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Revista RecreArte 12 > I - Creatividad Básica: Investigación y Fundamentación
David de Prado Díez 2010
Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da
transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y
Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad.
MÉTODOS INTERATIVOS NA PERSPECTIVA DA
TRANSDISCIPLINARIDADE
Akiko Santos (Ph.D) – PPGEA/UFRRJ/Brasil
Sandra Barros Sanchez (Ph.D) - PPGEA/UFRRJ/Brasil
Introdução
Quando se pensa num processo educativo na perspectiva da
Complexidade e Transdisciplinaridade, voltar à história da educação é de
grande valia, pois fornece elementos para saber como os educadores que nos
antecederam agiram na ministração do conhecimento na perspectiva
renovadora e indicam modalidades metodológicas possiveis de resgatar e
recontextualizar segundo as necessidades do nosso momento histórico.
Neste texto não iremos retroceder aos primórdios da educação na
sociedade humana. Pretendemos revisitar Métodos Interativos que fazem parte
da história mais recente da educação e verificar sua compatibilidade com os
conceitos da teoria da Complexidade e Transdisciplinaridade e reconceitualizálos.
Métodos Interativos e a Transdisciplinaridade
Existem muitos métodos que poderíamos chamar de interativos, como
por exemplo, Método Paulo Freire, Método dos Complexos de Blonsky,
Pinkevich e Krupskaia. No entanto, neste texto nos restringiremos ao Método
Decroly, de Ovide Decroly (1871-1932) com seus “Centros de Interesse”,
Método Freinet de Célestin Freinet (1896-1966), Método de Projetos de William
Kilpatrick (1871-1965) e Temas Transversais (BRASIL, 1998).
Chamamos de Métodos Interativos aqueles que permitem:
1. Interlocução entre os conhecimentos que estão compartimentados
em disciplinas devido à orientação modernista.
2. Interlocução aplicando a democracia cognitiva (sem hierarquias, não
superestimando determinados conhecimentos em detrimento de
outros);
3. Interlocução entre todos os participantes do processo com
possibilidade de integração dos agentes comunitários;
4. Aprendizagem considerando razão e emoção, integrando teoria e
prática;
5. Uma organização do conhecimento de tal forma que o diálogo entre
os diversos saberes, acadêmicos ou não-acadêmicos, permita a
emergência de um saber global e significativo para o aluno;
6. Respeito à diversidade de estilos e ritmos de aprendizagem.
7. Respeito às diferenças individuais, raciais e culturais, considerando
uma auto-formação, hetero-formação e eco-formação, estimulando a
flexibilidade e tolerância perante as diferenças.
Tais métodos se diferenciam do método tradicional de transmissão de
conteúdos justamente pelos conceitos que os sustentam. Se focalizar tais
diferenciações ao longo da história da educação, veremos que seus conceitos
têm raízes no Iluminismo do século XVIII, época de grandes transformações
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político-econômico-sociais, início da Revolução Industrial e ascensão da
burguesia liberal (ARANHA, 1996).
Naquela época, segundo Aranha (1996) três eram as grandes linhas
pedagógicas: o Enciclopedismo; o Naturalismo de Rousseau e a Pedagogia
idealista de Kant (p.120).
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), não obstante ter sido um dos
colaboradores da obra organizada por Denis Diderot (1713-1784)
Encyclopédie, diferencia-se do grupo. Enquanto os outros enciclopedistas
priorizavam a objetividade, transmissão de verdades e valores já constituídos
pela humanidade, formando as bases da pedagogia europeia (Pedagogia
Tradicional), Rousseau pensava a educação a partir das potencialidades de
cada criança, como uma expressão própria em contato com a natureza
(Pedagogia Renovada) .
Rousseau centraliza os interesses pedagógicos no aluno, não
mais no professor. Mais
que isso, ressalva a especificidade da
criança, que não deve ser encarada como um
adulto em miniatura
(ARANHA, 1996: p. 121).
