco, onde fomos colocados em
camas em outra sala estranha, e eles começaram a aplicar produtos em meus
ferimentos. Achei que estava sendo tratado por uma extraterrestre, de tão feia
que era a baixinha que ficava nos injetando coisas, até que apagamos...
“Et?” – Berrou uma voz de umas caixas de som acima de suas
cabeças, Charles presumiu que fosse a Dra. Kim que certamente estava
escutando a conversa de sua sala.
- Quem está dizendo isto chefe? – Um dos agentes disse assustado.
- É o alienígena, disse sorrindo, já soltando os agentes, afinal, já
havia concluído que eles estavam com a saúde mental em ordem.
- Quem é está senhora? – Um deles questionou ao ter suas mãos
soltas das estranhas algemas às quais se abriram repentinamente, como se
tivessem sido acionadas eletronicamente.
Mais um brinquedinho da doutora. – Pensou Charles sorrindo,
tentando explicar em seguida o ocorrido:
- Fiquem calmos, ela é uma cientista que vai trabalhar conosco, e
creio que vão gostar dela mais do que pensariam.
- Em uma elegante sala, a Dra. Kim ficou intrigada ao ouvir aquilo. –
Como assim vão gostar de mim? – Refletiu.
- O que o senhor está dizendo chefe? Como uma mulher franzina
como ela poderia trabalhar conosco?
- Acho que vocês não podem falar de ninguém franzino, afinal, o
velho que derrubou vocês não é nenhum gigante. – Ele respondeu em tom de
ironia, mas sabia que aquilo havia até machucado o ego deles. – Ela
desenvolve armas, e outros brinquedinhos afins de inteligência, assim, creio
que...
Antes dele terminar os homens interromperam dizendo em uníssono:
- Não precisa dizer mais nada, já a amamos.
A Dra. Kim sorriu, porquanto, pela primeira vez estava tendo
esperanças de ter alguma pessoa de confiança em sua vida, ela era
representada pela pessoa de Charles, que se mostrava mais esperto e amável
do que pensava, era como se tivesse de volta o filho que o destino lhe tirou...
133
CAPÍTULO 34
Vilarejo na França, 1982
Quando Damião estava para abrir a porta da casa, ouviu um
sussurro vindo de trás de um arbusto:
- Precisamos conversar agora...
Damião sabia muito bem de quem era aquela voz, contudo, somente
assentiu com a cabeça, parou bem devagar, e, sem virar-se falou:
- Somente daqui a dois dias. Eles ainda podem estar aqui...
Portanto, vou conversar com a família da Joana, e lhe explicar tudo. Depois
conversamos no alto da colina, como de costume. – fez uma pequena pausa
somente para escutar e deduzir que tudo estava em ordem – Já estarei
desencarnado neste momento, por isto teremos mais privacidade e correremos
menos perigo, afinal, materializado sou bem mais vulnerável.
Quando Damião abriu a porta uma forte luz brilhou atrás dos
arbustos de onde vinha à voz. O ser que ali se encontrava já havia partido em
questões de segundos.
Ele é um bom ser, até hoje não entendi suas escolhas, mas quem
sou eu para questionar os mistérios e desígnios dos Criadores. – Pensou
Damião ao sentir que o Senhor da Luz já havia partido.
Logo ao entrar na residência, Jonas, o pai de Joana, veio apavorado
conversar com ele.
- O que era aquilo lá fora? Aonde o senhor encontrou esta espada
tão grande e brilhante? O que o senhor estava matando perto daquele buraco
enorme que surgiu na frente da casa?
Nisto Damião interrompeu as perguntas ao pegar fortemente no
braço de Jonas, e, olhando em seus olhos disse em tom ríspido:
- Pare com isto Jonas! Não temos tempo para infantilidade. Vocês já
são evoluídos espiritualmente o bastante. – Soltou o braço de Jonas, mas não
parou de falar. - Poderiam facilmente terem rompido a barreira, já cansei de
esperar, me desculpe, sei que rompendo ela abruptamente vocês podem
desencarnar, mas não tenho mais tempo, vocês vão ter que confiar em mim.
Neste momento Damião pegou novamente no braço de Jonas, desta
vez com mais força, e o arrastou até sua mulher que acabara de dar a luz.
Lucinda era definitivamente uma bela mulher, forte, e acreditaria em
tudo que Damião lhe dissesse, tinha uma enorme consideração por ele.
Certa vez ela o procurou para curar uma enfermidade em um de
seus filhos, e após a criança sarar em alguns dias, ela disse que o considerava
um santo perdido na terra, na ocasião ele até pensou que realmente referido
pensamento era diante dos conhecimentos terrestres uma realidade.
134
Contudo, lhe advertiu à época que ela manifestou tal pensamento
para ele: “Não fale mais isto minha filha, todos nos temos o poder de fazer o
bem e o mal, basta, tão somente, fazermos as escolhas certas, e termos fé, o
resto será apenas conspiração do universo.” E ainda lembrava que terminou
dando uma dica para ver se ela quebrava a barreira: “E você tem que saber
que por dentro desta matéria, é considerada um ser extremamente evoluída,
capaz de proceder a milagres talvez até maiores do que os que humildemente
eu tento lhes prestar.”.
Nisto Damião viu que ainda estava segurando do braço de Jonas
com força, e ele já o estava olhando com certa dúvida, então afastou as
lembranças, e decidiu iniciar os trabalhos.
Inicialmente decidiu lhes explicar no que consistia a barreira, e
asseverou que não queria ser interrompido até que houvesse terminado:
- Quero que me escutem com atenção, existe uma força que é por
mim e por vários seres denominada como “barreira”. Referida força é uma
energia que separa os pensamentos do chamado espírito com os do corpo
material o qual ele está encarnado. O que tem que entenderem é que existe
uma ligação do cérebro com o espírito. Simplificando, o espírito capta tudo
aquilo que o cérebro processa. E depois guarda em uma memória infinita em
sua essência imaterial.
Jonas e Lucinda o olhavam em atenção, mas ainda não conseguiam
retirar a expressão de dúvida com tudo aquilo. Para Damião isso não
importava, por isso ele prosseguiu:
- Deste modo, um espírito que encarnou na terra por anos,
acumulou muito conhecimento, só que este conhecimento das vidas passadas
somente é acessível quando ele está desencarnado. O Criador ou Criadores
fizeram desta forma por um motivo simples: Toda pessoa encarnada tem o
mesmo desenvolvimento, então o que lhe diferencia é sua dedicação, amor ao
próximo, etc., sendo irrelevante o conhecimento que já continha. Contudo,
como tudo na vida desta dimensão material há uma exceção, alguns quebram
esta barreira por razões alheias à perfeita criação, apesar disso, ao invés de
benéficas, referidos pensamentos fazem é que aconteça um curto no cérebro,
e a pessoa fica desnorteada ou até mesmo em estado vegetativo de
consciência.
Percebendo que eles agora estavam prestando ainda mais atenção
ele continuou:
- Assim, podemos dizer que nascemos sem nenhum pensamento, e,
nosso cérebro vai recebendo no decorrer da vida milhares deles, descartando
os desnecessários e guardando os necessários. Contudo, o espírito capta
todos eles, levando-os para além da barreira, a qual somente suga
pensamentos para o espírito, não deixando que estes retornem todos para o
cérebro, um modo até mesmo de não sobrecarregá-lo, porquanto, conforme
disse anteriormente, o cérebro é algo material, e, mesmo que consiga deter
poder sobre esta ligação, o ser tem que ser evoluído para administrar tantos
pensamentos. Assim, somente espíritos muito evoluídos podem quebrar esta
135
barreira naturalmente, e ainda conseguir sobreviver de forma normal, ou seja,
sem sequelas durante o tempo em que estiver encarnado.
Ele tomou um ar, mas retornou imediatamente, não queria
realmente perder o foco.
- Isto somente ocorre porque o poder espiritual desta alma é tão
grande, que sua alma interage com o corpo de tal forma que a mesma de
alguma configuração inexplicável libera as informações na medida em que a
pessoa necessita acessá-las.
- Entendo, mais me dê um exemplo, se não for pedir muito. – O pai
de Joana era realmente esperto, além de absorver, estava como um aluno
sedento por saber.
- Um dos principais exemplos são as pessoas que parecem já
nascerem sabendo tocar piano, desenhando, pintando quadros, facilidades em
lidar com uma determinada profissão, etc. Muitas vezes isto é chamado de
“dom”, ou seja, eles têm o privilegio de serem diferentes dos demais. Mas o
que realmente ocorre não é que eles possuem somente um privilégio sobre os
demais seres, e isto também não acontece por acaso. Na realidade eles
realmente já possuem todas aquelas informações em sua memória, não no
cérebro, mas na memória espiritual infinita, e devido ao poder acumulado
durante as várias encarnações, conseguem equilibrar o espírito com o cérebro,
quebrando a barreira em partes que deixem passar somente o que lhes
interessem no momento, como uma conexão a um banco de dados, assim não
sobrecarregando o cérebro material. Após isso ocorrer eles podem
desenvolver facilmente habilidades adquiridas em outras encarnações, como
também acessar pensamentos ou informações guardados em sua memória
infinita da alma, só que não de uma vez, somente aos poucos, para não fundir
o cérebro.
Fez mas uma pequena pausa indo buscar um copo com água,
assim que se levantou Jonas e sua esposa se olharam durantes alguns
segundos, o olhar de ambos não mentia, estavam fascinados com o que
estavam ouvindo.
Quando Damião retornou da pequena cozinha para o quarto, ficou
admirado com o casal, eles haviam seguido a risca sua imposição de não ser
interrompido, e, mesmo que estivessem assustados com tudo o que estavam
escutando, ainda se mostravam companheiros, segurando um na mão do outro
firmemente, e atentos para as próximas explicações, as quais ele não quis
perder tempo em ensinar-lhes.
- Agora sim, estava com uma sede enorme, a saliva mais parecia
cola em minha boca seca. – Olhou rapidamente novamente para o casal e
retornou as explicações. - Mas vamos ao que interessa. Outro fator, é que para
um espírito evoluir, ele tem que estar encarnado. Os Criadores fizeram assim
para dar a oportunidade para todos, e, por certamente entenderem que isto
seria mais justo. Com isto, encarnado o espírito adquire dons, aguça bondade,
amor pelo próximo, etc. Contudo, eles também podem ao invés de progredir,
retroagir, afinal de contas, no mundo existem várias provações, um espírito
pode encarnar muito evoluído, e no decorrer da vida cometer tantas faltas,
136
como fazer o mau ao próximo, abusar de drogas, etc., o que lhe acarretara em
uma regressão que muitas vezes perderá todo o trabalho de três para
progredir. Por esta razão os espíritos evoluídos não costumam voltar a terra,
eles podem, mas como é muito arriscado, preferem não aceitar esta
oportunidade. Portanto, ficam nas dimensões mais avançadas, mas por não
mais encarnarem, não conseguem chegar à dimensão sublime, onde se
encontram as almas mais evoluídas existentes, entre eles os chamados
Santos, Arcanjos, Anjos, Deuses, etc., local onde poderiam evoluir
infinitamente, fazendo, até mesmo caso mereçam, parte do Conselho
Supremo, etc., e devido a tudo, ainda, podendo adquirir poderes magníficos
para ajudar aos próximos. Tais poderes e a entrada na dimensão sublime,
somente são concedidos para almas muito evoluídas que voltam a terra não no
intuito mais de evoluir espiritualmente, mas para ajudar outras almas a
evoluírem, estas almas são as que alcançam poderes Divinos. Elas adquirem o
poder da cura, acessam habilidades e dons extraordinários, tanto encarnados,
quanto desencarnados. São considerados Deuses, não como os Criadores, os
quais os poderes são infinitos, mas, em suma, estão acima de qualquer outra
alma ou ser existente.
Ele tomou um gole da água, e prosseguiu:
- Assim, se uma alma tiver coragem de voltar à terra várias vezes, e
fizer o bem, ela ira progredir espiritualmente de tal forma que em breve será
um espírito de luz, afinal, quem nunca conheceu uma pessoa que somente faz
o bem, não esperando nada em troca, será que não receberia nada mesmo? –
Ele fez uma pausa olhando para eles sorrindo. – Talvez não nesta vida, mas
espiritualmente evoluirá de tal forma que em breve alcançara a dimensão
sublime, desfrutando de amor, carinho, e paz para todo eternidade, e, ainda,
adquirindo conhecimento e poderes que lhes serão úteis para o
prosseguimento de toda a sua existência de auxílio ao próximo, porque tais
almas não ficam lá paradas olhando para o teto, são verdadeiros Anjos.
Jonas e Lucinda olhavam admirados para Damião, aquela história
realmente era fantástica, e estava lhes hipnotizando. Eles pensavam agora se
teriam que ter quebrado está barreira que separa o pensamento e o poder da
alma com o corpo físico material.
Damião vendo a cara de questionamento do casal virou-se para eles
dizendo em tom ríspido, como um professor que chama a atenção de seus
alunos de forma enérgica, mas para o bem dos mesmos:
- Vocês terão que acreditar em mim. Eu não vou estar mais no meio
de vocês, e precisam ter conhecimento suficiente para protegerem Joana de
um grande mau.
O casal se entreolhou assustados, até aquele momento estavam
felizes escutando toda aquela história, mas agora que Damião havia dito que
Joana corria perigo eles ficaram apavorados.
O que está história tem a ver com nossa pequena filha? - Tal
pensamento afligia a ambos no silêncio de suas consciências.
Damião parou subitamente de narrar os ensinamentos.
137
- Pierre! – Gritou ele ao filho mais velho do casal.
A criança olhou subitamente para o senhor, e rapidamente desviou o
olhar, tinha tanto respeito por aquele homem que não ousava olhá-lo
diretamente nos olhos.
- Porque não olha diretamente em meus olhos filho? – Questionou
Damião já se levantando e indo de encontro a ele.
Sem levantar a cabeça, e com voz rouca devido à boca seca de
aflição diante de todos os acontecimentos que se passaram anteriormente,
principalmente, o estrondo e a cratera próxima a sua casa, respondeu em um
timbre de voz o mais baixo que pode, demonstrando sua submissão extrema:
- É que eu tenho um respeito enorme pelo senhor, assim acho que
seria muita arrogância de minha parte olhá-lo diretamente nos olhos, afinal,
não chego sequer aos pés de sua imponência meu senhor.
Damião sorriu, aquilo era a maior demonstração de respeito que ele
já havia recebido. Sabia que até mesmo na dimensão superior, nenhum ser
seria tão puro como uma criança, ela era o símbolo da bondade, e aquele
menino estava predestinado a passar por tantas provações, que ele até
esfriava a espinha ao pensar nos acontecimentos futuros... Mas no fundo,
sentiu uma grande paz, afinal o Conselho Supremo havia feito à escolha certa,
aquela alma era perfeita para estar ao lado de Joana enquanto crescer.
Com delicadeza, e demonstrando carinho, Damião pegou com suas
enrugadas mãos suavemente no queixo do garoto, levantando seu rosto até
que seus olhos pudessem encontrar com os dele.
Quando o garoto olhou no fundo dos olhos do velho, viu a ternura
que eles emanavam, e apesar de querer, não conseguiu desviar o olhar.
- Escute Pierre, quero que saiba que ninguém neste mundo é melhor
do que o outro. O que acontece é que podemos fazer escolhas que nos
colocam em escalas sociais melhores ou piores.
Ele soltou o queixo do garoto, e quando percebeu que ele não
desviou o olhar, prosseguiu em seus ensinamentos:
- Ou muitas das vezes os homens não têm oportunidades de subir
em escalas sociais, seja porque são pobres ou nasceram em famílias
ignorantes de espírito, caso das mulheres que são proibidas de estudar em
alguns países, ou de minorias que são reprimidas pelas demais. Mas mesmo
assim temos sempre a escolha de estarmos em uma escala humanitária de
solidariedade, união e compaixão pelo próximo. Deste modo, o sentimento
puro formador da alma será sempre o mesmo, puro e límpido, como o fez os
Criadores, basta que moldemos nosso futuro da melhor forma que
conseguirmos.
O garoto ouvia com extrema atenção às explicações, sequer
piscava, olhava bem no fundo dos olhos negros do senhor.
138
- Tem também que saber meu caro, que você é muito especial, e eu
sou grato por sua amizade e consideração, por isto quero que saiba que o
respeito é mútuo.
- O que significa respeito mútuo? – Questionou o garoto.
Damião ficou satisfeito, sabia que aquele garoto teria futuro, afinal,
era inteligente e ainda questionava sem vergonha alguma, somente com sede
de apreender.
- Quer dizer que lhe considero na mesma medida que você me
considera, e não me acho melhor do que você, e sim igual.
O menino sorriu. Aquilo foi a melhor coisa que já ouviu depois de
seus pais dizerem o quanto ele era especial por cuidar tão bem de seus
irmãos.
Damião retribuiu o sorriso, contudo, ainda lançou o sermão:
- Mas o que fez é errado!
- Como assim? Me diga que eu irei imediatamente me redimir! –
Indagou o jovem com aflição, revertendo o sorriso, agora crendo ter
decepcionado o senhor, algo que lhe traria grande remorso.
- Acalme-se... – Respondeu ainda sorrindo Damião. – Não há nada
neste mundo que não podemos consertar.
- Não entendi?
- É simples. Quando olha em meus olhos, demonstra mais respeito
do que desviar o olhar! Além disso, tem que saber que os olhos são o espelho
da alma...
- Como assim espelho da alma? – Interrogou o garoto demonstrando
novamente seu aguçado interesse, como se estivesse com sede de apreender
tudo aquilo que ainda estava predestinado a encontrar em seus caminhos.
Damião sorriu, queria
para aquele jovem, mas assim
intermediar diretamente com o
espiritual em sua jornada, um
algumas coisas da vida.
ter mais tempo para ensinar muitas coisas
que voltasse para a dimensão superior iria
conselho uma pessoa para ser seu tutor
Anjo ou Arcanjo que lhe pudesse ensinar
- Olhe, vou lhe ensinar bem rápido, porque infelizmente agora não
tenho muito tempo para saciar sua sede por conhecimento, mas lhe prometo
que em breve alguém muito sábio, certamente possuindo maiores
conhecimentos do que os meus, ira lhe ensinar tudo que deve apreender.
- Ninguém é mais sábio do que o senhor! – Afirmou o jovem com
olhar de tristeza pelo ancião não poder ser está pessoa.
- Não fique triste meu jovem! – Respondeu Damião fazendo um
carinho em sua cabeça. – Você verá que durante a sua existência neste
139
mundo material, vai encontrar pessoas com maior sabedoria do que eu, e
outras com nem tanta, mas que você poderá ajudá-las quando for à hora.
- Eu? Ajudar alguém? – Questionou o menino incrédulo.
- Sim você mesmo, você vai se surpreender com o que é capaz de
fazer se fizer as escolhas certas. Mas agora quero que leve seus irmãos para o
quarto, e se realmente confia em mim, não saia de lá, nem se ouvir gritos de
horror. – Damião olhou bem no fundo dos olhos do jovem, falando agora com
mais autoridade. – E quero que você cuide desta criança que acabou de
nascer com a sua vida, não somente porque ela é sua irmã, mas porque este é
o seu destino!
O jovem não respondeu, somente balançou a cabeça positivamente,
havia olhado no fundo dos olhos de Damião, e entendeu naquele momento
que as palavras levam a mensagem, mas os olhos confirmam sua veracidade
e também sua importância, e aquela ordem com certeza era de uma grande
importância...
O garoto em silêncio tomou a pequena Joana em um dos seus
pequenos braços, e com o outro foi guiando os demais irmãos com muito
carinho para dentro do quarto, quando fechou a porta Damião tranco-a
imediatamente, não duvidava do jovem, mas ele não poderia de forma alguma
correr o risco deles saírem daquele quarto enquanto ele estivesse fazendo os
trabalhos necessários...
******
Enquanto isso, Nimrod iniciava suas explicações para Expedito:
- Após o dilúvio, os homens que se formaram cresceram com medo,
e este medo passava de geração em geração. Eu simplesmente não poderia
permitir que tal medo barrasse a civilização humana, e, assim, impedisse a
continuidade no plano terrestre de forma livre das garras de um Deus tirano.
- Mais este mesmo Deus havia feito uma aliança com vosso bisavô e
toda posteridade, assim, a população não tinha o que temer, e, sequer ver
Deus como um tirano. – Expedito tentou contrapor.
- Não sei o que pensar, contudo, àquela época tudo era sim dirigido
por um Deus tirano, e todos tinham medo de que ele rompesse a aliança, após
ter derrubado minha torre, e, espalhado meu povo confundindo às línguas ele
provou assim o ser, porquanto, mais uma vez interferiu diretamente nas coisas
que havia deixado claro que não iria fazê-lo.
Realmente ele tem razão! Ao erguer a torre de babel Nimrod foi
longe demais, mais com a interferência daquele que eles dizem ter sido Deus,
a aliança de não interferência foi sim em parte quebrada. – Expedito
raciocinava concordando em parte, contudo, não poderia deixar que ele
pensasse assim e continuasse com tal ódio, então decidiu colocar panos
quentes:
140
- Mais dizem que este Deus tirano deixou o cosmos e o Conselho
Supremo assumiu nesta época.
- Não pense assim meu caro... – ele fez expressão de desdém,
como se Expedito não soubesse sequer do início da história. – Muita coisa
rolou antes disso ocorrer, e, até mesmo para eu ter dado início a torre foi
porque não aguentava mais tanta pressão.
- Como assim? – Expedito se interessou, não tinha muito tempo,
mais sempre quis saber a verdadeira história, e, no fundo sempre soube que a
que lhe contaram continha pelo menos lacunas muito obscuras.
- Quando vi meu povo com temor de Deus, me rebelei contra ele,
afinal, o mesmo continuava em muitas oportunidades interferindo diretamente
nas coisas. Assim, uni forças e iniciamos a construção da torre não para trazer
segurança, porquanto, tinha convicção de que ele poderia quando quisesse
destruí-la com seu enorme poder divino. Porém, eu queria que ele entendesse
que a população tinha que ter a confiança que a aliança ia ser cumprida, e,
caso tivessem um falso refúgio para alagamentos iriam pensar estarem
seguros, e tocariam suas vidas sem medos.
- Faz sentido. – Expedito teve que concordar.
- Lógico. Contudo, ao invés de deixar as coisas acontecerem, ele foi
além de derrubar a torre, visto que ainda confundiu e espalhou meu povo que
eu custei para unir. Neste mesmo dia jurei que iria obter vingança, não iria para
o lado negro, contudo, ele iria sentir minha ira.
- O que você fez? – Agora Expedito estava mais do que curioso,
afinal, até aquela parte ele sabia, após e que a versão que ele conhecia não
fazia muito sentido.
- Iniciei uma aliança com os maiores guerreiros, e formamos o
primeiro exército celestial, onde continha além de seres místicos, alguns
Arcanjos e Anjos da primeira classe existente, ainda, advindos da era
mitológica, os quais não concordaram com a atitude daquele Deus.
- Então foi você que reuniu o primeiro exército sublime, e, justamente
para atacar Deus... – Expedito não conteve seu espanto.
- Ai você está enganado em uma parte meu caro, não atacamos o
verdadeiro Criador ou Criadores, atacamos um Deus.
- Como assim?
- Utilizando de muita cautela adentramos com forças hoje ditas
ocultas, mas que naquele tempo dizíamos ser magia, diretamente na dimensão
daquele ser que se intitulava Deus. Após se acuar, por perceber que o exército
era formado por seres muito poderosos, ele abriu-se com muito custo para um
diálogo.
- Você já conversou diretamente com Deus, o todo poderoso? –
Expedito parecia uma criança.
141
- Não! Percebemos somente naquele momento que a aliança havia
sido quebrada não pelo verdadeiro Criador ou Criadores que pactuou com meu
bisavô.
- Quem era então? – Expedito não se aguentava de curiosidade,
havia até mesmo se esquecido que estava no inferno.
Para seu espanto Nimrod foi direto ao ponto:
- Lúcifer!
- Lúcifer?! – Expedito não acreditava – Como assim?! Ele conseguiu
adentrar no espaço celeste?
- Pelo que ficamos sabendo depois, ou pelo menos cremos nisto,
porquanto, é a única explicação mais racional, parece que o Criador após fazer
a aliança e prometer não mais interferir em sua criação, simplesmente foi-se
embora.
- Como assim foi embora? – Expedito realmente não havia
entendido.
- Você já viu o Criador? – Nimrod falou mais com conotação de
pouco-caso.
É, vejo que ele está em todas às coisas, assim, o vejo em tudo, até
mesmo em mim... – seus pensamentos tilintavam – Lado outro, o ver em forma
materializada como se fosse um igual infelizmente nunca. Sei que ele está
presente, mais somente o sinto, o toco com minha essência, porque ela é parte
dele, contudo, não sei se posso afirmar que o conheço a fundo, apesar de
amá-lo acima de tudo!
- Não consegue chegar a está resposta, estou certo não é meu
amigo? – Nimrod questionou sorrindo, literalmente por ter pegado Expedito de
surpresa.
- Sim... – A resposta veio com uma ponta de vergonha e decepção.
- Não se sinta culpado, porquanto, nem eu nem ninguém desde os
tempos primevos desta era podem afirmar com precisão que já estiveram na
presença dele, até mesmo os Arcanjos atuais desta dinastia celeste
certamente nunca o viram face a face senão pela presença energética.
- Sei, mais o que fizeram com Lúcifer? – o olhar de Expedito estava
mudado, era consumido pelo ódio somente de falar naquele ser –
Conseguiram prendê-lo?
- Lúcifer como você já deve saber é o ser mais enigmático de todo
cosmos, pelo menos em meu ponto de vista. Após o verdadeiro Criador ou
Criadores terem ido, ele viu a oportunidade de ser aquilo que ele sempre
sonhou, o verdadeiro Deus. Já que todos os outros Semideuses da era
mitológica estavam encarnados, e, ele além de não estar, ainda, tinha enormes
poderes, conseguiu adentrar no espaço celeste e ludibriar a todos. Só que ele
142
não contava que humanos como eu iriam se rebelar, igualmente aos Arcanjos
e outros seres celestiais que ele pensava que iriam protegê-lo.
- Ele lutou quando vocês o emboscaram?
- Não, ele é esperto demais meu caro Expedito, sabia que
poderíamos aniquilá-lo, e que com a fúria que estávamos iriamos realmente
fazê-lo. Ele simplesmente fugiu.
- E vocês permitiram? – Expedito estava agora perplexo, afinal,
pensava:
Como seres tão poderosos não enfrentaram o maldito do Lúcifer?!
- Não tínhamos isto em mente, e, tenho que lhe confessar que
estávamos mais assustados do que Lúcifer, porquanto, tínhamos ido ao local
enfrentar o todo poderoso, e nos deparamos com aquilo.
- E após ele fugir, o que fizeram?
- Misteriosamente sentimos como se nossos ouvidos estivessem
sendo pressurizados por algo estranho, de repente ouvimos uma estranha voz,
não tinha timbre nem som, era como se estivéssemos ouvindo nossa
consciência, contudo, sem ter qualquer poder de parar, etc.
- Sei, já senti isso, só que nunca em coletividade. – Expedito estava
arregalando os olhos, aquilo lhe parecia esplendido. – O que ouviram?!
- Era algo neste sentido:
“Agora sei que os homens em todos os estágios da evolução, tanto
na material quanto imaterial, bem como, demais seres celestes estão prontos
para assumirem esta parte do cosmos...”
- Como assim esta parte do cosmos? Afinal, teria outra parte? –
Expedito interrompeu.
- Sei lá, deixa eu terminar, depois você pensa o que quiser. – Nimrod
foi totalmente grosso.
- Sim. – Expedido respondeu diminuindo sua empolgação.
- O final foi assim:
“Agi certo pela primeira vez ao entregar tudo, e deixar que sigam
seus caminhos, sem qualquer interferência, e, assim, será até o fim dos
tempos.”
Expedito estava boquiaberto, não poderia acreditar no que estava
ouvindo, e foi logo tagarelando:
- Você ouviu o Criador em pessoa!...
- Não. Somente ouvimos algo, não podemos afirmar nada. – ele foi
categórico – Lado outro, após isso, não retornei mais para o meu reino na
143
dimensão material, tornando-se ali somente uma lenda após libertá-los dos
dogmas de um falso Deus, e fui caçar tesouros perdidos pelo cosmos.
- Foi nestas caçadas que encontrou o objeto que vim buscar?
- Sim, foi em uma dessas que encontrei o objeto que você pretendia
buscar. – Nimrod não conseguiu esconder seu sorriso malicioso ao ver a
expressão de Expedito.
- Achei que você iria colaborar.
- Isto não é para mim meu caro. – agora ele andava de um lado para
outro, demonstrando seu nervosismo – Além disso, não sei se posso confiar no
Conselho novamente, porquanto, mesmo não tendo me caçado, e, deixado
que eu cuidasse deste objeto, eles ainda me traíram.
- Não traíram não! – Expedito não apenas respondeu, mais apontou
o dedo indicador para Nimrod em sinal e fazendo, ainda, expressão de
reprovação. – Você é que se sentiu perseguido, e, ao invés de lutar, decidiu
fugir como um covarde, porque não ficou para lutar por seus ideais?!
Antes mesmo de Expedito terminar de falar Nimrod já estava em
cima dele... Pulou sobre o mesmo como um leão agarrando sua presa, no
exato momento em que sua fúria atingiu o limite.
- Então quer dizer que um ser fraco como você é quem está à frente
do exército dos homens? – Nimrod caçoava enquanto um punhal cintilava no
pescoço de Expedito.
- Posso ser mais fraco que você meu caro, contudo, te advirto que
antes de você cortar meu pescoço rasgo seu estomago de fora a fora! –
Expedito lhe advertiu com sague nos olhos, e cutucando-o na barriga com seu
pequeno punhal que retirou às pressas antes do ataque.
Nimrod sorriu muito, e vagarosamente foi se levantando...
- Você é bom meu novo amigo! Lado outro, para recuperarmos o
objeto terá que ter mais do que coragem, porquanto, ele está em um lugar
muito perigoso.
- Como assim em um lugar muito perigoso? Você não está cuidando
dele não?! – Expedito é que agora quase saltou em Nimrod de fúria.
- Acalme-se meu caro. Acalme-se... Você acha que durante todos
estes anos eu poderia simplesmente ficar passeando com o objeto por este
lugar.
Expedito olhou em volta e teve que concordar mesmo a contragosto,
realmente andar por aquele lugar portando algo tão poderoso era algo
inimaginável.
- Você está certo.
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- Sempre estou certo meu caro Expedito. Estava quando fugi com o
objeto, estava quando o escondi, e, estou agora em aceitar seu convite!
- Mais aonde você o escondeu?
- No castelo do maldito.
- O que?! Você está louco?! Como pôde ser tão estupido?! Dizem
que é neste castelo que Lúcifer reinou e ainda reina quando aqui está, é o
maior covil desta dimensão.
- Então, quem poderia imaginar que eu o esconderia ele lá? –
Nimrod se gabava de sua astúcia, era uma verdadeira loucura, mais no fundo
fazia realmente algum sentido.
- Como vamos pegá-lo novamente?
- Conheço alguns esconderijos e atalhos que vamos seguir que são
menos visados. Além disso, fiz alguns amigos que poderão nos guiar pelo
menos até perto dele. – pensou mais alguns segundos – Lado outro, tenho que
lhe advertir que se algo sair errado estaremos mortos. Não simplesmente
mortos, mais trucidados, porquanto, ali eles não matam, eles literalmente
torturam almas até a morte e depois às voltam à vida eterna somente para
recomeçar tudo novamente...
- Sei... – o silêncio tomou conta por alguns segundos – Já ouvi falar
o que Lúcifer fazia ali.
- Se fosse somente Lúcifer meu caro, aquilo ali seria o paraíso.
- Porque, quem mais orquestra ali?
- Neste tempo que estou aqui, percebi que todos criticam o lugar,
mais sonham em um dia ali estarem. É como se todos dissessem que eles são
manipuladores, gananciosos, etc., mais se tiverem a oportunidade de um dia
ali adentrar para mandar um pouco nesta dimensão eles se tornarão iguais, ou
até mesmo piores.
- São como a classe dominante da dimensão material, reis, políticos,
etc., todos criticam mais se estivessem no lugar deles iriam fazer o mesmo, ou
até pior.
- Sim, é por ai, só esqueceu-se de incluir o Conselho nestas
citações.
- Que isso Nimrod! Isso não é justo, posso até concordar que você
está certo em ter algum ressentimento ao Conselho, mais todos os seus
membros são justos.
- Não meu caro Expedito, posso lhe garantir que está errado, e, já
deve ter sentido isso. Utilizam votos, contudo, o exército e seus lideres sempre
perdem, visto que, não possuem o mesmo cabedal de palavras e afins
utilizados pelos filósofos. E, esta palavra “cabedal” – ele entonou, como se
tivesse decorado com ódio – eu apreendi da pior forma possível, e, percebi
145
naquele dia que a democracia do Conselho e todas existentes sempre serão
uma utopia.
Expedido ficou mudo, lembrando-se que realmente nunca teve voz
ativa no Conselho, sempre a ala filosófica ou politica vencia tantos os debates
quanto nas votações, aquilo realmente fazia algum sentido. Lado outro, não
poderia deixar que Nimrod permanecesse com tamanho ressentimento:
- É meu amigo, mais creio que apesar de algumas vezes injusta, a
democracia ainda é uma das melhores formas de divisão do poder, o qual,
sempre será de alguma forma injusto, mais ainda assim é menos tirana.
- Sei... – Nimrod deixou os pensamentos se perderem, voltando após
a realidade – Vamos parar de filosofar, porquanto, temos um longo caminho a
seguir. – e rapidamente virou-se andando apressado.
Expedito rapidamente o seguiu, e seus pensamentos não paravam:
Será que Nimrod não está é me fazendo cair em uma emboscada?
Afinal, tanto tempo neste local não poderia significar somente esconderijo,
mais, além disso, poderia ser sua nova casa, e, talvez eu esteja indo para a
recepção, direto para a recepção...
Em outro sentido pensava Nimrod:
Estou surpreso com este ser que me substitui na exército, ele é
muito corajoso, sequer titubeou em ir ao Castelo buscar o objeto, penso até
que cara ele vai fazer quando souber que não iremos ao Castelo...
146
CAPÍTULO 35
Berlim – Alemanha, 1982
O pai de Estela passou novamente pelo quarto, temia ver novamente
às figuras que ali se encontravam minutos atrás.
Após analisar o ambiente percebeu que eles finalmente foram
embora, então resolveu entrar, e ao avistar sua filha não se conteve, às
lágrimas escorreram por sua face.
Seu maior desespero foi quando percebeu que ela não estava
machucada em seu exterior, mas suas vestes estavam todas rasgadas, vendo
ainda a grande quantidade de sangue no colchão vindo de sua vagina, a qual
estava a mostra e muito avermelhada.
- O que eu fiz... – Disse baixinho com a voz se perdendo no vazio de
sua amargura e arrependimento...
147
CAPÍTULO 36
Londres – Inglaterra, 1982
Arthur olhava de longe, precisamente na grande sala de reuniões
com os diversos monitores em que se reunia com os demais membros do
Conselho.
Contudo, naquele momento os monitores exibiam tudo,
absolutamente tudo que ele quisesse ver em qualquer canto de todo o
audacioso projeto que estavam montando naquela base de operações, ele
monitorava de perto cada canto, cada pessoa, cada palavra.
Ele não precisava ficar olhando o tempo todo, porquanto, foi
instalado por uma equipe de amigos que mantinha em outro País, os quais
desenvolveram um avançadíssimo software que tinha a capacidade de captar
imagens e vozes e ainda literalmente deduzir o que seria suspeito e mostrar
logo após.
Ninguém em todo o mundo tinha referido sistema, e, até mesmo seu
amigo mais fabuloso no assunto, o qual ele havia conhecido em sua
adolescência, o matemático húngaro John Von Neumann, que desenvolveu ali
mesmo na Inglaterra os primeiros conceitos de um software morreu sonhando
em um dia chegar em algo tão avançado.
Tudo no complexo era exclusivo, e ele tinha certeza que não apenas
aquilo, mais até mesmo os sistemas de computação e computadores eram
únicos, e, muitos deles somente seriam mostrados para o mundo anos após,
tudo, porquanto, ele adquiriu exclusividade e confidencialidade, a base do
pagamento de milhões. Portanto, tinha a certeza que estaria à frente até
mesmo de nações.
Ele estava agora analisando a Dra. Kim ensinar para Charles os
projetos que seriam desenvolvidos em seu departamento, e em que partes
iriam trabalhar juntos.
Sua análise consistia em verificar cada passo dos dois, para ver se
havia ali entrosamento, e ficou surpreendido ao perceber que eles estavam se
dando mais bem do que ele esperava.
Olhou em outro monitor e verificou que quase todos os homens que
trabalhavam para Charles já estavam na sala de reuniões de sua divisão, se
espantando com a quantidade deles e em como eles se davam bem, estavam
todos agora conversando com os homens que foram pegos por ele na outra
noite, e o papo não era outro:
- Vocês foram pegos por um velho raquítico? – Caçoava um homem
alto e corpulento, ao passo que os homens abaixavam a cabeça sorrindo, e
somente respondendo:
- Queria ver se vocês dariam conta daquele fantasma.
Ele ficou chateado de ser chamado de velho raquítico, mas gostava
do apelido de fantasma. Após, voltou os olhos e o áudio ao monitor que exibia
148
Charles e a Dra. Kim, eles já estavam indo para o setor onde se encontravam
os homens.
- Homens! Quero que conheçam a Dra. Kim. – Disse Charles ao
entrar na sala.
Os indivíduos se levantaram demonstrando respeito.
- Como sabem nossa empresa terá como sede este local.
- Muito legal por sinal em chefe! – Disse um dos homens olhando
para toda a estrutura.
- Sim, também acho! Contudo, tenho que dizer que mesmo não
estando todos aqui, visto que alguns ainda estão em missões, quero que
foquem neste novo trabalho o máximo possível, e a Dra. Kim vai me ajudar a
equipar vocês com tudo que precisarem para os trabalhos. – Ele explicava
andando de um lado para outro, como sempre fazia nas reuniões.
- Quando poderemos conhecer as armas? Porque, segundo os
rapazes tem até uma bengala que faz altas coisas. – Questionou um dos
homens demonstrando ainda seus reais interesses, ou seja, que todos
estavam mesmo interessados nas armas, era para eles como brinquedos.
- Tenho que dizer que aquela arma, infelizmente, nunca estará
disponível para nenhum de vocês, ela é exclusiva do Sr. Arthur, e, tem
tecnologia secreta que ele não permite que seja compartilhada ainda, contudo,
creio que tenho outros brinquedinhos que vocês vão adorar. – Respondeu a
Dra. Kim se intrometendo nas explicações de Charles.
Os homens sorriram, se entreolhando e alguns chegaram a bater
nas costas do parceiro ao lado, como verdadeiras crianças quando recebiam o
recado de que iriam tomar um sorvete.
Charles estava muito assustado, mas ao mesmo tempo satisfeito ao
perceber a rapidez que parte de seus homens receberam a notícia da troca de
posto de trabalho. Parte, porquanto, muitos estavam em missões naquele
momento, e, portanto, somente iriam saber quando regressassem, mais já
haviam sido avisados para não irem para a antiga sede.
Neste momento Arthur entrou na sala para espanto de todos,
inclusive de Charles, menos da Dra. Kim que já sabia que o velho monitorava
tudo. O ancião havia acompanhado toda conversa, e queria além de conhecer
os homens, dar algumas notícias.
- Boa tarde a todos. Creio que alguns não me conhecem ainda, mas
outros sim. – Olhou sorrindo para os homens que havia literalmente aniquilado,
não com deboche, mas com alegria de estarem se entrosando. Ao passo que
estes abaixaram a cabeça, ainda não tinham superado a forma como foram
surpreendidos, mas os outros homens somente olhavam para a bengala.
– Vocês querem testar ela? – Questionou erguendo a bengala, e
jogando para um dos homens que ficou perplexo com o objeto em mãos.
149
- Como se utiliza? – Questionou um dos agentes com um enorme
sorriso nos lábios.
- Descubram e depois que terminarem venham a minha sala com
Charles que temos que acertar sobre remuneração, etc. – Respondeu já
virando-se e saindo rapidamente.
- Não estranhem, ele é assim mesmo. Entra sempre de surpresa, faz
coisas ainda mais surpreendentes, e, depois, para completar, sai também de
surpresa. – Disse a Dra. Kim sorrindo, ou pelo menos tentando esboçar um
sorriso, e também se retirando do recinto, regressando ao seu setor.
- Chefe... – fez uma pausa como se a pergunta fosse meio
constrangedora – Não vamos mais ganhar por missões concluídas?
- Creio que não meu caro Jefer, ele acertou a transferência da firma
e acertamos os custos e demais termos, mas quanto à remuneração de vocês
não quis interferir, afinal, seria questionável eu falar por vocês.
Todos confirmaram com a cabeça, mas deixando transparecer em
suas expressões que estavam preocupados que suas remunerações fossem
diminuídas.
- Vamos parar de falar em dinheiro, e tentar descobrir como funciona
este treco. – Disse um deles tentando afastar o mau humor, pegando a
bengala e colocando sobre uma grande mesa de reuniões.
Charles sorriu acompanhando os homens até a mesa, contudo, seu
pensamento não estava naquela bengala, mas sim na conversa que teriam
mais tarde, porquanto, ninguém mais do que ele queria que seus homens
ganhassem uma quantia digna, e, privá-los disto somente para descobrir um
segredo pessoal era algo que lhe deixava constrangido.
******
Após mais de cinco horas analisando a curiosa bengala, os homens
haviam entregado os pontos, não encontraram nenhuma forma daquele objeto
fazer nada de especial.
- Vocês tem certeza de que era está a tal bengala? – Questionou um
dos homens se jogando em uma das cadeiras totalmente transtornado.
- Olha, se não é ela se parece muito. – Respondeu um dos homens
que foi atacado.
- Deixem para lá homens, já está na hora da reunião na sala de
Arthur. – Disse Charles já se virando deixando a mesa.
Todos seguiram o chefe saindo do setor, e ao chegarem do lado de
fora pararam vislumbrando a grandiosidade do local. Todos definitivamente
ainda iriam ficar muito tempo daquela forma até acostumarem com tudo aquilo.
150
- Chefe, como é que vamos saber chegar até o escritório do velho?
- Eles me ensinaram que quando necessitarmos do transporte é
somente digitar neste painel a quantidade de pessoas e o local, que os
motoristas daqueles carrinhos vêm para buscar, pode demorar um pouco, mas
eles vêm. – Respondeu já inserindo a quantidade de pessoas e apertando o
botão enviar no painel ao lado da porta do galpão.
Para seus espantos em pouquíssimo tempo vários carrinhos
surgiram, devia ser quase toda frota, alguns agentes ficaram ainda para a
segunda viagem, mas não se incomodaram, aquilo tudo ainda era uma grande
diversão para todos.
Charles seguiu em um dos primeiros carrinhos junto a mais três
agentes e o motorista.
- Para onde vocês vão senhor? – Questionou o motorista.
- Vamos para uma reunião com o Sr. Arthur.
- Ele disse se era na sala de reuniões de sua sala, ou se era para
encontrá-lo na sala especial de operações? – Tornou o motorista.
Charles estava intrigado, não sabia que ele tinha tantos locais para
estar, pensava em uma grande sala, mas sala especial de operações soava
mais como um espaço fantasioso de filmes de ficção cientifica.
Percebendo a expressão de Charles o motorista não aguardou
resposta, pegou um pequeno telefone dizendo:
- Senhor, onde será vossa reunião com o Sr. Charles e sua equipe. –
fez uma pausa. – São aproximadamente quarenta pessoas. – mais uma pausa.
– Sim estou indo.
- Para onde vamos?
- Para a sala de reuniões de sua sala mesmo, ele disse que eram
poucos e que ali estariam confortáveis.
- Quarenta pessoas vão ficar confortáveis somente em sua sala?
Nossa, então não quero nem saber o tamanho e requinte desta tal sala de
operações especiais.
- Ele sempre diz que o nome é ao contrário que você disse, se trata
de sala especial de operações. – Disse o motorista sorrindo, como se já
tivesse cometido a mesma gafe próximo ao velho e sido corrigido.
- É a mesma coisa. – Um dos agentes retrucou com deboche.
- Não, ele me ensinou que a forma que ele diz presume que sala
especial de operações é o real significado, porquanto, segundo ele ali não se
trata de um local de operações especiais, mas de especial de operações. –
Tentou explicar o motorista, que, conforme confessou, já havia recebido,
inclusive, uma correção pela troca.
151
- Ainda acho que é a mesma coisa. – Retrucou o mesmo agente
agora com cara de paisagem.
- Nunca diga algo assim para o Sr. Arthur! – O Motorista parecia
agora com medo. – Ele é um homem muito simples, humilde e descente, mas
tem certas manias, e, elas envolvem até mesmo ter um certo arrepio quando
as pessoas erram nomes de pessoas ou trocam nomes ou invertem alguns,
principalmente neste local. Aqui ele parece que trata tudo como uma mãe que
protege um filho, até mesmo quando alguém pronuncia seu nome de forma
errada. – O motorista orientou.
- Entendido, então creio que se chama mesmo sala especial de
operações, e pronto! – Disse um dos agentes sorrindo, ao passo que o outro
ainda permaneceu com a mesma cara achando tudo aquilo uma tremenda
bobagem.
Ao chegarem a um grande galpão, os carros pararam, e, todos
desceram. Charles determinou que aguardassem que os outros chegassem,
para entrarem juntos. A princípio o setor em que Arthur ficava parecia se tratar
de um galpão como os outros, por fora imponente, mas sem nada de mais.
Após todos chegarem em mais duas viagens, Charles digitou no
monitor, e recebeu a permissão de adentar vinda da mesma central próxima à
porta, e, se assustaram ao cruzarem a mesma...
O interior da sala de Arthur não era composta de grandes
laboratórios como os demais, mas era como se estivessem entrando em um
museu. E não era um simples museu, tinha um grande aquário com várias
espécies de peixes, tumbas em ouro que os homens e Charles ao analisarem
mais de perto perceberam que deveria provir do Egito, e várias relíquias que
enxeriam os olhos de qualquer colecionador.
- Nossa, nunca entrei em um lugar tão fascinante. – Disse um dos
agentes como um tarado entrando na zona.
Ao adentrarem ainda mais eles ficaram ainda mais perplexos, havia
uma biblioteca onde vislumbraram volumes muito antigos, ela era cercada por
vidros que formavam uma estufa, mas haviam muitos aparelhos em seu
interior, e Charles disse sorrindo:
- Deve ser para conservarem os documentos, afinal, parece que ali
têm vários... – Fez uma pausa lembrando-se do que eles tinham que pegar na
missão anterior na mansão de Arthur. Dizendo baixinho, mas todos os homens
entenderam os motivos: - Pergaminhos.
- É chefe, pelo menos agora sabemos que mesmo que passássemos
pelo velho, acho que seria impossível chegarmos neste local e pegarmos
qualquer um destes objetos. – Disse um dos agentes que participou da
operação, quase soando como um grito de alívio por não terem falhado tanto,
afinal, aquilo não era definitivamente uma missão possível.
- É meus caros, tenho que concordar que até mesmo eu estou
espantado com tudo isso. E, pelo que me parece, teremos agora a missão
152
inversa, ou seja, proteger isto tudo! – Disse Charles sorrindo, e, erguendo os
braços para a imensidão daquele lindo local.
- Nossa chefe, tem até uma estufa de plantas ali. – Disse um deles
apontando para outro setor que se mostrou presente somente após eles muito
andarem.
- Creio que nem se vocês ficarem aqui por uma semana vão
conseguir apreciarem minhas preciosidades! – Gritou Arthur ao longe soltando
uma enorme gargalhada, afinal, ninguém havia estado ali após a conclusão da
obra, somente a Dra. Kim, mas ela era outra história, porquanto, nunca
demonstrava qualquer sentimento, agora ele tinha certeza que seu setor
estava maravilhoso, como sempre sonhou.
- Nossa Sr. Arthur, estávamos muito intrigados com a sua bengala,
mas pode esquecer, nos estamos agora mais surpreendidos com este local. –
Disse um dos agentes ainda sorrindo de forma abobada.
- Espero que eu também não fique desta forma quando discutirmos a
suas remunerações. – Respondeu o velho sorrindo. – Venham, vamos logo à
sala de reuniões que tenho um compromisso daqui a duas horas, e, creio que
neste terei que tomar banho. – Concluiu com cara feia, como um menino
fazendo pirraça para não se lavar.
Eles seguiram o velho, e, após uma boa caminhada, chegaram a um
enorme elevador, que levou todos de uma só vez a um andar superior, que
eles juravam não ser possível ali estar, devido à altura que tinha aquele local,
visto que às estufas eram enormes, havendo na estufa de vegetação, até
mesmo enormes árvores ali plantadas.
- Podem ficar tranquilos, já estamos quase lá. – Disse o velho
sorrindo para todos, os quais ainda estavam perplexos com o tamanho
daquele elevador, afinal caberiam facilmente umas cem pessoas em seu
interior.
- Para que um elevador tão grande? – Teve que questionar Charles.
- É para o caso de eu querer trazer algum dos itens lá de baixo para
mais perto de mim, ou trazer de volta os que já estão lá.
Quando o elevador parou e se abriu, Arthur saiu rapidamente, mas
os demais não, afinal, estavam muito perplexos para fazê-lo...
- Vocês gostaram tanto assim do elevador? – Disse Arthur sorrindo.
Lógico que sabia que eles estavam boquiabertos com o local, afinal, até
mesmo ele ficou encantado com o mesmo após terminado.
O ambiente era enorme, o piso foi o que mais lhes intrigou, afinal,
era inteiramente de vidro, eles podiam ver todo o acervo do galpão lá embaixo,
havia uma grande mesa de reuniões, que deveria contando por baixo caber
umas setenta pessoas facilmente.
153
Contudo, o que mais lhes intrigou foi à mesa de Arthur, a qual ele se
dirigiu para pegar uma caneta e alguns papeis antes de retornar para a parte
da ponta da outra grande mesa de reuniões.
No topo de sua mesa, eles ainda perceberam que havia telões que
mostravam todos os setores daquela fortaleza em tempo real, e havia em meio
a animais empalhados uma porção muito grande de objetos que eles
presumiram serem armas de última tecnologia, mas eram apenas os
computadores da central.
- Sentem-se. – Ordenou o velho apontando para as cadeiras, mas
ele permaneceu de pé, afinal, queria discorrer sobre seus planos e sobre a
remuneração deles.
- Todos se sentaram, mas a maioria deles não olhou para Arthur,
mas sim para o chão, ou melhor, para a sensação de ausência dele!
- É como se estivéssemos voando não é? – Disse Arthur para
quebrar o gelo.
- Sim, nunca me senti tão bem. – Respondeu um dos agentes que
olhava para o chão sorrindo como criança.
- Bem agentes, já se divertiram muito, mas agora é hora de
tratarmos de coisas serias. – Disse Arthur mudando sua expressão, ao passo
que os agentes seguiram-no, erigindo a postura em sinal de atenção.
A sorte está lançada, é agora que vou saber se meus agentes vão
me seguir nesta empreitada. – Pensou Charles com temor, não sabia o que o
velho iria propor, mas tinha a impressão que aquilo tudo não foi construído
esbanjando dinheiro, e, ainda, sabia que pessoas daquele tipo costumavam
pagar muito mau seus funcionários...
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CAPÍTULO 37
Vilarejo na França, 1982
O casal estava com um medo extremo, porquanto, Damião ao
trancar as crianças no quarto foi de encontro a eles segurando aquela espada
enorme.
Contudo, à medida que ele se aproximava o medo foi se esvaindo,
afinal de contas era o mesmo senhor que sempre os ajudou, e aquilo tudo
deveria ter algum significado, por isto decidiram confiar nele...
Enquanto ele caminhava, a mãe foi apertando um pequeno rosário
na mão esquerda, a qual se encontrava úmida de tanto suor, rezava baixinho,
e pensava que afinal de contas Damião sempre foi considerado um santo
naquela região, onde ajudou muito gente necessitada, sem pedir nada em
troca, curou várias pessoas, e muito humilde nunca aceitou qualquer
reverência ou dinheiro.
Ao se aproximar da cama Damião colocou a espada sobre uma
velha mesa de carvalho, chegou bem perto do casal levantando ambas às
mãos, às colocou uma na testa de Lucinda e a outra na de Jonas.
No momento em que sentiram as mãos do velho em suas testas,
perceberam como se uma forte descarga elétrica tivesse passado subitamente
por seus corpos. Neste momento, Damião começou a rezar de uma forma que
eles nunca tinham visto, era uma língua estranha, e após alguns minutos o
ancião começou a suar, e para espanto do casal de seus poros não saiam um
suor comum de fluido liquido cristalino, mas avermelhando, e à medida que o
tempo passou eles confirmaram, era sim com toda certeza sangue...
O casal estava espantado, a cada minuto o velho suava em maiores
proporções, o que o levou em pouco tempo estar coberto pelo seu próprio
sangue.
E, em poucos segundos o casal foi perdendo a visão, a última coisa
que os dois lembravam-se era das vestes do senhor que estavam
completamente encharcadas em sangue, e, após, mais nada, somente a
escuridão, eles ainda estavam conscientes, mas não conseguiam mover
nenhum músculo, era como se estivessem em um pesadelo e não podiam
acordar nem se moverem.
Após minutos na escuridão e aflição, Lucinda e Jonas começaram a
visualizar algo como se fosse um túnel. Apesar da escuridão seus olhos
estavam agora abertos, só que suas pupilas estavam extremamente dilatadas,
como se estivessem sendo acometidos por Midríase.
Contudo, tudo aquilo tinha uma explicação, ou melhor, quase...
Inexplicavelmente Damião podia ver através das pupilas dilatadas tudo o que o
casal estava vendo em seus inconscientes, e à medida que rezava com mais
afinco, visualizava ainda melhor o filme da vida de ambos.
À medida que as imagens foram se tornando mais nítidas, Lucinda e
Jonas começaram a perceber o que estava ocorrendo, era como se estivesse
155
sendo rodado em suas frentes um filme de suas vidas desde os últimos
acontecimentos, só que como se estivesse sendo transmitido em alta
velocidade do presente para o passado.
Dava para ver tudo o que já tinham vivenciado na vida! Tentavam
parar em alguma lembrança, como a dos pais que sentiam tantas saudades.
Mas não dava! O pensamento não parava, o filme da vida parecia estar fora de
controle, voltando no tempo de maneira frenética, resgatando memórias que
eles nem se recordavam mais devido ao longo tempo que não as acessavam.
Após alguns minutos, a memória dos dois chegou à infância, em
tempos diferentes porquanto Jonas era mais velho que ela dois anos. Lucinda
e Jonas começaram a tremer, quando às imagens começaram a ficarem
turvas, ao passo que eles enxergavam somente cabeças, como se alguém
estivesse a bajulá-los.
Nisto Damião parou, e falou:
- Agora vocês estão próximos a quebrarem a barreira, equilibrei as
lembranças para vocês chegarem juntos às que tiveram quando ainda eram
recém nascidos, as quais somente estavam guardadas em seus
subconscientes... Neste momento vocês estão vendo somente imagens
foscas, porquanto, nesta época somente viam rostos de parentes que
chegavam para lhe mimarem. – O mais estranho era que Jonas e Lucinda
podiam ouvir perfeitamente Damião, mas não conseguiam qualquer
comunicação com ele, seus pensamentos estavam parados em uma imagem
fosca.
Após dizer isto, Damião apertou fortemente às mãos na cabeça de
ambos, fazendo com que gotas de seu sangue escorressem por seus rostos.
Neste momento, Jonas que estava em pé foi caindo ao chão,
gemendo e suando frio, ao passo que Lucinda que ainda estava deitada,
porquanto, havia acabado de dar a luz, começou também a suar, e a tremer.
Em pouco tempo os tremores que eram poucos se transformaram
em algo frenético, eles babavam como se estivessem sofrendo de epilepsia.
Neste momento Damião gritou:
- Aguentem firme, vocês vão conseguir, não desistam pelo amor de
Deus...
Ao proferir a palavra “Deus”, ambos pararam de tremer, e os olhos
arregalaram-se ainda mais, e às pupilas de ambos que estavam dilatadas
foram ficando esbranquiçadas, como se uma nevoa cobrisse tudo!
Após alguns minutos a nevoa esbranquiçada no olho foi dando
novamente lugar ao negro, e às pupilas de ambos foram gradativamente
voltando ao normal, e eles voltaram a si como se tivessem acabado de acordar
de um pesadelo, e um silêncio tomou conta do quarto...
Damião tirou as mãos das testas deles, e caiu ao chão gritando de
dor, estava fraco, não conseguindo sequer aguentar o peso do próprio corpo,
mas ainda conseguiu gritar para eles:
156
- João, você esta me ouvindo? – Após virou-se com dificuldade a
cabeça para Lucinda dizendo: - E você Lourdes, está bem?
Nisto Damião não conseguia mais firmar seus pensamentos, foi
consumido pela extrema dor que tomava conta de todo o seu ser, e começou a
gemer no chão.
O filho mais velho do casal batia na porta tentando sair, os gritos
vindo de fora o haviam atordoado, nisto vendo que a porta estava trancada
pelo lado de fora, pulou a janela, e correu para a porta de entrada, porquanto,
lembrou-se que a janela ali estava quebrada devido a saída de Damião
momentos antes portando aquela grande espada.
Contudo, quando conseguiu pular pela janela quebrada e adentrar
na casa novamente, ficou muito mais assustado ao ver Damião completamente
ensanguentado caído ao chão.
Correu para ajudá-lo, mas ao se aproximar de Damião este lhe olhou
no fundo dos olhos, dizendo gemendo de dor:
- Não falei para você ficar no quarto? – O menino assentiu com a
cabeça com o corpo todo tremendo. Virou-se e correu destrancando a porta e
entrando novamente no quarto, trancando-a agora pelo lado de dentro, ao
passo que o medo lhe consumia todo ser, como um parasita...
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CAPÍTULO 38
Londres – Inglaterra, 1982
- Vocês conseguiram encontrar o segredo de meu brinquedinho? –
Questionou Arthur olhando para sua bengala no colo de um dos agentes.
- Desculpe senhor, ficamos muito exaltados ao ver este local que
nos esquecemos, tome. – Respondeu o agente entregando o objeto.
- Vocês conseguiram fazer ela trabalhar? – Arthur questionou
sorridente, mas já sabia a resposta, ela estava estampada em suas testas,
afinal, não era difícil ver a expressão de fracasso em seus rostos.
- Me desculpe senhor, mas será que não nos entregou o objeto
errado por engano? – Outro agente questionou com certa cautela, afinal,
estavam ali para acertar salários, e colocar a honestidade de seu eventual
futuro cliente era algo insensato.
Arthur olhou para o abjeto, colocou sua alça apoiada em seu ombro,
mirando como uma metralhadora, após, deu um berro:
- Tatatatatata! – Ao passo que alguns agentes pularam, e Arthur
percebeu que foram os mesmos que ele baleou no dia anterior. – Vocês
ficaram assustados? – Questionou ele sorrindo muito da expressão de espanto
dos mesmos.
- Desculpe senhor, mas creio que isto não tem graça. Os nossos
companheiros não falam, mas duvidam que esta arma possa fazer o que
dissemos, e, estamos passando por mentirosos. – Gritou um dos agentes,
jogando para fora sua total revolta com a situação.
- Qual deles mais duvida de tudo isto? – Questionou Arthur ainda
sorridente.
- Eu duvido! – Gritou um dos agentes que se encontrava na fileira da
frente. Era loiro e magro, mas parecia ser muito astuto. – E digo mais, mesmo
que este treco fizesse algo, nunca conseguiria pegar um cara como eu
desprevenido...
Enquanto ele ainda falava a expressão de Arthur mudou
subitamente, ele deixou a bengala rolar por entre os seus dedos, colocando
sorrateiramente o indicador próximo à alça, após a mesma emitiu um pequeno
e quase que inaudível bibe, e vibrou um pouco, era o sinal que o sensor havia
feito o reconhecimento das digitais, dai em diante foi questão de segundos
para Arthur levar a alça de apoio das mãos para seu ombro como se o objeto
fosse uma metralhadora! O agente sorriu, crendo que tudo era a mesma
brincadeira anterior, mas em milésimos de segundos a bengala emitiu agora
um grande bipe, movendo mais algumas partes, virando uma pequena
metralhadora. Aquilo era inexplicável, e o agente que antes falava agora calou
subitamente a boca, afinal, estava com uma arma que ele julgava inexistente
apontada para seu peito, após ele somente teve tempo de gritar, antes que um
tiro certeiro acertasse seu peito...
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Os demais agentes se afastaram, e o baleado tentou se levantar,
mas caiu como um saco de frutas novamente ao chão, deixando um pouco de
seu sangue escorrer no lindo chão de vidro.
- Você está louco?! – Questionou Charles assustado e ao mesmo
tempo consternado com a atitude do velho.
- Não, estou apenas salvando a boa harmonia de nossa equipe,
afinal, não acho justo que os agentes que foram por mim surpreendidos sejam
objeto de chacota dos demais, e, ai, alguém mais dúvida?! – Respondeu Arthur
sorrindo e olhando para todos na sala.
- Mas para isto você tem que matar meu agente?
- Largue de ser bobo, afinal, os demais não estão aqui?! - Olhou com
cara de cético para os rapazes que haviam sido anteriormente baleados. – A
bengala, ou melhor, arma, tem um sensor tanto de laser, calor e demais, os
quais quando a mesma é apontada medem com precisão a distância que será
percorrida pela bala após o disparo até acertar o alvo, tudo para que a bala
perfure somente uma pequena camada da pele.
Fez uma pausa olhando, e percebeu que Charles ainda não estava
contente, então resolveu terminar a explicação para acalmá-lo:
- Após o disparo, as balas, as quais insta mencionar, também não
são comuns, contém micro sensores para ajudar os demais equipamentos de
sensores anteriores, razão pela qual, não falha! E, após entrar em contato com
a pele é liberado um sonífero poderoso, que entra rapidamente na corrente
sanguínea, mas não atingem órgãos, o máximo que fazem é dor, sangue e
derrubar o individuo em pouco tempo.
- Mas porque saiu muito sangue? – Questionou um dos agentes que
olhava para o vidro avermelhado.
- Nas balas também contém um agente que provoca uma pequena
hemorragia no local em que penetra a bala, razão pela qual, sai um pouco de
sangue. Tudo para dar a impressão que a pessoa foi baleada realmente e
morreu, e, por esta razão que seus parceiros ficaram em minha mansão
naquela noite. – Fez uma pausa olhando para os agentes. – Mas podem ficar
tranquilos que a reação do agente dura apenas alguns segundos, após sair um
pouco de sangue ele é anulado e entra em cena outro, o qual promove uma
coagulação, barrando assim a hemorragia.
- O senhor quer dizer que isto tudo se encontra nesta simples
bengala que analisamos a tarde toda sem nada encontrar? – Questionou agora
outro agente, um pouco mais alto e gordinho.
- Sim, e mais algumas coisas. Mas não fiquem nervosos, afinal, este
equipamento contém sensores que somente liberam o poder letal deles após
colocar meu dedo e ainda de fazer uma leitura sonora de meu batimento
cardíaco. – Tentou explicar Arthur.
- Porque o batimento cardíaco, isto não tem nada a ver. – Retrucou o
mesmo agente.
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- Digamos que não posso dizer mais nada, mas podem ter certeza
que teria balas aqui suficientes para terem acabado com uma boa parcela de
vocês, e, ainda, algumas pequenas bombas que neutralizariam o restante, pelo
mesmo modo, só que de forma mais agressiva.
- E quando meu agente voltará ao normal, afinal, temos que discutir
tudo em conjunto. – Disse Charles agora mais calmo.
- Quero primeiramente que vocês entendam que somos a partir
deste momento uma família, e, assim sendo, podemos brincar, sorrir, zuar,
mas nunca, absolutamente nunca menosprezar os sentimentos de nossos
parceiros, porquanto, é certo que alguns tem traumas que os outros não
compreenderiam. Além disso, devemos apoiar e compreender o outro como
nosso irmão, ou até mais, porquanto, será o seu parceiro o responsável por te
ajudar a voltar para casa para encontrar-se com sua legítima família. – Arthur
berrou com olhos fixos como uma fera, não deixando passar nenhuma
expressão, como se lesse cada um.
Todos assentiram, e Charles expressou até mesmo um sorriso,
aquilo ele realmente nunca poderia esperar, estava muito preocupado com a
relação dos agentes que foram atacados naquela noite na mansão com os
demais, mas, Arthur parecia ter pensado naquilo e fulminou qualquer
controvérsia que poderia ocorrer futuramente.
Arthur vendo que todos estavam entendendo, principalmente,
Charles, sua verdadeira fonte de preocupação, afinal, não queria passar por
cima de sua autoridade, mas queria ajudar como poderia, chegou perto do
agente, e, digitou algo em um teclado não visto pelos demais na alça da
bengala. – Ele é somente vibratório, não é identificado pela visão, assim, fica
mais fácil de eu potencializar meu fator surpresa. – Explicou ao perceber que
os demais tentavam visualizar o painel em que ele digitava.
Após chegou perto do agente, e encostou à ponta da bengala em
seu peito, posteriormente a um estalo seu corpo começou a tremer. – Choque
elétrico bem no coração é capaz de neutralizar parte do sonífero e fazer com
que a adrenalina prevaleça, assim, ele ira acordar...
Foi então interrompido pelo agente que soltou um enorme grito
erguendo-se do solo como se estivesse acordando de um pesadelo. –
AAAAAAAAAAAAAAAA. – O grito foi ecoado por todo ambiente.
- Agora. – Concluiu saindo de perto. – Creio que é melhor ficar
longe, vou ao banheiro, e, quero que ao retornar vocês tenham explicado para
ele o que ocorreu, e como quero que se comporte a partir de agora. – E saiu
apoiando seu corpo na bengala que já havia voltado ao normal na mesma
rapidez que havia se transformado...
- Isto é a coisa mais impressionante que já vi... – Disse um dos
agentes após ver o velho andando vagarosamente em direção ao final da sala,
ao passo que o baleado olhava para todos os lados, como um cedo em um
tiroteio, ainda tentando se situar no ambiente.
160
CAPÍTULO 39
Vilarejo na França, 1982
Jonas e Lucinda se levantaram ao mesmo tempo, ele do chão e ela
da cama. Ela não mais parecia que tinha dado a luz naquele momento, e ao
verem Damião estirado ao chão daquela forma, abaixaram-se rapidamente
colocando as mãos sobre seu corpo trêmulo, Jonas falou baixinho, como se
estivesse querendo consolar o amigo:
- Oi meu amigo, pedimos desculpas, mas após tanto tempo nesta
dimensão material ainda não havíamos conseguido quebrar nossas barreiras
sozinhos! Foi por isto que não conseguíamos nos lembrar da nossa vida
passada na dimensão suprema... – O pesar lhe consumia.
Damião custou a abrir os olhos, mas conseguiu balbuciar algumas
palavras com dificuldades:
- Deixe disto meus amigos... Cof! Cof! – Tossiu repelindo o sangue
de sua garganta, que manchou ainda mais a roupa de Jonas que o segurava
no colo. – As coisas mudaram e o universo não é mais o mesmo. O importante
é que vocês estão bem, e afinal de contas eu precisava de vocês somente de
agora para frente, a missão de vocês será muito importante, talvez a mais
importante de nosso grupo!
Damião parou um momento, cuspindo mais sangue agora sem
tossir, após uma longa pausa para recuperar forças continuou:
- Preparar Joana com carinho e amor e ainda para ser uma guerreira
como sempre foi não é, e nunca foi fácil... – Cof! Cof! – Sua personalidade é
muito difícil, e somente vocês dois seriam capazes de lhe proporcionar o amor
de que ela necessita, e ao mesmo tempo a garra e determinação para
enfrentar tudo que virá pela frente...
- Mesmo assim, demoramos muito tempo, e o senhor teve até que
intervir se sacrificando para quebrarmos a barreira, somos espíritos evoluídos,
não entendo porque não conseguimos sequer acessar alguns dons? – Falou
agora Lucinda demonstrando extrema tristeza e decepção.
Damião conseguiu dar um discreto sorriso.
- Lourdes, você é muito bela e amorosa espiritualmente, não se
sacrifiquem ou se martirizem com isto. Um amigo me disse hoje que Lúcifer
esta de volta... – Nisto ele parou, medindo as palavras, e somente após uma
pequena pausa prosseguiu, mas os dois perceberam o que ele queria evitar. Creio que ele de alguma forma interferiu na quebra voluntária da barreira de
vocês, afinal de contas, vocês são muito evoluídos, quem além de Lúcifer seria
capaz de interromper a quebra de barreira de Santos tão poderosos como
vocês dois?
Ao ouvir o que Damião disse João e Lourdes que se lembravam
agora de seus nomes adotados na dimensão suprema começaram a tremer
novamente, não podia ser verdade, João somente teve força de dizer:
161
- Lúcifer está de volta?
- Sim... Um amigo muito confiável me confirmou. Eu pensava que a
quebra da barreira poderia ocorrer mais para frente, só que após analisar a
questão, este amigo descobriu alguns planos de Lúcifer que me fizeram mudar
de ideia. - Damião foi direto ao ponto, não tinha mais forças para rodeios.
- Que planos são estes? – Questionou Jonas evidenciando sua
extrema preocupação.
- Ele não conseguiria fazer nenhum mal a vocês, porquanto, os
Arcanjos estão lhes protegendo. Mas conseguiu algo inusitado, consistente em
uma forma de barrar a quebra de barreira.
- Ele realmente é um gênio do mal, por isto comanda com eficiência
e rigor as trevas! Sabia que não conseguiria nos fazer mal, mas que evitando a
quebra da barreira isto seria ruim para nossos planos, contudo, ele estaria
estabelecendo as normas gerais do universo, de que a barreira não deve ser
quebrada para que a pessoa tenha uma vida desvinculada de sua herança
espiritual e consiga fazer a jornada em paz. Ele ajudou o universo a seguir seu
curso, e os Arcanjos nada perceberam, porquanto, evidentemente estavam
atentos somente para energias negativas que nos fossem impelidas, não para
positivas com efeitos negativos diante dos nossos planos. – Disse Lucinda com
o olhar perdido.
Damião pensou naquele momento na escolha sabia do mestre,
realmente aquela era a alma perfeita para criar Joana, Lucinda não era apenas
forte e destemida, era acima de tudo de uma inteligência surpreendente. Após
algum tempo contemplando a inteligência daquela alma havia até mesmo se
desligado um pouco da dor, como uma espécie de medição, contudo, voltou a
si quando uma dor dilacerante submergiu subitamente de sua barriga, e o
gosto de sangue veio ainda mais forte em sua boca, tinha pouco tempo...
- Certo... Não tenho muito tempo! O certo é que com este ato Lúcifer
iria garantir que após eu desencarnar, não teria ninguém com poderes
suficientes que fizesse o que acabei de fazer, e Joana não receberia os
ensinamentos de que tanto necessitaria tendo em vista que, como é de
conhecimento de vocês, o Conselho Supremo proibiu que qualquer espírito
conversasse desta vez com ela, queria que crescesse normalmente, e fosse
treinada pelos pais, por isto determinou que vocês encarnassem
imediatamente, mesmo quando não tinham vontade.
João e Lourdes abaixaram às cabeças demonstrando vergonha,
afinal, haviam questionado não apenas o Conselho Supremo, mas
principalmente seu mestre de coração, quando este lhes pediu pessoalmente
para encarnarem, sem lhes contar o que estava acontecendo.
- Não fiquem com vergonha, se ele lhes enviou é porque acredita
que serão capazes. – Disse Damião, com a voz ainda mais fraca...
João virou-se para Damião chorando, e somente deu conta de dizer:
- Você não existe meu amigo, seu amor e carinho são infinitos, e
seus dons ultrapassam qualquer poder... Em breve será um Deus...
162
- Para tudo há seu tempo, não tenho ambição em ser um Deus! Já
sou muito grato pelos poderes que já adquiri, eles foram capazes de quebrar o
que Lúcifer fez para que vocês não rompessem a barreira, por ora isto basta. –
Damião fechou os olhos mais uma vez, e gemeu como se as dores fossem
intensas, cuspindo mais um pouco de sangue. – Realmente não tenho mais
tempo, vocês deverão guardar esta espada em um lugar seguro, ela é do
arcanjo Miguel, uma das armas mais poderosa de todas as dimensões. – Fez
sinal para que Lourdes pegasse o objeto já que João o estava segurando. Cheguem mais perto que lhes falarei quem deverão encontrar no morro, ele vai
ajudar no treinamento de Joana, mais não deixem os Arcanjos ou Anjos, ou
qualquer outro ser além de Miguel ou minha alma verem vocês juntos a ele...
Ao chegarem perto de Damião e ouvirem quem é que iria orientá-los
no treinamento de Joana, eles deram um salto, dizendo em um som uniforme:
- O Traidor???!!!! Não pode ser!!!
Damião levantou a mão com o resto de suas forças, bateu ela
fortemente no chão, espirrando o sangue que ali estava empossado, falando
logo após com suas últimas forças:
- Não questionem mais as ordens do mestre como fizeram ao não
quererem encarnar!!! Somente as cumpram...
Após dizer isto Damião fechou os olhos, uma forte luz começou a
brotar de seu umbigo. Ao olharem para cima, João e Lourdes avistaram o
Arcanjo Miguel, ele entrou com as asas abertas no quarto em uma velocidade
extraordinária, colocou as mãos dentro do umbigo de Damião, levantando, logo
após, sua alma. O abraçou fortemente, olhou para eles, falando de uma
maneira ríspida e seca:
- Em breve entrarei em contato, não questionem mais qualquer
ordem, se não, eu mesmo desço na terra e arranco suas almas destes
corpos!!!
João e Lourdes ficaram atordoados ao verem o arcanjo retirando a
alma, viraram-se um ao outro falando:
- O mestre nos concedeu o dom de vermos as almas e Arcanjos,
tudo que está desencarnado! – Disse Lourdes.
- Só que Miguel está muito nervoso, como sempre... – João
respondeu com desanimo.
Mal sabiam eles que com este dom não poderiam ver somente seres
bons, mas alguns que em breve iriam preferir não verem nada... Onde a fúria
de Miguel seria muito pequena comparado ao que iriam presenciar...
163
CAPÍTULO 40
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
No céu da dimensão sublime surgiu uma grande bola de fogo, a qual
ia diretamente à grande colina...
Os Arcanjos, Anjos, Santos e outros seres evoluídos que estavam
naquela dimensão ficaram atônitos, se perguntando o que era aquela bola de
fogo? E, principalmente, porque ia para a grande colina?...
Todos se perguntavam se poderiam estar correndo algum perigo?...
Entreolhavam, não podia ser... Nada atravessava aquela barreira se não
tivesse luz e força espiritual suficiente...
A alta colina da dimensão sublime era um mistério, até mesmo para
os espíritos mais evoluídos do universo que ali se encontravam naquela
dimensão. Naquele local somente poderiam subir os espíritos sublimes,
considerados eleitos a se tornarem semideuses, uma vez que todas as
decisões sobre o universo eram ali discutidas pelo que era chamado Conselho
Supremo.
Então mesmo que todos que ali se encontrassem achassem que a
bola de fogo representasse uma ameaça, nada poderiam fazer, não tinham
autorização para ali adentrar sem serem convidados, mesmo sob qualquer
perigo a lei era clara, nunca subirem...
À medida que a bola de fogo foi chegando ao chão, foi parando, até
que o fogo que a cobria começasse a se dissipar, e em seu núcleo aparecesse
Miguel carregando a alma de Damião em seus braços.
Miguel havia em poucos segundos atravessado todas as dimensões
chegando à dimensão sublime com o amigo. Ninguém, absolutamente
ninguém além de um semideus conseguiria atravessar as barreiras naquela
velocidade sem ser destruído, era claro que ele tinha adquirido uma vasta
força e poder, e Damião que estava acordado sabia disso, e queria respostas...
Ao atingirem o solo, Miguel encostou seus pés de forma graciosa,
tinha perfeito domínio de seus poderes, o que deixou Damião ainda mais
espantado. Era certo que desde que encarnou na terra, tinha acontecido outras
coisas, e Jesus, Buda e os outros membros do Conselho Supremo, bem como,
certamente os Criadores tinham outros planos, que com certeza incluía o vasto
poder que o Arcanjo adquiriu neste tempo.
Mas como ele adquiriu tamanhos poderes? Como se curou tão
rapidamente após a luta com Serfalos? – Referidas perguntas não saiam da
cabeça de Damião, e ele sabia que aquilo seria um verdadeiro mistério, e por
isto mesmo tendo conhecimento do temperamento do Arcanjo, sabia que ele
não iria lhe contar nada, portanto, preferiu mudar de ideia e ficar calado.
Miguel deixou Damião descer, ele também era muito forte, já tinha
se recuperado da desencarnação, e as asas do Arcanjo o haviam protegido na
quebra das barreiras, aquilo era realmente magnifico.
164
Damião pensou consigo mesmo que também tinha recebido mais
poderes após regressar de sua missão a terra, porquanto, sabia que uma alma
comum levaria seis dias para conseguir reunir energias e sabedoria sobre a
desencarnação, porquanto, muitas almas ficavam fracas ou atordoadas, diante
do fato de se apegarem com tanta voracidade pela vida terrestre e aos bens
materiais que não mais poderia ter após o evento inevitável.
Damião há muito tempo não tinha mais estes sentimentos, em suas
últimas encarnações evoluiu muito, sabia perfeitamente o que lhe esperava
após a morte material, e dela não tinha medo ou receio algum, tinha era anseio
por este momento...
Pensou ainda nas primeiras vezes que desencarnou, quem foram à
sua solenidade de sétimo dia e, também, nos tempos que ainda não tinha a fé
católica em outras festas e encontros religiosos, sempre no sétimo dia,
porquanto, após este período o espírito volta à terra a fim de se despedir pela
última vez dos entes queridos que ali permaneceram, o sétimo dia sempre teve
conotação com o ciclo da vida, mas ele preferia intimamente o número seis,
ele simbolizava algo ainda imperfeito, inacabado, mas que em breve teria um
fim, um número fonte de mistério, que o intrigava muito.
Damião estava muito curioso, virou-se para Miguel com a confiança
de um amigo e falou em um tom não de questionamento, mas de respeito e
satisfação pelo amigo ter evoluído tanto:
- Parece Miguel que desde que encarnei você adquiriu poderes que
eu nunca tinha visto. Afinal, enfrentar Serfalos e ainda por cima atravessar as
barreiras como se fossem bolhas de sabão, e surpreendente! E segundo me
relataram você conseguiu fazer todos se tele transportarem direto daqui desta
dimensão até a terra, e isto usando a água como condutor, e, ainda, tem o fato
de em minutos ter se recuperado da batalha, o que aconteceu desde que
encarnei?...
- Não se preocupe Damião! Tudo lhe será explicado agora mesmo,
mas agora vamos correr! Não temos tempo para ficar conversando.
Ao responder desta forma Miguel surpreendeu o amigo, que
esperava uma evasiva não uma confirmação de explicações.
Neste momento o Arcanjo apoiou os braços nas costas de Damião, e
se dirigiu a uma entrada que se encontrava na colina, parecia uma caverna,
mas ao invés de conter escuridão dentro dela, ocorria o contrário... De lá de
dentro emanava-se uma luz, não uma simples luz, mas algo encantador, que
atraia Damião como um inseto sendo levado ao encontro de uma lâmpada, ele
só esperava não se queimar como o que ocorria com a pobre criatura...
******
- Como assim amigos? – Expedito quase gritou, porquanto, Nimrod
estava andando rápido demais.
165
- Porque a pergunta? Acha que não podemos fazer amizade em
todos os lugares?! Ou que alguém não seria digno de minha amizade neste
local?! – Nimrod respondeu com questionamentos, e, continuando a andar
rapidamente.
- Não é isso. Somente porque este lugar esta cheio de gente muito
má! Portanto, creio que não é o melhor dos lugares para se iniciar uma
amizade. – Expedito concluiu olhando para alguns demônios que estavam ao
longe, eles estavam escavando a terra, como se estivessem à procura de algo
ou procurando esconder algo...
- Isso é preconceito meu caro. Aqui tem pessoas que estão
simplesmente porquanto não aceitam a ordem que foi posta pelo Conselho de
submissão e encarnação em prol da evolução.
- Mais se eles tivessem estacionado sem tentar evoluírem, estariam
pelo menos em uma dimensão intermediária. Somente foram parar aqui,
porque, são gananciosos e não souberam aproveitar a oportunidade.
Assim que acabou de falar Expedito se assustou, porquanto, Nimrod
quase pulou novamente em sua garganta, mais assim que ele fez menção de
se proteger do ataque, o mesmo olhou bem no fundo de seus olhos dizendo
com ódio:
- Oportunidade? Você me diz que é oportunidade você ser jogado
em uma dimensão com tanto sofrimento como a material? Nascer no lixo e
passar por diversas provações enquanto alguns nascem em berços de ouro?!
Aqui está cheio destas pessoas que tiveram oportunidades, mas estão nisto
porque segundo eles não souberam aproveitá-la e não queriam admitir que de
que em pelo menos algum ponto de vista a dita oportunidade é na verdade
uma armadilha!
- Você não está exagerando um pouco meu amigo. – Expedito não
queria deixar somente o mesmo falar, afinal, já havia questionado sobre tais
fatos, contudo, nunca sob este enfoque tão temerário do ponto de vista da
razão – Afinal, as oportunidades são escolhidas pelos próprios seres, é um
sistema pelo menos justo, ao passo que à medida que você escolhe não tem
do que reclamar.
- Você está errado meu caro. Porquanto, a maioria das pessoas que
aqui estão pensavam que poderiam mudar o mundo, e foram com muita sede.
Concordo que elas devem pagar de alguma forma, mais este não seria o lugar,
aqui não tem futuro para ninguém, não recupera nada, somente estraga.
- Mais eles podem sair quando quiserem, basta, tão somente, querer
mudar, e serão salvos?
- Fique aqui durante algum tempo com ódio no coração e depois me
diga se o ódio ira aumentar ou diminuir?!
Expedido ficou perplexo, realmente olhando em volta, o lugar tinha
tudo para aumentar o ódio, e, assim, a chance de submissão e aceitação de
seus erros e posicionamentos. Mais decidiu abarcar sobre outro ponto:
166
- Mais então em sua opinião qual seria o sistema melhor?
- Não sei. Mais creio que levantar esta dúvida e tentar buscar
soluções não poderia ser o motivo de minha expulsão! – Ele respondeu quase
que com ódio.
- Mais você sabe que fez mais do que levantar dúvidas e buscar
soluções, não sabe?... – Expedito questionou deixando às palavras se
perderem, quase como uma alfinetada.
- Sim... – ele fez uma pausa analisando a situação que levou o
mesmo a fugir – Contudo, não me arrependo! – concluiu quase que como um
touro ignorante.
- Contudo, para mim poderia dizer que sistema entende que seria o
melhor, afinal, somos guerreiros, e, portanto, nos entendemos. Além disso,
caso me convença, poderei lutar e buscar soluções junto a você, porquanto,
espero que lutemos juntos não apenas nas batalhas de guerra, mais
principalmente perante os debates no Conselho, os quais como você mesmo
falou sempre estamos em desvantagem.
- Você acha que serei aceito diretamente no Conselho novamente?
- Não acho, tenho certeza. A ordem foi clara que necessitamos de
você, assim, isso é quase que questão de lógica.
- Posso então lhe explicar, mais temos que ir andando. – ele disse
apertando o passo seguindo pelo caminho mais do que tenebroso.
- Certo. – Expedido respondeu apertando também o passo.
- Quando surgiram as primeiras ideias de religião, e, a ordem de
manutenção do universo sofreu as primeiras alterações, com decida dos
semideuses, etc. a dimensão material como humanos, eu acreditava que nada
daquilo iria fruir. Contudo, após tudo começar a se encaixar e as coisas irem
se afunilando melhor, percebi que pelo menos em parte as coisas estavam
tomando um caminho melhor, principalmente, nos últimos tempos após criação
do Conselho.
Ele se calou um pouco, porquanto, estavam passando por alguns
demônios, os quais sequer olharam para eles.
- Não fique apavorado, eles somente tentam pegar os fracos,
sozinhos e os indecisos, são covardes demais para tentar pegar qualquer um
de nos dois. – ele disse após perceber que Expedido ficou apreensivo em ter
que enfrentar os demônios.
- Certo, mais nunca é demais manter a cautela. – Expedito
respondeu retornando do estado de vigília.
- Pois bem. No início dos homens atuais tudo era um caos, ao passo
que, se atualmente melhorou, tenho que dizer que sim. Dentre às principais
religiões que dominam a dimensão material, nomeadamente, no plano
terrestre, posso afirmar que a evolução com a chamada oportunidade é ainda
167
a mais acertada. Contudo, somente não concordo com a vinda para este lugar,
poderíamos fazer pelo menos melhorias.
- Mais dizem que isso seria impossível, visto que qualquer
interferência aqui seria quebrar o pacto sagrado de que ela pertence a Lúcifer
e seus seguidores.
- Não concordo com isso, creio que este pacto está velho demais, e
que está na ora de revogar direitos ao Lúcifer, e sim aniquilar aquele
desgraçado de uma vez por todas.
Expedito não respondeu, afinal, tinha o mesmo pensamento...
168
CAPÍTULO 41
Londres – Inglaterra, 1982
Arthur retornou para a sala com um sorriso malicioso em seu rosto.
Ele analisou o ambiente e o sorriso aumentou ainda mais ao perceber que os
agentes o olhavam agora com mais respeito, notando ainda que somente um
estava de cabeça abaixada, justo o que desafiou há todos.
- Vejo que apreendeu a respeitar os seus companheiros. – Ele disse
ao se aproximar do grupo.
O agente levantou a cabeça, somente assentindo um afirmativo com
o olhar, o qual ainda deixava claro sua total vergonha.
- Porque se envergonha? – Retornou Arthur ao perceber que não
teria nenhuma palavra.
- Não me envergonho do senhor ter me acertado, mas sim por minha
atitude anterior com os meus parceiros. – O agente fez uma pequena pausa
olhando principalmente para os que foram atingidos naquela noite. – Me
desculpem novamente rapazes. – Disse ele olhando para todos.
Charles havia literalmente ganho seu dia, tinha a certeza que mesmo
que os agentes ficassem com alguma decepção com a proposta financeira que
estava para ser feita, pelo menos iriam raciocinar que aquele homem seria
muito mais útil do que qualquer dinheiro que a terra poderia pagar, eles teriam
tecnologia militar de ponta, que não tiveram nem de longe quando serviram
aos seus países, e, ainda, teriam um experiente combatente a frente de tudo.
- Mas vamos falar em dinheiro, que é o verdadeiro motivo para vocês
estarem aqui. – Disse Arthur ao perceber que todos haviam entendido o seu
recado.
Os agentes e Charles assentiram com a cabeça se dirigindo
novamente a grande mesa, sentando-se todos em sua lateral, ao passo que
Arthur sentou igualmente em sua ponta.
- Qual é a proposta senhor Arthur. – Disse um dos agentes mais
experientes do grupo.
- Qual o seu nome meu filho? – Retornou o velho.
- Dominik senhor.
- Não preciso nem perguntar se você é russo certo?
O agente sorriu, seu sotaque o entregava, mas como falava várias
línguas conseguia escondê-lo facilmente, mas entre amigos ele não escondia
nada, e, seu nome ainda confirmava as suspeitas.
- Vejo que você tem capacidade nata de liderança, e, ainda, tem o
apoio de seus parceiros, por isto vou lhe nomear neste momento o interventor
para assuntos estratégicos perante meu gabinete, afinal, não podemos
169
reunirmos sempre com todos. Charles me disse que nem neste momento
todos estão presentes, porquanto, alguns estão em missões, mas tenho
certeza que quando retornarem vão gostar das mudanças.
Todos olharam para Charles, com caras de “você não dirá nada?”.
- Nunca objetaria uma escolha destas, não porque os outros não
sejam qualificados para o ato, mas, porquanto, Dominik é perfeito para o
serviço, um líder nato, tem capacidade de lidar com adversidades que creio
que todos aqui nesta sala evitam, que é tratar de assuntos burocráticos com
muita eficiência, afinal, vocês são todos agentes que procuraram esta vida por
adrenalina ou para se esconderem de pessoas, etc., enfim, James Bond é
somente no cinema. – Respondeu Charles aos olhares de seus parceiros.
- Fico lisonjeado, e aceito o encargo, mas conforme havia
questionado anteriormente, temos que saber de uma proposta, porquanto, sem
querer questionar nosso chefe, deveríamos ter tido uma reunião antes para
termos tempo de pensarmos no assunto. – ele mostrou ter realmente pulso
firme – Contudo, já viemos para cá, soubemos de assuntos que ao que tudo
indica é secreto, e, tudo sem qualquer negociação preliminar. – Dominik foi
mais do que direto, e Arthur gostou dessa sinceridade, afinal, tudo foi
realmente muito rápido.
- Não se preocupe, eu e Charles já havíamos conversado e
chegamos à conclusão que vocês estariam satisfeito com o combinado.
Olhou para Charles dando uma piscadela, visto que, não haviam
combinado nada, mas ele queria deixar claro que Charles era o chefe e
mandava, mas não queria impor isto.
– Além disso, creio que se são da equipe de Arthur são de
confiança, e, ainda, se não combinarmos irão sair daqui e esquecer tudo,
senão... – a pausa foi estratégica, e ele olhou para todos sem exceções –
Vamos deixar o senão dizer tudo.
- Diga para eles o que havíamos combinado anteriormente. –
Charles entrou no jogo.
- Pensamos que vocês deveriam receber um fixo além do valor de
cada missão, assim, teriam mais estabilidade para manterem suas famílias, e,
pensariam duas vezes antes de saírem do serviço, bem como, teríamos uma
fidelidade maior.
- Mas quanto seria este valor fixo? – Tornou Dominik. Os agentes
olhavam tudo, e Arthur e Charles perceberam em suas expressões que eles
estavam realmente satisfeitos com a escolha do companheiro para estes
assuntos.
- Quando vocês recebem em media anual? – Retrucou Arthur.
Os agentes se entreolharam com a pergunta, afinal, nunca haviam
parado para pensarem naquilo.
170
- Digam em dólares, porquanto, quero uma moeda mais estável para
promoverem seus pagamentos. A não ser que prefiram receber em ouro, ai eu
posso pegar dos que encontro em minhas expedições. – Disse Arthur ao
perceber que o seu questionamento havia levantado um assunto nunca
discutido antes.
- Eu sempre tento passar a mesma quantidade de serviços para
todos, e, assim, manter a ordem de pagamentos quase que em grau de
igualdade, mas sempre há algumas distorções, porquanto, algumas missões
são mais perigosas, outras mais demoradas, razão pela qual, tenho que
remunerar melhor os agentes e ainda escolher aqueles que não têm famílias,
etc. – Justificou Charles ao perceber que os agentes estavam acanhados em
falar seus valores de remuneração abertamente, afinal, era uma firma, e isto
poderia causar sérios conflitos.
- Mas creio que recebem pelo menos em torno de cem mil dólares
anuais? – Questionou Arthur dando mais um caminho para o diálogo.
- Em anos bons sim, creio que conseguimos ganhar perto disso. –
Dominik respondeu olhando para seus parceiros, os quais assentiram
afirmativamente com a cabeça.
- Ficariam satisfeitos se eu lhes pagasse trezentos mil dólares
anuais de forma fixa, e, ainda mais um plus por cada operação? – Arthur
arrematou.
- O que acham pessoal? – Questionou Dominik olhando para todos.
– Vocês querem conversar sobre isso em particular, para podermos chegar em
um acordo comum. – Todos negaram com a cabeça. Estava claro que queriam
fechar rapidamente naquele valor, afinal, eles sabiam que nunca conseguiriam
ganhar aquela quantia de forma fixa e ainda abonos por cada missão, aquilo
era um sonho para todos. – Então aceitamos senhor. – Respondeu Dominik
levantando-se e pegando na mão de Arthur em sinal de fechamento de acordo
de cavalheiros.
- Não precisam fechar acordo de cavalheiros comigo, passem no
setor de RH e conversem diretamente com a Dra. Alice, ela é psicóloga, e, vai
providenciar toda documentação para legalizarem vocês em algumas de
minhas companhias, vão receber previdência, tudo para que trabalhem sem se
preocuparem com salário, aposentadoria digna, não aquela que o governo de
seus países lhes pagam, os que pagam, e, ainda, ela vai liberar alguma
quantia de imediato em cartões corporativos para que vocês comprem todo
vestuário de executivos de sucesso, os quais quero que vocês utilizem,
porquanto, vou inserir vocês em minhas empresas como se o fossem, e assim
não levantarão suspeitas aos meus acionistas. Vocês vão ficar nas
companhias, onde vão desenvolver alguns trabalhos deste setor, após, quando
necessário, sairão delas para suas missões, isto evitara que esta casa fique
ainda mais cheia. Somente quero que Dominik e Charles fiquem aqui, o
primeiro cuidara de assuntos diretos entre vocês com missões, etc., e o
segundo chefiara, o que sempre fez com maestria.
Os agentes estavam boquiabertos, não tinham sequer palavras,
haviam entrado naquela sala com total descrença sobre o rumo de suas vidas,
171
e, saiam dela agora com quantias que eles nunca sonharam em ganhar, e,
garantias que eles não tiveram sequer quando trabalhavam em seus governos.
À medida que os agentes foram saindo, Arthur disse com educação:
- Charles, você poderia ficar somente mais um tempinho? Temos
que terminar de acertar os demais honorários, afinal, sua empresa terá que
continuar lucrando, não apenas os seus homens.
Charles parou subitamente, já estava pensando que o velho
somente iria lhe pagar com a resposta ao segredo de sua vida, não que ele
trabalhasse somente por esta informação, mas sabia que Frederick queria
lucros.
Os agentes não continham suas alegrias, alguns sequer perceberam
que Charles havia ficado, outros batiam nas costas dos outros, somente
Dominik estava estranhamente calado, e saiu olhando diretamente para os
dois que ficaram na sala...
172
CAPÍTULO 42
Vilarejo na França, 1982
João e Lourdes estavam atordoados, afinal, Damião tinha acabado
de falecer, e sido buscado por um Arcanjo. Contudo, isto ainda não era o mais
estranho, eles estavam alegres, porquanto, agora haviam rompido a barreira,
e, também estavam aliviados por saberem que Damião estava bem.
O bom de terem quebrado a barreira, é que agora tinham
pensamentos de vidas passadas e de quem realmente eles eram, e
principalmente o porquê deles terem encarnado...
Contudo, os dois se levantaram ficando em pé não mais com alegria,
mas seus rostos transpunham uma preocupação.
Será que seremos capazes de treinar Joana? – Está pergunta
estavam se fazendo no silêncio de suas mentes desde que Damião lhes
aclarou o saber da alma...
Mas o que mais os preocupavam era quem iria lhes guiar nos
ensinamentos que não continham nenhuma experiência, não poderia ser, o
traidor, devia ser uma brincadeira de Damião, mas no interior sabiam que
aquele Santo tão poderoso não brincava em serviço.
Nisto olharam um para o outro, não precisavam mais conversar, o
olhar de cada um revelava tudo o que estavam pensando.
Abaixaram-se e pegaram pelas mãos o corpo de Damião que se
encontrava estirado no chão, arrastando-o para fora da casa. Não queriam que
as crianças vissem ele daquela forma, iam conversar com elas e depois iriam
chamar todos os vizinhos da pequena região rural, para que juntos pudessem
dar um enterro digno para aquele homem, que tanto ajudou aquelas famílias,
sem nada pedir em troca...
******
Nimrod e Expedito estavam chegando próximo a uma caverna oculta
sobre uma relva.
