Diferenças sociais também nas ações judiciais por medicamentos
Mércia Pandolfo Provin, Silvana Nair Leite Contezini, Rita Goereti Amaral
Resumo: apesar do acesso aos serviços de saúde no Brasil ser gratuito e universal e fornecer
assistência integral aos seus usuários, inclusive assistência farmacêutica, inúmeros cidadãos tem
procurado a justiça solicitando bens e serviços de saúde. Esse fenômeno vem sendo chamado de
judicialização da saúde. No entanto, não se sabe ao certo se a via judicial se configura numa forma
igualitária de acesso e o quanto as diferenças sociais e geográficas influenciam em suas
características. Objetivo: Este estudo teve como objetivo caracterizar as ações judiciais que
solicitaram medicamentos considerando o perfil econômico de seus impetrantes. Metodologia:
foram analisadas as ações judiciais deferidas contra Goiânia, GO no período de 2003 a 2007
totalizando 1378. Foram descritas as características demográficas dos impetrantes, as doenças
relatadas, os medicamentos solicitados, a origem do serviço de assistência e o condutor da ação. Os
endereços dos impetrantes foram geoprocessados e distribuídos em 4 grupos classificados de acordo
com a renda média da população. Resultados: foi observado que os moradores de regiões ricas
impetraram mais ações, 1.7 ações/1000 habitantes em comparação com 0.55/1000 na região mais
pobre. Os custos das ações judiciais também foram maiores nessas regiões sendo 4 vezes mais caros
dos que as das regiões mais pobres. As doenças crônicas estavam presentes na maioria das ações,
entre os impetrantes que moravam em regiões mais pobres as doenças agudas e de menor
complexidade tiveram mais destaque. Conclusão: assim, as diferenças sociais são refletidas na
concessão do direito à saúde.
Palavras chaves: direito à saúde, acesso a medicamentos, desigualdades em saúde, gastos em saúde
e assistência a saúde.
Justificativa
O acesso aos serviços de saúde no Brasil é gratuito e universal e garante assistência
integral aos seus usuários, inclusive assistência farmacêutica. Apesar disso, nos últimos anos um
número cada vez maior de cidadãos brasileiros tem buscado a justiça para garantir o acesso aos
medicamentos, esse fenômeno vem sendo chamado de judicialização da saúde.
Alguns autores defendem que os mandados judiciais transformam-se em instrumentos de
iniqüidade de acesso e irracionalidade no uso dos recursos públicos ao ordenarem o fornecimento
de medicamentos que não estão padronizados nos sistemas públicos de saúde ou quando contrariam
normatização do SUS e da Assistência Farmacêutica (Vieira, Zucchi, 2007; Silva, Terrazas, 2009).
Ao revés, há quem reconheça a legitimidade para o controle das políticas públicas pelo Poder
Judiciário de modo a ampliar debate democrático, inclusive adotando posições contramajoritárias
(Appio, 2007; Freire, 2003).
As ações judiciais postularam pelos mais diversos tipos de medicamentos, grande parte
deles constava em listas de distribuição gratuita disponíveis em unidades de saúde, outros tantos
apresentavam alternativas terapêuticas padronizadas e uma pequena parte representava vazios
assistenciais ou novas tecnologias ainda não incorporadas pelo SUS (Messeder et al, 2005; Vieira,
Zucchi, 2007; Pereira et al, 2007; Romero, 2008; Bomfim, 2008; Leite et al, 2009; Chieff, Barata,
2009; Borges e Uga, 2010). Ferindo ou não as políticas públicas de saúde a demanda judicial por
medicamentos pode refletir as condições de acesso aos serviços e bens de saúde pelo cidadão.
O padrão de acesso aos serviços públicos de saúde é fortemente influenciado pela condição
social das pessoas e a disponibilidade de acesso a saúde complementar (Travassos, 2006; Silva et al,
2000). Demora no atendimento, excesso de encaminhamento a outros serviços, falta de médico,
deficiência na estrutura física são aspectos apontados pelos usuários como desfavoráveis à
utilização do sistema de saúde público (Schwartz et al, 2010).
