X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq
Centro Universitário Ritter dos Reis
DESIGN, POLÍTICA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
SILVA, Carlos Viana;
Mestrando em Design
Centro Universitário Ritter dos Reis
[email protected]
WALDMAN, Ricardo Libel
Doutor em Direito
Centro Universitário Ritter dos Reis
[email protected]
Resumo: O presente artigo é o resultado de estudos e considerações em busca
de estabelecer relações entre os princípios fundamentais do design, os conceitos
referentes ao desenvolvimento sustentável e políticas públicas. Inicia descrevendo
o atual panorama social que está estruturado sob uma cultura de consumo intenso
e generalizado, onde o lixo é, comprovadamente, o subproduto de maior
abundância desta sociedade. Segue apresentando considerações sobre possíveis
caminhos a serem seguidos em busca de uma sociedade menos desigual e
questionando sobre o papel do designer contemporâneo frente a esse cenário de
risco. Com a democracia deslegitimando a voz do bem comum, esta pesquisa traz
possíveis visões sobre novos modelos econômicos, que proporcionem formas
inovadoras de relações entre os agentes envolvidos em determinados processos.
Com este trabalho, percebe-se que, caso queira-se abandonar o atual trauma
econômico, social e ambiental, será preciso rever o atual comportamento político
econômico social, para que seja possível alcançarmos níveis melhores de
sustentabilidade e qualidade de vida, exigindo, entre outros aspectos, uma
considerável habilidade de design em projetar e organizar visões de um sistema
sociotécnico sustentável em um sistema coerente de produtos e serviços.
1 Introdução
O atual panorama social em que nos encontramos, na segunda década
do século XXI, apresenta, uma cultura estruturada sob condições de consumo
intenso e generalizado. Esta fase, definida como modernidade reflexiva,
líquida, fluida, de risco, é determinada por profundas mudanças sociais. Um
período de desenvolvimento em que os riscos ambientais, sociais, políticos e
econômicos tendem a escapar de controle, podendo originar inúmeros
transtornos caso não aconteça algum tipo de mudança radical (BECK, 1997;
MANZINI e VEZZOLI, 2002; BAUMANN, 2009; FRY, 2011).
Esta vida líquida caracteriza-se por constantes incertezas, uma vida
precária, onde o lixo gerado, em grande parte como consequência desta
situação de extremo consumo, é comprovadamente o subproduto atual de
maior abundancia e permanência. Mas ainda há tempo, embora pouco, para
refletir e propor mudanças no caminho a ser seguido, no intuito de transformar
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SEPesq – 20 a 24 de outubro de 2014
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esse trauma econômico, centrado no consumidor e baseado no excesso de
ofertas e no envelhecimento cada vez mais acelerado dos bens de consumo,
exigindo uma grande capacidade de abandonar certos hábitos presentes
(BAUMANN, 2009, 2010).
Sob tais aspectos, já é de extrema relevância que o designer
contemporâneo assuma novas posições estratégicas no significativo elo entre a
indústria, que produz e comercializa bens de consumo e a sociedade, que os
utiliza e descarta cada vez em maiores quantidades. Este novo profissional
criativo, além de projetar, gradativamente deverá atuar de um modo político
pedagógico, conscientizando clientes, consumidores e a sociedade no geral,
em relação à importância das questões ambientais e sociais, propondo
soluções inovadoras centradas nas reais necessidades dos seres humanos.
Segundo Papanek (1997, p. 14), o
[...] designer tem sido sempre (...) um professor, estando em posição
de informar e influenciar o cliente. Com a atual confusão ambiental é
ainda mais importante que ajudemos a orientar a intervenção do
design, de modo que seja natural e humana.
Entretanto surgem questões simples, porém vitais, que necessitam de
respostas: considerando o atual estado insustentável do planeta, o que
ativistas políticos e designers (bem como todos os outros profissionais que,
consciente ou inconscientemente, tomam decisões de design) podem fazer e
quais rumos devem ser seguidos?
Apesar de o termo “desenvolvimento sustentável” ter sua primeira
utilização pública em agosto de 1979, no Simpósio das Nações Unidas sobre
as inter-relações entre recursos, ambiente e desenvolvimento (VEIGA, 2007),
segundo Margolin (1989), é possível identificar já no início da década de 1970,
designers como Dieter Rams e Vitor Papanek entre os vanguardistas a
perceberem que a sustentabilidade deveria ser um dos principais critérios
norteadores de um bom projeto de design.