Nimrod ergueu alguns galhos evidenciando a passagem e
adentrando rapidamente. Ao perceber que Expedido estava paralisado na
entrada bradou com austeridade:
- Entre rápido, porquanto, ninguém poderá ver este lugar, do
contrário estaremos perdidos.
Expedido que estava pensando se aquilo não seria uma armadilha
retornou de seus devaneios com o chamado, adentrando também, mesmo que
suas pernas queriam era realmente sair correndo.
173
A entrada da caverna era estreita, e eles seguiram por um túnel, ao
passo que Expedito percebeu que ela parecia ter sido cavada a mão. Haviam
vários caminhos e Nimrod seguia em zigue zague.
- Nimrod! Este túnel foi cavado à mão?
- Sim. Quando cheguei aqui percebi que iria precisar de um abrigo
seguro. Assim encontrei uma caverna. Lado outro, não era segura, porquanto,
sua entrada era muito aberta, e, em seu interior estava dominada por
demônios.
- O que você fez então? – Expedito quase que tinha que gritar,
porquanto, Nimrod andava muito rapidamente, tanto, que ele temia ficar para
trás e se perder.
- O primeiro passo foi matar os demônios, o que na época foi fácil.
Em seguida, eu destruí a entrada principal da caverna, assim, seu interior
estaria seguro! Após, eu me assegurei de que conseguiria cavar e chegar até o
interior novamente, contudo, passei com dificuldade, porquanto, somente
poderia utilizar naquele momento uma fresta, a qual adentramos neste
momento.
- E estes outros caminhos?
- Há, isso eu fiz após, quando um certo dia um demônio conseguiu
adentrar e quase me pegou. Eu então resolvi que seria melhor fazer um
labirinto de entrada.
- Mais isso não é suficiente, afinal, o ser poderá tentar e chegar
mesmo que após algum tempo ao interior, porquanto, tempo é o que não falta
nesta dimensão para se pensar o mal.
- É por isso que eu criei alguns brinquedinhos... – virou-se fazendo
quase que uma cara de maníaco. – Entrar pode até ser fácil, contudo, se errar
o caminho digamos que será apenas por uma vez...
Realmente este Nimrod parece não ser normal! – Pensou Expedito
seguindo agora mais rapidamente o sujeito, afinal, sabia que se se perdesse
algo de muito ruim iria lhe acontecer.
Após muito ziguezaguear, finalmente Expedito avistou uma luz forte
à frente. Quando adentraram ele se espantou, porquanto, o que viu não era
nada parecido com o que esperava...
174
CAPÍTULO 43
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Após ser quase que cegado pela luz inebriante, Damião adentrou no
local e estava impressionado com a beleza daquela caverna, mesmo estando
há muito tempo na dimensão sublime, ele nunca havia tido permissão para ali
adentrar. O túnel era todo revestido de belas pedras preciosas o que fazia
cintilar pela forte luz que havia ficado para trás.
- Aquela luz é a barreira de segurança! Somente com permissão se
pode aqui adentrar, dizem que quem não a possui e ainda assim tenta, fica por
séculos vagando inebriante seguindo aquela luz, sem encontrar um destino
final... – Disse Miguel querendo puxar assunto com o amigo.
- Mas qual a necessidade de se ter uma magia tão poderosa de
segurança neste local? Afinal lá fora se encontra os seres mais evoluídos do
universo, jamais ousariam tentar aqui adentrar sem permissão. – Respondeu
Damião com indignação.
Miguel sorriu. Aquela era a mesma pergunta que havia feito quando
ali adentrou, então decidiu dar a mesma vaga resposta que recebeu, afinal,
somente após algum tempo Damião iria entender por meios próprios a
necessidade daquela fonte de segurança.
- Meu amigo, você disse tudo... – fez uma pausa olhando para o
rosto do amigo, emanando mais um sorriso, desta vez de despreocupação. –
Aqui se encontram os seres mais evoluídos do universo, e, consequentemente,
alguns dos mais poderosos...
Damião perdeu-se em seus pensamentos, o que o amigo acabará de
dizer o atordoava, não pela resposta, mas pela verdade obscura e sombria que
ela realmente emanava.
Seres evoluídos e poderosos. - Pensava mais e mais o quanto aquilo
realmente poderia ser perigoso. – O livre arbítrio que é lei universal, aliado a
todos aqueles poderes poderia gerar catástrofes... – Concluiu em pensamento.
Contudo, foi tirado subitamente desses pensamentos, porquanto, o
corredor à medida que eles adentravam tornava-se ainda mais brilhante, onde
pequenos feixes de luzes que vinham do local onde eles caminhavam agora
em direção refletiam em todas as pedras e metais, fazendo-as tomarem vários
tons de cores.
- Isso é magnífico. – Damião exclamou quase como um sussurro,
diante de sua voz quase que sumir com a estranha emoção que sentia.
Ao chegarem ao fim do corredor Damião não tinha palavras, Miguel
mesmo conhecendo aquele local contemplou novamente a grandeza daquele
lugar, foi quando se lembrou das explicações que havia recebido quando ali
adentrará pela primeira vez, e por isto queria compartilhar a mesma com seu
amigo:
175
- Este local é assim Damião não porque os Criadores tinham desejos
e cobiças por pedras e metais preciosos, mas porque foi aqui que tudo
começou... – Ergueu seus braços em sinal de imensidão. – Deste ponto diz à
lenda que o universo foi criado, este é o núcleo de toda criação! Para os
cientistas o ponto exato do Big Bang, para os religiosos o jardim do Éden.
Ambos ficaram parados por algum tempo que não saberiam precisar
devido à mente embaralhada que lhes acometiam, o local não era lindo, era a
verdadeira essência do belo, do paraíso, era como se estivessem
contemplando a criação naquele instante, podiam vislumbrá-la em seus
pensamentos.
Miguel então voltou de seus pensamentos, decidindo prosseguir em
sua narrativa:
- Dizem que os Criadores reuniram na dimensão sublime um
verdadeiro paraíso, esperando que todos os seus filhos aqui chegassem em
pouco tempo. Mas infelizmente poucos a alcançaram desde então, porquanto,
para infelicidade deles a maioria das almas preferiram permanecerem nas
dimensões intermediárias ao terem que se arriscarem em às vezes regredir
para poderem alcançar este local...
Damião estava com a mão estendida, nela pairava cores infinitas,
era lindo, ele contemplava a luz entrando por uma espécie de enorme feixe no
teto.
Eles então começaram a caminhar mais um pouco, até que
chegaram ao final definitivo do corredor, ali contemplaram a imensidão daquele
local, eles haviam chegado a uma sala muito grande, tão grande que por ali
andavam vários animais, era ainda a caverna, mas tinha grama e em todas as
partes eram revestidas de pedras e metais preciosos. Contudo, o teto era
muito alto, e muito acima da cabeça dos dois, onde havia no seu fim um domo
de vidro por onde entrava muita luz, era o cume da montanha...
- Todas as vezes que entro aqui, tenho certeza de que valeu a pena
todo sacrifício para chegar nesta dimensão meu amigo! Aqui me sinto amado
não por um ser, mas é como se os Criadores estivessem me abraçando neste
instante. – Falou Miguel demonstrando seu estado, o qual não era outro do
que a maior alegria de todas, a qual Damião experimentava como uma criança
quando vê sua mãe, afinal, era isso que estava ocorrendo, eles não apenas
viam ali os Criadores, mas podiam senti-los em cada canto daquele local.
- É como se estivesse finalmente chegado à casa de meus pais em
um domingo de manhã, depois de vários anos sem os verem. – Damião falou
com lágrimas nos olhos.
Miguel olhou para o amigo, com um olhar sereno, falando com uma
voz saindo suave e também chorosa:
- Mas será que você não está mesmo certo meu amigo, afinal,
finalmente chegou à casa de seus pais após tantos anos... – fez uma pausa
olhando a imensidão. – Só não é domingo!...
176
Após mais um tempo contemplando o local começaram a andar
olhando tudo, e à medida que adentravam no imenso ambiente os animais iam
lhes recepcionar, o engraçado que ao contrário de uma primeira imaginação,
os animais que ali estavam não eram somente os mais belos, tinham diversos,
cobras, lagartos, tigres, coelhos, ratos, tudo...
De repente os animais foram todos saindo por uma saída lateral,
abrindo espaço para os dois, Miguel estava impressionado, nunca tinha visto
tantos animais naquele local, afinal, somente havia entrado ali duas vezes, e
tinha que admitir que na primeira havia ficado tão emocionado que mal
conseguiu prestar atenção em tudo.
À medida que os animais saiam, eles avistaram ao longe um
homem, Damião notou que ele brilhava de uma forma estranha, parecia que
seus poros emanavam uma estranha luz, como um brilho, mas que
estranhamente não cintilava a ponte de ofuscar a sua imagem. Parecia que
sua pele emanava a luz mais sem parecer estranho, era como se fosse sua
áurea, ao passo que mesmo com a luz se avistava que sua pele não era
completamente branca.
Ao avistá-los, o homem começou a caminhar na direção deles, que
ficaram parados contemplando a aparência do ser que vinha vagarosamente, e
à medida que ele se aproximava, eles podiam sentir que todo amor do mundo
parecia encontrar-se naquele indivíduo...
Nem em seus sonhos mais remotos Damião poderia sentir tamanha
sensação, era como se tudo de bom do universo tivesse sido sugado por
aquele homem, e ele emanasse em todas as direções esta energia, que atingia
todos ao seu redor.
Miguel que até aquele momento estava parado abaixou a cabeça em
sinal de reverência, e Damião que não sabia o que fazer, fez o mesmo.
Contudo, quando finalmente o homem chegou perto deles falou em
uma voz forte, mas que emanava uma ternura como um pai ou uma mãe que
fala com o filho ao pegá-lo pela primeira vez nos braços:
- Esperava-os já há algum tempo. Não estou apenas orgulhoso de
vocês, tenho uma grande admiração! Levantem a cabeça porque se tivesse
que ser venerado, teria que ser ao contrário, ou seja, eu venerando vocês...
Quando levantaram a cabeça não acreditaram no que viram, o
homem a sua frente era magnífico, vestia uma túnica branca, seus cabelos
eram curtos e castanhos, iguais seus olhos, os quais eram amendoados. Sua
pele era macia, não tinha barba, o que deixava seu rosto brilhar ainda mais...
Era alto, muito alto, devia ter uns dois metros de altura, e possuía um corpo
forte e robusto, aparentando ter uns 33 anos.
Ele se aproximou ainda mais, e quando chegou bem perto puxou os
dois de uma só vez, dando-lhes um forte abraço. No momento que apertaram
os dois, eles sentiram todas as energias de seus corpos voltarem, se sentiam
como recém nascidos nos braços da mãe.
177
Após o abraço, o homem deu um beijo na face de cada um, e se
afastou, virando-se e lhes convidando para seguirem-no.
Os dois saíram andando em transe, era como se tivessem acabado
de serem atingidos por um raio de energia positiva, eles caminhavam, mas não
sentiam o chão, parecia que estavam levitando.
Ao chegar ao centro da sala, Damião viu algo que se estendia por
uma grande área. No início não entendeu o que era, mas quando viu algumas
cadeiras em suas bordas concluiu que se tratava de uma mesa de cristal. Não
uma comum, esta era enorme, nela cabia facilmente milhões de pessoas, só
conseguiu ver as cadeiras que estavam perto deles, às demais sumiam na
imensidão do lugar.
O homem sentou-se em uma das cadeiras, apontando para eles se
sentarem em outras duas que estavam ao seu lado, eles prontamente se
sentaram, mas permaneceram ainda olhando a imensidão da mesa e do lugar.
- E grande não é? – Questionou o homem com um leve sorriso no
canto da boca, e depois continuou a falar ao perceber que eles somente
assentiram com a cabeça. – Nossos pais esperam que em pouco tempo ela
esteja cheia de almas boas como às vossas...
- Como assim cheias?! – Damião e Miguel haviam perguntado ao
mesmo tempo.
- Quando nossos pais criaram o universo, esperavam que em pouco
tempo boa parte de seus filhos estivessem sentados nesta sala, discutindo
maneiras de ajudarem seus irmãos menos evoluídos a alcançarem por seus
próprios méritos seu lugar neste local, como faz uma verdadeira família. Lógico
que sempre pautados no respeito ao livre arbítrio de cada um.
Falou o homem, olhando a um canto remoto, como se estivesse a
imaginar aquela mesa cheia, e depois de algum tempo continuou a falar
demonstrando um pouco de tristeza em suas palavras:
– Contudo, após muito tempo, poucos conseguiram...
Damião e Miguel alcançaram-lhe um olhar de reconforto, ao
perceberem a tristeza que transparecia de suas palavras.
- Mas agora é diferente!
Falou o homem como se estivesse saindo de seus pensamentos.
Virando-se aos dois, prosseguiu em tom de ternura:
- Hoje é dia de comemorar! Venho juntamente com o Conselho
acompanhando vocês dois, e pela determinação, bondade, carinho para com o
próximo com que vêm pautando todas as suas atitudes, concluímos que
chegou a hora de se sentarem nesta mesa, junto a mim e o Conselho formado
por outras almas que já alcançaram este lugar.
Eles se sentiram confusos, olharam para o homem, então Miguel foi
quem questionou:
178
- Que almas já alcançaram este lugar? Não estamos vendo ninguém
além de nós! E das outras duas vezes que estive aqui somente fui apresentado
ao local e orientado por um bondoso senhor negro, o qual me ensinou que
atitudes eu deveria tomar com algumas questões...
- Lógico que não estão vendo almas aqui sentadas sem fazer nada!
Acham que os espíritos mais evoluídos do universo iriam simplesmente ficar
somente sentados em uma mesa? E que iriam sair contando aos quatro cantos
que aqui estiveram e que fazem parte do Conselho Supremo do universo?!
O homem falou e lhes lançou um sorriso, continuando com o mesmo
tom de um mestre ensinando seus pupilos:
- Todos que aqui chegaram estão por ai, ensinando, pregando,
descansando quando lhes faltam energias, e, principalmente, vivendo a vida
eterna pautados no amor ao seu próximo e a sua parceira celestial... Afinal,
assim na terra como no céu, ou melhor, nas dimensões!
Damião sorriu entusiasmado, achava que todas as almas que
alcançassem aquele lugar e o poder que diziam que elas continham somente
queriam saber dali para frente em curtir o paraíso, agora sentia o verdadeiro
amor dos Criadores.
Eles nós deram as escolhas, cabe a nos escolher o caminho! Mas
que caminho devo escolher? Será que este homem vai me dar orientação para
isto? – Pensou, e, após algum tempo meditando resolveu perguntar:
- Mas agora que...
Contudo, antes de continuar foi interrompido pelo homem que falou
de uma maneira alegre:
- Você quer mesmo saber Damião se agora que foi juntamente com
seu amigo convidado para participar do Conselho o que os Criadores esperam
que você faça?
Damião ficou atordoado, ele havia visto um ser poderoso, mas igual
aquele homem era impossível, nunca após estar evoluído alguém tinha
entrado em sua mente e lido seus pensamentos com tamanha facilidade.
O homem lhe lançou um sorriso, e lhe respondeu ainda com o
mesmo tom de alegria:
- Você já tem tudo o que quiser, aqui chegou por seus méritos, não
posso lhe pedir nada, afinal, você sempre foi livre para seguir o seu caminho, e
agora não é diferente! Mas se quiser me ajudar e a seus irmãos, serei grato da
mesma forma...
Damião não esperava aquela resposta, pensava que aquele homem
seria mais direto, lhe dando um caminho. Contudo, ao contrário, ele deixou
para ele decidir...
179
- Então quer dizer que se eu quiser descer a colina e ficar curtindo a
vida eterna eu posso? E mesmo assim poderei participar das reuniões e tudo
mais?! – Questionou Damião incrédulo.
- Lógico! Você já fez muito a mim e a nossos irmãos. Poderá
descansar e desfrutar deste paraíso como bem entender, natural que dentro
dos limites éticos, se não retornará imediatamente para uma dimensão inferior
ou até mesmo terá que regressar as encarnações curativas da alma e da
incapacidade de compreensão de sua insignificância perto do poder do
universo. - O homem respondeu sorrindo, mas de forma direta.
- Mas porque alguém ao chegar neste nível poderia querer continuar
a trabalhar pelo próximo? – Damião foi seco.
Na realidade ele não estava realmente questionando nada daquilo,
queria era saber a inteligência daquele homem, afinal, estava intrigado para
saber até que ponto ele iria ser paciente e manteria aquele discurso de livre
arbítrio pleno para seguir qualquer caminho.
- Olhe Damião, eu não posso lhe dizer esta resposta, você teria que
descobrir por si próprio! Somente posso lhe dizer, que sempre haverá espaço
para mais crescimento espiritual, mesmo sendo uma simples alma, uma
evoluída, um santo, um anjo, um semideus, e um verdadeiro Deus entre todos,
etc... Nunca tem fim, sempre poderá alcançar mais um nível de conhecimento,
relacionamento, energia, amor, tudo...
- Quer dizer então que o senhor entende que o progresso de nosso
ser é infinito?
O homem sorriu ainda mais, vendo que Damião começou a
entender, então se virou para ele é falou calmamente:
- Pode ir agora! Vá desfrutar do paraíso eterno da dimensão sublime!
Damião ficou perplexo, nunca imaginaria que aquele homem seria
assim tão direto daquele momento para frente. E, Miguel estava somente
calado escutando.
- Mas tem um problema! E Cosme, Lívia, Ariane e demais espíritos
que por tantos anos estiveram em minha jornada, eles também estarão
comigo? – Perguntou Damião com certa preocupação. - Afinal eles são
extremamente bons para com o próximo. – a conclusão soou quase como um
apelo e defesa de seus interesses.
O homem, no entanto cerrou às sobrancelhas e lhe disse em um tom
mais sério:
- Eles também possuem o livre arbítrio, não sou eu ou o Conselho
Supremo que determinarão se eles ficam aqui ou não! Além disso, pelo que
me consta, muitas das almas que lhe acompanhou em todas às suas jornadas
de existência ainda estão encarnados ou em dimensões inferiores! Isto não
pode ser mudado! Tudo dependerá deles e de almas mais instruídas que lhes
ajudarão...
180
- Mas eu quero ajudá-los a aqui chegar, não somente eles, mas
todos! – Gritou Damião, a qual já estava suando de aflição, somente ao pensar
em deixar seus companheiros para trás.
Para seu espanto o homem que até aquele momento ainda
permanecia com a cara fechada soltou uma enorme gargalhada, batendo com
as mãos em suas costas, e após um longo tempo sorrindo, falou com ternura:
- Sabia que você era merecedor de sentar-se nesta mesa! Agora
entende porque nossos pais algumas vezes não são compreendidos por
nossos irmãos! Eles querem exatamente o que você quer, ou seja, eles
querem ficar juntamente com seus filhos, e por isto esperam e ajudam todos
igualmente na medida de suas necessidades e possibilidades de não
cometerem qualquer desvantagem!
O homem parou, suspirou e prosseguiu:
- O objetivo é que todos pensem como você pensou neste
momento... Neste dia, não nos preocuparemos em somar, mas em dividir em
proporções igualitárias, pautados sempre no amor ao próximo, respeito e
carinho! Neste dia, estaremos no paraíso! Mas por enquanto, podemos
desfrutar dele, mas vamos estar sempre vazios, uma vez que, enquanto todos
não estiverem aqui reunidos sempre nos faltará algo...
Damião sorriu, havia recebido em pouco tempo a maior lição de sua
vida, pensava que iria saber com quem lidava agindo daquela forma, contudo,
percebeu que além de forte, aquele homem era poderoso não somente na
energia, mas na sabedoria e poder de argumentação.
Então é assim mesmo que funciona a lei geral do universo para se
alcançar o verdadeiro paraíso, o qual consiste em um momento em que todos
ajudam todos com um único ideal: “evolução”. – Damião pensou com alegria.
- Melhor corrigir uma coisa. Afinal, vocês disseram que não havia
ninguém na sala, mas havia sim. - O homem disse com alegria.
Os dois ficaram confusos, porquanto, tinham certeza que não
avistaram nenhuma alma naquele recinto após chegarem.
O homem sorriu, sabia que eles não tinham entendido.
- Afinal, quando vocês chegaram não viram que eu estava em uma
reunião?
- Reunião?! O senhor estava era rodeado de animais, achamos que
eles estavam somente lhe fazendo companhia. – Disse Damião com cara de
espanto.
- Animais, você fala daqueles seres como se eles fossem menos
significantes do que você Damião! – Respondeu agora o homem não mais
sorrindo, mas demonstrando um pouco de preocupação com a consideração
de Damião.
181
- Desculpe se fiz transparecer isto, não penso assim, é somente
porque me assustei em você dizer reunião, isto denotaria que estariam
dialogando, o que é impossível. - Damião percebendo a mudança de rumo da
conversa resolveu corrigir seu argumento o mais rapidamente possível.
- Como assim impossível? Eu estava conversando com eles sim! –
Respondeu o homem agora exibindo novamente o sorriso, sabia que Damião
não tinha a intenção de menosprezar os animais, mas queria deixar claro que
aquilo era um assunto sério, e que tinha tudo a ver com sua missão.
- O senhor conversa com os animais? Mas como? Nunca vi isto! –
Interrogou Damião com cara de espanto. Ele ainda olhou para Miguel, o qual
somente ergueu os ombros, como se dissesse que não tinha nada a dizer.
- Todos os animais são dotados da capacidade de comunicação.
Contudo, cada espécie comunica com cada espécie, isto é fato, por isto os
humanos acham que somente eles se comunicam.
Damião ficou pensando naquilo, realmente era estranho, tinha plena
convicção que os animais e outros seres se comunicavam entre eles como os
humanos, somente não entendia como aquele homem tinha o poder de
conversar com eles e eles entenderem, ou seja, uma alma humana interagir
com a de um ser diferente, a ponto de dizer que estavam em reunião.
- Certo Damião, se esta é sua dúvida, irei respondê-la. Me desculpe
por estar lendo sua mente antes de você formular a pergunta, mas sei que
você compreende que não estou fazendo isto para lhe impressionar, ou para
lhe retirar sua intimidade do consciente. Isto somente é necessário para
ganharmos tempo, e para que eu possa saber sobre suas dúvidas
essencialmente, sem acanhamentos.
Damião sorriu, aquele homem era realmente muito poderoso.
- Olha Damião e Miguel, você conhecem Deus, Criador, Criadores
do universo, etc.? – O questionamento soou mais como uma ponte para um
diálogo.
Mas Miguel decidiu responder quebrando seu silêncio após muito
tempo, porquanto, daquele assunto ele entendia:
- Tenho a certeza que ele ou eles existem, já tive várias vezes à
impressão de estar sendo guiado, etc., mas nunca tive uma conversa com
nada desta natureza, e o ser mais poderoso que já tive em minha frente...
- Certo! – Disse o homem interrompendo o Arcanjo.
Já havia concluído que eles não haviam entendido ainda o que ele
queria explicar, por isso decidiu reformular a pergunta:
- Me respondam o que é que rege o planeta terra, todo universo e às
dimensões?
- São vários fatores, químicos, atômicos, etc., é difícil saber, mesmo
tendo os sete elementos poder fundamental, eles não são todos, somente no
182
mundo físico, o mundo imaterial é mais complexo... – Desta vez tentou
responder Damião ao ver que Miguel havia se calado.
– Certo. Não quero detalhes, quero uma resposta direta. –
Interrompeu novamente o homem.
- Não posso lhe dar uma resposta direta. – Disse Damião, olhando
nos olhos do homem e após para Miguel, para ver se ele tinha alguma ideia,
ao passo que, já esperava por aquilo, quando por mais uma vez o Arcanjo
somente deu de ombros.
- No mundo material, os elementos químicos são elementares para a
vida, mas existem seres que tornam tudo possível, são desde seres
microscópicos para os olhos dos homens, como células, átomos, alguns vírus,
fungos, etc., até seres dotados de um tamanho notável, como elefantes,
baleias, etc., todos trabalhando para mover o universo material, e da mesma
forma ocorre no imaterial, mesmo que de uma forma digamos um pouco
diferente. – O homem decidiu iniciar sua posição.
- Certo, mas o que isto tem a ver com os Criadores? – Questionou
Miguel para alívio de Damião que já estava ficando irritado em ser o único a
ficar questionando, como se fosse o mais interessado de uma classe ou até
mesmo o mais burro.
- Simplesmente tudo! – Respondeu o homem sem parafrasear.
Como você tornou-se Arcanjo?
- Evolui da condição humana desde os primórdios da humanidade
até ser contemplado com dons, não me considero diferente dos outros, tenho
até mais responsabilidades, mas adoro. – Miguel respondeu analisando
Damião que ficou surpreso em saber da história do amigo.
- E quando foi sua passagem pela terra? – O homem queria saber
mais.
- Foi há muito tempo, na chamada era mitológica. Depois voltei
algumas vezes para ajudar minha amada Serena a evoluir a qualidade de
Anjo.
- Nossa, então quer dizer que você não foi criado como Arcanjo? –
Damião estava tilintando de emoção em ouvir aquela história.
- Não, fui uma das primeiras almas a serem criadas após uma era
que eu não conhecia, não me lembro da época, mas nos primórdios já estive
em outros mundos no plano terrestre.
- Como assim outros mundos? – Tornou Damião evidenciando sua
curiosidade agora com a vida do amigo.
- Creio que Miguel já explicou demais para o tempo de que temos,
além disso, somente queria fazer um ponto com está pergunta, não uma
estrada de história. – O homem foi direto.
183
Miguel pigarreou, tinha se empolgado em contar sua história, não
podia contá-la, mas como aquele homem questionou pensou que lhe seria
permitido. Por isso resolveu retornar a pergunta que havia lhe sido dirigida
antes de ter desvirtuado a conversa:
- Como assim tudo que o senhor disse tem sentido com os
Criadores? Afinal, tem que haver uma resposta direta, mais explicativa!
- É mesmo, por gentileza seja mais claro. – Completou Damião, já
demonstrando estar impaciente com aquele jogo de saber e descobrir.
- Todos os homens encarnados e desencarnados dizem não
conhecerem Deus. Contudo, se esqueceram de que se somos formados de
sua essência, logo somos ele ou eles. E, indo mais além, se tudo o que é
descende desta mesma essência, então, nos alimentamos dele, razão pela
qual, em suma, ele é tudo e todos.
- Certo, e os animais? – Damião estava se esforçando.
- Os animais e outros seres são uma parte tão importante neste ciclo
da vida, que verdadeiramente são como o espelho de Deus. Neles podemos
ver que seguem ciclos para preparar a vida em todos os espaços do universo.
- Me desculpe, mais estes ciclos consistiria em que? – Agora foi
Miguel que questionou.
- Quando um homem encarnado come um alimento, carne, etc., ele
involuntariamente encontra-se incorporando nutrientes e demais essências que
seu corpo físico necessita, então, em suma, o que ele se alimenta ou é
inserido em seu corpo é logo inserido ao seu ser imaterial. E, assim, ocorre
com o corpo imaterial, que mesmo não tendo um involucro físico, necessita de
energia e em suma se alimenta desta energia que se encontra ao seu redor
gerada por seres em sua essência invisíveis aos seus olhos. Assim, neste
ciclo, podemos considerar que aquele que proporciona a vida, é, portando, a
nossa razão de existir. Razão pela qual, os animais e demais seres, são em
essência verdadeiros Deuses, porquanto, possibilitam que se viva
materialmente e imaterialmente, desta forma, são as partes mais puras dos
Criadores.
Damião e Miguel estavam boquiabertos, nunca em suas existências
haviam parado para pensar em tamanha verdade, em essência, a regência do
universo era dotada de uma capacidade de criação e regeneração
incompreensível, mas tudo, exatamente tudo, tinha uma essência que
inexplicavelmente trabalhava misteriosamente em prol da vida, tanto material
quanto imaterial. Logo, os componentes deste verdadeiro motor do universo
eram os seres que faziam tal ciclo, como animais e demais seres desta
natureza como árvores, fungos, bactérias, etc., os quais evoluíam e se
transformavam no decorrer das necessidades de adequação da regência do
universo, logo, eram verdadeiramente a mais pura essência do universo, fonte
da existência e realmente um espelho do verdadeiro Criador.
Ao perceber suas expressões de espanto o homem decidiu
arrematar:
184
- Vejo que finalmente entenderam, assim...
- Espere! – Interrompeu Damião. – Somente me responda uma
pergunta. Porque estava reunido com estes seres antes de chegarmos?
- Porque eles terão uma missão essencial na terra, são lideres de
algo que terá que acontecer. Mas não me pergunte o que, porquanto, não
posso lhes dizer. – O homem foi direto.
Inesperadamente, quando o homem esperava receber mais
perguntas, Damião simplesmente voltou-se dizendo:
- Estou a sua disposição, pode falar-me como poderei ajudar a
todos! Que sacrificarei o meu ser pelo meu próximo...
O homem sorriu alegremente, ponderando:
- Não somente vai ajudar a todos, como a si mesmo, afinal, é dando
que recebemos, e ajudando é que somos ajudados, e assim por diante...
185
CAPÍTULO 44
Berlim – Alemanha, 1982
Estela já estava novamente deitada em sua cama, seu pai havia
levado sozinho à mesma desacordada e lhe dado um banho e trocado suas
vestes juntamente com a roupa de cama ensanguentada, foi quando percebeu
que ela mexia os dedos dos pés, e foi tomado por uma nova emoção, desta
vez de alegria.
Pelo menos ele cumpriu com o prometido... – Pensou.
******
Distante dali, Expedito estava tão perplexo que não conseguia se
mexer, por isso ficou somente olhando com os olhos totalmente esbugalhados.
- E ai, acha que poderei vencer Lúcifer com este exército?! – Disse
Nimrod ao ver que o novo amigo estava perturbado.
O interior da caverna era enorme, e ela se adentrava ainda mais,
porquanto, parecia haver outras cavernas interligadas, onde seus olhos não
conseguiam enxergar. Contudo, o que mais assustava era a quantidade de
demônios que ali se encontravam, eles estavam conversando, outros sorrindo,
alguns jogando algo que ele concluiu serem cartas, devendo ter no mínimo uns
quatro mil ou mais, diante do fato de que a caverna se estendia ainda mais.
- Não vai falar nada? – Nimrod já estava ficando impaciente com o
espanto de Expedito.
- Você está louco? – Foi à única coisa que ele conseguiu pronunciar.
- Como assim louco?! – Ele evidenciou seu nervosismo com o
questionamento.
- Você está cuidando de um exército de demônios, e ainda pergunta
o que acho? – Agora o estado de Expedito havia passado de perplexidade
para indignação.
- Não entendo o que quer dizer?
- Não entende?...
- Não mesmo! – ele berrou. – Estes homens e mulheres foram por
mim escolhidos durante todos estes anos em que aqui estive. Alguns deles me
ajudaram, eu os ajudei, os acolhi em minha casa, doutrinei para que
186
retornassem a um estado pelo menos de lutarem por seus ideais, e,
principalmente, eles são fieis a uma causa.
- Que causa seria esta? – Expedito não escondia sua total
indignação.
- Tomar o inferno de Lúcifer! – Nimrod foi direto.
- O que? Você deve estar louco! – a cara de espanto quase que se
transformou em medo com a revelação. – Isso é impossível.
- Porque tem tanta certeza, afinal, nunca ninguém tentou. – A
resposta veio em tom de deboche.
- Simplesmente, porquanto, não sei se você sabe, lá fora devem ter
milhares, talvez bilhares de demônios fiéis ao seu oponente!
- É por isso que precisarei de mais ajuda. – Ele agora falou com
seriedade.
- Vai tentar recrutar mais demônios?! – Agora foi Expedito quem
usou a ironia.
- Não, usarei o seu exército para completar o meu! – Ele falou agora
com uma voz sinistra.
Os pensamentos de Expedito quase fritaram sua cabeça, afinal,
aquilo lhe soou mais como uma ameaça.
Os demônios que estavam mais próximo da entrada apenas
olhavam a discussão, nunca ousariam interferir em assuntos de seu mestre
Nimrod.
Este desgraçado me atraiu aqui, e agora certamente ira tentar
alguma coisa! E creio que será para tomar literalmente o meu exército. –
Pensou, já sacando sua arma...
187
CAPÍTULO 45
Londres – Inglaterra, 1982
- Porque pediu para aguardar, já não temos nosso combinado? –
Questionou Charles sentando-se novamente, analisando ainda se não havia
ficado nenhum dos agentes na grande sala.
- Temos um acordo em relação a nossa amizade, e, principalmente,
o mesmo foi importante para você aceitar o trabalho. – Respondeu Arthur
sorrindo.
- Então quer dizer que não tem a informação que desejo? – Exaltou.
– Você não poderia ter feito isto.
Arthur ergueu as mãos em sinal de paz, tentando ponderar:
- Acalme-se, não foi isso que quis dizer... – Abaixou as mãos
vagarosamente. – Somente disse que esta informação será lhe dada como
sinal de retribuição de nossa amizade, não de valores financeiros.
- Então quer dizer que o senhor além de remunerar meus agentes
ainda vai pagar pelos serviços de minha empresa? – Charles questionou agora
em tom de voz mais ameno.
- Lógico, afinal, creio que o velho Frederik é totalmente avesso a dar
cortesias.
Charles ficou pasmo.
Como será que ele descobriu Frederik? – Questionou-se em
pensamento. Após olhou para a sala, pensou ainda naquele local, e concluiu o
obvio:
Seria mais sensato pensar como ele não poderia saber dele!
Mas mesmo assim ele tinha que perguntar:
- De onde conhece Frederik?
- Digamos que somos velhos amigos. – A resposta veio curta e seca,
diferente do que esperava Charles.
- Não quer falar sobre ele? – Tentou Charles, vendo que a pergunta
tinha misteriosamente deixado Arthur um pouco incomodado, apesar dele já
saber que seria questionado sobre sua ligação com o velho.
- Não! – Novamente veio seca e agora ríspida a resposta.
- Por quê? – Charles insistiu.
- Simplesmente porque não tenho o costume de falar de meus
amigos. Como nunca vou falar de minha relação com você para ninguém,
também não gosto de falar das demais, mesmo para demais amigos, porque
188
todo amigo tem outro amigo, então em questão de tempo planos são desfeitos
por puro descuido e confianças hipócritas.
- Como você poderia me considerar um amigo, afinal, mal nos
conhecemos?
- Já lhe conheço há algum tempo Charles, você não sabe, mas
sempre estive presente em sua vida.
Charles ficou perplexo, aquele senhor era realmente um mistério, e
ele se revelava a cada momento ser ainda mais emblemático, mas tinha que
insistir:
- Como assim?
Arthur levantou-se, e quando Charles achou que ele iria dar a
resposta, ele fez o inverso:
- Quanto à outra pessoa pagou a sua empresa pelo serviço que iria
fazer contra mim?
- Mas...
- Não tem “mas” Charles! – Ele exaltou o tom de voz. – Estamos aqui
para tratar de negócios neste momento, tenho que fechar com vocês todos
para que meus assistentes encontrem uma forma de colocar vocês em folhas
de pagamentos sem serem notados.
Ele não dirá mais nada, e creio que não seja melhor insistir, afinal,
ele é muito impaciente. – Concluiu em pensamento sabiamente, e já dando
uma resposta rápida:
- Eles me pagariam um milhão.
- Mas você ainda teria despesas com agentes e demais, assim, seu
verdadeiro lucro seria bem menor do que está quantia. – Arthur foi categórico,
e mostrou que aquela negociação seria bem diferente do que teve com os
agentes.
Entrando no jogo Charles concluiu que teria que endurecer.
- Mas o serviço aqui é quase que em tempo integral, minha empresa
foi totalmente transferida para este local.
- O qual vocês não teriam nunca em todas as suas existências. –
Arthur voltou a retrucar agressivamente, mostrando ser um home de negócio.
- Mas terei que deixar quase que todo o meu contingente de agentes
a sua exclusividade, assim, os lucros serão reduzidos drasticamente.
- Mas eu irei pagá-los por isto, então, sua empresa não terá mais
estes custos. – Tornou Arthur agora se voltando para Charles demonstrando
um largo sorrindo.
- Porque o sorriso irônico?
189
- Porque você vê agora o tanto que foi idiota meu querido Charles.
Você deixou que eu negocia-se com sua equipe, eu simplesmente os
conquistei. – Ele sorriu ainda mais, bateu com a mão sobre a mesa inclinando
o corpo para olhar Charles mais de perto. – Acha que eles irão mudar de ideia
caso não combinemos nada. – A resposta veio como uma bomba jogada no
colo de Charles.
Não pode ser, ele me enganou? Este cretino me enganou... Vai
pegar toda a minha equipe sem me dar nada. Isto não ficará assim. – Seus
pensamentos eram frenéticos, e seus olhos deixavam transparecer sua
preocupação repentina, bem como, uma gota de suor que escapou de sua
testa.
- Pode ficar tranquilo que não vou fazer isto com você! – Apaziguou
Arthur agora batendo no ombro de Charles como um pai que educa o seu filho
lhe dando uma lição, e, aquilo era sim uma grande lição.
- Como assim, você está brincando?
- Não! Estou lhe ensinando que se você colocar seus sentimentos
antes da razão, vai acabar sem nada... – Fez uma pausa olhando para a cara
de Charles, o qual expressava agora um olhar de desentendimento com o
rumo da conversa. – Você aceitou tudo somente pensando em você. Em
momento algum pensou na sua equipe, na empresa e nem no Frederik.
- Pensei sim, eles...
Mas foi interrompido por Arthur que gritou:
- Não minta para você mesmo Charles! Acha que alguém racional
teria feito tudo que você fez em questão de um dia? Mudaria o rumo de suas
operações somente com promessas?
Charles abaixou a cabeça, realmente havia agido com o coração
antes da razão, mas ainda tentou argumentar:
- Mas Frederik...
- Frederik é passado meu caro Charles! O futuro é você. Afinal estes
homens respeitam mais a você do que a Frederik, porque eles sabem que
você daria a vida por eles... – Chegou bem perto do rosto de Charles e colocou
as duas mãos em sua face, como que clamando por concentração no que
tinha a dizer. - Mas se hoje eu não tivesse trago sua equipe de volta, você
talvez os teria perdido para sempre, afinal, eles são espiões, e, ao que tudo
indica não tem qualquer sentimento em matar, aniquilar ou fazer qualquer
coisa para manter a dignidade de seus países, mas, agora, eles não defendem
mais a sua pátria, e, desta forma, somente buscam o dinheiro ou o vício pela
adrenalina. Portanto, se não são remunerados dignamente vão aceitar outro
trabalho, quem sabe até contra nós mesmos.
Ao perceber que Charles estava atordoado com aquela resposta ele
sorriu concluindo:
190
- Mas acima de tudo, eles têm que ter confiança em você! Eles têm
que sentir que você pensou neles, por isto deixei que pensassem que você
havia pensado neles quando aceitou o emprego.
Charles estava com os olhos fixos nos de Arthur, e seus
pensamentos não paravam, principalmente, o mais obvio deles:
Eu realmente falhei neste ponto...
Vendo que Charles havia entendido, Arthur tirou suas mãos de seu
rosto.
- Me desculpe...
Mas antes que terminasse Arthur interveio novamente:
- Não se desculpe. Vou pagar dois milhões por este serviço, este vai
ser um montante para que Frederik fique calmo, e, ainda, depois quero acertar
um plus que vamos combinar na medida em que sentirmos que a nossa união
está dando certo. Também, quero que você saiba que poderá cumprir para
com todos os trabalhos que já estavam fechados anteriormente, inclusive,
usando os recursos deste local. Depois quero que pegue alguns serviços por
fora, principalmente, para não perder sua carteira de clientes, e, também, para
que os agentes não achem que retornaram a um serviço público.
- Sim senhor, e fico muito grato por tudo. – Charles respondeu
levantando-se e indo de encontro a Arthur para lhe dar um abraço, estava
muito emocionado como ele havia conduzido tudo, se mostrou o pai que ele
nunca pôde contar, pelo menos ao que ele pensava.
- Não venha com abraços. – Arthur disse dando um pulo para trás. –
Odeio que fiquem me encostando.
- Me desculpe. – Disse Charles ao parar subitamente totalmente
envergonhado.
- Deixe de ser bobo meu filho, claro que pode vir aqui me dar um
abraço. – Disse Arthur agora sorrindo e puxando Charles ao seu encontro,
dando um enorme e apertado abraço. – Mas não se acostume. – Ele disse
sorrindo.
No momento em que estavam abraçados, pela primeira vez em anos
Charles sentiu que era amado, mesmo que não conhecesse ainda quase nada
de Arthur, ele, em apenas pouco tempo, havia lhe proporcionado
ensinamentos, cuidados e principalmente carinho, o que ele nunca teve, afinal,
Frederik era muito gentil com ele, mas nem de longe lembrava uma figura
paterna.
- Agora quero que vá com seus homens até minha outra sala, lá
estará um tatuador de minha confiança, ele vai fazer uma tatuagem em todos,
após, podem cobrir ela com outra do gosto de vocês.
Charles ficou espantado, o que era aquilo? Tatuar! Isto seria ridículo.
191
Vendo a cara de espanto de Charles o velho resolveu explicar:
- Sei que é estranho, mas vamos lutar contra forças muito
poderosas, assim, não podemos nos preparar somente para ataques deste
mundo, mas temos que nos preparar para tudo o que está por vir, e isto inclui
vocês fecharem o corpo contra possessões, usarem amuletos que eu vou lhes
proporcionar como forma de presente, para que seus homens não desconfiem.
- O senhor havia deixado isto antes no ar, e eu não questionei, mas
acha mesmo que demônios e isto tudo existe?
- Charles, não vou gastar conversa com você sobre este assunto,
porque creio que mais em breve do que você pensa terá a certeza que isto é
mais real do que você imaginava. – Arthur respondeu sorrindo, mas a
realidade era que ele queria prepará-lo sem assustá-lo.
- Sim, se o senhor está pedindo. Afinal, sempre quis fazer uma
tatuagem. Mas e se algum dos homens não quiser...
- Charles não seja bobo, eles não largarão de ganhar tudo o que
está em jogo por causa de uma tatuagem!
- Tenho que concordar com o senhor, nunca vi eles tão felizes em
suas vidas.
Arthur fechou o cenho e voltou a se sentar.
- O que foi senhor? – Questionou Charles em tom de preocupação
sentando-se ao seu lado.
- Não pedi para Dominik ficar aqui por acaso.
- Como assim?
- De todos, o único que eu não tenho nenhuma confiança é ele. –
Respondeu olhando para Charles com cara de desânimo.
- Mas senhor, se fosse assim era melhor ter dispensado ele ao invés
de colocá-lo em um cargo daqueles.
- Isto foi somente para checar aonde ele poderia chegar, e, ainda,
para deixar ele aqui dentro.
- Não entendo, mas aqui é mais perigoso, ele terá acesso a dados,
etc.
- Não seja idiota Charles, tenho total controle de tudo aqui, tenho
funcionários de confiança vigiando cada passo de cada um neste complexo, e,
eles receberão ordens expressas para ficarem de olho em Dominik, eu
somente dei corda e uma isca para ver no que ele está metido, ou, quem sabe
se minhas suspeitas se confirmarem, descobrir para quem ele realmente
trabalha.
192
- Me desculpe, mas ele trabalha para mim há muitos anos, e seu
irmão também está na equipe, só que atualmente encontra-se em uma missão.
– Charles relutava ainda a aceitar aquilo.
- Não sei meu caro Charles, mas creio que está enganado em
relação a este rapaz, mas somente o tempo dirá. – Levantou-se estendendo a
mão direita. – Tenho uma reunião em breve, mas quero que saiba que
estamos juntos em tudo, e, em breve saberá o que anseia.
Charles cumprimentou Arthur e saiu da sala somente com um
pensamento:
Seria maravilhoso se ele fosse o meu pai!
Mas ele ainda teria muitas surpresas antes de descobrir a verdade...
193
CAPÍTULO 46
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Damião sorriu, nunca havia visto aquele homem, mas ele era sábio
como nunca havia visto antes, precisava perguntar:
- Você é o Criador, o todo poderoso do universo? Ou é um deles?
O homem já esperava por esta pergunta. Encostou a mão no ombro
de Damião, e falou suavemente:
- Não! Nosso pai ou pais como venho lhe dizendo, se assemelha ou
assemelham a nós. Contudo, mesmo que se passássemos a eternidade
evoluindo não alcançaríamos a imensidão do amor que ele ou eles contêm! Ele
ou eles não apenas nos criaram, mas acima de tudo nos deram opções,
liberdade até que não interfira na liberdade do próximo, amor, a existência
eterna, tudo... Em minha última passagem pelo plano terrestre tentei ensinar
sobre ele como um ser único, simplesmente para que presenciassem o seu
amor, e, principalmente, para pararem de idolatrar vários seres, em sua
maioria Deuses ou seres mais evoluídos que mesmo ajudando ainda tinham
suas vaidades.
Damião então com cara de mais dúvida ainda fez outro
questionamento:
- Porque você fala ele ou eles?
- Porque eu os ouço, porém não os vejo, acredito, porém não
questiono! Por esta razão eu não posso afirmar para você que seja um, ou
dois, ou muitos... Somente, que tenho a plena certeza de sua existência ou
suas existências em cada pedaço de meu ser. Mas cada um é livre para crer
no que entender e lhe for pertinente. E, é por está razão que não afirmo
qualquer número. – Respondeu o homem sorrindo como um pai que ensina ao
filho a dizer as primeiras palavras.
- Então é você que manda em tudo? Como o senhor disse o Criador
ou Criadores não fazem nada? Afinal, pelo que me consta eles somente
criaram e orientam, não regem!
O homem sorriu mais uma vez, era evidente que Damião evoluiu não
por acaso, era curioso e buscava respostas o tempo todo, mas ele não tinha
tempo, o corpo dele estava iniciando um processo de perca total da ligação da
alma, ele não poderia mais esperar, então lhe disse tentando não demonstrar
que estava apressado:
- Damião, não posso lhe dar agora todas as respostas, nem as tenho
por completo, por isto digo meu amigo que você terá que descobri-las por si
próprio. Somente posso lhe garantir que não mando em nada, somente tento
ajudar ao máximo que todos evoluam para em breve estarem aqui ao nosso
lado.
Fez uma pausa e depois de um forte suspiro continuou:
194
- Aqueles que me procuram lhes darei às mãos, se não, lhes
oferecerei ajuda... E sobre o Criador ou Criadores não fazerem nada, acho que
este é o maior absurdo que já falou em toda sua existência, afinal de contas,
só de eles terem criado o universo e inclusive você, já é grande coisa! Não
tendo, portanto, que ser questionado ou questionados, somente respeitados!
Damião abaixou a cabeça evidenciando a tamanha vergonha que
naquele momento tomou conta de seu ser, não tinha a intenção que suas
palavras tomassem o tom de questionamento, somente queria respostas, e
aquele homem parecia ter todas. – Me desculpe... – Falou após algum tempo
com voz chorosa.
O homem continuava com a mão em seu ombro, apertou ela bem
forte, e falou pacientemente, novamente como aquele pai ou mãe ensinando
ao filho os princípios basilares da vida:
- Não precisa se desculpar! É natural de até mesmo os evoluídos
espíritos questionarem e quererem saber da onde vieram e para onde vão, ou
quem são seu pais, como foram criados, etc., tudo porque afinal ele ou eles
são realmente seus pais. Por isto vou lhe dar uma dica, quando quiser
conversar com ele ou eles ou senti-los, encoste suas mãos em qualquer lugar,
seja até em sua pele, e tente se comunicar, afinal, ele ou eles estão em todos
os lugares, e tudo veem e ouvem. E está sua busca por respostas não é de
questionamentos banais, é a busca de um filho que anseia em encontrar seus
pais, por isto é a atitude mais bonita que se pode esperar de um ser.
Damião assentiu com a cabeça, havia entendido, não respondeu
falando, porque em sua cabeça a dúvida agora era quem era aquele ser tão
evoluído que com ele dialogava.
- Outra coisa! – Falou o homem agora em tom mais serio. – Tenho
que lhe pedir que regresse a terra.
Damião ficou surpreso, até Miguel que até aquele momento estava
quieto ficou espantado, e ameaçou dizer algo, mas o amigo saiu na frente:
- Mas eu não posso voltar para a terra agora, tenho que esperar
algum tempo em descanso, porque se não minha alma poderá sofrer as
consequências que todos sabemos. Além disso, não tenho uma família traçada
para me receber.
O homem olhou no fundo de seus olhos e lhe respondeu em tom
autoritário:
- Mais quem falou em voltar em forma de espírito ou nascimento,
preciso que você volte ao seu mesmo corpo que lhe abrigava!
Damião sorriu alegremente, aquilo era hilário, virou-se ao homem é
falou com um tom de ironia:
- Meu senhor, você é muito sábio, e também pelo que pude notar
muito poderoso, mais até hoje em toda a minha existência espiritual, em
qualquer dimensão pelas quais eu passei, e quero lhe dizer que não foram
poucas! Somente ouvi falar de uma alma que conseguiu fazer uma pessoa
195
voltar à vida material que não fosse pelo processo de encarnação ou pelas
trevas que utilizam a possessão.
Miguel ficou calado, não disse nada desde que sentou, somente
observava Damião, ele era um Arcanjo e estava acostumado a seguir ordens
sem questionar, por isto se interessava tanto pelos questionamentos do amigo,
era claro que a alma humana era diferente de todos os seres, eles tinham sede
de respostas, e isto o impressionava, afinal, já havia perdido a tempo está
sede por respostas.
O homem ficou quieto, seu rosto não transparecia qualquer emoção,
então perguntou a Damião calmamente:
- Quem seria este homem que conseguiu ressuscitar alguém?
- Jesus lógico!
Respondeu Damião prontamente, e prosseguindo:
- Ele não só ressuscitou Lazaro, como também ocorreu o mesmo
com ele... O senhor não acompanhou deste local tais acontecimentos ou não
ouviu ao menos falarem disto na dimensão sublime? O fato é bem notório, mas
ninguém o viu nesta dimensão sublime após regressar da dimensão material,
dizem que ele se encontra com os Criadores em pessoa...
O homem virou-se para ele com um sorriso, falando:
- Lógico que conheço toda está história, posso dizer melhor do que
ninguém, porque eu a vivi!...
196
CAPÍTULO 47
Vilarejo na França, 1982
O corpo de Damião encontrava-se na soleira da porta da casa da
recém-nascida Joana, já estava coberto pela neve que se formou novamente
após o derretimento provocado pelo Arcanjo atacando Serfalos. A neve que se
acumulava estava totalmente avermelhada devido a grande quantidade de
sangue.
Dentro da humilde casa, João e Lourdes estavam conversando com
as crianças, explicando que não deveriam contar a ninguém o que ocorreu
naquele dia!
- Isto não é mentir crianças, temos que ser fortes! Sua irmã recémnascida terá que ter muita ajuda, tanto nossa quanto de vocês que são mais
velhos. – Falavam calmamente.
As três crianças assentiram com a cabeça. O mais velho ainda
estava com Joana nos braços, ele não conseguia largá-la, parecia que aquele
bebê emanava uma paz a todos, ela era iluminada, e as crianças sentiam isto!
Além disso, o garoto se lembrava das palavras de Damião para cuidar dela.
- Pode deixar mamãe e papai, vamos cuidar dela. – Falou o irmão
mais velho Pierre.
João levantou-se chamando Lourdes em um canto.
- Tenho que chamar alguns amigos e falar que Damião foi atacado
por algum animal...
A mulher não gostava de mentir, mas às pessoas naquela região
amavam muito aquele homem, não sabiam sequer se eles iriam acreditar
nesta história, corriam riscos de serem linchados, afinal, quem poderia explicar
uma casa cheia de sangue com um corpo.
- Certo! Mas antes temos que limpar a casa, do contrário seremos o
alvo das atenções.
João assentiu e foi para a cozinha buscar panos e água para
iniciarem a limpeza, enquanto a mulher foi dar banho nas crianças, ele estava
extremamente feliz por recuperar sua memória infinita cerebral, e,
principalmente, de estar ao lado daquela alma tão boa novamente.
197
CAPÍTULO 48
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Damião estava pensativo.
Como assim, este ser viveu a história de Jesus, será que ele estava
encarnado e presenciou tudo? Será que é um dos discípulos. – Pensou!
Nisto notou que as mãos do homem ainda estavam em seus
ombros, elas emanavam luz, como seu corpo, olhou para elas e se petrificou...
O que viu desatinou ainda mais sua consciência! Na mão esquerda
do homem havia um buraco, então virou rapidamente a cabeça ao ombro
direito e não acreditou, eram marcas de cravos...
Neste exato momento somente teve forças para afirmar com voz
rouca já segurando a emoção e o choro que em segundos veio a lhe consumir:
- Jesus?...
O homem se levantou, levantando ao mesmo tempo Damião pelos
ombros, uma vez que seu corpo estava ainda paralisado com a revelação.
- Sou sim...
Jesus falou com uma voz meiga e suave, mas dura e concisa, não
dispunha de tempo, por isto não esperou nenhuma resposta e continuou a
falar:
- Entenda meu irmão, que não quero que perca seu tempo me
glorificando. Que é o que estava prestes a fazer! Preciso que retorne
imediatamente ao seu corpo, Miguel ficará aqui comigo, e lhe explicarei tudo!
Ao voltar, não olhe para trás, e não converse com ninguém nem mesmo com
Lourdes e João! Não temos tempo a perder com explicações. Por isto siga ao
porto e pegue a primeira embarcação que sair para o Brasil.
Ele apertou ainda mais suas grandes mãos no ombro de Damião,
terminando as orientações:
– Estarei sempre com você, e tudo que precisar peça ao Criador,
que em breve ficarei sabendo. Saiba que Miguel também lhe acompanhará de
perto, ou qualquer outro irmão de confiança. Chegando ao Brasil procure uma
Igreja que vai lhe ser revelada em um sonho, lá encontrará um padre que vai
ver neste mesmo sonho, ele estará lhe esperando no porto e se não tiver vá à
igreja, ele lhe aceitará imediatamente como padre e professor na faculdade.
- Mas senhor... – conteve-se. – Eu nunca lecionei! – Concluiu com
um tom de preocupação.
- Não se preocupe, terá tempo de aprender, o Conselho lhe
concederá alguns poderes a mais dos que já recebeu após a reencarnação, na
medida em que vier a precisar. E como a barreira já estará quebrada poderá
198
lecionar filosofia e outras matérias que já aprendeu em uma de suas vidas
passadas, já que tem algum conhecimento em leis.
- Mas quando voltarei a conversar com o senhor?
- Somente vou poder vê-lo por enquanto em sonhos! Um amigo meu
vai lhe procurar. Não duvide dele, ele vai se identificar por Senhor da Luz,
porquanto, é muito perigoso usar o nome que todos o ficaram conhecendo.
Damião assentiu com a cabeça, dizendo:
- Pode ficar tranquilo senhor, eu já o conheço. E tenho muita
confiança nele, mesmo com tudo que aconteceu com...
Mas foi interrompido por Jesus que abriu um enorme sorriso e
gesticulou para parar, não havia sido informado que Damião e o Senhor da Luz
já se conheciam. Aquilo iria facilitar muito às coisas, e iria ganhar tempo, o que
mais precisavam no momento...
Neste momento Jesus saiu de perto da mesa, ao passo que ambos
ficaram observando seus passos.
- Miguel fique longe de nós, por favor! – Pediu ao Arcanjo, o qual
obedeceu sem titubear.
Jesus que segurava os braços de Damião lhe deu um grande
abraço.
- Sei que é um homem de fé meu amigo, mas quero que você saiba
que não é apenas uma referência para ser seguida, mas uma alma a ser
idolatrada por sua coragem e sabedoria, por isto sou eu que me sinto honrado
em estar ao seu lado.
Damião lhe lançou um olhar de admiração, ao passo que Jesus
mesmo não dispondo de tempo, resolveu responder a sua maior dúvida, já que
tal resposta poderia ajudar o amigo em algumas coisas:
- Sobre a minha aparência, saiba que não uso barba e cabelo
grande unicamente porque ultimamente resolvi mudar depois de muita
insistência de alguns amigos do Conselho, principalmente Buda que dizia que
aquilo era desconfortável e difícil de cuidar. – Deu um suspiro sorrindo em
seguida. – Se fosse por ele eu estaria careca! – Deu agora uma gargalhada. –
Mas como não gosto de ser inflexível resolvi cortar para ver como ficava... –
colocou uma das mãos no canto da boca, dizendo baixinho, como se não
quisesse que alguém escutasse. – E saiba que no cabelo eu não gostei muito,
mas a barba é outra coisa, parece que minha pele é mais macia e coça menos,
acho que pelo menos na barba vou deixar desta forma por algum tempo, mas
tenho que manter segredo porque se Buda descobrir estou frito, afinal, havia
dito a ele que se não gostasse iria gastar umas boas energias lutando com ele
para fazer nascer cabelo naquela careca feia dele! – Terminou dando mais
uma grande gargalhada.
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Damião sorriu, nunca pensava que Buda fazia parte do chamado
Conselho Supremo, e nem que seus membros dispunham de tanta amizade
entre eles. Aquilo era realmente fantástico.
Sorrindo Jesus deu-lhe mais um abraço beijando sua face direita, e
lhe desejando boa sorte, após colocou as duas mãos em sua cabeça, rezou
um pai nosso, após proferiu as seguintes palavras:
- Necessito que esta alma pura volte ao seu corpo terreno, ele ainda
tem uma importante missão a cumprir, por seu amor, e glória, permita que esta
ressurreição seja consumada...
Antes de acabar de dizer as últimas palavras à alma de Damião foi
sumindo aos poucos como que levada pelo vento. Miguel ficou espantado,
quando à alma do amigo havia desaparecido totalmente, Jesus foi em direção
ao Arcanjo, pegou suavemente em seus ombros, falando:
- Vamos, agora tenho que lhe guiar! Não temos muito tempo antes
de eu partir, por isto terá que aprender o que vou lhe ensinar muito depressa,
uma vez que não apenas os humanos necessitam, mas todo o universo carece
de sua força.
Após, seguiram para a grande mesa...
200
CAPÍTULO 49
Vilarejo na França, 1982
De dentro da neve foi saindo vários feixes de luz, como se
houvessem acendido um grande farol que iluminava toda parte interior da neve
e saia pelas frestas devido sua enorme intensidade.
Com o calor gerado pela luz a neve começou imediatamente a
derreter, e em poucos segundos do início do processo de derretimento
começou a surgir uma mão, após todo corpo de Damião estava sob uma
grama queimada, a neve tinha derretido totalmente e era possível vislumbrar
que de seu corpo saia uma grande fumaça devido ao calor que dele emanava
ainda derretendo a neve que estava mais longe e evaporando muita água.
Seus olhos se reviravam, não por frio, mas pela sensação
inexplicável que ele sentia naquele momento, sua mente estava toda
embaralhada, não conseguindo firmar o pensamento em nada, e não tinha
domínio sobre mãos e pernas.
Em síntese, o que ocorria era que quando nascemos, o espírito
desce ao corpo do bebê três meses após o início de sua formação na barriga
da mãe, e nos seis meses seguintes evoluí juntamente com o corpo, fazendo
um equilíbrio e formação entre alma e matéria.
Contudo, com Damião era muito diferente, um acontecimento
anômalo, que somente se tem poucos relatos verídicos em todo o mundo, e
apenas um deles foi retratado em um livro difundido por gerações, promovido
por uma única pessoa que ainda se mostrava capaz de concluí-lo sem deixar
qualquer sequela.
Se o espírito de Damião tivesse encarnado em um corpo de outra
pessoa viva, isto seria fácil, afinal, possuir o corpo alheio desprotegido era
tarefa tão simples que vários demônios neste mesmo momento o fazem. Só
que por não ter muito domínio ou destreza muitos acabam por destruir
somente a vida da pessoa que possuem, com doença e outros males.
Por isto o caso de Damião era raro, ele estava voltando para um
corpo sem qualquer vida, era uma ressurreição, que segundo relatos históricos
somente teria ocorrido com Lazaro no decorrer dos tempos. Isto não era
impossível, pois Jesus já tinha provado o contrário, contudo, devido a ninguém
ter o poder para fazê-lo ocorrer, muitos espíritos, inclusive, os demônios já
haviam desistido de questionar esta possibilidade, e aquilo havia virado lenda
em todas as dimensões.
Ocorre que muitos não se perguntaram por que Jesus ressuscitou
Lazaro, uma coisa era certa: não foi por vaidade, para mostrar seu poder, ou
por acaso, o que realmente ocorreu era que ele ainda tinha uma missão muito
importante, o mesmo caso de Damião naquele momento.
Assim, o que estava ocorrendo era que seu espírito estava de uma
forma inexplicável e maravilhosa voltando ao seu corpo que já se encontrava
logicamente em estágio de início de decomposição da matéria. De tal modo
201
que o espírito tentava iniciar uma interação com o corpo formando o canal que
levaria seis meses em apenas alguns segundos...
Portanto, os ajustes de memória da alma com o cérebro, estavam
sendo feitos em uma velocidade até mesmo perigosa, e, ainda, tinha o fato que
Damião era tão evoluído que não possuía mais a barreira, deste modo o
espírito estava equilibrando informações suficientes no cérebro do corpo, para
não sobrecarregá-lo, quase a mesma coisa que Damião havia feito com os
pais da pequena Joana.
Após três minutos o corpo parou de tremer, o sangue se
apresentava somente nas roupas, e seu corpo estava limpo devido à grande
transpiração pela qual passou. Seus olhos pararam de tentar se revirar para
cima, e se fecharam lentamente, e após poucos segundos eles se abriram
novamente. Suas pupilas estavam dilatadas, ele se levantou calmamente, sem
sentir qualquer dor, somente uma sede enorme lhe afligia, certamente devida à
transpiração excessiva.
Colocou uma das mãos na frente dos olhos, a claridade ainda o
atordoava devido às pupilas ainda estarem muito dilatadas, mas seus
pensamentos já se encontravam perfeitamente e assustadoramente em ordem.
- Que sede! Pena que não posso entrar na casa para me despedir,
isto iria me aliviar não somente a consciência, mas acima de tudo minha
sede... – Falou para si mesmo ainda terminando de se levantar.
Ele ficou parado por algum tempo com as mãos nos olhos, tentando
firmar o olhar, o qual ainda estava muito turvo, mas aos poucos este sentido
também foi voltando ao normal.
Ao conseguir olhar para o chão viu muita água aos seus pés. – Não
vou tomar está água, afinal ela encontra-se muito suja com sangue e sabe-se
lá mais o que! – Pensou sorrindo para si mesmo.
Olhou para as árvores, e após escrever algo com um pouco do
sangue que estava mais coagulado no chão, adentrou rapidamente na floresta,
afinal, tinha que conseguir chegar rapidamente ao porto, como havia sido
ordenado.
Dentro da casa, Lourdes e João tinham acabado de colocar Joana
no pequeno e humilde berço de madeira, seus outros filhos estavam na
cozinha, cada um com um grande pedaço de pão e uma laranja, comiam
freneticamente, estavam realmente famintos devido aos acontecimentos.
- Fiquem ai meus filhos, e olhem a sua irmã, somente vou avisar o
pessoal da vila da morte do senhor Damião. E não incomodem sua mãe, ela
está muito cansada devido a ter dado a luz e aos eventos que hoje aqui se
sucederam, os quais, conforme já combinamos, não vamos mais comentar
nem entre nós, estamos entendidos! – Ordenou João que ainda respondia por
seu antigo nome de Jonas, ao passo que os filhos somente assentiram com a
cabeça, as bocas cheias o impediam de falar qualquer palavra.
Ao abrir a porta levou um susto, seu coração saltitava devido ao fato
de não haver nenhum corpo onde haviam deixado Damião. Em volta do lugar
202
havia muita neve, mas em seu meio ela estava totalmente derretida, a ponto
de aparecer à grama queimada untada em sangue.
Ele gritou por Lourdes que mesmo cansada veio correndo ao seu
encontro, a qual ao chegar e ver a cena começou a chorar, e, seus olhares se
encontraram, questionavam um ao outro incrédulos o que teria acontecido com
o corpo de Damião.
Neste momento, notaram algo diferente na grama, tinha alguma
coisa escrita nela, parecia que alguém tinha utilizado um pedaço de madeira
misturado ao sangue e terra que ali se encontrava. Quando se aproximaram
puderam ler:
- RESSUSCITEI! CUMPRAM A SUA MISSÃO!
Eles estavam espantados, conheciam a letra, estava muito tremida,
mas era realmente de Damião. – Como assim “ressuscitei”? Isto é impossível!
Ele é poderoso, mas não possui este poder extraordinário, e, ainda, tem o fato
de que vimos inclusive Miguel recolhendo sua alma – Lourdes falava
freneticamente para João que somente olhava aquilo tudo incrédulo, mal
escutando a mulher.
Nisto uma rachada de vento fez João olhar mais para a frente, foi
quando ele avistou as pegadas de Damião na neve indo em direção à floresta.
Isto é surpreendente... Pensou antes de estender lentamente a mão e apontar
o dedo, o qual, Lourdes parou de falar e seguiu-o com o olhar, tendo a mesma
reação ao avistar as pegadas...
Viraram-se e entraram correndo para o interior da humilde casa, não
tinham tempo para buscarem respostas, tinham que iniciar os trabalhos, limpar
lá fora, e, ainda, esconderem a espada de Miguel. Não sabiam quando o
Senhor da Luz iria aparecer, isto se ele realmente aparecesse devido a sua
reputação em matéria de promessas e fidelidade...
A única certeza que tinham era que Damião com certeza tinha
encontrado um método de voltar, não cabia a eles questionarem, somente
podiam assentir, agradecer ao Criador ou quem quer que seja que o
ressuscitou.
Neste momento os dois se sentiram mais seguros, tendo a plena
convicção que estavam sendo protegidos e guiados por um líder e mestre
supremo. E, principalmente, que além de escolherem o lado certo, ele era
definitivamente muito poderoso, e, assim, tinham somente que rezarem para
que tudo pudesse correr bem, porque tinham um longo caminho até o
confronto final, e até lá certamente o outro lado que já era assustadoramente
forte poderia até mesmo igualar seus poderes, se isto ocorresse haveria
muitas perdas não apenas no plano material, mas até mesmo no plano
imaterial...
203
CAPÍTULO 50
Londres – Inglaterra, 1982
Charles chegou à sala onde se encontravam os agentes, os mesmos
estavam comemorando com pequenas lutas em um ringue localizado na área
de treinamento do complexo a conquista da remuneração.
Contudo, ele não conseguia tirar os olhos de Dominik.
A dúvida é o pior dos sentimentos, nela não se pode reconfortar-se
com o poder da certeza que mesma drástica tem que ser encarada. – Pensou,
já acenando e sorrindo para Dominik quando o mesmo retribuiu o olhar.
- Chefe, venha participar! – Gritou um dos agentes com a face
ensanguentada devido à luta com o companheiro. – Vamos comemorar ao jeito
antigo, só tenho que lhe advertir que tem apostas rolando, afinal, agora temos
muito dinheiro para gastar.
Charles sorriu somente balançando a mão em sinal negativo, já se
dirigindo ao seu escritório localizado na parte superior do complexo.
Ao chegar à sala se assustou, diante do que viu, era enorme, tinha
monitores, uma grande mesa de reuniões, completa. Ele se dirigiu para uma
grande mesa ao canto reconfortando-se em uma cadeira executiva magnifica.
- Isto só pode ser um sonho! – Exclamou para si mesmo.
- Se chama isso de sonho, tenho que dizer que você é um louco ou
um desfavelado! – Uma voz gritou, fazendo que Charles pulasse da cadeira
com o susto. – Não se assuste seu bobo, sou eu. – Tornou a voz, ao passo
que Charles não precisou sequer virar-se para o monitor para ver quem era,
certamente era a Dra. Kim.
- Será que a senhora não vai me dar sossego nem em meu
escritório? Não terei liberdade nem para expressar meus sentimentos no meu
recanto! – Berrou Charles perdendo as estribeiras com a Doutora.
Para espanto dele que achou que iria levar era uma resposta furiosa,
devido já conhecer o temperamento da baixinha, ela fez foi dar uma
inesperada gargalhada, dizendo em tom alegre:
- Tenho que lhe dizer que ninguém aqui tem liberdade para
expressar nada verbalmente, e, se minhas tecnologias evoluírem mais um
pouco, em breve nem mentalmente.
Charles deixou os ombros caírem, era impossível discutir com
aquela mulher, ela era estranha, ora furiosa ora alegre, e, em raras vezes
sarcástica. Não sabia ele que ela somente era assim com ele, estranhamente
com ele...
- Me desculpe por ter gritado, é porque me assustei. – Tentou
apaziguar ao perceber que não compensava discutir com ela, afinal, se iriam
204
trabalhar juntos tinham que ter um bom relacionamento, mesmo que isso
implicasse perca de liberdade.
- Não precisa se desculpar, eu é que agi errado, deveria ter pedido
permissão antes de invadir o servidor de seu complexo e me dirigir ao seu
monitor desta forma, mas é porque tenho algo muito importante para lhe dizer.
Ela pedindo desculpas, deve ser algo mesmo muito importante. –
Pensou já se prontificando:
- Pode dizer Doutora.
- Quero que aqueles homens das cavernas que estão lutando como
bobos, os quais você muito amável chama de agentes se dirijam ao meu
complexo para que eu possa mostrar-lhes alguns dos equipamentos que eles
irão utilizar na primeira missão, traga somente de sete a dez agentes.
- Sim vou separá-los quanto aos melhores. – Ele respondeu já se
virando.
- Espere! – A Doutora gritou fazendo com que Charles quase
escorregasse ao parar subitamente em cima de um tapete resvaladio.
- O que mais Doutora? – A voz saiu com desânimo.
- Arthur deu ordens para não escolher Dominik, para dar-lhe
afazeres na área que ele vai trabalhar, administrativa.
É logico que não iria escolher ele! – Pensou, já respondendo a
mulher de uma forma mais ponderada:
- Sim Doutora, pode deixar que já havia entendido quando Arthur me
explicou, vou mantê-lo aqui dentro.
Quando Charles bateu a porta a Doutora Kim em seu complexo
desconectou um estranho aparelho de um computador, ele é que havia
quebrado os dispositivos de seguranças do complexo ao qual somente Arthur
estava autorizado a fazê-lo, dizendo baixinho somente para si mesma:
- Eles estão temendo a pessoa errada...
Não sabia ela que Arthur estava naquele momento observando-a de
sua sala por uma micro câmera escondida feita por seus amigos de uma
agência de inteligência sueca a qual promovia serviços aos bancos que ele
guardava parte de sua fortuna.
- Você é que pensa Doutora... – Disse o velho de sua sala, sorrindo
sinistramente após ouvir o comentário da pequena mulher.
205
CAPÍTULO 51
Vilarejo na França, 1982
Damião já caminhava e tinha todos os sentidos apurados, além
disso, ajudou muito ele conhecer toda a região. Assim, antes de seguir para o
porto, tinha tempo para desviar-se rapidamente para um leito de rio mais
afastado da comunidade em que moravam, afinal, não poderia correr o risco
de se lavar próximo à vila, porquanto, certamente os ribeirinhos ou até mesmo
algum morador em pescaria poderia reconhecê-lo.
Ao chegar ao leito do rio não fez cerimônia, pulando de roupa e tudo
na água, a qual apesar de não estar congelada, estava em processo de
congelamento, razão pela qual, após pular se arrependeu extremamente, era
como se várias espadas tivessem sendo ao mesmo tempo fincadas em seu
corpo.
E para seu espanto, ele ouviu uma gargalhada enorme, o que o fez
tremer desta vez não de frio, mas de medo que pudesse ser algum morador,
que viu suas vestes untadas em sangue.
- E ai meu amigo, está querendo virar um sorvete humano! – Falava
um grande homem que ele de primeiro momento não conseguiu avistar, devido
a grande claridade que seu corpo inexplicavelmente emitia.
Para seu espanto e ao mesmo tempo alívio, quando finalmente
conseguiu avistar o engraçadinho, pôde ver que se tratava do Senhor da Luz,
e não se conteve de alegria, mas para não deixá-lo se achando, resolveu
ironizar seu contentamento:
- Nossa, é a primeira vez que fico alegre em lhe ver!
- Para tudo em nossa existência há que ter um início, assim, pode ter
certeza que o início deste seu estado de contentamento quando me viu está
apenas começando, e deste modo será todas as vezes que nos vermos daqui
em diante. – Respondeu sorrindo ainda mais.
Não tenho tanta certeza disso, mas não custa nada confiar, afinal, se
os criadores confiaram em nós mesmo após provarmos que somos seres
totalmente falíveis. – Pensou retribuindo o sorriso e saindo rapidamente da
água, tremendo muito, razão pela qual, esfregava as mãos contra o peito
tentando inutilmente esquentar-se.
Para seu total espanto o Senhor da Luz lhe estendeu uma pequena
bolsa.
- Tome meu amigo, acho que peguei tudo que você vai precisar para
cumprir com seu destino.
Damião estendeu lentamente as mãos para pegar a bolsa de pano,
deixando transparecer seu espanto.
206
- O que! Está espantado pelo fato de eu ter te achado do nada, ou
pelo fato de ter lhe trago suprimentos? – O Senhor da Luz questionou com
ironia, porquanto, sabia os reais motivos da desconfiança.
- Pelos dois! – Respondeu sem hesitar Damião, já abrindo com as
mãos tremulas pelo frio a bolsa, a qual para confirmar seu espanto portava
toalha, roupas, comida, que ele reconheceu que desde os objetos ali contidos
como até mesmo a bolsa lhe pertenciam, e estavam em sua casa.
- Como você entrou em minha casa? – Questionou, sem parar de
retirar os objetos da bolsa e iniciar rapidamente a retirada das roupas
molhadas, afinal, as respostas não eram mais importantes do que se aquecer
naquele momento, e, como a boca não atrapalhava mover os braços, matava
dois coelhos com uma cajadada só.
- Entrar em sua taperinha que você chama de casa foi fácil,
porquanto, apesar de ter que enfrentar vários encantamentos, os quais insta
mencionar, são muito rudimentares, mas que para ser sincero tenho que
admitir que me deram um pouco de trabalho, afinal, estava um pouco
enferrujado em quebra de encantos de proteção de terreno. – Ele fez uma
pausa olhando para o final de suas vestes, a qual estava queimada,
demonstrando que ele teve realmente trabalho. – Mas o que me deu muito
trabalho mesmo foi achar uma bolsa, e, depois achar os itens que acreditei
serem os mais importantes além das vestes, como amuletos antigos, poções,
etc. Separei com cuidado alguns que creio que o senhor vai precisar em vossa
jornada.
- Muito obrigado, não sei como lhe agradecer. – Respondeu Damião
sentindo um peso na consciência por duvidar das intenções daquele que
estava se mostrando já durante um bom tempo ser digno de sua confiança. –
Mas como sabia que eu estava vindo por este caminho?
- Quando você me falou que íamos nos encontrar na colina, alguma
coisa me chamou a atenção que tudo estava muito estranho no ar. Sentia que
deveria ficar por ali, logicamente a espreita, aguardando os eventos, e quando
já me preparava para ir embora, achando que tudo estava terminado, e que
você como prometido iria me encontrar já desencarnado na colina, seu corpo
começou a se revirar. Assisti aquela cena não muito assustado, afinal, já havia
visto aquilo antes, e quando o observei entrando na floresta, sabia que, por
evidente, você por algum motivo não poderia se dirigir a sua humilde taperinha.
Dai por diante somente deduzi que iria morrer de frio o que iria jogar por terra
seu ressuscitamento, e como não gosto de estragar ressuscitamentos, até
mesmo ajudo eles a acontecerem... – Ele terminou sorrindo com mais ironia.
Damião não tinha palavras, não gostou da comparação, mas sabia
que ele era brincalhão, e, realmente iria morrer de frio naquela floresta, afinal,
o porto ficava a vários quilômetros dali, se não morresse de frio a fome iria lhe
derrubar mais cedo ou mais tarde.
- Mas agora sou eu que quero respostas. Para onde você está indo?
– Questionou o Senhor da Luz sem hesitar.
- Tenho que ir ao porto, minha missão agora será no Brasil.
207
- Então é você quem vai orientar Marcos?
- Não sei, somente recebi ordens de pegar o primeiro barco para lá,
que quando chegasse seria levado para uma igreja onde seria padre, e ainda
iria lecionar latim e outras coisas em uma faculdade de Direito, etc.
O Senhor da Luz soltou um enorme sorriso, havia matado realmente
a charada:
- É meu amigo, você vai realmente orientar o garoto Marcos. Eu
estava lá, seu nascimento não foi nada fácil.
- Mas você acha que esta alma sem qualquer poder poderá ser o
braço direito de Joana nesta batalha tão dura? – Questionou Damião
demonstrando sua intranquilidade com a escolha do Conselho.
- Não sei meu amigo, mas creio que poder não vence batalhas, do
contrário... – Ele terminou olhando com admiração para seu próprio corpo.
- Entendi, não precisa nem completar. – Interveio Damião
demonstrando que não queria entrar naquele assunto. Foi quando uma
inquietação tomou conta de seu ser, percebeu que no calor dos
acontecimentos sequer havia se certificado de que ninguém estava olhando e,
principalmente, ouvindo aquela conversa. Foi quando começou a olhar por
todos os lados, se certificando de que ninguém os estava espreitando.
- Não precisa temer meu amigo, já me certifiquei antes de você
chegar que ninguém encarnado ou desencarnado está nos espiando, e tenho
que lhe admitir que este local é bem mais isolado do que a colina.
Damião sorriu sem graça estendendo a mão direita para
cumprimentá-lo, já estava vestido, e seu corpo já estava bem mais aquecido.
Havia tentado ser sútil, mas pelo visto o dito Senhor da Luz sabia bem que
ninguém queria ser visto com ele, e resolveu se antecipar e certificar-se da
total descrição daquela curta, mas imprescindível reunião.
- Vamos ao que interesse meu amigo. Afinal, eles realmente lhe
enviaram para o Brasil após todo este estardalhaço que foi o nascimento de
Joana? – Questionou sem rodeios, e pegando na mão de Damião
respondendo ao cumprimento.
Mesmo se assustando com a pressa do seu interlocutor, Damião não
pestanejou, e decidiu respondê-lo rápido também, enfim, sabia que o amigo
também temia em ser surpreendido naquela conversa:
- Sim, sei que é estranho, mas realmente fui enviado para o Brasil.
- Mas mesmo entendendo os motivos, que por óbvio é o garoto
Marcos, porque o Brasil?! O que o Conselho Supremo está pensando?!
Necessitamos de você aqui na Europa! Afinal quem ficará ao lado de Joana e
a treinará quando chegar a hora? – Bradou o Senhor da Luz demonstrando
somente naquele momento seu total espanto com a revelação do destino de
Damião.
208
Damião olhando bem no fundo dos olhos do Senhor da Luz o qual
parecia já esperar a resposta respondeu sorrindo:
- Muito simples meu amigo, você!
- Como assim eu? Você sabe que eu não posso me expor desta
forma! O que eles têm naquelas cabeças para imporem tal absurdo?!
Damião parou de sorrir, ao perceber o medo tomar conta da
expressão do amigo, o que era coisa rara, aquilo revelava que ele realmente
pressentia o perigo em treinar Joana.
- Mas quem te falou que foi o Conselho Supremo que determinou
que você prepare Joana?
Aquela resposta o pegou de surpresa.
- Como assim? Se não foi o Conselho Supremo então quer dizer
que...
- Isto mesmo. – Respondeu Damião interrompendo-o antes de
terminar de completar seu raciocínio, afinal, mesmo que houvessem tomado o
cuidado de assegurarem que não estavam sendo espionados, tinham que agir
com cautela.
- Mas onde ele está com a cabeça de me incumbir de tamanha
responsabilidade! Creio que se o Conselho Supremo descobrir isto pode até
discutir a sanidade deste membro, porquanto, mesmo sendo muito poderoso,
ao tomar uma decisão desta para não dizer doida é no mínimo arriscada, ao
passo que com está deliberação ele arriscou toda a sua reputação.
- Não vejo como você meu amigo, entendo que você não precisa ser
um doido para ser um gênio, contudo, seu raciocínio lógico e decisões devem
ser um pouco desequilibrados aos olhos dos demais, porquanto, você tem que
pensar e agir diferentemente do dito padrão normal de razão da grande
maioria dos seres para revolucionar o mundo! – Arrebatou Damião, querendo
por fim a discussão.
Naquele momento o Senhor da Luz entendeu porque o Conselho
Supremo e principalmente seu basilar membro havia escolhido Damião para
liderar e acompanhar o nascimento de Joana, e, agora seguir para treinar
Marcos, o qual por ter menos poderes naturais necessitava realmente de uma
ajuda mais profunda.
Ele se mostrava tão preparado e sua resposta foi tão curta, porém,
tão sábia que o deixou sem palavras, afinal, aquilo fazia sentido, já que o
Conselho havia acordado que ninguém poderia interferir no desenvolvimento
de Joana, quando chegasse a hora, outra pessoa não seria melhor do que ele,
que é considerado um ser atípico, tendo em vista que sua maldição fez com
que ele transige-se com naturalidade e perfeição entre o material e imaterial, o
que iria facilitar e muito no treinamento da infante, tendo em vista que ele era
então um ser material...
209
- O papo está muito bom, mas acho que você precisa ir, porquanto,
fiquei sabendo que ainda tem que encontrar uma forma de pegar o navio, e
como não arrumei muita comida acho que terá que se virar na cidade. – Disse
o Senhor da Luz já se virando de costas. Ele não gostava de despedidas, e
não podia deixar transparecer que se importava muito com uma pessoa,
pensava que se assim agisse, perderia sua identidade.
- Que isto meu amigo, fico é muito feliz de você ter me ajudado nesta
hora, pelo menos agora estou quente, e posso chegar à cidade sem parecer
um mendigo, e...
- Olha, tenho que lhe contar que peguei as roupas que achei mais
novas, mas mesmo assim creio que estas não vão servir para que as pessoas
não achem que você é um mendigo! – Interrompeu o Senhor da Luz com
sarcasmo, e desaparecendo sem esperar resposta.
Sei que você não é desta forma meu amigo, a pessoa que lhe deu
um voto de confiança fez de você não apenas um ser melhor, lhe devolveu a
humanidade. - Pensou Damião, já se virando para seguir ao porto, comia uma
maça que encontrou dentro da sacola, e por um momento olhou para suas
vestes, e um pensamento veio imediatamente a sua cabeça, ao passo que
após um raciocínio rápido ele disse para si mesmo:
Ele realmente tem razão, me preocupei tanto em cuidar de meu
interior nesta minha encarnação, que me esqueci de também zelar pelo meu
exterior, estou realmente muito mal vestido...
******
Acalme-se, não quero lhe fazer mal algum! – Nimrod foi categórico,
ao passo que Expedito não se deu por vencido.
- Então porque me atraiu para este local e está falando desta forma,
como se fosse impor que eu usasse o meu exército para ajudar em seu plano
maluco! – Ele respondeu mais não retirando a arma dos punhos.
- Você deve estar louco! Eu estou é lhe dando um voto de confiança.
E sobre o seu exército eu não estou reivindicando ele de volta, porquanto, se
não se esqueceu eu era quem o comandava, e, tenho certeza que pelo menos
metade daqueles homens não pestaneariam em me seguirem.
- Então me diga o que realmente quer! – Expedito estava quase que
mordendo os lábios, realmente a qualquer momento iria atacar, mesmo que
soubesse que iria ser certamente aniquilado, preferia ali morrer do que deixar
que usassem-no para tentar manipular o seu exército.
- Eu necessito de um aliado de confiança junto ao Conselho. –
Nimrod foi mais direto do que Expedito esperava.
- Não entendo. – Ele disse deixando claro que estava confuso, lado
outro, mantendo ainda a formação de combate.
210
- É simples, o Conselho deixou de lutar pela salvação das almas que
aqui estão! Eles oferecem ajuda, contudo, na realidade não resgatam estas
almas como deveriam, olhe você mesmo! – Ele terminou estendendo a mão
direita para que ele olhasse novamente os homens.
Quando Expedito olhou novamente levou um susto enorme...
Todos, exatamente e simplesmente todos os homens e mulheres
que ali se encontravam estavam naquele momento vestidos com trajes rústicos
de guerra, feitos a mão, e, armas mais do que primitivas. Mais o que mais
espantou Expedito foi o fato deles estarem com um joelho dobrado e cabeças
abaixadas, em sinal de prontidão e ao mesmo tempo submissão e inteira
devoção a Nimrod.
Como este louco conseguiu?! Ele formou realmente um exército no
centro deste caos de dimensão, realmente ele não era um homem comum, e,
certamente, possui a alma não de um guerreiro, mais do principal mestre da
guerra... – Expedito pensava ao passo que Nimrod o olhava com um sorriso,
afinal, sabia que o atual chefe do exército supremo dos homens estava
finalmente entendendo suas intenções.
- Venha aqui Sistemak! – Bradou Nimrod sequer virando-se para sua
legião de demônios.
Um dos demônios se levantou, ele era alto e corpulento, tinha a
cabeça grande, cabelos amplos e negros, e o rosto inteiramente queimado,
como se tivesse levado um banho de ácido. Quando se aproximou,
cumprimentou Nimrod em um gesto amistoso, olhando fixamente para
Expedito, que continuou irredutível em abaixar a guarda.
- Sistemak, este é um novo amigo, chamado Expedito, ele é o chefe
do exército supremo dos homens.
- Muito prazer! – O ser estendeu a mão direita para cumprimentá-lo,
ficando literalmente no vácuo, porquanto, Expedito não abaixara ainda a
guarda.
- Desculpe senhor, mais creio que tem algo contra nós que
desconhecemos! – Sistemak disse em tom ainda amistoso, mais ao mesmo
tempo com autoridade.
- Não tenho nada contra vocês, apenas creio que ao invés de
ficarem se rebelando, deveriam aceitar a oferta para retornarem ao caminho da
luz. – Expedito foi categórico.
- Poderíamos até mesmo aceitar, contudo, cremos que igualmente
ao que se encontra ocorrendo nesta dimensão, à terrena encontra-se com leis
falhas. Advindas diretamente dos Criadores, as quais todos aqui não
comungamos, e, portanto, lutaremos até o fim para derrubarmos elas, igual
iremos fazer com Lúcifer...
- Exatamente o que vocês não comungam? – Expedito começou a
articular com mais calma, afinal, até aquele momento todos ali pareciam não
buscar o mal, pelo contrário, davam realmente a entender que queriam lutar
211
por um ideal, o que estava deixando-o de certo modo desconcertado pela
forma que estava se portando.
- Não comungamos pela forma abrupta que ocorre, ou seja, em
termos que nascer na dimensão material passando por fome e privações, ao
passo que, lá enfrentamos todos os tipos de tentações, temos que ver
injustiças, pessoas más enriquecendo, enquanto boas morrem, e, ainda, se
fizermos algo de ruim, alguma escolha infeliz, ou nos rebelarmos, nos jogam
aqui neste local, onde nos tornamos piores ainda. – O sujeito foi claro e direto
ao ponto.
- Contudo, não foram os criadores que impingiram o mal no mundo,
as injustiças estão ali por causa dos homens, se alguém passa fome, isso é
porque outros assim permitem, visto que muitos até mesmo desperdiçam
comida. Lado outro, o sofrimento elevaria a bondade, visto que sentiriam a
presença e elevação de que não somos nada se não ajudarmos ao próximo.
Portanto, ao invés de lutarem para fazer cessar está diferença existente, vocês
fizeram escolhas erradas e agora realmente terão que suportar. Quanto ao
lugar para isso, creio que está dimensão realmente não é a apropriada, e farei
de tudo para que o Conselho mude de ideia e autorize algo.
- Autorizar o que Expedito?! – Nimrod falou com desdém. – Não há
nada o que autorizar. Você melhor do que ninguém é sabedor que o Conselho
tem coisas mais serias para se preocuparem neste momento do que com está
dimensão infernal.
Realmente isso faz sentido, se o Conselho não deliberou sobre as
mudanças nesta dimensão quando tudo estava sob controle, imaginar que iria
fazê-lo agora era algo totalmente inconsequente em se pensar. – Raciocinou
Expedito rapidamente, e logo emendando:
- Mais então o que pretendem?
- Pretendemos utilizar da guerra que será travada na dimensão
material para iniciar a guerra nesta dimensão. – Sistemak disse com firmeza
nas palavras.
- Não entendo ainda. – Expedito já havia compreendido um pouco do
plano, contudo, queria confirmar para ver se aquilo significava realmente o que
ele estava pensando.
- É fácil! Lúcifer e seu exército do mal irão focar todo o seu poder na
guerra que será travada na dimensão material. Assim, quando isso ocorrer ele
deixará este local totalmente vulnerável, visto que é sabedor que nenhuma
alma entrará para tomar o lugar, contudo, não sabe que não haverá entrada,
porquanto, já estaremos aqui. De tal modo, que é somente sair e tomar a
fortaleza. Quando Lúcifer menos esperar ele terá perdido sua dimensão, e, se
vocês souberem lutar na batalha, ele não terá para onde fugir, assim, é
somente matá-lo definitivamente e acabar com seu reinado de terror.
Expedito estava boquiaberto.
Nimrod seu maluco, você é muito mais inteligente do que pensei! –
Ele pensava sorrindo.
212
Vendo que Expedito realmente havia não apenas compreendido o
plano, mais acima disso, gostado Nimrod gritou virando-se para o exército às
suas costas:
- Homens e mulheres, lembrem-se bem do que havia lhes dito, que
meu pai enviaria uma luz! Muitos duvidaram, mais hoje vocês estão vendo que
está luz chegou, estaremos prontos quando for à hora!
Em questão de segundos os demônios começaram a gritar com
alegria, muitos se exaltaram mais do que os outros, e batiam fortemente com a
cabeça ao chão, gritando cada vez mais alto.
Expedito finalmente abaixou a guarda quando viu o que estava a sua
frente, ele ainda não concordava com aquilo, mais tinha que admitir que ver
milhares de demônios seguindo um guerreiro de Luz como Nimrod não era
algo que se via todos os dias.
213
CAPÍTULO 52
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Jesus foi diretamente conversar com Miguel sobre a concepção do
filho das trevas, e articulava ao Arcanjo seu plano...
Miguel não podia acreditar, Jesus era mais forte do que ele poderia
imaginar, quando viu o problema, rapidamente modificou todos os planos, e
agora tudo estava fazendo sentido para ele, Damião não voltou a terra
somente para uma simples missão, ele teria papel crucial neste novo plano de
emergência...
Nisto, Jesus vendo que Miguel estava espantado, lhe chamou
calmamente:
- Miguel... Miguel... – Sacudindo seu ombro.
- Me desculpe Mestre, estava perdido em meu subconsciente... - O
arcanjo saiu de seus pensamentos.
- Deu para perceber! – Jesus falou interrompendo-o não por afoito,
somente queria deixar claro que não estava chamando a sua atenção, até
mesmo entendia a preocupação do Arcanjo com toda a responsabilidade que
havia lhe sido incumbida.
Assim, estampando um sorriso no canto do rosto, ele continuou a
falar:
- Queria lhe parabenizar Miguel! Sempre confio em todos os filhos de
meu pai, mas acreditar em um incondicionalmente é um desafio. Não porque
me falta a capacidade de confiar plenamente, mas porque tendo em vista o
que se encontra em pauta, sei no fundo de meu coração que se ele falhar,
outros irmãos meus vão morrer, isto me deixa extremamente desapontado não
com aquele irmão em quem confiei, mas de mim mesmo, porque se assim
ocorrer é porque coloquei um fardo mais pesado do que você poderia carregar,
e isto seria um erro meu e não seu.
- Não pense assim Mestre, nunca ninguém iria lhe culpar por algo,
ainda mais que o senhor está se sacrificando novamente para salvar a
humanidade. Também tem o fato de que o senhor já fez mais por todos nossos
irmãos do que qualquer outra alma jamais fez. – Miguel falou, colocando suas
enormes e fortes mãos no ombro de Jesus, o qual perto do robusto corpo do
Arcanjo, apesar de ser grande parecia uma criança.
Jesus olhou para ele no fundo dos olhos com um olhar triste, não de
medo, mais de sabedoria, como um professor que sabe que mesmo se
esforçando ao máximo nunca vai dar conta de agradar a todos seus alunos.
- Meu caro Miguel, nossos pais nos deram a vida, o poder de
escolhermos, amor, paciência para nos ensinar, e também para aprendermos
com nossos erros, e mesmo após isto tudo, não há aqueles que teimam em
culpá-los por seus próprios erros que cometeram por vaidade, inveja,
arrogância, e outros que eu poderia passar o dia falando?...
214
Fez uma pausa para que o Arcanjo pudesse processar a pergunta,
mas não o deixou responder, somente queria que ele raciocinasse sobre tudo,
então prosseguiu:
- Então o que te leva a crer que não me culpariam por falhas? Afinal,
todo animal quando se encontra cercado, seu primeiro instinto não é
raciocinar, mais atacar quem quer que seja! Muitas das vezes este ataque é
em quem está mais próximo, neste momento ele ataca seus próprios irmãos! E
a alma dos humanos não se destoa em nenhum momento dos animais, afinal,
todos são e partiram de um mesmo fundamento ou verbo...
Miguel não sabia o que dizer, estava perplexo, em toda a sua
jornada não havia conhecido alguém tão sábio, mas sábio que ainda não tinha
conhecido os outros membros do Conselho Supremo, os quais Jesus falava
sempre demonstrando sua humildade que eram os mais brilhantes seres do
universo, mas isto não retirava o fato de que ele era mais sábio do que ele
poderia imaginar.
Miguel compreendeu a cautela de Jesus, e seus pensamentos não
paravam:
- Ele não tem medo, o que ele faz é agir com prudência porque
mesmo acreditando em seus irmãos incondicionalmente, tem a consciência
que eles poderiam falhar, e se isto ocorresse outros irmãos seus morreriam, é
evidente que tal fato além de entristecê-lo por errar na escolha, o deixaria em
uma situação difícil com outras almas que nele confiaram, as quais poderiam
até mesmo questionar a liderança do Conselho Supremo, o que colocaria em
risco algo que eles lutaram há milênios para conseguir, e assim tudo poderia
estar perdido, afinal, quando não se confia nos líderes, várias pessoas
começam a formar pequenos grupos ou até mesmo mudar de lado, neste
momento acabando a união, consequentemente diminui-se a força, e o inimigo
se arma e pode até mesmo vencer a batalha... – Miguel ainda continuava
perdido em seus pensamentos, e percebendo isto Jesus calmamente o
aguardava, queria que ele raciocinasse sobre todo ocorrido. – E ele ainda esta
certo em dizer que se algumas almas se voltam até mesmo contra os criadores
e dos que estão ao seu lado, porque não se voltariam contra ele, e seus
parceiros, isto é quase lógico! – Pensou Miguel agora arregalando os olhos,
havia concluído a razão de tudo, e isso lhe assustou...
Jesus sorriu de alegria, afinal Miguel finalmente havia entendido a
grande responsabilidade que se encontrava sendo depositada em seus
ombros, e se ele mesmo assim aceitasse prosseguir, não tinha dúvidas, ele
seria o escolhido para comandar o exército celestial na grande batalha...
215
CAPÍTULO 53
Vilarejo na França, 1982
João e as crianças estavam organizando toda a casa, limpavam toda
a sujeira, enquanto Lourdes agora amamentava a pequena Joana no
dormitório.
De repente uma forte luz começou a iluminar todo quarto onde
estavam.
Ao avistarem a claridade que emanava como um farou no meio da
escuridão do mar, João e as crianças se assustaram, temeram que Lourdes e
Joana corressem mais um perigo naquele dia já tumultuado.
De prontidão correram sem sequer raciocinar o que fazer quando ali
chegassem, contudo, ao cruzarem a porta se petrificaram após vislumbrar a
imagem que viram...