Sua noção de “democracia direta” também diferia da “democracia
representativa”. Defendia que toda lei deveria ser ratificada pelo povo. O
soberano era o povo que não delega poderes para os representantes:
O cidadão, homem ativo e soberano, capaz de autonomia e
liberdade, é ao mesmo
tempo um súdito, porque submisso à lei
que ele próprio ajudou a erigir. Liberdade e
obediência
são
polos que devem se completar na vida do homem em sociedade
(ARANHA: 1996: 122).
As ideias de Rousseau vêm repercutindo ao longo dos séculos e
influenciando as tendências pedagógicas alternativas, entre elas a Escola
Nova, um ramo da Pedagogia Renovada, que se consolidou no Brasil pelas
atuações de Anísio Teixeira (1900-1971), inspirado no ideário liberal de John
Dewey (1859-1952):
O movimento de renovação da educação, inspirado nas ideias de
Rousseau, recebeu
diversas
denominações,
como
educação nova, escola nova, pedagogia ativa, escola do
trabalho (LIBÂNEO, 1991: 62).
As características dessa tendência pedagógica, sintetizando as
colocações feitas por Libâneo (1991: p. 62-65), são:
1. Se opõe à concepção da Pedagogia Tradicional, verbalista, de
memorização dos conhecimentos acumulados pela humanidade.
2. Advoga a educação pela ação. O centro é o aluno ativo e
investigador. Interação entre o organismo e o meio através da
experiência, estimulando a criança para que alcance seu objetivo de
crescimento e desenvolvimento. Colocar o aluno em condições
propícias para que, partindo das suas necessidades e estimulando
os seus interesses, possa buscar por si mesmo conhecimentos e
experiências. Trata-se de colocar o aluno em situações em que seja
mobilizada a sua atividade global e que se manifesta em atividades
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3.
4.
5.
6.
intelectual, atividade de criação, de expressão verbal, escrita,
plástica ou outro tipo.
A atividade escolar deve centrar-se em situações de experiência
onde são ativadas as potencialidades, capacidades, necessidades e
interesses naturais da criança.
Escola não é uma preparação para a vida, é a própria vida.
O currículo não se baseia nas matérias de estudo convencionais que
expressam a lógica do adulto, mas nas atividades e ocupações da
vida presente, de modo que a escola se transforme num lugar de
vivência daquelas tarefas requeridas para a vida em sociedade. O
aluno e o grupo passam a ser o centro de convergência do trabalho
escolar.
O melhor método é aquele que atende as exigências psicológicas do
aprender.
Para que tais características fossem consideradas num processo ensinoaprendizagem, os educadores adeptos dessa tendência dedicaram-se à
construção de metodologias de ensino, que aqui chamamos de Métodos
Interativos, mas que também são conhecidos como Métodos Globalizados.
Assim, temos:
 A metodologia chamada de “centros de interesse” proposta pelo
belga, médico e educador Ovide Decroly (1871-1932) foi precursora da
educação transdisciplinar, um ensino globalizado, centrado no aluno,
contrapondo-se ao ensino fragmentado, centrado no professor. Decroly
parte do princípio de que a criança percebe os fatos como uma
totalidade, e que suas representações são globais (ARANHA, 1996, p.
173). De uma atividade como comer, estudava-se a origem dos
alimentos, seus preços e distribuição, noções de geografia, história,
ciências, matemática e linguagem oral e escrita. Ele classificou os
interesses das crianças em seis grupos: A criança e a família; A criança
e a escola; A criança e o mundo animal; A criança e o mundo vegetal;
A criança e o mundo geográfico e A criança e o universo.
 Método Freinet, de Celéstin Freinet (1896-1966), francês, constrói sua
teoria com base na ação, não separando o conhecimento escolar da
vida, dos fatos sociais e políticos. Assim como Decroly, Freinet insurgiase contra o ensino tradicional enciclopédico, fragmentado, e era
defensor da unidade do conhecimento através de um ensino global.
