A Revolução Francesa é considerada pelos historiadores
o marco que assinala o fim da Idade Moderna e o início
da Idade Contemporânea.
O movimento foi o mais poderoso golpe contra o Antigo
Regime na França e repercutiu em toda a Europa e em
várias regiões do mundo, inclusive na América.
Os revolucionários franceses, sob o lema liberdade,
igualdade e fraternidade, levaram os ideais iluministas
às últimas consequências.
Procuraram instituir um Estado caracterizado por maior
participação política da população e pela diminuição das
desigualdades sociais. Inauguraram assim um Estado
que tinha em sua base o "povo" e o direito à cidadania.
A França às vésperas da Revolução
No século XVIII, a França viveu um período de grande
prosperidade, embora sua economia se conservasse
predominantemente agrícola. De sua população,
estima-se que 80% viviam no campo.
A prosperidade chegou ao fim por volta de 1778, quando
uma crise começou a tornar evidente a precariedade da
organização administrativa, política, financeira,
econômica e social do país.
Enfim, ficou claro que a França se encontrava num
impasse decorrente de tudo o que constituía o Antigo
Regime representado pela monarquia absolutista de
direito divino, que tinha como personagens centrais os
membros da dinastia dos Bourbon.
Desde 1774, a França era governada por Luís XVI.
Distante dos interesses da maioria da população, que
vivia na miséria, o rei governava o país de longe, do
Palácio de Versalhes, nos arredores de Paris.
Para sustentar o luxo de sua corte — formada por
numeroso séquito de nobres ociosos —, Luís XVI
dependia dos tributos pagos pela população mais pobre.
Para essa camada menos favorecida, a situação era
insustentável e a insatisfação, crescente.
A sociedade estava dividida em três estados: o clero, a
nobreza e o povo. Os dois primeiros estados mantinham
vários privilégios do sistema feudal, como o direito de
cobrar impostos. Além disso, eram isentos do
pagamento de diversos tributos, ao contrário do que
ocorria com o povo, que não possuía direito algum.
Outro fator que aprofundava as diferenças era a grande
dificuldade de romper com a economia agrária e de
implementar o desenvolvimento industrial no país.
Para completar o quadro, a desorganização do governo
era total. Proliferavam leis e instituições diversas em
várias províncias, as contas do rei se confundiam com as
contas do governo e constantes déficits eram
provocados por gastos excessivos.
Essa situação causava enorme descontentamento à maioria
da população que formava o terceiro estado. Desse
estamento também fazia parte a burguesia (formada por
comerciantes, banqueiros, industriais), que enriquecera na
época da prosperidade. Tendo consciência de sua força, a
burguesia passou a lutar por mudanças que lhe permitissem
exercer maior controle sobre o governo e o Estado.

Alto clero – reunia
bispos, abades e
cônegos, oriundos de
famílias da nobreza. Sua
fortuna era proveniente
de dízimos e dos imóveis
urbanos e rurais de
propriedade da igreja.

Baixo clero – compunhase de sacerdotes pobres,
muitos dos quais
simpatizantes dos ideais
revolucionários. Esses
sacerdotes eram
geralmente responsáveis
pelas paróquias mais
carentes.

Nobreza cortesã –
formada por cerca de 4
mil pessoas que viviam
no palácio de
Versalhes, em torno do
rei, recebendo pensões
do Estado.
Nobreza provincial –
formada por nobres,
muitas vezes
empobrecidos, que viviam
nas províncias (interior) e
sobreviviam à custa de
taxas cobradas dos
camponeses, a título de
direitos feudais.
Nobreza de toga –
formada por burgueses
ricos que compravam
títulos de nobreza e
cargos políticos e
administrativos.
Camponeses –
trabalhadores rurais
submetidos a diferentes
formas de trabalho
(livres, semilivres e servos
presos às obrigações
feudais).
Sans-culottes – camada
social urbana, de
aproximadamente 200 mil
pessoas, concentrada em
Paris e composta de
aprendizes de ofícios,
assalariados e
desempregados
marginalizados.
Pequena burguesia –
pequenos comerciantes e
artesãos.
Média Burguesia –
profissionais liberais, como
médicos, advogados,
professores e
comerciantes.
Alta burguesia –
banqueiros, grandes
empresários e
comerciantes (incluindo
os que compravam e
vendiam mercadorias
coloniais).