Assim, diferenças geográficas e sociais são importantes como determinantes de saúde e de
acesso aos serviços de saúde. Ao analisar, por exemplo, a taxa de utilização de serviços de saúde
entre diferentes regiões, municípios e inclusive intra-município pode-se ter a dimensão geográfica
das diferenças na capacidade local de financiamento, do acesso do indivíduo e o tamanho e
complexidade das redes de serviços disponíveis (Travassos, 1997).
Para acessar os medicamentos o indivíduo deve se inserir no SUS e aceitar todo seu
regramento técnico-organizativo, que inclui respeito a hierarquização das ações, regionalização e
padronização de procedimentos. Aquele que assim não o quiser pode optar pelo sistema
suplementar privado cujo custeio é feito pelo próprio usuário, por seguros ou convênios de saúde.
Nesses casos, a assistência está sujeita a condições contratuais.
A via judicial como discutido anteriormente vem se apresentando como uma forma de
acesso aos medicamentos, mas não se sabe ao certo se ela tem sido uma via igualitária desse acesso
e o quanto as diferenças sociais e geográficas influenciam em suas características.
Desse modo, este estudo teve como objetivo caracterizar as demandas por medicamentos
pela via judicial em regiões com diferentes rendas.
Metodologia
Estudo transversal descritivo realizado na Universidade Federal de Goiás, aprovado pelo
Comitê de ética desta instituição. Foram analisadas as ações judiciais movidas pelo cidadão contra a
Secretaria de Saúde Municipal de Goiânia- GO (SMS/Goiânia) no período de janeiro de 2003 a
dezembro de 2007 e que resultaram em ordem judiciária a favor do fornecimento de medicamentos.
Os dados foram coletados a partir do arquivo documental da Farmácia de Medicamentos não
Essenciais da SMS/Goiânia, unidade pública responsável pela distribuição dos medicamentos
solicitados em juízo, para tanto, foi utilizado formulário padronizado. Foram excluídos do estudo
ações judiciais que não solicitaram medicamentos e do geoprocessamento as que não possuíam
endereço completo.
Assim, entre processos os 1553 processos arquivados, 175 foram excluídos por não
solicitarem medicamentos e dos 1378 restantes 129 foram excluídos do geoprocessamento.
As variáveis de interesse foram: (a) judiciais: número de ações judiciais e ano de aprovação;
(b) impetrante: número de impetrante, doenças referidas, gênero, idade, local de residência e renda;
(c) tipo de serviço de origem das prescrições e (d) medicamentos: custo, disponibilidade do
medicamento ou de uma alternativa terapêutica na assistência pública de saúde.
Pela indisponibilidade de informações sobre o custo de cada medicamento fornecido pela
SMS/Goiânia, foi necessário atribuir valores monetários a eles adotando a seguinte estratégia: para
cada especialidade farmacêutica solicitada adotou-se o medicamento de referência segundo
definição da Lei n. 9.787/99 (Brasil, 1999); o valor atribuído a cada item fornecido foi resultante do
preço ao consumidor consultado no Guia Farmacêutico Brasíndice de 2003 a 2007, considerando a
tributação de 17%, descontado 30% referente à margem média de lucro do varejo. Aos
medicamentos de preço liberado e/ou oriundo de importações, foram utilizados os valores atuais
praticados pelo comércio e aplicado índice de deflação correspondente ao período para se chegar ao
valor hipotético no ano em que efetivamente foi dispensado.
Os fármacos solicitados foram confrontados com as listas oficiais que compõem os três
componentes definidos na Política de Assistência Farmacêutica: componente básico e componente
estratégico (Relação Municipal de Medicamentos Essenciais – REMUME) e o componente
especializado de assistência farmacêutica. Os fármacos que não estavam relacionados em nenhuma
das listas do SUS foram relacionados e classificados pelo sistema anatômico-químico-terapêutico
(ATC) proposto pelo Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde (World Health
Organization - WHO, 2010). Foram considerados como alternativa terapêutica os medicamentos
requeridos por meio de ações judiciais que pertencem ao mesmo subgrupo terapêutico (3º nível da
classificação ATC) de outros que já constam nas listas do sistema público de saúde.