Trabalhava os conhecimentos integrados e interdisciplinarmente. Na sua
visão, o natural da criança, sendo ele seguidor do Partido Comunista
Francês, não seria propriamente o jogo, mas sim o trabalho, como
incentivo inicial do interesse na aprendizagem. Freinet utilizava técnicas
tais como: Aula-passeio; Estudos de campo; Confecção de jornais de
classe; Texto livre; Documentação; Livro da vida; Correspondência entre
escolas, ler, compreender e responder.
 Método de Projetos, de William Kilpatrick ((1871-1965), norte-americano,
difundiu-se no Brasil pela atuação de Anísio Teixeira e Lourenço Filho. O
conhecimento seria trabalhado através de Projetos que requeriam
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diversidade de olhares, favorecendo a capacidade de análise,
interpretação e crítica. Seu método consistia em uma tarefa como, por
exemplo, construir uma casinha. Ao desenvolver o Projeto, ia-se
aprendendo a geometria, desenho, cálculo, história natural. Kilpatrick
formulou sua metodologia a partir de problemas reais, do dia-a-dia do
aluno. Uma metodologia que transgride fronteiras disciplinares, visando
a um ensino globalizado. Não havia disciplinas isoladas, elas se interrelacionavam. Kilpatrick concebia quatro grupos de projetos: de
Produção; de Consumo; Resolução de problemas e Aperfeiçoamento
de uma técnica.
Dentro dos Métodos Interativos, podemos ainda incluir os Temas
Transversais, instituídos nas escolas brasileiras no final do século passado,
com assessoria de César Coll. Por sua amplitude metodológica, os Temas
Transversais são os que melhor expressam a aplicação dos conceitos da
Transdisciplinaridade, considerando a lógica do terceiro termo incluído,
elaborado por Basarab Nicolescu (1999).
Os Temas Transversais possibilitam o envolvimento de toda a
comunidade escolar, desde professores, alunos e funcionários, como também
a comunidade na qual estão inseridos.
 Ao se tomar a ÉTICA como tema transversal, discute-se o conceito de
justiça, tomadas de decisões justas, solidariedade planetária, injustiças
sociais, valores e moralidades que estruturam a atual sociedade.
 Ao se tomar o MEIO AMBIENTE, trazem-se à tona as relações homemnatureza, homem-animal (seres vivos em geral), conceitos e estruturas
da economia predominante, da política e da cultura.
 Ao se tomar a SAÚDE, debate-se a miséria da humanidade planetária
como consequência de uma orientação política, econômica, social,
cultural e sanitária. Não só disseminar (como se pratica hoje em dia)
hábitos de cuidados tanto da saúde como do meio ambiente. Os hábitos
e valores estão em relação direta com o grau de consciência políticohistórico-cultural.
 Ao se tomar a PLURALIDADE CULTURAL como tema transversal,
emerge a diversidade da formação humana, diferenças de raça, crença,
origem social, cultura, formação profissional.
 Na ORIENTAÇÃO SEXUAL, para que não se transforme em simples
receituário comportamental, torna-se necessária a contextualização na
história da humanidade dos papéis assumidos em cada cultura,
articulação com a ÉTICA referindo-se à integridade e dignidade, valores,
tabus, preconceitos, respeito aos diferentes e igualdade de gêneros.
Os métodos de ensino acima relatados, na prática, eles sofreram o
fenômeno observado por Edgar Morin (2002) da “ecologia da ação”.
O pesamento complexo nos diz que há uma ecologia da ação. A
partir do momento em
que lançamos uma ação no mundo,
essa vai deixar de obedecer às nossas intenções, vai
entrar
num jogo de ações e interações do meio social no qual acontece, e seguir
direções muitas vezes contrárias daquela que era nossa intenção.
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Logo, nunca estamos
certos se nossas boas intenções vão
gerar boas ações (MORIN, 2002: 19).
Como já destacado por Libâneo (1991),
Esse entendimento da Didática (ativa) tem muitos aspectos
positivos, principalmente
quando baseia a atividadade escolar na
atividade mental dos alunos, no estudo e na
pesquisa, visando a
formação de um pensamento autônomo. Entretanto, é raro encontrar
professores que apliquem inteiramente o que propõe a Didática ativa.
