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Real Forte Príncipe da Beira
"A soberania e o respeito de Portugal impõem que neste lugar se erga
um Forte, e isso é obra e serviço dos homens de El-Rei nosso senhor e,
como tal, por mais duro, por mais difícil e por mais trabalhoso que isso
dê, (...) é serviço de Portugal. E tem que se cumprir."
D. Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, Junho de 1776
A construção do Real Forte Príncipe da Beira, bem como a dos demais fortes construídos a Oeste da linha definida
no Tratado de Tordesilhas, demonstram a visão geopolítica da diplomacia portuguesa no século XVIII, que,
aproveitando-se do Tratado de Madrid (1750), procurou assegurar a posse do território da Amazónia.
Mesmo contra o estabelecido noutros tratados, que o anulariam posteriormente, conseguiu garantir, em linhas
gerais, a actual fronteira do Brasil, muito além da linha acordada no referido tratado, assinado na cidade espanhola
de Tordesilhas a 7 de Junho de 1494 (no reinado de D. João II).
Durante o reinado de D. José I (1750-1777), o seu primeiro-ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de
Pombal, lançou um ambicioso projecto de colonização da Amazónia.
Sob sua directa orientação e através de decisões estratégicas de grande alcance, determinou a construção de um
verdadeiro cordão de fortes e fortalezas, com o objectivo de barrar as vias de entrada que, a Norte e a Oeste,
atingiam a Amazónia.
Para afirmar a consolidação do domínio português na zona do rio Guaporé, tendo em vista a exploração de ouro na
região, que então florescia rapidamente, e como resposta à aproximação dos espanhóis, que recrudescia desde
1743, D. João V (1706-1750), antecessor de D. José I, criou a capitania do Mato Grosso.
D. João V nomeou como primeiro Governador e Capitão-General da capitania do Mato Grosso, D. António Rolim de
Moura Tavares. A ele se ficou a dever a fundação de Vila Bela da Santíssima Trindade, nas margens do Guaporé,
que passou a ser a sede da Capitania.
Em 1769, enquadrada nesta política, que tinha como objectivo garantir a soberania portuguesa na região, foi
construído o Presídio de Nossa Senhora da Conceição.
No entanto, a fragilidade da construção, em vez de os demover, incentivou os espanhóis a tentar a sua conquista. A
invasão só não teria êxito em virtude dos castelhanos terem sido vitimados por febres e outras maleitas.
Em 1772, por nomeação directa do Marquês de Pombal, Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres assume
funções como quarto Governador e Capitão-General da Capitania do Mato Grosso.
O jovem capitão de 31 anos, até aí Ajudante de Ordens do Marechal de Campo Francisco Mac-Lean, Governador da
Praça de Almeida, já então demonstrava, nesta Praça Forte de Almeida, o seu gosto pela engenharia e pelas
plantas e cartas, como se pode hoje constatar no seu retrato dessa época (in sala dos Retratos da Cada da Ínsua)
em que ele se apresenta com a planta de Almeida nas mãos.
Luís de Albuquerque, conforme determinação da Coroa, incluía nos seus planos o objectivo de dominar ambas as
margens do rio Guaporé, afastando os Castelhanos e assegurando o controlo integral das minas dos Guarujus,
entre o Paragaú e o Tanquinhos (actual Mateguá), garantindo uma via segura, pelo Guaporé, Mamoré e Madeira,
para o monopólio da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão.
Com essa missão no espírito e no desempenho das ordens régias que lhe haviam sido confiadas, empreendeu, em
finais de 1773, uma viagem descendente no rio Guaporé. Ali inspeccionou e aprovou um local na margem direita
daquele rio, para uma construção "de pedra e cal", com o fito de substituir o anterior Forte de Bragança, então muito
arruinado, e que distava cerca de dois quilómetros deste local agora escolhido.