A partir dos endereços dos impetrantes as ações judiciais foram distribuídas, por
geoprocessamento, entre as 63 Unidades Territoriais de Planejamento (UTP) de Goiânia. As UTP
correspondem, cada qual, a um bairro ou a um conjunto de bairros delimitadas por barreiras físicas,
tais como: sistema viário, córregos e rios que separam porções do espaço urbano que guardam grau
significativo de homogeneidade. O dado populacional e a renda média do chefe de família (expressa
em reais) de cada UTP foram obtidos a partir dos dados censitários de 2000 (Brasil, 2003). A partir
daí a renda média foi transformada em salário mínimo cujo valor de referência de R$ 151,00 está
definido na Lei 9.971 de 18/05/2000 (Brasil, 2000).
Após o geoprocessamento as ações judiciais foram agrupadas, de acordo com a renda média
estimada do chefe de família para as respectivas UTP, em quatro grupos nomeados descritos a
seguir:
Região tipo I: conjunto de ações judiciais originadas em regiões cuja renda média é de 0 a 3
(inclusive) salários mínimos;
Região tipo II: conjunto de ações judiciais originadas em regiões cuja renda média é superior a 3
até 6 (inclusive) salários mínimos;
Região tipo III: conjunto de ações judiciais originadas em regiões cuja renda média é superior a 6
até 9 (inclusive) salários mínimos;
Região tipo IV: conjunto de ações judiciais originadas em regiões cuja renda média é superior a 9
salários mínimos
Para comparação entre os grupos de renda foi considerado como unidade amostral as UTP,
ou seja, quando há, por exemplo, uma média, este valor representa a média de todas as UTPs que se
encaixam nas características do grupo. Foi utilizado o teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis,
pois, no geral, os dados não seguiam uma distribuição normal.
Quando obtida a significância no teste de Kruskal-Wallis foi utilizado o teste de múltiplas
comparações de Tukey para verificar quais grupos diferem-se significativamente dos demais.
Devido a utilização de um teste não paramétrico, não foram realizados os testes de aderência
a distribuição normal.
Para identificação dos grupos utilizou-se a seguinte definição: 0-3 renda mensal de 0 a 3
salários mínimos, 3-6 renda média de 3 a 6 salários mínimo, 6-9 renda média de 6 a 9 salário
mínimos e 9- renda acima de 9 salários mínimos.
Para os testes foi utilizado um nível de significância de 0,05.
Resultados
O levantamento realizado na Farmácia de Medicamentos não Essenciais do município de
Goiânia identificou 1344 cidadãos impetrantes com 1378 ações judiciais que demandaram por
diferentes medicamentos durante o período de janeiro de 2003 a dezembro de 2007.
O número de processos impetrados ano a ano foi crescente de 2003 (96) a 2006 (481), sendo
que em 29 processos não constavam as datas de aprovação do processo. Em 2007 o número de
novos mandados teve uma redução de 46,7%% totalizando 225. Embora o número de novos
processos tenha reduzido em 2007, não se observou queda proporcional no número de processos
correntes no mesmo ano, isso se deve a característica cumulativa dos mandados (Figura 1).
1400
Número de processos
1200
1000
800
novos processos
600
processos correntes
400
200
0
2003
2004
2005
2006
2007
Ano
Figura 1. Comparativo entre o número de novos processos impetrados ano-a-ano e o
número de processos correntes no mesmo período.
As enfermidades mais citadas nas ações eram crônicas como diabetes mellitus tipo 1
(24,1%), hipertensão arterial (9,4%), transtorno do humor (6,4%), diabetes não-insulino depenente
(4,4%), refluxo gastroesofágico (4,2%) entre outras. Idosos e crianças corresponderam a 47,1% dos
impetrantes.
As prescrições que originaram essas ações vieram do sistema de saúde privado em 56,4%
dos casos, 18,1% sistema público, em 25,5% dos casos não foi possível identificar a origem da
prescrição. A maioria dos impetrantes era do sexo feminino totalizando 54,5%.
Foram postulados 482 fármacos diferentes, dos quais 93 (19,3%) estavam disponíveis na
REMUME, 48 (10%) disponível no Programa de Medicamentos Excepcionais e de Alto Custo
(PMEAC) e 8 (1,7%) estavam disponíveis em ambas as listas. Assim, 333 (69,3%) dos fármacos
solicitados não estavam inclusos em nenhuma das listas oficiais de distribuição gratuita, no entanto,
139 (41,7%) deles possuíam pelo menos uma alternativa terapêutica disponível (Figura 2).