Por falta de
conhecimento aprofundado das bases teóricas da
pedagogia ativa, falta de condições
materiais,
pelas
exigências de cumprimento do programa oficial e outras razões, o que
fica são alguns métodos e técnicas (p; 66).
Métodos de ensino são sistematizações construídas a partir dos ideários
de cada momento da sociedade, dando sustentação e fundamentação
conceitual à educação no que se refere ao ser humano, à sociedade, à
aprendizagem e ao próprio conhecimento.
As teorias e seus conceitos orientam as práticas pedagógicas. No
entanto é necessário atentar para o fato de que entre teoria e prática há o
mundo da vida, da condição humana e sua sobrevivência no sistema
constituído. Essas dimensões da vida fazem com que uma prática como a
educativa nem sempre corresponda, integralmente, à teoria que a constituiu.
Devido à força que a lógica clássica ainda exerce de separar, simplificar
e reduzir quando um fenômeno é complexo, persiste a dicotomia entre teoria e
método, sendo frequente aplicar-se o método com o senso comum, como se
fosse algo independente, um saber simplesmente técnico.
A dicotomia teoria e método leva a esse comportamento. Se a mudança
metodológica não se faz acompanhar de mudança epistemológica, reproduz-se
o sistema vigente da mesma maneira, ou seja, com novos métodos talvez mais
eficientes.
Os Métodos Interativos não seguem conceitos da Pedagogia Tradicional
que organiza o sistema educacional em base a fragmentação do
conhecimento, valorizando a objetividade e racionalidade, seguindo a lógica
clássica de identidade e não-contradição e acreditando que aprender é
memorizar, apropriar-se dos conhecimentos disponíveis fora do sujeito
(dicotomia sujeito/objeto).
Ao fazer a articulação dos conhecimentos, os Métodos Interativos
transgridem a organização estabelecida. A lógica clássica não admite interação
entre as disciplinas compartimentadas, de modo que, décadas atrás, quando
se começou a falar de interdisciplinaridade, esta já extrapolava tal lógica.
Os citados Métodos Globalizados (Escola Nova) também transgrediam a
organização estabelecida. Na sua elaboração, os conceitos eram diferentes,
hoje, aprofundados e delimitados pela teoria da Complexidade e
Transdisciplinaridade. Ao articular os conhecimentos escolares, não os
separando da vida, dos fatos sociais e políticos, trabalhando os diversos
conhecimentos disciplinares integradamente, tais métodos seguiam outra
lógica, a Lógica do Terceiro Termo Incluído que comanda a Metodologia
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Transdisciplinar (NICOLESCU, 1999) e sistematiza as articulações, visando
uma compreensão mais global e significativa dos conhecimentos para a vida.
Ao praticar a articulação dos conhecimentos transgride-se leis, lógica e
conceitos que estruturam o nível disciplinar de fragmentação e
compartimentação de saberes. Passa-se a trabalhar no outro nível, o nível da
articulação dos saberes, da unidade do conhecimento.
Cada Nível de Realidade (disciplinaridade e transdisciplinaridade) possui
leis, lógica e conceitos próprios. Na articulação, dependendo das leis, lógicas e
conceitos utilizados, observa-se, na prática, a emergência de vários graus de
transdisciplinaridade. Conforme a satisfação em relação às leis, lógicas e
conceitos aplicados, a articulação se aproxima mais do nivel da disciplinaridade
ou do nível da transdisciplinaridade.
Sommerman (2006) refere-se a tais oscilações entre Multi, Pluri, Inter e
Transdisciplinaridade1 como a “valsa dos prefixos”. Na prática, há momentos
em que estamos simplesmente justapondo (multidisciplinaridade) e há
momentos em que integramos conteúdos de diferentes disciplinas
(interdisciplinaridade) e quando se realiza, simultaneamente, diálogo entre
distintos saberes (transdisciplinaridade) a compreensão supera o nível da
fragmentação e passa-se a desenvolver no outro Nível de Realidade, uma
compreensão global dos objetos de estudo.