Os problemas do país se intensificaram a partir de 1785,
em razão de problemas que podem ser considerados as
causas imediatas da revolução.
O primeiro deles foi a falência financeira do governo,
principalmente depois dos gastos realizados com a
participação francesa na guerra de independência das
treze colônias inglesas.
Outro aspecto que acabou agravando a situação foi o
tratado de comércio estabelecido com a Inglaterra, em
1786. A medida favorecia a importação de
manufaturados (tecido x vinho = trigo), o que provocou
o fechamento de empresas francesas, gerando uma
onda de desemprego.
Além disso, um rigoroso inverno prejudicou as colheitas
de 1788, causando escassez de alimentos e alta de
preços. A população, que já enfrentava sérias
dificuldades de subsistência, não tinha como comprar
pão, produto que constituía a base da alimentação.
Faminta e revoltada, estava prestes a se sublevar.
Algumas tentativas de reformas foram
feitas pelos ministros de Luís XVI para
alterar esse estado de coisas. Turgot, por
exemplo, era um fisiocrata que procurou
controlar as finanças cortando gastos
públicos e propondo a cobrança de
impostos da nobreza e do clero. Suas
medidas, porém, atraíram contra si a ira
desses setores e ele acabou demitido.
Prontamente, o rei nomeou um substituto,
Necker, que deu continuidade ao processo
reformista. Em 1781, o ministro publicou a
relação das contas do governo, e a população
ficou escandalizada ao tomar conhecimento das
despesas da corte, que consumiam os recursos
do país. Necker também foi demitido.
A crise se agravava, e não havia como conter as
manifestações de revolta que ocorriam no país. Diante
do inevitável, a própria nobreza se rebelou e forçou o rei
a convocar os Estados Gerais, ou seja, a reunião dos
representantes dos três estados (clero, nobreza e povo),
o que não acontecia desde 1614.
No período imediatamente anterior
à revolução, circulou entre os
franceses um folheto escrito pelo
abade Sieyés, que, embora clérigo,
era deputado pelo terceiro estado e
acabou participando das grandes
decisões de 1789.
No folheto, assim Sieyés sintetizou
os anseios e a importância desse
grupo social: O que é o terceiro
estado? Tudo. O que ele tem sido
na política francesa até hoje?
Nada. O que pede ele? Ser
qualquer coisa.
Os Estados Gerais reuniram-se no Palácio de Versalhes
em maio de 1789.
O terceiro estado era representado na sua maioria por
burgueses. De imediato, porém, surgiu o problema de
como se fariam as votações. Isso porque, de acordo com
a tradição, cada estado tinha direito a um voto.
Se as votações continuassem a ser feitas dessa forma, o
clero e a nobreza votariam juntos e nada mudaria —
ainda que alguns nobres e clérigos apoiassem as
reformas.
O terceiro estado, que tinha a maioria, exigiu que a
votação fosse realizada por representantes e não por
estado.
As discussões se arrastaram por um mês, mas não se
chegou a acordo algum.
O terceiro estado, então, decidiu se separar dos Estados
Gerais e proclamar-se Assembleia Nacional, com o
objetivo de extinguir os privilégios da nobreza e do clero
e dar à França uma Constituição conforme os ideais do
Iluminismo.
Luís XVI tentou impedir a iniciativa, proibindo o
encontro. Mesmo assim, os representantes se reuniram
e, por fim, os outros dois estados se aliaram ao terceiro
estado para formar a Assembleia Nacional Constituinte.
O terceiro estado havia triunfado. Era o começo da
revolução.
Enquanto a Assembleia estava reunida, uma agitação
crescente tomava conta das ruas. Luís XVI, temeroso da
revolta popular, concentrou tropas às portas de Paris e
de Versalhes. A população, por sua vez, procurava se
armar a fim de defender a Assembleia Nacional
Constituinte de uma possível agressão.
Nesse clima, começaram a ocorrer os primeiros conflitos
nas ruas de Paris. Em 14 de julho de 1789, uma grande
massa popular tomou de assalto a Bastilha, uma
fortaleza utilizada como depósito e presídio, em busca
de armas e munição. A Bastilha era um símbolo da
opressão, pois em seu interior ficavam trancafiados
os prisioneiros políticos.
A revolução se espalhou por todo o país. Os sangrentos
episódios que se seguiram forçaram o rei a retirar as
tropas, mostraram a força da população e levaram à
formação de um conselho de cidadãos para administrar
Paris.