Em uma era de linha de produção, em que tudo tem que ser
planejado e projetado, o design tornou-se a ferramenta mais
poderosa que o homem usa para configurar suas ferramentas e o
meio ambiente (e, por extensão, a sociedade e ele próprio). Isto exige
do designer uma responsabilidade moral e social. Também requer
profissionais de design com uma maior compreensão das pessoas, e
do público um conhecimento mais amplo sobre o processo de design.
(PAPANEK, 1971, p. 12, tradução nossa)
No Brasil, em 1977 o designer Joaquim Redig já expressava a sua
preocupação com a relação entre o design e o meio ambiente: “Desenho
Industrial (Design) é o equacionamento simultâneo de fatores ergonômicos,
perceptivos, antropológicos, tecnológicos, econômicos e ecológicos” (REDIG,
1977, p. 32). Outro brasileiro, agrônomo, filósofo e ecologista, extremamente
dedicado com as questões ambientais e sobre a reverência pela vida, José
Lutzenberger em seu texto original da década de 1970, acreditava que
Só o cego intelectual, o imediatista, não se maravilha diante desta
multiesplendorosa sinfonia, não se dá conta de que toda agressão a
ela [natureza] é uma agressão a nós mesmos, pois dela somos
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apenas parte. A contemplação do inimaginavelmente longo espaço
de tempo que foi necessário para a elaboração da partitura e o que
resta de tempo pela frente para um desdobramento ainda maior do
espetáculo, até que se apague o Sol, só pode levar ao êxtase e à
humildade. Assim, o grande Albert Schweitzer enunciou, como
princípio básico de Ética, 'o princípio fundamental da reverência pela
Vida em todas as suas formas e manifestações'! Se há um pecado
grave, esse é frear a Vida em seu desdobramento, eliminar espécies
irremediavelmente,
arrasar
paisagens,
matar
oceanos.
(LUTZENBERGER, 1990, p. 85)
Após esse período inicial de preocupações ambientais, a literatura
específica sobre a sustentabilidade volta a ganhar força com Manzini e Vezzoli
em 2002, indicando que a Sustentabilidade Ambiental refere-se às condições
sistêmicas segundo as quais, em nível regional e planetário, as atividades
humanas não devam interferir nos ciclos naturais em que se baseiam tudo o
que a resiliência do planeta permite e, ao mesmo tempo, não devem
empobrecer seu capital natural. Mencionam ainda que, para que seja possível
considerar as atitudes humanas como sustentáveis, estas devem atender aos
seguintes requisitos:
a) basear-se fundamentalmente em recursos renováveis, garantindo, ao
mesmo tempo, otimizar o emprego dos recursos não renováveis
(compreendidos como ar, água e o território);
b) não acumular lixo que o ecossistema não seja capaz de reutilizar;
c) agir de modo com que cada indivíduo e cada comunidade das
sociedades „ricas‟ permaneçam nos limites de seus espaços ambientais, bem
como que cada indivíduo e cada comunidade das sociedades „pobres‟ possam
efetivamente gozarem dos espaços ambientais aos quais potencialmente têm
direitos.
Já no ano de 2008, Manzini volta a escrever sobre o tema, porém desta
vez sob a ótica da inovação social para a sustentabilidade.
(...) as inovações sociais de base na vida cotidiana (as comunidades
criativas), que indicam como, às vezes, as habilidades difusas de
design são capazes de criar modos de ser e de fazer ao mesmo
tempo criativos e colaborativos, considerados também como passos
promissores rumo à sustentabilidade. (MANZINI, 2008. p. 17)
Segundo o autor, um poderoso fator de transformação da sociedade
contemporânea é o fato de que os limites da Terra tornaram-se mais evidentes.
Considerando o sistema cultura e operacional da sociedade industrial como um
todo, o tema dos limites não está simplesmente relacionado com as questões
ambientais, mas em que forma de desenvolvimento não comprometeria o bemestar, ou todas as vidas, das futuras gerações? (MANZINI, 2008).
Bosselmann (2009) explica que o atual entendimento da sociedade
sobre desenvolvimento sustentável, em um sentido fraco, pode ser
representado conforme a Figura 1, onde a sustentabilidade seria apenas uma
meta, o ponto central de encontro entre os três pilares, objetivo este, muito
difícil de ser alcançado.
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Figura 1 – Sustentabilidade no sentido fraco
Fonte: Adaptado pelo autor com base em Bosselmann (2009)
Por outro lado, Bosselmann (2009) defende a transição dos
entendimentos para o desenvolvimento sustentável no sentido forte, conforme
ilustrado na Figura 2. Onde a esfera ecológica, que condiciona todas as formas
de vida na Terra, é limitante das atividades referente à esfera social, e esta por
fim aparece como fronteira para as ações provenientes da esfera econômica.