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Reza assim o termo de lançamento da primeira pedra do novo forte:
"Ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1776, aos vinte dias do corrente mês de Junho,
vindo o Ilmo. e Exmo. Sr. Luiz de Albuquerque de Mello Pereira e Cáceres a este lugar, situado na margem
oriental ou direita do rio Guaporé, desta Capitania, em distância de mil braças pouco mais ou menos da
antiga Fortaleza da Conceição: o qual lugar tinha sido escolhido e aprovado pelo mesmo Sr., depois de
circunspectamente o reconhecer, ouvindo a vários Engenheiros, com particularidade o Ajudante de
Infantaria, com o dito exercício Domingos Sambuceti, a quem pela sua inteligência, tem cometido a
direcção principal das obras, para nele se fundar outra nova Fortaleza que Sua Majestade ordenou, assim
porque está livre das maiores excrescências do dito rio, como porque o terreno é naturalmente o mais
sólido e o mais acomodado em todos os sentidos que podia desejar-se: aí por Sua Exa. foi pessoalmente
lançada a primeira pedra nos alicerces, depois de se lhe gravar a inscrição seguinte:
“Sendo José I, Rei Fidelíssimo de Portugal e do Brasil, Luiz Albuquerque de
Mello Pereira e Cáceres, por escolha da Majestade Real, Governador e CapitãoGeneral desta vastíssima Província do Mato Grosso, planeou para ser
construída a sólida fundação desta Fortaleza sob o Augustíssimo nome do
Príncipe da Beira, com o consentimento daquele Rei Fidelíssimo e colocou a
primeira pedra no dia 20 do mês de Junho do ano de Cristo de 1776”
A pedra foi com efeito posta no alicerce do ângulo flanqueado no baluarte em que de presente se trabalha,
cujo ângulo, com pequena diferença, olha para o Poente; e determinou o dito Sr. que a mesma Fortaleza,
de hoje em diante, se denominasse - Real Forte do Príncipe da Beira - consagrando-se os quatro Baluartes
em que há de consistir, a saber: a Nossa Senhora da Conceição, o referido em que se trabalha, com
direcção geral ao Poente; a Santa Bárbara, o outro que vira para o Sul, ambos adjacentes ao rio; e a Santo
António de Pádua e Santo André Avelino, os outros dois, que devem corresponder-lhes; o que tudo se faz
sendo presentes o Capitão de Dragões da Capitania de Goiás José de Mello Castro de Vilhena e Silva; o
referido Engenheiro Domingos Sambuceti; o Tenente de Dragões José Manoel Cardoso da Cunha; o
Tenente em segundo de Artilharia Tomé José de Azevedo; o Alferes de Dragões Joaquim Pereira de
Albuquerque; o Capitão Joaquim Lopes Poupino, Intendente das Obras, de que se fez este Auto com mais
quatro cópias em que o dito Senhor Governador e Capitão General assinou, e da mesma forma os
sobreditos, com as pessoas que abaixo constam; e eu António Ferreira Coelho, Escrivão da Fazenda Real
que o escrevi. Luiz de Albuquerque de Mello Pereira e Cáceres, José de Mello Castro de Vilhena e Silva,
Domingos Sambuceti, José Manoel Cardoso da Cunha, Tomé José de Azevedo, Joaquim Pereira de
Albuquerque, Joaquim Lopes Poupino, Inácio Pedro Jácome de Souza Magalhães, Belchior Alz. Pereira,
João Magalhães Coutinho, José da Cunha Morais, Joaquim de Matos."
Durante as obras, o engenheiro Domingos Sambuceti faleceu vítima de malária, tendo sido substituído pelo Capitão
de Engenheiros Ricardo Franco de Almeida Serra, responsável mais tarde pela nova fortificação de Coimbra (Forte
Novo de Coimbra, 1797). Entre 1766 e 1776, nela sempre se trabalhou "ao menos com duzentas pessoas e daí para
mais." (Informação do governador e Capitão General da Capitania do Mato Grosso, em Janeiro de 1786).
Sobre o Forte conta-nos António Leôncio Pereira Ferraz:
"O forte fica em 12o. 36' de Latitude e 21o. 26' 28" de Longitude W do Rio de Janeiro, e a ele voltaria, em
1778, o mesmo Capitão General [Pereira e Cáceres], em inspecção às obras em andamento e ao material
de guerra ali chegado.
A cal empregada na construção fora enviada de Curumbá pela via fluvial do [rio] Jaurú e dali à do [rio]
Guaporé; só em 1782 foram conduzidas pedras que deram para o fabrico de 2.000 alqueires [de cal]. As
obras de cantaria eram executadas no [rio] Jaurú e o restante do material vinha do Pará, pelo rio Madeira,
na época tão movimentado, a ponto de dar melhores resultados que as monções de povoados.