Ao lado da cama se encontrava um homem com uma túnica branca,
ele olhava fixamente para a garota, que se contraia esboçando quase que um
sorriso para ele, o que deixou todos perplexos foi o fato de que a forte luz
emanava de todo seu corpo, apesar disso, Lourdes e Joana pareciam não
perceberem a luz, as duas continuavam a sorrir.
- Se afaste de minha esposa e de nossa filha! – Ordenou com voz
firme João após se recuperar do susto, em suas mãos segurava a longa e
pesada espada entregue por Damião, a qual tocava o solo devido ao fato de
que ele não suportava o grande peso dela.
Não sei como Damião naquela idade empunhou está arma com
tanta destreza? – Se questionava em pensamento enquanto aguardava uma
resposta daquele ser.
Ao ouvir João o ser que até aquele momento estava brincando com
a pequenina Joana virou-se.
João que até aquele momento não entendia a alegria de Lourdes
com a figura ao seu lado não pôde conter a emoção, um forte sentimento de
paz e amor invadiu todo seu corpo somente com o olhar daquele homem, e a
luz que iluminava o quarto foi diminuindo aos poucos, até que ele percebeu
que ela atenuava à medida que ele chegava perto deles.
Quando o homem chegou à frente dele e das crianças, ele se
ajoelhou, ao passo que os infantes mesmo sem entenderem o que estava
ocorrendo fizeram o mesmo.
Contudo, em poucos segundo todos estavam novamente em pé,
porquanto, em movimentos rápidos, mas carinhosos o homem os agarrou-os
fortemente pelos braços, içando-os.
- Vocês não têm que se ajoelharem diante de mim! Somos irmãos, e,
portanto, somos todos iguais. Por está e outras razões não devem me
reverenciar, mas aceito um forte abraço.
216
Nisto o homem que ainda segurava os braços de João, o qual foi o
último a ser içado, puxou-o de encontro ao peito, abraçando-o fortemente.
João ficou fascinado... Seu corpo parecia levitar, e seu coração
começou a bater mais forte de emoção.
- Como é linda a criação de nosso pai! – Falou o homem afastandose e olhando para o peito de João, se mostrando fascinado pelo aumento das
batidas de seu coração.
Isto é maravilhoso, até mesmo em uma simples reação de meu
corpo, ele vê uma benção e perfeição da criação divina. – Pensou João
maravilhado.
- A que devemos tanta graça senhor? – Questionou João com a voz
rouca segurando o choro.
- Somente passei aqui para lhes agradecerem pessoalmente por
terem aceitado esta missão sem questionarem, e, ainda, aproveitar para falar
que estarei ao lado de vocês olhando e orando por todos...
O homem fez uma pausa e foi andando novamente em direção à
cama, à medida que se distanciava de João, a luz começava novamente a se
irradiar de seu corpo.
João estava ainda mais fascinado, era tamanho o poder daquele
homem que perto da matéria corpórea ele assumia a feição e matéria de um
humano, e longe ele assumia a feição de um espírito de luz, era um verdadeiro
Deus, tinha enormes poderes, e cumpria a história de que subiu aos céus em
matéria...
Joana começou novamente a se contorcer de alegria quando foi
tocada novamente pelo homem.
- Ela é muito especial, cuidem bem dela. – Disse sorrindo e tocando
com a ponta dos dedos carinhosamente no rosto da pequena.
Neste momento, ele começou a sumir, João e Lourdes ficaram
apavorados, achavam que teriam a chance de conversarem mais com ele, e
de estar pelo menos por mais alguns instantes em sua presença.
- Jesus! Por favor, nos responda algumas perguntas! – Gritou
Lourdes que estava mais próxima quando ele começou a partir.
- Lembram quando vocês questionaram voltarem a terra nesta
missão sem que eu lhes explicasse os reais motivos? – Lourdes e João
abaixaram a cabeça após ouvir o questionamento. – Então, minha resposta
para suas perguntas ainda é a mesma daquela época, a qual insto ecoar para
que se recordem: para todas as perguntas somente obterão respostas quando
chegar o devido tempo. É assim até para os mistérios da existência. –
Respondeu ele abrindo um largo sorriso.
- Mas porque o maior traidor de todos é quem irá nos ajudar? Por
que ele? – Questionou agora João levantando a cabeça, tinha que obter
217
respostas, e, aquela, era definitivamente a pergunta que mais ele ansiava por
retornos, e Jesus sabia respondê-la.
Com mais um sorriso, desta vez demonstrando que não iria
responder muita coisa, Jesus antes de sumir definitivamente falou com uma
voz suave, contudo, firme, como se quisesse deixar claro:
- Não cabe a vocês julgarem ele... E a pergunta é boa “Porque ele
está nos ajudando?”, mas a resposta é ainda melhor, mas vocês somente
saberão no tempo certo. O importante, e a única coisa que devem saber neste
momento, é que ele esta nos ajudando... Até quando? Somente nosso pai
sabe, mais até lá, temos que confiarmos nele como devemos confiar em todos
nossos irmãos, porquanto, por mais que eles nos machuquem sempre serão
parte de nós, e, por isto, merecem uma segunda chance, como nosso pai dá a
cada um de seus filhos sem distinção...
Lourdes começou a chorar, e João abaixou a cabeça demonstrando
novamente vergonha por sua insistência, se emocionaram com as palavras
doces e ao mesmo tempo firmes daquele homem, ele era muito mais do que
um irmão para todos, era um mestre, e, exatamente devido a isso que
seguiriam seu plano até as últimas consequências, não por imposição, mas
definitivamente por amor e confiança em seus ideais...
218
CAPÍTULO 54
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Jesus apareceu subitamente na caverna, e Miguel se sobressaltou,
porquanto, encontrava-se distraído admirando a perfeição daquele local.
- Ainda distraído Miguel? Dei uma volta para que você colocasse os
pensamentos em ordem, e ainda parece estar da mesma forma? – Disse
Jesus com um enorme sorriso ao amigo.
- Não senhor, estava somente pensando como isto pode ser feito, é
maravilhoso, não acha?
Jesus olhou para o ponto em que o Arcanjo estava falando, e após
um longo suspiro respondeu:
- Não existe lugar que seja feio neste universo!
- Me desculpe mestre, mas ouso discordar do senhor, já vi muita
coisa que me faz pensar o contrário. – Miguel rebateu de prontidão, ainda
arregalando os olhos em espanto a tamanha absurdo com a afirmação.
- E o que você exatamente viu de feio Miguel, havia sido deixado
para evoluir, ou havia sido interferido por alguma força?
Miguel ficou a pensar, era estranha aquela observação, mas fazia
sentido, tudo que ele viu de horrível no universo, havia sofrido alguma
mudança externa em sua evolução, do contrário realmente seria linda...
Vendo que o Arcanjo havia compreendido ele emendou antes de
qualquer resposta:
- Sempre temos a sensação Miguel, de que quando olhamos para
algo que não nos agrada, seja visível, ou de qualquer outra forma, que a culpa
seja daquilo a que estamos julgando ser feio, malcheiroso, etc... – Ele fez uma
pausa, olhou para um lindo vaso com plantas, e após calmamente foi
amassando todos os seus galhos.
O Arcanjo somente ficou observando, ao passo que foi surpreendido
com um questionamento de seu interlocutor:
- Porque você não me impediu de fazer isto, ou pelo menos
protestou após eu ter feito?
Miguel ficou sem palavras. E ele prosseguiu em seus ensinamentos:
- Certamente meu caro amigo Arcanjo, se eu tivesse feito à mesma
coisa que fiz com esta inocente planta com uma pessoa, arcanjo, anjo, etc.,
você iria ter outra reação! Não estou certo?
Miguel somente balançou a cabeça em afirmação.
- O problema esta ai meu irmão. Afinal, se não temos o cuidado com
tudo que é vivo, com o tempo passaremos a perder também o cuidado com o
219
resto das criaturas que nos cercam, e em breve, estaremos matando uns aos
outros sem qualquer arrependimento ou peso na consciência.
- Mas esta planta não deve ser comparada a um de nós! – Interveio
Miguel tentando justificar sua omissão.
- Porque não? – Questionou Jesus sem nada responder, somente
querendo analisar até onde Miguel iria tentar justificar sua atitude omissa.
Medindo bem suas palavras o Arcanjo resolveu responder:
- Porque sabemos que ela é um ser inanimado, não tem alma!
Jesus fez cara de espanto com aquela afirmação, não sabia que um
ser tão evoluído como um Arcanjo poderia dizer tamanha barbaridade.
- É ai que você está completamente enganado meu amigo, todos os
seres possuem uma essência do criador, absolutamente todos! – Continuou
respondendo, mas, ao mesmo tempo, foi se levantando indo de encontro ao
Arcanjo e levando em suas mãos o vaso de planta. – E quando eu digo todos,
não são apenas os que estão aqui, mas os que se encontram em outras
dimensões. Porque se existem é por um motivo, e, consequentemente,
devemos cuidar de tudo e de todos.
Quando Jesus chegou bem próximo, levantou o vaso e continuou a
tecer seus ensinamentos:
- Como nos foi ensinado desde o início, os animais, as flores, ou
seja, definitivamente tudo, existem para nos servir. Assim, é permitido
consumi-los para nossas necessidades básicas, somente para isto. De tal
modo que eles nos alimentam e neste processo transmitem-nos suas energias,
portanto, em nenhum momento eles desaparecem quando assim o fazemos,
porque passam a partir de então a fazer parte de nós, e, consequentemente,
de nossa essência. – Ele sorriu ao perceber que o Arcanjo estava entendendo.
– Desta forma, eles não existem para alimentar nosso ódio, eles possuem
feixes de luz, com essência profunda dos pais celestiais.
Miguel ficou fascinado, nunca havia pensado daquela forma.
Agora entendo porque um espírito ou até mesmo Arcanjo ou outro
ser ainda toma água e comia no plano imaterial, mesmo que em menor
quantidade, mas logo foi entendendo, era como se eles retirassem da natureza
mais essência dos criadores, para continuarem a vida eterna, fazendo, assim,
um ciclo da vida gerada pelos criadores que pareciam ter sido espalhada
através da natureza e seus seres que sempre se renovam, nunca acabam, isto
é fato em qualquer dimensão, menos no limbo.
Miguel raciocinava freneticamente.
Ou melhor dizendo, na dimensão do comumente chamado inferno...
Lá sei que a água é suja, e as plantas e seres são medonhos, mas agora
entendo que são assim não porque foram assim criados, mas, simplesmente
porque eles absorveram o que estavam ao seu redor, ou seja, o ódio. Deste
modo, por não receberem nenhum cuidado assim o eram. E, neste ciclo, os
220
seres ali existentes vão aos poucos perdendo a essência dos criadores, se
definhando como figuras humanas e da natureza, e, após permanecerem
muito tempo naquele local estão mais parecendo verdadeiros monstros...
Foi quase terminando seus pensamentos, quando teve uma
conclusão, fazendo se desesperar:
- Espere! – Gritou ele após fazer tal raciocínio, e retornar de seus
pensamentos a realidade!
- Vejo que entendeu o que eu queria lhe ensinar meu filho. Se na
dimensão material, precisamente na terra que é um dos berços de raças
menos civilizada, e, assim, que mais necessita de nossa ajuda continuarem
destruindo a natureza, e achando que ela não tem importância, teremos há
longo prazo um verdadeiro inferno naquele paraíso. E, de tal modo, sem
essência dos criadores saudável, seus corpos evoluirão para seres sem a
devida e necessária fonte de renovação celestial, tornando-se, mais cedo ou
mais tarde, verdadeiros monstros, o que influenciará em seus espíritos, e,
assim, neste ciclo, no grau de evolução. – Ele suspirou profundamente,
demonstrando sua tristeza com aquela realidade. – Razão pela qual, estes
meus amigos de todo reino animal, etc., que acabei de enviar para a terra
quando vocês chegaram são de vital importância, porquanto, são capazes de
mudar o rumo da vida naquela dimensão, afinal, eles são a vida em sua mais
nobre essência. E depois os encarnados dizem que Deus não está entre eles,
o maior absurdo que dizem, porquanto, ele ou eles estão em tudo, razão pela
qual, tudo veem e escutam...
- Sim mestre, sim... – Disse Miguel demonstrando que havia
entendido tudo como um bom aluno.
Jesus parou e ficou olhando firmemente para os olhos do Arcanjo, o
qual por respeito em nenhum momento desviou o olhar.
- Entrei neste assunto, porque precisava que você entende-se tudo
isto antes de lhe dizer o que Buda descobriu sobre os planos de Lúcifer...
Após dizer isto, passou as mãos sobre o vaso de planta, ao passo
que ela murchou completamente, como se estivesse morta, mas em segundos
começou a brotar outros galhos, e ela voltou à vida como em um passe de
mágica.
Ao ver a fascinação de Miguel Jesus disse antes que ele fizesse a
pergunta óbvia que já ensaiava fazer:
- Não usei nenhum poder mágico meu caro para curá-la, apenas um
pequeno e sutil poder de acelerar o que mais cedo ou mais tarde ocorreria...
Isto porque a vida não é retirada de nada e nem de ninguém facilmente, tendo
em vista que antes disso a essência dos criadores luta de todas as formas
para retornar a sua existência, e a natureza é um dos melhores exemplos
deste fato, uma vez que, por mais que os homens e outros seres a destruam,
basta um pouco de tempo para que ela retorne novamente a vida plena.
Assim, reafirmo o absurdo praticado por alguns que acreditam veementemente
que o pai celestial ainda não estão em nossa presença.
221
Miguel sorriu, estava fascinado, ficaria durante tempos escutando
aquele homem e absorvendo um pouco de sua sabedoria, contudo, sabia que
não tinha muito tempo, tendo em vista a velocidade que tudo estava
acontecendo, em breve a guerra estaria presente, e, assim, ele temia pela
primeira vez não ser capaz de aguentar tamanha responsabilidade que lhe
estava sendo incumbida.
******
Expedito estava agora andando no meio dos demônios, muitos o
cumprimentavam com alegria. Ele não escondia o temor que exalava de seus
olhos, afinal, mesmo sabendo dos planos, sempre lutou contra demônios,
nunca em seus mais absurdos devaneios poderia um dia imaginar estarem
comungando de um ideal comum.
Ao chegarem a uma grande mesa, Sistemak puxou uma cadeira
fazendo sinal para que Expedito se sentasse, e mais uma vez o Santo
guerreiro se espantou com a bondade do demônio que ao que tudo indicava,
era o braço direito de Nimrod.
Após se sentar, ele foi logo dizendo o que estava ainda lhe afligindo:
- Tudo bem Nimrod, mais quando iremos buscar o objeto que
necessito?
- Buscar para que, ele esta aqui!
Sua resposta espontou ainda mais Expedito que ficou olhando como
que dizendo que não estava entendendo nada.
- Sistemak, vá buscar a caixa que entreguei para os homens do
Conselho quando aqui cheguei. – Ele determinou e o parrudo demônio girou
indo rapidamente cumprir a ordem.
- Mais você não disse que havia escondido no castelo de Lúcifer?! –
Expedito dizia cochichando. – E o que é este tal de Conselho?
- Disse aquilo, porquanto, do contrário você nunca iria me seguir. E
sobre o Conselho, ele é formado pelos homens que me salvaram quando aqui
cheguei, e de mais alguns que mostraram sua devoção no passar do tempo.
Todos nesta sala, e, ainda, os espiões que estão lá fora vagando, podem dele
fazer parte, basta merecer.
- Quer dizer então que você abriu mão do Conselho Supremo para
fazer um Conselho Demoníaco?
Ao dizer isso alguns demônios próximos, os quais pareciam não
estarem prestando atenção na conversa fulminaram Expedito com olhares
tenebrosos, que o fizeram estremecer, principalmente, uma mulher que tinha a
face linda, contudo, sua cabeça estava rachada ao meio, como se tivesse sido
golpeada com um machado, que além do olhar bradou:
222
- Pois saiba que para um espírito dito de luz, você esta se mostrando
muito insensato, porquanto, faz mal julgamento de seus irmãos, que é o que
realmente somos, iguais. Assim, ao invés de julgar deveria era tentar ajudarnos.
- Me desculpe, não estou fazendo mal juízo, e sempre estive aberto
para ajudar meus irmãos, contudo, somente aqueles que realmente querem
ser ajudados! – Expedito respondeu querendo transparecer que não tinha
medo de nenhum deles, e, que mesmo concordando em parte, ainda não
estava cem por cento satisfeito.
- Acalmem-se! – ordenou Nimrod. – Ele está ainda se acostumando
com a ideia, não podemos forçá-lo a gostar de vocês que até minutos atrás ele
entendia serem o verdadeiro inimigo.
Após ouvirem isso os demônios se afastaram com a cabeça
abaixada em sinal de respeito ao chefe. Menos a mulher que ainda continuava
encarando-o.
- Você não escutou Dulce! – Nimrod foi mais categórico.
- Escutei chefe, e irei como sempre respeitá-lo. Contudo, quero
apenas dizer Expedito, que ainda irei salvar sua vida! E quando isso ocorrer,
você terá que dormir com este pensamento para sempre.
- Quando este dia chegar, não apenas aceitarei este pensamento,
como irei lutar com unhas e dentes para fazê-la retirar todo este ódio que lhe
consome, e voltá-la para o caminho correto da luz! – A resposta foi igualmente
cortante.
Dulce se retirou de perto de mesa, agora não olhando mais para
nenhum dos dois.
- Fique tranquilo Expedito, eles são boas pessoas, somente
possuem ódio. – Tentou dialogar Nimrod.
- E você fala isso como se não fosse nada! – Expedito respondeu em
tom e expressão facial de sarcasmo.
- Creio que não, e, até mesmo utilizo deste ódio!
- Utilizasse deste ódio, como? – Ele se interessou deixando o
sarcasmo de lado e falando agora seriamente.
- Se sabe muito bem, em uma batalha muito ódio cega. Contudo, na
dose certa é um incentivo. Assim, eu doutrino eles retirando apenas o que
transborda, deixando sempre um pouco para esquentar as coisas!... – Ele
respondeu com uma expressão sinistra.
Neste momento Sistemak retornou trazendo uma grande caixa,
entregando-a para Nimrod dizendo:
- Aqui está chefe!
223
- Você deixou um dos objetos mais sagrados em todo o universo nas
mãos de demônios que você julgou confiáveis! – Expedito disse demonstrando
sua indignação.
Contudo, não esperava pela reação de Nimrod, o qual até aquele
momento estava muito calmo, lado outro, tudo se modificou. Inesperadamente,
ele bateu na mesa gritando:
- Pois saiba que confio mais nestes homens do que em todo aquele
Conselho hipócrita! Eles me salvaram, me deram a mão quando precisava,
sempre estiveram ao meu lado, não por interesse, porquanto, aqui não há no
que se interessar realmente, visto que somente há sofrimento e dor. Agora
creio que já admiti você zombar demais destes meus irmãos!
- Me desculpe, não quis ofender. – Expedito disse abaixando a
cabeça.
- Pegue! Leve o objeto e diga ao Conselho que conseguiu-o, mais
que eu não voltarei. Além disso, não conte nada do que conversamos aqui.
Estamos entendidos! – Ao final ele novamente gritou.
- Sim, estamos. – Ele respondeu já pegando a caixa e começando a
desaparecer. – Manterei contato.
- Espero Expedito, Espero... – Nimrod respondeu não olhando para
ele, mais para o chão, como se aquela atitude fosse a mais difícil que tomou
nos últimos tempos.
224
CAPÍTULO 55
Londres, Inglaterra, 1982
Nas semanas que se passaram os agentes treinaram duro com o
armamento desenvolvido pela Dra. Kim, e o treinamento era incessante, já que
a mesma falava que em breve eles sairiam em uma missão com Arthur.
O que mais intrigava Charles era que além de bombas e outros
apetrechos, quase todos possuíam alguma coisa com água, nas metralhadoras
e outras armas, todas possuíam um dispositivo acoplado de lançamento desta
espécie de água.
Para os agentes ela dizia que ali seria colocado um líquido altamente
corrosivo, mas nos dias que se passaram ele percebeu que ela tinha estas
águas guardadas em um tonel muito estranho, com várias cruzes afixadas na
sua parte externa.
Contudo, já conhecendo seu lugar Charles resolveu que era melhor
não entrar em questionamentos, afinal, queria manter o bom convívio com a
pequena mais grandemente geniosa mulher.
Ele também percebeu que além do estranho tonel, às armas tinham
dispositivos estranhos, e, ainda, havia nas mesmas alguns símbolos em forma
de hologramas em algumas partes de madeiras que seria até mesmo
desnecessárias em razão da tecnologia que estava ali empregada naqueles
objetos.
Ou a Doutora é muito religiosa, ou ficou biruta de colocar e portar
tantas coisas estranhas assim. – Pensou ele sorrindo ao analisar uma espécie
de bumerangue que os agentes estavam recebendo as instruções, as armas
de grosso calibre como rifles e metralhadoras era acopladas e tinham tais
hologramas místicos, mais o bumerangue eram normais, mais poderiam
modificar-se abrindo uma nova aba, virando uma espécie de estrela ninja com
água em seu interior, e, ainda, tinha os mesmos hologramas com símbolos
diversos, e pequenas esferas junto à água de seu interior, pelas explicações,
parece que a mesma retorna para o lançador caso não atinja seu verdadeiro
alvo, mas explode se o acerta.
225
CAPÍTULO 56
Vilarejo na França, 1982
Damião andava a passos largos, sabia que tinha que chegar ao
porto rápido, afinal, não sabia sequer o horário que o navio iria zarpar.
De repente outro problema lhe ocorreu, olhou no interior da bolsa e
percebeu o óbvio, não tinha sequer uma moeda para pagar pela viagem.
Afinal, como o Senhor da Luz tinha lhe dito, ele realmente não era apegado
pelo material, assim, durante todos os anos nunca guardou qualquer quantia, o
que sobrava ele doava aos pobres, e quando lhe faltou comida um amigo
sempre aparecia com um banquete em agradecimento a alguma caridade que
ele fez no passado, sabia que a lei era uma só, colhia a cada dia o que
plantava no passado.
Mas será que terei algum amigo ou conhecido para me ajudar no
porto? – Pensou.
Como em um passe de mágica uma voz lhe respondeu em seu
subconsciente, ele nunca soube diferenciar o que era provindo de seu
raciocínio, ou de um amigo em um plano maior, mas na maioria das vezes o
que ele ouvia ou raciocinava sempre lhe dava muito conforto como neste
momento:
- “Não temas, para tudo há um tempo, e, portanto, em seu tempo
terás sua passagem.”.
Ele sorriu, estava cansado e a caminhada ainda era longa, ainda
tendo que aguentar a fome devido ao fato de que a comida já havia acabado,
mas sabia lá no fundo que estava sendo guiado, como sempre o foi em toda a
sua longa existência.
226
CAPÍTULO 57
Berlim – Alemanha, 1982
O pai de Estela já havia pensado em tudo para ela não questionar
mais sobre aquela noite...
No dia seguinte, quando Estela acordou, já estava sentada no sofá
da sala de estar. Seu corpo estava limpo e vestia um lindo vestido azul.
Ela não entendia como aquilo lhe parecia tão normal depois da noite
pela qual passou, e, também, definitivamente não estava entendendo como foi
parar naquele local.
Assim que abriu os olhos, viu seu pai se aproximar com uma
bandeja de café com bolinhos, quando o viu se sobressaltou, era como se
tivesse visto um estranho. Pensou melhor, então descobriu que um estranho
não lhe seria tão repugnante, ela o via realmente como um monstro.
Verdadeiramente aquele sentimento ainda lhe afligia, ela havia visto
na noite anterior os olhos passiveis de seu pai que nada fez para lhe ajudar,
isto a fez até mesmo duvidar que aquele homem realmente fosse seu pai...
O pai de Estela parou de repente ao perceber nos olhos da filha seu
medo, e para espanto dela ele somente questionou de uma forma mansa e
pacífica, como se nada houvesse ocorrido:
- O que aconteceu minha filha? Porque a cara de assustada?
Estela não podia acreditar.
O que ele está dizendo? – Pensou.
E seus pensamentos prosseguiram de uma maneira frenética,
enquanto seu pai aguardava com olhar demonstrando paciência e serenidade:
Ele não pode falar que não era ele! Eu o vi. Era realmente ele. E não
tem desculpas para aquilo. É absolutamente inexplicável para qualquer ser,
ainda mais um pai abandonar a filha como ele o fez.
Percebendo que aquele estado de espanto e perplexidade não iria
passar, Pierre resolveu intervir:
- Filha... Não estou entendendo o que está acontecendo?
- Eu é que não estou entendendo o que o senhor permitiu que
fizessem comigo na noite passada! – Gritou Estela com todas suas forças
demonstrando sua total e absoluta indignação.
Muito calmamente, o pai de Estela foi se aproximando, colocou a
bandeja em uma mesinha próxima à poltrona, e quando chegou bem próximo
falou ainda serenamente:
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- Filha, você deve ter tido algum pesadelo!
Ele com a paciência de um advogado criminalista em um júri fez
ainda uma cara de espanto chegando ainda mais próximo da mesma, pôs as
mãos em seu ombro com carinho dizendo com a mesma voz abranda:
– Encontramos
ensanguentada...
você
caída
em
baixo
das
escadas
toda
Ele fez uma pausa abaixando a cabeça como que demonstrando
preocupação, para ele aquilo era fácil, afinal, atuava quase que semanalmente,
por óbvio não em frente a uma garota inocente, mas de um Júri formado por
pessoas inteligentes o bastante para captar o menor sinal de mentira. E, ao
perceber que a filha nada respondeu, prosseguiu:
– Ainda não sabemos como foi parar lá, mas já analisamos as
câmeras de segurança e conferimos que ninguém entrou na casa. Além disso,
todo o sistema de alarme estava ligado, e até mesmo as câmeras da rua não
captaram nada de estranho, somente você indo correndo em direção as
escadas e caindo...
Estela ficou pasma, ou o seu pai havia melhorado extremamente sua
qualidade de enrolar os outros, ou ela realmente tinha tido um pesadelo
horrível...
- Mas... Era tão real!... – Ela exclamou com a voz custando a sair.
- Sei que deve ter acontecido algo muito forte durante o sonho.
Contudo, ainda não entendo como você conseguiu se locomover até a escada.
– Ele respondeu agora com um olhar de dúvida, que intrigavam ainda mais a
pobre Estela.
Ela então se lembrou da dor que sentira em todo seu corpo durante
o suposto “pesadelo”.
Se senti dor, é porque tenho controle sobre meu corpo novamente! –
Pensou já olhando para seus pés.
Em poucos segundos um sentimento lhe tomou todo o seu ser, não
podia acreditar, seus dedos estavam se mexendo...
Pierre ao ver a cena, pulou para trás fingindo espanto, após ainda
dissimulou um sorriso de alegria com uma expressão quase que de pasmo.
Foi então que Estela percebeu o quanto estava apreensiva na
conversa com seu pai, visto que somente agora sentia todo seu corpo doer,
mais parecia que isto não lhe incomodava, há anos não sentia qualquer dor,
isto era como se estivesse recebendo uma benção, ou poderia significar outras
coisas...
228
Após alguns segundos contemplando os dedos, ela resolveu arriscar
uma tentativa de se levantar, o pai ainda demonstrando surpresa e alegria a
ajudou apoiando-a pelo ombro, e ela após anos ficou de pé.
Apesar de moça ela naquele momento mais parecia uma criança
aprendendo a andar, para seu espanto suas pernas estavam fortes e
saudáveis, ela somente estava andando devagar porque havia perdido a
prática, mas era como se tivesse sido curada por milagre, afinal, durante tantos
anos em uma cama, era para suas pernas estarem ao menos atrofiadas, mas
nada, parecia que ela nunca havia deixado de andar.
- Mais pai, isto é um milagre! – Estela falou entusiasmada.
Pierre ao ouvir a palavra milagre se estremeceu, e somente assentiu
com a cabeça, não escondendo um choro repentino, soltou o ombro da filha e
se sentou novamente em sua poltrona favorita, aquela que lhe confortou em
tantas magoas e agora que poderia lhe confortar na alegria que achava que iria
sentir ao ver sua filha andar novamente, mas o sentimento era outro: culpa.
O que fiz! – Pensou ele levando as mãos ao rosto em completo
pânico.
Estela vendo a reação do pai, e, enfim em pé com suas próprias
forças e solta a própria sorte naquela que mais parecia sua primeira caminhada
da vida, foi arrastando os pés e aos tropicões chegou até seu genitor. E, em
uma narrativa abafada questionou tentando segurar o choro:
- Pai! O que está acontecendo com o senhor? Parece que não
compartilha de minha felicidade.
O Pai sabia que não poderia consertar sua decisão, então afastou
sua aparência de medo e culpa, retirou as mãos do rosto e respondeu-a
tentando esboçar um sorriso:
- Alegria minha filha... Somente alegria... – Retornou às mãos a face
agora para enxugar as lágrimas. – Tenho que me recompor! – Completou
secamente.
E para novo espanto de Estela além de não olhá-la nos olhos, ele
saiu quase que correndo em direção ao corredor central da grande mansão,
seus passos ecoaram por um longo período na memória de Estela, era como
se ele estivesse a abandonando em seu momento de maior alegria.
Igualmente ele fez ontem... – Ela raciocinou não se dando por
vencida.
Estela cansada devido aos seus primeiros passos em anos girou seu
corpo para sentar-se na poltrona em que momentos antes aos prantos seu
genitor sentava-se.
Contudo, quando já estava para abaixar-se, viu algo cair do meio de
suas pernas no chão, ao olhar do que se tratava foi tomada por um assombro
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que fez seu corpo congelar, colocou a mão entre às pernas e ao analisar o
liquido somente teve forças para exclamar:
- Isto é realmente sangue...
Nisto levantou-se rapidamente da poltrona e ergueu a aba do
vestido, e viu que sua calcinha estava encharcada do líquido.
Neste mesmo momento Vilauba, sua cuidadora desde o acidente, e,
por ela considerada como uma segunda mãe abriu à porta principal da
mansão, pensando em como estaria sua menina, quando a senhora afastou
seus pensamentos e dúvidas pôde ver toda a cena a sua frente, e somente
teve tempo de gritar:
- Minha filha, o que está acontecendo? – Lançando ao seu encontro
para ajudá-la, não parando de falar em total desespero. - Estelinha, o que está
acontecendo? Você esta andando! E o que é que aconteceu para ter tanto
sangue em suas vestes?
Estela não podia responder, estava novamente paralisada, mais
agora somente por sua consciência, que não queria acreditar que aquele
pesadelo realmente tinha acontecido...
Nisto, em um movimento rápido, levantou as mangas compridas do
vestido, deixando a mostra seus braços, e, ficou gélida...
Com certeza o sangramento em sua vulva poderia ser explicado
pela queda, mais aquilo que estava vendo naquele momento com certeza
não...
Em seus braços estavam vários hematomas evidenciando machas
roxas, que deixavam bem a mostra não simples contusões de pancada, mas de
dedos, no mesmo local em que ali pegou o monstro que a segurava em seu
suposto pesadelo induzido por seu pai minutos atrás...
A empregada que agora dava alguns passos para trás de espanto
parou, e Estela somente conseguiu pronunciar:
- Aquilo realmente não foi um pesadelo. Foi real! E meu pai sabe de
algo que não quer me contar... Tudo agora se encaixa, a sua folga repentina
ontem Vilauba, aliado ao fato da mansão vazia sem nenhuma das enfermeiras
noturnas, tudo, absolutamente e espantosamente tudo se encaixa...
230
CAPÍTULO 58
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Após deixar o vaso de planta encima de uma mesinha de pedra,
Jesus ficou em frente a Miguel.
- Meu amigo, sei que o que lhe pedirei agora será de uma
responsabilidade muito grande, mas quero que saiba que não deverá tirar os
olhos de sua arma celestial, afinal, creio que Lúcifer tem algum plano para
estas armas, e, quero que oriente Gabriel e os outros disto, por evidente, sem
alarmá-los.
- Sim mestre. Mas o que o senhor acha que ele poderia querer com
elas, afinal, conforme já é sabido e consabido, elas sequer responderiam a ele
ou algum ser perdido nas trevas!
- Mas quem disse que creio que seja ele ou algum de seus
discípulos que poderia utilizá-las... – Respondeu deixando suas palavras se
perderem, demonstrando que não iria dar mais detalhes.
Miguel se intrigou, agora estava com um frio em seu ser que lhe
afligia.
Será que ele quis dizer que... – Pensou se esfriando ainda mais.
231
CAPÍTULO 59
Berlim - Alemanha, 1982
Estela andava perfeitamente, e com sua fúria era capaz de muitas
outras coisas...
- Estelinha! Estelinha! Por favor, pare! Você está sangrando muito,
volte que vou chamar uma ambulância para levá-la ao médico! – Clamava
Vilauba correndo em seu encalço, já suando devido à idade avançada e a
imprecisão de seu físico, que exibia uma enorme e saliente gordura.
Antes de entrar no escritório Estela virou-se dizendo de uma forma
que Vilalba nunca havia presenciado, era como se ela estivesse possuída por
um demônio, ela somente teceu ordens:
- Gosto de você como uma mãe. Então faça somente o que creio
que uma mãe faria neste momento, não tente me impedir, somente chame o
médico da família, e quando ele chegar já terei obtido minhas respostas. – E
antes que a empregada pudesse abrir a boca a jovem entrou no escritório
batendo fortemente a porta.
Adentrou ao escritório da mansão pisando forte, não porque estava
se acostumando a sensação, mas porque imaginava que aqueles passos
poderiam estar sendo na cara de seu pai.
Viu somente a cabeça dele, o qual estava sentado em uma poltrona,
lendo jornal, como fazia todas as manhãs, mas naquele dia tal atitude era mais
do que suspeita, ou seria normal um ser humano que após descobrir que sua
filha estava andando se recostaria em uma poltrona em seu escritório para ler
jornal?!
- Pai! – Gritou, ao passo que com o grito ele foi obrigado a abaixar o
jornal e mostrar que ainda estava chorando.
Contudo, seu choro não a interessava, afinal, ela sabia ser o mesmo
de culpa, então lançou diretamente a pergunta:
- Eu dormi na sala está noite? Ou após cair da escada você me deu
um banho, me vestiu um lindo vestido e me colocou no sofá ao invés de me
levar ao hospital? E como explicar eu estar sangrando na vagina e com marcas
de dedos em meus braços? – Seus questionamentos soavam mais como um
desafio e ao mesmo tempo um desabafo do que como simples perguntas.
Seu pai por outro lado mostrando todo seu temperamento frio que
adquiriu em tantos anos de advocacia criminal, somente levantou a mão
fazendo sinal para ela aguardar alguns minutos, como se estivesse muito
ocupado em meio a um importante raciocínio sobre a última notícia que lera no
jornal que agora jazia em seu colo.
Estela se assustou com o comportamento frio, como se nada
houvesse ocorrido, e mesmo percebendo seus olhos marejados de choro,
232
decidiu aguardar, afinal, sabia que se o pressionasse muito ela certamente
nada obteria.
Após alguns minutos, o pai de Estela retirou os olhos do jornal ainda
sobre seu colo, olhou calmamente para a filha dizendo:
- Sim minha filha, o que quer me falar? Acho que já conversamos na
sala, e devido a forte emoção já lhe disse que precisava de um tempo para
assimilar todo o ocorrido.
- Você precisa de tempo para assimilar o ocorrido?! Será que na
realidade não está é tentando me evitar? – Seus dentes estrilavam
demonstrando seu ódio.
- Não sei aonde quer chegar com este seu tom de voz, mas somente
vou lhe responder que não fiquei na sala porque achei que você também
precisava de um tempo sozinha, afinal, os acontecimentos após sua queda
foram dramáticos. – Respondeu em um tom muito calmo, o qual soou muito
mais equilibrado do que Estela poderia imaginar.
Contudo, Pierre não conseguiu esconder seu nervosismo interno,
porquanto, Estela pôde ver que de sua testa escorria suor, e ela mais do que
sabia que quando ele ficava nervoso ou com remorso aquilo ocorria, mesmo
que até seus olhos não lhe entregassem, o suor era inevitável.
Ela sabia deste fato da pior maneira, tendo em vista que foram anos
vendo sua mãe ser enganada, ele havia feito isto não apenas uma ou duas
vezes, mas várias, definitivamente não tinha escapatória...
Após tal percepção, ela se dirigiu até a estante de livros e começou
a analisar alguns volumes, tentando também demonstrar que não estava
apavorada, mesmo que embaixo de seu vestido estivesse ensopada de sangue
sabia que tinha que se manter firme, porquanto, necessitava mais de respostas
naquele momento do que de um médico, e, ainda, sabia que para obter alguma
resposta teria que jogar o jogo que seu pai estava propondo.
Após alguns minutos de puro silêncio ela resolveu rompê-lo:
- Então papai, quer dizer que acredita mesmo que eu recuperei
todos os meus movimentos por um milagre Divino?
- Há outra explicação então? – Replicou o pai, em um tom desta vez
ameaçador.
- Não sei papai... Pensei muito nisto, e devido a noite de sofrimento
e aos fatos que temo que realmente presenciei, acho que tudo isto pode estar
ligado a seu surpreendente e repentino sucesso no mundo jurídico.
Estela fez uma pequena pausa, somente observando seu pai, e pelo
seu silêncio soube que estava no caminho certo, então continuou:
233
– Até os jornalistas acharam estranho um simples e humilde
advogado vindo da França de uma ora para outra ser um dos mais requisitados
na área criminal de toda Alemanha, e com cem por cento de aproveitamento
em todos os casos, até naqueles considerados perdidos...
Neste momento Pierre interveio:
- Não fale comigo desta forma, parece até sua mãe! Sempre me
criticando! Se não ganho dinheiro é porque não estava me arriscando! Se
ganho, é porque estou fazendo coisa errada! Isto é patético.
Após esbravejar, ele se levantou, mais em nenhum momento olhou
no rosto de Estela, e, ela sendo muito inteligente, logo percebeu que havia
tocado no ponto crucial para se chegar às respostas que ansiava...
- Papai, se o senhor não soubesse realmente o que me fez
recuperar os movimentos, será que não teria me levado ao médico ontem à
noite quando me socorreu?
Aquilo pegou o pai de surpresa, não havia atentado para este fato.
Estava tão apavorado que realmente nem percebeu que sequer havia ligado
para o médico, soava mesmo mais que estranho, era como se realmente
soubesse o motivo da recuperação dos movimentos, buscou então uma
resposta rápida em sua conturbada mente:
- Acho que você tem que voltar a ter suas reponsabilidades agora
que voltou a ter seus movimentos, achei que você iria preferir contar
pessoalmente ao médico o que aconteceu, por isto eu te limpei pessoalmente,
vesti e te coloquei no sofá, e apesar de desacordada, não parecia estar
sofrendo de nada grave.
A resposta não era nada convincente, mas Estela decidiu deixar
aquele desagradável interrogatório para outra hora, necessitava realmente ligar
para seu médico, tudo estava muito estranho, e ela não aquentava mais de
tanta dor na vagina e o sangue já estava escorrendo por suas pernas, ela podia
senti-lo nos dedos dos pés...
Para sorte de Estela Vilalba já havia conseguido contato com o
médico da família, o qual quase morreu de susto ao ser informado do ocorrido.
Então em um movimento rápido ela saiu do escritório sem se
despedir, simplesmente batendo a porta, tinha que ir rápido para o quarto
tomar um banho, mesmo com todo o ocorrido estava emocionada, afinal, há
quanto tempo não fazia isto sozinha.
Contudo, estava ainda com muito medo, mas no seu interior ainda o
maior sentimento era de alívio pela recuperação dos movimentos, mal sabendo
que lá dentro existia outra coisa...
234
CAPÍTULO 60
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Mas mestre, porque pensa desta forma? – Questionou Miguel
tentando mesmo que em vão obter alguma resposta após os pensamentos
anteriores quase lhe consumirem pela aflição.
- Como você sabe meu amigo, não falo diretamente, penso que cada
um tem que encontrar aquela resposta que melhor lhe conforte. Tem ainda o
fato de que posso estar errado, assim, somente necessito que por ora você
regresse para o plano material e leve uma mensagem.
- Mas e se me procurarem aqui?
- Não tenha medo, já estou cuidando junto ao Conselho de todos os
assuntos pendentes. – Fez uma pausa olhando fixamente para os olhos do
Arcanjo. – E por falar em assunto pendente, a mensagem é para ele mesmo...
- Pode deixar mestre, vou lhe entregar pessoalmente, e me
certificarei que ninguém irá me ver.
- Te ver não é o problema meu caro, o que me preocupa é
raciocinarem, afinal, muitos veem as coisas, mas não retiram qualquer
conclusão ou raciocínio para o bem, sempre as conclusões são precipitadas, e,
assim, o mundo é esmagado pela total ignorância...
- Após eu retornarei para demais atos que deverei tomar. – Falou o
Arcanjo já se virando e abrindo suas longas asas para sair do local pela
redoma do teto, afinal, não precisaria agora utilizar o outro caminho que havia
chegado com Damião.
- Espere! – Ordenou Jesus, ao passo que o Arcanjo se virou
novamente assustado. – Estarei em uma reunião com o Conselho daqui a
pouco, caso chegue e perceba que se encontra muito tumultuada não se
aproxime, aguarde terminar.
- Certo senhor. – Respondeu o Arcanjo como um soldado quando
recebia uma ordem, batendo suas enormes asas e em questão de segundos
havia rompido a barreira dimensional.
Estes novos poderes de Miguel podem atrair muita inveja, vou ter
que falar para ele para maneirar quando estiver na presença de outros. –
Pensou Jesus sorrindo.
235
CAPÍTULO 61
Berlim - Alemanha, 1982
Ao sair Estela deixou para trás um homem arrasado, ele somente
colocou as duas mãos na cabeça, tendo tempo para dizer com voz baixa e
demonstrando sua derrota:
- O que foi que eu fiz?! Desta vez eu fui além de todos os meus
limites. Ainda bem que ela não tem a consciência que não apenas o que é
Divino é que é capaz de fazer milagres...
De repente ele se esfriou após raciocinar um pouco.
– Não?! Ela sabe disto, afinal, ela jogou isto na minha cara ao dizer
sobre minha ascensão profissional e consequentemente financeira meteórica,
e, da mesma forma por outro lado meu decesso familiar. Estou literalmente
perdido...
236
CAPÍTULO 62
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Havia na dimensão sublime várias coisas que os espíritos evoluídos
poderiam se ocupar, tudo no objetivo de ajudarem na vida terrena ou espiritual.
Ou seja, tanto material quanto imaterial, desde grandes feitos até
simples melhorias ou lazeres na própria vida nas várias dimensões existentes.
Assim, devido ao fato de na dimensão sublime encontrar-se a
grande maioria dos seres evoluídos do universo que se tinha conhecimento em
todas às dimensões de evolução, era certo que ninguém ali ficava parado,
todos estavam sempre tentando evoluir ainda mais, mormente, os membros do
Conselho Supremo.
Para uma melhor divisão de tarefas, e, até mesmo para colocar um
pouco de ordem, o Conselho deliberou que o melhor seria dividir em núcleos
as funções ou afazeres, e, assim, se formaram núcleos de ciência, física,
matemática, humanas e espirituais, etc., os quais reuniam os espíritos mais
evoluídos em cada área, e afins.
Contudo, um impasse afligia todos os núcleos, principalmente, o de
ciência e física com o de filosofia, porquanto, o Conselho havia iniciado uma
deliberação entre todos os seus membros se poderiam criar novas armas para
serem utilizadas na guerra que estava por vir.
Jesus já havia deixado Miguel partir para sua missão de entregar a
mensagem no plano material, e encontrava-se sentado junto a Buda na grande
mesa.
Referida deliberação se tornou imprescindível após espiões
celestiais tomarem conhecimento que Lúcifer estava organizando uma espécie
de arma letal, o que gerou um grande pânico em todos os membros do
Conselho, principalmente, em alguns entes que dele não faziam parte, mas
que tinham grande poder.
Alguns membros do Conselho, mormente, os das áreas de filosofia e
materiais e imateriais, estas duas últimas que na terra recebem o nome, tão
somente, de humanas, haviam aberto uma discussão que alçou várias
contendas em todas as bases.
A celeuma levantada era de simples compreensão, porém,
certamente de consequências que até então não haviam sido cogitadas em
ordem tão vasta, o questionamento consistia simplesmente em uma
deliberação alçada por ninguém menos do que o espírito do famoso filósofo
que respondia por Platão, assim, asseverou se levantando na grande mesa do
Conselho:
- Solicito renovadas venias aos meus nobres colegas que possuem
pensamentos destoantes aos meus e dos membros de nosso núcleo de
filosofia e afins, mas diante de análises de nossos próprios ensinamentos e
razões racionais que seguimos pautados no amor incondicional ao próximo,
podemos concluir que se a alma é algo sagrado, parte que até onde
237
conhecemos é a principal fonte de contato direto com a mais maravilhosa
criação dos denominados Criadores, e, ainda, levando-se em conta que
trabalhamos com os ensinamentos que todos os filhos merecem ter a
oportunidade de se redimir, como explicar criar armas para destruir nossos
irmãos?!
Após finalizar um imenso burburinho se formou, todos conversavam
entre si, e a imensa mesa que se estendia por quilômetros parecia estar
pequena para tantos questionamentos que se formaram.
Percebendo
que
a
discussão
estava
tomando
rumos
desconcertantes, porquanto, os membros do núcleo de guerra, os quais não
gostavam muito dos seus irmãos do núcleo de filosofia, principalmente,
porquanto, tinham convicção de que enquanto eles lutavam na guerra
arriscando suas vidas mortais quando encarnados e imortais quando a guerra
era imaterial, os filósofos e grupos afins ficavam apenas contando histórias e
pensando em hipóteses e mais hipóteses, as quais para eles de nada
ajudavam.
Por isto Aristóteles, também membro do núcleo de filosofia, e, bem
mais ponderado do que seu mestre Platão, resolveu colocar panos quentes:
- Não queremos barrar ou atrapalhar a guerra, e, principalmente, o
núcleo formado pelos nobres guerreiros que dele fazem parte, os quais
arriscam suas existências lutando por causas de justiça. – Olhou para todos
para ver se tinha suas atenções, e somente ao perceber que sim prosseguiu. –
Contudo, temos que concordar que até o presente momento não se tem a
certeza absoluta se a destruição da alma por estas armas seria apenas
temporária ou somente um acontecimento nesta dimensão que passaria para
outra dimensão ainda desconhecida, ou, se seria realmente em definitivo, ou
seja, aniquilando para sempre o espírito em toda a sua essência!
A partir deste questionamento, o qual foi acompanhado por
Zoroastro que se postou imediatamente de pé para ser o próximo a falar, mas
foi interrompido por Expedito que não continha sua irresignação, se erguendo
e bradando:
- Estava em uma missão muito perigosa, e, não consegui concluí-la,
até o presente momento, simplesmente, porquanto, o homem que fui buscar se
recusa a aceitar o que estão impondo na dimensão chamada vulgarmente por
inferno, assim, se querem mudar algo deveriam começar por lá! Bem como, sei
que muitos dos guerreiros têm opiniões como a que vou exprimir agora, mas
não falam para não entrarem em discussões inúteis, o que não deve mais
aguardar, porquanto, certamente estamos perto de enfrentar a maior guerra de
todos os tempos que temos conhecimento, a qual atingirá tanto o plano
material quanto imaterial, e, exatamente com tudo o que temos em jogo vocês
alçam uma discussão sobre respeito àqueles que na primeira oportunidade
irão nos aniquilar?! – Para demonstrar sua indignação ele ainda se curvou
sobre a mesa. – Será que é isto mesmo que querem?! – Retornou seu corpo
para trás, e respondeu a si mesmo em conclusão. – Sinto muito meus irmãos,
mas nós do núcleo da guerra, não podemos liderar o exército dos arcanjos e
demais guerreiros e guerreiras portando somente palavras filosóficas sobre a
origem da vida, etc., uma vez que temos que ter armas, não para atacar, mas
238
para defendermos a ordem, afastando, assim, o caos, onde certamente não
irão ter a oportunidade de filosofar, mas arderão nas mãos de Lúcifer trocando
ideias de vida, por uma perturbação diante da falta de expectativa de um
futuro!
- Defesa da ordem? Quantas almas e seres humanos formaram
exércitos para defenderem a ordem, e, logo após terem o poder da destruição
em mãos, começaram a aniquilar seus irmãos somente porque não pensavam
da mesma forma! – Respondeu Zoroastro que ainda estava em pé aguardando
para falar.
Expedido ergueu as sobrancelhas, demonstrando seu espanto
inicial, mas depois fechou o cenho, batendo fortemente na mesa,
respondendo:
- Isto é um ultraje! Luto com honra e jamais, digo jamais se teve
notícia que o exército celestial tenha aniquilado qualquer demônio se este não
tivesse na iminência de aniquilar uma alma inocente. E ainda tenho que
lembrá-los que da última vez que conseguimos vencer Lúcifer, tivemos a
chance de aniquilá-lo, contudo, resolvemos novamente prendê-lo. Ou seja, isto
é a maior prova de que o núcleo de guerra não é um celeiro de gananciosos
que anseiam por poder, nos somente queremos salvar nossos irmãos, mesmo
que para isso tenhamos que usar da força, a qual, insta ecoar, é usada para
defender a paz, nunca para saciar vaidades pessoais!
- Ao que se tem conhecimento nas várias camadas de todas as
dimensões, Lúcifer pode ser a pior alma existente, e, certamente a mais
perigosa, porquanto, possui o poder dos Deuses de sua era. Contudo, não se
tem notícia de que matou uma alma sequer, já existe histórias que após a era
mitológica, onde as almas mais evoluídas atuais, dentre elas Jesus, Buda, etc.,
acataram a ordem do Criador para abdicarem de seus poderes de deuses e
descerem a terra para evoluírem como humanos, Lúcifer se negou a isto, e, o
Criador então teria deixado seus poderes, e, ainda deixado ele levar seu povo
para uma dimensão só sua, que mais tarde devido ao seu ódio teria se
transformado na dimensão que chamam atualmente de inferno, seu verdadeiro
lar. Tenho que dizer que sou um defensor do exército celestial, contudo, tem
que haver ponderação até mesmo para tomarmos atitudes. – Disse Aristóteles,
novamente colocando panos quentes.
- É somente histórias das quais não poderemos nunca confirmar,
porquanto, Jesus, Buda e todos os outros que estão na história não dizem
nada a respeito desta era, afirmando, apenas que o que passou deve ficar no
passado, e que se hoje estamos aqui ao lado deles é porque o Criador acertou
em toda a sua obra, nada mais nada menos. – Zoroastro resolveu parar, e
olhar para Jesus e Buda, os quais confirmaram suas respostas apenas
afirmando com as cabeças, não queriam participar ativamente da reunião,
porque se assim agissem junto com outros membros mais antigos do
Conselho, poderiam ao invés de ajudar atrapalhar, porquanto, os membros
mais exaltados certamente levantariam a hipótese de autoritarismo, etc., por
isto resolveram antes da audiência apenas observar e falar somente na última
hipótese, e, ainda, caso algo fugisse do controle, haviam conversado com um
amigo que iria interferir e tentar levar todos à paz na decisão.
239
Após perceber a negativa de resposta por parte dos membros mais
antigos do Conselho, Zoroastro continuou a falar:
- Outros já dizem que Lúcifer após ser um dos Deuses da era
mitológica resolveu descer por livre e espontânea vontade para participar da
origem da vida humana, e encarnou com nome de Caim, e, assim, deu início
ao mal na dimensão material...
Antes de terminar de falar, Zoroastro foi interrompido por uma
franzina alma que se levantou falando já demonstrando sua humildade:
- Me desculpe irmão, mas creio que falarmos de Lúcifer, e,
principalmente, das histórias de sua suposta origem maligna somente trará
este mau que ele dissemina para nossa reunião. – Todos se calaram, e
Zoroastro em respeito ao amigo de longa data resolveu agradecer e sentar-se,
afinal, concluiu que falou mais do que queria.
Neste momento todos olharam para o pequeno homem, o qual
apesar de seu porte físico humilde, incomuns para uma alma tão elevada
tomar como forma de se apresentar em essência, mas que emitia grande
energia, demonstrando seu elevado poder. E, assim mesmo, desta mesma
forma humilde o simpático senhor iniciou o pedido que havia recebido de
membros do Conselho, dentre eles principalmente Jesus e Buda, para
apaziguar a situação que já previam que sairia do controle. Neste momento,
ele então ergueu a cabeça com cuidado, olhou em todos os cantos da grande
vastidão da mesa de reuniões, dizendo com muita calma:
- A raiva paira sobre minhas veias, não me deixando raciocinar. Se
por todos sou muito ou pouco, nesta hora meus pensamentos se perdem no
vazio que se forma em minha alma. Para recobrar minhas forças e retornar a
paz interior, me fecho todo, principalmente os olhos... Somente aguardando...
Aguardando... E no momento certo expilo tudo o que me aflige para fora do
meu ser, tentando não deixar vestígios de sua existência, para que ali não
brote algo de que não vou me orgulhar no futuro, uma psicopatia profunda,
onde levaria sangue às minhas mãos, e mais ódio a meu ser, e, em crendo
que referido ódio seria a razão de minha destruição, não o levo comigo aos
meus irmãos, porque é assim que nasce o mal, e é deste sentimento que ele
se alimenta... – ele falava com maestria, e todos estavam boquiabertos
escutando. – E, foi assim que nasceu Lúcifer, e é o que temos que saber para
não nos tornarmos um dos seus discípulos, ou, até mesmo pior do que ele.
Não tenho fortunas materiais, nem mesmo adoto uma imagem em espírito de
grande beleza física para os padrões atuais, mas me considero uma pessoa
afortunada, porquanto, me foi concedido esta essência de vida, da qual
considero que muitos seres encarnados e desencarnados poderão tentar
dominar, mas que somente eu poderei permitir que assim o façam, uma vez
que, isto encontra-se em meu poder de escolha, do qual me apoio não apenas
para mostrar liberdade, mas, principalmente, o poder que temos de ser donos
de nós mesmos.
Ele se calou por alguns segundos, e, percebendo que tinha a
atenção de todos que estavam perplexos com suas palavras, prosseguiu:
240
– Contudo, quando esta escolha esbarra em interesses diversos,
não poderei parar e gritar com aqueles irmãos que não concordam comigo,
tenho que parar e escutar para assim buscarmos em conjunto fazermos uma
reflexão de ambas as partes, no objetivo único de se chegar a um bem comum
em todas as direções.
Parou novamente se certificando que todos estavam prestando
atenção, e, para seu espanto, todos estavam ainda vidrados, o que era raro.
– Vejo irmãos que todos nesta mesa são dignos de deliberar de igual
para igual, mas advirto que se mostrará o mais sábio não aquele que
demonstrar maior poder, mas sim, aquele que comprovar estar no caminho
correto, partindo, inicialmente, em respeitar a opinião do próximo. Assim,
entendo que estamos todos assustados, e, por isto todos nesta mesa querem
fazer o melhor para salvar principalmente os irmãos que ainda estão em
dimensões inferiores ou na material, contudo, primeiramente temos que salvar
a nós mesmos, e não deixar que este mau que Lúcifer e seus discípulos
espalham nos atinja de qualquer forma, nomeadamente, através de discussões
que não terão fim.
Ergueu uma das mãos estendendo-a para o alto, e concluiu:
– Portanto, creio que com diálogo poderemos traçar um caminho que
satisfaça ambas as partes, tudo no objetivo comum, afinal, é por isto que foi
formado este Conselho, e, ergo minha mão esquerda em sinal de que busco a
paz sempre.
Após as palavras o silêncio se fez presente, momento no qual Buda
deu um discreto sorriso para Jesus, realmente tinham feito a escolha correta
para intermediar o assunto, afinal, quem melhor para pacificar uma discussão
do que Gandhi.
******
Na outra ponta da grande mesa Expedito retirou uma caixa que
havia colocado antes da reunião entregando-a para Buda, o qual
sorrateiramente a colocou próximo aos seus pés para não esquecer, como se
um objeto tão valioso poderia ser ali esquecido como um molho de chaves.
- Você conseguiu apenas o objeto, mas e Nimrod? – Questionou
Platão que estava prestando atenção na entrega.
- Ele não virá por enquanto, concordou em devolver o objeto, lado
outro, disse ainda guardar ressentimentos da situação que o levou a deixar o
Conselho.
- Entendo... – Respondeu Platão pensando ainda que sabia
exatamente os verdadeiros motivos dele não ter voltado:
Certamente este maluco do Expedito sedento por batalhas deve ter
aniquilado Nimrod quando este não quis lhe entregar o objeto, ao passo que,
241
mesmo sendo mais poderoso deve ter se debilitado na dimensão inferior e sido
presa fácil para ele. Esta seria a única forma de Nimrod entregar este objeto!
Após Platão lançou um sorriso para os dois como se estivesse
querendo demonstrar que havia ficado feliz com a situação.
Sei que Expedito está mentindo, contudo, ainda não sei os motivos...
– Desta vez foi Buda que pensou, respondendo ao sorriso falso de Platão.
Como de seu feitio Expedito não sorriu para ninguém, odiava ter que
bancar o sujeito bacana, quando na realidade queria era mandar eles todos,
com raras exceções, a merda.
242
CAPÍTULO 63
Dimensão material neutra – submundo, 1982 – ano terrestre
Não muito longe da dimensão sublime onde ocorria a reunião do
conselho, o Senhor da Luz escutava todas às discussões através de uma
pedra capacitor muito poderosa que Miguel lhe entregará antes da reunião,
porquanto, membros do Conselho sabiam que tinham que ter a certeza que
Joana teria uma proteção extra, afinal, agora que o filho das trevas já estava a
caminho, tudo teria que ser acompanhado de perto...
À dimensão onde o Senhor da Luz se encontrava era próxima da
outra do ponto de vista físico quântico, porquanto, em suma todos sabiam que
a distância entre as dimensões materiais e imateriais era algo de essência e,
portanto, não realmente de distância. Assim, a mensagem havia chegado a
tempo.
Mesmo que com o respaldo de senhores de alta posição no
Conselho, o Senhor da Luz tinha a plena convicção do risco que estava
correndo em ali permanecer, afinal, a dimensão material neutra, ou como os
leigos a apelidaram: Submundo! Era algo totalmente confuso.
Naquela dimensão se encontravam almas perdidas, que não podiam
permanecer na dimensão imaterial simplesmente porque ainda teriam que
estar na material, e nem poderiam ficar na material, porquanto, desta saíram
antes do tempo certo, por isto ficavam exatamente no meio.
Em sua essência eram almas de seres que se suicidaram, as quais
aguardavam o tempo certo de poderem seguir em frente. Muitos diziam que
aquela permanência não se consistia em um castigo, mas um ensinamento
que tudo deveria ser respeitado, nomeadamente, a concessão de
reencarnação e outras missões.
Dali, somente daquele local o Senhor da Luz sabia que poderia
escutar aquela reunião tão importante, lógico somente através da pedra
capacitor que Miguel lhe entregou, algo único em todo o universo, e que estava
prestes a fazer o seu último trabalho, espionar nada menos do que a reunião
mais importante do universo naquele momento!
243
CAPÍTULO 64
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Após a intervenção de Gandhi às deliberações prosseguiram, e
mesmo que em tons mais amenos do que os que estavam se formando até
sua intercessão, os ânimos estavam ainda acirrados.
- Meu amigo, na minha concepção a vida é como um carrossel, da
volta e voltas sem sair do lugar naquele momento de funcionamento. Mas
quando o espetáculo termina e o parque vai embora, o carrossel realmente se
move ao ir, assim, irá dar voltas em outro local. Desta forma, o fato dele partir
não significa que ele não mais exista, apenas que se encontra em outro local,
e, para vislumbrá-lo terá que fazer uma viagem, que diferente de tantas outras
será bela, porquanto, será regada de emoção para reencontrar a felicidade. –
Falou Tomas de Aquino, adepto da criação das novas armas para proteção,
tomando naquele momento o início dos diálogos mais apaziguados iniciados
por Gandhi. Em suma, ele queria ajudar não somente a corrente que lutava
para aprovar a criação das armas, mas, principalmente seu amigo Expedito
que ainda se mostrava muito nervoso com sua falha em trazer Nimrod do
inferno.
- Entendo, contudo, se destruirmos este carrossel, ele não mais
existirá! – Contrapôs Platão tomando a frente antes que Aristóteles resolvesse
responder, afinal, reconhecia que naquele momento o amigo estava muito
furioso para dialogar.
- Duvido muito disso meu caro Platão, afinal, temos a certeza que
tudo que é destruído nunca perde a sua essência. – Arrebatou Tomas.
Zoroastro com seu temperamento forte, não se conteve, gritando do
outro lado da mesa:
- Isto no plano material seus inconsequentes!
Platão pegou no ombro do amigo, sentando-o, e dizendo com
ponderação e calma:
- Acalme-se meu amigo, como disse Gandhi, o melhor a fazermos é
dialogarmos. Sei que você já está cansado de tentar colocar na cabeça deles
sua visão, da qual nos comungamos, contudo, pelo bem de todos, que é nosso
principal objetivo, o melhor realmente é buscarmos a paz até mesmo ao
expormos nossos ideais, tudo no objetivo de não ferirmos o sentimento do
nosso semelhante, afinal, eles também querem preservar a vida, só que da
maneira deles...
- Me desculpe Tomas, realmente acho que me excedi. – Ponderou
Zoroastro, já se sentando, em demonstração que iria tentar um diálogo mais
apaziguado.
- Que isto meu amigo, não me deve desculpas, todos estamos no
mesmo barco, e como disse Platão, mesmo que de modos diferentes estamos
buscando entrar em um consenso para promovermos um bem maior, como
sempre fizemos após a formação do Conselho.
244
Gandhi sorriu, afinal, tudo estava correndo bem, conforme o
combinado...
- Contudo, tenho que respondê-los, quanto a sua resposta de que o
que é destruído não perde a sua essência somente no plano material,
porquanto, na realidade, será que apenas não sabemos o que ocorre neste
plano imaterial? Portanto, quando lá estamos, ou seja, no plano material na
forma encarnada, não temos a certeza que teremos uma vida após a morte,
assim, quem não garante que estamos agindo da mesma forma nesta
dimensão que somente cremos sem certeza ser a última?
Após fazer esta observação Tomas fez uma pausa, e, vislumbrou o
que já pensava, todos ficaram com cara de dúvida, foi quando decidiu
arrebatar:
– Ou seja, ela poderia perfeitamente ser somente mais uma dentre
outras, e, do interior desta alma que apenas acreditamos ser imortal, poderia
existir algo ainda maior, algo além de nossa compreensão neste plano, afinal,
não é porque somos considerados os seres mais evoluídos na escala humana,
que podemos afirmar que nada neste infinito possa ser mais evoluído ainda. –
Concluiu assim Tomas tentando retomar o debate, contudo, mantendo a calma
e ponderação, ao passo que todos permaneceram com a mesma cara de
dúvida com a questão aberta por ele.
- Comungo com você meu amigo, afinal, aqui estamos, e, segundo
vagos relatos, poucos se encontraram frente aos criadores ou criador, e, estes,
ainda nada revelaram do que acreditamos. – O interlocutor fez uma pausa
olhando para o setor em que se encontravam os seres mais antigos do
Conselho. – Ou seja, poderia perfeitamente existir uma energia que chamamos
erroneamente de imaterial, porquanto, sempre estamos medindo entre
encarnado como material e desencarnado como imaterial, mas, se pararmos
para pensar, poderia haver uma terceira, quarta, quinta, e, assim adiante de
matérias energéticas que seriam refletidas na essência do nosso ser.
- Entendemos... – Platão ameaçou iniciar, sendo interrompido.
- Me desculpe Platão, mais somente para terminar meu raciocínio,
quero simplesmente dizer que para qualquer um de nós creio que não é fácil
compreender esta gama de energia que forma nossa alma! Portanto, o
embasamento de pensamento de Tomas, mesmo exposto da forma leiga para
o ponto de visão cientifica, o qual ele não domina, pode sim ter algum sentido
tanto filosoficamente, quanto cientificamente! – Disse para surpresa de todos
um dos adeptos da não criação de armas, mas que por amor a ciência, e,
diante da compreensão de que ali não teria vencedores, mas, sim, consenso
para tentar salvar os semelhantes, expôs sua visão, de uma maneira simples,
mas dinâmica.
Zoroastro tinha prometido para si mesmo ficar calado, mas aquilo lhe
tirou novamente do serio, e não se conteve:
- Espere... – Fez uma pausa olhando fixamente para o pequeno
sujeito, arrebatando sua indignação. – De que lado realmente você está
Einstein?
245
Einstein com seu jeito brincalhão, mas ao mesmo tempo autoritário
diante da força de seu nome respondeu com um sorriso:
- Do lado da busca incansável e inabalável da verdade cientifica, a
qual sempre busquei para que um dia possa ser digno de através desta busca
encontrar não apenas minha essência, mas, principalmente, meus verdadeiros
pais.
Quando proferiu estas palavras ouve novo silêncio, e Gandhi não
segurou sua emoção, deixando cair uma lágrima, realmente estava havendo
naquele momento uma verdadeira busca não pro e contra criação de armas
celestiais, mas sim para salvar as pessoas e seres que estavam prestes a
serem aniquilados por uma guerra inevitável, aquilo sim que retratava o
verdadeiro Conselho Supremo. Ele sentia ainda que estavam indo além, que
pela primeira vez diante de diálogos tão acalorados estavam discutindo algo
muito maior que todos pensavam, eles estavam ponderando sobre a essência,
eles estavam pela primeira vez em toda existência do Conselho Supremo
discutindo algo inimaginável até então.
- O que lhes dão tanta certeza disso? – Disse Isis, considerada uma
poderosa mulher dentre às várias que compunham o Conselho,
principalmente, porquanto, compunha uma ala mais política, não adepta de
núcleos, mas sim em fazer com que todos eles trabalhassem em equipe para
um bem maior, uma verdadeira líder política e de coalisão, a qual Buda e
Jesus tinham esperança de que fosse ajudar a formar um consenso, mas que
não poderiam te pedir anteriormente, porquanto, a mesma era muito
temperamental, e, qualquer pedido poderia ser interpretado equivocadamente
como um pleito para favorecimento.
- Tenho uma grande consideração por sua graça Isis,
principalmente, por ter em um período altamente difícil de início de uma
civilização que se consagrou como moderna para a época, e que representava
um avanço para a raça humana situada no oriente, ter sido uma mulher forte
que foi, e, ainda, por ter prosseguido durante os tempos, sempre ajudando os
semelhantes, ora encarnada, ora em espírito, e nisto conseguiu ser uma
grande governanta quando encarnada, e, após sua morte material foi
considerada uma Deusa, principalmente, por ter propagado tais venerações
em seu nome por séculos. –
O homem corpulento fez uma pausa olhando fixamente diretamente
aos olhos negros da imponente mulher, enlevando:
– Contudo, para sua resposta acho que podemos concluir que é
simples, afinal, seres tão poderosos como nós que aqui se encontramos ainda
não estamos completamente ao lado de nosso Criador ou Criadores, isso já
não seria uma boa certeza para você?! – Entrou no diálogo o espírito que ficou
mais conhecido como Plutão, sendo venerado por ser o Deus do submundo e
dos mortos.
- Mas Plutão, não podemos fincar alicerces tão profundos no futuro
somente com a observância de nossos seres. – Rebateu Isis não se dando por
satisfeita.
246
Plutão então resolveu arrebatar mencionando sua experiência:
- Conforme todos vocês bem sabem, tenho verdadeira proximidade
com a morte, e, após anos cumprindo minha missão, posso dizer com perfeita
convicção que creio que há sim uma vida interior de essência, como soube
explicar mais didaticamente Einstein, mas que posso simplificar em meus
dizeres de um ser que trabalhou sempre ao lado da crente e errônea afirmação
de que ela seria o extermínio da vida, tenho que discordar, porque sempre tive
a certeza e convicção de que a vida sempre subsiste, pelo simples fato de que
para onde olho há vida! Portanto, porque ela não subsistiria após a conhecida,
mas ainda obscura morte espiritual, tendo em vista que é certo que a essência
é algo tão complexo que até mesmo o núcleo de ciência aplicada já se deu
conta de que nem com todo o conhecimento do universo em todas as suas
dimensões poderia ser capaz de compreendê-lo totalmente?
- Entendo, mas vocês não responderam o questionamento de Isis.
Porque tem tanta certeza que há algo além? – Ecoou Zoroastro tentando
galgar alguma vantagem do questionamento da colega para reforçar suas
convicções.
- Simples, porque isto não é correto de dizer. Sabemos que ele ou
eles estão ao nosso redor em tudo e em todos, somos parte deles! Interagimos
sem ver, sentimos sem tocar, amamos incondicionalmente sem questionar sua
existência, assim, devemos confiar em prol de um bem maior. – Disse
Expedido sem querer intrometer, mas tentando que aquele questionamento
terminasse.
- Mas nunca os vimos em pessoa, conversando diretamente, olho no
olho. Avancei como tantos outros por dimensões e dimensões para aqui
chegar, e até hoje tenho que me contentar em senti-los na brisa que acaricia
meu rosto, no amor que exala de meu peito quando penso nele ou neles, na
beleza da vida, etc., etc., etc. – Respondeu Zoroastro abaixando a cabeça não
em descrença ou decepção, mas externando seu completo temor de nunca
estar diante de seus verdadeiros pais, e, ainda, para demonstrar que não está
questionando em vão, mas que aquilo faz parte de suas convicções, as quais
seriam defendidas até o fim.
Fez assim um pequeno silêncio, onde as partes não mais estavam
pensando no pro e contra, mas nos dizeres de Zoroastro, os quais mesmo nos
mais crentes e evoluídos seres do universo ainda afligia mesmo que em menor
grau.
Lado outro, quebrou esse silêncio o ser mais conhecido como
Akenaton, o qual foi um dos primeiros seres que encarnados adentrou em um
rumo ao monoteísmo:
- Muitos nas dimensões superiores, mesmo que não digam, assistem
seus semelhantes no plano material como se fossem porcos cercados em um
chiqueiro, os quais comem e aceitam tudo que lhes é oferecido sem
questionar, se fartando e se empanturrando do que para eles é o mais
importante em suas vidas, e, não sabendo que tais farturas são apenas o que
a vida ali lhes oferece para lhe retirar a verdadeira vida que é a imaterial.
Assim, se fossem sábios, e tivessem a inteligência necessária como poucos o
247
têm, saberiam que deveriam comer menos, ou seja, se deleitarem menos, e,
focarem-se essencialmente em uma forma de não apenas se libertarem, mas
de proporcionarem aos seus irmãos e amigos a mesma libertação. Contudo, a
lavagem que para eles naquele momento é o manjar dos Deuses, é melhor e
mais segura, por isto, preferem permanecer na lama. Contudo, entendo que
temos que salvá-los a todo custo, e, tenho a certeza que meu Deus único, que
ainda prego ser o Aton encontra-se olhando por nós, e, talvez tenhamos medo
de arriscar afundo para realmente encontra-la, comenda aqui a mesma
lavagem dos encarnados, e nos deleitando em um manjar que na realidade
não existe.
- Você quer dizer que estaríamos nesta dimensão superior da
mesma forma que os nossos irmãos encarnados na dimensão material?
Portanto, sem saber o que realmente se encontra além, e agindo com medo ou
preguiça de procurar e questionar este além, e, bem como, onde o senhor
acha que se encontra este seu Deus único?! – Questionou incrédula Isis, a
qual não nutria muita afinidade por Akenaton, não por vaidade por este ter-lhe
retirado à veneração de Deusa, afinal, acreditava que títulos e venerações
eram quereres meramente da vaidade mortal, não para os imortais, mas tinha
certa resistência com seu ser, simplesmente não gostava de sua ideia
monoteísta.
- Não estou falando, estou afirmando! – Respondeu Akenaton em
tom sério.
- Por quê tem tanta certeza? – Retrucou Isis querendo levar o
assunto para um patamar mais aprofundado.
Neste momento uma alma baixa como um anão, o qual na realidade
era um ser extremamente evoluído da era primitiva, mas que ajudou a
desenvolver os primeiros esboços civilizados da matemática, cutucou sua
mulher que estava ao seu lado, falando baixinho para não atrapalhar o embate:
- Odeio quando estes seres evoluídos principalmente no Egito, os
quais querem ser os donos da verdade como se fossem eles os Deuses da
inteligência na civilização, quando na realidade estávamos na dimensão
material lutando com feras muito antes deles lá ficarem brincando em suas,
digamos, caixinhas de areias.
Um homem enorme, que mais parecia um gigante, se aproximou do
baixinho que havia acabado de profer aquelas palavras, e mesmo sabendo
que não estava no diálogo, se abaixou, olhou bem nos olhos do pequenino ser
em relação a ele, e disse em uma voz fina:
- Concordo.
Enquanto isto, o embate prosseguia, ao passo que Akenaton
respondeu Isis:
- É simples, aqui chegando perdemos mesmo que não queiramos
admitir o que nos move, ou seja, a persistência em melhorar e levar nossos
irmãos ao mesmo nível. Assim, quando chegamos, queremos buscar nossos
irmãos, mas, após um tempo, começamos a nos contentar, e mais cedo ou
248
mais tarde perdemos a força, porque entendemos em nossa essência que não
podemos mais avançar. Diante disso, paramos devido ao medo de regredir ao
estado anterior, uma vez que, quando deveríamos pensar que isto seria
somente o começo, achamos que é o fim, mesmo que lutamos para tentar
provar que não o seja.
- Mas você tem que admitir que não são todos nesta dimensão que
estão parados como você faz crer com referida afirmação. – Retrucou agora
Plutão, tomando a frente para que Isis não prosseguisse, sabia que ela não
nutria muita afinidade pelo amigo, e, se aquela conversa continuasse não iria
acabar bem...
- Se ainda não estão todos, somente alguns têm a coragem de
novamente encarnar, e, estes poucos correm grandes riscos na dimensão
material, principalmente, porque não recebem o apoio que necessitam dos
amigos desencarnados, os quais, mesmo que queiram ajudar não se
empenham o bastante. – Respondeu Akenaton.
- Estou perplexo com tamanha descrença com seus semelhantes! –
Rebateu Isis externando sua indignação.
- Não estou descrente, apenas sendo realista e sincero. E tenho que
confessar que o que me intriga é está sua relutância e de seus companheiros
em menosprezarem os poderes do Criador, afinal, admitir que armas celestiais
aniquilariam a essência da alma em sua finitude é o mesmo que questionar o
poder de Deus no plano material! – Concluiu Akenaton se sentando.
- Nem tanto meu amigo! Não estamos questionando em momento
nenhum o poder do Criador como quer se referir em sua crença monoteísta, ou
Criadores para os que assim não entendem. Ou seja, não gozam de sua
convicção. Mas estamos apenas defendendo nossos semelhantes, exatamente
como tenho certeza que o Criador ou Criadores o defenderiam, afinal, são
pais, e, portanto, assim creio que agiriam. – Respondeu Platão.
- Estou entendendo muito bem o seu lado meu irmão Platão, mas os
pais também têm a incumbência de educarem seus filhos que estão prestes a
ameaçarem a vida de outros de seus filhos, ou seja, seus irmãos. E tenho que
dizer que neste caso, é pior, porque os rebeldes estão prestes a aniquilar
almas e mais almas, talvez milhares de seus correligionários. – Respondeu
Expedido ao ver que Akenaton se sentara descrente de prosseguir após ver a
relutância e antipatia de Isis para com a sua pessoa.
Brahma, o qual segundo relatos de todos os entes da dimensão
sublime, dentre eles vários que compunham o Conselho, foi quem teria
ajudado mais ativamente na criação das dimensões, resolveu neste momento
interromper nas discussões:
- Como todos sabem, ajudei a desenvolver o poder de criação das
dimensões da forma como são atualmente, e disso não posso falar sobre
essência e demais atos desta criação, visto que não foi um trabalho uno,
somente fiz minhas partes e não pude interferir nas demais. Como sabem,
recebi somente parte desta incumbência no objetivo de não ser alvo de
atentados ou até mesmo, para que não ocorresse por minha ou de alguém dos
249
entes que desenvolveram o sistema qualquer ameaça de quebra da mesma,
etc.
Fez uma pausa olhando para Expedito e depois para Platão, após
somente correu os olhos pela mesa até Zoroastro, e prosseguiu:
- Lado outro, posso afirmar que elas não estão fixadas de maneira
imutável no cosmo, pela forma que fiz pelo menos a parte a que me incumbi,
elas estão, mesmo que de forma lenta, se propagando em formato contínuo,
de forma que não se pode ter certeza absoluta de sua ordem ou de sua
finitude, se é que podemos afirmar algum feitio de finitude diante da
complexidade do cosmos como um todo, razão pela qual, somente posso dizer
as palavras de um cientista iluminado mentalmente.
O silêncio se fez finalmente presente, e entrando nesta deixa Gandhi
resolveu lançar sua proposta:
- Vejo que estão chegando mesmo que paulatinamente em uma
solução pacificadora.
Todos balançaram a cabeça.
Entendo que ambos os lados tinham uma parte da razão, Gandhi
resolveu que não poderia deixar que iniciassem novamente a discussão:
- Meus irmãos, todos sabem que prego a paz incondicional, mas
neste momento, tenho que confessar que não estou nem do lado pro armas,
nem do contra elas, apenas estou pensando que podemos chegar a uma
decisão pacífica entre nós, e, assim, conduzirmos estas questões com a
paciência, humildade e, principalmente, união que nossos irmãos esperam.
- Tenho que o senhor tem razão. – Disse Expedito com firmeza,
olhando para seus semelhantes de ideais, os quais confirmaram sua posição
somente com o balançar de cabeças.
Não ficando de fora da harmonia, inesperadamente Platão tomou a
frente em seu lado:
- Também entendo como meu irmão Gandhi. E tenho certeza que os
núcleos que comungam de meu posicionamento assim entendem.
- Sim meus irmãos, e me desculpem se me exaltei. – Disse
Zoroastro demonstrando que não guardava ressentimentos, somente estava
defendendo seus ideais como todos ali.
- Que isto, ambos somente estamos lutando pelo bem comum. –
Respondeu Expedito, já emendando: - Mas meu irmão Gandhi, qual seria sua
proposta já que o senhor se encontra dividido?
- Tenho que o melhor seria formarmos uma comissão que seria
composta por todos os núcleos, onde não iriamos debater razões de disputa
sobre quem teria razão, como ficam fazendo os diversos líderes dos países na
dimensão material, principalmente, os do planeta terra. Mas iriamos trabalhar
em conjunto, cada um em sua área, mas sempre ligados, trocando ideias e
250
experiências, respeitando os resultados do próximo, isto sim é que o Criador
ou Criadores iriam querer que seus filhos fizessem. É por isto que proponho
que assim procedamos para encontrarmos uma solução entre fazermos novas
armas celestiais, e, ainda, respeitarmos nossos irmãos rebeldes.
- E se focássemos em desenvolvermos uma espécie de arma que ao
invés de aniquilar como fazem as armas já existentes, de Arcanjos e Santos
Guerreiros, elas poderiam transferir ou uma espécie de exorcizar através de
uma transferência de dimensões destas almas para a dimensão intermediária,
mais conhecida como inferno, após tentaríamos resolver o problema deles
naquela dimensão, que sabemos ser um caos, mas é a única que poderia lhes
abrigar como uma espécie de prisão mais segura. – Falou Agostinho o qual
recebeu um aceno de concordância imediata de Expedito e dos demais
membros da facção pro arma.
- Ou poderíamos tentar formar armas que sugariam somente a
energia da alma, assim, ela ainda existiria, mas sem força para lutar,
abandonariam o campo de batalha. – Emendou Zoroastro o que mais havia se
exaltado nos diálogos, demonstrando que estava disposto a conversar após a
intervenção de Gandhi.
Vendo isto Gandhi que por sua vez via que ambos os lados já
estavam se entendendo, sorriu alegremente dizendo em alto e em bom tom:
- Meus irmãos, conforme podem ver, após iniciarmos um diálogo
mais aberto e dinâmico, pautado em resolução do problema, e não em
avaliação de formas e verdadeiras vaidades pessoais, já estamos encontrando
soluções. Por isto quero que saibam que neste momento já estamos vencendo
a batalha, porque tenho certeza que Lúcifer de alguma forma estava
atrapalhando nossas discussões, agora, tudo fluirá perfeitamente. – Ao
terminar deu uma piscadela para Jesus e Buda que não se continham de tanta
exultação.
Buda se levantou dizendo com alegria:
- Posto isto irmãos, creio que vocês mesmos podem estabelecer a
melhor forma desta comissão de análise trabalhar, sigam em paz, e em no
máximo um ano terrestre teremos que ter chegado a uma solução, todos de
acordo?
Todos já estavam com a expressão mais alegre, gritaram um sim
quase que uníssono, e aos poucos foram deixando a grande mesa e a
montanha diretamente para seus afazeres, os quais naquele momento tinham
que ter um único foco e objetivo: estudar a criação e formas de novas armas
celestiais para a quase que inevitável batalha final, mas desenvolvendo-as
com formas mais amenas.
******
Ao final da reunião Platão e Zoroastro foram conversar com
Expedito, ao passo que o filosofo tomou a iniciativa:
251
- Sabe que não temos nada contra você meu irmão, pelo contrário,
temos é uma extrema gratidão. Por isto queremos que mesmo sendo contra a
criação das armas por convicções expostas na audiência, deixarei de lado uma
de minhas principais convicções, e estaremos ao seu lado no campo de
batalha.
- Vocês no campo de batalha? Isto somente pode ser uma piada!
Desculpem-me, não que esteja esnobando suas ajudas, mas dispenso, afinal,
somente iriam atrapalhar.
- Não seja ignorante Expedito! Já se esqueceu de que em uma
batalha o lado vencedor não é aquele que tem maior poderio bélico ou de
contingente, mas sim aquele que conta com estrategistas, ou seja, mentes que
podem mudar o rumo de uma guerra? – Respondeu Zoroastro com um ar não
de fúria pela recusa, mas de ensinamento, afinal, sabia que Expedito tinha
temperamento forte, e, certamente, ainda estava nervoso principalmente com
os dois.
Expedito não esperava aquela resposta, e por isso resolveu não
prolongar mais a conversa, estava muito cansado, afinal, tinha pouquíssimo
tempo que voltara do inferno. Somente assentiu com a cabeça e respondeu
diretamente:
– Muito obrigado. Depois veremos. Guardando somente em seu
consciente a verdadeira resposta:
Não quero!
Após isso ele se pôs a sair rapidamente, porquanto, sabia que se
permanecesse os dois certamente tentariam dialogar ainda mais, e ele
definitivamente não tinha mais paciência para aquilo.
Contudo antes de deixar a sala Platão gritou algo que o fez parar
subitamente:
- Se convencermos ele de retornar e lutar ao seu lado, o senhor nos
aceita como conselheiros no campo de batalha!
- Quem? Nimrod?! – Seu questionamento teve um tom ameaçador. –
Saibam que irei trazer ele, de uma forma ou de outra.
- Sabemos disso, contudo, não falamos nele! – Platão retrucou.
Falam em quem então?
- No guerreiro das areias, no mais famoso dos guerreiros de todas
as eras na dimensão material.
A resposta de Expedido foi seca e direta:
- Se convencerem ele de lutar ao meu lado, terão pleno acesso ao
no campo de batalha, contudo, terá uma condição...
- Qual? – Os dois questionaram intrigados em uníssono.
252
- Terão que ficar até o fim, mesmo que isso signifique a morte do
último guerreiro no campo de batalha, e, ainda, se perdermos a guerra, terão
que estar ao meu lado quando atacarmos pela última vez, afinal, não sairei
daquele campo de batalha derrotado, somente haverá um jeito de sair de lá,
vitorioso ou morto. Portanto, se perdermos será somente após o último ser
morto no campo de batalha, nele, incluindo, por evidente, nós se for preciso.
Platão pigarreou, mas respondeu com convicção:
- Aceitamos, estaremos juntos até o fim.
- Isto se conseguirem convencer ele de lutar ao meu lado, afinal, se
isso ocorrer, vocês terão uma grande chance de voltar daquele campo de
batalha para continuar em vossas lereias! – Respondeu Expedito sorrindo e se
retirando.
- É Platão, agora temos que convencer ele de qualquer forma, afinal,
do contrário é bem provável que não voltamos daquele campo de batalha,
porque pelo que conheço o Expedito ele é capaz de tirar nossas vidas se
tentarmos recuar. – Disse Zoroastro não em demonstração de medo, mas sim
de total conhecimento da fúria de Expedito se fosse decepcionado.
253
CAPÍTULO 65
Dimensão material neutra – submundo, 1982 – ano terrestre
O Senhor da Luz estava muito satisfeito com o resultado da reunião,
e dando um sorriso falou após esmagar a pedra capacitor para não deixar
rastros:
- E mais uma vez Jesus e Buda conseguiram seu objetivo somente
calados, isto é uma arte. E, agradeço por não ter esmagado esta pedra logo
após o termino da reunião, porquanto, o resultado final dela foi bom, mas
melhor ainda foi ver que Expedito terá a chance de lutar ao lado do mais
grandioso dos guerreiros, aquele que com ele formariam uma aliança capaz de
enfrentar Lúcifer de igual para igual, quero somente ver se Platão e Zoroastro
vão realmente cumprir com o combinado...
De repente ele calou-se ao perceber que algo estava atrás dele
próximo a agarrá-lo, em um salto virou-se empunhando uma adaga, ao passo
que, um homem caiu de susto ao ver a arma, e começou a chorar e tentar se
proteger com as mãos erguidas:
- Por favor senhor, não me machuque, somente estou precisando de
ajuda para achar minha família!
O Senhor da Luz se comoveu, sabia do que se tratava, e resolveu
ajudar, mesmo que seu tempo não permitisse. Assim, guardou o punhal, e,
ergueu as mãos em sinal de paz, ao passo que o homem ao ver a cena
começou a se acalmar.
O Senhor da Luz percebendo que o homem havia se acalmado, foi
chegando perto dele, abaixou-se e disse bem baixinho:
- O que o senhor se lembra?
O homem ficou mudo por algum tempo, estava tentando lembrar-se
de algo, e, após um prolongado raciocínio respondeu:
- Nada... Não me lembro de nada! Somente que estava muito triste e
deprimido, e, em uma tarde fiz uma loucura de tirar minha vida, agora vago por
este local sem ver ou interagir com ninguém, você é a primeira pessoa que
vejo em anos! – O desespero tomou conta ao final. – Pelo amor de Deus, me
ajude. Sei que deve ser um anjo do senhor, assim, me leve embora deste
local!
O Senhor da Luz não tinha palavras, sabia muito bem que aquela
dimensão era traiçoeira, afinal, ali as almas não se viam, ou seja, era como se
estivessem em outro plano, mesmo que existindo várias, os seres que ali
abitavam não interagiam um com o outro, tudo para que ficassem em estado
de pensamento interior.
Ele me vê por causa de minha maldição, afinal, transito em várias
dimensões, e, por isso, devo ter quebrado mais está regra. – Pensou, antes de
responder:
254
- Me desculpe, não posso ajudá-lo a sair daqui. Não sou um anjo,
estou longe disso! Mas posso lhe orientar para que o tempo passe mais rápido.
- Então eu vou ficar aqui para sempre nesse limbo?! – O desespero
tomou novamente conta do homem.
- Não! Não! – O Senhor da Luz foi enfático. – Não ficará aqui para
sempre, pode ficar tranquilo. Isso é somente até você completar o tempo que
deveria ter ficado na terra junto a vossa família e cumprido sua missão, após
você seguira um caminho.
- Então quer dizer que estou aqui pagando por meus atos! Deus é
tão vingativo assim? Não serei salvo? – O homem se desesperou ainda mais.
- Deus não é vingativo, mas como pai é seu dever ensinar a todos os
seus filhos que devemos arcar com as consequências de nossa escolhas.
Portanto, ele não está te punindo, mas te ensinando a não mais agir desta
forma. Razão pela qual, não será salvo por milagres, mas no tempo certo
seguirá seu caminho, com este ensinamento que está apreendendo ao passar
por este local, do contrário poderá agir da mesma forma em tempos vindouros.
- Mas eu sempre fui um homem do bem! Contudo, cai em desgraça,
tudo iniciou quando perdi meu emprego e cai em depressão, depois, nada
mais me dava prazer, perdi minha família antes de ter cometido suicídio,
porque eles me abandonaram, após, subi em uma cadeira, amarrei uma carda
na tábua do teto e pulei. Confesso-lhe que não pensei muito no assunto antes
de tomar está atitude, e, por isso tentei voltar, a cadeira já estava embaixo do
meu pé, e eu já estava quase me livrando da corda do meu pescoço, quando,
algo pareceu me puxar para baixo, e, em questão de segundos a cadeira caiu
de meus pés, e, fui me debatendo e, após uma escuridão, vim para neste local.
O Senhor da Luz balançou a cabeça demonstrando seu nervosismo
com parte da história, e resolveu explicar:
- Você foi induzido a praticar este ato, por seres malignos que
estavam sugando toda a sua energia, os quais, após você colocar a corda no
pescoço e pular nunca o deixariam retornar. Foi por isso que você sentiu o
peso quando tentou desistir, e, a cadeira saiu de seus pés. Você não via, mas
naquele cômodo você certamente não estava sozinho, havia um ou mais seres
que queriam muito que você deixasse sua jornada.
- Mas como Deus permite isso?! – O homem estava agora
indignado.
- Não posso lhe explicar isso meu amigo, porquanto, está resposta
creio que ninguém a têm com extrema certeza, mas sei que se ficar desta
forma sofrerá e muito ainda nesta dimensão.
- Mas isso não é justo! – O homem demonstrava ainda sua
indignação.
- Não sei se é justo ou não, mas sei que se ficar se remoendo será
pior. Tenho que lhe confessar que já fiz o que você fez, e, permaneci neste
local, por isso o conheço tão bem, após sair ainda respondi por meus atos, e,
255
até hoje estou tentado me redimir, assumi encargos que não sei se vou
conseguir cumprir, mas estou aos poucos vencendo.
- Então me ensine como fazer? – O homem se deu por vencido,
afinal, pelo jeito não tinha muita escolha.
O Senhor da Luz sorriu, era muito bom poder finalmente ajudar
alguém que não o recriminava por seus atos passados:
- Olha, você terá que permanecer em completo silêncio, como que
meditando, irá comer quando sentir fome, beber quando sentir sede, enfim,
viver, contudo, sempre em silêncio. Quando menos perceber vai estar
raciocinando de uma forma diferente, como se alguém estivesse dentro de sua
cabeça, neste momento, vai perceber quem será, dai é somente seguir seus
ensinamentos, e, em pouco tempo sem perceber já está fora daqui e, acima
disso, curado de tudo que lhe aflige.
- Mas quem será essa pessoa que está em meu inconsciente
conversando comigo?
- Não sei, alguns dizem ser nosso próprio raciocínio lógico, outros
que são anjos, alguns que são santos, eu prefiro pensar que são meus
Criadores, os quais nunca saíram dali, mas que eu não os ouvia devido ao fato
de estar muito ocupado pensando em coisas que eu julgava erroneamente
serem mais importantes.
O homem ficou calado raciocinando, não dando nenhuma resposta.
- Você já está praticando? – Questionou o Senhor da Luz, já
iniciando a sua passagem daquela dimensão.
- Sim, acho que isso será o melhor a fazer. – A resposta do homem
foi curta, mas foi dita com emoção, ao passo que ele olhou ainda no fundo dos
olhos do Senhor da Luz o qual já estava desaparecendo ao ouvir a resposta,
partindo literalmente daquela dimensão, a qual ele já deveria ter saído,
porquanto, permanecer ali significava correr o risco de ser pego por algum
guardião do universo: - Creio que você estava certo em quase tudo meu
amigo.
- Como assim quase tudo? – O Senhor da Luz ainda teve tempo de
questionar antes de partir, e, agora estava curioso para saber da resposta.
- Quando me falou que estava longe de ser um anjo, porquanto,
anjos não são aqueles seres mitológicos, mas sim um estado de evolução que
leva um ser a atingir uma compreensão plena de ajudar ao próximo sem
esperar nada em troca, afinal, você já poderia estar longe, mas está aqui
tentando me ajudar, isso pode ser pouco para alguns, mas significou muito
para mim, e, creio que de uma forma ou de outra será recompensado hoje
mesmo.
O Senhor da Luz ficou emocionado em ouvir aquilo, afinal, estava
tão acostumado em escutar que ele não prestava que não tinha sequer
palavras para responder, e, nem poderia, já que estava correndo sérios
256
perigos ali permanecendo. – Fique com Deus, e espero que encontre o seu
caminho. – Respondeu já desaparecendo por completo.
Após o Senhor da Luz desaparecer o homem sorriu, ergueu os
ombros e de uma forma fantástica começou a se transformar... Aos poucos foi
mudando por completo sua fisionomia, os cabelos foram de um branco para
negros encaracolados, o rosto foi tomando uma feição jovem, a pele de branca
foi escurecendo, até mesmo a altura foi aumentando, após se transformar o
ser ainda estava sorrindo, contudo, ainda mais alto, era como se ele estivesse
em um estado de alegria plena.
- Agora entendo porque aquele louco do Miguel e outros seres estão
confiando neste sujeito, afinal, ao que tudo indica ele realmente encontra-se
mudado, mas será até quando? – O ser se questionava, não deixando sua
alegria. – Espero que não me decepcione, porquanto, não sou de aceitar
ordens, e, foi por isso que o encontrei e testei sua mudança, espero que
continue, porque senão eu mesmo vou aniquila-lo mesmo que isto signifique a
punição mais severa do senhor, eu juro por tudo que é mais sagrado que eu
Rafael irei até o fim caso você saia da linha caro Senhor da Luz.
Já em outra dimensão o Senhor da Luz ouviu em sua mente estas
palavras, olhou em todas as direções esfriando todo o seu ser, achava que
Rafael estava ao seu lado, contudo, ao ver que ele não estava ficou
extremamente confuso, então, crendo que estava sendo seguido e que corria
perigo, iniciou seu plano de fuga de contingência, o qual era muito arriscado,
implicava simplesmente em mudar de dimensões de forma continua e
frenética, passando, inclusive pelo chamado inferno, e, quando estivesse
exatamente naquela, ficar um tempo, afinal, Arcanjos e outros seres evitavam
ali passar, não por medo, mas para evitar um embate com um demônio, o que
ele não temia mais devido aos vários que enfrentava diariamente, e, quando
sentisse que estava pronto, mudava novamente de dimensões de forma
continua e migratória, após retornava a terra e sumia em um submundo de
uma sala projetada com símbolos específicos capazes de afastar qualquer ser
que não pertencesse a raça humana, era algo muito confuso para todos, mas
que já o salvará até aquele momento, e, ele iniciou.
- Tenho que admitir que ele é inteligente, mudar de dimensões é
algo arriscado mais eficaz para fugir de um arcanjo ou qualquer ser celestial ou
maligno, contudo, hoje será em vão, já que não vou te pegar. – Rafael
conseguiu dizer ao Senhor da Luz quando este iniciou a migração entre às
várias dimensões.
- Isso não me interessa seu porco de Arcanjo, e, saiba que eu ainda
não te perdoei pelo que você fez a mim! – Respondeu o Senhor da Luz já
sumindo na vastidão das dimensões que mudavam freneticamente.
Rafael sorriu, e com uma feição de vitória, estranha para um ser
celestial, disse dessa vez para si mesmo:
- Fico feliz que não tenha esquecido, afinal, é assim que se
conquista respeito.
257
Após dizer estas palavras o Arcanjo abriu suas enormes asas, e, em
movimentos rápidos sumiu daquela dimensão.
Ao longe um homem que estava escondido sorriu.
Tenho mais um arcanjo em nossa causa. - Pensou Jorge um dos
guerreiros mais especiais do exército celestial ainda da evolução da alma
humana, ele era o principal parceiro de Expedito, lado outro, um pensamento
não saia de sua cabeça:
Mesmo que consigamos todos os Arcanjos e Anjos e demais, creio
que temos que ter um guerreiro estrategista, o qual terá que ser o principal
deles, tomara que Platão e Zoroastro consigam cumprir a promessa...