As características das demandas judiciais variaram entre as regiões intramunicipais cujas
rendas do chefe de família eram diferentes e estão descritas na Tabela 1.
Notou-se um crescente número de ações à medida que a renda aumentava de tal maneira a
região com melhor renda (Região tipo IV) apresentou um número 3 vezes maior de ações que a
Região tipo I, de pior renda.
O custo médio das ações de impetrantes residentes em regiões com melhores rendas (Região
tipo IV) foi superior ao dos residentes em regiões de piores rendas (Região tipo I), chegando a ser 4
vezes maior. Com exceção do câncer que representa elevados custos em ambas as regiões, as
indicações terapêuticas na Região Tipo I formam um mix de enfermidades de menor complexidade
e que por sua vez menores custos quando comparada à da Região do Tipo IV.
Ambos
componentes
1,7%
PMEAC
10,0%
REMUME
19,3%
Não
padronizados
69,3%
Sem alternativa
farmacoterapêutica
58,3%
Com alternativas
farmacoterapêutica
41,7%
Figura 2. Distribuição dos fármacos em listas oficiais de distribuição gratuita e a existência de
alternativas terapêuticas. PMEAC: Programa de Medicamentos Excepcionais e de alto
Custo; REMUME: Relação Municipal de Medicamentos Essenciais.
Observou-se que as infecções bacterianas são as principais necessidades terapêuticas
indicadas como causa para solicitação de medicamentos na Região Tipo 1 e a diabete mellitus tipo 1
na Região Tipo IV.
Não houve diferença significativa de presença de prescrições originadas no sistema público
de saúde (SUS) entre as regiões. Porém, observou que o uso do sistema suplementar de saúde foi
mais frequente em regiões com rendas melhores.
Não houve diferença significativa entre as regiões na frequência de solicitação de
medicamentos não padronizados e daqueles que representam vazios assistenciais.
Discussão
As principais enfermidades relatadas nos processos eram de natureza crônica como os
distúrbios do metabolismo, doenças cardiovasculares, distúrbios no sistema nervoso central e
gástrico a exemplo do encontrado em outros estudos (Messeder et al, 2005; Viera, Zucchi, 2007;
Borges, 2007; Pereira et al, 2007; Romero, 2008) explicando o caráter cumulativo dos processos de
fornecimentos de medicamentos judicializados.
A maioria dos fármacos solicitados eram padronizados ou possuíam alternativas terapêuticas
disponíveis gratuitamente no SUS, o mesmo foi observado por outros autores (Messeder et al, 2005;
Viera, Zucchi, 2007; Borges, 2007). A solicitação de medicamentos para enfermidades, cujo
tratamento estava contemplado no SUS, pode ser compreendida a partir de dois pontos.
O primeiro entende que impetrante oriundo do sistema privado de saúde, que foi a maioria
dos casos nesse estudo, busque tais medicamentos na justiça talvez por desconhecerem a
disponibilidades desses na rede pública, ele e seus respectivos médicos assistentes, ou a prática
médica prescrita seja discordante dos protocolos clínicos e das ações programáticas definidas pelo
SUS. O segundo, que mesmo esses medicamentos estando padronizados em listas oficiais de
distribuição gratuita, os impetrantes podem ter encontrado alguma dificuldade de acesso.
Considerando, aqui, um sentido mais amplo de acesso, ou seja, não basta o medicamento estar
disponível, ele deve estar acessível no momento oportuno e o paciente (usuário) tem que acreditar e
se sentir acolhido no serviço (WHO, 2008; Penchansky e Thomas 1981).