Quando os Métodos Interativos, sustentados na crença de que a criança
percebe os fatos como uma totalidade, e que suas representações são globais,
centram o ensino na aprendizagem do aluno com base na ação e na
experimentação, seja no estilo de “Centros de Interesse”, de Decroly; ou seja
propondo um trabalho no estilo Freinet; ou um projeto, no estilo de Kilpatrick;
ou, ainda, desenvolvendo Temas Transversais, o conceito de aprendizagem já
não é mais o de acumulação de conhecimentos, o de memorização e repetição
mecânica da Pedagogia Tradicional
Os conceitos de aprendizagem e de ser humano seguem outra
fundamentação. Ainda que nos anos da elaboração dos métodos globalizados
não se tinha uma sistematização científica, os conceitos que os sustentam,
hoje, correspondem aos conceitos que os pesquisadores Maturana e Varela
(2001) chamaram de autopoiese, isto é, que a aprendizagem é algo que o
sujeito constrói por si mesmo em interação com as informações que o meio
disponibiliza, um ato autopoiético e o ser humano seria um sistema
autopoiético.
A autopoiese sugere que a aprendizagem é um processo de duas vias:
de fora para dentro e de dentro para fora. Ou seja, o sujeito, frente às
informações, negocia, as adapta segundo suas características. Ele interage
com o meio físico e social, como dizia Piaget (1976).
No entendimento da Pedagogia Tradicional, a aprendizagem teria uma
só via: de fora para dentro. Por isso, a forma tradicional de ensino se sustenta
na exposição e memorização do conhecimento. A aprendizagem como
sinônimo de memória se enreda com o conceito de conhecimento, como sendo
1 1
Nicolescu (1999) tanto alerta para o fato de que a transdisciplinaridade é radicalmente
distinta das duas visões que a antecedem (pluri e Inter) como chama atenção para que não se
diferencie em forma absoluta, pois a transdisciplinaridade corre o risco de esvaziamento.
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já dado, verdadeiro e universal, por isso, era necessário sua apropriação da
parte dos alunos por meio de exercícios de repetições. Com tais conceitos, o
ensino-aprendizagem só poderia ser o de transmissão de conteúdos, com um
só movimento: o de transmissor para receptor.
O conhecimento não é objetivo (fora do sujeito) e neutro. O sujeito
constrói seu próprio conhecimento, dialogando com os que lhe são
apresentados e para tal necessita o envolvimento emocional e racional,
portanto, o conhecimento seria objetivo e subjetivo ao mesmo tempo e nãoneutro. Tudo o que existe no ambiente influencia o ser que o capta e integra no
processo mental de interação e construção. Desse modo, o conhecimento é
dinâmico, provisório e não-neutro.
Os Métodos Interativos já trabalhavam com os novos conceitos de
conhecimento, aprendizagem e ser humano. Considerar o ser humano como
um sistema autopoiético é bem diferente da definição modernista de um ser
racional.
A modernidade, como continuidade da forma de pensar dos gregos se
apoia no princípio da identidade e não-contradição da lógica Aristotélica, hoje,
conhecida como lógica clássica. Descartes (1560-1650), pai da ciência e
filosofia moderna, ao separar o sujeito do objeto, separa também o ser do
conhecimento, a emoção da razão, o particular do coletivo, a unidade da
diversidade (DESCARTES, 1973).
Assim, trabalha com um sistema fragmentado, parcializado, unilateral.
Daí, a definição do Homem como um ser racional, determinando e subsidiando
o modo de ensinar, privilegiando somente a sua dimensão racional. A
Pedagogia Tradicional se fundamenta no sistema cartesiano de interpretar os
fenômenos e organiza toda a estrutura burocrática e conforma a mente das
pessoas, aprisionando-as. As pessoas que nasceram e tiveram o cérebro
estruturado dentro desse sistema não têm consciência do seu aprisionamento.