258
CAPÍTULO 66
Berlim – Alemanha, 1982
Quando o médico viu Estela não podia acreditar, aquilo realmente
era um milagre.
- Como é que você do dia para a noite deixa a cama e agora está ai
toda contente? – Disse o doutor tentando quebrar um pouco sua primeira
reação de espanto, a qual havia ficado evidente até um ponto constrangedor.
- É doutor, o senhor é um dos meus únicos amigos, por isto posso
lhe confessar que não sei como estou desta forma. Somente sei o que meu pai
me disse, mas não quero falar sobre isso.
- Entendo... – Respondeu o doutor desviando inconscientemente o
olhar, sabia que aquilo não estava correto, ele era quem havia feito todos os
diagnósticos nela após o acidente, os exames não mentiam, o estado em que
ela se encontrava era irreversível pelo menos no sentido de voltar a andar.
Somente a incapacidade de falar que parecia ser reversível já que não
descobriram danos. Contudo, a ética profissional não abria brecha para ele
ficar questionando, tinha que se ater ao seu trabalho, não a sentimentalismo e
incertezas de curas milagrosas. – A ciência sempre tem uma resposta! E vou
encontrá-la com os exames. – Pensou.
- Vamos ao hospital para eu lhe analisar melhor. Quando a Vilauba
me ligou somente havia me dito que era urgente, contudo, nunca imaginei que
seria tão serio assim. – Já se levantou estendendo às mãos como se dissesse
que tudo era muito sério. – Dessa forma o melhor a fazer é realizarmos todos
os exames para descartarmos qualquer possibilidade de reversão deste quadro
de melhora.
Ao dizer isto o doutor esperou receber uma negativa, por isto se
assustou com a prontidão da resposta de Estela:
- Sim doutor, vamos agora mesmo! Somente tenho que me trocar. E,
por gentileza, será que o senhor pode levar eu e a Vilauba, porque eu não sei
dirigir e meu pai não tem condições de nos acompanhar.
- Claro que sim, vou aguardá-las no carro. – Respondeu já se
virando, afinal, não queria que ela percebesse seu espanto pelo fato de seu pai
não lhe acompanhar.
Isso está muito estranho, afinal, Pierre é um dos pais mais presentes
que eu conheço, sei que ultimamente seu tempo parece custar milhões, tudo
pelo que vejo das notícias na televisão, onde tenho certeza que aqueles
clientes pagavam caro por um pouco de seu tempo, mas para Estela ele nunca
esteve indisponível, ainda mais em uma ocasião como essa. – Ele pensou já
abrindo a grande porta de saída.
Estela subiu às escadas contando com a ajuda de sua amiga e
segunda mãe Vilauba que lhe apoiava pelos braços. – O que será que os
exames vão apontar? – Ela pensava somente em seu íntimo, e logicamente
259
agradecia aos céus pelo fato do doutor ter feito aquela proposta, além de matar
sua curiosidade, era ainda uma oportunidade de ficar longe de seu pai, seu
principal objetivo naquele momento.
Contudo, mal sabia ela que no hospital os exames ao invés de lhe
darem paz, iriam é revelar algo que iria lhe tirar o sono pelo resto de sua, ao
que tudo naquele momento indicava, curta vida...
260
CAPÍTULO 67
Vilarejo na França / porto de Le Havre, 1982
Após um longo percurso mantido graças à ajuda do Senhor da Luz,
Damião havia finalmente chegado ao porto.
Estava maravilhado com todo aquele movimento, e ao ver o mar
ficou deslumbrado, afinal, já tinha um bom tempo que não o vislumbrava, e já
estava com saudades não apenas da vista, mas principalmente da brisa e do
cheiro, os quais sempre lhe encantavam.
Foi então perguntando há várias pessoas sobre o navio que zarparia
para o Brasil, e um velhinho magro e de corpo esguio lhe respondeu:
- Ele ainda não chegou meu filho. – E já saiu apressado como os
demais, sequer esperando por uma resposta, mas antes disto indicou com o
dedo a placa que o levaria ao local onde ele atracaria.
Damião seguiu a placa e avistou um grande cais, e, ao chegar mais
perto ficou maravilhado devido ao fato de não ter nenhum navio ali ancorado,
ficando somente um grande precipício, onde ele podia contemplar a imensidão
do mar.
Após algum tempo ali parado contemplando a beleza do mar, um
pensamento lhe veio: Como vou arrumar dinheiro para embarcar? Ele havia
revirado novamente a bolsa no caminho, e se certificou que realmente não
havia nenhum dinheiro ali, não por culpa do Senhor da Luz, por óbvio, o qual
ele sabia que por trauma nunca mais tocou em uma moeda...
Foi quando um senhor muito bem vestido, branco como a neve e
barba rala como a de um jovem, o que contrastava com sua idade já
avançada, que Damião em primeiro momento lhe atribuiu ter uns sessenta
anos se aproximou dele repentinamente.
Ele ainda percebeu que o homem segurava um grande charuto entre
os dedos cheio de anéis.
- Porque pensa tanto em dinheiro? – Questionou o homem como se
estivesse lendo os seus pensamentos.
- Como sabe que estou pensando nisto. – Respondeu Damião já
temendo ser algum ser maligno que teria algum poder de quebrar sua barreira
psíquica de pensamentos, ou captava ondas, etc...
- Todos pensam nele a todo tempo. Ainda mais quando mantém uma
expressão como a sua.
Damião se acalmou um pouco, a resposta eliminava em parte seu
temor inicial, por isto resolver questionar o sujeito, demonstrando
incredulidade, mas ao mesmo tempo tentando obter mais respostas, e, ainda,
porquanto, dispunha de muito tempo, além do fato de que conversar lhe
afastava a fome que já estava lhe afligindo:
261
- Você sabe ler pensamento somente analisando expressões?
- Não simplesmente isto meu amigo! Tenho a capacidade de analisar
cada ponto de sua expressão e de seus quase que imperceptíveis
movimentos, e após um tempo deduzir com grande precisão o que está
pensando.
- Então quer dizer que somente pela análise disto conseguiu concluir
que estava pensando em dinheiro? – Retrucou Damião já pensando em se
levantar e sair correndo, já que após a resposta estava desconfiando que
aquele cara fosse um perfeito charlatão, ou até mesmo algo pior, voltando a ter
como pensamento ser algum ser maligno que poderia querer o conteúdo de
sua bolsa, a qual apesar da falta de dinheiro continha uma gama de itens de
valores inestimáveis, por serem tão raros, eram amuletos e poções quase que
únicas na terra.
Mas antes de tomar a atitude de se levantar o homem lhe
respondeu:
- Quase... Isto era apenas uma das hipóteses de conclusão inicial de
tais fatores que já havia analisado. Normalmente eu puxaria uma conversa
antes, para somente assim concluir o correto, contudo... – O senhor fez uma
pausa olhando para suas vestes.
Bem que aquele engraçadinho do Senhor da Luz me falou, estou
realmente parecendo um mendigo. - Pensou Damião antes de lançar a dúvida
que lhe afligia desde a chegada daquele estranho e melhor definindo
excêntrico homem.
- Mas se sou tão maltrapilho assim, porque o senhor me analisa
tanto? Afinal, diante de minhas condições, e, analisando a qualidade de suas
vestimentas e ostentação material de anéis e demais bens e adornos materiais
em seus dedos e pescoço, é óbvio que em todas as hipóteses imagináveis
você não tem qualquer interesse em nenhum traço de minha pessoa, nem de
nada que levo, os quais são somente roupas velhas como eu estou vestindo!
Mentiu para tentar iludir que não tinha nada de valioso para que
aquele homem pudesse roubar em sua bolsa, e concluiu:
– Então, se quer realmente fazer alguma coisa, vai doar um pouco
de seu dinheiro para alguma instituição, quem sabe você ao invés de se vestir
como um príncipe, não ajuda Deus a cumprir com algum desígnio maior e mais
digno do que ficar analisando pessoas e caçoando delas por não terem
condições de se vestirem adequadamente conforme seu padrão ou vontade.
O senhor colocou o grande charuto no canto da boca, e, logo após,
Damião percebeu surgir um pequeno sorriso no outro canto de sua boca o qual
quase fez o charuto cair, era como se ele tivesse dito o que o homem queria
ouvir.
- Do que está rindo? – Questionou Damião novamente, desta vez
demonstrando sua indignação com o sorriso que a princípio lhe pareceu um
deboche.
262
- Mas é realmente isto que eu estou fazendo meu amigo. –
Respondeu o homem agora se sentando ao seu lado, como se quisesse iniciar
uma conversa. Damião ameaçou sair correndo, temendo que ele fizesse
alguma coisa, mas o senhor segurou forte em sua perna para que ele não
fugisse, e ele ficou com medo de lutar e cair ou fazer o homem que até aquele
momento não havia lhe feito nenhum mal no precipício daquele cais.
- Como assim? – Questionou Damião incrédulo com a resposta e
atitude do homem, que sentou em uma calçada toda suja ao seu lado, sem
qualquer cerimonia, e, que ainda, o segurou quando percebeu que ele iria
correr de medo.
- É muito simples. Sou um homem de muitas posses, mas tenho
convicção que Deus não quer o meu dinheiro, o que ele realmente quer é que
eu ajude o próximo! E isto não é feito somente materialmente, ou seja, através
apenas de dinheiro. Mas é procedido de amplas formas de amparo e carinho,
os quais podem ser exercidos diretamente, como ora estou fazendo, afinal,
você ao invés de dinheiro, poderia somente precisar de um apoio de alguém
para desistir de se matar neste abismo, seja porque sua mulher havia lhe
traído ou pela perca de um ente querido, ou seja, eu poderia lhe amparar de
várias coisas somente com uma conversa amiga, etc.
O homem bateu em sua cocha piscando, como se dissesse que ele
não esperava por aquilo, após prosseguiu:
- Além disso, com a doação de valores a templos sem a prévia
análise do destino, eu estaria beneficiando talvez falsos discípulos, os quais
poderiam até fazer com que meu dinheiro chega-se a algum necessitado,
contudo, infelizmente, a grande maioria destes homens ou instituições para
fazerem isto retirariam suas digamos “comissões”, o que dilapidaria
consideravelmente minha ajuda. E, o dito Deus continuaria ali, inerte, porque
não foi ele, mas eu que escolhi ter um interventor unicamente porque não tive
a coragem e humildade de vir diretamente ajudar os necessitados, o que as
pessoas fazem sempre, porque tem medo de perceber que conforme lhe falei,
na grande maioria das vezes os mais necessitados não precisam de dinheiro,
mas de carinho e atenção.
Damião estava boquiaberto. Aquela resposta havia lhe pegado de
surpresa, afinal, nunca esperava daquele homem uma verdade tão curta,
porém tão sábia, a qual foi articulada da forma mais suave de se chamar a
atenção para um fato que até aquele momento ele havia pensado somente em
reuniões com outros seres de luz.
O homem vendo a surpresa de Damião, resolveu arrematar:
- Ainda sei meu amigo, agora que analisei mais sua pessoa, que
você é um ser de extrema inteligência, porquanto, além de me responder com
verdade, dizia não possuir nada de valor, mas instintivamente apertava esta
sua bolsa contra o peito, demonstrando que ai há algo se não valioso
materialmente, pelo menos sentimentalmente. O que acho difícil, tendo em
vista que, pela análise de demais fatores, percebi que não tem esposa ou
família, e que aguarda neste porto não por dinheiro, mas pela oportunidade de
seguir adiante.
263
- Como concluiu isto? – Interveio Damião querendo saber como
percebeu sobre a missão. Afinal, qualquer deslize poderia colocar a perder
tudo pelo que estava lutando, o que consequentemente colocaria em risco
milhares ou senão todas às vidas na terra.
O senhor olhou bem no fundo de seus olhos, e após um suspiro,
como que se gabando por seu poder de percepção, decidiu revelar os motivos
que o levaram a promover mais aquela descoberta:
- É simples, após ter visto a forma que você agarrou instintivamente
a bolsa, percebi que nela se encontra tudo que necessita para chegar ao seu
destino, isto ainda foi aliado ao seu olhar, quando cheguei o senhor olhava ao
horizonte como se estivesse à espera de algo. Após algum tempo percebi que
não se tratava de uma pessoa, porquanto, seu olhar aliado a sua expressão
não demonstravam desespero por algo ou alguém, então decidi dizer missão,
o que aumenta consideravelmente as chances de acerto, afinal, uma missão é
algo muito vago, e, portanto, praticamente se encaixa em qualquer situação.
Mas após seu espanto, tenho que sua missão é algo muito importante, afinal,
pelo que percebi o senhor ficou inclusive com medo de eu ser uma espécie de
espião, o que me causa espanto, tendo em vista que o senhor não me parece
alguém perigoso ou que tenha desavenças capazes de lhe causar algum mal.
Além disso, através de sua resposta e da forma que raciocinou sobre minha
resposta, percebi que não é apenas culto, mas sábio! E, pela forma que falou
tive a certeza que é muito estudado, o que novamente contradiz com suas
vestes. Enfim meu amigo, ainda poderia ficar lhe analisando até descobrir sua
verdadeira missão, mas após estas analises acho melhor pularmos esta parte,
porquanto, meu objetivo não é ficar escarafunchando sua vida, a qual não é de
minha conta, mas lhe ajudar no que necessitar.
Damião abriu ainda mais a boca instintivamente, aquilo era
extraordinário, não tinha palavras para aquele poder de percepção, era como
poderes mágicos, mas ele percebeu que o homem dizia a verdade, ele
realmente somente fazia análises lendo o corpo do individuo e suas
expressões, isto era sim um poder, o chamado poder do ser humano de
desenvolver e levar suas capacidades cerebrais para além do normal, sem
com isto utilizar-se de qualquer poder sobrenatural, somente o cérebro, a
máquina perfeita dos criadores.
- Não se assuste meu amigo, não vou lhe fazer nenhum mal,
somente estou aqui para lhe ajudar no que precisar. – Disse o homem com voz
suave e colocando a mão direita no ombro de Damião, como se quisesse
confortá-lo. – E para não parecer mal educado, me chamo Pablo.
- Damião. – Respondeu rapidamente sorrindo pela primeira vez após
passar o espanto.
Na realidade, ao ser tocado por Pablo, Damião que havia prometido
somente utilizar seus poderes quando necessário, decidiu fazer uma exceção,
afinal, aquele homem poderia colocar em risco toda missão, podendo ser
algum aliado de Lúcifer querendo saber seu destino. Desta forma, após uma
analise profunda de seus sentimentos e de todo o ser daquele homem,
concluiu que ele era uma alma pura e bondosa, desprovida de qualquer
maldade, mas com uma força mediúnica que ele mesmo não conhecia, o que
264
fazia que seu cérebro trabalhasse além do normal. Razão pela qual, ele fazia
tamanhas observações, o poder realmente vinha de sua forma material, sem
qualquer poder sobrenatural, mas ele havia com isso libertado sua capacidade
mental superior ao homem médio.
Querendo puxar conversa até que o navio chegasse, Damião decidiu
finalmente tentar descobrir como um homem conseguia sem utilizar poderes
sobrenaturais, desenvolver tamanho poder cerebral, ao ponto de ser
desenvolvida uma percepção digna da mediunidade:
- Dei uma olhada e questionei pessoas aqui no porto, que me
disseram que o navio que eu pretendo embarcar sequer chegou ao porto.
Aguardo neste local porque afirmaram que é aqui que ele vai atracar. Tenho
que confessar que o senhor também acertou que terei uma nova vida neste
novo País, posso lhe dizer que vou ter que cumprir meus desígnios. Por isto,
disponho de algum tempo. O senhor poderia me dizer, lógico se quiser, e se
tiver tempo, como o senhor ficou tão rico, e, principalmente, como se tornou
tão sábio e com tamanhas habilidades?
Na realidade o que Damião queria saber era se aquela bondade toda
na verdade não seria fruto de uma consciência pesada, fato que sempre levou
os homens a serem bons, assim agindo, portanto, não por essência, mas para
tentarem na velhice se redimirem de um passado de maldade.
- Para o senhor disponho de tempo sim. E, não é vergonha nenhuma
dizer que ganhei toda a minha fortuna.
- Ganhou? Como assim, em algum jogo?
- Digo que sim meu amigo, em um jogo chamado ajudar ao próximo
e em contrapartida ser ajudado, como estou fazendo contigo neste momento...
265
CAPÍTULO 68
Londres, Inglaterra, 1982
Charles chegou à sua sala. Já estava naquele local há semanas,
havia ido a sua casa somente uma vez após aceitar o contrato, afinal,
anteriormente aos acontecimentos recentes ele já não era de ficar em casa,
visto que não havia nada ali para ele fazer, porquanto, nunca teve vida social,
e, achava que no complexo havia de tudo para ele, pois, tinham alojamentos
para os agentes e demais funcionários em todos os setores.
Além disso, como ocupava a chefia de seu setor, tinha um quarto
separado, até mesmo com uma pequena cozinha contendo frigobar e outros
luxos, o qual era limpo e abastecido diariamente por um senhor alto e
corpulento que cuidava dos afazeres domésticos de seu complexo, ele
somente retirava o pó do alojamento dos agentes, visto que estes preferiam
dormir em suas casas, contudo, tinha muito trabalho em seu quarto.
- Bom dia Sr. Ruber. – Disse Charles em tom amistoso ao sair do
quarto e ver que o senhor estava carregando alguns produtos de limpezas pelo
complexo.
- Bom dia Sr. Charles. Já limpei todo complexo, falta como sempre,
tão somente, vosso quartinho.
- É por isso que está carregando tantos produtos então! – Brincou
Charles com a sua bagunça.
Ruber sorriu, contudo, seus pensamentos se fossem externados
junto ao seu sorriso seria algo diferente, algo como: Seu traste, porco imundo,
vai fazer bagunça lá na sua casa! Se tiver uma!
Charles sabia que Ruber o odiava, mas o que poderia fazer?! Ele
gostava daquele local, e tinha a certeza que já estava se acostumando a
rotina, mas sabia que em breve teria que sair em missões, por isso, mantinha
seus agentes em um costume duro de treinamentos.
Mais adiante avistou os mesmos chegando aos poucos de forma
sonolenta no complexo, ao passo que um a um foram cumprimentando-o de
formas diferentes, afinal, nenhum de seus homens era igual ao outro, as
personalidades realmente ali borbulhavam.
- Onde está Dominik? – Questionou para um dos agentes.
- Não o vimos chefe, ele não veio no carrinho inicial, e, também não
está em nenhuma missão.
Nas primeiras semanas achei que pudesse ser somente a
preocupação de minha cabeça após a orientação de Arthur, mas Dominik tem
realmente me instigado com suas atitudes nestes dias, chegando tarde, e,
muitas vezes desligado. – Pensou Charles, logo dizendo para não deixar seus
outros agentes esperando-o perdido em seus pensamentos:
266
- Certo homens, quero que hoje interceptem o que as agências dos
governos, principalmente, o Britânico estão planejando, e, quero um relatório
sobre a minha mesa ao final do dia, além disso, desejo que entreguem as
fichas tanto médicas quanto do profissional de saúde física e mental desta
semana, visto que sei que em breve teremos alguma missão, e, assim, terei
que saber qual de vocês estão mais aptos.
- Nossa, mas o senhor quer de todas às agencias? Será muito
demorado. Além disso, o médico e o educador físico disseram que a Dra. Kim
somente liberou às análises dos médicos para amanhã, e, ainda tem o fato de
que a equipe de ciência da computação estar reparando o supercomputador
central, provavelmente ele somente seja liberado a tarde.
- Então quer dizer que terão mais tempo para promoverem as
interceptações pelo modo antigo, afinal, não será sempre que teremos tantas
regalias, sem contar com o fato de que com os equipamentos de que dispomos
atualmente isto se tornou muito fácil, e, quanto ao tempo restante que não
estarão, portanto, no médico e profissional de saúde física e no mental, quero
que treinem aquele novo armamento que a Dra. Kim enviou.
- Mas senhor, ainda estamos lendo o manual preparado, e, tenho
que lhe dizer que é enorme, tem mais de trezentas páginas, portanto, seu
manuseio será quase impossível para hoje! – Reclamou outro agente.
- Me desculpem se vocês estão sem tempo e parecem estarem
cansados, se quiserem posso ir à minha sala e preencher uns documentos
liberando vocês para férias, lógico de forma definitiva e sem remuneração.
- Não chefe, desculpe nosso relapso. – Tentou acalmar os ânimos
do chefe outro agente de nome Michael, ao perceber que Charles não estava
para brincadeiras aquele agente que tinha fama de ser muito calado decidiu
romper o silêncio e apaziguar as coisas.
- Isso mesmo, você disse certo Michael, relapso, afinal, estão em
total estado de reincidência do estado de calma incomum para agentes de
suas estirpes, e, para informação de vocês eu já li os manuais de todas as
armas, e, já fiz os manuseios de todas.
Para você é fácil, afinal, não tem vida fora deste local. – Pensou um
dos agentes chamado George externando um curto sorriso, por óbvio, não
exteriorizando tal pensamento em palavras, somente resolvendo dizer com o
sorriso ainda maior:
- Chefe, lhe prometo que hoje mesmo vou concluir todas as minhas
obrigações, e, tenho certeza que meus amigos também. – olhou para os
homens que afirmaram com a cabeça em concordância. – Caso contrário, não
sairemos daqui até que tudo esteja pronto.
- Espero... – Concluiu de forma descrente Charles.
De repente ouviram a porta bater, e, antes mesmos de se virarem
passos apressados seguiram pelo corredor, era Dominik que chegou de forma
assustada, tentando mesmo ainda ao longe se explicar:
267
- Me desculpe chefe, é porque dormi mais do que a cama.
- Pois compre um despertador. Os agentes vão lhe passar o que foi
dito por mim, visto que não tenho tempo para passar tudo novamente para um
displicente, além disso, creio que nem eles têm, mais deve ser que algum
encontre algum tempo, visto que estão até agora em minha frente.
Imediatamente os agentes se dispersaram, ao passo que Dominik foi
de encontro a um que tinha mais afeição, o mais brincalhão, certamente amigo
de todos George, buscando explicações:
- Porque Charles está tão bravo hoje?
- Não sei, mas tenho que admitir que também estejamos dando
motivo certo? Afinal, não estamos nos dedicando ao máximo neste novo
projeto, o qual ele está se dedicando exclusivamente, além disso, seus atrasos
tem sido recorrentes.
Dominik resolveu não responder, somente se dirigiu para sua mesa,
iria estudar o manual da nova arma, que sabia que Charles já havia cobrado,
após ele discutiria com algum agente o que mais deveria fazer, afinal, naquele
momento todos pareciam estarem nervosos com ele devido aos atrasos.
Mas o que posso fazer? Afinal, sei que não tenho escolhas... –
Pensou com descrença.
268
CAPÍTULO 69
Porto de Le Havre - França, 1982
- Não entendi? Como assim ganhou uma fortuna ajudando o
próximo? – Questionou Damião com cara de ceticismo devido à dubiedade da
resposta.
Pablo suspirou como quem iria iniciar uma longa história, e resolveu
iniciá-la:
- Eu nunca conheci meu pai, e minha mãe infelizmente faleceu
quando eu tinha apenas seis anos. Assim, eu e minha irmãzinha que tinha
apenas três anos à época, tivemos que ir morar com minha avó, em uma
pequena vila aqui perto do porto. – ele apontou com o dedo a direção. –
Devido à tenra idade, não tínhamos ainda a consciência da situação,
sentíamos a falta de nossa mãe, que era muito presente em nossa vida, talvez
até mesmo pelo fato de eu me lembrar que ela tentava suprir a falta de meu
pai, mas a realidade era que ela desempenhava bem a função de mãe e
trabalhadora, provendo com satisfação nosso lar e nos educando. Minha avó
era uma excelente pessoa, uma senhora que mesmo tendo quase setenta
anos à época, ainda trabalhava duro, não por opção, lógico, mas por
necessidade, tendo em vista que as coisas já eram difíceis para ela sozinha,
imagina com duas crianças...
Os olhos de Pablo começaram a marejar, e Damião ameaçou dizer
algo, mas foi interrompido pelo homem que prosseguiu, nitidamente querendo
contar sua história sem interrupções:
- Quando tinha seis anos, já comecei a ajudar minha avó. Ajudava
em tudo, bordado, fazer comida, cuidar de minha irmã, tudo. Ela dizia que eu
era o homem da casa, o que me fazia sentir-se a pessoa mais importante do
planeta. Por estar quase sempre ajudando minha avó, não tinha muito tempo
para brincar, pela manhã estudava, e no período da tarde desempenhava
minhas funções. Contudo, sempre antes de anoitecer, ela me mandava brincar
um pouco enquanto ela fazia o jantar, dizia ela querendo demonstrar
autoridade, mas com uma ternura que era inconfundível: “Vá brincar, você já
fez o almoço, tenho que fazer a janta para não perder a prática!” Muito alegre
eu saia correndo, e brincava até o anoitecer.
Pablo fez uma pausa, como se estivesse perdido naquele tempo, e
Damião desta vez não ameaçou interromper, queria ouvir aquela história,
ainda mais devido ao fato de que era contada com maestria, o que levava
Damião a imaginar todos os detalhes, como uma criança ouvindo as histórias
contadas pelos pais antes de dormir.
- Quando tinha apenas oito anos, já vim trabalhar aqui no porto. Eu
fazia de tudo, carregava pequenas bagagens, ajudava os marinheiros de
embarcações menores a atracar, etc. Mas nunca deixei a escola, esta foi à
imposição que minha avó fez para permitir que eu pudesse aqui trabalhar. Em
certo dia, em que eu devia contar na ocasião ainda com uns oito anos, ao
chegar ao porto pude ver ao longe um velho marinheiro sentado em seu barco.
Ele tinha a cabeça inclinada. Sempre tive este meu poder de análise, lógico
269
que não desta forma, mas foi o suficiente para perceber que o senhor agia em
atitude suspeita. No início eu me assustei, e pensei em correr e chamar
alguém, crendo ser algum marginal, mas após alguns segundos a mais de
análise, e, chegando mais perto, pude perceber que o ancião estava era a
chorar muito olhando para uma foto. Foi quando eu vi o rosto daquele senhor e
comecei a sentir algo estranho, como se eu já o conhecesse, isto mesmo!
Realmente eu já o conhecia. Eu conclui. Será que é daqui do porto? Me
questionava. Quando cheguei ainda mais perto e fixei o olhar em seus olhos
não tive dúvida, e cheguei até a dizer em voz alta minha conclusão: “É o
senhor que vi em meu sonho...”.
- Como assim o senhor que você havia visto em um sonho?! –
Questionou Damião somente para demonstrar interesse, porquanto, por seu
vasto conhecimento sabia que visões em sonhos podem ser o preludio para
fatos vindouros, quando a missão é muito importante, muitas vezes impostos
por anjos que querem certificar que a pessoa vai fazer aquilo para que estava
designada a cumprir, e naquele caso não era diferente, ao passo que ele teve
a confirmação com a resposta.
- Sim em meu sonho! Bem na noite anterior àquele encontro, eu
sonhei com a minha mãe, ela estava linda como nunca havia visto ela antes,
vestida de branco e com uma coroa de rosas na cabeça que reforçavam ainda
mais a beleza de seu lindo rosto. Ela apontava para o horizonte, e nele estava
aquele mesmo senhor, só que não em um barco, ele tinha ao seu redor
sombras negras, elas se moviam rapidamente, mas eu podia ver que em
alguns momentos elas tomavam algumas formas como se fossem humanas,
me olhavam e soltavam gargalhadas gritando: “Ele não vai conseguir, pode
tentar sua idiota!”, lembro perfeitamente que minha mãe sorria para mim e
acariciava meu rosto, dizendo para que não tivesse medo, lembro que a
questionei: “Mais mamãe, eles vão pegar aquele senhor! Eles são maus.”, ela
sorriu dizendo-me: “Pode ficar tranquilo meu bem, um amigo meu está
enviando um forte cavaleiro para salvar aquele senhor. E quanto aqueles seres
que estão perto dele, pode ficar tranquilo que eles não são maus, apenas
estão desorientados. Pode ser que após algum tempo eles retornem ao
caminho da luz.” Ela disse é foi sumindo, eu chorava muito devido ao fato dela
estar tão perto e ao mesmo tempo tão longe, perto porque estava sempre em
meu coração e pensamentos, mas longe porque seu beijo me fazia uma falta,
quando pensei nisto ela antes de desaparecer completamente abaixou-se e
beijou o meu rosto, tive a certeza que aquilo não era um sonho, porque senti
seus lábios macios realmente.
- Acredito veemente em você meu amigo. Também já tive esta
sensação. – Se solidarizou Damião.
- Contudo, meu amigo este sonho foi confirmado estranhamente
naquele dia aqui no porto, porque ao se aproximar ainda mais, além de ter
certeza de que ele realmente era o senhor do sonho, pude ver que tinha uma
arma na mão direita, que apontava para a cabeça, “ele vai se matar”, esta foi à
conclusão que fiz, ou seja, um tanto óbvia! – Disse ele olhando para cima,
como se aquela fosse à conclusão mais fácil que fizera em toda sua vida. –
Mas que minha cabeça de criança demorou algum tempo para raciocinar.
“Senhor, não faça isto!” Gritei, e para minha sorte ele escutou...
270
Pablo fez uma pausa e Damião viu escorrer uma lágrima, e não
conteve a curiosidade.
- Qual a razão das lágrimas? Ele não te ouviu e se matou! E você
uma criança inocente viu toda cena... – Disse Damião deixando cair os ombros
de tristeza.
Pablo enxugou a lágrima solitária com o indicador, e abrindo um
enorme sorriso decidiu responder:
- Acalme-se que minha lágrima é inteiramente de alegria! E meu
sorriso demonstra isto. Antes que me pergunte, posso lhe afirmar que daquele
instante em diante minha vida mudou, salvei uma vida o que para mim já era
gratificante, mas, principalmente, porque, além disso, eu ganhei um pai.
- Como assim pai, seu pai não havia... – Mas antes mesmo de
Damião terminar o questionamento Pablo interviu:
- Não meu pai biológico! Somente força de expressão. – Respondeu
com um sorriso. – Mas era como se o fosse... – Deu um suspiro perdendo o
olhar na imensidão do horizonte, obviamente relembrando do senhor.
Damião a partir daquele momento tinha a certeza que aquele senhor
havia sido mudado pelo ancião que ele salvará a vida no barco, mais algo
parecia ficar no ar, afinal, como um senhor em um pequeno barco fez com ele
tivesse enriquecido? Mas a resposta era simples, e ele iria se surpreender
ainda mais com aquela história do que ele imaginava...
271
CAPÍTULO 70
Londres, Inglaterra, 1982
Ao anoitecer Charles estava retornando para a sua sala após uma
saída rápida até o setor de saúde para se certificar pessoalmente que eles
analisariam seus agentes no dia seguinte, contudo, ao abrir a porta do
escritório levou um grande susto ao encontrar Dominik sentado lhe
aguardando.
- O que foi chefe, parece que viu um fantasma?
- Somente me assustei ao me deparar com você, afinal, nunca
recebo visitas inesperadas, as quais tenho que lhe dizer que não gosto nem
um pouco!
- Me desculpe, os agentes me mandaram trazer os relatórios, e,
ainda, afirmar que eles já terminaram de estudar a arma e que já manusearam
a mesma, amanhã terminam o treinamento.
- Certo, mas não precisava ter me esperado somente para isso, sabe
o esquema, anote na caderneta e saia. – Charles respondeu passando
diretamente por ele e se dirigindo rapidamente para sua cadeira.
- Sei chefe, mas é porque queria novamente me desculpar, estou
tendo alguns problemas familiares, e creio que não estou resolvendo os
mesmos de forma a separá-los de meu trabalho. – abaixou a cabeça em sinal
de culpa. – Mas isso não vai mais se repetir.
Problemas familiares, estranho, visto que ele nunca sequer disse ter
uma família, e, ainda, seu irmão nunca me falou nada também a respeito. –
Pensou cauteloso Charles, mas respondendo, obviamente diferentemente:
- Sem problemas, todos nós temos em algum momento problemas
familiares, ou melhor, - se entristeceu um pouco – quase todos, afinal, para os
que não têm família como eu este problema não existe. – fez uma pausa
pensando em sua vida – Mas lhe confesso que queria ter estes problemas... –
Ele não queria, mas o final de seus dizeres saiu até mesmo externando
melancolia extrema.
Dominik ficou sem palavras, aquilo foi mais do que inesperado,
afinal, nunca havia visto Charles ter falado qualquer coisa sobre sua vida,
quanto mais demonstrando sentimentos tão profundos.
- Pode se retirar Dominik, mas quero que se dedique mais, como lhe
falei, não sei o que é trabalhar pensando em problemas familiares, mas posso
lhe garantir que eles aumentarão caso você perca este serviço.
- Sim chefe, e, ainda, lhe agradeço por ter me recebido. –
Respondeu e já saiu rapidamente, com o pensamento aliviado: Agora sei que
ele não desconfia de nada, do contrário não teria se aberto desta forma.
Charles sorriu enquanto Dominik se distanciava, ele havia
conseguido:
272
- Agora estou certo que ele tem algo a esconder, e, ainda, me
abrindo deixei claro que ainda confio nele, assim, ele vai ter maior segurança,
e, com isso abaixar a guarda, quando menos esperar vou lhe agarrar. –
Concluiu dizendo bem baixinho para si mesmo, abrindo mais o sorriso e já se
dirigindo para seus aposentos, novamente, não para o seu pequeno e
conturbado apartamento, mais para seu quartinho ali mesmo, definitivamente
sua nova casa...
******
Charles estava com insônia, afinal, não sabia o que lhe esperava
naquela nova missão, a primeira após seu início naquele empreendimento que
se mostrava a cada dia muito maior do que esperava quando aceitou.
Será que Arthur sabe realmente quem é meu pai? – Este
pensamento não lhe saia da cabeça.
Rolou mais uma vez na cama, o que já havia feito muitas vezes
naquela noite, tentando encontrar um aconchego que não lhe privasse do
sono, ou pelo menos, que lhe proporciona-se maior conforto e, por
conseguinte, induzindo nem que fosse a um estado de descanso maior.
A vida é realmente um mistério, muito clamam por não saberem o
que se encontra oculta nos mistérios da vida, já eu, somente queria saber duas
coisas: quem é meu pai, e, ainda, meu outro pai, aquele que me criou para
aqui estar neste momento. – Ele gostava de filosofar em pensamento sozinho
na madrugada, muitas vezes pensando na essência de sua verdadeira
existência sob a terra.
Ainda clamando por querer ver a face não apenas de seu pai
terreno, mas acima disso, do criador, Charles finalmente rompeu a figura
sombria da insónia e adormeceu...
De repente iniciou um sonho, no qual viu que estava andando por
um corredor lindo, o qual somente tinha as paredes laterais se perdendo de
vista tanto o seu início quanto o seu final, e, ao olhar para o teto, percebeu que
ele também não havia, somente um maravilhoso céu.
Nas paredes percebeu haver muitas plantas e flores. Enfim, tudo
muito estático, ao ponto que ele andou admirando sem perceber um só
movimento.
Quando de repente ouviu um grave som, e ao virar-se viu um beija
flor voando rapidamente por todo local. Então, assentou em uma mureta lateral
vislumbrando o pequenino.
Após algum tempo assustou-se ao perceber que o pequeno ser
estava ao invés de sugar néctar literalmente criando de seu pequeno bico
seres como uma aranha que brotou de seu acúleo como mágica e o pequeno
aracnídeo não tardou em fazer uma grande teia.
273
Além da pequena aranha, do bico do pequeno saiu uma lagarta e
outros vários insetos...
Maravilhado e ao mesmo tempo assustado com tudo aquilo Charles
se espantou ainda mais quando a diminuta criatura alçou voo em sua direção.
Foi quando ele percebeu que estava totalmente despido de qualquer
vestimenta, ao passo que, ao olhar para suas extremidades, percebeu ainda
que lhe faltavam as pontas dos dedos.
De repente o pequenino ser se aproximou ainda mais tocando com o
pequeno bico nos locais onde faltavam, criando do nada, ou melhor, do todo,
tais membros faltantes.
Após encontrar-se totalmente pronto o beija flor alçou novo voo, mas
antes de partir parou plainando em sua frente, como se estivesse a olhá-lo, e
após alguns segundos voou para longe sumindo na imensidão do céu azul.
Neste momento Charles acordou, extremamente suado, mais uma
paz profunda instalou em seu ser...
- Percebi, finalmente, percebi... – Ele dizia ofegante com extremo
sentimento de elevação espiritual, e, como se tivesse retornado de uma
viagem para casa, a qual nunca teve naquele plano material, mais que pela
primeira vez, mesmo sem ter noção do sentimento diante da ausência de
parâmetros em sua vida, soube em seu intimo, ser aquele talvez o sentimento
mais puro e perfeito que teve desde seu nascimento, o da revelação...
274
CAPÍTULO 71
Porto de Le Havre - França, 1982
Pablo após um longo suspiro iniciou a desenrolar da sua história,
sob o olhar de atenção absoluta de Damião:
- Tudo iniciou naquele dia. Após eu ter gritado, o senhor parou e
abaixou a arma. Em primeiro momento era como se ele tivesse sentido
vergonha de eu tê-lo visto. “Por favor menino, saia de perto que eu tenho que
trabalhar com um instrumento do barco muito perigoso.” disse ele abanando a
mão para que eu saísse de perto do barco. “Não, daqui eu não saio!” Respondi
batendo o pé direito, como uma criança empacando. Não sei como respondi
isto, mas ainda bem que tive coragem de contrapor. Vendo que eu realmente
não iria embora, o senhor abaixou e começou a balançar a cabeça, em sinal
de reprovação, e misturado ao choro começou a resmungar: “não tem jeito
meu Deus, além de não me deixar partir com dignidade, ainda envia uma
criança para ser expectadora de minha fraqueza!”.
Pablo fez uma pausa, e seu olhar que ainda encontrava-se no
horizonte foi lançado a Damião, como se ele quisesse deixar claro o que
estava para falar:
- Meu amigo, você é a primeira pessoa que confesso isto em toda
minha vida, mas a verdade era que após ver aquele senhor ali resmungando
para Deus, eu fui entrando no barco, mesmo que não tivesse ao menos
raciocinado para fazer tal ato, era como se não tivesse controle sobre meu
corpo, e quando menos percebi já estava na frente do senhor. Ele também se
assustou ao erguer um pouco a cabeça e me perceber à sua frente, tanto que
deu um solavanco para trás, quase deixando a arma cair. “O que faz aqui
dentro menino? Já falei para ir embora!” disse ele escondendo o revolver nas
costas. Não sei explicar, mas inexplicavelmente me veio algo na cabeça, e eu
comecei a repetir, desta fez era por vontade própria, mas era como se as
palavras viessem e eu somente repetisse, então, de uma forma estranha falei
com aquela voz infantil inconfundível, onde me lembro até hoje de cada
palavra:
“Meu senhor, não vim aqui para assistir sua fraqueza, mas para lhe
oferecer a oportunidade de cumprir sua missão até o fim com a dignidade que
ora lhe falta. Além disso, pesadamente não é somente vossa mente que está
fraca, mas vosso espírito, e, por está razão está escolhendo este caminho que
entende ser mais fácil, mas que na realidade não será apenas o mais difícil,
mas será aquele que vai atormentá-lo, por isto posso tirar aquilo que lhe aflige
a alma induzindo este ato impensável, para que possa então raciocinar com a
razão.”
- Nossa! Você realmente foi profundo. – Damião disse perplexo.
- lembro-me perfeitamente que ao terminar de dizer isto, ou melhor,
repetir, tendo em vista que conforme lhe falei era como se aquelas palavras
estivesse sendo ditas em minha cabeça, até mesmo, porquanto, eu naquela
idade logicamente não teria a capacidade de dizer algo neste tom e
desenvoltura de diálogo e poder de persuasão. Assim, após me recordo
275
perfeitamente que de uma maneira totalmente irracional e desprovido de
vontade própria soltei um enorme grito de fúria que fez o velho se sobressaltar
de susto, lado outro, o que mais lhe assustou não foi meu grito, mas o fato de
que após o urro ele percebeu sombras saindo rapidamente de perto dele e
pareciam que haviam pulado do barco diretamente na água, ele se levantou
me deixando ali estacado, e foi olhar o que era, mas ao chegar e ver somente
bolhas subindo da água, ele me disse em conversas futuras que lhe arrepiou
todos os fios da cabeça.
- Realmente ele estava na presença de algumas coisa muito ruim. –
Damião afirmou.
- Após, somente me lembro dele retornar de perto da borda do barco
e começar a me sacudir, e, quando voltei a si, ele me questionava assustado:
“O que era aquilo perto de mim? O que era aquilo perto de mim?” e ao
recobrar minha consciência comecei a gritar que não tinha ideia do que ele
estava falando, foi quando ele me soltou e começou a andar pelo barco
batendo na cabeça dizendo “O que eu iria fazer com minha vida meu Deus?
Sei que tenho pouco tempo, mas nunca me perdoarei por ter tentado retirar
aquilo que vossa Graça me concedeu com vosso amor.” foi quando percebi
que ele não iria mais se matar, e que estava naquele momento somente
perdido em seu pensamento de culpa pelo ato que quase havia praticado.
- O que você falou para ele depois? – Damião estava realmente
curioso.
- Nada, não disse nada. Simplesmente com a inocência de criança,
virei às costas e fui sorrateiramente saindo da embarcação, foi quando escutei
um grito de alegria e em exaltação ouvi o senhor me dizer: “Minha criança,
você salvou minha vida, e ainda parece que tirou tudo de ruim que estava me
afligindo, me sinto renovado. Como posso lhe ajudar?” novamente com a
inocência de uma criança, somente supliquei: “Não conte para minha avó o
que aconteceu aqui, porque senão ela não permitirá mais que eu volte para
trabalhar!” quando terminei de falar já fui agarrado pelo senhor, que me ergueu
somente com um abraço demonstrando sua força que contrastava com sua já
avançada idade, me beijando a face, após um longo tempo, quando eu já
estava ficando assustado com tamanha gratidão, ele me colocou no chão, se
agachou e olhando em meus olhos me respondeu sorrindo: “Trabalhar? A
partir deste dia meu jovem, você não vai mais trabalhar neste porto!” quando
eu já estava me assustando com aquela afirmação, pensando que ele iria de
alguma maneira me privar de laborar e assim ajudar minha avó, ele disse algo
que de início eu não poderia nem acreditar...
Pablo começou a chorar muito, realmente aquela era uma história
que ele parecia que nunca havia contado para ninguém, era como se ele
estivesse remexendo em um baú antigo e ali se encontrava fotos de sua
família que há muito tempo não via, e que trazia de volta todas as recordações
maravilhosas.
- O que ele te disse meu amigo, para te deixar tão emocionado até
hoje? – Questionou Damião acariciando as costas do senhor, em sinal de
solidariedade com seus sentimentos.
276
- Primeiramente, ele me questionou: “Você somente tem sua avó?”
respondi que havia também minha irmãzinha, e de uma forma estranha
desabafei com ele que havia perdido minha mãe e que meu pai morreu quando
eu era muito jovem, e, ainda, que minha avó somente permitia que eu ali
trabalhasse após os estudos, etc.
- O que ele lhe respondeu?
- Ele sorriu me dizendo e passando a mão direita embaixo de meu
olho no qual já brotava uma lágrima: “A partir deste momento, lhe devo minha
vida, que não é muita coisa, porque tenho uma doença incurável, mas sei que
Deus me dará forças para lhe ensinar tudo que sei, lógico se estiver
interessado.” balancei a cabeça em afirmação, pensava que ele iria aceitar
meus trabalhos no barco, e, assim, vislumbrei a oportunidade de ajudar ainda
mais minha avó tendo um trabalho fixo. “Eu aceito ajudar o senhor em seu
barco!” eu disse a ele demonstrando minha inocência, e meu desconhecimento
em negócios, afinal, antes da proposta aceitei aquilo que sequer foi cogitado,
e, ainda, sem discutir qualquer remuneração, ou seja, uma total demonstração
de que aceitaria qualquer proposta. Contudo, o que ele tinha a propor sequer
passaria por minha cabeça...
Fez uma pausa voltando o olhar para o horizonte. Mas voltou
novamente a relatar sua história, afinal, além de querer contá-la parecia que
seu novo amigo estava muito feliz em ouvi-la.
- Ele me disse: “Vou lhe ensinar tudo o que sei, mas em troca não te
darei de imediato nenhuma remuneração, você topa?” lembro-me direitinho
destas palavras de questionamento ansiando pela resposta correta. Eu
realmente era muito pequeno, até hoje não sei se naquele instante o respondi
realmente tendo consciência do que estava a aceitar, mas parecia que estava
sendo conduzido a dizer: “Sim, claro que aceito!” e ainda completei dizendo:
“Minha avó sempre me diz que o aprendizado é a melhor remuneração.” foi
quando percebi as lágrimas escorrerem pelo seu rosto já enrugado, ele me
ergueu novamente, beijou minha face e me disse demonstrando extrema
emoção: “O senhor atendeu minhas súplicas, me enviou o filho que sempre
sonhei. Prometo-te que além de ser o homem mais rico, será o mais sábio!”.
- Ao ouvir isto meu coraçãozinho de criança quase parou, minha
mente não processava o que estava ocorrendo. Seria verdade? Questionavame. Somente regressei de meus pensamentos quando ele me desceu ao solo
com ternura, pegou em minha mão e pediu para que o levasse até minha casa.
No início eu hesitei, afinal, era muito novo, mas já tinha uma certa malícia que
havia adquirido após vários golpes que levei no porto, o principal deles era
ajudar marinheiros que me pagavam com um pequeno peixe. Mas não tinha
jeito, aquele senhor estava tão determinado em seus intentos, que soube
naquele instante somente através de seu olhar direto aos meus pequenos
olhos que qualquer coisa que eu fizesse não iria fazê-lo mudar de ideia.
- Ele realmente foi à sua casa? – Damião estava espantado.
- Sim, e ainda no caminho ele elogiou muito minha avó, dizendo que
ela havia me educado muito bem, acrescentei que minha mãe também me
ajudava muito, ele sorriu proferindo que era lindo a forma com que eu ainda
277
lembrava com ternura e consideração por minha mãe. Quando chegamos à
vila, notei que ele estava olhando tudo com muito espanto, era como se ele
tivesse entrado em outro mundo, do qual parecia não gostar nem um pouco, foi
quando notei que ele começou a chorar.
- Chorar?
- Sim chorar meu amigo! “Porque chora meu senhor?” questionei a
ele com a inocência infantil, afinal, eu já estava acostumado à pobreza, mas
para uma pessoa que ali não havia antes adentrado era como chegar em um
novo País desconhecido, onde crianças brincavam próximo ao esgoto, as
casas eram verdadeiras taperas, e os habitantes realmente ali não viviam,
somente sobreviviam...
278
CAPÍTULO 72
Londres, Inglaterra, 1982
Na manhã seguinte quando Charles acordou levou um susto ao
descer e se deparar com todos os seus agentes já no centro de treinamento.
Foi descendo as escadas ainda se espreguiçando, quando se assustou ainda
mais ao perceber que Arthur estava sentado em uma cadeira observando-os
treinar e ainda dando algumas dicas.
Cautelosamente Charles foi se aproximando do centro, e quando
menos esperava Arthur logo lhe contemplou com seu ar de entusiasmo:
- Bom dia meu caro!
Antes de adentrar no complexo de treinamento Charles acenou com
a mão para que os agentes deixassem o lugar, para que eles pudessem
conversar, sabia que havia algo de errado. Os agentes rapidamente
começaram a sair, mais antes do último deixar o setor Charles o segurou pelo
braço questionando de uma maneira estranha mais direta:
- Porque estão aqui tão cedo, e, ainda por cima com ele?
- A secretária dele nos telefonou de madrugada, dizendo que era
para estarmos aqui para antes do senhor acordar, pensei ser pela manhã, mas
eles disseram para virmos naquele momento, fiquei primeiramente assustado
como o senhor acorda cedo, mas agora vejo que é verdade. – o agente olhou
para a toalha na mão de Charles. – O senhor vai nadar?
- Pelo visto a resposta correta pelo que eu vejo era que eu realmente
“iria nadar”, visto que estou pressentindo que haverá mudança em meus
planos. – Respondeu soltando o braço do agente e indo logo na direção de
Arthur.
- Vejo que estraguei seus planos? – Arthur foi quase irônico.
- Não. – Charles foi seco.
- Tem algo de errado com você Charles?
- Não, somente não sou muito de falar quando acordo.
Arthur sorriu, havia mais uma semelhança sua com Charles, ele
também já teve várias mulheres que disseram que ele era rabugento pela
manhã, por isso fez a escolha de dispensá-las na noite mesmo, dizia que iria
sair de viagem, mas ia para outro quarto deixando que elas dormissem na sua
suíte de luxo, somente para que não pudessem reclamar no dia seguinte.
- O que o senhor pretendia ao dar ordens a meus agentes desta
forma?
- Seus agentes não. Nossos agentes. – o velho disse olhando nos
olhos de Charles. – Temos que sair o mais rápido possível.
279
- Mas para onde?! – Charles questionou demonstrando certa
exaltação, e, também um pouco de vergonha pela forma que expressou
anteriormente sua indignação.
- Você somente saberá quando chegarmos. – Arthur respondeu em
um tom não de mistério, mas firme, como se não quisesse discutir aquilo.
Charles muito inteligente, e já conhecendo o velho, decidiu não
questionar.
- Escolha dentro de sua equipe alguns homens, vamos partir em
duas horas, por isso quero que tome café agora para que até que nós
tenhamos saído já ter feito à digestão, visto que, segundo me consta, você
enjoa em jatos, e posso lhe garantir que nesse será pior, visto a sua
velocidade não ser comum.
Charles deu de ombros, odiava que os outros falassem sobre aquilo,
afinal, somente vomitou uma vez, e era em um simulador gravitacional para
uma missão, não em um jato, mas preferiu desconversar e mudar de assunto:
- Quantos homens o senhor acho que vamos precisar.
- Pode escolher dez, peço que coloque aquele grandalhão negro, ele
é muito habilidoso.
- Sim, é o Robson, ele é brasileiro e muito bom com bombas e outras
peripécias, além de ser muito dedicado. – Charles ficou feliz que algum dos
homens tenha agradado o velho, porquanto, pela forma que ele estava
olhando todos ultimamente, como um pai que desagrada às atitudes do filho,
ele estava receoso.
- Coloque também aquele russo louco e temperamental. – Tornou
Arthur.
- Não sei se isso vai funcionar, tenho que lhe advertir que ele e
Robson não se dão muito bem!
- Por isso mesmo. – Arthur respondeu já se levantando e saindo.
- Não entendi?! – Charles teve quase que gritar, ao passo que Arthur
parou e olhou-o com um alhar estranho, parecia que não iria responder nada.
Contudo, após algum tempo ele voltou somente alguns passos e começou a
passar um verdadeiro sermão:
- Pois bem meu caro Charles. Por óbvio eu já havia percebido isso!
Assim, quero testar os dois e ainda fazer com que trabalhem em equipe, do
contrário teremos que dispensar um deles, porquanto, você já deveria saber
que não podemos nos dar ao luxo de ter entre os homens alguns com
desafetos entre si, isso poderá custar à vida de todos em uma situação...
digamos... mais perigosa!
- Certo... – Charles respondeu quase que deixando transparecer um
sorriso, mesmo após a bronca, e, espantando sua rabugentíssima
personalidade matinal, havia tomado uma confiança extrema nas decisões de
280
Arthur, ele parecia um líder nato, em alguns momentos ele pensava o porquê
daquele velho ainda o manter ali, afinal, o mesmo poderia comandar facilmente
uma equipe sem qualquer ajuda. Contudo, sabia que ele tinha outros afazeres.
- Estamos combinados?
- Sim senhor Arthur, no horário marcado estaremos aqui prontos lhe
esperando.
O velho foi saindo, ao passo que quando já estava bem próximo da
porta lembrou-se de algo, virou-se e gritou para Charles que deu um pulo de
susto:
- Não fiquem aqui, vão direto para o heliporto, e lembre todos de
levarem os escudos como combinado, e, ainda, conforme havia solicitado que
treinassem, creio que vamos precisar não apenas deles.
Charles somente acenou com a cabeça positivamente, mas seu
corpo estava tremendo de raiva, ele odiava carregar coisas penduradas em
seu corpo, ainda mais um escudo.
É certo que ele é um pouco leve e pequeno para se carregar, isso
após a Dra. Kim e sua equipe ter desenvolvido a meu pedido um dispositivo
que faz com que eles diminuam seus tamanhos para transporte, e, somente
aumentem para o combate, Arthur achou que isso poderia nos colocar em
risco, e não deve estar muito errado, visto que caso o dispositivo falhe
estaríamos perdidos. – sorriu a se recordar dos acontecimentos sobre os
escudos. – Após a doutora ter quase agredido o velho devido a sua quase que
afirmação de incompetência por parte daquela de desenvolver o produto, creio
que não teremos problemas, afinal, ela garantiu que ele estava completamente
livre de falhas. – Se recordou pensando no drama que seria levar um
trambolho nas costas e lembrando-se da cena inusitada no dia da briga da
franzina mulher testando os escudos com Arthur. – Ela atirava nele certamente
querendo que os dispositivos falhassem. – Sorriu novamente com as
lembranças.
Os homens começaram pouco a pouco chegarem novamente, havia
percebido a saída de Arthur e estavam regressando para saberem as ordens.
Quando todos estavam presentes, Charles começou a dar ordens:
- Temos uma viagem às pressas...
- Para onde iremos chefe? – Interrompeu George um dos agentes
que certamente era o mais comunicativo e brincalhão.
- Não sei, somente tenho a informação de que vamos. Mas não
iremos todos, somente dez de vocês mais eu. O restante de vocês quero que
interceptem um satélite americano e um britânico, após peguem um dispositivo
com a Dra. Kim e insiram como ela ordenar nestes satélites, seguindo as
coordenadas dela vocês vão nos localizar, após quero que sigam suas ordens
sem hesitar.
281
- Mas somos muitos para trabalharmos somente nesta interceptação.
– Tornou um dos agentes. – Além disso, os homens que estão em campo na
China retornarão hoje, e teremos ainda mais homens aqui.
- Quero que trabalhem em equipe, um ajudando ao outro, após
peguem com a doutora as outras armas que pedimos na semana passada, e
iniciem o treinamento, e, quanto aos que chegarem ajudem-nos a alcançar
vocês nos testes e demais, afinal, eles estão atrasados.
- Mais quem irá chefe? – Novamente George questionou para variar.
- Serão os dez na ordem que eu já havia classificado anteriormente,
somente haverá uma troca, o Robson irá conosco no lugar da Raposa.
A mulher, uma das únicas da equipe, que atendia pelo codinome
Raposa, quase fuzilou Charles com os olhos azuis frios que possuía.
- O senhor acha que não sou capaz chefe?! – Ela disse externando
ainda mais sua indignação.
- Não seja boba agente, sabe muito bem que lhe trato como todos os
outros, e, ainda, com mais responsabilidades, visto que tive que me arriscar
por você quando os homens não acreditaram que você era capaz. Contudo, a
Dra. Kim é uma mulher muito geniosa, e, creio que ouvira mais uma pessoa
como você aqui com os homens. Ainda, tem o fato de que Arthur pediu o
acréscimo do Robson pessoalmente.
A mulher se acalmou, dando um passo para trás e abaixando a
cabeça, contudo, naquele momento foi Russo que ficou louco, demonstrando
que não era chamado assim pelos amigos à toa, e, com seu olhar de louco
começou a olhar para Robson que retribuiu o olhar de desagrado pela escolha.
- Mas chefe, o senhor sabe que não suportamos um ao outro. –
Disse russo ainda encarando Robson que como sempre preferiu ficar calado.
- Por isso mesmo vão vocês dois. – Charles foi categórico já se
levantando para ir para seus aposentos para trocar e, principalmente, comer
algo, devido aos enjoos que já estava sentindo somente de ter relembrado
aquela noite no simulador gravitacional, sabia que não enjoava como os outros
diziam, mas não poderia arriscar.
- Mas chefe não estou entendendo, o senhor sempre respeitou
nossas personalidades, colocando cada agente trabalhar com aquele que
nutre mais afeto, tudo para sair um trabalho mais agradável. – Tornou Russo
que não deixava dúvidas sobre sua discordância com a escolha.
Charles chegou bem próximo dos dois, queria que eles ouvissem
para não questionarem:
- Certo, então me responda se quando tivermos que trabalharmos
todos em conjunto como iremos fazer? E se em campo de batalha tiverem que
lutar ao lado e proteger um ao outro como irão proceder? Respeitava-os até o
limite que entendi que estamos em outra realidade, visto que pelo que me
parece teremos que trabalharmos ainda mais em equipe, e, por isso, terão que
282
saber que equipe é como um todo, e se eu ver que as diferenças persistirem
após está viagem será feito um confronto, onde o melhor ficará, e o outro terá
que deixar a equipe. – Após este sermão saiu deixando para trás somente um
burburinho formado imediatamente.
O famoso Russo louco não parecia mais tão louco, após a
advertência, demonstrou sua humildade e qualidade em sopesar o que poderia
significar a aniquilação de um dos dois na equipe, levantou-se e fez o que já
deveria ter feito anteriormente, estendeu à mão direita em cumprimento a
Robson, dizendo:
- Me desculpe por aquela noite na Rússia, sei ou pelo menos quero
pensar que você não queria mexer com a minha família.
Robson não pegou nas mãos de Russo, e saiu às pressas da sala
em direção ao vestiário, ainda guardava magoas do antigo parceiro, afinal,
perdeu seu grande amor por uma crise estúpida daquele que ele considerava o
mais idiota de todos os tempos, não sabia como sua amada poderia ter
nascido do mesmo ventre daquele ser tão desprezível.
- Deixe ele respirar um pouco Russo, o Robson não vai esquecer
rapidamente o fato de você não ter aprovado o relacionamento dele com sua
irmã, mas sei que isso não vai atrapalhar em sua escolha profissional, não
creio que ele deixará que vocês coloquem em risco o futuro de ambos na
equipe. – Disse, como sempre George o falastrão, com um sotaque italiano
somente para trazer alegria ao grupo, como se fosse um apaziguador,
colocando suas mãos no ombro do companheiro tentando confortá-lo.
Os outros agentes foram saindo aos poucos, puxados pelo calado e
centrado Michael.
- Não sei não meu amigo, creio que tomei a decisão errada. Sei no
fundo de meu ser que Robson não apenas amava ela, mas ainda a ama... –
ele fez cara de desanimo. – Contudo, não poderia ter deixado que ela se
envolvesse com alguém que amanhã poderia deixá-la desamparada. – Tentou
justificar-se Russo.
- O que o irmão de sua esposa, ou seja, seu cunhado fala do seu
relacionamento? – Tornou George para espanto de Russo, demonstrando que
não era somente de brincadeiras que ele entendia.
- Nada. Mais isso não é o mesmo, afinal, eles não sabem o que faço,
e, eu sabia o que Robson fazia.
- Por isso mesmo, eles não lhe conhecem, mas você conhece
Robson, e sabe que ele poderia até mesmo não ser o melhor homem do
mundo somente em razão de seu emprego de risco, contudo, seria o melhor
marido e pai para seus futuros sobrinhos, afinal, você mais do que ninguém
conhece a índole do seu antigo parceiro de trabalho.
Russo abaixou a cabeça, agora ele estava assimilando que poderia
realmente ter errado.
283
Após perceber que o famoso Russo louco estava começando a
entender que errou, e, pelo menos estava assimilando seu equívoco, George e
mais alguns dos agentes que estavam ainda aguardando na conversa foram
para o vestiário, e os demais que não iriam àquela missão seguiram
diretamente para a sala de inteligência, para iniciarem os preparativos para
interceptação dos satélites.
Russo ainda pensativo também se dirigiu para o vestiário, sua
vontade era dizer para Charles que não iria mais, mas sabia que o chefe não
aceitava desistências...
284
CAPÍTULO 73
Porto de Le Havre - França, 1982
Damião notou que ao relatar a sua chegada à vila em que morava o
até então estranho senhor começou novamente a chorar muito, parecia que se
lembrava até aquele momento da extrema pobreza pela qual passou.
Contudo, o senhor era forte, enxugou novamente as lágrimas e
prosseguiu no relato de sua vida, e, para surpresa de Damião aquilo era
somente o começo de uma história fantástica...
- Quando chegamos à porta de minha casa, soltei minhas
pequeninas mãos das do senhor e sai correndo para abraçar minha avó que
estava costurando próximo à pequena porta de entrada da nossa taperinha, e
quando olhei para sua face levei um susto, porquanto, ela olhava para o
senhor como se estivesse vendo um fantasma. “O que foi vovó, este é um
senhor que prometeu que vai nos ajudar, por esta razão é que o trouxe à
nossa casa.”, mas mesmo após os meus dizeres minha avó não mudou o olhar
fixo no ancião, quando olhei para trás notei que o senhor tinha o mesmo olhar.
“O que está acontecendo vovó?” lembro-me de ter questionado à época, já
tremendo de medo daquele senhor ser uma pessoa má. Foi quando para meu
espanto o senhor questionou gritando bem alto o nome de minha avó “Maria?!”
“eles se conhecem” raciocinei à época naquele momento o óbvio, e, após
algum tempo tive a certeza quando ela revidou o questionamento gritando em
mesmo tom “João?!”, “realmente eles se conhecem” havia concluído naquele
momento, mas seria ainda mais surpreendente os motivos...
Pablo não havia parado de narrar a história, somente fez uma
pequena pausa, mas Damião estava tão ansioso que quando ele havia
fechado a boca foi logo dizendo:
- Não pare! Agora estou ainda mais curioso.
Pablo sorriu, agora tinha a certeza que seu novo amigo estava
realmente muito interessado em saber sua história de vida.
- Me lembro de que minha avó me pôs de lado, levantando-se e indo
de encontro ao senhor que quando notei também vinha se encontrar com ela
ainda com o mesmo olhar. Quando os dois se encontraram, se olharam por um
longo tempo, e, após para minha surpresa veio um beijo, não um simples beijo,
mas algo mágico, do qual eu como criança somente via no porto nas
despedidas e reencontros, e, assim, logo percebi que aquele era um
reencontro, e que reencontro...
- Eles eram namorados? – Questionou Damião perplexo. Aquilo era
muita coincidência para ele, encontrar um senhor que estava prestes a se
matar, ajudá-lo, ter uma promessa de ajuda de ganhar uma melhoria nas
condições de vida, levá-lo para casa e este ser o namorado de sua avó que
pareciam não se verem a anos, era realmente algo fantástico.
- Após o encontro eles me contaram a história de como se
conheceram, a qual realmente não era das melhores, minha avó trabalhava
para a família de João quando ambos contavam com apenas vinte e poucos
285
anos. Eles começaram a namorar escondidos, porquanto a família de João era
muito rica, e já haviam escolhido uma mulher da nobreza para ele casar, e,
assim, unirem duas linhagens de nobres. Em certo dia eles resolveram fugir,
mas minha avó não apareceu no lugar combinado, ele vendo que ela sumiu,
procurou por ela por todos os cantos, e por vários anos, mas quando percebeu
que realmente havia sido abandonado, ele voltou para casa, aceitando a
imposição de sua família, casando-se com a nobre, a qual não pôde lhe dar
nenhum filho, e, ainda, morreu muito cedo. Ele nunca se casou novamente,
dizia sempre que estava esperando o retorno de sua grande amada, e parece
que finalmente havia chegado a hora.
- Mas porque sua avó não apareceu no lugar combinado? –
Questionou Damião até chegando para frente para melhor ouvir a resposta que
tanto ansiava. Não chegou muito, porquanto, se assim o fizesse caia no mar.
- Na ocasião me lembro de cada palavra que ela falou, afinal, elas
até hoje estão em minha cabeça: “João, quero que saiba que meu amor por
você era tão grande, que não conseguiria viver com o peso na consciência de
que você largaria com aquele ato uma vida de luxo para viver na miséria ao
meu lado.”.
- Nossa, sua avó realmente o amava.
- Se acha que isso era amor, espere então para ver a resposta do
João a qual em minha opinião foi ainda mais profunda, foi exatamente dessa
forma: “Mas Maria, quando você me deixou, definitivamente não restou mais
vida, e o luxo era ainda mais atormentador, porque me fazia lembrar que havia
perdido meu grande amor somente pelo fato de ter nascido em uma família
rica. Assim, segui meu caminho somente com a matéria corporal, porque
minha alma e minha razão de viver partiram com você naquele dia.”, após isto
minha avó desabou a chorar, até aquele momento creio que ela não tinha a
consciência do tamanho do amor de João por ela, e que havia feito à escolha
errada, afinal, era certo que ela com aquele ato queria resguardá-lo, mas na
realidade lhe prejudicou durante uma vida inteira.
- Nossa. Este senhor devia realmente amar sua avó. Mas tenho que
confessar que acho que sua avó fez com este ato uma linda demonstração de
amor, afinal, somente o deixou porque tinha a certeza que aquilo era o melhor
para ele no momento. – Disse Damião interrompendo, estava tão fascinado
com a história que necessitava expressar seus pensamentos.
- É meu amigo, mas ainda não acabaram às surpresas... – Disse em
tom de mistério, evidenciando que aquilo era somente o começo do
surpreendente desfecho da história, e logo emendando:
- Minha avó começou a chorar muito. Eu a conhecia muito bem, e
soube na hora que aquele choro não era mais de alegria, mas de completo
desespero. “Acalme-se meu amor, te perdoo por tudo!” lembro-me que João
disse a ela tentando acalmá-la. Só que ele não sabia que a resposta iria lhe
paralisar por um bom tempo. Minha avó tomou folego, olhou diretamente nos
olhos dele respondendo-o ainda com a voz rouca e engasgada “Você me
perdoaria até mesmo por lhe ter retirado à oportunidade de ter criado sua
filha!” minha mente infantil naquela oportunidade não soube processar a
286
resposta de minha avó, mas certamente João a processará instantaneamente,
porquanto, me lembro de sua expressão de espanto inicial a qual após algum
momento deu lugar a um olhar fixo para mim. “Não entendo.” lembro
perfeitamente de ter dito a ele, porquanto pensava que havia feito algo de
errado para receber aquele olhar. Ele voltou os olhos para minha avó e já
tentando segurar o choro questionou-a: “Então quer dizer que este menino é...”
mas antes dele terminar minha avó completou: “Sim, ele é seu neto.”.
- Nossa! – Damião gritou de emoção, contudo, somente ficando
nisso, visto que o deixou terminar.
- Deste momento em diante me lembro que João, ou melhor daqui
para a frente meu avô, mantinha ainda a mesma expressão de espanto,
contudo, de seus olhos desceram lágrimas em abundância! Era como se ele
estivesse por dentro sendo consumido por uma explosão de sentimentos
inexplicáveis, os quais somente era exteriorizado pelas lágrimas. Recordo que
ele se levantou com dificuldade, suas pernas tremiam, então veio tropeçando
ao meu encontro. Quando chegou perto se abaixou me enlaçando em seus
grandes braços, meus braços ficaram para baixo, e ele me apertou fortemente
contra seu peito, ao passo que senti até mesmo meu ombro molhar devido as
suas lágrimas que escorriam como uma cachoeira.
Damião agora enjugava suas lágrimas, não aguentou a história e
estava muito emocionado, não sabendo ainda que iria se emocionar ainda
mais...
- Após um longo tempo que não sei precisar, ele segurou em minha
cabeça e olhando no fundo de meus olhos inocentes disse algo que nunca vou
me esquecer: “Hoje pensei que iria acabar com minha vida, contudo, Deus
tinha outros planos para mim, dos quais até este momento não tenho ainda
dimensão se é realidade ou apenas um lindo sonho. Ele enviou não apenas
um pequeno anjo, mais aquele com meu sangue para me encontrar no
caminho da perdição. Não vou responder para a sua avó se a perdoo, porque
sei que no fundo ela sabe que não tem nada há ser perdoado, e que meu amor
por ela é o mais profundo e maravilhoso dos sentimentos, aquele que me fez
nesta altura de minha vida ter em meus braços meu herdeiro e salvador. Te
amo tanto meu neto!” terminou me dando mais um enorme abraço. Em poucos
segundos meu cérebro infantil começou a racionar e processar o que estava
acontecendo, quando finalmente tive consciência de tudo, desvencilhei meu
braços, e abracei seu pescoço, recordo-me que as lágrimas desciam pelo meu
rosto e sentia um gosto salgado em minha boca, sempre falei que aquele era o
gosto do mar, que trouxe meu avô, e me permitiu seguir o caminho que tenho
traçado até hoje, de ajuda ao próximo.
Pablo terminou a história, mas Damião ainda estava perplexo com a
linda biografia. Contudo, ainda muito curioso com o fato dele ter apreendido
tanta coisa.
- Linda sua história de vida... Mas se me permite... – hesitou.
- Pode perguntar meu amigo, afinal sei que você quer saber sobre a
parte final. – Respondeu Pablo agora com um sorriso misterioso em sua face.
287
- Sim, queria saber o final.
- O final envolve uma pessoa que foi crucial em nossa vida, ela se
chamava Damião, vivia em uma vila um pouco distante aqui do porto, e dizia
que espantava demônios e maldições...
******
Chegando a dimensão Sublime após a literal ida ao inferno e
participação na deliberação, Expedito estava adentrando em uma pequena
casinha próximo a uma cachoeira, seu reduto de descanso e medição, quando
foi chamado: - Expedito! Espero somente um minuto.
Sem precisar se virar ele já fez cara feia, afinal, era novamente um
dos chatos do núcleo de filosofia. Da mesma forma em que estava ele
somente respondeu: - O que quer, necessito descansar! Como sabem, não fico
filosofando, agora mesmo acabo de chegar da dimensão chamada de inferno.
- É por isso mesmo que estou aqui. Ninguém ainda questionou-o,
mais gostaria de saber porque Nimrod não lhe acompanhou?
Expedito somente o olhou de relance, percebendo ser um oriental de
estatura mediana, e olhar firme, logo dizendo:
- Primeiramente, sei que você é do núcleo de filosofia, mas se não
for muito perguntar, quem é você?
- Me desculpe, meu nome é Aizawa Seishisai. – Ele respondeu
fazendo um aceno tipicamente oriental com a cabeça.
- Sim, agora me diz porque quer saber exatamente sobre Nimrod?
- Porque estava entusiasmado para lhe ver, dai ele não veio, e decidi
lhe perguntar. Além disso, se necessitar de ajuda na próxima missão estou a
sua disposição.
- Certo, obrigado! Mas dispenso ajuda do núcleo de filosofia quando
o assunto é guerra.
- Mais eu entendo de guerra, fui um samurai em minha ultima
passagem, e, ainda, nas demais sempre fui uma lenda na arte da guerra
dentre a cultura oriental, protegi minha nação desde os tempos primevos.
- Entendo... – Expedito agora estava pensativo. – Tudo bem, lhe
chamo da próxima vez! – Ele disse mais para tirar o sujeito de seu encalço. –
Mais agora deixe-me dormir.
- Sim senhor! Estarei às suas ordens. – O sujeito diminuto fez a
famosa continência oriental de envergadura do corpo, contudo, Expedito já
estava longe, dentro de seu reduto, sequer ligando para continências.
288
CAPÍTULO 74
Berlim – Alemanha, 1982
Ao chegarem ao hospital o doutor pediu gentilmente para uma
enfermeira da recepção:
- Leve está moça para um quarto particular, e, logo após, marque
com a equipe todos os exames disponíveis no hospital, quero que ela seja
analisada desde o fio de cabelo até suas unhas dos pés.
- Como assim doutor? Todos os exames disponíveis no hospital?
Isto pode levar dias! – Questionou a enfermeira assustada, recebendo os
mesmos olhares de suas companheiras que nunca haviam pelo menos ouvido
falar em ordens daquelas. – Será que o doutor quer estudar está moça? –
Pensou a enfermeira. Sem saber que estava correta...
- Cumpra às ordens sem questionarem! – Respondeu secamente o
médico.
Após isso às enfermeiras saíram com Estela às pressas para uma
ala, Vilauba às seguiu de perto, não iria deixar sua menina ali sozinha.
Após chegarem próximo ao quarto, enquanto a enfermeira chefe
preenchia uma ficha de entrada dela, Vilauba já estava telefonando para o pai
de Estela para lhe explicar que ela teria que permanecer alguns dias no
hospital de repouso. Não contou que iriam fazer a bateria de exames, afinal,
ela queria que ele ficasse distante, nada poderia chegar perto dela naquele
momento, muito menos aquele sonso de seu pai...
- Sim Sr. Pierre, vou estar com ela por estes dias, pode ficar
tranquilo que vou avisar para ela que o senhor terá que fazer uma viagem. –
Disse Vilauba ao telefone.
Ele está fugindo de mim. – Pensou Estela ao ouvir a resposta de
Vilauba.
Do outro lado da linha Pierre deixou-se cair na poltrona, estava
aliviado em ouvir aquilo, afinal, teria alguns dias para pensar.
- Obrigado Vilauba por ter conversado com meu pai em meu lugar,
nem sei como lhe agradecer. – Disse Estela que já se encontrava deitada na
cama aguardando que as enfermeiras terminassem os procedimentos para os
primeiros exames. Após muito pensar as enfermeiras decidiram que deveriam
começar pelos exames básicos, para depois passar para os mais complexos,
mas por via das dúvidas, elas imprimiram uma lista contendo todos os exames
que o hospital disponibilizava, e para suas infelicidades ela não era pequena...
- Não precisa me agradecer minha criança, quero que saiba que
sempre vou estar ao seu lado para o que der e vier. E quero lhe confessar uma
coisa. – Disse Vilalba acariciando sua cabeça.
289
Estela se assustou, Vilauba sempre foi uma pessoa meiga e
carinhosa com ela, contudo, nunca havia lhe confessado nada.
- Pode dizer Vilauba o que está lhe incomodando?
A mulher chegou mais perto pegando nas mãos de Estela, queriam
antes de fazer aquela revelação que ela estivesse calma.
- Antes de sua mãe falecer, já no hospital ela teve forças para dizer
algumas palavras, poucas, muito poucas, devido aos vastos ferimentos do
acidente que quase lhe levou também.
- O que ela lhe disse?! – Questionou Estela apreensiva.
- Ela mandou me chamar sozinha, o que deixou o senhor Pierre
extremamente irritado, mas ele respeitou sua última vontade.
- Sozinha! Então quer dizer que meu pai não foi à última pessoa que
ela quis falar? – Questionou com perplexidade Estela.
- Não, realmente pelo o que parece a última pessoa que sua mãe
queria ver naquele momento era seu pai.
- Estou boquiaberta Vilauba.
- Imagina como fiquei naquele momento. – Respondeu a empregada
segurando ainda mais forte as mãos da moça. – Mas o que foi mais estranho, é
que ela me fez prometer que sempre estaria ao seu lado.
- Como assim ao meu lado para sempre? – Questionou Estela
demonstrando sua evidente surpresa com o pedido da mãe.
- Ela me disse que não era para lhe abandonar, e que você iria
precisar muito de meu apoio. Disse ainda que eu seria sua única família
verdadeira, e que não era para deixar sob hipótese alguma que o doutor Pierre
lhe fizesse qualquer mal.
- Nossa Vilauba minha mãe realmente lhe disse tudo isto?
- Sim minha criança, desta forma. Nunca vou me esquecer de suas
ordens. E, ainda, quando lhe questionei que ele poderia me despedir se eu
ficasse desconfiada dele, ela me disse que era para eu procurar por uma conta
em meu nome em um banco chique no centro, que lá o gerente que era seu
amigo tinha algo que iria garantir que eu estivesse sempre ao seu lado.
- E o que o gerente tinha que te manteve durante todos estes anos
ao meu lado?
- Ele me entregou alguns papeis, e disse que o restante deles se
encontravam com os advogados do banco e da sua mãe, os quais segundo ele
iriam me procurar em alguns dias. Fiquei espantada de sua mãe ter
advogados, visto que seu pai é um. Como eu não sabia ler, fiquei esperando os
290
advogados me ligarem. Por sorte eles me telefonaram no mesmo dia dizendo
que era para eu comparecer imediatamente no escritório deles, me passando o
endereço. Pedi folga ao seu pai, que muito relutante me concedeu, devido ao
fato de você ainda estar internada naqueles dias.
- Nossa minha mãe tinha advogados... Credo que coisa mais
estranha!
- Se você acha isto estranho espere para ver o final disto tudo...
Estela encostou suas costas, elas já estavam doendo naquela
posição, foi tanto tempo sem poder sentir dor que ela ainda estava se
acostumando a senti-las.
- Quando cheguei ao escritório, fiquei boquiaberta, o lugar era lindo
e imponente, parecia escritórios de filmes americanos. Os advogados vieram
pessoalmente me receberem, e me levaram para uma sala de reuniões que eu
mal pude acreditar que pudesse existir algo tão chique, e olha que a mansão
que você mora é linda.
- Mas o que eles queriam Vilauba, me conte logo, estou apreensiva.
– Estela foi quase rude, devido à nítida apreensão.
- Eles me disseram que sua mãe havia testado metade de toda sua
fortuna para mim, e me incumbido de cuidar da outra metade que ela deixou
para você!
- Como assim? Minha mãe excluiu a parte do meu pai e colocou
você? Estou chocada.
- Também questionei isto, mas os advogados me disseram que seu
pai nunca teve nada em comum com sua mãe, que eles eram casados em um
regime de separação de bens, e que a fortuna de sua mãe era proveniente da
herança de seu avô materno, assim, ela sempre havia sido administrada por
empresas especializadas, portanto, seu pai nunca teve sequer a administração
de um único centavo.
- Mas eles te falaram porque ela havia chegado a essa decisão?
Afinal, para fazer algo desta natureza ela deveria ter alguma coisa contra meu
pai, você não acha?
- Foi à primeira coisa que questionei. Lado outro, os advogados me
disseram que ela havia mudado seu testamento recentemente, e que havia
excluído seu pai, mas que não havia lhes dito os motivos. Como você sabe sua
mãe era uma mulher reservada, e não havia contado isto sequer ao seu pai.
- E como meu pai recebeu na época esta notícia? – Questionou
Estela agora sorrindo, estava satisfeita com a sabedoria da mãe, ela devia ter
descoberto algo sobre seu pai, do contrário não teria modificado o testamento.
E, devido a tudo que estava ocorrendo com ela, e das atitudes de seu pai, ela
não mais estava duvidando de nada que surgisse a seu respeito.
291
- É ai que eu me espantei. Seu pai recebeu tudo com a maior
naturalidade, disse ainda que iria construir sua fortuna pessoal, e que as coisas
estavam indo de vento em poupa para ele no mundo dos negócios. E o que
mais me abalou foi o fato dele dizer isto com frieza, e sem demonstrar qualquer
sentimento pela atitude de sua mãe, sequer raiva.
- Isto realmente foi muito estranho... – Respondeu Estela pensativa.
Algumas enfermeiras entraram no quarto, a mais baixinha parecia
ser a superior, ela tinha um ar de superioridade, o que contrastava com sua
estatura e com seu aspecto anêmico de olhos esbugalhados, ao contrário das
outras que a levaram para o quarto, esta parecia um general ditando ordens:
- Garotas iniciem a coleta dos materiais, após, devem levá-la para a
sala de raios-X, e assim sucessivamente por todas as salas de diagnósticos
que constam no grande relatório que entreguei para vocês. Devem ainda se
lembrarem que tudo deve ser relatado nos documentos, o doutor quer
prioridade nestes exames!
Estela ficou ali parada olhando a enfermeira baixinha tecer ordens,
enquanto Vilauba estava assustada com todos aqueles procedimentos que a
garota seria submetida, parecia que o doutor estava mesmo obstinado a
encontrar respostas concretas para o estranho milagre ocorrido.
Vilauba foi orientada a deixar o quarto e aguardar na recepção, o
que atendeu prontamente, contudo, antes de sair chegou próximo ao ouvido de
Estela dizendo bem baixinho:
- Não tenha medo meu bem, estarei logo ali te esperando e rezando
para que tudo dê certo. - Após deu um beijinho em sua testa e saiu do quarto
calmamente, seus olhos brilhavam misteriosamente...
292
CAPÍTULO 75
Porto de Le Havre - França, 1982
O coração de Damião quase parou, nem imaginava que estava de
alguma forma ligado à história daquele homem.
Não é possível, não me lembro de nada assim?! - Pensou perplexo.
- Pelos sinais vejo que meu sonho de hoje estava certo, realmente
encontraria mais uma vez alguém perdido neste porto, e dessa vez seria a
pessoa que há muitos anos nos ajudou, saindo após as pressas sem nada
cobrar ou pedir em troca, somente pela bondade da ajuda.
- Como você soube que estaria aqui necessitando de ajuda? –
Questionou Damião.
- Em um sonho, e desta vez não foi minha mãe que estava nele, mas
sim meu avô, o qual me disse que iria sempre estar ao seu lado por tudo que
você fez a ele, e, principalmente, por lhe conseguir mais alguns anos de vida
para que ele pudesse cumprir sua promessa de me treinar.
- Quando isto tudo ocorreu? Quero dizer, que lhes ajudei de alguma
forma? – Damião ainda demonstrava estar reticente.
- Eu já era um jovem, ao passo que logo após os acontecimentos
que lhe relatei, nosso avô imediatamente nos levou para morar com ele no
antigo castelo de sua família, ou melhor, de nossa família. O lugar era mágico,
jardins suntuosos, empregados para tudo que necessitávamos. Lembro que ao
chegar ao local havia questionado meu avô porque ele estava em uma
embarcação tão velha já que tinha tantos lugares bonitos para morrer, ele me
disse que não sabia os motivos, que saiu sem rumo com a arma em punho,
seus pensamentos estavam embaraçados, e ele ouvia vozes de seus parentes
lhe chamando, quando ele menos percebeu estava naquele barco com a arma
na cabeça, e o sentimento certo que aquela seria a melhor alternativa de
terminar com seus sofrimentos.
- Para esta pergunta posso lhe dar a resposta, a qual é simples,
todos os seres de escuridão ou simplesmente malvados querem um lugar feio
e penumbroso para cumprimento de tais atos que eles induziram, do contrário,
ou seja, se a pessoa estiver em um lugar belo é muito possível que consiga
através das lembranças boas se livrar da indução ao ato do suicídio, dentre
outros fatores diversos que creio que você ainda não está preparado para
escutar, dos quais teria que ficar dias lhe ensinando. – Ensinou Damião
querendo contribuir para que Pablo entendesse pelo menos este triste fato.
- Agora tenho a certeza que o senhor realmente é o Damião que me
ajudou. – Respondeu Pablo sorrindo.
- Certo, mas onde entro nesta história?
- Como lhe disse, tudo era muito luxuoso, contudo, minha irmãzinha
começou aos poucos a ficar doente, o que foi piorando dia após dias, até ficar
alarmante. Na realidade não era apenas ela, todos no castelo, menos os
293
empregados estavam com algumas moléstias, mas não ao ponto que ela
chegou. Como havia lhe falado no início, até os médicos haviam desacreditado
meu avô devido aos graves problemas de saúde que ele estava enfrentando.
Os empregados eram em sua grande maioria negros, e, certo dia a senhora
muito gentil que cuidava de minha irmã, disse para minha avó que aquele
castelo era lindo por fora, mas podre por dentro. No início minha avó não
entendeu, e ao falar com meu avô, ele não ligou, somente dizendo que a
senhora era muito supersticiosa. – fez cara de reprovação pela atitude do avô.
– Mas os acontecimentos iam tomando proporções estranhas, além dos
médicos não conseguirem curar ou pelo menos diagnosticar a moléstia de
minha irmã, alguns padres que certo dia foram conversar com o meu avô sobre
uma ajuda para o orfanato, negaram-se a ali adentrarem, dizendo que estavam
passando mal somente ao tentarem, e, quando questionados, diziam que era
para ir conversar na congregação que o monsenhor relataria os eventos. No
mesmo dia meu avô procurou os monges em um mosteiro bem perto do
castelo, e o que eles falaram não o agradaram...
- O que eles disseram? – Questionou Damião ao notar que Pablo
estava um pouco acanhado em prosseguir.
- Eles disseram que era para sairmos do castelo, que ali não era
mais um ambiente sadio para se criar uma família como ele estava fazendo.
Eles diziam que o amor que nós estávamos demonstrando naquele lugar
estava atiçando coisas traiçoeiras, que sentiam enorme inveja de nossa
alegria. Além disso, falaram que o fato dele estar me treinando para adquirir
meus dons de percepção e ajuda ao próximo, estávamos deixando loucos
alguns seres que ali estavam há milênios, os quais, queriam ver somente
decisões politicas ali sendo tomadas, e, principalmente, sobre guerras, as
quais em sua grande maioria eles induziam os reis e príncipes que ali
residiram em tempos anteriores a tomar.
Foi quando Damião se lembrou do castelo, realmente aquele foi um
dos piores lugares que ele já viu, não poderia definir o mesmo melhor do que
simplificou a negra, “lindo por fora, mas podre por dentro”, pensou: realmente
aquela serviçal tinha razão, aquele lugar era o luxo e ao mesmo tempo isto era
a armadilha perfeita para atrair as pessoas para a podridão que se encontra ali
em material de espíritos desencarnados, muitos deles mortos ali mesmo,
dentre reis e rainhas, princesas e príncipes, escravos, etc.
- Me lembro deste lugar. – resolveu dizer Damião. – Contudo, não
me lembro que foram os monges que me pediram ajuda, mas sim um...
- Sim um jovem, ainda quase criança! – Completou Pablo.
Damião não podia acreditar, Pablo era a criança que lhe clamou por
ajuda! Agora ele se lembrava dele perfeitamente. Damião era ainda muito
jovem, e havia chegado há pouco tempo à França, vinha de Roma, onde
atuava em diversas ordens, dentre elas uma em especial, quase que secreta
especializada especialmente em exorcismos. Era raro alguém que quisesse
nela entrar, afinal, para ser um exorcista não serve ser apenas uma pessoa de
bom coração, é até pior se assim for, afinal, o demônio utiliza das fraquezas, e,
principalmente, da bondade das pessoas para dominar e se sobressair.
294
- O senhor não me questionou nada à época, somente disse que iria
aceitar meu convite, e que iria até nossa casa. Por isto posso lhe contar que
estávamos realmente sendo aniquilados e somente tomei aquela atitude louca
após utilizar minhas habilidades de percepção que meu avô estava me
ensinando com maestria, e, assim, concluir que se não agisse minha irmã iria
morrer.
- Mas o que te levou a minha casa naquele dia? – Damião matava
sua curiosidade.
- Conversei com a empregada que havia dito aquilo, ela me disse
que um monge que diziam ser muito bondoso e poderoso havia desembarcado
há poucos meses aqui no cais, e que ele veio para cá com a missão de
evangelização, mas que diziam que estava era realmente para cumprir uma
missão de expulsão de demônios, porque neste local iria ser cumprida uma
profecia sobre uma criança muito poderosa que aqui iria nascer para mudar o
rumo da história...
Damião se assustou.
É inacreditável como o poder das massas em literalmente passar
adiante um assunto era aguçado, poucas pessoas sabiam dos reais motivos
de minha mudança para a França! – Ele pensou.
Contudo, no fundo tinha a resposta, aquela negra não era uma
simples acompanhante, devia ser membra de alguma seita derivada da África,
eles eram muito ligados em profecias e dominavam como nunca o poder de
detectar espíritos ou lugares em que eles sobrepujavam como queriam. Mas
resolveu desconversar sobre seus motivos de ali estar.
- Sim... Bem... Sei que você apareceu pela madrugada montado em
um cavalo preto, era um jovenzinho, mas a inteligência de um homem. –
Respondeu Damião principalmente para tentar afastar o foco de sua missão
envolvendo o nascimento de Joana.
- Pois bem, me desculpe por ter interferido em seus assuntos,
somente queria saber se isto era realidade, mas como percebi o senhor não
quer conversar sobre isto, e eu não vou insistir. – Respondeu Pablo erguendo
as mãos, como em sinal de paz.
- Agradeço. – Damião disse secamente, como se realmente
quisesse por uma pá de cal no assunto da profecia. – É para o seu próprio
bem. – Advertiu.
Em sinal de obediência Pablo prosseguiu:
- O que realmente aconteceu, era que após os monges terem
relatado tais fatos ao meu avô ele ficou possesso, utilizando seu poder de
percepção ele concluiu que os monges estavam era querendo seu castelo, o
que não posso culpá-lo por assim concluir, porque o monsenhor disse para ele
deixar o castelo o quanto antes, e que a ordem ali se fixaria para afastar o que
ali se encontrava. Não era preciso ser muito sábio para concluir o óbvio!
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Damião sorriu, não porque sentira graça, mas, porquanto, sabia que
o real objetivo daqueles monges eram realmente se beneficiar da situação.
Pablo vendo a expressão de Damião decidiu prosseguir, não queria
mais entrar em uma via errada e magoar aquele senhor que havia lhe ajudado
tanto.
- Então quando percebi que meu avô não iria agir resolvi lhe
procurar, mas para não levantar suspeitas tive que sair na noite, por isto contei
com a ajuda de nossa criada que me ajudou tanto em sua localização como
para preparar que eu saísse sem ser notado.
- Então por isto você me acordou àquela hora da madrugada?! –
Respondeu Damião agora sorrindo, tentando acalmar os ânimos, afinal,
achava que tinha pegado pesado anteriormente, não tinha razões para
responder com tamanha rispidez.
- Era sim. E me assustei quando joguei o saco de moedas em sua
mesa e o senhor disse que era para eu guardar minhas economias, que iria
fazer uma visita para minha irmã, e que por isto os convidados não eram
comprados, mas apenas convidados e recebidos com afeto.
- Sim, nunca cobrei por nada, ainda mais por uma visita daquelas.
- O senhor chama aquilo de visitas? O senhor não se lembra? Aquilo
foi à coisa mais horrível que vi em toda a minha vida... – Disse Pablo
arregalando os olhos e mostrando os braços arrepiados, demonstrando que se
arrepiava somente ao se lembrar daquele dia.
Damião firmou o pensamento, dizendo com desdém:
- Não gosto de contar vantagem, mas aqueles demônios não eram
tão fortes assim...
- Como assim?! Escutamos gritos vindos do além, urros de pavor, e
o senhor fez uma verdadeira algazarra, onde meu avô que até certo momento
achou que iria perder sua alma, vimos sombras sair do castelo por todos os
lados.
Damião não estava mentindo, e queria deixar aquilo agora claro,
porquanto, não tinha mais razões em manter sua pequena mentira:
- Realmente o exorcismo foi simples. As almas que ali se
encontravam estavam somente perdidas, elas eram sim da realeza, era em
sua maioria antecessores até mesmo das origens da construção daquele
Castelo, mas suas forças eram insignificantes.
- Insignificantes?! Eles quase mataram minha irmãzinha! – Pablo não
se convencia.
- Posso garantir que somente afligiam sua irmã porque ela se
assemelhava e muito com uma filha de um rei que ali se encontrava até aquele
momento vagando querendo reinar, ele via em sua irmã sua filha, assim,
desejava tanto que ela ficasse ao seu lado que tal indução estava a consumi296
la. Igual ao seu avô quando ele estava daquela forma, pelo que posso concluir
pela minha experiência, diante do que você me disse, parece que eram os
seus bisavós que estavam a atormentá-lo para que se juntasse a eles, e
demais entidades que queriam tirar proveito da situação. – Explicou Damião.
- Então o senhor quer dizer que mentiu para meu avô quando disse
após todos aqueles lances que era melhor ele vender o castelo e promover
com o dinheiro outros investimentos, porque aquele lugar estava condenado às
trevas?! – Questionou Pablo indignado.
- Me diga como era a vida antes de eu ter sugerido isto? – Interpelou
Damião sem responder nada.
Pablo pensou, e resolveu respondê-lo mesmo estando com muita
raiva:
- Como havia lhe falado antes, uma vida de luxo, contudo, sempre
muito unidos.
- Então agora me diga como era a vida quando resolveram seguir
meu conselho? – Damião arrematou.
Pablo estava agora boquiaberto. Havia finalmente entendido que
eles desfrutavam de luxo, mas nada faziam em troca, e, após vender o castelo
tudo mudou. Seu avô comprou uma frota de navios, que foram aumentando no
decorrer dos anos.
- Nós estávamos sempre mais unidos do que nunca, e, viajamos
cada ano em um de nossos navios, sempre para destinos diferentes, assim,
conhecemos o mundo todo, e eu fui mais treinado do que nunca... – Ele
raciocinava em voz alta se lembrando das viagens e do treinamento
diversificado que seu avô lhe impingiu, bem diferente do que estavam fazendo
no castelo, onde somente teorizavam, ao passo que em países diferentes eles
puderam treinar os ensinamentos.
- Espere... – Pablo fez uma pausa, analisando ainda bem sobre o
que somente agora estava claro. – Então quer dizer que meu avô viveu mais
porque...
Damião sorriu, porquanto, finalmente ele entendeu a essência do
porque seu avô havia vivido tanto mesmo tendo a doença que possuía quando
se conheceram. Por isto resolveu interrompê-lo:
- Isto mesmo meu caro Pablo. Antes de sair do castelo, ensinei ao
seu avô que o que ele via como uma garantia de uma vida sossegada, estava
na realidade matando-o. Ou seja, como ele pensava que a vida havia
terminado, e que não tinha mais forças para construir, inovar e principalmente
ajudar ao próximo, o universo conspirava para tirá-lo deste mundo, afinal, aqui
estamos para acrescer, se for para parar e relaxar este não é o lugar,
porquanto, a inércia nesta dimensão não prejudica somente o individuo, mas
todos à sua volta, afinal, se seu avô tivesse permanecido naquela situação,
vocês também ficariam, e assim por diante...
297
- Entendi. Realmente as coisas mudaram bastante, e isto foi muito
bom ao meu avô! – sua expressão era de fascínio. – Os negócios
prosperaram, ele se sentiu com isto mais capaz, resolveu que iria investir na
antiga vila em que nós encontramos, promovendo ali investimentos diversos
como água tratada, saneamento, etc., ou seja, além de ajudar muitas pessoas
indiretamente, ao fazer o dinheiro da venda do castelo girar, tendo em vista
que impulsionou vários empregos, ainda ajudou diretamente, e, assim, foi
passando para mim e minha irmã tais ensinamentos, o que contribuiu e muito
para que após a partida dos dois, nossa empresa de navios prosperasse ainda
mais, com meu conhecimento e estudo.
- Vejo que agora entendeu. Mas me diga quando é que eles
partiram?
- Ambos partiram no mesmo dia, em um acidente que ocorreu em
um de nossos navios petroleiros. O interessante é que isto ocorreu quando já
estávamos bem, eu havia me formado, minha irmã iria para a faculdade, então,
assumindo a empresa meus avós finalmente teriam um tempo para curtir a vi...
– Parou subitamente ao concluir o óbvio.
- Você agora após meu ensinamento sabe a razão disto? –
Questionou Damião agora lançando um olhar como de desafio.
Pablo fez uma pausa, e resolveu responder de sua forma:
- No início pensei em vender nossa frota. Não aquentava ver sequer
um navio após o referido acidente. Mas quando eu e minha irmã se dirigimos
para a empresa para decidirmos o que fazer, concluímos que aquela firma era
a única coisa que restou para lembrarmos de nossos avos, e que eles ficariam
felizes de continuarmos a fazer tudo de bom que nossa família estava fazendo
naqueles anos. Contudo, agora entendo que eles partiram, porquanto, haviam
cumprido suas missões. E, como um casal, o que tornava tudo ainda mais
bonito, ao passo que, iriam curtir um descanso merecido.
- Vejo que entendeu. – Disse Damião passando a mão em suas
costas tentando reconfortá-lo.
