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14/7/2005 12:04:00 Operação na Daslu provoca surpresa, aplausos e protestos Último Segundo Darlan Alvarenga, repórter iG no Rio
RIO – A operação Narciso realizada ontem na Daslu, a mais famosa – e cara ­ loja de luxo do País, e que prendeu a proprietária da multimarcas, Eliana Tranchesi, e seu irmão Antônio Carlos Piva de Albuquerque, surpreendeu o País, caiu como uma bomba no mundo fashion, mas também provocou a revolta de políticos, advogados e entidades como a Fiesp e OAB, que criticaram a invasão da loja e a prisão da sua proprietária. Ministério da Justiça e a Polícia Federal rebateram nesta quinta­feira as críticas de que tenham ocorrido excessos na operação, que mobilizou 250 agentes da Polícia Federal, 80 auditores da Receita.
Por meio da sua assessoria de imprensa, o ministério informou que a operação ocorreu dentro da normalidade e sem qualquer desrespeito à portaria 1.287, recém assinada pelo ministro Márcio Thomaz Bastos, que "estabelece instruções sobre a execução de diligências da Polícia Federal para cumprimento de mandados judiciais de busca e apreensão". Para as autoridades federais, a operação ocorreu “de maneira discreta, apenas com o emprego dos meios proporcionais, adequados e necessários ao cumprimento da diligência”.
“Tudo ocorreu dentro do rigor da lei. A Polícia Federal dar apoio e cumprir uma ação do Ministério Público e da Receita Federal, conforme determinação judicial. A ordem do ministro é para que o trabalho seja impessoal e republicano, sem perseguir ou proteger qualquer investigado e respeitando todos os direitos do cidadão”, afirmou o ministério. Como demonstração de que a operação foi realizada com discrição e respeitando a nova portaria, o ministério cita o fato de não ter sido permitida a entrada de pessoas alheias à operação ou a exibição dos investigados presos cautelarmente, respeitando a intimidade dos envolvidos. “Não houve excessos ou constrangimento. Nenhuma TV entrou, foi tudo filmado de fora. E os presos não foram exibidos, entraram e saíram pela garagem da Polícia Federal”, afirma.
A PF lembra ainda que as diligências não interromperam o funcionamento da loja e que nenhuma mercadoria foi retirada ou impedida de ser descarregada no local. Por cumprir 36 mandados de busca e apreensão em diversas partes do país, o ministério considerou também normal o número de homens envolvidos na operação. Segundo a PF, o forte aparato exibido, com agentes portando fuzil na entrada da loja, por exemplo, se faz necessário para inibir qualquer tipo de reação e garantir a qualidade e a segurança do trabalho.
Procurador diz que prisão era necessária
O procurador responsável pela investigação Matheus Baraldi, também rebateu as afirmações dos advogado da Daslu, de que a prisão temporária teria sido abusiva e desnecessária. Em entrevista à apresentadora Ana Maria Braga, no programa ´Mais Você´, ele afirmou que Eliana Tranchesi “não ficou presa um minuto a mais do que o necessário”. A empresária passou 10 horas presa na sede da PF e foi solta no início da noite, após prestar depoimento, a pedido do próprio Ministério Público Federal.
Segundo ele, a prisão temporária (ou cautelar) dos envolvidos se fazia necessária para a instrução do inquérito e impedir a destruição de provas, uma vez que a fraude investigada passava pela substituição de faturas originais. Na antiga sede da Daslu, na Vila Nova Conceição, agentes da PF encontraram caixas de notas fiscais com ordem para "incinerar". Segundo Baraldi, a operação mostra que não o existe mais no Brasil pessoa que, em função do poder, esteja "blindada" da investigação do Ministério Público. Ele informou que a documentação recolhida na Daslu será encaminhada ainda nesta quinta­feira para a Receita Federal, que analisará os documentos. O segundo passo será o MP oferecer a denúncia à Justiça.
Os dirigentes da Daslu são acusados de ter praticado sonegação fiscal, descaminho (contrabando), falsificação de documentos e formação de quadrilha. Há suspeitas de que a Daslu comprava produtos de luxo de marcas famosas do exterior e, através de empresas laranjas, importava as mercadorias com notas falsas, a fim de sonegar impostos no Brasil, como o de produção industrial (IPI), de importação e, inclusive, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Fiesp, OAB e ACM criticam operação O trabalho da Polícia Federal foi considerado uma "arbitrariedade" pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), que já marcou até um encontro, na próxima segunda­feira, para “mobilizar a sociedade contra excessos cometidos pela Polícia Federal e outros órgãos” e “defender o Estado Democrático de Direito”. Em nota, a Fiesp declarou que "todos gozam de presunção de inocência" e afirmou que é inadmissível alguém ser preso sem culpa evidenciada e de modo extravagante, "como um espetáculo pirotécnico".