Figura 2 – Sustentabilidade no sentido forte
Fonte: Adaptado pelo autor com base em Bosselmann (2009)
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Vezzoli (2010) acredita que sustentabilidade se faz com equidade e
coesão social. O princípio da equidade propõe que todas as pessoas, em uma
distribuição justa de recursos, tenham direito ao mesmo espaço ambiental. Em
outras palavras, a níveis equivalentes de satisfação, oportunidade de acesso e
disponibilidade de recursos naturais globais. Seguindo esse pressuposto, o
autor propõe requisitos e diretrizes de design de sistemas para a equidade e
coesão social, tais como: aumento da empregabilidade e melhores condições
de trabalho; aumento da equidade e da justiça em relação aos atores
envolvidos; promoção do consumo responsável e sustentável; favorecimento e
integração das pessoas com necessidades especiais e marginalizadas;
melhoraria da coesão social e o incentivo do uso e a valorização dos recursos
locais.
A expressão sustentabilidade social refere-se às condições sistêmicas
através das quais, seja em escala mundial ou regional, as atividades humanas
não condizem os princípios de justiça e da responsabilidade em relação ao
futuro, considerando a atual distribuição e a futura disponibilidade de “espaço
ambiental”. (MANZINI, 2008.)
Conforme Manzini (2008, p. 23), para que possa ser considerado
sustentável, “um sistema de produção, uso e consumo tem que ir ao encontro
das demandas da sociedade, (...) sem perturbar os ciclos naturais e sem
empobrecer o capital natural”.
Sobre a atuação na dimensão social, existe um papel em potencial para
o design, implicando em uma considerável habilidade de integração, visando
uma sociedade justa, que respeite os direitos fundamentais e a diversidade
cultural, proporcionando igualdade de oportunidades e combatendo a
discriminação em todas as suas formas. (MANZINI, 2008; EU, 2006)
O presente artigo caracteriza-se como uma revisão teórica inicial,
buscando determinar entendimentos e relações entre o desenvolvimento
sustentável, política e novas formas de pensar e praticar o design, sob um
panorama social complexo e fluido. Conforme Gil (1987), a pesquisa
exploratória desenvolve, esclarece e modifica conceitos e ideias, com o intuito
de formular soluções mais precisas ou hipóteses para estudos posteriores.
Uma pesquisa qualitativa que, segundo Gonçalves e Meirelles (2004),
trata da investigação de valores, atitudes, percepções e motivações do objeto
pesquisado, com o objetivo principal de compreendê-los em profundidade.
A pesquisa bibliográfica foi a base utilizada para construir o referencial
teórico deste artigo. Segundo Gil (2006), a principal vantagem deste tipo de
pesquisa reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama
de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia ser pesquisada
diretamente. De acordo com Yin (2005), esta pesquisa tem em vista favorecer
a familiaridade, o aumento da experiência e uma melhor compreensão do
problema investigado.
A estrutura do presente trabalho se encontra da seguinte forma: a seção
2 apresenta considerações sobre possíveis caminhos a serem seguidos em
busca de uma sociedade menos desigual; na seção 3 encontram-se relações
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entre a democracia, avanço tecnológico e novos modelos econômicos, no
sentido de uma transição política orientada pelo design. Finalizando esta
pesquisa, apresentam-se as considerações, agradecimentos e referências.
2 Novos Caminhos
De acordo com Veiga (2013, p. 31), os países desenvolvidos que
apresentam os menores índices de desigualdades são os que
sistematicamente apresentam melhores desempenhos nas dimensões sociais
mais relevantes para a qualidade de vida, como coesão social, dependências
químicas, saúde pública, doenças mentais, educação, encarceramentos,
longevidade, mobilidade social, obesidade, partos de adolescentes, vida
comunitária e violência. Acrescenta ainda que em algumas destas nações,
além de menores desigualdades há também menos consumismo, mais
reciclagem e maior ajuda externa aos países subdesenvolvidos.