- Você foi muito importante em nossas vidas meu amigo, e quero
que saiba que o navio que você espera é um de nossa empresa. Assim, você
terá além de passe livre, um tratamento de luxo, com cabine privativa, jantar,
tudo... – Disse Pablo sorrindo.
Damião ficou muito satisfeito, havia resolvido um problema. O
problema quanto à viagem.
- Tenho que ir meu amigo. Mas tome esta carteira, ela dará além do
acesso ao navio tudo que lhe prometi. Vou ainda passar ali e conversar com o
capitão que pegará esta viagem.
- Ele é experiente? – Questionou Damião para espanto de Pablo.
- Sim, muito. Porque a pergunta?! Não vai me dizer que tem medo
de viajar de navio?
298
- Não, somente posso dizer que tenho o pressentimento que esta
viagem não será nada simples. – Respondeu Damião olhando ao horizonte.
- Não se preocupe meu amigo, tenho plena confiança em seu
potencial. E quero que saiba que já vou planejar vários investimentos para a
vila em que o senhor estava morando, acho que isto vai ajudar e muito a
criança predestinada, porquanto, se eu não sei quem ela é, o melhor é ajudar a
todos, sempre... Assim, ela será atingida indiretamente... – Disse Pablo já se
levantando e sumindo entre a vasta quantidade de pessoas no porto...
299
CAPÍTULO 76
Londres, Inglaterra, 1982
No horário combinado todos já estavam aguardando Arthur na pista
de pouso onde três helicópteros estavam lhes esperando com pilotos que
pareciam um tanto impacientes.
Todos os homens achavam que os helicópteros iriam levá-los para o
aeroporto onde embarcariam em um voo no famoso jato de Arthur, o qual já
havia se transformado em uma lenda entre os trabalhadores do complexo,
principalmente, em razão de boatos que ele teria sido produzido
exclusivamente para o magnata por uma empresa obscura com uso de
tecnologia ultramoderna desenvolvida exclusivamente para ele, e, ainda, que
havia sido montado cada parte em um local, sendo, as partes somente
reunidas ao final em um complexo próprio, tudo para que ninguém pudesse
visualizar a fundo o todo de sua tecnologia, não levantando, assim, com tal
tática muitas suspeitas.
Charles, assim, como os outros estavam pensando naquilo, ele
especialmente, devido ao fato de que como sua vida se resumia agora naquele
complexo de onde ele saiu poucas vezes após iniciar os trabalhos, e, mesmo
assim nestas parcas vezes também a trabalho, tudo que lhe restava era
escutar as fofocas internas para se distrair um pouco.
Quando o velho chegou todos já estavam impacientes, afinal, além
de não saberem o destino, ainda tinham que aguentar a ansiedade pela
primeira missão no novo emprego.
- E ai rapazes, prontos para uma emoção que nunca sentiram antes.
– Bradou Arthur saindo de um pequeno carro trajando vestes que nada
pareciam as que ele usava diariamente, era como se já estivesse em batalha,
usava um uniforme negro com diversos equipamentos presos em seu corpo e
em sua cabeça um estranho capacete com óculos de visão noturna e demais
apetrechos que lhe tomavam cada centímetro de seu velho corpo.
Quando ele andou os homens ficaram curiosos, porquanto, ele
andava de uma forma engraçada, como se seus passos estivessem um pouco
mais fáceis, diferentemente do habitual que se resumia em um caminhar um
pouco mais lento em razão da idade.
- Senhor Arthur, é impressão minha ou você está andando melhor?
Mais tenho que lhe advertir que drogas causam mal, e, ainda, que você está
mais parecendo uma máquina, superdesenvolvida, mais ainda assim não
natural até mesmo para jovens como nós. – Disse como já era de costume
George.
- Suas capacidades de observação são espantosas meus caros! –
Arthur respondeu sorrindo, havia se questionado no caminho se algum deles
iria notar seu novo brinquedinho para combate. Então em um movimento rápido
ele começou a abrir o zíper do macacão militar, e começou a abaixá-lo exibindo
toda a parte interna de seu corpo, ao passo que quando terminou os agentes
estavam extasiados com o que viam...
300
- Meu Deus, aonde o senhor arrumou isto?!... – Disse Charles com
as palavras custando a sair, era como se tivesse visto um alienígena chegar a
terra em um disco voador, afinal, nunca havia visto algo como aquele.
- Isto foi desenvolvido pelo setor da Dra. Kim, a ideia já era antiga
pelos setores de desenvolvimento de vários países, mas todos eles não
tiveram dinheiro, vontade, e, bem como, as pessoas certas para desenvolver
com esta perfeição. – ele se curvou exibindo ainda mais o produto. – Ele
consiste em uma verdadeira estrutura que é presa em cada parte de meu velho
corpo, funciona como se fosse uma base, não apenas de sustentação, mais
para aguentar mais peso, correr distâncias enormes a uma velocidade maior do
que a normal, enfim, poderia definir isto como um novo esqueleto com
músculos de fora de meu corpo.
- Mais como é isso tudo e sua estrutura é tão fina em seu corpo, tá
certo que o senhor é magro, mais mal podemos percebê-lo pela roupa,
realmente, toda a sua estrutura é muito fina e compacta. Além disso, com que
energia isso funciona?
Arthur se mexeu um pouco se exibindo ainda mais com a estrutura a
mostra, os agentes não acreditavam naquilo, aquele velho definitivamente
havia mostrado ter mais capacidade de surpreendê-los do que eles
imaginavam.
- Esta pequena mochila em minhas costas contém um poderoso
capacitor, que funciona como motor, e, este macacão parece de tecido normal,
contudo, ele tem certos dispositivos que interagem com pequenas mais
potentes baterias, as quais são carregadas por energia solar em uma
frequência ultramoderna captadas pelos dispositivos no macacão, de forma
que seu carregamento pode durar até setenta e duas horas tranquilamente.
Os agentes estavam boquiabertos, e, percebendo isso Arthur se
empolgou e continuou suas explicações, ele gostava tanto de conversar sobre
seus produtos que até se esquecia de seus afazeres, o que dava para ver
pelas expressões dos pilotos dos helicópteros, que estavam em completo
estado de desânimo e raiva.
- Além disso, a estrutura é toda em uma coisa que a Dra. Kim disse
ter usado, ela disse se chamar um tal de Aerogel e um tal de SeaGel com
estruturas destes materiais na parte interna, bem como, para dar maior
resistência Titânio e Ouro, entre outros truques dela, passando por fios
ultramodernos, e uma série de parafernálias que eu não quis mais saber, visto
estar mais interessado em como usá-lo, que ai sim é minha especialidade.
- Mais isso realmente torna o senhor mais forte? – Novamente foi
George que questionou.
Em um movimento rápido Arthur pegou o falastrão pelas mãos e
puxando-o fortemente ergueu-o no ar como se fosse um graveto, todos quase
que soltaram gritos de emoção ao vislumbrarem tal maravilha, por óbvio, o
único que não ficou emocionado foi George que ficou se contorcendo no ar.
301
- Quando vamos ter um desses? – Questionou Russo em êxtase.
Arthur
prontamente:
colocou
George
ao
chão,
sorrindo
e
respondendo
- Acho que não tão cedo, afinal, somente este traje custou mais de
duzentos milhões, entre desenvolvimento, compra e melhoria da tecnologia e
outros gastos, portanto, vocês têm a sorte de serem jovens, porquanto, do
contrário certamente estariam perdidos por um bom tempo! – Terminou
soltando uma enorme gargalhada e fechando o zíper do macacão, e já
entrando rapidamente em um dos helicópteros. – Rápido vamos, afinal, já
perdemos muito tempo!
Os pilotos que já estavam impacientes, e, conheciam Arthur muito
bem suspiraram ao vê-lo adentrar no helicóptero.
- Finalmente o velho se tocou sobre nosso pouco tempo! – Disse um
dos pilotos para os outros pelo rádio.
– É mesmo, vamos nos separar para não levantarmos muitas
suspeitas, nos encontraremos no local designado. – Respondeu o outro.
Contudo, para espanto dos três pilotos, após uma pequena
interferência na linha, ouviram a voz de Arthur que lhes disse em tom irônico:
- Tudo bem pilotos, sigam os planos iniciais. Ah, e a propósito, sei
que estão se questionando como estou fazendo isso, é, porque pedi para a
Dra. Kim colocar neste meu traje um dispositivo que permite que eu intercepte
e se comunique com aparelhos de comunicações diversos.
Mesmo com as pernas meio bambas após o baque de serem pegos
por Arthur falando mal de suas manias, os pilotos fecharam o cenho,
suspiraram, e iniciaram a decolagem.
Arthur sorria, gostava de seus truques.
Eles me permitem ter vantagens inimagináveis. – Pensou.
Após o velho disse para si mesmo externando sua preocupação:
- Somente espero que tenha vantagem sobre o que estamos prestes
a enfrentar nesta missão...
302
CAPÍTULO 77
Berlim – Alemanha, 1982
Após dois dias de exames, Estela já estava cansada. Seu pai não
havia lhe visitado um único dia, mas ela não se importava, porquanto, Vilauba
estava ali ao seu lado, se mostrando cada dia mais ser não apenas uma
simples empregada, mas era como se ela fosse da família.
Vilauba acariciava a cabeça de Estela que dormia calmamente,
quando o doutor entrou no quarto.
- Quer que eu a acorde doutor?... – Questionou Vilauba
sussurrando.
- Não há necessidade! Somente queria falar que amanhã
terminaremos todos os exames, e vocês poderão voltar para casa.
- Certo doutor! Assim que ela acordar vou lhe dar a notícia.
Após o doutor sair da sala Estela abriu os olhos, e para espanto de
Vilauba que percebeu que a moça não estava mais dormindo quando o doutor
entrou na sala, somente fingiu dormir para não ter que conversar com ele.
- Porque você não quis conversar com o doutor Estela?
- Não queria que ele ficasse com proza médica.
- É somente isto minha querida? – Questionou Vilauba erguendo
uma das sobrancelhas.
Estela ficou pensativa, não sabia se contava para Vilauba seus
medos, os quais eram tantos, principalmente, tendo em vista o que presenciou
na noite anterior a sua milagrosa cura.
- Não quero lhe esconder nada minha amiga. Somente preciso de
um pouco de tempo para poder assimilar tudo que ocorreu comigo.
Vilauba sequer respondeu, somente passou as mãos nos cabelos de
Estela, olhando-a com ternura, deixando descer uma lágrima. Aquela atitude
para Estela era mais do que uma resposta de que ela entendia o que ela
estava sentindo, era sua confirmação que entendia seus medos e
compartilhava de sua dor.
- Vilauba, posso lhe pedir um favor?
- Todos que estiverem ao meu alcance minha doce criança.
Estela parou por algum momento, Vilauba sempre tratava dela como
se fosse uma mãe, sempre com palavras de carinho, contudo, ela nunca havia
percebido como aquilo era importante em um momento de desespero,
principalmente após as revelações que havia ouvido, era como se ela estivesse
sendo amparada novamente com amor de uma mãe.
303
- Vilauba, quero que você prepare para mim um advogado para
providenciar meu testamento.
- Testamento? Desculpe mas não estou entendendo?!
- É simples. Igualmente a minha mãe, não confio mais em meu pai.
Por isto quero fazer como ela e deixar tudo em caso de minha morte para você
minha amiga.
- Morte?! – ela demonstrou perplexidade. – Mas quem está falando
em morte?! Você está boa, curada por um milagre e me vem dizer sobre morte
e testamentos... – fez uma pausa foi quase dramática. – Isto é inadmissível!
- Não é! Estou em um hospital curada não sei de que forma e por
quanto tempo, e se você tivesse visto o que vi na noite de minha cura iria fazer
o que estou não apenas lhe pedindo, mas ordenando sem pestanejar.
Vilauba abaixou a cabeça respondendo de uma forma tímida:
- Sim minha criança, o que você quiser. – Seus olhos novamente
brilharam de uma forma estranha, mas Estela nada percebeu...
304
CAPÍTULO 78
Porto de Le Havre - França, 1982
Após Pablo ir embora Damião ficou um bom tempo com o olhar
perdido no horizonte.
Será que ele vai mesmo ajudar a vila onde se encontra Joana? – Ele
pensava, quando de repente seu estomago o trouxe de volta de seus
pensamentos com um enorme ronco demonstrando sua evidente e clara fome,
a qual quase havia sumido após se entreter com a história do amigo, mais
estaca de volta, e, mais forte do que nunca!
- Uma coisa eu sei, ele resolveu boa parte de meus problemas,
agora é somente aguardar o barco, contudo, tenho que buscar comida, afinal,
não poderia abusar daquele sujeito tão gentil incomodando-o ainda com minha
fome. – Disse para si mesmo já se levantando e seguindo andando
vagarosamente pelo porto.
Lado outro, o porto era um local verdadeiramente infernal, por isso
não sabia por onde começar.
Após muito andar, se sentou em um pequeno banco próximo a
algumas pequenas lojinhas, e ficou durante horas contemplando os navios
saindo e sumindo ao horizonte. Meditava como a civilização evoluía
progressivamente, bem como, o quanto ainda necessitava evoluir...
- Pensando na vida meu amigo? – Uma voz rouca lhe veio aos
ouvidos, e ele levantou a cabeça para ver quem lhe falava.
Quando avistou o sujeito, percebeu se tratar de um homem magro,
alto e muito pálido, tinha bigodes cumpridos, e usava um chapéu muito
engraçado de palha, devendo contar com uns quarenta anos.
- Me desculpe, não ouvi sua pergunta? – Questionou Damião já se
levantando para cumprimentar o simpático homem.
- Perguntava se você estava pensando na vida! – Retrucou o
homem sorridente.
- Há! Não! – Respondeu Damião também retribuindo o sorriso. –
Pensava como o mundo é belo, e como devemos agradecer a oportunidade de
podermos estar nele.
O homem somente respondeu com outro sorriso, ao passo que
Damião voltou a sentar-se.
- Também estava imaginando como o homem progrediu, fazendo
máquinas magnificas, que melhoraram a qualidade de vida de milhares de
pessoas. E, por outro lado, como regrediu, deixando vários na miséria, e,
também, destruindo várias vidas para construir tais avanços... – Completou
Damião que olhava agora para um espaço vago, demonstrando sua melancolia
com aquela constatação final.
305
O homem estava assustado, nunca esperava uma resposta como
aquela vinda de um senhor sujo e maltrapilho, o qual, ele na realidade somente
havia percebido por pena, e, justamente por este sentimento havia parado
somente para lhe dar algumas moedas para lhe ajudar de alguma forma.
- Não esperava que o senhor estivesse contemplando belezas e
também desilusões, achava que estivesse com fome, e vim lhe oferecer algum
dinheiro para que o senhor possa comprar alimento. – O homem respondeu
demonstrando um pouco de vergonha por ter pensado somente que ele fosse
um pedinte faminto.
Damião sorriu espantado com a bondade que emanava daquele
homem, e decidiu testá-lo, por isso alçou um questionamento intrigante:
- O senhor é um homem bom? Ou um bom homem?
Aquilo pegou o homem de surpresa, ao passo que ele resolver
sentar-se ao lado de Damião. Após sentar-se o sujeito ficou durante muito
tempo somente olhando para o mar, pensando na pergunta que Damião lhe
fizera. Então, depois de muito tempo perdido em seus pensamentos, quebrou o
silêncio:
- Sempre procurei ser um homem justo, pautado no pensamento de
que todos teriam aquilo de que necessitariam caso trabalhassem, e, por isto,
nunca fui um homem bom e generoso para os outros. Por outro lado, eu
sempre paguei em dia meus funcionários, mais nunca me misturei a eles, e
sempre exigi muito deles, algumas vezes até mesmo como o senhor falou,
usando as pessoas para progredir, por isto, creio que não fui um homem bom.
Damião olhou bem nos olhos do homem e disse com voz serena:
- Não se envergonhe, são muitos os homens que acreditam que
todos tem a mesma oportunidade que eles, e se esquecem de ajudar o
próximo. Não são todos que tem a oportunidade de estudar, de abrir uma
empresa, e muitas vezes até mesmo de trabalhar. Outros não têm sequer a
oportunidade de conviver em sociedade, porquanto, lhes faltam o
discernimento necessário. Estas pessoas precisam de ajuda, e cabe àqueles
mais afortunados ajudarem não alimentando, mais dando oportunidade de que
estes irmãos possam fazer isto com dignidade, através do trabalho.
O homem estava espantado, aquele não era um simples mendigo,
mais antes que ele pudesse perguntar algo, Damião lhe lançou uma outra
pergunta:
- Você com certeza deve estar arrependido da vida que levou até o
momento, o que já é um grande progresso. Contudo, resta somente saber se
você está determinado a mudar?
O homem voltou novamente seu olhar para o mar, aquilo era o que
ele mais queria, e uma lágrima escorreu pelos seus olhos... Após algum tempo
ele resolveu se abrir para Damião:
306
- O que eu mais queria neste momento era esta oportunidade que
tanto neguei ao próximo em toda minha vida. Eu sou muito rico, lado outro, não
tenho sequer uma esposa... Não foi por falta de pretendentes! Eu nunca levei
um relacionamento a frente, sempre fui desconfiado de que todas as mulheres
estavam somente interessadas em meu dinheiro, com isto perdi várias, e, a
maior delas, certamente meu grande amor. E, definitivamente não tenho mais a
oportunidade de poder mudar...
- Porque diz isso com tamanha certeza? – Questionou Damião.
As lágrimas do homem agora escorriam por sua face em
abundância, mais ele resolveu que seria melhor desabafar com aquele senhor,
por isto prosseguiu:
- Há um ano os médicos descobriram em mim um câncer incurável,
e estou assim pálido e magro devido à doença. Após o diagnóstico, cai em
extrema depressão por meses. Pensei em fazer um pacto com o diabo, mais
isto não iria adiantar. Por isto há duas noites, vendo que a doença estava
realmente em seu estágio final, pela primeira vez em anos, ajoelhei-me e rezei,
não de uma maneira normal, mas de uma forma como nunca havia feito antes.
- Porque tomou está decisão de rezar a Deus ao invés do pacto? –
Damião alçou o questionamento, porquanto, estava intrigado com a forma que
ele disse que desistiu do pacto, o qual seria mais fácil, e, de certa forma mais
garantido do ponto de vista da cura rápida para se livrar da morte repentina.
- Pensei comigo que se dizem que o Diabo faz pactos, então porque
Deus não faria?! E nas minhas orações fiz um pacto com Deus, disse a ele que
se me curar, abrirei muitas instituições de caridade, e que os lucros de todas as
minhas empresas serão para estas instituições! Bem como, parte considerável
seria destinada para o desenvolvimento de novos medicamentos para
combater o câncer, porquanto, não quero que ninguém passe pelo o que eu
estou passando...
- Mais como selou o pacto? – Damião estava muito interessado
naquilo, porquanto, era novo para ele fazer pactos com Deus.
- Como prova de que cumpriria minha promessa, mandei meus
advogados elaborarem um testamento, onde deixo todas as minhas empresas
para a caridade e para o desenvolvimento de medicamentos contra o câncer,
eles definiram como seria a melhor maneira de que os bens fossem
administrados, e eu assinei. Além disso, como uma espécie de sinal de minha
devoção, mandei transferir muitas posses, mais da metade já para instituições
no mundo todo.
O homem fez uma pausa, devido aos enormes soluços que dava de
choro, mais queria prosseguir:
- Eu sei que é tarde, e não espero que Deus ouça meus pedidos,
mais minha vida não mais importa. Se ele me concedesse a graça de pelo
menos entrar por um dia no céu, e estar pelo menos por um dia em sua
307
presença, já ficaria satisfeito, após eu poderia retornar para meu lugar, que
certamente será o inferno.
O homem mais uma vez parou, somente de falar em inferno ele
tremia todo, mais prosseguiu firmemente:
- Na noite passada sonhei com este porto, e nele vi um anjo lindo,
ele acenava para mim. Logo após acordei, e cai em desespero, achava que
seria salvo, e descobri que era somente um sonho. Mais algo dentro de mim
me dizia para vir aqui.
Ele olhou nos olhos de Damião, e disse:
- Nunca dei dinheiro para ninguém, pelas minhas convicções de que
isso seria propagar a preguiça de trabalhar. Contudo, quando vi o senhor
sentado aqui olhando para o mar, e pensei que pudesse estar com fome, pela
primeira vez resolvi ajudar uma pessoa necessitada. – ele abaixou a cabeça
demonstrando sua descrença. – Acho que não vou encontrar nenhum anjo que
possa me curar, mais se eu puder lhe proporcionar um pouco de alegria e
saciar sua fome, já ficarei satisfeito, porque vi somente agora que ajudar faz
bem, e, bem como, que ajudando ao próximo parece que recebemos mais do
que quem estamos ajudando, a sensação e incrível!
- Aceito se o senhor aceitar comer comigo! – Respondeu Damião em
um tom desafiador.
O homem achou aquilo estranho, aquele mendigo ainda impunha
condições para receber ajuda? Antes, ele nunca aceitaria comer ao lado
sequer de um empregado, quanto mais de um mendigo! Mais este seu lado
negro estava para trás, havia sido enterrado quando ele soube que não
passava de uma carne que em breve estaria apodrecendo aos poucos abaixo
da terra, como aquele câncer que lhe comia aos poucos...
- Lógico que aceito comer com o senhor! – O homem respondeu
para alegria de Damião, o qual sorriu ao perceber que o homem estava
também se abrindo para a humildade. O homem se levantou estendendo a
mão para o novo amigo. – Me chamo Gerard.
- Então vamos, pois estou faminto! – Disse Damião estendendo as
mãos para que o senhor pudesse ajudá-lo a levantar. – Me desculpe, porque
estou com muita fome, mais pode me chamar de Damião.
Antes de pegar na mão de Damião o homem a olhou, vendo que
estava muito suja, e pensou consigo mesmo:
Estão limpas perto das minhas, que estão sujas com meu ódio e
desesperança pela vida.
O homem ficou encabulado com aquele senhor, ele lhe passava
uma energia diferente de tudo que já sentiu, suas palavras eram para refletir.
308
- Vamos a um restaurante aqui perto, quando passei por ele senti
um aroma muito bom, rezei para ter a oportunidade de comer nele. – Disse
Damião com os olhos brilhando.
Ele ainda exige o restaurante em que quer comer! Isto que é abusar
da oferta, exigir que eu coma com ele e ainda escolher o restaurante. Na certa
será um dos mais caros do porto! – Pensou Gerard sorrindo, mas deixando,
afinal, já havia aceitado.
Quando Gerard viu o restaurante que Damião havia falado, se
assustou, porquanto, por fora ele era muito simples, então logo pensou que
seria por dentro muito sujo e não muito higiênico.
Sempre comi nos melhores restaurantes de Paris e aqui da
Normandia, e, ainda assim estou com câncer, muitas pessoas comem por
tempos em restaurantes infestados de ratos e são saudáveis. Higiene e bom e
necessário, contudo, não deve estar acima de tudo. – Pensou ele antes de
adentrar com Damião no humilde restaurante.
Para espanto de Gerard o restaurante era muito bem arrumado,
várias famílias humildes estavam ali almoçando, e a garçonete parecia ser uma
pessoa muito boa. Sentaram-se em uma mesa e foi Damião que demonstrando
estar realmente faminto pediu o cardápio.
- Desculpe a pressa, mas é porque estou realmente faminto! – Dizia
Damião tentando explicar sua falta de educação.
- Mas porque ao invés de pedir comida o senhor somente estava
olhando o horizonte?
- Porque penso que quando eu realmente estivesse em sérios
apuros o Senhor, ou melhor, meu Criador, o qual você chama de Deus me
mandaria ajuda. – Tentou explicar Damião.
- Mas e se não mandasse, o senhor morreria de fome? – O
questionamento veio quase como um desafio.
- Não, ai eu iria pedir, contudo, sempre funcionou para mim.
Gerard olhou pela janela, vendo uns sete meninos olhando pelo
vidro.
Certamente estão famintos. – Pensou ele.
Então, após este raciocínio, lembrou-se de que na porta de um
restaurante caríssimo de Paris olhou para alguns meninos que estavam
olhando da mesma forma pelo vidro, e ele, à época, somente teve a reação de
colocar a carteira no bolso da frente, e ainda questionar o que eles olhavam
tanto, porque certamente ali não era o lugar deles.
309
Naquele momento percebendo suas atitudes, Gerard sentia tanta
vergonha de suas atitudes, ele tinha dinheiro suficiente para alimentar milhares
de meninos, mais sequer teve a coragem de alimentar alguns famintos.
Teve então a certeza que não estava morrendo devido ao câncer,
mas que já estava morto há anos por dentro...
- Com licença Damião, já retorno. – Gerard disse se levantando.
Damião somente ficou observando o homem se dirigir para a
garçonete e o garçom e após sair do restaurante, por minutos Damião pensou
que ele havia desistido de comer ao seu lado e teria ido embora, contudo, viu
que não se tratava disso após ver os funcionários imediatamente virem
arrastando mais uma mesa, anexando-a a que eles estavam sentados.
Em poucos minutos Gerard entrou no restaurante com os meninos.
Segurava a mão de um menor que devia contar com menos de quatro anos.
Eles sentaram-se todos admirados, nunca deviam ter estado em um
restaurante, suas roupas eram rasgadas, e não tinham sequer sapatos.
- Bom dia, o que vocês fazem aqui no porto? – Disse Damião
quebrando a admiração dos menores com o ambiente.
- Nos viemos ajudar as pessoas a carregarem as malas, quando
permitem, porque não nos dão muito trabalho. – Respondeu com olhar ainda
vislumbrando o restaurante um dos garotos, o mais franzino.
- Não conseguem emprego por causa da idade, são ainda muito
novinhos para carregar qualquer coisa. – Respondeu Gerard tentando
prosseguir a conversa, para maior surpresa de Damião.
O garoto voltou-se para Gerard e Damião, como quem estivesse
respondendo bobos, mas mesmo assim respondeu deixando transparecer
desânimo:
- Não é por isso, é porque acham que vamos roubar. Conseguimos
mais trabalho com os carregadores dos barcos de carga, só que somente
quando a carga é leve, estes sim acreditam um pouco em nós, mas os outros
sequer chegam perto.
Gerard iniciou novamente suas lembranças, se lembrava agora de
sua atitude egoísta na porta do restaurante em Paris, talvez os meninos
quisessem igualmente aqueles que ali se encontravam somente uma
oportunidade de trabalho. Então resolveu perguntar:
- Os pais de vocês os apoiam a trabalhar?
O mais velho que devia contar com uns dez anos de idade disse
com a voz baixa e tentando parecer o mais educado o possível, mais não
escondia a emoção de falar nos pais:
310
- Não temos pais, moramos no orfanato da Igreja. Os padres não
sabem que tentamos arrumar trabalho, mais como o orfanato não tem dinheiro
para comprar doces, tentamos arrumar algum serviço para poder matar nossa
vontade.
O coração de Gerard se partiu, eles eram crianças, e tinham um
único desejo, simplesmente comer doces, só que tinham que trabalhar duro
para isto.
- Vocês já comeram em um restaurante? – Questionou agora
Damião ao perceber que Gerard havia ficado engasgado.
- Não... – o mais velho novamente respondeu, fazendo uma pausa
olhando para o interior do restaurante da mesma forma que olhava o mais
novo, ou seja, com admiração pelo ambiente. - Sempre olhamos as pessoas
entrarem, e os padres nos ensinam que não devemos ficar pedindo esmolas,
porque temos o que comer no orfanato, por isto somente olhamos. Não
querendo reclamar da comida do orfanato, afinal temos que agradecer por
Deus nos dar o que comer... mas... não é como a deste restaurante... – Ele
falava pausadamente, e, após terminar, abaixou a cabeça com vergonha de ter
dito aquilo.
Damião pôs a mão em seu ombro dizendo:
- Não se envergonhe, todos buscamos algo melhor, você não está
pecando em desejar comer uma comida gostosa, desde que respeite o
próximo, e não cometa nada de errado para conseguir seus desejos.
O menino olhou no rosto de Damião, e disse agora com mais
satisfação, por se sentir menos culpado:
- A comida do orfanato é bem feita, mais esta deve ser espetacular!
Mas os doces são melhores, e, além disso, o pouco que ganhamos não dá
para comer neste local, ainda tem o fato que temos que voltar rapidinho para o
orfanato para estudar.
- Vocês estão de parabéns! O trabalho dignifica a alma, e trás uma
sensação de utilidade, mais não devemos deixar os estudos, eles são a
essência para deixarmos a ignorância, e buscarmos a evolução intelectual,
base para melhorarmos também nosso espírito, não com crenças, mais com
mensagens de humildade e amor ao próximo. Além disto, tudo que
conseguimos com esforço, será mais bem apreciado. – Disse Damião batendo
palmas de tanta emoção por ver a atitude daqueles meninos.
- Quando eu crescer quero ter um restaurante, onde todas as
crianças poderão comer de graça. – Disse o mais jovem dos meninos, com um
leve sorriso, certamente imaginando seu sonho.
Damião olhou para o menino deixando transparecer ainda mais sua
alegria, então teve que dizer:
311
- Sonhe com o seu restaurante, mas quero que saiba que existe um
restaurante desta forma, onde todos os necessitados comem de graça! Lá
temos que cumprir nossas tarefas diariamente, mais a comida é farta e
igualitária. Um dia estaremos todos almoçando neste restaurante, e você se
lembrará deste dia com alegria, não pela comida, mais pela oportunidade de
estarmos todos unidos.
O menino quase explodiu de tanta alegria em saber da existência de
tal restaurante.
A comida finalmente havia chegado, Damião comia como um louco,
estava literalmente morto de fome, mas os meninos comiam muito devagar.
- Porque estão comendo tão vagarosamente? – Questionou Gerard
intrigado.
- Queremos apreciar melhor o sabor, bem como, este momento... –
Disse uma criança que até aquele momento nada tinha dito.
- Fazem bem meninos! Muitas pessoas não sabem apreciar um
momento, e acabam deixando passar certos pontos em suas vidas que fariam
toda importância em um futuro próximo... Mas me desculpem não cumprir esta
regra hoje, porquanto, estou faminto, meu corpo tinha que ser alimentado com
rapidez, por isso não posso me dar ao luxo. – Disse Damião não escondendo a
emoção que sentia naquele momento, mas com a boca cheia, afinal, não se
aguentava de tanta fome.
- O senhor fala como os padres do orfanato, eles explicam as coisas
sempre muito bem para nós, assim não nos sentimos muito sozinhos. Será que
o senhor não poderia ir para a Igreja? Tenho certeza que aceitariam o senhor
lá! – Disse o menino mais velho.
- Porque diz isso meu jovem. – Damião questionou intrigado com as
razões daquele convite.
O garoto somente olhou para as vestes de Damião, dizendo com
certa vergonha pela conclusão que havia feito:
- Me desculpe senhor, mas creio que o senhor precise de um local
para ficar, e eles podem te dar roupas, alimento, e um local para dormir, em
troca o senhor pode ajudar com os meninos, e, ainda, nos demais afazeres do
orfanato.
Damião ficou um tempo pensando naquilo que aquele jovem estava
lhe dizendo, após algum tempo perdido em seus pensamentos, disse:
- Agradeço sua preocupação, mas não estou necessitando deste
tipo de ajuda. Tenho que te falar que não tenho religião... Minha crença é
indivisível para crer somente em um ou em outro culto! Mais acho que terei que
ficar em uma igreja, que infelizmente não é a que vocês moram. Mais saibam
que não é porque não tenho uma religião que não acredito nelas, em seu poder
de fazer o bem ao próximo, mesmo que para isto elas mais dividam do que
312
unem as pessoas. E, por isto tenho minha fé alicerçada no amor ao próximo,
independente de sua religião, naturalidade, cor, raça, etc., no dia em que todos
entenderem isto, estaremos juntos não contra alguém ou alguma outra
instituição, mais a favor e em prol de um todo...
Os meninos voltaram a comer, a tenra idade deles os impediam de
raciocinar o que Damião falou, contudo, Gerard estava de boca aberta, naquele
momento tinha a convicção que aquele homem não era um simples mendigo.
Após todos terminarem de comer, Gerard pediu ao garçom para
trazer todos os doces de que dispunham para uma sobremesa, e, que ainda
era para arrumar todo o estoque disponível para viagem, que os garotos iriam
comer ali alguns e o restante iriam levar para os amigos.
Os garotos encheram-se de alegria, comeram até quase de
empanturrarem de comida, e, por isso não tinham muito espaço disponível em
seus pequeninos estômagos para os doces, mas já que poderiam levar eles
estavam satisfeitos, afinal, poderia naquele dia dividir com todos os seus
coleguinhas.
Gerard foi até o caixa e pagou a conta, dando uma excelente gorjeta
aos garçons, os quais até brilhavam os olhos de tanta satisfação.
- Me digam qual é o orfanato que vocês moram? – Perguntou Gerard
ao retornar à mesa.
Os meninos ficaram meio receosos, e Gerard teve que questionar:
- Porque o receio?
O mais velho novamente tomou a frente, respondendo com certo
temor:
- O senhor não vai contar para o Padre Alencar que estávamos
trabalhando, e que aceitamos a comida, vai?
Damião e Gerard caíram na gargalhada.
- Não meu jovem, é somente para poder enviar os brinquedos e
demais coisas de que vocês devem estar precisando neste orfanato, também
vou providenciar um ótimo cozinheiro e alimento necessário para a
manutenção mensal, para que os Padres possam ter mais tempo para lhes
ensinarem sobre religião e demais conhecimentos.
Os meninos estavam eufóricos, não podiam acreditar, deram o
endereço e todos juntaram em Gerard abraçando suas pernas, após, saíram
correndo, a alegria era tanta que eles pareciam que iriam explodir.
Gerard ficou sorrindo, sentia em seu interior uma sensação
sensacional, não podia explicar, era melhor do que qualquer coisa que já
presenciou, era novo, magnífico, se sentia vivo, mesmo com as fortes dores
que lhe afligiam.
313
- Onde é sua casa Damião? Quero te visitar mais vezes!
- Está nela Gerard. – A resposta veio curta e direta, soando como
um desafio.
- Não entendi. – Respondeu Gerard após muito raciocinar.
- Minha casa é o universo! Mais o local onde me descanso, não é
nesta dimensão, é muito longe, e ao mesmo tempo muito próximo! Estou aqui
somente de passagem, não apenas nesta dimensão, mais digo na França, logo
irei para o Brasil, lá tenho uma missão.
Gerard franziu o cenho, que missão poderia ter aquele homem?
Mais tinha uma certeza, aquelas horas que passaram juntos foram as melhores
de sua vida, então queria saber se poderia ajudar ainda mais:
- Você tem dinheiro para chegar até o destino de sua missão?
- Não necessita, já ganhei a viagem, e, somente estava pedindo
ajuda aos meus amigos espirituais para me alimentar enquanto aguardava o
navio, justamente quando você chegou! – Respondeu Damião com um sorriso.
- Acho então que interrompi seu pedido a estes amigos? –
Questionou Gerard também com um sorriso.
- Não, acho que eles resolveram me ajudar rápido demais, enviando
imediatamente o senhor. – Damião respondeu secamente, ao passo que pegou
Gerard de surpresa.
- Você é especial Damião, vou lhe dar um pouco de dinheiro para
qualquer emergência.
Damião agradeceu, e eles saíram sorrindo, antes de se despedirem
ainda passaram em uma loja, onde Gerard lhe presenteou com roupas e
sapatos.
Damião saiu correndo da loja ao avistar que o navio havia atracado,
afinal, não sabia quanto tempo iria levar para ele zarpar, e não poderia perder a
viagem de forma alguma. Ao chegarem perto do navio Gerard deixou escorrer
uma lágrima, e disse com a voz rouca de emoção:
- Posso lhe chamar de amigo?
- Claro! Mais prefiro que me chame de irmão!
Gerard sorriu, aquele sujeito era muito encantador, nunca esperava
encontrar em um maltrapilho, o pai que sempre lhe faltou, e disse ainda mais
emocionado:
- Posso não ter encontrado a cura para meu corpo, mais sei que
hoje encontrei uma para minha alma...
314
- Tudo tem um motivo e uma razão de ser. No passado você
acumulou uma fortuna, que agora será usada para o bem. O Criador não te
puniu com um câncer, esta moléstia foi à oportunidade de você poder ver a
vida de uma maneira diferente! Se morresse agora, tenho certeza que iria para
um local melhor, porque soube se arrepender no tempo certo, e mesmo que
fosse tarde, fez de tudo para reverter suas atitudes egoístas.
- Você realmente acha isso? – Gerard até brilhava os olhos de
emoção, os quais estavam marejados.
- Saiba que já vi vários reis e rainhas morreram em cima de uma
pilha de ouro, sem abrir mão de um único centavo para alimentar a população
faminta, que tirava da boca para alimentar suas ambições. Você por outro lado,
mesmo sem ter certeza da salvação do corpo, abriu mão de seus bens, e
salvou sua alma no dia em que tomou esta atitude... Ganhará mais tempo, não
para salvar sua alma, mais outras, que necessitam de sua ajuda,
principalmente, a pessoa que lhe amou, e que até hoje aguarda para ser
retribuída... – A resposta de Damião veio em um tom de mistério.
Gerard ficou parado, mudo, então resolveu quebrar o silêncio:
- O que está dizendo?
- Nunca diga nada a meu respeito, e para onde eu fui! Não tente me
encontrar em meu destino, porque não sou deste mundo, mais nele tenho
neste momento minha morada, e farei de tudo para que seja a mais feliz
possível. Hoje você me mostrou que poderá fazer a diferença, então se levante
a cada dia da cama, e se questione o que poderia fazer para mudar o mundo, e
não apenas pense, mas faça! – A resposta de Damião veio ainda com mais
mistério com o seu significado.
Gerard ainda estava parado, em transe com seus pensamentos, foi
quando Damião chegou bem perto e lhe deu um forte abraço, fazendo com que
ele começasse a sentir seu corpo queimar inteiramente...
Quando Gerard finalmente conseguiu abrir os olhos viu que Damião
estava brilhando como o anjo que ele viu no sonho. Seu coração bateu mais
forte, e as dores de seu corpo foram sumindo pouco a pouco, em pouco tempo
ele adormeceu lentamente...
Quando acordou o navio não mais estava no deque, havia partido
igual a sua doença...
315
CAPÍTULO 79
Oceano Atlântico – França para Brasil, 1982
O navio de Damião já estava muito longe do local de sua partida,
cortava as enormes ondas, as quais anunciam uma forte tempestade...
Sei que não deveria ter curado aquele homem, afinal, estou
gastando energias de que poderei necessitar, mais senhor, necessitava ajudálo! Além disso, senti que fui movido a isso. – Ele raciocinava em perdão.
- O senhor poderia se dirigir para sua cabine? – Orientou um
pequenino e simpático marinheiro para Damião retirando-o de seus
pensamentos.
Quando veio a orientação, Damião olhou o mar agitado pela proa.
- Está vindo uma tempestade? – Retrucou não escondendo seu
medo, o qual era revelado pelo tom preocupado de sua voz.
- Sim senhor. Creio que em breve estaremos dentro de uma
tempestade que nunca presenciei em mais de trinta anos no mar...
- Como assim?! – Damião bradou como um covarde, suas pernas
tremiam, afinal, ele tinha verdadeiro pânico quando se tratava de água, frutos
de um afogamento na infância.
- Quando saímos não tinha qualquer previsão de tempestade, e
segundo constatamos, há uma de grande proporção à frente. O capitão está
muito preocupado, chegou até mesmo a questionar se os nossos
equipamentos estavam com problemas, tendo em vista que não havia qualquer
previsão de tempestade, e, a formação de uma destas proporções em tão curto
espaço de tempo é algo tão raro que poderíamos dizer ser um mistério
daqueles que só acontecem em alto mar.
- Porque não mudaram de direção? – Damião questionou quase que
como uma reclamação.
- Mudamos, mais parece que inexplicavelmente a tempestade está
nos perseguindo, em breve o capitão disse que estaremos no centro dela, por
isto estamos retirando todos da proa e da popa, e pedindo que fiquem em suas
cabines.
Damião agradeceu e saiu diretamente para a cabine. Sabia que algo
estava errado, e tinha que descobrir imediatamente o que era...
Chegando à cabine, ajoelhou-se e começou a rezar de uma maneira
diferente, somente ficou calado e com as duas mãos para o alto.
Em alguns instantes uma forte luz começou a se formar na cabine
logo atrás dele, era muito forte e Damião abaixou as mãos, mas não abriu os
olhos.
316
Aos poucos a luz foi diminuindo, e podia-se ver a figura de uma linda
mulher. Ela tinha um vestido reluzente, cabelos negros e longos, os quais
deixavam ainda com mais contraste as diversas perolas em um colar no
pescoço, em pulseiras em suas mãos, e em uma linda tiara, sua pele parecia
ser macia e lisa, tendo um tom moreno claro, era simplesmente a imagem da
perfeição.
Damião conseguiu abrir os olhos, e viu que sua amiga havia
atendido seu pedido de ajuda.
- Há quanto tempo meu amigo? – Questionou com ternura a mulher
com uma voz serena e afetuosa, mais com um misto de cinismo.
- Não muito se formos considerar sua visita inesperada na França! –
Respondeu Damião com um enorme sorriso.
A mulher se aproximou de Damião, sentando-se imediatamente em
uma poltrona, em nenhum momento lhe dirigiu qualquer sinal de afeto maior,
sequer um abraço.
- Sinto que você ainda tem receio de mim. – Ponderou Damião
cauteloso.
- Não tenho receios, mas estou com cautela, afinal, da última vez
que te visitei, fui efetivamente enxotada. Você sequer conversou comigo!
Damião maneou a cabeça, ela não era fácil, tinha um gênio muito
difícil, era uma excelente amiga, fiel, mais sabia ser insuportável quando
queria.
- Em nenhum momento te enxotei! Somente te disse que não
poderia lhe receber naquele local, não por falta de hospitalidade, mas
simplesmente porquanto estava no meio de uma grande missão, e recebi
ordens plenas e concretas do Conselho Supremo de que não poderia ter
qualquer ajuda, do contrário poderiam descobrir quem realmente eu era. Bem
como, sabe que como não está encarnada sua energia pode ser facilmente
constatada por qualquer demônio a quilômetros, o que certamente iria
afugentá-los, e com isto estragar toda minha missão.
- Porque simplesmente não me disse isto! – Respondeu agora
vorazmente a mulher.
Damião abaixou a cabeça, não em sinal de vergonha, mais de
nervosismo.
- Está vendo! Não responde minhas perguntas! – Tornou a mulher.
- Eu não tenho tempo para discutir com você Iemanjá! Sinto que
estou correndo grande perigo, e precisaria da ajuda de uma amiga! Contudo,
vejo que você esta mais preocupada em obter respostas para um
acontecimento banal, do que em me ajudar! – Damião simplesmente
desabafou, deixando cair os ombros.
317
A mulher se sobressaltou assustada com a resposta, mais não se
deu por vencida:
- Não lhe entendo, pelo que fiquei sabendo você agora será um
Padre e ainda um professor em uma diocese e faculdade do Brasil, não deveria
me chamar então como sua agora igreja me designa, ou seja: de nossa
senhora dos navegantes?! Ao invés de Iemanjá?!
Damião não acreditava que Iemanjá havia guardado tanta raiva dele
somente por ter-lhe mandado embora. Era certo que ele havia se excedido à
época, mas era pelo medo de perder sua missão, portanto, não segurou o
nervosismo, respondendo em um tom agora não mais de desanimo, mas de
fúria:
- Estou encarnado, e necessito de sua ajuda! Mais sei que poderia
lhe chamar de vários nomes, posso escolher entre vários, até mesmo voltar em
tempos mitológicos em que você era uma das principais Deusas! Contudo, teria
que me chamar também por meus vários nomes que me atribuíram no decorrer
dos milênios, o que somente nos atrasaria ainda mais! Estou falando sério
Iemanjá, preciso de sua ajuda, e não tenho tempo para discutir!
- Como poderia lhe ajudar se você mesmo me disse que não posso
interferir diretamente no mundo material? Repito que você mesmo fez questão
de frisar isto para mim na França!
- E quem disse que teria que interferir no mundo material?
Iemanjá parou subitamente de falar, e lançou um olhar desafiador
para Damião. Não sabia o que estava ocorrendo.
O que ele quer dizer que eu não iria interferir no mundo material? –
Pensou, sabendo então que Damião não estava realmente para brincadeiras.
- Me desculpe. O que está acontecendo?
- Já era hora! Achei que não ia me dar crédito! – Exclamou Damião
mostrando totalmente sua impaciência, e já começando a explicar
imediatamente para não perder mais tempo:
- Eu estou indo em direção ao Brasil, como você já disse que tem
conhecimento desta nova missão. Contudo, parece que demônios ou sei lá o
que seja, descobriram minha localização, quem sou e minhas intenções...
- Como sabe disto? – Interrompeu Iemanjá agora também
assustada.
- Há uma forte tempestade vindo de encontro ao navio. – Respondeu
Damião pensativo.
318
- Ainda com aquele medo estupido de água Damião? Tenho que lhe
dizer que no mar isto é comum?! – Rebateu a mulher com cara de pouco caso,
prosseguindo calmamente em sua explicação:
- No mar existem várias tempestades que podem formar-se de
repente! Não vejo razão para que se preocupe. Repito que é somente seu
medo atrelado ao seu trauma infantil, bem como, comum em todos que não
costumam se aventurar neste mundo aquático que poucos ousam enfrentar.
Damião olhou para ela com um olhar furioso, agora somente
pensando:
É certo que está mulher tem enorme poder em manipular e reger a
água e o que vive nela. Contudo, este mesmo poder parece perder importância
quando ela esta com rancor de alguém. Entendo que fui grosseiro quando ela
resolveu me visitar, mais o que ela queria? Afinal, quantas vezes terei que
explicar que não podia colocar em risco minha missão?!
Após tal pensamento ele olhou para ela de cima em baixo, respirou
fundo respondendo com uma voz calma e cortês:
- Somente te peço como amigo que analise para mim se isto
somente é uma tempestade normal, ou se é algo diferente... Se for normal não
deve interferir, caso for algo diferente precisarei de sua ajuda. Além disso,
estou muito fraco, porquanto, tive que usar um pouco meus poderes, e, creio
que demorarei em recobrá-los.
Iemanjá olhou-o também de cima em baixo, também pensando:
Sei que Damião não esta mentindo, ele é um bom amigo, mas
também não posso deixar por menos sua grosseria na França, afinal, na
ocasião eu somente queria ajudar.
Após a pequena pausa de ponderação em seus pensamentos ela
resolveu responder:
- Está bem! Vou analisar do que se trata está tempestade. Se eu não
aparecer é porque não é nada, e terei ido embora sem me despedir, porquanto,
ainda estou muito nervosa com você!
- Muito obrigado! – Respondeu Damião se dirigindo para lhe dar um
abraço de agradecimento, contudo, antes dele chegar perto, ela desapareceu.
Gênio forte e difícil tem está mulher! – Ele concluiu em pensamento
balançando a cabeça.
319
CAPÍTULO 80
Londres, Inglaterra, 1982
Arthur, Charles e os agentes estavam já há algum tempo
sobrevoando o céu de Londres nos três helicópteros. Como haviam
combinado, eles mantinham uma distância segura um do outro, mais se
comunicavam de cinco em cinco minutos para certificarem que corria tudo bem.
- Pensei que o senhor somente ficaria no comando externo, não na
linha de frente de batalha! – Exclamou Charles que estava no helicóptero de
Arthur evidenciando sua surpresa não apenas em ver o novo amigo não
apenas naquele traje cibernético, mas, principalmente, por querer estar à frente
de tudo.
- Pois é meu caro Charles, ficarei sim no comando, por isso tenho
que ir a frente de vocês, porquanto, é assim que um verdadeiro general faz. –
O velho respondeu estufando o peito para demonstrar sua virilidade, e, ainda,
para ironizar um pouco aquele espanto inicial dele e dos demais agentes. –
Além disso, creio que você melhor do que ninguém sabe que ficar em
comandos externos não é uma boa opção!
Charles ligou rapidamente a alfinetada do velho, que queria lhe
lembrar do dia em sua mansão.
Mesmo com os olhares ainda assustados com a figura de Arthur
trajado para a guerra todos estavam muito tranquilos, afinal, quanto ao
combate já estavam mais do que acostumados, e ainda mais trajando armas
de última geração.
Bem como, agora por saberem que estavam acompanhados de uma
verdadeira máquina guerreira ao lado deles. Certamente todos naquele
helicóptero já haviam enfrentado missões tanto para a organização comandada
por Charles quanto em seus antigos empregos em situações muito mais
difíceis, desta forma, mesmo que agora enfrentariam algo novo, estavam mais
do que preparados tanto psicologicamente quanto materialmente.
Após algum tempo de viagem Charles observou pela janela a
localização, e concluiu o óbvio.
- Arthur, o aeroporto certamente não fica nesta direção!
- Mas quem disse que meu jato fica em um aeroporto comum meu
caro e inocente Charles?! – Respondeu o velho com um sorriso malicioso e um
olhar que demonstrava seu poder não apenas intelectual mais acima disso
material e de influência.
Após aquela resposta Charles decidiu ficar calado, realmente havia
sido inocente ao pensar que Arthur manteria algum de seus itens retirados de
sua exclusiva fábrica de peripécias militares para um aeroporto comum.
Quando os helicópteros saíram da cidade de Londres sobrevoaram
ainda vários quilômetros, até que entraram em uma região mais inóspita, neste
320
instante todos se juntaram naquela área muito plana e com muito verde,
contudo, totalmente isolada...
- Senhor, os radares não indicam a presença de nada nem ninguém
dentro do perímetro da zona crítica de voo. – Disse o piloto para Arthur
parando o helicóptero no ar e sobrevoando em um local fixo.
Charles olhou para baixo e não viu nada além de capim e algumas
árvores, definitivamente não entendeu o que estava acontecendo, afinal,
aquela região certamente não tinha sequer pista de decolagem, quanto mais
condições de que um avião ali estivesse e ainda que pudesse dali decolar.
- Meu caro Charles, apenas observe... – Disse Arthur sorrindo ao ver
a expressão de dúvida do rapaz, retirando de sua cintura um pequeno
aparelho, digitando alguns códigos no mesmo.
Após ele retirou vagarosamente, como se curtisse a situação, um
pequeno aparelho de telefone da cintura, telefonou e após um pouco de espera
disse ao seu interlocutor:
- Pode acionar o dispositivo, já acionei o meu, e segundo o radar do
helicóptero não há nada nem ninguém nas proximidades, assim, pode liberar a
abertura da tampa.
Após dizer isso em poucos segundo Charles e os demais agentes
que estavam naquele helicóptero, e, certamente os demais que estavam nos
outros dois se assustaram ao ouvir um grande barulho vindo do solo abaixo
deles, quando Charles e os demais agentes se esticaram para observarem o
que estava ocorrendo no solo pasmaram, porquanto, o solo estava se abrindo,
e de seu interior um grande buraco se formava.
- O que é isso? – Questionou Robson rompendo o silêncio, olhando
fixamente para Arthur.
- Isto é o meu pequeno esconderijo para minha máquina, afinal, não
poderia guardar um item tão precioso em um local comum, assim, inventei isto,
e, sob minhas ordens minha equipe o criou.
- No que consiste?
- Em síntese meu caro Robson, consiste em um hangar subterrâneo.
Por isso tinha que me certificar que não tinha ninguém na região, razão pela
qual, instalei sensores em todo o perímetro e ainda analisamos por um radar os
movimentos, tudo para que não corra o risco de descobrirem minha joia. Após
eu libero a abertura por este aparelho, telefono para um escritório secreto de
vigilância que libera outro código após eu dizer que está tudo bem – Tentou
explicar rapidamente o velho sua façanha, enquanto a grande tampa já estava
quase que totalmente aberta.
- Mas o senhor não falou nenhuma senha para o rapaz que
telefonou. Isto não seria um risco? – Questionou Robson ainda curioso, e,
321
também tentando obter pontos com o velho, afinal, queria demonstrar que
entendia um pouco de segurança e demais.
- Meu caro Robson, senhas são muito perigosas, por isso no
escritório que telefonei há um aparelho que além de reconhecer minha voz,
ainda, faz um reconhecimento utilizando o tom e timbre dela, entre outros
quesitos analisando se sou eu, se estou nervoso ou alterado, o que poderia
significar um sequestro, etc.
- Fico cada vez mais espantado com suas artimanhas tecnológicas
meu caro Arthur. – Disse Charles sorrindo, quando percebeu que Robson ficou
tão maravilhado com aquilo que ficou mudo.
Após todos dirigiram os olhares para a janela, observando o terminar
de abertura da verdadeira cratera que se formou no subsolo.
Em seguida um alto bipe soou, e os helicópteros começaram a
descerem ao interior da cratera, e, logo após eles adentrarem pousaram em
uma espécie de solo de metal.
- Isso é muito raso. – Disse George tentando como sempre brincar.
- Este é apenas o chamado solo elevador meu caro George. – Arthur
respondeu com um sorriso malicioso, estava convicto que o rapaz assim como
os outros não esperava por aquilo. – Ele foi desenvolvido para que os
helicópteros ou veículos que adentrassem descessem com segurança até o
subsolo onde se encontra o hangar com meu brinquedinho.
Assim que os helicópteros pousaram no solo de metal o mesmo
começou a descer suavemente, como um elevador, e à medida que ele descia
a chamada “tampa”, como Arthur a nominou começou a se fechar acima deles,
e, somente a escuridão tomou conta do local...
Ao cair na escuridão Charles sentiu uma pontada de medo,
raciocinando o óbvio:
Isso é realmente muitas vezes maior do que eu imaginava...
322
CAPÍTULO 81
Oceano Atlântico – França para Brasil, 1982
Já havia se passado uma hora que Iemanjá havia partido e até
aquele momento nada de retornar ao navio. Damião deveria então ficar mais
despreocupado, afinal, ela havia dito que se não retornasse era porquanto não
se tratava de nada.
Ela está demorando, mais algo me diz que esta tempestade não é
normal...
Em razão deste pensamento ele simplesmente andava de um lado
para outro na pequena cabine, foi quando resolveu ir até a janela, assustandose com o que avistou...
À sua frente avistou duas enormes trombas d‘águas, como
redemoinhos que se chocavam!
- Meu Deus... – Ele exclamou antes de deixar o queixo cair de medo,
e, suas pernas tremerem ainda mais.
E não era para menos, a cena ainda era mais assustadora,
porquanto, elas não estavam seguindo em direção ao navio, estavam se
chocando entre si com extrema força.
- É como se estivessem lutando... – Ponderou Damião perdendo-se
em seus pensamentos, afinal, precisava ver aquilo melhor, poderia saber se
Iemanjá tinha encontrado algo, porquanto, possuía o dom de ver o mundo e os
seres imateriais do plano material no qual estava encarnado, lado outro, para
isto, tinha que encontrar algo que pudesse aproximar seu campo de visão...
- O capitão! Ele deve ter um binóculo ou luneta, com isto poderei ver
o que está acontecendo. – Arrematou em voz alta, já saindo correndo de sua
cabine, em direção à sala de comando.
Passou correndo pelo estreito corredor que levava para a sala de
comando se escorando nos corrimões, porquanto, agora parecia que o navio
estava sendo sacudido, foi quando parou subitamente ao chegar perto das
escadas superiores.
- Isto não pode ser real! – Exclamou olhando para as duas trombas
d’águas.
Ele chegou não apenas à conclusão que aquelas duas trombas
d‘águas estavam lutando, mais agora tinha certeza, e elas estavam fazendo
aquilo de uma maneira voraz.
Os marinheiros corriam para todos os lados, assustados e seguindo
as ordens de um senhor que se encontrava em uma sala no topo do navio.
Neste momento, Damião recebeu um banho de água do mar,
advinda devido a uma enorme onda, momento em que acordou de seus
323
devaneios, então continuou sua trajetória rumo ao topo do navio, afinal, sabia
agora que tinha que encontrar o capitão com urgência.
Subiu várias escadas, e quando estava prestes a entrar pela porta
da sala do capitão, recebeu um baque que o fez voar para trás.
- Aonde pensa que vai? – Bradou em alto e bom tom um enorme
marinheiro a sua frente.
Como Damião não respondeu, porquanto, ainda estava tomando ar,
para recuperar o que perderá com o baque repentino, o marinheiro o pegou
pela gola da blusa e começou a arrastá-lo para longe da sala do capitão.
- Par.. e... Pare! Po... Posso ajudar! – Gaguejou Damião, ainda
recobrando a consciência e o ar de seus pulmões.
O marinheiro parou subitamente, olhando para Damião como um
cão que espreita sua presa, após um longo período analisando-o, disse com
uma voz cortante:
- No que pensa que poderia ajudar?
- Eu acho que sei o que está causando aquelas trombas d’águas. –
Damião respondeu tentando ainda obter mais ar.
- Como assim? – Respondeu rapidamente o marinho muito cético e
desconfiado, contudo, não escondendo sua curiosidade.
Damião tomou mais ar e elaborou uma explicação mais rápida,
lógico, não contando a verdade:
- Sei que aquelas trombas d’águas estão seguindo o curso do navio,
e que cada vez que vocês mudam de direção parece que elas te seguem!
Trabalho há muito tempo em uma empresa de meteorologia, e posso
estabelecer um curso que elas podem seguir, com isto será mais eficaz ao
mudarmos de direção.
O marinheiro ficou pensativo, aquele senhor parecia ser uma pessoa
honesta, mesmo somente lhe vendo uma vez na vida, era como se lhe
conhecesse há tempos, ele transmitia confiança...
- Fique onde está! – Ordenou o marinheiro, soltando as grandes
mãos da gola de sua camisa, e, ainda, taxando logo em seguida: - Não mexa
nem um músculo! Vou ver com o capitão se ele pode lhe receber!
- Posso pelo menos me levantar? – Questionou Damião prostrado
ao chão como um trapo.
- Pode! – Respondeu o marinheiro já entrando imediatamente na
sala de comando.
324
Damião foi se levantando devagar, todos os seus músculos doíam,
pensou porque Jesus não lhe concedeu um corpo mais novinho em sua
ressureição, ou porque não fez algum milagre do rejuvenescimento, sorriu
somente de pensar nestas possibilidades, sabia que eram impossíveis, devido
a não terem permissão de interferirem na matéria.
Após alguns minutos a porta se abriu, saindo um senhor de uns
setenta anos, cabelos grisalhos, e um vigor físico invejável, Damião pensou
consigo mesmo:
Bem feito... Se eu fosse marinheiro poderia estar com um físico
igual!
Dando um sorriso novamente somente com esta imaginação,
percebendo que apesar de tudo que estava ocorrendo ele ainda estava de bom
humor.
- Do que está sorrindo senhor? – Questionou o capitão de maneira
brusca e arrogante.
- Não é do senhor capitão! – Respondeu Damião com vergonha,
tentando demonstrar que não tinha a intenção de debochar dele. - Estou aqui
para ajudar...
Antes mesmo que terminasse de falar havia dois marinheiros
fazendo uma vistoria por todo o seu corpo, o que o fez sobressaltar de susto.
- Não se acanhe, são procedimentos básicos para entrar na sala de
comando! O marinheiro Araújo me contou que o senhor pode nos prestar
auxilio em alguns problemas que estamos enfrentando! Então venha, entre
rápido, afinal, pelo que estou notando temos pouco tempo, porquanto, é certo
que aquelas trombas d’águas parecem seres vivos que estão nos
perseguindo... – Disse o capitão agora em tom mais amistoso, abrindo a porta
para que Damião entrasse.
Os marinheiros pararam de revistá-lo, ao passo que ele seguiu
rapidamente para dentro da sala de comandos, se surpreendendo com a
quantidade de equipamentos que ali continham.
- Do que precisa? – Questionou o capitão de maneira ríspida.
- Preciso de um binóculo ou luneta. – Ele foi direto.
- Luneta? Acho que anda vendo muitos filmes antigos, não vejo uma
luneta desde a escola naval, onde estudei sobre elas nas aulas de história! –
Gritou o capitão soltando um enorme sorriso, que contagiou todos os
marinheiros.
Damião achou aquela atitude estranha, parecia que eles estavam
preocupados, mas não ligavam muito para aquela situação. Então resolveu
questionar:
325
- Vocês não estão com medo do que está acontecendo?
O capitão soltou mais uma gargalhada, dizendo em tom amistoso:
- Somos lobos dos mares, já passamos por várias situações!
Sempre encaramos como mais uma aventura! – Fez uma pausa maneando a
cabeça. – Confesso que esta é inusitada, nunca vi nada igual. Mais tenho
certeza que nossa senhora dos navegantes estará ao nosso lado.
Damião sorriu, era contagiante a fé de algumas pessoas, mal
sabiam que naquele momento uma semideusa ou santa estava realmente
cuidando deles...
O capitão entregou um grande binóculo para Damião, que se
assustou com aquele instrumento. Ele era muito pesado, e moderno.
Vendo que Damião estranhou o equipamento, o capitão resolveu
ensiná-lo rapidamente a usá-lo.
Após os ensinamentos Damião o levou aos olhos, aproximando a
imagem para as trombas d’águas, aquela cabine fornecia uma visão
privilegiada, mais aquele aparelho era fabuloso, era como se ele realmente
estivesse perto daqueles dois fenômenos que se gladiavam no mar, fazendo
tudo a sua volta se sobressaltar.
Quando analisou mais de perto as trombas d’águas assustou-se de
tal maneira que retirou o binóculo dos olhos por alguns segundos, tornando a
voltá-lo rapidamente.
Aquilo não era possível... Avistou no centro da primeira tromba
d’água Iemanjá, e na outra um semideus que ele há milênios não via mais
sequer falar.
Damião somente ouviu dizer sobre ele, vendo inclusive fotos do
mesmo em alguns livros e coisas do gênero, ao passo que até mesmo na
dimensão sublime ele era uma lenda, porquanto, reinou na era mitológica,
sendo um dos seres mais poderosos daquela era primeva.
Este ser é definitivamente Poseidon!... – Ele concluiu em
pensamento após a criteriosa observação.
Após a conclusão ele passou a analisar o contexto dos
acontecimentos ainda mais assustado, afinal, nunca pensaria que Poseidon e
Iemanjá estavam lutando ferozmente.
Por isto estas trombas d’águas não estão vindo em direção ao navio!
Iemanjá deve ter encontrado Poseidon que certamente iria atacá-lo, e iniciouse esta batalha... – Concluiu, por óbvio, ainda somente em seus pensamentos.
- O que está vendo? – Questionou o capitão.
326
Para espanto de todos da sala Damião somente ergueu uma das
mãos pedindo mais tempo, o capitão ficou mudo, e agora mais preocupado.
Iemanjá lançava raios contra Poseidon que se defendia mais
rapidamente revidando com mais raios, e parecia que aquilo iria demorar muito
tempo...
- Temos que fazer uma corrente de oração, precisamos de ajuda
urgente! – Disse Damião já pegando nas mãos de dois marinheiros que ficaram
extremamente assustados.
- Aceitamos que o senhor entrasse aqui para nos dar uma ajuda
plausível! Se fosse para rezar, nos mesmos o faríamos! – Disse o capitão
extremamente irritado.
- Me desculpe capitão, mas não tenho tempo para suas ordens
ridículas! Se estivesse realmente com o controle da situação não teria aceitado
minha ajuda. – Vociferou Damião em alto e bom tom, assustando todos os
marinheiros e até mesmo o próprio capitão que teve que reconhecer que
aquele estranho senhor tinha razão, por isso abaixou a cabeça pegando nas
mãos dos marinheiros e formando, então, a roda de oração pedida.
Damião já havia pensado em quem poderia ajudar Iemanjá naquela
hora, não tinha o poder de invocar nenhum semideus, o que realmente poderia
fazer a diferença, pensou em Miguel que tinha muitos poderes novos, mas
sabia que ele estava muito ocupado. Gabriel também não poderia vir,
porquanto estava em uma missão. Não tinha muita amizade com os outros
arcanjos, principalmente com Rafael, devido a alguns desentendimentos do
passado. Somente lhe sobrou pedir ajuda a uma Arcanja, a única amiga
realmente de confiança...
Serena! – Ele ponderou em pensamentos.
Ele tinha que confessar que ela era muito poderosa, mais teve
certos receios em levar o pedido de ajuda a cabo, afinal, perto de um semideus
era como colocar uma criança dentro da jaula de um leão.
Mais não tenho muitas opções. – Concluiu ao final.
- Rezem um pai nosso, e logo após pensem no nome Serena. –
Ordenou Damião aos integrantes da sala.
Os marinheiros ficaram todos encabulados com o que iam fazer,
perguntavam-se intimamente o que aquele velho estava pensando, mais sem
muitas alternativas, tinham que admitir que não custava nada tentar.
Damião tomou a frente e começou a rezar o pai nosso, os
marinheiros e o capitão o acompanhavam, após terminarem Damião começou
a falar em uma língua diferente, que todos na sala assustaram-se, era diferente
de tudo o que eles já ouviram, após algumas palavras, ele ergueu as mãos e
clamou bem alto:
327
- Peço Serena que venha a nosso encontro, estamos em um
momento de aflição, e não temos muito tempo!
Um grande silêncio prevaleceu na sala, podiam escutar o barulho de
uma enorme mosca que voava tranquila...
Após alguns minutos Damião já pensava que Serena não lhe
atenderia, e os marinheiros e o capitão já questionavam a sanidade daquele
senhor, bem como, a deles, afinal, deveriam ser mais loucos em aceitaram
fazer tudo aquilo.
De repente tudo começou a tremer, o capitão olhou pelo vidro
analisando se eram as trombas d’águas que já havia chegado ao navio
enquanto eles estavam fazendo aquela palhaçada. Contudo, percebeu que
elas ainda estavam muito longe.
Em alguns segundos uma forte luz se formou bem no meio da roda
em que eles formavam na sala, quase cegando todos que ali se encontravam.
Rapidamente eles tapavam os olhos como podiam, somente Damião olhava
diretamente para a luz não se preocupando em cobrir os olhos.
A luz foi perdendo força, e ao mesmo tempo tomando a forma de
uma forte e alta mulher. Os quatro marinheiros e o capitão aos poucos
retiravam a mão da frente dos olhos, ficando boquiabertos ao ver aquilo, era
realmente inacreditável...
- Tenho que confessar capitão, que já devemos estar mortos, porque
se isso não for um sonho, estamos ficando loucos! – Bradou um dos
marinheiros assustados ao vislumbrar a estranha figura à sua frente.
Em poucos segundos a forma já estava completa, era uma mulher
de uns trinta anos, cabelos ondulados e negros, pele negra. Eles se
assustaram com o tamanho dela, facilmente passava de dois metros e meio de
altura, o que deixava os marinheiros de corpos parrudos extremamente
pequenos. Vestia um lindo vestido verde, com vários objetos que mais se
pareciam com medalhas presas ao seu vestido próximo ao decote.
Ela virou-se rapidamente para Damião lhe dando um forte abraço, foi
quando os marinheiros e o capitão puderam ver as enormes asas de cor cinza
que a mulher tinha nas costas largas e fortes.
- Obrigado por você ter vindo! – Disse Damião com extremo
agradecimento.
- Que isto meu amigo! Sabe que estou sempre ao seu lado para o
que der e vier, comigo não tem tempo ruim... – Respondeu a Arcanja com uma
voz serena, que lhe atribuía o nome juntamente a sua fisionomia.
Damião olhou pela janela, e disse em tom alegre:
- É! Para você parece não ter tempo ruim, mais terá que concorda
comigo que lá fora está um tempo muito ruim!...
328
Serena chegou bem perto da janela, firmando as vistas para poder
enxergar melhor, Damião sabia que ela podia ver uma agulha a quilômetros.
Os marinheiros e o capitão foram se arrastando para um canto,
afinal, não conseguiam esconder os seus medos.
- Aquela é Iemanjá? – Perguntou a Arcanja após algum tempo para
Damião mostrando-se confusa.
- É sim! E aquele com quem ela está lutando é certamente
Poseidon. – Respondeu Damião com uma voz desanimada.
Serena olhou para Damião com
mencionando após alguns minutos de silêncio:
uma
cara
de
ceticismo,
- Achei que Poseidon não passasse de uma lenda da era mitológica,
já me disseram que ele era real e que não quis reencarnar com os outros
semideuses quando lhes foram determinados ao fim da era mitológica.
- Pelo que sabia, somente Lúcifer não havia aceitado encarnar na
terra quando isto foi ordenado aos semideuses mitológicos, mais hoje, vendo
esta cena, concluo que outros devem ter se negado a isto! – Respondeu
Damião pensativo.
Serena estava indignada, analisava toda a situação, e sabia que
pelo que estava parecendo, Iemanjá não iria aguentar muito tempo. Ela não
tinha poder o bastante para enfrentar um semideus daquele porte, se as lendas
que ouviu quando foi criada eram verdadeiras, Poseidon era definitivamente
muito forte...
Os marinheiros e o capitão ainda assistiam tudo do canto, estavam
mudos, e não diziam nada, não queriam acreditar naquilo que estavam vendo,
questionavam em seus interiores se o navio não havia afundado, e estavam
mortos naquela hora, em pleno limbo, ou melhor, no purgatório...
- Tenho uma ideia! – Disse Serena já andando em direção ao
capitão.
O capitão ficou com mais medo ainda, aquela mulher era linda, mais
não conseguia pelo menos imaginar aquela cena, quanto mais vê-la!
- Quantas pessoas têm a bordo do navio? – Questionou Serena.
O capitão não conseguia dizer nada, então um marinheiro que
estava mais calmo respondeu em voz baixa:
- Duzentos e quarenta, entre passageiros e pessoas que aqui
trabalham.
Serena analisou toda situação, virou-se para Damião e disse em tom
de alegria:
329
- Acho que consigo tele transportar todos para o destino no Brasil...
Damião maneou a cabeça pensativo, e Serena respondeu em tom
mais agressivo:
- Sei o que está pensando Damião! – Mandou-lhe um olhar mais
compenetrada em intimidar. - Que não tenho poderes para isto, mais saiba que
desde a última vez que nos vimos, eu evolui muito, e creio ser capaz de fazer
isto!
- E se não conseguir? – Questionou Damião, lhe lançando o mesmo
olhar de intimidação.
Serena pensou novamente, mais tinha uma coisa que Damião não
havia pensado, e Serena tinha já chegado à conclusão desde que avistou a
cena, então resolveu clarear ao amigo:
- Do jeito que as coisas vão, creio que Iemanjá aguente somente
mais algumas horas nesta luta. Apesar de seu enorme poder, não acho que ela
vai vencer esta batalha... Além disto, não vejo que vocês têm outras opções, o
que limita para o fato de que realmente não restem muitas alternativas. Desta
forma, ou aceitam minha proposta, ou em pouco tempo todos estarão
desencarnados... Bem como, sei muito bem, e você também sabe que eu não
ajudaria Iemanjá em nada nesta batalha, talvez até lhe atrapalhasse. Com isto,
o que posso fazer é somente isto!
Damião abaixou a cabeça pensativo.
- Não é que duvide de você Serena, e de seus poderes, mais temo
que fracasse e se culpe por isto pelo resto de sua existência.
- Mais creio que serei capaz! – Ela demonstrou convicção e
confiança.
Após algum tempo de extensa reflexão, Damião chegou a uma
conclusão, a única que parecia ter disponível.
- Tudo bem... Faça! Mas temos que ver um modo de avisar Iemanjá!
- Isto é com você Damião! Eu creio que através do subconsciente
você possa se conectar com ela, afinal, vocês são santos da mesma linhagem!
Brigam muito, mais é discussão de irmão! – Disse Serena sorrindo para o
amigo, que lhe retribuiu o sorriso.
Após dizer isto Serena virou-se para os marinheiros dizendo em tom
firme:
- Já decidimos! Vocês estão sob novo comando! Não estou retirando
o poder do senhor Capitão, mais é porque sei que perto do que está ocorrendo,
o senhor é impotente no bom sentido para fazer qualquer coisa. Por isto, quero
que vocês marinheiros coloquem todas as pessoas, mulheres, crianças, todos
330
na proa do navio, eu ficarei aqui nesta cabine, porque as pessoas não podem
me ver.
Serena fez uma pausa pensativa, pensando como seria difícil para
ela apagar as lembranças das cabeças daqueles marinheiros após ter
esgotados todos os seus poderes naquela proeza...
Os marinheiros estavam assustados, contudo, acostumados a seguir
ordens de um mortal, não seriam tolos de questionar as ordens daquela
mulher, que eles até aquele momento questionavam o que era!
Saíram todos da cabine correndo, ficando somente Serena, Damião
e o capitão, que estava sentado, pensativo, quase chorando.
- O senhor está sentindo alguma coisa capitão? – Questionou
Damião ao ver que ele não estava bem.
O capitão olhou fixamente primeiro nos olhos de Damião, após nos
de Serena respondendo com voz chorosa:
- Há dez anos perdi minha mulher e meus dois filhos em um
acidente de automóvel! Questionei Deus porque havia levado eles ao invés de
mim! Todos me diziam que o mar era perigoso, mais minha família morreu toda
em terra firme, de uma só vez! Após este dia, eu não vivo, somente vegeto... O homem fez uma pausa para enxugar as lágrimas, e prosseguiu após algum
tempo com uma voz fraca: - Após te ver, sei que Deus existe, e que por isto,
devo ir para estar junto a minha família! Quero que você não me leve, me deixe
morrer aqui com este navio!
Serena olhou para o Capitão com lágrimas nos olhos, era uma
Arcanja, mais tinha uma família também, e sabia quanto era duro perder
alguém que amava, andou bem devagar, compreendendo o que afligia aquele
velho desde quando ela chegou. Não era o medo de sua presença! Mais seu
subconsciente prevendo que aquilo era um caminho, errado, mais um caminho
para encontrar novamente sua família...
- Sei que o senhor está com saudades de sua família! A Janifer sua
esposa, o Pierro e o Alexander também estão morrendo de saudades de você!
Aquilo pegou o capitão de surpresa, aquele ser sabia os nomes de
seus familiares mortos, devia ter noticias! Então não perdeu tempo:
- Eles estão bem?
Serena olhou novamente para ele com cara de pena.
- Não posso lhe dizer isto!
- Porque não? – Questionou impaciente o capitão.
- Você tem que saber que nesta dimensão, somente tem que aceitar
as coisas como elas ocorreram, porque nunca algo ocorre por acaso...
331
- Mas eu somente queria saber notícias deles, e poder morrer para
estar junto a eles! – Clamou o capitão.
- Não é você que escolhe isto capitão! No tempo certo estará
novamente junto a eles, e neste dia, tudo lhe será explicado. Enquanto isto não
ocorrer, deve seguir em frente! Não deve morrer em vão, porque a morte não
lhe servirá para juntá-los, somente para separá-los ainda mais!
Serena fez uma pausa, escolhendo as próximas palavras com
cautela, prosseguiu com mais calma:
- O senhor tinha uma missão hoje, que era deixar Damião entrar
nesta cabine, isto salvará muitas vidas! Por esta razão hoje o senhor fez a
diferença! Talvez ficou aqui somente para cumpri tal missão... Ou pode ser que
ficou para ser o chefe da marinha de seu País, e fazer ainda mais diferença! O
interessante da vida material é não saber de nada... Mais saiba que tudo que
fizer terá um grande significado. Por isto, deve ser salvo, porque assim é para
ser, e assim será!...
O capitão estava mais calmo, e sentia-se bem como nunca havia
sentido nos últimos dez anos de luto por sua família. Após alguns segundos
questionou para Serena:
- Vou me lembrar desta conversa?
Serena sorriu e disse alegremente:
- Vou deixar esta nossa conversa gravada em sua mente... Achará
que é seu inconsciente, e saberá no fundo que é algo maior, pensará que é
Deus, e isto será verdade, porque eu sou ele, uma vez que dele fui criada,
então sou parte dele como você o é também!
O capitão sorriu, e Damião que olhava tudo de longe se admirando
como Serena havia evoluído no decorrer daqueles anos em que ele estava
encarnado. Contudo, não tinham muito tempo, por isto resolveu interromper:
- Me desculpe interromper, mas o marinheiro já deu sinal de que
todos estão aguardando na proa lá embaixo, temos que ser rápidos porque tem
crianças lá, e as ondas estão enormes...
Serena mandou que o capitão descesse para a proa juntando-se aos
outros, e aguardasse. Ele a abraçou com força, ainda chorava, mais agora de
alegria. Após saiu correndo escadas abaixo.
- Damião! Tente conectar seus pensamentos com Iemanjá! Te
buscarei depois... – Gritou Serena fazendo um sinal de tudo certo com a
cabeça.
- Fico muito feliz em ver sua evolução Serena. Você está mais forte
do que nunca, conseguirá fazer isto. Sei que arrisca sua existência em tele
transportar tantas pessoas ao mesmo tempo, e por isto estou orgulhoso em
332
mesmo sabendo disto tentar, somente para ajudar estas pessoas e a mim e
também Iemanjá.
Serena sorriu alegre, e começou a chorar abraçando Damião e
dizendo com uma voz emocionada:
- Isto é muito importante para mim! Você foi o único que me apoiou
ao ser gratificada como Arcanja do Exército Supremo Celestial... Confiou em
mim, e farei de tudo para lhe ajudar.
Após dizer isto, Serena foi caminhando lentamente para o centro da
sala, e começou a rodar cada vez mais rápido... Em alguns minutos ela abriu
as grandes asas e continuou a rodar, parecia um disco, foi aos pouco subindo,
e sumiu no teto da sala de comando, Damião olhou para fora pelo vidro, e viu
que ela estava naquele momento planando sobre as pessoas, como um disco
voador.
- Mamãe, olhe um disco voador! – Uma das crianças disse
apontando para a estranha luz brilhante, ao passo que todos que estavam em
volta olharam se espantando.
Neste momento houve uma grande explosão de luz ocorreu se
espalhando pela proa e, por conseguinte, por todos que foram tragados por
seus raios, sumindo...
Damião sorriu, Serena utilizou uma tática digna de uma excelente
líder militar. Em uma jogada de mestre, imitou um disco voador! Todos os
humanos em algum momento da vida já questionaram se realmente existiria
vida fora do planeta terra. Com isto somente iriam lembrar-se de terem sido
tragados por uma luz emitida de um disco luminoso, e, após de serem movidos
para outro ponto da terra... Aquilo certamente iria causar um frisson na
imprensa, contudo, antes mesmo deles tentarem questionar, os governos
correriam para abafar o caso, e encobririam até mesmo que o navio sumiu.
- Pobre Pablo que perderá um dos navios de sua frota. – Pensou
Damião.
Damião colocou as duas mãos na testa, e iniciou em uma língua
estranha uma oração, fixando seu pensamento fortemente em Iemanjá, tentava
encontrar a consciência dela. Aquilo não estava sendo fácil, ela estava lutando
muito, e seus pensamentos eram voltados exclusivamente para aquela luta
mortal.
Iemanjá... Responda, sou eu Damião! – Disse Damião a ela em seu
pensamento.
Após ele se alegrou ao perceber um pequeno contato da amiga, que
dizia furiosa:
Você me colocou em uma enrascada Damião! No que foi se meter?
Este cara é muito forte, nunca vi nada igual, acho que não vou aguentar muito
tempo...
333
Damião sorriu, havia conseguido estabelecer um contato maior, e
parecia que Iemanjá estava ainda mais furiosa com ele...
Ouça bem! Vou falar somente uma vez! E ao invés de me culpar,
somente diga se escutou! Serena retirou todos do navio. Então quando lhe der
um sinal, pode sair daí o mais rápido possível!
Iemanjá suspirou aliviada, aquilo era como um banho quente de
banheira bem no paraíso celestial!
Sim entendi! – Respondeu já se demonstrando mais calma pelo tom
da voz em seus pensamentos telepáticos.
Em alguns segundos uma forte luz brilhou na sala, mais desta vez
era como se estivesse caindo, quando Damião olhou para trás se assustou ao
ver Serena caída e suando muito.
- O que aconteceu minha irmã? – Questionou Damião correndo em
sua direção para ajudá-la.
- Aquilo realmente foi uma loucura Damião! Quase perdi todos a
alguns quilômetros de distância daqui... Não foi fácil!
Respondeu Serena totalmente assustada, e ainda arrematou para
aliviar o amigo que agora lhe olhava com olhar espantado e coração saltitando:
- Mais pode ficar tranquilo, porque eu consegui! Estão todos bem, já
em terra firme no Brasil.
Damião respirou mais aliviado.
- E você está bem? – Ele questionou após um tempo.
- Sim estou! Até agora... Porque sei que Miguel vai me matar quando
voltar para a dimensão sublime! – Respondeu Serena sorrindo.
Damião sorriu sabendo que Miguel iria entender. Neste momento
lembrou-se de Iemanjá, então lembrou Serena:
- Vamos?
- Sim! – Ela respondeu segurando mais forte suas mãos.
Damião colocou a mão na testa, e disse para Iemanjá da mesma
forma anterior por ondas telepáticas:
- Pode deixar a fera vir, já estamos partindo neste momento!
Em segundos eles desapareceram após uma forte explosão de luz...
Serena estava muito fraca, e não podia mais correr riscos, usou todo restante
334
de seu poder, após teria até que ser carregada por Damião, mais isto era o de
menos, confiava nele como um pai...
Quando ouviu a voz de Damião em sua cabeça, Iemanjá sorriu, e
muito sarcástica gritou para Poseidon:
- Não aguento mais lutar com você, deixarei você cumprir a missão
pela qual saiu de seu buraco! Mas deixe-me ir!
Neste momento Poseidon parou por alguns segundos, tempo
suficiente para que Iemanjá pegasse um pouco da água a sua volta e a
soprasse, em milésimos de segundos ela sumiu... Afinal, seu maior poder era
poder manipular o melhor condutor, em segundos sabia que poderia estar em
qualquer lugar do cosmos, o que fez...
335
CAPÍTULO 82
Londres, Inglaterra, 1982
Após um longo tempo de descida em um pequeno baque o estranho
elevador parou, ao passo que fortes luzes se ascenderam quase cegando
Charles que ainda estava com os olhos vidrados na janela na tentativa de
avistar alguma coisa na escuridão.
- Parece que você foi surpreendido pela luz meu caro Charles. –
Brincou Arthur já abrindo a porta do helicóptero e pulando ao chão.
George sorria muito, estava gostando muito de Arthur,
principalmente, de seu senso de humor meio misterioso e estranhamente
requintado para o lado sombrio, aquilo lhe fascinava.
Todos os agentes e principalmente Charles não acreditaram no que
estavam vendo, o local era simplesmente incrível, era, por óbvio, milhares de
vezes menor do que a sede da organização no subsolo da mansão de Arthur,
mas ainda assim era um espaço muito grande, com luzes localizadas somente
ao chão, o qual parecia de vidro, quanto ao teto era confeccionado no mesmo
material mais ficavam apagadas.
- Na ideia original era para a sede ser neste local. – Disse Arthur
tentando puxar conversa enquanto todos os agentes desciam dos helicópteros.
- Porque o senhor mudou os planos? – Questionou George que
estava bem próximo do velho e, ainda, maravilhado com o senso de humor do
mesmo.
- Simplesmente porque achei este local muito exposto e pequeno. –
Arthur respondeu já andando pelo grande saguão em direção a um lugar onde
se encontrava um objeto enorme coberto por um plástico brilhante.
- Esta certo que o tamanho é infinitas vezes menor do que aquele
complexo, mas é quase que impossível perceber aquela entrada, portanto,
creio que poderia ter aumentado tudo. – Disse dessa vez Robson já olhando o
grande objeto ao qual eles andavam em direção.
Certamente é a aeronave. – Pensou Robson sorrindo.
- É, contudo, para construir este complexo sem levantar suspeitas já
foi muito difícil, porquanto, em minha propriedade poderia colocar várias
máquinas trabalhando, locomoção de várias pessoas, tudo, e ninguém acharia
anormal. Lado outro, aqui, tudo é diferente. Afinal, como explicaria carros
sumindo no meio do nada de instante em instante. Vocês podem não perceber,
mas os governos monitoram e muito atividades incomuns em campos e regiões
inóspitas.
- Além disso, somente o custo de transporte das pessoas seria uma
fortuna. – Disse Charles tentando demonstrar que entendia também os motivos
da mudança.
336
- Isto mesmo meu caro amigo, queria que estivesse comigo para
ajudar-me quando tive que convencer algumas pessoas da mudança. – ele
sorriu para Charles, e, estranhamente George olhou para ele com ciúmes. –
Contudo, pelo projeto inicial não seriam tantas equipes como se encontra
atualmente, assim, os gastos não seriam tantos.
Eles já estavam quase próximos do que se achava ser a aeronave.
- Porque o senhor mudou então os projetos? – Charles retornou.
- Simplesmente porque acho que o inimigo que estamos prestes a
enfrentar em um futuro muito próximo, e que é a razão da formação do nosso
projeto, é muito maior do que qualquer organização poderá suportar. – ele fez
uma expressão de desanimo com aquela afirmação. – Por isso enfrentei toda a
organização e investi de meu bolso toda aquela mudança que vocês viram, e,
ainda, terminei este complexo, o qual hoje é utilizado somente para guardar
tecnologia e demais produtos, mas terá ainda outro destino em breve, o qual
ainda não poderei lhes revelar.
Quando chegaram próximo ao grande volume encoberto pelo
plástico todos os agentes e Charles já estavam entusiasmados e, quase que
parando para olharem o objeto.
Contudo, para surpresa destes Arthur simplesmente passou reto, ao
passo que quase todos pararam não olhando mais para o objeto escondido,
mas para o velho por não entenderem a atitude dele.
Percebendo a atitude dos agentes ele parou subitamente virando-se
para trás em um solavanco, em razão da estranha armadura que usava, a qual,
somente algumas vezes dava a impressão de que ele era um ser totalmente
cibernético, o que é uma grande façanha em razão do que aquele aparelho era
capaz conforme havia lhes sido demonstrado antes da partida.
- O que estão esperando?! – O velho questionou quase gritando.
- Desculpe Arthur, mas até eu achei que isto que se encontra
embaixo deste plástico seria a aeronave. – Respondeu Charles também sem
graça pelo ato.
- Vocês acham mesmo que eu iria colocar o meu nenê embaixo
deste plástico horrível?! – Arthur respondeu com um sorriso. – Este é somente
um projeto inacabado de um interceptador que esta unidade ira abrigar.
Os agentes sorriram também entrando na brincadeira, e seguiram
todos em frente até pararem diante a uma grande parede.
Arthur estava olhando para a parede sorrindo, aquilo era mais um
dos truques dos garotos da sua unidade de segurança. Após olhar para a
parede por algum tempo, os agentes e Charles já estavam pensando que a
armadura de Arthur teria enferrujado e paralisado ele subitamente...
337
Contudo, em poucos segundos quase pularam de susto quando toda
a parede começou a se mexer para baixo vagarosamente e emitindo um
grande barulho devido ao seu enorme peso.
À medida que a parede se movia eles perceberam que havia outra
sala quase que do mesmo tamanho da anterior em que se encontravam, e
quando ela terminou de descer totalmente Arthur entrou na mesma com os
passos firmes proporcionados por seu traje.
Os agentes e Charles ficaram parados, não por cautela, mas pelo
êxtase que tomou conta de seus seres ao avistarem a grande e incomum
aeronave que estava bem à frente deles...
338
CAPÍTULO 83
Oceano Atlântico – França para Brasil, 1982
Poseidon ficou surpreso com a atitude de Iemanjá. No início uma
dúvida profunda lhe afligia.
Porque será que aquela mulher desistiu de lutar? – Este
questionamento não lhe saia da cabeça.
Contudo, após analisar toda situação foi tomado por um grande
sentimento, que ele há muitos milênios não sentia, o sentimento de ter
novamente o “poder”.
Ele sabia que não possuía mais os grandes poderes dos tempos em
que era um semideus na era mitológica. Mas parecia que ainda estava muito
forte.
Neste instante ele começou a olhar para seu corpo imaterial, sua
essência, ela estava um pouco diferente do que era antigamente, estava
aniquilada pelo tempo em que passou vagando pelo cosmos, fugindo e
agredindo a quem quer que seja.
Não sou quem era antes. Mais em breve retornarei triunfante! Já
começou meu renascimento... – Pensou inflando o pleito glorioso.
Seus cabelos estavam esbranquiçados, e ele ainda exalava um
fedor como o de um demônio... Por dentro já se sentia como se fosse um.
Sabia que somente não tinha ainda se transformado em tal coisa porquanto
não lhe foram retirados à força os poderes pelos quais não abriu mão para
poder encarnar como humano, no momento que isto lhe foi ordenado.
Estes poderes me foram de grande valia durante estes milênios, me
concederam o período de que necessitava para ressurgir. – Ele concluiu em
seus pensamentos, sabendo no fundo de seu ser que isso lhe havia salvado a
existência, não sabendo que ao certo isso foi o que quase lhe retirou tudo de
bom que um dia teve.
Contudo, ao pensar nisto, amaldiçoou o profeta dos desertos.
Aquele homem comandou minha captura. Caçou-me como uma fera
caça uma presa, e inexplicavelmente conseguiu me achar e aprisionar-me
naquela dimensão maldita que ninguém jamais tinha ouvido falar... Pensei por
todos este tempo em que fiquei preso que Lúcifer e Serfalos haviam me traído,
contudo, nos últimos meses descobri que estava enganado... – Ele ainda
estava perdido em seus pensamentos.
Era como se a suposta vitória que ele acreditava que havia
conseguido, após tantos milênios de inércia total tivesse feito-o relembrar do
passado, o que se prosseguiu:
Após ser aprisionado naquela dimensão por milênios, fui
completamente esquecido por todos, e, por ironia, conseguia ver nas nuvens
339
daquela dimensão, tudo o que ocorria no mundo, principalmente na terra.
Tenho que admitir que aquele lugar não era ruim, era parecido com a dimensão
material. No início cheguei a pensar que eles queriam apenas que eu refletisse
minhas escolhas. Contudo, após a chegada de mais semideuses que não
abriram mão de seus poderes para seguir Lúcifer, e a coisa foi esquentando a
cada dia, não gosto nem de lembrar, aquilo se transformou em um verdadeiro
inferno, afinal, eram vários seres que ainda se sentiam deuses, contudo, sem
ninguém para governar, o que gerou o verdadeiro caos...
Ele parou ainda mais, olhava o navio mais não conseguia ainda se
mover, parecia que seu estado inicial de êxtase havia acionado lembranças do
que ocorrerá, era como se estivesse hipnotizado, então ao invés de
pensamentos, somente as imagens surgiram em sua cabeça, via as lutas pelas
quais passou naquela dimensão, quase como simples mortais lutando, tendo
em vista que seus poderes naquela dimensão inexplicavelmente foram
anulados por completo. O ódio foi aumentando entre eles...
Lembrou-se ainda do dia em que no início ele pensou em abrir mão
dos poderes e tentar ter uma nova chance, neste dia um anjo apareceu, ele
nunca havia visto tal criatura, sequer sabia da existência destes seres, o qual
somente foram criados após o término da era mitológica, sendo, segundo ele
pôde concluir a evolução intelectual de um espírito extremamente evoluído
tanto feminino quanto masculino.
Via a imagem do Anjo estendendo-lhe suas grandes mãos, e lhe
oferecendo para lhe levar novamente para o plano material, dizia que ele seria
encarnado em uma família humilde, mas muito honesta, almas bondosas que
resolveram lhe agradar com esta oportunidade. Somente reforçou a mesma
imposição, que ele abandonasse seus poderes.
Isto nunca! – Lembrou-se de sua resposta naquele dia.
Lembrou-se ainda do dia em que quando ele pensava não haver
mais retorno, o chamado Conselho Supremo enviou novamente o Anjo, que lhe
disse que todos ali naquela dimensão poderiam retornar encarnados para a
dimensão material, que manteriam alguns dons, não poderes.
Via a imagem do Anjo que tentou convencê-los, que dizia em alto e
bom tom para todos que estes dons mais apurados aos poucos levaria ao
começo de um processo de evolução de suas almas, e de forma mais rápida.
Lembrou-se que alguns resolveram seguir o Anjo, e que ele foi o primeiro a se
objetar a proposta.
Recordava-se ainda que sua resposta fora o “não” porquanto no
fundo ele pensou que se haviam aberto mão para terem um dom na
encarnação, o conselho certamente abriria mais regalias, e ele poderia
desfrutar disto. Havia sido criado em meio a semideuses mitológicos, e sabia
que sempre seria melhor barganhar...
Contudo, abaixou a cabeça ao lembrar-se que após este dia nunca
mais o Anjo retornou, até o dia que quando ele pensou que estava fadado a
340
ficar preso naquela dimensão pelo resto de sua existência, em uma noite
escura sem qualquer luar, Lúcifer e Serfalos chegaram.
Sorriu ao se recordar que a chegada deles causou um enorme
alvoroço, porquanto, eles ficaram completamente enfurecidos ao verem o que
eles haviam feito naquela dimensão.
“Não sei se devo libertar vocês. Parece que se transformaram em
animais. Isto aqui está um lixo!” – Se recordou das palavras de Lúcifer o qual
ainda na ocasião olhava para todos os lados.
Poseidon lembrava-se disto como se fosse naquele momento, o
verdadeiro mal, o Deus das trevas, não acreditava que eles poderiam ter
destruído uma dimensão daquela forma.
Na realidade, eles haviam passado um pouco da conta mesmo,
poderiam ter progredido ali, contudo, acreditavam que se fizessem isto,
estariam fazendo a vontade do Conselho Supremo, e acatar qualquer coisa
vindo deste novo poder nunca.
A dimensão em si havia acabado por completo, mais por causa das
batalhas que eram travadas diariamente. Ela ficou como o chamado inferno,
porquanto, não existe um local criado para fazer alguém sofrer, mais prisões,
onde, por haver maior livre arbítrio, as almas dali transformam este local em
inferno, e, como todos sabem, onde há rancor, ódio e guerra sempre haverá
um inferno, até na dimensão material.
Lembrava-se que mesmo após horas andando, Lúcifer não queria
acreditar no tamanho daquela desordem. Sabia que ele estava se
questionando intimamente se poderia contar com eles para a guerra que
estava por vir, e, somente após horas de negociação, ele resolveu libertar a
todos, e disse ter chegado o momento de retomarem o poder.
Contudo, deixou claro que se eles fizessem com o cosmos material
o que haviam feito com aquela dimensão, ele iria cuidar pessoalmente de
capturar um por um, não para prender em uma dimensão, mais para aniquilar a
essência de cada um...
Recordou ainda que todos ficaram pensativos, sabiam que Lúcifer
amava muito todo o cosmos, somente não tinha o mesmo amor pelas almas
que nele agora habitavam. Além disto, outro fato para ele não abdicar de seus
poderes, era que ele não se achava melhor do que as almas encarnadas, ele
tinha completa certeza. Poseidon lembra-se ainda do dia que ele disse se
sentir ofendido por lhe ser ordenado a se juntar a tais seres, os quais
anteriormente ele governava.
Era certo que Poseidon definitivamente não sabia até aquele
momento porque seguiu Lúcifer no dia em que ele saiu da dimensão sublime,
mais uma coisa era certa, ele pensava da mesma forma...
341
Por esta razão, Poseidon estava tão fraco, os anos naquela
dimensão com seus poderes limitados por algo inexplicável, de alguma forma
havia aniquilado boa parte destes poderes.
Contudo, não havia perdido sua capacidade de raciocinar em uma
batalha. Por isto, em nenhum momento daquela batalha que travou com aquela
mulher, deixou transparecer para ela que ele não estava mais aguentando
lutar.
Fez uma pausa meditando quanto estava fraco, se Iemanjá lutasse
mais alguns minutos ele seria derrotado, porquanto, não tinha mais força
sequer para fugir.
Neste momento abriu um enorme sorriso, lembrando-se novamente
dos tempos antigos, ocasião em que em segundos teria exterminado aquela
mulher pela qual ele nutria um ódio extremo.