Conduziram, finalmente, à organização de um corpo de
voluntários armados que se intitulou Guarda Nacional,
cuja chefia foi entregue ao marquês La Fayette, o
mesmo que havia lutado nas treze colônias americanas
durante o processo de independência.
As mudanças estavam em curso, e numerosos nobres,
temendo as represálias dos revolucionários, começaram
a deixar a França. Refugiados nos países vizinhos,
procuravam convencer os governantes europeus do
perigo que o movimento revolucionário francês
representava para as demais monarquias absolutistas da
Europa.
Na França, as antigas estruturas começaram a ser
alteradas pela ação dos revolucionários. Em 4 de agosto
de 1789, a Assembleia Nacional Constituinte decidiu
abolir os resquícios do feudalismo, privando a nobreza e
o clero de muitos privilégios, como o não pagamento de
impostos.
Inspirada nos ideais iluministas, nesse mesmo ano foi
proclamada a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão.
Em 1790, com a aprovação da Constituição Civil do
Clero, os bens da Igreja foram confiscados e os
membros do clero passaram a ser funcionários do
governo.
No ano seguinte, Luís XVI tentou fugir da França para a
Áustria, de onde pretendia combater, com os nobres
franceses exilados, o regime recém-criado. No entanto,
foi reconhecido por populares e levado de volta a Paris,
onde o mantiveram sob vigilância.
Ainda em 1791, passou a vigorar a nova Constituição,
que transformava a França em monarquia
constitucional e a reorganizava, de acordo com a
teoria da tríplice divisão dos poderes do Estado.
Ao concluir a Constituição, os membros da Assembleia
deram seu trabalho por encerrado e a dissolveram em 30
de setembro de 1791.
Ficou estabelecido que os novos deputados seriam
eleitos pelo voto censitário (segundo a renda de cada
um) e constituiriam a Assembleia Legislativa.
O Poder Executivo ficou nas mãos do rei, responsável
pela nomeação dos ministros. O terceiro poder — o
Judiciário — foi formado por juízes eleitos.
Vários problemas, entretanto, já ameaçavam a
estabilidade do novo governo. Em certas regiões, o clero
insuflava os camponeses contra a revolução. Em Paris, o
rei e a rainha conspiravam contra o movimento,
mantendo contatos com os nobres que haviam deixado
o país.
Em abril de 1792, o governo francês, receando que os
exilados organizassem a contrarrevolução, declarou
guerra à Áustria e à Prússia, países que abrigavam a
maioria desses refugiados. Os austríacos, com o apoio
da Prússia, partiram para a invasão da França. A
Assembleia Legislativa, então, convocou todos os
franceses a pegar em armas e defender o país.
A partir desse momento, as ações revolucionárias
tornaram-se mais radicais. Luís XVI, suspeito de traição
por colaborar com os invasores na guerra, teve seus
poderes suspensos pela Assembleia.
Foram convocadas eleições para uma nova assembleia,
que adotou o nome de Convenção — dessa vez, os
deputados foram eleitos por sufrágio universal
masculino, isto é, sem exigência de renda.
Na Convenção, os grupos políticos ficariam assim
posicionados: do lado direito da sala de sessões,
sentavam-se os girondinos, políticos moderados que
defendiam uma República liberal que garantisse a
propriedade privada;
Do lado esquerdo, ficavam os deputados mais radicais,
que lutavam por uma República democrática e
igualitária — entre estes, destacavam-se os jacobinos
(liderados por Maximilien Robespierre) e os cordeliers
(chefiados por Georges Danton e Jean-Paul Marat).
No meio dos dois grupos, sentavam-se os centristas
(também chamados de pântano ou planície), políticos
indecisos que votavam ora com os girondinos, ora com
os jacobinos.
Com a Queda da Bastilha, surgiram em Paris inúmeros
clubes revolucionários. Parte desses clubes se reunia no
convento dos monges jacobinos. Daí se originou a
expressão "clube dos jacobinos" para designar um dos
grupos mais radicais da Convenção.
O termo "girondino", por sua vez, era aplicado
inicialmente aos deputados eleitos pela província de
Gironda, localizada no sul da França. Depois, a palavra
passou a ser empregada para designar um grupo político
mais amplo, que incluía a burguesia.
A Convenção tomou posse no mesmo dia em que os
franceses venceram os exércitos austríaco e prussiano e
detiveram a invasão do território.