Tabela1 . Características das ações judiciais entre as regiões com diferentes rendas
Ações judiciais por média de salários mínimos (SM)
Região Tipo 1
Região Tipo 2
Região Tipo 3
0 a 3 SM
3 a 6 SM
6 a 9 SM
161.627
475.814
247.208
197.893
p
−
89
417
407
336
−
285.427,58
1.280.606,35
1.826.535,36
1.472.447,36
−
0,55
0,88
1,65
1,70
0,001
1,77
2,69
7,39
7,44
0,0001
3,58
3,92
5,17
3,30
0,5
6,00
7,96
21,08
16,92
0,004
0,95
1,68
3,48
3,08
0,0004
0,98
1,37
2,74
2,2
0,008
0,35
0,5
0,98
0,84
0,01
População
Número de ações
Custos das ações (R$)
Número de ações por 1.000
habitantes
Average cost of lawsuits per
inhabitants
Região Tipo 4
Acima de
9 SM
Origem da prescrição por tipo de serviço
Média do serviço púbico de
saúde
Média do serviço provado de
saúde
Disponibilidade do fármaco solicitado
Média de número de fármacos
não padronizados em listas
oficiais por 1.000 habitantes
Média de número de fármacos
padronizados em listas oficiais
por 1.000 habitantes
Média de fármacos que
representam vazio assistencial
por 1.000 habitantes
Esperava-se que os prescritores do SUS procurassem indicar medicamentos disponíveis
gratuitamente na rede por conhecerem as listas de medicamentos padronizados. No entanto,
observou-se que as prescrições de medicamentos não padronizados estavam presentes inclusive em
receitas para pacientes do SUS.
A solicitação de medicamentos não padronizados podem se referir a tecnologias não
incorporadas no sistema público de saúde. Vieira e Zucchi (2010) identificaram deficiências
qualitativas nos tratamentos disponíveis pelo SUS para algumas enfermidades, indicando a
necessidade de revisão das políticas existentes com a possível inclusão de novas tecnologias.
Porém, essa situação deve ser avaliada com bastante cautela, pois a existência de uma nova
tecnologia não implica necessariamente que ela seja melhor que as já disponíveis (Rascati, 2010), a
assimilação de tecnologias deve ser feita de forma crítica e responsável pelo SUS.
Diferenças foram observadas entre as regiões cujos salários médios foram divergentes. Uma
delas já era esperada, a origem das prescrições em sistema privado de saúde foi mais frequente nos
estratos com maior renda, ou seja, esperava-se que em regiões mais abastardas financeiramente os
indivíduos não utilizassem tanto o SUS, optando por serviços de saúde suplementar, como
observado em outros estudos (Vieira, Zucchi, 2007; Terrazas, 2008). A busca do setor público para
superar lacunas do acesso e da integralidade da atenção num mix público privado são arranjos em
que os indivíduos recorrem no cotidiano assistencial influenciados pela cobertura dos planos de
saúde (Conill et al, 2008).
A indicação mais importante no grupo de impetrantes residentes na região de menor renda
foram as infecções do tipo bacteriana, que embora tenham requerido medicamentos de elevado
valor, o tempo de tratamento é de curta duração por se tratar de doença aguda, principalmente se
comparado com as doenças crônicas como é o caso do diabetes mellitus tipo 1, a principal indicação
encontrada entre os impetrantes residentes na região maior renda.
As indicações de maior importância financeira no estrato de maior renda demandaram por
medicamentos que representam assimilação de novas tecnologias que por sua vez possuem elevados
custos. O mesmo não aconteceu com o estrato de menor renda, exceto o câncer que esteve presente
em ambos, os principais problemas de saúde desse estrato requereram medicamentos menos
complexos e, portanto mais baratos.
Alguns autores têm chamado a atenção para iniquidade provocada pela Judicialização da
Saúde (Vieira, Zicchi, 2007; Terrazas, 2008). O que se verificou nesse estudo foi que indivíduos
residentes em regiões com características sociais diferentes em uma mesma cidade possuem
diferentes necessidades quanto a garantia do acesso ao tratamento farmacológico como parte de seu
direito a saúde. Essa diferença entre regiões socialmente diferentes pode indicar uma desigualdade
de acesso aos medicamentos por essa via. No entanto, não há subsídios ainda suficientes para
afirmar que essas diferenças reflitam uma iniquidade, considerando como iniqüidade as diferenças
injustas, desnecessárias e evitáveis ((Whitehead, 2000).
A abordagem ecológica permite visualizar tendência e perfil no espaço urbano, porém devese evitar tirar conclusões em nível individual a partir desses achados.
Conclusão
O perfil das demandas judiciais em regiões intramunicipais com rendas diferentes
apresentaram características distintas podendo representar necessidades desiguais na garantia dos
direitos a saúde, particularmente ao acesso aos medicamentos. Estratos da população com maiores
rendas buscam com mais freqüência a justiça para acesso aos medicamentos e solicitam tratamentos
mais caros.
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Diferenças sociais também nas ações judiciais por