Se por um lado algumas soluções buscando a redução da pobreza pela
ótica do consumo já estão em curso, por outro lado pouco ou nada se sabe
sobre políticas públicas capazes de aumentar a capacitação dos menos
favorecidos, no intuito de que estes tenham maiores rendimentos e possam
conquistar mais acesso aos bens públicos. A melhor hipótese encontrada
parece ser a de que a desigualdade econômica inevitavelmente gere
desigualdade política, que por sua vez reproduz a desigualdade econômica. O
máximo que as nações mais progressistas fazem é negociar com base na
redução dos impactos ambientais, sem deixar de preservar o paradigma
econômico existente. (FRY, 2011; VEIGA, 2013)
Vale ressaltar ainda que, se nada mudar, em pouco mais de 20 anos a
resiliência do planeta será ultrapassada e os limites físicos da Terra causarão,
ainda neste século, uma ruptura do processo de crescimento econômico,
obrigando as futuras sociedades a se adaptarem a circunstâncias
completamente inéditas em “[...] instantes críticos nos quais surgem mudanças
que, embora pequenas, surtem um efeito extraordinário” (VEIGA, 2013. p. 103).
Para ser possível estabelecer um desenvolvimento sustentável de fato,
será necessário que a sociedade passe por um período de transformação.
Vários designers acreditam e dissertam sobre essa transição, apontando que o
que definirá o grau de mudança será o nível de informação da população. Uma
mudança radical pode acontecer de duas maneiras: por acidente, como um
caminho traumático, no qual a transição será forçada por fenômenos e efeitos
catastróficos, ou por uma intenção pré-configurada (o que de fato é o design
como ciência), por uma escolha consciente e prudente (MANZINI e VEZZOLI,
2002; FRY, 2011).
Entretanto, vale salientar que pode não ser fácil inovar, pois deve-se
romper com as barreiras orçamentárias e, principalmente, culturais entre outras
questões, para que a inovação gere produtos e serviços com caráter
sustentável de sentido forte.
Conforme Fry (2011, tradução nossa), existem três principais
fundamentos a serem seguidos: (1) a criação do, e o movimento para, um novo
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paradigma econômico que abandona a nação de crescimento quantitativo
contínuo; (2) a adaptação do mundo material de consumo que foi estabelecido
concomitante com o desenvolvimento industrial (o alcance real desta tarefa é
enorme e atualmente obscurecido pela criação contínua e crescente de coisas,
incluindo os ditos produtos amigos do meio ambiente e as „coisas verdes‟); (3)
o reconhecimento de que a atual estrutura insustentável tornou-se elementar
para a existência e continuidade do ser humano modernizado.
Em um mundo de rápida urbanização, aumentando as pressões
populacionais e a insustentabilidade estrutural, além da probabilidade do
aumento de conflitos sobre os recursos naturais e uma enorme explosão de
refugiados ambientais devido à mudanças climáticas, a relação entre o design
e o político se tornará mais evidente e mais importante. Em face desta situação
o design tem que ser feito abertamente e proativo politicamente. O design tem
que se tornar uma política. (FRY, 2011. p. 7, tradução nossa)
Mas que tipo de visão sócio-política deverá ser adotada para se engajar
nesta gigantesca tarefa de transformação?
3 Transição Política
A democracia acabou deslegitimando a voz do bem comum,
abandonando o desenvolvimento de condições capazes de um novo caráter
social. De democracia, passou a ser entendida por democracia do consumidor,
que por sua vez deu origem a nação de soberania do consumidor, que por fim
resultou em políticas dominadas por uma reação às exigências dos
consumidores (FRY, 2011; VEIGA, 2013).
Já que pela primeira vez desde a existência dos seres humanos, „nós‟
descobrimos que somos responsáveis por colocar o futuro da nossa existência
planetária em risco, duas perguntas devem ser colocadas: „é muito tarde para
pararmos de destruir?‟ e depois „temos tempo suficiente para nos adaptarmos
às circunstâncias de devastação que criamos‟?
Embora o avanço tecnológico traga inúmeras melhorias para o bem
estar do homem, parece não dar conta de dois outros fatores que mais
contribuem para o impacto ambiental das atividades humanas, como o
tamanho da população e seu nível de afluência, em outras palavras, o aumento
populacional e dos níveis de consumo (VEIGA, 2013).
Torna-se imprescindível pesquisar novas formas para se lidar com os
problemas complexos apresentados, incluindo novos modelos econômicos.
Essa nova economia poderia propor mudança de direção, como em sua forma
mais simples, a criação de produtos de longa duração trocados por um valor
econômico e cultural muito maior, transformando a maneira como as coisas
são vistas, utilizadas, valorizadas e consumidas.