Outro modo de pensar o ser humano consiste em tomá-lo por inteiro
como faz Edgar Morin (2000): um ser complexo. Falar do ser humano é um
problema realmente complexo. Complexo, no sentido de fenômenos “tecidos
em conjunto”, um entrelaçamento de múltiplos fatores. E, para complicar, existe
uma multiplicidade de facetas ainda não devidamente esclarecidas e outras
que surgem no enfretamento da vida. Assim, o que quer que seja dito sobre o
ser humano, deve-se tomar como conclusões transitórias e sujeitas a
mudanças.
Mas, mesmo nessas condições, é imprescindível que os educadores
possuam uma noção do que seja o ser humano, pois é seu objeto de trabalho.
Dependendo da definição que se tenha do ser humano, variará o seu modo de
ensinar.
Como Rousseau já percebia a condição paradoxal do cidadão dizendo
que a liberdade e obediência (opostos) são polos que devem se completar na
vida do homem em sociedade, hoje, a teoria da Complexidade e
Transdisciplinaridade, fala do binário autonomia e dependência e traz o
Princípio da Complementaridade dos Opostos:
A noção de sujeito (como uma estrutura organizadora) compelenos a associar noções
antagônica...
o
que exige
um
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pensamento complexo... um pensamento capaz de
unir
conceitos que se rechaçam entre si e que são suprimidos e catalogados em
compartimentos fechados... esse é o trabalho que precisa
ser feito para que emerja a
noção de sujeito. Do contrário,
só continuaremos dissolvendo-o e
transcendentalizando-o, e não chegaremos a compreendê-lo jamais
(MORIN,
1996: 55).
A construção da subjetividade humana é uma articulação de contrários
(autonomia e dependência). A unidade se constrói em diálogo com a
multiplicidade (autorreferencialidade e multirreferencialidade), consolidando
uma unidade indissolúvel (opostos complementares unidade e multiplicidade).
Desse modo, o ser humano tece a si mesmo articulando os antagônicos:
razão/emoção, unidade/diversidade, subjetividade/objetividade, ser/saber,
egocentrismo/altruismo. Oscila de um polo a outro conforme as circunstâncias
internas e externas. É a dança dos binários.
Os novos conceitos aqui delineados muito brevemente, estão implícitos
nos Métodos Interativos. Ainda que nas suas aplicações manifesta-se o
fenômeno do reducionismo.
Na prática, as teorias são interpretadas por sujeitos que trazem suas
próprias convicções e estão imersos no mundo da vida, da sobrevivência,
adequando-se ao sistema. A falta de preparo adequado dos professores, faz
com que se aplique a lógica clássica de oposição e não-articulação (que
comanda inconscientemente o raciocínio. Fenômeno esse conhecido como
princípio oculto), dicotomizando os pares binários, isto é, ao dicotomizar teoria
e prática (ou teoria e método) desfigura a teoria que fundamenta a prática,
anulando as transformações preconizadas pelas teorias e a educação continua
igual, integrando somente algumas inovações pontuais, sem que se atinja o
sistema como todo.
Conclusões
Assim como todo conhecimento é reconstrução do conhecimento, o
resgate dos Métodos Interativos da história da educação nos oferece
elementos para a construção metodológica de como se educar segundo os
conceitos da teoria da Complexidade e Transdisciplinaridade.
O importante nesse afazer é estar atento quanto ao nosso próprio
instrumental de raciocínio, pois as sinapses neuronais estão automatizadas na
lógica clássica de identidade e não-contradição. Lidar com a educação
transdisciplinar significa construir novas sinapses neuronais. É distinguir a
formação disciplinar, vida já determinada, certeza de todos os dias,
comodidade dos horários fixos de aulas e mergulhar no incerto, na utopia, na
possibilidade, ampliando o horizonte em busca da totalidade perdida. E então,
um novo panorama se descortinará aos que ousam.
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