Seu primeiro ato foi a proclamação da República,
seguido da adoção de um novo calendário e de uma
nova contagem do tempo: o ano de 1792 passava a ser
considerado o Ano I da Revolução. Com isso, os
revolucionários queriam marcar o início de um novo
tempo, diferente do passado.
Os partidos se reorganizaram. A direita continuava
sendo representada pelos girondinos, grupo mais
conservador e identificado com os interesses da alta
burguesia. A esquerda seguia reunindo os jacobinos e
outros grupos políticos radicais, representando a
pequena burguesia e os sans-culottes — pessoas
pertencentes às camadas populares.
Ambas as tendências eram republicanas e
revolucionárias, mas os jacobinos pregavam a
radicalização e queriam aprofundar as mudanças
revolucionárias.
Confirmadas as suspeitas de traição de Luís XVI, ele foi
condenado à morte e guilhotinado em janeiro de 1793.
Sua execução só fez aumentar a oposição interna e
externa ao regime revolucionário e levou à formação da
Primeira Coalizão contra a França, na qual Áustria,
Prússia, Inglaterra, Rússia, Espanha e Portugal investiam
contra a revolução.
Diante de tantas dificuldades, a Convenção teve de
tomar medidas mais duras. Convocou a população para
a defesa do país e instituiu a Lei dos Suspeitos, pela
qual qualquer pessoa denunciada como
contrarrevolucionária podia ser condenada à morte.
Diante de tantas dificuldades, a Convenção teve de
tomar medidas mais duras. Convocou a população para
a defesa do país e instituiu a Lei dos Suspeitos, pela
qual qualquer pessoa denunciada como
contrarrevolucionária podia ser condenada à morte.
Em junho de 1793, os jacobinos, o grupo mais forte da
Convenção, fizeram uma demonstração de força: com o
apoio de aproximadamente 80 mil homens e sessenta
canhões, obrigaram a Convenção a decretar a prisão dos
principais líderes girondinos. A partir desse momento, os
jacobinos instalaram a ditadura na França e
estabeleceram o regime do Terror.
A frente desse movimento
estava o jacobino
Robespierre, apelidado de
"o incorruptível", que
levava ao extremo os
ideais democráticos de
Rousseau.
Para se fortalecer, a Convenção reuniu um grupo de
ferrenhos defensores da revolução e formou o Comitê
de Salvação Pública, que tinha como atribuições cuidar
da administração do país e promover a defesa externa.
O novo órgão era dirigido por Robespierre.
Após se voltar contra os
girondinos, Robespierre
perseguiu os mais exaltados e
os políticos moderados,
como o aliado Danton,
condenado por ele à morte
na guilhotina.
Com essa política radical, Robespierre acabou perdendo
o apoio de setores importantes para manter seu poder.
Em julho de 1794, foi destituído e, a exemplo de muitos
de seus adversários, também morreu na guilhotina. O
Terror ameaçava tantas pessoas que não foi difícil se
formar uma aliança dos oposicionistas ao regime.
Com a queda de Robespierre, os girondinos voltaram ao
poder e deram início à Reação Termidoriana, como
ficou conhecida a perseguição aos jacobinos. O retorno
dos girondinos significava a retomada de um caráter
mais moderado no processo revolucionário.
Em 1795, a Convenção finalmente concluiu a nova
Constituição, conhecida como Constituição do Ano III,
por ser o terceiro ano no novo calendário criado pela
Convenção.
Com a nova Constituição, o país passou a ser governado
pelo Diretório, controlado pelos girondinos. Entre os
principais acontecimentos dessa fase, destacam-se:


o cancelamento de muitas das medidas aprovadas no
tempo da Convenção, como o sufrágio universal
masculino;
a continuidade da guerra contra diversos países,
liderados pela Inglaterra;

e o agravamento da crise interna, em virtude da
desorganização da economia, da inflação e da
corrupção por parte de setores do governo.
Em meio a essa crise generalizada, os líderes burgueses
recorreram a Napoleão Bonaparte, na época um general
de prestígio. Apoiado pelo exército e pela burguesia,
Bonaparte deu um golpe de Estado contra o Diretório e
assumiu o poder.
Esse fato, conhecido como Golpe do 18 de Brumário de
1799, assinala o início de uma nova etapa da Revolução
Francesa, na qual seus princípios se expandiriam por
toda a Europa e várias regiões do mundo.
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A Revolução Francesa