(...) A fundação do Forte do Príncipe da Beira [1776], com a de Viseu [1776], obrigaram os espanhóis à
assinatura do Tratado de Santo Ildefonso, cujo ajuste foi terminado em 1777, valendo aquele Capitão
General [Pereira e Cáceres] a frase com que o pintaria o dirigente espanhol de Santa Cruz de la Sierra: 'O
mais ambicioso dos Governadores portugueses'. (...)
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O forte do Príncipe da Beira é abaluartado, [pelo] sistema Vauban, e construído sobre um quadrado,
medindo cada face 118 metros e 50 centímetros e tendo em cada ângulo um baluarte de 59 metros sobre
48 na máxima altura.
Em cada baluarte há 14 canhoneiras, sendo três por flanco e quatro por face. As cortinas, que ligam os
baluartes entre si, medem cada uma 92 metros e 40 centímetros , e as golas 22 metros. O fosso, de largura
variável, entre um metro e 50 centímetros e três metros, atinge a de nove metros em frente ao baluarte da
Conceição, tendo em todo o seu desenvolvimento dois metros de profundidade.
O portão do forte fica no centro da cortina que se acha voltada para o Norte e dá acesso a um saguão,
dividido em dois compartimentos; liga-o ao outro lado do fosso uma ponte de 31 metros de comprimento.
Na praça principal da fortificação há duas ruas de casas, paralelas às cortinas e formando um conjunto de
12 edifícios, todos em ruínas. As muralhas do forte são de alvenaria de pedra, com revestimento de
cantaria, e medem da esplanada ao fosso 8 metros e 22 centímetros. Na cortina, voltada para Oeste, há
também um portão que dá saída para o rio. O forte se acha assentado numa colina, que dista 180 léguas
aproximadamente da actual cidade de Mato Grosso e 14, em linha recta, da foz do [rio] Mamoré.
A Comissão de Limites de 1874 diz que, a sua posição astronómica é a de 12º 17' 19" de longitude W do
meridiano do Rio de Janeiro. O principal técnico de que dispôs [o governador] Luiz de Albuquerque, no seu
projecto de edificação do forte, foi o Ajudante de Infantaria Domingos Sambuceti, conquanto tenha sido
ouvido a respeito Ricardo Franco [Serra].
O Director de Obras, porém, foi o Capitão José Pinheiro de Lacerda, que dispendeu na construção
480:000$000 soma essa, sem dúvida alguma, vultosa para aqueles tempos. As obras ficaram terminadas
em 1783 e era o forte destinado a receber 56 canhões, segundo se infere do seu próprio traçado; mas só
em 1830 ali aportava a primeira artilharia que lhe era destinada, constante de quatro bocas de fogo de
calibre 24, enviadas do Pará desde 1825. Mais tarde ali foram ter mais 14 canhões de ferro, de calibre 12.
Foi seu primeiro comandante o Capitão de Dragões [da Capitania de Mato Grosso] José de Melo Castro de
Vilhena e Silva. Em 1864 ainda havia ali uma guarnição de 10 soldados, dos quais só três ficavam no forte,
sendo os demais deslocados para Pedras e Itonamas, segundo o Coronel [Augusto] Fausto de Souza.
A 9 de Junho de 1789 foi aquela fortificação visitada pelo naturalista Dr. Alexandre Rodrigues Ferreira,
vindo do Pará em missão régia de carácter científico. Em 1831, devido ao abandono em que se achava e o
consequente relaxamento da disciplina, houve um levante da guarnição, concomitante com o de outras
forças da Província.
Cinco anos mais tarde [1836] para ali eram mandados os sentenciados cumprir penas, e dois anos mais
tarde [1838] o Dr. Francisco Sabino da Rocha Vieira, chefe da Sabinada, haveria tido igual sorte, se
potentados de Mato Grosso não lhe tivessem ostensivamente dado guarida, salvando-o certamente de
perecer em região tão inóspita."
O Real Forte Príncipe da Beira foi construído ao mesmo tempo que Luís de Albuquerque enviava para Portugal as
plantas para a construção da Casa da Ínsua.
Como refere António Leôncio Pereira Ferraz, Luís de Albuquerque optou, para a concepção deste forte, pela
construção de baluartes ou bastiões, que, em arquitectura militar são obras defensivas avançadas em relação à
estrutura principal da fortificação. Constituem-se como saliências, apresentando duas faces e dois flancos,
sustentadas por muralhas de alvenaria e preenchidas com terra, no cimo das quais se colocam as principais armas
para defesa da fortificação, que deste modo têm maior margem de manobra e melhor posicionamento defensivo. O
baluarte surgiu pela primeira vez em Itália, em fins do século XV, tendo alcançado a sua máxima expressão com o
marquês de Vauban, em França, na segunda metade do século XVII.