No decorrer dos anos em que ficou preso naquela dimensão inferior,
via e ouviu falar dos feitos daquela mulher. Todos diziam que ela protegia as
pessoas dos perigos da água, e, ainda, somente de boa vontade. Sem pedir
nada em troca. Tinha que admitir que aquilo era muito diferente do que ele
fazia no passado...
No decorrer destes milênios, ele sempre sonhou em travar com ela
uma batalha. Contudo, não esperava que em seus primeiros dias na dimensão
material após ser libertado a encontraria, e, ainda por cima a venceria...
Sentia-se ainda mais forte.
O meu tempo de glória ainda vai voltar, vou reger novamente boa
parte de todo cosmo... Lúcifer ficará com o domínio das almas, ele sempre foi
mais político e ambiciona este poder sobre estas almas patéticas. Contudo, eu
vou ser novamente o Deus da fonte da vida, eu regerei a água, eu serei o
verdadeiro senhor do cosmos... – Concluiu, sorrindo vigoroso pensando no dia
em que isto ocorresse novamente.
De repente saiu de seu transe de pensamentos, lembrando-se da
missão pela qual veio. Tinha que destruir todos naquele navio, não poderia
sobrar nada...
Foi então que raciocinou algo fantástico:
Estou ainda com muitos poderes, agora sei por que entrei em transe,
foi para recuperar minhas forças, afinal, após este tempo de raciocínios das
lembranças de minha existência me sinto mais forte do que nunca!
Lúcifer e Serfalos haviam lhe orientado que a chave principal do
Conselho Supremo Celestial estava ali na destruição daquele navio. Ele não
sabia do que se tratava, porque eles se recusaram a dar maiores detalhes,
mais sabia que era preciso fazê-lo, afinal, não se importava com nada. Ficou
ainda mais convicto da necessidade e precisão de sua missão, após aquela
mulher que alguns dizem ser uma santa, e outros uma Deusa lhe atrapalhar.
342
Sorriu mais uma vez vendo a cara de espanto com que ela correu
dali. Realmente tinha feito à escolha certa ao aceitar partir com Lúcifer no
momento em que eles foram obrigados a reencarnar na terra igual a todas
aquelas almas miseráveis que eles comandavam no passado...
Suas energias gastas naquela batalha já estavam novamente
voltando, e ele fez a tromba d’água que usava para se conduzir na água girar
ainda mais rápido, saindo rapidamente em direção ao navio.
No momento que chegou bem perto do navio, não avistou ninguém
na proa ou na popa, mais logo raciocinou dizendo para si mesmo o que lhe
parecia o óbvio:
- Devem estar escondidos como ratos que realmente são, e logo
serão exterminados como tais.
Tomou ainda mais força, e começou a girar a tromba d’água de uma
maneira muito mais rápida e veloz.
Devo aniquilar este navio para que não sobre sequer destroços
boiando no mar... Quer dizer, em meu mar! – Pensou sorrindo principalmente
com a última conclusão.
Quando achou que já estava na velocidade perfeita, em um
movimento rápido subiu até o topo da tromba d’água, e apoiando seus pés no
cume desta, colocou a mão direita nas costas retirando um tridente enorme.
Quando olhou para aquele objeto, pensou no quanto o mesmo era
desejado.
Não há nada igual em todo cosmos, ele pode criar raios! Contudo,
está fraco como eu... Mas em breve estará novamente com todo seu poder. –
Seus pensamentos não paravam, ainda mais quando admirava seu
instrumento que se encontrava em seu poder desde sua criação.
Em um movimento rápido, ergueu o mesmo para cima, deixando
somente a sua ponta apoiada na tromba d’água, de modo que ele seria um
perfeito condutor.
Começou então a invocar raios de uma nuvem que estava próxima,
utilizando para isto uma língua estranha.
Quando eu tiver meus poderes novamente farei isso descansando!
Não será tão difícil como esta sendo... – Ele pensava enquanto o suor escorria
por sua face evidenciando seu esforço. Definitivamente ele sonhava
novamente com o dia prometido por Lúcifer.
Quando o primeiro raio caiu acertando diretamente no tridente, o
qual rapidamente conduziu toda energia para a tromba d’água, como um para
raios.
343
Com a outra mão Poseidon conduziu a grande tromba d’água agora
eletrificada para o navio que foi se despedaçando aos poucos, sendo que
algumas coisas estavam inclusive queimando devido a enorme eletricidade,
que foi potencializada ao máximo pelo poder do tridente.
Em menos de dez minutos o navio estava toda dizimado.
Lúcifer ficará satisfeito... – Pensou triunfante.
Colocou o tridente novamente nas costas. Logo após analisou para
certificar-se de que não havia sobrado nada nem ninguém. Em segundos seus
olhos começaram a emitir raios, ele pulou do alto da tromba d’água. Quando
seu corpo bateu no mar, ouve uma pequena explosão de luz, e ele sumiu,
conduzido para outra dimensão pelo condutor universal...
A grande tromba d’água se desfez, caindo em uma alta velocidade,
levando ainda os restos das cinzas e poeira do grande navio para o fundo do
mar...
344
CAPÍTULO 84
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Miguel estava olhando fixamente para Jesus, então o mestre
prosseguiu:
- Quando você e Damião chegaram até aqui, viram que eu
conversava com vários animais, correto?
Miguel assentiu com a cabeça, respondendo com uma voz baixa,
como se estivesse pensando ainda no ocorrido:
- Fiquei até espantado, porque havia estado aqui uma única vez
antes, e quando cheguei e vi aquela quantidade de animais, achei que pudesse
ocorrer outro dilúvio...
Jesus riu alegremente, era sensacional o senso de humor de Miguel,
ele era frio e calculista, um líder nato, mais tinha um carisma faustoso.
- Porque o traidor está nos ajudando? – Questionou diretamente
Miguel, aproveitando-se daquele momento de descontração.
Jesus olhou nos olhos, e com uma voz extremamente humilde
respondeu:
- Bem você disse: “ele está ajudando”, por isto, não merece ser
julgado por ninguém neste momento, principalmente por você!
Miguel abaixou a cabeça com vergonha, jamais esperava aquela
resposta.
Após algum tempo calado Jesus prosseguiu:
- Já perdemos muito tempo, vamos ao que interessa! – Olhou nos
olhos de Miguel que ergueu a cabeça, e começou a contar a história com uma
voz calma e amistosa. - Há muitos e muitos milênios, os seres humanos
enfrentaram na terra um forte e poderoso Arcanjo do senhor que se voltou
contra alguns semideuses, este Arcanjo se chamava Serfalos.
Miguel ficou espantado, sabia que Serfalos era um Arcanjo, diferente
de Lúcifer, que ao contrário do que todos imaginam era um Deus mitológico
que se recusou a abdicar de seus poderes.
- Mestre não sabia que Serfalos era tão forte?
- Era sim Miguel, ele é quem comandava o exército celestial, você,
Gabriel, Rafael, Aurora, e outros ainda eram muito jovens, advindos a pouco
tempo da evolução espiritual, frutos da quarta linhagem de Arcanjos, mais ele é
da primeira linhagem, recebeu todos seus poderes assim que evoluiu, por isto
nunca teve que evoluir como Arcanjo como vocês, uma vez que foi honrado
com todos eles, como os chamados Deuses da era mitológica, e isto foi mais
um erro que estamos pagando até agora.
345
Jesus fez uma pausa para respirar, aquele assunto certamente não
lhe trazia boas lembranças, após algum tempo com o pensamento longe
prosseguiu:
- Tenho que lhe contar uma historia, ela atualmente para muitos é
somente uma lenda, mas realmente ocorreu, e se não tomarmos cuidado vai se
repetir...
Miguel afirmou com a cabeça positivamente, e Jesus prosseguiu:
- Como é de conhecimento de todos, almas desencarnadas não
conseguem encarnar novamente antes de estarem preparadas, para, assim,
poderem usar a encarnação para melhorar seu amor ao próximo, e com isto
evoluir.
- Correto!
- Contudo, há milênios, algumas almas muito perversas conseguiram
algo um tanto inusitado, dizem que foi neste tempo que Lúcifer e Serfalos
uniram forças pela primeira vez, e, inexplicavelmente eles conseguiram romper
a barreira, para que alguns de seus seguidores, sem que ninguém percebesse,
voltassem a terra como animais...
- Animais?! Mais isso é impossível! – Miguel exaltou-se.
- Eu também diria isso, já que pelo menos cogitar isto antes era
questão sensata de responder que era impossível de dar certo, mas para eles
pouco importava o resultado, como todos sabem, todas as almas são lixos para
eles... – Jesus respondeu com lágrimas nos olhos, fazendo uma pequena
pausa para respirar e pensar em seus irmãos aceitando tal submissão,
naturalmente por sede de poder. – Os primeiros a conseguirem, nitidamente já
se mostravam anormais nos primeiros dias de vida, eles tinham pensamentos
de humanos, afinal eram almas humanas, mas o corpo de animal.
- Mais ninguém percebeu isso? – Miguel questionou ainda mais
assustado.
- Ninguém percebeu porque o Criador ou os Criadores fizeram a
encarnação dos animais tão maravilhosamente bem, que era difícil perceber ou
entrever qualquer falha. Os anos foram se passando, e como o corpo material
é sujeito a uma evolução maior, esta ocorreu rapidamente nestes animais...
Quando fomos perceber alguns já haviam evoluído, e para coisas terríveis, daí
vêm às lendas: lobisomens, vampiros, etc...
- Já combati uma criatura dessas uma vez... – Respondeu Miguel
com certa desconfiança, sabia que não poderia interferir em seres encarnados,
mesmo que se tratassem de monstros, mas isso era uma situação que ele não
teve escolhas. Para sua sorte Jesus não lhe repreendeu, somente
prosseguindo em sua história:
346
- Neste momento, quando o homem, e todos da dimensão superior
perceberam, o mundo estava infestado de aberrações, por todos os cantos.
Lado outro, os homens sofreram muito, porquanto, naquele tempo, ainda eram
precariamente evoluídos, bem como, também sofreram os pobres animais, já
que, quando os homens achavam um cadáver com marcas de dentes, logo
concluíam que eram lobos, etc., e ai os animais que não tinham nada com isto
literalmente eram caçados com ódio.
- Uma verdadeira atrocidade, já ouvi falar dessa época em meus
estudos quando era muito jovem. – Miguel tentava interagir, contudo, Jesus
novamente somente prosseguiu:
- Mais o pior ainda estava por vir, Lúcifer e Serfalos sabiam que seu
plano havia funcionado perfeitamente, uma vez que nós não poderíamos
interferir, tínhamos, então, que deixar tudo evoluir, tudo por causa do pacto
com Noé.
- Pacto com Noé? - Interrompeu novamente Miguel. – Achava que
isso não tivesse ocorrido conforme restou narrado nas escrituras.
- Depois te explico isto, é outra história complexa, mas primeiro
preciso que você entenda o que estou lhe dizendo, isso implicará em sua
missão atual.
- Sim mestre, me desculpe à intromissão, pode continuar...
Neste momento entrou na grande sala um homem magro, porém
muito saudável, pele amarela, olhos um pouco puxados, vestia uma túnica
branca com amarelo e uma fita vermelha, de seu peito saia um pequeno feixe
de luz.
Em um salto que assustou Miguel, Jesus levantou-se imediatamente
indo de encontro ao homem, lhe dando um forte abraço.
- Meu amigo, já estava preocupado!
- Tivemos alguns imprevistos, mais conseguimos. – Respondeu o
homem igualmente com a voz calorosa.
Jesus não pôde conter sua alegria, virou-se para Miguel e disse com
voz alegremente:
- Miguel, venha cá! Quero que conheça nosso irmão, ele faz parte do
Conselho Supremo, e acabou de conseguir algo extraordinário para nós!
O Arcanjo levantou-se, sua estatura era muito superior a daqueles
homens, mais ele tremia, sentia suas pernas bambas somente de chegar perto
deles, porquanto, o poder dos mesmos parecia infinito, ele podia sentir...
Miguel abaixou suas enormes mãos, pegando nas mãos franzinas e
suaves do homem que adentrará a sala.
347
- Muito prazer senhor, estou à disposição do conselho, meu nome é
Miguel. – Se apresentou, deixando sua mão tremer, evidenciando seus receios
com o que estava sentindo.
- O prazer é todo meu! Há muito tempo queria lhe conhecer!
Contudo, foi votado no conselho que era melhor aguardarmos, então mudei de
ideia e achei também mais sensato, votando a favor de esperar sua
preparação...
Miguel ficou parado, mudo e perplexo, a voz daquele homem parecia
lhe acalmar, e a luz que saia de seu peito puxavam os olhos do Arcanjo para a
mesma, não percebendo sequer que ele havia dito que já o estava analisando
há tempos...
348
CAPÍTULO 85
Londres, Inglaterra, 1982
Vagarosamente Charles e os agentes começaram a entrar na sala,
contudo, alguns até tropeçaram em uma pequena lombada formada pelo cume
onde se encontrava antes à parede diante de estarem todos andando como
zumbis, seus olhos estavam fixos juntamente aos seus pensamentos que
tilintavam, tão somente, para a maravilha a frente deles.
Ela era realmente algo incomum, seu formado era como o de um
morcego, ao passo que não apenas as asas e a sua cor totalmente negra fosca
fazia a máquina se assemelhar ainda mais com o animal, mas, principalmente,
o formato de sua cabine que se assemelhava a cabeça e o compartimento dos
passageiros seu corpo.
À medida que eles se aproximaram perceberam que de cada lado
das grandes asas haviam hélices que acompanhavam a fuselagem,
- Porque ele se assemelha tanto a um morcego? – Foi Michael o
primeiro a sair do transe e questionar aquilo para a alegria de Arthur, o qual
esperava uma reação de espanto, contudo, não daquela forma, obviamente,
diante de estar diante de agentes que já viram um bocado de coisas estranhas
em diversas missões secretas.
- Simplesmente porque eu fiz questão que assim o fosse, e, além
disso, a aerodinâmica deles é perfeita para o que eu pretendia.
- Como assim? – Foi Charles que retrucou, já estava mais do que
curioso pela resposta, contudo, as palavras saíram rapidamente, mais seus
olhos ainda ficaram perdidos admirando o estranho objeto.
- O morcego é para mim o animal mais perfeito que existe.
- Me desculpe Arthur, mas creio que o senhor está sendo ou radical
ou maluco de dizer que um bicho que não enxerga direito, é feio, transmite
doenças, pode ser a criatura mais perfeita. – Agora havia sido George com o
seu jeito estranhamente divertido quem deu sua opinião.
- Meus caros amigos, nem tudo que é feio é imperfeito, porquanto,
no meu ponto de vista a beleza é totalmente relativa, tendo em vista que
partimos de padrões de belezas estigmatizados ao fofo ou aquele que melhor
nos agrada para definirmos o que seria ou não belo. Assim, se todos
pensassem desta mesma forma certamente você George nunca teria sequer
uma namorada.
Todos sorriram com a alfinetada final, mais Arthur prosseguiu, agora
olhando para a aeronave não como se visse uma máquina, mais todos ali
perceberam que ele a olhava como se fosse o próprio animal:
- Além disso, não falei que ele seria o mais belo, mas sim mais
perfeito, o que leva você a cometer outro erro humano, o de definir que o que é
perfeito necessariamente tem que ser belo, o que em meu ponto de vista não é
349
a realidade visto que a perfeição é algo também de definição de um objetivo,
assim, ele é perfeito para os desígnios que quero dizer, da mesma forma que
um homem feio como você George é perfeito para o trabalho que tenho que lhe
incumbir, não quero saber se é bonito somente se é inteligente e eficaz.
Ele ainda alfinetou o agente que fez cara feia com todas as rizadas
que os demais agentes deram novamente.
– E posso ainda terminar meu caro George dizendo que seria
perfeito por ser amoroso a sua mulher e seus filhos. E quanto ele ser meio
cego, você se engana, isso é somente em uma parte, porquanto, isto o tornou
ainda mais perfeito, porquanto, ele foi capaz de evoluir para outro patamar de
desenvolvimento de suas capacidades, o qual uma de minhas unidades de
ciência avançada estão tentando desenvolver um aparelho baseado neles para
fazer uma pessoa voltar a enxergar.
- Como assim? – Um dos agentes se interessou mais do que os
outros. O qual, não havia até aquele momento dado sinal de vida, causando,
assim, o espanto de todos, que também estavam cientes de sua total
descrição.
- Se interessou nisto não é Balogun? – Arthur contra respondeu com
um olhar estranho ao negro simpático de olhos claros.
Balogun era um homem muito fechado, Charles quase não notava
sua presença, o que lhe tornava perfeito para serviços que requeriam
descrição, eles havia se conhecido na África, em uma missão de Charles
naquele País quando Balogun ainda trabalhava para o governo africano.
Ele era nascido na África, filho de pai africano e de mãe australiana,
uma missionária que morreu por uma guerrilha, principal motivo que levou
Balogun ao serviço que desenvolvia.
Contudo, o sujeito estava desiludido, porquanto, a corrupção no
governo era muita, e ele estava convicto que nunca conseguiria honrar a
imagem de sua mãe.
Charles como sempre ficou solidarizado, e, após travar uma briga
com Frederick, que achava aquilo perca de tempo, ele fez uma proposta para
Balogun, disse que iria juntar alguns agentes e que acabaria em meses com
toda a guerrilha que matou sua mãe.
E, mesmo contra a posição de Frederick ele assim o fez, recrutou
alguns dos agentes mais amigos e como prometido após alguns meses de
estudo e planejamento iniciaram a missão, desbarataram todo o bando,
mataram os lideres, e, libertaram os demais, incluindo crianças.
Após tais acontecimentos Balogun tem sido um dos melhores e mais
dedicados agentes, Frederick teve que engolir a seco quando este provou em
uma missão que havia valido cada mês perdido com aquela vingança para tê-lo
na equipe.
350
Contudo, mesmo com toda a sua calma, Balogun ficou novamente
mudo após ouvir Arthur, e, por óbvio, todos os demais agentes ficaram olhando
sem entenderem nada.
George era o único que não olhava para o negro, por certo por estar
aliviado pela conversa ter tomado outro rumo diferente das alfinetadas que
estava levando pelo comentário que ele confessava intimamente ser idiota e
desnecessário.
Será que ele sabe? – Pensou estranhamente Balogun.
Charles assim como os outros agentes por não estarem entendendo
nada somente ficaram olhando para os dois esperando uma resposta, a qual
para surpresa de todos veio de Arthur.
- Balogun tem um filho que já nasceu cego, ele é muito amado,
contudo, como já se pode deduzir, não é fácil ver um filho seu desta forma sem
poder fazer nada além de apoiar.
À medida que Arthur narrava às lágrimas começaram a rolar pelo
rosto carrancudo do grande e musculoso negro, como se ele fosse uma
criança.
E, Arthur prosseguiu, demonstrando a todos que ele sabia muito
mais da vida deles que eles poderiam imaginar, e, que tinha informações de
tudo e de todos, as quais eles iriam perceber eram mais para tentar lhes
ajudarem de alguma forma do que de lhes retirarem a privacidade ou por
desconfiança.
– Após conseguir o primeiro salário fixo mais alto soube que a sua
mulher e filho haviam se mudado, e, ao pesquisar mais fiquei sabendo que o
motivo da mudança era para que o filho pudesse frequentar uma escola
especial que lhe ajudaria a se adaptar a sua deficiência, a qual, Balogun já
percebeu que seu filho mesmo sem um auxílio mais profissional, já havia se
adaptado e muito, demonstrando a maravilha que é a evolução, ao passo que,
quando um sentido é retirado, outros suprem tal deficiência, uma verdadeira
maravilha.
- Porque você não me disse que tinha estes problemas, e, ainda,
que necessitava de dinheiro para proporcionar o tratamento para seu filho? –
Charles questionou Balogun com um olhar de solidariedade, o qual era
compartilhado com todos os companheiros ao lado, os quais sequer notavam
agora a grande aeronave, prestando atenção somente naquele momento de
reflexão com a dor de uma família em ver seu filho naquela situação.
- Não queria prejudicar ninguém da equipe, afinal, os serviços eram
bem distribuídos, e narrar esta história poderia fazer com que eu tivesse
privilégios que outros não teriam, o que não seria justo, visto que tenho que
enfrentar meus problemas e não tentar aliviar minha carga com os outros que
nada tem com isto e que talvez tem problemas ainda maiores. – ele enxugou
os olhos com as mangas da farda militar de maneira brusca, aquilo parecia ser
mais difícil do que o comum. – Quando recebi o primeiro salário, e, com a
351
garantia de uma verba fixa me mudei e matriculei meu filho na instituição. Achei
que seria muito apertado mesmo ganhando mais, porquanto, os gastos eram
grandes, e, minha família não é pequena, e, ainda teríamos que ajudar meu pai
que ainda mora na África e meus sogros, mas resolvemos que teríamos que
tentar.
Ele enxugou melhor às lágrimas, e percebendo que todos ainda
estavam inertes prosseguiu:
Contudo, quando retornamos na segunda para o primeiro dia de
aula, ocasião em que já deveríamos efetuar o primeiro pagamento, o diretor da
instituição é quem nos recebeu, dizendo que todo o ensino de meu filho
estavam pagos até sua formatura, juntamente, com uma bolsa de estudos, tudo
concedido por um doador anônimo.
Todos os homens ficaram espantados, mais deixaram-no continuar.
- Voltamos para nossa nova casa, pequena e humilde, porquanto,
acreditávamos que não sobraria dinheiro para algo melhor após pagar todas as
despesas e ajudar nossos pais, em completo êxtase de alegria, e, quando
telefonamos para nossos pais na África, fomos informados de outra surpresa,
eles haviam sido admitidos em uma fazenda muito rica na região, cujo o
proprietário havia ido buscar eles dizendo que necessitava de dois caseiro e de
uma cozinheira, além de outras pessoas para fazer serviços gerais. Eles
narraram que já estavam de partida para a fazenda, e que em breve nos
ligariam para passar o novo número do telefone do local.
Às lágrimas começaram novamente a rolar por sua face,
demonstrando ainda mais emoção com os pais recebendo um emprego e
oportunidade em um País sem qualquer amparo.
- Quando desligamos o telefone, eu e minha esposa ficamos calados
por muito tempo, não acreditávamos que aquilo fosse real. Desde este dia
venho fazendo um trabalho de espionagem para descobrir quem teria pagado
pelos estudos e influenciado no emprego, contudo, tudo parecia ter partido
somente daquelas pessoas, do diretor e do fazendeiro, não havia nenhuma
movimentação estranha em suas contas e de seus parentes, nada, pesquisei
tudo. Então resolvi esquecer isso, até agora que percebi quem foi o bem feitor
que concedeu tudo isso para nossa família.
- Deixe disto, não sou nenhum bem feitor, somente cobrei alguns
favores daqui e dali, a bolsa foi em razão de uma influência no governo e da
minha intercessão junto a este para que apoiasse o projeto na instituição, após
isso dobraram os recursos e as vagas, por óbvio o carisma do diretor, e, quanto
ao emprego é em razão de umas amizades antigas que tenho naquele País, às
quais conquistei em minhas expedições, portanto, nada de mais. – Arthur
respondeu já andando para mostrar algo na fuselagem.
- Espere Arthur, mesmo assim muito obrigado. – o grandalhão
puxou-o pelo braço dando-lhe um desajeitado abraço. - Mas o que o senhor
estava dizendo antes, sobre o projeto do morcego, etc.? – Mesmo naquele
momento ele quis saber, por óbvio, agora já não estava mais chorando.
352
- Como já é sabido por todos que se interessem um pouco por
animais, os morcegos desenvolveram a habilidade, ou sendo mais realista a
evolução em razão da deficiência de voarem no escuro e pelo fraco
desempenho visual de literalmente enxergarem através de sonares, ou melhor,
pela chamada ecolocalização, aprendi isso com meus cientistas que
desenvolvem o projeto.
Ele sorriu com as mãos erguidas para descontração, porquanto,
havia ficado emocionado com a resposta afetiva de Balogun, prosseguindo:
– Eles emitem sons em ondas de altíssima frequência, os quais não
são percebidas pelos homens, que são transmitidas por suas bocas ou pelas
narinas, os quais ao atingirem um objeto, retornam em forma de ecos ao passo
que são então detidos pelos seus ouvidos, e, então identificam, principalmente
em voo, tanto qual é o ambiente em que se encontra mas também formas e
dimensões de objeto que devem desviar, etc.
- Sim, mais no que isso poderia ajudar a vida dos cegos? – Charles
quem questionou, estava muito interessado.
- Tudo! – Arthur ergueu novamente as mãos como se a resposta
fosse óbvia. – O trabalho de minha equipe de cientistas consiste em criar um
aparelho que será ligado ao corpo humano, e, utilizando o mesmo sistema dos
morcegos irão orientar um cego a se locomover.
- Estão avançados nisto. – Agora foi Balogun quem questionou, por
óbvio, se mostrando muito entusiasmado ao perceber que Arthur realmente
não brincava em serviço.
- O aparelho foi simples de construir e criar outros mecanismos, mas
ainda estamos longe de conseguir tecnologia capaz de mapear e reproduzir ao
cérebro os dados, entre outros fatores que são muito técnicos, razão pela qual,
não sei lhe explicar, mas prometo que te levarei para conhecer os cientistas
qualquer dia destes, eles estão na suíça, portanto, teremos que dispor de mais
tempo.
Balogun ficou tão alegre com a disposição de Arthur que
inesperadamente o abraçou novamente, ao passo que, desta vez o velho ficou
um pouco constrangido diante da nova reação inesperada.
- Tudo bem meu filho, tudo bem. – Arthur foi dando alguns tapinhas
nas costas de Jonas, nomeadamente, os mesmos queriam dizer: “Isto já é
demais!”, mas ele se mostrou mais uma vez educado até quando surpreendido.
Logo após Balogun finalmente largá-lo, Arthur que já estava abaixo
das asas da aeronave mostrou que as turbinas eram flexíveis, se
movimentando com seu canhão tanto para baixo quando para todas as
direções.
- Sabem para que serve isto? – Ele indagou com ar de: Me
perguntem por favor, estou ansioso por contar!
353
- Todos balançaram a cabeça negativamente.
Arthur saiu debaixo da asa e olhou para cima, onde eles puderam
ver que muito acima se encontrava uma espécie de porta, por conseguinte,
raciocinaram o que havia ficado óbvio a partir daquela explicação.
- Isto mesmo que vocês estão pensando, meu bebê pode plainar e
voar em todas as direções, inclusive para trás, voa pouco nesta posição de ré,
mas em situações de emergência isto é crucial. Além disso, ele não precisa de
pista de decolagem, ou melhor, pelo menos não de uma física especifica.
- Como assim? O que quis dizer com “física especifica”? – Interrogou
Charles muito curioso.
- Conforme vocês vão perceber, vamos subir até a claraboia
plainando de forma vertical, após sairmos ele vai continuar subindo mais e
mais, e, quando tiver atingido uma grande altitude, ele é totalmente desligado,
iniciando, por conseguinte, uma descida rápida, neste momento as turbinas
que já estão desligadas são voltadas para a posição de voo horizontal, são,
então, religadas em pleno ar e o piloto inicia uma aceleração, quando atinge
velocidade ele começa aos poucos a subir até atingir a posição horizontal
novamente, após isto é ligado o turbo que se encontra na calda de meu
morceguinho, e, ele atinge velocidades que nenhum avião tripulado com mais
de trinta pessoas conseguiria. – Se Arthur não estivesse com aquele estranha
armadura, certamente todos iriam perceber o seu peito inflar ao descrever
aquilo.
- Mas como é a tecnologia... – Tentou perguntar George já sendo
interrompido por Arthur:
- Não me pergunte mais nada, que eu somente sei este básico. – Ele
erguia as mãos e sorria como uma criança com o olhar em seu chamado por
ele mesmo “brinquedinho”.
- Porque ele é preto e qual é a do morcego? – Charles quis matar
sua curiosidade, e, também por saber que Arthur sabia muito mais da
aeronave, somente não estava querendo revelar mais detalhes, mas sabia que
sua língua estava salpicando por detalhar seu xodó.
- A cor preta é porquanto ele não é pintado, mas isto é uma espécie
de teflon.
- Teflon?! – Um dos agentes questionou perplexo.
- Seu nome verdadeiro é difícil, mas ele consiste em uma espécie de
plástico bastante resistente que tem propriedades antiaderentes, assim, ele faz
com que a aeronave tenha menos atrito no ar, sendo um dos motivos dele voar
tão rápido. Mais os técnicos tiveram que misturar ele a outros produtos,
porquanto, segundo eles o avião ainda necessitaria de ter algumas resistência
e certa aderência, ai eu já não sei explicar mais alguma coisa do que foi
misturado.
354
- E o porquê do formato e nome de morcego. – Charles insistiu.
- O formato é a aerodinâmica que meus cientistas e técnicos
disseram que seria melhor para os fins que eu buscava, que era uma aeronave
leve e que pudesse transportar uma pequena tropa para missões com
equipamento, fizesse pousos e decolagens sem necessidade de pista, e, ainda,
pudesse plainar para cumprir algumas coisas que não posso revelar. A partir
dai eu pedi para que eles colocassem ele como um morcegão, ao passo que
tenho que admitir que isto se deve por minha fixação por este animal, que já
devo ter demonstrando pela minha exposição anterior e até ofensa a George
ao dizer que ele era feio.
- Não se preocupe Arthur, sei que sou feio mesmo, mais isso é o
meu maior charme. – George respondeu sorrindo, como sempre.
- Como assim fixação por morcegos? – Charles sequer prestou
atenção em George, queria mesmo era saber os motivos daquela estranha
fixação por aquele bicho, afinal, mesmo sabendo da excentricidade de Arthur,
aquilo ainda era muito estranho.
- Sou um fanático por mitos, afinal, sou uma espécie de arqueólogo
misturado a aventureiro, e afins, mas na realidade busco no desconhecido e
muitas vezes em mitos e lendas a origem para encontrar tesouros inestimáveis.
– ele agora apontava para o avião, olhando novamente para o mesmo como se
ali estivesse vendo o próprio animal. – E, digo que o morcego é um dos
animais mais mistificados desde os velhos tempos.
- Mesmo? – Charles ainda se mostrava cético.
- Sim meu caro! No passado ele era tido como um animal impuro,
que se assemelhou ou até superou a serpente como símbolo de paixão e
também de temor, ao passo que, para muitos índios ele era o terror diante de
alguns acreditarem que nos fins dos tempos o sol seria comido por um
morcego. Já para alquimistas eles acreditavam que ele consistia em uma
mistura de rato e pássaro, formando, assim, um ser híbrido, o que em seus
entendimentos representariam os demônios, razão pela qual, até mesmo nas
pinturas os habitantes do inferno e outros seres maléficos são retratados com
asas desta criatura. Já eu tenho que discordar de tudo, e dizer que eles são
belos, evoluídos, e, acima de tudo uma espécie que ajuda e muito a
humanidade.
- Em que exatamente? – Charles tornou.
Neste momento um homem forte e musculoso entrou na sala,
falando de uma forma rápida e já apertando em um controle alguns botões, ao
passo que, imediatamente uma porta se abriu e uma escada desceu.
- Chefe já podemos sair, porquanto, certificamos que já está tudo
limpo, nenhuma atividade lá fora e nenhum voo próximo que poderia nos
atrapalhar, podemos decolar em paz. E somente para cientificá-lo, os cientistas
não avisaram, porquanto, o senhor estava um pouco ocupado, mas eles já
355
instalaram o mecanismo que faz ele desaparecer de qualquer instrumento atual
de identificação, assim, já podemos ir para qualquer canto do mundo sem
sermos notados.
- Eles se certificaram mesmo que não há nenhum instrumento novo?
Afinal você mesmo se lembra dos problemas que enfrentamos em território
Russo! – Arthur questionou e alfinetou o rapaz de uma forma brusca.
- Sim senhor, eles me disseram que está tudo certo agora. – O rapaz
respondeu já adentrando na aeronave.
- Pois bem, então vamos. – Seguiu-o Arthur também entrando.
Quando entraram na aeronave logo atrás de Arthur os homens se
assustaram, ela era muito pequena, mas os espaços eram bem divididos, e,
havia além de confortáveis poltronas reclináveis alguns itens que os deixaram
encantados, tinha geladeira com refrigerantes, cervejas, e, ainda, um armário
com salgadinhos, comidas já preparadas em outra geladeira, que eles
poderiam esquentar caso quisessem em um equipamento de micro-ondas,
localizados entre outros itens.
- Lembrem-se que as bebidas alcoólicas somente poderão ser
consumidas na volta. – Disse Arthur sorridente, e, sentando-se calmamente em
sua poltrona.
Os homens riram alegremente, alguns já pegando salgadinhos e
refrigerantes, ao passo que outros mais gulosos antes mesmo de levantarem
voo começaram a esquentar pratos prontos de comida, na realidade se tornava
certo que todos já estavam famintos.
- Esta espécie de armadura não lhe atrapalha a se sentar não
Arthur? – Charles que não havia ido comer puxou papo com o velho.
- Ela foi feita sob medida, e, ainda, tem alguns itens que fazem com
que me sinta ainda mais confortável com ela, afinal, meu esqueleto não está
mais tão forte assim, então, principalmente quando me assento, passados
algum tempo, começo a sentir dores na coluna, porquanto, pela força da
gravidade aliada a minha fragilidade vou meio que me reclinando
inconscientemente para frente. O traje corrige isso, meu corpo e mantido na
posição certa por quanto tempo necessitar, e, ainda, um sensor instalado
detecta caso algum de meus músculos demonstrar que tem alguma
indisposição, e, imediatamente corrige a posição caso isso ocorra, assim,
inconscientemente estou seguro.
Imediatamente a aeronave fora ligada, e, às turbinas fizeram algum
barulho ao serem acionadas e ligadas, contudo, os agentes se assustaram ao
perceberem que apesar de a aeronave ser pequena, eles não escutavam
quase que nenhum barulho ali de dentro.
De repente Arthur retirou de um compartimento um estranho
controle, ligou uma televisão acoplada, e, para espanto de todos ele sintonizou
em um canal de desenhos.
356
- Desenhos?! – Charles questionou com espanto.
- Sim. – fez cara de descaso com o espanto. – Isto é a melhor coisa
que acho, principalmente, os de aventura.
Os agentes sorriram também com aquela revelação.
Lá fora já se podia ver que a aeronave já começava a plainar, a
porta da plataforma na cúpula do complexo começou a se abrir, e como um
morcego ele começou a subir cada vez mais, por óbvio, sem bater asas,
somente com a força das turbinas propulsoras.
Quando ele saiu do complexo imediatamente a porta começou a se
fechar, e o estranho objeto subindo mais e mais...
Arthur pediu para que todos se sentassem somente por aquele
momento e colocassem os cintos de segurança, o que foi atendido
prontamente.
Após algum tempo, como o velho havia lhes contado, as turbinas
foram desligadas, e, lentamente a aeronave começou a cair, após um tempo de
queda, onde alguns começaram até mesmo a pensar bobagens, porquanto,
pela primeira vez sentiam aquela sensação, as turbinas foram novamente
ligadas, e, aos poucos eles foram sentindo que estavam retornando para a
posição horizontal, até que tudo se estabilizou.
- Pronto, já podem retornar para seus afazeres, agora é somente
relaxar até o nosso destino. – Disse Arthur sorridente.
- Quanto tempo o senhor acha que vai demorar? – Charles estava
curioso, mais por sua tensão pela primeira missão do que pela expectativa de
chegar ao destino.
- Se fossemos em um avião comum, chegaríamos entre dez ou onze
horas, contudo, em meu morceguinho creio que em quatro ou cinco estaremos
no local exatamente como havia previsto. – A resposta foi dada com ar de
glória, e, principalmente, um gostinho de que tinha tudo sob controle.
- Mas não teremos que parar para reabastecer? – Foi George quem
questionou aguçando ainda mais a curiosidade, e, cuspindo salgadinhos para
todos os lados ao questionar com a boca cheia.
- Nossa, engula antes! – Arthur até colocou a mão para tentar evitar
em vão que nenhum farelo lhe acertasse. – Não tão cedo, afinal, temos uma
base certa de energia nuclear e outras parafernálias que garantem autonomia
plena por dias de voo sem pouso.
- Porque sem pouso? – Charles agora é quem bancou o curioso.
- Porque não poderia correr o risco de deixar esta belezinha
simplesmente estacionada em qualquer lugar. Portanto, ele vai descer, nos
357
deixar, subir imediatamente, e após ficará sobrevoando até que retornemos.
Assim, ele somente pousa em seu devido lugar, que é a base de onde saímos,
por óbvio, caso nada de grave aconteça.
- E se acontecer? – Charles mostrou-se reticente.
- Tenho um segundo plano, simplesmente ele aguarda em um
estado de blindagem total, e, caso a mesma seja forçada, e, se rompa, ele
aciona um mecanismo de destruição, explode não deixando nenhum
pedacinho. Mas fiquem calmos, que antes disso, ou seja, se ele apresentar
algum problema, anteriormente ao acionamento da blindagem, os
componentes de energia nuclear são despejados e anulados completamente
para fins não desejáveis, justamente para que caso a explosão ocorra, nada
disso afete a vida humana.
- Exceto para os que estiverem próximos da explosão! – Charles
exclamou com sarcasmo, afinal, da forma que Arthur estava falando parecia
que tudo era como um passeio no parque.
- É meu caro Charles, como você mesmo bem sabe, nunca
podemos salvaguardar tudo, afinal, do contrário seus homens e você próprio
nunca teriam matado qualquer pessoa, porquanto, poderíamos dizer que se
pensássemos desta forma que você quer colocar, deveria abordar qualquer
missão para evitar que uma mãe perdesse um filho, ou um filho perdesse um
pai, entre outros. E, caso optássemos pela prisão, que seria a mais sensata,
você mesmo sabe que ela não funciona para certas pessoas...
Charles engoliu em seco, não pensava em levar uma resposta como
aquela. E George muito brincalhão soltou uma gargalhada cuspindo ainda mais
farelo para explosão de Arthur que quase perdeu as estribeiras ao ser
novamente atingido.
- Qual será o objetivo da missão? – Michael questionou ao longe
somente para retirar a atenção e fúria de Arthur que já estava para enforcar
George.
- O avião nos deixará nesta área. – disse Arthur mostrando um mapa
em um estranho aparelho. – É um pouco longe de nosso destino, contudo, não
podemos correr o risco que vejam a aeronave, tenho que admitir que há outra
solução, que consistiria em descermos por cabos, lado outro, isto também está
fora de cogitação, afinal, o País é muito populoso, e, se assim o fizéssemos
iriamos chamar muito a atenção, talvez de quem não devêssemos.
- Qual é o País senhor? – Michael tornou ainda com olhar fixo em
Arthur.
- Não saberão até que estejamos em solo. – A resposta veio curta e
grossa.
- Por quê? – O agente insistiu.
- Porque será assim. – A resposta veio novamente seca.
358
- E o senhor acha que se andarmos com estas roupas e armas não
seremos vistos? – Agora foi Charles que questionou novamente cético.
- Não seja estupido meu caro Charles, vestiremos aquelas túnicas –
apontou para um amontoado de trapos ao canto –, e, terá um conhecido meu
nos esperando com algumas vacas e demais bens, para que possamos entrar
no local da missão como se fossemos comerciantes ou algo assim.
- Com estes trapos vão é desconfiar se não somos ladrões ou
pedintes. – Novamente para irritação de Arthur George abriu a boca, contudo,
desta vez não cuspiu nada, e, levantou às mãos em sinal de paz, realmente ele
era hilário, após ergueu as roupas e jogou uma para cada agente.
- Pode caçoar, contudo, saberão que estou certo quando
conhecerem o País, ali os comerciantes em sua grande maioria andam assim,
por óbvio, os de animais e afins, que serão os que nós iremos se passar.
- Quanto tempo de caminhada? – Charles questionou, desta vez em
tom mais ameno, afinal, estava convicto que Arthur tinha tudo sobre controle, e,
além disso, tais questionamentos se tratavam mais de nervosismo do que de
desconfiança.
- Creio que se os animais colaborarem em menos de trinta ou
quarenta minutos estaremos no local designado, que se encontra neste ponto –
disse apontando no mapa – após, iremos dispensar os animais, porquanto, já
estaremos em uma zona de alto risco.
- O senhor acha que os sujeitos que estarão protegendo este bem
estarão fortemente armados? – Robson questionou demonstrando ainda estar
totalmente fora do contexto.
- Me desculpe, mas achei melhor esconder de vocês que não iremos
enfrentar algo... como posso dizer... – Charles tentava escolher as palavras,
afinal, não era fácil para ele admitir sequer que aquilo existisse, e, quanto mais
enfrentar algo assim.
- Ele quer dizer que iremos enfrentar algo que vocês nunca
enfrentaram. Quando chegar a hora irão ver. – Interrompeu Arthur, que
somente naquele momento resolveu assim dizer, porquanto, somente naquele
instante havia visto pelos olhos dos agentes que Charles estava certo em
guardar segredo sobre o inimigo, além de soar um tanto estranho dizer aquilo,
ele não poderia correr o risco que eles ou temessem ou menosprezassem o
que estivessem prestes a enfrentar.
******
Após algumas horas de viagem, ao passo que alguns agentes até
dormiram, e, para infelicidade de todos entre estes se encontrava George, o
que ocasionou que outros que tinham maior sensibilidade não conseguiram
359
sequer fechar os olhos devido ao incomodo sonoro proporcionado por ele que
roncava como um porco sendo abatido.
- Senhor, chegamos ao ponto! Pelo radar parece que Mahesh
encontra-se lá com os animais, posso descer? – Questionou o piloto através de
um rádio, o qual quase matou os agentes de susto, principalmente, o roncador
George que acordou somente não pulando porquanto estava grudado na
poltrona pelo cinto.
Além disso, até mesmo Arthur se assustou, porquanto, já havia até
esquecido da existência do piloto ao passo que estava perdido em seus
pensamentos.
- Pode descer, já estamos prontos. – Respondeu ele apertando um
botão próximo ao alto-falante.
– E você George devia era fazer um tratamento para este ronco
infernal. – Disse o velho apontando o dedo para o rapaz, que muito sem graça
não respondeu.
Como George não respondeu Arthur para alivio do roncador desviou
o olhar deste prosseguindo nas instruções:
- Homens, quero que saibam que estaremos a partir do momento em
que pisarmos em solo em uma missão, portanto, respirem fundo e que a sorte
esteja com cada um de vocês, e, se creem em algo maior, podem começar a
pedir sua intervenção, porquanto, a missão não será fácil. – Arthur disse
sorrindo, ao passo que os agentes se entreolharam, até mesmo Robson olhou
rapidamente para Russo, acenando com a cabeça desejando boa sorte, afinal,
mesmo ainda se encontrando em dissintonia de sentimentos de afeto, a vida de
um dependeria daquele momento em diante do outro novamente, como na
época em que eram parceiros...
360
CAPÍTULO 86
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Miguel ainda estava fascinado com a luz que saia do peito do
homem. – Me desculpe à ignorância, mas como é o seu nome? – Seu
questionamento foi prontamente solidificado, porquanto, não aguentava mais
para saber de quem estava diante.
- Me desculpe, falei e falei e não me apresentei, pode me chamar de
Buda, é assim que todos me chamam no Conselho!
Aquilo pegou Miguel de surpresa. E seu espanto foi visível inclusive
para seu interlocutor.
Como assim Buda? – Ele pensou.
- Achou que eu era mais gordo, né? – Falou o homem que já previa
a reação do Arcanjo.
- Sinceramente senhor... – Miguel fez menção em não dizer, mas
sentiu que deveria se abrir. – Não sei o que pensar, me desculpe por ter
pensado assim, mas nunca ponderei que o senhor realmente existisse.
O homem sorriu alegremente, respondendo com voz serena:
- Ninguém tem certeza se realmente existe meu jovem, estou a
milhares de anos nestas dimensões, e a cada dia descubro que somos tão
ínfimos perto do poder que nos rege que concluir que existimos de fato seria,
antes de tudo, ter que concluir que nada somos...
O Arcanjo ficou perplexo diante da humildade daquele homem,
sentia que ele tinha enorme poder, mais falava como se já fossem mais do que
amigos, como se fossem verdadeiros irmãos.
- Não pense assim meu jovem, somente sou mais velho que você
pouca coisa, mas somos e seremos sempre irmãos...
Miguel estava mais espantado ainda, ele tinha o poder de bloquear
qualquer um que tentasse ler seus pensamentos, mas aquele homem
simplesmente ignorou este poder, e leu sua mente de uma maneira fácil que
ele sequer percebeu...
- Agora que já se conhecem, preciso acabar de contar a história para
Miguel, para que ele possa ir para sua primeira missão neste novo posto de
comando do exército dos Arcanjos. – Ele chegou bem pertinho do ouvido do
Arcanjo dizendo de uma maneira alegre: - Se eu não interromper ele vai ficar
tagarelando durante horas...
- Eu escutei!... – Disse Buda soltando um enorme sorriso.
Ao passo que Jesus retrucou sorrindo:
361
- Eu sei, era para você escutar mesmo, e se tocar.
- Posso fazer somente uma pergunta antes? – Clamou o Arcanjo,
como uma criança que quer descobrir o que ganhou de presente de natal.
- Tudo bem, faça! – Responderam os dois em uníssono.
O Arcanjo parou e pensou na melhor maneira de dizer aquilo,
concluindo que não havia outra forma senão ser direto:
- Vocês se tratam entre si como irmãos, e inclusive a mim, que não
sou nada perto de vocês. Protejo o universo e nunca vi seres mais evoluídos
do que vocês, mais na terra povos são divididos justamente por acreditarem
em um ou no outro... Simplesmente não entendo, porque não mudam isto?
Jesus olhou para Buda, o qual entendeu o olhar do amigo que queria
dizer que era melhor ele explicar.
- Miguel, sinto muito te falar isto, mais ao contrário do que você esta
falando, você não conhece nem um pouco o universo em seu todo para dizer
que o protege. – Buda fez uma pequena pausa olhando no fundo dos olhos do
Arcanjo. - O cosmo é tão vasto que você se espantaria com seu tamanho... O
que você vê, sente e toca, atrelado às dimensões que já foi em alguns
momentos de sua existência, etc., são somente grãos de areia na dimensão
real que não pode ser calculada.
- Não pode ser verdade, se assim fosse, quer dizer que nossa
regência estaria um caos total, que estaríamos lutando por nada, já que
podemos simplesmente migrar para outras dimensões ao invés de consertar as
que estão diante de nós! – Miguel respondeu relutante.
- Não é assim que funciona meu filho, eu, Jesus e outros do
chamado conselho, há milênios percorremos várias dimensões, e sabemos que
em cada uma delas os Criadores ou Criador fez tudo em harmonia por um
motivo, se estragamos isto, devemos consertar, porque lá na frente teremos
que repor.
Fez uma pausa ao observar que Miguel ainda estava perplexo,
aquilo era muito para sua cabeça, então Buda resolveu minimizar e ser mais
didático:
- Você já se perguntou para onde foram os primeiros seres que
surgiram na origem de tudo? Sabe por que hoje eles são somente lendas nesta
dimensão sublime?
O olhar do Arcanjo estava vago e perdido, aquilo era realidade.
- Não... Muitos dizem que eu sou da quarta ou terceira linhagem de
Arcanjos e Anjos, e sempre me perguntei para onde foram os da primeira...
- Então sabe que eles existiram? – Retrucou Buda.
362
- Não posso ter certeza. – Concluiu Miguel de cabeça baixa ainda
muito pensativo.
- Não se envergonhe meu amigo! Eu também não sei... Mais
acredito que eles estão em uma dimensão ainda mais avançada, olhando por
nós. – Concluiu Buda com uma voz confortante.
- Como assim mais avançada? A dimensão sublime é a mais
avançada, berço das almas mais evoluídas do universo! – Disse o Arcanjo de
uma maneira afirmativa.
- Isto é você quem diz... – Respondeu agora Jesus que até aquele
momento estava calado somente observando.
- Como assim? - Questionou novamente rapidamente o Arcanjo.
Jesus pegou em seu rosto e falou calmamente, contudo, com uma
voz firme e direta:
- Escute Miguel, você receberá ainda mais poderes, os de agora não
serão para destruir, mais para construir. No universo todo você somente tem
que ter um pensamento, de que nada é absoluto! Tudo se transforma,
querendo ou não...
Buda caminhou de encontro ao Arcanjo, e colocou a mão no peito,
logo após ergueu a mesma mão que agora tinha um feixe de luz, levando-a a
cabeça do Arcanjo, que começou a suar assustado.
- Acalme-se meu amigo, isto é somente conhecimento... – Abrandou
Buda já encostando a mão na cabeça de Miguel, quando o feixe de luz entrou
na cabeça do Arcanjo ele caiu, Jesus olhou para Buda sorrindo.
- Você não tem jeito mesmo, sempre compartilhando seu
conhecimento com o próximo! Mais como já sabe, isto é muito arriscado.
Buda sorriu alegremente, respondendo diretamente ao amigo:
- Afinal é você quem sempre me diz, é dando que recebemos... E sei
que Miguel tem força o bastante para isto, não correrá perigo.
Após algum tempo se contorcendo no chão o Arcanjo levantou-se
assustado, de seus olhos ainda saiam faíscas de luz, e ele via mundos que
nunca havia estado, e não poderia até aquele momento sequer imaginar...
- O que é isto? – Questionou o Arcanjo com a voz demonstrando seu
estado de extremo pânico pelo que acabará de ver.
- Somente um pouco de meu conhecimento! – Concluiu Buda. Queria lhe mostrar como somos diminutos diante da complexidade do universo,
e de seus mistérios...
363
O Arcanjo estava extasiado, aquilo era assustador e ao mesmo
tempo maravilhoso...
Mais e a terra em tudo isto, como fica esta dimensão material? As
almas encarnadas? Tudo? – Ele pensava freneticamente.
- Na dimensão material a terra é um grão de areia... – Respondeu
Buda lendo novamente os pensamentos do Arcanjo.
E Jesus resolveu prosseguir:
- Esta dimensão se estende mais além, algumas civilizações já
progrediram muito, e inclusive visitam a terra, contudo, não mais interferem em
seu funcionamento, porque já se machucaram uma vez...
- Então quer dizer que os chamados alienígenas que os homens
tanto falam e mistificam realmente existem? – Questionou Miguel.
- Os alienígenas como os humanos os veem é uma piada. Eles
são muito mais que isto! eles representam a maior e melhor evolução do
pensamento humano que existe. São diferentes porque têm que ser diferentes,
o clima e a atmosfera do seu planeta mãe era muito frio, o que lhes custou uma
pele muito sem melanina, e poucos pigmentos.
Disse Buda calmamente, prosseguindo em sua explicação
após perceber que o Arcanjo estava vidrado:
- Concluí também que a baixa gravidade permitiu que eles
ficassem maiores do que qualquer ser humano, o que vem se desfazendo nos
últimos séculos, devido ao aumento da gravidade e cruzamento de raças,
talvez um erro, que pode lhes custar à extinção.
Ele prosseguiu em suas explicações sem qualquer interrupção:
- Quando eles perceberam que não poderiam interferir em um
planeta diretamente, tendo várias experiências mal sucedidas neste sentido,
resolveram estudar a fundo cada planeta que encontrassem, partindo em
expedições. Eles são evoluídos porque ao contrário dos seres humanos
terrestres, eles evoluíram rapidamente, devido a todos pensarem no próximo e
ao próximo. Contudo, ao partirem em suas expedições pelo universo, e,
principalmente, após buscarem por muitas espécimes diferentes de cada ser e
levá-los para outros planetas, buscavam somente que estas espécies
pudessem repovoar estes novos planetas, contudo, estavam errados...
Após isso ele ficou pensando no que eles haviam feito, e, se
perdeu sem querer em seus pensamentos que se misturavam com sentimentos
de toda ordem, principalmente, de raiva por tudo que viu neste sentido...
364
CAPÍTULO 87
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
A aeronave começou a parar, e, em pouco tempo o piloto
desligou os motores, e, logo após cair um pouco os motores foram religados e
ela começou a plainar e a descer suavemente.
Todos já haviam vestido os trapos arrumados por Arthur e
retornado para as poltronas apertando os cintos antes de ter início à descida.
- Quando as portas se abrirem, saiam rapidamente, afinal,
mesmo não tendo qualquer movimentação não podemos correr o risco de que
a aeronave seja vista. – Alertou Arthur.
No solo à medida que a estranha aeronave descia os olhos do
cidadão ficavam ainda mais miúdos tentando distinguir o que era aquilo.
Mahesh era um sujeito simples da região, se considerava amigo de Arthur, o
qual já ajudou em várias missões, e, também foi ajudado em contrapartida pelo
velho, principalmente, há sair da miséria extrema.
- Eu sabia que o velho Arthur era um sujeito muito misterioso,
contudo, nunca imaginaria que ele poderia possuir um troço tão estranho como
este. Quando me ligou ontem pedindo minha ajuda e para providenciar tais
apetrechos nunca poderia imaginar uma coisa destas. – O pequeno e magro
Mahesh dizia lentamente para si mesmo, aquele ser com olhos negros
esbugalhados, pele marrom como terra e cabelos lisos e mal peteados, não
sabia se estava sentindo alegria em rever o amigo, ou medo daquela coisa em
que ele estava chegando, à medida que ela descia, ele não disse mais nada,
mais seus pensamentos ainda tilintavam:
Parece uma espaçonave alienígena! Será que Arthur não tem
limites para suas loucuras e engenhocas? Já vi ele trazer várias parafernálias
para missões, contudo, essa é a maior e mais estranha delas!...
Quando a aeronave já estava próxima ao chão, Mahesh
agradeceu por ter amarrado os animais em uma pequena mais firme árvore,
porquanto, do contrário, não iria permanecer nenhum deles ali naquele local
para contar história, tendo em vista que o barulho e o vendo proporcionado
pelas estranhas turbinas assustavam até mesmo ele, quanto mais os pobres
bichos.
Assim que a aeronave pousou uma pequena porta se abriu, e
Mahesh pôde ver o velho Arthur sair primeiro seguido por vários homens, todos
vindo rapidamente em sua direção, em pouco tempo as portas se fecharam e a
aeronave decolou novamente, mas Mahesh não tinha mais olhos para ela,
somente para o velho e seus homens.
- Mahesh, há quanto tempo! – Arthur gritou ainda de longe.
Mahesh sorriu, um pouco por alegria em rever o amigo,
contudo, certamente estava rindo ainda mais da forma como eles estavam
365
vestidos, ao passo que, assim que ele e os homens que o seguiam chegaram
mais perto, ele gritou soltando uma gargalhada:
- Desculpe senhor, mais não posso dar esmolas para tantos
maltrapilhos! Além disso, pela forma que o senhor está andando não posso
ajudar um robô.
Charles e os agentes olharam para Arthur que sorriu um pouco
sem graça, afinal, olhando agora parecia mesmo que havia exagerado no mau
estado das vestes, mas ficou satisfeito ao saber que o amigo franzino havia
apreendido a observar mais os detalhes, assim como ele o havia ensinado
tantas e tantas vezes, e ao mesmo tempo triste, porquanto, ele observou logo
seu andar mecânico, logo pensando:
Estava crente que minha equipe o tinha deixado muito realista
em passadas normais, e, somente na luta elas ficavam mais firmes após eu
acionar um mecanismo para lhe proporcionar maior potência, como se fosse
um turbo, agora que o pobre Mahesh conseguiu observar isso tenho minhas
dúvidas.
- Meu amigo, se não tem esmola me de um abraço então. E,
prometo que este robô não vai te aniquilar. – Disse Arthur já enlaçando nos
braços o pequeno amigo.
Enquanto os dois se abraçavam e se cumprimentavam os
agentes olhavam para Charles que estava olhando para o horizonte tentando
se situar.
- Homens, estamos na Índia! – Disse ele sorrindo por ter
conhecido o local somente pela análise de alguns fatores.
- Já sabia disso desde o momento que o piloto disse o nome do
sujeito que estava nos aguardando. – Respondeu Robson.
- Está certo que Mahesh é um nome Indiano, contudo, poderia
ser qualquer lugar, afinal, nomes estrangeiros são comuns atualmente. –
Charles não se deu por vencido.
- Não foi somente por isso, liguei isso ao tempo de viagem que
Arthur disse que um avião comum gastaria, e, calculei a distância e tempo
médio de voo dos aviões comerciais. Além disso, tracei antes de sairmos uma
rota após perceber para o lado que o avião havia seguido. – Robson retrucou
não se dando também por derrotado, e, demonstrando que era mais avançado
do que seu chefe poderia imaginar.
- Muito bem, está realmente de parabéns. Não consegui pensar
desta forma, e, ainda, traçar rotas e calcular distância com velocidades não é
nem de longe o meu forte. – O chefe respondeu com um sorriso.
Robson ficou como há muito tempo não ficava, afinal, para
conseguir um elogio como aquele de Charles era algo muito difícil, e, quando
alguém conseguia era como se tivesse ganhado um prêmio financeiro.
366
- Venham rapazes, quero que conheçam meu amigo Mahesh o
homem vaca da Índia! – Disse Arthur sorrindo ainda com o braço no pescoço
do amigo, e, com o outro chamando os agentes e Charles.
Todos se aproximaram e foram cumprimentando o sujeito
tipicamente indiano, o qual certamente trajava roupas milhares de vezes mais
novas do que os trapos arranjados por Arthur para ficar acima de suas
vestimentas militares.
- Porque o apelido homem vaca? – Russo questionou sorrindo
e olhando no fundo dos olhos do pequeno Mahesh, tinha que se curvar todo,
afinal, como era grande demais o Indiano a sua frente parecia um pequeno
anão.
- Arthur me colocou este apelido porque após me enriquecer
com suas expedições, eu sou tido em minha região como um Deus para os
pobres, e, como a vaca é sagrada, este velho brincalhão fez esta comparação,
o que é motivo de chacota para ele, porquanto, a vaca é um animal para vocês
que é uma simples comida, lado outro, em minha região tornou-se motivo de
autoridade e orgulho, diante da comparação a este belo e abençoado animal.
- Fico muito feliz por você. – Charles disse apertando a mão do
pequeno mais muito simpático homem.
- Bem, já que todos já se conhecem, podemos seguir nossos
planos, afinal, o tempo está contra nós a partir deste momento. – Arthur alertou
flexionando as mãos e erguendo os trapos que ele chamava de disfarce, e,
acionando em seu pulso um cronometro que se encontrava embutido em sua
estranha armadura.
Nem vou perguntar para Arthur o que se trata isso em seu
corpo, afinal, já não me assusto com mais nada que venha deste velho louco. –
Mahesh pensou sorrindo.
- Senhor Arthur, pensando que vocês iriam precisar de alguns
disfarces, e, seguindo a onda mais realista, trouxe alguns trajes. – Mahesh foi
dizendo após seus pensamentos sobre o traje mecânico do amigo e já tirando
algumas vestes de um cesto que se encontrava preso em um pequeno jumento
– Contudo, não sabia quantos homens eram, assim, acho que trouxe poucas
roupas.
- Sem problema meu caro, e vejo que você melhorou muito não
apenas seu poder de observação em uma missão, mas também de premeditar
necessidades e, ainda, descrição, ao sequer questionar sobre meus
brinquedinhos. – Arthur elogiou seu pequeno e valioso amigo pela atitude.
- É, e ficará ainda mais realista desta forma. – Russo disse
sorrindo.
- Por quê? – Arthur teve a audácia de questionar intrigado com
aquela resposta.
367
- Os que seguirem com as vestes que o senhor nos deu,
poderiam se passar por escravos dos comerciantes. – A resposta veio com
uma gargalhada, ao passo que todos sorriram levando na esportiva, exceto
Robson que ainda não achava sequer graça do que vinha de Russo.
Quando todos já estavam trajando as novas vestes, ou melhor,
quase todos, porquanto, Charles e Russo ficaram sem, o último por conta da
chacota feita anteriormente, e, Charles por opção, porquanto, achava que os
trajes novos eram feitos de material que ele tinha alergia, e, não queria admitir
aquilo para os outros, assim, finalmente, começaram a seguir viagem.
******
- Estes animais não andam mais rápido não? – Russo disse
olhando para os bichos que caminhavam lentamente à sua frente, isso,
somente após alguns minutos de viagem.
- Quem sabe se um dos escravos levar o peso que eles estão
carregando poderiam se apressar ainda mais? – Foi Charles que agora
respondeu alegre, apontando para os cestos onde estavam sendo conduzidas
as armas, mais um ponto que Mahesh ganhou com Arthur ao ter a ideia de
colocar cestos para tal transporte.
Arthur ficou satisfeito, parecia que todos estavam se
interagindo muito bem, e isso seria vital para o sucesso da missão que estava
por vir, a qual no fundo de seu ser ele sabia que não seria nada fácil...
368
CAPÍTULO 88
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
- Como assim estavam errados em que sentido? Afinal,
queriam somente promover o bem! Estou certo? – Miguel retirou Buda de seus
pensamentos após perceber que ele já estava quase que meditando.
- Me desculpe! Somente fico meio pensativo ao raciocinar
sobre isso. – ele balançava os braços como se estivesse afastando os
pensamentos. – Não estavam certos não meu caro Miguel! Afinal, como você
bem já sabe, as dimensões inferiores estão repletas de seres maléficos que em
sua visão distorcida achavam do fundo do seu ser que estavam promovendo o
bem. – seu dedo indicador foi erguido e depois abaixado.
Miguel não entendeu, mas Buda sabia que somente após ele
iria raciocinar, então prosseguiu:
– O que você tem que saber é que com está experiência
promovida por eles nada saiu como queriam, porquanto, em pouco tempo eles
perceberam que aquele planeta que parecia inabitado, estava em perfeita
evolução, aguardando o tempo certo para ser então utilizado em plenitude por
aqueles que já estavam lá, contudo, ainda não poderiam serem vistos por olhos
normais.
- Mais o que o líder fez? – Miguel demonstrou sua curiosidade.
- Ele ordenou que parassem imediatamente o que eles
chamavam de inseminação do universo, e se pautassem somente em ajudar
aquelas que já estavam um pouco mais desenvolvidas a evoluir ainda mais.
- Em que consistia tal ajuda? – O Arcanjo estava realmente
interessado.
- Eles se pautaram em civilizações que já estavam em um
processo mais avançado pelo menos da forma mental. Foi assim que o Egito
conseguiu evoluir tanto para sua época, os maias, bem como, antes os
sumérios, e, outras tantas civilizações anteriores e posteriores do universo. Sei
Miguel que você somente tem por obrigação e permissão para guardar o
planeta terra, contudo, quero que saiba que existem tantas outras dimensões e
mundos além dos quais estamos acostumados, que ficaria espantado.
- Quer dizer que os Sumérios e outros... – Miguel começou a
dizer sendo interrompido por Buda que não queria parar sua explicação.
- Sim Miguel, contudo, igualmente a estas outras experiências,
está também não surtiu muito efeito, principalmente, no que diz respeito ao
Egito e outras civilizações que podemos dizer mais modernas, porquanto,
ocorreram revoltas e outras diversas ameaças, que igualmente colocaram em
risco a evolução, desta vez da terra.
369
- Presenciei algumas destas revoluções, iria tentar ajudar de
alguma forma, mais na época recebi ordem para ficar longe, ao passo que me
disseram que ali já havia muita interferência. Assim, somente acatei as ordens.
- Fez bem, porquanto, eles não escutaram e estavam agora
sentindo as consequências de seus atos, e, após muito dialogarem, concluíram
que era como se o homem evoluído atualmente chegasse a um planeta de
canibais e povos primitivos, ou seja, a mente destes seres, mesmo que em
processo evolutivo, ainda não eram capazes de processar como deveriam
tantas informações e ensinamentos, ocorrendo, por conseguinte, vários
desastres lógicos.
- Sim, isso é óbvio. – Miguel disse baixinho, logo se calando
para ouvir mais.
- O atual líder desta civilização alienígena avançada, ordenou
então que parassem também com mais aquela interferência, retirando todas as
suas tecnologias destes planetas. Neste dia o que eles não sabiam eram que
vários espíritos discutiam em nosso Conselho Supremo, exatamente isso, ou
seja, que se esta interferência continuasse, teriam que dar fim aquela nação
mais desenvolvida, e estas almas somente poderiam voltar a encarnar quando
todas as outras estivessem também desenvolvidas na mesma proporção, tudo
para que assim não pudessem novamente provocar esta desproporção,
mesmo estando com boas intenções.
- Justo, mas... – Miguel tentou dialogar, sendo novamente
interrompido por Buda que não queria parar.
- Me desculpe, mas tenho que terminar meu raciocínio Miguel.
Ocorre que sem o Conselho Supremo saber, uma força inexplicável já havia
colocado uma alma encarnada entre esta nação alienígena, a qual, assim,
convenceu todos a abandonar suas missões, pois conseguiu abrir a mente
deles que uma interferência deste tipo não ajudava uma nação de um planeta a
evoluir, somente atrapalhava sua evolução e, assim, toda a lei do cosmos.
- Esse líder agiu na hora certa! – Exclamou Miguel sorrindo
com a inteligência do condutor.
- Sim. Este líder propôs que eles não mais interfeririam
diretamente nos planetas, somente os vigiariam de perto, e caso algum deles
colocassem em perigo toda a nação, somente assim, deveriam interferir.
- Isto é muito sensato. – Concluiu Miguel ainda entusiasmado
com a atitude do sujeito, e, desta força oculta que ali o inseriu para pregar tal
ideal.
- Poderia ser se este dia não estivesse chegando, ou seja, que
agora eles poderão ter que interferir para que não ocorra algo pior, e, caberá
principalmente a Marcos e Damião mostrar-lhes que não somente a terra, mas
o todo o cosmos corre grande perigo...
370
- Mas o líder saberá que este dia chegou? – Questionou o
Arcanjo o que lhe parecia óbvio.
- Não poderá meu caro Miguel, simplesmente porque este líder
já desencarnou de perto deles, então, também não mais poderá interferir em
suas escolhas. Além disto, a mesma força inexplicável que colocou um espírito
que podemos dizer que era fortemente de luz de outra civilização e evolução
encarnado nestes alienígenas para mudar seus planos, desta vez colocou um
espírito destes alienígenas em um corpo humano, o que o Conselho Supremo
somente tomou conhecimento muito mais tarde, o que os chocou devido ao
pensamento de que os Criadores ou Criador estivessem após tantos e tantos
milênios interferindo novamente em sua criação...
- Você acha que nosso pai está de volta?! – Miguel questionou
em tom de alegria, sentindo um calor em seu interior que não sentia há muito
tempos, era um claro sentimento de esperança que brotava em seu ser, a
esperança de encontrar seu pai...
- Pode ser meu jovem Arcanjo. O Conselho viu que a
inteligência desta alma alienígena encarnada em corpo humano era um golpe
de mestre, porquanto, superava todos os precedentes, porque ajudava a raça
humana na terra, sem a interferência direta de seus pares da civilização
alienígena, e, com a vantagem dele poder conhecer a raça humana não de
fora, mas fazer parte dela, o que mudaria tudo, porquanto ele não estaria
interferindo para salvar um planeta, mais o seu planeta, mesmo que ele não
soubesse disto.
- E o que esta acontecendo a este homem. – Miguel agora
estava curioso para saber o destino que aguardava aquele ser tão místico que
agora era um humano.
- Posso afirmar que ele atualmente já foi de alguma forma
guiado por esta mesma força inexplicável, e encontra-se preparando armas
capazes de lutar de igual para igual na guerra que esta por vir, fez amigos
confiáveis e influentes, aguardando o tempo certo, e ele mudou os precedentes
de encarnação de alma evoluída em corpos e raças subdesenvolvidas
mentalmente e tecnologicamente, se isto será bom ou ruim somente o tempo
dirá, mas esta força inexplicável parece saber o que faz...
- Mas eu não entendo, porque os lideres preferem não interferir
na terra? Questiono isso porque talvez se exercesse uma liderança mais
aprimorada a evolução seria mais rápida. – Miguel ainda tentava entender
relutante com o fato da não interferência.
- Quando você chega em uma floresta toda infestada de
animais você entra logo? – Desta vez foi Jesus quem disse.
Aquilo pegou Miguel de surpresa, que respondeu ainda
pensativo:
- Creio que não... Não penso como um humano, porquanto,
nunca fui um de verdade, apesar de ter feições destes e demais semelhanças,
371
mas sei que mesmo sendo infinitas vezes mais poderoso, e, que assim não
estaria correndo nenhum perigo imediato, mas, primeiramente tentaria ganhar
a confiança destes animais, fornecendo aos poucos algo de que precisassem,
para ao final tentar uma interação maior.
Primeiramente você esta errado que nunca foi um ser humano.
– Buda sorriu e Jesus também ao receber seu pensamento em sintonia,
contudo, não poderiam comentar por motivos certos ao Arcanjo aquela
verdade. Assim, decidiram prosseguirem sem dizerem uma só palavra.
- Exatamente isto é que aquele líder conseguiu colocar na
cabeça dos alienígenas... Eles não querem mais interferir na terra sequer para
fazer o bem, simplesmente porque agora sabem que os homens atualmente
são apenas animais selvagens comparados à evolução que eles já
conseguiram, e, por isto, necessitam de uma maior interação de conhecimento.
Buda fez uma pequena pausa, analisando se o Arcanjo havia
entendido, quando finalmente percebeu que sim prosseguiu:
- Quando estamos diante de um animal selvagem, por mais
manso que ele seja, sabemos que se ele se sentir acuado ou com medo, mais
cedo ou mais tarde ira atacar, por fome ou ódio. No caso dos homens, os
alienígenas sabem agora que eles ainda têm fome de poder, e ódio de serem
os segundos, porquanto, ainda são poucas as exceções do contrário a esta
triste regra, a maioria dos homens somente não são repressores porque não
detém nenhum poder! Assim, tantos que uma vez investidos em qualquer
forma de domínio e posse, certamente se corromperão por ele, não pensando
no próximo, mas somente em si mesmos, muitas vezes até mesmo movidos
não por ganância ou outros sentimentos impuros, mas pelo próprio medo de
perder tal força.
- Mais porque nunca vi uma alma alienígena na dimensão
superior?!... – Questionou o Arcanjo pensativo olhando naquele momento não
mais para Buda, mas para o alto, como se aquele pensamentos fosse mais
uma conclusão.
- Estudando tudo isto, eu e Jesus achamos que eles já passaram
pela dimensão superior, mais todos evoluíram muito em várias encarnações, e
foram para uma dimensão ainda maior e mais complexa, que você pôde ver no
conhecimento que lhe passei. – Tentou explicar de uma maneira simples.
- Então quer dizer que todos da dimensão superior podem evoluir
ainda mais? – Miguel concluiu, deixando claro que havia entendido tudo
perfeitamente.
- Sim, é isto mesmo que concluímos ao conhecermos estas novas
dimensões que certamente estão à frente da sublime ou superior que estamos
agora. – Respondeu agora Jesus.
- Como tem certeza disto? – O Arcanjo não parava, aquele assunto
estava lhe interessando.
372
- Não tenho certeza de nada. – Buda foi dizendo com certa incerteza
nas palavras, como se estivesse ainda incerto com o que de fato teria ocorrido.
– Mais após aceitar muitas evoluções na terra, mesmo já estando na dimensão
sublime há milênios, somente retornando para ajudar mais almas a evoluir,
enfim, não pensando em poder, fui inesperadamente enviado para este novo
planeta, por uma força que desconhecia até aquele momento. E, após anos
com eles, vi que apesar de serem desenvolvidos na imaterial, muitos tinham se
apegado ao material, o que é estranho para nós que buscamos o oposto,
enfim, eles não queriam voltar para o mundo imaterial. – Terminou Buda ainda
meio que pensativo, como se estivesse com vergonha de seus irmãos que se
encontravam naquela dimensão dita sublime.
- Como assim, resolveram ficar no plano material? – Miguel
definitivamente não havia entendido:
- Como algum ser preferiria permanecer no plano material, mesmo
sendo evoluído o bastante para retornar para o imaterial e viver ainda melhor?
– Ele pensou intrigado.
- Eles se desenvolveram tanto no mundo material, que praticamente
extinguiram todas as doenças. Com o avanço tecnológico conseguiram
inclusive retardar muito o envelhecimento, por isto, praticamente eles somente
morrem após longos anos, podendo, em alguns casos viver por séculos.
Buda fez uma pausa pensativo, olhou para Jesus com olhar triste, e
prosseguiu em uma voz abatida:
- Eu particularmente acho isto um modo de se apegar a matéria, o
que em certo sentido enfraquece este povo. Contudo, não há do que reclamar
deles, já que em sua grande maioria são dotados não só de conhecimento
tecnológico e cientifico, mais de bondade. Creio ser por isto que não há
qualquer interferência das dimensões imateriais, bem como, o Criador ou
Criadores, nada fazem para retardarem esta questão, já que certamente estas
dimensões não devem estar inseridas no pacto que conhecemos como tratado
com Noé, que tanto respeitamos após o início desta nova era.
- Você é que se tornou o líder dos alienígenas, fazendo desistirem
da interferência na terra, e em outros planetas! - Miguel exclamou, afinal, agora
tudo fazia sentido para ele.
Buda sorriu alegremente olhando para Jesus, e dizendo:
- Você mais uma vez estava certo, este Arcanjo é mais inteligente do
que muitas almas que se dizem evoluídas e se vangloriam no Conselho!
Miguel ficou alegre com o elogio, e rapidamente prosseguiu nas
perguntas, afinal, não era todos os dias que tinha explicações tão valiosas.
- Mais após desencarnar, o que ocorreu?
- Eu aceitei a proposta de Jesus e de outras almas evoluídas, e
formamos e aprimoramos este Conselho Supremo, que já existia em termos
373
menores, concluímos que todos podem evoluir ainda mais, e, após isto muitas
almas evoluídas quiseram retornar para a terra, ocorrendo assim uma maior
evolução de todos que lá estão, e, consequentemente, de todos que aqui estão
também... – ele parou pensativo, como se raciocinasse se o que iria dizer era
apropriado. – Também tivemos acesso a uma dimensão que é totalmente
desconhecida de todos, uma dimensão ainda mais maravilhosa, onde estão
boa parte destas almas mais evoluídas, as quais detém poderes infinitas vezes
maiores do que os nossos, contudo, jurei não contar a ninguém sobre o que
vimos lá, por isto, não poderei lhe contar mais nada.
- Mais nos pensamentos que você me passou, vi mundos
maravilhosos! – Exclamou Miguel.
- Estes estão na dimensão material próximo à galáxia onde se
encontra o planeta terra, por ser material não tem segredos, a imaterial é que é
um mistério maior ainda, é dela que vão e que vêm as almas destas outras
galáxias, as mais evoluídas...
Miguel estava extasiado, aquilo mudava toda sua percepção de sua
vida e da forma como via o mundo, ele protegia a terra, e, as dimensões que
até aquele momento achava que eram as únicas, porquanto, eram elas que
estavam ligadas a este planeta e sua evolução.
- Não falei que o Buda é um tagarela, falou e falou, contudo, aquilo
que realmente tenho que lhe explicar, aquilo que será realmente útil para sua
missão, não foi sequer cogitado na conversa! – Disse Jesus em um tom
descontraído mais sério, sabia que não dispunham de maior tempo, e tinham,
portanto, que irem direto ao assunto.
Buda sorriu, e abraçou Miguel fortemente, sabia que Jesus estava
certo, se despediu dizendo alegremente:
- Depois lhe ensino mais coisas interessantes! – Dando ainda um
forte abraço em Jesus, chamando-lhe de irmão, e saiu da sala celestial
cantando uma música que o Arcanjo desconhecia, mas que Jesus já estava
farto, devido ao fato de Buda somente cantar está música, aquilo lhe dava nos
nervos, e, era uma das únicas coisas que conseguiam lhe irritar, e, era
exatamente por isso que seu amigo a cantava, somente para implicar...
374
CAPÍTULO 89
Oceano Atlântico – França para Brasil, 1982
Após se certificar que não havia sobrado nada do navio e das
pessoas que ele achava que nele se encontravam, Poseidon ergueu seu
tridente, onde vários raios o acertaram. Logo após foi fazendo com que a
tromba d’água sob seus pés fossem diminuindo lentamente, e, quando ela
terminou por completo, e o mesmo encostou os pés na água do mar um último
raio, desta vez o maior deles atingiu o tridente e sua energia desceu
rapidamente deste para o corpo do velho Deus mitológico, ao passo que,
quando atingiu a água do mar aos seus pés ele começou a se derreter como se
fosse feito inteiramente daquele liquido, mas antes de se desfazer totalmente,
disse triunfante somente para seu ego:
- Sou novamente o senhor dos mares... – Derretendo
completamente em meio ao mar, ao passo que, misturado às partículas do
líquido viajou rapidamente pelo condutor para a dimensão paralela onde Lúcifer
e Serfalos lhe aguardavam para a reunião que traçaria as diretrizes de seus
futuros passos.
******
- Muito longe dali, exatamente estirado ao chão de um porto
brasileiro Damião começou a abrir os olhos, todo o seu corpo doía...
375
CAPÍTULO 90
Dimensão Sublime, 1982 – ano terrestre
Após a saída de Buda Jesus olhou para Miguel com um leve sorriso
no canto da boca, sentando-se novamente.
- Sei que ele lhe mostrou coisas inacreditáveis, e que você ficou
muito impressionado, e por isto queria saber mais. Contudo, temos que tratar
de assuntos mais importantes para o momento, e se eu deixasse Buda
continuar ele iria tagarelar por um bom tempo, do qual não dispomos.
- Não estou chateado mes... mestre... – Gaguejou um pouco, se
perdendo nas palavras, consertando com um questionamento: - posso lhe
chamar assim?
- Você pode me chamar de irmão. – Disse Jesus em tom alegre e
descontraído.
- Somente fico a pensar como fomos criados, e viemos parar nestas
dimensões, e, principalmente, por quê? – Respondeu com um questionamento
Miguel ainda perdido em seus pensamentos.
- Todos em qualquer fase de toda existência já fizeram a mesma
pergunta. E a resposta somente pode ser uma, há de que nos foi dado uma
oportunidade de existirmos, seja nesta ou naquela forma, isso basta...
Miguel ainda permanecia perdido em seus pensamentos,
questionando não para Jesus, mas para si mesmo: E se não sabermos para
onde seguir?
- Sempre teremos escolhas, até quando nada fazemos estamos
exercendo uma escolha. – Fez uma pausa, e olhou bem no fundo dos olhos do
Arcanjo, que levantou a cabeça ao ver o silêncio que tomava conta do local. –
Meu caro Miguel, basta somente sabermos que devemos seguir nossa
percepção, afinal, se estamos aqui é por um motivo, e se nos foi dado o livre
arbítrio, é porque não querem que nós sejamos subordinados, e sim livres para
fazermos nossas escolhas, seja ajudar ou ficarmos omissos...
- Mais e os primeiros arcanjos? O que foram feito de meus
ancestrais? Sei que evolui desde a percepção da alma humana, mais e os
outros que estavam aqui antes de mim?
- Você pode ver através das imagens que Buda colocou em sua
alma, que existem dimensões além das quais nós compreendemos, e que
como ele mesmo lhe disse à medida em que evoluímos vamos tendo
permissão para nelas adentrar, eu, Buda e outros membros do Conselho,
tivemos várias permissões, inclusive, para voltar para esta dimensão
primordial, a qual na realidade é somente uma delas, e nestas oportunidades,
descobrimos coisas desconhecidas para a maioria dos seres.
Fez uma pausa pensando se não havia dito muita coisa, afinal, tinha
que ter melhor noção do que seria dito, após resolveu somente finalizar:
376
- Contudo Miguel, eu creio que se tudo foi feito desta forma, seria
imprudente de minha parte revelar algo assim para você neste momento. Na
hora certa descobrirá o que deve saber, e quando todas as suas perguntas
forem respondidas, terá certeza de que escolher ajudar é o melhor caminho
para obter suas almejadas respostas, e, que talvez ao contrário do que pense,
está muito próximo de seguir passos além desta dimensão do que outros
membros deste Conselho que entendem em sua ignorância que estão a frente
de tudo e de todos por ali já se encontrarem...
Miguel sorriu, porquanto, um fio de esperança se abriu em seu peito.
Somente não entendeu bem a parte final, contudo, decidiu calar-se quanto a
questionamentos nessa ordem, afinal, já havia questionado muito, agora era
hora de saber escutar um pouco, somente queria dizer algo para afirmar que já
praticava o que Jesus tentou lhe passar.
- Às vezes quando estou em uma situação difícil, escuto uma voz
dentro de minha consciência que me acalma e me faz seguir um caminho
melhor, o qual naquele momento não parece o mais perfeito para se seguir,
contudo, se o escolho ao final percebo que escolhi certo. No início achava que
esta voz era minha consciência, após vi que era algo maior, que não estava em
mim.
Jesus levantou-se, foi de encontro ao Arcanjo colocando sua mão
direita em seu peito, e a esquerda em sua cabeça, dizendo bem baixinho:
- Pense assim: Se fomos criados, existe a certeza de uma força
poderosa que se encontra presente em tudo e em todos. Portanto, se esta
força nos deu escolhas, quer dizer que mesmo ela sendo onipotente, não é
opressora. Se o seu corpo é constituído desta mesma força, quer dizer que ao
se abrir completamente ao pensamento positivo e com humildade de sua
essência ser meramente uma criação de algo maior, poderá interagir
conscientemente com ele, não no seu estado atual, mas com o seu estado de
essência. O que quer dizer que talvez seja só sua consciência, ou algo maior
que já se encontra em seu interior e em tudo lhe ajudando, mas, conforme você
observou, somente orientando quando lhe é ofertado assim o fazê-lo. Ou seja,
nunca lhe impondo suas vontades, deixando que você decida o que fazer, e,
indo além disso, que pense que foi você que assim escolheu. Portanto,
deixando para todos que seria sua consciência que assim ofertou para ti, em
verdadeira demonstração de sua não apenas bondade, mas fraternidade, como
um pai e mãe que doa de tudo para seu filho, até mesmo sua própria vida, o
que assim provavelmente foi feito.
Miguel sorriu, Jesus tinha uma habilidade extraordinária para
ensinar, mesmo não impondo qualquer ponto de vista ou opinião, e até mesmo
não concluindo nenhuma teoria sua como absoluta, simplesmente guiava seu
interlocutor para a resposta que melhor lhe seria apreciada.
Não é a toa que na terra ele ensinou tudo através de parábolas,
método que levou dos mais humildes, aos mais sábios a retirar delas os
ensinamentos para chegarem a uma evolução intelectual e espiritual ao mesmo
tempo. – Pensou Miguel sorrindo.
377
- Entendeu? – Questionou Jesus.
- Sim mes..., quer dizer, irmão! – Concluiu o Arcanjo após gaguejar
um pouco em se corrigir quando se lembrou do pedido anterior.
- Muito bem, assim gosto mais, irmão. E, ainda, tenho que dizer que
estava certo quando lhe adverti que Buda era um tagarela e caso deixássemos
ele ficaria aqui por horas, afinal, parece um carma, mas você percebeu que
mesmo ele tendo saído, tivemos que permanecer em suas reflexões por longo
período?
- Sim percebi. – Miguel respondeu curtamente sorrindo com a
conclusão obvia de Jesus.
- Então agora podemos ir para o mais importante?
Miguel afirmou positivamente com a cabeça e se dirigiu para a
grande mesa, aguçando bem os ouvidos para seu interlocutor, que
imediatamente começou a falar, sem se sentar, andando de um lado a outro,
não por nervosismo, mas como um defensor expondo suas ideias.
- Você precisa saber Miguel, que no momento em que Lúcifer e
Serfalos viram que o plano deles estava dando certo, ou seja, inserir demônios
entre os animais, eles simplesmente iniciaram o que poderia se chamar de
catástrofe da criação. Os demônios foram enviados por Lúcifer para
começarem em massa a manipular as almas do mal encarnadas nos animais,
as quais por estas manipulações iniciaram uma série de estupros a mulheres,
para que tudo pudesse se iniciar novamente, desta vez de forma ainda mais
assustadora... Assim, de alguma forma inexplicável às mulheres engravidaram,
e a alma vinha, mas quando chegavam ao corpo material no ventre, este
estava estranhamente modificado, por fatores genéticos, então ou nascia com
feição de aberração, ou instintos destes.
- Mas isso foi nos primórdios da civilização correto?
- Sim Miguel, foi nos primórdios desta civilização atual. E foi sem
dúvida literalmente um caos, porquanto, esta época foi marcada para sempre
como o pior pesadelo na dimensão superior. Dizem que o Criador ficou furioso
por não poder fazer nada, juntamente com os Arcanjos da primeira linhagem
magoados por não terem percebido o que ocorria. Da maneira certa Lúcifer e
Serfalos tinham armado a maior armadilha.
- Mas se o Criador estava presente, porque não fez nada?
- Dizem que o Criador não poderia instigar qualquer alma humana a
matar as aberrações que estavam nascendo, porque, afinal, eram almas muitas
vezes boas, mas que corriam sérios riscos de se traumatizarem com a
encarnação, e, assim, poderiam ter sequelas nunca vistas antes. Então, sem
interferência do Criador, dizem que se iniciou a luta mais estranha, onde os
homens caçavam as aberrações, que ficavam com ódio dos homens, sem
378
saber que eram almas idênticas, que somente estavam se estranhando pelas
diferenças da carne e do instinto animal.
- Então em síntese o Criador se afastou.
- Não diria isso, creio que foi a partir do chamado pacto de Noé que
ele se afastou, afinal, se não iria mais interferir em sua criação de forma direta,
seria melhor não interagir com esta igualmente, seja na forma material ou
imaterial, deveria deixar que ela caminhasse com a própria vontade e destino.
Creio que o fez como um pai e uma mãe que para não ver o filho sofrer ainda
mais diante de sua impossibilidade de ajudá-lo, se afasta para tentar que com
este ato ele fique mais forte.
- Então, mas porque os Arcanjos e Anjos não fizeram nada? –
Miguel não poderia admitir que eles haviam ficado inertes com tanta desgraça.
- Segundo consta, foi porque eles seguiram a mesma atitude do
Criador de não interferir, afinal, não poderiam matar aqueles seres, porquanto,
até onde constava eram inocentes. Por isso tiveram que ver a guerra de longe.
Dizem que a única coisa que o Criador deixou que os seres celestiais fizessem
era não deixar qualquer força do mal interferir do plano imaterial ao material
direto. Assim, lhes advertiu que agindo desta forma em breve tudo estaria
equilibrado. Contudo, os seres celestiais não acreditavam muito nisto, afinal, os
homens eram em maior número, mas as aberrações tinham maior força, bem
como, instintos selvagens de sobrevivência.
- Mas como tudo terminou? – Miguel estava curioso com o desfecho.
- Após muito sangue, dizem que finalmente os homens venceram,
mas permaneceram alguns seres da linhagem dos chamados monstros, que
até hoje existem, escondidos no submundo de tudo e de todos, com medo,
matando para sobreviver. Outros se misturaram tão bem na sociedade que
hoje são imperceptíveis, menos para as pessoas desaparecidas de repente,
estas sabem o que as atacou...
- Mas eu que sou um ser celestial, porque não soube até hoje disso?
- Miguel, tenho que lhe dizer que você é da linhagem de Arcanjos
novos, e tudo isso ocorreu no início desta civilização atual. Ou seja, após a era
que conhecemos como mitológica, precisamente, da chamada descidas dos
chamados Deuses, e, extinção dos seres místicos por estes criados, com a
formação do homem, somente o homem e evolução de outros seres. Portanto,
se já viu algum destes seres, não notou, devido ao fato que eles já evoluíram
bastante. Além disso, alguns são melhores do que muitos homens atuais, sem
falar que muitos já fizeram uma miscigenação de espécies tão vasta que
atualmente se passam por humanos de maneira fácil.
- Sabe se essa guerra durou muito tempo?
- Olha, pelo que sei ela durou por milênios de forma sangrenta, e,
por séculos de forma mais branda, quase imperceptível, e, segundo me consta,
ocorre certamente até hoje na dimensão material, onde temos as famosas
379
histórias de homens caçando lobisomens e vampiros. Neste momento, com a
situação quase por controle, já podem os homens respirarem quase que
aliviados, e dizerem que isto não passa de lendas! Porquanto, suas grandes
maiorias não sabem que seus antepassados remotos estiveram nesta guerra,
e, muitos ainda estão...
- Mas o que era feito com as almas das aberrações? – Miguel
questionou demonstrando sua preocupação com as mesmas, afinal, era
estranho imaginar que haviam passado por tudo isso e ainda estarem bem.
- Dizem que quase todas as almas que morriam eram acolhidas
pelos anjos imediatamente, principalmente, as das aberrações, porquanto,
mereciam maiores cuidados e doutrina. Mas outras não permitiam, e, diante do
livre arbítrio, ficaram vagando ou presas em dimensões inferiores, sendo
consumidas pelo ódio até os tempos atuais.
- O senhor disse que ainda existem estes seres. Mas qual deles
ainda existe em maiores quantidades? – Retornou o Arcanjo.
- Não sei, mais creio serem de lobisomens, até pouco tempo eles
eram comuns, hoje as gerações foram tantas que difundiram seus genes, e
aqueles que ainda o recebem de seus ancestrais os chamam simplesmente de
maldição, e poucos conseguem sobreviver com ajuda dos parentes e amigos.
- Sei. Mais se tudo já se encontra sobre controle, porque esta me
contando esta história? – Concluiu Miguel o que lhe parecia óbvio diante dos
relatos.
- Aqueles animais que estavam aqui, vão procurar para o Conselho
em toda terra seres com estas características, e, quero que você coloque um
de seus Arcanjos a disposição de entender estes líderes animais. Após,
quando eles encontrarem os mesmos vão caçar estas criaturas.
- O senhor quer que nos os matemos? – Questionou Miguel
assustado, e já completamente com medo da resposta. Afinal, se o próprio
Criador havia deixado claro que não iria interferir, ele não queria fazer o
contrário.
- Não! – Ponderou Jesus. – Eu quero que você os recrutem, que
façam eles lutarem ao nosso lado, eles não tem culpa de terem nascido
daquela forma, e não podemos interferir em suas vidas, mas eles poderão lutar
por uma causa maior, e, poderei com isto fazer pequenos ajustes na medida do
possível.
- Mais não temos o dom de conversar com os animais! Nós os seres
celestiais não entendemos nada disto, principalmente, dos animais, que
somente foram entendidos de forma de linguagem por poucos seres de luz. –
Ponderou o Arcanjo quase como uma súplica, porquanto, além de não saber
muito sobre os animais, achava aquilo muito ariscado.
- Acalme-se, Buda já pediu para Francisco ajudar você, e ele
aceitou.
380
Miguel tremeu todo, sempre ouviu falar dos dons de Francisco com
os animais, mais nunca pensou que trabalharia junto com o mesmo.
- Vejo que ficou feliz por ter o privilegio de conhecer Francisco, estou
certo? – Perguntou Jesus com um enorme sorriso.
- Sim, sempre quis conhecê-lo, e, além disso, poder trabalhar ao
lado dele será um sonho realizado. – Após uma pausa perdido em seus
pensamentos, Miguel se sobressaltou tentando se corrigir imediatamente. Depois de trabalhar com o senhor lógico!
Jesus sorriu alegremente, Miguel era tudo que ele esperava, tinha
certeza que ele usaria para o bem os novos poderes que lhe seriam em breve
confiados, além dos que já havia adquirido.
381
CAPÍTULO 91
Porto da cidade de Santos / São Paulo – Brasil, 1982
A dor tomava conta de todo o seu ser, a ponto de não conseguir
abrir os olhos. Após perceber que a mesma era é um bom sinal, porquanto,
significava que estava pelo menos vivo, Damião esboçou algo que de longe
poderia parecer um sorriso, contudo, devido à fraqueza seus lábios mais
tremiam do que transmitiam o que ele estava expressando naquele momento.
Após um longo tempo, o qual ele não conseguiu, por óbvio,
determinar, a dor foi cedendo aos poucos, e seus pensamentos já estavam
quase todos em ordem, a ponto de racionar os motivos de encontrar-se
daquela forma. Recordou-se dos ensinamentos de um poderoso ser que lhe
tele transportou pela primeira vez em sua existência, em épocas passadas que
ele somente se rememorava naquele momento por já ter quebrado a barreira.
“Meu caro sujeito” ele lembrou-se da forma que o ser lhe tratava,
porquanto, naquele tempo ainda não era chamado pelo nome Damião, o qual
veio muito tempo após.
Recordou-se ainda que o ser era tão poderoso que não se deixava
apegar por nada do mundo material ou afins, assim, sequer pronunciava
nomes, ao passo que, lhe dizia que isso já seria uma forma de distinção, a qual
ele dizia que nunca fazia, porquanto, ajudava sem qualquer distinção.
Ele era realmente excêntrico. – Damião sorriu se recordando da
figura, e, ainda, do restante de seus ensinamentos, os quais ele lembrava que
o ser tentava de todas as maneiras explicar de uma forma mais branda,
contudo, pela magnitude e grandeza aquilo era quase que impossível:
“Quando um corpo tanto celestial quanto material é tele
transportado, ocorre um evento único no universo, ao passo que a
essência material do Criador se mostra capaz de se quebrar e
desaparecer do mundo físico em que se encontra, para
reaparecerem com mesmo código em local pré-determinado pela
consciência do ser capaz de assim fazê-lo. Em realidade, alguns
dizem que esta essência viajaria rapidamente para o local. Já outros
que ela seria capaz de ler o código subatômico de sua existência
neste novo local, e, assim, simplesmente desaparecer de um ponto
e ser codificada novamente em outro. Contudo, outros afirmam que
a matéria existente em um local é a mesma do outro, somente teria
que ser recriada naquele novo ambiente de forma a necessitar, tão
somente, de uma pequena ligação para isso ocorrer. Eu, contudo,
humildemente meu caro, lhe digo que nada disso importa, visto que
o que realmente importa é que eu vou conseguir levar você para o
local determinado, e, após, você e eu iremos quase que revivermos
novamente, porquanto, será como se nosso corpo tivesse sido
totalmente quebrado em frações infinitas, e, reagrupados com uma
pressão que fará com que você sinta como se estiver renascendo.
Lhe digo que alguns dos que já levei não se lembraram sequer do
que fizeram nos dias anteriores, principalmente, os menos
desenvolvidos, os quais, dependendo do grau, passaram por dias
382
sem saberem sequer quem são. Contudo, creio que você meu
jovem, será capaz de sentir somente algumas dores, e, em alguns
minutos saberá não apenas quem é, como para que estará naquele
local, assim, poderemos cumprir para com nossa missão.”.
Damião sorriu agora de forma melhor, ainda não era capaz de abrir
os olhos, contudo, já tinha quase que totalmente controle de seu corpo. Se
lembrou que após fazer tal distinção, o ser lhe tele transportou para o meio de
uma guerra, onde ele teve que cuidar de muitos doentes, e, ao contrário do que
lhe havia sido prometido pelo ser, ou seja, que ele se recuperaria rapidamente,
ele levou horas se remoendo, e teve ainda que ser cuidado pelo sujeito durante
todo este tempo, a ponto de ele pensar que ao invés dele estar ali para ajudar,
ele é que seria o maior dos doentes entre os feridos naquela guerra.
Foi quando ele escutou um sujeito conversando de uma maneira
estranha, o qual dizia quase que como um filósofo discursando para um
público, entretanto, com um sotaque muito estranho e de forma muito simples,
ele ainda não conseguia abrir os olhos, assim, somente escutou o sujeito:
- Assim como você tem seus componentes em seu corpo, o universo
também tem no dele, e todos estes componentes ou elementos estão
funcionando em harmonia e sincronismo para seguir em frente, mais em muitas
vezes voltar ao estado anterior, porque em seu interior sabem que irão
encontrar algo maior com isto. Se você deixa um lixo, ou seja, um rastro que
você esteve ali, em breve estes componentes do universo vão se interagir para
extingui-lo, ou melhor, transformá-lo... Será que acontece o mesmo conosco
meu caro Damião?