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também viu exagero e “estardalhaço” na forma como a operação foi realizada e critica o uso das ações da PF como propaganda do Estado. "É muito próprio de regimes totalitários se usar da polícia para se fazer política de Estado e nós não pretendemos que isso ocorra no Brasil", afirmou o presidente da entidade, Roberto Busato. Segundo ele, as diligências de busca e apreensão não podem se transformar em “constantes e verdadeiros shows pirotécnicos”.
A OAB cobra ainda informações sobre os resultados das mais de 80 operações já deflagradas pela PF, uma vez que a “esmagadora maioria das prisões ocorridas durante tais diligências foi revogada”. “Será que essas operações tiveram um efeito posterior, estão sendo continuadas ou pararam simplesmente no show, depois que ocorreram?", questionou.
A operação também provocou reações até na tribuna do Congresso. O senador Antonio Carlos Magalhães (PFL­BA), por exemplo, viu na operação uma "manobra" do governo para mudar o foco das atenções. "Deveriam sim é abrir a sede do PT para ver o que existe lá e qveriguar por que razão o filho do presidente recebeu dinheiro da Telemar", disse, referindo­se à sociedade da empresa de Fábio, filho de Lula, com a telefônica.
Para os advogados da Daslu, a prisão foi desnecessária e a Justiça não teria verificado a existência de justa causa para expedir os mandados. Para o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, contratado pela loja, a operação confirma seu "antigo temor da escalada do arbítrio". "A ação parece ideológica, para mostrar que os ricos também vão para cadeia”, disse.
“O excesso está na reação das elites”
Juristas e magistrados também saíram em defesa da operação e da juíza de Guarulhos que determinou a prisão temporária de quatro pessoas na operação Narciso. Para o jurista Dalmo Dallari, as megaoperações da PF mostram que os privilégios estão acabando. O presidente da Associação Brasileira dos Magistrados (AMB), Rodrigo Collaço, diz que a prisão temporária é um instrumento indispensável para a apuração de crimes e visa exatamente a produção de provas. “O preso temporário é detido com todas as garantias. A prisão impede que ele destrua provas ou que dificulta a investigação. Ele pode até ficar em silêncio, se quiser”, afirma.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Jorge Antonio Maurique, afirma que a prisão temporária é um instrumento legítimo previsto na legislação e que é o juiz quem deve julgar se ela faz­se ou não necessária. “Ela é de cinco dias, podendo ser renovada por mais cinco, mas também pode ser de horas”, afirma.
Segundo ele, a prova de que não houve excesso é que quando a prisão não se fazia mais necessária, Eliana foi liberada. “Não vejo qualquer indício de arbitrariedade ou excesso, o que vejo é um excesso de retórica de uma elite que sempre se julgou acima da lei”, afirma o presidente da Ajufe.
Na opinião dos magistrados, a reação à operação na Daslu só está ocorrendo porque o foco da investigação atinge a elite econômica, social e política do País. Segundo Maurique, a elite demonstra revolta ao se ver atingida pela Justiça Federal, mas não manifesta a mesma indignação quando esse mesmo tipo de mandado de prisão é contra o pobre, “o que acontece todos os dias, dentro da mais absoluta legalidade”.
“Quando um pobre é acusado de algum crime, a foto dele é colocada no jornal e a imagem dele aparece na TV e nunca vi a Fiesp reclamar”, alfineta. “Eu considero esse tipo de reação um completo absurdo, pois é justamente o Estado Democrático de Direito que propicia que os três poderes cheguem a todos da mesma maneira”.
Os magistrados demonstram, no entanto, preocupação com uma tendência de “espetacularização” das diligências da PF e uso das operações como instrumento midiático. “Essas operações podem ser feitas sem alarde ou sensacionalismo. O espalhafato é ruim em qualquer operação, pois pode desrespeitar a intimidade das pessoas”, diz. “O que mais me chama a atenção é o acompanhamento instantâneo das TVs, que costumam ser avisadas com antecedência”, afirma Collaço. Maurique destaca, no entanto, que não notou excessos ou constrangimentos desnecessários na operação da Daslu. Ele defende a discrição, mas diz ser contra qualquer cerceamento da atividade jornalística. “Não tem como esconder uma operação dessa”, conclui. 
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