Depois do lançamento da primeira pedra, em 20 de Junho de 1776, a construção demoraria mais um ano e
resultaria numa obra gigantesca, com plano quadrangular, quase com um quilómetro de perímetro e com muralhas
de dez metros de altura. Esta construção, pela sua dimensão e arrojo, espantaria até, na altura, o megalómano
Marquês de Pombal.
A original cor avermelhada que ficou a marcar a fortificação ficou a dever-se à utilização, na sua construção, de
pedra de canga laterítica, abundante naquela região e especialmente apropriada pela camada superficial resistente
que a caracteriza. Já a pedra calcária, utilizada nos remates por exemplo, teve que ser transportada desde Vila
Maria e de Belém do Pará.
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Embora o número de trabalhadores utilizado na construção, referido nos documentos, seja de duzentos homens,
estima-se que pelo menos mais mil outros trabalhadores tenham estado envolvidos na edificação, entre indígenas e
escravos africanos.
A construção do Real Forte Príncipe da Beira foi, em grande parte, financiada pelas receitas geradas pela
Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão.
Nem toda a informação nos chegou por via dos documentos da época, por exemplo através de inscrições nas
paredes das masmorras, que chegaram aos nossos dias, ficamos a saber que no dia 18 de Setembro de 1852,
pelas duas horas da tarde, a terra tremeu, ou que alguns prisioneiros usavam grossa e comprida corrente ao
pescoço e que eram ajudados com esmolas dadas pela população local.
Em posição dominante na fronteira com a Bolívia, esta fortaleza é considerada uma das maiores edificadas pela
Engenharia Militar portuguesa no Brasil Colonial e foi um dos argumentos que obrigou os espanhóis à assinatura do
Tratado de Santo Ildefonso definido as fronteiras naquela zona, cujo ajuste foi terminado em 1777, e que valeu a
Luís de Albuquerque a frase com que o dirigente espanhol de Santa Cruz de la Sierra, o definiria: “O mais ambicioso
dos Governadores portugueses”, como enfatiza António Leôncio Pereira Ferraz na sua crónica.
Esta fortaleza foi dedicada ao primeiro Príncipe da Beira, D. José de Bragança, neto primogénito de El-Rei D. José I,
na altura segundo na linha de sucessão, a seguir a sua mãe, a Princesa do Brasil e D. Maria.
Na altura, o herdeiro ou herdeira da coroa portuguesa recebia o título de “Príncipe ou Princesa do Brasil” e, a partir
do nascimento de D. José, o seu primogénito ou primogénito, herdeiro da coroa em segunda linha, passaria a usar o
título de “Príncipe da Beira”.
D. José de Bragança (1750-1777), filho do casamento de D. Maria com seu tio D. Pedro (futura rainha D. Maria I e
respectivo rei-consorte D. Pedro III), foi o primeiro “Príncipe da Beira”, assim agraciado por seu avô, el-rei D. José I,
no momento do seu nascimento, a 20 de Agosto de 1761. No dia 21 de Fevereiro de 1777, em Lisboa, D. José
desposou a sua tia materna, a Infanta Maria Francisca Benedita (1746-1829).
Na época, ele tinha quinze anos de idade e sua noiva, trinta. Três dias depois seu avô, el-rei D. José I, morreria e D.
Maria seria coroada como Rainha D. Maria I, passando D. José a usar o título de “Príncipe do Brasil”, como herdeiro
directo da coroa. No entanto D. José, viria a morrer cedo, em 1777, com apenas 27 anos, não deixando filhos, e
passando, por isso, o título de “Príncipe do Brasil”, para o seu irmão mais novo, D. João, futuro rei D. João VI.
O Real Forte Príncipe da Beira, ou Fortaleza do Príncipe da Beira, localizado na actual Rondónia, na margem direita
do rio Guaporé, hoje Guajará-Mirim seria, em 2009, um dos monumentos seleccionados para a escolha das 7
Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo.
A Casa da Ínsua – Hotel de Charme, evocando esta gigantesca construção, adoptou o nome de Príncipe da Beira
para o maior salão do Hotel de Chame, Salão Príncipe da Beira, em homenagem ao seu fundador.
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