Neste momento Damião percebeu que o sujeito discursava para ele,
mais ao tentar responder percebeu que igualmente aos olhos, ainda não tinha
controle vocal, e o sujeito percebendo isso prosseguiu:
– Somente iremos saber quando estes componentes do universo
retornarem ao estado em que viemos, ou melhor, ao que fomos criados... Não
posso dizer que sou melhor que os animais, somente porque meu físico, ou
corpo material como um todo evoluiu ao estado consciente maior do que o
deles! Será que sou mesmo mais racional do que eles? Ou me engano
tentando ser assim somente para acariciar meu ego? À medida que a evolução
no plano material decorre, o amanhã é incerto, e o presente é dúvida, mais a
certeza é somente uma: não vim do nada, e um dia retornarei ao tudo, ao meu
lugar seja ele aonde for...
Quando terminou, Damião sorriu, já sabia quem estava ali, e ele se
alegrou muito de seu amigo tão querido ir lhe recepcionar.
- Ainda... – finalmente conseguiu começar a dizer, os olhos ainda
não abriam, mas as palavras mesmo que de forma lenta já saiam. – Ten...
Tentando aprender sobre o universo apenas utilizando-se da velha filosofia
para encontrar significado para algo tão vasto – neste momento seus olhos
finalmente se abriram, mas mesmo após ele perceber que realmente se tratava
do amigo não parou de dizer – como o universo e o poder que nos rege.
383
O sujeito franzino abaixou-se lentamente, e chegando bem perto do
ouvido de Damião respondeu-o sorrindo:
- Aprendi a assim o fazê-lo, porquanto, buscando entender melhor
minha existência, entenderei melhor minhas missões não apenas de cunho
material, mas, principalmente, as que realmente me levaram a um patamar
evolutivo além da compreensão humana e de todos os seres, aquela que não
estará pautada apenas em conhecimento, mas em algo maior, que ainda não
consigo sequer qualificar.
Damião foi se levantando com a ajuda do sujeito, e quando já estava
totalmente de pé, percebeu as roupas do amigo, ele vestia uma túnica preta,
um chapéu grande que lhe proporcionava sombra em boa parte de seu corpo
franzino, ao passo que, seus olhos azuis amendoados tinham um tom de
mistério, era como um lago formado pela água do mar sobre uma areia branca,
quase transparente, mas a pele era castigada pelo tempo, tendo muitas rugas,
que eram quase imperceptíveis devido ao tom amorenado proporcionado pelo
sol.
Contudo, para surpresa de Damião, assim que terminou de ajudá-lo
o sujeito começou a se desintegrar.
- Espere meu amigo! – ele tentou ainda em vão segurar-se no
sujeito, contudo, as suas mãos já passaram em falso, ele já estava literalmente
desaparecendo daquela dimensão. – Pensei que você iria me ajudar, afinal,
evoluiu mais neste País, assim, pensei que poderia ficar um pouco mais e me
apresentar o lugar. – clamou por fim.
Contudo, o sujeito não parou de se desintegrar, mais antes de
desaparecer completamente olhou bem no fundo dos olhos de Damião dizendo
com o mesmo sotaque carregado:
- Somente queria lhe receber e dizer que estarei por perto lhe
guiando e quando for permitido ajudando no que puder. Contudo, tenho que ir
rapidamente, afinal, recebi também uma missão no mundo imaterial, a qual não
esperava nem em meus mais remotos sonhos. Saiba que modifiquei um pouco
a rota sua de tele transporte, porquanto, não achei que seria bom para você ser
deixado próximo aos outros, os quais em sua grande maioria já estão sendo
levados para hospitais, tendo em vista que a Iemanjá e aquela Arcanja tiveram
a sensacional ideia de levá-los para a costa e colocar como se tivessem sido
arrastados pelas ondas até aquele local. E para trazer ainda mais realismo elas
proporcionaram uma pequena tempestade no local, fazendo com que a guarda
costeira do local pensassem que o navio teria naufragado próximo à costa e a
tripulação teve tempo de nadar até a praia. O plano delas até daria certo,
contudo, como isto foi forjado em uma pequena ilha, não poderiam deixá-lo
aqui e trabalharem no plano de ocultação da batalha ocorrida e salvamento de
todas aquelas pessoas. Assim, me ofereci para trazê-lo, e, retornei ainda,
mesmo contra a vontade das duas, que temiam que Poseidon ainda estivesse
lá, e após muito procurar recuperei sua sacola.
- Nossa! Realmente não precisava... – Damião respondeu tateando
e sentindo a sua bolsa, ali se encontrava tudo para sua missão. – Na realidade
384
meu amigo você sabe que precisava sim, porquanto, estou muito fraco e nunca
conseguiria me transportar em matéria para aquele local, além disso, creio que
ainda não tenho poderes para agir assim partindo da matéria.
- Sabendo disso fui lá, por sorte Poseidon já havia partido, e, logo
após, peguei você e trouxe ao porto onde deveria estar conforme era
combinado. Portanto, pegue suas coisas e vá, não precise se preocupar com
Iemanjá e a Arcanja simpática que lhe ajudou, nem com os tripulantes do
navio, porquanto, todos estão bem. Siga em frente, e, em último recurso, caso
necessite me chame, você sabe como.
Damião no impulso ia dar um abraço de despedida no amigo,
contudo, travou quando se lembrou de que ele já estava de partida, assim,
somente acenou e assistiu o amigo desaparecer por completo.
Assim que ele sumiu, Damião olhou em volta, estava em um local
totalmente oculto do porto, tinha que rapidamente chegar ao local de
desembarque do navio, afinal, teria que dar a entender para quem é que por
acaso fosse lhe buscar que estava tudo bem.
De repente sentiu o suor escorrer por sua testa, assimilando
somente naquele instante que o clima era muito quente, muito diferente dos
longos anos que passou na França e no restante da Europa.
Começou a caminhar, e para sua surpresa parecia que não estava
tão longe, porquanto, mais a frente já avistou um grupo de pessoas.
Mesmo sabendo que as pessoas daquele País estavam passando
por um período difícil, à medida que foi chegando ao local sentiu que em sua
grande maioria eram alegres e de bem com a vida, naquele momento sabia
que era um País que tinha tudo para melhorar no decorrer dos anos. Somente
não sabia ainda o que poderia esperar de sua missão.
Quando chegou ao local onde o navio deveria desembarcar
percebeu o burburinho que estava se formando, todos comentavam o
naufrágio, e de maneira mais enfática sobre a misteriosa forma com que todos
do navio se salvaram sem se recordarem dos acontecimentos.
Para sua sorte avistou um senhor chegando naquele exato momento
olhando para todos os locais, como se estivesse procurando alguém, Damião o
notou, porquanto, o mesmo se destacava do restante, visto encontrar-se
trajando batina.
Deve ser Dom Nestor, o homem que me disseram ser muito
iluminado, e que irá me estabelecer em sua diocese. – Pensou Damião
sorrindo e já indo de encontro ao sujeito.
Ao avistar também Damião Dom Nestor que o reconheceu pela
descrição que lhe foi passada, foi igualmente de encontro a Damião, o qual se
assustou ao perceber que sem nada anunciar quando chegou perto o senhor
foi lhe abraçando, como se fossem grandes amigos.
385
- Você não esta se lembrando de mim? – Mencionou o senhor com
voz rouca e gasta se afastando um pouco após o abraço e olhando diretamente
na face da Damião.
Damião olhou para os olhos do senhor e quase chorou de alegria,
eram inconfundíveis! Além disso, reconheceu a áurea dele, a qual transmitia
enorme paz.
- Antônio? – Questionou em voz alta, devido a grande alegria.
- Finalmente! Achei que você não iria se lembrar!
- Eu sabia que você estava na dimensão material, mais nunca tive
contato com nenhuma alma que pudesse me dizer sua localização, ao procurar
algo ao seu respeito, sempre mudavam de assunto...
O homem cortou a conversa e puxou Damião rapidamente para um
canto, chegando com a cabeça bem perto de seu ouvido e falando de uma
maneira extremamente baixa:
- Não diga nada neste sentido aqui. Estamos sendo vigiados!
Damião assustado olhou para os lados, mais nada viu de anormal.
- Não vai perceber nada neste momento, tenho que lhe ensinar
algumas coisas que estão acontecendo neste País. Conversamos na diocese.
Imediatamente eles saíram às pressas para embarcarem em um
automóvel, sem que Damião pudesse perceber um vulto que os seguia ao
longe.
- Não olhe agora! Vire a cabeça bem devagar, como se estivesse
analisando as lojas, e vai ver um homem vestido de preto que está nos
seguindo... – Disse Antônio em tom baixíssimo.
Damião não era bom em notar isto, mais era impossível aquele
homem não ser notado, ele era o único de terno naquele local.
- Quem é ele, um demônio encarnado por possessão? – Questionou
assustado, e já colocando a mão dentro do paletó para pegar o frasco de água
benta que carregava a tiracolo.
- Pode ficar tranquilo... – Antônio fez uma pausa maneando a
cabeça, e prosseguiu cauteloso: - É... Bem... Quase tranquilo!
- Porque diz desta forma? – Damião não conseguiu esconder a
preocupação, afinal, estava em local totalmente diferente ao que era
acostumado, e, após os estranhos acontecimentos recentes estava agindo
como uma pessoa traumatizada.
- Ele é do governo, estão me vigiando de perto, querem algo que
acham estar comigo.
386
- E realmente esta?
- Não sei! – Respondeu Antônio de maneira alegre, e soltando um
enorme sorriso.
Damião também sorriu, sabia que Antônio não voltaria para a
dimensão material se não fosse por uma missão muito importante. Ficou ainda
mais calmo após perceber o desdém do amigo quanto ao sujeito.
- Então você esta utilizando o nome de Dom Nestor? – Tentou
mudar de assunto.
- Somente para os presentes nesta minha forma material e que não
tenham quebrado a barreira utilizo este meu nome de batismo, os outros
podem me chamar de Antônio ou outros de meus tantos nomes que já tive,
enfim, aquele que tiverem maior conhecimento. Temos que viajar rápido,
porquanto, estou no meio de uma faxina na diocese, e, somente larguei para vir
te buscar pessoalmente, e, quanto ao sujeito não precisa temer, ele
acompanha tudo, mais sempre ao longe, rapidamente ele já haverá sumido.
Quando Damião virou-se já não viu mais o sujeito.
Após a viagem do porto a São Paulo capital, ao chegarem e
passarem o portão da diocese, Damião assustou-se com a quantidade de
pessoas que vistoriavam o local, utilizavam vários aparelhos.
- Espero que o senhor não se assuste muito! – Disse um jovem que
vinha em sua direção, estendendo a mão para cumprimentá-lo. - Prazer meu
nome é Ciro! – Damião sentiu uma leve dor em suas mãos, o aperto de mão
daquele jovem era muito forte para seu corpo que sofria pela idade e por tudo
que passou nos últimos dias.
- O prazer é todo meu, pode me chamar de Damião!
- Nossa, não precisa nem dizer, afinal, como sabemos disto! –
Respondeu o jovem de maneira meio que sarcástica.
- Não estou entendendo? – Questionou Damião.
- Há algumas semanas Dom Nestor somente fala em sua vinda.
Damião olhou para Antônio com um sorriso cínico. - Você não daria
o braço a torcer que estava com saudades de mim, não é seu rabugento! –
Batendo vagarosamente no ombro do amigo em sinal de afago.
O clima descontraído se formou, e todos caíram na gargalhada.
- Tudo muito bom, mais Damião precisa descansar, afinal, teve uma
viagem conturbada! – Antônio deu um sorriso ao terminar e uma piscadela para
Damião que se assustou ao perceber que ele sabia dos acontecimentos.
387
Contudo, além da presença de Ciro, não queria discutir como ele
havia ficado sabendo, enfim, estava realmente exausto.
- Pode me seguir senhor Damião, já arrumamos seus aposentos. –
Ciro disse já se virando e andando em direção a um corredor.
Após algum tempo, já quase chegando ao quarto que seria por ele
ocupado, Damião não aguentou e questionou:
- Porque aquela quantidade de pessoas com aqueles aparelhos?
- Contratamos uma empresa especializada em encontrar escutas! –
ele virou-se arregalando os olhos, como se estivesse dizendo algo tenebroso. –
Nos últimos anos estamos sendo vigiados de perto pelo governo autoritário, e
não podemos nos dar ao luxo de relaxar na segurança. Além disso, Dom
Nestor pagou para que a empresa ensinasse a alguns de nossos irmãos a
encontrar as mesmas, e comprou alguns aparelhos de rastreamento para
consecução das buscas ordinárias.
- Mas qual o interesse do governo em uma diocese? – o
questionamento de Damião logicamente veio em tom tanto assustado quando
de intriga pela forma como Ciro havia dito, parecia tudo muito normal para ele.
- Não posso ainda te dizer, afinal, temos que esperar eles
terminarem de fazer a vistoria, tome um banho e descanse um pouco, seu
quarto já foi revistado, à noite conversamos na praça ou o Dom Nestor lhe
explica em seu escritório.
Damião não entendia tamanha cautela de Antônio e daquele seu
excêntrico e estranho assistente, mas sabia que coisa boa não deveria ser.
Contudo, sabia que ele estava certo, seus pés o estavam matando, e há muitas
noites não dormia um sono descente, precisava relaxar. Despediu-se de Ciro
seu novo amigo e adentrou em seus novos aposentos.
O quarto era amplo e espaçoso, muito bem mobiliado, tinha banheiro
com uma modesta banheira na qual Damião relaxou todos seus músculos.
Tirando a banheira, não havia outros luxos, uma pequena escrivaninha, uma
cama simples, mas bem espaçosa, e um guarda roupas pequeno, tudo muito
bem organizado.
Damião ficou tão relaxado que adormeceu na própria banheira,
acordando somente após quase uma hora, devido ao esfriamento da água. Foi
para a cama sem perceber, somente acordando sete horas após com algumas
cutucadas de Antônio, que ainda lhe dizia de forma alegre bem baixinho:
- Acorde seu preguiçoso!
Damião custou a se levantar, não era possível que eles deveriam
conversar naquela hora, justo quando sonhava com algo tão bom.
- Gostou do quarto?
388
- Você acertou em tudo, sabe que não gosto de luxo, mais não abro
mão de uma deliciosa banheira bem quentinha. Não me relaxava assim há
tempos!
- Bem, vou esperar você se trocar, trouxe algumas roupas que já
guardei em seu guarda roupas, somente não havia equipado ele antes, porque
não sabia que tamanho era seu corpo material.
- Bem pequeno... Bem pequeno... – Disse Damião ironicamente. –
Igual ao seu atual. – Sorriu olhando para o corpo franzino do amigo.
Antônio saiu do quarto indo para um banco próximo, se sentando e
contemplando as estrelas, alguns dias ele passava horas contemplando aquilo
que chamava de paraíso material, sabia que ao contrário do que todos
pensavam as dimensões mais elevadas não tinham nada a ver com o céu
daquela dimensão, mais bem que poderia ter, ele era maravilhoso...
- Vejo que não perdeu a mania de contemplar as belezas materiais.
– Disse Damião sentando-se ao lado de Antônio, já trajando as vestimentas
deixadas pelo amigo.
- Durante várias noites contemplo esta vista, por vários milênios, e
nunca me canso. Acho a dimensão material a mais bela, ver está vista não tem
preço.
- Tem sim, correr sérios riscos... – Respondeu Damião em tom
alegre.
- Seu estraga prazeres! – Replicou Antônio levantando-se. – Vamos
para o meu escritório, enfim, temos muitos assuntos para tratar...
389
CAPÍTULO 92
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
Eles já estavam andando a mais de quarenta minutos, no passo
lento dos animais, em direção ao local da missão.
- Você acha que falta muito Arthur? – Russo questionou mais uma
vez, somando três questionamentos naquele sentido desde a partida rumo à
cidade.
Foi o bastante para deixar o velho bastante zangado, o qual se virou
furiosamente vociferando:
- Credo! Parece uma matraca estragada, e tem ainda a impaciência
de uma mulher! Mahesh já lhe respondeu três vezes que estamos, para que
ficar perguntando toda hora?!
- Então! Se ele me respondeu três vezes, e, em todas disse que
estávamos chegando, é sinal que podemos estar a quilômetros ainda, e, sua
resposta será sempre a mesma. – Russo não se deu por vencido, até parando
para demonstrar sua indignação.
- Você é um idiota mesmo não é Russo?! – Desta vez foi Charles
quem se indignou. – Pois saiba que agora é uma ordem, pare de aporrinhar
sobre isso, caminhe sem pronunciar mais nenhum comentário.
Ao perceber que Charles havia realmente se irritado, Russo resolveu
fazer mimicas em tom de brincadeira, para descontrair um pouco, levantou o
dedo indicador e começou a fazer sinais que diziam claramente, ou seja, não
necessitava dominar nenhuma língua de sinais para saber que ele queria
somente fazer um último comentário.
Todos pararam ao perceberem que Charles havia também parado e
se virado, achavam que ele iria avançar no Russo, lado outro, se intrigaram
com a forma paciente que ele respondeu:
- Diga...
- É porque estamos passando por várias pessoas que conversam
entre si sobre algo como uma cidade assombrada, estamos indo para este
local? – Tentou justificar sua inquietude.
Charles e Arthur se entreolharam, aquele deveria ser o momento.
- Você entende nossa língua e dialetos? – Mahesh questionou
entusiasmado.
Para fúria de Charles Russo não respondeu o pequenino, ficou
balançando os dois dedos indicadores em sinal de que pedia permissão para
responder.
390
Charles gritou furioso, demonstrando que a paciência anterior era
sinal de que ele estava segurando a fúria:
- Seu idiota, estamos a caminho de uma missão perigosa, e você faz
com que nós percamos tempo fazendo brincadeiras sem graça!
Russo sorriu pela forma que recebeu a resposta, há muito tempo
não via Charles daquela forma. – Ele também está muito nervoso, posso me
preocupar. – Pensou sorrindo, havia conseguido o que queria desde o começo,
perceber se a missão era muito perigosa, agora não sabia se sentia alegria por
ter sido capaz de descobrir isso, ou tristeza por confirmar suas suspeitas, mais
tinha que responder de maneira ponderada, então começou a andar
juntamente com os demais, demonstrando que estava de olho em tudo e queria
chegar rápido, apesar de naquele momento não querer mais...
- Como sou agente de campo, e trabalhei em missões em vários
países, fui treinado pela melhor agência de inteligência do mundo, sem querer
me vangloriar, a de meu país. – os demais agentes balançaram a cabeça
sorrindo com a humildade do companheiro, mais resolveram não interromper
para não deixarem o assunto se prolongar ainda mais – Nestes treinamentos
tive que apreender desde jovem, ou melhor, desde criança, visto que fui
treinado desde os meus sete anos para minha designação militar, a falar ou
pelo menos compreender todas às línguas, isto é vital em uma missão.
Algumas eu falo inclusive com sotaque, para me misturar, mais na Índia a coisa
é um pouco mais complicado, mas consegui entender bem que se trata de algo
sobre cidade fantasma.
- Rapazes! – gritou Arthur erguendo as mãos. – Quero lhes dizer que
nossa missão consiste em pegar um objeto em uma cidade chamada Bhangarh
que fica nesta região do Rajastão. Ela é conhecida por lendas e mitos de todas
as espécies. Ela é uma cidade abandonada, e isso desperta ainda mais
mistérios que a cercam.
- E porque este produto estaria nesta cidade? – O questionamento
de Russo saiu tímido, como se estivesse ainda raciocinando sobre a situação,
ao passo que os demais agentes sequer estavam prestando muita atenção
naquela situação, queriam somente um objetivo para cumpri-lo, não queriam
questionar e dialogar sobre lendas e mitos da região.
- Porque o que estamos atrás é segundo minhas fontes o principal
instrumento de todas estas lendas. – Arthur respondeu em tom mais sério,
olhando também para os demais agentes.
- E no que consiste isto? – Russo agora se estremecia, ele
certamente poderia enfrentar uma guerra, mas temia de morte qualquer coisa
ligada ao sobrenatural, tudo diante de um acontecimento da infância...
- Teremos que encontrar uma espécie de tumba, que segundo
minhas pesquisas e de meus homens de campo encontra-se em um local que
eu vou lhes conduzir, talvez possam encontrar algo sobrenatural.
391
Os agentes se entreolharam agora assustado, demonstrando, por
óbvio, que aquilo estava totalmente fora de seus pensamentos quando
embarcaram no avião.
- Mais não recebemos um treinamento voltado para isto! Então como
poderemos enfrentar algo que nunca tivemos contato antes? – Questionou um
dos agentes chamado Michael Scott, um sujeito asiático de aparência anêmica,
e, estatura mediana, mais que contrastando sua aparência tinha músculos e
perfil muito atlético, mais que até aquele momento não havia aberto a boca
para dizer qualquer palavra, o que já era esperado para o mesmo que sempre
se comportou assim com os seus colegas, os quais atribuíam este fechamento
a sua cultura asiática, mais após tudo aquilo que ouviu parece que não teve
como ficar mais calado como tanto praticavam os seus ancestrais.
- Vocês foram treinados por todos estes meses, e, ainda, receberam
as melhores armas contendo ciência de última geração. – Tentou explicar
Arthur.
- É mais para enfrentarmos algo sobrenatural deveríamos ter todo
um treinamento desenvolvido para este lado. – Michael retrucou, ao passo que
todos os agentes ficaram perdidos, eles não poderiam sequer imaginar que
aquilo poderia ser realidade, somente Russo que já havia tido sua experiência
com o lado sobrenatural, os outros não sabiam sequer o que pensar, assim,
somente ficaram concordando com o parceiro, ao passo que alguns
balançando as cabeças e outros até extravasando seus nervosismos apenas
com estranhos grunhidos de apoio.
- Entre vocês tem uma pessoa que entende muito bem sobre o
sobrenatural, afinal, ele foi treinado por algo mais do que sobrenatural, se
tornou inclusive um padre influente, trabalhando não com uma batina, mais em
uma ordem consagrada que trava uma verdadeira guerra contra o mau. Dizem
que ele teria se afastado desta ordem para seguir caminhos novos nos Estados
Unidos e na Inglaterra na agência liderada por Charles. Contudo, creio que ele
de alguma forma misteriosa já estava ciente do destino que as coisas iam
tomar, e, assim, somente encontra-se infiltrado, portanto, aguardando não sei
se para ajudar ou para bisbilhotar... – Arthur disse mais como um desafio,
olhando em todas as direções onde se encontrava um agente e por fim para o
céu, o qual já estava iniciando o crepúsculo poente.
Após tal afirmação não apenas os agentes ficaram inquietos,
olhando cada um para o outro em procura do sujeito que Arthur dissera, ao
passo que, até mesmo Charles ficou atônito com aqueles dizeres, nunca
poderia imaginar alguém daquela forma em sua agência, assim, decidiu
atrapalhar Arthur dizendo:
- Como assim há um agente que faz parte de uma ordem secreta
que lida com o sobrenatural?! – Ele fazia a pergunta, mais em seu interior
exaltava o susto, afinal, aquilo era impossível, ele mesmo se encarregava de
vasculhar como um cão faminto por tudo ligado a vida de seus homens,
chegando, inclusive a viajar e confirmar várias ramificações antes de aceitar
cada agente, e, até mesmo, havia um longo e cansativo estágio probatório.
392
- Em que ordem você trabalhou Michael? – Para espanto de todos
foi Russo e não Arthur quem questionou o rapaz.
- Como ousa me questionar quanto a isso? E o que lhe diz que eu
sou quem este velho está falando, por fim, poderia ser qualquer um! – Bradou o
asiático.
- Simplesmente porque analisei todos quando o senhor Arthur disse
isto, e, o único que não tentou olhar para o parceiro ao lado ou para o resto da
equipe para tentar descobrir quem era o sujeito foi você. Ainda, analisei alguns
tiques que lhe entregaram, sei de todas as atitudes dos agentes quando
mentem ou tentam disfarçar algo, fruto de meus treinamentos, colho estas
informações no dia a dia até mesmo sem querer, levado pela prática
incessante a qual fui submetido em meu rigoroso treinamento tanto intelectual
quanto militar e afins. Em todos fui treinado para desvendar detalhes que
poderiam fazer a diferença, e, tenho o desprazer de lhe dizer que não tem
escolhas perante minha pessoa, ou diz o que estou lhe perguntando de uma
forma pacífica, ou pode ir encomendando seu caixão ou vaso já que vocês
preferem serem ali depositados, ou melhor, não preferem, mais são levados a
isto pela necessidade de espaço aos vivos que falta em seus países! Há, e, por
fim, liguei isso ainda ao fato de que você ao invés de se assustar como todos
nós, se entregou ainda mais ao somente dizer que não poderíamos enfrentar o
sobrenatural porque não havíamos sido treinados. Ora, como alguém em sã
consciência poderia imaginar que poderia haver treinamentos eficazes para
isso sem ter algum conhecimento!
Todos, inclusive Arthur e Charles ficaram boquiabertos com a atitude
de Russo, sabiam que ele era um sujeito estranho e muito bem treinado, mais
aquilo demonstrava que ele era excêntrico tanto ou até mais do que Arthur.
Por outro lado Michael não se deixou abalar, com seus olhos
pequenos e cortantes olhou Russo da cabeça aos pés, e com voz serena
respondeu:
- Se acha que temo um ser como você Russo pode desistir,
porquanto, sei muito bem que você pode ser um dos melhores agentes da
empresa de Charles, contudo, sei muito bem que Arthur escolheu está agência
mais porquanto sabia que havia nela guardiões já renegados da O.S.S.V. do
que pelo poderio bélico ou qualquer outra coisa.
- O.S.S.V.?! O que significa isso?! – Dizia Charles que estava quase
louco por uma mistura de raiva e ódio por ter sido pego tão de surpresa.
- Ordem Secreta Sobrenatural do Vaticano – Foi Arthur que
respondeu cheio de convicção, estava realmente certo, a agência de Charles
era a correta. – Aquele velho do Frederick tinha razão, ele conseguiu inserir
vários agentes renegados da melhor e da mais qualificada ordem sobre
sobrenatural do mundo! – conclui por fim somente em pensamento e
expressando somente um sorriso.
393
CAPÍTULO 93
Berlim – Alemanha, 1982
No dia seguinte, o doutor adentrou ao quarto de Estela portando um
calhamaço de documentos.
- E ai doutor, há algo de grave com a minha criança? – Vilalba que
estava acariciando os cabelos de Estela que acabará de acordar foi logo
questionando.
- Não sei muito bem o que dizer Estela, creio que seja melhor
conversarmos em particular. – O doutor não se mostrou nada a vontade com a
presença no ressinto da senhora, ainda mais com a notícia que tinha para dar.
- Seja o que for doutor, pode dizer na frente de Vilalba. Ela é mais do
que uma serviçal, é um ente de minha família. – Respondeu Estela afagando a
mão calejada da empregada, a qual lhe olhou com ternura, ao passo que a
moça notou o brilho estranho em seus olhos, contudo, diante da presença do
doutor não deu maior importância para aquele fato.
- Se prefere assim. – ele foi quase que ríspido. – Quero
primeiramente lhe questionar se você sofre algum abuso por parte de alguém
próximo, ou até mesmo de um parente... – O doutor parou subitamente
tentando notar algo que pudesse detectar, visto que casos de abusos ele tinha
que tentar mais notar por detalhes, visto que as vítimas, principalmente,
quando eram afligidas por familiares, por questões óbvias, não se abriam
facilmente.
- Não doutor, por quê? – Estela responde sem titubear, afinal, havia
percebido que o doutor estava analisando-a para talvez reportar as autoridades
alguma suspeita que fosse erigida. Assim, raciocinou rapidamente, e chegou à
conclusão que seria melhor deixar os assuntos para serem resolvidos no
âmbito de sua família, ainda mais diante do fato de que após o que passou,
qualquer autoridade iria qualificá-la como louca caso contasse a verdade.
- Você então tem uma vida sexual? – O doutor foi mais fundo.
Percebendo que Estela estava mentindo mal, Vilalba decidiu ajudar
como poderia, mesmo, em tese, nada sabendo a fundo:
- Minha menina apesar de estar acamada tinha alguns namoricos,
contudo, creio que a intimidade dela deve ser resguardada, até mesmo pelo
sigilo médico estou certa doutor? – o médico pego de surpresa balançou a
cabeça afirmativamente. – E, ainda, queremos saber a razão destas perguntas,
afinal, minha menina já é maior de idade, razão pela qual, sua palavra deve
bastar.
- Sei disso minha senhora, contudo, os exames apontaram para
alguns hematomas estranhos, além do fato de que os últimos exames
apresentaram taxas hormonais com elevação, ao passo que, após pedir mais
uma bateria de exames, e, promover um estudo clínico mais avançado... – O
394
doutor se perdeu um pouco, estava com a mente um pouco perturbada com o
resultado dos exames.
Percebendo a deixa diante da pausa Vilalba não tardou a rebater:
- Os hematomas ali se encontram porquanto minha menina estava
há anos sem andar, razão pela qual, diante da repentina melhora, os tombos
foram eminentes.
- Até mesmo hematomas com marcas de mãos nos braços, e,
vagina esfolada com rupturas de vasos e demais são comuns em alguém que
somente voltou a andar misteriosamente? Além disso, estou achando estranha
a ausência de seu pai! – O médico quase que foi grosseiro, afinal, estava se
irritando, porquanto, sabia que a menina estava escondendo algo, e aquela
misteriosa mulher que tinha somente a aparência humilde, mais o raciocínio
rápido de uma mulher de negócios, a estava encobrindo nestas mentiras, ou
pior, encobrindo outra pessoa...
- Não sei doutor o que quer insinuar, contudo, o senhor sabe que o
pai de Estela além de ser um homem muito integro, é um dos melhores
advogados de toda Alemanha, então, meça bem suas palavras.
- Me desculpe, creio que me exaltei um pouco. – o médico disse
abaixando a cabeça, afinal, a última coisa que queria era encrenca com o Dr.
Pierre. – Isso não vai se repetir, prometo.
- Sei de sua preocupação comigo doutor, e sou muito grata por isso
e por todos os anos que passamos de tratamentos. Contudo, hoje já sou
praticamente uma mulher, e sei me cuidar, apesar de não parecer. – Estela se
sentiu mal, afinal, sabia que o doutor somente estava querendo ajudá-la.
- O que deu os exames? – Vilalba foi direto novamente ao ponto.
- Em suma não consegui descobrir nada de anormal além dos
hematomas e danos vaginais descritos antes, porquanto, de resto a estrutura
fisiológica encontra-se intacta. Lado outro, somente terá que avisar a seu
último namorado que ele será pai.
Estela perdeu o chão, seu corpo se petrificou mais do que quando
ela estava tetraplégica, chegando ao ponto de adormecer após raciocinar o que
o doutor estava daquela forma meio que sútil e ao mesmo tempo sagaz lhe
falando.
Contudo, estranhamente Vilalba sorriu, e novamente seus olhos
brilharam...
395
CAPÍTULO 94
São Paulo – Brasil, 1982
Ao chegarem ao escritório Damião assustou-se, porquanto, Antônio
não era de ostentar qualquer grandeza, mais aquela sala ia contra qualquer
visão simplista anteriores do amigo.
Afinal, o recinto era simplesmente fabuloso, ao passo que os móveis
eram todos em madeira maciça, quadros lindos expostos nas paredes, lustres
suntuosos, e, para espanto maior, o teto o qual era muito alto era todo pintado,
retratando várias passagens da Bíblia.
- Sei o que está pensando, mais não fui eu quem fez toda esta
porcaria! – Disse Antônio sentando-se em uma enorme poltrona que ele mal
podia arrastar, devido ao seu enorme tamanho e peso. - Quando assumi esta
diocese, havia aqui um Bispo lunático por brio material! Pregava em suas
missas uma coisa, e exercia outras. Esta sala foi toda construída com dinheiro
que poderia ser usado para outros fins mais necessários, como compra de
alimento ou para alguma instituição de caridade. Contudo, achei que seria
também muito desperdício desmanchá-la, já que estava pronta, não tinha
motivos para isso.
- Onde se encontra atualmente este Bispo? – O questionamento de
Damião era obviamente aplicável diante do espanto inicial, afinal, tinha que
confessar ao amigo. – Pergunto, porquanto, ele poderia trabalhar em palácios,
visto tamanho bom gosto.
Antônio o olhou com cara de sarcasmo, dizendo logo após com o
mesmo desdém:
- Você acreditaria se eu lhe dissesse que onde ele está não tem
nada disso?!
- Onde? – Indagou Damião agora ainda mais curioso, e, ao mesmo
tempo, extremamente espantado com a resposta.
- Ele encontra-se atualmente em uma dimensão muito inferior,
segundo me foi informado por uma Arcanja. Disseram-me que com seu apego
ao materialismo, foi muito difícil retirá-lo desta dimensão, e também ele sabia
que não iria para uma melhor que a presente diante de seus feitos!
- Faz muito tempo que ele faleceu?
- Quando assumi a diocese, há exatamente cinco anos. Ele já estava
afastado, o Vaticano descobriu que ele encontrava-se desviando verbas das
Igrejas para o governo ditador que se instalou neste País, recebendo em
contrapartida vários benefícios em troca, aviões particulares, mulheres, etc...
Damião balançou a cabeça negativamente, não havia nada a falar,
infelizmente as religiões eram comandadas por homens, que poderiam errar.
Contudo, sabia que muita coisa estava melhorando, devido a outros exemplos
que vinham de sujeitos simples e humildes da sociedade, os quais certamente
396
tinham consciência de que receberiam seus méritos em outra dimensão mais
elevada.
- Você deve estar querendo saber por que o Governo ditador está
nos vigiando de perto, não estou certo?
Damião balançou afirmativamente a cabeça, Antônio prosseguiu
calmamente, não queria esquecer-se de nenhum detalhe:
- Minha missão era simplesmente ajudar um jovem chamado Bruno.
Ele possui uma inteligência incompatível até mesmo para os padrões das
almas mais bem evoluídas da nossa chamada dimensão sublime. Ele é capaz
de planejar máquinas avançadíssimas, das quais os homens no estágio que
estão da evolução, ainda levariam milênios para inventar. Bem como, fontes de
energias plenas e inesgotáveis, que os cientistas atuais e de um futuro bem
longo somente a vê em obras literárias e em filmes de ficção cientifica.
Damião estava até mesmo inclinado para frente na cadeira, sem
dizer uma palavra, prestando absoluta atenção ao que lhe era dito.
Antônio pensou rapidamente consigo mesmo, que era devida a esta
atenção em escutar que levava Damião a ser tão inteligente, ele sabe escutar
melhor do que falar, por isto resolveu continuar:
- Este jovem é Americano, e atualmente trabalha na CIA, somente
para vigiar de perto tudo o que ocorre no mundo. Contudo, sabia que um País
não deveria ter tamanho poder. Bem como, mesmo sabendo que as fontes de
energias de que dispunham poderiam vir a ajudar várias pessoas em todo
mundo, também sabia ao mesmo tempo que se usadas para outros fins,
poderiam retirar mais vidas ainda. Por isso minha missão começava ai! Eu
tinha que formar uma sociedade que iria financiar todo este conhecimento do
jovem, e, ao mesmo tempo, protegê-lo e colocá-lo em prática em local seguro.
- Sei. – Foram as únicas palavras ditas por Damião, para alegria de
Antônio, que prosseguiu:
- Para não corrermos riscos, eu primeiramente formei um conselho
religioso, com mestres de todas as religiões, aqueles que somente pensavam
no progresso humano. Não tinham necessariamente que pertencerem a uma
religião, mais tinham que praticar o bem incondicionalmente. Em segundo
momento foi criado um conselho político, com lideres de várias nações, com
qualidades idênticas. Em um terceiro momento levantamos o capital com
outros membros de um conselho financeiro, e, montamos os planos e
financiamos o jovem Bruno, o qual criou sozinho durante mais de dez anos
todas as armas.
- Armas? – Interrompeu Damião, que agora se apresentava muito
assustado com o que estava lhe sendo dito.
- Isto mesmo, armas! – Fez uma pausa, e vendo que Damião não
mais interrompia, prosseguiu. - Provavelmente haverá uma grande guerra,
porque como sabemos Lúcifer e Serfalos estão novamente trabalhando juntos.
397
Damião respondeu somente com um aceno, sabia muito bem do que
estava por vir, Miguel havia lhe contado deste risco, e, ainda, ele presenciou no
nascimento de Joana a força de Serfalos.
- Para não deixarmos pistas, não formamos um grupo para concluir
todas as armas, terceirizamos todos os serviços, cada parte foi feita em um
canto do mundo, e a montagem de todas elas ficou a cargo do próprio Bruno, o
qual também fez sozinho toda à fonte de energia destas armas.
- E nenhum chefe de um País desconfiou de que estavam sendo
criadas estas armas? – Questionou Damião.
- Nosso conselho político era composto de pessoas de extrema
confiança, almas evoluídas que encarnaram especificamente para esta missão.
O conselho estava presente em todas as potências, e dissecavam qualquer
dúvida que por ventura pudesse ocorrer. Além disso, a presença de Bruno na
CIA anteriormente a empreitada, era justamente para inserir mecanismos de
espionagem tanto naquela agencia quanto em outras, ele com sua inteligência,
conseguia, espionar os espiões.
- Jovem inteligente mesmo. – Damião respondeu coçando o queixo.
- Além disto, a fabricação das armas em nenhum momento geraria
suspeitas, eram tão sofisticadas que seus componentes eram tão simples e ao
mesmo tempo tão avançado que era impossível para o País que fabricava
alguma parte prever que se tratava da parte de uma arma. Bem como, os
Países estão mais vigilantes com o enriquecimento de uranio, etc., e a energia
desenvolvida por Bruno sequer leva qualquer uranio, sua tecnologia é tão
avançada que mesmo se um País tivesse acesso às instalações onde foi
processado o desenvolvimento dela, não notariam se tratar de qualquer fonte
de energia.
Damião estava espantado. Então decidiu finalmente perguntar: Mas como este homem pode saber tanto?
- Na dimensão superior não me foi explicado isto, mas dizem que ele
é uma alma avançadíssima para o conhecimento e desenvolvimento da matéria
em todos os sentidos. Segundo a Arcanja Juventis, ela tomou conhecimento
que ele parece vir de uma civilização em uma dimensão material anexa a
presente dimensão terrestre, que possui ainda uma dimensão imaterial
desconhecida, que segundo ela pôde perceber, somente os membros do
conselho supremo tinham tido acesso a ela.
Damião estava ainda mais espantado, aquilo era novo para ele,
nunca havia tido notícia de dimensões materiais existentes perto da dimensão
terrestre, aquilo era fabuloso, e explicava algumas dúvidas que ele tinha, mas
não queria prolongar o assunto, assim, somente questionou: - Mas como
fizeram para esconder estas armas?
Antônio olhou para Damião seriamente, dizendo: - Elas estão em um
local muito estratégico, somente algumas almas tem conhecimento de sua
398
localização, nem mesmo o conselho religioso ou político sabem de seu
paradeiro, porquanto, sabedores de que estávamos encarnados, poderíamos
mesmo contra nossa vontade de alguma forma dizer algo a mais e elas caírem
em mãos erradas...
- Mas como saberemos delas no momento em que precisarmos? –
Questionou Damião.
- Não pretendemos precisar delas algum dia, mas os membros do
Conselho Supremo nos disseram que quando chegasse a hora, e se fosse
realmente preciso, elas seriam então localizadas.
Damião sentiu um pouco de alívio, parecia que tudo estava indo
bem, queria acreditar que nunca precisariam utilizá-las, mas sabia que seu
pensamento era mais uma utopia diante da forma que percebeu que Serfalos
estava agindo, e, ainda mais pelo seu enorme poder.
- Em pouco tempo vou retornar a dimensão sublime, e não sei o
que você vai enfrentar aqui, porque vou ter que me reunir novamente com o
Conselho Supremo, e talvez vão me enviar para uma missão em um lugar
muito distante, assim, você terá que assumir meu lugar não apenas nesta
instituição, mais perante o conselho formado, e, principalmente nos cuidados
com Marcos.
- Como está ele? – Damião quase saltitou da cadeira de alegria por
ouvir sobre o pequeno.
- Segundo informações está bem, me disseram que perceberam foi
à presença do traidor rondando os lugares que ele frequentava.
Damião sabia que o Senhor da Luz deveria estar cuidando do
pequeno, mas como não sabia da relação de Antônio com ele, decidiu que era
melhor deixar tudo para lá, afinal, se ele havia dito traidor então era melhor não
aprofundar no assunto, somente rebateu:
- Mais ele está respeitando limites, certo?
- Sim! Segundo os Arcanjos ele mantem distância, mais me intriga é
ele estar sempre presente nos principais acontecimentos.
- Somente saberemos de suas reais intenções ao final. Bem como,
como nos foi ordenado pelo mestre, é para deixar ele em paz, porquanto, o
criador sabe o que faz, por isso temos que confiar que nada é por acaso.
- Estava com saudades deste seu otimismo. – Antônio respondeu
com um sorriso de alegria.
- Até eu meu amigo estava com saudades deste meu otimismo, lhe
confesso que após os últimos acontecimentos, estava um pouco receoso sobre
o nosso poder de revidar o que estava por vir, contudo, após o que me disse,
estou um pouco melhor. Somente, um pouco, mas estou!
399
CAPÍTULO 95
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
Charles andava de um lado a outro com a mão direita na testa. Isto
não está acontecendo! – Ele dizia para si mesmo. – Frederick vai ficar muito
decepcionado comigo!
- Acalme-se chefe, o velho Frederick já tem conhecimento de nossa
existência dentro de sua agência, como Arthur também tinha. – Michael disse
demonstrando sua calma de sempre.
Mahesh sorriu, afinal, não era todos os dias que ele tinha a
oportunidade de presenciar uma discussão como aquela, no máximo em sua
vila ele apaziguava brigas entre casais por causa de traição e afins. Mais
mesmo gostando, tinham que seguir em frente, então resolveu intervir:
- Desculpe homens, mas é porque temos que adentrar antes do
anoitecer, do contrário não conseguiremos.
- Você está certo meu pequeno amigo. – Arthur disse também
demonstrando sua calma. – E olhem bem meus homens! Hoje vocês não
fazem mais parte de agencias e ordens, fazem parte de minha equipe. Então,
pouco importa de onde vieram, visto que são agora irmãos. Portanto, temos
que unir a habilidade de cada um para formarmos a melhor equipe sobre o
assunto, porquanto, para lidar com o sobrenatural teremos que lidar em várias
das vezes com coisas mais do que naturais em nosso cotidiano. Assim, todos
terão que desempenhar uma função, mas lembre-se, nunca se esquecendo de
que são liderados por Charles!
Então seu dedo indicador foi alçado em direção a Charles que ouvia
tudo, mais ainda estava assimilando toda a situação. E o velho arrebatou:
– É verdade que escolhi a agência de Charles não porque ela tinha
agentes renegados da O.S.S.V., mas porque ela tinha algo que nenhuma outra
tinha, consistente em agentes experientes em vários setores, inclusive,
diretamente com o sobrenatural, com o qual até Russo tem uma certa
familiaridade! – Terminou olhando para Russo que se assustou com a
afirmação, afinal, nunca poderia crer que o velho também soubesse o seu
segredo.
Eles começaram novamente a andar, realmente já estava bem
próximo de escurecer, e agora apertavam o passo.
- O senhor acha que já estamos próximos senhor Mahesh. –
Novamente foi Russo que impaciente questionou.
Mahesh o olhou com um sorriso, e para alivio de Russo que já
estava inclusive se coçando em razão daqueles trapos que Arthur havia levado,
o pequeno sujeito alçou o dedo indicador, quando todos olharam já puderam
ver algumas ruinas da estranha cidade abandonada.
400
- Mais tem pessoas lá! – Foi George, um dos agentes que mais riam
daquela situação que afirmou, da mesma forma como sempre sorrindo.
- São turistas. – Respondeu Arthur secamente, ele olhava para a
cidade como se fosse um monstro que estivesse a sua frente.
- Turistas?! – George chegou a gritar, ao passo que recebeu um
olhar frio e penetrante de Arthur que o fizeram quase que congelar. – Desculpe,
somente achei estranho alguém querer vir para um lugar como este.
- O homem é movido por aquilo que não compreende meu caro
George, aquilo que lhe intriga é o que lhe movimenta. Se fosse o contrário
ainda estaríamos divididos, porquanto, no início eram poucos que se
arriscavam a cruzar o horizonte para se aventurar. As pessoas não queriam
morar aqui, isto é o principal mistério, e, é o que atrai o público cativo por isso.
– o velho Arthur explicou apontando ainda para as ruínas. – Pense naquele
local como o seu e nosso horizonte, que devemos cruzar independente do que
vamos descobrir hoje!
- Acho que devemos deixar os animais assim que adentrarmos na
cidade. Fiz uma busca aqui quando o senhor disse a localização. – Mahesh
dizia olhando somente para Arthur, como se ninguém mais estivesse ali. –
Vamos nos esconder em um local que acho que estará tranquilo para
esperarmos até o horário certo para seguirmos para o ponto designado que o
senhor recebeu como informação de que a relíquia encontra-se.
- Certo vamos! – Arthur já seguiu andando, sendo seguido pelos
outros. Naquele momento nenhum dos agentes quiseram dizer mais nada,
porquanto, estavam todos perdidos em seus pensamentos, inclusive Charles
que pensava e muito sobre a tal de O.S.S.V., que não lhe saia da cabeça.
******
Após muito tempo de espera no local designado por Mahesh, Arthur
que desde que todos chegaram naquele local ainda não havia tirado os olhos
da lua.
- O que o senhor observa tanto. – Charles questionou Arthur com um
sussurro, não queria atrapalhar nada.
- Segundo minha fonte, está seria a noite certa, e a localização da
lua funcionária como um relógio, quando ela passar aquela estrela será o
horário.
- Quem lhe disse isso? – Charles novamente se mostrou
extremamente curioso, ao passo que Arthur admirava aquilo, contudo, não
estava muito para conversas.
- Não posso lhe falar? – A resposta foi seca.
- Certo, também protejo minhas fontes. – Charles sorriu, sabia que
ele não queria dizer por causa de proteção de fontes, mas simplesmente
401
porque queria manter silêncio. Lado outro, ele queria mesmo era saber porque
aquela noite e o que aquela criatura sobrenatural iria fazer, assim, tomou
coragem e questionou. – Porque está noite? E o que este ser sobrenatural
poderá fazer?
- Você é chato mesmo em Charles?! – a resposta veio mais em tom
de descrença do que de nervosismo. – Mais vou matar um pouco de sua
curiosidade, afinal, temos ainda alguns minutos. Dizem que a criatura que
estamos prestes a enfrentar possui um tempo de hibernação de anos, assim,
ela fica sempre vigiando o tesouro, contudo, dormindo. O local exato é
indecifrável, razão pela qual, temos que percorrer o perímetro no horário
indicado, porquanto, segundo consta somente nesta noite ela acordará e sairá
para se alimentar, após teríamos ou que aguardar por anos, ou vasculhar tudo
com escavações, o que é impossível neste local.
- Como tem certeza que a informação é confiável? – Charles agora
estava um pouco mais nervoso, afinal, a criatura iria sair para se alimentar,
então por óbvio ela estaria muito faminta, podendo, inclusive devorá-los caso
fosse um ser canibal.
- Não dá para confiar muito quando o assunto é o sobrenatural,
muitas vezes eu perco muito dinheiro em expedições que não dão em nada.
Contudo, temos sempre que vasculhar e seguir as pistas. Neste caso, minha
equipe após receber a informação estudou o local, e, percebeu que em uma
sequência exata de cinco anos havia várias denúncias de mortes e
desaparecidos na região, e, segundo consta o governo tentou encobrir as
mesmas, porquanto, eram, segundo informações: “mortes estranhamente
medonhas, como se fossem feitas por feras pré-históricas.”, minha equipe
cruzou todas as informações e descobriu que a sequencia batia com a data da
informação, assim, podemos dar maior credibilidade a fonte.
- Nossa, isso é realmente incrível. – Charles estava boquiaberto.
- Sim, é bem incrível, agora fique calado, porquanto, chegou a hora.
– levantou-se rapidamente dando a ordem: - Vamos homens, está no horário!
Achei que ele estivesse contemplando a lua pela forma que olhava
para a mesma. – Pensou George deixando mais uma vez escapar um sorriso,
realmente ele não tinha pensamentos ruins, estava sempre sorrindo de alguma
coisa, e, mesmo que a situação fosse alarmante ele dava um jeito de encontrar
graça, mesmo que somente para si mesmo para alegrar sua existência.
Eles andavam por um beco escuro e até que de certo modo
malcheiroso, era como se Charles estivesse entrando em um cemitério onde os
cadáveres ficavam expostos ao ar livre apodrecendo pouco a pouco.
- Arthur, o senhor está ai atrás? – Perguntou ele querendo mais é
ouvir uma voz para acalentar seu total temor com aquele local.
- Não! Estou lá na Inglaterra. – A resposta veio em tom de ironia e
deboche, afinal, Arthur percebeu o medo do jovem.
402
Será que este velho não tem medo de nada? – Pensou Charles.
Os demais agentes seguiam na frente, abrindo caminho com as
armas com miras a laser, as quais cintilavam na escuridão, menos George que
disse sorrindo e brincalhão como sempre que iria proteger a retaguarda. No
início Arthur até pensou em dizer que era para ele deixar de ser medroso e ir
para frente junto aos outros, contudo, após ver que ele estava realmente
olhando e fiscalizando tudo à medida que eles andavam, mudou de ideia. –
Afinal você até que pensa muito bem meu caro George. – Disse sorrindo para
ele, realmente aquilo fazia sentido, enfim, ele sabia onde era o local que iriam
adentrar, contudo, aquele lugar não era nada confiável. E o cheiro ruim já dizia
tudo, aquela noite era realmente a que ele tanto ansiava, a noite escolhida,
onde a besta estaria ali presente aguardando...
Mahesh estranhamente andava com eles, ele não tinha arma, nada,
somente seguia com sua coragem ao fundo.
- Mahesh, você não tem medo de estar neste local sem nada? –
George que estava próximo a ele questionou com um cochicho, tentando puxar
papo para descontrair, mais nunca retirando os olhos do que ocorria a sua
volta, sua arma e as miras não paravam de se mover.
- Mais quem lhe disse que não estou protegido?! – O pequeno
homem respondeu exibindo uma estranha pulseira. – Isto é um Kavacha.
George sorriu não respondendo, mais um pensamento não lhe saiu
da cabeça:
Este pequeno homem é mais louco do que Arthur, vir para um lugar
destes com uma pulseirinha é hilário!
- Parece que estamos no meio de um cemitério... – Charles
reclamou novamente com um cochicho para Arthur.
- Você está certo Charles. – interrompeu Arthur para responder o
óbvio, e ainda advertir. – Estamos em um total cemitério, não tenho tempo de
lhe contar a verdadeira história deste lugar, mais tenho que lhe dizer que como
é a sua primeira expedição ao meu lado, vejo que você está parecendo um
mariquinha, então, pelo amor de Deus fique mais calado.
- É porque eu nunca havia enfrentado coisas sobrenaturais, creio
que isto é totalmente fora do contexto que sempre idealizei. – Tentou justificarse sussurrando.
- Pois saiba que eles são melhores do que os homens, não jogam
bombas, não plantam minas terrestres, e, ainda, em sua grande maioria
gostam de lutar dignamente. – Respondeu Arthur diretamente, como quem
tinha grande experiência em lidar com o sobrenatural.
- Mas o que você acha que vão proteger estes objetos que o senhor
sequer ainda nos contou? – Tornou a questionar Charles como uma criança.
403
- Sei lá, pode ser um cão do inferno, um demônio, um Deus
mitológico, um homem ou um exército possuído, entre tantas e tantas outras
possibilidades. – Ele colocou o dedo indicador na boca – Agora vamos manter
o silêncio. Correto? Creio que estamos próximos!
- Certo, mas somente me responda mais uma coisa! O senhor já
enfrentou algum destes? – Charles era realmente insistente.
- Lógico, somente estava dando exemplos reais pelos quais já
enfrentei. – Arthur respondeu tão baixo que era ínfimo até para um sussurro.
- Porque está falando tão mais baixo?
- Porque creio que estamos não apenas próximos, mais já sendo
observados...
- Como sabe?... – Questionou Charles agora também sussurrando
baixinho.
- Porque estava percebendo algo, agora estou vendo algo...
Antes mesmos de terminar de falar, escutaram um pequeno e suave
sussurro, ao passo que os homens pararam assustados projetando as miras a
laser em direção do local que pensavam vir o cicio.
- Retirem a mira a laser rápido! – Gritou Arthur. – Mahesh está ai? –
Ele se preocupou com o pequeno.
- Não, quando percebi que o pequenino estava somente com uma
pulseirinha, e, parecia animado para lutar, dei uma pequena pancada em sua
cabeça, e coloquei-o para dormir, ele já ficou e muito para trás. – Respondeu
George como sempre sorrindo.
Credo, nunca pensei que George com este jeito meio que brincalhão
tivesse capacidade para tomar decisões e as executar sem mesmo se reportar
aos superiores. Isso no futuro poderá ser um problema. Contudo, hoje foi uma
solução, afinal, nunca esperava que o ser estivesse já tão próximo! – Arthur
pensou.
Porém, assim que os agentes desativaram as miras perceberam que
já era muito tarde, porquanto, já viram uma bola de fogo se formando mais a
frente, e, em questão de segundo foi lançada em direção a eles.
– Rápido, usem os escudos! – Tornou Arthur a gritar, ao passo que
todos os agentes retiraram os evoluídos itens, Charles sentiu que seu coração
iria saltar, estando muito feliz pelo fato de Arthur ter tomado a frente, afinal,
estava com muito medo para assim fazê-lo...
404
CAPÍTULO 96
Berlim – Alemanha, 1982
O doutor saiu do quarto estarrecido, e um pensamento não saia de
sua cabeça:
Quem teria abusado da menina Estela?...
Contudo, preferia manter distância de problemas com o Dr. Pierre, e,
ainda, tinha o fato de que Estela parecia que necessitava mais de silêncio para
resolver seus problemas do que ficar com a polícia e seu cumprimento frio da
lei ao seu lado.
Tenho que tomar cuidado, vou analisar estes documentos e destruir
as evidências de abuso, após isso tudo estará resolvido. Mesmo que algum
superior por uma infelicidade checar os mesmos não encontrará qualquer fato
atinente a esta minha omissão. – Concluiu ele em seus pensamentos, não
sabendo que algo muito sinistro estava naquele exato momento ao seu lado
sussurrando em seu ouvido lhe induzindo a está atitude.
O ser ao seu lado era medonho, seu odor fétido não era sentido pelo
doutor, que mesmo que lhe escutasse não poderia perceber a presença do
demônio ali dizendo e dizendo: - Deixe de ser bobo, você seria capaz de
arriscar sua carreira para salvaguardar uma pirralha que não quer ser ajudada?
Além disso, deve temer o pai dela, ele acabaria com tudo que você tem caso
suas suspeitas não fossem confirmadas! Bem como... – O ser sussurrava e
sussurrava, e o doutor seguiu andando pelo corredor cada vez mais
convencido de que estava fazendo a escolha mais sensata.
No quarto Estela não havia se recuperado do baque. Nem em seus
piores pensamentos poderia imaginar um resultado como aquele!
- Minha menina, fique calma, vamos resolver isso. – Vilalba tentou
confortá-la, ainda acariciando suas mãos.
- Como assim resolver?... Saiba que mesmo não querendo esta
criança sou totalmente contra o aborto! Não consigo imaginar retirar uma vida
inocente que nada tem de culpa em tudo isso. – Estela foi categórica.
- Desculpe criança, mas não quis dizer isso. Também sou contra o
aborto! Disse que iremos resolver tudo com o seu pai.
Estela suspirou com cara de nojo. Somente de pensar em seu pai
seu estomago revirava.
- Ele não vai ser o problema. – Ela respondeu categórica.
- Sim, ele realmente não será o problema! – Concluiu a empregada
com um misterioso sorriso, e, quando Estela a olhou percebeu novamente o
estranho brilho prateado em seu olhar, contudo, atribuiu aquilo tudo ao seu
cansaço, infelizmente...
405
CAPÍTULO 97
Brasília – Brasil, 1982
A mãe e pai de Marcos estavam finalmente saindo pela primeira vez
com o pequeno nos braços para um passeio, porquanto, após passarem dias
de internação no hospital, devido às complicações no parto, e, aos tristes
acontecimentos, tanto mãe quanto filho tiveram que permanecerem internados
recebendo cuidados constantes.
Portanto, de forma paranóica, resolveram que somente iriam sair
com o frágil pequeno após o mesmo passar uma grande temporada somente
em casa. Aquele dia era especial, aniversario da mãe, onde concluíram que o
pequeno já estaria pronto para enfrentar os agentes biológicos presentes no ar.
Fruto da cabeça de pais de primeira viagem e que ainda por cima passaram
por traumas no parto, visto que, para qualquer pessoa sensata concluiria que
existe perigo em toda parte, inclusive, dentro de casa.
- Verônica, você realmente acha que ele já está forte o bastante? –
Se preocupou o pai do pequeno.
- Não se preocupe meu caro Saulo, ele já está mais do que forte,
nem parece que teve nascimento prematuro.
- Concordo com você, contudo, o receio me persegue, afinal, vocês
são os meus maiores tesouros. – Respondeu o esposo com ternura,
acariciando o rosto de sua amada.
Após um passeio na praça próximo à residência, onde tomaram
sorvete, uma dúvida alçou, consistente no fato se poderiam se arriscar em
passar pequenas quantidades na boca do pequeno para ele experimentar a
delicia, concluíram que seria melhor arriscar, ao passo que Marcos soltou gritos
de alegria quando sentiu o sorvete tocar em sua boca, sorrindo ainda mais
após sorver o creme.
Após muita descontração já estavam se preparando para retornar
para a residência, quando Saulo avistou um restaurante tendo uma ideia
repentina:
- Meu bem, não acho certo você cozinhar no dia de seu aniversário.
O que acha de irmos comer naquele restaurante novo? – Disse apontando para
um elegante e requintado restaurante.
- Não sei meu bem, ele parece ser muito caro, e, diante da nossa
atual condição creio ser melhor economizar. – A mulher ponderou, visto que
realmente não estavam passando por tempos de vacas gordas, e, às
dificuldades aumentaram muito após o nascimento do infante.
- Certo meu bem, você tem razão, melhor não arriscarmos, afinal,
terei vergonha caso adentrarmos e eu não tenha condições de pagar, até se for
barato poderá fazer falta. – Acatou Saulo com os ombros caídos, se sentia
humilhado por não conseguir pagar um momento de descontração para sua
esposa que tanto lhe ajudava.
406
- Meus filhos, posso lhes fazer uma proposta? – Disse um velhinho
que estava sentado em um banco próximo, e, por óbvio havia escutado toda
conversa. O senhor vestia uma elegante roupa social com um colete em lã, em
sua cabeça uma boina para proteção do sol, sendo branco como leite, com
olhos amendoados pelas rugas, e óculos em estilo tartaruga.
- Claro meu senhor, o que o senhor necessita? - Respondeu Saulo
com um sorriso carismático e de solidariedade, visto que pensou que o senhor
queria ajuda para se levantar ou algo assim.
- Estou ao mesmo tempo com o mesmo problema que vocês!
Contudo, em uma posição um pouco diferente. – A resposta veio em tom
alegre soando quase como um enigma.
- Como assim? – Verônica e Saulo questionaram quase que em
uníssono, já se encontravam em frente ao senhor, ao passo que Saulo
segurava o pequeno Marcos no colo.
- Eu queria tanto ir naquele restaurante... – A resposta do senhor
veio e terminou de maneira pausada, como se ele estivesse a se deliciar com o
pensamento de ali comer.
- É meu senhor, ele parece ter uma comida muito gostosa. Apesar
disso, conforme o senhor deve ter ouvido, não temos condições também para
ali comermos, até podemos, contudo, não devemos. – A resposta de Verônica
soava como se fosse uma explicação a um mendigo, das razões que eles não
poderiam ajudar. – Mais quem sabe um dia tenhamos condições, e rezarei para
que o senhor tenha também condições algum dia.
- Mais vocês não deixaram eu terminar. – O velho respondeu com
um sorriso.
- Me desculpe senhor, não percebi que ainda tinha algo a concluir,
me desculpe mesmo, não foi minha intenção. – Verônica falava e gesticulava
com os braços tentando expressar sua vergonha.
- Não se preocupe minha filha, somente por me dar atenção já faz
mais do que meus netos! Além disso, sei que não fez por mal, a culpa é minha
pela forma pausada que falo. Mais queira me perdoar, afinal, isso é fruto da
idade e de uma mente cansada. – ele respondia também gesticulando com as
mãos para ela não se preocupar. – Como ia dizendo, meu problema é o
mesmo só que em vias diferentes, porquanto, eu queria tanto comer naquele
restaurante, no entanto, tenho muito dinheiro para isso, mais nenhum ente
querido para me fazer companhia... – fez uma pausa pensativo, como se
aquele sentimento lhe consumisse. – Assim, se me dessem a honra de
comemorar o aniversário com vocês ficaria muito feliz de pagar por tudo.
Verônica e Saulo estavam boquiabertos, porquanto, nunca
esperavam por aquela resposta, assim, não tinham palavras para responder
devido terem sido pegos de surpresa.
407
Percebendo isso o senhor decidiu intervir:
- Vou aceitar esta surpresa como um sim. – E já foi se levantando.
- Mais meu senhor, não queríamos lhe incomodar. – Tentou se
justificar Saulo.
O senhor que já estava de pé olhou bem no fundo dos olhos de
Saulo, após, nos de Verônica, respondendo de uma maneira ao mesmo tempo
estranha que lhes tocou o coração:
- A terra é somente um átomo de um corpo maior, e somos partes
vivas deste corpo, como elementos indispensáveis para a sobrevivência deste
ser superior. Ele cuida de nós assim como nós cuidamos de nosso corpo para
não ficarmos doentes. E, neste tom de ajuda mútua, devemos somar forças
para ajudarmos os próximos e sermos ajudados ao mesmo tempo. Assim, se
aceitarem meu convite, estarão comemorando esta data especial de vossa
família, e, ainda, me dando a oportunidade de por um pequeno momento voltar
a ter uma família, porquanto, perdi minha esposa recentemente, e, meu único
filho mora distante, ao passo que, meu neto encontra-se em outro País. Assim,
tenho muito dinheiro, e poucos entes queridos para compartilhar tal riqueza.
Bem como, sinto nesta família algo diferente, assim, se me derem este prazer
ficarei muito feliz.
Saulo e Verônica ficaram extremante felizes, seguiram para o
restaurante com o estranho senhor, e passaram com o pequeno Marcos uma
tarde inesquecível, talvez por ter sido a última...
408
CAPÍTULO 98
Porto de Le Havre - França, 1982
A mulher se insinuava para o executivo. Ela queria não apenas o
homem, mas a posição de sua esposa. Ansiava por tomar tudo o que a mulher
dele tinha.
Foi quando o Senhor da Luz adentrou o recinto, havia acabado de
resolver alguns assuntos pendentes no porto após a partida de Damião, e
nestes dias de estada naquele porto havia visto várias coisas. Contudo, o que
estava presenciando e ao perceber as intenções da secretária ao executivo,
resolveu ajudar, afinal, ele sabia mais do que ninguém de que necessitava
fazer o bem para exercitar o seu lado humano, o qual ainda estava estilhaçado.
Estava na forma desmaterializada, portanto, para não se materializar
repentinamente à frente da moça e matá-la de susto, fez o que sempre fazia
quando queria ser notado, adentrou em um recinto onde não havia ninguém, e,
após se materializar saiu como se já estivesse lá.
Vou manter somente minhas vestes, afinal vi nestes dias aqui no
porto que há pessoas de várias nações, e, por conseguinte, vestimentas
diversas. Assim, prefiro permanecer desta forma. Tem ainda o fato de ficar
mais a vontade, fim mais que buscado por assim ainda me trajar. – Pensou ele
antes de sair do recinto ermo para seguir em direção à moça.
- No que pensa minha senhora? – Questionou para a mulher que
mesmo não tendo visto a materialização se assustou com aquela figura a sua
frente. Afinal, não era todo dia que ela via um homem vestido com túnica
branca no escritório, já havia visto muitos executivos internacionais de países
do oriente médio com aquelas túnicas, mas aquele homem era diferente.
- Não estou pensando em nada meu senhor. Mas em que posso
ajudá-lo?
- A dissimulação em sua expressão é algo fascinante, não acha?
- Não entendo o que está dizendo... – Respondeu a garota fingindo
um desentendimento em relação aos seus pensamentos, mas, realmente, não
compreendendo as reais intenções daquele homem.
- Percebi que você olhava para aquele homem, e sei o que pretende
fazer, contudo, lhe advirto para não seguir em frente.
A secretária ficou pasma.
Será que realmente este estranho homem sabe o que estou prestes
a fazer?! – Pensou.
- Ainda não lhe entendo. – Ela decidiu após a perca de tempo em
seu raciocínio responder secamente.
409
- Não estou aqui para lhe dar um sermão, mas quero que saiba que
seduzindo aquele homem estará acabando com uma família.
A resposta pegou a mulher de surpresa.
Como é possível este homem saber disso? – Refletiu. Contudo, a
resposta estava pronta:
- Se quer saber, não sou nenhuma pervertida meu senhor. Sou uma
pessoa boa, que trabalho ordinariamente para pagar minhas contas. E com
relação à família daquele homem, saiba que a mulher dele é uma perua metida
que sequer cumprimenta qualquer pessoa que com ele trabalha, se sente a
maioral, e sempre se encontra posando de a mais linda e gostosa do pedaço,
quando, na realidade, é uma pessoa podre. Assim, tenho certeza que ele
merece coisa melhor. Por isto, estarei fazendo um favor para ele.
O senhor da luz deu um sorriso, realmente havia sido guiado para
ajudar, porquanto, a menina estava realmente crente que estaria com aquele
ato tenebroso fazendo um bem, não sabendo das consequências.
- Não quero criticar suas intenções, e, nem de longe sua pessoa.
Somente quero que entenda que o que pretende fazer não é o correto.
- Mas mesmo após lhe dizer isto tudo, você ainda não se convence?
- Você sabia que assim o fazendo, você estará destruindo a vida não
desta mulher, mas de duas menininhas inocentes?
- Como assim? É esta perua que vai perder o marido para mim.
- Sim, ela vai perder o marido, mas em breve vai arrumar um
namorado ou coisa qualquer, sua vida não vai mudar tão cedo. Contudo, suas
filhas vão perder o pai e até mesmo coisa pior...
- Mas ele somente vai largar da mãe delas, não vou nunca privar
que visite elas e que tenha contado com as mesmas.
- Sei disso também. Contudo, vou lhe fazer um favor, vou lhe
mostrar o que ocorrerá quando eles se divorciarem.
Nisto o senhor da luz tocou com a ponta dos dedos na testa da
mulher, colocando um poder de visão de um eventual futuro que ocorreria caso
ocorresse aquela escolha, afinal, nosso futuro não se encontra predefinido, já
que temos escolhas, mas para tudo na vida é possível antecipar as escolhas
que a pessoa está para tomar, ou melhor dizendo, os caminhos que seguirá,
assim, visões são somente de escolhas que podem ocorrer, podendo mudar
dependendo do ato final de escolha da pessoa ou grupo.
Em segundos a secretária começou a ver tudo embaçado, contudo,
como se estivesse em um sonho, começou a ver novamente, lado outro,
daquele momento em diante, somente estava vendo, nada ouvia, viu
primeiramente o executivo discutindo com sua esposa em uma sala suntuosa,
410
ele grita e sai do recinto, ao passo que a mulher sentasse, uma lágrima escorre
por seu rosto frio e calculista. A visão agora se encontra em um quarto onde se
localiza duas garotinhas de aproximadamente sete e dez anos, o executivo
aparece, provavelmente logo após a discussão com a mulher, porquanto,
estava com a mesma roupa, conversa com elas e deixa o quarto momentos
após. As garotinhas choram muito, e se consolam uma a outra. Uma lágrima já
começa a escorrer pelo rosto da secretária ao ver aquela cena. A visão fica
novamente turva, e o senhor da luz lhe fala:
- Agora vamos adiantar mais ainda as coisas!
Na primeira cena que vê a secretária, ela não acreditou, estava
novamente no quarto das duas garotinhas, contudo, parecia ser noite, e um
homem estranho estava parado observando as meninas dormirem. Ele chega
bem perto e começa a acariciar a mais velha ainda dormindo, descendo até as
suas genitálias. A secretaria tenta fechar os olhos ao ver aquela cena horrível,
mas não era possível, aquilo era uma visão avançada de um futuro eventual,
portanto, por óbvio não estava ocorrendo através de seus olhos.
Percebendo que já estava terminado seu trabalho o senhor da luz
estalou os dedos trazendo a secretária de volta.
- Isto é o que ocorrerá quando eu tentar se aproximar daquele
homem? – Indagou a secretária ainda perplexa.
- Sim minha querida, quando tomamos uma escolha, acreditamos
que estamos ferindo somente os responsáveis diretos, lado outro, estamos
ferindo muitos outros, e, ainda, a nós mesmos.
A secretária ficou imóvel, até mesmo sua expressão havia mudado,
estava raciocinando tudo com mais clareza a partir daquele momento.
O senhor da luz saiu do escritório sorrindo, certo de que havia feito
um excelente trabalho, desceu a rua e se dirigiu para uma viela erma aonde iria
se tele transportar para a Alemanha, onde queria analisar, por certo, somente
ao longe, como estavam às coisas com a jovem Estela que carregava sem
saber o filho das trevas em seu útero.
Contudo, antes mesmo de iniciar os trabalhos, sentiu algo se
movendo lentamente atrás de si.
Será que fui seguido? Mas quem? Será que Xotono ou Serfalos se
anteciparam e agora eles é que estão me casando? – Tais perguntas
perpetraram por sua mente em questão de segundos, justamente pelos poucos
segundos que dispunha antes de ter que se abaixar para fugir de uma curiosa
linha brilhante que passou próximo a sua cabeça, mais um pensamento e
certamente estaria sem cabeça.
Após desviar-se o senhor da luz pulou ao chão, virando-se
rapidamente para avistar seu oponente, tomando um susto ao nada ver, sendo
novamente surpreendido pela linha agora passando próximo a sua perna, e, ao
411
desviar-se, um pedaço de seu tecido foi desintegrado pela mesma, aquilo o
assustou ainda mais.
- Quem é você? Apareça seu covarde! – Gritou enfrentando com
coragem seu oponente, mas se assustando ao ouvir a resposta vinda de uma
fina voz feminina:
- Desculpe-me meu caro vulgo atualmente senhor da luz. Mas creio
que você se encontra tão acostumado a lutar com homens que menospreza um
ser feminino até mesmo como um oponente...
Não pode ser, será mesmo uma delas? – questionou em
pensamento esfriando-se todo o seu ser, porquanto, se aquela voz viesse do
ser que ele estava pensando estaria certamente aniquilado em pouco tempo...
- Agora sei quem você é, uma senhora do tempo... – Tentou
enfatizar na tentativa desesperada de ganhar, curiosamente, para sua tristeza,
exatamente mais tempo...
- Tenho que admitir que você é veloz, mas como sabe, somente
deixei você sobreviver até agora, porque não gosto de aniquilar meus
oponentes quando estão indefesos. – A voz respondeu ainda sem se mostrar.
- Porque não se mostra? Está com medo de que eu seja ainda mais
rápido do que pensa?
- Como sabe meu caro senhor, não adianta rapidez contra mim,
afinal, uma tecelã do tempo sabe exatamente quais escolhas, ou, como gosto
de dizer, quais fios todos vão escolher para que eu possa tecer sua vida... –
Ela novamente respondeu sem se mostrar, e a voz parecia vir do nada, não
tinha direção. - Assim, sempre estarei à frente de você em qualquer de uma de
suas escolhas...
O senhor da luz sabia muito bem o que tinha feito para estar prestes
a ser aniquilado por uma tecelã do tempo, nunca havia visto uma, enfim, eram
seres raros de encontrar-se. O último relato de uma havia surgido na
Alemanha, onde dizem que um poderoso ser do bem tentou influenciar as
escolhas de Hitler, ele queria ajudar a salvar vidas, mas dizem que foi
aniquilado por uma senhora do tempo.
Na essência o que fazia uma senhora do tempo era cumprir um
mandamento básico do universo que consistia que nenhum ser imaterial
poderia influenciar no mundo material de qualquer forma, sob pena de ser
imediatamente aniquilado por uma destas guardiãs do destino dos seres
materiais, os quais, pela lei também universal teriam o direito de tomar suas
decisões baseados em seu livre arbítrio. Contudo, o Conselho Supremo, após
a formação atual baseada no amor mútuo, entendeu que as funções destes
seres teriam que sofrer modificações, visto que o aniquilamento imediato era
algo muito cruel e primitivo, bem como, retirava do ser influenciador um direito
básico universal que consistia na ampla defesa.
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O senhor da luz tinha tomado conhecimento que alguns destes
seres não aceitou muito bem tal redução de suas deliberações, as quais
julgavam serem originadas dos criadores e eram vitais desde os tempos
primitivos mantendo a ordem. Lado outro, os opositores a este regime
venceram, não apenas pautados no amor e princípios da ampla defesa, etc.,
mas principalmente em denúncias de que referidos seres estariam agindo de
forma autoritária e sem medir as consequências.
Assim, as senhoras do destino passaram a agir somente em casos
estremos de influências que poderiam gerar transformações em uma grande
massa de seres, como no caso de Hitler, onde mesmo querendo fazer o bem, o
ser influenciador não poderia agir, visto que poderia de alguma forma fazer
mais mal ainda, porquanto, estaria mudando a ordem do destino de milhares
de pessoas, o que poderia ter consequências catastróficas.
Em regra o senhor da luz defendia em seu íntimo a influência destes
seres, afinal, não havia nada pior do que influência e alteração do livre arbítrio
dos seres, se assim persistisse atualmente o mundo material estaria um caos.
- Mas eu não mudei o destino daquela mulher, eu somente tentei
convencê-la a tomar uma decisão correta, não é isto que um amigo faz? –
Tentou se defender o senhor da luz, ao ver que aquele ser estava partindo logo
para o aniquilamento ao invés de levá-lo a um julgamento. Não entendia os
motivos, afinal, não havia, em sua concepção, influenciado nenhuma pessoa
capaz de mudar o destino de várias pessoas, e, além disso, realmente ele
havia dado uma escolha à mulher.
- Um amigo aconselha verbalmente, e deixa para o ser material
decidir qual caminho tomar, não usa de poderes sobrenaturais para levar a
pessoa a uma decisão, isto é influencia grave, visto que você utilizou nas
imagens um dos destinos, o qual se deve dizer que ela poderia não utilizar,
para praticar um ato que você tenta dizer que é bondoso, mas que feriu toda
uma cadeia de livre arbítrio. Isso porque quem em sã consciência que tivesse
uma visão daquele futuro não o abandonaria. – A voz ecoou por todos os
cantos na mente do senhor da luz.
Este ser realmente tem razão! – Concluiu o senhor da luz se
assustando quando admitiu intimamente que realmente errou naquele ponto.
- Admite seu erro?
- Sei que tenho o direito de receber então um julgamento. – Ele
respondeu enfático.
- Não tem não. Estou com você para meu ato final, afinal, não sei
onde conseguiu estes poderes, visto ser um ser altamente excluído, mas tenho
a meu favor que você utilizou destes poderes na influência, isto eleva o risco e
me deixa na escolha de lhe aniquilar. No mais, prefiro assim o fazer e eu
passar por um julgamento, do que você, visto que pensava que já estivesse
morto há tempos, e se não está, é porque tem grande influência não só sobre
as vidas materiais, mais de alguma forma em algum membro do Conselho
Supremo, única explicação para a libertação de um traidor como você.
413
Estava agora claro para o senhor da luz que ele estava prestes a ser
aniquilado não pela influência, mas por ser ele... Tinha que tomar uma decisão
rápida, do contrário não haveria escapatória.
Mas qual seria a maneira de escapar de um ser que sabe todas as
escolhas que vou tomar? – Se perguntava em seu âmago, tentando
desesperadamente obter alguma luz. De repente algo lhe veio. – Isto! Já que
eu não tenho um futuro pré-definido de escolhas que ela não saiba, poderia
fazer o inverso, e tentar aniquilar minha consciência, assim não escolherei...
- Infeliz escolha meu amigo... – Disse a voz em tom de sarcasmo,
como se aqueles pensamentos fossem os mais idiotas possíveis. – Como lhe
falei, tudo em sua essência é feito de escolhas, e eu sei de cada uma delas,
até mesmo aqueles que são inconscientes, tudo, absolutamente tudo...
Estou realmente perdido... – Foi o único pensamento que teve
sensato.
Os minutos se passavam e o silêncio plainava no ar, a tecelã estava
muda, o que deixava mais apreensivo ainda o senhor da luz, que decidiu ficar
imóvel sem fazer nenhuma escolha.
- Você é mais idiota do que pensei, hem?! Como pode pensar que
não fazendo nenhuma escolha eu não teria como saber, afinal, ficar sem
reação já é uma escolha. – Decidiu a tecelã falar após a pausa dramática. Na
realidade, ela já poderia ter aniquilado o senhor da luz, contudo, com aquele
ser, ela estava tendo extremo prazer, e queria curtir cada minuto daquele
momento.
- Por que não se mostra, e lute como uma mulher então sua fraca. –
Tentou então persuadir.
- Não me mostro porquanto nunca existi em qualquer forma, muito
menos em uma material. Digamos que sou somente uma essência imaterial, a
qual é desprovida de feição humana ou de qualquer outro ser existente, sou
aquilo que sou, e nada mais.
- Quer dizer que você sente é inveja dos seres como eu, por isto é
que está levando isto ao extremo! – Tentou novamente testar a tecelã.
- Não! Sinto é pena de vocês. Sei que fui criada desta forma
unicamente para que não me identifica-se com qualquer ser existente. Assim,
seria mais fácil cumprir meu papel sem fazer distinções. – A resposta veio
secamente.
- Então porque no meu caso está fazendo distinção? – A pergunta
veio em mesmo tom.
- Não! Quer dizer... – fez uma pausa como se buscasse uma
explicação plausível, a qual não existia. – Em parte sim. Mas não é por mim,
414
mas pelo o que você já fez. – Ela titubeou um pouco, mas respondeu. E para
surpresa do senhor da luz ela confessou a distinção.
- Mas quem é você para me julgar, quando o próprio prejudicado não
o fez? – Agora o senhor da luz sentia que estava obtendo uma pequena
vantagem. Razão pela qual, decidiu ainda complementar o que já estava óbvio:
- E não minta para mim, fale quem lhe deu a informação de que eu estava
interferindo nas escolhas daquelas pessoas! Insta ecoar que era para ajudar...
O questionamento e a conclusão posterior pegaram a tecelã de
surpresa, e ela já começava a sentir dúvidas de suas escolhas.
É realmente muito estranho eu estar prestando atenção em algo tão
banal como aquele, e, ainda, o futuro daquelas pessoas realmente não
representavam uma interferência muito grande no destino dos demais, aliado
ao fato de que eu estou realmente julgando um ser quando, pelo que consta,
realmente o próprio prejudicado não o fez, porquanto, do contrário ele ali não
estaria. Tudo me leva então a crer que de determinada maneira fui induzida e
levada para aquele momento, isto nunca havia ocorrido. – Ela pensava agora
preocupada.
- O que é? Você está pensando nisto não é? Pois pense, porque sei
que você foi realmente induzida por algo ou alguém para me aniquilar.
- Mas quem poderia ter feito isto? Você tem conhecimento? –
Questionou com voz agora de aflição a senhora do tempo.
- Eu poderia dizer quem não queria fazer isto comigo, seria bem
mais fácil. – A resposta veio em tom de brincadeira, afinal, o senhor da luz já
estava tendo alguma esperança.
- Não seja tolo, não pergunto no geral. Sei que você é um dos seres
mais procurados tanto por demônios quanto por outros seres bons, neles
enquadrados até Anjos e Arcanjos, mas queria saber quem teria tamanho
poder para me induzir a fazer isto, afinal, teria que ser um ser dotado de
poderes celestes plenos, não um simples demônio ou anjo, etc...
- Creio que seja o próprio Lúcifer, só consigo pensar nele, afinal,
somente com os poderes de um verdadeiro Deus das eras antigas que a
senhora seria induzida desta forma, do contrário acho pouco provável. – O
senhor da luz respondeu com descrença, afinal, sabia que ter Lúcifer em seu
encalço era somente uma questão de tempo, mas não pensava que ele viria
com tamanha rapidez, se tudo continuasse neste ritmo ele teria que adiantar
também algumas coisas...
- Mas então quer dizer que o antigo chefinho está agora atrás de seu
amado pupilo?!... – A senhora do destino respondeu sorrindo, deixando claro
que não iria mais aniquilá-lo, e tudo tinha um significado, e ela não o deixou
somente no vaco, queria falar, se sentia muito bem com isto. – Creio que meus
serviços aqui estão terminados, e, digo adeus para você meu caro, porque se
realmente for Lúcifer que o quer aniquilado, você o será, de uma forma ou de
outra... – Deu mais algumas gargalhadas e se calou.
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O senhor da luz ficou aliviado pelo fato de ter se livrado da senhora
do tempo, contudo, não conseguiu esbanjar nenhum sorriso, afinal, ela não o
aniquilou até mesmo por prazer, porque sabia que se Lúcifer o fizesse com as
próprias mãos após ver que seu induzimento não surtiu efeito, tudo seria
diferente, haveria certamente mais dor infligida com tortura e seja lá o que
mais. Ele somente tinha uma saída, e tinha que agir rápido...
O senhor da luz invocou Miguel, tinha que contar o que ocorreu no
beco, afinal, poderia ser sua última chance antes que Lúcifer viesse
pessoalmente fazer o serviço.
******
Miguel somente apareceu no beco após um longo tempo, estava
muito nervoso para variar.
- Qual o problema agora?
- Lúcifer esta atrás de mim! – O senhor da luz foi direto ao ponto,
sabia que Miguel não dispunha de tempo. – Ele mandou uma tecelã me pegar
quando influenciei, mesmo que por bem, o destino de uma pessoa.
- Nossa... Só você para encontrar estas coisas! – A resposta foi mais
irônica. – Não vejo uma dessas há milênios.
- É... Mais ela veio, e tenho certeza que Lúcifer foi quem induziu
para que ela me pegasse.
- Não seja retardado, descobrimos que Lúcifer não pode agir com
seus poderes no plano material. – Miguel respondeu já se preparando para
partir.
- Espere! Sei disso, mais ele está utilizando uma técnica muito mais
ousada, em sua inteligência magnifica, lógico que utilizada ao mau, mais nem
por isso menos magnifica, ele encontrou um meio de fazer cumprir leis
universais antigas, e de alguma forma induz que isto se consuma, assim, ele
consegue seus objetivos de uma forma em tese lícita.
- Mas porque será que ele perdeu seu poder no plano material? –
Miguel estava entendendo finalmente o medo do amigo, e queria saber mais.
- Você sabe que não consegui entender isso até agora, afinal, ele
fugiu sem evidencias e parece estar forte, mais sem poderes aparentes, exceto
aquela concepção na jovem Estela que não conseguimos evitar.
- Não sei não, creio que isto foi alguma obra de um ser ainda mais
poderoso do que ele, um Deus do tempo antigo, algo assim, mas ainda não
encontramos o responsável. Mas seja ele quem for, isto veio a calhar, afinal, se
ele tivesse seus poderes plenos, as coisas iriam ficar no mínimo mais quentes.
416
- Eu que o diga! Sem poderes este ser consegue fazer proezas
como a que ora ocorreu, por pouco não sou aniquilado.
- É, mas por via das dúvidas fique mais atento, afinal, ele pode
retornar a qualquer hora com mais alguma tática, e da próxima você pode não
ter tanta sorte. E, segundo informações ele está pagando um preço muito alto
por seu aniquilamento. Desde que saiu, falam que ele contratou a peso de
almas sua morte eterna, quer porque quer que o traidor tanto do bem quanto
do mal pague com sua essência por tê-lo feito de otário. Não posso ficar mais
sequer por um minuto, tenho uma missão para cumprir, e ficarei fora algum
tempo. Portanto, se necessitar de algo terá que recorrer a outra pessoa.
- Sei muito bem disso, ele mesmo me disse naquele dia, que mais
cedo ou mais tarde ele iria acabar comigo, para servir como exemplo para
todos aqueles que futuramente quiserem tentar o mesmo. E, pode ficar
tranquilo, não vou te incomodar, sei que se encontra muito atarefado.
Miguel partiu, e o senhor da luz ainda ficou um bom tempo ali
parado, não conseguia se mexer, pela primeira vez em milênios estava
sentindo medo novamente...
417
CAPÍTULO 99
São Paulo – Brasil, 1982
Antônio chega apressado ao quarto de Damião.
- Acorde meu amigo! Preciso que faça algo muito importante!
Damião pulou da cama, estava tendo um pesadelo onde estava
ainda no ataque de Serfalos e da legião de demônios na França. Contudo, no
letargo ele estava amordaçado e amarrado, não podendo fazer nada, e
assistindo Serfalos rasgar a barriga da mãe de Joana. Era horrível...
Vendo o estado do amigo, o qual transpirava excessivamente,
Antônio resolveu acalmar-se também.
- Me desculpe companheiro, lhe acordei muito depressa, devo tê-lo
assustado.
- Não se preocupe, você fez foi me ajudar! – Damião respondeu já
se levantando da cama. – Estava tendo um pesadelo horrível, era tão real...
Antônio ficou a pensar como iria dizer aquilo. Então resolveu
começar devagar para não assustar ainda mais o companheiro:
- Creio que não era somente um simples pesadelo...
- Como assim? – Damião questionou sem se virar, estava molhando
a nunca com bastante água que pegava diretamente da banheira, a qual havia
sobrado após o banho que tomou antes de adormecer.
Antônio parou pensativo novamente, aquilo era muito difícil para ele.
- Acho que esta noite tivemos uma visita inesperada!
- Visita inesperada? – Damião estava agora espantado! Como aquilo
poderia ter algum sentido com o seu pesadelo? Ainda mais algo tão horrível
como aquele. – O que aconteceu, vá direto ao ponto, afinal, já estou ficando
preocupado. – Ele pegou uma toalha e começou a secar o pescoço.
- Meu amigo... – fez mais uma pausa escolhendo as palavras, mas
finalmente decidiu contar. – Quando estava me preparando para dormir, fui
tomado por uma força enorme.
- Como assim tomado? Você quer dizer possuído?
- Isto mesmo! – Antônio respondeu com os olhos estatelados, como
se estivesse até aquele momento transtornado com o que ocorreu.
Damião ficou boquiaberto, não poderia imaginar aquilo, Antônio era
um poderoso espírito, nenhuma alma conseguiria dominar facilmente seu corpo
material e afastar sua alma do controle, a não ser que... Fez uma pausa, e
olhou espantado para Antônio, deixando a toalha cair.
418
- Isto mesmo! – Respondeu Antônio antes que Damião pudesse falar
qualquer coisa. – Acho que um espírito do mal quer nos ajudar!
- Mas isto é impossível! Há milênios que não ouço que qualquer ser
ligado diretamente ao lado perverso, e evoluído a ponto de te possuir ajudou
qualquer missão do Conselho...
- É! Se eu não tivesse vivido isso hoje, e tivesse simplesmente
escutado de outro, também não acreditaria.
- Como foi? – Questionou Damião demonstrando sua impaciência.
Antônio começou a falar andando pelo quarto, demonstrando estar
extremamente inquieto:
- Quando me sentei na cama me preparando para dormir, senti logo
a presença de algo no quarto, e misturado a este sentimento, pude perceber
uma forte e poderosa energia. Mas quando menos percebi, ele já estava dentro
de mim! Nunca vi algo desta forma...
Damião ameaçou abrir a boca para questionar algo, lado outro, foi
imediatamente contido por Antônio que levantou as mãos pedindo para ele
esperar, era evidente que ele não queria intromissões, então, ele continuou a
andar pelo quarto de Damião e a narrar os eventos:
- Quando ele estava dentro de mim, ele não prendeu minha alma, a
deixou livre, eu tinha todos os sentidos de meu corpo! Contudo, somente não
comandava minhas pernas e braços corretamente. Tentei rezar para iniciar um
exorcismo, mas o efeito foi desastroso, nada aconteceu.
Antônio fez uma pausa olhando no fundo dos olhos do amigo, e
prosseguiu:
– De repente... Sem mais nem menos, eu comecei a andar pelo meu
quarto, como que se estivesse procurando alguma coisa... Abri a porta do
guarda roupas e pude perceber o que procurava, ou melhor, não eu, mas
aquilo que estava me possuindo.
- E o que aconteceu? – Damião questionou logicamente querendo
rapidamente saber dos acontecimentos.
- Um espelho. E para meu espanto, quando meu ser foi ali refletido,
eu simplesmente não vi minha imagem!
- Como assim? De quem era a imagem?
- A imagem era de um ser que eu desconheço! Ele não era um
demônio, parecia mais um ser do bem, mas eu sabia que sua força era
maligna, senti a energia negativa. Ele tinha a pele de cor negra, mas não era
um negro comum, ele tinha tons avermelhados, e seus olhos eram somente
brancos. Não possuía cabelos, e não pude ver se possuía boca, pelo menos
419
não vi lábios, somente ouvia o que ele queria falar, parecia se comunicar pelo
pensamento.
- E ele lhe disse algo pelo pensamento?
- Sim... – Antônio parou como se avaliasse se contava isto para o
amigo. Por fim, achou que seria o melhor a fazer. - Ele me disse para lhe dar
um recado!
- Recado?! – Damião questionou perplexo. – Que recado?!
- Disse que próximo de uma praça, chamada de Consolação. Tem
uma igreja que eu poderia pegar às chaves, para caso necessitarmos fugir.
Assim, amanhã à noite, ou melhor, hoje, iriamos encontrar um homem que
estaria vestido e se portando como um morador de rua, este homem atende
pelo nome Lucas.
- Mas para que isso? – Indagou demonstrando sua impaciência
Damião.
- Fiz o mesmo questionamento para ele, e recebi como resposta
somente que este tal de Lucas seria de grande ajuda para nossa missão. Disse
ainda que seus métodos são questionáveis, mas sua devoção em acabar com
o mal de toda espécie é também inquestionável.
- Como assim? Se esta coisa que te possuiu é tão forte como você
sentiu, porque ele mesmo não nos ajuda, ao invés deste tal de Lucas?
- Também fiz a mesma pergunta para ele! – Respondeu Antônio.
- E o que ele lhe respondeu homem?! – A irritação já tomava conta
de seu ser.
- Disse que ele não pode mudar de lado simplesmente quando bem
lhe entender, e, por fim, proferiu que sua missão é muito maior, e que,
conforme ele havia dito esse tal de Lucas somente atendia por este nome, mais
na verdade ele teria outro muito mais famoso...
- E o que mais ele disse? Disse quem realmente este Lucas seria?
- Nada, após isto ele sumiu de mim! – Antônio fez uma pausa. –
Espere! Ele disse mais alguma coisa! Ele me disse que iria lhe mostrar o que
poderia acontecer aos escolhidos caso você fracassasse! E ainda disse que a
ajuda que ele iria fornecer não era um acaso, mas que tudo estava de alguma
forma escrita na essência do universo... Não me lembrava disto porque foi
quando eu literalmente apaguei... Isto deve ter ficado no meu inconsciente.
- Então está explicado este meu pesadelo! Há milhares de anos não
tenho pesadelos, isto só poderia ser alguma mensagem! – Disse Damião,
olhando para o nada, ainda se lembrando do pesadelo horrível daquela noite.
420
- Acalme-se meu amigo! Isto esta me cheirando mais a uma
armadilha! – Disse Antônio, demonstrando que o amigo não poderia acreditar
naquela coisa que lhe dominou.
Damião ficou pensativo, então após muito meditar concluiu:
- Não sei... Acho que não temos muitas opções! Não posso deixar
Marcos e Joana desamparados um no Brasil e um na França... Antes de dormir
havia me questionado quem iria protegê-los até que tenham aptidão para se
protegerem sozinhos, isto poderia ser um sinal...
- Sinal de cilada! – Respondeu Antônio, totalmente assustado com a
atitude inconsequente do amigo.
- Acho muito engraçado, você sofre uma possessão, e ainda quer
me dar conselhos! – Respondeu Damião soltando um enorme sorriso ao
amigo.
- Não brinque com coisa seria Damião, acho que isso não é um sinal
para seus pedidos, está mais parecendo uma emboscada!
- Não se preocupe amigo, tenho um plano. – Respondeu Damião já
se dirigindo para o guarda roupas, para trocar se trocar. - Mais, por favor,
Antônio, vá tirar também seu pijama! Definitivamente não podemos ir para esta
ponte vestidos desta forma, não seremos visto como mendigos, mas sim como
loucos. – Disse por fim sorrindo ao amigo.
Antônio olhou para suas vestes, sequer havia percebido que ainda
estava vestido com pijamas, aquilo era realmente hilário, não podia sair
daquele quarto daquela forma, alguém poderia até pensar que ele teria
dormido com Damião. – Credo! – Pensou ele sorrindo consigo mesmo.
Damião percebendo o medo do amigo de sair de seu quarto vestido
daquela forma, lhe jogou uma batina, dizendo alegremente:
- Toma, vista isso! Também não quero ninguém falando que você é
minha mulherzinha.
Antônio sorriu, afinal, o senso de humor de Damião era
inquestionável, até mesmo naquele momento em que ele deveria estar com
uma pulga atrás da orelha, ele fazia piada, não era atoa que era alegre, e
espalhava esta alegria a todos a sua volta.
421
CAPÍTULO 100
Berlim – Alemanha, 1982
Estela estava deitada, contudo, seus olhos estavam abertos e fixos
na parede.
- No que está pensando minha menina? – Questionou Vilalba que
estava sentada em uma poltrona lendo uma revista, ou pelo menos fingindo
ler...
- Estou pensando no que se encontra em minha barriga. Sei que não
deveria tê-lo, contudo, a dúvida me aflige.
Neste exato momento uma mulher entrou no quarto, ao passo que
Vilalba assustou-se a perceber o jeito estranho da moça, ela realmente não era
uma enfermeira, somente estava representando uma.
A empregada percebeu isso ao analisar o perfil da moça, os sapatos
que ela usava eram muito caros para uma simples enfermeira, e, ainda, tinha o
fato dela ter literalmente se arrepiada toda quando ela adentrará no quarto.
- O que quer de minha menina. – Vilalba bradou da poltrona ao
perceber que a moça havia se dirigido diretamente para a cama de Estela. Por
isso já se levantou indo em direção à mulher, tomando um baque quando a
mesma lhe olhou...
Os olhos da mulher que adentrará no quarto tinham um pigmento
vermelho estranho nas íris, bem como, ela era muito alta e sua pele negra
jambo era linda e combinava com seus cabelos encaracolados.
- Me desculpe, somente estou aqui para medir a pressão e ajudar no
que sua menina precisar minha senhora. – Respondeu a moça.
- Deixe de neura Vilalba, a moça somente quer ajudar. – Estela disse
já estendendo o braço para a moça colocar o aparelho de pressão.
- Esta se sentindo bem? – A moça questionou, já colocando o
aparelho e puxando papo, muito diferente das outras enfermeiras que queriam
apenas fazer seus trabalhos sem serem incomodadas.
- Sim, estou. – A resposta veio curta demais.
- Não parece, porquanto, você certamente me parece muito
preocupada e indecisa. – A moça respondeu pegando Estela de surpresa que
não esperava se encontrar tão evidente suas dúvidas.
- Estou preocupada com o filho que descobri neste momento que
estou esperando. – A resposta de Estela veio espontânea, preocupando
Vilalba que achou estranho aquela abertura fácil com uma desconhecida.