[...] há uma variedade de produtos/serviços que fomentam grande
desenvolvimento: produção local de alimentos; gestão local de água;
a melhoria do meio ambiente; cuidado com as crianças; gestão de
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resíduos, serviços de suporte técnico e manutenção de TI, sistemas
de energias e edificações renováveis. (FRY, 2011. p. 65)
Na essência, o objetivo geral deve ser reconfigurar a relação entre a
produção e o consumo. Tornar a produção mais gratificante e atraente, fazendo
com o que seja „consumido‟, de fato seja efetivamente consumido ou
duradouro. Serviços com mais relevância, diversidade de funções sociais e
econômicas. Tal economia seria centrada em um grande desenvolvimento de
formas de produção culturais, com o objetivo de alterar radicalmente o
equilíbrio entre produção e consumo cultural. Essas atividades, ao invés de
serem práticas participativas de minorias marginais, seriam posicionadas como
elementos chave da vida cotidiana. A música, a dança, as artes visuais, o
artesanato, entre outros, não serão mais vistos apenas como um meio de
prazer, mas como uma base para criar e explorar novas formas de ver e
aprender.
Levar o design além dos limites usuais significa que será necessário um
novo tipo de pensamento e prática do design, incluindo novas formas de
ensinar, com valores e objetivos adaptados para este cenário complexo
moderno. De acordo com Fry (2011, tradução nossa), existem três possíveis
movimentos para que se possa alcançar tal objetivo: (1) ampliar o âmbito do
design para além do âmbito do discurso existente; (2) reconhecer que a
humanidade em geral está entrando em um terceiro momento de habitação
mundial, a era da instabilidade; (3) levar o design além da linha desenhada
sobre as políticas institucionais existentes.
Vale ressaltar que essa ideia de sustentabilidade irrestrita não implica
em qualquer tipo de „retorno da sociedade à natureza‟, e sim o reconhecimento
e o engajamento com as propriedades que definem todas as relações sociais,
diminuindo com o consumo excessivo do artificial que agora já está
naturalizado, infundindo e poluindo o planeta.
Dado a complexidade e amplitude do assunto, de fato parece não haver
como escapar de uma mudança radical, exigindo um processo de decisão e
ação diretiva, com profissionais que apresentem uma maior compreensão das
pessoas, unindo políticos, designers, universidades, escolas e a sociedade
como um todo, trazendo os imperativos de liberdade e futuro juntos para formar
uma unidade indissolúvel. Tarefa complexa e turbulenta, mas o mais provável
é que turbulência e transformação continuem em constante simbiose
(PAPANEK, 1971; LUTZENBERGER, 1990; MANZINI e VEZZOLI, 2002;
VEIGA, 2007, 2013; MANZINI, 2008; BOSSELMANN, 2009; VEZZOLI, 2010;
FRY, 2011).
4 Considerações Finais
A dimensão da mudança é grande, e a tão desejável transição para uma
cultura sustentável não será uma tarefa fácil e simples, e sim um longo
processo de aprendizagem social. A cultura está em constante transformação,
mas não de uma maneira especificamente direcionada. Segundo Fry (2011,
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tradução nossa), a única maneira que a natureza da cultura é modificada para
uma direção específica é através de algumas culturas políticas, evidenciando a
importância da conexão entre os designers (e profissionais da economia
criativa), com suas habilidades inovadoras de visualizar e recriar o mundo, com
os corpos políticos que governam cidades, estados e nações.
Esta tarefa irá implicar em uma considerável habilidade de design, de
projetar visões de um sistema sociotécnico sustentável, organizá-las num
sistema coerente de produtos e serviços regenerativos. Mudar a perspectiva do
interesse das coisas para os resultados, imaginar soluções alternativas, avaliar
e compará-las bem como desenvolver as ideias e propostas mais adequadas
são alguns dos desafios que os designers contemporâneos precisam enfrentar,
caso desejam ampliar e efetivar os conceitos do desenvolvimento sustentável.
(MANZINI 2008).
Sob tais condições, parece haver uma grande oportunidade e certa
necessidade de desenvolver o design dentro dos setores públicos, na intenção
de integrar, mediar e traduzir as reais necessidades sociais. Será preciso um
novo quadro de designers estratégicos, de designers de serviços, fazendo as
perguntas certas, para que possa ser possível surgirem melhores serviços
públicos e novas relações entre governos e sociedade.
Contudo fica a esperança de que essa minoria, que já vem atuando
propondo transformações de “baixo para cima”, com suas escolhas não usuais,
preocupada em preservar a natureza em toda sua extensão, em desenvolver
uma sociedade mais digna e equilibrada com uma nova economia, possa ser
elevada à condição de maioria (BAUMAN, 2010, p. 89).
Agradecimentos
O autor deste artigo expressa sinceros agradecimentos à Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, e ao Centro
Universitário Ritter dos Reis pela oportunidade de desenvolver o curso de
Mestrado enquanto bolsista.
Referências
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YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre:
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