Contudo, assim que Vilalba ameaçou abrir a boca a moça virou-se
estranhamente em direção da empregada dizendo misteriosamente:
422
- Você sabe que eu nunca faria qualquer mal para esta garota!
- Sim... Espero que sim! – Vilalba respondeu também de forma
estranha, retornando para sua poltrona, e, retirando a mão da cintura, onde se
encontrava um enigmático punhal...
- Saiba minha jovem que toda vez que um casal jovem engravida,
após alguns anos na grande maioria das vezes o pai, a mãe, ou até mesmo os
dois, jogam na cara do filho que se não fosse pelo seu nascimento tinham feito
tantas outras coisas, como arrumado empregos melhores, terminado os
estudos, feito faculdade, casado com outra pessoa, etc... A pior coisa para
uma criança ou para qualquer ser humano é o sentimento de ser um estorvo,
um atrapalho na vida de quem eles mais amam, quais sejam: seus pais. Muitas
vezes isto gera rebeldia, afinal, que jeito um jovem encontra para extravasar e
chamar a atenção dos pais e de todos? Por este motivo, o que os pais
deveriam fazer é parar de chorar por suas fraquezas, e dizer: Filho eu não fiz
tudo que queria, mas tudo que fiz até hoje foi por você!
A moça dizia e Estela ficou pasma ao ouvir a forma com que ela
tentava adentrar no assunto maternidade, e, ao mesmo tempo, ensinar um
pouco. Vilalba era a mais assustada. Mais a moça prosseguiu:
– Muitos pais tem que largar seus sonhos para cuidar da família,
mais o mais importante é sempre ter em mente, eles não são culpados pelo
seu erro. E se pedirmos para Deus ele nos dará forças para corrermos atrás de
nossos sonhos, mesmo que às pedras no caminho machuque nossos pés.
Estas simples palavras podem mudar a vida de um ser humano, afinal de
contas somos feitos de amor, que é moldado desde o nascimento até o ultimo
suspiro de vida, e somente uma mãe seria capaz de mudar o sentimento de
qualquer ser, por mais perversa que tenha sido sua concepção...
Vilalba somente assistia da poltrona a conversa, fingindo que lia um
livro, o qual estava até de ponta cabeça, seus pensamentos não paravam:
Será que está moça esta tentando mesmo dizer que um filho é algo
bom, ou será que está tentando algo para tirar a criança de minha menina?!...
- Mais sou muito nova, e, como posso lhe dizer... – Estela escolhia
às palavras. – Não sei se o pai de meu filho seria a pessoa ideal.
- Não importa o pai, o que realmente importa é o que ele vai ser, a
forma que você vai moldar ele, vai lhe dar amor, e, proporcionar-lhe tudo aquilo
que necessitar.
- Mais se ele tiver nascido de algo ruim, que me causou grande dor e
amargura. – Estela de alguma forma, a qual ela mesma não conseguia
explicar, se abria com a jovem.
- Quando você nasceu tinha alguma maldade já fixada em seu
coração? Ou será que era um ser dotado de amor e ternura, o qual devido ao
meio que foi criada foi se amoldando para o bem?
- Creio que não tinha maldade. Mais toda criança é um pouco
perversa, nas brincadeiras, egoísmos, etc.
423
- Então, este pequeno que virá ao mundo, não é fruto do meio, mais
vítima dele, e, assim, ele é quem deverá receber mais e mais amor,
principalmente, para que amanhã não fique da mesma forma que aquele que
você tanto rejeita, ou seja, o pai.
Percebendo o jeito estranho de Vilalba a jovem saiu subitamente e
muito rapidamente do quarto.
Vilalba sem querer abaixou o livro, o ato foi totalmente involuntário, e
ocasionado devido ao fato dela ter voltado todo o pensamento para aquela
resposta.
Está moça realmente não se trata de uma pessoa comum, ela tem
um dom, e se encontra estranhamente utilizando ele para algo, somente ainda
não sei qual... – A empregada pensava.
Estela estava também em tamanho raciocínio que não percebeu
igualmente a saída da moça do quarto.
- Vilalba, cadê a moça?! – Gritou para a criada.
- Hã? Moça? Ora, estava conversando com você! – Ela realmente
estava perdida, afinal, estava tentando entender o que aquela moça pretendia.
– Pelo jeito ela saiu minha menina.
- Então corra trás dela, preciso pelo menos saber seu nome!
Vilalba correu até à porta assustando-se quando não viu a moça no
corredor.
É impossível ela já ter passado por todo este vasto corredor! Pensou já atónita.
- O que foi Vilalba, não há encontrou? E porque você esta
assustada? Afinal, queria saber somente o nome daquela mulher, não
necessitava de um órgão dela para você ficar tão estranha em não conseguir
alcançá-la. Além disso, ela deve voltar mais tarde.
Sim... Ela deve voltar. Mais se ela souber o que lhe espera não
voltará. - Concluiu em pensamento a empregada retornando a poltrona.
******
Já bem longe do hospital, plainando no céu com suas enormes azas
a mesma moça disse vagarosamente, como que se vangloriando ou se
deliciando do que havia acabado de fazer:
- Sei que Miguel não ficaria nada contente com este meu ato de ir
contra seus mandamentos! Contudo, creio que fiz a coisa certa, tenho plena
convicção que a criança poderá rejeitar seu lado maldito caso encontre o
amor... – E num bater mais forte de asas atravessou a dimensão.
424
CAPÍTULO 101
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
Charles estava assustado, retirou de suas costas o escudo que
antes de saírem havia reclamado que seria um desperdício de energia
carregar, agora estava aliviado de ter ouvido Arthur e trago o objeto.
Após os testes promovidos com a Dra. Kim, antes de saírem Arthur
ensinou a utilizarem aqueles escudos no momento do combate, era para
fazerem uma formação como o exército romano, onde formavam uma
carapaça, onde nada poderia penetrar. Ele também ordenou que o parceiro
que estivesse na frente sempre protegesse o do lado, e, assim,
sucessivamente, ninguém deixando a formação, que aquilo poderia representar
a morte de todos, e pelo menos naquele primeiro momento deu muito certo...
Os demais agentes permaneceram mais tempo com o escudo a
frente, todos formaram a carapaça se ajoelhando ainda para que o mesmo
pudesse proteger também as suas pernas, após perceber que o fogo havia
passado, Arthur levantou-se, ergueu o seu escudo e gritou:
- Ao ataque homens, vamos à pré-formação e a qualquer sinal de
novo fogo não esperem minhas ordens, protejam-se que poderá ser tarde
demais caso aguardarem para tomar esta atitude!
Todos saíram correndo na direção em que foi lançada a bola de
fogo, eles corriam em pré-formação, ou seja, corriam mais com os escudos já
quase que alinhados para a qualquer momento entrarem novamente na
constituição de proteção.
- Mais isto é suicídio, não deveríamos estar correndo na direção
oposta?! Afinal, é certo que vamos ser atacados novamente! – Gritou Charles
para Arthur, logicamente não parando, porquanto, tinha medo de ficar sozinho
atrás do grupo. Não é bom ser o primeiro e menos ainda ser o último ele
pensava. E o novo amigo tinha deixado claro para manterem no momento da
corrida a chamada pré-formação.
- Eu sei o que estou fazendo, quando é algo que ataca de longe, é
porque não tem poderio suficiente para lutar de perto. – Respondeu Arthur com
um grito correndo como uma criança junto aos agentes bem mais jovens que
ele, os quais apesar da vantagem da juventude, estavam ainda era em
desvantagem em relação ao velho, por óbvio, diante de não terem qualquer
experiência em expedições deste tipo, e, ainda, pelo traje moderníssimo.
- E se você estiver errado? – Agora gritou George que estava mais
atrás como desde o início quando para ali se dirigiu.
- Aí meu caro, vamos ter que lutar até a morte, e, espero que
ninguém abandone o barco, senão estaremos fritos literalmente, ou melhor, na
presente hipótese de barco, afogados ao invés de fritos. – O velho respondeu
com sarcasmo, ao passo que, tanto Charles quanto os agentes ficaram
boquiabertos ao perceberem que ele não ligava com o perigo, ao contrário,
parecia que ele o excitava ainda mais.
425
Eles continuavam avançando, mas nenhuma bola de fogo foi mais
lançada.
- Creio que os ataques pararam. – Disse Robson.
- Não creem nisso! Esta criatura parece ser esperta, viu que
estamos atacando, vai esperar a oportunidade certa. Por isso fiquem
preparados. – Gritou Arthur.
Após algum tempo correndo eles escutaram uma voz grossa e
aterrorizante, a qual lhes ameaçou:
- Retornem! Caso contrário, não terei piedade...
- Parem homens, já estamos muito próximos da criatura, posso
sentir o seu cheiro pútrido, além desta ameaça inútil de um ser fraco ter vindo
de muito perto. – Gritou Arthur fazendo que todos os homens parecessem
imediatamente de forma brusca, abaixando-se cada qual sem sair da formação
e encolhendo ainda mais a carapaça de segurança.
- Do que você me chamou seu verme? – A criatura disse, soltando
após um grande rugido, misteriosamente, como se fosse de um leão.
- Acho que não foi sensato dizer aquilo para ele. – Cochichou
Charles para Arthur logicamente tremendo de medo juntamente com seus
agentes.
- Podem agradecer por estarmos neste local fétido, do contrário
poderiam passar pela vergonha de eu sentir o odor das fezes que se
encontram escorrendo por suas calças. – Arthur ironizou Charles dando uma
enorme gargalhada.
Este velho parece um louco mesmo! Estamos diante de uma coisa
estranha desta, que não vimos sequer sua verdadeira feição e ele brinca como
se estivesse diante de um parque de diversões. – Concluiu Charles em
pensamento, afinal, se exprimisse esta conclusão correria o risco de levar mais
uma resposta ou de ser mais caçoado junto aos seus agentes.
- Como me encontraram? – A criatura vociferou ainda ocultando sua
feição dentro de uma entrada aberta totalmente camuflada, como se tivesse
sido aberta por algum mecanismo secreto.
- Isto não interessa. Terei que levar o livro e também as cinzas, e,
espero que seja em paz. – Gritou Arthur, ao passo que, seu pleito veio mais em
tom de ameaça do que de alguém que realmente quisesse tranquilidade.
Após dizer isso um estranho fogo começou a sair da passagem, e a
criatura começou a sair sorrateiramente do interior do local subterrâneo.
426
Ao perceber que a criatura estava saindo, Arthur abaixou somente
um pouco o seu escudo deixando uma pequena fresta aberta onde olhava a
saída do ser.
- Está vendo algo? – Questionou Charles curioso.
- Acho melhor vocês não olharem e nem saberem o que está
saindo... – Respondeu Arthur para espanto de todos exibindo um sorriso e um
olhar de encantamento, era como se estivesse hipnotizado com a imagem da
criatura.
Não era para menos, em pouco tempo a criatura já estava do lado
de fora da caverna, demonstrando para Arthur que ele não teria aquele livro,
pelo menos de uma maneira fácil...
- Algum de vocês é muito bom em desvendar enigmas?... –
Questionou no mesmo tom de ironia Arthur bem baixinho, somente para
Charles e seus agentes.
- Deixe-me ver logo o que é este... – Charles havia aberto também
uma fresta em seu escudo demonstrando sua revolta com os joguinhos de
Arthur, contudo, ao avistar a criatura além de perder completamente a voz,
desejou nunca ter tomado àquela atitude.
O que eles viam devia ter uns quinze metros de altura! Tinha o corpo
de leão alado e cabeça e busto de uma belíssima mulher, seus cabelos eram
castanhos, e a pele rosada com bustos delicados que contrastavam com seu
estranho corpo e a voz que saia de sua grande boca a qual exibia ainda dentes
afiados como uma verdadeira fera.
- Que merda é essa?! – Questionou espantado Charles, ao passo
que as palavras custavam a sair, visto que sua boca estava totalmente seca
devido ao medo que lhe tomou totalmente.
- Tenho certeza que é uma esfinge. – Arthur lhe respondeu ainda
com um sorriso e o mesmo olhar de admiração ao estranho ser.
Os agentes não haviam olhado do que se tratava o ser, mais todos
estavam com medo, exceto Michael, o qual, igualmente Arthur sorriu quando
ouviu o velho dizer do que se tratava ao concluir diante da brincadeira anterior
sobre se alguém seria bom em desvendar enigmas.
Definitivamente teremos que desvendar algo. – Concluiu Michael em
pensamento aumentando gradativamente seu sorriso.
No instante que Michael sorriu, Robson e Russo se entreolharam
como há anos não faziam, não disseram nada um ao outro, mas ambos sabiam
os pensamentos que lhes ocorreram: Este oriental definitivamente veio de uma
ordem que trata do sobrenatural.
427
CAPÍTULO 102
São Paulo – Brasil, 1982
Antônio e Damião andavam a passos largos. Ainda era dia, mas
queriam chegar bem cedo ao local, para ver como era, e, principalmente, para
poderem estudar qualquer movimentação estranha, táticas de guerrilha que
eles conheciam muito bem.
- E se for uma armadilha? – Questionou Antônio assustado.
Damião olhou para o amigo, e após dirigiu os olhos para uma grande
maleta que Antônio estava carregando, questionando como um mestre se
vangloriando de um dom:
- Sabe esta maleta que você carrega para mim?
- Lógico que sei Damião, ela pesa uma tonelada! – a resposta veio
em tom de descrença. – Saiba que eu somente estou carregando ela, porque
estou encarnado há menos tempo que você, por isto sou mais jovem, e, ainda,
mais forte e bonito.
- Pode até ser mais jovem, contudo, bonito somente em seus
sonhos! – Soltou uma enorme gargalhada – me poupe destas suas
brincadeiras sem nexo com a realidade.
- O que você carrega de tão pesado dentro desta maleta? – Antônio
cortou rápido, sabia que Damião iria ficar caçoando de sua feiura.
Damião deu um sorriso, respondendo em tom de mistério:
- Diremos que meu arsenal de guerra!...
- Não vai me dizer que você tem armas aqui dentro? – Questionou
Antônio arregalando os olhos assustado, e quase soltando o objeto ali mesmo
ao chão.
- Todos os tipos, para enfrentar uma guerra contra almas
encarnadas e desencarnadas! – ele dizia arregalando os olhos. – Estamos em
guerra meu amigo, não podemos bobear e confiar somente em nossos
poderes. Além disso, foi você mesmo que disse que poderia ser uma cilada!
- Não acredito?! E se a polícia nos pegar?! – Antônio questionou
arregalando os olhos de pavor somente em pensar naquela hipótese.
- Deixe de ser medroso Antônio, nós somos padres, e, ainda por
cima, velhos! Acha que a polícia vai nos revistar?! – Damião disse quase que
dando um tapa na cabeça do amigo para ele ficar mais esperto. – Por isto fiz
questão de vir com as batinas, porquanto, às mesmas nos dará credibilidade.
Isso porque ninguém revista um padre! Ainda mais que estaremos em um local
que somente terá mendigos e alguns poucos transeuntes, é logicamente
dedutível que estamos distribuindo comida aos pobres, etc.
428
Antônio sorriu, definitivamente Damião não era nada bobo. Já havia
bolado os preparativos de um plano antes mesmo de sair.
Após uma longa caminhada enfim chegaram ao local, haviam vários
moradores de rua, crianças, idosos, mulheres, homens, todos sujos e
maltrapilhos aglomerados em uma viela próximo a praça principal.
Ninguém se dirigiu até eles. Damião não se espantou, a vida era
muito difícil para aquelas pessoas, haviam perdido a capacidade de sonhar e
lutar por seus ideais. Muitos empurrados neste abismo, outros por vontade
própria ou das drogas, era certo que eles não queriam sequer saber da palavra
de Deus, aquilo não lhes enchia a barriga.
Ao ver às pessoas naquela situação Antônio logo começou a chorar.
- Não chore meu amigo, afinal, você sabe melhor do que ninguém
que tudo tem uma razão de ser... – Disse Damião tentando acalmar o amigo.
- Sei disto, mas é duro ver crianças serem criadas desta forma. –
Respondeu Antônio ainda secando as lágrimas.
- É... Isto é verdade... – Retornou Damião sem mais palavras.
Após um longo período vendo aquela cena, Damião não se conteve.
- Você tem alguma comida ai?
- Tenho um pequeno sanduiche que trouxe para o caso de sentirmos
fome, já que aqui perto não tem nada para comprarmos, e, na igreja
certamente não encontraremos nada para comer além das hóstias.
- Me dê! – Ordenou Damião.
- Como assim? São somente dois sanduíches, isso não matará a
fome sequer de quatro crianças, será ainda pior, as outras vão ficar com
vontade, isso sim seria um pecado...
- Pare de falar e me dê os sanduiches! – Ordenou novamente
Damião.
Antônio sem entender, abriu alguns botões da sua batina próximo ao
peito, retirando dos bolsos internos um saquinho com os dois lanches.
Damião pegou o pequeno saco, e seguiu caminhando rumo aos
moradores de rua, mas antes ordenou:
- Fique aqui meu amigo.
Antônio ficou imóvel, somente vendo o amigo ir até os moradores.
Mas quando ele chegou, ele ficou espantado...
429
Inexplicavelmente Damião foi entregando um sanduiche para cada
morador de rua! Antônio tentou chegar mais perto, contudo, logo voltou para
trás, afinal, Damião foi claro ao lhe dizer para ficar ali...
Damião colocava a mão direita dentro do pequeno saco, pegava um
sanduiche e entregava para um morador, após virava-se para outro, colocava
novamente a mão dentro do saquinho e retirava outro, fazendo isto diversas
vezes, sem que qualquer morador de rua percebesse que o saco era pequeno
demais para tantos itens, afinal, eles tinham olhos somente para os suculentos
sanduiches...
Após entregar o lanche a todos, Damião pediu que eles rezassem
um pai nosso, o que foi atendido prontamente por todos ali presentes, enfim,
estavam extremamente agradecidos.
Logo após, Damião se despediu, principalmente das crianças, as
quais, ele entregou um pequeno rosário, dizendo que era para elas guardarem
aquilo para se protegerem, as crianças não sabiam se comiam ou olhavam
para o lindo presente.
- Este homem na cruz, morreu para lhe dar uma segunda chance,
por isso, mesmo que vocês não tenham esperanças, ele sempre será um
exemplo de superação e amor. – Disse Damião ao se despedir das crianças e
dos moradores. Antônio pôde escutar porque ele falou aquilo em tom tão alto,
que parecia que queria que todos gravassem aquilo não somente em seus
cérebros, mas principalmente em suas almas.
Lado outro, Damião não percebeu que um dos moradores de rua
havia percebido tudo, e, seus olhos brilhavam evidenciando uma astúcia e fúria
inexplicáveis.
Ele foi voltando rapidamente para junto de Antônio, quando chegou,
entregou o saco para o amigo, quando Antônio o abriu se assustou, visto que
dentro dele ainda estavam os dois sanduiches.
- Como você fez isso? – Questionou intrigado Antônio.
- Eu somente precisava de uma matéria com essência e base
alimentar, um baldrame... O resto foi somente multiplicação! Não posso lhe
explicar como adquiri este dom, mas sei que não poderia usá-lo em vão, se
usei, é porque este era um momento especial. – Fez uma pausa olhando para
os olhos de Antônio. – Senti que tinha que proteger aquelas crianças do que
parece estar para ocorrer aqui à noite, e não tinha outra forma de fazer isto, a
não ser ganhando a confiança de todos, entreguei um rosário que ira pregar
em todas as crianças de uma forma inexplicável, e irá proteger cada um destes
inocentes seres.
Antônio balançou a cabeça, sentia orgulho do amigo, ele tinha uma
índole inacreditável, e certamente novos poderes que ele não imaginava.
- Mais agora vamos comer, porque já esta anoitecendo e eu estou
faminto! Confesso que temi por você distribuir estes sanduiches e eu ficar sem
430
nada! – Disse sorridente e alegre Antônio, já se dirigindo a algumas latas de
tintas no canto de uma encosta.
- Não se preocupe meu amigo, sei deste seu estomago sem fundo! –
Respondeu Damião também sorrindo, e se dirigindo para sentar na outra lata
ao lado do amigo.
Contudo, não perceberam que durante todo aquele tempo estavam
sendo observados por vários mendigos escondidos ao longe, todos estavam
encapuzados, e o que havia notado a proeza de Damião estava retornando a
este grupo, certamente para contar o que percebeu e presenciou...
******
Após dias de espera pelo resultado dos exames finalmente Estela e
Vilalba estavam retornando para casa. Nem em seus mais tristes pensamentos
a jovem poderia imaginar o que os exames iriam revelar, contudo, era a
verdade e dela não tinha como fugir.
Ao chegar à residência, ou melhor, à mansão da família, chegando
até a porta Estela se sentiu constrangida e parou subitamente não conseguindo
adentrar.
- Porque o receio minha menina? - Vilalba questionou-a com voz de
ternura.
- Não queria ver meu pai pelo menos neste primeiro momento. - Ela
foi seca e direta ao ponto.
- Não se preocupe, telefonei antes para saber das coisas e ele me
disse que tinha que defender um caso muito importante na Itália, e que voltaria
somente após alguns dias. - fez uma pausa analisando a expressão de alívio
da jovem. - ele lhe mandou um beijo, e desculpas por não ter ido ao hospital,
dizendo que estava muito ocupado.
Sei... – Estela somente pensou finalmente adentrando.
431
CAPÍTULO 103
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
A formação foi avançando, e quando a besta se afastou da entrada
para uma melhor posição para o ataque, eles já havia combinado que Michael
e Charles correriam para o interior da passagem aberta misteriosamente, e de
onde aquela besta havia saído.
Charles havia raciocinado muito se iria se aventurar daquela forma
com Michael, mais depois decidiu que era melhor ele entrar ali do que ficar do
lado de fora, tudo rapidamente, enquanto Arthur gritava feito louco:
- Peguem rapidamente o livro!!! E não esqueçam das cinzas!!!
Ao chegarem ao final da escadaria Charles e Michael se
petrificaram.
Isso não é possível! – Pensou Charles, ao passo que Michael se
expressou foi em voz alta:
- Que merda é essa?!
- O que você disse Michael?! – Gritou Arthur que havia escutado o
xingamento pelo aparelho de comunicação.
- Me desculpe, não foi dirigido ao senhor, é que... Como posso
dizer...
- Desembucha logo, porquanto, estamos ficando sem poder aqui em
cima, está fera é muito doida mesmo, estou me divertindo mais... – A
comunicação sumiu.
- Arthur! Arthur! – Agora era Charles quem gritava, sob o olhar
atônito de Michael, quando perceberam que a comunicação foi cortada e, por
óbvio, pensaram somente o pior.
- Estou aqui! – ele respondeu mais ofegante. – Somente fui acertado
pelo bicho, ou seja lá o que isso deve ser denominado! Agora poderei
promover a equipe que desenvolveu este meu traje, realmente ele é muito
resistente. – Ele gritava para surpresa deles como uma criança que se divertia
em um parque.
Charles e Michael se entreolharam ao escutarem o que Arthur
estava dizendo, não falaram nada, mais ambos sabiam o que o outro achava:
Este velho é mais louco do que havíamos imaginado!
- Certo Arthur, o que Michael queria dizer é que aqui embaixo não
tem nenhum livro.
432
- Como assim nenhum livro?! Quer dizer que estou arriscando minha
existência por nada?! – Foi George que disse em seu radio. Como os
equipamentos eram todos interligados eles escutavam e poderiam interagir.
Contudo, pelo que veio depois parece que Arthur não gostava nada
de ser interrompido:
- Ai Arthur, porque fez isso. – George reclamou novamente pelo
aparelho.
- Isso é para apreender a não ficar dizendo bobagem! – Arthur
respondeu como um pai que acabará de bater em seu filho atentado.
- É mais atirar em meu colete enquanto estamos lutando com esta
fera foi sacanagem. – George respondeu com voz chorosa, como se fosse uma
criança.
Michael e Charles novamente se entreolharam, realmente o velho
era imprevisível.
- Arthur! E ai? O que devemos fazer? – Michael interrompeu a
briguinha infantil que estava ocorrendo enquanto enfrentavam uma fera
abominável.
- O que tem ai embaixo? – O velho respondeu novamente mais
ofegante, e, um som da fera interrompeu parte de sua voz.
Charles olhou melhor na pequena sala, para responder sem
nenhuma dúvida:
- Tem somente um amontados de pedras em forma de talhas. – A
resposta foi com voz de descrença.
- Seus burros! – Arthur gritou como um lunático, ao passo que os
sons ouvidos por Charles e Michael ao fundo da comunicação, tanto do
monstro quanto dos disparos das armas cessaram por alguns segundos,
parece que todos pararam por algum tempo diante daquele ataque verbal do
velho.
- Me... – Charles tentou ensaiar uma resposta mais não conseguiu,
as palavras não saíram.
- Não falei para vocês que se tratava de um livro antiguíssimo! –
Arthur tornou a gritar.
- Sim, mas... – Desta vez foram interrompidos ao darem a resposta
em uníssono.
- Não tem este tal de “mas” seus incompetentes! Acham que os
livros antigos eram todos em papel seus tolos! Este é tão antigo que o papel
não havia certamente sido inventado!
433
Michael e Charles primeiramente se entreolharam novamente,
haviam captado a mensagem bruta e louca de Arthur, após olharam para a
pilha de pedras em forma de lascas empilhadas.
- Como não havíamos pensado nisso, realmente há escritas
lascadas nas mesmas. – Charles balbuciava passando juntamente com
Michael as mãos nas pedras, sentindo e encantados com a beleza e magnitude
daqueles objetos.
- Entenderam patetas! – Arthur ainda estava muito zangado, e,
agora ele gemia, parecia que estava fazendo força.
Do lado de fora se via que o gemer era porquanto Arthur estava
segurando a cabeça da fera de uma forma estranha, e os agentes tentavam
acertar o bicho sem acertarem Arthur, o que de certa forma era quase
impossível devido a besta ficar se debatendo, fazendo com que o velho
parecesse um brinquedo grudado na cabeça de um leão.
– Andem, não sabemos se vamos aguentar por muito tempo, saiam
rapidamente com o livro! Ao saírem corram sem olhar para trás imediatamente
em direção à saída, despontem sem se preocupar conosco, porquanto, pela
lenda indígena que ouvi sobre o ser que estava preso aqui, ele não poderá sair
desta cidade tão cedo, assim, se cruzarem o portão o livro estará a salvo.
- E nós? – George arriscando a sorte resolveu questionar.
- Sairemos após, se der, e tenho que lhe advertir seu mer... – A
comunicação cortou novamente e eles somente puderam ouvir um forte grito
do Arthur.
- O senhor está bem?! – Foi Robson quem questionou com voz
rouca devido ao sufoco que enfrentavam.
- Sim, estou! – Arthur respondeu tossindo muito.
- Parece que ele caiu do bicho. – Charles disse para Michael pela
primeira vez desde que tudo aquilo começou sorrindo um pouco imaginando a
cara do George e de Arthur brigando em uma batalha em que eles deveriam
lutar unidos.
- Já peguei as cinzas, elas estavam naquela caixinha. – Michel disse
colocando a caixa em um grande bolso em sua calça.
Rapidamente Charles pegou cinco tabletes em cada braço, ao passo
que Michael pegou o restante.
- Você deixou mais para mim chefe! – Michael reclamou.
- Você é mais jovem. Além disso, estou indo na frente, assim, caso o
bicho atacar tenho que estar mais leve para conseguir desviar. – Ele respondeu
já subindo as escadas correndo.
434
Espertinho... O bicho poderá atacar tanto o da frente quanto o de
trás! – Somente pensou Michael zangado fechando o cenho e subindo as
escadas no encalço de Charles.
Ao cruzarem a saída da estranha entrada Michael quase abalroou
nas costas do chefe, porquanto, Charles havia parado subitamente por alguns
segundos quando avistou a cena de uma verdadeira guerra que acontecia.
- Nossa, pelo rádio e pela forma que Arthur e os outros estavam
discutindo e falando não dava para perceber que isto estava desta forma! –
Michael gritou para Charles que naquele momento já estava correndo em
direção à saída da cidade, ao passo que sequer respondeu-o, porquanto, lhe
faltava ar para carregar o livro, imagine para falar naquele momento.
O cenário realmente estava muito assustador, a fera estava muito
machucada, mais tentava a todo custo matar Arthur e os demais, não se
entregava sob nenhuma hipótese.
- Graças a Deus ela ou ele não viu Charles e Michael passarem! –
George disse, atirando e se desviando dos ataques da besta.
Contudo, ao dizer isso a besta parou subitamente, e, por óbvio,
olhou para Charles e Michael que já estavam ao longe correndo como loucos.
Então, em um salto a fera se desvencilhou deles e começou a perseguir os
dois que mesmo já tendo corrido muito, a vantagem aberta ainda era pouca
para conseguirem cruzar o portão de saída sem serem capturados.
- Você tinha que abrir este bocão não é George?! – Arthur vociferou
querendo matar o agente.
Eles começaram a seguir a fera, mais todos sabia que seria inútil,
certamente ela alcançaria os dois em questão de pouco tempo.
A fera corria de forma absolutamente desenfreadas, seu estranho
corpo de leão e seu tamanho lhe conferiam uma enorme vantagem na corrida,
se no ataque de perto ela não tinha muita vantagem, e, isto havia sido provado
na batalha anterior, na corrida ela era imbatível.
- Corra Michael. – Charles gritava eufórico com a boca já seca de
tanto correr, mesmo tendo um preparo físico invejável aquilo estava sendo
alucinante. – Mais rápido!
- O senhor tem que ver que estou carregando quase o dobro de
peso!!! – O grito de Michael foi tão forte que até promoveu um eco.
Arthur e os demais agentes tentavam a todo custo acertar a fera,
contudo, ao perceberem que ela estava não apenas indo rápido demais, mais
estava se desviando de todos os tiros, Russo gritou:
- Não atirem mais, esta coisa encontra-se desviando muito, e, assim,
podemos acertar Charles ou Michael que estão mais à frente.
435
Todos concordaram e pararam de atirar, foi quando se assustaram
ao perceberem o que Arthur estava fazendo, o velho simplesmente começou a
bater intermitentemente no peito de uma forma estranha e forte.
- O que você está fazendo? – Gritou Robson que estava mais
próximo dele.
- Esta merda deve ter estragado devido as pancadas daquele
monstro. Não consigo acionar o dispositivo para proporcionar uma corrida mais
rápida, se estivesse funcionando certamente já teria alcançado aquela
aberração! Ele encontra-se aqui no peito, desta forma, vou agir como os brutos,
batendo, porquanto, caso pare para analisar certamente não o alcançaremos
mesmo. – Ele se lamentava, contudo, não parando de bater no peito.
George como sempre intrometido, mesmo com a boca seca e
extremamente cansado, se aproximou de Arthur tentando correr bem pareado
com ele, ao passo que quando estavam lado a lado, o velho ranzinza e
desesperado berrou:
- O que pensa em fazer George? – Ele gritou já com o pouco de voz
que lhe sobrava pela corrida, eles discutiam mais não poderiam parar.
Mesmo também com pouquíssima força, e correndo como um louco
George respondeu com dificuldade:
- Confie em mim, abra os braços.
O que este idiota pensa em... – Arthur havia começado há pensar se
iria atendê-lo quando George subitamente em um movimento rápido pegou seu
escudo e bateu tão forte no peito do velho que ele foi quase que arremessado
para trás, não apenas devido ao impacto, mas, principalmente, pelo choque
repentino que o pegou totalmente desprevenido.
- Seu idio... – Arthur parou no meio do xingamento. E uma
esperança brotou no coração de George, não apenas que ele pudesse
alcançar a fera, mas, principalmente, em limpar a sua barra que estava
extremamente suja com o velho.
Arthur sequer respondeu, somente começou a correr em passadas
mais largas, e, em poucos segundos já estava muito a frente dos agentes, e,
George somente não chorou, porquanto, não tinha mais nenhum líquido em
seu corpo diante da excessiva transpiração e da boca completamente seca.
Somente um pouco mais a frente da fera Charles e Michael ainda
continuavam correndo feito loucos em disparada à saída.
- A saída é por aqui mesmo?! – Charles que estava mais à frente
questionou gritando, custando a abrir a boca, devido à mesma estar grudada
pela sensação de secura que lhe afligia.
Michael sequer respondeu, não porquanto não conseguia, mas
diante do ódio que estava sentindo por aquela situação toda. Ele não aceitava
436
estar levando quase o dobro de carga, além disso, sabia que estavam no
caminho certo, então tinha que poupar energia e saliva.
Contudo, após poucos segundos teve que dirigir a palavra para
Charles, não para responder seu questionamento anterior, mas para alertá-lo:
- É melhor nos apresarmos, porquanto, a fera além de ter vindo atrás
de nos encontra-se perto, já posso inclusive escutá-la.
Charles tentou se esforçar mais, contudo, não aumentou muito a
velocidade, não conseguia mais se movimentar para nada. Assim, ele decidiu
sabiamente no desespero que era melhor manter aquele ritmo, do contrário iria
desabar na primeira curva, as quais já eram muitas, além dos pequenos
degraus, e demais obstáculos.
Mais atrás Arthur já se encontrava bem mais próximo da fera,
contudo, ainda não era suficiente. – Acho que não será possível... – Ele pensou
se lamentando.
Michael que acelerou mais a corrida ultrapassou Charles, ao passo
que ainda teve que ouvir do chefe:
- Não te falei que deveria levar mais peso?! Está vendo. Se assim
não fosse eu já estaria estirado lá atrás!
Contudo, logo após dizer isso ele se estremeceu, porquanto, não
apenas ouviu o som dos grandes pés do monstro ao bater ao chão, como o viu
após olhar para trás quando escutou o som. E quando olhou para frente e nem
sinal de estarem próximos da saída, somente resmungou bem baixinho:
- Agora estou perdido, afinal, não tenho forças sequer para correr,
quanto mais lutar, vou morrer...
Michael havia também percebido tudo, e, inclusive, escutado
algumas partes do resmungar do chefe. Contudo, sabia que ele ainda tinha
forças pelo menos para se defender até os outros o alcançarem para ajudá-lo.
Mais se eles já estiverem mortos? – Este pensamento lhe brotou de
repente, e seu ser gelou completamente.
Quando Arthur viu que estava próximo da fera não teve sequer um
minuto de alegria, porquanto, ao avistá-la viu também Charles somente um
pouco mais a frente.
Não terá jeito, eles serão pegos... – O velho raciocinou o óbvio.
437
CAPÍTULO 104
São Paulo – Brasil, 1982
A noite chegou, e nem sinal de qualquer movimentação diferente.
Antônio e Damião estavam bem longe dos moradores de rua, escondidos atrás
do monte de latas as quais anteriormente serviram de bancos para lancharem.
De repente, um bando novo de moradores de rua começou a chegar
junto àqueles que já se encontravam ali o dia todo.
- Será que algum deles é o tal de Lucas? – Questionou Antônio.
Damião não respondeu, estava com o olhar fixado nos novos
mendigos que acabaram de chegar.
- Damião?
- O que foi Antônio?! – Respondeu o amigo impaciente, quase que
gritando mais interrompendo o impulso no último instante.
- Não acha que devemos ir lá conversar com eles?
- É isto que vamos fazer, venha! – Respondeu Damião, já se
levantando e se dirigindo à multidão agora formada de moradores de rua, os
quais já estavam acendendo fogueiras para se aquecerem da noite gelada que
estava por vir.
- Por favor, algum de vocês se chama Lucas? – Questionou Damião
em alto e bom som, contudo, mostrando-se extremamente educado.
Os mendigos já não lhe olharam com desconfiança, mas com
enorme respeito, afinal, aquele homem matará a fome deles naquele dia.
Em questão de minutos um morador de rua enorme levantou-se, sua
estatura era assustadora, não se podia ver seu rosto, devido ao enorme capuz
que ele usava, o qual deixava somente uma enorme sombra em sua face.
Quando o mendigo levantou-se, Damião percebeu que todos os
moradores de rua que haviam chegado pouco antes vestiam roupas
semelhantes, e traziam enormes sacos amarrados às costas. Estavam como
maltrapilhos, mas tudo parecia forjado, não eram mendigos realmente.
- Acho que caímos realmente em uma armadilha! – Cochichou
Damião para Antônio, o qual sequer se mexia.
Eu avisei! – Somente pensou Antônio, não querendo dizer isso para
o amigo, para não irritá-lo ainda mais naquela hora.
Damião segurou forte na maleta, mas sabia que se aquele sujeito
enorme ataca-se sequer teriam tempo para abri-la...
438
O enorme sujeito parou bem próximo aos dois, e mesmo assim, não
era possível ver seu rosto, mas lhes dirigiu uma voz grossa e poderosa aos
seus interlocutores:
- Por gentileza, vi o que os senhores fizeram por estes irmãos a
tarde. Contudo, lhes digo que tem pessoas nos vigiando! Portanto, recomendo
que vocês joguem algumas moedas ao chão, e se dirijam para trás daquele
pilar, chegando lá, fiquem próximos às crianças e das mães...
Damião ficou espantado, a voz daquele sujeito era cortante, e
correspondia perfeitamente a sua estatura, sendo grossa e ao mesmo tempo
rouca, contudo, a educação e tom com que respondia, surpreendeu aos dois,
os quais imediatamente retiraram algumas moedas dos bolsos das batinas,
jogando-as ao chão.
- Agora vá para o local que eu ordenei! – Ordenou o sujeito enorme.
Damião e Antônio imediatamente acataram a ordem, não estavam
em situação de protestarem.
Logo após eles saírem, o sujeito voltou a sentar-se junto ao grupo.
Quando chegaram até o local indicado, os dois assustaram-se,
porquanto, todas as crianças estavam encolhidas juntas, e as mães as
abraçavam. Damião pôde perceber que nas mãozinhas das crianças estavam
os rosários que ele distribuiu.
- Damião, você acha que aquele sujeito está prendendo estas
crianças e mães? E o que ele quis dizer com: nós estamos sendo observados?
- Não sei, mas acho melhor ficarmos aqui com estas pessoas. Vou
deixar aberta a maleta, se algo vir, podendo ser aquele homem ou outra coisa,
não diga nada, pegue armas e defenda-se!
Antônio ficou assustado, nunca havia presenciado uma batalha com
o amigo, era evidente que ele não tinha ponderações quando o assunto era
proteger crianças, afinal, seu maior dom era este, por isso foi escolhido para
proteger Joana em seu nascimento.
Após uns trinta minutos, Antônio e Damião já se questionavam se
algo ia acontecer naquele local, estava tudo muito quieto, e os mendigos que
ficaram pareciam que estavam tentando transparecer para alguém que tudo
estava transcorrendo como um dia comum.
De repente ruídos vindos de longe cortaram o silêncio...
- O que é isto Damião?! – Antônio não conseguiu esconder o medo,
que transpareceu em seu questionamento que veio carregado de assombro.
- Acho que é barulho de motocicletas!
439
Em questão de minutos os ruídos se tornaram mais próximos, e
junto aos sons dos motores das potentes motocicletas, vinha risos e gritos, que
mais pareciam de loucos ou drogados.
Damião e Antônio colocaram as cabeças na tentativa de olharem o
que, ou quem estava vindo, contudo, para suas surpresas o que viram não era
nada bom...
Eles avistaram na média de uns quarenta motoqueiros se dirigindo
na direção dos mendigos, e suas intenções não eram das melhores, eles
gritavam como se quisessem apavorar os pobres indivíduos, e pareciam
estarem armados, muitos deles rodavam correntes, mais certamente tinham
outras armas.
As grandes maiorias dos arruaceiros estavam com enormes tochas
nas mãos, e gritavam frases ameaçadoras como: “vamos colocar fogo nestes
vagabundos!” entre outras.
- Temos que ajudá-los Damião! – Antônio ficou desesperado, não
entendia nada de batalhas, mais tinha que fazer alguma coisa.
Damião olhou para o amigo, aquilo era o certo, mas não o sensato a
fazer pelo menos naquele momento.
- Acho que não teremos muita chance com aquela gangue... Além
disso, temos que ficar para proteger estas crianças e mulheres, se eles os
acharem, ai sim será uma carnificina! Deve ser que aquele homem queria que
ficássemos aqui para ocultarmos e acalmarmos estas pessoas.
Antônio concordou somente assentindo com a cabeça.
Após muita algazarra, os motoqueiros foram estacionando suas
grandes motocicletas formando um circulo perfeito em volta da parede que os
mendigos se encontravam, tudo levava a entender que eles queriam
literalmente cercar todos os mendigos para não fugirem, e, principalmente, de
uma forma que não sobrasse ninguém para contar história.
- Isto não me parece nada bom Damião! Acho que eles rapidinho
vão matar aquele mendigos, e, após, quando perceberem que não há crianças
e mulheres certamente vão dar uma busca. Quando nos encontrarem não
teremos chance, não temos sequer como fugir deste beco.
Damião não respondeu, somente olhou para o amigo, ele tinha
razão, estavam em uma situação extremamente perigosa.
Os mendigos altos e fortes que estavam de capuzes, os quais
chegaram pouco antes de Damião e Antônio se aproximaram, pareciam não
ligarem muito para os motoqueiros, eles permaneceram conversando entre si,
e aquecendo as mãos nos galões de fogo que haviam acendido minutos antes.
440
Os outros moradores de rua que estavam ali durante toda tarde,
foram todos se dirigindo para um canto, como se quisessem se proteger, mas
não tinham muita saída.
Os motoqueiros foram se aproximando, e à medida que chegavam
mais perto, Damião pôde perceber um forte e alto motoqueiro que parecia ser o
líder. Ele tinha cabelos compridos, e uma enorme barba, aparentando ter uns
cinquenta anos, o que contrastava ao seu tipo totalmente maloqueiro, tecendo
algumas ordens para seus companheiros, onde podia se ouvir: “vá por aquele
lado!”, “Não deixe ninguém fugir!” “Faça-os sentirem muita dor!”, entre outros...
À medida que iam recebendo as ordens do grandalhão, os outros
motoqueiros iam cumprindo, e aos poucos foram apertando o cerco aos
mendigos já acuados.
- Avancem homens, não quero que sobre ninguém! Façam estes
vagabundos sentirem enorme dor, matem eles aos poucos, cortando membro
por membro! – Gritou por fim o sinistro motoqueiro grandalhão...
441
CAPÍTULO 105
Berlim – Alemanha, 1982
- Você prometeu que nada iria acontecer à minha filha! E agora me
vem com isso! – Pierre gritava de sua poltrona em seu escritório em Berlim,
como sempre havia mentido sobre a viagem para outro País somente para ficar
longe de Estela, ao passo que à frente dele uma figura muito estranha somente
o observava.
O interlocutor do pai de Estela era um homem ruivo, seus cabelos
eram vermelhos como fogo, tendo um estranho bigode da mesma cor, em
forma de caracol. Era extremamente pálido aonde se chegava a ver suas veias,
e os olhos era de um verde musgo. Vestia um terno impecável, com uma
gravata borboleta excêntrica, a qual era de uma cor viva que contrastava ao
fraque. Ele olhou com seus grandes olhos diretamente para Pierre, o qual
desviou o olhar, dizendo:
- Eu sou um comerciante meu amigo. Vendo o que ninguém quer ou
pode vender, mais cobro o preço justo, porquanto, na lei da oferta e da procura
posso lhe dizer que isso será uma bagatela.
- Bagatela?! – Pierre gritou transtornado, mais ainda assim não
olhando diretamente ao homem. – Minha filha foi abusada por um maluco
estranho, e o que aconteceu naquela noite não foi definitivamente nada normal!
E, você me vem dizer que isso é uma bagatela?!
- Sim. – ele foi categórico. – E digo mais! Você não tem como
reclamar, porquanto, sabia dos riscos... – fez uma pequena pausa observando
que Pierre ainda não o encarava. – E quero que saiba que meus patrões não
gostam de pessoas que tentam gracinhas, por isso fique na sua cumprindo o
combinado até o fim.
- Ficar na minha?! O médico me telefonou dizendo sobre uma
história de minha pequena Estela estar... – às palavras pareciam ter sumido,
então apenas concluiu de uma forma engasgada. – grávida!
- Sim, conforme nosso contrato rege, eu teria uma noite com sua
filha, podendo escolher o cliente. Em troca você receberia status e glamour no
mundo profissional, e, ainda, ao final do acordo sua filha voltaria a ser uma
pessoa normal. Creio que tudo esta conforme restou acordado.
- Acho que o senhor não entendeu. Eu disse que minha filha está
grávida, creio que isso não estava dentro do contrato.
- Mais o que você acha que ocorre em uma noite de amor? Às
consequências são consequências, não podemos ter o prazer sem enfrentálas.
- Isso não é consequência, isso é abominável, vocês me enganaram
para usar minha filha para gerar o que nem sei o que é.
442
- Você, um advogado de tanto talento dizendo que foi enganado
pelas cláusulas de um contrato que você leu e releu?! Por favor, me poupe
meu caro Pierre.
Após dizer isso Pierre se perdeu um pouco em seus pensamentos,
e, o homem já estava saindo do escritório quando advertiu:
- E saiba que se algo acontece à criança, você e sua família, ou
melhor... – a pausa veio mais como uma forma de deliciar-se com a situação. –
Filha, porquanto, são somente dois em toda aquela mansão! Irão arcar com as
consequências pessoalmente com meus patrões.
Ao bater a porta o estranho mercador deixou para trás um homem
acabado.
443
CAPÍTULO 106
São Paulo – Brasil, 1982
Quando os mendigos já estavam para serem aniquilados, algo
estranho aconteceu. Os mendigos encapuzados começaram a se levantar, e o
mais alto, o qual havia ido conversar com Damião e Antônio anteriormente,
tomou à frente deles, gritando:
- Isso ai homens! Vocês ouviram as ordens do balofo, não é para
deixarem ninguém fugir, por isso, vamos cercar mais bem este lugar!
Em questão de segundos os mendigos encapuzados retiraram dos
sacos que estavam nas suas costas enormes armas, mirando imediatamente
para os motoqueiros, os quais rapidamente se jogaram ao chão, mesmo
estando armados, visto que não aguardavam tal reação.
Para espanto ainda maior, nenhum mendigo atirou em qualquer
motoqueiro, os quais tentaram era retornarem para as motos que eles haviam
colocado ali cercando o local antes do ataque final.
Porém, antes destes chegarem, os mendigos, ou melhor, agora
restando claro serem falsos mendigos, atiraram todos nos tanques das
motocicletas. Os tiros eram certeiros, e as grandes motos começaram a
explodir, formando um grande cerco de fogo! Agora literalmente tudo estava
cercado...
Damião e Antônio não acreditavam naquilo que seus olhos viam, era
realmente inconcebível. A habilidade daqueles homens era extraordinária,
pareciam ser um esquadrão de elite, os tiros foram certeiros, não
desperdiçaram nenhuma bala.
- Rápido irmãos! A isca funcionou, agora corram para junto de suas
famílias! – Ordenou o grande homem encapuzado aos mendigos acuados, os
quais foram imediatamente se levantando e correndo em direção onde se
encontrava Damião e Antônio, estavam tão atordoados que pareciam baratas
correndo de um inseticida.
Os motoqueiros ao perceberem que a situação havia se invertido,
estavam atordoados, para onde olhavam não viam saída, somente chamas que
cercavam todo local, a única forma de saírem vivos era lutar...
Todos os motoqueiros foram se levantando, e começaram a contraatacar.
O grande mendigo de capaz soltou uma enorme gargalhada, o medo
dos motoqueiros parecia excitá-lo. – Vamos homens, lembre-se de minhas
ordens, quero todos eles vivos e crucificados naquela parede! – Disse aos
homens e apontou para uma enorme parede que se encontrava ao lado deles.
- Crucificados?... Como assim?! – Questionou Antônio assustado
após ouvir as intenções daqueles mendigos, que naquele momento pareciam
tudo para ele, menos moradores de rua...
444
Damião não respondeu, porquanto, prestava atenção em tudo.
Aquilo lhe intrigava, visto que era realmente muito estranho ver aqueles
homens vestidos de mendigos mais que pareciam soldados antigos! Ele podia
sentir a forte energia deles de longe, parecia que lutavam lado a lado há
milênios, a interação, a organização, frieza, tudo levava a crer que não eram
simples homens...
De repente uma forte explosão chamou a atenção de Damião,
retirando-o de seus pensamentos, parecia uma bomba que fez tremer tudo. Os
mendigos que haviam corrido do local da batalha e estavam acabando de
chegar ao local de abrigo caíram ao chão, mais por medo do que pelo abalo do
chão.
Damião e Antônio correram para ajudá-los, e quando Damião olhou
para os homens de capuzes não acreditou, não viu nada, somente uma fumaça
cobria o local, parecia que a bomba explodiu tudo. – Será que eles morreram?!
– Pensou ele assustado.
O coração de Damião começou a bater muito forte, visto que era
certo que se aquele homens de capuzes morreram na explosão, o que era
inevitável, em poucos minutos os motoqueiros estariam atacando aquele local,
e para piorar eles não tinham saída...
445
CAPÍTULO 107
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
Para não tentar pensar no ser que já estava próximo Michael
começou a pensar no que havia aprendido na ordem secreta sobre tal ser
mitológico:
Em muitos mitos este ser representa proteção. Lado outro, é certo
que na mitologia grega a esfinge não representa proteção mais perigo. Pelo
que vejo realmente estavam certos os relatos de que ela é um monstro cruel,
que ainda era perversa e se dizia bondosa ao propor difíceis enigmas a
viajantes, ao passo que, se não conseguissem decifrá-los, eram devorados
pelo monstro. Há, e ainda tem a parte que ela se encontra presente na lenda
de Édipo, que decifra o enigma por ela lançado e depois parte para o seu
destino fatal, simbolizando, assim, o perigo inevitável. Raciocinando assim,
posso, portanto, afirmar com certeza que as pessoas que utilizavam seu
simbolismo como proteção estavam certas, porquanto, pelo que percebi hoje
ela protege itens valiosos. Mais porque ela não propôs nenhum enigma e foi
logo nos atacando de longe? – era estranho, mas Michael não parava de
raciocinar e se questionar, isso o acalmava muito em situações como aquela,
sempre acreditou que se ficasse prestando muita atenção quando precisasse
correr de algo, seu coração iria disparar mais, sua pressão, tudo, fazendo-o
gastar nisto parte de suas energias, por isso, não parava de correr e raciocinar.
– Já sei, ela deve não ter proposto qualquer enigma porquanto nesta era é
sabedora que com armas modernas e outros itens mesmo que proponha e
ganhe terá que lutar, assim, ela protege sem qualquer enigma, tentando ao
máximo que o individuo não chegue próximo ao que se encontra guardando.
- Michael! – Charles gritou acordando o agente de seus devaneios.
- O que foi? – Ele disse como se estivesse prestando atenção em
tudo desde antes.
- A besta está muito próxima, e a saída muito longe, o que vamos
fazer?
- Chefe, literalmente eu não sei. Creio que continuar correndo e
rezar por uma graça seria a escolha mais sensata! Porquanto, se todos os
agentes foram derrotados pela fera, se pararmos para lutar será suicídio.
Arthur estava muito próximo da fera, contudo, não conseguia chegar
ainda mais perto, foi quando algo surpreendeu a todos...
446
CAPÍTULO 108
São Paulo – Brasil, 1982
Damião não acreditou no que seus olhos viam... Várias balas
estavam cruzando a fumaça provocada pela bomba, disparadas de dentro da
cortina de fumaça formada pelas explosões em direção aos motoqueiros, os
quais, antes das balas começarem a acertá-los estavam cantarolando de
alegria, crentes de que as várias granadas que arremessaram nos misteriosos
homens de capuzes haviam desintegrado os mesmos, mas parecia que haviam
cantado vitória antes da hora...
As balas acertavam os motoqueiros nas cabeças, e estes com o
forte impacto eram arremessados para trás, a precisão dos disparos
assustavam. Damião percebeu que todas disparadas encontraram seu destino
bem na cabeça de um motoqueiro, esteja ele parado ou correndo de medo.
Os motoqueiros estavam novamente atordoados, os que ainda
estavam de pé, disparavam suas armas para qualquer lado, tendo em vista que
não viam sequer de onde vinham as balas que lhes acertavam, devido a forte
fumaça que agora estava chegando até eles levada por uma rachada de vento.
À medida que a fumaça ia de encontro ao local onde se
encontravam os motoqueiros, Damião começou a ter uma visão mais nítida do
local onde estavam os homens de capuzes, ponto em que minutos antes, havia
sido alvejados por séries e mais séries de granadas.
- Aquilo não pode ser real! – Disse Antônio para Damião ao ver
também o local onde estavam os homens de capuzes.
Damião novamente não respondeu, suas dúvidas estavam sendo
esclarecidas, aqueles homens não eram normais, eles possuíam uma
capacidade de combate extraordinária, misturavam técnicas antigas, com
equipamentos militares de última ponta.
Realmente a surpresa dos dois era compreensível, o que eles viam
era algo surpreendente, ou melhor, o que eles não viam, já que somente
podiam avistar uma carapaça perfeita, que mais parecia uma grande caixa
metálica, e os tiros que acertavam os motoqueiros direto nas cabeças vinham
de alguma forma lá de dentro...
- O que é aquilo Damião? Como aquela caixa foi parar ali? E ainda
mais soltando tiros como se fosse um tanque de guerra? – Questionou Antônio
atordoado.
Antônio estava espantado, mas Damião entendia o que aqueles
homens haviam feito.
- É uma técnica militar utilizada já há muitos anos atrás, a qual
consiste simplesmente de todos os soldados usarem os escudos juntos de
forma a formarem uma carapaça, com isto nada poderá atingi-los, é a perfeita
união que faz a força... – Respondeu Damião, interrompendo os ensinamentos,
447
devido ao fato de que parecia que todos os motoqueiros já estavam caídos ao
chão.
- Mas aquele revestimento não pode ser escudos! – Antônio não se
deu por satisfeito. – Mesmo agora que a fumaça se extirpou e a imagem é
nítida, não consigo enxergar qualquer ponto não coberto na carapaça, o que
não se admite, tendo em vista que nem se eles fossem muito treinados não
conseguiriam formar uma proteção com tanta perfeição.
Damião teve que concordar com o amigo, aquilo era perfeito, não
apresentava nenhum vestígio de qualquer ponto descoberto.
Contudo, quando o último motoqueiro caiu ao chão, os dois se
espantaram, porquanto, uma forte voz ecoou de dentro da carapaça... Eles
logo reconheceram a voz do enorme mendigo encapuzado, dando mais ordens
aos seus companheiros.
- Homens! Desativar imã fixador dos escudos!
E como passe de mágica, um forte estalo irradiou da carapaça,
como uma onda magnética, e em segundos as chapas de metal começaram a
se moverem aos poucos...
Quando Damião e Antônio perceberam que eram realmente escudos
presos as mãos dos homens, suas expressões não eram mais de dúvida, mas
de incerteza, aquilo era ao mesmo tempo aterrorizante e esplêndido.
Quem são estes homens? Como possuem tanto treinamento?
Estas somente foram algumas das perguntas que eles teciam em
suas cabeças, mas que não questionaram um ao outro, logicamente,
porquanto, sabiam que nenhum deles teria qualquer resposta.
Os homens encapuzados largaram os escudos e corriam com
perfeição em volta dos motoqueiros caídos ao chão, alguns recolhiam suas
armas, e outros os arrastavam para próximo à parede, antes indicada pelo
mendigo enorme, que para todas as circunstâncias aparentava ser o líder.
Em questão de minutos todos os motoqueiros estavam amontoados
próximo ao muro, e um dos homens encapuzados se dirigia ao local onde
estavam os escudos arrastando um grande saco com todas as armas
recolhidas.
Tudo era feito com extrema perfeição e sincronismo.
- Será que eles vão queimar os corpos?... – Questionou Antônio,
sendo interrompido por algo que acabara de ver e que em parte respondia a
sua pergunta, parecia impossível, mais de uma forma estranha os motoqueiros
estavam se remoendo no chão, como se estivessem se contorcendo de dor,
certamente não estavam mortos...
448
- Vamos lá, preguem-nos neste muro, que já volto para iniciarmos o
trabalho. – Disse o enorme homem encapuzado, retornando ao local onde
estavam os escudos e as armas.
- Como assim “preguem-nos”? O que este homem pretende fazer
com aqueles motoqueiros? – Questionou Antônio que ainda não acreditava
naquilo que estava presenciando.
- Não sei, mas se minha memória não falha, antes de iniciar isto
tudo, este homem falou aos seus colegas encapuzados que queria os
motoqueiros vivos, e que iria crucificá-los... – Respondeu Damião,
demonstrando sua preocupação, mais ainda não acreditando que aquilo seria
levado a cabo.
Contudo, suas dúvidas viraram certeza quando eles viram o que o
grande homem foi buscar próximo aos escudos e armas, pareciam serem
enormes pregos, os quais cintilavam devido ao fogo à volta. Junto aos pregos o
homem pegou uma enorme sacola, e saiu calmamente arrastando as mesmas
voltando novamente para junto dos outros homens.
- Temos que fazer alguma coisa! – Disse Antônio assustado.
- Não vamos fazer nada! Não sabemos quem são aqueles homens,
e temos é que proteger estas pessoas.
- Proteger estas pessoas daqueles homens? Não seja tolo Damião!
Eles acabariam conosco antes mesmo de nós piscarmos, você mesmo viu,
eles acabaram com quase cinquenta homens em questão de segundos, e
agora parece que estão prontos para crucificá-los!
- Então Antônio você mesmo se respondeu! Já que não temos
chance com eles, como faremos alguma coisa?
Antônio calou-se arregalando os olhos, o que o amigo estava
falando fazia enorme sentido, eles não tinham opções...
Quando olharam para os homens encapuzados levaram um susto,
visto que avistaram que eles já haviam pregado às mãos e os pés de pelo
menos cinco homens, e a velocidade com que eles faziam isto era algo
assustador... Enquanto dois levantavam um já ia pregando, e isto tudo
simultaneamente.
Os gritos de dor eram inevitáveis, e, em questão de segundos, o
silêncio do local foi quebrado por uma série de gemidos e enormes gritos de
aflição.
Antônio virou-se para Damião, contudo, não emitiu nenhum som,
mas seus olhos diziam tudo, aqueles homens encapuzados somente poderiam
ser demônios, porquanto a frieza deles em fazer aquelas atrocidades era
absurda, e pareciam gostar do que estavam fazendo. Devia ser uma legião do
mal, treinada para acabar com tudo a sua volta, um verdadeiro exército das
trevas...
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CAPÍTULO 109
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
Quando tudo parecia perdido, porquanto, Arthur não conseguia se
aproximar o suficiente e em tempo. Bem como, Charles e Michael já estavam
literalmente nas mãos da besta, ou melhor, patas! Algo inusitado ocorreu...
A Esfinge simplesmente caiu ao chão se prostrando, e Arthur que
não esperava pelo tombo quase trombou na mesma.
Sua queda ocorreu tão repentina e brusca que ao rolar com a queda
a Esfinge quase esmagou Charles e Michael com seu grande corpo.
O tombo foi tão grande que atordoou a besta, a ponto dela ficar tanto
tempo parada que os agentes que chegavam após correr muito e alcançar
Arthur que estava analisando a mesma de prontidão já sentiam um pouco de
esperanças dela estar morta.
Charles e Michael por outro lado não quiseram colocar nada em
risco, mesmo sem qualquer folego continuaram correndo.
- Como ela caiu desta forma? – Foi George que questionou
apontando para a besta com olhar perplexo.
Em instantes todos se espantaram, porquanto, um pequeno sorriso
se fez ecoar de trás de algumas rochas empilhadas, onde há muitos anos
deveria ter sido alguma construção, contudo, naquele momento não passavam
de um amontoado de escombros.
Ao escutarem o sorriso todos os agentes e Arthur viraram-se
rapidamente apontando às miras a laser das armas para o local, foi quando
perceberam o que estava ali, e não acreditaram...
450
CAPÍTULO 110
São Paulo – Brasil, 1982
Damião e Antônio assistiam a tudo perplexos, afinal, tudo
acontecerá tão rápido que eles não tinham mais qualquer reação, e no fundo
sabiam que nada poderiam fazer.
Os homens já estavam acabando de pregar o último motoqueiro na
parede.
Do local onde se encontravam Damião e Antônio não podiam ver os
corpos pregados, somente se ouviam os gritos de aflição, e os risos dos
homens encapuzados, seus rostos ainda continuavam um mistério...
- Você não acha estranho eles esconderem os rostos? Afinal de
contas, um demônio encarnado em qualquer homem não necessitaria ter
privacidade de suas feições materiais, já que o corpo não lhe pertence! – Disse
Damião quebrando o silêncio aterrorizante que havia se formado.
- É mesmo... Não havia pensado nisso! – A resposta de Antônio veio
mais em tom de alívio, queria acreditar que eles não fossem demônios.
Quando os corações de Damião e Antônio passaram a bater mais
aliviados com a recente e ainda precoce conclusão que havia sido alçada, suas
esperanças se esvaíram novamente. O grande homem bateu nas costas de
alguns de seus companheiros, lhes deu algumas ordens que eles não puderam
entender, e após começou a andar em direção ao local onde eles se
encontravam.
- O que faremos agora Damião? – A aflição justificável de Antônio
restou evidente, visto que suas palavras vieram carregadas de forma eufórica
pela adrenalina.
Damião abriu a maleta, pegou um pote com água em uma mão, e na
outra uma arma.
- Vamos! Pegue uma arma e um pote de água benta, se o exorcismo
deste infeliz não der certo, não podemos ter piedade... Manda bala nele!
Antônio virou-se para os mendigos, principalmente as crianças:
- Todos fiquem aí nesse canto, e não saiam para nada, nada
mesmo!
Eles mantiveram a mão com a arma escondida nas costas, e fingiam
que estavam bebendo a água do pote, quando os passos pesados e
carregados começaram a serem ouvidos, eles sentiram que o homenzarrão
estava próximo, muito próximo...
Mal apontou na abertura do beco, Damião e Antônio imediatamente
jogaram o conteúdo de água benta dos potes na cara do grande homem
451
encapuzado, e começaram a rezar um em latim e outro em aramaico iniciando
o exorcismo.
Lado outro, aquilo estava muito estranho, o homem sequer se
mexeu com a água benta, não saiu nem fumaça de sua pele, algo incomum.
Será que seu poder é maior ainda do que pensamos? Pensou
Damião.
Quando retiraram as mãos das costas, e o homem encapuzado viu
as armas em suas mãos, em questão de segundos ele colocou as mãos nas
costas, e quando as abaixou, lançou duas coisas brilhantes rumo às armas, e,
inesperadamente, antes que eles pudessem pelo menos pensar em atirar, as
armas não mais estavam em suas mãos, caíram com o impacto daquilo que foi
arremessado.
Eles ficaram atordoados, sequer haviam entendido o que tinha sido
atirado em suas direções a ponto de retirarem suas armas somente com um
forte impacto e pouca dor, e quando olharam para o chão, puderam ver qual
eram os objetos capazes de tamanha façanha, dois pequenos bumerangues
prateados.
Não acreditaram. A velocidade e precisão daqueles pequenos
objetos, diziam tudo sobre o homem que os lançou, ele não era apenas ágil,
era um dos melhores, um verdadeiro Deus da guerra...
- Por favor, faça o que quiser conosco, mas deixe estas pessoas
irem! Eles são famílias, sofrem com a miséria, e permanecem assim não
porque querem, simplesmente é porque tem alguma pendência há passar, e
juntos! São unidos e solidários, por isto lhe rogo meu senhor que deixe os
mendigos irem, não iremos mais resistir... Tem ali crianças! – Implorou Damião
com lágrima nos olhos, clamando de uma forma bem autentica e desesperada
por piedade com as mãos para cima.
Antônio nada falou, ficou quieto, parado, mudo, sentia a morte se
aproximar, mais não tinha medo, sabia que algo melhor lhe esperava, somente
ficava pesaroso por não ter conseguido cumprir sua missão.
Inexplicavelmente o homem soltou uma enorme gargalhada, e falou
calmamente:
- Vocês resistirem?! Isto deve ser alguma piada! Nem em seus
melhores sonhos conseguiriam resistir a um ataque meu!
Damião e Antônio ficaram atordoados, parecia que aquele homem
além de matar, gostava de caçoar de suas vítimas. Contudo, inexplicavelmente
seus semblantes se modificaram quando viram o que o homem fez em
seguida.
Aos poucos ele foi retirando o enorme capuz, e eles já estavam
preparados para ver alguma figura demoníaca horripilante. Contudo, o que
viram os chocaram ainda mais, devido a ser totalmente inesperado...
452
CAPÍTULO 111
Berlim – Alemanha, 1982
- Vilalba! Estou ainda em Berlim. Não quero que conte para Estela. –
Pierre dava às ordens ao telefone, contudo, seu ser estava aniquilado, e a
empregada notou isso...
- Porque se encontra tão triste doutor? Algum problema?
- Não! – ele respondeu de uma maneira grosseira. – Somente diga
para Estela que estarei fora por mais um tempo, após conversaremos a
respeito.
- Tudo bem senhor. – Respondeu a empregada já desligando o
telefone. Sabia que Pierre poderia ficar até mesmo agressivo, então resolveu
responder e desligar o mais rapidamente possível.
- Quem era no telefone? – Questionou Estela descendo às escadas
da mansão.
- Era seu pai. Ele queria saber como você estava e lhe dizer que em
breve estará de volta. Falei que você estava no banho conforme havíamos
combinado.
- Muito bem minha amiga, se ele voltar a ligar vá inventando
desculpas. – Estela disse já se dirigindo para o jardim.
Vilalba percebendo que a menina iria ficar sozinha em seus
pensamentos, como sempre gostava, resolveu dizer:
- Lembre-se que amanhã teremos que ir fazer os exames clínicos
para checar se se encontra tudo certo com o bebê.
- Certo Vilalba, ligue para o hospital e marque tudo, quero estes
exames prontos.
Vilalba se assustou com a forma da resposta, parecia que Estela
estava mais forte, como se estivesse não apenas mais convicta de suas
decisões, mais inexplicavelmente ela transmitia uma autoridade que não lhe
era comum...
453
CAPÍTULO 112
São Paulo – Brasil, 1982
Quando o homem misterioso acabou de retirar o capuz, o espanto
de Damião e Antônio era visível, eles estavam literalmente de bocas abertas
devido à surpresa.
Ao contrário do que imaginavam, certamente não se tratava de um
demônio, mas sim de um jovem que devia contar com no máximo vinte e oito
anos. Seus cabelos eram lisos e um pouco longos, rentes ao ombro, loiros em
tom de mel, e sua pele era rosada, possuindo penetrantes olhos azuis que
brilhavam com os feixes de luzes que vinha de um pequeno poste próximo a
entrada do beco.
Para completar, o jovem exibiu um sorriso cativante aos dois,
mostrando possuir dentes perfeitos.
- E ai meus amigos... Então vocês acham que eu sou um demônio?
Um ser das trevas! Ou algo deste gênero. Para retirar tais suspeitas, me
permitam me apresentar. – ele fez uma reverência, como se estivesse
agradecendo ao publico em uma peça teatral. – Atendo atualmente pelo nome
de Lucas, e em outros momentos já tive vários nomes nesta dimensão material.
Atendido como Rei, príncipe, etc., sendo o principal e mais conhecido
Alexandre, comumente chamado de Grande, Alexandre o Grande! Nesta minha
forma que possuo desde que deixei a cidade, devido a uma concessão, eu e
meu exército permanecemos imortais, desde aquela época meu corpo material
não mudou.
Damião e Antônio estavam completamente atordoados. Aquele não
poderia ser ele, mas a destreza, força, capacidade de comando, afinal, tudo era
inegável, estavam diante de um dos mais famosos Deuses da mitologia, o
verdadeiro Deus da guerra.
Segundo a lenda, o Deus da guerra teria descido a dimensão
material pela última vez como Alexandre, e, desde então, sumiu
misteriosamente de todas as dimensões.
Então agora está explicado, ele nunca regressou para a forma
imaterial devido a esta concessão, que deve ser uma forma de maldição... –
Damião raciocinava quase sorrindo com aquilo, estava diante de um ser muito
mais experiente que ele, mais ao mesmo tempo, amaldiçoado como um
simples mortal. – Mais ser imortal não seria a pior das maldições! – Concluiu
ele, por óbvio, também em pensamento.
Antônio por outro lado também conhecia a história do Deus da
guerra, e raciocinava também naquele momento sobre o que sabia:
Como dizia a lenda, quando os criadores ordenaram à descida dos
Deuses para a dimensão material para encarnarem como humanos, e, assim,
sentirem na pele o que eles passavam, ele se mostrou o mais entusiasmado,
dizendo que estava muito ansioso para lutar ao lado dos homens, não para
destruir, mas para libertá-los de tiranos, e uni-los em uma causa maior.
454
- Vocês devem estar se perguntando como uma concessão de
imortalidade seria boa, e, ao mesmo tempo seria ruim, mais saiba que é ruim
no final das contas... – sua pausa veio carregada, como se de alguma forma
estivesse cansado. – Além disso, a dimensão material acaba com a alma de
um ser que sempre viveu para lutar, porquanto, aqui você tem que lutar até
mesmo com você mesmo para não cair em tentações. – O jovem disse.
- Pelo que diziam na dimensão sublime, você nunca parou! Esteve
em todos os grandes eventos de revolução, e seu principal triunfo teria sido na
encarnação como Alexandre, onde conquistou meio mundo de sua época. Até
que sumiu... Ou melhor, agora sei a verdade. – Disse Antônio.
- Pelo que ouvi, para muitos você foi um louco, para outros um
verdadeiro Deus na terra, mais é inegável que revolucionou a sua época e o
rumo da história com sua espada e sede de união. – Damião deu forças ao
perceber que Lucas, ou melhor, Alexandre estava um pouco desanimado ao ter
comentado como era difícil enfrentar o que ele estava chamando de
concessão.
- Eu fui um dos primeiros membros do Conselho Supremo, sendo
minha ascensão após a retirada de meus poderes de Deus mitológico rápida,
devido o fato de que em todas as minhas estadas na dimensão material,
montei cidades, derrubei Reis tiranos, fui político influente, levei conhecimento
onde antes somente havia desinformação e ignorância, dei um verdadeiro
pontapé para a evolução do homem, e isso, utilizando da batalha física e
intelectual, sempre pautado na ética, e nunca com deslealdade, possuindo
extremo respeito e consideração por meus oponentes. – Ele desabafou.
- Dizem que em batalhas você mobilizava seus companheiros de
uma forma tão cativante, que os soldados lutavam como se estivessem
batalhando para salvar a mãe biológica, e não a nação. Agora vejo que isso é
realmente verdade, ao ver você com alguns destes que devem ser seus
homens leais. – Antônio disse quase como um fã falando do ídolo.
- É verdade! Eles estão comigo sempre para o que der e vier. Aqui
estão apenas alguns, os outros estão espalhados, cada qual em uma missão.
Damião levantou-se, caminhou vagarosamente em direção ao jovem
agora sem medo, quando chegou perto, começou a ajoelhar-se em sinal de
reverência. Contudo, foi imediatamente contido por poderosas mãos, as quais
o agarraram pelos ombros com extrema força, alçando-o para cima. Logo após,
quando viu que o senhor já estava em pé, o esguio jovem ajoelhou-se aos pés
de Damião e Antônio.
- Por que está fazendo isto? – Questionou Damião e Antônio quase
que em uníssono.
- De longe vi o que o senhor fez por aqueles moradores de rua! Você
e seu amigo possuem grandes poderes, e acima deles esta seus bons
corações. Por isto não poderia deixar que pessoas tão nobres como os
senhores se curvassem a mim, quando o certo é o contrário. – Respondeu
455
calmamente o jovem ainda de joelhos, sendo que devido ao seu tamanho
enorme, de joelhos ele quase chegava a ser maior que Damião que estava
mais próximo.
Damião ficou desconcertado, não esperava por aquilo, e ainda mais
por aquela resposta. Antônio olhava tudo de longe, não acreditava no que
estava presenciando, aquilo era totalmente diferente do que ele estava
imaginando, naquele momento ele esperava já não estar naquela dimensão.
Após um momento, o jovem levantou-se, ficando parado em frente a
Damião, não falando nada.
- Sei que você deve ter seus motivos Lucas, e até os entendo em
partes, visto o que aqueles motoqueiros estavam prestes a fazer. Contudo,
tenho que discordar da maneira voraz que você encontra torturando-os.
- Venha Damião, e você também Antônio, porquanto, quero que
vejam do que vocês estão tendo pena. – Respondeu o Jovem, virando-se e
colocando o capuz sobre a cabeça, andando em direção à parede onde os
motoqueiros estavam pregados.
Lado outro, antes de dar o primeiro passo ele parou virando-se
novamente, entregou dois pedaços de pano a eles, dizendo:
- Por prudência quero que vocês coloquem isto na cabeça, não
quero que eles vejam seus rostos materiais.
Damião e Antônio ficaram sem entender, mas não questionaram,
colocaram os panos na cabeça, de modo a tampar seus rostos, e
imediatamente seguiram o jovem, o qual já estava muitos passos à frente e
havia abaixado também o capuz.
- Acho melhor vocês apertarem o passo, porquanto, eu tenho os
passos largos! – Disse o jovem sorrindo.
Damião balançou a cabeça com um leve sorriso, logo pensando:
É incontestável o senso de humor deste jovem!
Deixe ele ficar velho para ver se vai sorrir com as costas doendo. Pensou Antônio, apertando o passo para acompanhá-lo.
Quando Damião e Antônio chegaram até o local onde estavam
pregados os motoqueiros levaram o maior susto, a cena era literalmente
horrível...
O muro era enorme, e imediatamente Damião avistou algumas
coisas pintadas neste, grandes símbolos, talvez os maiores, a estrela de Davi,
uma cruz, pentagrama, etc. Contudo, ele assustou-se ainda mais com o
material utilizado na pintura.
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Literalmente aquilo é sangue... – Pensou Antônio também
boquiaberto.
- O que significa isso, porque pintar todos estes símbolos neste
muro? – Questionou Damião.
O jovem olhou para ele, contudo, Damião nada pôde perceber,
tendo em vista que o capuz novamente cobria todo seu rosto. Então Lucas
resolveu questionar:
- O senhor já viu o que são estas pessoas pregadas no muro?
Damião assustou-se, havia ficado tão entretido com as pinturas em
sangue, que sequer olhou para as pessoas. Quando avistou o primeiro sua
espinha gelou, aquilo era inexplicável.
Era estranho, era como se os homens estivessem possuídos por
algum demônio, mas suas feições eram de algo ainda mais assustador, era
como se eles fossem as próprias pessoas, tendo em vista que em uma simples
possessão as feições materiais das pessoas não se modificam, mas aquelas
pessoas nem pareciam humanos, mas sim monstros.
A maioria possuía olhos vermelhos, mas alguns eram totalmente
brancos. Os rostos estavam desfigurados, muitos não possuíam nariz, boca,
nada... Somente olhos, grandes e aterrorizantes olhos...
- O que é isso? – Disse Damião apontando assustado para o mais
estranho, o qual não possuía nada, somente sinistros olhos.
- Ele é o líder! – Respondeu Lucas.
- Achava que o líder era o de barba e um cabelo enorme, sendo
extremamente gordo, sendo o cara que havíamos avistado tecendo ordens. –
Damião disse.
- Líder... Que líder? Líder de que? – Disse Antônio apressadamente,
demonstrando sua preocupação e impaciência, pela primeira vez se
manifestando desde quando chegaram, antes estava muito atordoado para
falar, mas agora clamava por respostas.
Lucas fez um sinal para que eles o seguissem, e começou a
caminhar mais para longe. Quando estavam a certa distância do muro, ele
parou, mas continuou a olhar para o muro, e apontando o dedo indicador
questionou:
- Conhecem aqueles símbolos?
- Lógico! – Disse Damião, – Todos! Só que nunca vi alguém fazer
uso deles simultaneamente.
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- A situação aqui é outra! Não pude me dar ao luxo de escolher um
ou outro símbolo, tendo em vista que aqueles seres que ali estão pregados são
algo difícil de serem definidos.
- Como assim definidos? – Questionou Antônio.
- O Damião já foi há certo tempo nos primórdios de sua evolução,
uma espécie de exorcista de sua época, e diante de suas evoluções já se
deparou com espíritos da mais variável espécie de forças... – Lucas iniciou as
explicações.
Damião somente afirmou com a cabeça, ainda tinha fortes
lembranças daquele período, e não gostava de relembrá-las, considerava isto
uma das mais difíceis situações, porquanto, conforme costumava definir, uma
pessoa com um demônio é e não é a pessoa ao mesmo tempo, algo que
requer muita cautela. Além disso, tem ainda casos que parecem possessões e
não são, o que torna tudo ainda mais difícil.
- Portanto, como eu não poderia saber qual destes símbolos
poderiam funcionar como um modo de aprisionar estes demônios, tendo em
vista que há ali umas vastas diversidades deles, com poderes e formas
diferentes, optei por usar todos, e até o momento parece ter funcionado. –
Respondeu Lucas.
- Mas aqueles seres não parecem demônios, você acha que são o
que? – Questionou novamente Antônio.
- Não sei meus amigos... Tenho que confessar que nunca havia visto
alguma coisa deste jeito. Segundo uma fonte, eles são uma espécie de
demônios com poderes extremos que foram concedidos pelo próprio Lúcifer.
Está mesma fonte me disse que eles são capazes de se apoderar de tal forma
do corpo material da pessoa que de algum modo este poder do mal que lhes
foram concedidos interagem com o corpo material, formando estas aberrações!
Meus homens fizeram alguns testes básicos, e pelo o que consta, eles não
necessitam mais respirar, comer, nada...
Lucas fez uma pausa pensativo, e por fim resolver dar sua
conclusão:
– Segundo os testes de minha equipe, parece que eles são o
verdadeiro exército das trevas que vai atuar na dimensão material, para a
batalha final, tem alguns que possuem células e órgãos de animais.
- Mas como vocês conseguiram derrubá-los com tamanha precisão?
Tudo pareceu tão fácil! E como assim animais? – Indagou Damião.
- Fácil?! – ele questionou com uma entonação de espanto. – Vocês
não devem estar falando sério! Estes são partes dos meus melhores homens,
os quais são de longe o melhor exército que conheço. Creio que se não
tivéssemos a informação de que eles caiam com uma mistura de sal grosso,
água benta, prata, ouro, chumbo, e madeira sagrada direto na cabeça, nunca
teríamos derrubado eles com balas normais, nem com água benta. Além disso,
458
muitos já haviam se recuperado antes mesmo de os pregarmos naquela
parede! Para minha equipe fazer os testes, tivemos que usar equipamentos de
última geração, e ao mesmo tempo utilizar métodos medievais. Por isso deixei
parte de meus homens lá no nosso escritório na Suíça, enviei os dados por
aparelhos modernos, e eles analisaram tudo em tempo recorde, mas ainda
encontra-se pendente de algumas confirmações, principalmente, sobre esta
mistura com animais.
- E quem prestou as informações para que vocês pudessem vencer?
– Questionou Damião.
- Acho que ele fez uma visita para o Antônio noite passada e
também interagiu em seu sonho Damião! Mas acho que não posso ainda lhes
contar quem seja, da mesma forma que pelo que consta, ainda não podem
dizer muito sobre um tal de Senhor da Luz que o senhor Damião anda
protegendo, o qual está recebendo e proporcionando proteção no mundo das
trevas.
Damião ficou mudo, aquilo o havia pegado de surpresa. Ele tinha
certeza que ninguém além de Miguel, ele e mais alguns poucos membros do
Conselho Supremo tinham conhecimento do Senhor da Luz ter mudado de
lado.
Parece que os segredos são mais difíceis de guardar do que
imaginava. – Pensou...
459
CAPÍTULO 113
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
Os agentes e Arthur não acreditavam que alguém tão pequeno e
franzino havia conseguido derrubar a fera e literalmente salvar a missão. O
mais assustado era sem sombra de dúvidas George que disse como um louco:
- Mahesh! Como você conseguiu está proeza?
Ao passo que o pequeno e ao mesmo tempo grande guerreiro
respondeu-o até inflando o peito demonstrando sua virilidade:
- Com este objeto que você havia demonstrado pouco caso com seu
poder de destruição e aniquilamento. – O exagero foi proposital. Mais ele
ergueu a pulseirinha em seu braço como se fosse a arma mais poderosa do
mundo.
- Não acredito? – Bradou George.
Até mesmo os outros agentes estavam transtornados, queriam
explicações rápidas, até mesmo, porquanto, a fera parecia não ser muito
problema, visto que ela agora sequer se mexia.
- Porque ela não se mexe? – Berrou Russo que parecia ser o único
que temia qualquer reação da fera.
- Eu apliquei uma espécie de sedativo poderoso. – ele respondeu
sequer olhando para Russo, e, ainda, falando como se fosse a coisa mais
normal do mundo. – Além disso, se ele não fizer efeito, e ela levantar acionará
uma bomba que trucidará todo seu corpo.
- Bomba! – o espanto veio acompanhado de uma expressão não de
temor, mais de raiva pela forma que o maluco do Arthur estava tratando aquilo.
– Não sei se notou, mais estamos ao lado dela.
- Acalme-se, é uma bomba especial, desenvolvida...
- Por um de seus amigos ultrassecretos em um laboratório
ultrassecreto, de tecnologia inigualável, que não devemos temer porque ela
estoura bolinhas de sabão que vão sufocar um monstro destes! – O desdém e
misturado ao tom sarcástico de Russo foram a mola para atrapalhar Arthur.
Ao contrário do que os outros pensaram, ou seja, que o velho iria se
irritar, ele simplesmente olhou para Russo continuando sua explicação:
- Consistindo em pequenas esferas que ficam sob a pele do
individuo, desenvolvida para ao ser acionada entrar na corrente sanguínea, e
irem contra o fluxo sanguíneo, e, ao chegarem ao coração estouram
aniquilando o ser e não ferindo ninguém ao redor.
460
Ao terminar Arthur já se virou olhando para Mahesh, tudo sob os
olhares de espanto de todos os agentes com aquela explicação, principalmente
Russo que nada mais disse também olhando para o pequenino.
- Quando acordei... – ele fez uma pausa olhando para George
fechando o cenho em sinal de reprovação a atitude de tê-lo apagado. – Percebi
que realmente eu não poderia fazer muita coisa na batalha. Contudo, este
objeto tem uma espécie de corda fina como uma linha de pescaria, utilizada
para escaladas e também para enforcamento, a qual é potente como um cabo
de aço. – ele mostrou esticando uma espécie de linha. – Assim, quando
Charles e aquele chinesinho passaram correndo, eu deduzi que algo os seguia,
e, então amarrei a linha de um lado da estrada, e, do outro, fazendo uma
armadilha para que o perseguidor pudesse tropeçar. Simples assim.
- Simples, prático e eficaz meu pequeno amigo. – Arthur disse já
abraçando fortemente o pequenino.
Neste momento a fera soltou um rugido, e, ainda meio tonta foi se
levantando.
Os agentes saíram de perto já formando posição de ataque, e, o
pequeno Mahesh correu para trás de alguns escombros.
Só o maluco do Arthur que estava de costas para a fera não se
moveu.
- Saia de perto Arthur! – George bradou eufórico.
- Nada. Tenho que confiar em minhas armas! – Ele respondeu
calmamente, e demonstrando convicção.
Ao ficar de pé ouviu-se um pequeno zumbido, e, após alguns bipes,
a fera soltou mais um rugido e começou a olhar para seu corpo, como se
estivesse procurando algo. Em segundos ouviu-se um pequeno barulho, como
uma pequena explosão em tom abafado, como quando ao estourar uma
granada uma pessoa pula sobre a mesma para salvar quem se encontra a sua
volta. O olhar da ferra se estatelou, e ela tombou fazendo erguer-se uma
espeça poeira.
Arthur que continuava de costas apenas retirou de um dos bolsos de
seu traje um lenço e tapou as narinas.
Os agentes e todos ficaram perplexos com a forma que o velho
louco fazia tudo, ele não tinha apenas que utilizar seus produtos, ele tinha que
sentir a emoção em ter que confiar neles, queria isso, e, parecia que sentia
enorme prazer em viver perigosamente.
- Charles e Michael voltem, já aniquilamos a fera! – Disse Arthur pelo
rádio.
Graças a Deus! – Charles disse para Michael. – a única coisa ruim e
ter que carregar tudo de volta! – ele concluiu já descendo os ombros.
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CAPÍTULO 114
São Paulo – Brasil, 1982
Damião ainda estava mudo, ao passo que Antônio o olhava
extremamente assustado, afinal, foi pego de surpresa.
- Não se preocupe Antônio, que seu amigo é uma pessoa confiável,
este tal se Senhor da Luz parece que se encontra realmente ajudando em
algumas coisas, pelo que eu pude conferir. – Disse Alexandre ao perceber que
Antônio estava olhando para Damião com um olhar de desconfiança diante da
revelação.
- Chefe! Já podemos começar! – Gritou um dos homens
comandados por Alexandre ao mesmo.
Alexandre virou-se indo de encontro aos homens próximo ao muro.
Antônio e Damião permaneceram ao longe, afinal, não sabiam o que
seria feito.
Quando Alexandre estava de frente às literais aberrações pregadas
ao muro, bradou fortemente, por óbvio com o rosto totalmente coberto pelo
capuz:
- Ouçam bem! – Seu dedo indicador foi alçado na direção de um por
um dos motoqueiros, como se quisesse deixar claro que a mensagem seria
para todos sem distinção. – Não vou torturar nenhum de vocês!
Tanto Damião quanto Antônio soltaram o ar aliviados, mais um
pensamento óbvio não saia de suas mentes:
Porque alguém crucificaria pessoas para afirmar que não iria torturálos?!
Lado outro, infelizmente a resposta a este questionamento veio
rapidamente, com as palavras seguintes de Alexandre:
- Não me importo que seja o chefe, ou o subalterno mais inferior
nesta hierarquia pútrida de vocês! Faço perante vocês um juramento de
sangue! – Imediatamente ele retirou um grande punhal cortando a mão direita
com o mesmo, e erguendo para evidenciar o sangue escorrendo...
- Ele ficou louco Damião! – Antônio exclamou.
- Fique quieto então! – A resposta foi curta e grossa.
- Não temos nenhum acordo com você seu lixo! – Bradou o sujeito
que parecia ser o líder, ainda tentando cuspir em Alexandre sem sucesso
devido à distância.
462
- Creio que a partir de minhas palavras seguintes você vai se
arrepender desta sua afirmação! – A resposta veio seguida de um sorriso, o
qual, diante da cobertura da face o interlocutor demoníaco não pode notar.
- Duvido muito! – Bradou outro demônio, demonstrando confiança e
dando apoio ao chefe.
Alexandre ergueu o punhal que havia cortado à mão em juramento,
dizendo até mesmo com certo sarcasmo:
- Sei que todos reconhecem agora que estou mostrando que esta é
uma arma celestial!
Damião e Antônio até gelaram, realmente se tratava de uma arma
vinda das guerras celestiais, e, como tal poderia aniquilar até mesmo a alma de
qualquer ser.
Mesmo assim, os demônios pregados permaneceram firmes,
nenhum falou mais nada.
- Pois bem, continuando minha proposta... – Alexandre ia dizendo
em pausa, agora andando, como se quisesse demonstrar que tinha o domínio
pleno da situação. – Já pesquisei, e sei que cada um de vocês tem a
informação que procuro... O pacto será o seguinte: Eu vou matar todos vocês
sem piedade!... – ele parou subitamente voltando à face negra novamente para
todos. – Mais juro, como assim acabei de fazer, que aquele que me contar
onde se encontra o filho das trevas sairá livre.
Damião e Antônio gelaram ainda mais ao saberem o que aquele
misterioso guerreiro buscava naquele beco...
- Nenhum de nós entregará, porquanto, sabemos muito bem que
você irá cumprir sua parte no acordo, lado outro, Lúcifer reservará ao desertor
destino bem pior do que a morte plena! – Disse o chefe.
- Sei disso. Mais quem aceitar minha proposta teria pelo menos a
chance de tentar escapar. E pode tentar a sorte, ao invés de morrer aqui
simplesmente tentando encobrir um chefe mesquinho e sagaz, como você
mesmo acaba de afirmar. – Respondeu Alexandre erguendo o punhal.
O silêncio se fez presente, onde naquele momento certamente todos
os seres crucificados estavam pelo menos raciocinando sobre a proposta.
- Vou melhorar as coisas para vocês! – A ironia estava muito
presente nas palavras de Alexandre, mais todos tinham certeza que ele não
brincava, estava afirmando realmente o que iria fazer, afinal, haviam
presenciado o que ele era capaz de fazer... – Vou contar até dez, e, aquele...
Somente aquele que gritar primeiro vai poder me contar o local exato onde se
encontra o pequeno.
463
Antes mesmo de começar a contar um dos demônios, ou seja lá o
que são, já que sequer Alexandre conseguiu achar uma explicação lógica para
tais atrocidades, berrou:
- Eu contarei!
Todos os outros demônios, olharam em direção do pequeno ser que
havia bradado, o qual estava pregado mais acima, ao passo que o chefe gritou
exteriorizando sua indignação:
- Seu traidor!
Seu corpo era muito
como a dos demais, contudo,
mesmo ao longe puderam ver
língua para fora rapidamente,
negros e penetrantes.
pequeno, e sua face não era muito desfigurada
ao abrir novamente a boca Damião e Antônio
que ele tinha dentes pontiagudos, e retirava a
como uma serpente, possuindo, ainda, olhos
- Não sou traidor. Lado outro, sei muito bem que algum de vocês
certamente irá contar. E quero então ser esta pessoa, porquanto, compreendo
que Lúcifer fará comigo se me encontrar, mais como este homem está falando,
pelo menos terei uma chance.
- Então diga rápido, porque se não disser em poucos segundos irei
passar sua oportunidade para outro! – Bradou Alexandre.
- Ele encontra-se em Berlim na Alemanha. Ainda está no ventre de
uma jovem chamada Estela, em uma mansão de um advogado famoso, de
nome Pierre, que é pai dela! – O demônio foi conciso e direto ao ponto.
Um... – Alexandre começou a pensar na sorte que tinha. – Este
sujeito já foi advogado de um de nossos membros em um caso de homicídio...
Isso poderá facilitar as coisas...
- Então me solte agora! – Berrou o demônio sob o olhar de
reprovação dos demais.
- Certo meu caro, afinal, trato é trato... – Disse calmamente
Alexandre já indo de encontro ao muro.
Lado outro, quando chegou bem perto ele enfiou o punhal
diretamente no peito do pequenino, fazendo com que ele gritasse de dor
primeiramente, e sem nada entender questionasse para Alexandre
demonstrando sua indignação:
- Mais eu juro que contei tudo! Porque ainda está me matando?!
- Simplesmente porque não esperou a contagem, então, não estava
valendo! – A resposta veio em tom de euforia, como se a morte daquele ser lhe
proporcionasse extremo prazer...
464
Após Alexandre enfiou o punhal completamente no peito do pequeno
demônio, o qual o olhava fixamente, certamente, não acreditando como foi
inocente.
Uma espécie de pequena explosão ocorreu no interior do corpo do
demônio, e de todos os seus orifícios saíram feixes de uma luz escura.
- Esta é a cor de sua áurea seu verme! Escura e sombria diante das
vitimas que você fez nesta caminhada de atrocidades, como as pessoas que
iriam matar neste local somente por prazer, o mesmo prazer que sinto agora
em aniquilá-lo! – Alexandre dizia em tom ainda mais eufórico, como se
estivesse tendo um orgasmo.
Imediatamente os outros homens retiraram também punhais
semelhantes, e começaram a aniquilar um por um dos demônios...
- Damião, creio que temos que fugir! – Antônio disse demonstrando
seu medo diante dos acontecimentos.
- Não! Temos que evitar que ele quebre o ciclo do universo! – A
resposta veio com um olhar penetrante, demonstrando que não sairia dali de
forma alguma, mesmo que significasse ser também aniquilado.
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CAPÍTULO 115
Bhangarh, região do Rajastão, Índia, 1982
O estranho avião desceu rapidamente, e Arthur e os outros agentes
amarraram o estranho ser em uma espécie de guindaste, e, o mesmo foi
eriçado para uma espécie de compartimento de carga, que custou a caber o
enorme ser.
- Mahesh, leve estes itens consigo, e doe os que puderem, os outros
como as armas guarde para nossa próxima expedição! – Disse Arthur
apontando para os vários itens que foram retirados do compartimento para que
pudesse caber a fera.
- Senhor, este ser é muito grande, creio que nosso voo poderá sofrer
com tanto peso no compartimento de carga! – Orientou o piloto ao velho ao
perceber que o peso do bicho era muito grande.
- Não se preocupe, apenas eu, Charles e Michael retornaremos, isso
deve aliviar o peso.
- Mais...
George ameaçou iniciar um protesto, contudo foi logo contido não
por Arthur, mais por Charles:
- Sem mais nem menos, ordens são ordens! Além disso, Mahesh
necessitará de ajuda, e, Michael será o único porquanto temos que enviar o
bicho para esta seita que ele faz parte, a qual eu irei me certificar que estará ao
nosso lado realmente.
Ele terminou olhando fixamente para o oriental que sequer deu muita
atenção, apenas entrando na aeronave com parte das lascas que ela havia
carregado com tanto sacrifício.
Após a aeronave erguer voo, Mahesh bateu nas costas de George
dizendo com alegria:
- Pode ficar tranquilo meu amigo! Sei que me apagou para me
proteger, e, não se arrependerá de ter ficado para me ajudar. Ou melhor,
nenhum de vocês se arrependerão, porque ao chegarem a minha aldeia serão
tratados como meus convidados, e, ficaram pouco tempo, já que o chato do
Arthur enviará um jatinho para lhes buscarem em dois dias. Mais garanto a
vocês que serão os melhores dias de suas vidas!
Todos os agentes, principalmente, George olharam um para o outro
com alegria, até mesmo Russo olhou para Robson, o qual lhe retribuiu com um
sútil sorriso, demonstrando que as coisas estavam caminhando bem.
466
CAPÍTULO 116
São Paulo – Brasil, 1982
Após ter arrancado a informação que desejava dos motoqueiros, e,
de todos estarem aniquilados, Alexandre bradou aos seus homens com
autoridade, mais ao mesmo tempo demonstrando um carisma fora do comum:
- Companheiros, unindo novamente nossas energias conseguimos o
que viemos buscar! Assim, tenho que agradecer a cada um de vocês, e dizer
que peguem todas as coisas que temos que arrumar uma maneira de partir
urgente para aniquilar o filho das trevas!
Os homens soltarão um grito potente em sinal de vitalidade e do
modo que faziam ao final de cada batalha:
- Urrá!!!
- Alexandre riscou um fósforo e lançou-o em direção ao muro que já
se encontrava encharcado de óleo, fazendo com que todos os corpos dos
demônios começassem a queimar imediatamente.
Após todos saíram pegando as armas e colocando nas sacolas, e
juntando os demais apetrechos.
Os mendigos que estavam ainda muito ao longe lá ficaram
amoados, ainda não conseguiam sequer mexerem às pernas devido ao medo
que passaram.
- Tenho que agradecer a vocês dois, são pessoas de bem, não são
guerreiros mais possuem o maior dos dons, o da coragem e amor a uma
causa, por isso poderão contar comigo e todo o meu exército sempre que
necessitarem.
Os dois quase soltaram um suspiro de alivio, afinal, não sabiam se
Alexandre iria trucida-los também.
- Sabemos disso Alexandre, contudo, queremos lhe pedir para não
seguir adiante com este seu plano. – Clamou Damião, depois de tomar fôlego.
- Como assim? Não estou entendendo aonde querem chegar! – Ele
começou a falar de uma maneira mais dura.
- O filho das trevas como você denomina já foi concebido, e, por
isso, não podemos mais interferir diretamente!
- Vocês sabem por que estou aqui? Como sai após minha suposta
morte?! – Ele quase bradou demonstrando agora uma fúria
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